rumo à uma teologia da emoção
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Por Sam Williams, Ph.D. Traduzido por Wlademir Mendes. Disponível em Todah Elohim pelo link http://wp.me/p4lBlo-3e4 Southern Baptist Journal of Theology. Vol. 7, Nbr 4, 2003.TRANSCRIPT
Sam Williams, Ph.D.
Tradução de Wlademir P. Mendes
Ruma à uma teologia da emoção
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Sam Williams, Ph.D.
Rumo à uma teologia da emoção Sam R. Williams, Ph.D. (2003)
INTRODUÇÃO
As Escrituras estão repletas de emoção tanto de Deus como do homem. A Bíblia é uma
coleção de livros dirigidos às pessoas por uma Pessoa. É a revelação de um Deus pessoal
para pessoas humanas feitas à sua imagem. Uma vez que as emoções são um
componente importante da personalidade, a Bíblia lida necessariamente com a emoção
entre outras coisas. A Bíblia frequentemente revela as emoções de Deus de maneira que
nossas vidas, incluindo nossas emoções, possam honrá-lo e glorificá-lo em plenitude.
Por exemplo, as Escrituras falam frequentemente da ira de Deus. Sem meios-termos,
Deus quer que entendamos não apenas o que Ele pensa do pecado, mas também o que
Ele sente sobre o pecado. Por que? Claramente, é para que possamos conhecer melhor
ao Senhor e, em particular, aprimorar nossa compreensão de sua santidade e seu amor.
A Bíblia fala da ira de Deus para que possamos compreender, racional e
emocionalmente, nosso dilema moral perante sua santa justiça e para que possamos
experimentar a profundidade do seu amor por nós quando derramou sua justa ira sobre
seu Filho e não sobre nós. "As Escrituras não apenas falam sobre emoções, elas também
falam para e através das nossas emoções. A própria Bíblia é literatura emocional, cheia
de expressão emocional e planejada não apenas para comunicar-se com nossa
racionalidade, mas também para instigar-nos emocionalmente, afirmando assim a nossa
‘emocionalidade.’"1
Embora alguns teólogos, a fim de preservar a imutabilidade de Deus, tenham
interpretado a abundância de referências às emoções de Deus como antropomorfismo,
este artigo procurará mostrar que é mais adequado ver as emoções humanas como
teomorfismo. A boa teologia deveria nos levar não apenas a pensar os pensamentos de
Deus, mas também a sentir os sentimentos de Deus. Se a semelhança de Cristo é nosso
alvo como Seus seguidores, isso deveria incluir não apenas a semelhança de Cristo em
nosso comportamento e pensamentos, mas também em nossas emoções. A compaixão, a
emoção mais frequentemente atribuída a Cristo nos evangelhos,2 facilita o cumprimento
do "uns aos outros" do Novo Testamento. Jesus nos convida a participar de sua alegria
nos Evangelhos e nos promete, nos Salmos, que à sua mão direita existe alegria para
1 D.G. Benner, “Emotion,” Evangelical Dictionary of Theology, ed. Walter A. Elwell (Grand Rapids: Baker, 1984) 352. 2 B.B. Warfiel, The Person and Work of Christ (Phillipsburg: P & R, 1950) 96-97.
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sempre. O fruto do Espírito Santo é caracterizado por atributos - amor, alegria, paz,
bondade, mansidão - que são carregados de emoção.
Infelizmente, os evangélicos contemporâneos têm prestado pouca atenção ao
desenvolvimento de uma teologia ou uma antropologia bíblica das emoções, afeições e
sentimentos. Como resultado, quando se fala de emoções, a opinião pessoal, os
preconceitos denominacionais ou culturais e a psicologia pop são as vozes dominantes.
E o que é pior, essas vozes são raramente questionadas ou justificadas com respaldo
bíblico.
As Escrituras contêm as normas, não apenas para nosso comportamento e pensamento,
como também para nossas emoções e afeições. O apóstolo Paulo disse aos Coríntios que
ele buscava trabalhar para a alegria deles e então, os admoesta por terem reprimido
suas afeições por ele. Tanto Paulo como Davi frequentemente conclamam seus ouvintes:
"regozijai-vos" e "alegrai-vos". Pedro nos diz para lançar toda nossa ansiedade sobre
Ele, porque Ele tem cuidado de nós. "Não temas" é um mandamento frequente tanto no
Antigo como no Novo Testamento. As Escrituras nos dizem que o homem justo odeia o
que Deus odeia. Moisés diz aos israelitas que eles seriam julgados "porque vocês não
serviram o Senhor Seu Deus com alegria e gozo de coração pela abundância de todas as
coisas." Quer estejamos cônscios disso ou não, temos teorias e princípios operantes
sobre as emoções. Não deveria ser surpresa que, quando as Escrituras não moldam
nosso pensamento, especialmente num assunto como a emoção que é parte tão
importante da natureza das pessoas, alguma outra coisa o moldará. O ministério cristão
não pode acontecer sem um conjunto de crenças e conceitos sobre as pessoas, uma
psicologia se você prefere, que necessariamente leve a crenças sobre emoções.
Felizmente, a Palavra de Deus escrita pode ser qualquer coisa menos omissa sobre
emoções. Sabedoria bíblica prática sobre emoções está disponível nas Escrituras, se
estivermos dispostos e separarmos tempo e fizermos o esforço necessário para
garimpar esses tesouros latentes da sabedoria de Deus. O propósito desse artigo é
definir parâmetros bíblicos e oferecer algumas poucas e modestas propostas para o
desenvolvimento de uma teologia, ou talvez mais apropriadamente, uma psicologia
bíblica das emoções, afeições e sentimentos. Em última análise, o propósito desse artigo
é considerar a realidade das nossas emoções como uma manifestação da imagem e da
glória do nosso grande Deus.
DISTINGUINDO SENTIMENTOS, EMOÇÕES E AFEIÇÕES
A confusão e a imprecisão abundam no uso destas três palavras correlatas: sentimento,
emoção e afeição. Isso é muito difícil de evitar visto que seus significados se sobrepõem
e elas compartilham o mesmo campo semântico. Além disso, elas são frequentemente
usadas como sinônimos no linguajar comum. Entretanto, algumas definições são
essenciais como ponto de partida. São propostas algumas definições.
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Sentimento: a percepção sensorial de algum evento externo ou interno, que é
tipicamente classificado em categorias binárias de experiência: bom/mau,
agradável/desagradável, suave/áspero, duro/macio, quente/frio; ou, a experiência e
relato subjetivos de uma emoção. Frequentemente, na linguagem comum, a palavra
"sentimento" coincide com a palavra "emoção".
David Powlison descreve quatro usos diferentes da palavra "sentimento:" (1) descrever
percepções sensoriais; (2) expressar emoção; (3) comunicar desejos; (4) comunicar
pensamentos, crenças e atitudes.3 Os primeiros dois usos que Powlison descreve são
similares à minha definição, têm o potencial para uma maior precisão e evitam
confundir faculdades e capacidades humanas.
O primeiro uso de Powlison e minha primeira definição nos fornece um termo que
descreve amplas categorias da experiência humana: prazer ou dor, frio ou quente, etc.
"Eu me sinto bem/mal" ou "isso parece bom/ruim". Deus nos projetou de maneira a
desejarmos nosso próprio bem; nós naturalmente buscamos aquilo que achamos que
nos levará à vida, felicidade e prazer e evitamos o que achamos ser ruim, repulsivo,
doloroso ou desagradável. A busca do prazer e felicidade e a aversão à dor e ao
sofrimento é um princípio básico da vida, e em si mesmo, dado por Deus. É porque
fomos criados dessa maneira que Deus frequentemente nos motiva nas Escrituras com
promessas de bênção e ameaças de castigo. Por exemplo, em Dt 30.15-20.
“Vê que proponho, hoje, a vida e o bem, a morte e o mal; se guardares o
mandamento que hoje te ordeno, que ames o SENHOR, teu Deus, andes nos
seus caminhos, e guardes os seus mandamentos, e os seus estatutos, e os
seus juízos, então, viverás e te multiplicarás, e o SENHOR, teu Deus, te
abençoará na terra à qual passas para possuí-la. Porém, se o teu coração se
desviar, e não quiseres dar ouvidos, e fores seduzido, e te inclinares a outros
deuses, e os servires, então, hoje, te declaro que, certamente, perecerás;
não permanecerás longo tempo na terra à qual vais, passando o Jordão,
para a possuíres. Os céus e a terra tomo, hoje, por testemunhas contra ti,
que te propus a vida e a morte, a bênção e a maldição; escolhe, pois, a vida,
para que vivas, tu e a tua descendência, amando o SENHOR, teu Deus,
dando ouvidos à sua voz e apegando-te a ele; pois disto depende a tua vida
e a tua longevidade; para que habites na terra que o SENHOR, sob
juramento, prometeu dar a teus pais, Abraão, Isaque e Jacó.”
3 D. Powlison, What Do You Feel? Journal of Pastoral Practice, 10/4 (1991) 50-53.
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De maneira similar, Pascal escreveu:
“Todo homem busca a felicidade. Sem exceção. Independente dos meios
empregados, todos tendem a esse fim. O motivo porque alguns vão à
guerra e outros a evitam é o mesmo desejo em ambos, satisfeito por
diferentes visões. A vontade nunca dá o mínimo passo em outra direção a
não ser esta. Esta é a motivação de todo homem, até mesmo dos que se
enforcam.” 4
A segunda parte da minha definição de sentimento, assim como o segundo uso de
Powlison simplesmente usa a palavra como um predicado para a emoção
conscientemente experimentada. "Eu me sinto feliz, triste, enojado, com medo, etc."
Emoção: uma resposta somática, totalmente individual (envolvendo pensamentos,
crenças e julgamentos feitos sobre o meio ambiente e sobre si mesmo) a experiências
internas e/ou externas, subjetivamente vivenciadas como alguma variedade de
sentimento, que prepara o corpo e a mente para a ação. As emoções são normalmente
psicossomáticas, corpo e alma, para os seres humanos. Entretanto, as emoções não são
necessariamente mediadas por um corpo.
As palavras "emoção" e "motivo" derivam da mesma raiz latina, movere, que significa
"mover". As emoções são tanto responsivas como preparatórias. Elas são parte de nossa
resposta às nossas experiências e também nos motiva em direção a fins particulares. E,
emoções específicas têm propósitos e função específicos. Por isso, nós acertadamente
falamos de uma emoção ser justificada ou injustificada, racional ou irracional, realista
ou irrealista, sensível ou ridícula. Experiências emocionais não são neutras; ou elas
facilitam os propósitos e funções do indivíduo ou, ainda mais importante, os propósitos
de Deus, ou não, logicamente em graus variados. Coram Deo,5 emoções específicas em
contextos específicos tanto podem ser pecaminosas como justas.
Emoções particulares têm funções particulares e servem a propósitos particulares.
Qualquer definição e especificação do papel de emoções particulares devem levar em
conta as dimensões intrapessoal, horizontal/interpessoal e vertical/espiritual/moral.
Afeição - profundos e permanentes vetores emocionais/motivacionais da alma, que nos
movem para, ou de alguma coisa, dependendo da avaliação moral que fizermos.
McDermott, seguindo Jonathan Edwards, diferencia afeição e emoção ao notar que as
afeições são fortes e poderosas e determinam, em última análise, nossas escolhas,
enquanto as emoções são comparativamente fracas e fugazes.6
4 B. Pascal, Pascal’s Pensees, trad. por W. F. Trotter (New York: E. P. Dutton, 1958) 113. 5 Nota do Tradutor: diante de Deus. 6 G. McDermott, Seeing God: Jonathan Edwards and Spiritual Discernment (Vancouver, Regent College, 2000) 31-33.
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Jonathan Edwards foi cuidadoso em evitar separar as afeições da vontade. Em Religious
Affections (Afeições Religiosas), ele declarou,
A vontade e as afeições não são duas aptidões; as afeições não são
essencialmente distintas da vontade nem diferem de meros atos da vontade
e da inclinação, exceto somente pela animação e sensibilidade do agir... que
são comumente chamados de afeições não são essencialmente diferentes
deles, a não ser somente pelo grau e maneira do agir. Todo ato da vontade,
qualquer que seja ele, goste ou não a alma, está inclinado ou não para o
que tem em vista.7
Cerca de cem anos antes de Edwards, um puritano inglês, William Fenner escreveu, com
discernimento e imaginação gráfica, sobre o papel das afeições e sua necessária conexão
com o senso moral.
“As afeições são os movimentos impetuosos e sensíveis do coração ou da
vontade em direção a algo ou fugindo de algo, dependendo se esse algo é
percebido como bom ou mau... As afeições são os pés da alma: pois assim
como corpo vai com seus pés para aquilo que ama, assim a alma vai com
suas afeições para aquilo que ela ama. A alma não tem outro caminho para
se achegar àquilo que ama a não ser através das suas afeições... As
afeições são os cavalos da alma que as conduzem como numa carruagem
para aquilo que ela afeta: um homem é movido pelas afeições. Pela raiva
ele se move para uma vingança; pelo desejo ele se move para obter; pelo
amor ele se move para apreciar; pela compaixão ele se move para
confortar. As afeições são os movimentos da alma... As afeições estão
diretamente relacionadas com a percepção de bem ou mal. Quando há
pouca percepção do bem ou do mal, as afeições são fracas e dificilmente
podem afetar o corpo. Mas, quando existe grande percepção de ambos,
não somente a alma é profundamente afetada, mas o corpo também.8
Nossa definição de afeição inclui emoção, que envolve o intelecto, "pensamentos,
crenças e julgamentos" e nossa definição de afeição inclui avaliação moral. Podemos
desprezar sumariamente definições reducionistas que tratem a emoção ou afeição como
meros distúrbios somáticos, biológicos. Estas definições não nos permitem separar
emoções ou afeições da razão, consciência ou volição.
7 W. Fenner, A Treatise of the Affections (London: I. Rothwell, 1642) 3-5. 8 Idem.
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A DOUTRINA DE DEUS
Uma psicologia bíblica da emoção deve começar e terminar com Deus. John Frame
notou habilmente que nós não podemos conhecer outras coisas adequadamente sem
conhecer a Deus adequadamente, "essencialmente porque a doutrina do conhecimento
de Deus implica na doutrina do conhecimento de todas as coisas".9 Calvino começa suas
institutas com um reconhecimento similar: o conhecimento de nós mesmos é
inextrincavelmente dependente de nosso conhecimento de Deus e vice-versa.10 Não é
por coincidência que sabedoria e conhecimento sobre qualquer coisa começa com o
temor de Deus, uma resposta emocional particular a Ele (Pv 1.7; 9.10).
A maioria dos psicólogos e filósofos começam pelo lugar errado quando pensam sobre a
emoção porque eles não partem de um temor do Senhor, que é o principio da sabedoria
e entendimento.11 Embora eles possam nos fornecer observações importantes, coletar
dados importantes ou fazer perguntas importantes, suas conclusões são
frequentemente superficiais e sempre fundamentalmente imperfeitas quando o Criador,
cuja imagem nós refletimos, é excluído das suas formulações. Mesmo sob uma
perspectiva secular, tem se discutido que o afastamento da psicologia da filosofia,
particularmente da metafísica e da ética no final do século 19 deixou ela moralmente e
espiritualmente vazia, virtualmente ignorando a condição humana.12 A psicologia
acadêmica está dominada pelo behaviorismo (incluindo a variedade behaviorista-
cognitiva) e pelo reducionismo biológico. Ela exclui a reflexão moral e metafísica visto
que esses domínios não estão acessíveis aos métodos empíricos. A psicologia se tornou
uma "ciência comportamental" e psiquiatria biológica, o paradigma reinante no campo
da saúde mental que tipicamente reduz a experiência humana à mera neurobiologia.
Deus é uma pessoa
Direta ou indiretamente, cada página das Escrituras responde à pergunta, "Quem é
Deus?" Que tipo de ser Ele é. Uma resposta central a essa questão é que Deus é uma
pessoa.
Deus é retratado nas Escrituras em termos pessoais. Yahweh (AT) e Kurios (NT) são os
nomes que Deus dá a si mesmo e estes são nomes pessoais, nomes próprios com vários
níveis de significados.13
9 J. Frame, The Doctrine of the Knowledge of God (Phillipsburg: P & R, 1987) 10. 10 J. Calvin, Institutes of The Christian Religion, trad. por H. Beveridge (Grand Rapids: Eerdmans, 1997) 37-39. 11 Provérbios 1.7; 9.10. 12 D.N. Robinson, An Intelectual History of Psychology (New York: MacMillan, 1976) 352-8, 379-80. 13 J. Frame, The Doctrine of God (Phillipsburg: P & R, 2002) 21-6
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Ele é a única pessoa auto-existente, totalmente independente. "Somente as Escrituras
apresentam consistentemente a realidade de um Deus que é tanto pessoal como
absoluto”.14 Ele não é apenas uma força de vida ou uma ideia moral ou racional, ou um
princípio ético transcendente. Embora Ele seja o criador e sustentador onipresente da
vida e de todas as coisas sobre a terra, Ele não é idêntico nem compartilha uma
identidade comum com qualquer coisa que criou. Embora Deus seja santo e também
amor, o inverso não é verdade; nem a santidade e nem o amor é Deus. Embora Ele tenha
atributos, Ele não é um atributo; Ele é uma Pessoa com atributos. Desde o início das
Escrituras, Deus age como uma pessoa. Ele pensa, escolhe e sente, fala e expressa prazer
e desprazer, expressa deleite e ira, ama e odeia. Em outras palavras, Ele age como uma
pessoa porque Ele é uma pessoa. Deus é Pai. Deus é Filho. Deus é Espírito Santo que
sofre, conhece e para quem se pode mentir. Ele é um Senhor Pessoal, e por causa disso
podemos ter um relacionamento pessoal com Ele (em seus termos, é claro; Ele é
Senhor) como entre companheiros, mas devemos fazer isso como servos. Ele é a Pessoa
que cria; nós somos as pessoas as quais Ele criou. Ele é Pai; nós somos seus filhos.
Visto que Ele é uma pessoa, não apenas podemos nos engajar num relacionamento com
Ele, mas também podemos entender a nós mesmos através do entendimento dele à
medida que ele se revela a si mesmo nas Escrituras e em Jesus Cristo. Conhecendo o Pai
e o Filho passamos a conhecer quem somos nós como pessoas e a conhecer que tipo de
pessoas deveríamos ser. Deus é o protótipo para a humanidade e personalidade. Ele
também é O Santo, Personalidade perfeita. Portanto deveríamos olhar para Ele para
entender o que significa ser uma pessoa, um ser caracterizado por personalidade.
Alvin Platinga pergunta,
Como deveríamos pensar sobre as pessoas humanas? Que tipo de coisas,
fundamentalmente elas são? O que é ser um humano, o que é ser uma
pessoa humana? O que deveríamos pensar sobre pessoalidade? (...) A
primeira coisa a pensar é que no esquema cristão das coisas, Deus é a
primeira pessoa, o primeiro e principal exemplar de pessoalidade... e as
propriedades mais importantes para uma compreensão de nossa
pessoalidade são propriedades que compartilhamos com Ele.15
Portanto, a fim de entender a nós mesmos como pessoas com emoção, devemos
entender a Deus como uma pessoa com respeito à emoção. Nós fomos feitos à sua
imagem e semelhança. Uma teologia da emoção deve começar com Deus e sua
autodescrição nas Escrituras porque Ele é a Pessoa Absoluta e eterna, o Criador, o
original cuja imagem refletimos. No final das contas, todas as emoções são planejadas
14 Idem, p.602. 15 A. Platinga citado por J.P. Moreland e S.B. Rae em, Body & Soul, (Downers Grove: Intervarsity, 2000) 25.
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para terminar no próprio Deus, retornar a Ele para sua exaltação porque, "O destino
principal do homem é glorificar a Deus e alegrar-se nele para sempre".16
Deus como uma pessoa com emoções
A afirmação de que o Deus da Bíblia experimenta emoções pareceria óbvia não fosse a
influência precoce de Platão e dos Estoicos sobre os teólogos. A ideia de um Deus
impassível, sem emoções, deriva de uma visão pejorativa das emoções como
inerentemente incontroláveis e caprichosas. As emoções eram vistas como irracionais e
destemperadas e como um sinal de fraqueza, dependência e contingência. Como
resultado, o ideal estoico de apatia tornou-se o ideal e esta ideia foi imposta sobre Deus.
McGrath cita o desafio da modificação do conceito de que Deus é impassível como um
exemplo do modo como a teologia é afetada pelos conceitos culturais e filosóficos,
escrevendo: "A reflexão patrística sobre se Deus poderia sofrer era significativamente
influenciada pelo consenso filosófico prevalecente de que um ser perfeito não poderia
mudar ou ser afetado por influências externas."17
Com o intuito de preservar os atributos divinos de transcendência, imutabilidade e
auto-existência, muitos dos teólogos patrísticos acreditaram que era necessário definir
Deus como impassível - Ele é incapaz de experimentar "paixões", emoções negativas ou
sofrimento.
Os Trinta e Nove Artigos da Igreja da Inglaterra e a Confissão de Fé de Westminster
descrevem Deus como "sem corpo, partes ou paixões". Os abundantes versículos
bíblicos que pareciam atribuir emoções a Deus foram considerados antropomórficos ou,
mais apropriadamente, antropopáticos. Em outras palavras, nas Escrituras, Deus
representa a si mesmo com emoções apenas para se tornar compreensível para seres
humanos emocionais. Entretanto, como escreveu Bruce Ware, em todas as referências
bíblicas às emoções relacionadas a Deus não parece existir nenhum exemplo no qual seja
dito que Deus, na realidade, transcenda estas qualidades emocionais. Parece então não
existir nenhuma orientação clara, como havia com relação à questão do arrependimento
divino, para interpretar as emoções divinas de qualquer outro modo que não seja as
declaradas no texto.18
D. A. Carlson também criticou a hermenêutica da impassibilidade:
“O problema metodológico com o argumento da impassibilidade divina é
que ele escolhe certos textos das Escrituras, notadamente aqueles que
insistem na soberania e imutabilidade de Deus, constrói uma peneira
16 The Confessions of Faith, The Shorter Catechism (Richmond: John Knos Press, 1959) 387. 17 A. McGrath, Historical Theology – An Introduction to the History of Christian Thought (Oxford: Blackwell, 1998) 15. 18 B. A. Ware, An Evangelical Reformulation of the Doctrine of the Immutability of God, JETS 29/4 (1986) 445.
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teológica com base nestes textos e então usa essa peneira para filtrar todos
os outros textos, em particular aqueles que falam das emoções de Deus.”19
Vários teólogos modernos a partir da metade do século 20 reconhecem que Deus
realmente experimenta emoções.20 Bruce Ware reformula a doutrina da imutabilidade
negando que Deus seja "absolutamente imutável" ao afirmar que Deus conserva
imutabilidade ética e ontológica ou "imutabilidade onto-ética". Em outras palavras,
Deus é imutável e autodeterminante em seu ser santo e imutável (ou sua natureza
intrínseca) e também imutável em suas perfeições morais, incluindo sua total
integridade e fidelidade em manter sua Palavra. Entretanto, Ware defende que Deus é
relacional e emocionalmente mutável, ainda que sua imutabilidade ética e ontológica
seja preservada. Ele declara:
“Quando corretamente entendidas, as mudanças relacionais que
acontecem através da interação entre Deus e suas criaturas, longe
de contradizer o seu caráter imutável, elas na realidade são uma expressão
dele... É porque a natureza moral intrínseca de Deus é imutável que ela
precisa sempre, sem falhar, expressar-se de maneiras adequadas ao estado
moral de cada situação. Assim, quando o estado moral humano muda (e.g.
da rebelião para o arrependimento) a natureza divina imutável deve agora
refletir-se de modo adequado a essa nova situação. Portanto, mudanças
nas atitudes e ações de Deus são produzidas naturalmente à medida que
Deus consistentemente aplica os padrões e requisitos de sua natureza
moral constante de maneira que correspondam às mudanças morais a que
suas criaturas são continuamente submetidas. Barth estava certo ao falar
de uma "santa mutabilidade de Deus" pela qual se entende que Deus muda
em suas atitudes, condutas e relacionamentos com humanos de maneira
que tanto atenda sua natureza moral intrínseca imutável como confronte
apropriadamente a situação moral humana.” 21
Certamente este tipo de mudança nos relacionamentos e atitudes de Deus para com
suas criaturas incluiriam várias mudanças emocionais. Estas várias emoções seriam
uma expressão necessária de Deus como um ser completamente santo, amoroso,
pessoal, sábio e moralmente perfeito. Deus não se torna melhor ou pior com essas
mudanças emocionais que são consistentes e mesmo necessárias para expressar suas
supremas perfeições. Ware conclui: "A abundância de evidências de expressão de
emoção por Deus nas Escrituras e uma compreensão mais positiva de sua natureza
19 D. A. Carson, How Long O Lord? (Grand Rapids: Baker, 1990) 186. 20 P. S. Fides, Divine Suffering, em The Blakcwell Encyclopedia of Modern Chrsitian Thougth, ed. A. McGrath (Cambridge: Blackwell, 1993) 634. 21 An Evangelical Reformulation of the Doctrine of the Immutability of God, 439-440.
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levam à conclusão que o Deus vivo e verdadeiro é, entre outras coisas, um ser
genuinamente emocional."22
O fato de que Deus é um ser espiritual, sem um corpo mas com emoções, nos informa
que as emoções não são essencialmente materiais ou somáticas. Além disso, vemos
evidência da natureza essencialmente espiritual da emoção humana nas Escrituras onde
indivíduos que haviam morrido fisicamente são descritos no estado intermediário. Em
Apocalipse 6.9-11, as almas dos mártires clamam com justa indignação para que a
justiça de Deus seja feita. Na parábola de Lucas 16.19-31, Lázaro recebe conforto
enquanto o homem rico está em tormento e agonia (entendendo que, não estamos
certos sobre o quanto podemos confiar em todos os pontos da parábola, mas é muito
consistente com outros relatos do sofrimento que acompanhará a punição eterna no
inferno). O que é relevante nesta parábola é que essas pessoas sem corpo estão
conscientes e que uma alma experimenta a emoção do sofrimento enquanto a outra
recebe conforto.23 De acordo com John Piper: "Filipenses 1.23 e 2 Coríntios 5.8 ensinam
que após a morte de um cristão e antes da ressurreição do corpo, o cristão estará com o
Senhor e será capaz de alegrias ‘muito melhores’ dos que as que conheceu aqui."24
Finalmente, um certo apoio para a defesa de que a emoção não necessita
necessariamente de um corpo físico humano pode ser inferido das descrições bíblicas
dos anjos, que são essencialmente não-físicos, seres espirituais. Por exemplo, em Lucas
2.8-14, o anjo que anuncia a encarnação do Messias aos pastores traz "boas novas de
grande alegria". As hostes celestiais que louvam e dão glória a Deus não se parecem com
robôs apáticos. Lucas 15.10 sugere, pelo menos, algum tipo de capacidade emocional
nos anjos: "há alegria na presença dos anjos de Deus quando um pecador se arrepende".
Além disso, é difícil imaginar anjos celestiais na presença de Deus, adorando-o
incessantemente, mas sem emoção. Com certeza eles se regozijam e tremem em sua
presença.
A DOUTRINA DO HOMEM
“Quando se fala da natureza das pessoas humanas, a ciência é amplamente
incompetente, seja para formular as perguntas certas, como para dar
respostas. O máximo que as várias ciências conseguem fazer é descrever o
funcionamento de sistemas físicos, mas elas são largamente incompetentes
para decidir questões sobre a natureza da consciência, intencionalidade,
identidade e ação pessoal e assuntos relacionados.”25
22 Idem, 445. 23 J. P. Moreland e S.B. Rae, Body & Soul (Downers Grove: Intervarsity, 2000) 35-37. 24 J. Piper, Desiring God: Meditations of a Christian Hedonist (Oregon: Multnomah, 1986, 1996) 299. 25 Body & Soul, 41.
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Uma vez que a emoção é um fenômeno essencialmente pessoal e espiritual, uma
teologia e uma filosofia biblicamente fundamentadas estão "dando o melhor de si"
quando "discutem questões sobre a natureza da consciência, intencionalidade,
identidade e ação pessoal e assuntos relacionados." O paradigma histórico-redentivo da
Criação, Queda e Redenção servirão para organizar e enfocar a discussão sobre emoção
à medida que ela se relaciona com a doutrina do homem.
Criação
"Nós não deveríamos nos surpreender que uma sociedade que nega a
realidade do Deus da criação esteja cheia de indivíduos que não sabem
quem são e que não sabem explicar por que eles fazem o que fazem."26
Perceber que a emoção é um aspecto importante da nossa natureza como pessoas
humanas criadas por, como e para um Deus absolutamente Santo e Pessoal, nos livra
das várias noções erradas sobre a emoção que prevalece em nossos dias.
A disputa estoica de que a emoção é uma paixão tola que atrapalha o pensamento
racional e impede as boas escolhas, juntamente com a versão "cristianizada" do
estoicismo que afirma que Deus não se importa com nossos sentimentos mas somente
com nossa santidade, pode ser contestada em várias bases.
Primeiro, nossas capacidades emocionais são parte da nossa natureza como seres
pessoais criados à imagem e semelhança de Deus. Contrariamente à tendência estoica
de ver a emoção como uma perturbação, existem muitos mandamentos bíblicos para
experimentar certas emoções. Somos ensinados a odiar o pecado, regozijarmos sempre,
agradar-se e alegrar-se no Senhor, chorar com os que choram, sofrer como quem tem
esperança e temer a Deus.
Segundo, a capacidade para responder emocionalmente é parte do projeto original de
Deus, pré-queda, que foi considerado muito bom pelo Senhor. O segundo capítulo de
Gênesis faz três referências diretas à capacidade emocional do homem. Primeiro, Deus
faz árvores com frutos que eram agradáveis à vista (v.9). Ele poderia ter colocado bio-
tabletes de soja verde em máquinas hermeticamente seladas, mas em sua sabedoria, Ele
fez a comida com uma aparência atraente e agradável. Segundo, a exclamação poética de
Adão, após Deus ter lhe presenteado com a companhia feminina: “Esta é agora osso dos
meus ossos e carne da minha carne”, sugere alívio e excitação (v.23). Finalmente, a
história da criação termina nos informando que “o homem e sua esposa estavam nus e
não se envergonhavam.” (v.25). É razoável inferir que Adão e Eva não estavam apenas
26 A. Begg, What Angels Wish They Knew – The Basics of True Christianity (Chicago: Moody Press, 1998) 33.
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nus e sem sentir vergonha, mas que sentimentos positivos estavam relacionados ao seu
estado de nudez diante de Deus e diante um do outro.
Terceiro, emoções específicas como medo, alegria e prazer são componentes essenciais
na realização do propósito primário de nossa existência: servir e glorificar a Deus.
Somente os tolos não temem a Deus. Temer a Deus é uma resposta natural e necessária
à sua santidade e poder. Até mesmo Jesus Cristo, o Homem perfeito, experimentou e
apreciou o santo temor (Is 1.1-3; Hb 5.7). “Servi ao Senhor com temor, e regozijai-vos
com tremor.” (Sl 2.11). “Por não haveres servido ao Senhor teu Deus com gosto e alegria
de coração, por causa da abundância de tudo, servirás aos teus inimigos, que o Senhor
enviará contra ti...” (Dt 28.47)
O conceito de John Piper de "Hedonismo Cristão," fazendo eco com temas encontrados
em outros pensadores cristãos como Agostinho, Pascal, Edwards e Lewis, defende que a
busca da alegria não é meramente popular ou apenas mais uma entre as muitas opções
da vida, mas pelo contrário, é a essência do nosso dever de glorificar a Deus agradando-
se dele. “A busca do prazer é uma parte necessária de toda adoração e virtude.”27 “Deus
é mais glorificado em nós quando estamos mais satisfeitos nele” é um tema axiomático
para Piper.28
Então, Deus dá emoções para um propósito específico. Elas são necessárias para que
possamos conhecer, nos relacionar e glorificar a Deus; elas são planejadas para facilitar
o cumprimento dos Grandes Mandamentos: amar a Deus com tudo o que somos e
fazemos e amar nosso próximo tão prontamente quanto amamos a nós mesmos. A
capacidade para sentir emoções é projetada por Deus e é parte de seu plano
divinamente ordenado para nós como seus servos. Entender os planos e a ordem de
Deus para as emoções é um pré-requisito sem o qual não podemos entender as
desordens emocionais.
Uma das explicações contemporâneas mais comuns para o porquê das pessoas fazerem
o que fazem e para a miséria pessoal e social, é que elas sofrem de uma "Desordem do
Humor", que é uma categoria diagnóstica no DSM-IV,29 ou simplesmente que elas têm
um "problema emocional", como depressão ou ansiedade. Entretanto, as profissões
seculares da área da saúde mental não compreendem nem definem adequadamente as
desordens afetivas ou problemas emocionais porque eles ignoram a ordem divina e o
Divino Ordenador. Desnecessário é dizer que um pré-requisito para definir uma
desordem é uma noção prévia da ordem apropriada. A fim de entender o que está
27 J. Piper, Desiring God: Meditations of a Christian Hedonist (Oregon: Multnomah, 1986, 1996) 23. 28 J. Piper, Future Grace (Oregon: Multnomah, 1995) 9. 29 American Psychiatric Association, Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders – IV (Wash., D.C.: American Psychiatric Association, 1994). Nota do tradutor: Manual Estatístico e Diagnóstico das Desordens Mentais, publicado pela Associação Psiquiátrica Americana, amplamente usado em todo o mundo para classificação e diagnóstico das patologias psiquiátricas.
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desordenado, você deve primeiro entender a ordem certa ou ideal. Por exemplo, de uma
perspectiva bíblica, uma pessoa que não experimenta qualquer temor de Deus e
nenhuma ansiedade a respeito do seu destino eterno é mais perturbada do que uma
pessoa que tem ataques de pânico após a convicção de que ela é culpada diante de um
Deus santo e justo e está destinada ao inferno exceto por Cristo. Em ambos os casos,
suas emoções não podem ser corretamente decifradas até que seu status diante de Deus,
que nunca dorme ou cochila e que esquadrinha cada coração, sejam compreendidos.
Quando as emoções são isoladas "dAquele com quem nos relacionamos," elas não
podem ser entendidas e, de fato, podem ser tragicamente mal interpretadas e
frequentemente medicadas ou, de algum outro modo falsamente acalmadas.
De modo similar, conselheiros cristãos às vezes se referem a emoções “feridas” ou
“danificadas” como a fonte dos problemas na vida de uma pessoa. Essa maneira de falar,
embora faça algum sentido experimental, é equivocada porque as emoções são
abstraídas e separadas da pessoa ou do coração. Como resultado, o aconselhamento se
concentra em curar emoções em vez de enfocar no coração, de onde estas emoções
fluem. O diagnóstico bíblico não é que temos emoções feridas ou problemas emocionais,
mas sim que temos problemas do “eu” ou problemas do “coração”. “Este é o mal que há
em tudo quanto se faz debaixo do sol: a todos sucede o mesmo; também o coração dos
homens está cheio de maldade, nele há desvarios enquanto vivem.” (Ec 9.3). Jay Adams
afirma,
“O fato é que não existem emoções destrutivas ou danificadas per si. Nossa
constituição emocional vem totalmente de Deus. Todas as emoções com
que ele nos capacitou são construtivas quando usadas apropriadamente
(i.e., de acordo com os princípios bíblicos). Todas as emoções, entretanto,
podem se tornar destrutivas quando falhamos em expressa-las em
harmonia com as limitações e estruturas bíblicas.”30
É aí que mora o problema.
Queda
Derek Kidner oferece o seguinte comentário em Gênesis 3 a respeito da proposta de
tentação a Adão e Eva, “O clímax é uma mentira grande o suficiente para reinterpretar a
vida e a dinâmica o suficiente para redirecionar o fluxo de afeição e ambição. Ser como
Deus e conseguir isso passando a perna nele, é um programa intoxicante.”31 As emoções
de Adão e Eva são incitadas e direcionadas contra Deus em vez de a favor dele. A
emoção, assim como o que comemos ou bebemos ou qualquer outra coisa que façamos,
deveria ser para a glória de Deus. Mas, as emoções caídas aparecem rapidamente na
30 J. Adams, The Christian Counselor Manual (Grand Rapids: Zondervan, 1973) 349. 31 D. Kidner, Genesis: An Introduction and Commentary (Downer’s Grove: Tyndale, 1967)68.
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história humana. Adão e Eva experimentaram uma panóplia de emoções negativas
somente após renderem seus próprios desejos ao “programa intoxicante” de Satanás.
Tornaram-se envergonhados, preocupados, ansiosos e medrosos logo após desobedecer
a Deus. Em Gênesis 4, o primeiro assassinato ocorre num contexto de emoção ímpia:
inveja e ira injusta.
Um dos mais populares e perniciosos mitos sobre as emoções é o de que elas não são
nem boas nem más, simplesmente são. Nesta perspectiva, a experiência emocional
ocorre dentro de uma zona moralmente neutra, livre de valores onde conceitos tais
como bom e mau, certo e errado, justo e pecaminoso são sistematicamente evitados ou
pelo menos minimizados.
Carl Rogers foi o mais proeminente proponente deste ponto de vista do século 20, que
impregna o aconselhamento clínico, a psicologia educacional, a educação da clínica
pastoral e que tem se infiltrado no aconselhamento cristão. Um foco primário da terapia
rogeriana (também conhecida como terapia não-diretiva ou centrada-na-pessoa) está
no ouvir cuidadosamente, aceitando e simpatizando com os sentimentos do
aconselhado. “Fatos objetivos são sem importância. Os únicos fatos que tem importância
para a terapia são os sentimentos que o cliente consegue trazer à tona.”32 O alvo da
terapia é reduzir a alienação da própria experiência e sentimentos de alguém e facilitar
a congruência ajudando-o a entrar em contato com seus próprios sentimentos.
Sentimentos negativos como ansiedade e depressão resultam da incongruência e da
falta de aceitação do verdadeiro eu da pessoa. A fim de facilitar a congruência e a auto
realização, o conselheiro simplesmente dirige a atenção e se simpatiza com as emoções
do aconselhado. As pessoas funcionarão como seres humanos plenos se estiverem livres
para experimentarem, expressarem e satisfazerem sua natureza interior, o que é
positivo, racional e basicamente bom. Avaliação moral e conselhos diretivos somente
inibiriam o processo de atualização. As emoções devem ser aceitas sem condições ou
julgamentos.
Uma outra maneira na qual a valência moral e a natureza espiritual da emoção são
negadas ou minimizadas é através do reducionismo biológico. Em outras palavras, a
emoção é reduzida ou completamente atribuída ao corpo, comumente à fisiologia
cerebral, herança genética ou alguma combinação disso. Esse é um ponto difícil, visto
que a emoção como a experimentamos é, indubitavelmente, psicossomática, alma e
corpo. O corpo é, inclusive, o canal através do qual experimentamos a emoção, e quem
poderia questionar que nossos corpos e cérebros influenciam nossas emoções. Uma
psicologia bíblica da emoção pode reconhecer a mediação somática da emoção e uma
interação íntima entre psique e soma, mas deve sustentar que a emoção é
essencialmente pessoal e espiritual e normalmente, mas não necessariamente ou
32 C. Rogers, Counseling and Psychotherapy (Boston: Houghton Mifflin, 1942) 244.
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essencialmente, somática. Comentando sobre a relação entre corpo e alma, Jonathan
Edwards escreveu:
“Tal parece ser nossa natureza e tais as leis da união entre a alma e o
corpo, que não existe jamais qualquer exercício vigoroso e vívido da
inclinação que não tenha algum efeito sobre o corpo... Mas mesmo assim,
não é o corpo, mas sim a mente, o lugar próprio das afeições. O corpo do
homem não é mais capaz de ser realmente o sujeito de amor e ódio, alegria
ou tristeza, medo ou esperança, do que o corpo de uma árvore ou do que o
mesmo corpo de homem é capaz de pensar e compreender. Assim como
apenas a alma é capaz de ter ideias, assim também é a alma que se agrada
ou desagrada com suas ideias. Assim como apenas a alma pensa, assim
também apenas a alma ama ou odeia, alegra-se ou se entristece com o que
pensa.” 33
Uma visão bíblica da emoção, ao mesmo tempo que sustenta que a capacidade para ter
emoções é boa, deve levar em conta o pecado que corrompeu todas as partes de nosso
ser e de nossa experiência... O coração humano caído é mau, enganoso e rebelde;
portanto, seus produtos são inevitavelmente manchados pelo pecado. O pecado infecta
todo nosso ser; toda nossa capacidade ou faculdade se desviou de Deus. Nossas emoções
não são mais naturalmente orientadas de modo a contribuírem para honrar, amar e
obedecer a Deus. Em vez disso, nossas emoções se tornaram egoístas, nossas afeições
idólatras e nossa paixão é para nossa própria glória e não dEle. Nossa tendência é
buscar satisfação no que não pode durar, prazer no mal ou apenas em nós mesmos,
temer o que Deus proíbe, irar-se quando devíamos ser pacientes, ficar sem esperança e
odiar o que é bom. A depravação penetrante e holística significa que nós não somente
escolhemos e pensamos as coisas erradas, mas também que nossas emoções, a não ser
pela graça, são enganosamente orientadas.
A esta altura precisamos reiterar que todas as nossas capacidades ou faculdades
primárias (intelecto, vontade, consciência e emoção) estão igualmente envolvidas no ser
a imagem de Deus e igualmente corrompidas pelo pecado. Isso é importante porque,
“Às vezes se argumenta que, a menos que se declare a primazia do
intelecto, pode-se corretamente seguir toda e qualquer sorte de emoção.
Mas isso só seria verdadeiro no conceito não cristão da natureza humana.
Somente no conceito não cristão do homem as emoções são inerentemente
ingovernáveis; elas se tornaram ingovernáveis apenas por causa do pecado.
Mas, quando o pecado entrou na mente humana, o intelecto se tornou tão
ingovernável quando as emoções. O homem como um todo se recusa a
submeter-se ao governo de Deus. Quando um pecador salvo aprende a
33 J. Edwards, Treatise Concerning the Religious Affections, 237.
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controlar suas paixões, a razão primária não é que ele tenha entendido o
significado da primazia do intelecto como uma verdade psicológica, mas a
razão primária é que seu ser como um todo nasceu de Deus.” 34
Do mesmo modo, John Frames escreve, “a queda não foi em essência um desarranjo nas
faculdades interiores do homem. Foi a rebelião da pessoa como um todo – intelecto
tanto quanto emoção, percepção e vontade – contra Deus. Meu problema não é algo
dentro de mim; o problema sou eu!”35
Felizmente, esse não é o fim de nossa história.
REDENÇÃO
Por causa da graça de Deus e seus propósitos de redenção realizados em Cristo pelo seu
Espírito, os efeitos penetrantes do pecado sobre a imagem de Deus no homem não são
irreversíveis. Toda e qualquer das nossas capacidades foram corrompidas, mas do
mesmo modo, elas podem ser restauradas. Em Cristo encontramos todos os tesouros
escondidos da sabedoria e do conhecimento e verdade (Cl 2.3; 3.10; Ef 4.21), de modo
que o que há de bom na razão é restaurado. Em Cristo, nossa consciência é renovada
(Hb 5.11-14; 9.8-14; 10.22; 1Pd 3.21). Em Cristo somos capacitados para escolher o que
é bom (Ef 2.10; Tt 2.14; 3.8; Hb 9.14); a volição é renovada. Em Cristo, nossas emoções e
afeições se tornam aliadas no amar a Deus e aos outros; nossas emoções e afeições
podem ser redimidas (Fp 1.7,8; 2.1-5; Cl 3.5-12; 1Ts 2.7-8). Além disso, Jesus Cristo
pode restaurar a interação harmoniosa entre a razão, consciência, volição e emoção que
foram desintegradas na queda. “É melhor pensar no intelecto, vontade e emoções como
interdependentes. Cada um afeta os outros e nenhum funciona adequadamente sem ou
outros. Quando tentamos empregar um sem os demais, o resultado é compreensão,
escolhas e sentimentos distorcidos.”36
Uma falha em reconhecer a decadência e o potencial para redenção da emoção tem
resultado em algumas falácias contemporâneas. Por exemplo, o conceito de Jay Adams
de vida orientada-por-sentimentos e vida orientada-por-mandamento37 é
frequentemente mal entendido (e provavelmente poderia ter sido delineado de modo
mais completo por Adams a fim de evitar o abuso de seu conceito), dicotomizando
falsamente emoções e obediência. Do mesmo modo, a tão conhecida ilustração do
folheto evangelístico As Quatro Leis Espirituais distribuído pela Cruzada Estudantil e
Profissional para Cristo, onde os sentimentos (emoções específicas) são o vagão que
34 C. Van Til, An Introduction to Systematic Theology (Phillipsburg: P & R, 1978) 34. 35 J. Frame, The Doctrine of the Knowledge of God (Phillipsburg: P & R, 1987) 337. 36 J. Frame, Worship in Spirit and Truth (Phillipsburg: P & R, 1996) 78. 37 J. Adams, The Christian Counselor Manual (Grand Rapids: Zondervan, 1973) 118.
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segue a fé no que diz respeito aos fatos da salvação, contém tanto verdade como erro. A
dicotomia de Adams e a ilustração deste folheto evangelístico da Cruzada são
verdadeiras no sentido de que seguir emoções específicas (i.e., medo ou culpa) e deixar
de preocupar-se com as promessas e mandamentos bíblicos é tolice e pecado.
Entretanto, a Palavra de Deus e o Espírito Santo toca o homem todo de modo que o
intelecto é desafiado a pensar com sinceridade, as emoções são inflamadas em direção a
Deus e a vontade é estimulada a agir de maneira que agrade a Deus. Estas versões
“cristãs” do ditado popular de que “não se deve agir com o coração” deixam de levar em
conta tanto o efeito do pecado como o efeito da redenção sobre o homem todo, sobre
toda e qualquer de nossas capacidades e faculdades. Quando revejo minha própria
história pecaminosa, fica claro que meus pensamentos, decisões e ações me causaram
muito mais problemas do que minhas emoções. De fato, a manifestação de emoções
“negativas” como desespero, culpa, vergonha e medo refletiu melhor minha verdadeira
condição e impulsionou um retorno à Palavra de Deus como fonte da verdade e a Cristo
como minha única esperança.
Emoções específicas podem, de fato, facilitar o pensamento verdadeiro e a ação correta.
Em 2 Coríntios 7, Paulo escreve que a tristeza segundo Deus produz arrependimento
enquanto que a tristeza do mundo produz morte. Em outras palavras, o problema que
Paulo está destacando não é o “seguir as emoções”, mas o seguir as emoções do mundo.
John Frame observa:
“É verdade, claro, que as pessoas às vezes seguem suas emoções em vez de
pensar com responsabilidade. Mas também é verdade que, às vezes, as
pessoas seguem esquemas racionalistas que funcionam de modo contrário
ao que eles sabem em seu íntimo (sentimentos) ser verdade. Deus nos dá
uma série de faculdades para servir como um sistema interno de checagem
e de equilíbrio. Algumas vezes a razão nos salva de loucuras emocionais,
mas as emoções também podem verificar as pretensões extravagantes da
razão... [Algumas vezes] o sentimento guia minha reflexão; minha reflexão
refreia meus sentimentos. Esses sentimentos refinados provocam reflexão
adicional e assim por diante. O alvo é uma análise satisfatória, uma análise
que me faz sentir bem, com a qual eu tenho descanso cognitivo, uma
relação pacífica entre intelecto e emoção. Essa relação me parece estar
envolvida em todo conhecimento.” 38
O médico e neurocientista Antonio Damásio igualmente afirmou: “As emoções não são
um luxo. Elas desempenham um papel em comunicar significado aos outros e também
podem exercer um papel de orientação cognitiva... os sentimentos interferem no
38 J. Frame, The Doctrine of the Knowledge of God (Phillipsburg: P & R, 1987) 336.
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funcionamento do resto do cérebro da cognição. Sua influência é imensa... Os
sentimentos são uma influência poderosa sobre a razão.”39
As emoções foram desenhadas, tanto quanto qualquer de nossas capacidades, para
responder à Palavra e ao Espírito de Deus e são cruciais para uma resposta sincera a Ele
e aos outros. A igreja de Laodicéia de Apocalipse 3 é rejeitada e ameaçada tanto por suas
obras como por sua apatia, “porque tu és morna, e nem quente nem fria, vomitar-te-ei
da minha boca”. Eles são exortados não somente ao arrependimento, mas a “sê pois
zeloso e arrepende-te”. Regeneração e santificação não nos fazem necessariamente mais
emocionais, embora elas certamente tenham a intenção de renovar nossas emoções e
acender e redirecionar as afeições de modo que, gradualmente, o novo homem seja
capaz de amar a Deus e ao próximo e odiar o mal e o pecado mais sinceramente. E, é
claro, o evento e o processo da redenção não nos fazem menos emocionais (como alguns
dos crentes gelados esperariam!) embora o coração renovado com crescente fé em
Cristo pode e deve experimentar emoções pecaminosas e afeições idólatras cada vez
menores.
Gálatas 5 apresenta um quadro da liberdade que o crente que coloca sua fé somente em
Cristo experimenta (v.6, 13-14). Nesta passagem, a redenção das emoções é evidente.
Em Cristo e pelo Espírito, os redimidos recebem poder para evitar emoções impuras ou
imorais como ciúme, raiva e inveja que estão intimamente associadas com inimizade,
disputas, dissensões e facções (v. 19-20). A redenção significa que paixões e desejos
malignos foram crucificados com Cristo. (Certamente, isso é um processo; a tensão
entre o “já” e o “ainda não” do reino de Cristo em nossos corações é verdadeira aqui
como em qualquer outro lugar. Devemos reconhecer os dois sentidos da santificação:
um evento definitivo no passado e um processo progressivo,40 como faz a Escritura).
Estar em Cristo nos liberta para viver e andar no Espírito, capacitando-nos a
progressivamente manifestar uma renovada vida afetiva de amor, alegria, paz,
paciência, bondade, mansidão e domínio próprio (v.22-24).
Jonathan Edwards enfatizou o papel crucial das afeições na autêntica experiência
cristã.
“Pois embora para a religião verdadeira deva mesmo existir algo além da
afeição; mesmo assim, a verdadeira religião consiste de afeições em tal
nível, que não pode haver religião verdadeira sem elas. Aquele que não tem
afeição religiosa está num estado de morte espiritual e está totalmente
destituído das poderosas, vivificadoras e salvadoras influências do Espírito
de Deus sobre seu coração. Assim como não existe religião verdadeira onde
não existe nada além de afeição, assim também não existe religião
39 A. Damasio, Descartes’ Error: Emotion, Reason, and the Human Brain (New Yoork: Grosst/PutnaM, 1994) 130, 160. 40 J. Murray, Collected Writings of John Murray, 2 vols. (Carslile, Pa: Banner of Truth Trust, 1977) 2:277-93.
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verdadeira onde não existe afeição religiosa... Se as grandes coisas da
religião forem corretamente entendidas, elas afetarão o coração... Deus
deu à espécie humana as afeições pelo mesmo propósito que deu todas as
faculdades e princípios da alma humana, ou seja, que elas sejam
subservientes à finalidade principal do homem e o grande negócio para o
qual Deus o criou, que é o negócio da religião.”41
A transformação de nossa vida afetiva requer assistência sobrenatural. John Owen
reconheceu o poder das afeições: “É inútil contender com qualquer coisa que tenha o
poder de nossas afeições à sua disposição; ela prevalecerá no final.”42 A atividade
redentora de Deus neste domínio é necessária e típica. Como Senhor sobre tudo, Ele
soberanamente inicia um relacionamento pactual conosco através de sua Lei e sua
Graça, pela qual somos transformados à medida que respondemos com obediência fiel.
Uma vida afetiva transformada requer que reconheçamos, aceitemos e confiemos no
Senhorio de Deus; sua presença amorosa, seu poder e autoridade e seu sábio e soberano
controle sobre nossas vidas e circunstâncias.43 É nossa resposta à sua compaixão, suas
ordens e seu controle que media a transformação pessoal incluindo nossas emoções e
afeições.
Compaixão: É devido a um viés estoico, não bíblico, que alguns dizem que Deus não se
importa com nossas emoções, mas somente com nossa santidade. É a sua presença
amorosa conosco, através de sua Palavra e seu Espírito que aplaca nossas ansiedades,
nos conforta em nossas aflições e nos dá esperança na tristeza (2Co 1.3,4). Ele é um
Deus de encorajamento (Rm 15.5). Somos orientados a lançar todas as nossas
ansiedades sobre Ele, porque Ele cuida de nós (1Pe 5.7). Não precisamos temer o mal
porque Ele está conosco e sua mão firme nos conforta (Sl 23.4). Quando sentimos medo,
podemos confiar nEle (Sl 56.3). Ele recolhe nossas lágrimas no seu odre (Sl 56.8). Seu
amor “é derramado em nosso coração pelo Espírito Santo que nos foi outorgado” (Rm
5.5).
A compaixão amorosa de Deus é mais evidente em seu Filho que Ele enviou para morrer
por nós, mesmo embora nós fôssemos inimigos dele, não merecedores. Cristo é o
Príncipe da Paz, que traz paz perfeita aos que confiam nele (Isa 9.6; 26.3). Compaixão é
a emoção mais frequentemente atribuída a Cristo.44 A presença compassiva de Deus
conosco e por nós é essencial para a transformação de qualquer componente de nossas
vidas. Precisamos de ajuda para mudar nossas emoções; uma das maneiras pela qual
Deus providencia tal ajuda é cuidando de nós.
41 J. Edwards, Treatise Concerning the Religious Affections, 243-4. 42 J. Owen, The Works of John Owen, vol. VII, (Carslile, PA: Banner on Truth Trust. 1965) 397. 43 Doctrine of God, 42 44 B. B. Warfield, The Person and Work of Christ, 96-97.
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Ordem: Como Senhor, Deus não está presente apenas pessoalmente com compaixão
infalível, mas Ele também tem o direito e a autoridade de nos dizer como viver,
incluindo as emoções que deveríamos ou não sentir. Mesmo embora não possamos
ordenar e dirigir nossas emoções do mesmo modo como podemos fazer com nossos
pensamentos e ações, Deus não parece ter qualquer constrangimento em ordenar e
dirigir as emoções e afeições de seu povo. Ele ordena que nos rejubilemos e alegremos
(Sl 100.2; Rm 12.15; Fp 4.4; 1 Ts 5.16), O temamos (Lc 12.5; Rm 11.20; 1Pe 1.17), não
temer as pessoas (Js 1.9; Dt 31.6-8), a perseguição (Lc 12.4-5), ou se preocupar com as
circunstâncias (Mt 6.25-34; Mc 4.40. Ele ordena lamentar e chorar com outros e por
nossos próprios pecados (Sl 51.17; Rm 12.15; Tg 4.9), a deixar que a paz de Cristo seja o
árbitro em nossos corações (Cl 3.15), a ser bom e gentil e compassivo para com os
outros (Ef 4.32; Cl 3.12) e a odiar o mal (Sl 97.10; Am 5.15), mas não odiar nosso irmão
(Lv 19.17; 1Jo 2.9, 11; 3.15). Como Senhor, Ele não apenas dá ordens sobre nossas
emoções, mas também as questiona (Gn 4.6; Jn 4.4-9) e julga (Dt 28.47). Seu interesse
não é apenas em como agimos com respeito a nossas emoções, mas também com seus
motivos e causas. Suas exigências não se limitam meramente ao que fazemos com
nossas emoções, mas também se estendem a quais emoções nós sentimos e o porquê de
nós a sentirmos.
Como Senhor sobre todas as coisas, os desígnios e intenções de Deus para nossas
emoções são normativos. Como o Supremo e Mais Alto Ser, Ele tem direito à nossa
lealdade em todas as coisas. Portanto, quer estejamos comendo ou bebendo, ficando
com raiva ou tristes, sentindo medo ou estando alegres, todas as coisas devem ser
apenas para a Sua glória. Assim, nosso Santo Senhor amorosamente provê normas para
nossas emoções: o que sentimos – o que inclui até mesmo nossos motivos para tais
emoções, o que fazemos com estas emoções e seu propósito e objetivos finais.
Controle: Senhores são, por definição, soberanos; nosso Deus reina mesmo sobre todas
as coisas. Todos os eventos e circunstâncias de nossas vidas estão sob controle de suas
sábias e amorosas mãos. A intenção de nossas emoções e afeições é glorificá-lo e à
medida que confiamos e descansamos em sua soberania, somos capacitados a sermos
orientados por Ele e para Ele. O controle soberano de Deus sobre todas as coisas traz
ordem, senso, significado e propósito para nossas vidas e nossas emoções. Quando
entendemos nossas emoções à luz da soberania de Deus, particularmente quando
acompanhada de uma compreensão sincera de sua presença e autoridade sobre nós,
nossa vida emocional fica situada dentro das perspectivas divinas que as temperam,
ordenam e dirigem.
O Deus da Bíblia almeja estabelecer seu senhorio não somente sobre nossas ações e
pensamentos, mas também sobre nossas emoções, afeições e sentimentos. “As afeições
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religiosas são parte das afeições em geral e todas as afeições são religiosas.”45 Qual é a
fonte de nossa alegria e felicidade? Com o que nos tornamos mais pesarosos e tristes? O
que provoca nossa raiva? Quem ou o que nós mais tememos? Ele é o Senhor sobre
minhas emoções ou elas me comandam? Meus sentimentos são por Ele ou contra Ele?
Minhas afeições indicam que eu o amo acima de todos os outros deuses, com minha
alma, coração, mente e força? Quem ou o que é o fim último das nossas afeições? Nossos
estados emocionais são janelas para nossas almas, revelando a lealdade de nossos
corações. Vamos tentar pensar os pensamentos de Deus, conformar nossas ações à sua
Palavra e experimentar emoções que refletem e honram a Ele.
TRADUÇÃO DE WLADEMIR P. MENDES
(DEZEMBRO DE 2003)
45 D. Powlison, A Call for Papers on the Emotions, Journal of Biblical Counseling, 2002.