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  • 8/18/2019 Sara Da Silva Barreto

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    UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO ESPECIAIS 

    DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO 

    PROJETO “VEZ DO MESTRE” 

    REFORMA AGRÁRIA NO BRASIL:O MST COMO MOVIMENTO EDUCACIONAL 

    AUTORA: SARA DA SILVA BARRETO 

    OR IENTADOR(A): FABIANE MUNIZ 

    Rio de Janeiro –  RJ Fevereiro- 2003

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    UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO ESPECIAIS 

    DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO 

    PROJETO “VEZ DO MESTRE” 

    REFORMA AGRÁRIA NO BRASIL: O MST COMO MOVIMENTO EDUCACIONAL 

    AUTORA: SARA DA SILVA BARRETO 

    ORIENTADOR(A): FABIANE 

    Monografia apresentada ao Curso deSupervisão Escolar da Universidade CândidoMendes, como requisito Parcial do Curso deSupervisão Escolar a nível de Pós-graduação“Lato-sensu”.

    Rio de Janeiro –  RJ 

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    Fevereiro- 2003

     ___ Barreto, Sara da SilvaMonografia (Pós-Graduação em

    Supervisão Escolar -  Áreas:Metodologia da Pesquisa) - Universidade Cândido Mendes. Bibliografia: 

    CDD ____.____

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    SARA DA SILVA BARRETO 

    REFORMA AGRÁRIA NO BRASIL:O MST COMO MOVIMENTO EDUCACIONAL 

    Monografia apresentada ao Curso deSupervisão Escolar da Universidade Cândido

    Mendes, como requisito Parcial do Curso deSupervisão Escolar a nível de Pós-graduação“Lato-sensu”.

    Aprovada em ................................................................. de 2003.

    BANCA EXAMINADORA

     ______________________________________________________________________

     ______________________________________________________________________

     ______________________________________________________________________

    Rio de Janeiro –  RJ Fevereiro- 2003

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    iii 

    Ao meus filhos, netos, nora egenro, por todo o amor e carinhoque me transmite. Obrigado por vocês existirem. 

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    iv 

    A Deus por Ter me dado força e coragem para chegar até aqui e vencermais essa etapa da minha vida. 

    A professora Fabiane pelas as orientações Seguras. Aos demais Professores, por todas experiência transmitida. 

    Ao meus familiares e amigos pelo incentivo. 

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    A partir do momento que aeducação começar a valorizar ohomem enquanto ser, procurandofazer com que ele se situe no tempo

    e  no espaço, trabalhando suainteração com o outro e sua relaçãocom o mundo, poderá ter início umagrande mudança. 

     Nazaré Lima

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    vi 

     NOVA FORMA DE APRENDIZADO 

     Ninguém educa ninguém ninguém se educa sozinho As pessoas se educam entre si Descobrindo esse novo caminho 

    Como pensa o MSTE o setor pensa a educação Muito além do a, e, i, o, u 

    Ou um canudo de papel na mão Professor tem de ser militante Ensinar dentro da realidade A importância da Reforma Agrária E a aliança do campo e cidade Discutindo as tarefas da escola Ensinado como plano quer  Ir gerando sujeitos da história 

     Novo homem e nova mulher  

    Combatendo a individualismo Se educando contra os opressores Aprendendo a viver coletivo Construindo assim novos valores 

    Discutindo cooperativismo o avanço da organização É na vida do assentamento Que a criança aprende a lição 

    Conhecer a caneta e a enxada Afinando estudo e trabalho Aprendendo teoria e prática  Nova forma de aprendizado 

    Avançar nossa pedagogia Construir é bem mais que querer  Educando pra sociedade Que implantaremos ao amanhacer. 

     Músico Zé Pinto

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    vii 

    RESUMO

    Entre os movimentos sociais recentemente no Brasil, o

    Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra  – MST ocupa um lugar

    de proeminência, considerando e tratado como “movimento revolucionário”

    e r eferenciado pelos articulistas como “um dos grupos rebeldes mais

    importantes da América Latina”. A tática do movimento é assim registrada:

    como uma nova forma de pressão dos camponeses brasileiros que usam

    “as ocupações organizadas dos latifúndios improdutivos para dar um

     pedaço de terra a milhares de famílias. 

    Além de tratar o MST como um movimento social que inovou e

    reacendeu a luta política revolucionário, no Brasil, também a educação do

    movimento merece um lugar de destaque, pois para eles a Educação é tão

    importante como a luta pela terra ou a reforma agrária.

    Um dos grandes problemas dos países menos desenvolvidos é,

    sem dúvida, o analfabetismo no meio rural. Mas o MST busca em torno da

    educação e seu trabalho pelo desenvolvimento de um novo modelo de

    homem através da construção de um novo paradigma educacional voltado

     para a realidade rural, discutindo-se alguns de seus pressupostos

    ideológicos, levando-se em conta sua mística e sua visão da necessidade

    inexorável da reforma agrária e da educação como instrumentos capazes de

    libertar a classe trabalhadora da exploração a que está submetida,

    transformando a realidade social do homem do campo. 

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    viii

    SUMÁRIO 

    INTRODUÇÃO.................................................................................................................... 1

    CAPITÚLO I - BRASIL: 500 ANOS DE LUTA PELA TERRA........................................... 3

    1.1. A RESISTÊNCIA CAMPONESA..................................................................... 4

    1.2. O MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA ............... 12

    CAPÍTULO II- ESTRUTURA ORGANIZATIVA DA EDUCAÇÃO NO MST.................. 20

    2.1. A IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO DO MST.............................................. 20

    2.2. ESTRUTURA EDUCATIVA E FORMATIVA DO MST ..................................27

    CAPÍTULO III - PRINCÍPIOS EDUCATIVOS DO MST ...................................................30

    CONCLUSÃO.................................................................................................................... 35

    BIBLIOGRAFIA.................................................................................................................. 37

    ANEXO................................................................................................................................38

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    INTRODUÇÃO 

     No momento em que a globalização faz parte da parte da nossa realidade eque, em contrapartida a todos os avanços provenientes dela observamos um abismo

    incomensurável do cotidiano das pessoas - alguns poucos têm acesso às mais variadas formas

    de informação, outros tantos vivem em um mundo a parte onde a tal globalização ainda não

    ousou chegar, a iniciativa do MST em capacitar em suas frentes crianças, jovens e adultos

    demonstra preocupação não somente com a luta pela reforma agrária como garantia de

    subsistência para os seus integrantes. Mais do que isto, demonstra a preocupação de que,

    uma vez garantindo o direito ao seu pedaço de terra o indivíduo esteja pronto para os seus

    sustento, baseado em todo o treinamento ao qual estiver submetido. 

    Esta iniciativa vem provar ainda que com organização pode-se mudar a

    realidade de toda uma nação com base na Educação. 

    Os objetivos gerais são identificar no Movimento Sem Terra brasileiro a busca

     por uma prática intelectual e política que permita a produção de conhecimento científico

    necessário à sociedade partindo de um Sistema Educacional.. 

    E conceituar e contextualisar o MST, estudando as atividades do movimento

    no âmbito educacional, refletindo sobre um projeto popular para o Brasil que nosso povo

    desejar construir e sobre as escolas do campo e como elas se inseriam na dinâmica das lutas

     pela implementação deste projeto. 

    Esta pesquisa será baseada nas mais diversas fontes que nos forneçam

    subsídios relativos ao Movimento Sem Terra Brasileiro e o Projeto Educacional por ele

    desenvolvido tais como matérias da imprensa escrita -  jornais e revista, da TV,

    documentários, publicações literárias e internet - especificamente a página do MST na rede,

     buscando os subsídios teóricos nos pensadores socialistas que desenvolveram suas teorias

    dentro de contextos bastantes semelhantes ao vivenciados por nós neste momento na

    sociedade brasileira. A consolidação da ordem burguesa, industrial e capitalista na Europa do

    Século XIX produziu profundas transformação no mundo do trabalho. As precárias

    condições de vida dos trabalhadores, as longas jornadas de trabalho, a exploração em larga

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    escala do trabalho feminino e infantil, os baixíssimos salários, o surgimento de bairros

    operários onde conforto e higiene inexistiam, eram apenas algumas das condições geradas

     pela nova sociedade capitalista, em muito semelhantes as condições que geraram hoje os

    conflitos pela terra. 

    É dentro deste contexto que se desenvolve a teoria socialista. Trata-se ao

    mesmo tempo, de uma reação aos princípios da economia política clássica e às práticas do

    liberalismo econômico que, nessa época, serviam de referencial teórico ao desenvolvimento

    do capitalismo. 

    Os pensadores socialistas entendiam que a produção capitalista, estabelecida

    a partir da propriedade privada dos meios de produção e da exploração do trabalhoassalariado, era incapaz de socializar a riqueza produzida. Pelo contrário, o capitalismo tendia

    à máxima concentração de renda, não apenas pelo avanço contínuo do progresso da técnica

    aplicada à produção mas, também, e principalmente, pelo fato de se apropriar do excedente

    das riquezas, produzidas pelo trabalhadores. A necessidade de modificações profundas na

    sociedade, geraram, e continuam gerando teorias, propondo mudanças desejáveis, visando

    alcançar uma sociedade mais justa, igualitária e fraterna, sem, no entanto, apresentar de

    maneira concreta os meios pelos quais essa sociedade se estabeleceria. Mais tarde, com a

    teoria desenvolvida por K arl Max e Friedrich Engels algumas considerações sobre essa

    sociedade almejada seria desenvolvida partindo-se da análise crítica de científica do próprio

    capitalismo. Marx e Engels acreditaram que chegar -se-ia a mais completa igualdade entre os

    homens, o que seria uma realidade concreta e inevitável e que para se alcançar tais objetivos

    o primeiro passo seria a organização da classe trabalhadora. 

    Pretendemos, assim, levar à reflexão e ao debate o MST como movimentoorganizado de uma classe trabalhadora, bem como sobre a educação básica do campo,

     proposta por esse movimento que vem sendo articulada, mais sistematicamente no Brasil

    desde 1998. Visamos aqui, de modo especial, refletir num primeiro momento sobre um

     projeto popular para o Brasil que nosso povo deseja construir e, num segundo momento,

    refletir sobre as escolas do campo e como elas se inserem na dinâmica das lutas pela

    implementação deste projeto. 

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    CAPÍTULO I 

    BRASIL: 500 ANOS DE LUTA PELA TERRA

    A luta pela terra é uma ação desenvolvida pelos cam poneses para entrar na

    terra e resistir contra a expropriação. A resistência do campesinato brasileiro é uma lição

    admirável. Em todos os períodos da história, os camponeses lutaram para entrar na terra.

    Lutaram contra o cativeiro, pela liberdade humana. Lutaram pela terra das mais deferentes

    formas, construindo organizações históricas. Desde as lutas messiânicas ao cangaço. Desde as Ligas Camponesas do

    MST, a luta nunca cessou, em nenhum momento. Lutaram e estão lutando até hoje.

     No nosso País, a reforma agrária é uma política recente, comparada ao

     processo de formação do latifúndio e da luta pela terra. A luta pela reforma agrária ganhou

    força com o advento das organizações políticas camponesas, principalmente, desde a década

    de cinquenta, com o crescimento das Ligas Camponesas. Todavia, a luta pela terra é uma

     política que nasceu com o latifúndio. Portanto, é fundamental distinguir a luta pela terra da luta

     pela reforma agrária. Primeiro, porque a luta pela terra sempre aconteceu, com ou sem

     projetos de r eforma agrária. Segundo, porque a luta pela terra é feita pelos trabalhadores e na

    luta pela reforma agrária participam diferentes instituições. 

     Na realidade, a diferença da luta pela terra da luta pela reforma agrária é

    fundamental, porque a primeira acontece independentemente da segunda. Todavia as duas

    são interativas. Durante séculos os camponeses desenvolveram a luta pela terra sem a

    existência de projeto de reforma agrária. O primeiro projeto de reforma agrária do Brasil é da

    década de sessenta - O Estatuto da Terra, elaborado no início da ditadura militar e que nunca

    foi implantado. A luta pela reforma agrária é uma luta mais ampla, que envolve toda a

    sociedade. A luta pela terra é mais específica, desenvolvida pelos sujeitos interessados. A luta

     pela reforma agrária contém a luta pela terra. A luta pela terra promove a luta pela reforma

    agrária (ANDRADE, p. 56). 

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    Essa distinção nos ajuda a compreender que ainda não foi implantado um

     projeto de reforma agrária no Brasil, mas está acontecendo uma intensificação da luta pela

    terra, por meio do crescimento das ocupações massivas, realizadas por diversos movimentos

    sociais, principalmente pelo MST. Na realidade, nos últimos anos, o aumento do número de

    assentamentos foi resultados do territorialização do MST, que em duas décadas multiplicou

    intensamente o número de ocupações em todo o País. A política de assentamentos do

    governo federal e de alguns governos estaduais é apenas uma resposta às ações dos sem-

    terra. Essa política não existiram sem as ocupações. 

    1.1.  A RESISTÊNCIA CAMPONESA 

    Há 500 anos, desde a chegada do colonizador português, começaram as lutas

    contra o cativeiro, contra a exploração e consequentemente contra o cativeiro da terra, contra

    a expulsão, que marcam as lutas dos trabalhadores. Das lutas dos povos indígenas, dos

    escravos e dos trabalhadores livres e dos imigrantes, desenvolveram-se as lutas camponesas

     pela terra. Lutas e guerras sem fim contra a expropriação produzida continuamente no

    desenvolvimento do capitalismo. 

    A formação das fazendas desenvolveu-se um processo de grilagem de terras.

    As terras devolutas foram apropriadas por meio de falsificação de documentos, subornos dos

    responsáveis pela regularização fundiária e assassinatos de trabalhadores. Assim, os grileiros -

    verdadeiros traficantes de terra - formaram os latifúndios. Os camponeses trabalhavam na

    derrubada da mata, plantavam nessas terras até a formação da fazendas, depois eram

    expropriados. Aos que resistiram na terra, o poder do coronel era explicitado pela perseguição e morte. Dessa forma, os camponeses sem-terra formavam fazendas que eram

    apropriadas pelos coronéis. 

    Territórios indígenas, terras de camponeses - posseiros invadidas por grileiros.

    A migração como sobrevivência e resistência, procurando se distanciar da cer ca e do cerco

    do latifúndio. Os diversos enfrentamentos geraram a morte, muitas vezes o massacre e o

    genocídio. A violência contra esses povos delimitaria as extensões históricas do latifúndio. Em

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    todo o tempo e em todo o espaço, a formação do latifúndio f rente a resistência camponesa

    determinaria a realidade da questão agrária. 

    O fim do cativeiro humano foi após alguns anos de instituído o cativeiro da

    terra. Assim, os escravos libertos que deixaram as fazendas migraram pelas estradas, por

    onde encontram terras cercadas. Quando acampavam nas fazendas, os coronéis convocavam

    a polícia para expulsá-los. Igualmente, os camponeses europeus, migraram por e para

    diferentes regiões, lutando contra o latifúndio. Muitos de seus filhos e netos ainda continuam

    migrando. A maioria absoluta desses trabalhadores começaram a formar uma categoria, que

    ficaria conhecida como Sem-Terra. 

    A migração e a peregrinação como esperança de chegar à terra liberta, sãomarcas da história do campesinato brasileiro. Na luta contra o cerco da terra e da vida,

    surgiram várias formas de resistência. Lutar contra as cercas era lutar contra o coronelismo,

     porque os latifundiários foram senhores absolutos e dominavam a terra e a vida dos

    camponeses. Na Bahia, camponeses sem-terra terminaram uma longa peregrinação no arraial

    de Canudos. Era um movimento social messiânico que não se submetem à ordem coronelista

    e latifundiária. E por essa razão, foram declarados inimigos de guerra. 

    A guerra contra os camponeses foi marcada pela maior exemplo da

    or ganização de resistência camponesa do Brasil chamada de Canudos. Os camponeses sem-

    terra acamparam na fazenda Canudos e passaram a chamar o lugar de Belo Monte. A

    organização econômica se realizava por meio de trabalho cooperado, o que foi essencial para

    a produção da comunidade. Todos tinham direito à terra e desenvolviam a produção familiar,

    garantindo um fundo comum para uma parcela da população, especialmente os velhos e

    desvalidos, que não tinham como subsistir dignamente. Canudos sofreu vários ataques do militares, exércitos foram enfrentados e

    refreados até o cerco completo e o massacre do povo de Canudos. Foi a guerra mais trágica,

    mais violenta do Brasil. 

    Esta guerra representou o desdobramento das disputas pelo poder, entre os

    coronéis e o governo. Derrotar Canudos significava mais força política entre militares e civis,

    ligados ao interesse da economia da monocultura cafeeira. Para os sertanejos, combater os

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    republicanos, tinha, antes de mais nada, o sentido de luta contra os inimigos dos

    trabalhadores: os fazendeiros e os militares. 

    Fechava-se o século XIX com uma guerra contra os camponeses e abria-se o

    século XX como outra. No sul do Brasil, no Paraná e em Santa Catarina, também, os

    coronéis controlavam a terra e a vida dos camponeses. Na primeir a década deste século, na

    região fronteira destes estados começaram outro movimento de resistência. 

    A entrega de terras à empresa norte-americana para a construção da ferrovia

    São Paulo - Rio Grande, gerou expropriação de camponeses, que organizaram a resistência.

    Em 1912, em Campos Novos - SC, formaram-se um movimento camponês de caráter

     político - religioso. Foram vários enfrentamentos com a Polícia, contra o Exército e contra jagunços. Milhares de camponeses foram assassinados. Vencidos, reorganizavam-se  e

    retomavam as lutas de resistência até o massacre final. 

    Da mesma forma no Contestado, como em Canudos e em diversos outros

    movimentos messiânicos que ocorreram no Brasil, os camponeses foram destroçados. Foram

    movimentos populares que acreditaram na construção de uma organização em oposição à

    república dos coronéis, da terra do latifúndio e da miséria. Em nome da defesa e da ordem, os

    latifundiários e o governo utilizaram as forças militares, provendo guerras políticas. Não era a

    monarquia que combatiam, mas sim a insurreição dos pobres do campo. 

    A revolta contra o cerco e a submissão gerou novas formas de resistência.

     Nas primeiras décadas do século XX, nas terras do Nordeste, onde a expulsão e a

     perseguição até a morte era coisas comuns aos camponeses, surgiu uma forma de banditismo

    social que ficou conhecida como cangaço. Tornar -se cangaceiro era decorrência da ação em

    defesa da própria dignidade e da vida de sua família. Nas terras onde a lei não alcança ocoronel porque ele é ou está acima da lei, restou bem pouco à resistência camponesa a não

    ser a rebelião. 

    O cangaço foi uma forma de organização de camponeses rebeldes que

    atacavam fazendas e vilas. Os grupos eram formados, principalmente, por camponeses em

    luta pela terra, expulsos de suas terra pelos coronéis. Os cangaceiros replicavam, vingando-se

    em uma ou mais pessoas da família do fazendeiro. Os diferentes grupos cangaceiros

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    desenvolviam suas ações por meio de saques nas fazendas e nas casas comerciais. Essa forma

    de banditismo colocava em questão o próprio poder do coronelismo. 

    A forma de organização deste movimentos messiânicos até os grupos de

    cangaceiros demarcavam os espaços políticos da revolta camponesa. Era conseqüências do

    cerco à terra e à vida. Embora fossem lutas localizadas aconteciam em quase todo o território

     brasileiro e representaram uma importante força política que desafiava e contestava

    incessantemente a ordem instituída. São partes da marcha camponesa que percorre o espaço

    da história do Brasil. 

    Os camponeses sempre enfrentaram os latifúndio e se opuseram ao Estado

    representante de classe dominante. Assim, a resistência camponesa manifesta-se em diversasações que sustentam formas distintas e se modificam em seu movimento. Deste meada do

    século XX, novas feições e novas formas de organização foram criadas na luta pela terra e na

    luta pela reforma agrária: as ligas camponesas, as diferentes formas de associações e os

    sindicatos do trabalhadores rurais. 

    Em todo o país, diversos conflitos, e eventos foram testemunhados da

    organização camponesa no início da segunda metade do século XX. As lutas dos pequenos

     proprietários, dos arrendatários e dos posseiros para resistirem na terra juntamente com as

    lutas dos trabalhadores assalariados e os congressos camponeses, desenvolveram o processo

    de organização política do campesinato. Crescia a luta pela reforma agrária e o Partido

    Comunista Brasileiro - PCB - e a Igreja Católica, entre outras instituições, disputaram esse

    espaço político, interessada nesse processo. 

    As Ligas Camponesas surgiram por volta de 1945. Ela foram uma forma de

    organização política de camponeses que resistiram a expropriação e a expulsão da terra. Suaorigem está associada a recusa ao assalariamento. Foram criadas em quase todos os estados

     brasileiros e tinham o apoio do PCB, do qual eram dependentes. Em 1947, o governo

    decretou a ilegalidade do Partido e com a repressão generalizada, as ligas foram

    violentamente reprimidas, muitas vezes pelos próprios fazendeiros e seus jagunços. 

    Em Pernambuco, em 1954, as ligas ressurgiram e se organizaram em outros

    Estados do Nordeste, bem como em outras regiões. Neste mesmo ano, o PCB criou a União

    do Lavradores e Trabalhadores Agrícolas - ULTAB, que se organizou em quase todo o

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    território nacional. Com essa forma de organização, o Par tido pretendia realizar uma aliança

    camponesa operária. Em 1962, as ligas realizaram vários encontros e congressos,

     promovendo a criação de uma consciência nacional em favor da reforma agrária. A ação das

    ligas era definida na luta pela reforma agrária radical, para acabar com o monopólio de classe

    sobre a terra. Em suas ações, os camponeses resistiam na terra e passaram a realizar

    ocupações. 

    O crescimento da luta pela terra dimensionava a questão agrária, colocando a

    reforma agrária na pauta política. Esse avanço foi acompanhado por disputas pela sua

    representação. A ULTAB  era controlada por Partido Comunista. A Igreja Católica

    estava dividida em dois setores: o conservador e o progressista. O primeiro, no Rio Grandedo Norte, criou o Serviço de Assistência Rural. Em Pernambuco criou o Serviço de

    Orientação Rural e no Rio Grande do Sul a Frente Agrária Gaúcha. O segundo setor da ação

    católica era liderado pela Confederação dos Bispos do Brasil -  CNBB, e formou o

    Movimento de Educação de Base, que trabalhava com a alfabetização e com a formação

     política dos camponeses. 

     No Rio Grande do Sul surgiu, no final da década de cinquenta, o Movimento

    dos Agricultores Sem-Terra - MASTER. Os agricultores sem-terra eram assalariados,

     parceiros e também os pequenos proprietários e os filhos destes. Em 1962, os sem-terra

    começaram a organização de acampamentos e territorializaram a luta por todo o Estado.

    Receberam o apoio de Partido Trabalhista Brasileiro do então governador Leonel Brizola e

    ficaram circunscritos ao Rio Gr ande. Com o golpe militar de 1964, todos esses movimentos

    camponeses foram aniquilados. 

    De 1940 a 1964, esse tempo foi abundante em lutas de resistência pelaconquista de terra. Em Minas Gerais, nos vales dos rios Mucuri e Doce, os posseiros

    formaram vários movimentos camponeses e resistiram a expropriação. Na região de

    Governador Valadares, em Minas Gerais, desde do início da década de quarenta, os

     posseiros enfrentaram fazendeiros interessados naquelas terras, por causa da construção da

    rodovia Rio - Bahia. Para formar fazendas, os fazendeiros impuseram aos posseiros a

    condição de derrubar a mata para a formação de pastos, e só poderiam plantar para a

    subsistência. 

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    Ainda, nos vales dos rios Mucuri e Doce, agora no Espírito Santo, na porção

    noroeste do Estado, ocorreram vários conflitos, onde muitos camponeses foram assassinados

     pela Polícia Militar e jagunços. Nessa região está localizado o município de Ecoporanga. No

    final da década de 40, a região era contestada pelos Estados de Minas Gerais e do Espírito

    Santos. Essas terra estavam oculpadas por posseiros e passaram a ser disputadas por

    fazendeiros - grileiros, que procuravam tirar vantagem daquela situação indefinida. 

    Em Goiás, no norte do Estado, com a construção da Transbrasiliana e por

    causa do projeto de colonização promovido pelos governos federal e estadual, as terras da

    região foram valorizadas. As terras devolutas, ocupadas por posseiros, passaram a ser

    griladas por fazendeiros. O processo de legalização fundiária foi feito por meio dedocumentos falsos. Iniciou-se um processo de resistência nos povoados de Trombas e

    Fomoso, que foram atacados por jagunços e pela Polícia Militar. Os camponeses resistiram e

    as lutas multiplicaram-se por o Estado até serem dizimadas pelo governo militar. 

     No norte e no sudeste do Estado do Paraná, ocorreram diversos conflitos por

    terra. Na região de Porecatu aconteceu um enfrentamento armado entre posseiros e a polícia.

    Desde meados da década de 40, os posseiros estavam em luta com um grande latifundiário,

    que recebia proteção do governador do Estado. Envolvido em negócios irregulares com a

    compra de venda de terras. No Sudoeste do Estado, também aconteceu manobras ardilosas

    com as terras devolutas, entre o governo e latifundiários, gerando conflitos com os

    trabalhadores que lá viviam. 

     No Maranhão, em meadas da década de 50, na região do Pindaré chegaram

    famílias expulsas do vale do Mearin, que foram expulsas do Piauí e que já vinha expulsas do

    sertão do Ceará. Nessa mesma época, iniciou o processo de grilagem da região, expulsandonovamente muitas famílias, que partiram para o oeste e sudoeste do Maranhão, sempre em

     busca da terra liberta e da conquista da liberdade. Assim, camponeses migrantes e expulsos

    chegaram na região que depois se tornaria conhecida como Bico de Papagaio. Desde essa

    época iniciaram os conflitos entre grileiros e posseiros que transformaria região em uma das

    mais violetas do Brasil, com intensos conflitos por terra e de continua resistência dos

    camponeses. 

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    Durante toda a história do Brasil, os camponeses, bem como todos os

    trabalhadores, foram mantidos à margem do poder, por meio da violência. Nos grandes

     projetos nacionais não foram considerados. Ao contrário, foram julgados como obstáculos

    que precisavam ser removidos. Em 1964, os militares tomaram o poder, destituindo o

     presidente eleito João Goulart, numa aliança política, em que participaram diferentes setores

    da burguesia: latifundiários, empresários, banqueiros, etc. 

    O golpe significou um retrocesso para o país. Os projetos de desenvolvimento

    implantados pelos governos militares levaram ao aumento da desigualdade social. Suas

     políticas aumentaram a concentração de renda, conduzindo a imensa maioria da população à

    miséria, intensificando a concentração fundiária e promovendo o maior êxodo rural da históriado Brasil. Sob a retórica da modernização, os militares aumentaram os problemas políticos e

    econômicos, e quando deixaram o podem, em 1985, a situação do País estava extremamente

    agravada pelo que fora chamado de “milagre brasileiro”. 

     No campo, o avanço do capitalismo fez aumentar a miséria, a acumulação e a

    concentração da riqueza. Esse processo transformou o meio rural com a mecanização e a

    industrialização, simultaneamente a modernização tecnológica de alguns setores da agricultura.

    Também expropriou, expulsou da terra os trabalhadores rurais, causando o crescimento do

    trabalho assalariado e produzindo um novo personagem da luta pela terra e na luta pela

    reforma agrária: o bóia fria. 

    Em seu pacto tácito, os militares e a burguesia pretendiam controlar a questão

    agrária, por meio da violência e com a implantação de seu modelo de desenvolvimento

    econômico para o campo, que priorizou a agricultura capitalista em detrimento da agricultura

    camponesa. Ainda, governo da ditadura ofereceu aos empresários subsídios, incentivos eisenções fiscais, impulsionando o crescimento econômico da agricultura e da indústria,

    enquanto arrochava os salários, estimulava a expropriação e a expulsão, multiplicando os

    desejos das famílias camponesas. Essas ações políticas tiveram efeitos na questão agrária,

    intensificando ainda mais a concentração fundiária. 

    O Brasil se transformara no paraíso dos latifundiários e os camponeses foram

    forçados a migração pelo território brasileiro e para o Paraguai. O ataque contra os

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    trabalhadores, e especificamente contra os camponeses, agregou novos elementos à questão

    agrária, aumentando e expandido os conflitos, fazendo eclodir as lutas camponesas. 

    De meadas da década de 60 até o final da década de 70, as lutas camponesas

    eclodiam por todo o território nacional, os conflitos fundiários triplicaram e o governo, ainda

    na perspectiva de controlar a questão agrária determinou a militarização do problema da terra.

    A militarização proporcionou diferentes e combinadas formas de violência contra  os

    trabalhadores. A violência do peão que é o jagunço da força privada, muitas vezes com o

    amparo da força pública. A violência da polícia, escorada na justiça desmoralizada, que

    decretou ações contra os trabalhadores, utilizando recursos dos grileiros e grandes

    empresários, defendendo claramente e tão somente os interesses dos latifundiários. No anoderradeiro do governo militar. 1985, os jagunços dos latifundiários e a polícia assassinavam

    um trabalhador rural a cada dois dias. 

     No começo dos anos 60, nasceram as primeiras Comunidades Eclesiais de

    Base - CEB’s. Em meadas dos anos 70, elas existiam em todo o País. No campo e na

    cidade, foram importantes lugares sociais, onde os trabalhadores encontraram condições para

    se organizar e lutar contra as injustiças e por seus direitos. À luta dos ensinamentos da

    Teologia da Libertação, as comunidades tornaram-se espaços de socialização política, de

    libertação e organização popular. Em 1975, a Igreja Católica criou a Comissão Pastoral da

    Terra - CPT. Trabalhando juntamente com as paróquias nas periferias das cidades e nas

    comunidades rurais, a CPT foi articuladora dos novos movimentos camponeses que

    insurgiram durante o regime militar. 

    Ao reprimir a luta pela terra e não realizar a reforma agrária, os governos

    militares tentaram restringir o avanço do movimento camponês. Com a implantação do atual

    modelo de desenvolvimento econômico da agropecuária, apostou-se no fim do campesinato.

     No entanto, por causa da repressão política e da expropriação resultantes do modelo

    econômico, nasceu o mais amplo movimento camponês da história do Brasil: O Movimento

    dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra - MST. 

    A luta marca a vida e fica na memória. Aos que lutam, a memória persiste e

     jamais se esquece da história (FERNANDES, P.62). Foi assim que em 1979, no dia 7 de

    setembro, 110 famílias ocuparam a gleba Macali, no município de Ronda Alta, no Rio Grande

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    do Sul. Essa ocupação inaugurou o processo de forma do MST. As terras da Macali eram

    remanescentes das lutas pela terra da década de sessenta, quando o MASTER organizara os

    acampamentos na região. Portanto, a luta pela conquista desta terras estava registrada na

    memória dos camponeses, que agora participavam de um luta maior: a luta pela construção da

    democracia (FENANDES, p.63). 

     No inicio da década de oitenta, as experiências com ocupações de terra nos

    Estados do Sul e em São Paulo e Mato Grosso do Sul, reuniram os trabalhadores que

    iniciaram o processo de formação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra. A

    construção do Movimento se constituiu na interação com outras instituições, especialmente a

    Igreja Católica, por meio da Comissão Pastoral da Terra - CPT. Aprendendo com história daformação camponesa, na sua caminha o MST construiu o seu espaço político, garantido a sua

    autonomia, uma das diferenças com os outros movimentos camponeses que o precederam. 

    O MST leva na memória a história camponesa que está construindo. Esse

    conhecimento explica que o fato dos camponeses não terem entrado na terra até os dias de

    hoje é político. É a f orma estratégica de como o capital se apropriou e se apropria do

    território. Portanto, as lutas pela terra e pela reforma agrária são antes de mais nada, a luta

    contra o capital. É essa luta que o MST vem construindo nessa história que completa meio

    século (FERNANDES, p. 23). 

    1.2.  O MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS S EM-TERRA 

    De 1979 a 1985, os trabalhadores sem-terra reuniram as principais lutas efundaram o MST. Essa lutas foram realizadas no Centro - Sul e representaram o processo de

    formação do Movimento. Em janeiro de 1984, no município de Cascavel - PR, os sem-terra

    fundaram o MST e partiram para a construção de um movimento nacional. Com a realização

    do Primeiro Congresso em 1985, na cidade de Curitiba, abriram caminhos para a organização

    do Movimento nas regiões Nordeste e Amazônia, territorializando a luta pela terra. Nesse

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     período de reconstrução da democracia no Brasil e início da Nova República, os camponeses

    sem-terra definiram a ocupação da terra como forma de resistência da luta camponesa. 

     Na Região sudeste o surgimento do MST aconteceu nos estados de Espírito

    Santo, onde o MST foi formado em 1985, mais suas primeiras reuniões iniciaram em 1983

    com grupos de famílias sem-terra na favela do Pé Sujo, na periferia da cidade de São Mateus,

    no Litoral Norte Espírito-santenseção do MST iniciou-se no ano de 1983. Essa famílias foram

    expropriadas e expulsas pela territorialização de grandes projetos agroindustriais,

     principalmente, eucalipto e cana-de-açúcar, por meio de incentivos fiscais e financeiros, que

    ocorreram desde meadas da década de 1960. As reuniões para discussão das realidades

    dessas famílias eram parte dos trabalho das Comunidades Eclesiais de Base, que recebiamorientação e apoio da Comissão Pastoral da Terra e do Sindicato dos Trabalhadores Rurais

    de São Mateus. Nesse mesmo ano, em diversos municípios da região, outros grupos de

    famílias começaram a se organizar com o objetivo de negociar terra e trabalho com os

    governos municipais e estadual. Das negociações com prefeitos e o governador resultaram as

    conquistas de dois assentamentos: Córrego de Areia e São Roque, no município de Jaguaré.

    O objetivos de construir o MST só aconteceu mesmo após o primeiro Congresso que

    defendia a ocupação como forma de acesso à terra, mas os poucos assentamentos

    conquistados foram resultados de muita negociações e pressão principalmente da ocupação,

     pessoa como Hamilton Santos Moura, morreu numa emboscada por pistoleiros e

    assassinado, e a intensificação dos conflitos aumentava na proporção em que os sem-terra se

    organizavam para as ocupações. Esse fato resultou numa onda de perseguições e prisões.

    Com esse conflitos a Arquidiocese de Vitória divulgou uma nota em todas as CEBs,

    informando que esse conflito era fruto da “injustiça institucionalizada no campo, gerada pelaconcentração da terra, pelo insucesso das tentativas de reforma agrária e pela impunidade

    diante de centenas de assassinatos de trabalhadores e índios” (Pizetta, 1999, p. 33). O

    governo estadual se manifestou por meio da imprensa, afirmando que os latifundiários se

    apropriam de terras devolutas, acusando-os de “serem invasores de colarinho branco... são

    invasores tanto quanto os trabalhadores que invadem propriedades... já que nos dois casos a

    ocupação é feita em áreas que não pertencem nem aos trabalhadores e nem aos

     proprietários” (Bussinger, 1992, p.153). 

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    Trabalhadores sem-terra, lideranças sindicais e pastorais precisaram deixar a

    região para não serem chacinados. Em 1990, no Espirito Santo, o MST já havia conquistado

    vinte e um assentamentos, onde foram assentados aproximadamente 700 famílias. 

    Em Minas Gerais (1989) a questão agrária fora militarizada. O MST

    denunciava a ação conjunta da polícia e da UDR, de modo que a repressão policial contra os

    sem-terra aumentava na mesma proporção que os trabalhadores intensificava suas ações. 

    Em 1990 em Iturama, no Triângulo Mineiro, os sem-terra tentaram ocupar a

    fazenda Colorado e foram impedidos por jagunços e policiais. As duzentos e cinqüentas

    famílias, que não conseguiram ocupar, acamparam nas margens da rodovia. Um grupo

    ocupou a sede do INCRA, em Belo Horizonte, exigindo a vistoria da fazenda, que foideclarada empresa rural. A luta por outras fazendas existiram, três anos depois, organizadas

    no MST, essas famílias conquistaram a terra. 

     No Rio de Janeiro a formação do MST foi singular. Um dos principais

    aspectos dessa distinção com os outros estados foi a ocorrência de um interstício no processo

    de formação do MST-RJ. No período de 1985 a 1987 aconteceu a primeira fase desse

     processo, quando o Movimento tentou, sem sucesso, se consolidar no Rio de Janeiro. No

    final de 1993, o MST-RJ voltou a se organizar e desde então começou a se territorializar por

    diversas regiões do estado. Outro aspecto importantes, que diferenciava de outros estados,

    era a participação massiva de trabalhadores urbanos na luta pela terra. 

     Nesse interstício de 1987 a 1993, os sem-terra cariocas mantiveram contato

    com o MST, principalmente via comissão do Programa Especial de Crédito para a Reforma

    Agrária (Procera). Nesse período, ocorreram várias reuniões, quando os sem-terra do Rio e

    dos outros estados matutaram as discussões a respeito da rearticulação do MST-RJ. Em1993, o Movimento enviou uma liderança do Paraná, que juntamente com as lideranças

    cariocas reiniciaram os tra balho de construção do Movimento no Rio de Janeiro. Começava,

    dessa forma, uma nova fase da formação do MST-RJ. 

     No estado de São Paulo, a gestão e nascimento do Movimento aconteceram

    da conjunção das lutas e conquistas dos movimentos em várias regiões do Estado. Até 1984,

    a articulação desses movimentos foram coordenadas pela Comissão Pastoral da Terra. Com

    a fundação do MST e a realização do Primeiro Congresso, os sem-terra escolheram uma

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    coordenação e estabeleceram a Secretária Estadual na cidade de São Paulo, em uma sala na

    sede da Central Única do Trabalhadores (CUT). Em 1985, o MST-SP iniciou o seu processo

    de territorialização a partir da região de Campinas. Nesse ano, nas regiões de Sorocaba e

    Araçatuba também ocorreram diversas ocupações organizadas por movimentos isolados. 

    Essas primeiras ocupações do MST-SP foram realizadas em terras do

    Estado. A partir do quarto grupo, o Movimento começou a ocupar latifúndios e terras

    devolutas do Estado de São Paulo. No período 1985-1990, o MST territorializou-se para

    outras regiões. 

    Em 1990, no dia 14 de julho, quatrocentos famílias organizadas no MST

    ocuparam a fazenda Nova Pontal, no município de Teodoro Sampaio, na região do Pontal doParanapanema. Essa ocupação marcou o processo de territorialização do Movimento sobre

    um dos maiores grilos de terra do Estado de São Paulo. Na primeira metade da década de

    1990, o Pontal se tornaria uma das principais regiões de conflitos de terra do Brasil. O MST

    começava a desentranhar um grilo de mais de 1.000.000 de ha. Nesse tempo, o Movimento

    se consolidara no estado, constituindo seus principais setores: frente de massa, educação,

    formação, produção etc. Desenvolvida várias lutas, em diversas regiões, ao mesmo tempo.

     No estado, onde se defendia que os latifúndios era áreas f ictícias, conforme Graziano Neto:

    “Vale a pena repetir que nenhum dos latifíndios ‘ por dimensão’ do Estado de São Paulo

    sofreu ação desapropriatória do poder público, simplesmente porque não foram encontrados:

    eram áreas fictícias...” (Graziano, Neto, 1989, p. 37), os sem-terra espacializaram e

    territorializaram a luta pela terra, derrubando essa tese. 

    Em 1985 foi apresentada à sociedade o Plano Nacional de Reforma Agrária.

    Em quatro anos, menos de 10% previsto no Plano foi realizado. Em parte, asdesapropriações ocorreram porque os sem-terra intensificavam as ocupações de terra. Por

    essa razão surgiu a União Democrática Ruralista, organização dos latifundiários criada para

    defender seus privilégios e interesses. Em 1988, essa organização conseguiu minar a criação

    de uma lei de reforma agrária no processo Constituinte e inviabilizou a solução para a questão

    agrária. 

    O processo de territorialização do MST aconteceu por meio da construção

    do espaço de socialização política. Nas periferias das cidades, os sem-terra organizados

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    realizaram levantamentos das realidades da luta pela terra nos municípios. Com o apoio da

    Igreja Católica, dos Sindicatos de Trabalhadores Rurais e de Partidos Políticos, reuniram as

    famílias para refletirem sobre suas vidas e as perspectivas da vida e trabalho. Formam

    organizações locais, analisaram as conjunturas políticas por meio da construção de

    conhecimentos e tomaram decisões para transformar os seus destinos. Esses trabalhos foram

    feitos pelos próprios sem-terras, que têm na experiência de vida, a história da luta. Dessa

    forma, dimensionam os espaços de socialização política e os transformam em espaços de luta

    e resistência. 

    Os espaços de luta e resistência são materializados na ocupação da terra. A

    ocupação é condição da territorialização. A terra conquista é uma fração do território, ondeos sem-terra se organizam para promoverem um novo grupo de famílias que irá realizar uma

    nova ocupação, conquistando outra fração do território. Assim, a luta se renova e se amplia,

    territorializando-se. Dessa forma, os sem-terra migram por todo o território nacional,

     plantando as raízes da luta e minando a concentrado estrutura fundiária. 

    Em 1989, a reforma agrária saiu da pauta política do governo federal, com a

    eleição de Fernando Collor, árduo defensor dos latifundiários. Começaram as mais fortes

    repressões contra os sem-terra, que não se limitavam nas ações da força policial, e se valiam

    também da intervenção do Poder Judiciário como uma nova cerca para impedir as

    ocupações, por meio da incultivável criminalização ações das famílias sem-terra. Criou-se,

    assim, a judiciarização da luta pela terra e pela reforma agrária, resultando em prisões e

    massacres de camponeses sem-terra. Embora esse processo seja histórico, com o aumento

    das ocupações, o Poder Judiciário mostrou sua face, descoberta pela realidade construída

     pelos sem-terra. Por causa de tamanha repressão e sem perspectiva de fazer a luta pela terra

    avançar, os sem-terra voltaram-se para outra dimensão organizativa, investindo no

    desenvolvimento do Sistema Cooperativista dos Assentados, criando cooperativas locais e

    regionais. Desse modo, o MST fundou a Confederação das Cooperativas de Reforma

    Agrária do Brasil - CONCRAB. Esse fortalecimento da luta promoveu a territorialização do

    Movimento, que a cada dia contava com o apoio da sociedade, enquanto o presidente fora

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    impedido pelo Congresso Nacional, por ser criador e criatura de um profundo e não

    explicando processo de corrupção. 

    Em 1992, o FAO -  Órgão da Nações Unidas para a Agricultura e

    Alimentação - Apresentou o relatório de uma pesquisa nacional a respeito da realidade

    econômica dos assentamentos, em que demonstrava a sustentabilidade das experiências dos

    assentados na consolidação da agricultura camponesa. A luta pela reforma agrária tinha uma

    nova amplitude: construir um outro modelo de desenvolvimento para a agropecuária. Durante

    séculos, o desenvolvimento do campo esteve referenciado nos padrões do latifúndio e da

    agricultura capitalista. Agora será preciso pensar um modelo para a agricultura familiar, em

    que o campesinato seja o principal protagonista. Em 1994, com a eleição de Fernando Henrique Cardoso, a reforma agrária

    torna-se uma política compensatória, com de implantação de assentamentos rurais, de acordo

    com a territorialização de luta pela terra e, também, com a regularização das terras de

     posseiros nas áreas de fronteira da Amazônia. 

     Nesse ano, o MST estava territorializado por todas as regiões e se

    consolidava como uma das principais forças políticas do País. O governo FHC ampliou a

     política neoliberal, que vinha sendo implantada desde o governo Collor, agudizando a crise da

    agricultura, transformando muitos camponeses em sem-terra, entre outros fatores econômicos

    que atingiram a classe trabalhadora. 

    Da mesma forma, o desenvolvimento tecnológico da agricultura patronal

    contribuiu para o desemprego de milhões de trabalhadores assalariados. Esses problemas

    aumentaram a população na luta pela terra e por conseguinte multiplicou os conflitos

    fundiários, que resultam no assassinato de trabalhadores. Segundo pesquisa da ComissãoPastoral da Terra nos 20 anos de ditadura militar -  1964 - 1984, foram assassinados 42

    trabalhadores por ano. De 1985 a 1989, esse número triplicou e chegou a 117 assassinatos

     por ano. De 1990 a 1993, morreram 53 pessoas na luta pela terra. No período governo FHC

    - 1994 - 1997, esse número foi 43 pessoas assassinadas por ano. Número maior que do

     período da ditadura. 

    E, 1995, em Rondônia, na porção ocidental da Amazônia, aconteceu o

     primeiro grande conflito, no governo FHC, que resultou na chacina de 9 sem-terra e dezenas

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    de feridos e desaparecidos. Naquele ano, 500 famílias haviam ocupado uma fazenda no

    município de Corumbiara. Por ordem da Justiça. 300 policiais realizaram o despejo das

    famílias de forma violenta. Aquela ação era um indicador que nada mudara na luta pela terra e

    a resistência camponesa. 

    De fato, um ano depois, no dia 17 de abril, agora na porção oriental da

    Amazônia, outro massacre aconteceu. No município de Eldorado dos Carajás, no Pará,

    centenas de famílias sem-terra caminhavam por um rodovia em direção à cidade de Belém,

    quando foram surpreendidas pela ação policial. Resistiram e foram massacradas. A ação

    violenta da Polícia Militar causou 19 mortes e dezenas de feridos. A caminhada tinha como

    objetivo pressionar o governo para que as famílias fossem assentadas. O MST denominou odia 17 de abril como o Dia Internacional de Luta Camponesa. 

    A impunidade dos assassinos e de seus mandantes também continua sendo

    uma realidade, em que o Poder Judiciário é inoperante. Uma liminar de reintegração de posse

    com ordem de desejo é expedida em horas. Em julgamento de assassinos de trabalhadores

    demora anos e na maioria absoluta das vezes, os criminosos não são condenados

    (FERNANDES, p. 54). 

    Desde 1994, com o aumento de intensidade de problema fundiário, surgiram

    novos movimentos sociais na luta pela terra. Alguns como dissensão do MST, outros

    formados a partir de suas própria lutas. O desemprego gera uma demanda crescente,

     principalmente nas médias e pequenas cidades. Uma opção para os trabalhadores rurais e

    urbanos é a luta pela terra. Dessa forma, é constante a formação de um movimento social no

    interior do Brasil. Os latifúndios estão em toda a parte, assim com o sem-terra. 

    Em 1977, o MST realizou a Marcha Nacional por Terra, Emprego e Justiça.Duas mil pessoas partiram de três diferentes pontos do País em direção ao Distrito Federal. A

    caminhada durou dois meses e na chegada em Brasília, com mais de 30 mil pessoas, torno-se

    o principal assunto, chamando a atenção e ganhado a admiração do Brasil e do mundo.

    Chegaram no dia 17 de abril, lembrando e registrando na memória de toda a sociedade o

    massacre de Eldorado do Carajás. 

    O MST atua numa nova conjutura da questão agrária. O prolongamento

    dessa questão deve-se ao emperramento causado pelo sobre poder do latifúndio, que

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    determina o controle político do problema fundiário. Por ser estrutural, o arranjo do problema

    mantém-se firme, quase inabalável, pelo seu vigor astucioso e fundamentado em um projeto

     político linear e evolutivo, relacionado com a dependência de uma política internacional. 

    Durante século, os movimentos camponeses tentaram romper com essa

    estrutura de poder, por meio de luta pela terra. Entretanto, todas as lutas ainda não foram

    suficientes para uma mudança eminente. Pela sua perenidade, a questão agrária nutre-se de

    conflitos, assumindo diferentes feições sem modificar sua essência. Portanto, a persistência da

    questão agrária é um cerco político e uma projeto camponês. A questão agrária hoje já não

    coloca mais a pergunta: quem é contra ou a favor da reforma agrária? A sociedade em geral é

    favorável à sua realização. Mas, como será feita a reforma agrária? O que está em questão éa fundamental participação política dos trabalhadores. 

    O poder e a estúcia dos ruralista e o papel fundamental do Poder Judiciário

    em defesa dos interesses e privilégios dos latifundiários e grileiros, têm um resultado perverso

     para a sociedade (OLIVEIRA, 80). Em vários estados, as propriedades em desapropriação

    são supervalorizadas pela perícia e pelo Judiciário, tornando as indenizações impraticáveis.

    Atualmente, o governo federal possui um precatório de 4 bilhões para pagar aos latifundiários.

    Essas ações inescrupulosas ainda são utilizadas para convencer a sociedade que o melhor

     para o Brasil é a mercantilização da terra, por meio da venda direta do latifúndio aos sem-

    terra. 

    Por causa da diminuição de preço da terra, têm muitos latifundiários

    interessados em vender suas terras. Como o único comprador em potencial é o Estado, a

    criação de uma política imobiliária é de interesse dos latifundiários para manterem seus

     privilégios. Dessa forma, os latifundiários transferem suas riquezas para outros setores daeconomia. Nesse sentido, a reforma agrária como política pública de desapropriação precisa

    ser mantida. Para isso, é fundamental a participação dos trabalhadores. 

    O Censo Agropecuário de 1995/1996 registrou que a concentração fundiária

    aumentou. Mesmo a multiplicação das ocupações, o crescimento da luta pela terra na

    territor ialização do MST e implantação de milhares de assentamentos não foram suficientes

     para causar alguma mudança na estrutura fundiária, por menor que seja. A luta pela reforma

    agrária passa ser um das principais políticas do século XXI.

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    CAPÍTULO II 

    ESTRUTUR A ORGANIZATIVA DA EDUCAÇÃO NO

    MST 

    A problemática educacional ganha importância à medida que o MST coloca

    como fundamental o rompimento de três grandes “cercas”: a cerca do latifúndio, a cerca do

    capital e a cerca da ignorância e que submetem os trabalhadores rurais sem terra a condições

    de vida degradantes na sociedade brasileira. 

    2.1 - A IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO DO MST

    Falar de Educação no interior do MST é um grande desafio, pois esse

    movimento, apesar de sua organização e disciplinar, devido à dispersão nesse imenso

    continente que é o Brasil, não dispõe de dados precisos sobre o número de escolas ou alunosque estudam nos acampamentos ou assentamentos de R.A., nem das crianças, jovens e

    adolescentes que, morando em assentamento ou acampamentos, estudam na zona urbana. 

    É certo que ao longo dos tempos, o MST vem construindo uma proposta

     pedagógica através da qual educar não se reduz meramente a transmitir conhecimentos

    acumulados (FUNDEP 1995, p. 14-15), uma vez que, através da educação o Movimento

     busca integrar o homem a seu meio. Essa proposta de educação está sendo concebida por

    um projeto a ser aplicado nas suas áreas de influência, visando contribuir para a redução da

    retenção e evasão escolar, procurando ao mesmo tempo poder ir além da escola tradicional,

    no sentido de construir um projeto educativo dos oprimidos. 

    É nesse eclético projeto pedagógico, iniciado no seio do Movimento dos

    Trabalhadores Rurais Sem-Terra que se pratica o processo educacional do MST e que será

    estudado, buscando entender -se as diferença teórico-metodológicas que estão na origem

    dessas concepções pedagógicas, visto que o MST adota a mesma concepção de Salm (1980:

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      21 

     p. 34) ao conceder a educação como uma arma na luta contra a opressão, como instrumento

    moral e intelectual da jovem geração da classe oprimida e base de organização do movimento

    socialista atual para o futuro socialista. 

    A educação é vista, nessa perspectiva, como possuidora de uma vocação

    redentora da miséria a que a maior parte da sociedade brasileira está submetida pelos

    “desmandos” da classe dirigente do país, formada por um burguesia capitalista aliada a um

    segmento agrário retrógrado e mal intencionado, que procura manter o povo na ignorância

    como forma de facilitar a dominação dos trabalhadores por essa classe de parasitas. 

    O poeta Pedro Tierra, num de seus discursos, quando do assassinato de

    trabalhadores rurais sem-terra no município de Eldorado dos Carajás/PA, afirmava que, parao MST, investir em educação é tão importante quanto o gesto de ocupar a terra, um gesto,

    aliás, que se encontra no cerne da pedagogia do movimento. Aqui, educar é o aprendizado

    coletivo das possibilidades da vida. As dores e as vitórias são face e contraface do mesmo

     processo (CALDART, 1997: p. 23). 

    Essa busca de contribuir com a educação numa perspectiva que julga mais

    adequada à classe trabalhadora e, principalmente, aos trabalhadores rurais, tem possibilitado

    ao MST desenvolver algumas experiências que o movimento considera inovadoras, sobretudo

    no que diz respeito à prática de gestão democrática da escola que se vem tentando construir,

     principalmente, no que diz respeito aos conteúdos e metodologias de ensino, bem como o

    envolvimento da comunidade no direcionamento das atividades escolares. 

    Sendo assim, os pais participam e estimulam a participação de outros pais nos

    conselho escolares, nas associações de pais e mestres, além de buscarem estar próximo dos

     professores, discutindo o conteúdo ensinado. Esse processo fica mais evidente quando oMST realiza seus encontros de educadores, com o objetivo de ampliar a formação de seus

     professores ou através dos materiais que seus coletivos de educação produzem para servirem

    de apoio aos professores. 

    Esse trabalho educativo tem sido desenvolvido com êxito, visto que o setor de

    educação do movimento consegue atingir grande número de analfabeto, que jamais teriam

    oportunidade de acesso à escola no meio rural se não fosse sua participação nas fileiras do

    MST. 

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    Outros trabalhadores, mesmo sentindo a necessidade de estudar, por

    habitarem no meio rural, muitas vezes ficavam impossibilitados de freqüentar as aulas, devido

    às longas distâncias entre a escola e o local de moradia, problemas que só se resolveu com

    sua participação no MST, após a construção de escolas nos acampamentos ou assentamentos

     próximas de suas casas. 

    O MST acredita, ainda, na necessidade da educação como possibilidade de

    transformar a sociedade através de uma revolução cultura, que se daria também através de

    suas escolas de formação. Nesse aspecto, o MST adota as posições assumidas ens ino

    tecnológico, ao proclamar que não há dúvida de que a trará a adoção do ensino tecnológico,teórico e prático nas escolas dos trabalhadores. 

    Considerando o analfabetismo como o mais sério entrave a ser enfrentado no

    sentido de transformar a realidade agrária do povo brasileiro, o MST coloca como tarefa

    fundamental para si, eliminar o analfabetismo nos assentamentos e preparar os jovens para

    assumirem a condição de futuros técnicos, futuros doutores e transformar o meio rural numa

    sociedade pregressista, igualitária, onde haja justiça social e educação para todos. 

    Um sério problema enfrentado pela trabalhador rural em geral, e pelo MST

    em particular, é a falta de propostas dos órgãos oficiais para a educação no setor rural, em

     praticamente todo o território nacional. No Rio Grande do Sul, por exemplo, um dos Estado

    onde o movimento está mais bem organizado, principalmente no setor educacional, a

    coordenação do setor de educação no MST em 1992 afirmava que o governo estadual

    gaúcho não tinha um projeto de educação para o meio rural. Sua única proposta seria o

    fechamento das pequenas escolas multisseriadas, assegurando o transporte das crianças e suareunião nos Centros Integrados de Educação Pública (CIEPS), escolas rurais de tempo

    integral (HADDAD e DI PIERR O, 1994: p. 12). 

    Os problemas da educação no Brasil não se restringem ao meio rural, nem os

     problemas da educação rural se restringem à falta de escolas ou de propostas para esse setor.

    Englobam também os professores, pois estes são preparados para atuar no meio urbano, com

    material típico do setor urbano e com falhas de formação, visto que não há uma proposta de

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    formação específica para o professor da zona rural, que leve em conta as especificidades

    desse meio e o conhecimento que a criança traz em sua bagagem. 

    Para o desenvolvimento desse trabalho, o MST tem investido na habilitação

    de professores leigos através do trabalho desenvolvido na Escola Nacional de Formação,

    cujas primeiras turmas aconteceram na Escola “Uma Terra de Educar”, do Departamento de

    Educação Rural FUNDEP, em Braga, noroeste do RS. A partir de então, várias outras

    turmas por lá passaram, consolidando o trabalho de equipe. 

    A partir de 1993, com a implantação das Oficinas de Capacitação

    Pedagógicas (OFOCs), tiveram grande avanço os trabalhos de formação de educadores do

    MST, visto que o número de formandos aumentou. Outro fator importante naquele momento, para o qual os OFOCs contribuíram, foi a definição de quem poderia ser ou não considerado

    como educador do MST. 

    Para o MST, é importante que os filhos dos agricultores permaneçam no

    campo e continuem a luta pelo acesso à terra, partilhando as tradições e o projeto social do

    movimento. Em outras palavras, a luta por uma R.A. e por uma sociedade socialista não deve

     parar jamais, pois somente assim se construirá o homem novo almejado pelo movimento. A

    educação é considerada fundamental nesse processo. 

    Para o MST, a conquista da R.A. faz parte de uma luta dos sem-terra para se

    transformarem em cidadãos. Sendo assim, a luta do MST deve ser, em pr imeiro lugar, por

    terra, para dela tirarem o sustento, por trabalho para poderem vislumbrar um futuro melhor

     para suas famílias, se livrarem da exploração dos latifundiários e da miséria que existe no meio

    rural. O MST entende, no entanto, que não terá atingido plenamente seus objetivos, se tudo

    isso não vier acompanhado de um sistema educacional verdadeiramente comprometido comas necessidades da classe trabalhadora. 

    O MST, ao definir sua proposta de trabalho educacional, procurou aliar a

    educação ao trabalho e à organização que poderá possibilitar uma formação para as suas

    lutas, cujos princípios norteadores podem ser assim sintetizados através do trabalho,

    organização e participação coletivos, tornando mais firme o vínculo entre o trabalho produtivo

    e o estudo, que deve ser uma tônica constante na educação do MST, bem como a necessária

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    ligação entre a teoria e a prática, sendo esta última entendida como tarefa obrigatória dos

    educandos. 

    Partindo desses princípios, o MST reivindica do Estado que a escola pú blica

    do meio rural seja pensada e organizada para o trabalho no campo, dando a mesma ênfase

     para o trabalho manual e o trabalho intelectual, rompendo assim com a dicotomia social do

    trabalho intelectual para uma classe e o trabalho braçal para outra. O MST entende, portanto,

    que, partindo da prática produtiva para a educacional, estariam fazendo uma relação dialética

    entre teoria e prática. 

    Cumpre assinalar que a proposta pedagógica do MST não é uma proposta

    que surge do nada ou que busque dar início a uma nova pedagogia. Na prática, é umaapropriação da proposta educacional de Paulo Freire, inclusive com os problemas

    decorrentes dessa metodologia, acompanhada das orientações pedagógicas de pensadores

    como Makarenko, Piaget, Martí e Che Guevara. 

    O MST tem como objetivo construir um novo modelo de educação mas, ao

    mesmo tempo, entende que há muitas dificuldades para mudar a mentalidade educacional no

    Brasil. Essas dificuldades estão presentes tanto nos órgãos do Estado, que fiscalizam e

    enquadram o currículo e os conteúdos trabalhados pelos professores, como no

    conservadorismo dos pais que muitas vezes se colocam contra as novas propostas

    educacionais. Outra dificuldade para implantar seu programa é a falta de colaboração de

    alguns órgãos regionais de educação, sobretudo quando esses são dirigidos por pessoas

    simpatizantes ou, até mesmo, ligadas aos grandes latifundiários, como era o caso da 39ª DE

    do Rio Grande do Sul, onde a titular (no ano de 1993) era, segundo Haddad e Di Pierro,

    ligada à UDR o que a levava a boicotar as propostas do MST no sentido de dar umaformação entendida como a mais adequada para os professores que trabalhavam nos

    acampamentos e assentamentos. 

    Embora tenha optado por não construir uma estrutura escola autônoma,

    durante muito tempo o MST pensou em ter sua própria escola no assentamento educando na

    realidade do movimento. Onde tanto o conteúdo quando a metodologia deveriam estar ligada

    à sua ideologia, chegando mesmo a afirmar por algum tempo que os professores do MST

    deveriam ser formados pelo próprio movimento, através de um escola “diferente”, integrada

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    ao assentamento e ao mesmo tempo lugar de estudo e trabalho, em que os alunos aprendam a

    organizar -se e participem democraticamente, tendo por objetivo formar militantes que dêem

    continuidade à sua luta, “sujeitos de práxis”, dotados de clareza de objetivos, consciência

    organizativa, conhecimento teórico e competência prática. 

    O movimento entende que esse objetivo deva ser conquistado através de um

    método específico, constituído pela dialética entre teoria e prática, perspectiva epistemológica

    que subjaz a um currículo desenvolvido através de complexos temáticos. 

    Apesar de se auto reivindicarem dialéticos, apontam para a utilização de uma

    metodologia advinda do existencialismo cristão de Paulo Freire, ao escolherem com ponto de

     partida os complexos temáticos em torno de uma abordagem interdisciplinar. Esses complexos temáticos giram em torno da realidade do MST, sobretudo

    em torno da R.A., da cooperativa e da luta pela terra num sentido mais amplo. É também

    importante para a educação a problemática associada à formação política e a organização dos

    trabalhadores. Sendo assim, trabalho, R.A., organização e cooperação compreendem os

     principais eixos temáticos em torno dos quais o MST se estrutura para educar. 

    A utilização da proposta pedagógica de Paulo Freire pode também ser

     percebida nas palavras de Haddad e Di Pierro (1994: p. 48), a respeito das proposições do

    MST, quando afirmam: “Os objetos ou temas geradores devem emergir da realidade ou das

    necessidades da comunidade na qual a escola e as crianças estão inseridas”, como se, por si

    mesmos, os temas geradores levassem à dialética. A proposta do MST demonstra um certo

    equívoco tanto em torno do método em si, como em torno do conteúdo do método.

    Para viabilizar tal proposta a ser fiel a realidade dos assentamentos ou

    acampamentos, cujos temas deveriam ser bem conhecidos, o MST, por algum tempo,desenvolveu uma espécie de xenofobia maniqueísta, acreditando que somente quem morasse

    no assentamento, fazendo parte do MST, poderia ter capacidade para ser um verdadeiro

     professor de sem-terra. Isso levou o movimento a pensar em construir sua própria rede de

    ensino ou, pelo menos, tentar controlar ao máximo as escolas onde estudavam as crianças dos

    moradores de acampamentos ou assentamentos. 

    Essa proposta de formação de professores militantes do movimento fica

    claramente identificada nos documentos do MST que tratam da problemática educacional no

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     período anterior a 1995, quando este reivindicava que os professores de suas escolas

    deveriam ser pessoas que vivessem nos acampamentos e assentamentos como trabalhadores

    sem-terra. Verificou-se na prática que a proposta de ser ter esse professor militante vivendo

    entre os acampados e assentados não seria viabilizada, visto que o MST deparava-se com as

    dificuldades da formação específica do professor e da formação do cidadão que tem de ter,

    também, conhecimentos técnicos e não apenas políticos, como demonstram Haddad e Di

    Pierro (1994: p. 48), ao sugerirem que os professores influenciados pelo MST de fato

    militantes, aparentemente, estão mais bem preparados politicamente (porque consciente das

    metas que desejam alcançar) que tecnicamente (porque nem sempre dispõem do

    conhecimento específico das disciplinas que seria necessário ao desenvolvimento de seutrabalho) 

    Com relação à gestão e manutenção da escola, o movimento baseia-se no

     princípio de que o que confere o caráter público à escola não é a gestão estatal e sim a

     participação democrática da comunidade na qual a escola está inserida. Nesse sentido, a

    comunidade tem que ser entendida tal qual ela é concebida pelo MST, ou seja, como todos

    os usuários e trabalhadores daquela área de abrangência do assentamento ou acampamento. 

    Segundo Haddad e Di Pierro (1994: p. 49), na prática, o MST busca

    fundamentalmente garantir a influência das associações de trabalhadores rurais cooperados na

    gestão da escola. Através dessa participação, somada à prática dos professores assentados,

    o movimento procura exercer influência sobre os conteúdos e metodologias de ensino, na

     perspectiva de atingir seus objetivos filosófico- pedagógicos. 

    O MST tem insistido na participação de toda a comunidade interessada na

    gestão da escola, entendendo que nisso consiste a democracia. Mas fica explícito que, atéagora, nem mesmo onde o movimento está mais organizado, esse apelo tem dado os

    resultados esperados, como demonstram Haddad e Di Pierro (1994: p. 51), ao constatarem

    que “o discurso do MST que insiste na participação das crianças na gestão da escola não

    encontrou ainda formas de efetivação” pois na prática as crianças não têm como assumir

    tarefas que se destinam exclusivamente a adultos, tais como administração e direção da

    escolar. 

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    O MST tenta partir das necessidades práticas dos assentamentos e 

    acampamentos para desenvolver seu projeto pedagógico. Nesse sentido, a orientação

     pedagógica dada pelo setor de educação do MST aos professores e às liderança

    comunitárias estimula e incentiva a adoção de conteúdos e metodologias de ensino mais

     próximos e adequados ao contexto econômico e sócio-cultural dos assentamento rurais. 

    Diante desse contexto, o que se tem verificado é que o grau de influência do

    MST nas escolas dos assentamentos está diretamente relacionado com o comprometimento

    que os professores daquele assentamento tiverem com as causas do movimento, bem como

    do perfil dos delegados de ensinos, diretores e supervisores ligados às escolas da região. 

     Não podemos, no entanto, deixar de reconhecer que a proposta de educaçãodo MST está profundamente conectada ao projeto político e sócio-econômico do

    movimento, encontrando maior ressonância nas áreas onde vivem os trabalhadores

    assentados num projeto de R.A.. 

    2.2 – ESTRUTURA EDUCATIVA E FORMATIVA DO MST 

    O trabalho de educação desenvolvido pelo MST a brange a maior parte dos

    acampamentos e assentamentos, com uma estrutura maior que alguns Estados brasileiros.

    Segundo Caldart (1997: p,28), esse universo de trabalho atualmente desenvolvido pelo Setor

    de Educação abrange aproximadamente 950 escolas públicas de 1ª a 4ª séries e 50 de 5ª a

    8ª série (Ensino Fundamental), o que significa cerca de 1.800 professores de 40 mil alunos.

    Além disso, existem 600 monitores de alfabetização trabalhando com um número aproximadode 8 mil alfabetizados jovens e adultos dos assentamentos e acampamentos, bem como

    algumas experiências (ainda sem contabilização) de educação infantil. 

     No campo educacional, em área de acampamentos e assentamentos, o MST

    entende que um dos maiores desafios é erradicar o analfabetismo que, segundo  seus

    componentes atinge índices de 80% a 90% entre seus militantes. Esse números levaram a

    Movimento a buscar ampliação dos níveis de escolarização das crianças e jovens, através da

    criação de escolas de ensino fundamental e ensino médio nas regiões de ocupação. O MST

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    vem tentando constituir um Movimento Nacional de Educação de Jovens e Adultos nas áreas

    de R.A., multiplicando aos poucos as turmas de alfabetização, e chegando à escolarização de

    1º grau, começando pela dos próprios monitores, que na maioria  dos casos tem uma

    escolaridade inferior à 8ª série. 

    Essas escolas de ensino fundamental e ensino médio visam atender às

    necessidades de crianças em idade escolar que não terão acesso a elas se tais vagas não

    forem oferecidas pelo próprio movimento, pois o Estado alega que não pode fornecer escola

    em acampamentos para não legitimar uma situação que considera ilegal. 

    Foi para suprir essa necessidades que o MST criou suas próprias escolas,

    sendo que as criadas e mantidas pelo MST funcionam normalmente, embora algumas tenhamque permanecer na informalidade, pois há dificuldades para serem reconhecidas pelas

    secretarias de Educação em alguns Estados. Já nos assentamentos, essa situação é mais

    tranqüila e o próprio Estado, na maioria dos casos, fornece professores e equipamentos para

    as escola, reconhecendo-lhes o direito de acesso ao saber escolar. 

    Além do atendimento da faixa etária considerada ideal pelo Estado para o

    ingresso da criança na escola, as de primeiro e segundo graus visam atender, também, aquelas

     pessoas que não tiveram acesso à escola na idade apropriada para o ingresso escolar, fato

    corriqueiro no meio rural. Nesse meio, o aluno ingressa na escola com dez (10) anos ou mais,

    enquanto na cidade esse ingresso se dá aos seis (6) ou sete (7) anos. 

    Visando assegurar o cesso de todos os seus integrantes ao ensino médio,

     pensou-se num segundo grau alternativo, que já funciona nos Estados do Rio Grande do Sul,

    Paraná, e Espírito Santo, pretendendo-se ampliar para todos os Estados brasileiros. 

    O MST luta, também, pela implantação de uma universidade popular,reconhecida pelos órgãos públicos, que possibilite o acesso aos jovens que vivem do trabalho

    no campo, e que encontrem nele seu lugar de habitação, com normas e condições específicas

    de formação para tender a essa “Clientela”, formada por acampados e assentados, nos mais

    variados cursos, com as mesmas facilidades que existem para os jovens da cidade, mas que

    leve em conta as peculiaridades do campo. 

    O setor educacional do Movimento Sem-Terra está organizado em 15 dos 22

    Estados brasileiros onde o movimento se faz presente. Essa presença se dá através de

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    equipes de educação nas áreas ocupadas e de coletivos regionais e estaduais constituídos por

    membros dos próprios assentamentos, que buscam atender às necessidades de cada região,

    de acordo com a demanda da área.

    É importante lembrar que o MST não dá formação apenas para aquelas

     pessoas que se identificam com o movimento, mas quer atingir todos aqueles professores que

    atuam em suas áreas de abrangências. Entende que a transformação da sociedade não pode

    se dar apenas através da ocupação de terras, o que leva a educação a Ter uma abrangências

    mais geral. Nesse sentido, muitos professores que atuam nas redes municipais e estaduais de

    ensino, trabalhando ou não em assentamentos e acampamentos, são convidados a participar

    dos cursos.  No início é relativamente comum haver resistência por parte dos educadores

    aos métodos do MST, mas após alguns dias de cursos ou algumas etapas, alguns acabam

    indo morar nos assentamentos ou se envolvendo com alguém de lá. Para Roseli Caldart,

    algumas mudanças acabam ocorrendo sobretudo após a encanação de peças teatrais sobre o

    que seria a vida nos acampamentos ou mesmo o processo de ocupação de terras, como

    metodologia educacional que visa transformar a mentalidade de alguns educadores. 

    O Setor Educacional do movimento sem-terra acredita, no entanto, que não

     basta ser militante de um movimento social para estar apto a assumir com coerência e

    competência uma proposta de educação que corresponda aos seus objetivos mais amplos de

    transformação, mas é preciso que esse militantes esteja comprometido com a causa dos

    trabalhadores em luta pela transformação social de sua realidade. 

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    CAPÍTULO III 

    PRINCÍPIOS EDUCATIVOS DO MST 

    A proposta de gestão da educação através dos mecanismos de controle do

    movimento, bem como seu “ecletismo Metodológico”, sem deixar de levar em conta a

    discussão dos trabalhos que são desenvolvidos na formação dos jovens e adultos analfabetos

    que vivem nas áreas de acampamentos e assentamentos de R.A. neste país. 

    O princípio Educacionais do MST consiste na formação de militantes, quer

    como forma de instruir (e educar) as crianças e os adultos, bem como de influenciar nas

    escolas onde os jovens estudantes que pertencem aos seus assentamentos ou acampamentos.

    Isso tem contribuindo tanto para divulgar a luta do homem do campo como para demonstrar a

    importância da educação nesse segmento social. 

    Os primeiros conhecimentos de toda criança estão ligados a seu habitat. Os

    conhecimentos da criança rural estão ligada à vida na roça, mas os conteúdos oferecidos a ela

     pela escola tradicional partem do princípio de que, para ser culto, é preciso ser letrado,

    contando com uma formação típica para os desafios do mundo urbano e submetendo acriança a um calendário escolar que não valoriza a prática de seus pais, nem a sua dimensão

    temporal, uma vez que esse calendário é elaborado para ser praticado a partir do ano civil e

    não do ano agrícola, mais próximo à realidade do homem do campo. 

    É no meio rural que se encontram os valores primordiais do povo que luta

     pela R.A. no Brasil. Esses valores, advindos das práticas do meio rural, acarretam, além dos

     problemas da organização do calendário, problemas como o ingresso tardio no ambiente

    escolar, o que faz que optem por esperar a idade mínima necessária para o ingresso no ensino

    supletivo. 

    Segundo o MST, a problemática educacional constitui-se num ponto

    fundamental para o sucesso e continuidade de seu trabalho, bem como para o

    desenvolvimento de suas atividades. Esse ponto ganha importância quanto se verifica que o

    movimento defende uma concepção de educação, segundo a qual essa é portadora de uma

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    ação redentora da sociedade, pois é através da educação que o MST pretende transformar

    as relações capitalistas, predominantes, hoje, em relações socialistas no futuro. 

    Em seu manifesto das educadoras e educadores da R.A. ao povo brasileiro,

     publicado na revista SEM-TERRA n.º 2 de 1997, os educadores da R.A. caracterizam a

    educação a partir de seu envolvimento com o dia-a-dia da comunidade, afirmando a todos o

     povo brasileiro: 

    “Queremos uma escola que se deixe ocupar pelas questões

    de nosso tempo, e que ajude no fortalecimento das lutas

     sociais, e na solução dos problemas concretos de cada

    comunidade.

     Defendemos uma pedagogia que se preocupe com todas as

    dimensões da pessoa humana e que crie um ambiente

    educativo baseado na ação e na participação

    democrática, e na dimensão educativa do trabalho, da

    cultura e da história do nosso povo.

     Acreditamos numa escola que desperte os sonhos de nossa

    mocidade, que cultive a solidariedade, a esperança, e o

    desejo de aprender sempre e de transformar o mundo.

     Entendemos que para participar da construção desta nova

    escola nós, educadoras e educadores, precisamos construir

    coletivos pedagógicos com clareza política, competência

    técnica, valores humanistas e unidade de ação.

     Lutamos por escolas públicas em todos os acampamentos

    e assentamentos de R.A. do país e defendemos que a

     gestão pedagógica destas escolas tenha a participação da

    comunidade Sem-Terra e de sua organização”.

    O MST reconhece que essa não é uma tarefa fácil. Aliás, entende que não é

    fácil a luta pelo acesso ao saber, sobretudo para quem habita a zona rural, onde estima-se que

    90% dessa população é constituída de analfabetos. Não obstante, afirma estar construindo

    um novo jeito de educar e um novo tipo de escola. 

    Partindo do pressuposto segundo o qual a escola tradicional não corresponde

    às suas necessidades, o movimento reivindica uma educação de classe, com as seguintes

    características: 

    a)  uma educação pensada, planejada e estruturada a partir dos princípios da

    classe trabalhadora do MST. 

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     b)  Uma alfabetização que vá muito além do reconhecimento das letras, que

    vá além do espaço da sala de aula e que se dê nas atividad es culturais,

    religiosas, recreativas, etc. do assentamento. 

    c)  a escola precisa ser um ambiente seguro, receptivo e acolhedor para que

    a criança se sinta feliz para poder expressar afetividade, sonhos, desejos,

    fantasias, etc., desenvolvendo-se com liberdade. 

    d)  a escola deve ser planejada como um todo, com a participação de alunos,

     pais, professores, etc., visando atender a todos. 

    Com a luta pela adoção dessas medidas, o movimento entende que está

    dando sua cota de contribuição para ajudar na eliminação de alguns dos males do ensino brasileiro, sobretudo no que se refere à problemática da seleção pela via da exclusão dos

    educandos, que, no Brasil, sempre se deu em todos os níveis, desde a educação elementar,

    onde a seleção se dá pela retenção e pela evasão escolar, patrocinada pela forma

    desinteressante como a educação era promovida, embora essa, a partir do império, tenha

    sempre sido encarada como um direito de todos os cidadãos e, posteriormente assumido

    como um dever do Estado. 

    Partindo de afirmações como o Ministério da Educação deixa milhões de

    crianças fora da escola, onde há um acampamento e um assentamento todas as crianças

    freqüentam as aulas, o MST tem reforçado o discurso de que sua participação nas áreas de

    acampamentos e assentamentos tem se constituído um importante instrumento de combate ao

    analfabetismo produzido pela sociedade brasileira, subretudo no setor rural. 

    A partir desse entendimento, o movimento reivindica a construção de uma

    escola que se preocupe com a formação do cidadão-militante ou com a formação docidadão-militante ou com a formação do homem omnilateral. Uma escola, portanto, que

    contribua com os destinos da história da humanidade onde se educa partindo da realidade;

    uma escola onde professor e aluno sejam companheiros e trabalhem juntos aprendendo e

    ensinando; uma escola que se organize criando oportunidades para que as crianças se

    desenvolvam em todos os sentidos; uma escola que incentive e fortalece os valores do

    trabalho, da solidariedade, do companheirismo, da responsabilidade e do amor à causa do

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     povo. Uma escola que tenha como objetivo um novo homem e uma nova mulher, para uma

    nova sociedade e um novo mundo. 

    Essa nova escola será, no entendimento do MST, a porta de entrada para a

    construção do “homem novo”. 

    Para atingir seus objetivos, o MST parte do princípio de que se deva procurar

    fazer uma educação de classe. Essa verdade viria através da comprovação prática da teoria

    que afirma que uma coisa é verdadeira quando pode ser comprovada na prática. Nesse

    sentido, o setor de educaçã