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SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO – SEED SUPERINTENDÊNCIA DA EDUCAÇÃO - SUED
DIRETORIA DE POLÍTICAS E PROGRAMAS EDUCACIONAIS - DPPE
Ficha para Catálogo Artigo Final
Professor PDE/2010
Título Lembranças de Capoeiras em Apucarana- PR
Autora Leonirce Moya Mareze
Escola de Atuação Colégio Estadual “São Bartolomeu”- Ensino
Fundamental e Médio
Município da Escola Apucarana
Núcleo Regional de Educação Apucarana
Orientadora Profª Drª Regina Célia Alegro
Instituição de Ensino Superior Universidade Estadual de Londrina (UEL)
Área do Conhecimento/Disciplina História
Relação Interdisciplinar
Público Alvo Alunos da 8ª série do Ensino Fundamental
Localização (identificar nome e
endereço da escola de
implementação)
Colégio Estadual “São Bartolomeu”- Ensino
Fundamental e Médio. Rua Panamá, 101- Jardim
Diamantina
Resumo: (no máximo 1300 caracteres, ou 200 palavras, fonte Arial ou Times New Roman, tamanho 12 e espaçamento simples)
O objetivo deste artigo é registrar as lembranças de Capoeiras em Apucarana - PR. Estudar a capoeira assume um sentido muito especial uma vez que foi necessário construí-la com ajuda de seus personagens através de entrevistas. Buscou-se materiais que pudessem auxiliar nessa produção, porém o maior obstáculo foi a ausência dos mesmos nos livros didáticos e de memória local. Daí a importância em deixar escrito uma vez que essa História esquecida e que anteriormente Não foi registrada para preservar viva a memória desses personagens e as lembranças guardadas para as próximas gerações. O estudo da capoeira apresenta como componente da História e da cultura local e permite que sujeitos e identidades antes não mencionados sejam contemplados, respeitando-se suas singularidades no espaço multicultural.
Palavras-chave ( 3 a 5 palavras) Capoeira. Memória. História local. Ensino de história. Apucarana
LEMBRANÇAS DE CAPOEIRAS EM APUCARANA – PR
Autora: Leonirce Moya Mareze1
Orientadora Regina Célia Alegro2
Resumo O objetivo deste artigo é registrar as lembranças de Capoeiras em Apucarana – PR. Estudar a capoeira na cidade assume um sentido muito especial uma vez que foi necessário construí-la com ajuda de seus personagens através de entrevistas. Buscou-se materiais para que pudessem auxiliar nessa produção, porém o maior obstáculo foi à ausência dos mesmos nos livros didáticos e de memória local. Daí a importância em deixar escrito uma vez que essa História esquecida e que anteriormente não foi registrada para preservar viva a memória desses personagens e as lembranças guardadas para as próximas gerações. O estudo da capoeira apresenta como componente da história e da cultura local e permite que sujeitos e identidades antes não mencionados sejam contemplados, respeitando-se suas singularidades no espaço multicultural. Palavras–chave: Capoeira. Memória. História local. Ensino de história. Apucarana.
Introdução
A capoeira (caá+puuéra) é um vocábulo tupi – guarani que significa
“mato ralo ou mato que foi cortado, extinto.” (SILVA, 1993, p. 10). O nome capoeira
designava o mato onde os negros fugitivos se entrincheiravam e exerciam seus
treinos sendo também o nome de uma ave cujos machos lutavam entre si pela
posse de fêmea e pareciam reproduzir a simulação que faziam os escravos se
divertir (AREIAS, 1983b, p. 18).
Segundo Rego (1968, p. 21) o nome está vinculado à floresta
virgem. Trata-se de caápuêra uma aglutinação do prefixo caá – da língua tupi-
guarani, que significa mato, floresta virgem, mais o sufixo púêra, que significa o que
foi o que não existe mais.
1 Especialista em História e Política Brasileira e licenciada em História pela Fundação Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras de Mandaguari (FAFIMAM); professora do Ensino Fundamental e Médio do Colégio São Bartolomeu, em Apucarana- PR.
2 Orientadora, doutora em Educação, professora adjunta da Universidade Estadual de Londrina.
2
Hoje, capoeira é música, poesia, festa, brincadeira, diversão e,
acima de tudo, uma forma de luta e manifestação da expressão de um povo
oprimido em busca de sobrevivência liberdade e igualdade (AREIAS, 1983a, p. 8). A
capoeira é, antes de tudo, concebida como uma manifestação cultural, expressão da
cultura afrodescendente (BARBIERI, 1993, p. 14).
Também são várias as explicações acerca das origens da capoeira,
ora creditada aos africanos, ora aos indígenas (SANTOS, 1990, p. 19). Na sua
origem a capoeira é brasileira ou africana? O que se sabe é que na África existia “O
Jogo da Zebra”, ou N’Golo, uma dança era praticada com bastante violência no sul
de Angola:
Entre os mucope do Sul de Angola, há uma dança da zebra, N`golo, que ocorre durante a Efundula, festa da puberdade da raparigas, quando essas deixam de ser muficuenas, meninas, e passam à condição de mulheres, aptas ao casamento e à procriação. O rapaz vencedor no N`golo tem o direito de escolher esposa entre as noivas iniciadas e sem pagar o dote esposalício [...] O N`golo é a Capoeira.... (CÂMARA CASCUDO, 1967, p. 184).
Em busca de uma resposta, historiadores e folcloristas tendem para
hipótese brasileira devido a alguns fatores. No livro do Padre José de Anchieta, A
arte da Gramática da Língua Mais Usada na Costa do Brasil, editado em 1595, há
uma citação de que “[...] os índios tupi guaranis divertiam-se jogando capoeira”.
Guilherme de Almeida, no livro “Música no Brasil”, sustenta serem indígenas as
raízes da capoeira. Martin Afonso de Souza, navegador português, teria observado
tribos jogando capoeira (apud SILVA, 1993, p.10).
Em sua obra Capoeira, pequeno manual do jogador, observou: “A capoeira nasceu da mistura de diversas lutas, danças, rituais e instrumentos musicais vindos de várias partes da África. “Mistura realizada em solo brasileiro durante o regime de escravidão provavelmente em Salvador e no Recôncavo Baiano durante o século XIX (CAPOEIRA, 2002, p. 34).3
Areias defende que a capoeira é afrobrasileira, criada por africanos
em terras brasileiras.
3 Alguns historiadores alegam que não conseguiram provas documentais
3
Considera-se que o negro não veio apenas para o Brasil, foi levado para diversas partes do mundo sendo que em nenhum lugar onde foi instituída a escravidão temos conhecimento da prática da capoeira antes da metade do século XX, a não ser em algumas regiões da áfrica próximo a Dakar (República do Senegal), por exemplo, para onde retornaram africano após a libertação, levando consigo coisas do Brasil, coisa não só inventadas por eles aqui, como assimiladas do índio e do português (AREIAS, 1983a, p.19).
Como os escravos africanos não possuíam armas para se defender dos inimigos – os feitores, os senhores de engenho, movidos pelo instinto natural de preservação da vida, descobriram em si mesmo a sua arma, a arte de bater com o corpo, a semelhança das brigas dos animais, suas amarradas, coices, saltos e botes. Aproveitaram ainda suas manifestações, culturais trazidas da África, suas danças e suas cantigas e movimentos que praticavam em cerimônias ritualísticas (AREIAS, 1983b, p.16-17).
Brasil Gerson afirma que a capoeira nasceu na rua D. Manuel, no
Rio de Janeiro, onde existia grande mercado de aves. Lá se reuniam grupos de
escravos transportando capoeiras que eram cestos para guardar capões e onde os
negros se entregavam à brincadeira de lutar surgindo daí a verdadeira capoeira
(apud REGO, 1968, p. 24).
Diante dessas questões, outra, mais específica preside esse
trabalho: a capoeira floresceu em outras regiões, além de cidades do nordeste e do
Rio de Janeiro, mais especificamente em Apucarana, no Paraná, uma cidade que
não destaca a presença negra nas suas origens?
Apucarana foi projetada pela companhia de terras do Norte do
Paraná em 1934 para ser pólo intermediário e convergente da produção agrícola.
Tinha como função abastecer os núcleos criados a uma distância de mais ou menos
100 km. Tais núcleos, no caso Londrina e Maringá recebiam toda a assistência da
companhia.
A companhia de Terras Norte do Paraná em 1938 mandou para
Apucarana um mineiro de nome Benevides Mesquita, cuja função era coordenar sua
fundação. Porém a empresa não investiu seu capital em Apucarana, interessado pôr
comércio com outras cidades, abriu estradas de Arapongas à Lovat (hoje
Mandaguari), desviando Apucarana pelo patrimônio conhecido como Caixa de São
Pedro, e por isso seu trabalho se limitou á demarcação da areá urbana e divisão de
lotes para comercialização. Tudo que se fez em relação a desenvolvimento e
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progresso em Apucarana deram – se por iniciativa de seus primeiros moradores
vindos de diversas partes do mundo e de diversos estados do Brasil.
A empresa denominou a nova cidade como Apucarana, nome usado
pelos caingangues que significa: “Apó” – a base, Caarã – semelhante à floresta,
“Ana” – imensa, que deu “a base semelhante à floresta imensa”. Em 1943 foi
elevada à categoria de município, cuja instalação se deu a 28 de janeiro de 1944.
A partir desses elementos pretende-se aqui tratar da capoeira e
traçar um breve histórico da sua manifestação em Apucarana (PR). O estudo da
capoeira e dos grupos de capoeira, Geração Brasil e Pedagoginga, pode ser visto
como estratégia pedagógica para abordar a construção e a compreensão do
conhecimento histórico escolar garantindo melhor apropriação do conhecimento,
baseado em recortes selecionados do conteúdo, os quais serão integrados no
conjunto do conhecimento dos alunos sobre as manifestações culturais da sua
comunidade. Ao estudar a capoeira como tema no ensino de história se concretiza
um nosso objetivo mais específico: estudar as lembranças dos grupos de capoeira
existentes em Apucarana.
Embora esse tema tenha sido por nós estudado em vista das
atividades em sala de aula, nesse artigo relata-se apenas alguns resultados
encontrados na pesquisa que antecede a atividade pedagógica. Parece
fundamental esse registro já que nenhum assemelhado foi encontrado. Acredita-se
que as informações aqui apresentadas podem contribuir para o trabalho de outros
colegas professores.
As atividades aqui referidas têm como interesse a história local.
Essa não contém em si mesma, a chave de sua própria explicação, pois os
problemas culturais, políticos, econômicos e sociais de uma localidade explicam-se,
também, pela relação com outras localidades. Deve estar incluída nos estudos de
história, não exatamente na ordenação do mais próximo ao mais distante, mas de
forma de ser problematizada a cada momento do estudo. A história local tem com a
intenção de recuperar a história das sociedades e das pessoas comuns.
O trabalho com a história local pode beneficiar a inserção do aluno
na comunidade da qual faz parte, a criar sua própria historicidade e identidade. Esse
estudo pode auxiliar a geração de atitudes investigativas, desenvolvidas com base
no cotidiano do aluno, além de ajudá-lo a refletir acerca do sentido da realidade
social. O trabalho com a história local também pode ser instrumento para a
5
construção de uma história mais plural, menos homogênea, que não silencie a
multiplicidade de vozes dos diferentes sujeitos da História.
Outro conceito fundamental para esse trabalho é “multiculturalismo”.
Esse pressupõe uma contribuição para uma educação que valorize a diversidade
cultural, questionadora das diferenças, sem pretender fixar identidades.
O multiculturalismo também é um termo com diferentes significados.
A começar pelo nome, o interculturalismo, seria um termo mais apropriado, na
medida em que o prefixo “inter” daria uma visão de culturas em relação, ao passo
que o termo multiculturalismo é uma sociedade ser composta de múltiplas culturas
(CANEN, 2007, p. 92).
Para Candau (2005), no Brasil, a questão multicultural apresenta
uma configuração própria, esta autora reforça que nossa formação histórica está
marcada pela negação da alteridade.
Esses estudos se tornam referência para esse artigo que vai
destacar as lembranças de praticantes de capoeira em Apucarana (PR)
responsáveis por iniciar novas gerações no jogo.
GRUPOS DE CAPOEIRA DE APUCARANA
As informações que constituem esse relato foram obtidas por meio
de entrevistas e elaboradas a partir das lembranças dos entrevistados. Isso se fez
necessário porque, aparentemente, em Apucarana não havia prática de capoeira a
ser destacada. Os dados obtidos nas entrevistas desmentem essa idéia. Então,
aqui, em primeiro lugar, é preciso registrar os grupos de capoeira encontrados em
Apucarana.
Em 1973 teve início a capoeira em Apucarana, que era praticada
num salão de madeira no bairro Vila Nova, na Rua Aquiles, denominado de Salão de
Capoeira do Silveira cujo professor era o Gideoni Silveira. Deu aula em diferentes
locais entre eles: na antiga UEA, próximo ao SESC e no Clube XV de Novembro.
Formou-se Mestre em Curitiba.
Grupo de Praia Salvador, 1980 – 1985, criado pelo Mestre Silveira
(Gideone Silveira) que em 1980 veio de Curitiba para Apucarana e dava aulas na
ACAPRAS (Associação de Capoeira Praia de Salvador).
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Grupo Ilha da Maré, 1978-1984. O fundador, Mestre Fernando saiu
de Salvador-Bahia da Praia Ilha da Maré para Apucarana e ministrava aulas no
SESC e na Academia Ilha da Maré na rua da Rádio Cultura, onde hoje está o
Carimbo Rei. Morava sozinho triste, se sustentava como armador de ferragens e
nunca falava da família. Ele mudou-se para Maringá e morreu em 1989.
Grupo Besouro Dourado. Mestre Shut (Francisco Barbosa) veio de
Maringá em dezembro de 1985 e ministrava aulas na Casa Portugal na Rua Clotário
Portugal em frente à União dos Estudantes, próximo do SESC. Em 1985 foi para o
Lagoão Ginásio de Esportes. Em 1989 voltou para Maringá e Airton Manfrini
(popular Quati), que era seu aluno, continuou o seu trabalho.
Grupo Filhos do Valtinho da Senzala – 1986. Quem trouxe o
grupo para Apucarana foi o Contramestre Ventania. Dava aulas na Conceição,
antigo salão de dança, e no Ginásio de Esportes Lagoão, e depois, no barracão ao
fundo da sua casa à Rua Mato Grosso, no Jardim Ponta Grossa. Mestre Valtinho da
Senzala era de Santos e vinha a Apucarana apenas para os eventos.
Grupo Lendas do Abaeté – 1987. Mestre Pessoa (Manoel de
Souza Pessoa) era de Salvador e foi para São Paulo. Lá se formou pela Secretaria
de Educação de Osasco São Paulo, pelo Mestre Souza (José Carlos de Souza).
Mudou-se para Apucarana em 1987 para dar aulas no Clube Modelo, na Avenida
Minas Gerais, e ficou sobre a coordenação do Contramestre Mauro (Mauro Ângelo
Moura).
Grupo Muzenza – 1995. O fundador em Apucarana é o professor e
instrutor Quati (Airton Manfrini). Funcionou na Academia Muzenza e depois na
Academia Acka. Hoje funciona na Academia Shirói, na Avenida Pirapó, nº 100,
sendo o presidente e fundador geral do grupo, Mestre Burguês, e a supervisão de
Mestre Narizinho e Mestre Boca, de Maringá. Atualmente é coordenado pelo
Contramestre Carneiro (Carlos Cândido).
Grupo Maculelê – 2002. Professor Celsinho (Celso de Souza)
trouxe o grupo para Apucarana, e o coordena. O Presidente Majoritário do grupo é
Mestre Fran (Francisco Antonio da Silva).
Geração Brasil – 2006. O Presidente Geral do Grupo é o Mestre
Cidinho, de Londrina; quem o coordena é Cristiano Mário Machado (professor
Skada). O Mário Brandino (professor Fião) participa do grupo no Centro de
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Treinamento na Academia Fight Club, na Avenida Pirapó, nº 180. O professor Fião
também ministra aula no Ginásio de Esportes Jardim Ponta Grossa.
Projeto Pedagoginga – Capoeira Educativa – 2009. Conduzido
por Cristiano Mário Machado (Professor Skada), no Colégio Nilo Cairo, Rua Osório
Ribas de Paula, nº 970.
PRÁTICAS DA CAPOEIRA EM APUCARANA
Tradições
Joga-se a Capoeira Angola, Capoeira São Bento Pequeno, São
Bento Grande de Angola. São Bento da Regional, e depois Maculelê e Samba de
Roda. Mestre Skada conta que aprendeu a capoeira regional e que hoje se fala
muito na capoeira contemporânea de estilo atualizado. Então, hoje ele pratica a
regional do Mestre Bimba e a contemporânea.
Funções
Mestre é o presidente, o responsável pelo grupo. Ele dá o parecer se
o aluno está apto a exercer a função contramestre, professor; para fazer um evento
é preciso a sua autorização.
O Contramestre comanda a responsabilidade do grupo, passa a dar
aula para alunos quando formado professor.
Professor é responsável pelas aulas para o grupo, tem a permissão
de graduar alunos até a corda amarela e azul.
O Instrutor pode monitorar aulas e ensinar a tocar instrumentos,
executar vários estilos de capoeira e fazer palestras.
Confraternização
Após o batizado de capoeira ou para a confraternização de grupos,
todos se responsabilizavam em levar qualquer tipo de alimento ou bebida para a
festa de finalização do evento. Os capoeiristas levam bebidas, cachaças, doces do
tipo rapadura, pé de moleque, comidas como farofa e frango frito muito apimentado.
Ao final do ano, é feita uma reunião com todos os membros do grupo
para acertar e concluir quais os eventos que serão realizados no próximo ano.
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Samba de roda
Em dia de evento, ou na rotina da academia, acabada a roda de
capoeira se faz o samba de roda, mistura de samba com frevo usados em roda de
capoeira. Toca-se o berimbau, o pandeiro e o atabaque. Mas pode-se usar todos os
instrumentos da capoeira: pandeiro, berimbau gunga, médio e viola, atabaque, reco-
reco, agogô e caxixi. Também é usual em apresentações de samba de roda usar um
guarda-chuva do frevo para se defender, caso tenha um inimigo próximo.
Antigamente era usado para se defender da polícia.
Na roda entra um capoeirista e convida outro para entrar junto com
ele, e após esse par dá continuidade, entrando várias pessoas, individualmente ou
em pares. Quem está na roda pode ser substituído pela compra. Entra alguém que
queria dançar com o homem que já está dançando na roda. Esta pessoa dá um sinal
para que abandone seu par. Quando a compra é feita por um homem, ele simula
uma cabeçada como sinal que está entrando na roda e o atingido deve sair. Assim
os pares vão se alterando e no final entram todos os participantes sambando junto.
Ritual de Maculelê (Facão)
Maculelê era um guerreiro que pertencia a uma tribo indígena. Ele
não saía para buscar seu alimento com os outros guerreiros, não gostava de caçar e
nem pescar, e dependia dos outros guerreiros para o seu sustento. Certo dia todos
os guerreiros saíram para buscar alimentos na selva ficando o Maculelê na tribo
junto com as mulheres e crianças. Foi então que a tribo foi atacada por inimigos.
Maculelê com o facão em punho foi o único guerreiro que matou e morreu
defendendo a própria tribo.
Quando os guerreiros de tribo retornaram e viram aquela situação,
resolveram homenageá-lo com a dança do facão, que hoje é tradicional, sendo
chamada de dança de Maculelê. É realizada em todo final de batizado de capoeira
em homenagem ao guerreiro (Maculelê).
Para fazer a marcação do ritmo da música, das batidas dos
instrumentos, são usados somente atabaque e bastão de madeira para cantar a
música de Maculelê.
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Refrão:
Sou eu Sou eu Sou eu
Maculelê sou eu E canta qualquer música que seja de Maculelê.
E nós viemos de Aruanda E o sangue real de Maculelê
(Mauro Ângelo Moura)
Ritual de Batizado de Criança
O mestre manda um convite para outro mestre. Se ele aceitar ser o
padrinho de seu neto na roda de capoeira começa então a ser realizado o ritual. São
convidados outros mestres de diferentes grupos para que prestigiem o ritual. Na
roda só entra o mestre que vai ser o padrinho e o avô, que também é mestre.
Ritual da roda:
1º todos os mestres convidados.
2º A roda é formada e em volta dela são colocadas várias velas
acessas. Não pode haver claridade natural. A claridade pode ser providenciada com
tochas de fogo lateral e no chão.
3º A criança recém-nascida é colocada deitada em um lençol branco
na roda, nuazinha. Aí começa o jogo, somente com os berimbaus e os dois mestres
(o avô e o padrinho). O jogo é realizado dentro da roda com a criança, não podendo
tocar na criança, as velas não podem ser derrubadas e nem apagadas, e o jogo é
finalizado após serem cantadas (somente) ladainhas de Angola.
Os dois mestres quando estão preparados para entrar na roda ficam
ajoelhados de costas para a criança e de frente para o berimbau, o avô canta um
ladainha agradecendo ao outro mestre que é padrinho por ter aceitado o convite. O
outro mestre responde também em agradecimento por ser o padrinho da criança. Às
vezes o pai leva o próprio filho para o ritual. É muito difícil ganhar um convite
desses.
Os outros mestres ficam um passo distante da roda ao final do ritual,
os dois mestres se cumprimentam e todos os outros batem palma pela beleza e pela
purificação do ritual, depois vão beber um gole de cachaça (aguardente) e quem não
bebe toma água.
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Ritual da Pesca
Os pescadores, após terem lançado as redes em alto mar, ficam em
fila cantando as ladainhas na marcação do som, todos puxam as cordas da rede ao
final ao mesmo tempo. Após o recolhimento é formada uma roda de capoeira em
agradecimento pela boa pescaria.
Rituais Yuna
Ao trocar de graduação é tocado o toque Yuna, os alunos dão volta
“ao mundo” com a corda segurada com as duas mãos. Na segunda volta, ao
berimbau, gunga apresenta a sua graduação ao mestre que está com o berimbau
gunga. Ao sair do lado coloca sua graduação para começar o batizado, ao levar uma
queda ao chão do mestre, aí ele passa ser um capoeirista de verdade.
Gestos
Na roda de capoeira muitos para enganar seus oponentes,
demonstram que estão embriagados trançando as pernas de bêbados procurando
melhor momento para (acertar) finalizar o oponente.
Gestos - volta ao mundo
Quando o capoeirista está jogando e se sentiu cansado, outro
capoeirista compra o jogo e o aluno dá a volta ao mundo e volta ao pé do berimbau.
Depois, quando os dois voltam a jogar, o jogo fica violento. O mestre do berimbau
gunga que comanda a roda, abaixa o berimbau e manda que parem com a luta. Ao
comprar o jogo de capoeira não se pode sair ao lado da roda, deve-se lutar ao pé do
berimbau.
Alguns capoeiristas costumam se benzer ao pé do berimbau para ter
um jogo sem maldade e para os dois participantes não se machucarem.
Gesto do Macaco
Muitos usam imitar os gestos do macaco, ficando a pessoa
agachada se movimentando de um lado para outro, quando o oponente se distraía
recebia golpes com a perna e joelhadas.
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O canto e a dança
O canto faz parte da capoeira. Nas aulas de capoeira são
apresentados os instrumentos e as músicas. No passado isso era feito “ao vivo”:
enquanto um tocava, outro cantava, outros ensinavam. Atualmente está bem mais
fácil, são usados vários recursos: memória de celular, cartão de memória, CD,
internet, todos os recursos multimídia, e se aprende tudo junto, canto, instrumento e
dança.
Os novatos pensam que a dança é o disfarce da luta, aprendem a
esquiva desde a primeira aula, aprendem a ginga, aplicam os golpes da luta,
dançam tudo isso com fundo musical. Tem sempre um CD, sempre alguém tocando
instrumento e os alunos aprendem o canto e a dança observando os mais
experientes. Aquele que sabe ensina os outros. Quem não sabe é humilde para
aprender. “O canto se aprende no dia a dia, nos treinos nas rodas de capoeira com
seu professor. A ginga se aprende treinando porque é a base da capoeira”. (Mestre
Pessoa).
Aprender a cantar se inicia com a participação no coro, ouvindo os
outros capoeiristas cantando e respondendo com o coro. Cada jogo tem seu ritmo
de música diferente, a dança e a ginga é o primeiro passo do aprendizado, começa-
se com os movimentos, mas esses vêm com as músicas. Vejamos um exemplo:
Primeiramente o solista convoca:
Ladainha E maior é Deus O que eu tenho Foi Deus que me Deu O que eu tenho Foi Deus que me Deu Na roda de capoeira Grande e pequeno sou eu.
(Mestre Pastinha, 2011).
Depois, os dois capoeiristas, todos de cabeça baixa em respeito à
ladainha, se benzem só tocando com a mão no berimbau ou atabaque. Se benzem,
se cumprimentam e entram na roda.
Cada um tem seu jeito próprio, é sagrado. O restante do grupo
depois acompanha o instrumento, inicia o toque, Angola, Benguela ou regional. Isso
não muda: quando acaba o jogo se cumprimentam e saem da roda.
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Novamente entram dois oponentes, um cumprimenta outro. Se
forem dois mestres, o restante bate palma em respeito à apresentação do seu jogo e
por admiração aos mestres.
Instrumentos
Os instrumentos usados são de origem africana (o atabaque, o
berimbau, junto com o caxixi, o agogô, reco-reco) e o pandeiro tem origem árabe, os
tambores eram usados por qualquer tribo indígena. “Os instrumentos que uso são de
origem africana, mas de alguns deles não se sabe ao certo suas origens, por
exemplo o berimbau de boca e o berimbau de barriga”. (Mestre Pessoa).
Os entrevistados se referem ao berimbau gunga, médio e viola. O
berimbau, cujas origens são lendárias e remontam a quatro mil anos A.C.,
possivelmente do Egito ou da Índia, pode assumir três formas: berimbau Berra-Boi
(tom grave e forte); berimbau Gunga ou Médio (tom médio); berimbau Viola ou
Violinha (tom agudo).
Além dos instrumentos musicais, uma aula de capoeira hoje precisa
de vários recursos materiais, como saco de pancada, colchonete, tatame.
Conclusão
Para concluir esse breve relato sobre a capoeira em Apucarana (PR)
é preciso registrar a avaliação que os capoeiristas da cidade fazem do momento
presente: os grupos estão crescendo, estão organizando campeonatos, fazendo
novas alianças com os grupos de Maringá, de Londrina, campeonatos dentro do
grupo ou com participantes de outros grupos. As rodas de capoeira são abertas ao
público, são realizadas pelo grupo na Praça Rui Barbosa, no Platô da Praça da
Catedral e na frente da Catedral, entre outros lugares.
Os grupos contribuíram para a vida cultural de Apucarana com
palestras e apresentações de Capoeira no SESC, nas escolas municipais e no
Centro de Educação Básica para Jovens e Adultos - CEBJA. No dia da Consciência
Negra o Grupo Maculelê faz a apresentação juntamente com o Grupo MACONE
(Movimento Apucaranense da Consciência Negra) no Salão da Igreja Cristo Profeta
e debate sobre a importância da cultura afro descendente.
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Os capoeiristas sonham poder levar a capoeira para as escolas e
inseri-la nos currículos educacionais.
A capoeira tem história na cidade e está muito viva!
O estudo aqui apresentado buscou uma análise de capoeira
enquanto uma manifestação cultural, considerando a necessidade de um
aprofundamento nessa temática para uma atuação mais eficaz junto ao aluno do
Ensino Fundamental. Esse objetivo foi delimitado pelas lembranças de praticantes
de capoeira em Apucarana (PR).
Nem todas as informações coletadas em entrevistas foram aqui
apresentadas. Esse breve relato constituiu parte da base informacional para as
aulas de História.
Acredita–se que a aprendizagem mais significativa se viabiliza por
meio de um trabalho pedagógico mais articulado através do qual, os alunos sejam
capazes de compreender o processo de desenvolvimento sócio–cultural da
localidade através da apropriação das relações entre capoeira de diferentes épocas,
lugares e da capoeira geral.
O estudo da Capoeira e de seus grupos em Apucarana pode ser
visto como estratégia pedagógica para abordar a construção e a compreensão do
conhecimento, baseado em recortes selecionados do conteúdo, dos quais serão
integrados no conjunto de conhecimento. O trabalho realizado tomou como
referencia as idéias prévias dos alunos (segundo o exemplo de Silva e Alegro (2010)
não apenas sobre a capoeira, mas também sobre os aspectos da cultura afro-
brasileira. Estudar em sala de aula as entrevistas coletadas com mestres e
praticantes de capoeira no município de Apucarana foi muito positivo!
Referências
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AREIAS, Anande das. O que é capoeira. 4. ed. São Paulo: Tribo, 1983b.
BARBIERI, Cesar. Um jeito brasileiro de aprende a ser. Brasília: Centro de informação e Documentação sobre a Capoeira – CIDOCA, 1993.
BRASIL. Lei 10.639 de 9 de janeiro de 2003. Dispõe sobre a inserção de História e Cultura Afro-Brasileira nos Currículos Escolares. Brasília, 2003. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2003/L10.639.htm>. Acesso em: 22 mar. 2011.
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CANDAU, Vera Maria. Sociedade multicultural educação: tensões e desafios. In: ______ (Org.). Cultura e educação: entre o crítico e o pós-critico. Rio de Janeiro: DP&A, 2005.
CANEN, Ana. O multiculturalismo e seus dilemas implicações na educação: Comunicação e Política, Rio de Janeiro, v. 25, n. 2, p. 91-107, 2007.
CAPOEIRA, Nestor. Capoeira: pequeno manual do jogador. 7. ed. Rio de Janeiro: Record, 2002.
CÂMARA CASCUDO, Luís. Folclore do Brasil. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1967. Pesquisas e Notas
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PARANÁ. Departamento de Ensino Fundamental. Cadernos Temáticos de História e Cultura afro-brasileira e africana; educando para as relações étnicas raciais. Curitiba. SEED, 2006.
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