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Observatório de Segurança Pública
Universidade Estadual Paulista – Unesp. Campus de Marília.
Segurança Pública e Participação Social.
Experiências locais de segurança e qualidade de vida.
Pesquisa de vitimização, 2010-2011
Equipe de trabalho
Luís Antônio Francisco de Souza
Thiago Teixeira Sabatine
Bóris Ribeiro de Magalhães
Thaíse Marchiori
Isabela Venturoza de Oliveira
César Grusdat de Assis
Maíra Torelli Ferraz
Glauce Oliveira Ferreira
Thaís Barbosa Passos
Camila Fontes Savassa
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Introdução
As agências de aplicação da lei têm demonstrado dificuldades para assegurar a
proteção dos cidadãos contra o crescimento dos crimes considerados violentos por três
razões básicas: 1) O poder público não atribui a devida importância aos conflitos
interpessoais; no máximo merecem atenção esporádica, desproporcional, descontínua e
ineficaz das agências de segurança; 2) O poder público entende os conflitos locais como
pertencentes ao âmbito privado, relegando-os às iniciativas assistenciais ou aos poderes
diferenciais existentes na comunidade; 3) Os conflitos existentes na comunidade não foram
incorporados pelas políticas públicas voltadas para a educação, saúde, habitação e trabalho.
Neste vácuo se dá o aumento da demanda por políticas penais de caráter punitivo, a
aceitação da violência policial contra eventuais criminosos e a descrença da população na
capacidade do poder público de garantir seus direitos mais básicos.
Além disso, o crescimento das taxas de criminalidade cria ambiente favorável à
proliferação de toda a sorte de crimes, desde as incivilidades e a depredações de patrimônio
público até as ameaças e o homicídio. O crime organizado vinculado em geral ao comércio
de drogas é um componente complicador deste processo. O problema se agrava na medida
em que a comunidade é dominada pelos traficantes ou por milícias armadas. As frustrações
decorrentes de um acesso precário aos direitos afetam a concepção popular de justiça. A
comunidade, diante disso, define de maneira contraditória quem merece e quem não merece
ser respeitado, o que interfere na sua percepção sobre o valor dos direitos humanos, da
cidadania e da avaliação do que é justo e igualitário. As pesquisas antropológicas têm
reconhecido a importância do ethos da honra masculina como componente da violência.
Nas comunidades, os valores sociais ganham um sentido específico, que deve ser
compreendido e levando em consideração na elaboração e priorização de políticas públicas
locais.
Estamos diante de três fenômenos interligados:
A) a emergência de um novo tipo de cidade, baseado nos chamados enclaves
fortificados; a cidade cada vez mais se fragmenta em unidades que conclamam sua
3
independência, autonomia, segregando e isolando as pessoas e os grupos (Caldeira, 2000:
12).
B) no caso dos bairros populares, esse microcosmo é comumente caracterizado
como um estado dentro de outro, cujas regras e os mecanismos de controle mútuo seriam
ditados pelos criminosos, fortalecidos mediante a penetração nas comunidades do crime
organizado. Mas não há espaço para ilusões, no discurso dos moradores, há uma forte
oscilação das opiniões quando se trata de fazer distinções entre os membros da
comunidade, os trabalhadores ou gente de bem, e os criminosos e entre aqueles criminosos
que “protegem” a comunidade e aqueles que a prejudicam. Certamente, a penetração das
drogas pesadas e das armas nas comunidades foi responsável por esse efeito.
“Nas favelas, na periferia dos grandes centros urbanos e nos conjuntos habitacionais
multiplicaram-se quadrilhas, compostas predominantemente por jovens, que
passaram a exercer, em muitos casos, um controle efetivo sobre essas áreas da
cidade. Através do tráfico passaram a ter acesso a armas de todos os tipos, com as
quais exercem seu poder e travam verdadeiras guerras com seus competidores.
Dentro desse quadro os valores tradicionais em que, por exemplo, as gerações mais
velhas ocupavam uma posição de prestígio vão por água abaixo. Diferentes tipos de
vida associativa, previamente existentes, são colocados em cheque pela ascensão
dos traficantes e seus séqüitos” (Velho, 1996: 18).
A presença do crime organizado desestrutura as relações sociais tradicionalmente
baseadas na confiança mútua e na solidariedade (Montes, 1996: 230-231).
C) Ocorre também a chamada interiorização da criminalidade. Sociedades
acostumadas com altos índices de criminalidade (e isto não é mais exclusividade das
grandes capitais) passam a desvalorizar os espaços compartilhados, os indivíduos passam a
ter mais interesse em proteger seus bens pessoais do que se preocuparem com a cidade e
com o espaço público. A criminalidade é um fenômeno complexo que na maior parte das
vezes legitima a violência social e a descrença na capacidade do poder pública para resolver
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os problemas dos cidadãos. Assim, paralelamente ao crime, várias formas de violência e de
ilegalidades tornam-se naturalizadas e aceitas pela comunidade.
Alba Zaluar reflete sobre o que ocorreu após a ocupação da Cidade de Deus:
“Não menos importante é o relativo fracasso dos planejadores que deixaram sua
marca impressa na linguagem dos conjuntos: as ruas largas e retas, por onde passam
com facilidade os veículos militares, as casas alinhadas e absolutamente iguais por
várias ruas, a praça de esportes como o lugar certo do esporte adulto, os play-
grounds com os imponentes brinquedos de cimento armado para o divertimento
infantil. Uma mensagem da disciplina, feita para encontrar e cultivar, nos
trabalhadores pobres, a alma de cordeiros domesticados e amantes da ordem. Hoje,
reina a polifonia dos desejos e gostos populares. Raras são as casas que não foram
modificadas nas cores e nas formas acrescidas em todas as direções. É difícil
encontrar duas iguais, maneira de nos lembrar mais uma vez que as classes são
compostas de indivíduos. Os „prei-graum‟ não existem mais. Os balanços,
escorregas e gangorras de cimento armado foram pacientemente destruídos a golpes
de marretas e que mais instrumentos pudessem encontrar, sem que os planejadores
fossem consultados. Em seu lugar, nas praças espalhadas pelos conjuntos, surgiram
quadras de samba e campos de futebol de salão, sempre ocupados por dedicados
jovens futebolistas, ou por crianças praticando suas brincadeiras prediletas: soltar
pipa, jogar capoeira ou queimado e brincar de „bandido e bandido‟ ou „bandido e
polícia‟ com revólver de pau. (Não tem mocinho nesta estória) As casas destinadas
a atividades comerciais foram ocupadas por sedes dos blocos de carnaval e as ruas
usadas para um comércio ilícito, mas muito próspero. Os postes de luz, como em
toda a cidade, exibem os resultados do bicho, jogo feito à luz do dia em
barraquinhas de madeira, com uma rapidez e eficiência de fazer inveja às modernas
empresas do país, bem perto da praça principal do conjunto.” (Zaluar, 1985: 83).
Assim, o valor supremo parece ser a “união” e a desunião é considerada uma
conseqüência do individualismo, do enriquecimento, do envolvimento com a política etc,
5
daí a inveja. A rixa e a jura de morte são outros fatores perturbadores da moral comunitária,
pois suprimem qualquer possibilidade de recomposição da reciprocidade.
A presença dos jovens é significativa nas comunidades, mas não reflete na maior
participação em assuntos locais. Para atrair jovens, algumas associações buscam incorporar
novas linguagens e interesses a suas lutas. Por exemplo, os adolescentes são considerados
ótimos educadores quando se trata de questão ambiental. Nota-se também uma tendência
do aumento de grupos juvenis culturais (rap, pagode, dança, teatro) revitalizando o espaço
das associações (Ibase, 2000: 25).
A hierarquia que está presente em todas as relações comunitárias é minimizada ou
diluída quando os valores compartilhados ganham destaque. De qualquer forma, levando-se
em consideração a persistência de espaços de incivilidade, dentro e fora das comunidades
periféricas, caracteriza a sociedade brasileira como uma democracia sem cidadania, ou uma
democracia disjuntiva (Caldeira, 2000).
A Pesquisa de Vitimização
A pesquisa de vitimização foi planejada a partir do referencial da ICVS
(International Crime Victimization Survey), considerando uma população estimada em
19.390 habitantes, 20,63% do total como sendo abaixo de 15 anos. A pesquisa realizou uma
amostra proporcional estratificada de conglomerados, por seleção aleatória de setores
censitários do IBGE e de domicílios, com intervalo de confiança de 95%. A pesquisa
fechou a estratificação por idade e sexo. Coletou 84 questionários válidos para população
do município (Dentro da margem estatística de 65 a 95). A coleta de dados ocorreu entre os
dias 26 e 29 de julho de 2010.
O município em questão tem uma população majoritariamente urbana, sendo que
18.340 vivem na cidade (94,58%) e 1.050 na área rural (5,42%), 9.549 (49,50%) são
homens e 9.841 (50,50%) mulheres. 15.300 moradores têm idade acima de 15 anos, destes
1.438 estão na faixa de 15 a 19 anos, 1.695 entre 20 e 24, 1.891 entre 25 e 29, 1.780 entre
30 e 34, 1.400 entre 35 e 39, 1.325 entre 40 e 44, 1.304 entre 45 e 49, 1.168 entre 50 e 54,
935 entre 55 e 59. 2.450 têm mais de 60 anos.
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Distribuição da População por Faixa Etária (IBGE)
Faixa Etária População %
Menos de 15 anos 4.004 21,00
15-19 anos 1.438 7,41
20 a 24 anos 1.695 8,74
25 a 29 anos 1.891 9,75
30 a 34 anos 1.780 9,17
35 e 29 anos 1.400 7,22
40 a 44 anos 1.325 6,83
45 a 49 anos 1.304 6,75
50 a 54 anos 1.168 6,02
55 a 59 anos 935 4,82
Mais de 60 anos 2.450 12,64
Total 19.390 100
Distribuição da População na Amostra
Faixa Etária Segmento da
População
Percentual na
amostra
Percentual na
população geral
Desvio
Padrão
Abaixo de 15 anos 4.004 -- 21,00 --
16 a 29 anos 3.586 33,00 18,49 (-) 1,7
30 a 44 anos 4.505 29,00 23,23 (-) 1,3
45 a 59 anos 3.407 22,00 17,57 (-) 1,29
Acima de 60 anos 2.450 16,00 12,63 (-) 1,33
Total Geral 19.390 100 100
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A seleção dos setores censitários obedeceu a uma distribuição intencional. Tendo
em vista a coleta de dados em 7 setores censitários - um central e comercial, um
predominantemente de classe média e alta mais central e outro mais periférico, dois setores
mais populares (mais central e outro periférico, e de estabelecimento recente). Todavia,
alguns estabelecimentos habitacionais recentes não encontram segmentos de dados no
IBGE. Setores abaixo de 1000 habitantes receberam uma cota de 10 questionários. Setores
com população acima de 1000 habitantes receberam uma cota de 11 questionários.
Fonte: IBGE e Ministério da Saúde.
Escolaridade, renda, tipo de domicílio e tipo de família são bem conhecidas a partir
da PNAD 2007 e da recontagem populacional de 2006. Serão entrevistadas 75 pessoas
residentes no município. O questionário terá perguntas agrupadas segundo os seguintes
critérios: a) caracterização sócio-econômica do respondente; b) caracterização do bairro e
do domicílio; c) problemas que afetam a qualidade de vida; d) problemas que afetam a
segurança; e) os conflitos que prevalecem; f) crimes ocorridos; g) o que provoca mais
insegurança; h) quais melhorias devem ocorrer na justiça criminal; i) quais são as
expectativas em relação à ação da polícia; j) quais são as práticas locais, públicas ou
privadas, de resolução de conflitos; k) quais atividades ou serviços são necessários na
comunidade para minimizar os problemas; l) quais espaços são necessários dentro da
comunidade.
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Workshops
Em 27 de março de 2010 foi realizado o primeiro workshop no município para
levantamento dos problemas percebidos como sendo prioritários na cidade. O wokshop foi
organizado pelo Conseg local e contou com a participação e apoio de empresas.
Após uma explanação geral sobre o propósito daquela reunião, uma explicação
sobre a importância do engajamento da comunidade local nas reuniões e sobre a parceria
entre o OSP e o Conseg, os presentes foram distribuídos em mesas e nestas, foram
debatidos os problemas e soluções para os mesmos. Após a discussão em grupos, passou-se
para a discussão mais ampla com a exposição dos resultados em quadro geral e votação
para a definição das prioridades. Ao final das votações, ocorreu um breve debate no sentido
de fazer com que os resultados fossem reconhecidos como expressão da vontade da
maioria.
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Prioridades dos problemas (Votação)
Sequências Problemas Votos (múltiplos)
01 Drogas 21
02 Efetivo Policial 18
03 Família Desestruturada 16
04 Falta de Civilidade 15
05 Prostituição (Infantil) 14
06 Desemprego 13
07 Engajamento da sociedade 09
08 Bullying 08
09 Integração das instituições 08
10 Menores infratores 08
12 Violência no trânsito 08
13 Áreas socialmente problemáticas 07
14 Evasão escolar 01
Soluções apontadas para os problemas
Projeto educacional (integrando aluno e família)
Fortalecimento do CRAS;
Participação da sociedade civil.
Levantamento da real situação de segurança da cidade.
Criação de uma Central de Inteligência;
Equipe multidisciplinar preparada para assistir as famílias.
Em 30 de outubro de 2010, foi realizada outra reunião do Conseg com o objetivo de
apresentar os resultados preliminares da análise da pesquisa de vitimização. Após a
apresentação dos slides da pesquisa, a mesma metodologia foi adotada para a discussão em
grupos e definição dos problemas e das estratégias de enfrentamento.
Mesa 1
Problemas:
1. Consumo, tráfico e disseminação das drogas (10 votos);
2. Ausência e/ou crise de valores (03 votos);
3. Desestruturação familiar (11 votos);
10
4. Falta de civilidade (03 votos);
5. Falta de Deus ou crise de valores religiosos (06 votos);
6. Sociedade individualista e consumista (05 votos)
Soluções:
1. Projetos de prevenção em educação (04 votos);
2. Criar ambientes sociais “sadios” (02 votos);
3. Gestão eficiente de educação, saúde e segurança (11 votos);
4. Campanha de civilidade e valores (21 votos).
Mesa 2
Problemas:
1. Consumo, tráfico e disseminação das drogas (06 votos);
2. Crise de valores (09 votos).
Soluções:
1. Projetos que reconstruam valores, práticas sociais, cidadania e cultura de paz,
sobretudo entre gerações (11 votos);
2. Projeto de profissionalização visando os jovens e as jovens mães, bem como
geração de renda e formação de lideranças que atuem na comunidade (10 votos);
3. Projetos que envolvam conhecimento histórico das transformações da cidade para
planejamento político e comparação entre comunidades para atuar frente ao
problema que afetam mais cidades e comunidades (10 votos);
Mesa 3.
Problemas:
1. Falta de participação social (10 votos);
2. Falta de efetivo policial (10 votos);
3. Consumo de drogas (5 votos).
Soluções:
1. Campanhas de mobilização da comunidade (10 votos)
2. Mobilização política (07 votos)
3. Políticas de prevenção e tratamento junto às escolas e população, por meio de
equipes especializadas em psicologia e assistência social (09 votos).
Síntese
Problemas
1. Consumo, tráfico e disseminação das drogas (21 votos)
2. Ausência de valores (12)
3. Desestrutura familiar (11)
4. Falta de participação social (10)
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5. Efetivo policial (10)
6. Falta de Deus (06)
7. Sociedade individualista (05)
8. Falta de civilidade (03)
Soluções
1. Campanhas educativas de caráter preventivo (34 votos)
2. Reconstrução de valores por meio de ações com jovens (11 votos)
3. Gestão eficiente de educação, saúde e segurança (11 votos);
4. Mobilização e participação social (10 votos)
5. Conhecimento histórico, articulação local (10 votos)
6. Políticas de prevenção e tratamento junto às escolas e população, por meio de
equipes especializadas em psicologia e assistência social (09 votos).
7. Ação política (07 votos)
Workshop – OSP e Conseg
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Workshop – OSP e Conseg
Plano Municipal de Segurança
Os Planos Municipais de Segurança Pública têm como objetivo principal a
resolução concreta dos problemas de segurança na localidade. Para isso, os planos devem
emergir de uma ampla mobilização do conjunto dos atores locais ligados à prevenção,
repressão e tratamento social (diretores de escolas, serviço de polícia, responsáveis pelos
serviços sociais, pela administração penitenciária e pela administração da justiça, e os
representantes comunitários, incluindo organizações não-governamentais), dentro de uma
lógica de parceria entre estes diferentes atores. A idéia é fazer com que as diferentes
intervenções setoriais do poder público ganhem consistência e sejam articuladas a partir de
uma perspectiva local e integradora. Ou seja, os planos atuam na prevenção social e
situacional do crime e das incivilidades e funcionam como instrumento de identificação de
problemas no funcionamento das instituições voltadas para a segurança pública.
Os planos colocam as comunidades, mesmo sendo uma comunidade desprovida de
recursos e dos serviços tradicionalmente oferecidos pelo poder público, em condições de
definir o serviço a ser prestado e sua qualidade. Segundo os planos de segurança analisados
pelas pesquisas do Observatório de Segurança Pública, uma política local de segurança
envolve: 1) políticas locais de prevenção e de segurança; 2) as demandas populares de
segurança; 3) estratégias de educação e cidadania; 4) parcerias; 5) polícia comunitária ou
modulada por problemas; 6) acesso à justiça; 7) política específica de emprego para jovens;
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8) política de minimização das inseguranças e das incivilidades. É necessário definir as
áreas a ser abrangidas pelo projeto. De uma forma geral, a definição deve levar em conta os
jovens enquanto grupo social mais vulnerável às drogas e à violência e aqueles bairros que
carecem de políticas específicas para essa faixa da população.
As atividades necessárias para a realização das etapas de elaboração de um plano de
segurança devem ser seguidas, conforme a seguinte ordem:
1. Identificação das políticas públicas em curso na cidade, sobretudo voltadas para os
jovens;
2. Definição dos principais problemas da comunidade, por meio de um work-shop com
gate-keepers. Este trabalho foi realizado em parte na primeira reunião organizada
pelo Conseg, em 27 de março de 2010;
3. Identificação dos parceiros do projeto. Os parceiros devem esclarecer seus papéis e
responsabilidades;
4. Levantamento das informações sócio-demográficas; histórico da urbanização; perfil
da administração pública; estatísticas dos crimes, acidentes e das incivilidades;
5. Definição dos grupos focais. Os dados quantitativos e a pesquisa de vitimização
devem ser complementados com informações qualitativas. Identificar as lideranças
da comunidade e realizar reuniões com pelo menos quatro grupos de representantes
locais e da administração pública, para confirmar o diagnóstico e definir
prioridades;
6. Elaboração do Plano Municipal de Segurança: definição das atividades, das metas e
das responsabilidades, dos ganhos, e da adesão de todos ao processo. Definição de
instrumentos de implantação e de acompanhamento;
7. Banco de dados com todas as informações coletadas: dados demográficos,
econômicos, sociais, políticos e administrativos, crimes, violências, acidentes, áreas
vulneráveis, boas práticas etc... Sugestão que o Conseg manifeste interesse em que
estas informações estejam acessíveis a um maior número de interessados,
participantes do Plano de Segurança na forma de dados geo-referenciados com
acesso via internet (verificar disponibilidade de assessoria local em informática para
tal fim e discussão dos custos deste empreendimento que não integram o presente
projeto);
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8. Avaliação e feed-back
9. Relatório circunstanciado.
Exemplos de ações e projetos relativos à segurança no âmbito local
1. Orçamento participativo: as cidades com planos municipais de segurança pública
costumam praticar orçamento participativo, que possibilita uma gestão participativa
de prioridades do orçamento municipal, entre as cidades que possuem estão:
Diadema, São Carlos, São Leopoldo (RS), Jundiaí, Araxá (MG), Barra Mansa (RJ)
e outros.
2. Iluminação pública: o melhoramento da iluminação pública possibilita aumento da
sensação de segurança, eliminado pontos escuros que trazem insegurança;
3. Recuperação dos espaços públicos e revitalização dos bairros: Além da
recuperação urbana, são propostas ações integradas de habitação, saneamento, infra-
estrutura, trabalho social, cursos profissionalizantes e geração de trabalho e renda;
4. Jovens: os mapeamentos da criminalidade apontam os jovens como populações
vulneráveis socialmente, sendo agentes e vítimas;
• Projeto adolescente Aprendiz (Diadema): Vinculado à Secretaria de Educação e
destinado a jovens entre 14 e 15 anos, das áreas de maior vulnerabilidade social do
município, o projeto oferece ações educativas complementares à escola. Os jovens
recebem também uma bolsa-aprendizagem de R$ 65,00 mensais, desde que estejam
freqüentando a escola ou volte a estudar. Desde a sua criação, em 2001, o
Adolescente Aprendiz contabilizou mais de 12 mil atendimentos.
• Núcleo de Atendimento Integrado (Centro de Acolhimento para adolescentes
autores de ato infracional) São Carlos: São diretrizes da política de atendimento:
Integração operacional de órgãos do Judiciário, Ministério Público, Defensoria,
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Segurança Pública e Assistência Social, preferencialmente em um mesmo local,
para efeito de agilização do atendimento inicial ao adolescente a quem se atribua
autoria de ato infracional. A integração destes órgãos viabiliza o cumprimento aos
artigos 171 a 190 do ECA no que se refere à apuração de ato infracional atribuído
ao adolescente, enquanto oferece acomodações e atendimentos básicos do momento
da apreensão até o cumprimento das medidas de internação provisória e de meio
aberto.
• Programa de Integração Sócio-Econômica para jovens em conflito com a lei
(Barra Mansa-RJ): Proporcionar aos jovens de 15 a 24 anos, de ambos os sexos, que
possuem ocorrências policiais, uma alternativa ao crime através de ações integradas
que busquem a reinserção social dos jovens. O Programa é direcionado
principalmente a dois grupos de jovens: aqueles que cometem uma primeira
ocorrência de menor potencial ofensivo e aqueles que egressam do sistema prisional
após haver cumprido a medida sócio-educativa.
5. Conselhos de Segurança Pública: fortalecer os Conselhos de Segurança Pública
através da participação do poder público municipal, realizando uma articulação
entre os diversos órgãos locais.
6. Escolas: as escolas vêm sendo espaços de diversas violências e merecem atenção.
• Escola Sem Medo (São Leopoldo-RS): o plano municipal abrange: capacitar
profissionais da educação e da área social para intervir em problemas referentes ao
uso indevido de drogas e circulação de armas de fogo, qualificar a comunidade por
intermédio da escola para servir de mediadora na problemática da violência,
promover a escola para que seja um local de convivência e de discussão de forma
prazerosa através de oficinas, capacitar os profissionais de ensino por meio de
oficinas de artes, de jogos e trabalhos de conscientização junto aos alunos, pais,
professores e comunidade, oferecer atividades alternativas aos jovens,
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aconselhamento psicológico e capacitação profissional com o intuito de afastar os
adolescentes da participação em gangues e “torcidas organizadas”,
• Guarda Municipal provendo segurança à prestação de serviços de educação.
• Escola de Todos (Diadema): é um programa da Secretaria de Educação que
promove ações de cultura, esporte e lazer junto à comunidade por meio da rede
municipal de ensino.
7. Sistema de Informações Criminais: para organizar e unificar as informações
criminais.
• Programas (Barra Mansa-RJ): SP/Normatizer: Normatização dos dados do
município e configurações gerais, SP/sgGM: Registro de ocorrências da Guarda
Municipal, SP/CCO: Central de Chamados e Operação, SP/Integrator: Extrator e
manipulador de dados, SP/DW: Repositório Integrado de Dados (Data Warehouse),
SP/Decision: Apoio à decisão, SP/Alert: Alertas inteligentes, SP/GPA: Geo-
Processamento Ativo, SP/Portal: Portal de informações da comunidade de
segurança pública, P/Perfil: Normatização de Perfil Individual, P/FGr: Ficha Geral
de Indivíduo.
8. Mediação de conflitos: Resolver conflitos através do diálogo, promover o acesso a
direitos fundamentais, criar redes de cooperação entre moradores de comunidades
violentas. Algumas cidades e estados aderiram esse projeto como Diadema, Santo
André, a Secretaria de Estado e Defesa Social de Minas Gerais (SEDS) que desde a
sua implantação em 2005, até o mês de agosto de 2008, o Programa Mediação de
Conflitos já realizou 48.635 atendimentos, nos 35 núcleos espalhados pelo estado.
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Considerações Finais
A presente pesquisa buscou lançar as bases de alternativas comunitárias de
segurança para os moradores do município. Os resultados podem incentivar estratégias para
que o poder público, a sociedade civil e a população possam fazer frente à violência, à
insegurança e aos problemas dos serviços públicos. Embora projetos deste teor tenham
como referência municípios com altos índices de crimes e de insegurança, a presente
pesquisa pretende incentivar a cultura da prevenção ao crime e à violência. A idéia,
portanto, é dar consistência local às diferentes intervenções setoriais do poder público, que,
tradicionalmente, foram desarticuladas da realidade social e das necessidades da população.
A segurança pública é considerada como um fenômeno complexo, enraizado em
processos culturais locais. Ela, portanto, deve decorrer de um conjunto de práticas
comunitárias e de iniciativas que compreendem um sem-número de experiências bem-
sucedidas, em diferentes áreas de atuação das entidades públicas e privadas. Trata-se de um
experimento de produção coletiva de um ambiente social seguro.
Neste sentido que a pesquisa direcionou o olhar para as práticas, experiências e
significados conferidos pelas pessoas em suas vivencias pela cidade. Estas vivências estão
intimamente ligadas às questões de segurança pública. As diversas formas de sociabilidade
desenvolvidas são indicativas das redes de confiança e de solidariedade que permitem um
maior grau de controle das comunidades no que diz respeito à experiência de vida, como
são indicativos de formas de distanciamento entre as pessoas e esvaziamento das
concepções de solidariedade no cotidiano marcado pelo empobrecimento do tecido
relacional e afetivo entre os indivíduos.
As possibilidades de experimentação dos espaços com os outros permitem a
sobreposição das iniciativas individuais de proteção e responsabilização compartilhada para
as questões que afetam o cotidiano. E estas dependem do contexto, do acesso ao
equipamento urbano, das atividades, sejam elas de lazer, recreativas, esportivas, culturais,
religiosas, educativas e dos serviços públicos.
A avaliação que as pessoas proporcionam destas práticas são indicativas do
equipamento urbano disponível, e também das desigualdades operadas no acesso, e o
envolvimento dos atores sociais nestas atividades permite inferir sobre a qualidade de vida
e as pluralidades de experimentações que tecem as relações cotidianas na cidade. O certo é
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que esse repertório de práticas, como os hábitos cotidianos, a interações com os serviços
públicos, o uso dos equipamentos urbanos entre outros expressam os impactos das
intervenções das instituições públicas e privadas e das interações cotidianas no espaço
urbano.
As iniciativas locais de segurança devem valorizar, sem dúvida, a melhora das
condições de inserção social dos jovens e de grupos vulneráveis. Dentro do território
municipal, as entidades, sobretudo aquelas voltadas para a educação de crianças e jovens,
devem ter preocupação essencial com a prevenção do uso de drogas e com a adequada
orientação dada aos jovens.
Outra dimensão que circunscreve a capacidade da sociedade de garantir a segurança
e o bem estar são as percepções que as pessoas têm da violência e da criminalidade urbana.
As percepções sobre a criminalidade e a qualidade das iniciativas voltadas para a garantia
da segurança expressam a rigor os custos simbólicos que a violência provoca nas vivencias
das pessoas pela cidade, e que ensejam mudanças e medidas voltadas para assegurar os seus
efeitos, seja de maneira individual ou por meio das relações com as iniciativas das
instituições.
De modo geral, na perspectiva dos entrevistados pela pesquisa, a cidade se mostra
segura e os efeitos da violência quando percebidos ensejam mudanças cotidianas adstritas
aos cuidados na rotina de interações estabelecidas pela cidade e na residência, como evitar
lugares e horários, sobretudo, a freqüência em horários noturnos e tomar medidas voltadas
para a proteção e fechamento das residências. As reações que as pessoas tomam visando à
garantia da segurança podem estar adstritas para além do crescimento da criminalidade as
percepções de mudanças e da sensação de insegurança que aposta em um amplo mercado
que concorre com os investimentos públicos nesta área.
Cabe destacar o quanto na sociedade contemporânea a polícia é responsabilizada
pelo fenômeno da violência e as percepções do fenômeno da violência enquanto problemas
policiais são muitas vezes reforçados pelas percepções de insegurança. Neste sentido, estes
fatores colaboram para a definição que as pessoas têm acerca do trabalho policial e da sua
eficácia. De modo geral os entrevistados declararam ter percebido que a criminalidade na
cidade permaneceu em patamares iguais e pouco expressivos, mas parte substancial
também aponta o aumento da criminalidade e da sensação de insegurança.
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Este dado contrasta com a proporção elevada de pessoas que declararam se sentirem
seguras na vizinhança de suas residências, nos outros bairros, e em locais de trabalho que
transitam seja de dia ou noite pela cidade. Isto ocorre porque mecanismos complexos atuam
na formulação das respostas que as pessoas dão as questões de segurança, sendo comum
um mesmo entrevistado considerar sua vizinhança segura, mas declarar que percebe que a
criminalidade nela está aumentando e não obstante ter realizado investimentos que julgam
torná-los mais seguros.
A atuação da polícia, a vitimização, ou ainda a presença em situações de violência
colaboram para esta ambigüidade, mas muito decorre das imagens sociais que passam a ser
incorporadas e que subsidiam a suspeição generalizada na área, com a valorização de
mecanismos privados para a garantia da segurança, bem como a idealização das vivências e
das expectativas em relação ao trabalho realizado pelas instituições públicas.
Assim a pesquisa buscou direcionar o olhar para temas afetos à segurança de uma
perspectiva mais ampla e não obstante questionou as formas mais comuns pelas quais os
indivíduos são envolvidos enquanto vítimas das situações de violência. A esse cenário
decorre uma multiplicidade de formas de violência que redistribui desigualmente seus
custos simbólicos e materiais, aprofundando a sensação de insegurança no cotidiano. Neste
sentido, a pesquisa aponta a vitimização de setores da sociedade que expressam o abismo
na garantia de direitos e impede a experiência integral da segurança.
As políticas sociais devem ser referidas à questão da segurança, interconectando
saúde, educação, planejamento urbano, combate às desigualdades sociais ligadas a renda e
aos preconceitos raciais, de gênero, étnico, geracional e de orientação sexual. Há pontos de
contato entre políticas públicas que precisam ser constituídos.
Vale ressaltar que os estudos, pesquisas e indicadores analisados constituem parte
de um trabalho que viabiliza a estratégia de romper com os problemas históricos na área de
segurança e qualidade de vida. Este é um passo para que as agências sociais,
potencializando a comunidade, realizem uma agenda compartilhada de política de
segurança local.
Os encontros promovidos pelo Conseg do município, com a colaboração da
universidade, representam um passo substancial na direção da divulgação para a sociedade
de instrumentos que permitem a participação qualificada no levantamento e enfrentamento
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dos problemas vivenciados pela população. Neste sentido os resultados da pesquisa podem
auxiliar os atores sociais na gestão democrática, com responsabilidade, além de reafirmar
valores como convivência pacífica dos indivíduos, rica de possibilidades, assegurada pelo
respeito aos direitos fundamentais e visando alterar as práticas que geram e reforçam as
vulnerabilidades. É nesta visão mais ampla que se coloca a segurança como um direito
fundamental e essencial para o desenvolvimento da cidadania.
Referências Bibliográficas
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IBASE. Com a palavra, os moradores! Pesquisa qualitativa em comunidades e
bairros da Grande Tijuca. Agenda Social, Ibase e Fundação Heinrich Boll, 2000.
VELHO, G. Violência, reciprocidade e desigualdade: uma perspectiva
antropológica. In. VELHO, G. e ALVITO, M. (Orgs).Cidadania e violência. Rio de
Janeiro, Editora UFRJ, FGV, 1996.
ZALUAR, A. A máquina e a revolta. 1ª ed., São Paulo, Brasiliense, 1985.