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Universidade de So Paulo
Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz
Caracterizao nutricional e funcional da farinha de chia (Salvia hispanica)
e sua aplicao no desenvolvimento de pes
Tnia Rachel Baroni Ferreira
Dissertao apresentada para obteno do ttulo de
Mestra em Cincias. rea de concentrao: Cincia e
Tecnologia de Alimentos
Piracicaba
2013
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Tnia Rachel Baroni Ferreira
Bacharel em Cincias dos Alimentos
Caracterizao nutricional e funcional da farinha de chia (Salvia hispanica)
e sua aplicao no desenvolvimento de pes
Orientadora:
Profa. Dra. JOCELEM MASTRODI SALGADO
Dissertao apresentada para obteno do ttulo de
Mestra em Cincias. rea de concentrao: Cincia
e Tecnologia de Alimentos
Piracicaba
2013
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Dados Internacionais de Catalogao na Publicao DIVISO DE BIBLIOTECA - DIBD/ESALQ/USP
Ferreira, Tnia Rachel Baroni Caracterizao nutricional e funcional da farinha de chia (Salvia hispanica) e
sua aplicao no desenvolvimento de pes / Tnia Rachel Baroni Ferreira.- - Piracicaba, 2013.
112 p: il.
Dissertao (Mestrado) - - Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, 2013.
1. Alimentos funcionais 2. Semente de chia 3. Fibras alimentares 4. mega 3 5. Clcio 6. Po Funcional I. Ttulo
CDD 664.752 F383c
Permitida a cpia total ou parcial deste documento, desde que citada a fonte -O autor
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Dedico este trabalho a todos que me incentivaram,
apoiaram e acreditaram que o mesmo seria possvel. Em
especial, dedico Profa Jocelem Mastrodi Salgado e
Andrea Frias, minhas tutoras e grandes amigas, e
tambm Silvana, Natal, Valter, Leonardo e Joo
Henrique, meus pilares e motivos das minhas lutas
dirias.
Muito obrigada!
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A mente que se abre a uma nova ideia jamais voltar ao seu tamanho original. Albert Einstein
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SUMRIO
RESUMO .................................................................................................................................. 9
ABSTRACT............................................................................................................................. 11
1 INTRODUO ................................................................................................................... 13
2 REVISO BIBLIOGRFICA ............................................................................................ 15
2.1 Alimentos funcionais ........................................................................................................ 15
2.1.1 Fibras alimentares .......................................................................................................... 18
2.1.1.1 Benefcios sade........................................................................................................ 20
2.1.2 cidos graxos mega 3.................................................................................................. 22
2.1.2.1 Benefcios sade........................................................................................................ 26
2.2 Semente de chia................................................................................................................. 29
2.2.1 Semente de chia e legislao brasileira .......................................................................... 33
2.3 Pes ................................................................................................................................... 35
3 MATERIAL E MTODOS ................................................................................................. 39
3.1 Caracterizao da matria prima........................................................................................ 39
3.1.1 Composio centesimal.................................................................................................. 40
3.1.2 Aminocidos................................................................................................................... 41
3.1.3 cidos graxos................................................................................................................. 42
3.1.4 Minerais.......................................................................................................................... 42
3.1.5 Compostos bioativos....................................................................................................... 43
3.1.6 Micotoxinas..................................................................................................................... 44
3.2 Desenvolvimento do produto............................................................................................. 44
3.2.1 Farinha de semente de chia no desenvolvimento de pes funcionais............................. 44
3.2.2 Produo dos pes funcionais......................................................................................... 44
3.2.3 Anlises dos pes ........................................................................................................... 46
3.2.3.1 Anlises microbiolgicas ............................................................................................ 46
3.2.3.2 Clculo do valor calrico ............................................................................................ 47
3.2.3.3 Digestibilidade in vitro ................................................................................................ 47
3.2.3.4 Avaliao Sensorial de aceitao ................................................................................ 48
3.3 Precificao dos produtos desenvolvidos ......................................................................... 50
3.4 Anlise estatstica............................................................................................................... 50
4 RESULTADOS E DISCUSSO.......................................................................................... 51
4.1 Matria prima..................................................................................................................... 51
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4.1.1 Composio centesimal......................................................................................... 51
4.1.2 Aminocidos.......................................................................................................... 53
4.1.3 cidos graxos........................................................................................................ 57
4.1.4 Minerais................................................................................................................. 59
4.1.5 Compostos bioativos.............................................................................................. 60
4.1.6 Micotoxinas........................................................................................................... 63
4.2 Pes Funcionais........................................................................................................ 64
4.2.1 Anlises microbiolgicas ...................................................................................... 67
4.2.2 Composio centesimal ........................................................................................ 67
4.2.3 Aminocidos.......................................................................................................... 72
4.2.4 cidos graxos........................................................................................................ 74
4.2.5 Minerais................................................................................................................. 77
4.2.6 Compostos bioativos.............................................................................................. 79
4.2.7 Valor calrico e digestibilidade............................................................................. 80
4.2.8 Anlise sensorial de aceitao .............................................................................. 82
4.2.8.1 Caracterizao dos provadores........................................................................... 82
4.2.8.2 Anlise sensorial de cor, odor, sabor, textura..................................................... 84
4.2.8.3 Inteno de compra............................................................................................. 86
4.2.8.4 Precificao dos produtos desenvolvidos........................................................... 87
5 CONCLUSES .......................................................................................................... 89
REFERNCIAS ............................................................................................................ 91
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RESUMO
Caracterizao nutricional e funcional da farinha de chia (Salvia hispanica) e sua
aplicao no desenvolvimento de pes
Os alimentos funcionais vm despertando o interesse de governos, indstrias e
principalmente dos consumidores, devido importncia que os mesmos representam para a
sade da populao. A semente de chia, um alimento pouco conhecido pela populao
brasileira, apresenta uma composio nutricional rica em macro e micronutrientes essenciais
sade humana, podendo auxiliar na preveno de diversas enfermidades relacionadas ao
elevado consumo de gordura saturada e baixa ingesto de fibras. Com base nisso, o presente
trabalho teve como objetivos caracterizar a semente de chia e desenvolver pes funcionais
elaborados com adio da farinha dessa semente (FSC) em detrimento farinha de trigo em
diferentes concentraes (0%, 3%, 6% e 9%). Tanto a semente de chia quanto os pes foram
analisados quanto composio centesimal e funcional. Os pes tambm foram avaliados
microbiologicamente e atravs de anlise sensorial. A semente de chia apresentou elevado
teor de fibras, protena e cidos graxos poliinsaturados, sendo aproximadamente 70% desta
frao composta por cido linolnico (mega-3). Apresentou tambm timo perfil de
aminocidos, sendo comparvel ao da soja. Os resultados mostraram tambm elevados teores
de fsforo, potssio, magnsio e principalmente clcio, alm de baixo teor de sdio. De
acordo com os dados obtidos, a semente de chia apresenta atividade antioxidante mensurada
pelo EC50 do DPPH de 15,3, enquanto que o leo apresenta um teor de 54,9. Os compostos
fenlicos tambm apresentaram maior teor no leo em relao semente. Quanto aos taninos
e cido ftico, ambos apresentaram maior concentrao na farinha do que no leo. Os pes
funcionais apresentaram composies centesimais semelhantes entre si e o padro (sem FSC),
exceto pelo aumento gradativo no teor de fibras alimentares em detrimento ao teor de
carboidrato, e maior teor proteico conforme maior adio de FSC. Os pes com 3% e 6% de
FSC, segundo a legislao brasileira, podem ser considerados como fonte de fibras e os pes com 9% como rico/alto teor de fibras alimentares. O gradativo aumento de adio de FSC apresentou maiores teores de atividade antioxidante, compostos fenlicos, taninos e
cido ftico, alm de proporcionar diminuio no valor calrico dos pes em relao ao padro
e melhor digestibilidade protica in vitro. Os pes apresentaram elevados teores de cidos
graxos n-9 e n-6 principalmente, e n-3, o qual apresentou maiores nveis conforme maior
adio de FSC. Quanto aos minerais, todos os pes desenvolvidos apresentaram excelentes
teores dos minerais avaliados quando comparados a outras fontes vegetais, sendo que o sdio
diminuiu conforme se aumentou a adio de FSC e o clcio aumentou conforme maior
concentrao de FSC nas formulaes. Todos os pes encontram-se de acordo com a
legislao vigente em relao salmonela e coliformes totais. Para o teste de aceitabilidade,
constatou-se que 70% consomem pes diariamente, sendo que 31% consomem pes integrais.
Os pes no se diferiram significativamente ente si quanto aos parmetros sensoriais, ou seja,
apesar da maioria (40,4%) indicar o po com 6% de FSC como mais saboroso, os resultados
mostraram que todos os pes seriam adquiridos e consumidos por 100% dos provadores.
Palavras-chave: Alimentos funcionais; Semente de chia; Fibras alimentares; mega 3; Clcio;
Po Funcional
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ABSTRACT
Nutritional and functional characterization of the chia flour (Salvia hispanica) and
application on bread development.
Functional foods are attracting the interest of governments, industries and consumers,
mainly due to the importance that they represent in population`s health. The chia seed, a food
almost unknown by Brazilians, has a distinctive nutritional composition rich in macro and
micronutrients essential to human health, and may help in the prevention of several diseases
related to high consumption of saturated fat and low fiber intake. Based on that, the present
study aimed to characterize the chia seed and develop functional breads produced with the
addition of chia seed flour (FSC) substituting the flour wheat in different concentrations (0 %,
3 %, 6% and 9 % ). Both the chia seed and the bread were analyzed for nutritional and
functional composition. The bread was also evaluated microbiologically and through sensorial
analysis. The chia seeds presented high fiber, protein and polyunsaturated fatty acids
concentration, with approximately 70% of this fraction composed of linoleic acid (omega-3).
It also presented great amino acid profile, comparable to the levels found in soybeans. The
results also showed high levels of phosphorus, potassium, magnesium and particularly
calcium, beyond low levels of sodium. According to the data obtained, chia seeds present
antioxidant activity measured by EC50 of DPPH of 15.3, while the oil presents a level of
54.9. The phenolic compounds also presented a higher concentration in oil compared to the
levels found in the seeds. Whereas tannins and phytic acid were in higher concentration in
flour compared to oil. The functional breads presented similar percentage compositions
between themselves and the standard bread (without FSC), except for a gradual increase of
dietary fibers levels compared to the carbohydrate, and higher protein content as a result of
FSC addition. Breads with 3% and 6% of FSC, according to Brazilian legislation, can be
considered a "source of fiber" and the breads with 9% as a "rich/high content of dietary fiber".
The gradual increase of FSC resulted in higher antioxidant activities, phenolic compounds,
tannins and phytic acid levels, reducing bread caloric values and better protein digestibility in
vitro compared to standard bread. The functional breads presented high levels of fatty acids,
mainly n-9 and n-6, while the levels of n-3 were increased with the addition of FSC. All
formulations showed good mineral contents, the levels of sodium decreased with more
addition of FSC and the calcium present in the developed breads increased with higher
concentration of FSC. All breads are in accordance with the legislation in referring to micro-
organisms. For the acceptability test data showed that 70% eat bread daily, and 31% eating
whole-wheat bread. The functional breads did not differ significantly among themselves
regarding the sensory parameters, i.e. , even though the majority (40.4 %) indicated bread
with 6% of FSC as the most tasty, the results showed that all breads would be purchased and
consumed by 100% of participants.
Keywords: Functional Foods; Chia Seed; Dietary Fiber; Omega 3; Calcium; Functional Bread
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1 INTRODUO
O aumento do consumo de alimentos mais saudveis e com propriedades funcionais no
Brasil uma prerrogativa para que efetivamente seja possvel consolidar uma alimentao
saudvel e segura em vrias regies do pas. A semente de chia foi selecionada para o
presente estudo por apresentar amplo crescimento de consumo, apesar dos poucos trabalhos
cientficos disponveis que apresentam sua caracterizao nutricional e aplicao da mesma
em produtos alimentcios. Maiores estudos/comprovaes cientficas so necessrios para que
essa rica semente seja aprovada como alimento seguro para consumo pela Agncia Nacional
de Vigilncia Sanitria. J o po foi selecionado por ser um alimento amplamente consumido
no mundo todo, por ser fonte de energia, carboidrato, protenas e apresentar elevada aceitao
por todas as faixas etrias. A utilizao de farinhas mistas em produtos de panificao
objetiva substituir parcialmente a farinha de trigo para oferecer aos consumidores alimentos
diversicados com melhor qualidade nutricional. Por este motivo, a incluso da farinha de
semente de chia em detrimento farinha de trigo foi utilizada na formulao do presente
trabalho, visando a oferta de um novo produto aos consumidores com melhor perfil
nutricional, rico em mega 3, fibras e clcio.
A chia (Salvia hispnica L.), tambm conhecida como salvia espanhola, artemisa
espanhola, chia mexicana ou chia negra, uma planta herbcea, da famlia
das lamiceas, originaria das reas montanhosas do oeste e centro de Mxico. Apesar de ser
consumida desde a antiguidade pelos Astecas, nos ltimos anos essa semente ganhou elevada
notabilidade por suas caractersticas nutricionais, sendo rica em fibras, protenas, minerais e
cidos graxos, os quais podem ser responsveis pela diminuio do risco de doenas
cardiovasculares. Alm disso, seu consumo passou a ser relacionado amplamente com a perda
de peso, o que aumentou ainda mais o interesse por essa matria prima. Apesar da elevada
procura pela chia, poucos estudos apresentam sua caracterizao nutricional, ou aplicao da
mesma em produtos viveis para consumo. Por este motivo, a presente pesquisa teve como
objetivos caracterizar a semente de chia quanto aos seus parmetros nutricionais,
micotoxicolgicos e de compostos bioativos; desenvolver pes funcionais com adio de
diferentes percentuais de farinha de semente de chia em detrimento farinha de trigo;
caracterizar os produtos desenvolvidos quanto aos teores nutricionais, microbiolgicos e
compostos bioativos; comparar os teores nutricionais de cada produto com o po padro
desenvolvido e calcular seu preo terico; submeter os pes anlise sensorial de
aceitabilidades pelos consumidores, visando determinar a concentrao aceitvel de
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substituio de farinha de trigo pela farinha de semente de chia e fornecer literatura
cientfica apoio para comprovao dos benefcios nutricionais da semente de chia, auxiliando
sua aprovao perante a Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria como alimento seguro para
consumo por toda populao brasileira.
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2 REVISO BIBLIOGRFICA
2.1 Alimentos Funcionais
A globalizao e industrializao proporcionaram populao mundial facilidades
alimentares que, apesar de toda praticidade, acarretaram alguns malefcios sade do
consumidor. Produtos industrializados, ricos em conservantes, gorduras, sdio, entre outros,
so facilmente encontrados e consumidos, visando um estilo de vida cada vez mais prtico
(LAMOUNIER et al, 2007). Isso acarreta em quadros nutricionais inadequados e antagnicos
por toda populao mundial, pois atualmente mais de 2 bilhes de pessoas apresentam
deficincias de micronutrientes, 870 milhes tm ingesto energtica inadequada e 783
milhes de pessoas no tm acesso a gua potvel (NORDIN et al, 2013). Enquanto isso,
progressivamente crescente ocorrncia de obesidade mundial, a qual atinge atualmente cerca
de 10% dos homens e 14% das mulheres, perfazendo um total de aproximadamente meio
bilho de pessoas obesas no mundo (WHO, 2012). No Brasil, a obesidade atinge cerca 15,8%
da populao, de acordo com MINISTRIO DA SADE, 2012.
A obesidade uma das principais responsveis pela ocorrncia de diversas
enfermidades, como dislipidemias, diabetes, doenas respiratrias, distrbios dermatolgicos,
distrbios alimentares e, principalmente, as relacionadas com complicaes cardiovasculares
(FABBRO E FOSS, 2008; MELO et al, 2009; SANKHLA et al, 2013). Esses agravos
ilustram a importncia e o impacto das doenas no mbito individual e coletivo, tendo em
vista que dados publicados recentemente apontam que se gasta cerca de R$3,8 bilhes em
ambulatrios e R$3,7 bilhes com internao relacionada a doenas crnicas no
transmissveis. Isso totaliza aproximadamente R$7,5 bilhes/ano em gastos do setor pblico
com essas doenas, proveniente do governo via Sistema nico de Sade (MINISTRIO DA
SADE, 2005; ABIA, 2005; MALTA et al, 2006), sendo, portanto, de extrema importncia a
busca por alternativas que possam prevenir os quadros de enfermidades citados acima. Uma
das principais tendncias a preveno pela adoo de hbito de vida mais saudvel,
incluindo atividades fsicas e alimentao adequada, onde os principais e mais efetivos grupos
de alimentos so os chamados alimentos funcionais.
O termo alimentos funcionais recebe diversas denominaes, mas no Brasil, a
Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria (ANVISA) o define como todo aquele alimento ou
ingrediente que, alm das funes metablicas normais bsicas, quando consumido como
parte da dieta usual, produza efeitos metablicos e/ou fisiolgicos e/ou efeitos benficos
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sade, devendo ser seguro para consumo sem superviso medica (BRASIL, 1999(a)). Esse
termo surgiu no Japo na dcada de 80, sendo definido como alimentos similares em
aparncia aos convencionais, utilizados como parte de uma dieta comum, e que apresentam
benefcios fisiolgicos e/ou reduzem o risco de doenas crnicas, alm de suas funes
bsicas nutricionais (ROSS, 2000). J amplamente disseminado pela literatura cientfica que
a ingesto regular desses alimentos pode reduzir riscos de enfermidades como cncer, doenas
cardiovasculares, osteoporose, problemas intestinais, entre outros (ALISSA E FERNS, 2012;
HALFORD E HARROLD, 2012; KANG et al, 2013).
Diversos so os compostos bioativos presentes nesses alimentos que lhes fornecem
caractersticas benficas de auxlio na manuteno da sade e preveno de doenas
(SALGADO, 2000). A Tabela 1 exemplifica alguns compostos, suas fontes alimentares e os
benefcios ocasionados pelos mesmos no metabolismo humano. Esses alimentos, conforme j
citado anteriormente, devem ter, como componentes ativos, substncias naturais que
apresentem seus efeitos bsicos nutritivos e outros efeitos benficos que promovem e
potencializam o bem estar e a sade de quem os consume (SALGADO, 2000). Essas
substncias podem ser naturalmente encontradas nos alimentos ou ingredientes adicionados
ao produto final para potencializar uma caracterstica funcional desejada. Alm disso, esses
alimentos devem ser consumidos como parte de uma dieta usual e constante (ROBERFROID,
2002). Com o aumento da expectativa de vida conjuntamente prevalncia de doenas
crnicas (obesidade, hipertenso, osteoporose, diabetes e cncer), crescente a preocupao e
busca por uma alimentao funcional, devido ao conceito de que este tipo alimento pode
reduzir riscos de doenas e aumentar a qualidade de vida de quem os consome, de acordo com
a Associao Brasileira da Indstria da Alimentao (ABIA, 2005).
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Tabela 1 - Alimentos funcionais, suas fontes e benefcios ao organismo humano
Composto Ativo Fontes Alimentares Benefcios sade
cidos Graxos/ mega 3
Peixes de aguas frias com alto
teor de gordura; leos vegetais
(linhaa, etc)
Preveno doenas cardiovasculares, doenas
autoimunes inflamatrias.
Esteris/estanis vegetais Milho, soja, trigo e leos
vegetais
Reduo do risco de doenas cardiovasculares,
diminuio da absoro de colesterol.
Flavonoides
Uva, amora, framboesa, frutas
ctricas, brcolis, repolho, ch
verde
Efeito antioxidante, ao sobre formao de
radicais livres e diminuio dos niveis de LDL
Antocianinas
Frutas vermelhas escuras e
roxas
Preveno doenas cardiovasculares e cncer
Catequinas Uva, morango, ch verde, ch
preto
Atividade antioxidante e inibio da formao de
ateromas; preveno de certos tipos de cncer
Limonides Frutas ctricas
Estmulo produo de enzimas protetoras contra
o cncer, reduo do colesterol.
Lutena e zeaxantina Folhas verdes (lutena), pequi e
milho (zeaxantina). Proteo contra degenerao macular
Sulfetos allicos Alhos e cebolas
Reduo do risco de doenas cardiovasculares,
estmulo produo de enzimas protetoras contra
cncer gstrico.
Resveratrol e quercitina Casca de uva, vinho tinto,
ma.
Reduo do risco de doenas cardiovasculares,
inibio da formao de carcingenos, cogulos e
inflamaes.
Isoflavonas Soja, leguminosas, amendoim,
ervilha.
Alvio dos sintomas de menopausa; Reduo do
risco de doenas cardiovasculares e osteoporose,
reduo do risco de cncer de mama e prstata.
Betaglucana Aveia, cevada, legumes. Controle da glicemia e do colesterol srico
Isocianatos e indol Brcolis, repolho, couve-flor,
rabanete, folha de mostarda.
Aumento da atividade de enzimas tipo 2
protetoras contra carcinognese
Licopeno Tomate, goiaba, melancia.
Atividade antioxidante, Reduo do risco de
doenas cardiovasculares, proteo contra o
cncer, principalmente prstata.
Lignana Linhaa Inibio de tumores hormnio dependente
Fibras/ Prebitico Gros integrais, frutas e
vegetais em geral.
Melhora da sade intestinal, reduo do risco de
cncer do clon, controle do colesterol.
Probiticos Leites fermentados, iogurtes.
Melhora da sade intestinal; Reduo do risco de
cncer de clon e melhora da intolerncia
lactose.
Fontes: SALGADO, 2000; OZEN et al, 2012; PHILLIPS E RIMMER, 2013.
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A importncia deste mercado evidenciada em levantamento realizado pela ABIA, que
mostra que o setor de alimentos funcionais cresceu por volta de 14% ao ano no mundo,
enquanto as vendas de alimentos convencionais registram ndices de 4% e, no Brasil, o setor
registrou um crescimento de 81% entre 2004 e 2009, passando de R$ 15 bilhes para R$ 27,2
bilhes faturados (ABIA 2011). Deste modo, visvel a importncia deste segmento perante
a populao, o que justifica investimentos de pesquisa e desenvolvimento de novos produtos
que acompanham essa tendncia, os quais devem conter em sua composio quantidades
adequadas de componentes benficos, como fibras, protenas, cidos graxos poli-insaturados,
entre outros.
2.1.1 Fibras Alimentares
No Brasil, as fibras alimentares so definidas como qualquer material comestvel que
no seja hidrolisado pelas enzimas endgenas do trato digestivo de humanos, de acordo
com a ANVISA (BRASIL, 2001). Esta Agncia reconhece algumas fibras alimentares
(glucanas, dextrina resistente, frutooligossacardeos, goma guar parcialmente hidrolisada,
inulina, lactulose, polidextrose, psillium e quitosana) como fibras funcionais, ou seja,
empresas que seguem as exigncias dessa classe de alimentos podem apresentar em seu rtulo
o seguinte claim (alegao) de alimento funcional no rtulo: As fibras alimentares auxiliam
o funcionamento do intestino. Seu consumo deve estar associado a uma alimentao
equilibrada e hbitos de vida saudveis (BRASIL, 2008). Para isso, o produto pronto para
consumo (poro) deve apresentar 3 g.100 g-1 (base integral) para alimentos slidos e 1,5
g.100 mL-1 (base integral) para lquidos. Essa Agncia tambm permite o uso como
informao nutricional complementar, a qual abrange todas as fibras alimentares e no precisa
de registro como alimento funcional. Para essa categoria, o claim descrito acima no
permitido no rtulo, e sim apenas a alegao fonte de fibras quando o mesmo fornece as
mesmas 3 g.100 g-1
para alimentos slidos e 1,5 g.100 mL-1
para lquidos. Caso apresente o
dobro deste contedo considerado um alimento com elevado teor de fibra alimentar, e pode
apresentar no rtulo a denominao rico em fibras alimentares (BRASIL, 2012a)
Fisiologicamente as fibras so consideradas substncias de origem vegetal que auxiliam
no aumento do volume do bolo fecal e diminuem o tempo do mesmo do transito intestinal
(SCHROEDER, 2013). Elas pertencem a uma ampla categoria dos carboidratos, podendo ser
fermentveis ou no fermentveis, ainda divididas quanto s suas caractersticas estruturais,
em polissacardeos estruturais e no estruturais (SAAD, 2006). Os primeiros so constitudos
de componentes da parede celular das plantas, como celulose, hemiceluloses, pectinas, dentre
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outras. Os no-estruturais incluem as gomas, derivados das algas e mucilagens e os
compostos no polissacardeos incluem a lignina como principal representante (SALINAS,
2002). Porm, a forma mais utilizada em pesquisas para classificar as fibras alimentares est
relacionada com a solubilidade das mesmas: as fibras solveis e insolveis (BELITZ E
GROSCH, 2000). Ambas no so absorvidas pelo intestino delgado, chegam ao intestino
grosso sem se degradar e apresentam diversos benefcios sade, como preveno do cncer
de intestino, diabetes, hiperteno e doenas cardiovasculares, auxlio na eliminao gorduras
prejudiciais e toxinas do organismo, contribuio para a reduo da obesidade por induzirem
a saciedade e, consequentemente menor ingesto calrica (PIMENTEL et al 2005;
POSSAMAI, 2005). Estudos apontam que as fibras solveis aumentam o tempo de trnsito
intestinal, controlam a absoro de glicose e reduzem a velocidade de absoro, enquanto
fibras insolveis reduzem o tempo de trnsito e aumentam a capacidade de reteno de gua
(MONTAGNE et al, 2003; BAZZANO, 2008).
As fibras solveis so compostas principalmente pela pectina, amido resistente, gomas e
mucilagem e so encontradas na aveia, gros, nozes, sementes, frutas e leguminosas. Essas
fibras apresentam maior solubilidade em meio aquoso, capacidade significativa de absoro
de gua e aumento da massa microbiana, sofrem fermentao pelas bactrias intestinais e
posteriormente so degradadas no clon (POSSAMAI, 2005). Essas substncias, quando
aliadas a uma dieta pobre em gorduras, so capazes de diminuir o colesterol sanguneo, alm
de regular o nvel de acar sanguneo (glicemia), sendo essencial a ingesto das mesmas em
quantidades adequadas por pessoas com diabetes ou taxas de colesterol inadequadas
(FARIAS, 2004).
J as fibras insolveis apresentam em seu grupo as celuloses, ligninas, e algumas
hemiceluloses, encontradas em vegetais crus, gros de cereais como o milho, soja e gro-de-
bico, alm de frutas consumidas com casca, como ma, pra e ameixa (DE ANGELIS,
2001). Essas fibras auxiliam no tratamento/preveno de hemorroidas, constipao, doena
diverticular, cncer e outras enfermidades intestinais, pois apresentam efeito mais
pronunciado no aumento do bolo fecal, por manterem sua estrutura no clon (POSSAMAI,
2005). A Tabela 2 apresenta a classificao das principais fibras para cada alimento e seus
efeitos sade.
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Tabela 2 - Fontes de fibras alimentares e seus benefcios sade
FIBRA ALIMENTAR FONTES BENEFCIOS SAUDE
Celulose Trigo integral, centeio
integral, mas, peras,
feijes, ervilhas,
verduras de raiz, tomates
frescos, soja.
Reduz nvel de glicemia e as exigncias de insulina no
diabetes. Estimula peristaltismo, aumenta volume do
bolo fecal, proporciona saciedade, atua na preveno e
tratamento da obesidade e constipao, etc.
Pectinas
Mas, frutas ctricas,
frutas silvestres, feijes
de vagem, cenouras,
cascas de frutas.
Liga-se ao colesterol e cidos biliares, previne doenas
cardiovasculares, reduzindo nveis de triglicerdeos e
colesterol.
Gomas
Farinha de aveia, feijes
secos, gomas vegetais.
Retarda tempo de esvaziamento gstrico, fornece
material fermentvel para as bactrias colnicas com a
produo de cidos graxos volteis e gs, previne
obesidade, diabetes e doenas cardiovasculares.
Lignina
Trigo integral, centeio
integral, morangos,
pssegos, peras, ameixas,
verduras.
Antioxidante, liga-se aos cidos biliares e aos metais.
Previne obesidade, diabetes, doenas cardiovasculares,
alguns tipos de cncer e outras doenas
gastrointestinais.
Polissacardeos
(quitosana)
Carapaas de crustceos
Diminui nvel de LDL no sangue, auxilia no tratamento
da obesidade e tratamento de algumas doenas crnicas
degenerativas como cncer e cardiovasculares.
Fonte: WILLIAMS, 1997.
2.1.1.1 Benefcios sade humana
Os efeitos metablicos benficos das fibras alimentares no organismo humano incluem
ainda a diminuio da efetividade e teores de absoro de nutrientes como a glicose
(MLLER et al, 2013), lipdeos e colesterol (MUMFORD et al, 2011), alm de atuar na
moderao da resposta dos nveis de insulina ps-prandial (HOSSEINPOUR-NIAZI et al,
2011; GEMEN et al, 2011), regulao do apetite (MATTES, 2007; IBRGGER et al, 2012),
reduo dos riscos de surgimento de doenas cardiovasculares (BAZZANO, 2008; SATIJA E
HU, 2012; KACZMARCZYK et al, 2012) e reduo da absoro de metais pesados e
compostos txicos (ABDEL-SALAM et al, 2008).
Os principais benefcios atribudos a ingesto de fibras relacionam-se com as funes do
trato gastrointestinal, o qual apresenta de 300 a 500 diferentes espcies de bactrias e que
pode sofrer alteraes endgenas e exgenas (uso de antibacterianos, mudanas alimentares e
estresse, entre outros), reduzindo significativamente suas funes fisiolgicas e protetoras
(PENNA et al, 2000; BRANDT et al, 2006; SAAD, 2006). As fibras atingem o clon intactas
-
21
(no sofrem digesto) e so ento fermentadas total ou parcialmente. Essa fermentao resulta
em metablitos como o lactato, piruvato, etanol, metano, hidrognio, cidos orgnicos
(fumrico, ltico e acetato) e os cidos graxos de cadeia curta, os AGCC (propionato e
butirato) (TEITELBAUM, 2011). Esses ltimos so responsveis pela diminuio do pH do
lmen intestinal, aumento da absoro de vitaminas e minerais e estmulo ao peristaltismo
intestinal, ocasionando efeitos benficos sob o colesterol srico, maior proteo contra
incidncia de cncer e diminuindo o estabelecimento de bactrias patognicas (SAAD, 2006).
Esses efeitos so relacionados aos efeitos bifidognicos e osmticos ocasionados pela
fermentao no intestino, a qual estimula as bactrias a metabolizar substratos, aumentar
energia e crescimento dos microrganismos benficos. Os ACGC apresentam tambm o efeito
de retardar o crescimento de clulas cancergenas e aumentar a apoptose das mesmas, por
meio da capacidade de modulao da atividade de acetilao de histonas e,
consequentemente, da transcrio dos genes que ocasionam as modificaes celulares
tumorosas (KIEFER et al, 2006; THIRABUNYANON E HONGWITTAYAKORN, 2013)
Outro benefcio atribudo as fibras a diminuio da absoro de glicose no intestino
delgado, ocasionando a reduo desta no plasma, a qual ocorre devido ao tempo decorrido at
o esvaziamento estomacal, que maior quando h ingesto de fibras (MAKI et al, 2007). Esse
maior tempo prejudica o contato do alimento com as enzimas digestivas no estmago e no
intestino delgado, retardando assim o transporte da glicose para a superfcie de absoro
intestinal, reabsoro dos cidos biliares no intestino delgado. Alm disso auxilia na formao
de uma camada na superfcie intestinal, a qual dificulta a difuso da glicose e tambm do
colesterol na corrente sangunea (NSOR-ATINDANA et al, 2012; GATO et al, 2013). Isso
acarreta em menores picos e reas das curvas de glicose no sangue , as quais esto associadas
diminuio da resposta de insulina ps-prandial (BROCKMAN et al, 2012; ROBERTSON
et al, 2012). A ingesto de quantidades adequadas de fibras alimentares tambm dificulta a
emulsificao e a hidrlise dos lipdeos, resultando no aumento de gordura eliminada pelas
fezes, sendo que as fibras alimentares tambm apresentam efeito sobre a saciedade, pois
ocasionam distenso no estmago aumentando a secreo do hormnio intestinal
colecistoquinina, o qual diminui a velocidade do esvaziamento gstrico (HOWARTH, 2001;
PAREJA, 2003).
A Organizao Mundial de Sade (OMS), citado por PACHECO E SGARBIERI,
2001, preconiza que o consumo de fibras seja entre 27 a 40 g/dia. A Food and Agriculture
Organization (FAO, 2002) estabeleceu, por meio da Dietary Reference Intake (DRI), que a
ingesto adequada (AI) para as fibras de 38 g para homens adultos e 25 g para mulheres
-
22
adultas, valores esses baseados nos riscos de incidncia de doenas cardiovasculares. O
consumo excessivo de fibras pode ocasionar desconfortos fisiolgicos, como flatulncias,
diarreia e estufamento, os quais tambm podem ocorrer quando o consumo de fibras no
acompanhado por uma ingesto adequada de gua e lquidos, como chs e sucos de frutas
naturais (GWEE, 2010). No Brasil, a ANVISA preconiza a ingesto de 25g/dia de fibras
alimentares diariamente (BRASIL, 2003).
2.1.2 cidos graxos mega 3
Os cidos graxos (AG) so compostos de cadeias lineares de hidrocarbonetos que
apresentam um grupo carboxila em uma extremidade e um grupo metila na outra. So
compostos por carbonos, os quais podem variar de 4 a 22 em sua estrutura, e so classificados
de acordo com seu grau de insaturao (saturados, monoinsaturados ou poli-insaturados)
(OETTERER et al, 2006). A diferena entre tamanho, grau e posio da insaturao nessas
molculas fornecem propriedades distintas quanto s caractersticas fsicas, qumicas e
nutricionais das mesmas (BELITZ E GROSCH, 2000). Os cidos graxos podem ser
classificados como de cadeia curta (SCFA, do ingls Short-Chain Fatty Acids, com cauda
aliftica de menos de 6 tomos de carbono); cadeia mdia (MCFA, Medium-Chain Fatty
Acids, com cauda aliftica de 6 a 12 carbonos); cadeia longa (LCFA, Long-Chain Fatty Acids)
com cauda aliftica de mais de 12 carbonos e de cadeia muito longa (VLCFA, Very-Long-
Chain Fatty Acids) com cauda aliftica contendo mais de 22 tomos de carbono (OETTERER
et al, 2006).
Esses compostos podem ser classificados tambm quanto essencialidade para o
organismo humano, sendo que cidos graxos essenciais so aqueles que o organismo humano
no consegue sintetizar, ou seja, devem ser adquiridos exclusivamente da dieta (PUPE et al,
2003; LANDS, 2012). Essa essencialidade ocorre pela incapacidade do metabolismo humano
em produzir as enzimas 12 e 15 dessaturase, responsveis pela sntese dos respectivos
cidos graxos essenciais (cido linoleico e cido linolnico, respectivamente)
(NAKAMURA E NARA, 2004). As alongases so responsveis por adicionar dois tomos de
carbono parte inicial da cadeia e as dessaturases atuam na oxigenao de dois carbonos da
cadeia, originando uma dupla ligao com a conFigurao cis (MARTIN et al, 2006). Os
cidos graxos essenciais esto divididos em dois grandes grupos, que so os cidos graxos da
famlia mega 3 (n-3) e mega 6 (n-6). Os primeiros podem ser encontrados abundantemente
em determinadas plantas e em leo de peixe, enquanto que os mega 6 so encontrados
principalmente em leos vegetais (GIBSON E MAKRIDES, 2000; DE ANGELIS, 2001). Os
-
23
precursores desses lipdeos (cido linoleico e alfa-linolnico) encontram-se exemplificados na
Figura 1.
Figura 1 - Estruturas dos mega 6 (a) e mega 3 (b); Fonte: NAKAMURA E NARA, 2004; MARTIN et al,
2006.
Um cido graxo pode ser denominado mega 3, que tem como precursor o cido -
linolnico (18:3) ou mega 6, cujo precursor o cido linoleico (18:2). Essa denominao
depende da localizao da primeira insaturao: quando est localizada no terceiro carbono a
partir do radical metil (CH3), denominado mega 3 e quando est localizada no sexto
carbono a partir do mesmo radical, denominado mega 6 (OETTERER et al, 2006). Os AG
n-3 e n-6 apresentam afinidade pelas mesmas enzimas (alongase e dessaturase), e por esta
razo competem pelas mesmas para sintetizar seus derivados, que incluem os cidos
eicosapentaenico (EPA, 20:5 n-3), docosapentaenico (DPA, 22:5 n-3) e docosahexaenico
(DHA, 22:6 n-3) e cido araquidnico (AA, 20:4 n-6) (BISTRIAN, 2003). A Figura 2
demonstra o metabolismo dos cidos graxos da famlia mega 3 e mega 6.
-
24
Figura 2 - Representao do metabolismo dos cidos graxos das famlias mega 3 e mega -6; Fonte: SALEM,
1999; INNIS, 2003
Conforme j mencionado anteriormente, a enzima dessaturase apresenta afinidade por
ambos cidos graxos AG n-3 e n-6, porem, tem maior especificidade pelos cidos graxos n-3.
-
25
Por este motivo, necessita-se de uma menor quantidade de n-3 em relao aos AG n-6 para
sintetizar a mesma quantidade de AG derivados (MADSEM et al, 1999).
Devido a essa competio pelas mesmas enzimas, essencial que haja um equilbrio
entre os AG dessas famlias para a manuteno adequada do metabolismo, pois um elevado
consumo de cido linoleico favorece o aumento do contedo de cido araquidnico (AA) nos
fosfolipdios das membranas celulares (BISTRIAN, 2003). Esse elevado teor de AA eleva a
presena de eicosanoides no metabolismo, cuja famlia composta por prostaglandinas (PGs),
tromboxanos (TXs) e prostaciclinas (PCI), os quais so denominados de prostanides, bem
como dos leucotrienos (LTs), lipoxinas (LXs), cidos hidroperoxieicosatetraenico
(HPETEs), e cidos hidroxieicosatetraenico (HETEs) (SIMOPOULOS, 2002;
SIMOPOULOS, 2003). Os eicosanoides tambm podem ser derivados do cido
eicosapentaenoico, conforme observado na Figura 3 (MOREIRA et al,2002; SIMOPOULOS,
2006).
Figura 3 - Biossntese dos eicosanides derivados do AA e do EPA; Fonte: MOREIRA et al., (2002);
SIMOPOULOS (2006)
Sendo que: LOX = lipooxigenases; COX = ciclooxigenases; PGs = prostaglandinas;
TXs = tromboxanos; LTs = leucotrienos; LXs = lipoxinas; HETESs = cidos
hidroxieicosatetraenico
Os eicosanides derivados do AA (srie par, sendo os principais a PGE2, LTB4, TX,
etc.) apresentam-se biologicamente ativos quando presentes em pequenas quantidades no
organismo, sendo que a PEG2, por exemplo, apresenta potencial imunossupressor e inibe a
-
26
produo do fator de necrose tumoral e interleucinas 1, apresentando, portanto, caractersticas
anti-inflamatrias (FERRERI et al, 2012). Porm, o elevado teor desses mesmos compostos
no metabolismo humano, ocasionados pela elevada ingesto de AG n-6, apresenta
caractersticas pr-trombticas e pr-inflamatrias, ocasionando trombose, ateromas,
transtornos alrgicos e inflamatrios (KELLEY, 2001; CALDER 2002; CALDER E
GRIMBLE, 2002), alm de agregao plaquetria, adeso leucocitria e contrao da
musculatura lisa (SIMOPOULOS, 2006).
Por outro lado, o elevado teor de AG n-3 potencializa a sntese de eicosanides da srie
mpar (PGE3, TXA3 e LTB5, etc), os quais possuem caractersticas anti-inflamatrias
independente da quantidade que se encontram no metabolismo humano. Torna-se, portanto,
visivelmente essencial o equilbrio entre a ingesto de AG n-3 e n-6 para que haja menor
formao de mediadores pr-inflamatrios e efeitos imunossupressores (MOREIRA et al,
2002; CALDER, 2003; ANDRADE E CARMO, 2006; KIECOLT-GLASER JK et al, 2012).
2.1.2.1 Benefcios sade humana
Durante a ocorrncia de doenas inflamatrias ocorre aumento do metabolismo do cido
araquidnico, o que resulta na produo de leucotrienos B4 (LTB4). Esses, por sua vez,
potencializam significativamente os processos de inflamao crnica e aumento da
permeabilidade vascular (FAN et al, 2013). O consumo de cido graxo mega 3 pode atenuar
esses processos inflamatrios por competir pelas mesmas vias enzimticas (COX e LOX),
promover a formao de PGE3, em vez de PGE2, e LTB5, em vez de LTB4, que so
mediadores anti-inflamatrios (JAMES et al, 2000; KELLEY 2001; KIECOLT-GLASER et
al, 2012) e tambm apresentar benfico aos pacientes infectados pelo vrus HIV por diminuir
a produo de citocinas e eicosanides pr-inflamatrios. (PIMENTEL et al, 2005; PETERS
et al, 2012).
Alm disso, o mega 3 atua diretamente evitando a formao de trombos, tendo em
vista que esse AG compete com o cido araquidnico como substrato para a enzima
ciclooxigenase, inibindo a formao de tromboxano A2, que um importante agente
vasoconstritor e agregante plaquetrio. Com a diminuio de tromboxano A2 formados,
ocorre diminuio da agregao plaquetria, evitando assim a formao de cogulo,
importante causa de infartos do miocrdio e aterosclerose (DE CATERINA E ZAMPOLLI,
2007; VEDTOFTE et al, 2012).
Diversos estudos apontam tambm que os hbitos alimentares esto diretamente
relacionados com transtornos de humor, inclusive depresso, devido ao um balano
-
27
desequilibrado entre os cidos graxos n-6 e n-3 no interior da estrutura fosfolipdica (ZEMAN
et al, 2013). O elevado consumo de mega 3 auxilia na preveno desses transtornos, por
alterar as estruturas e funcionalidade da membrana fosfolipdica, ocasionando uma maior
fluidez da membrana celular (KIECOLT-GLASER et al, 2007). Isso acarreta em uma maior
mobilidade das protenas favorecendo maior troca de sinais de transduo, interao
hormnio-receptor e transporte de substratos entre os meios intra e extracelular (FREEMAN
E RAPAPORT 2011; LESPERANCE et al, 2011; BLOCH E HANNESTAD, 2012).
O consumo de mega 3 pode tambm ocasionar a diminuio da presso arterial, sendo
que a intensidade dessa reduo varia proporcionalmente ao nvel de ingesto de sdio e da
dose de cidos graxos mega 3 administrados, particularmente o cido docosahexanico
(CICERO ET AL, 2009). Esse mecanismo de reduo deve-se, provavelmente ao desvio da
produo de eicosanoides da srie 2, derivados do cido araquidnico, para a srie 3, derivado
do cido eicosapentanico, que competem pelas mesmas enzimas, conforme j citado
anteriormente. Consequentemente ocorre uma atividade mais vasodilatora e anti-agregante,as
quais acarretam em menores ndices de doenas cardiovasculares (ZIBOH et al, 2000; LIU et
al, 2011).
Esse AG da famlia n-3 pode tambm atuar beneficamente na reduo dos nveis de
triglicrides plasmticos, devido a sua capacidade de inibir a secreo heptica de VLDL e
por diminuir a atividade de vrias enzimas hepticas responsveis pela sntese de triglicrides.
Por esse motivo, desde que a ingesto calrica seja adequadamente controlada, os cidos
graxos mega 3 podem exercer efeitos benficos no perfil de risco cardiovascular em
pacientes com diabetes (DJOUSS et al, 2011; ZHUKOVS'KA et al, 2012; MALEKSHAHI
MOGHADAM et al, 2013; JEPPENSEN et al, 2013; SU et al, 2013). Outro beneficio
atribudo a ingesto de AG n-3 a deformao dos eritrcitos e diminuio da viscosidade do
sangue, por facilitar a microcirculao e possibilitar maior oxigenao dos tecidos, mesmo
com baixas doses de consumo. Esse AG tambm impede a ativao da protena C quinase,
diminuindo, assim, a produo de fatores responsveis pela leso cutnea da psorase,
melhorando o eritema, infiltrao e descamao (PIMENTEL et al 2005; BALBAS et al,
2011).
A relao de consumo de AG n-6:n-3 em populaes ocidentais de aproximadamente
15:1 a 17:1, sendo que a proporo adequada para se obter os benefcios da ingesto de AG
por volta de 2-5:1 (SIMOPOULOS, 2008; STRANDVIK, 2011), sendo que a Organiza
Mundial da Sade (WHO) preconiza uma relao de at 5-10:1 (WHO1995). Em uma dieta
Norte Americana tpica, por exemplo, consome-se cerca de 89% do total de cidos graxos
-
28
poli-insaturados como cido linoleico e apenas 9% como cido linolnico (AGENCY...,
2005). Isso se deve ao elevado consumo de fontes de AG n-6, como leos de milho, girassol e
soja e baixo consumo de fontes de cidos graxos n-3, como peixe, linhaa, chia, canola, entre
outros (AYERZA et al, 2002; SOCCOL E OETTERER 2003). Quanto maior a proporo de
cidos graxos mega-6/mega-3, maior a taxa de morte por doenas cardiovasculares,
cncer, doenas inflamatrias e autoimunes, ao passo que nveis elevados de mega-3 (menor
relao n-6/n-3), exercem efeitos inibidores dessas enfermidades (SIMOPOULOS, 2008;
SIMOPOULOS, 2011). Considerando ainda que essas duas famlias de cidos graxos
competem pelas mesmas enzimas, conforme j citado anteriormente, o equilbrio entre n-6:n-
3 na dieta de extrema importncia, tendo em vista que, na era paleoltica, essa relao era de
aproximadamente 1:1 a 1:2, enquanto que o padro atual (dieta ocidental) apresenta uma
relao de 17:1 (FRST, 2002, WHO/FAO, 2003).
No Brasil, preconizado pela Agencia Nacional de Vigilncia Sanitria (ANVISA) que
produtos com alegao de propriedade funcional para mega trs devem fornecer, no
mnimo, 0,1 de EPA e/ou DHA na poro em 100g ou 100mL do produto pronto para
consumo, caso a poro seja superior a 100g ou 100mL (BRASIL, 2008). Pases como
Canad, Sucia, Reino Unido, Austrlia, Japo e as organizaes das Naes Unidas
recomendam de 0,3 a 0,5 g/dia de EPA + DHA e 0,8 de 1,1 g/dia de alfa-linolnico, sendo
que indivduos com incidncia de doenas cardiovasculares devem elevar o consumo de EPA
e DHA para 1 g/dia (KRIS-ETHERTON et al, 2002). A Tabela 3 demonstra a quantidade de
n-3 recomendado para homens e mulheres, em diferentes faixas etrias.
-
29
Tabela 3 - Teores de n-3 recomendado para homens e mulheres
Idade (anos) mega 3 (gramas/dias)
Homens
9 a 13 1,2
14 a 18 1,6
19 a 30 1,6
31 a 50 1,6
50 a 70 1,6
>70 1,6
Mulheres
9 a 13 1,0
14 a 18 1,1
19 a 30 1,1
31 a 50 1,1
50 a 70 1,1
>70 1,1
Fonte: FOOD AND NUTRITION INFORMATION CENTER, 2005; THE NATIONL ACADEMY PRESS,
2006.
2.2 Semente de chia
A semente de chia (Salvia hispanica L.) uma oleaginosa nativa do sul do Mxico e
norte da Guatemala. Seu nome deriva do nahuatl chian (que significa "oleoso") e sua cultura
foi expandida at a Amrica do Sul, sendo comprovadamente consumida h sculos pelas
civilizaes Maias e Astecas. Mas apenas h pouco tempo ressurgiu o interesse por esta
semente, por ser considerado um alimento com significativo valor nutricional. (AYERZA,
2005; JIN et al, 2012). Ela rica em diversos micros e macronutrientes essenciais sade
humana, como clcio (456mg/100g), protena (24g/100g), fibra (30g/100g) e cidos graxos
poli-insaturados (23g/100g) (CAHILL, 2003; AYERZA E COATES, 2007; AYERZA, 2009;
JIN et al, 2012; VZQUES-OVANO et al, 2013). Esses teores apresentam-se satisfatrios
quando comparados a outras fontes de nutrientes j conhecidas, conforme Tabela 4.
-
30
Tabela 4 - Valores aproximados de nutrientes na semente de chia e em outros alimentos
Composto Benefcios Teor na Chia Teor em outros alimentos
Clcio
Formao de ossos e
dentes, participao no
crescimento, cofator/
regulador de reaes
bioqumicas, auxlio na
coagulao sangunea, etc.
500mg/
100g
200mg/100g (linhaa)
150mg/100g(amaranto)
90mg/100g (quinoa)
Fibras
Ao hipoglicemiante,
hipocolesterolmica,
hipotri-gliceridemica,
aumenta bolo fecal,
previne contra
constipao, diverticulite,
etc.
30%
14%(linhaa)
9% (amaranto)
5% (Quinoa)
Protenas
Um dos maiores
constituintes no
organismo. Atua
beneficamente na
coagulao sangunea,
catalisao de reaes
qumicas, formao de
tecidos, etc.
24%
26% (linhaa)
16% (amaranto)
18% (quinoa)
mega 3
Ao antiinflamatria,
inibio da formao de
trombos, diminuio da
presso arterial, atuao
benfica em
neurotransmissores, etc.
23%
20% (linhaa)
9% (amaranto)
6% (quinoa)
Fontes: MARQUES, 2008; LI et al, 2010; MALPELI et al, 2012; ESCUDERO et al, 2012; VILCHE et al, 2013;
COSTA, BORGES, 2005; BORGES et al, 2010;
O principal interesse nessa semente refere-se ao teor de cidos graxos poli-insaturados
cido alfa-linolnico (18:3 n-3, LNA), e cido linoleico (18:2 n-6, LA) (AYERZA, 2009;
MOHD et al, 2012), tendo em vista que esses compostos auxiliam as funes imunolgicas,
inibem a proliferao de linfcitos e citocinas pr-inflamatrias, atuam na preveno de
incidncia de doenas cardiovasculares e mantm a integridade das membranas celulares e
dos neurotransmissores (YAO et al, 2012; LUDWIG et al, 2013).
Estudos com a semente de chia ainda so raros, sendo poucas as pesquisas disponveis
que avaliaram essa matria prima. Alguns autores, entretanto, realizaram estudos visando
comprovar os diversos efeitos benficos que essa semente pode oferecer sade humana. JIN
ET AL, 2012 observaram em seu estudo que a ingesto de 25g/dia da semente de chia durante
sete semanas elevou os nveis plasmticos de cido -linolnico (ALA) e cido
eicosapentaenoico (EPA) em mulheres ps-menopausa, em 138 e 30%, respectivamente.
Outra pesquisa concluiu que a ingesto dessa mesma quantidade de semente de chia durante
-
31
10 semanas por 62 mulheres com sobrepeso tambm elevou os nveis de ALA, quando
comparado com o grupo de mulheres que no consumiram a respectiva semente (NIEMAN et
al, 2012).
Um estudo randomizado, duplo-cego com11 indivduos saudveis, mostrou que aps
120 minutos da ingesto de 50g de po branco contendo diferentes concentraes de semente
de chia reduziu a glicemia ps-prandial (VUKSAN et al, 2010). VUKSAN et al, 2007
tambm avaliaram, em 20 pacientes, o consumo de 37g/dia de semente de chia ou farelo de
trigo durante 12 semanas, em um estudo cross-over duplo-cego em indivduos com diabetes
tipo 2 controlado. Os resultados mostraram que o consumo de chia elevou os nveis
plasmticos de cidos graxos poli-insaturados ALA e EPA, alm de reduzir a presso arterial
em cerca de 6,3 mmHg, elevar a sensibilidade protena c-reativa (PCR - biomarcador
relacionado inflamaes) em cerca de 40% e ao fator de vonWillebrand (vWF - doena
hemorrgica) em cerca de 21%, em comparao com grupo que consumiu farelo de trigo, ou
seja, a suplementao com semente de chia pode ser um importante fator contra o risco de
doenas cardiovasculares e fatores emergentes (hs-CRP e vWF), mantendo controle
satisfatrio no ndice glicmico e no perfil lipdico em pessoas com diabetes tipo 2. Esse
resultado tambm foi encontrado por POUDYAL et al, 2012, os quais concluram que a
suplementao com 5% de sementes de chia durante 8 semanas atenuaram os sinais
metablicos de ratos, havendo melhora nos parmetros de sensibilidade insulina e tolerncia
glicose, reduo da adiposidade visceral, diminuio da esteatose heptica e reduo da
inflamao cardaca e heptica.
HERNNDEZ-VIVEROS et al, 2012 tambm avaliaram a associao de fontes
vegetais (protena de soja, semente de chia e aveia) com a sndrome metablica, que um
problema de sade em todo o mundo e est associado a doenas cardiovasculares e diabetes.
Os autores observaram que todos os participantes apresentaram reduo de peso, IMC e
circunferncia da cintura nos 2 meses de tratamento, mas apenas no grupo controle houve
reduo nos nveis de triglicerdeos plasmticos, protena C-reativa (PCR) e intolerncia
glicose esse estudo. Segundo os autores, apresentou tambm importantes resultados para
facilitar o desenvolvimento de estratgias personalizadas dietticas para indivduos com
sndrome metablica, os quais apresentam elevados risco de desenvolver diabetes e doenas
cardiovasculares.
Estudos com durao de oito semanas tambm apontam o efeito benfico do uso tpico
de leo de chia 4%, onde cinco pacientes saudveis com prurido e cinco pacientes com
insuficincia renal terminal ou com diabetes, tambm com prurido, relataram melhora dos
-
32
sintomas, incluindo maior hidratao da pele e permeabilidade da mesma pelos pacientes que
utilizaram o leo de chia, sendo que nenhum participante relatou efeitos adversos a esse
tratamento com leo de chia (JEONG et al, 2010).
Alm desses benefcios, iniciou-se uma propagao por todas as mdias de que a
semente de chia poderia auxiliar em dietas de emagrecimento, devido ao poder saciante
relacionado ao elevado teor de fibras e tambm pelo gel que se forma ao hidratar essa semente
(AYERZA et al, 2002), conforme observado na Figura 4. Apesar do aumento do consumo da
chia visando esse benefcio, poucos estudos discorrem sobre o efeito da mesma relacionada
perda de peso, sendo que a maioria das pesquisas disponveis aponta para a ineficincia de c
comprovao cientifica suficiente para esse beneficio (NIEMAN et al, 2009; ULBRICHT et
al, 2009 ; EGRAS et al, 2011).
Figura 4 - Semente de chia hidratada
-
33
2.2.1 Semente de chia e legislao brasileira
Apesar de todos os benefcios dos compostos presentes na semente de chia
demonstrados pela literatura internacional, ela ainda no reconhecida como um alimento
seguro para comercializao pela legislao brasileira, devido escassez de pesquisas
relacionando a caracterizao desta semente e seus benefcios sade humana. Para que a
ANVISA reconhea a mesma como segura, deve-se enviar uma solicitao de registro como
Novo Alimento, pois esta Agncia compreende que, alimentos sem tradio de consumo no
pas devem ser avaliados pela mesma antes de serem comercializados (BRASIL, 1999 (b);
BRASIL, 1999 (c)). Alguns alimentos j aprovados pela ANVISA, e que no necessitam de
registro de novo alimento para comercializao esto descritos na Tabela 5.
Tabela 5 - Alimentos j aprovados pela ANVISA e seus requisitos na rotulagem
Fonte: (BRASIL, 1999b).
Ingrediente Requisitos
Amido resistente com alto teor de amilose Declarar na Tabela de informao nutricional como fibra alimentar. No
permitido especific-la abaixo do valor de fibra alimentar.
Beta-glucana de levedo de cerveja -
Saccahromyces cerevisiae
Rotulagem:Especificar a fonte da beta-glucana (Saccahromyces cerevisiae)
junto declarao da mesma na lista de ingredientes do rtulo
Colgeno Hidrolisado/gelatina hidrolisada Sem requisito adicional.
Frutooligossacardeo - FOS - declarar na Tabela de informao nutricional como fibra alimentar. No
permitido especific-la abaixo do valor de fibra.
Goma accia (Goma Arbica) - declarar na Tabela de informao nutricional como fibra alimentar. No
permitido especific-la abaixo do valor de fibra alimentar
Goma guar parcialmente hidrolisada - declarar na Tabela de informao nutricional como fibra alimentar. No
permitido especific-la abaixo do valor de fibra alimentar.
Inulina - declarar na Tabela de informao nutricional como fibra alimentar. No
permitido especific-la abaixo do valor de fibra alimentar.
Inulo-oligossacardeos - declarar na Tabela de informao nutricional como fibra alimentar. No
permitido especific-la abaixo do valor de fibra alimentar.
Polidextrose - declarar na Tabela de informao nutricional como fibra alimentar. No
permitido especific-la abaixo do valor de fibra. A recomendao diria de
consumo do produto no deve resultar na ingesto de polidextrose acima de
90g ou cuja poro nica de consumo resulte em ingesto de polidextrose
superior a 50g.
Trealose Rotulagem: incluir a seguinte informao: "Este produto pode ter efeito
laxativo", para os alimentos cuja poro nica de consumo resulte em ingesto
de trealose superior a 50 g.
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34
O processo de registro para novo alimento, no entanto, extremamente burocrtico e
demanda elevado custo, pois a empresa/instituio a qual deseja obt-lo para comercializao
como novo alimento deve apresentaras seguinte documentao (BRASIL 2008):
denominao do produto;
origem ou fonte de obteno;
finalidade de uso;
recomendao de consumo;
histrico de uso, bem como sua forma de consumo em outros pases;
especificao da origem do produto e ou do novo ingrediente, ou seja, a espcie
botnica ou a espcie animal ou a fonte mineral, quando for o caso;
composio qumica do novo ingrediente, quando se tratar de uma substncia
desconhecida ou uma modificao da estrutura qumica de um ingrediente conhecido;
processo de fabricao do produto;
laudo de anlise que comprove a quantidade do ingrediente ou substncia no produto;
laudo de anlise de contaminantes no produto, como por exemplo, metais pesados,
micotoxinas, resduos de agrotxicos ou de drogas veterinrias, dependendo da origem do
produto;
descrio da metodologia analtica para avaliao do novo ingrediente ou substncia
no alimento;
evidncias cientficas aplicveis comprovao de segurana de uso:
- ensaios nutricionais e ou fisiolgicos e ou toxicolgicos em animais;
- ensaios bioqumicos;
- estudos epidemiolgicos;
- ensaios clnicos;
- comprovao de uso tradicional, observado na populao, sem danos sade;
- evidncias abrangentes da literatura cientfica, organismos internacionais de sade e
legislao internacionalmente reconhecida sobre as caractersticas do alimento ou ingrediente.
H ainda de se realizar o pagamento de uma taxa que varia de acordo com o porte da
empresa e aguardar o aval da Agncia, que pode ser negado caso a mesma conclua que no h
evidencias suficientes para liberao do produto para consumo (BRASIL, 1999(d)). Para a
maioria das indstrias, esse tramite torna-se invivel, pois, mesmo que haja aprovao da
ANVISA para comercializao do alimento requerido, a empresa detentora do registro no
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35
pode fazer nenhuma alegao de benefcio sade/preveno de doenas no rtulo do
produto.
Por este motivo, essencial que mais estudos sejam realizados com a semente de chia
para fornecer suporte ANVISA, a fim de viabilizar a comercializao deste alimento sem
restrio no Brasil, assim como diversas outras sementes/gros/cereais j o so (exemplo:
aveia, linhaa, etc).
2.3 Pes
Historiadores relatam que os primeiros pes foram produzidos por volta de 10.000 anos
a.C, com uma formulao mais rudimentar que a conhecida atualmente, composta por cereais
selvagens e gua, os quais eram cozidos ao sol (PHILIPPI, 2003). Por volta de 2600 a.C., os
egpcios descobriram o processo fermentativo ao misturar gua e farinha, deixando-as ao sol
at que se formassem bolhas, que eram ento assadas entre pedras aquecidas (JACOB, 2003).
Atualmente cada regio possui seu tipo caracterstico, sendo poucas as culturas que no o
consomem. Esse um alimento rico em carboidratos e protenas, mas pobre em fibras e com
elevado ndice glicmico (BURTON et al, 2011).
No Brasil, a Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria (ANVISA) define po como todo
produto obtido pela coco, em condies tcnicas adequadas, de massa preparada com
farinha de trigo, fermento biolgico, gua e sal, podendo conter outras substncias
alimentcias aprovadas (BRASIL, 2000), sendo que a farinha de trigo o principal ingrediente
da formulao. Essa matria prima responsvel pelo fornecimento de protenas que atuam
na formao da rede de glten que, juntamente com gua, conferem estrutura elstica
caracterstica desses produtos. As quantidades de todas as outras matrias primas so
calculadas em relao farinha de trigo, a qual corresponde a uma base de 100% (MATUDA,
2004).
A produo de pes consiste basicamente em homogeneizar, solubilizar e hidratar
adequadamente os ingredientes da massa em uma masseira destinada a essa finalidade e
posterior assamento, o qual tem seu tempo determinado pelo tipo de forno utilizado e pelo
tipo de po a ser produzido (CARR E TADINI, 2003). A qualidade de uma massa pode ser
mensurada por sua habilidade de reter o gs e por suas propriedades visco elsticas, as quais
definem o volume final, auxiliam na expanso adequada durante a fermentao e atuam nas
etapas que antecedem o assamento (PATIENT E AINSWORTH, 1994). Para a
homogeneizao da massa, empregado um trabalho mecnico que normalmente realizado
em duas etapas, sendo a primeira em uma velocidade mais reduzida, para garantir a
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36
incorporao da gua pela farinha de trigo, e a segunda em velocidade mais acelerada, na qual
se formam as estrutura das redes de glten, que acontecem em estgios distintos: na fase
inicial, as molculas de protena so hidratadas e as suas fibrilas se aderem umas s outras
formando uma rede desorganizada de fios espessos (Figura 5a) (STAUFER, 1998). No
estgio seguinte, a ao mecnica contnua torna os fios mais finos e organizados, facilitando
a interao entre eles (Figura 5b) e, na fase final, o pico de consistncia formado. Nessa
etapa, o dimetro das fibrilas de protenas reduzido significativamente, resultando em uma
massa que pode ser estendida em forma de filme contnuo, conforme observado na Figura 5c
(PATIENT E AINSWORTH, 1994; STAUFER, 1998). Essa ultima etapa fundamental no
processo produtivo dos pes, pois, caso a mistura continue sendo homogeneizada aps a
formao do pico de resistncia, a massa pode se tornar mole, menos resistente e ter sua
capacidade de reter gs durante a fermentao comprometida (STAUFER, 1998).
Figura 5 - Rede de glten em diferentes estgios de mistura; (a) incio do processo de mistura, hidratao parcial;
(b) massa parcialmente misturada; (c) massa no estgio de desenvolvimento mximo. Fonte:
STAUFER, 1998
Alm da farinha de trigo, outros ingredientes bsicos so utilizados na produo de
pes, entre eles o acar (substrato para fermentao, confere maior maciez e participa das
reaes de Maillard, acarretando na colorao caracterstica no produto final), gua (auxilia
na homogeneizao dos ingredientes e na formao da rede de glten), fermento (metaboliza
acares sob condies anaerbias, resultando na produo de gs carbnico (CO2), o qual
essencial para o crescimento da massa e obteno dos compostos aromticos caractersticos
deste alimento) (LAAKSONEN, 2001; CAUVAIN E YOUNG, 2009), etc. O sal tambm
um componente essencial na fabricao de pes por atuar diretamente na formao da rede de
glten, controlar a fermentao (que depende tambm dos ingredientes e aditivos utilizados,
quantidade de levedura, da temperatura e umidade local) e, principalmente, fornecer sabor ao
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37
produto (pouco sal torna o alimento inspido, enquanto que o excesso de fermentao tende a
fornecer um sabor cido) e garantir melhor palatabilidade ao mesmo (CARR E TADINI,
2003). No entanto, a ANVISA divulgou em 2012 um documento estabelecendo metas da
reduo deste composto no po francs: segundo essa Agncia, foi determinado que a adio
de sal ao produto seja progressivamente reduzida de 2% para 1,8% at o final de 2014, o que
representar uma reduo de 10% na quantidade de sdio no produto final. Por exemplo: uma
unidade de po francs (50g) que em 2011 apresentava em mdia 320 mg de sdio, ter
aproximadamente 289 mg em 2014 (BRASIL, 2012; DAUGIRDAS 2013).
Segundo a Associao Brasileira da Indstria de Panificao e Confeitaria (ABIP), esse
setor alcanou um faturamento de aproximadamente 63 bilhes de reais em 2011, um
crescimento de cerca de 12% em relao ao ano de 2010, quando o faturamento foi de 56
bilhes (ABIP, 2012). Os empregos gerados tambm apresentaram aumento no ano de 2011
(2,8% em relao a 2010), o que representa 21 mil novos funcionrios atuando no setor de
panificao, que emprega diretamente 780 mil pessoas, e mais 1,8 milhes de forma indireta
(ABIP, 2012). Apesar disso, o consumo per capita brasileiro (30kg/habitante/ano) bem
abaixo do estipulado pela ORGANIZAO MUNDIAL DA SADE (OMS), que de
60kg/habitante/ano e de outros pases da Amrica Latina, conforme Tabela 6 (ABIP, 2011).
Tabela 6 - Consumo de po (kg/habitante/ano) em pases da Amrica Latina
PAS QUILOS/HABITANTE
Chile 98
Argentina 82,5
Uruguai 55
Costa Rica 52
Brasil 33,5
Mxico 32,5
Colmbia 24
Honduras 18,1
Fonte: ABIP, 2011.
A produo de pes que incorporam sua formulao ingredientes diferenciados, como
fibras, gros, multigros, etc, tem aumentado progressivamente, vide as vrias opes
disponveis comercialmente. Esse aumento deve-se principalmente ao crescente interesse da
populao em adquirir alimentos que tragam benefcios sade, aliando a reduo do
consumo de carboidratos simples, gorduras e sdio diminuio do risco de doenas como
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obesidade e diabetes mellitus (SIVAM et al, 2010; SALGADO et al, 2011; MERAL E
DOAN, 2012; MONTONEN et al, 2012). As modificaes na frmula dos pes,
acrescentando outros ingredientes em detrimento farinha de trigo, acar ou gordura pode
levar a diluio das protenas formadoras de glten, afetando a caracterstica da massa
(absoro de gua e tempo de fermentao), uma vez que o produto final pode ter seu volume
especfico diminudo alm de outras modificaes, como aumento da firmeza do miolo,
aparncia mais escura e textura modificada (WANG et al, 2002; GOMEZ et al, 2003,
BARTKIENE et al, 2012).
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3 MATERIAL E MTODOS
As anlises foram realizadas na semente de chia em forma de farinha (FSC) e nos
produtos desenvolvidos (po tradicional e pes enriquecidos com FSC em diferentes
concentraes). A caracterizao centesimal e de compostos bioativos foram efetuadas em
triplicata no Laboratrio de Bromatologia e Nutrio Experimental, pertencente ao
Departamento de Agroindstria, Alimentos e Nutrio da Escola Superior de Agricultura
Luiz de Queiroz (ESALQ) /USP, em Piracicaba/SP. As anlises de micotoxinas foram
realizadas no Laboratrio de Micotoxinas, e as anlises microbiolgicas dos pes destinados
anlise sensorial foram feitas no Laboratrio de Microbiologia de Alimentos, pertencentes ao
mesmo departamento e Instituio. As anlises de minerais foram realizadas no Laboratrio
de Nutrio Mineral de Plantas do Departamento de Cincias dos Solos e os cidos graxos
foram determinados no laboratrio de Bromatologia do Departamento de Zootecnia, ambos
pertencentes Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ)/USP. As anlises
de aminograma foram realizadas no Laboratrio de Fontes Proteicas, pertencente ao
Departamento de Alimentos e Nutrio da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).
3.1 Caracterizao da matria prima
A semente de chia foi adquirida no mercado municipal da cidade de Piracicaba/SP,
sendo transportada do estabelecimento comercial at o laboratrio em caixa climatizada, a fim
de se evitar danos/degradao de qualquer componente desses insumos. Ao chegar ao
Laboratrio de Bromatologia e Nutrio Experimental, a semente foi moda e transformada
em farinha, conforme indicado na Figura 6.
Figura 6 - Semente de chia ntegra (a) e moda, na forma de farinha (b)
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40
A farinha foi ento armazenada em plsticos de polietileno, sendo seladas e armazenada
sob refrigerao (4C) at o momento das respectivas anlises. A semente de chia foi
quantificada quanto a sua composio centesimal, teor de cidos graxos, aminograma,
micotoxinas e compostos ativos, cujos mtodos esto detalhados a seguir:
3.1.1 Composio Centesimal
Matria seca - A matria seca foi determinada por diferena de peso das amostras
previamente pesada em cadinhos, as quais foram submetidas a aquecimento em estufa por
105C durante 24h, segundo metodologia sugerida pela AOAC, 2005.
Matria mineral - Os teores de matria mineral foram obtidos por diferena de peso
obtida pela incinerao da matria orgnica das amostras, submetidas a aquecimento (550C)
em mufla por 4h (AOAC, 2005).
Protena bruta - A extrao e quantificao de protenas foram realizadas de acordo
com mtodo Kkjeldahl (metodologia 920.152, AOAC, 2005), que consiste na digesto da
amostra em bloco aquecido a 350C, destilao (destilador modelo TE-636/1 Tecnal) com
NaOH 11N em cido brico e soluo indicadora de verde de bromocrezol e vermelho de
metila e titulao com cido sulfrico 0,02N, utilizando o fator 6,25 para converso do
nitrognio, sendo possvel quantificar o teor proteico de cada amostra. Foi realizada tambm
anlise de protena do resduo resultante da anlise de fibras (solvel e insolvel). Essa etapa
necessria para que sejam posteriormente realizados os clculos de fibras solveis,
insolveis e totais, conforme metodologia descrita abaixo.
Extrato etreo - A extrao e quantificao de extrato etreo foram realizadas pelo
mtodo da AOAC, 2005, sendo o teor de gordura total de cada amostra determinado atravs
de extrao com ter etlico no Extrator Soxlet Micro e calculado por diferena de peso.
Carboidratos - O contedo de carboidratos foi realizado por excluso do valor obtido
pela somatria dos valores das anlises do extrato etreo, resduo mineral (cinzas), fibras
totais, umidade e protena (PREGNOLATTO E PREGNOLATTO, 1985; BRASIL, 2003),
conforme frmula abaixo:
% carboidratos = 100 (% umidade + % cinzas + %extrato etreo + % fibras totais + % protena)
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41
Fibras - A extrao e quantificao do teor de fibras foram realizadas segundo
metodologia que envolve digesto enzimtica das amostras com -amilase para promover a
hidrlise do amido e pepsina, seguidas de pancreatina para a degradao da protena e
posterior filtragem em cadinhos porosos com celite, alm de precipitao com lcool etlico
95%, obtendo-se desta maneira, as fraes insolveis e solveis (ASP et al, 1983). Foi
utilizado o seguinte clculo para a determinao da porcentagem de fibras das amostras:
% fibra total (FT) = FI + FS
Sendo que:
W = peso amostra (g);
D = peso aps secar (g);
I = peso aps incinerar (g);
B = branco
3.1.2 Aminocidos
O perfil de aminocidos foi determinado de acordo com mtodo cromatogrfico descrito
por White Et al, 1986, o qual consiste na hidrlise por 24 horas a 110C em cido clordrico
(HCl) 6N, com fenol, seguida de filtrao, secagem e derivatizao. Posteriormente as
amostras foram transferidas para frasco de injeo com uma pipeta descartvel e foram
quantificadas, de acordo com respectivos padres, quanto ao perfil de aminocidos em
cromatgrafo lquido previamente condicionado equipado com coluna Luna C18 100 5u,
250 x 4.6mm 00G-4252-EQ (PHENOMENEX - USA Torrance, CA.), vlvula de injeo
Rheodyne Forno Thermasphere TS-130 HPLC (PHENOMENEX - USA Torrance, CA),
modulo de deteco UV SPECTRA SYSTEM UV 2000 (Thermo Separation Products), pela
absortividade UV em 254nm.
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3.1.3 cidos graxos
Para a determinao de cidos graxos, os lipdios da semente de chia foram extrados e
estericados de acordo com a metodologia descrita por HARTMAN E LAGO, 1983, sendo
pesados de 1g de amostra e adicionados 5 mL de soluo de NaOH 0,5 mol/L em metanol e a
mistura foi levada para aquecimento por 5 minutos. Posteriormente, foram adicionados 15 mL
do reagente de esterificao (preparado a partir da mistura de 2 g de cloreto de amnio, 60 mL
de metanol e 3 mL de cido sulfrico concentrado, aquecida por aproximadamente 15
minutos) e a mistura foi aquecida por mais 3 minutos e, em seguida, foi transferida para um
funil de separao juntamente com 25 mL de ter de petrleo e 50 mL de gua deionizada.
Aps agitao e separao das fases, descartou-se a fase aquosa. Adicionou-se 25 mL de gua
deionizada fase orgnica, agitou-se e aps a separao das fases, a aquosa foi descartada e o
procedimento repetido. A fase orgnica foi coletada, o solvente evaporado em evaporador
rotativo e o resduo foi removido sob fluxo de nitrognio. Os steres metlicos foram
solubilizados em n-heptano para posterior injeo no cromatgrafo gasoso (marca Shimadzu
modelo GC-14 B, equipado com detector por ionizao em chama, injetor do tipo split, coluna
capilar de slica fundida -50 m de comprimento x 0,22 mm de dimetro interno, Shimadzu-
Hicap, Austrlia). As condies cromatogrcas foram: temperatura da coluna em 180C
(isotrmica); gs de arraste, hidrognio numa vazo de 1,05 mL/minuto; temperatura do
detector e do injetor de 250C.
3.1.4 Minerais
Para determinao dos teores dos minerais presentes nos pes desenvolvidos, foi pesado
0,5g de amostra em tubos de digesto, e adicionados 10mL de cido ntrico, sendo esses
armazenados em capela por 12h. Aps esse perodo, as amostras foram digeridas em bloco
digestor com variao de temperatura crescente at 150C. Aps o resfriamento das amostras,
foi adicionado 1mL de cido perclrico e as mesmas foram novamente levadas ao bloco
digestor a 150C, elevando-se a temperatura at 250C. Aps o resfriamento da segunda etapa
de digesto, as amostras foram transferidas para frascos apropriados e completado volume at
25mL com gua destilada. Por fim, cada amostra foi transferida para frascos de absorbncia
em espectrofotmetro de absoro atmica (Perkim Elmer, 3110), e lidas a 248,3nm, obtendo-
se assim a determinao de clcio, cobre, ferro, fsforo, magnsio, mangans, potssio, zinco,
enxofre e sdio (SARRUGE E HAAG, 1974).
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3.1.5 Compostos bioativos
Atividade antioxidante (DPPH)
O teor de atividade antioxidante foi realizado na semente de chia na forma de farinha
desengordurada e no oleo da semente de chia (os lipideos foram separados pelo mtodo
Soxlet, previamente citado), a fim de estabelecer a comparaao entre o potencial antioxidante
de cada forma dessas materias primas. Foi utlizada a metodologia que avalia a atividade
antioxidante de componentes atravs do sequestro do radical DPPH (1,1- diphenyl- 2- picryl-
hydrazy), ou seja, o mtodo DPPH tem como base a reduo da absorbncia por
antioxidantes na regio visvel de comprimento de onda de 517 nm do radical DPPH. Para
isso, as amostras foram homogeneizadas e, aps extrao com metanol 80% (acetato de etila
para anlise do leo), foram mantidas por 40 minutos em local escuro, temperatura
ambiente. Posteriormente foi realizada leitura da absorbncia em espectrofotmetro a 517 nm
(BRAND-WILLIAMS et al, 1995).
Compostos fenlicos
A determinao dos contedos de compostos fenlicos totais foi realizada de acordo
com o mtodo que consiste na extrao desses compostos com metanol (SWAIN E HILLIS,
1959) e acetato de etila e/ou tolueno para anlise do leo. Essa metodologia utiliza o reagente
de Folin-Ciocalteau como agente redutor, e a catequina para construo da curva- padro. As
amostras e a catequina foram diludas em soluo hidroalcolica a 80% e posteriormente
determinadas por leitura em espectrofotmetro a 660 nm.
Taninos
A determinao do teor de taninos foi realizada por metodologia de extrao em
metanol (acetato de etila para anlise do leo), reao colorimtrica com soluo de vanilina a
1% em metanol 8% de HCl em metanol, na proporo 1:1, e subsequente repouso a 30C por
20 minutos. Posteriormente foi realizada leitura em espectrofotmetro a 500 nm. A
concentrao de taninos foi obtida a partir de uma curva padro de catequina, sendo os
resultados expressos em mEq de catequina/g de amostra (PRICE et al, 1980).
cido ftico
O teor de cido ftico foi determinado por metodologia sugerida por GRYNSPAN E
CHERYAN, 1989. 0,5g de amostra foram digeridos em 10mL de soluo de HCl 0,65N, com
posterior agitao e centrifugao a 300 rpm durante 10 minutos. Aps isso, foram pipetados
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2mL do sobrenadante em balo volumtrico de 25 mL, sendo esse volume completado com
gua destilada. Pipetou-se 10mL dessa soluo para bureta contendo resina, controlando o
fluxo de gotejamento a um a velocidade de 1 gota/segundo. Em seguida, foram pipetados 15
mL de soluo NaCl 0,1M na bureta e logo aps, mais 15 mL de soluo NaCl 0,7M, sendo o
eludo recolhido em bquer. Alquotas de 5mL foram pipetadas em tubos de ensaio,
adicionando 1mL de reagente Wade, sob agitao. A leitura da absorbncia foi realizada aps
15 minutos, em espectrofotmetro (DU 640, Beckman) a 500 nm. Para anlise no leo, foi
utilizado acetato de etila como substituto dos reagentes no lipoflicos.
3.1.6 Micotoxinas
As anlises de micotoxinas foram realizadas visando avaliar a presena de componentes
toxicolgicos nas sementes de chia utilizadas nessa pesquisa. A avaliao de micotoxinas
consistiu na deteco de aflatoxinas (B1, B2, G1 e G2), zearalenona e ocratoxina A, as quais
foram realizadas por cromatografia em camada delgada (CCD) utilizando extrao com
MeOH:KCl (9:1) e posterior quantificao em CCD de slica por comparao da
fluorescncia da amostra com padres conhecidos de micotoxinas, segundo procedimentos
preconizados por SOARES E RODRIGUEZ-AMAYA (1989).
3.2 Desenvolvimento do produto
3.2.1 Farinha de semente de chia no desenvolvimento de pes funcionais
A FSC utilizada para a produo dos pes funcionais foi obtida a partir da triturao da
semente em moinho, sendo selada logo aps a triturao e armazenada em saco de polietileno
laminado sob refrigerao 4C at o momento de sua utilizao.
3.2.2 Produo dos pes funcionais
A FSC foi utilizada na composio do desenvolvimento do po funcional em detrimento
farinha de trigo, na proporo de 3%, 6% e 9%. Foi desenvolvida tambm uma amostra
controle apenas com adio de farinha de trigo, conforme demonstrado na Tabela 7.
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Tabela 7 - Composio percentual de ingredientes dos pes desenvolvidos
Ingredientes Adio de Semente de Chia
0% 3% 6% 9%
Farinha de trigo (g) 1000 970 940 910
Semente de chia(g) 0 30 60 90
Acar refinado (g) 100 100 100 100
Sal refinado (g) 15 15 15 15
Ovos (g) 5 5 5 5
Margarina (g) 82 82 82 82
Fermento biolgico (g) 50 50 50 50
Melhorador (g) 20 20 20 20
gua (mL) 200 200 200 200
Para o preparo das quatro formulaes, todos os ingredientes foram inicialmente
pesados e separados. Primeiramente, homogeneizou-se apenas a farinha de semente de chia e
a farinha de trigo, quando aplicvel. Em seguida, todos os demais ingredientes foram
adicionados e homogeneizados em amassadeira espiral (marca Superfecta, modelo AE 15E)
at se desenvolver a rede de glten (ponto de vu), por aproximadamente 15-20 minutos. A
massa foi dividida e cortada em pedaos de 80g, boleadas, modeladas, untadas com leo de
soja e farinha de trigo, e disposta em assadeiras retangulares, as quais foram inseridas em
cmaras de fermentao com temperatura e umidade controladas (37C e 90%,
respectivamente), durante 90 minutos.
Aps esse perodo, os pes foram assados em forno turbo (Tedesco, Flex FTF 08G) a
145C por 15 minutos e quando retirados, foram resfriados em temperatura ambiente,
amostrados e adequadamente embalados e lacrados em sacos de polietileno. Essas amostras
foram destinadas a anlise fsico-qumica, microbiolgica e sensorial, visando avaliar a
percepo dos consumidores pelo teste de aceitabilidade por escala hednica. A Figura 7
representa o fluxograma da produo dos respectivos pes.
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Figura 7 - Fluxograma simplificado da produo dos pes funcionais; Fonte: BRASIL, 2000
3.2.3 Anlises dos pes
No total, foram fabricados cerca de 30 pes de cada formulao (0, 3, 6 e 9% de FSC)
na primeira fornada, os quais foram destinados s anlises de caracterizao fsico-qumicas e
funcionais. Aps a finalizao dessas anlises, foi produzida uma nova fornada (30 pes) a
qual foi destinada anlise sensorial, sendo que todos os pes desenvolvidos foram
submetidos anlise microbiolgica para garantia da inocuidade dos produtos.
As anlises de composio centesimal, aminograma, cidos graxos minerais e
compostos bioativos foram realizadas de acordo com metodologia j descrita nos itens 3.1.1,
3.1.2, 3.1.3, 3.1.4 e 3.1.5, respectivamente. Alm disso, foram realizadas as seguintes anlises
nos pes:
3.2.3.1 Anlises microbiolgicas
Foram realizadas anlises microbiolgicas de coliformes totais e salmonela, de acordo
com o Regulamento tcnico sobre padres microbiolgicos para alimentos, estabelecido pela
ANVISA (BRASIL, 2001(b)). No foram realizadas anlises microbiolgicas de bolores e
leveduras, uma vez que o objetivo principal dessas anlises foi assegurar a segurana
alimentar dos provadores e no o tempo de vida til dos produtos.
A determinao de Salmonella foi realizada pela pesagem