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1 Seminário POLÍTICAS CULTURAIS E POVOS INDÍGENAS A escola e outros problemas CEBRAP/CEstA (USP) 02 – 04 DE OUTUBRO DE 2013 UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Prédio de Ciências Sociais e Filosofia da Cidade Universitária (USP) Salas 14 e 08 Políticas culturais dos índios e para os índios têm efeitos que merecem exame. Iniciativas de patrimonialização de arte, conhecimentos, técnicas, lugares, línguas serão discutidas nesse seminário. Mas de todas as políticas culturais, a escola é provavelmente a de maior impacto e uma atenção especial será dedicada a sua análise. O seminário é uma iniciativa conjunta do projeto do CEBRAP que analisa os efeitos das políticas culturais em populações indígenas, financiado pela Fundação Ford, com o CEstA, Centro de Estudos Ameríndios da USP. PROGRAMAÇÃO 1º Dia - 02/10/2013 14: 00 - Abertura: Manuela Carneiro da Cunha Iniciativas culturais I Debatedor: Pedro Cesarino 14:20 - Marcela Coelho de Souza: “Conhecimento tradicional e seus conhecedores: uma ciência duas vezes concreta” 14:50 - Uraan Anderson Suruí e Maria Thais Santos: “Pensamento e Criação Paiter e o Projeto ‘Perspectivas Intercambiáveis: o teatro na Aldeia Gãpgir’” 15:20 - José R. Bessa: “Demarcação das línguas indígenas” 15.50 - Debate EM VIRTUDE DA MANIFESTAÇÃO INDÍGENA NO VÃO DO MASP ÀS 17 HORAS, A PROGRAMAÇÃO DO DIA 2 DE TARDE FOI REMANEJADA PARA TERMINAR ÀS 16.30. 2º Dia - 03/10/2013 Debatedor: Marcela Coelho de Souza Iniciativas culturais II 09:30 - Edilene Cofacci de Lima: “A internacionalização do kampô (via ayahuasca): difusão global e efeitos locais” 10:00 - Joaquim Maná, José Benedito Ferreira Kaxinawa, Marcos Matos e Paulo Roberto Ferreira: “Observações Sobre o Processo de Patrimonialização dos Kene Huni Kuĩ”

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Seminário

POLÍTICAS CULTURAIS E POVOS INDÍGENAS

A escola e outros problemas

CEBRAP/CEstA (USP)

02 – 04 DE OUTUBRO DE 2013

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Prédio de Ciências Sociais e Filosofia da Cidade Universitária (USP) Salas 14 e 08

Políticas culturais dos índios e para os índios têm efeitos que merecem exame. Iniciativas de

patrimonialização de arte, conhecimentos, técnicas, lugares, línguas serão discutidas nesse

seminário. Mas de todas as políticas culturais, a escola é provavelmente a de maior impacto e

uma atenção especial será dedicada a sua análise.

O seminário é uma iniciativa conjunta do projeto do CEBRAP que analisa os efeitos das políticas

culturais em populações indígenas, financiado pela Fundação Ford, com o CEstA, Centro de

Estudos Ameríndios da USP.

PROGRAMAÇÃO

1º Dia - 02/10/2013

14: 00 - Abertura: Manuela Carneiro da Cunha

Iniciativas culturais I Debatedor: Pedro Cesarino

14:20 - Marcela Coelho de Souza: “Conhecimento tradicional e seus conhecedores: uma ciência duas

vezes concreta”

14:50 - Uraan Anderson Suruí e Maria Thais Santos: “Pensamento e Criação Paiter e o Projeto

‘Perspectivas Intercambiáveis: o teatro na Aldeia Gãpgir’”

15:20 - José R. Bessa: “Demarcação das línguas indígenas”

15.50 - Debate

EM VIRTUDE DA MANIFESTAÇÃO INDÍGENA NO VÃO DO MASP ÀS 17 HORAS, A PROGRAMAÇÃO DO

DIA 2 DE TARDE FOI REMANEJADA PARA TERMINAR ÀS 16.30.

2º Dia - 03/10/2013

Debatedor: Marcela Coelho de Souza

Iniciativas culturais II 09:30 - Edilene Cofacci de Lima: “A internacionalização do kampô (via ayahuasca): difusão global e

efeitos locais”

10:00 - Joaquim Maná, José Benedito Ferreira Kaxinawa, Marcos Matos e Paulo Roberto Ferreira:

“Observações Sobre o Processo de Patrimonialização dos Kene Huni Kuĩ”

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10:40 - Artionka Capiberibe: “Não cutuque a cultura com vara curta: os Palikur e o projeto ‘Ponte entre

Povos’”

11:10 - Intervalo

11:30 - Joana Cabral de Oliveira: “A inconveniência das perguntas: Confronto entre o construtivismo e

duas teorias ameríndias de conhecimento.”

12:00 - Julia Otero dos Santos: “Notas sobre os usos e sentidos da cultura entre os Arara de Rondônia”

12:30 - Debate

Escola I Debatedor: José Bessa

14:30 - Maximiliano Menezes e Raphael Rodrigues: “Reflexões e experiências de um estudante-

liderança: os efeitos das políticas educacionais nas comunidades do alto rio Negro”

15:10 - Clarice Cohn: “A cultura nas escolas indígenas”

15:40 - Rita Potyguara: “Os professores indígenas como agentes culturais e a escola diferenciada como

‘local das culturas’: discursividades Tapeba, Pitaguary e Jenipapo-Kanindé”

16:10 - Intervalo

16:30 - Augusto Ventura e Luiz Henrique Eloy: “Os Terena e o Ensino Superior para Indígenas no Mato

Grosso do Sul”

17:00 - Marta Azevedo: “Os processos de gestão e transmissão dos conhecimentos tradicionais dos

povos indígenas e a educação escolar”

17:30 - Debate

3º Dia - 04/10/2013

Escola II Debatedor: Geraldo Andrello

09:00 - Ana Gomes: “A formação de professores indígenas na UFMG e os “projetos sociais” entre os

Xakriabá: explorando as políticas em campo com os povos indígenas

Célia Nunes Correia Xakriabá: “Comentário”

09:40 - Marina Vieira: “Pacificando os brancos: apreciações sobre a implementação de políticas culturais

e educacionais entre os Maxakali”

10:10 - Mutuá Mehinaku: “Visão Dupla”

10:40 - Intervalo

11:00 - Fabiano Bechelany: “Presença da Escola Matukré e transformações no cotidiano Panará (MT)”

11:30 - Nicole Soares-Pinto: “Sobre alguns modos de usar a cultura dos outros: reflexões djeoromitxi e

direitos culturais.”

12:10 – Debate

12:40 - Encerramento: Dominique Gallois

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CADERNO DE RESUMOS

A formação de professores indígenas na UFMG e os “projetos sociais” entre os Xakriabá: explorando

as políticas em campo com os povos indígenas

Ana Maria R. Gomes (Observatório da Educação Escolar Indígena/ UFMG) e Shirley Aparecida de

Miranda (Curso Formação Intercultural de Educadores Indígenas/UFMG)

O curso de Formação Intercultural de Educadores Indígenas teve sua primeira turma instituída pelo

Prolind/ Secad- MEC (Programa Pro-Licenciatura Indígena) em 2006; e em 2009, no âmbito do REUNI

(Reestruturação e Expansão das Universidades Federais), tornou-se curso de oferta anual. Desde então

o FIEI vem trabalhando com cerca de oito povos indígenas, e em sua configuração atual conta com

presença significativa de estudantes dos povos Xakriabá (MG), Pataxó (MG e BA), e recente inserção de

estudantes do povo Guarani (RJ) e Maxakali (MG). O FIEI diplomou 132 professores indígenas de MG em

2011; e a primeira turma da oferta regular se diploma em 2013. Seu funcionamento tem estreita relação

com as atividades de pesquisa desenvolvidas pelo Observatório de Educação Escolar Indígena

(OEEI/UFMG), em programa financiado pela CAPES, desenvolvendo ação conjunta que objetiva ampliar

e consolidar a interlocução da instituição com os povos indígenas envolvidos na formação de

professores.

Na primeira parte do artigo, analisaremos a experiência do FIEI, um curso que se estrutura, desde sua

criação, a partir da gestão compartilhada entre indígenas e não-indígenas, através da representação de

estudantes e lideranças indígenas em seu Colegiado. Recentemente, foi instituído o Conselho Consultivo

Indígena do FIEI, que deu caráter oficial a essa forma de gestão. As decisões quanto à modalidade da

oferta e as formas de enfrentar as limitações impostas pelo aparato institucional são sempre conduzidas

nesse fórum comum, e alimentadas pela ida regular dos docentes às terras indígenas para realização de

atividades acadêmicas e para reuniões de concertação com as comunidades envolvidas.

O último processo seletivo revelou que ainda existe uma demanda expressiva pela formação (para 35

vagas, houve 123 candidatos, mais de 180 acessos online), demanda essa que temos buscado discutir e

melhor compreender com os povos indígenas envolvidos, uma vez que se trata de universos

demograficamente reduzidos, por um lado, e com dinâmicas descontínuas e que oscilam em função de

diferentes fatores, por outro. A avaliação dos próprios estudantes indígenas – já formados e potenciais

alunos – assim como das lideranças que acompanham o curso, tem sido de fundamental importância

para se compreender o atual quadro da formação de professores indígenas.

Na segunda parte do artigo, iremos aprofundar alguns casos do percurso de formação de estudantes nos

quais convergem diferentes políticas culturais (como os Pontos de Cultura, o Fundo Estadual de Cultura,

e o Prêmio Culturas Indígenas, dentre outros) e as políticas da educação e formação de professores.

Nesses percursos, houve um interessante e significativo entrelaçamento entre práticas e conhecimentos

tradicionais, contato entre estudantes e sábios de diferentes povos indígenas oportunizados pelo curso,

e o desenvolvimento de pesquisas pelos próprios estudantes que articulam a renovação de sua relação

com os sábios e conhecedores tradicionais de seu povo, e o acesso a novas tecnologias e

conhecimentos.

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Não cutuque a cultura com vara curta: os Palikur e o projeto “Ponte entre Povos”

Artionka Capiberibe (EFLCH/UNIFESP)

Esta apresentação, que é fruto de pesquisas realizadas entre os Palikur, população indígena falante de

uma língua da família arawak-maipure que vive na região da fronteira Brasil/Guiana francesa, insere-se

na seara das relações entre índios e não índios e das indagações a respeito do sentido do termo ‘cultura’

suscitadas por estas relações. O objetivo aqui é o de refletir a respeito dos entendimentos gerados entre

os participantes palikur de um evento musical/transcultural, o “Ponte entre Povos”, coordenado pela

música Marlui Miranda, no qual participaram cinco povos indígenas da região Amapá/Norte do Pará,

músicos eruditos, antropólogos, linguistas e uma grande equipe de produção. Para os Palikur, que em

grande maioria se declaram evangélicos, este “projeto cultural” de cantar e representar as músicas “de

antigamente” significou mexer com um universo xamânico que, desde a evangelização, goza de um

estatuto mais negativo que positivo, e ao mesmo tempo, pôr-se em falta com a própria religiosidade

cristã. A apresentação buscará demonstrar como e porque um projeto inserido na chave da “cultura”,

suposto ser apenas uma demonstração e valorização desta frente aos não índios, extrapolou em muito

este campo, mexendo com questões tais como: noção de pessoa, cosmologia e socialidade.

Os Terena e o Ensino Superior para Indígenas no Mato Grosso do Sul

Augusto Ventura (Mestrando / USP) e Luiz Henrique Eloy Terena (UCDB/UFAM)

O estado de Mato Grosso do Sul concentra a segunda maior população indígena do Brasil. Nos últimos

anos um conjunto de políticas educacionais em nível superior vem ocasionando (ou ao menos tornando

perceptível) um fenômeno importante na região: o ingresso e participação de indígenas em

universidades, que fez com que este estado concentre hoje o maior número de acadêmicos indígenas no

país. O objetivo do presente trabalho é efetuar um balanço participativo acerca desse fenômeno,

tentando observar os efeitos dessa modalidade de política cultural para uma das populações indígenas

da região, os Terena. O caráter participativo dessa avaliação deverá se expressar em duas dimensões

complementares: em primeiro lugar, buscaremos reproduzir e analisar o ponto de vista de diversos

sujeitos Terena (de diferentes faixas etárias, direta ou indiretamente envolvidos com essas políticas)

com quem foi possível ter contato ao longo de um trabalho de campo realizado em julho de 2013. Mais

especificamente, pretendemos utilizar como fio condutor as reflexões de três pessoas cujas histórias de

vida representam formas distintas de se relacionar com a instituição escolar: Lindomar Ferreira,

professor Jonas Gomes e Luiz Henrique Eloy. Tendo em conta que o último sujeito de pesquisa

mencionado é também um dos autores do trabalho, tencionamos realizar um registro colaborativo

também num outro nível, aquele referente a análise e sistematização dos dados. O intuito, assim, é que

a escrita do texto seja feita a duas vozes, de modo que fique marcado o diálogo entre os dois autores,

um acadêmico indígena e um acadêmico não indígena.

A cultura nas escolas indígenas

Clarice Cohn (Departamento de Antropologia/ UFSCAR)

A garantia legal de escolas para indígenas que sejam específicas e diferenciadas, respeitando suas

manifestações culturais, organizações sociais e políticas e processos próprios de ensino e aprendizagem,

foi uma conquista de direito que se consolida desde a Constituição de 1988 e que se contrapõe à

vocação histórica da escolarização dos povos indígenas, catequética e civilizatória. Propondo uma escola

que permita aos povos manter, valorizar e reforçar suas culturas e construir sua autonomia, a escola

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indígena vem se constituindo, ao longo das últimas décadas, cada vez mais, embora não nominalmente,

em uma política cultural para estes povos. Por ela, se “resgata” culturas, se constrói identidades; cada

vez mais, nelas se propõem “partes diferenciadas” como um currículo (cultural e indígena) que

complementa o currículo dos “conhecimentos universais”, ou “aulas de cultura”, e em nome desta

especificidade cursos de formação de professores indígenas são criados e estimulados como política de

estado. Os próprios povos indígenas têm investido grandes esforços para criar e manter escolas, e

lideranças políticas têm que se mostrar capazes de negociar a criação de escolas para suas

comunidades, assim como as crianças atendem as aulas, investindo na escola parte importante de seu

tempo e de seus interesses, e suas famílias preocupam-se em oferecer esta experiência. As experiências,

elas mesmas, são das mais variadas, diferindo como diferem as situações mesmo de povos e

comunidades indígenas no Brasil, indo desde o lugar onde se aprende o “conhecimento do branco” até

o lugar onde se resgata a (própria) cultura. Apesar desta diversidade, percebe-se uma homogeneidade,

ou uma espécie de denominador comum, no discurso e nas práticas que deve ser debatida, e que está

exatamente nesta característica de uma política cultural para os povos indígenas, e que se refere aos

modos como cultura tem sido entendido, operado e construído em cada situação. Propõe-se aqui

enfrentar este debate a partir tanto das definições e dos documentos normativos elaborados nestas

décadas para a escola indígena quanto com casos etnográficos, resultados de pesquisas de projeto que

coordeno (na UFSCar com financiamento CAPES) com pesquisadores indígenas e não indígenas sobre

escolas indígenas no Alto Rio Negro (Baniwa), no Pará (Arara do Laranjal, Asurini do Koatinemo, Xikrin

do Bacajá e Guarani-Mbyá de Nova Jacundá), na Bahia (Tupinambá de Olivença) e em São Paulo (Tupi-

Guarani de Piaçaguera), com ênfase especial nas pesquisas que venho desenvolvendo com os Xikrin do

Bacajá e suas concepções de infância, aprendizagem, cultura e kukradjà (termo polissêmico e

fundamental de que cultura é uma das traduções dadas por eles), assim como com os Baniwa com que

tenho trabalhado nos últimos anos, que revelam as expectativas e as práticas escolares indígenas e sua

relação com a definição de culturas indígenas no Brasil contemporâneo.

A internacionalização do kampô (via ayahuasca): difusão global e efeitos locais

Edilene Coffaci de Lima (Departamento de Antropologia/UFPR)

Desde o começo deste século uma prática indígena usada como propiciadora de sorte na caça e vigor

para o desempenho de atividades cotidianas, ganhou popularidade em grandes centros urbanos, no

Brasil e no exterior. Conhecida popularmente como kampô ou kambô, o uso da secreção cutânea da

perereca Phyllomedusa bicolor alcançou um sucesso dificilmente imaginado anos atrás. Nesta

comunicação busco abordar o tema do kampô a partir de duas frentes. Primeiramente, tratando de sua

difusão urbana e internacionalização recente – podendo se ter notícias de seu uso, entre outros países,

no Chile e na Holanda –, através dos ayahuasqueiros, entendidos aqui como terapeutas esotéricos. Essa

difusão do kampô, além das fronteiras nacionais, segue de perto a própria internacionalização da

ayahuasca, que teve início e é conhecida há mais tempo. Em segundo lugar, buscar-se-á tratar dos

efeitos que essa difusão e circulação internacional de uma prática indígena têm entre aqueles que

primeiramente se envolveram nela, i.e., os próprios Katukina. A difusão urbana do uso do kampô acabou

atraindo diversos terapeutas esotéricos aos Katukina, tidos como os legítimos conhecedores dos

“ancestrais” e “misteriosos” saberes que a cercam. Como não poderia deixar de ser, esse interesse de

tantas pessoas, de tantos lugares diferentes, pelo kampô acaba por produzir efeitos imprevistos entre os

Katukina que, já há mais de uma década, tecem relações, ora cordiais ora conflituosas, com diferentes

pessoas que os procuram por esse exclusivo motivo: o uso da “vacina de sapo”, como é regionalmente

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conhecida a aplicação da secreção do kampô. Entre os efeitos em curso, destaca-se a própria concepção

que cerca o uso do kampô, com sua esoterização recente, e disputas políticas que se dão entre as

lideranças das várias aldeias (e de outras etnias linguisticamente aparentadas), na procura do

estabelecimento de parcerias com terapeutas urbanos engajados na difusão de seu uso, ou na recusa

delas.

Presença da Escola Matukré e transformações no cotidiano Panará (MT).

Fabiano Campelo Bechelany (Doutorando / UnB)

A educação escolar indígena é parte de uma dinâmica nova entre os Panará (MT), ainda coberta de

incertezas e ajustes. Este trabalho apresenta dados da etnografia realizada com o grupo a respeito das

relações entre as práticas de conhecimento tradicionais e a escola indígena. Apresento uma descrição

do funcionamento da Escola Matukré, desde a perspectiva dos seus alunos, gestores e membros da

comunidade. A pesquisa que desenvolvo trata das atividades técnicas dos Panará e conhecimentos

associados, e aqui analiso como a educação intercultural indígena tem se relacionado com essas

atividades. Cotejando as avaliações dos Panará, afirmo que a educação indígena se insere em um

complexo amplo de transformações geradoras de ansiedade, desejos e adaptações. Nesse sentido,

procuro debater como a educação é parte de um espectro de políticas de direitos que atingem os

Panará.

A inconveniência das perguntas: Confronto entre o construtivismo e duas teorias ameríndias de

conhecimento.

Joana Cabral de Oliveira (Pesquisadora associada CEstA - USP)

A reflexão proposta parte de dois contextos distintos de encontro entre regimes de conhecimento: o

primeiro referente a formação de professores indígenas entre os Wajãpi, onde sou responsável por

discutir e problematizar os saberes ligados as ciências naturais; e o segundo a formação de

pesquisadores guarani mbya, no âmbito de uma pesquisa colaborativa proporcionada por um projeto do

IPHAN em parceria com CTI (Centro de Trabalho Indigenista). Tomando como mote comentários e

reações dos guarani e dos wajãpi acerca do modo como são ensinados os conteúdos em ambas as

formações, discorro como embate entre uma teoria do conhecimento construtivista, que é subjacente a

operacionalização do ensino nesses contextos, gera estranhamento e incomodo que possibilitam

entrever as teorias wajãpi e mbya sobre o conhecimento. Além disso, a possiblidade de olhar

comparativamente para esses dois grupos tupi-guarani, permite evidenciar as diferenças das

concepções ameríndias realçando ainda mais as nuances que ocorrem nesses encontros.

Observações Sobre o Processo de Patrimonialização dos Kene Huni Kuĩ

Joaquim Maná de Lima (Doutorando em Linguística - UnB), José Benedito Ferreira Kaxinawa (Liderança

geral da Terra Indígena Kaxinawa Praia do Carapanã e Subsecretário de Cultura do Município de

Tarauacá/AC), Marcos de Almeida Matos (Doutorando - PPGAS/UFSC) e Paulo Roberto Nunes Ferreira

(Mestre em Antropologia Social – PPGAS/UFPR)

Em 2006 e 2007 a Federação dos Povos Huni Kuĩ do Acre (FEPHAC) enviou ao Instituto do Patrimônio

Histórico e Artístico Nacional dois documentos, pedindo o registro do kene (como são chamados os

grafismos tradicionais dos Huni Kuĩ) como patrimônio cultural imaterial brasileiro. Seu objetivo era

combater o que se descreveu como “uso indevido e sem autorização dos kene”. Em 2012 o IPHAN

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retomou o diálogo com a FEPHAC e com diversas lideranças huni kuĩ, realizando seis reuniões de

esclarecimento e consulta em terras indígenas. Nestas reuniões observou-se um curioso cruzamento de

interesses: uma vez que não pode garantir a proibição dos usos indevidos dos kene, o IPHAN parece

pensar que o seu papel é participar na gestão disso que ele compreende como um “bem cultural”. Já os

Huni Kuĩ insistem que o registro só seria útil como forma de proteger os kene dos usos indevidos,

conferindo legitimidade à sua posse pelas mulheres. Longe de ser um saber ou um ofício pacificado, o

kene faz emergir dimensões políticas insuspeitas: ele é pensado simultaneamente como saber específico

das mulheres, como objeto de negociação e litígio com agências governamentais, como marca

indentitária no contexto interétnico acreano, como peças de valor colocadas em circuitos comerciais,

como o saber apreendido no tempo mítico, como forma de conhecimento utilizada indevidamente, e de

muitos outros modos. O objetivo desta comunicação é refletir sobre este cenário, atentando para o

modo como aqueles que participaram das negociações com o IPHAN procuraram compreender (e assim

controlar) a proposta de patrimonialização, fixando ou se apoiando nestes diversos aspectos do kene.

Demarcação das línguas indígenas

José R.Bessa Freire (UERJ/ UNIRIO)

A relação entre língua e território sugerida no verso de Fernando Pessoa - "Minha Pátria é minha língua”

- nos oferece uma metáfora para abordar o recente processo de patrimonialização das línguas

indígenas. Historicamente, na Amazônia, durante muitos séculos, os povos indígenas identificaram seus

respectivos territórios, tendo como um dos critérios as línguas que eram ali eram faladas, portadoras de

narrativas orais, de conhecimentos e de memória. Em meados do século XVIII, a relação língua x

território foi reforçada com os Tratados de Madri (1750) e de Santo Ildefonso (1777) firmados por

Portugal e Espanha. Recentemente, em dezembro de 2010, foi instituído o Inventário Nacional da

Diversidade Linguística, sob gestão do Ministério da Cultura, destinado a identificar,documentar,

reconhecer e valorizar as "línguas portadoras de referência à identidade, à ação e à memória de

diferentes grupos formadores da sociedade brasileira". O processo de inclusão no inventário nacional

implica o reconhecimento das línguas que receberão o título de "Referência Cultural Brasileira"

expedido pelo Ministério da Cultura, além de envolver um conjunto de ações para preservá-las, de

acordo com a especificidade de cada uma. Embora o Inventário tenha sido criado há menos de três

anos, foram realizados projetos-piloto com algumas línguas em diferentes situações sociolinguísticas.

Pretendemos aqui discutir seus impactos iniciais nas sociedades indígenas e na sociedade nacional e

seus possíveis desdobramentos, abordando a elaboração do Inventário das línguas como um processo

análogo, nesta perspectiva, ao da demarcação dos territórios indígenas.

Notas sobre os usos e sentidos da cultura entre os Arara de Rondônia

Júlia Otero dos Santos (Doutoranda – UnB)

Como boa parte dos povos indígenas do Brasil, os Arara de Rondônia estão envolvidos em uma série de

processos que colocam a cultura no horizonte das ações e práticas nativas. O universo da cultura torna-

se, assim, um objeto importante da reflexão indígena e instrumento recorrente nas relações travadas

entre índios bem como entre índios e brancos. Neste trabalho, investigo o caso arara por meio da

análise da festa do jacaré – retomada em setembro de 2010 por um projeto do PDPI após um intervalo

de mais de sete anos sem ser realizada e alçada a emblema da cultura nativa –; dos encontros dos pajés

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organizados com o intuito de transmitir a medicina tradicional aos jovens e crianças; e, em menor grau,

da educação escolar e superior indígena. Nesses eventos e práticas, é possível vislumbrar como a cultura

tornou-se um poderoso instrumento nas disputas entre famílias e aldeias, e um idioma para se

conversar com os brancos. Interessam-me as concepções nativas sobre cultura, os mal-entendidos e

acordos em torno do termo e seus efeitos na produção de afastamentos e aproximações entre grupos.

Conhecimento tradicional e seus conhecedores: uma ciência duas vezes concreta

Marcela Coelho de Souza (Departamento de Antropologia/ UnB)

Esta reflexão nasce da constatação de que os discursos e práticas a voltados para valorização e

reconhecimento dos ditos conhecimentos tradicionais — se testemunham de um saudável esforço de

alargamento dos critérios que nos permitem falar de conhecimento onde antes se falava em “crenças”

— conservaram não obstante a inclinação em tomar conhecimento como uma categoria universal,

designando algo passível de ser genericamente produzido, possuído ou transmitido (ainda que os

conteúdos, e os regimes de produção, detenção e transmissão, possam variar dramaticamente).

Entretanto, esse privilégio do conhecimento sobre o conhecedor, esse movimento de abstração que

separa o primeiro, seja como ato seja como resultado, do segundo, torna difícil imaginar de que

maneira, concretamente, as pessoas permanecem implicadas em seus conhecimentos quando estes são

“passados adiante” — quando passam a circular enquanto, justamente, “conhecimentos tradicionais”.

Considerando as sinergias prospectivas entre conhecimento científico e tradicional, aposta-se aqui que

perguntar que tipo de pessoa é um conhecedor desse tipo de conhecimento pode oferecer uma

perspectiva valiosa para pensar no que este conhecimento se converte, do ponto de vista dos

conhecedores, quando ‘conhecido’ por outros. Com este objetivo, focalizarei duas figuras de

especialistas salientes na Amazônia — xamãs e narradores — tal como vim a conhecê-los por meio da

pesquisa etnográfica e do envolvimento em projetos de “registro” e “revalorização” cultural entre os

Kĩsêdjê, um povo jê que vive no Parque Indígena do Xingu.

Pensamento e Criação Paiter e o Projeto “Perspectivas Intercambiáveis: o teatro na Aldeia Gãpgir”

Maria Thais Lima Santos (ECA/USP) e Uraan Anderson Suruí (Liderança Suruí)

A trajetória do povo Paiter-Suruí se sobressai pela disposição em construir espaços de intercâmbio entre

a cultura Paiter e a cultura não indígena. A Aldeia Gãpgir, em especial, pelo modo como entende os

desafios de viver em permanente contato com não indígenas e, ao mesmo tempo, manter-se na

tradição de seu povo é o exemplo ativo desta postura. A Escola e a educação diferenciada (entendida

como o espaço de transmissão que permite o trânsito entre a cultura Paiter e a cultura não indígena e

solidifica dentro da própria etnia a diversidade de práticas e de pensamento) são os focos principais das

ações realizadas no âmbito da aldeia.

A normatização da língua Paiter, a recuperação e o reconhecimento das narrativas orais e dos saberes

transmitidos pelos mais velhos (que são considerados mestres no espaço da escola), a retomada e

manutenção das práticas artesanais, o registro escrito – cartilhas escolares em Paiter-Suruí que

organizam os conteúdos disciplinares do ensino, livro bilíngüe com narrativas dos mitos, registro

videográfico e sonoro, etc, integram o conjunto de ações desenvolvidas pelo grupo que estão

permitindo com que trabalhem juntos, pensem juntos e sobrevivam com sustentabilidade (entendido

aqui como a defesa do povo que vive na floresta, do seu modo de vida).

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A proposta de apresentação deste trabalho vem de uma experiência (em processo ainda) de

intercâmbio (aqui entendido eminentemente como troca) entre um grupo de pesquisadores da USP e

artistas de São Paulo com a comunidade indígena dos Paiter-Suruí (mais especificamente da Aldeia

Gãpgir – linha 14, Terra Indígena Sete de Setembro) no âmbito de um projeto aprovado no Programa de

Intercâmbio de Atividades de Cultura e Extensão da Universidade de São Paulo.

O pensamento e a criação Paiter na Aldeia Gãpgir se expressam nas narrativas míticas, na rica e

elaborada tradição musical, nas danças, nas formas improvisadas de cantos-narrativos, nos jogos, etc.

que demonstram a complexa, e indissociável, ação criativa. O desejo de ser ouvido para além da floresta

os conduziu - por sugestão da etno-musicista, cantora e compositora Marlui Miranda - ao teatro, por ser

uma linguagem que permite manter em rede as ações que produzem. Assim, o desejo de se apropriar da

gramática e da matemática cênica é condizente com a vontade de construção de espaços de troca

baseados na diferença, na autonomia das decisões e na condução do processo de criação e de

transmissão da cultura Paiter-Suruí.

Deste modo, os desafios de co-criação entre os dois coletivos – a comunidade da Aldeia Gãpgir e os

artistas e estudantes envolvidos nos projeto – se somam à experiência de elaboração de um arcabouço

conceitual comum e são os principais temas deste trabalho, na medida em que nos permitem desvelar

modos de pensar, compreender, realizar e criar perante a chave da “linguagem teatral”.

Pacificando os brancos: apreciações sobre a implementação de políticas culturais e educacionais entre

os Maxakali

Marina Vieira (Departamento de Antropologia, UFBA)

A partir da criação da ortografia ou escrita Maxakali pelo casal de missionários Frances e Harold

Popovich, entre os anos 1960 e 1970, os Maxakali inauguraram uma nova forma de relação com os não-

índios. No início da década de 1980 foram formados monitores indígenas bilíngües e iniciado o processo

de alfabetização nas aldeias, através da implantação de escolas pela FUNAI, em colaboração com os

missionários. A partir de 1995 os Maxakali passaram a contar com escolas indígenas diferenciadas,

gerenciadas e financiadas pela Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais em Convênio com a

UFMG. Em 2006, alguns Maxakali passaram a freqüentar o curso superior para professores indígenas

(FIEI), criado no mesmo ano na UFMG. Desde a implantação das escolas indígenas diferenciadas até

hoje, vários projetos relacionados à pesquisa, documentação e divulgação da cultura foram realizados

por professores e alunos da UFMG, resultando na produção conjunta com os pesquisadores Maxakali de

diversos tipos de material didático bilíngüe, livros de cantos e mitos, CDs, filmes etc. Nos últimos dez

anos, a intensidade da interação entre os Maxakali e instituições como a UFMG, o Museu do Índio e

outras aumentou significativamente. Pretendo apresentar os resultados da pesquisa de campo realizada

em diferentes aldeias Maxakali, no intuito de buscar compreender a importância e os efeitos desses

projetos na vida cotidiana dos grupos e indivíduos que participaram mais ativamente desses processos,

bem como dos que se mantiveram mais alheios.

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Os processos de gestão e transmissão dos conhecimentos tradicionais dos povos indígenas e a

educação escolar

Marta Maria do Amaral Azevedo (Pesquisadora do Núcleo de Estudos de População – NEPO – e

professora do Programa de Pós Graduação em Demografia, UNICAMP ; ex-presidente da FUNAI)

Os povos indígenas tiveram a educação escolar desde os primórdios da colonização no Brasil como um

instrumento de “civilização” e consequente desvalorização e destruição dos conhecimentos/línguas

tradicionais próprios desses povos. Durante o período da colonização, e até hoje, as escolas são

instituídas como instrumentos de imposição de valores, concepções de mundo, e estilo de vida contrário

aos modos de vida desses povos. Após a década de 70, quando foram experimentados novos processos

de escolas para os povos indígenas no Brasil e em outros países da América Latina, e após a Constituição

Federal de 1988, uma série de regras legais foram criadas com participação de lideranças e comunidades

indígenas, e de antropólogos, para que os processos escolares e a própria instituição escola não mais

tivesse esse papel avassalador sobre as culturas indígenas. Apesar disso, até hoje, na maior parte das

comunidades indígenas no Brasil, as escolas são cópias pioradas das escolas dos não índios. Pouca

reflexão se faz sobre a instituição e ou sobre os processos pedagógicos das escolas. Apenas

recentemente através de editais de pesquisa específicos a universidade tem produzido conhecimento

sobre esses processos, para além de apenas incluir no currículo alguns aspectos ou partes (selecionadas

por quem, como quais objetivos) da cultura de uma determinada comunidade/povo. A gestão dos

conhecimentos transmitidos através das escolas deve se fazer a partir de uma reflexão profunda sobre

os processos sociais em jogo nessa instituição, que é individualizadora e possuidora de uma carga de

hierarquias que são desconhecidas dos povos indígenas.

A reflexão que apresentarei parte do princípio que as escolas indígenas não devem ser instituídas ou

continuadas como simples adaptação das escolas dos não índios. As transmissões dos conhecimentos e

relações sociais criadas a partir daí são possivelmente mais prejudiciais aos conhecimentos tradicionais

do que o próprio conteúdo ensinado nessas instituições.

Visão Dupla

Mutuá Mehinaku (Pesquisador Indígena da Escola Indigena Kuikuro/ SEDUC- MT)

Este trabalho é resultado de uma pesquisa e reflexão sobre o efeito de projetos de proteção de

conhecimentos tradicionais sobre os povos indígenas, com foco na região do Alto Xingu. Foram visitadas

três aldeias com a finalidade de escutar e sentir como cada um defende seu entendimento sobre

educação e documentação da nossa cultura do alto Xingu. Depois do contato com os Kagaiha, estamos

vivenciando uma visão dupla e paralela entre o mundo dos brancos e o mundo indígena. Os Brancos

trouxeram muitas coisas boas e muitas coisas ruins para nossa cultura e para a vida do nosso povo. Este

trabalho me deu oportunidade analisar como os povos indígenas têm recebido e pensado sobre esses

projetos, que vão desde iniciativas de salvaguarda ou de patrimonialização de padrões gráficos e de

técnicas de manejo, os trabalhos de documentação ou tradução de artes verbais e rituais, de refletir

sobre o futuro da nossa educação indígena e educação escolar indígena e sobre nossos estudantes

perante esta visão dupla. A criação de associações e o modelo educacional dos brancos está causando a

substituição das lideranças tradicionais por novas lideranças, afetando a organização social indígena no

Alto Xingu. Os mais velhos não querem que nosso ügühütu ´nosso jeito de ser/cultura ´acabe, querem

que os mais novos continuem praticando as atividades tradicionais como eles praticavam na época sua

juventude. Não gostam da escola, para eles a escola viria para acabar com a cultura. Os mais novos

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vieram dizer que a escola é boa, por meio dela podemos fortalecer nossa cultura ao invés de acabar,

vamos valoriza-la. Precisamos cursar as séries inicias aqui na aldeia e depois vamos estudar na

universidade para entender o mundo do branco. Os pais dos alunos pedem aos professores das aldeias

do alto Xingu para que ensinem português para que seus filhos falem português com os brancos, que

ensinem os conhecimentos dos brancos. Deixei meu pai triste porque não realizei o sonho que ele

estava planejando, fui para outro rumo.

Sobre alguns modos de usar a cultura dos outros: reflexões djeoromitxi e direitos culturais.

Nicole Soares-Pinto (Doutoranda – UnB)

A comunicação versa sobre as reflexões de quatro professores djeoromitxi (língua Macro-Jê) acerca dos

direitos culturais indígenas. Irmãos, tais professores são também alunos do Curso de Licenciatura Inter-

Cultural da Universidade Federal de Rondônia (campus Ji-Paraná) e suas avaliações se concentram no

modelo de educação escolar diferenciada, como também nos efeitos de ações ou projetos relacionados.

Suas análises giram sobre três eixos principais, cujos desdobramentos procuro acompanhar: 1) as

transformações no campo relacional do parentesco, a saber, nos processos de criação de seus filhos e na

relação de transmissão/criação de conhecimento com seus pais e avós; 2) as incongruências produzidas

pela tensão entre a aplicação do modelo de educação diferenciada e o modo de vida indígena nas

aldeias; 3) as possibilidades –ainda não realizadas- de parceria com instituições não-indígenas

(universidades e laboratórios), calcadas sobre a contribuição de pesquisadores indígenas no sentido de

mitigar a inadequação da ciência moderna para o incremento da boa vida da população não-indígena.

Essas apreciações, deve-se sublinhar, ressoam a partir do jogo multi-étnico presente na T.I. Rio Guaporé-

espaço endogâmico composto por oito povos distintos. As expectativas djeoromitxi sobre direitos

culturais se balizam na ampliação de sua rede de relações com os “brancos” e no desafio em manter

vínculos apropriados com seus parentes.

Reflexões e experiências de um estudante-liderança: os efeitos das políticas educacionais nas

comunidades do alto rio Negro

Raphael Rodrigues (Doutorando/ UFSCAR) e Maximiliano C Menezes Tukano (Diretor de Educação da

FOIRN, Federação de Organizações Indígenas do Rio Negro e Coordenador Geral da COIAB)

Apresentar-se-á parte do material etnográfico registrado junto a Maximiliano Menezes, tukano, na

localidade de Taracuá, antiga missão salesiana, atual distrito multiétnico do baixo rio Uaupés (TI Alto Rio

Negro, noroeste amazônico) durante os meses de junho e julho de 2013. Através da coleta de relatos

produziu-se um texto em coautoria acerca dos efeitos das políticas educacionais na região a partir de

suas experiências na formulação e implantação de cursos superiores em contexto regional. Maximiliano

é uma liderança política atuante há mais de vinte anos no movimento indígena rionegrino e ocupa

atualmente o departamento de educação da FOIRN (Federação das Organizações Indígenas do Rio

Negro). A trajetória escolar deste estudante-liderança inclui o internato infantil salesiano e recém

autoria de um trabalho de conclusão de curso com temática em educação pela licenciatura diferenciada

em Políticas Educacionais e Desenvolvimento Sustentável (UFAM). Acredita-se que seu interesse, desde

2010, na produção de registros escritos sobre temas específicos pode ser tomado como campo de

reflexão do contexto etnográfico local e políticas de objetivação cultural desenvolvidas nas duas últimas

décadas.

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Os professores indígenas como agentes culturais e a escola diferenciada como “local das culturas”:

discursividades Tapeba, Pitaguary e Jenipapo-Kanindé

Rita Potyguara (Secadi/MEC)

O trabalho tem como objetivo apresentar, a partir de uma “análise compreensiva” dos discursos dos

professores Tapeba, Pitaguary e Jenipapo-Kanindé – participantes do curso de Magistério Indígena

realizado entre os anos de 2001 e 2005 no Ceará –, as percepções dos índios sobre o papel do professor

indígena e da escola diferenciada na construção de suas políticas culturais. A partir dos dados obtidos na

pesquisa de campo realizada para a dissertação de mestrado em Educação na Universidade Federal do

Rio Grande do Norte, concluído em 2006, busco destacar as imagens construídas pelos Tapeba,

Pitaguary e Jenipapo-Kanindé que apontam para o papel dos professores indígenas como agentes

culturais e para a escola como o “local das culturas”. Em síntese, a construção dos discursos analisados é

tomada como expressão das lutas dos índios por direitos culturais.

Como chegar

Av. Prof. Luciano Gualberto, 315 – Butantã – São Paulo – SP, CEP: 05508-010

http://goo.gl/maps/1HDiX

No terminal metrô Butantã (Linha Amarela) pegar o ônibus circular com destino a Cidade

Universitária (linha 8012-10), pedir para descer no ponto da História/Geografia.