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1 MARCUSCHI, L. A. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: Dionísio et al. Gêneros textuais e ensino. 2ed. 2002. p. 19-36 Esquema elaborado por Simone Garofalo para a disciplina da Professora Reinildes Dias - LIG905 C - Multiletramentos: leitura e escrita em LE e aplicações pedagógicas (2012/01) – POLIN/FALE/UFMG

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MARCUSCHI, L. A. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: Dionísio et al. Gêneros

textuais e ensino. 2ed. 2002. p. 19-36

Esquema elaborado por Simone Garofalo para a disciplina da Professora Reinildes Dias - LIG905 C - Multiletramentos: leitura e escrita em LE e aplicações pedagógicas (2012/01) – POLIN/FALE/UFMG

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1. Gêneros textuais como práticas sócio-históricas

● Características:

– Gêneros textuais são fenômenos históricos, profundamente vinculados à vida cultural e social.

– São entidades sócio-discursivas e formas de ação social incontornáveis em qualquer situação comunicativa.

– Não são instrumentos estanques e enrijecedores da ação criativa.

– Caracterizam-se como eventos textuais altamente maleáveis, dinâmicos e plásticos.

– Surgem emparelhados a necessidades e atividades sócio-culturais, bem como na relação com inovações tecnológicas.

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1. Gêneros textuais como práticas sócio-históricas

● Histórico:

– Numa primeira fase, povos de cultura essencialmente oral desenvolveram um conjunto limitado de gêneros.

– Após a invenção da escrita alfabética (séc. VII a.C.), multiplicam-se os gêneros, surgindo os típicos da escrita.

– A partir do século XV, os gêneros expandem-se com o florescimento da cultura impressa para, na fase intermediária de industrialização iniciada no século XVIII, dar início a uma grande ampliação.

– Hoje, na cultura eletrônica, presenciamos uma explosão de novos gêneros e novas formas de comunicação, tanto na oralidade como na escrita.

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1. Gêneros textuais como práticas sócio-históricas

● Os gêneros textuais:

– surgem, situam-se e integram-se funcionalmente nas culturas em que se desenvolvem.

– caracterizam-se muito mais por suas funções comunicativas, cognitivas e institucionais do que por suas peculiaridades linguísticas e estruturais.

– são quase inúmeros em diversidade de formas, obtêm denominações nem sempre unívocas e, assim como surgem, podem desaparecer.

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2. Novos gêneros e velhas bases

● Os grandes suportes tecnológicos da comunicação, por terem uma presença marcante e grande centralidade nas atividades comunicativas da realidade social que ajudam a criar, vão por sua vez propiciando e abrigando gêneros novos bastante característicos.

● Esses novos gêneros não são inovações absolutas, sem uma ancoragem em outros gêneros já existentes.

● Bakhtin falava na "transmutação" dos gêneros e na assimilação de um gênero por outro gerando novos.

● A tecnologia favorece o surgimento de formas inovadoras, mas não absolutamente novas.

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2. Novos gêneros e velhas bases

● Esses gêneros que emergiram no último século no contexto das mais diversas mídias criam formas comunicativas próprias com um certo hibridismo que desafia as relações entre oralidade e escrita e inviabiliza de forma definitiva a velha visão dicotômica ainda presente em muitos manuais de ensino de língua.

● Em muitos casos são as formas que determinam o gênero e, em outros tantos serão as funções. Contudo, haverá casos em que será o próprio suporte ou o ambiente em que os textos aparecem que determinam o gênero presente.

● Podemos dizer que as expressões "mesmo texto" e "mesmo gênero" não são automaticamente equivalentes, desde que não estejam no mesmo suporte.

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3. Definição de tipo e gênero textual

● Concepção de língua:

– Partimos do pressuposto básico de que é impossível se comunicar verbalmente a não ser por algum gênero, assim como é impossível se comunicar verbalmente a não ser por algum texto.

– A comunicação verbal só é possível por algum gênero textual.

– Noção de língua como atividade social, histórica e cognitiva.

– Privilegia a natureza funcional e interativa e não o aspecto formal e estrutural da língua.

– A língua é tida como uma forma de ação social e histórica.

– Hipótese sócio-interativa da língua.

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3. Definição de tipo e gênero textual

● Definição de tipo textual:

– Usamos a expressão tipo textual para designar uma espécie de construção teórica definida pela natureza linguística de sua composição {aspectos lexicais, sintáticos, tempos verbais, relações lógicas}.

– Em geral, os tipos textuais abrangem cerca de meia dúzia de categorias conhecidas como: narração, argumentação, exposição, descrição, injunção.

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3. Definição de tipo e gênero textual

● Definição de gênero textual:

– Usamos a expressão gênero textual como uma noção propositalmente vaga para referir os textos materializados que encontramos em nossa vida diária e que apresentam características sócio-comunicativas definidas por conteúdos, propriedades funcionais, estilo e composição característica.

– Se os tipos textuais são apenas meia dúzia, os gêneros são inúmeros.

– Alguns exemplos de gêneros textuais seriam: telefonema, sermão, carta comercial, carta pessoal, romance, bilhete, reportagem jornalística, aula expositiva, horóscopo, etc.

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3. Definição de tipo e gênero textual

● Quadro sinóptico:

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3. Definição de tipo e gênero textual

● Definição de domínio discursivo:

– Usamos a expressão domínio discursivo para designar uma esfera ou instância de produção discursiva ou de atividade humana.

– Esses domínios não são textos nem discursos, mas propiciam o surgimento de discursos bastante específicos.

– Do ponto de vista dos domínios, falamos em discurso jurídico, discurso jornalístico, discurso religioso etc., já que as atividades jurídica, jornalística ou religiosa não abrangem um gênero em particular, mas dão origem a vários deles.

– Constituem práticas discursivas nas quais podemos identificar um conjunto de gêneros textuais que, às vezes, lhe são próprios (em certos casos exclusivos) como práticas ou rotinas comunicativas institucionalizadas.

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3. Definição de tipo e gênero textual

● Deve-se ter o cuidado de não confundir texto e discurso como se fossem a mesma coisa.

● Pode-se dizer que texto é uma entidade concreta realizada materialmente e corporificada em algum gênero textual.

● Discurso é aquilo que um texto produz ao se manifestar em alguma instância discursiva.

● Assim, o discurso se realiza nos textos.

● Em outros termos: os textos realizam discursos em situações institucionais, históricas, sociais e ideológicas.

● Os textos são acontecimentos discursivos para os quais convergem ações linguísticas, sociais e cognitivas, segundo Robert de Beaugrande (1997).

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3. Definição de tipo e gênero textual

● Definições dadas: muito mais operacional do que formal.

● Para a noção de tipo textual predomina a identificação de sequências linguísticas típicas como norteadoras.

● Já para a noção de gênero textual predominam os critérios de ação prática, circulação sócio-histórica, funcionalidade, conteúdo temático, estilo e composicionalidade, sendo que os domínios discursivos são as grandes esferas da atividade humana em que os textos circulam.

● Importante é perceber que os gêneros não são entidades formais, mas sim entidades comunicativas.

● Gêneros são formas verbais de ação social relativamente estáveis realizadas em textos situados em comunidades de práticas sociais e em domínios discursivos específicos.

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4. Algumas observações sobre os tipos textuais

● Pode ocorrer que o mesmo gênero realize dois ou mais tipos. Assim, um texto é em geral tipologicamente variado (heterogêneo).

● Um tipo textual é dado por um conjunto de traços que formam uma sequência e não um texto.

● Pode-se dizer que o segredo da coesão textual está precisamente na habilidade demonstrada em fazer essa "costura" ou tessitura das sequências tipológicas como uma armação de base, ou seja, uma malha infraestrutural do texto. Como tais, os gêneros são uma espécie de armadura comunicativa geral preenchida por sequências tipológicas de base que podem ser bastante heterogêneas mas relacionadas entre si.

● Quando se nomeia um certo texto como "narrativo", "descritivo" ou "argumentativo", não se está nomeando o gênero e sim o predomínio de um tipo de sequência de base.

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4. Algumas observações sobre os tipos textuais

● Características predominantes dos tipos textuais:

– Narrativos → sequência temporal.

– Descritivos → sequências de localização.

– Expositivos → sequências analíticas ou então explicitamente explicativas.

– Argumentativos → sequências contrastivas explícitas.

– Injuntivos → sequências imperativas.

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5. Observações sobre os gêneros textuais

● Bakhtin (1997) dizia que os gêneros eram tipos "relativamente estáveis" de enunciados elaborados pelas mais diversas esferas da atividade humana.

● Sendo os gêneros fenômenos sócio-históricos e culturalmente sensíveis, não há como fazer uma lista fechada de todos os gêneros.

● Quando dominamos um gênero textual, não dominamos uma forma linguística e sim uma forma de realizar linguisticamente objetivos específicos em situações sociais particulares.

● Como afirmou Bronckart (1999), "a apropriação dos gêneros é um mecanismo fundamental de socialização, de inserção prática nas atividades comunicativas humanas"

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6. Gêneros textuais e ensino

● Um maior conhecimento do funcionamento dos gêneros textuais é importante tanto para a produção como para a compreensão.

● É esta ideia básica dos PCN quando sugerem que o trabalho com o texto deve ser feito na base dos gêneros, sejam eles orais ou escritos.

● Seria bom ter em mente a questão da relação oralidade e escrita no contexto dos gêneros textuais, pois os gêneros distribuem-se pelas duas modalidades num contínuo, desde os mais informais aos mais formais e em todos os contextos e situações da vida cotidiana.

● Gêneros textuais → artefatos linguísticos concretos.

● Pode-se dizer que os gêneros textuais fundam-se em critérios externos (sócio-comunicativos e discursivos), enquanto os tipos textuais fundam-se em critérios internos (linguísticas e formais).

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6. Gêneros textuais e ensino

● Não há só a questão da produção adequada do gênero, mas também um uso adequado.

● Não é uma questão de etiqueta social apenas, mas é um caso de adequação tipológica, que diz respeito à relação que deveria haver, na produção de cada gênero textual, entre os seguintes aspectos:

– natureza da informação ou do conteúdo veiculado;

– nível de linguagem (formal, informal, dialetal, culta, etc.);

– tipo de situação em que o gênero se situa (pública, privada, corriqueira, solene, etc.);

– relação entre os participantes (conhecidos, desconhecidos, nível social, formação, etc);

– natureza dos objetivos das atividades desenvolvidas.

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6. Gêneros textuais e ensino

● No ensino pode-se tratar dos gêneros levando os alunos a produzirem ou analisarem eventos linguísticos os mais diversos, tanto escritos como orais, e identificarem as características de gênero em cada um.

● É um exercício que, além de instrutivo, também permite praticar a produção textual.

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7. Observações finais

● Pode-se dizer que o trabalho com gêneros textuais é uma extraordinária oportunidade de se lidar com a língua em seus mais diversos usos autênticos no dia-a-dia.

● E há muitos gêneros produzidos de maneira sistemática e com grande incidência na vida diária, merecedores de nossa atenção. Inclusive e talvez de maneira fundamental, os que aparecem nas diversas mídias hoje existentes, sem excluir a mídia virtual, tão bem conhecida dos internautas ou navegadores da Internet.

● A relevância maior de tratar os gêneros textuais acha-se de modo todo especial no ensino de língua, já que se ensina a produzir textos e não a produzir enunciados soltos.

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7. Observações finais

● Uma análise dos manuais de ensino de língua portuguesa mostra que há uma relativa variedade de gêneros textuais presentes nessas obras. Contudo, uma observação mais atenta e qualificada revela que a essa variedade não corresponde uma realidade analítica.

● São poucos os casos de tratamento dos gêneros de maneira sistemática. Lentamente, surgem novas perspectivas e novas abordagens que incluem até mesmo aspectos da oralidade.

● É de se indagar se há gêneros textuais ideais para o ensino de língua. Tudo indica que a resposta seja não. Mas é provável que se possam identificar gêneros com dificuldades progressivas, do nível menos formal ao mais formal, do mais privado ao mais público e assim por diante. Tem-se a oportunidade de observar tanto a oralidade como a escrita em seus usos culturais mais autênticos sem forçar a criação de gêneros que circulam apenas no universo escolar.