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Informativo Nº 51 Brasília (DF) Outubro de 2015 InformANDES SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR - ANDES-SN Novas medidas aprofundam a reforma da Previdência. Entre os ataques mais recentes, a criação de fundos de pensão para servidores estaduais e alteração na lei para obrigar a adesão compulsória dos servidores federais ao Funpresp 4 e 5 Em todo o país, trabalhadores dos setores público e privado realizaram plenárias, atos e paralisações, como parte da jornada nacional de mobilizações "Outubro de Lutas", com o objetivo de barrar a retirada de direitos e lutar contra o ajuste fiscal 6 e 7 Somente em 2014, mais de 2.500 pessoas foram mortas pela PM, que segue sendo utilizada pelo Estado como instrumento para o extermínio da população pobre e para criminalizar os movimentos sociais. A desmilitarização é urgente 14 e 15 A greve dos docentes federais de 2015 ficou marcada como a mais longa da história das Instuições Federais de Ensino (IFE). Durante 139 dias, a mobilização serviu como importante instrumento de luta para expor a situação precária das IFE, o impacto dos cortes no orçamento da educação, impedir o avanço na re- rada de direitos dos trabalhadores e no desmonte do serviço público, entre eles, de um dos maiores patrimônios da sociedade brasileira – as Instui- ções Federais de Ensino. “Foi surpreendente a mobilização e o engajamento dos docentes na luta. Mesmo diante da conjuntura dicil, muitos professores, em conjunto com os técnico-administravos em educa- ção e o movimento estudanl, acredi- taram no movimento, e se não fosse essa luta, a situação das instuições estaria pior”, avalia o presidente do ANDES-SN, Paulo Rizzo. 8 a 11 Greve dos docentes federais 2015: A mais longa da história do ANDES-SN

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Informativo Nº 51Brasília (DF) Outubro de 2015InformANDES

SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR - ANDES-SN

Novas medidas aprofundam a reforma da Previdência. Entre os ataques mais recentes, a criação de fundos de pensão para servidores estaduais e alteração na lei para obrigar a adesão compulsória dos servidores federais ao Funpresp 4 e 5

Em todo o país, trabalhadores dos setores público e privado realizaram plenárias, atos e paralisações, como parte da jornada nacional de mobilizações "Outubro de Lutas", com o objetivo de barrar a retirada de direitos e lutar contra o ajuste fiscal 6 e 7

Somente em 2014, mais de 2.500 pessoas foram mortas pela PM, que segue sendo utilizada pelo Estado como instrumento para o extermínio da população pobre e para criminalizar os movimentos sociais. A desmilitarização é urgente 14 e 15

A greve dos docentes federais de 2015 ficou marcada como a mais longa da história das

Instituições Federais de Ensino (IFE). Durante 139 dias, a mobilização serviu como importante instrumento de luta para expor a situação precária das IFE, o impacto dos cortes no orçamento da educação, impedir o avanço na re-tirada de direitos dos trabalhadores e no desmonte do serviço público, entre eles, de um dos maiores patrimônios da sociedade brasileira – as Institui-ções Federais de Ensino.

“Foi surpreendente a mobilização e o engajamento dos docentes na luta. Mesmo diante da conjuntura difícil, muitos professores, em conjunto com os técnico-administrativos em educa-ção e o movimento estudantil, acredi-taram no movimento, e se não fosse essa luta, a situação das instituições estaria pior”, avalia o presidente do ANDES-SN, Paulo Rizzo. 8 a 11

Greve dos docentes federais 2015: A mais longa da história do ANDES-SN

InformANDES/20152

EXPEDIENTEO Informandes é uma publicação do ANDES-SN // site: www.andes.org.br // e-mail: [email protected] responsável: Marinalva OliveiraRedação: Renata Maffezoli MTb 37322, Mathias Rodrigues MTb 10126, Paola Rodrigues 10982 DRT-DF e Bruna Yunes 9045 DRT-DF Edição: Renata Maffezoli // Fotos: Mathias Rodrigues e Renata Maffezoli // Diagramação e Ilustrações: Paola Rodrigues 10982 DRT-DF

Editorial

O final de 2015 se avizinha. Término de um período que ficará marcado na história

como um ano em que, mais uma vez, a retirada de direitos dos trabalhado-res foi apresentada como a solução para a crise. Em estudo recente foi divulgada a concentração de riqueza no mundo. O 1% mais rico da popula-ção detém metade da riqueza global, enquanto cerca de 70% da população detêm apenas 3% da riqueza global. Em tempos de crise, as medidas tra-dicionalmente apresentadas como resposta, de fato, mantêm, repro-duzem e aprofundam essa perversa distribuição. Os lucros dos quatro maiores bancos no Brasil no primeiro semestre cresceram mais de 40%, se comparados com os primeiros seis meses de 2014, sendo que um deles atingiu o seu maior crescimento na história e o terceiro maior lucro tri-mestral na história, se considerados os bancos de capital aberto. Em relação ao setor produtivo, ainda que haja queda nas receitas com as vendas, se constata uma ampliação do lucro quando comparado ao mesmo período em 2014. Os “ganhos em eficiência” das empresas, assim denominados pela grande mídia, significam de fato a intensificação da exploração dos trabalhadores e redução de seus sa-lários combinada com o aumento dos preços, que incide, como inflação, de forma mais perversa na vida dos que sobrevivem de seu próprio trabalho, sobretudo os de mais baixa renda. Segundo as medidas apresentadas e defendidas não só pelo governo, mas também pela oposição, a “contribui-ção” que o “povo brasileiro” deve dar para a superação da crise passa, fundamentalmente, pela retirada de direitos sociais e ampliação da conver-

são desses direitos em mercadorias, a exemplo da PEC 395/2014, que propõe o fim da gratuidade em parte dos cursos oferecidos pelas instituições públicas de ensino – pós-graduação lato sensu e mestrado profissional. Também con-correm nesse sentido medidas outras como o PLC 77 de 2015, que amplia a mercantilização da pesquisa no interior das instituições públicas de ensino e pesquisa. Trata-se não só de ampliar a mercantilização e privatização do ensino, da pesquisa e da extensão realizados nas instituições públicas, mas de submetê--las, de forma mais explícita, institucional e orgânica aos ditames capitalistas.

No Brasil, as medidas por aprovar e já aprovadas no ano de 2015 respondem à crise não só retirando direitos dos tra-balhadores, mas implementando ações que visam obstar a mobilização e a luta de resistência a esses ataques. A trami-tação da Lei Antiterrorismo, em regime de urgência, coloca para nós muitas questões. O que dizer da proposição de um novo ordenamento jurídico, quando diversos especialistas apontam para a existência de leis, senão a de responder à pressão de movimentos internacionais que defendem a ampliação genérica da tipificação criminal do terrorismo, abrindo espaço para a ampliação da criminalização dos movimentos sociais. Em nome do combate ao terrorismo, amplia-se a perspectiva do “terrorismo de Estado”. O que dizer do parecer do relator do PLC no Senado em favor da retirada do parágrafo que excluía do escopo da lei as manifestações políticas de movimentos sociais ou sindicais? Da mesma forma, assistimos a apresenta-ção de propostas no poder legislativo, em nível federal, estadual e municipal, da denominada “Escola sem partido”, que pretendem silenciar a crítica nas escolas, mais uma medida cujo objetivo

é apresentar as ideias da classe domi-nante como universalmente válidas.

Nós, educadores, temos responsabi-lidade no curso desse processo. Nosso trabalho deve contribuir para que a educação forme os sujeitos históricos para a transformação radical da atual ordem das coisas. O enfrentamento a essas medidas se intensifica e radi-caliza em momentos de greve, como no ano de 2015, mas não se esgota nesse momento. Fruto de um processo forjado desde o período anterior às greves, nossa mobilização segue, mais do que nunca, necessária, posto que, ao longo do ano, os ataques só têm se aprofundado. Sobre isso tratam as matérias desse jornal.

“Queremos uma universidade que interaja com toda a sociedade e uma educação que forme os sujeitos his-tóricos para uma transformação ra-dical, que liberte as potencialidades de construção de um espaço social pertencente a homens e mulheres de todas as origens, comprometidos tão somente com o produzir e o partilhar da arte e da cultura, da ciência e da técnica e de todos os saberes erigidos nos limites de sua finitude, mas de al-cance universal. A universidade pública é uma das instâncias onde deve ocor-rer, de forma integrada, a formação profissional e a reflexão crítica sobre a sociedade, assim como a produção do conhecimento, o desenvolvimento e a democratização do saber crítico em todas as áreas da atividade humana. Suas funções básicas, o ensino, a pesquisa e a extensão, devem ser desenvolvidas de forma equilibrada, articulada e interdisciplinar.”(Caderno 2 – Proposta do ANDES-SN para a universidade brasileira)

Sobre nossas responsabilidades... ou ainda, como diria John Lennon, “É uma falta de responsabilidade esperarmos que alguém faça as coisas por nós”.

InformANDES/2015 3Movimento Docente

Encontro do Setor das Iees/Imes discute multicampia,orçamento e federalização

Os debates acerca da realidade multicampi, do financiamento e da federalização das institui-ções estaduais e municipais de

ensino (Iees/Imes) foram os principais destaques do XIII Encontro Nacional e do Seminário do Setor das Iees/Imes do ANDES-SN, realizados no final do mês de setembro, na Associação dos Docentes da Universidade Estadual de Campinas (Adunicamp – Seção Sindical do ANDES-SN), na cidade de Campinas (SP).

Alexandre Galvão, 3° Secretário do ANDES-SN, conta que, majoritariamente, o processo de expansão das universidades estaduais e municipais obedece aos inte-resses políticos dos gestores dos poderes locais - prefeitos e governadores -, e que não necessariamente se articulam com a defesa de uma educação de qualidade. “Isso quer dizer que, em muitos casos, são os poderes locais que conseguem se articular para criar novos campi, deixando claro que a multicampia é, muitas vezes, resultado de uma demanda política. Dessa forma, a universidade deixa de lado o tripé ensino-pesquisa-extensão e a garantia da oferta de uma educação pública de qualidade”, ressalta.

A síntese de que a multicampia, como a atual organização estrutural das institui-ções estaduais e municipais, é um processo de expansão mal planejado e que tem como consequência a precarização das condições de trabalho e ensino, foi unânime ao longo do debate. “Outra questão que discutimos foi a necessidade de reorganizar o sindicato diante dessa realidade de multicampia, à luz do nosso estatuto, com objetivo de estimular o envolvimento de mais docentes nas lutas do ANDES-SN”, afirma Galvão.

Gean Santana, 1º vice-presidente da Regional Nordeste III, também aponta que o cenário nas Iees/Imes tem sido, em

geral, de muito ataque por parte dos governos locais. “Há uma reconfiguração do que é um espaço acadêmico na tentativa de esvaziar com-pletamente o conceito de universidade pública e avançar no processo de destrui-ção para justificar a privatização total das universidades. Nesse ano, a situação em várias instituições foi de caos total, com atrasos dos salários dos trabalhadores e de terceirizados, corte de energia elétrica, suspensão de visita de campo, dentre outros”, diz. A redução do quadro docen-te, agravada pela ausência de concursos públicos diante do aumento do número de estudantes matriculados, também foi outro ponto destacado nas discussões.

Ao longo do debate acerca do finan-ciamento das Iees/Imes, os docentes reafirmaram a necessidade da luta para pressionar os representantes do poder executivo nos estados e municípios para a destinação de mais verbas para a educação. “Exigir mais recursos para a educação é a alternativa para superar o estrangula-

Vinícius c santos

mento orçamentário das instituições de ensino superior nos estados e municípios e garantir a nossa qualidade do ensino e trabalho”, destaca Galvão.

Os docentes também discutiram o processo de federalização das Iees/Imes, ou seja, quando a oferta e a manutenção do ensino superior local passa a ser de responsabilidade do governo federal - o que é, muitas vezes, apontado como uma forma de garantir orçamento adequado para as universidades.

No entanto, o 3° Secretário do Sindicato Nacional ressalta que “é preciso ter muito cuidado quando se toca no tema, pois existem estados que, ao querer se desres-ponsabilizar financeiramente de suas obri-gações relativas à manutenção da educação superior, aparecem com esse discurso de federalização. Diante disso, a nossa saída é avançar na luta por mais orçamento de forma articulada nacionalmente”.

InformANDES/20154Mundo do Trabalho

Direitos de aposentadoria sofrem novos ataquesMedida que prevê adesão compulsória ao Funpresp já foi aprovada no Congresso Nacional e aguarda sanção da presidente Dilma

A Previdência é um tema de enorme relevância social, que está sob constante ataque. Prevista no Brasil pela primeira

vez na Constituição de 1824 como “socor-ros públicos”, a Previdência só passou, no entanto, a existir para além do texto da Carta Magna em 1891. Após três consti-tuições e muitas mudanças no sistema previdenciário, chegou-se ao modelo atual, previsto na Constituição Federal de 1988.

Naquele ano, a Previdência foi consi-derada constitucionalmente um direito social e, dois anos depois, em 1990 foi criado o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que recebe as contribuições para a manutenção do Regime Geral da Previdência Social, sendo responsável pelo pagamento da aposentadoria, pensão por morte, auxílio-doença, auxílio-acidente e outros benefícios. Responsável, em 2014, por 21,76% do orçamento da União executado – a segunda maior fatia, atrás apenas dos pagamentos de juros e amor-tizações da dívida pública – a Previdência

atrai fortemente a iniciativa privada pelos recursos que movimenta.

A Previdência é deficitária?Um dos argumentos mais repetidos por

aqueles que querem modificar o sistema de previdência social no Brasil é o fato de esta dar prejuízo, ser deficitária. O argu-mento é rebatido por diversas entidades sindicais, que ressaltam que, seguindo os preceitos constitucionais, a alegação do déficit é inverídica. A Constituição prevê um sistema de Seguridade Social, com-posto pela Previdência Social, Saúde e da Assistência Social, que não é colocado em prática, orçamentária e financeiramente.

“A previdência não é deficitária, e ela não enfrenta meramente problemas de gestão, e sim problemas decorrentes da política econômica que vem sendo tocada. Isso é um discurso ideológico feito para envolver a população, para que não haja resistência. Estão retirando até nosso

direito de envelhe-cer com dignida-de”, afirma Sônia Meire de Jesus, 3ª vice-presidente do ANDES-SN

e uma das coordenadoras do Grupo de Trabalho de Seguridade Social e Assuntos de Aposentadoria (GTSSA) do ANDES-SN.

Mesmo analisando a Previdência fora do sistema de Seguridade Social, é pos-sível perceber a fragilidade do discurso de déficit. A Desvinculação de Receitas da União (DRU), instrumento criado em 1994 para facilitar o uso do orçamento das diversas áreas na geração de superávit primário, atinge diretamente a previdência e a seguridade social. A DRU prevê que a desvinculação de 20% das receitas de impostos e contribuições não sejam desti-nadas às despesas originalmente previstas.

Fundos de pensãoUma forma de retirada de direitos

de previdência é a criação de fundos de pensão privados para os servidores públicos, tanto em nível federal quanto nos estados. O Funpresp, voltado aos Servidores Públicos Federais (SPF), foi criado em 2012 e rapidamente gerou rechaço entre os trabalhadores. Além de quebrar a isonomia na aposentadoria no serviço público, o Funpresp é um fundo de contribuição definida, mas de benefí-cio indefinido. Ou seja, não há quaisquer garantias de que haja retorno financeiro no momento da aposentadoria.

“O fato de esse fundo descontar re-cursos de nossos salários para que eles sejam administrados por um conjunto de empresas privadas é um risco muito grande. Os recursos podem ser facilmente desviados, principalmente nos momentos de ajuste, para servir aos interesses do capital. Nós não podemos acreditar, nem creditar nossa aposentadoria na mão dos banqueiros”, afirma Sônia Meire.

O Sindicato Nacional organizou uma campanha em nível nacional em relação ao Funpresp com o objetivo de esclarecer aos docentes o que significa o fundo e os riscos da adesão. A Campanha Diga Não ao Funpresp-Exe foi um dos fatores que provocou baixa adesão dos docentes ao Regime de Previdência Complementar, reconhecida até pelo secretário de Políticas

InformANDES/2015 5Mundo do Trabalho

de Previdência Complementar do Ministério da Previdência Social (Mpas), Jaime Faria Junior, em que disse que a cartilha feita pelo ANDES-SN induziu o servidor a não aderir ao fundo. O Funpresp hoje tem, segundo o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), 16.400 filiados, e 25 mil servidores que optaram pela não filiação. Desses 25 mil servidores contratados após a criação do Funpresp e que não aderiram ao fundo, 16 mil são professores de uni-versidades e institutos federais.

“O governo começou incentivando a adesão à previdência complementar, mas nas universidades e institutos federais a adesão foi baixa, mesmo com toda a propaganda e o assédio que os profes-sores têm sofrido. São emails, cartas em nossas residências, sendo chamados para reuniões com o fundo de pensão dentro do espaço de trabalho, tentando que os docentes façam sua adesão ao Funpresp. O governo, observando que não houve grande adesão, tentou mudar o projeto, transformando-o em lei”, diz a diretora do ANDES-SN.

Fundos quebram, trabalhadores pagamFuncef: Fundo de pensão dos empregados da Caixa Econômica

Federal – registrou déficit de R$ 5,5 bilhões, acumulado nos três últimos anos. Metade do déficit será rateado entre os participantes ao longo de 12 anos.

Postalis: Fundo de pensão dos Trabalhadores dos Correios registrou rombo de R$ 5,6 bilhões. A conta já vinha sendo cobrada dos beneficiários, foi suspensa após um termo de ajuste de conduta e deverá ser retomada em abril de 2016.

Fapes: Fundo de pensão dos funcionários do BNDES comunicou recentemente que registrou um déficit atuarial de cerca de R$ 1,2 bilhão em 2014. A conta chegará aos participantes no ano que vem.

Mais de 40 fundos de pensão fecharam em 2014 com déficit total acumulado de R$ 31 bilhões. No primeiro trimestre de 2015, essas perdas já eram de R$ 36 bilhões.

Funpresp automáticoNo final de setembro foi incluída na

Medida Provisória 676/2015, aprovada no Congresso Nacional, a adesão automática dos servidores federais ao Funpresp. O

fundo, que ao contrário do imaginado pelo governo, não vingou, agora aposta na obrigatoriedade da adesão como forma de se manter, e de manter a política de ter-ceirização da previdência. A MP prevê que os SPF tenham até 90 dias após a adesão automática para pedir o cancelamento de sua participação no Funpresp.

Leandro Madureira, da Assessoria Jurídica Nacional (AJN) do ANDES-SN, avalia a medida como ilegal e inconsti-tucional. “A medida é, no meu ponto de vista, absolutamente ilegal. Primeiro, porque não há critério de urgência e relevância para ela ser aprovada como Medida Provisória, que demanda tais crité-rios para poder fazer um reordenamento jurídico. Segundo, mesmo que a medida fosse aprovada como Projeto de Lei, ela seria ilegal e inconstitu-cional. Isso porque a pre-vidência complementar tem como base o fato de ser facultativa, e não pode ser imposta”, diz o advogado.

Em muitos estados, tem se seguido a cartilha da privatização da pre-vidência dos servidores por meio de fundos de pensão. No Paraná, por exemplo, no primeiro semestre, os servidores estaduais realizaram um grande enfrentamento com o governo – que retirou recursos da pre-vidência dos servidores para usá-los no orça-mento e manter o supe-rávit, criando um fundo

de pensão como política alternativa de previdência. Rio Grande do Sul, São Pauo, Goiás e Rio de Janeiro são alguns dos outros estados que tem tomado esse caminho.

Fortalecer a lutaOutras medidas de ataque aos direitos

de seguridade social dos trabalhadores têm sido aprovadas esse ano pelo governo federal e pelo Congresso Nacional. Entre elas, a diminuição de benefícios do seguro--desemprego, da pensão por morte, etc. Buscando ampliar e fortalecer a luta contra essas medidas, o ANDES-SN realiza o seu XVIII Encontro Nacional de Assuntos de Aposentadoria, de 6 a 8 de novembro, em Recife (PE). “Para nós, é muito pertinente fazer esse encontro neste momento. Nesse encontro discutiremos a relação entre a dívida pública, a política econômica e os fundos de pensão. Como o governo vem retirando direitos, e para onde vão os recursos. Quais são os riscos que estamos correndo com essas medidas. O encontro reunirá representantes de seções sindicais de todo o Brasil e discutirá as políticas de ataque aos direitos de aposentadoria em curso, tanto em nível federal quanto estadual, e as que virão e será base para apresentarmos no Congresso do ANDES-SN o Plano de Lutas para 2016”, conclui a diretora do Sindicato Nacional, que ressalta que o evento é aberto à participação de docentes da ativa e aposentados.

InformANDES/20156Mundo do Trabalho

Unificar os trabalhadores na construção do “Outubro de Lutas” rumo à greve geral

Com o objetivo de unificar as diversas ações de entidades e centrais sindicais, organizações de esquerda e movimentos sociais

para dar continuidade à construção de uma alternativa dos trabalhadores para derrotar o ajuste fiscal e barrar a retirada de direitos, durante todo o mês de outubro acontece a jornada nacional “Outubro de Lutas”, definida no Encontro de Lutadores e Lutadoras, realizado, ao final do mês de setembro, em São Paulo (SP). Uma série de mobilizações, com atos públicos e paralisa-ções nos estados, nos locais de trabalho, nas escolas e nos bairros populares estão programadas por todo o país.

De acordo com Luis Eduardo Acosta, 1º vice-presidente da Regional do Rio de Janeiro e um dos coordenadores do Grupo de Trabalho de Política e Formação Sindical (GTPFS), “a ideia da jornada é exigir, além do fim do ajuste fiscal, mudanças em relação às medidas, aprovadas pelo governo federal, que vem prejudicando a classe trabalhadora. O nosso chamado também é contra a tentativa dos setores conservadores de se apropriarem dessa situação de crise para aprofundar medidas antipopulares”.

Além do ANDES-SN, a CSP-Conlutas, e demais entidades que compõem o Espaço de Unidade de Ação, movimentos sociais e populares de diversos estados do país deliberaram no Encontro a construção da manifestação nacional, que pretende se aliar às lutas em curso, apoiando as categorias em campanhas salariais e nas greves, as ocupações urbanas e rurais e os diversos protestos realizados nos estados.

“O Encontro e a Jornada definida para Outubro são tentativas de rearticulação da classe trabalhadora, que tem a CSP-Conlutas como um dos polos aglutinadores dessa construção, ao lado das entidades que compõem o Espaço de Unidade de Ação, e demais sindicatos e movimentos sociais. A Marcha dos Trabalhadores e Trabalhadoras, realizada em 18 de setem-

bro em São Paulo, foi um impulso para a construção dessa frente de luta chaman-do, inclusive, os outros setores, como as centrais sindicais, que são importantes para essa luta e para a construção de uma mobilização que culmine em uma greve geral”, apontou Amauri Fragoso de Medeiros, 1º tesoureiro do ANDES-SN e encarregado de Relações Sindicais.

Na declaração consensuada ao final do encontro, as entidades propõe a suspensão do pagamento da dívida pública e realiza-ção de auditoria da mesma, a adoção de impostos fortemente progressivos, para taxar as grandes fortunas e os ganhos de capital e da especulação financeira. Exigem também a proibição de remessas de lucros ao exterior. Apontam ainda a necessidade de somar forças na reação dos trabalhadores ao ajuste fiscal e contra os ataques à classe, além de ressaltar a importância das bases das organizações sindicais majoritárias, como CUT e CTB, se insurgirem contra a política de pacto social de suas direções e exigirem que essas centrais sindicais se coloquem ao lado dos trabalhadores e do povo.

Plenárias e mobilizações nos estados“Encaminhamos que, ao longo do mês,

nós deveríamos reproduzir o debate reali-zado no Encontro de Lutadores e Lutadoras também nos estados”, apontou Fragoso. Desde o dia 2 de outubro foram realizadas reuniões, plenárias sindicais e populares e manifestações em diversas capitais, como João Pessoa, Belém, São Luis, Fortaleza, Rio de Janeiro, Natal, Teresina, São Paulo e Salvador, convocadas pelas entidades do Espaço Unidade de Ação e pelos demais sindicatos que participaram do Encontro. “No Rio de Janeiro, nós temos uma organização chamada Plenária dos Trabalhadores em luta, que seria nosso Espaço de Unidade de Ação, que congrega sindicatos, oposições sindicais, movimen-tos estudantil e sociais. Realizamos, no dia 23 de outubro, uma passeata, até a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), levando as reivindicações centrais já pautadas na Marcha dos Trabalhadores e

Marcha dos Trabalhadores e Trabalhadoras (acima) e Encontro de Lutadores e Lutadoras (ao lado), realizados em setembro, em São Paulo (SP)

InformANDES/2015 7Mundo do Trabalho

Trabalhadoras, além das pautas específicas das diferentes categorias de trabalhado-res”, contou Acosta.

Como parte também das ações do “Outubro de lutas”, diversas entidades participaram da audiência pública, na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) pela defesa da autodeterminação do povo haitiano, pedindo o fim da Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti. A participação na atividade foi deliberada no Encontro, quando diver-sas entidades definiram a importância de dar um caráter internacionalista à jornada nacional somando-se, assim, às iniciativas da Rede Sindical Internacional de Solidariedade e Lutas - composta por mais de 50 organizações sindicais e mo-vimentos de trabalhadores, entre elas a CSP-Conlutas. Fora a campanha em soli-dariedade aos imigrantes haitianos, outras lutas internacionais, como a campanha por Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS), que propõe boicote contra governo de Tel-Aviv e em solidariedade ao povo pa-lestino e contra os planos de austeridade em todos os países, integram a jornada de mobilizações no mês de outubro.

Trabalhadores reagem à retirada de direitos“O mês de outubro inicia com a greve,

em curso, dos Correios, dos bancários e a articulação dos petroleiros. Queremos aproveitar o acúmulo das lutas já em curso para ampliar a mobilização, pautando a taxação das grandes fortunas, a defesa da suspensão do pagamento da dívida aos banqueiros, que consome bilhões do nosso orçamento, e exigir a revogação de uma série de instrumentos que retiram os nossos direitos”, disse Fragoso.

Diversas são as medidas aprovadas pelo Congresso Nacional, e sancionadas pelo governo federal, que vêm atacando fron-talmente os direitos sociais. Por exemplo, o pacote anunciado pelo governo federal em 14 de setembro, que inclui o corte de R$ 26 bilhões no orçamento, atingindo diretamente as já precárias áreas da Saúde e da Educação. Ainda nesse pacote o go-verno também indica o congelamento dos salários dos servidores públicos federais até agosto de 2016 – quando propõe um índice linear abaixo da inflação configuran-do um confisco no salário dos servidores - e suspende a realização de concursos

Trabalhadores e trabalhadoras de diferentes categorias realizaram ato público, em 22 de outubro, no centro de Fortaleza (CE), como parte da jornada nacional "Outubro de Lutas"

públicos até dezembro de 2016. Além de reduzir verbas para programas sociais, como Minha Casa, Minha Vida, e propor a volta da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF).

A mudança recente na medida provi-sória 680/2015, do Plano de Proteção ao Emprego (PPE) - que autoriza a redução de jornada de trabalho em 30%, com res-pectiva redução dos salários -, também é apontada pelo 1º tesoureiro do ANDES-SN como mais um instrumento que aprofunda a retirada de direitos dos trabalhadores, principalmente ao incluir um artigo que prevê a supremacia de acordos coletivos sobre a legislação trabalhista. Ademais, os diversos projetos de lei apresentados através da ‘Agenda Brasil’, a proposta de redução da maioridade penal, as mudan-ças no acesso ao seguro-desemprego e à pensão por morte, a ampliação de medi-das de privatização, o aumento da idade mínima para aposentadoria e a revisão da demarcação de terras indígenas, entre outras propostas, também evidenciam a necessidade da construção de uma forte articulação para avançar na luta contra a retirada de direitos trabalhistas.

Em outubro, bancários de todo país deflagraram greve por tempo indeterminadoEm diversos estados, trabalhadores dos Correios seguem em greve, no mês de outubro

Filipe Ramó

Tânia Rêgo/Agência BrasilM

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InformANDES/20158Matéria Central

Greve dos docentes federais 2015: A mais longa da história do ANDES-SN

A greve de 2015 ficou marcada como a mais longa da história das Instituições Federais de Ensino (IFE). Durante os 139

dias de muita luta, foi possível observar a força da categoria docente, junto com os demais segmentos da educação, em unidade com os servidores públicos fe-derais (SPF) em denunciar à sociedade o processo de privatização e da mercan-tilização do ensino superior público em curso no país, junto com o desmonte do serviço público, e a retirada de direitos dos trabalhadores. Com a desculpa da crise econômica, o governo adotou tais medidas para intensificar a implementa-ção de seu projeto mercantilista.

“Essa foi a mais longa greve promovida pelos professores federais. A duração da paralisação é responsabilidade exclusiva do governo federal, que foi incapaz de negociar efetivamente a pauta de reivin-dicações dos docentes e aprofundou a política de desmonte do serviço público”, analisa Paulo Rizzo, presidente do ANDES-SN. A última greve nacional dos docentes federais ocorreu no ano de 2012, com duração de 124 dias.

O presidente do Sindicato Nacional ressalta que a greve se deu como último recurso encontrado pelos docentes para pressionar o governo federal a ampliar os investimentos públicos para a edu-cação pública. Os sucessivos cortes no orçamento do Ministério da Educação (MEC), efetuados pelo governo federal em 2015, trouxeram enormes prejuízos para o desenvolvimento das atividades acadêmicas nas IFE, aprofundando ainda mais a situação precária nas instituições, com muitas impossibilitadas de funcio-nar por falta de técnicos, professores e estrutura adequada.

O lema do segundo mandato da pre-sidente Dilma Rousseff “Brasil: Pátria Educadora” só serve para o setor priva-do. O que se viu de janeiro para cá foi a passagem de três ministros pelo MEC, que sofreu um dos maiores cortes or-çamentários - mais de 30% - em relação ao que estava previsto para a pasta em 2015. Só nas universidades, houve redu-ção média de 10% da verba de custeio e 49% de capital.

Somando-se ao quadro de desmonte das IFE, outro elemento crucial para a deflagração da greve deveu-se à postura adotada pelo governo federal que que-brou o acordo assinado em 23 de abril de 2014, entre Secretaria de Educação Superior (Sesu)/ MEC e ANDES-SN. Neste termo, o governo reconheceu a desestru-turação da carreira dos docentes federais e apontou para a continuidade da sua discussão conceitual e possibilidade de alterações do modelo vigente e em 2015, rompendo com o acordado.

“A greve se impôs como uma neces-sidade na defesa da educação pública, gratuita e de qualidade, que vem sendo dilapidada por uma opção consciente do governo em privilegiar o setor privado”, diz Paulo Rizzo. Ele afirma que ao mesmo tempo em que diversas Instituições Federais de Ensino já haviam sinalizado a inviabilidade de funcionamento após o primeiro corte no orçamento do MEC, o governo liberava mais R$ 5,1 bi para o Programa de Financiamento Estudantil (Fies). Juntando-se a isso, segundo Rizzo, o governo ainda ameaça com a terceirização na contratação de professores federais via Organização Social (OS).

A greveA greve teve início no dia 28 de maio

com a instalação do Comando Nacional de Greve (CNG) dos docentes federais, na sede do ANDES-SN, em Brasília (DF). Docentes de 18 seções sindicais em 12 estados suspenderam as atividades, nesta data, por tempo indeterminado. No mesmo dia, técnico-administrativos de diversas universidades também iniciaram a greve nacional convocada pela Fasubra.

A ampliação da greve ocorreu gradu-almente, com entrada de mais seções sindicais do ANDES-SN e de sindicatos de docentes de algumas instituições que não eram seção sindical do ANDES-SN, mas que aderiram às reivindicações do Sindicato Nacional, como das universida-des de Goiás (UFG), Ceará (UFC) e Mato Grosso do Sul (UFMS). Na pauta da greve, a exigência de reversão dos cortes no orça-mento e mais investimento na Educação, além de melhores condições de trabalho, garantia de autonomia, reestruturação da

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carreira e valorização salarial para ativos e aposentados. O movimento paredista chegou a contar com a participação de mais de 50 universidades e institutos federais, demonstrando mais uma vez a capacidade de mobilização da categoria.

Neste período, os docentes realiza-ram diversas manifestações, tanto em Brasília (DF), quanto nos seus locais de trabalho. Diferente de 2012, neste ano os protestos dos docentes em defesa da Educação Pública foram marcados pela repressão policial, com o uso frequente do braço armado do Estado para intimi-dar os manifestantes. Na capital federal, vários atos em frente ao Ministério da Educação terminaram com os policias militares agredindo docentes, técnicos e estudantes com cassetetes e spray de pimenta. Nas IFE, professores enfrenta-ram a criminalização também por parte dos gestores.

Selma Silva, da Universidade Federal da Bahia (Ufba), explica que a defla-gração da greve na sua instituição se consolidou com os docentes, reunidos em assembleia, decidindo que o CNG do ANDES-SN os representaria na mesa de negociação desta greve. “Essa decisão foi um reconhecimento de que temos uma categoria nacional, com carreira única e um Comando Nacional de Greve que era o do ANDES-SN”, disse. Selma contou que a greve na instituição baiana se fez neces-sária desde o início do semestre letivo por uma série de indicadores, um deles é que a Ufba estava com três meses de atraso no pagamento de serviços terceirizados e de manutenção.

Outro caso emblemático, foi o dos docentes da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS). José Carlos

docentes federais

em greve

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- -PARA BARRAR O ATAQUE A EDUCACAO PUBLICA

da Silva, da UFMS, contou que antes da deflagração da greve na universidade, foi decidido em assembleia, por ampla maioria, pela participação da associação nas reuniões do CNG do ANDES-SN para lutar em defesa da pauta de reivindicações do Sindicato Nacional. “Consideramos o processo de luta um avanço para a cate-goria, pois conseguimos expor a intran-sigência do governo na falta de diálogo e na sua posição em atender aos interesses privatistas da educação. Houve avanços principalmente na organização sindical, com a vinda de novos filiados e, com isso, conseguimos travar lutas difíceis, mas que foram de extrema importância para a nossa base sindical”, ressalta. A Adufsm, que era filiada ao Proifes, aprovou durante a greve a desfiliação da entidade.

Para André Ferreira, da Universidade Federal do Ceará (UFC), os cortes no or-çamento da Educação e os ataques aos direitos dos trabalhadores e estudantes foram determinantes para a mobiliza-ção. “Foi uma greve bastante dura, mas que aos poucos conseguimos nos impor através das assembleias. Mesmo com dificuldades internas, construímos atos unificados e manifestações com técnicos e estudantes. E a nossa perspectiva é a de continuar com a mobilização”, disse o docente, pontuando que as medidas de ajuste fiscal não cessarão e, por isso, é preciso manter a luta.

ConjunturaDurante os primeiros meses de greve,

os representantes do MEC e do Ministério do Planejamento (Mpog) se mantiveram irredutíveis, alegando a crise econômica como principal argumento para não atender as reivindicações dos servido-res públicos federais, e só recebendo os docentes por conta da pressão do movi-mento grevista. Nas reuniões, o governo, só se dispôs a debater o índice salarial e reajuste de benefícios, ignorando os demais pontos da pauta unificada dos SPF. Os percentuais apresentados sequer repunham a inflação passada e a projetada para o próximo período, configurando o confisco do salário dos servidores.

Já em março, em reunião com entidades representativas dos servidores públicos federais, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, apontou a dificuldade de reajuste salarial em 2015 para o conjunto do funcionalismo e sinalizou também a proposta de um acordo para os próximos quatro anos.

À medida que o governo e os ataques aos direitos dos trabalhadores aumenta-

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ram, intensficou a mobilização dos docen-tes em greve e das demais categorias dos SPF. Nas ruas, sucessivas manifestações em unidade com outros trabalhadores do serviço público, movimentos sociais e populares, foram protagonizadas, como as quatro grandes marchas à capital federal, realizadas nos dias 7 e 22 de julho, 7 e 27 de agosto, convocadas pelo Fórum dos SPF. Milhares de servidores, vindos de diversos estados do país, pressionaram o governo federal a negociar efetivamente sobre a pauta unificada de reivindicações dos SPF e contra os cortes orçamentários.

Em agosto, um novo golpe aos traba-lhadores e ao serviço público. Um con-junto de medidas, da chamada “Agenda Brasil”, foi apresentado pelo presidente do Senado Federal, Renan Calheiros, com o intuito de “retomar o crescimento econômico”. No projeto, o fim da gratui-dade do SUS, uma nova contrarreforma previdenciária (com o aumento da idade mínima para aposentaria), ampliação das terceirizações e revisão das leis de proteção ambiental e de demarcação das terras indígenas. No mês seguinte, o go-verno federal apresentou novo pacote de medidas com mais cortes no orçamento social. Anunciou-se o congelamento, até agosto de 2016, do salário do funciona-lismo, suspensão dos novos concursos públicos, fim do abono permanência e a volta da CPMF.

Como resposta, nos dias 23 e 24 de setembro ocorreram diversas paralisações e atos em todo o país. Na capital federal, no dia 23, a manifestação ocorreu em frente ao Ministério da Fazenda (MF) e resultou na entrega e protocolamento de uma carta do Fórum dos SPF no Congresso Nacional, e junto ao MF e Mpog. No dia 24, docentes e estudantes realizaram mani-festação em frente ao Mpog e arrancaram desse ministério a carta com proposta de índice linear, 5,5% para agosto de 2016, e 5% para janeiro de 2017, além de reajuste de benefícios. A proposta, além de ignorar o conjunto das reivindicações, expressava a impossibilidade de avanços na reestruturação da carreira no período de vigência do acordo. No mesmo dia, diante da ausência de respostas a carta protocolada no Ministério da Educação no dia 18 de setembro, apresentando novos elementos para negociação, os docentes ocuparam a entrada do gabinete do ministro da Educação.

Durante a ocupação, conseguiu-se o agendamento de reunião com o ministro da pasta para o dia 5 de outubro, o que não ocorreu devido a saída de Ribeiro do

cargo e o retorno de Aloízio Mercadante ao MEC. “Durante todo o processo gre-vista o Comando Nacional de Greve submeteu a apreciação das assembleias dos docentes, a apresentação de novos elementos para a negociação, com o objetivo de abrir um canal de diálogo efetivo com o governo demonstrando disposição de negociar, mas o governo ignorou”, lembra Paulo Rizzo.

Em 5 de outubro os docentes foram ao MEC cobrar a reunião. Nesta mesma data, aconteceu o Dia de Luta e Mobilização em Defesa da Educação Pública para pressio-nar o governo a responder objetivamente a pauta de reivindicações da categoria. Durante todo o dia ocorreram aulas pú-blicas e intervenções artísticas em Brasília (DF), em frente ao ministério, e atividades nas IFE. No entanto, o final da manifestação na capital federal foi marcado pela ação truculenta da polícia militar contra profes-sores, técnicos e estudantes. Os policiais agrediram violentamente os participantes com cassetetes e spray de pimenta.

Enquanto o MEC se mostrava irredu-tível para negociar com os docentes, no âmbito dos SPF, somente após marchas, manifestações e ocupações dos minis-térios, o governo se dispôs a receber o Fórum das Entidades Nacionais dos SPF e modificou a estratégia do governo, pas-sando a negociar em mesas setoriais com a apresentação, para algumas entidades, da proposta de redução da vigência do acordo de 4 para 2 anos, mas mantendo os índices anuais (5,5% em agosto de 2016 e 5% em janeiro de 2017).

Durante os mais de quatro meses de greve, os docentes, através das suas lutas locais em unidade com demais segmentos da comunidade acadêmica, conquistaram grandes vitórias, como a campanha “Abre as Contas Reitor (a)!”. “A experiência que tivemos com essa greve é a de que a uni-dade e as articulações com os técnicos e estudantes, em várias instituições foram extremamente importantes. A campanha, com a cobrança de transparência nas contas das reitorias, no mínimo, modifi-cou a relação nas instituições e forçou os reitores a assumirem um compromisso maior com as IFE”, relembra Paulo Rizzo.

José Carneiro, da Universidade Federal do Pará (Ufpa), ressaltou a importância da unidade e disse que uma das maiores dificuldades enfrentadas no período da greve foi em relação à pauta local. Segundo ele, o reitor adotou uma postura dissimulada na greve e que, em muitos momentos, os docentes radicalizaram as suas atividades para chamar a atenção

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da reitoria e da sociedade acerca das reivindicações e cobrar das autoridades locais uma resposta. “Realizamos diversas mobilizações para expor a pauta nacional e local para a comunidade acadêmica e a sociedade, entre elas, o ‘Abre as contas reitor (a)!’. Radicalizamos ações, com trancamentos dos portões da universida-de, por duas vezes, e vigílias na reitoria, além das panfletagens. E os ganhos da greve podem ser vistos no respeito aos nossos princípios, porque não abrimos mão deles e na incorporação do espírito de luta que só a greve traz”, disse.

De acordo com o presidente do ANDES-SN, a greve dos docentes de 2015 foi um importante instrumento de luta para expor e impedir o avanço dos ataques aos direitos dos trabalhadores e do desmonte do serviço público, entre eles, de um dos maiores patrimônios da sociedade brasi-leira – as Instituições Federais de Ensino.

“Foi surpreendente a mobilização e o engajamento dos docentes na luta. Mesmo diante da conjuntura difícil, muitos professores, em conjunto com os técnico-administrativos em educação e o movimento estudantil, acreditaram no movimento, e se não fosse essa luta, a situação das instituições estaria pior. Destaco também o importante papel do Fórum dos SPF e a pressão exercida em conjunto pelas entidades que o com-põem, sem o quê o governo não teria re-cuado da sua posição de reajuste salarial de zero e depois do reajuste parcelado em quatro anos”, avalia.

Rizzo destaca ainda a grande adesão de professores recém-ingressos nas universidades e institutos federais à greve. “A renovação e manutenção do quadro de docentes empenhados em prol desse projeto demonstra a força e disposição da categoria para se manter na luta e resistir aos ataques em unidade com a classe trabalhadora”, pondera, observando ainda a importância da saída unificada da greve, como sinal de fortalecimento do Sindicato Nacional e unidade na categoria docente.

O presidente do ANDES-SN apontou a necessidade de manutenção e ampliação da unidade construída durante o mo-vimento grevista para continuidade da luta nos locais de trabalho, denunciando as situações de precarização. “Existem instituições que não têm orçamento para encerrar o semestre. E os diversos ataques que a greve conseguiu segurar, agora voltarão à pauta, e o projeto de desmonte da universidade pública irá se intensificar”, alerta Rizzo.

A participação dos estudantes foi fundamental para a construção da mobilização, com a deflagra-

ção de greve em várias IFE, a unidade nas manifestações e a radicalização das ações na ocupação de diversas reitorias. Na pauta do movimento estudantil, a luta contra a precariedade da infraes-trutura das instituições, e o atraso no pagamento de bolsas de assistência estudantil e melhoria nas políticas de acesso e permanência.

Os estudantes aderiram a greve nas universidades federais Fluminense (UFF), do Rio de Janeiro (UFRJ), na Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), da Bahia (Ufba), Grande Dourados (UFGD), de Goiás (UFG), do Mato Grosso do Sul (UFMS), da Paraíba (UFPB), e no campus Araguaia da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT). Na Universidade Federal do Paraná (UFPR) e do Ceará (UFC), a adesão à greve contou com a participação de mais de mil alunos nas assembleias. Ocorreram ocupações nas reitorias da UFPR, UFC, UFF, Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), do Amapá (Unifap), do Amazonas (Ufam), de Pelotas (Ufpel), de Alagoas (Ufal), de Santa Catarina (UFSC) e do Rio Garnde do Sul (UFRGS). No campus da UFF de Volta Redonda (Aterrado), os estudantes acamparam e permaneceram durante todo o período da greve.

Larissa Rahneier, da Oposição de Esquerda da UNE, explica que a cons-trução da greve nas IFE foi fundamental como uma forma de resistência aos cortes no orçamento das instituições. Para ela, a comunidade acadêmica

parava por meio da luta ou pela falta de verbas. “Os cortes impactaram concre-tamente no cotidiano dos estudantes, tanto das universidades públicas quantos nas privadas, no atraso e corte de bolsas de custeio. Vimos obras paralisadas, consequência da expansão precarizada, iniciada em 2007 com o Reuni. Faltam professores, materiais e investimentos em infraestrutura de uma forma geral. E diante desse cenário, a juventude deu respostas de uma forma radicalizada, com a ocupação de diversas reitorias, além da participação em diversas ma-nifestações, caravanas e marchas em unidade com outras categorias, pois a luta é uma só”, disse.

Janaína Oliveira, representante da Anel, afirma que a greve foi necessária diante do cenário de profundos cortes. “A greve resultou em uma grande lição, de que é possível unificar todos os se-tores da educação, docentes, técnicos, estudantes e terceirizados, para lutar-mos contra esse Congresso Nacional conservador. Com a greve aumentamos o grau de organização dentro da base estudantil e estamos nos preparando para o próximo ano que será de muita luta porque as medidas de ajuste fiscal não devem cessar”, reforça.

As lideranças estudantis são uníssonas em afirmar a importância da unidade dos segmentos da educação e a participação na construção do II Encontro Nacional de Educação, que será realizado em 2016, para enfrentar os duros e sucessivos ata-ques aos serviços públicos e aos direitos sociais e trabalhistas que tendem a se intensificar no próximo ano.

Estudantes lutam em defesa da Educação Pública

12 InformANDES/2015Entrevista

Democratizar a comunicação para dar visibilidade à luta de classes

Há mais de dez anos, na segunda semana de outubro, os movimentos que lutam pela

democratização da comunicação realizam a Semana Nacional pela Democratização da Comunicação. Neste ano, diversas atividades foram realizadas em mais de dez estados, pautando a importância da democratização dos meios e coletando assinaturas para o Projeto de Lei de Iniciativa Popular que propõe um novo marco regulatório para a comunicação no Brasil. Em entrevista ao InformANDES, Bia Barbosa, coordenadora do Intervozes, coletivo que defende o direito humano à comunicação, e membro da executiva do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), fala como a democratização dos meios é um passo fundamental para mudanças estruturantes na sociedade e para que a classe trabalhadora seja melhor representada nos espaços midiáticos.

Como está a luta pela democratização da comunicação no país?Bia Barbosa: A defesa da democratização

dos meios de comunicação é uma luta histó-rica dos movimentos sociais e da sociedade organizada no Brasil, que, infelizmente, do ponto de vista institucional, avançou muito pouco nos últimos anos. Havia uma expecta-tiva bem grande de que, a partir do momen-to em que tivéssemos um governo popular a frente da nação, que essa agenda ganhasse corpo e se concretizasse em mudanças es-truturais no campo da comunicação, o que a gente acabou não vendo nesses últimos 12 anos de governo. Isso só reforça a impor-tância dessa luta crescer do ponto de vista da mobilização e pressão popular. Nós só vamos conseguir tirar essa agenda do papel

e do campo dos especialistas, quando esse assunto for abraçado com mais afinco pelo conjunto dos movimentos populares e pela sociedade civil. Nesse sentido, a gente teve um avanço muito grande no último período. Esse assunto está cada vez mais inserido na agenda dos movimentos, até porque, a criminalização que os movimentos vêm sofrendo, a invisibilização das lutas dos mo-vimentos sociais e sindicais e a manipulação que os grandes meios de comunicação fa-zem na cobertura de temáticas importantes para a classe trabalhadora têm explicitado, para esse conjunto da sociedade civil orga-nizada, o quando que essa agenda é estra-tégica. Mas ainda temos muito que avançar. A semana nacional de democratização da comunicação é um momento importante para darmos visibilidade a essas lutas e para discutirmos mais de “frente“ aspectos, que cabem dentro dessa grande bandeira que é a democratização dos meios de comuni-cação. Um desses assuntos é justamente o Projeto de Lei de Iniciativa Popular [PLIP] traduzido na prática. Uma medida constru-ída pelos movimentos sociais, coordenada pelo FNDC [Fórum Nacional pela Democra-tização da Comunicação], e que vem, nos últimos dois anos, coletando assinaturas em todo o país para sensibilizarmos novos seto-res da sociedade e conseguirmos construir uma nova proposta legislativa para alterar o

sistema midiático no Brasil.Você poderia detalhar alguns pon-tos que estão no PLIP, numa relação mais direta com a luta da classe trabalhadora. Como o projeto pode abrir espaço para pautar as lutas de setores que hoje não têm espaço na mídia comercial?

BB: Um dos debates principais do PLIP é a regulamentação dos artigos da Constituição relacionados à comunicação. E vários deles têm impacto direto na luta da classe traba-lhadora. Por exemplo, tem um dos itens que regulamenta o artigo 220, que proíbe o mo-nopólio dos meios de comunicação. Ou seja, estaríamos instituindo uma legislação que quebra a concentração dessa propriedade no Brasil e que garante pluralidade e diversi-dade de expressões nos meios de comunica-ção de massas.

O Brasil é um dos países de maior con-centração de propriedade dos meios de comunicação. Uma concentração, inclusive, que tem características mais perversas, por-que ela se confunde com o poder político e, muitas vezes, com o poder religioso. Então, a quebra do processo de monopólio das comunicações já é um primeiro passo para aumentarmos o diálogo de vozes e ideias que circulam no espaço público midiático.

O Plip também prevê a regulamentação do artigo 223 da Constituição, que fala da

Lia de Paula/Minc

InformANDES/2015 13Entrevista

falando, por exemplo, da França, Estados Unidos, Inglaterra, Alemanha, Japão, Austrá-lia, Canadá e países vizinhos ao Brasil, que num período mais recente atualizaram seus marcos regulatórios sem cercear a liberdade de expressão, como o Uruguai e a Argentina, que adotaram medidas para garantir mais diversidade e pluralidade em seus sistemas midiáticos. Então, a gente tem que descons-truir essa ideia, porque infelizmente esses veículos usam o próprio espaço público para distorcer as informações e formar a socieda-de contrária a essa agenda.

Como os docentes podem contribuir com essa luta?BB: É importante pautar este debate nas

escolas e universidades. O exemplo mais claro de como essa mensagem é funda-mental para a luta do Sindicato é só olhar a cobertura que os meios de comunicação estão fazendo das greves que ocorreram e das que ainda estão em curso no país. E isso

complementariedade dos sistemas públi-co, privado e estatal. Quando tratamos a complementariedade, falamos necessaria-mente da ampliação dos espaços públicos de comunicação. Por exemplo, da reserva de espectro para Rádios Comunitárias, que hoje são marginalizadas, inclusive do ponto de vista do alcance à população em geral. Falamos também do tratamento dado à comunicação pública das redes educativas e universitárias, por exemplo, que são espaços onde a possibilidade de difusão das infor-mações produzidas pelos movimentos so-ciais e sindicais é muito mais ampla do que nos meios comerciais tradicionais. Então, garantir um sistema público de comunica-ção forte, com incentivo para as emissoras comunitárias, também tem impacto direto em como a sociedade vai ter acesso ao que esses movimentos defendem e nós, enquan-to movimentos sociais e sindicais, vamos nos sentir representados, com direito a voz nesses espaços.

A discussão sobre o Marco Regulatório na Comunicação e a luta pelo Plip levantou uma discussão na sociedade de que qualquer forma de regulação da mídia seria censura. Como você avalia esse discurso?BB: Esse é o discurso adotado por aque-

les que não querem perder seus privilégios históricos, que ocuparam um espaço público para fazer um negócio e que defendem seus interesses privados. Então, dizer que qual-quer regulação dos meios de comunicação é uma prática de censura é tentar formar uma opinião pública contrária à defesa da regulação dos meios de comunicação, justamente para que não se consiga avan-çar na luta para mudar esse quadro. Em democracias mais antigas que a brasileira há marcos regulatórios, os quais são atua-lizados periodicamente, e nenhum desses países são considerados ditaduras. Estamos

ocorre com as greves na Educação e tam-bém do funcionalismo público em geral e de outros segmentos. Tanto é que, quando os movimentos sindicais organizam suas mani-festações, pautam suas reivindicações, são raros os veículos que fazem uma cobertura que permita à população de fato compre-ender por que esses trabalhadores e essas trabalhadoras estão paralisados e o que eles estão reivindicando. Então, essa é uma boa porta de entrada para a discussão nas uni-versidades: qual é a cobertura da mídia para a nossa agenda? Com isso, o que fica claro para todo mundo é a necessidade de termos uma mídia mais plural e diversa, que dê co-bertura e espaço igual a todos os setores. E só vamos conseguir isso quando mudarmos a estrutura do sistema de comunicação no Brasil e democratizarmos a comunicação como um todo.

Agência Senado

* Listas de coletas de assinatura para o PLIP e demais materiais da campanha estão disponíveis no site www.paraexpressaraliberdade.org.br

InformANDES/201514Movimentos Sociais

Desmilitarização das polícias pode reduzir violência policialSomente em 2014, polícia militar matou 7 pessoas por dia no país

A criminalização contra a população pobre e negra sempre foi uma constante na história do Brasil, mas nos últimos anos a lógica de

repressão, protagonizada pela polícia bra-sileira - com o amplo apoio do Executivo, Judiciário e Legislativo, chegou a níveis alar-mantes para uma nação dita democrática. Dados divulgados neste mês na 9ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública apontam que ao menos 2.526 pessoas foram mortas no Brasil, em 2014, em ação da polícia militar. Isso significa sete mortos por dia, em média.

Segundo Elídio Marques, professor de Direitos Humanos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), os altos números representam a postura da polícia no país, em destaque a Militar, de tratar o outro como inimigo. “É uma herança da vinda da família Real para o Brasil [1808]. E a concepção militarizada e os aspectos mais combatíveis da PM foram reforçados no período da Ditadura Militar [1964-1985]. Então, essa é uma concepção de segurança prevalecente no nosso país de enfrentamen-to do ‘inimigo’”, explica.

O inimigo é invisível. Ele não mora em bairros nobres, não frequenta escolas eliti-zadas, não é branco. As vítimas da violência policial são quase todos pobres, em grande parte, negros e jovens, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Além dos

assassinatos diários, muitos justificados pelos autos de resistência, a limpeza social também é feita nas chacinas, que ocorrem nas periferias das cidades, na truculência utilizada na desocupação de áreas urbanas, e na repressão aos movi-mentos sociais e sindicais, que lutam em defesa dos direitos sociais da população que vem sendo exterminada.

Saulo Arcangeli, da Secretaria Executiva Nacional da CSP-Conlutas, explica que o poder público vem atuando na tentativa de criminalizar cidadãos e movimentos que discordem da atual política imple-mentada no país, e essa tentativa parte dos três poderes: Executivo, Legislativo

e Judiciário. Atualmente tramitam no Congresso Nacional o Projeto de Lei (PL) 2016/15, de autoria do Executivo - conhe-cido como Lei Antiterrorismo e que abre margem à criminalização dos movimentos sociais e populares -, e o PL 6268/2009, que criminaliza a obstrução de vias públicas. “Vimos um aumento da repressão aos movimentos sociais na mesma medida em que aumentamos a luta contra os ataques promovidos pelo governo federal à classe trabalhadora, na forma de medidas de ajuste fiscal e retirada de direitos”, conta.

Arcangeli citou o caso recente ocorrido no dia 5 de outubro, quando docentes, técnico-administrativos e estudantes

Durante ato público em frente ao MEC, docentes federais foram reprimidos pela polícia miliar, em 24 de setembro

15Movimentos Sociais

estavam realizando um ato em frente ao Ministério da Educação

(MEC), em Brasília (DF), em Defesa da Educação Pública e contra o descaso do governo em relação à greve dos docentes e as suas rei- vindicações, que naquele momento já ultrapassava quatro m e s e s . Ao final do ato, os mani-festantes foram surpreendidos e encur- ralados por policiais, que fi- zeram o uso de spray e casse- tetes para reprimir os que ali estavam. Ele também enfatizou as repressões sofridas nas diversas marchas que ocorreram neste ano convocadas pelo Fórum dos SPF.

O representante da CSP-Conlutas também criticou os casos de violência cometidos nas ações de reintegrações de posse, com a polícia servindo aos interesses dos empresá-rios, na garantia da especulação imobiliária, ou na formação de milícias quando ataca trabalhadores sem moradia e indígenas. “O papel da polícia hoje é o de servir ao grande capital”, ressalta, relembrando o caso da invasão da PM na ocupação de Pinheirinhos, em 2012.

Com um ação militar típica de guerra, na madrugada do dia 22 de janeiro de 2012, mais de 2 mil policiais militares, respaldados pelo Poder Judiciário e o Governo de São Paulo, invadiram a ocupação Pinheirinho. Os moradores foram expulsos de suas casas de forma violenta deixando para trás seus pertences, utensílios, roupas e documentos. Muitos moravam no terreno desde 2004, que na época da ocupação estava abando-nado e que servia à especulação imobiliária.

ExtermínioO extermínio dos “inimigos”, implantado

pela PM, fez novas vítimas neste ano. Os assassinatos de 19 pessoas durante uma chacina nas cidades de Osasco, Barueri e Itapevi, região metropolitana de São Paulo, na noite do dia 13 de agosto de 2015, re-meteu ao ano de 2006, em que cerca de 600 pessoas foram assassinadas na capital paulista e Baixada Santista, no mês de maio,

segundo o Movimento Independente Mães de Maio. Casos como o Massacre

do Carandiru, em que 111 presos foram assassinados em 1992, e o desaparecimento do pedreiro carioca Amarildo de Souza, em 2013, elencam a lista de crimes cometidos pelo braço armado do estado, que ganha-ram alguma repercussão e chegaram ao conhecimento da sociedade.

Desmilitarização da PMElídio Marques explica que a solução para

mudar esse cenário de violência seria uma reformulação estrutural nas polícias Militar e Civil, com a desmilitarização da polícia, a unificação das carreiras civil e militar, uma mudança nos currículos das escolas militares, construção de ouvidorias, entre outros pontos. Essa reforma, segundo ele, poderia ser feita mediante a aprovação de uma Emenda Constitucional, que alteraria a Constituição Federal de 1988, e também de uma legislação que regulasse o processo de transição assegurando direitos e transitando para uma estrutura policial compatível com a democracia. Em seu último congresso, realizado em fevereiro em Brasília (DF), o ANDES-SN incorporou ao plano de lutas gerais o posicionamento em favor da des-militarização das polícias e da segurança pública em geral.

“É preciso uma reforma radical no proces-so de formação de policiais, e de militares também, no Brasil. Ainda há uma herança da ditadura na formação desses profissionais, e que permeia concepções autoritárias, racistas, preconceitos ideológicos contra

Das muitas cenas de violência policial protagonizadas em 2015, a repressão contra servidores públicos no Centro Cívico de Curitiba, no dia 29 de abril, ganhou grande repercussão, dada a intensidade da ação repressiva e o

saldo de feridos. Milhares de servidores estaduais do Paraná, entre eles docentes das universidades estaduais e federais, foram violentamente reprimidos por po-liciais militares enquanto protestavam em frente à Assembleia Legislativa contra as mudanças na previdência do funcionalismo estadual. A ação policial resultou em mais de 400 feridos por balas de borracha, bombas, gás de pimenta, ataque de cães, além da prisão de sete manifestantes.

Estados que concentramos maiores números de mortescausadas pela Polícia Militar

695 mortes: São Paulo582 mortes: Rio de Janeiro

256 mortes: Bahia 178 mortes: Paraná159 mortes: Pará

agência brasil

movimentos sociais. Não existiria mais uma hierarquia fechada e antidemocrática”, disse.

Para o professor da UFRJ, o foco da segurança pública no estado democrático deveria ser o atendimento e o respeito ao bem estar do cidadão.

Do luto à luta“Perdi meu filho em 15 de maio de 2006

após um ataque promovido pelo braço armado do estado, a Polícia Militar, como retaliação ao crime organizado”, disse Débora Maria da Silva, coordenadora do Movimento Mães de Maio. Edson Rogério Silva dos Santos, na época com 29 anos, saia do trabalho quando foi alvejado com cinco tiros. “Eu caí em uma depressão profunda e com uma força que veio do além eu fui para a luta”, conta.

O Movimento Mães de Maio reúne mu-lheres da Baixada Santista, que perderam seus filhos de forma violenta, em decorrência da ação do Estado. “Lutamos de segunda a segunda contra o terrorismo do estado contra nós: pretos, pobres e periféricos. Depois dos crimes de 2006, fizemos vários protestos durante o ano e sofremos várias re-taliações da PM. Mesmo assim, continuamos na luta, conseguimos apoio de organizações internacionais e agregamos vários coletivos”, afirma Débora, que explica que a luta não é apenas contra a injustiça e pela desmilitari-zação das policias, mas também em favor do direito às manifestações. “Existe hoje na polícia um racismo institucional velado. A polícia é fascista e se diz restabilizadora da ordem. Que ordem é essa?”, questiona.

Repressão policial em Curitiba

InformANDES/2015

16 InformANDES/2015Internacional

Desaparecimento de estudantes mexicanos segue sem respostaMarcha de Indignação Nacional marca um ano do sequestro dos 43 estudantes de Iguala

Um ano após o “Massacre de Iguala” - como ficou conhecido o assassinato de três e o desapareci-mento de 43 estudantes da Escola

Normal de Ayotzinapa, no dia 26 de setem-bro de 2014, na cidade de Iguala, estado de Guerrero, no México, a indignação e a revolta por parte da população mexicana seguem presentes, principalmente diante da versão oficial do caso, apresentada apressadamente pelo governo mexicano, de que os estudantes foram assassinados por traficantes de drogas.

Os pais dos estudantes organizaram a “Marcha da Indignação Nacional”, na Cidade do México, no dia 26 de setembro deste ano para relembrar o caso e cobrar supervisão internacional nas próximas etapas da investigação. Com amplo apelo popular local e internacional, os manifes-tantes ainda realizaram uma vigília de 43 horas em homenagem aos desaparecidos. “A situação em si é dramática e trágica, mas a possibilidade dos 43 estudantes de Ayotzinapa estarem vivos nos traz es-perança em meio à barbárie capitalista”, afirma Wicho Rangel, estudante de econo-mia da Universidade Nacional Autônoma do México (Unam). Além da marcha, um grupo com familiares, amigos e sobrevi-

ventes do massacre integrou a Caravana 43 Suldamerica, que saiu do México com o objetivo de buscar apoio internacional à luta por justiça. No Brasil, realizaram ati-vidades no Rio de Janeiro e em São Paulo.

A manifestação veio em um momento em que a investigação do caso deu uma forte guinada. Em fevereiro de 2015, a Procuradoria Geral do México apresentou a conclusão de que os estudantes foram entregues por policias corruptos aos tra-ficantes de drogas locais, que os mataram e incineraram em um depósito de lixo nas proximidades, por suspeita de que os jovens seriam membros de um cartel rival.

Wicho Rangelconta que a versão ofi-cial apresentada pelo governo, na época, foi contestada pelos familiares das ví-timas, movimentos sociais e políticos, imprensa e, mais recentemente, pelo Grupo Interdisciplinar de Comissão Peritos Independentes, incumbido pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) de investigar o caso. Entre os questiona-mentos: “Como é possível queimar ao ar livre, em uma noite chuvosa, com gasolina e pneus 43 corpos de uma só vez, sem deixar nenhum vestígio? E a chama e fumaça não teriam sidos avistados a quilômetros de distância? Não há relato disso. No

lixão, onde eles supostamente foram queima-dos, não houve indicação de um grande incên-dio”, pontua o estudante.

Rangel relata que a pressão popular e a so-

lidariedade internacional, neste processo, foram de extrema importância para pres-sionar o governo a assumir novas linhas de investigação. “Grande parte do apoio e solidariedade vem da visibilidade mun-dial do caso Ayotzinapa. O governo pode apostar no esquecimento deste caso com o tempo, mas a mobilização da sociedade, com a realização da Marcha, mostrou que não será tão fácil assim”, disse.

DesdobramentosDurante a investigação foram encontra-

das diversas fossas comuns com centenas de cadáveres de casos desconhecidos, prin-cipalmente no Estado de Guerrero. Além disso, novos casos de desaparecimento forçados foram revelados e, para além do domínio do narcotráfico no interior do país, o envolvimento e a cumplicidade do Estado com os fatos gerou ampla revolta na sociedade mexicana.

ViolênciaO México está entre os 25 países mais

violentos do mundo. Segundo dados de 2014 do Instituto Nacional de Estatística e Geografia mexicano, menos de 2% dos crimes são resolvidos no país. Guerrero, além de ser um dos três estados com maior impunidade do país, é também o mais pobre. Entre 2007 e 2014, 164 mil civis morreram – o dobro do que foi registrado no mesmo período em países como Iraque e Afeganistão, que oficial-mente estão em guerra. “A violência no país não para e ela não tem distinção. As taxas de homicídio são parecidas com os de países em guerra como o Iraque ou na Síria, sem estarmos em ‘qualquer conflito’”, lamenta o estudante.

Pais dos estudantes mexicanos desaparecidos organizaram a “Marcha da Indignação Nacional”, na Cidade do México (acima) e manifestantes realizam ato público, em Barcelona, para relembrar o "Massacre de Iguala" (ao lado)

Fotos: Fotomovimiento