sintomas psicóticos em uma amostra comunitária de idosos ... · À marcela, minha companheira de...
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WALTER BARBALHO SOARES
Sintomas psicóticos em uma amostra comunitária de idosos
sem demência da cidade de São Paulo:
incidência e fatores de risco
Tese apresentada à Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo para a obtenção do título de Doutor em Ciências Programa de Psiquiatria Orientador: Prof. Dr. Helio Elkis
São Paulo 2017
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Preparada pela Biblioteca da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
reprodução autorizada pelo autor
Soares, Walter Barbalho
Sintomas psicóticos em uma amostra comunitária de idosos sem demência da
cidade de São Paulo : incidência e fatores de risco / Walter Barbalho Soares --
São Paulo, 2017.
Tese(doutorado)--Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Programa de Psiquiatria.
Orientador: Helio Elkis.
Descritores: 1.Transtornos psicóticos/sintomas 2.Comunidade 3.Idosos sem
demência 4.Incidência 5.Fatores de risco
USP/FM/DBD-173/17
Ao querido Professor Cássio Machado de Campos Bottino (i.m.).
À Marcela, minha companheira de vida, minha amizade e amor
para a vida inteira.
Ao meu filho, Miguel, pela simplicidade
do seu sorriso contagiante.
Aos meus pais, Clayton e Mariana, pelo amor,
pelo apoio e pela estrutura incondicionais.
À minha irmã, Mariana, pelo amor
e pela torcida carinhosa.
AGRADECIMENTOS
Ao Prof. Dr. Cássio Machado de Campos Bottino, por ter me dado uma
oportunidade ímpar e o privilégio de ser seu orientando, acreditando em mim
com tanta verdade desde o início. Por sua serenidade tanto nos momentos
difíceis, como também na hora de colher os bons frutos, por enxergar
oportunidades onde tantos não viam. Por ter compartilhado comigo o
conhecimento técnico de maneira direta, como também o conhecimento
humano de maneira indireta. Por ter sido e continuar sendo um grande
exemplo de professor, mestre, pesquisador, médico e psiquiatra, o qual
carregarei comigo e aplicarei por onde estiver.
Ao Prof. Dr. Hélio Elkis, pela emocionante atitude em ter me acolhido
como orientando em um momento tão difícil para todos nós, demonstrando
sempre a disposição em me ajudar prontamente, por ter contribuído de
maneira essencial ao trabalho, tanto nas qualificações como também no
processo final do artigo e da tese.
À Profª. Débora Pastore Bassitt, por ter me guiado no início da minha
caminhada na pós-graduação, por ter contribuído de maneira tão importante
na minha formação como psiquiatra, por sua simplicidade e humildade ao
compartilhar o seu conhecimento, e pelos conselhos sempre tão preciosos.
À querida Alessandra Vieira Rodrigues, pela essencial ajuda durante
todo o meu período no PROTER, pelas conversas e pelos risos fáceis, e por
seu apoio.
À Profa. Dra. Tânia Corrêa de Toledo Ferraz, que, como membro da
banca de qualificação, contribuiu com excelência por meio de seus
comentários e de suas sugestões para o desenvolvimento deste trabalho.
À Eliza Fukushima e Isabel Ataíde, pela ajuda constante nos processos
burocráticos da pós-graduação, pelas constantes lembranças quanto aos
prazos a serem cumpridos, pela disponibilidade em ajudar e pela torcida.
Aos estatísticos Melaine Oliveira, Eriton Barros e Helton Graziadei, por
terem contribuído nas diferentes partes do estudo.
A todos os profissionais que fazem parte do PROTER, por terem me
ajudado sempre que precisei, e por desenvolverem a pesquisa e a assistência
com excelência.
Aos pacientes e familiares, por aceitarem participar de todo esse grande
projeto.
A todos os profissionais que participaram do desenvolvimento, da
aplicação e da análise deste grande projeto de pesquisa.
À Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e ao seu
Instituto de Psiquiatria, pela infraestrutura física e de pessoal essenciais para
o desenvolvimento deste projeto.
À minha amiga, namorada, esposa, companheira, Marcela, por seu
amor, seu carinho, seu cuidado, sua torcida, sua dedicação e sua
compreensão, e por ter caminhado de mãos dadas comigo ao longo de toda
a minha trajetória acadêmica, sendo parte essencial da conquista desse
sonho.
Aos meus pais, Clayton e Mariana, pelo amor tão bonito e incondicional,
por terem me ensinado desde tão cedo como o estudo é a verdadeira fonte
de riqueza que podemos ter e por terem me dado condições plenas para eu
poder ter chegado tão longe.
Ao meu filho Miguel, que com tão pouca idade já me ensinou tanto, sobre
o amor e, principalmente, como a felicidade pode ser simples.
À minha irmã, Mariana, por vibrar e torcer tanto por mim, por seu amor
e por sua amizade.
À família Rocha Bezerra, por torcerem e vibrarem desde muito tempo
por mim e compartilharem alegrias por meus objetivos alcançados.
Aos meus tios, primos e queridos amigos, pela compreensão, pela
torcida e pelo amor, parte fundamental dessa caminhada.
NORMALIZAÇÃO ADOTADA
Esta tese está de acordo com as seguintes normas, em vigor no momento desta publicação: Referências: adaptado de International Committee of Medical Journals Editors (Vancouver). Universidade de São Paulo. Faculdade de Medicina. Divisão de Biblioteca e Documentação. Guia de apresentação de dissertações, teses e monografias. Elaborado por Anneliese Carneiro da Cunha, Maria Julia de A. L. Freddi, Maria F. Crestana, Marinalva de Souza Aragão, Suely Campos Cardoso, Valéria Vilhena. 3a ed. São Paulo: Divisão de Biblioteca e Documentação; 2011. Abreviaturas dos títulos dos periódicos de acordo com List of Journals Indexed in Index Medicus.
SUMÁRIO
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
LISTA DE TABELAS
LISTA DE FIGURAS
RESUMO
ABSTRACT
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................ 2
1.1 População idosa: crescimento e acometimento por transtornos mentais ......................................................................................................... 2
1.2 Prevalência e incidência de sintomas psicóticos em idosos sem demência ...................................................................................................... 3
1.3 Análises dos artigos mais relevantes da revisão bibliográfica. ........ 5
1.4 Possíveis fatores de risco relacionados aos sintomas psicóticos ..11
1.5 As relações entre os sintomas psicóticos e o posterior desenvolvimento de demência ..................................................................12
1.6 A investigação dos sintomas psicóticos em idosos sem demência 13
1.7 Primeira fase do estudo: estudo da prevalência de sintomas psicóticos em uma população de idosos sem demência do Município de São Paulo ...............................................................................................14
1.7.1 Prevalências dos sintomas psicóticos ............................................14
1.7.2 Aspectos cognitivos (Tabelas 1 e 2) ................................................15
1.7.3 Aspectos socioeconômicos ..............................................................16
1.7.4 Comorbidades ....................................................................................18
1.7.5 Possíveis fatores de risco .................................................................19
2 JUSTIFICATIVA DO ESTUDO ..................................................................21
3 OBJETIVOS ..............................................................................................23
3.1 Objetivo principal ..................................................................................23
3.2 Objetivos secundários..........................................................................23
4 HIPÓTESE DO ESTUDO...........................................................................26
5 MÉTODOS .................................................................................................28
5.1 Amostra .................................................................................................28
5.2 Instrumentos .........................................................................................33
5.3 Análises estatísticas .............................................................................35
6 RESULTADOS ..........................................................................................38
6.1 Descrição da amostra (Tabela 6) .........................................................38
6.2 Incidências de sintomas psicóticos ....................................................39
6.3 Aspectos cognitivos (Tabelas 7 e 8) ...................................................40
6.4 Aspectos socioeconômicos (Tabelas 7 e 8) .......................................42
6.5 Comorbidades (Tabela 9) .....................................................................42
6.6 Regressão logística (Tabela 10) ..........................................................43
6.7 Desenvolvimento de comprometimento cognitivo (Tabela 11) ........44
7 DISCUSSÃO ..............................................................................................46
7.1 Desempenho cognitivo.........................................................................48
7.2 Aspectos socioeconômicos .................................................................49
7.3 Associações com comorbidades clínicas ..........................................50
7.4 Possíveis fatores de risco para a incidência de sintomas psicóticos ...................................................................................................52
7.5 Conversão em comprometimento cognitivo ......................................53
8 CONCLUSÃO ............................................................................................58
9 ANEXOS ....................................................................................................60
9.1 ANEXO A – Artigo “Psychotic symptoms in older people without dementia from a Brazilian community-based sample”. ...........................60
9.2 ANEXO B – Carta de submissão do segundo artigo ao periódico PLOS ONE. Submetido em 13/08/2016, atualmente está sob revisão. ...69
10 REFERÊNCIAS .......................................................................................71
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
ABIPEME Associação Brasileira de Pesquisa de Mercado
AIDS Síndrome da Imunodeficiência Adquirida
AVC Acidente Vascular Cerebral
AVDs Atividades da Vida Diária
B-ADL The Bayer Activities of Daily Living scale
CAMDEX Cambridge Mental Disorders of the Elderly Examination
CID-10 Classificação Internacional de Doenças – 10ª versão
CPRS Comprehensive Psychopathological Rating Scale
D-10 Escala de 10 itens para screening de sintomas depressivos em idosos
DC Doença de Chagas
DSM-III Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais da Associação Americana de Psiquiatria versão III
DSM-III-R Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais da Associação Americana de Psiquiatria versão III Revisada
DSM-IV Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais da Associação Americana de Psiquiatria versão IV
DSM 5 Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais da Associação Americana de Psiquiatria versão 5
FOME Fuld Object Memory Exam
GMS Geriatric Mental State Schedule
HAS Hipertensão Arterial Sistêmica
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IQCODE Informant Questionnaire on Cognitive Decline in the Elderly
MEEM Miniexame do Estado Mental
OR Odds ratio
SDCS Sintomas Depressivos Clinicamente Significativos
SPSS Statiscal Package for the Social Sciences
TCE Trauma Cranioencefálico
USP Universidade de São Paulo
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Relação entre sintomas psicóticos e teste cognitivo (MEEM)/escala funcional (B-ADL) na Fase I. .......................... 15
Tabela 2 - Relação entre os sintomas psicóticos e as faixas de escolaridade na Fase I............................................................. 16
Tabela 3 - Relação entre os sintomas psicóticos e as classes socioeconômicas na Fase I. .................................................... 17
Tabela 4 - Relação entre os sintomas psicóticos e os tipos de serviços de saúde utilizados na Fase I. ...................................................... 18
Tabela 5 – Fatores associados à prevalência de sintomas psicóticos entre indivíduos sem comprometimento cognitivo. ........................... 19
Tabela 6 - Características sociodemográficas da amostra. ...................... 38
Tabela 7 - Relação entre sintomas psicóticos e testagem cognitiva (MEEM), e escala funcional (B-ADL) e serviços de saúde na Fase II. ..................................................................................... 41
Tabela 8 - Relação entre sintomas psicóticos, anos de estudos e classe socioeconômica na Fase II. ..................................................... 41
Tabela 9 – Prevalência de comorbidades por tipo de sintomas psicóticos (%) na Fase II .......................................................................... 43
Tabela 10 – Fatores preditores de sintomas psicóticos em indivíduos sem comprometimento cognitivo na Fase II. ................................... 44
Tabela 11 – Sintomas psicóticos e suas associações com a taxa de conversão em comprometimento cognitivo/funcional após 7 anos de seguimento................................................................. 44
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Estratificação dos 96 distritos da cidade de São Paulo de acordo com a situação socioeconômica para a seleção dos pacientes da amostra inicial. .................................................... 31
Figura 2 – Cálculo do número de indivíduos idosos a serem entrevistados por cada estrato socioeconômico de acordo com a fração amostral. .................................................................................. 31
Figura 3 – Divisão dos distritos selecionados em setores, posteriormente em domicílios, número de indivíduos identificados e os que aceitaram ser visitados após a abordagem dos entrevistadores. ....................................................................... 31
Figura 4 – Critérios de inclusão: testes cognitivos, funcionais e a escala de Sintomas Depressivos Clinicamente Significativos. ................. 32
Figura 5 – Diagrama envolvendo as subamostras utilizadas no presente estudo. ..................................................................................... 32
RESUMO
Soares WB. Sintomas psicóticos em uma amostra comunitária de idosos sem
demência da cidade de São Paulo: incidência e fatores de risco [Tese].
Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo; 2017.
Pouco se sabe sobre a presença de sintomas psicóticos em idosos sem
diagnóstico de demência, levando a dificuldades no esclarecimento da etiologia,
na ausência de informações quanto a possíveis diagnósticos e no manejo clínico.
Os estudos sobre a incidência de sintomas psicóticos nessa população são ainda
mais escassos e limitados. Os dados disponíveis na literatura são todos
provenientes de estudos em populações de países desenvolvidos. A prevalência
de sintomas psicóticos em idosos sem diagnóstico de demência varia de 0,9 a
10,5%, já a incidência na literatura varia entre 4,8 e 8,0%. É possível especular
sobre alguns fatores de risco para o desenvolvimento de sintomas psicóticos em
indivíduos sem demência: idade avançada, gênero feminino, comprometimento
sensorial, pior desempenho cognitivo, isolamento social, pior funcionalidade.
Dados recentes sugerem os sintomas psicóticos como uma expressão
prodrômica da demência, devido a sintomas como alucinações, delírios e
ideação paranoide estarem associados ao aumento da incidência de demência
no acompanhamento, à maior presença deles à medida que a faixa etária sobe
e à menor média no escore do Miniexame do Estado Mental (MEEM) em
indivíduos com tais sintomas. Objetivamos determinar a incidência de sintomas
psicóticos, correlacioná-los com características clínicas e estabelecer uma taxa
de conversão em idosos sem comprometimento cognitivo. Este estudo foi
realizado em uma amostra de idosos de comunidade de São Paulo, sendo a
amostra inicial composta por 1.125 indivíduos acima de 60 anos. Destes, 547
foram reavaliados em 2011 e submetidos ao mesmo protocolo inicial. Não tinham
sintomas psicóticos na primeira fase 199 e 64 já possuíam em 2006. A incidência
de ao menos um sintoma psicótico em 7 anos foi 8,0% (alucinações
visuais/táteis: 4,5%; ideias persecutórias: 3,0%; alucinações auditivas: 2,5%). A
incidência esteve relacionada à epilepsia (OR: 7,75 e 15,83), baixa pontuação no
MEEM (OR: 0,72) e depressão referida (OR: 6,48). 57,8% dos indivíduos com
sintomas psicóticos, mas sem demência na fase I, desenvolveram
comprometimento cognitivo em 7 anos (alucinações visuais/táteis foram
preditivas – OR: 5,66), o que estava relacionado a baixo MEEM e
comprometimento funcional. A incidência de sintomas psicóticos e a taxa de
conversão em comprometimento cognitivo estão no limite superior dos dados da
literatura. Alucinações visuais/táteis foram os sintomas mais incidentes e os
únicos preditivos para a evolução para comprometimento cognitivo em 5 anos.
Encontramos importantes relações entre sintomas psicóticos e MEEM, crises
convulsivas, depressão referida, diabetes e sífilis.
Descritores: Transtornos psicóticos/sintomas; comunidade; idosos sem
demência; incidência; fatores de risco.
ABSTRACT
Soares WB. Psychotic symptoms in older people without dementia from a
Brazilian community-based sample: Incidence, risk factors and cognitive
impairment development [Thesis]. “Faculdade de Medicina, Universidade de
São Paulo”; 2017.
Background: Studies of the incidence of psychotic symptoms in elderly
people at risk of dementia are scarce. This is a seven year follow up study
aiming to determine the incidence of psychotic symptoms and their correlation
with other clinical aspects as well as conversion rates to cognitive impairment.
Objectives: To determine the incidence of psychotic symptoms, correlate
these symptoms with clinical characteristics and establish the conversion rate
to cognitively impaired individuals. Design: Cross-sectional study of a
community-based sample of elderly subjects. Setting: City of Sao Paulo, State
of Sao Paulo, Brazil. Participants: The original sample was composed of
1,125 individuals aged 60 years and older from a community. Among this
sample, 547 subjects were re-evaluated in 2011 and submitted to the same
protocol. Of these, 199 did not have psychotic symptoms at phase I and 64
already had psychotic symptoms in 2006. Results: The incidence of at least
one psychotic symptom in 7 years was 8.0% (Visual/tactile hallucinations:
4.5%; Persecutory delusions: 3.0%; Auditory hallucinations: 2.5%). Psychotic
symptom incidence was associated with epilepsy (OR: 7.75 and 15.83), lower
MMSE (OR: 0.72) and reported depression (OR: 6.48). A total of 57.8% of
individuals with psychotic symptoms but without dementia at phase I
developed cognitive impairment after 7 years (visual/tactile hallucinations were
the only psychotic symptom predictive of this impairment – OR: 5.66), which
was related to lower MMSE and increased functional impairment.
Conclusions: The incidence of psychotic symptoms and the conversion rate
to cognitive impairment was in the upper range of previous literature reports.
Visual/tactile hallucinations were the most incident symptoms and the only
predictive psychotic symptoms for cognitive impairment in 5 years. Important
relationships were found between psychotic symptoms incidence and MMSE,
epilepsy, reported depression, diabetes and syphilis.
Descriptors: Epidemiology; psychotic symptoms; elderly; community sample;
incidence; risk factors.
1 INTRODUÇÃO
1 Introdução 2
1 INTRODUÇÃO
1.1 População idosa: crescimento e acometimento por transtornos mentais
Nos últimos anos, a população idosa tem crescido de maneira
considerável em nosso país, a tendência de envelhecimento da população
vem se consolidando cada vez mais. Dados do último censo do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) realizado em 2010 mostram as
pessoas com 60 anos ou mais somando cerca de 21 milhões, comparando-
se ao censo realizado em 1991, quando tal população atingia por volta de 11
milhões, verifica-se que o número de idosos no Brasil duplicou em 20 anos1.
Entre 2010 e 2030, projeções também indicam uma duplicação no percentual
de participação da população idosa na população brasileira geral, passando
de 6,8% para 13,44%1. Com isso, cada vez mais indivíduos estarão vivendo
mais tempo na nossa realidade e, possivelmente, desenvolverão mais
problemas de saúde relacionados a esse processo, dentre os quais as
doenças mentais também fazem parte.
Os transtornos mentais incidentes na população idosa, geralmente, são
causas de limitação e de pior prognóstico, dentre os quais as demências estão
entre os mais prevalentes. Pacientes com diagnóstico de demência vão ter
algum distúrbio mental ou de comportamento durante o curso da doença2 e
estima-se que sua prevalência em 5 anos seja de 97%3. Esses sintomas
podem ocorrer ao longo de todos os estágios da demência e podem ser
divididos em clusters ou síndromes: agitação, agressividade, depressão,
ansiedade, apatia, desinibição, distúrbios do ciclo sono-vigília, alterações de
apetite e a presença de sintomas psicóticos4, sendo estes uns dos causadores
de maior impacto social e de importante significado clínico. Nesses casos, a
demanda sobre os cuidadores tende a ser maior e mais desgastante,
aumentado a sobrecarga, o que também representa um problema de saúde
1 Introdução 3
pública, pois é um fator de risco fortemente relacionado ao desenvolvimento
de transtornos psiquiátricos nessa população5.
Na literatura médica, estudos sobre quadros delirantes em pacientes
jovens e em idosos com demência são frequentes e em grande número6-8. Tal
número de estudos faz com que alguns dados estejam bem sedimentados
quanto à população de idosos com demência, dentre eles: prevalência
variando de 10 a 60%8,-10; maior risco de desenvolvimento com o aumento da
idade11; prevalência maior entre os pacientes institucionalizados11, maior
frequência em quadros de demência mais avançados, principalmente dentre
os moderados e graves2; maior frequência em indivíduos diagnosticados com
Doença de Alzheimer em comparação a demências com outras etiologias,
como a Demência Vascular e a Demência frontotemporal2; associação com
doenças neurodegenerativas, como a Demência por corpúsculos de Lewy e a
Doença de Parkinson. Esses numerosos dados contrastam com a escassez
quantitativa e qualitativa, quanto a quadros psicóticos em idosos sem
demência.
1.2 Prevalência e incidência de sintomas psicóticos em idosos sem demência
Pouco se sabe sobre a presença de sintomas psicóticos em idosos sem
diagnóstico de demência9, levando a dificuldades no esclarecimento da
etiologia desses quadros, ausência de informações quanto a possíveis
diagnósticos, dificultando seu manejo clínico. Na literatura desde 1984,
quando o primeiro estudo mais abrangente foi publicado envolvendo essa
população6, evidenciou-se que a prevalência dos sintomas psicóticos tais
quais como: delírios, alucinações, experiências alucinatórias transitórias,
traços de personalidade paranoide, ideias de grandeza, ideias de
perseguição, ciúme exagerado, sentir-se controlado, pensamentos disruptivos
e acusação de outras pessoas9. Em idosos sem diagnóstico de demência, tal
prevalência varia de 0,9 a 8,0%, em populações acima de 65 anos2,7,9,11,12, e
de 7,4 a 10,5% em indivíduos acima dos 85 anos13-15. Considerando-se
1 Introdução 4
apenas ideação paranoide, definida como: crenças de estar sendo
perseguido; sentir que está sendo maltratado ou assediado; de maneira a não
caracterizar a proporção de um pensamento delirante bem estruturado, os
estudos mostraram prevalências entre 1,0 e 6,9%4,8,9,14. Quanto à prevalência
de sintomas psicóticos mais específicos tais como: alucinações, visuais,
auditivas, ou outras, a variação ficou entre 0,6 e 6,7%2,15 ou, no caso de
ilusões, 8,1%14. No caso de delírios mais estruturados, persecutórios ou não
persecutórios, a prevalência foi de 0,6%15.
Os estudos sobre a incidência de sintomas psicóticos nessa população
são ainda mais escassos e limitados. Henderson et al., 1998, estudaram
indivíduos acima de 70 anos sem comprometimento cognitivo, relatando uma
incidência acumulada de 4,8% para sintomas psicóticos, em um
acompanhamento superior a 3 anos2. No estudo realizado por Ostling,
Palsson & Skoog, 2007, evidenciou-se uma incidência acumulada de 4,8% ao
se considerar apenas a avaliação de profissionais, de 8,0%, quando se
considerou a avaliação de profissional e informações de cuidadores, e de
19,8% naqueles reavaliados aos 85 anos de idade5.
Tendo em vista a cronologia dos artigos mais relevantes, não se observa
aumento ou diminuição no número de pessoas sem diagnóstico de demência,
acometidas por esses sintomas. Existe uma oscilação nas taxas de
prevalência. No período de 1998 a 2001, estas taxas variaram entre 2,4 e
4,2%2,7,8,11. A partir de 2002, as populações das pesquisas passaram a ser
menores e os valores de prevalência apresentaram maior oscilação,
começando com 10,1%14, passando a 7,4%15, chegando a 0,9 e 1,2%9, em
2009. Em estudos publicados mais recentes, a prevalência voltou a atingir
10,5%13, elevando-se para 11,5%16 e variando entre 2,6% e 13,4%, em
201317,18. Tal oscilação pode ser justificada principalmente pelos seguintes
fatores: faixa etária das amostras desses estudos, o número de indivíduos de
cada amostra, e a diversidade no modo de avaliar os pacientes e os sintomas
psicóticos.
1 Introdução 5
Quanto às faixas etárias das amostras, há certa variação, por vezes
levando em consideração apenas indivíduos acima de 85 ou 95 anos, os quais
apresentaram, em geral, as maiores prevalências (10,1%, 7,4% e 10,5%)13-15.
Outros estudos, feitos com amostras de indivíduos acima de 64 ou 70 anos,
mostraram prevalências, em geral, mais baixas2,7,8,9,11,16-18. Essa estratégia
pode fazer com que a amostra fique muito restrita a uma determinada faixa
etária, dificultando a generalização dos resultados encontrados.
Observamos também uma variação no tamanho da amostragem dos
artigos. Os estudos com maior número de indivíduos (n= 720 a 5092) foram
realizados, em sua maioria, até 2001 e apresentaram menor prevalência de
sintomas psicóticos (0,9 a 4,2%)2,6,7,8,11. Já nos estudos com amostras
menores (163 a 451), observou-se prevalências mais elevadas (4,8 a
10,5%)10,12,14,15, tendo sido realizados de 2002 a 2009. Com o aumento das
dificuldades no recrutamento de indivíduos para as pesquisas, os estudos
com grandes amostras ficaram mais escassos.
1.3 Análises dos artigos mais relevantes da revisão bibliográfica
Henderson et al., 1998, incluíram idosos acima de 70 anos, apesar de
terem feito a classificação de pacientes com comprometimento cognitivo
(Miniexame do Estado Mental – MEEM – menor do que 24) ou que
preenchiam critérios para demência de acordo com a Classificação
Internacional de Doenças – 10ª versão (CID-10) ou DSM-IV. Os sintomas
psicóticos foram avaliados por meio do “Schedule for Clinical Assessment in
Neuropsychiatry”, que investiga ideias paranoides e alucinações auditivas por
quatro questões feitas ao paciente e uma ao informante. Caso uma dessas
questões tivesse resposta positiva, o indivíduo era classificado no grupo com
sintomas psicóticos7. Apesar de investigar satisfatoriamente delírios e
alucinações auditivas, não há avaliação de outros sintomas psicóticos, como
as alucinações táteis, visuais e olfatórias, as quais são mais frequentes entre
os idosos com esse tipo de quadro16. Nesse estudo, também foram
1 Introdução 6
investigados o suporte demográfico e social, funções cognitivas, outras
doenças mentais e personalidade, comprometimento físico, doenças físicas,
uso de serviço público e as atividades da vida diária, sendo esta última
variável mensurada por uma escala não validada internacionalmente, ao
contrário das outras variáveis do estudo7. Tratou-se de uma pesquisa
longitudinal de idosos residentes na comunidade, o que proporcionou
determinar não apenas a prevalência desses sintomas, como a também sua
incidência em um período superior a 3 anos7. Foi o primeiro estudo a abordar
a incidência de sintomas psicóticos em uma população sem demência7.
Forsell et al., 1998, avaliaram uma amostra expressiva (1.420
indivíduos) de uma região específica de Estocolmo. Os pacientes foram
divididos em “com sintomas paranoides” e “sem esses sintomas”, não sendo
excluídos aqueles com comprometimento cognitivo, utilizando apenas o
escore do MEEM menor do que 24, e não avaliando o comprometimento
funcional. A investigação da presença de sintomas psicóticos foi feita com a
aplicação da “Comprehensive Psychopathological Rating Scale” (CPRS). Esta
escala inclui questionamentos diretos ao indivíduo (como, por exemplo,
presença de vozes baixas que parecem estar nas redondezas), além de
também levar em consideração observações do entrevistador (pergunta
repetida sobre o propósito do questionamento; se a comunicação foi
dificultada pelo alto grau de suspeita do entrevistado; se o paciente procura
por gravadores ou câmeras escondidas). A observação do entrevistador
deveria ser levada em consideração diante da presença de delírios não
bizarros (sentir-se perseguido, envenenado, infectado ou traído)8, mas não foi
feita uma descrição mais detalhada dos questionamentos realizados. Os
indivíduos foram classificados no grupo com sintomas paranoides se tivessem
personalidade paranoide, ou se fossem diagnosticados com esses sintomas
psicóticos pelos médicos avaliadores8, não sendo descritos objetivamente
como esses diagnósticos foram feitos.
Em 2000, Lyketsos e colegas estudaram uma amostra da população de
um condado americano, avaliando 5.092 idosos com mais de 65 anos, sem
excluir pacientes com comprometimento cognitivo. O diagnóstico de
1 Introdução 7
demência foi feito levando-se em consideração a história clínica, exame
psíquico, exame neurológico, breve exame físico, uma hora de testes
neuropsicológicos, exames laboratoriais de screening para demência e
exames de imagem. Os sintomas psicóticos foram avaliados com a aplicação
do “Neuropsychiatric Inventory”, que investiga a presença dos seguintes
sintomas no último mês: delírio, alucinações, ansiedade, elação do humor,
apatia, desinibição, irritabilidade e comportamento motor aberrante.
Inicialmente, foram feitas perguntas de rastreio. Caso as respostas fossem
positivas, aprofundava-se o questionamento, tentando estimar a frequência e
a severidade do sintoma, levando em consideração informações do cuidador2.
Não há descrição específica dos questionamentos feitos tanto ao paciente
como ao cuidador, são relatadas apenas as áreas pesquisadas. Além disso,
em geral, apenas uma pergunta de rastreio é feita para investigação de
sintomas psicóticos para depois inquerir especificamente sobre tal sintoma
positivo. Essa metodologia pode mascarar a prevalência desses sintomas,
pois sabemos que o paciente pode relutar em relatar tais quadros18.
O trabalho publicado em 2001, de autoria de Livingston e colaboradores,
apresentou uma amostra 720 idosos acima de 65 anos, apenas de uma região
específica (uma das menos desenvolvidas) do Reino Unido11, teoricamente
restrito às características da população estudada. Os sintomas psicóticos
foram investigados pelo “Geriatric Mental State Schedule” (GMS), subdividido
em sessões: as primeiras questionam sobre experiências de
persecutoriedade; as segundas, sobre experiências sensoriais anormais em
todos os sentidos, se ocorrem dormindo ou se julgam ser realidade.
Respostas afetivas quanto ao delírio ou às alucinações também foram
averiguadas. As perguntas foram feitas diretamente ao paciente, em caso
deste ter tido o diagnóstico de demência, elas eram feitas aos cuidadores.
Não houve descrição literal das perguntas realizadas, como também não
foram descritos os critérios para inclusão no grupo dos indivíduos com
sintomas psicóticos.
O primeiro estudo a avaliar sintomas psicóticos e excluir os indivíduos
com comprometimento cognitivo da amostra foi realizado em 2002 na Suécia
1 Introdução 8
por Ostling e coautores, e que incluiu uma amostra de idosos com idade acima
dos 85 anos14. O diagnóstico de demência foi feito baseado no exame clínico
psiquiátrico e na entrevista do informante, os quais tiveram como orientação
um algoritmo inspirado nos critérios diagnósticos do DSM-III-R. Os sintomas
psicóticos foram investigados com a aplicação do CPRS (descrito
anteriormente) e classificados da seguinte maneira: alucinações (visual,
auditiva, outra); delírios (persecutórios ou não persecutórios); ideação
paranoide (crença de estar sendo perseguido, assediado, ou tratado de
maneira não digna, sem proporções de delírio)14. Dessa forma, os autores do
estudo demonstraram ter feito uma avaliação bem estruturada desses
sintomas. A investigação das doenças clínicas foi feita cuidadosamente,
inclusive com a realização de exames complementares, mas o mesmo não foi
feito com a avaliação das atividades de vida diária, pois não foi utilizada uma
escala validada, apenas a avaliação do psiquiatra. A amostra do estudo foi
acompanhada por três anos, o que proporcionou estudar a incidência de
demência nos indivíduos com sintomas psicóticos, sendo o primeiro estudo a
abordar a incidência de sintomas psicóticos em uma população de idosos sem
comprometimento cognitivo14. Para o cálculo da incidência, levou-se em
consideração toda a amostra e não apenas aqueles com algum sintoma
psicótico, diferindo um pouco da nossa análise14.
Ostling e colaboradores publicaram, em 2007, dois estudos importantes,
ambos com a exclusão de pacientes demenciados. O primeiro foi feito com
uma amostra de indivíduos acima de 70 e 85 anos, incluindo idosos da
comunidade e vivendo em casa de repouso, tal amostra foi obtida de maneira
aleatória em uma cidade sueca, baseando-se em registros populacionais12. O
diagnóstico de demência foi feito de maneira semelhante ao estudo de 200214.
Nos indivíduos com idade entre 70 e 85 anos, foi exigida a presença de
desorientação temporal e espacial e/ou comprometimento de memória de
longo prazo, mensurados por escalas e informações de cuidadores e dos
arquivos médicos12. Quanto aos indivíduos com mais de 85 anos, o
diagnóstico de demência foi feito de maneira mais subjetiva, baseando-se
apenas na avaliação do pesquisador. Os sintomas psicóticos foram
1 Introdução 9
pesquisados por meio de exame psiquiátrico (baseado no CPRS, exceto nos
sujeitos com 70 anos, nos quais uma escala similar, não descrita, foi aplicada),
entrevista com cuidadores e análise de arquivos médicos12. Foi um dos
primeiros estudos a avaliar especificamente a incidência de sintomas
psicóticos nessa população, o que foi feito por meio de um seguimento de
cerca de 20 anos12. Além disso, foi também avaliada a relação com
mortalidade e, principalmente, desenvolvimento posterior de demência12, esta
avaliação é bastante semelhante à que nós utilizamos, como veremos a
seguir. Trata-se do principal estudo envolvendo incidência de sintomas
psicóticos nesse tipo de população e a relação deles com o posterior
desenvolvimento de demência. O segundo trabalho levou em consideração
apenas indivíduos com mais de 95 anos, amostra retirada do mesmo registro
populacional citado anteriormente15. Este artigo utilizou o MEEM para a
avaliação cognitiva, critérios do DSM-III e o CPRS para a avaliação dos
sintomas psicóticos.
Outro importante estudo envolvendo a prevalência de sintomas
psicóticos e ideação paranoide, com exclusão de pacientes demenciados, foi
realizado por Sigstrom e colegas, em 2009, tendo como amostra quase 850
indivíduos, selecionados originalmente do registro populacional sueco. A
partir do exame psiquiátrico e da entrevista com cuidador, o diagnóstico de
demência, baseado no DSM-III-R, final era estabelecido se os dados eram
confirmados em ambas as fontes de informação, ou se em uma das fontes
associados a outras informações sugerindo sintomas limítrofes de demência9.
Assim como outros estudos da mesma época, a avaliação dos sintomas
psicóticos também foi por meio da aplicação da CPRS e da entrevista do
familiar/cuidador. Quanto ao CPRS, também não houve descrição das
perguntas feitas, houve relato apenas da pesquisa de ideias de grandiosidade
e de perseguição, ciúme patológico, sentir-se controlado, pensamentos
disruptivos, outros delírios, vozes com comentários e outras alucinações
auditivas, alucinações visuais e outros tipos de alucinações. Com relação à
entrevista do cuidador, questionava-se a presença de delírio, alucinações,
traços de personalidade paranoide, como também se o indivíduo acusava
1 Introdução 10
pessoas próximas e se era desconfiado9. Esse estudo, assim como em outros
já citados8,12-15, utilizando a CPRS, não deixou explícitas as perguntas
utilizadas, não foi feita a avaliação funcional do paciente e foram utilizados
critérios subjetivos no estabelecimento do critério de exclusão “demência”.
Um estudo relevante, envolvendo a prevalência de sintomas psicóticos
e idosos não demenciados, foi realizado por Ostling e colaboradores, em
2009. A amostra foi obtida a partir de um estudo populacional em
Gotemburgo, sendo incluídos idosos demenciados e não demenciados, todos
com 85 anos ou mais13. Para a investigação dos sintomas psicóticos, foram
incluídos, além da CPRS, testes de memória, compreensão de provérbios,
linguagem, apraxia, construção, agnosia, apraxia, acalculia, desorientação
direita/esquerda. Com os informantes, foi feita uma entrevista semiestruturada
por telefone, investigando presença de delírios, alucinações, ideação
paranoide, sintomas comportamentais, função cognitiva, linguagem e as
Atividades da Vida Diária (AVDs)13. Os indivíduos foram incluídos no grupo de
pacientes demenciados, de modo semelhante ao trabalho anteriormente
citado de Sigstrom e colaboradores de 2009. A diferença deveu-se à inclusão
dos indivíduos que apresentaram sintomas limítrofes de demência na
entrevista psiquiátrica e declínio da função cognitiva na entrevista com
familiar13. A prevalência de sintomas psicóticos, no grupo de idosos sem
diagnóstico de demência, foi de 10,5%, a maior taxa dentre os artigos
considerados na nossa revisão, o que pode ser justificado por se tratar de
uma amostra com indivíduos mais idosos.
Em 2012, Ostling e coautores publicaram um estudo multicêntrico
(Berlin, Dublin, Liverpool, Munique, Gotemburgo e Zaragoza), com uma
grande amostra (n=8762), na qual a presença de demência era critério de
exclusão18. A amostra foi obtida tendo como base registros municipais e
registros dos médicos assistentes, proporcionando, assim, uma inclusão
abrangente de pacientes18. O diagnóstico de demência diferiu entre os centros
de estudo, porém, em geral, baseou-se no DSM-III-R18. A avaliação dos
sintomas psicóticos também diferiu entre as cidades, sendo que parte delas
utilizou a escala GMS e a outra, a CPRS18. Tais diferenças no modo de avaliar
1 Introdução 11
podem dificultar a inclusão desses indivíduos em uma mesma amostra, como
foi feito na análise da amostra deste estudo.
Soulas et al., 2015, estudaram uma amostra de idosos (n=313) de uma
cidade da França com 60 anos ou mais, intervalo etário um pouco abaixo do
que os outros estudos citados19. O comprometimento cognitivo foi
diagnosticado de maneira muito simples, apenas por meio do escore de
MEEM, estratificado de acordo com a idade, o gênero e a escolaridade19. Os
sintomas psicóticos foram avaliados por meio de um questionário estruturado
de dez qualitativos itens, baseado no DSM-IV, os quais abordavam
alucinações delírios paranoides e sintomas psicóticos “menores”19. Assim,
este trabalho analisou a prevalência do maior espectro possível de sintomas
psicóticos nesse tipo de amostra. Não houve relato de ideias persecutórias,
porém os próprios autores frisam que essas foram pesquisadas de maneira
limitada.
1.4 Possíveis fatores de risco relacionados aos sintomas psicóticos
Apesar de não haver um consenso, é possível especular sobre alguns
fatores de risco para o desenvolvimento de sintomas psicóticos em indivíduos
sem demência. As variáveis mais citadas como fatores de risco para o
desenvolvimento desses sintomas são: idade avançada20,21,22, sexo
feminino8,20-24, traços de personalidade paranoide20,24, comprometimento
sensorial (visão e audição principalmente)20,23,25, pior desempenho
cognitivo20,21,26 e isolamento social18,20,23. Henderson et al., em 1998, ao
estudarem sintomas psicóticos em idosos, citam como fatores de risco
estatisticamente significantes: gênero masculino, ter poucos contatos sociais,
história de diagnóstico de depressão, saúde física comprometida, poucos
anos de estudo e viver sozinho7. Forsell et al., em 1998, abordaram apenas
sintomas paranoides em indivíduos com e sem diagnóstico de demência,
controlando a variável disfunção cognitiva, observando que apenas o sexo
feminino e o isolamento social mantiveram-se como fatores de risco para tais
1 Introdução 12
sintomas8. Livingston et al., em 2001, ao discutir sintomas persecutórios e
distúrbios de percepção em uma comunidade de idosos, estabeleceram como
fatores preditores independentes de sintomas psicóticos a sensação subjetiva
de perda de memória, o uso de álcool para dormir e o comprometimento
visual. Nesse mesmo estudo, o isolamento social foi questionado como fator
de risco, pois esse fator não estava significativamente associado aos
sintomas11. Ostling et al., em 2013, por meio de uma regressão logística em
uma população de idosos não demenciados associaram a tais sintomas:
isolamento social, comprometimento funcional, humor depressivo, desejo de
estar morto e baixos scores de MEEM18.
O desenvolvimento de sintomas psicóticos, por idosos sem
comprometimento cognitivo, pode ser um fator predisponente para o
aparecimento de outros quadros, tanto transtornos mentais como também
doenças clínicas.
1.5 As relações entre os sintomas psicóticos e o posterior desenvolvimento de demência
Os dados sobre a relação de sintomas psicóticos e posterior
desenvolvimento de demência são conflitantes. Os resultados de três estudos
publicados nos últimos cinco anos sugerem os sintomas psicóticos como uma
expressão prodrômica da demência, devido a sintomas como alucinações,
delírios e ideação paranoide estarem associados ao aumento da incidência
de demência nos três anos de acompanhamento de um destes estudos, à
maior presença deles à medida que a faixa etária sobe e à menor média no
escore de MEEM em indivíduos com tais sintomas, além disso,
frequentemente acompanham quadros demenciais e são mais comuns no
final desta doença10,14,19. Outros dois estudos demonstram o maior risco de
desenvolvimento de demência no seguimento em indivíduos com sintomas
psicóticos, com a razão de chances variando entre 2,76 e 8,017,27.
1 Introdução 13
Apesar disso, a maioria dos indivíduos que têm esses sintomas não
desenvolveu demência nos três anos seguintes, com as taxas de conversão
variando de 18% (Ostiling & Skoog, 2002) a 44% (Ostling et al., 2007). A
maioria da população estudada, como em outros estudos sobre sintomas
psicóticos em indivíduos sem diagnóstico de demência, não apresentava
comprometimento cognitivo, como foi relatado nos estudos de Henderson et
al. (1998) e Livingston et al. (2001), nos quais, 70% e quase 60%,
respectivamente, dos sujeitos não eram demenciados, apesar de apresentar
sintomas psicóticos.
Ostling et al., 2007, ao considerar os sintomas psicóticos isoladamente,
relataram aumento no risco de desenvolvimento de demência, nos indivíduos
que apresentavam alucinações, na maioria dos casos, visuais12. Investigando
a relação entre sintomas psicóticos e desenvolvimento de demência, Kohler
et al. (2013) relataram que tal risco foi relacionado ao pior desempenho
cognitivo basal, depressão, ansiedade, fatores de risco cardiovasculares e
aumentaram com o aumento de sintomas psicóticos17.
A presença de alucinações, de qualquer tipo, está associada a humor
depressivo, comprometimento de atividades do cotidiano e déficits visuais14.
Já a ideação paranoide está associada a déficits visuais e infarto do
miocárdio8, além de outros comprometimentos físicos7. A presença de
ideação paranoide e alucinações também podem ser consideradas fatores de
risco para o desencadeamento de agitação psicomotora e irritabilidade13.
1.6 A investigação dos sintomas psicóticos em idosos sem demência
A investigação de sintomas psicóticos em populações de idosos pode
ser feita por meio da entrevista do próprio paciente, seja por meio de uma
avaliação psiquiátrica, ou da aplicação de entrevistas estruturadas ou
semiestruturadas por um aplicador previamente treinado, como também pelo
questionamento dos familiares ou cuidadores. Sabe-se que os idosos são
relutantes em informar a presença de sintomas psicóticos14, por isso os
1 Introdução 14
cuidadores relatam mais do que os próprios pacientes12, levando a um
aumento da prevalência quando são considerados tais relatos12,14. Apesar
disso, também consta na literatura a boa concordância entre o relato do
paciente idoso sobre seus problemas de saúde e o relato do cuidador que vive
com o paciente28.
Outra importante forma de buscar informações é pela verificação e
análise de arquivos médicos2,12, o que é facilitado em países desenvolvidos,
com sistema de saúde integralizado, nos quais pode ser considerada uma
amostra de população mais restrita.
A “Comprehensive Psychopathological Rating Scale” (CPRS) é a escala
mais frequentemente utilizada pelos estudos envolvendo sintomas psicóticos
em idosos não demenciados5,8-10,14,15,18, porém não encontramos uma
validação dessa escala para a aplicação em Português. Em geral, essa escala
aborda delírios e alucinações, ideação paranoide, humor depressivo, afeto
embotado, ansiedade e irritabilidade.
1.7 Primeira fase do estudo: estudo da prevalência de sintomas psicóticos em uma população de idosos sem demência do Município de São Paulo
Em julho de 2014, publicamos a primeira fase do presente estudo, no
qual analisamos a prevalência de sintomas psicóticos em uma amostra
comunitária de idosos sem diagnóstico de demência e sem sintomas
depressivos clinicamente relevantes, além de avaliar possíveis fatores de
risco relacionados a tais sintomas29. Os resultados deste trabalho são
apresentados a seguir.
1.7.1 Prevalências dos sintomas psicóticos
A prevalência encontrada de, ao menos, um sintoma psicótico foi de
9,1%, sendo que foi observada a presença de 2 ou mais sintomas em 3,9%
1 Introdução 15
dos entrevistados e a de 3 sintomas em 0,9%. As alucinações visuais ou táteis
(7,8%) foram discretamente mais comuns do que as alucinações auditivas
(7,5%) e a presença de delírios persecutórios (i.e., sintomas psicóticos mais
bem estruturados) foi menos frequente (2,9%)29.
1.7.2 Aspectos cognitivos (Tabelas 1 e 2)
Os valores médios do MEEM nos indivíduos com sintomas psicóticos
mostraram-se menores do que naqueles indivíduos sem estes sintomas,
sendo a menor média entre aqueles que apresentavam delírios persecutórios
(23,45 vs. 26,21, p ≤ 0,01). Pacientes com sintomas psicóticos também
apresentam maior comprometimento em atividades da vida diária
mensuradas pela escala The Bayer Activities of Daily Living scale (B-ADL),
sendo os menores escores de tal escala encontrados nos indivíduos com
delírios persecutórios (2,31 vs. 1,55, p ≤ 0,01)29.
Quanto às faixas de escolaridade, em geral, os indivíduos com sintomas
psicóticos tiveram menor número de anos de estudo em comparação aos que
responderam negativamente para cada sintoma, sendo que a maioria
apresentava ausência de escolaridade ou essa era menor que 4 anos. Além
disso, quanto maior o número de sintomas psicóticos, menor o número de
anos de estudo (p ≤ 0,001)29.
Estes resultados estão apresentados nas Tabelas 1 e 2.
Tabela 1 - Relação entre sintomas psicóticos e teste cognitivo (MEEM)/escala funcional (B-ADL) na Fase I.
MEEM B-ADL
Com alucinações auditivas 23,831 2,051
Sem alucinações auditivas 26,211 1,551
Com alucinações visuais/táteis 25,112 2,011
Sem alucinações visuais/táteis 26,212 1,551
Com delírio persecutório 23,451 2,311
Sem delírio persecutório 26,211 1,551
MEEM = Miniexame do Estado Mental; B-ADL = Escala Bayer de Atividades da Vida Diária; 1 p<0,01 2 p<0,05.
1 Introdução 16
Tabela 2 - Relação entre os sintomas psicóticos e as faixas de escolaridade na Fase I.
Faixa de escolaridade em anos (%)
0 1-4 5-8 9-11 >12
Com alucinações auditivas 25,01 50,01 9,51 4,81 10,71
Sem alucinações auditivas 11,61 39,41 14,21 11,21 23,61
Com alucinações visuais/táteis 19,31 51,11 8,01 11,41 10,21
Sem alucinações visuais/táteis 11,61 39,41 14,21 11,21 23,61
Com delírio persecutório 27,32 45,52 6,12 9,12 12,12
Sem delírio persecutório 11,62 39,42 14,22 11,22 23,62
Sem sintoma psicótico 11,61 39,41 14,21 11,21 23,61
1 sintoma psicótico 21,61 44,11 6,91 12,71 14,71
2 sintomas psicóticos 23,51 52,91 11,81 5,91 5,91
3 sintomas psicóticos 301 601 01 01 101
1 p<0,01; 2 p=0,056.
1.7.3 Aspectos socioeconômicos
Nas Tabelas 3 e 4, apresentadas a seguir, podemos notar que a maioria
dos idosos com alucinações auditivas pertencia às classes mais
desfavorecidas (D e E) comparados aos idosos sem essas alucinações
(42,9% vs. 24,2%, p ≤ 0,01). Em contraste, aqueles sem alucinações auditivas
pertenciam às classes sociais mais favorecidas (A e B) (20,3% vs. 42,3%, p ≤
0,01). Com relação aos indivíduos com delírios, também pertenciam às
classes mais baixas D e E (42,5% vs. 24,2%, p ≤ 0,01) e os que não as tinham
pertenciam às classes mais altas A e B (21,2% vs. 42,3%, p ≤ 0,01). As
pessoas que apresentaram alucinações visuais ou táteis estavam quase que
igualmente presentes entre as classes B, C e D. Além disso, observamos uma
relação inversa entre número de sintomas psicóticos e classe social, com
maior presença desses nas classes D e E, e menor a presença destes
sintomas nas classes A e B29.
1 Introdução 17
Indivíduos com alucinações auditivas relataram maior utilização do
serviço público em comparação àqueles sem essas alucinações (69% vs.
44,3%, p ≤ 0,01), o mesmo ocorrendo na amostra de pacientes com
alucinações visuais ou táteis (61,4% vs. 44,3%, p ≤ 0,05), bem como na
amostra dos pacientes com delírios persecutórios (63,6% vs. 44,3%, p ≤ 0,05).
Como esperado, o aumento do número de sintomas psicóticos foi
acompanhado pelo aumento da utilização do serviço público de saúde 29.
Tabela 3 - Relação entre os sintomas psicóticos e as classes socioeconômicas na Fase I.
Classe socioeconômica (%)
A B C D E
Com alucinações auditivas 3,61 16,71 36,91 26,21 16,71
Sem alucinações auditivas 5,71 36,61 33,51 17,71 6,51
Com alucinações visuais/táteis 5,81 25,61 26,71 26,71 15,11
Sem alucinações visuais/táteis 5,71 36,61 33,51 17,71 6,51
Com delírio persecutório 9,11 12,11 36,41 27,31 15,21
Sem delírio persecutório 5,71 36,61 33,51 17,71 6,51
Sem sintoma psicótico 5,71 36,61 33,51 17,71 6,51
1 sintoma psicótico 6,01 24,01 35,01 21,01 14,01
2 sintomas psicóticos 2,91 20,61 29,41 38,21 8,81
3 sintomas psicóticos 10,01 01 30,01 20,01 40,01
1 p<0,01.
1 Introdução 18
Tabela 4 - Relação entre os sintomas psicóticos e os tipos de serviços de saúde utilizados na Fase I.
Tipos de serviços de saúde (%)
Não Particular Convênio Público
Com alucinações auditivas 1,21 8,31 21,41 69,01
Sem alucinações auditivas 1,91 6,31 47,61 44,31
Com alucinações visuais/táteis 1,12 2,32 35,22 61,42
Sem alucinações visuais/táteis 1,92 6,32 47,62 44,32
Com delírio persecutório 02 12,12 24,22 63,62
Sem delírio persecutório 1,91 6,31 47,61 44,31
Sem sintoma psicótico 1,91 6,31 47,61 44,31
1 sintoma psicótico 2,01 6,91 33,31 57,81
2 sintomas psicóticos 01 8,81 20,61 70,61
3 sintomas psicóticos 01 01 20,01 80,01
1 p<0,01; 2 p<0,05.
1.7.4 Comorbidades
Oitenta por cento da amostra relatou ter, ao menos, uma comorbidade.
Indivíduos com alucinações auditivas em comparação aos sem essas
alucinações apresentaram maior percentual de Trauma Cranioencefálico
(TCE), depressão, diabetes, Doença de Chagas (DC), artrite e menor taxa de
uso de álcool29.
Em relação aos que relataram alucinações visuais ou táteis, quando
comparados aos indivíduos sem essas, observamos maior percentual de
Acidente Vascular Cerebral (AVC), depressão, artrite e Doença de Chagas
nos indivíduos com tais alucinações29.
Já nos indivíduos com delírio, observamos maior associação com
Acidente Vascular Cerebral (AVC), depressão e Hipertensão Arterial
Sistêmica (HAS)29. Em termos do número de sintomas psicóticos, os
indivíduos com 1 ou 2 sintomas apresentaram maior percentual de AVC, TCE,
depressão, esquizofrenia e diabetes29.
1 Introdução 19
1.7.5 Possíveis fatores de risco
Os resultados apresentados na Tabela 5 mostram, com a análise por
regressão logística múltipla, que a escala B-ADL (para avaliar o
comprometimento funcional) e comorbidades como depressão e Doença de
Chagas (DC) permaneceram significativamente associadas a todos os
sintomas psicóticos. O MEEM foi preditivo para alucinações auditivas e delírio
persecutório. Pertencer às classes socioeconômicas D e E foi preditivo
apenas para alucinações visuais/táteis. A variável “anos de estudo” não foi
preditora de nenhum dos sintomas estudados29.
Tabela 5 – Fatores associados à prevalência de sintomas psicóticos entre indivíduos sem comprometimento cognitivo.
Beta (SE) Exp (B) 95% CI P
Alucinações Auditivas
ADL-IS 0.30 (0.10) 1.36 1.10 – 1.65 0.003
MEEM - 0.13 (0.03) 0.88 0.83 – 0.93 0.000
Depressão 1.02 (0.26) 2.78 1.68 – 4.62 0.000
DC 1.56 (0.65) 4.75 1.32 – 17.11 0.017
Alucinações visuais/táteis
Gênero (Feminino) 0.58 (0.29) 1.78 1.0 – 3.17 0.050
B-ADL 0.32 (0.10) 1.38 1.13 – 1.68 0.001
Depressão 1.02 (0.25) 2.76 1.69 – 4.51 0.000
DC 1.5 (0.66) 4.46 1.23 – 16.13 0.023
Classes D e E 0.76 (0.28) 2.13 1.22 – 3.73 0.008
Delírio
B-ADL 0.37 (0.13) 1.45 1.13 – 1.87 0.004
MEEM - 0.14 (0.04) 0.87 0.81 – 0.94 0.000
Depressão 1.48 (0.37) 4.39 2.11 – 9.15 0.000
MEEM = Miniexame do Estado Mental; B-ADL = Escala Bayer de Atividades da Vida Diária; DC: Doença de Chagas; Classes D e E: Classe socioeconômica D e E.
2 JUSTIFICATIVA DO ESTUDO
2 Justificativa do Estudo 21
2 JUSTIFICATIVA DO ESTUDO
O estudo dos sintomas psicóticos em indivíduos idosos com diagnóstico
de demência é frequente e bem estabelecido, mas o mesmo não ocorre
quando se considera a presença deles nos idosos sem demência. Isso
dificulta o esclarecimento da etiologia, o estabelecimento dos diagnósticos e,
por consequência, o tratamento adequado. A Psiquiatria tem se voltado cada
vez mais para a busca de quadros prodrômicos de transtornos mentais
graves, o pródromo de esquizofrenia e os indivíduos de alto risco para o
desenvolvimento de transtornos psicóticos são bons exemplos disso.
Caminhando nesta vertente, tem se discutido muito na literatura os possíveis
quadros prodrômicos de demência, como os episódios depressivos de início
tardio, os sintomas psicóticos também têm entrado nessa mesma linha de
raciocínio.
Dados epidemiológicos sobre esses quadros em idosos sem
comprometimento cognitivo têm se tornado mais frequentes, contribuindo
para a busca de uma etiologia, para a identificação do problema e para o
estabelecimento da melhor forma de tratamento.
Os dados disponíveis na literatura são todos provenientes de estudos
em populações de países desenvolvidos (EUA, Austrália, Suécia, Reino
Unido, Alemanha, Holanda). Diante disso, faz-se necessária uma análise da
população de um país em desenvolvimento, como a brasileira.
Neste sentido, a investigação da incidência de sintomas psicóticos em
uma população sem demência em uma amostra da população brasileira vem
a preencher uma lacuna na literatura, sendo a proposta da segunda fase do
estudo investigar a presença dos sintomas psicóticos incidentes e os fatores
de risco relacionados por meio de um seguimento de sete anos de uma
população previamente avaliada em termos de prevalência daqueles
sintomas29.
3 OBJETIVOS
3 Objetivos 23
3 OBJETIVOS
Este trabalho representa os resultados do seguimento de sete anos de
uma amostra populacional do Município de São Paulo de idosos sem
demência previamente avaliada em termos de prevalência de sintomas
psicóticos na primeira fase do estudo. Apresentamos os objetivos principais
e secundários desta segunda fase do estudo que é objetivo desta tese de
doutorado.
3.1 Objetivo principal
a) Determinar a incidência em sete anos de seguimento de sintomas
psicóticos e de demência nos indivíduos com mais de 60 anos sem
demências e com sintomas psicóticos, em uma amostra da
população de São Paulo, Brasil, previamente avaliada.
3.2 Objetivos secundários
a) Investigar os fatores associados à presença de sintomas psicóticos
(características socioeconômicas e demográficas, desempenho
cognitivo e comorbidades clínicas);
b) Comparar a incidência de sintomas psicóticos em idosos sem
comprometimento cognitivo no Brasil aos dados dessa prevalência
na literatura internacional, os quais se restringem a Estados
Unidos, Austrália, Suécia e Inglaterra;
c) Correlacionar incidência de sintomas psicóticos ao nível
socioeconômico;
3 Objetivos 24
d) Correlacionar o desenvolvimento de sintomas psicóticos ao
desempenho na avaliação cognitiva (Miniexame do Estado Mental
– MEEM) e às atividades de vida diária (The Bayer Activities of
Daily Living scale – B-ADL);
e) Investigar os fatores associados ao desenvolvimento de demência
nos indivíduos com sintomas psicóticos;
f) Comparar a incidência de demência em idosos com sintomas
psicóticos aos dados da literatura internacional.
4 HIPÓTESES DO ESTUDO
4 Hipótese do Estudo 26
4 HIPÓTESE DO ESTUDO
Por meio da comparação dos indivíduos que desenvolveram sintomas
psicóticos com aqueles que não desenvolveram tais sintomas, durante os sete
anos de seguimento, formulamos as seguintes hipóteses:
1. A incidência de sintomas psicóticos estaria relacionada a um maior
declínio cognitivo, bem como, a maior comprometimento da
funcionalidade;
2. A incidência de sintomas psicóticos estaria associada ao nível
socioeconômico e à presença de comorbidades clínicas.
5 MÉTODOS
5 Métodos 28
5 MÉTODOS
5.1 Amostra
Os dados da amostra de indivíduos da primeira fase deste estudo foram
retirados de um grande estudo clínico-epidemiológico sobre demência e
transtornos cognitivos em idosos com mais de 60 anos de São Paulo realizado
em 200630. Os indivíduos da segunda fase, isto é, o estudo da incidência que
é o objeto do presente estudo, são provenientes do estudo de
acompanhamento dessa população realizado em 2011.
De acordo com os dados do censo de 2000, a cidade de São Paulo
possui cerca de 970 mil pessoas com idade de 60 anos ou mais. Bottino et al.
(2007) estratificou os 96 distritos da cidade do mais adequado
socioeconomicamente ao menos favorecido, por meio dos seguintes
parâmetros: renda financeira, escolaridade, proporção de idosos vivendo em
cada distrito e saneamento. Tais distritos foram divididos em três grupos e
quatro distritos foram escolhidos para a representação de cada estrato
socioeconômico, foram eles: Jardim Paulista (representando o de melhor
situação), Rio Pequeno e Vila Sônia (distritos de situação intermediária) e
Brasilândia (grupo com maior carência). Tais distritos foram escolhidos tendo
como base os seguintes critérios: a) posição estratégica nos tercis, ou seja,
Jardim Paulista situa-se no topo do primeiro grupo; Vila Sônia e Rio Pequeno
no meio do grupo intermediário; e Brasilândia em posição compatível com os
Distritos de pior situação; b) aspectos operacionais que facilitassem a vinda
dos casos suspeitos ao Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo (USP) para serem examinados na 2ª fase do
estudo precedente; c) uma população de idosos e uma densidade
populacional desses que favorecessem o trabalho de campo; e d)
manutenção na amostra da proporção de idosos existente em cada
conglomerado socioeconômico.
5 Métodos 29
O cálculo do tamanho da amostra baseou-se em Herrera et al. que, em
1998, realizaram uma estimativa de demência de 7% em uma amostra de
comunidade brasileira, com precisão ou erro de amostragem de 1,5% e nível
de confiança de 95%31. Assim, inserindo estes dados no programa Epi-Info-
630, obteve-se uma estimativa inicial de 1.100 indivíduos, utilizando-se um
fator de correção de 1,5, multiplicando-o por 1.100 e acrescentando 20% de
possíveis perdas, obteve-se uma amostra de 2.062 idosos.
Os distritos escolhidos possuíam juntos uma amostra de 64.760 pessoas
idosas. A fração amostral calculada foi de 3,18%, a qual foi obtida pela divisão
da amostra a ser estudada (2.062) pelo número total de idosos dos distritos
escolhidos (64.760). Para a escolha dos setores censitários, os seguintes
procedimentos foram seguidos: cálculo do número de idosos a serem
entrevistados em cada distrito selecionado (3,18% x 22.010 = 700 – área mais
favorecida; 3,18% x 23.236 = 739 – área intermediária; 3,18% x 19,514 = 621
– área menos favorecida); estabelecimento de 30 setores por distrito, pois
cada distrito também foi analisado autonomamente; sorteio dos setores em 2
estágios, com probabilidade proporcional ao tamanho do conglomerado,
estabelecido o início casual para cada um dos distritos e organizados os
setores por soma acumulada, selecionamos os setores de forma sistemática,
aplicando as constantes 734, 774 e 650, que foram obtidas com a divisão da
população do distrito pelo número de setores (30). Tais setores censitários
foram divididos em quadros e estes em domicílios.
Após a seleção dos domicílios a serem visitados, realizou-se uma
divulgação na mídia local (jornal, rádio e televisão) e anúncios pelo correio, a
qual foi seguida pela visita desses domicílios por uma equipe de treinadores
treinada em busca de indivíduos idosos. Com a identificação, uma amostra de
2.233 indivíduos com 60 anos ou mais foi obtida, dos quais 1.563 aceitaram
ser visitados por um entrevistador treinado. Após a assinatura do termo de
consentimento livre e esclarecido, foram aplicados: um questionário sobre
dados sociodemográficos, clínicos e socioeconômicos, escalas avaliadoras
de comprometimento cognitivo e de comprometimento funcional, além de três
5 Métodos 30
perguntas sobre sintomas psicóticos extraídas do Camdex (Cambridge Mental
Disorders of the Elderly Examination, Roth et al., 1986).
Da amostra de 1.563 idosos, foram excluídos os pacientes que
pontuaram abaixo do ponto de corte para um dos testes cognitivos (MEEM <
20 – sem escolaridade; MEEM < 25 – 1 a 4 anos de estudo; MEEM < 27 – 5
a 8 anos de estudo; MEEM < 28 – mais de 9 anos de estudo; Fuld Object
Memory Exam (FOME) < 35) e acima do ponto de corte para um dos testes
funcionais (The Informant Questionnaire on Cognitive Decline in the Elderly
(IQCODE) > 3,40 e B-ADL > 3,19), sendo considerados como tendo
comprometimento cognitivo e funcional, ou seja, rastreio positivo para
demência. Também foram excluídos os indivíduos com sintomas depressivos
clinicamente significativos (avaliados pela escala D-10, com pontuação ≥ 7),
resultando em 1.125 indivíduos sem comprometimento cognitivo, os quais
constituíram a amostra da primeira fase do estudo, a qual foi publicada em
201529.
Em dezembro de 2010, foram contatados por meio de cartas,
telefonemas e e-mails com os domicílios dos participantes da primeira fase,
de maneira a esclarecê-los e convidá-los a participar da nova fase do projeto.
Em janeiro de 2011, foram realizadas 690 entrevistas, em que o mesmo
questionário sobre dados sociodemográficos, clínicos e socioeconômicos,
escalas avaliadoras de comprometimento cognitivo e de comprometimento
funcional, além de três perguntas sobre sintomas psicóticos, foram aplicados
novamente.
Da amostra inicial da primeira fase (1.563 idosos), 44,15% foram
entrevistados novamente, 8,45% recusaram-se a participar, 28,6% não foram
localizados e 18,8% faleceram. Dessa amostra de 690 idosos avaliados
novamente, foram excluídos os indivíduos com rastreio positivo para
comprometimento cognitivo ou sintomas depressivos clinicamente
significativos (SDCS) na primeira fase do estudo, resultando em uma
subamostra de 547 idosos sem comprometimento cognitivo inicial (2004) e
que foram submetidos ao mesmo protocolo sete anos depois da primeira
aplicação. Destes 547, 284 tiveram rastreio positivo para demência ou SDCS
5 Métodos 31
em 2011, 199 não relataram sintomas psicóticos na primeira fase e 64 já
tinham relatado sintomas psicóticos em 2004. A subamostra de 199 indivíduos
foi utilizada na análise da incidência de sintomas psicóticos neste intervalo de
sete anos e a subamostra de 64 indivíduos foi a utilizada nas análises
envolvendo a conversão em declínio cognitivo neste intervalo.
Figura 1 – Estratificação dos 96 distritos da cidade de São Paulo de acordo com a situação socioeconômica para a seleção dos pacientes da amostra inicial.
Figura 2 – Cálculo do número de indivíduos idosos a serem entrevistados por cada estrato socioeconômico de acordo com a fração amostral.
Figura 3 – Divisão dos distritos selecionados em setores, posteriormente em domicílios, número de indivíduos identificados e os que aceitaram ser visitados após a abordagem dos entrevistadores.
5 Métodos 32
Figura 4 – Critérios de inclusão: testes cognitivos, funcionais e a escala de Sintomas Depressivos Clinicamente Significativos.
Figura 5 – Diagrama envolvendo as subamostras utilizadas no presente estudo.
5 Métodos 33
5.2 Instrumentos
A avaliação para o rastreio de demência, comprometimento cognitivo
funcional bem como outros possíveis quadros psiquiátricos foi feita pelos
seguintes instrumentos:
• Questionário clínico sociodemográfico: Informações Pessoais do
Idoso (em relação à ocupação, perguntou-se que profissão o idoso
exercia ou havia exercido na maior parte de sua vida, sendo a
reposta codificada segundo a classificação de profissões do IBGE);
Informações Pessoais do Familiar/Cuidador; Avaliação Cognitiva
(Instrumentos de “screening” para demência - MEEM (Folstein et
al., 1975)32, FOME (Fuld et al., 1989)33, IQCODE (Jorm et al.,
1989)34, e B-ADL (Lehfeld et al., 1997)35; Inventário Clínico
(Perguntas referentes à memória, Perguntas referentes ao estado
de ânimo e sintomas psicóticos); Inventário de Antecedentes
Pessoais e Hábitos; Inventário de Antecedentes Familiares;
Utilização de Serviços de Saúde; Atividades Instrumentais e
Físicas; Classificação Sócio Econômica (por meio do questionário
de classificação socioeconômica da Associação Brasileira de
Pesquisa de Mercado – ABIPEME); Medida de Pressão Arterial e
Pulso (sentado e em pé).
• As três questões para o rastreamento dos sintomas psicóticos
foram extraídas do Camdex (Cambridge Mental Disorders of the
Elderly Examination) (Roth et al., 1986)36, são elas:
- Tem ouvido vozes que as pessoas não ouvem?
- Tem apresentado visões, sentido cheiros estranhos ou
notado sensações estranhas?
- Tem apresentado ideia de que está sendo perseguindo ou de
que alguém quer lhe fazer mal ou outros pensamentos
estranhos, fora do habitual?
5 Métodos 34
• O rastreio de screen-positivos para comprometimento cognitivo
funcional, o que é um critério de exclusão deste estudo, foi feito
com a combinação por regra mista das escalas citadas (MEEM ou
FOME e IQCODE ou B-ADL) (Bustamante et al., 2003)37. Os
pontos de corte das escalas utilizadas para o rastreio de demência
foram os seguintes:
- MEEM (segundo a faixa etária): < 20 (para analfabetos); < 25
para indivíduos com 1 a 4 anos de escolaridade; < 27 para os
com 5 a 8 anos de escolaridade e < 28 para indivíduos com
mais de 9 anos de estudo38;
- FOME: < 35;
- IQCODE: > 3.40;
- B-ADL: >3.19;
- D-10 (Escala de 10 itens para screening de sintomas
depressivos em idosos)39,40 para avaliação dos sintomas
depressivos clinicamente relevantes, tendo como ponto de
corte D-10 ≥ 7.
A pesquisa das comorbidades clínicas, importante parte da nossa
pesquisa, estava inclusa no inventário de antecedentes pessoais e hábitos,
ou seja, foi questionada de maneira direta ao indivíduo/cuidador. Dessa
maneira, vale salientar que algumas dessas comorbidades poderiam ser
questionadas por meio de nomenclatura popular, por exemplo, acidente
vascular cerebral (derrame), traumatismo crânio-encefálico (batida na cabeça
com desmaio), epilepsia (ataque, convulsão), diabetes (açúcar no sangue),
hipertensão (pressão alta), artrite reumatoide (reumatismo diagnosticado por
médico) e tumor (câncer). Outras comorbidades não possuíam uma
alternativa “popular” e foram questionadas de maneira direta, como, por
exemplo, Doença de Parkinson, depressão, esquizofrenia, infarto do coração,
sífilis, Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS), Doença de Chagas e
hepatite. Os aplicadores de questionário foram orientados a enfatizarem a
5 Métodos 35
importância do diagnóstico médico para tais perguntas envolvendo as
comorbidades.
5.3 Análises estatísticas
Na primeira fase do nosso projeto, calculamos a prevalência dos
sintomas psicóticos em geral e de cada categoria (alucinações auditivas,
alucinações visuais ou táteis, ideias delirantes)29. Em seguida, verificamos
que a distribuição das variáveis não pôde ser aproximada de uma distribuição
normal (Teste Kolmogorov-Smirnov), logo utilizamos o teste não paramétrico
de Mann-Whitney para comparar valores de variáveis contínuas (MEEM, B-
ADL, escala de depressão e escala de queixas de memória) à presença dos
sintomas psicóticos29. Para a análise bivariada comparando variáveis
categóricas (faixas etárias, classificação socioeconômica, anos de estudo,
uso de psicotrópico, comorbidades, uso de serviços de saúde) nos grupos
com e sem sintomas psicóticos utilizamos o teste de qui-quadrado29. Além
disso, para verificar a associação entre variáveis importantes e para identificar
fatores de risco, utilizamos o cálculo da regressão logística múltipla (“stepwise
backward”) separadamente para cada um dos sintomas psicóticos e as
seguintes variáveis que foram estatisticamente relevantes na análise
bivariada: gênero, anos de estudo, classificação socioeconômica, B-ADL,
MEEM, presença de depressão e presença de Doença de Chagas29.
Nesta fase, inicialmente, calculamos a incidência geral de sintomas
psicóticos em sete anos e, posteriormente, para cada um dos tipos de
sintomas. Em seguida, novamente, utilizamos o teste de Mann-Whitney para
comparar as variáveis continuas entre os grupos com e sem sintomas
psicóticos (para comparar os grupos sem sintomas, com ao menos um, dois
ou três sintomas, o teste de Kruskall-Wallis foi o usado), como também entre
os grupos com comprometimento cognitivo e os sem tal comprometimento e
com sintomas psicóticos. O teste de qui-quadrado foi utilizado para a análise
5 Métodos 36
bivariada, comparando-se variáveis categóricas entre os mesmos grupos
citados anteriormente.
Para verificar associações importantes e para identificar possíveis
fatores de risco para o desenvolvimento de sintomas psicóticos, fizemos uso
de uma regressão logística múltipla (stepwise backward) para cada sintoma
psicótico e para cada uma das variáveis que foram estatisticamente
relevantes nas análises bivariadas (MEEM, diabetes, convulsões, depressão
referida e sífilis), ou que tiveram relevância na primeira fase do estudo
(gênero, anos de estudo, B-ADL, classe socioeconômica e Doença de
Chagas).
Por meio de uma regressão logística múltipla, buscamos verificar a
associação entre cada sintoma psicótico e o desenvolvimento de
comprometimento cognitivo na amostra de 64 indivíduos, os quais já tinham
referido sintomas psicóticos em 2004. Também nessa subamostra,
calculamos a incidência do desenvolvimento de comprometimento cognitivo
nos sete anos de intervalo entre as avaliações.
Os dados foram analisados por meio do “Statiscal Package for the Social
Sciences” versão 16.0 para Windows (SPSS, desenvolvido por SPSS Inc,
Chicago, EUA).
6 RESULTADOS
6 Resultados 38
6 RESULTADOS
6.1 Descrição da amostra (Tabela 6)
Estudamos duas subamostras, uma sem sintomas psicóticos na Fase I
e outra com sintomas psicóticos na Fase I do estudo. Em ambas, a ampla
maioria (mais de 90%) dos participantes pertencia à faixa etária entre 80 e 90
anos, sendo o grupo sem sintomas psicóticos com maior percentual (99.5%),
e o gênero predominante foi o feminino, com mais de 63% nas duas amostras.
Mais de 80% dos participantes eram casados ou viúvos e, na amostra de
indivíduos com sintomas psicóticos na Fase I, há uma maior porcentagem de
divorciados e, nos sem sintomas psicóticos, uma maior porcentagem de
solteiros.
As duas subamostras compartilham quatro importantes características:
são aposentados ou sem atividade laborativa (80.9 e 82.8%); possuem
comorbidades clinicas (83,4 e 87,5%); pertencem às classes
socioeconômicas B ou C (75,3 e 76,6%); e referiram não usar medicação
psicotrópica (82,9 e 71,9%). Além disso, quanto à escolaridade, ambas
também têm sua maioria pertencente ao grupo do 1 a 4 anos de estudo, porém
em números diferentes (38 e 56,3%).
Tabela 6 - Características sociodemográficas da amostra.
Variáveis
Indivíduos N (%)
Sem sintomas psicóticos na Fase I
Com sintomas psicóticos na Fase I
Faixa Etária 80-90 anos 198 (99.5) 60 (93.8)
Mais de 90 anos 1 (0.5) 4 (6.3)
Gênero Masculino 72 (36.2) 17 (26.6)
Feminino 127 (63.8) 47 (73.4)
continua
6 Resultados 39
conclusão
Variáveis
Indivíduos N (%)
Sem sintomas psicóticos na Fase I
Com sintomas psicóticos na Fase I
Estado Civil
Solteiro (a) 17 (8.5) 2 (3.1)
Casado (a) 99 (49.7) 25 (39.1)
Divorciado (a) 6 (3.0) 6 (9.4)
Viúva (a) 73 (36.7) 31 (48.4)
Outros 2 (1.0) 0 (0.0)
Anos de estudo
0 0 (0.0) 1 (2.1)
1 a 4 71 (38.0) 27 (56.3)
5 a 8 27 (14.4) 5 (10.4)
9 a 12 27 (14.4) 6 (12.5)
13 ou mais 62 (33.2) 9 (18.8)
Classe Socioeconômica
A 41 (20.6) 6 (9.4)
B 93 (46.7) 25 (39.1)
C 57 (28.6) 24 (37.5)
D 8 (4.0) 9 (14.1)
E 0 (0.0) 0 (0.0)
Atividade Laborativa
Sim 16 (8.0) 3 (4.7)
Não 161 (80.9) 53 (82.8)
Comorbidade Sim 166 (83.4) 56 (87.5)
Não 33 (16.6) 8 (12.5)
Uso de Psicofármacos
Sim 34 (17.1) 17 (26.6)
Não 165 (82.9) 46 (71.9)
6.2 Incidências de sintomas psicóticos
A incidência de, ao menos, um sintoma psicótico em sete anos foi de
8,0%, a incidência de, ao menos, dois sintomas psicóticos foi de 1,0%, não
havendo relatos da presença de três sintomas nesta fase do estudo.
6 Resultados 40
Quanto aos tipos de sintomas psicóticos, as alucinações visuais e tácteis
foram as mais frequentemente referidas (4,5%), seguidas pelas ideias
delirantes (3,0%). Já as alucinações auditivas foram referidas por 2,5% dos
avaliados.
6.3 Aspectos cognitivos (Tabelas 7 e 8)
Os indivíduos que desenvolveram sintomas psicóticos tiveram uma
média menor no escore de MEEM na Fase II do que os indivíduos sem tais
sintomas (22,8 vs. 25,9). Participantes que responderam positivamente para
ideias persecutórias tiveram uma média de MEEM bem abaixo dos que as
negaram (19,0 vs. 25,84). Quanto às alucinações, apesar de não demonstrar
significância estatística na associação com o MEEM, os indivíduos que as
referiram apresentaram uma média de MEEM menor quando comparados
com os que não as apresentavam.
Quanto à escala funcional (B-ADL), as diferenças entre os grupos não
foram estatisticamente relevantes significantes. Apesar disso, observou-se
uma tendência à significância em relação ao comprometimento funcional
avaliado por tal escala, isto é, pacientes que referiram os sintomas psicóticos
tiveram maior média do escore em comparação aos que não referiram, tanto
especificamente para cada sintoma, como também de maneira geral. Além
disso, observou-se uma correlação positiva entre comprometimento funcional
e número de sintomas psicóticos.
A associação dos sintomas psicóticos com a variável “anos de estudo”
também não mostrou significância estatística. No entanto, observou-se maior
tendência aos participantes com alucinações auditivas, alucinações
visuais/táteis e ideias persecutórias concentrarem-se com escolaridade de 1
a 4 anos, como também uma menor concentração no grupo de 9 a 11 anos,
ocorrendo o contrário com aqueles entrevistados que as negaram.
6 Resultados 41
Tabela 7 - Relação entre sintomas psicóticos e testagem cognitiva (MEEM), e escala funcional (B-ADL) e serviços de saúde na Fase II.
MEEM B-ADL Serviço de Saúde Utilizado
Sem Privado Convênio Público
Com Alucinações auditivas
24.00b 2.25b 0.0b 0.0b 0.0b 100,0b
Sem Alucinações auditivas
25.69b 1.81b 0.5b 22.0b 44.0b 33.0b
Com Alucinações Visuais/Táteis
24.11b 2.28b 0.0b 11.1b 44.4b 44.4b
Sem Alucinações Visuais/Táteis
25.72b 1.80b 0.5b 21.9b 42.8b 34.2b
Com Ideias Persecutórias
19.00a 2.30b 0.0b 0.0b 50.0b 50.0b
Sem Ideias Persecutórias
25.84a 1.80b 0.5b 22.2b 42.3b 34.4b
Sem sintomas psicóticos
25.94 1.77 0.6b 23.0b 43.8b 32.0b
1 Sintoma psicótico 22.81 2.26 0.0b 6.2b 31.2b 62.5b
2 Sintomas psicóticos
21.50 2.38 0.0b 0.0b 50.0b 50.0b
MEEM = Miniexame do Estado Mental; B-ADL = Escala Bayer de Atividades da Vida Diária; a p<0,01; b p>0,05.
Tabela 8 - Relação entre sintomas psicóticos, anos de estudos e classe socioeconômica na Fase II. Anos de Estudo (%) Classe Socioeconômica (%)
1-4 5-8 9-11 A B C D E
Com Alucinações auditivas
50.0 b 25.0 b 25.0 b 0.0b 40.0b 40.0b 20.0b 0.0b
Sem Alucinações auditivas
37.7 b 14.2 b 48.1 b 21.1b 46.9b 28.4b 3.6b 0.0b
Com Alucinações Visuais/Táteis
55.6 b 11.1 b 33.3 b 11.1b 33.3b 55.6b 0.0b 0.0b
Sem Alucinações Visuais/Táteis
37.1 b 14.6 b 48.3 b 21.1b 47.4b 27.4b 4.2b 0.0b
Com Ideias Persecutórias
75.0 b 0.0 b 25.0 b 0.0b 33.3b 50.0b 16.7b 0.0b
Sem Ideias Persecutórias
36.8 b 14.8 b 48.4 b 21.4b 47.4b 27.6b 3.6b 0.0b
Sem sintomas psicóticos
36.0 b 14.5 b 49.4 b 22.1b 48.1b 26.5b 3.3b 0.0b
1 Sintoma psicótico 11.3 b 15.4 b 23.1 b 6.2b 31.2b 50.0b 12.5b 0.0b
2 Sintomas psicóticos
50.0 b 0.0 b 50.0 b 0.0b 50.0b 50.0b 0.0b 0.0b
a: p<0,01; b: p>0,05.
6 Resultados 42
6.4 Aspectos socioeconômicos (Tabelas 7 e 8)
Indivíduos que desenvolveram sintomas psicóticos não foram
significativamente diferentes daqueles que não desenvolveram quando em
relação às classes socioeconômicas as quais pertenciam no momento do
estudo. Entretanto, é possível observar que a maioria dos pacientes sem
sintomas psicóticos pertencia às classes A e B, e aqueles com sintomas
psicóticos pertenciam, em sua maior parte, às classes C e D.
Em relação ao uso dos sistemas de saúde, as diferenças também não
foram estatisticamente significativas. Contudo, foi possível observar maior
relato de uso do sistema público de saúde entre aqueles que referiram ter
sintomas psicóticos.
6.5 Comorbidades (Tabela 9)
Em torno de 84% da amostra total referiu ter alguma comorbidade
clínica. Ao menos uma comorbidade se destacou em cada tipo de alucinação:
uma maior porcentagem de indivíduos com alucinações auditivas tiveram
sífilis quando comparada aos sem alucinações auditivas (20,0% vs. 0,5%, p ≤
0,01); a presença de diabetes mellitus foi mais frequente nos indivíduos com
alucinações visuais/táteis em comparação aos que as negaram (33,3% vs.
20,5%, p ≤ 0,05); quanto àqueles com ideias persecutórias, quando
comparados aos que referiram não as ter, a depressão referida mostrou-se
mais frequente (50,0% vs. 12,6%, p ≤ 0,05).
Quando comparamos indivíduos com, ao menos, um sintoma psicótico
com aqueles que os negaram completamente, houve uma maior porcentagem
de epilepsia (6,2% vs. 1,1%, p ≤ 0,01), diabetes (37,5% vs. 19,9%, p ≤ 0,05)
e sífilis (6,2% vs. 0,6%, p ≤ 0,01). Ao considerarmos a subamostra de
indivíduos com ao menos dois sintomas psicóticos, a epilepsia foi novamente
mais frequentemente referida (50,0% vs. 1,1%, p ≤ 0,01). Apesar de não ter
sido estatisticamente significante, a epilepsia também foi mais referida por
6 Resultados 43
aqueles indivíduos com alucinações auditivas, visuais/táteis e ideias
persecutórias do que os que as negaram.
Tabela 9 – Prevalência de comorbidades por tipo de sintomas psicóticos (%) na Fase II
AVCd TCEe DEPf DMg EPIh IAMi SIFj DCl Artm
Com Alucinações auditivas
0.0c 0.0c 20.0c 40.0c 20.0c 20.0c 20.0a 0.0c 60.0c
Sem Alucinações auditivas
3.1c 2.6c 13.5c 20.6c 1.6c 8.8c 0.5a 0.5c 21.1c
Com Alucinações Visuais/Táteis
0.0c 0.0c 0.0c 33.3b 11.1c 0.0c 0.0b 0.0c 0.0c
Sem Alucinações Visuais/Táteis
0.0c 2.6c 14.3c 20.5b 1.6c 9.5c 1.1b 0.5c 23.2c
Com Ideias Persecutórias
0.0c 0.0c 50.0b 16.7c 16.7c 16.7c 0.0c 0.0c 16.7c
Sem Ideias Persecutórias
3.1c 2.6c 12.6b 21.4c 1.6c 8.9c 1.0c 0.5c 22.4c
Sem sintomas psicóticos
3.3c 2.8c 12.8C 19.9b 1.1a 8.8c 0.6a 0.6c 22.1c
1 Sintoma psicótico
0.0c 0.0c 25.0c 37.5b 6.2a 12.5c 6.2a 0.0c 25.0c
2 Sintomas psicóticos
0.0c 0.0c 0.0c 0.0b 50.0a 0.0c 0.0a 0.0C 0.0c
a: p≤0,01; b: p≤0,05; c: p>0,05; d: acidente vascular cerebral; e: traumatismo cranioencefálico; f: depressão; g: diabetes mellitus; h: epilepsia; i: infarto agudo do miocárdio; j: sífilis; l: doença de Chagas; m: artrite.
6.6 Regressão logística (Tabela 10)
Analisamos os possíveis fatores associados aos sintomas psicóticos
entre aqueles sem comprometimento cognitivo. A epilepsia foi a única variável
que mostrou ser um fator preditivo significante para as alucinações em geral
(Odds ratio – OR: 15,83) e para as alucinações visuais/táteis (OR: 7,75). No
caso das ideias persecutórias, permaneceram como variáveis preditivas a
pontuação no MEEM (OR: 0,72) e a depressão referida (OR: 6,48).
6 Resultados 44
6.7 Desenvolvimento de comprometimento cognitivo (Tabela 11)
Sete anos após a primeira avaliação do nosso estudo, 57,8% dos
indivíduos com sintomas psicóticos e sem comprometimento cognitivo prévio
avaliado na Fase I desenvolveram tal comprometimento.
Quando comparamos esses indivíduos com os que não desenvolveram
o comprometimento cognitivo após sete anos, uma menor média de MEEM
(19,5 vs. 24,0, p ≤ 0,01) e um maior comprometimento funcional foram
observados – B-ADL (3,3 vs. 2,1, p ≤ 0,01).
Esta subamostra foi avaliada por meio da regressão logística com o
objetivo de buscar sintomas psicóticos possivelmente associados a tal
conversão nos indivíduos sem comprometimento cognitivo e com sintomas
psicóticos na Fase I e reavaliados na Fase II. O resultado desta avalição
mostrou que as alucinações visuais/táteis mostraram ser o único fator
preditivo significante para a conversão neste grupo estudado (OR: 5,66,
p ≤ 0,05).
Tabela 10 – Fatores preditores de sintomas psicóticos em indivíduos sem comprometimento cognitivo na Fase II.
Beta (SE) OR 95% IC Exp (B) p
Alucinações auditivas
Crises convulsivas 2.76 (1.26) 15.83 1.34 – 187.25 0.028
Alucinações táteis/visuais
Crises convulsivas 2.05 (1.21) 7.75 0.72 – 83.00 0.091
Ideias persecutórias
MEEM - 0.32 (0.09) 0.72 0.60 – 0.88 0.00
Depressão Referida 1.87 (0.97) 6.48 0.97 – 43.47 0.05
Tabela 11 – Sintomas psicóticos e suas associações com a taxa de conversão em comprometimento cognitivo/funcional após 7 anos de seguimento.
Beta (SE) OR 95% IC Exp (B) P
Alucinações Auditivas 1.77 (1.17) 5.86 0.58 – 58,74 0.132
Alucinações visuais/táteis 1.73 (0.87) 5.66 1.04 – 30.86 0.045
Ideias Persecutórias - 24.41 (30468.61) 2.48 0.00 – a 0.999
7 DISCUSSÃO
7 Discussão 46
7 DISCUSSÃO
Os dados disponíveis na literatura atual relacionados a quadros de
sintomas psicóticos em indivíduos sem demência foram obtidos por meio de
estudos em países desenvolvidos. Salvo melhor juízo, este é o primeiro
estudo a abordar a incidência desse quadro no contexto de países em
desenvolvimento, remetendo a importantes características dessa sociedade e
relacionando-as ao estudo dos sintomas psicóticos nessa população. Dentro
da literatura internacional geral, quando consideramos qualquer país, este
trabalho é o terceiro estudo versando sobre o tema.
O principal achado do presente estudo é a constatação de que houve
uma incidência de 8,0% para ao menos um sintoma psicótico no período de
sete anos, que é praticamente o dobro da incidência (4.8%) descrita na
literatura7,12. No entanto, nos trabalhos da literatura internacional, quando são
levadas em consideração as informações dos cuidadores, esta incidência
passava a ser de 8.0%12, portanto, muito semelhante àquela obtida em nosso
trabalho.
No entanto, diferentemente dos outros trabalhos da literatura
internacional, o presente trabalho especifica de forma mais detalhada a
incidência de cada um dos tipos de sintoma psicótico pesquisado (alucinações
auditivas, alucinações visuais/táteis e ideias persecutórias), bem como, sua
relação com a cognição por meio de instrumentos como o MEEM e o FOME,
além das alterações funcionais avaliadas por meio de B-ADL e IQCODE.
Em nossa amostra, dentre os sintomas psicóticos com maior frequência
de incidência, destacam-se as alucinações visuais/táteis (4.5%), dado
semelhante ao observado em Ostling et al., 2007. Estes sintomas foram
seguidos pelas ideias persecutórias (3,0%), resultado também muito próximo
aos de Ostling et al. (2,6%)12, sendo que as alucinações auditivas (2,5%)
foram as de menor incidência. Na primeira fase do nosso estudo, as
alucinações visuais/táteis foram as mais prevalentes (7,8%)29, o que foi
7 Discussão 47
semelhante ao resultado da segunda fase, seguidas pelas alucinações
auditivas (7,5%) e ideias persecutórias (2,9%).
Os indivíduos do estudo foram questionados diretamente sobre sintomas
psicóticos específicos, o que não implica necessariamente em pessoas com
a doença psicótica, considerando-se a psicose como uma dimensão
contínua41-43. O debate na literatura sobre tal conceito de continuum aplicado
à psicose é bastante rico, estima-se que o fenótipo da psicose é cerca de 50
vezes mais prevalente do que a esquizofrênia44. Considera-se que a
população adulta em geral tenha uma prevalência de sintomas psicóticos
entre 10 e 25%, contudo, apenas uma minoria sofre verdadeiramente de uma
doença como a esquizofrenia, ou outro transtorno mental, ou ainda de
doenças neurodegenerativas, sugerindo que uma porcentagem significativa
de indivíduos sem doença clinicamente definida refere experiências
alucinatórias e/ou delirantes19.
Admitir que os sintomas psicóticos possam fazer parte de um continuum
entre normalidade e doença é possibilitar estudos que investiguem tais
sintomas permitindo identificar indivíduos mais susceptíveis que apresentem
risco de fazerem a transição para um estado de psicose clinicamente definida
41.
O mesmo conceito pode ser aplicado para a população que estudamos,
de maneira que é preciso, primeiramente, identificar tais indivíduos com as
características que podem predispor a tal transição ou conversão e,
posteriormente, traçar estratégias para abordá-los adequadamente. O estudo
destes indivíduos com sintomas psicóticos que não apresentam quadro clínico
definido poderá auxiliar de forma importante a utilização de tais sintomas
como preditores de risco de várias outras doenças, ou, então, determinar se
se trata de uma forma atenuada do mesmo processo patológico42.
7 Discussão 48
7.1 Desempenho cognitivo
Avaliamos o desempenho cognitivo da amostra por meio da aplicação
do MEEM e de acordo com a escolaridade medida em anos de estudo,
subdividindo os indivíduos em subgrupos para a melhor análise de tais dados.
Também avaliamos o desempenho funcional, o qual é estreitamente ligado ao
desempenho cognitivo, pela escala B-ADL.
Em relação ao MEEM, indivíduos com ao menos um sintoma psicótico
tiveram a média do escore mais baixa em quase três pontos quando
comparados com aqueles sem os sintomas (22.81 vs. 25.94). De fato,
Henderson et al., 1998, relataram a associação entre menor média no escore
de MEEM e a incidência de sintomas psicóticos em idosos sem
comprometimento cognitivo, apesar de ter estabelecido tal associação por
meio de regressão logística, não há relato do escore em si dos grupos, apenas
ao considerar toda a amostra7.
Na nossa primeira fase do estudo, indivíduos com ideias persecutórias
tiveram menor média de MEEM quando comparados aos que não as
relataram (mais de 3 pontos)29, o que também observamos nesta segunda
fase, porém com uma diferença maior, acima de seis pontos (19.00 vs. 25.84).
Quanto às comparações relacionando os indivíduos que relataram
alucinações, estas não foram estatisticamente significantes, apesar de
observarmos uma tendência a um menor escore de MEEM nos que as
relataram, assim como na primeira fase do estudo29.
Observamos uma concentração dos indivíduos com sintomas psicóticos
no grupo com escolaridade (1 a 4 anos), assim como uma menor presença
destes sintomas no grupo de 9 a 11 anos de estudo. As comparações
relacionando a porcentagem da presença das pessoas com sintomas
psicóticos e as sem nos grupos de escolaridade também não foram
estatisticamente significantes. Henderson et al., em 1998, já observaram que
uma educação limitada pode aumentar o risco da chance de desenvolver
sintomas psicóticos na velhice, elevando o risco de demência7. Na primeira
fase do estudo, foi estatisticamente significativo o fato de que indivíduos com
7 Discussão 49
sintomas psicóticos tinham menor número de anos de estudo quando
comparados aqueles sem sintomas7. Dessa maneira, fica claro que não se
trata de um pior desempenho cognitivo somente no momento da avaliação,
mas também ao longo de toda a vida destes indivíduos.
Apesar de não ter sido estatisticamente significativo, observamos, de
maneira geral, o escore de B-ADL maior em indivíduos com sintomas
psicóticos (alucinações auditivas: 2,25; Alucinações visuais/táteis: 2,28 Ideias
persecutórias: 2,30), valores estes distantes do ponto de corte (3,19)
considerado rastreio positivo para comprometimento cognitivo. Os escores
desta escala na segunda fase foram maiores do que os da primeira fase do
estudo29, demonstrando um possível declínio funcional desses indivíduos
durante os sete anos entre as avaliações. Apesar de a diferença ter sido muito
pequena, o maior escore (indicando o maior comprometimento) pertenceu ao
grupo com ideias persecutórias (2,30). De maneira semelhante, este grupo
também apresentou menor média no escore de MEEM (19,00).
Em ambas as fases do nosso estudo, o maior comprometimento
cognitivo, tanto no momento da avaliação como na vida acadêmica e funcional
dos indivíduos com ideias persecutórias se repetiu. Dessa maneira, é provável
que, possivelmente, tal sintoma psicótico tenha exercido maior impacto sobre
a cognição do que as alucinações.
7.2 Aspectos socioeconômicos
Salvo melhor juízo, este é o primeiro estudo a examinar a correlação
entre sintomas psicóticos e variáveis socioeconômicas. Como vivemos em
uma sociedade com altos índices de desigualdade social, estudar a influência
do status socioeconômico na sintomatologia é essencial para o melhor
entendimento da interferência dos fatores socioeconômicos sobre o
desenvolvimento das doenças, particularmente das psicoses nos idosos e sua
relação com a cognição.
7 Discussão 50
Assim, observamos que uma tendência dos indivíduos com sintomas
psicóticos (mais de 55,0% em todos os grupos de sintomas) pertencerem às
classes socioeconômicas menos favorecidas (C e D), assim como uma menor
presença de tais sintomas nas classes A e B. Estes resultados foram similares
aos da primeira fase deste estudo, uma vez que a presença de sintomas
psicóticos se mostrou significantemente associada às classes
socioeconômicas mais desfavorecidas.
Além disso, observamos correlação inversa entre número de sintomas
psicóticos e classe social, isto é, maior número de sintomas nas classes
menos favorecidas e menor número nas mais favorecidas29. Não
encontramos dados semelhantes na literatura para podermos comparar com
os nossos resultados.
Também observamos a tendência ao uso do sistema público de saúde
e de convênios de saúde por parte dos pacientes com sintomas psicóticos,
apesar desta associação não ter sido significante. Além disso, foi possível
observar a inserção de todos os que referiram sintomas psicóticos em algum
tipo de assistência, seja ela pública seja ela privada. Boa parte desses
indivíduos utiliza o sistema público, apesar de, no Brasil, existirem barreiras
para o uso adequado do serviço de saúde mental público, o que faz boa parte
desses pacientes procurarem o serviço privado45. Estes dados são
importantes para um melhor planejamento dos serviços públicos, permitindo
que esses possam melhor entender, diagnosticar e tratar estes tipos de
paciente.
7.3 Associações com comorbidades clínicas
As comorbidades clínicas relatadas foram comuns nesta amostra, com
mais de 83,0% dos indivíduos referindo ao menos uma. Populações de idosos
têm maior vulnerabilidade para ocorrência simultânea de comorbidades
físicas e mentais2, sendo esta relação bem descrita na literatura desde os
primeiros estudos envolvendo sintomas psicóticos e população idosa6, 7.
7 Discussão 51
Crises convulsivas, depressão referida, sífilis e diabetes foram as
comorbidades mais relevantes. As crises convulsivas foram referidas, mais
frequentemente, por indivíduos com, ao menos, um sintoma psicótico e com,
ao menos, dois sintomas quando comparados com aqueles sem sintomas (p
≤ 0,01). Também observamos uma tendência de indivíduos com cada um dos
sintomas psicóticos tomados isoladamente relatarem mais crises convulsivas
do que aqueles que não apresentavam tais sintomas.
Já é conhecido que 2 a 7% dos pacientes com epilepsia têm sintomas
psicóticos46. Essas associações podem ter várias possíveis causas, sendo as
principais as seguintes: atividade subictal no sistema límbico; o próprio uso de
anticonvulsivante; mudanças nos receptores dopaminérgicos; mudanças no
fluxo sanguíneo induzidas pelas repetidas crises convulsivas e reações
autoimunes46,47,48. Quadros epilépticos que se iniciam na população idosa
possuem uma forte ligação com síndromes demenciais46, as quais também
estão relacionadas a sintomas psicóticos. Diante disso, é possível aventar que
sintomas psicóticos em indivíduos com epilepsia (ou com crises convulsivas)
também podem representar um estado prodrômico de demência, o qual é
bastante debatido na literatura e será abordado adiante.
A associação entre sintomas psicóticos e quadros depressivos é bem
estabelecida na literatura. Ter sintomas psicóticos pode levar o individuo a
desenvolver sintomas depressivos, devido ao sofrimento psíquico que eles
podem causar. Além disso, episódios podem ser agravados pelos sintomas
psicóticos, e vice-versa, o que pode ter levado aos participantes da pesquisa
responderem positivamente quanto à presença de ambos os sintomas.
Alterações degenerativas cerebrais também podem ser a origem comum de
quadros depressivos e das ideias persecutórias no idoso, levando a tal
associação.
A sífilis foi outra comorbidade com relações importantes no nosso
estudo. Ela foi referida mais frequentemente por indivíduos com alucinações
auditivas e por aqueles com, ao menos, um sintoma psicótico em comparação
àqueles que negaram tais sintomas. A neurosífilis é uma das formas de sífilis
terciária e pode se manifestar por meio de síndromes psiquiátricas, dentre
7 Discussão 52
elas: síndrome demencial; comprometimento cognitivo e síndrome psicótica
(quadros psicóticos agudos, delírios persecutórios e alucinações)49. A forma
patológica mais associada aos sintomas psiquiátricos é a parenquimatosa, a
qual envolve perda neuronal, esta, inicialmente, leva a alterações do humor,
sintomas psicóticos e comprometimento cognitivo, posteriormente, o quadro
demencial torna-se proeminente49. Estes estágios da sífilis não foram
observados no presente estudo.
7.4 Possíveis fatores de risco para a incidência de sintomas psicóticos
Assim como fizemos na primeira fase do nosso trabalho29, estudamos
possíveis fatores de risco para a incidência de sintomas psicóticos utilizando-
se a regressão logística, uma vez que o estudo destes sintomas como
preditores em idosos sem demência é pouco encontrado na literatura,
particularmente usando tal método estatístico.
Deste modo, a presença de crises convulsivas mostrou ser a única
variável preditiva para todos os tipos de alucinações, com diferentes odds ratio
para cada uma delas. As crises convulsivas ocorrem dezesseis vezes mais
frequentemente em casos incidentes de alucinações auditivas e quase oito
vezes mais na presença de alucinações visuais/táteis. As possíveis
explicações para tal associação já foram debatidas anteriormente nesta
discussão.
Outra variável preditiva associada à presença de ideias persecutórias foi
o escore de MEEM. A perda de um ponto neste escore foi associada ao
aumento de 32% nas chances de desenvolver ideias persecutórias (p ≤
0,001). Escores de MEEM mais baixos, assim como sintomas físicos e viver
em “abrigos de idosos” estão relacionados à maior incidência de sintomas
psicóticos7. Na primeira fase do estudo, indivíduos com sintomas psicóticos
também tiveram piores desempenho no MEEM quando comparados aos sem
tais sintomas, a diminuição de um ponto no escore deste teste foi associada
a 13 a 14% de aumento nas chances de apresentar alucinações auditivas e
7 Discussão 53
ideias persecutórias, respectivamente. Pudemos perceber que a associação
entre menor MEEM e ideias persecutórias foram similares em ambas as fases.
Este é um importante dado para embasar a teoria de que esses sintomas
psicóticos podem representa um estado prodrômico de síndromes
demenciais.
A depressão referida também aumentou as chances de estar associado
a ideias persecutórias em mais de seis vezes. Encontramos dados
semelhantes na primeira fase, em que a depressão relatada foi tida como um
possível fator de risco para os todos os sintomas, aumentando a chance de
alucinação em 2,7 vezes e de delírio persecutório em mais de 4 vezes29.
Como discutimos anteriormente, essa associação entre depressão e sintomas
psicóticos em idosos sem comprometimento cognitivo pode estar associada à
depressão psicótica, ou a uma possível origem comum.
7.5 Conversão em comprometimento cognitivo
Este é o primeiro estudo em um país em desenvolvimento que examinou
uma amostra de indivíduos sem demência e com sintomas psicóticos e a taxa
de conversão em indivíduos com comprometimento cognitivo. Quase 58% dos
participantes da pesquisa com sintomas psicóticos passaram a apresentar
comprometimento cognitivo durante o seguimento de sete anos. Esse valor
mostra-se acima do encontrado na literatura, o qual varia entre 18,5 e
44,0%12,14.
A primeira descrição da taxa de conversão em quadros demenciais
relatado na literatura foi o estudo de Ostling & Skoog, 200214, realizado na
Suécia, com uma amostra de idosos acima dos 85 anos e que foram
acompanhados por 3 anos. Portanto, trata-se de uma amostra composta por
uma faixa etária maior do que a do nosso estudo e o acompanhamento foi por
um período mais curto. Para o cálculo da obtenção da incidência de demência,
toda a amostra foi utilizada, o que difere do nosso estudo, uma vez que
consideramos apenas a subamostra de indivíduos com sintomas psicóticos
7 Discussão 54
na fase I e que foram reavaliados sete anos depois. A importância do estudo
de Ostling e Skoog reside no fato de que foi o primeiro a aventar os sintomas
psicóticos como expressão de uma fase prodrômica de demência14.
O segundo estudo a abordar a esta taxa de conversão foi o de Ostling et
al., 2007. Este estudo também foi feito na Suécia, incluiu idosos da
comunidade e vivendo em “abrigos de idosos”, o que pode ter influenciado
esse resultado de 44%. O acompanhamento se deu por vinte anos, intervalo
bem maior do que o nosso. A taxa de conversão é em quadro demencial, ao
contrário deste, em que preferimos diagnosticar como comprometimento
cognitivo, pois o diagnóstico de demência requer uma avaliação mais
detalhada do que a apresentada. O cálculo da taxa de conversão foi mais
semelhante ao nosso do que o estudo de 200214, tornando a comparação
mais adequada. Apesar de ser outro importante estudo que reforça a ideia de
que os sintomas psicóticos seria parte de um estado prodrômico de síndrome
demencial, os autores enfatizam que a maior parte da amostra não
desenvolveu demência12.
Os sintomas psicóticos aumentaram as chances do posterior
desenvolvimento de uma síndrome demencial em 2,5 a 3,5 vezes12,14,17. Esse
comprometimento cognitivo nestes indivíduos é mais rápido do que na
população em geral e ocorre, principalmente, em outras funções cognitivas
que não a memória17. O intervalo médio entre o início dos sintomas psicóticos
e o desenvolvimento do comprometimento cognitivo foi de cinco anos12.
Observamos que as alucinações visuais/táteis aumentaram as chances
do desenvolvimento do comprometimento cognitivo em quase seis vezes.
Apesar de não ter sido estabelecido um odds ratio, a literatura relata dados
similares: alucinações, especialmente as visuais, e delírios persecutórios
estão relacionados ao aumento da incidência de comprometimento cognitivo
em grupos de idosos12,14.
A discussão quanto a esses quadros psicóticos serem ou não um estado
prodrômico de demência é presente na literatura. Sintomas psicóticos são,
mais frequentemente, acompanhados de quadros demenciais, principalmente
nos estágios mais avançados45,50. Devido a isso, com o objetivo de encontrar
7 Discussão 55
um possível quadro de demência, a investigação cognitiva e funcional dos
idosos com esses sintomas se faz extremamente necessária. Livingston et al.,
e Ostling & Skoog e Ostling et al. apresentaram estudos em que a maioria dos
indivíduos que tinham sintomas psicóticos não desenvolveu demência11,12,14.
Apesar disso, em ambos os estudos, Ostling e colegas afirmaram que os
sintomas psicóticos predizem ou fazem parte de um estado prodrômico de
demência, principalmente nos pacientes que apresentam alucinações
visuais12,14. Em nosso estudo, tais sintomas estavam associados a uma média
mais baixa de MEEM como também à menor escolaridade, denotando um pior
desempenho cognitivo desses indivíduos não apenas no momento da
avaliação, mas também durante toda uma vida de baixa exigência cognitiva,
o que pode ser considerado como fator de risco para demência.
Em resumo, o nosso estudo se alinha com outros da literatura e fornece
evidência de que há maior risco de desenvolver comprometimento cognitivo
em indivíduos sem demência quando esses apresentarem sintomas
psicóticos12,14,17.
Além disso, a presença de menores médias de MEEM7,12,29, maiores
escores de B-ADL29, pior escolaridade29, e a presença de comorbidades
clínicas (crises convulsivas, sífilis, AVC, Doença de Chagas) também estão
associadas a quadros demenciais29. Estes fatores bem como a associação
entre demência e sintomas psicóticos são pontos importantes para
sedimentar a ideia de que os sintomas psicóticos em idosos sem demência
pode ser um estado prodrômico dessa. Esta discussão precisa ser
aprofundada e os resultados encontrados devem ser replicados em outras
populações com características distintas.
Estudos anteriores avaliando sintomas psicóticos em idosos relataram a
associação entre comprometimento sensorial e tais sintomas11,12,14. Nós não
pudemos investigar essa associação, pois o nosso questionário não
pesquisou a presença de comprometimento visual ou auditivo na amostra.
Por se tratar de uma amostra da população residente na cidade de São
Paulo, esse estudo apresentou excesso de mulheres e um alto nível
educacional em comparação à média brasileira. Outra possível limitação foi o
7 Discussão 56
índice de resposta de 70% na primeira fase do estudo, índice semelhante a
outros estudos envolvendo idosos realizados em São Paulo30. Questionários
respondidos pelo paciente ou pelo seu cuidador podem resultar em dados
subestimados ou superestimados em algumas variáveis, essa situação
representa a principal limitação do presente estudo. Apesar disso,
pesquisadores avaliando problemas de saúde em indivíduos idosos
encontraram associações significativas entre o que era relatado pelos
próprios idosos e o correspondente relatado pelo cuidador28,51.
Em sendo um estudo de coorte, implicam-se em vantagens e
desvantagens inerentes a tal modelo de estudo epidemiológico. Os resultados
são obtidos após longo tempo de seguimento, o que o tornou vulnerável a
perda de indivíduos em tal período, nos 7 anos de follow-up, cerca de 18%
faleceram e 28% não foram localizados. O estudo do tipo coorte também pode
apresentar como desvantagens: potencial falta de comparatibilidade entre os
grupos, além de vieses decorrentes do conhecimento prévio da exposição da
dificuldade na análise de quadros raros52,53.
Apesar disso, há vantagens características no estudo de coorte aplicado
ao tipo de quadro investigado no presente estudo, visto que ele proporciona
um alto potencial analítico, possibilitando a obtenção de verdadeiros índices
de incidência e risco relativo; além da avaliação simultânea de vários
desfechos clínicos52,53.
Quanto às perguntas do Camdex36, as perguntas utilizadas para o
rastreio dos sintomas psicóticos não especificam um período de tempo exato
para a ocorrência destes sintomas, o que também pode ser considerado uma
limitação do nosso estudo.
8 CONCLUSÃO
8 Conclusão 58
8 CONCLUSÃO
Idosos sem comprometimento cognitivo de uma amostra da população
do município de São Paulo, reavaliados após 7 anos, apresentam uma
incidência de sintomas psicóticos de 8,0% e uma taxa de conversão em
comprometimento cognitivo de 57,8%, dados que estão um pouco acima da
literatura internacional vigente. As alucinações visuais/táteis foram as mais
incidentes e o único tipo de alucinação preditiva para o desenvolvimento de
tal comprometimento. Com isso, encontramos argumentos importantes para
contribuir com a fundamentação da ideia de que os sintomas psicóticos em
indivíduos sem comprometimento cognitivo é um estado prodrômico de
quadros demenciais.
Encontramos importantes relações entre a incidência de sintomas
psicóticos e o escore de MEEM, assim como com algumas comorbidades
clínicas referidas, foram elas: convulsões, depressão, diabetes e sífilis; sendo
o escore de MEEM e a presença de convulsões variáveis preditivas de ideias
persecutórias e alucinações, respectivamente. Apesar de não terem sido
estatisticamente relevantes, observamos uma tendência à maior
concentração de indivíduos com sintomas psicóticos em classes sociais mais
desfavorecidas, como também nos grupos com menor número de anos de
estudo.
Futuros estudos envolvendo esse tipo de indivíduos idosos são
fundamentais para buscarmos entender mais adequadamente, e,
futuramente, podermos prevenir quadros psicóticos e o comprometimento
cognitivo nessa população.
9 ANEXOS
9 Anexos 60
9 ANEXOS
9.1 ANEXO A – Artigo “Psychotic symptoms in older people without dementia from a Brazilian community-based sample”.
9 Anexos 61
9 Anexos 62
9 Anexos 63
9 Anexos 64
9 Anexos 65
9 Anexos 66
9 Anexos 67
9 Anexos 68
9 Anexos 69
9.2 ANEXO B – Carta de submissão do segundo artigo ao periódico PLOS ONE. Submetido em 13/08/2016, atualmente está sob revisão.
10 REFERÊNCIAS
10 Referências 71
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