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XVI CONGRESSO LATINO AMERICANO DE ESCOLAS DE SERVIÇO SOCIAL
‘’A GLOBALIZAÇÃO E SEU IMPACTO NO TRABALHO SOCIAL PARA O SÉCULO XXI”
APRESENTAÇÃO DE TRABALHO NO EIXO TEMÁTICO: INTERVENÇÃO
PROFISSIONAL. “ AS NECESSIDADES E AS DEMANDAS SOCIAIS A PARTIR DO
ENFOQUE DA GLOBALIZAÇÃO E DO TRABALHO SOCIAL: REALIDADE OU
INVENÇÃO? “
TÍTULO DO TRABALHO: Os desafios para o trabalhador social no contexto da
globalização do capital e das reformas do Estado Nação.
Autoria: Lúcia Cortes da Costa.
Tipo de trabalho: Resultado preliminar de pesquisa realizada na pós-graduação –
Doutoramento, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Brasil.
Palavras Chaves: Globalização, Reformas, Estado.
Abstract:
A tarefa do trabalhador social, no atendimento das demandas sociais, no contexto
da globalização tem encontrado novos desafios colocados pelas propostas de reformas
do Estado que buscam diminuir a ação dos governos na área social.
A internacionalização do capital, a articulação entre o capital financeiro e o capital
industrial, o livre fluxo dos investimentos, tem colocado novos desafios para os governos
nacionais, especialmente para os países periféricos.
A agenda política dos anos 90 é a Reforma do Estado, onde os temas colocados
em discussão revelam uma pressão dos países centrais na abertura econômica,
privatização e redução das dívidas públicas dos diferentes Estado Nacionais.
A austeridade fiscal dos Estados Nacionais na América Latina, tem revelado um
desafio para os setores sociais. A redução dos investimentos na área social, tem mantido
sem solução os graves problemas das populações pobres, colocando limites profundos na
ação profissional dos trabalhadores sociais. A ação social de caráter educativo e
promocional é uma necessidade concreta na realidade dos países subdesenvolvidos, que
deve estar articulada com medidas de caráter estrutural de redistribuição de rendas e
combate a pobreza. O desafio para o trabalhador social é encontrar novos modelos de
gerenciamento dos serviços sociais neste contexto de austeridade fiscal.
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PONENCIA:
“ Os desafios para o trabalhador social no contexto da globalização do
capital e das reformas do Estado Nação. “
Construímos nossa reflexão partindo da seguinte ordem: a consideração
sobre o conceito e as funções do Estado, a discussão sobre as redefinições do
Estado com o processo da globalização do capital para então debater sobre os
desafios do trabalhador social neste contexto de final de século.
1) Considerações sobre o Conceito e as Funções do Estado:
As mudanças dentro da sociedade capitalista estão redefinindo os papéis e
funções do Estado Nação. A conjuntura histórica das últimas décadas deste
século tem evidenciado uma perda significativa no poder de barganha das classes
trabalhadoras, que através de suas organizações sindicais, pressionavam o
Estado na aprovação de direitos trabalhistas e sociais. Este processo de
redefinição das relações de poder dentro da sociedade capitalista expressa-se na
agenda das reformas do Estado nos diferentes países e repõe a discussão do
contrato social.
O ponto central do presente processo histórico é a discussão da regulação
estatal, sua polêmica entre liberdade e igualdade, entre mercado e regulação
pública-estatal. O Estado, como instituição humana, é marcado pela historicidade.
O Estado sofreu várias redefinições, conforme o avanço da sociedade moderna
capitalista.
Num breve resgate da discussão sobre o conceito e as funções de Estado,
vemos que para Thomas Hobbes (1642), o Estado tinha a função de manter a
ordem e a propriedade na sociedade. Hobbes colocava que se aos homens fosse
dada toda liberdade de ação, a própria sociedade estaria sob o risco da violência e
de guerras civis, pois para Hobbes, os indivíduos eram como lobos – disputando
entre si.
Com o nascimento da doutrina sobre o direito público e das obrigações e
funções do Estado, nasce também a polêmica sobre o Estado natural e o Estado
político. Nesta polêmica se constrói a idéia do Estado racional, cujas ações
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deveriam ter fundamentos na razão moderna, e, a idéia de contrato social –
tematizada por Locke e Rousseau, entre outros.
A discussão do Estado político e dos direitos naturais abre a questão da
legitimidade do Estado e a democracia moderna.
Locke (1632-1704) colocava como imperativo para a ordem social – a
proteção da propriedade individual, e como atribuição do Estado assegurar o
direito da propriedade privada, a liberdade econômica, a segurança pessoal e
liberdade política. Locke já teorizava sobre o cidadão, o sujeito portador de
direitos, mas não universalmente concebido. O Contrato Social cria o Estado, e os
indivíduos – aqueles considerados cidadãos, os proprietários, poderiam dissolver
o Estado caso este não cumprisse suas funções. A legitimidade do Estado estaria
no contrato que o fundava, porém as funções do Estado garantiriam na prática,
sua legitimidade. Era o Estado dos proprietários.
Com Rousseau (1712-1778) nasce uma polêmica contra a democracia
censitária, a busca da igualdade como fundamento da sociedade colocou em
questão o direito da propriedade individual. O Estado foi visto por Rousseau como
uma invenção do rico contra o pobre. Pois para ele, se não houvesse igualdade
não haveria liberdade, mesmo que pensasse em igualdade perante a lei como a
base de uma sociedade democrática onde o poder deveria emanar do povo.
Rousseau percebia que a igualdade tem, além dos aspectos jurídicos e legais, um
fundamento econômico e social. A legitimidade do Estado para Rousseau estaria
no contrato que o fundava, porém, colocava que era a ignorância do povo que
aceitava o Estado. Assim, propunha a educação pública como caminho para
construir uma sociedade democrática, onde o poder da maioria fosse respeitado.
Com Rousseau as funções do Estado passaram a ser debatidas sob nova
perspectiva – a da maioria e a da igualdade.
Em Hegel também temos uma discussão sobre o Estado e a sociedade
civil. Para Hegel o Estado era a razão objetivada na história – o ente que fundava
a sociedade civil. Sendo o Estado que fundava a sociedade, a constituição seria
outorgada pelo monarca. Hegel analisa o Estado a partir da figura de Napoleão e
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estabelece na sua filosofia do direito uma dialética entre Estado e sociedade civil,
entre as esferas da universalidade (Estado), a particularidade e as singularidades.
É em Marx(1843/1844) que a critica ao Estado liberal se coloca com toda
força alegando o seu caráter de classe. Marx analisa inicialmente a filosofia do
Direito de Hegel, afirmando contra Hegel, que não é o Estado que funda a
sociedade civil e sim esta é que cria o Estado e o legitima. A base da sociedade
está na sua organização de classe e nos interesses que se fazem representar no
Estado. A crítica de Marx ao Estado Liberal de seu tempo(1848) o colocava como
“ comitê da burguesia” .
Gramsci (1920) coloca que o Estado é o campo de embate entre as classes
fundamentais da sociedade capitalista (capital e o trabalho). Coloca que o Estado,
além da preservação da propriedade privada, busca da legitimidade pela
construção da hegemonia e do poder ideológico – que responderiam pelas
funções de coerção e consenso, e a manutenção da ordem capitalista com o uso
legal da força – a função de repressão.
Segundo as inferências teóricas de Gramsci, o Estado tem uma função
educativa, que na sociedade capitalista é colocada a serviço dos interesses gerais
do capital. A igualdade jurídica e política não podem completar a democracia sem
a igualdade social, assim o Estado capitalista vive num impasse do discurso da
cidadania e a prática da opressão.
No século XX a polêmica da cidadania evidencia o caráter formalista da
democracia liberal que não resolve o problema da igualdade social devido as
contradições das relações sociais de produção capitalista.
As funções do Estado passam a ser discutidas não apenas do ponto de
vista dos direitos políticos e civis, mas dos direitos sociais. As funções do Estado
se ampliam no século XX, não apenas devido a luta pela igualdade social, mas
essencialmente devido a complexidade da sociedade e o acirramento da
concorrência capitalista. Foram os impasses das crises deste sistema de produção
que levaram as grandes modificações nas funções do Estado. Pensemos o
século XX a partir das grandes crises sociais: a primeira guerra mundial (1914-18),
a crise da bolsa de valores de Nova Iorque (1929), a Segunda guerra
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mundial(1939-45), a reconstrução da Europa a partir de 1947, o combate ao
comunismo – guerra fria de 1950/80, a guerra nas estrelas, o fim do comunismo
no leste europeu (1989), a ampliação dos mercados e as crises financeiras dos
anos 90.
Se os séculos XVII e XVIII evidenciaram a ascensão dos direitos naturais e
a discussão do contrato social, o século XIX a ascensão da democracia liberal
censitária e a luta pelo voto universal, o século XX colocou a discussão do Estado
Democrático, da universalização dos direitos políticos, civis e sociais.
A função regulatória do Estado assumiu maior destaque a partir da crise de
1929. Dado o impacto social da crise econômica, o governo americano realizou
uma atuação mais abrangente do Estado, buscando evitar que a fome e a miséria
deteriorasse definitivamente a sociedade. Iniciava-se a experiência histórica de um
modelo de Estado dirigista ou interventor. Franklin Roosevelt, buscando a
restauração econômica e social criou o New Deal em 1932.
Como se gestou a crise de 1929 e quais as novas funções que o Estado
passou a desempenhar? De maneira muito genérica podemos dizer que a crise
americana de 1929 foi resultado da sua própria prosperidade. No capitalismo
quando o crescimento econômico chega a patamares elevados sem a
correspondente elevação do consumo, ocorre crise de excesso de produção e
crise de especulações com as ações das empresas, vendidas nas bolsas de
valores.
Após a primeira guerra mundial a economia americana passou a ser a
grande potência econômica do mundo, mas ocorreu que cessados os conflitos, a
Inglaterra e França voltaram a produzir, derrubando as exportações americanas.
Este fator da queda das exportações estava aliado aos fatores do mercado interno
americano que não tinha potencialidade de absorver toda a produção, pois o
grande investimento sempre é precedido de uma acumulação, onde os salários
devem crescer sempre abaixo da produtividade das empresas, o que reduz a
demanda efetiva e leva a recessão.
Com as crises econômicas aparecem as crises sociais – dada em grande
parte pela elevação do desemprego. Este é o ciclo das crises capitalista:
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crescimento econômico, recessão e desemprego. Para desatar este ciclo de crise
o Estado passou a regular a economia.
Com esta importante experiência de planejamento da economia cresceu a
discussão sobre os modelos de Estado, levando a um impasse político e social
dentro do capitalismo. O Estado deveria ter funções mais amplas para evitar as
crises econômicas e sociais, o mercado deveria ser regulado. Assim, as medidas
de gastos públicos foram vistas como necessárias para evitar a queda do
consumo e a recessão.
Keynes(1936) propunha uma revolução no papel do Estado liberal. Para
Keynes a economia capitalista difere da economia de simples troca porque o
objetivo do capitalista é o lucro e não o consumo. A moeda no sistema capitalista
não é um meio de troca neutro, tem função de reserva de valor, o que gera a
preferência pela liquidez afetando o volume da demanda e gerando especulações.
Na polêmica com a teoria clássica, Keynes analisou o problema do desemprego,
que para ele era resultado da falta de investimentos, gerado pela falta de
demanda, ocasionando recessão. Keynes negou o princípio da teoria clássica de
que toda produção gera sua demanda e analisou o papel das expectativas dentro
do sistema produtivo, teorizando o papel ativo do Estado na regulação da
economia.
A partir das idéias de Keynes, a social-democracia européia passou a ver
nas suas proposições uma justificativa econômica para os gastos sociais e a
crescente inte rvenção do Estado no planejamento econômico.
Hayek, dentro das proposições do liberalismo clássico, nega a idéia de
regulação do Estado na economia, propondo o livre mercado como o caminho
mais eficiente para gerar riqueza. Para Hayek toda a intervenção do Estado na
regulação social seria desastrosa porque os indivíduos perderiam o incentivo para
desenvolverem suas potencialidades se o Estado assumisse um papel protetor.
A hegemonia das idéias Keynesianas durante o segundo pós-guerra serviu
para o crescimento dos partidos social-democratas e para a construção de um
modelo de regulação social e de um ideal de Estado de bem estar social. A partir
da década de 1970 perde força as idéias Keynesianas e se retomam as idéias
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inspiradas em Hayek sobre o livre mercado, levando a um sistemático ataque as
organizações das classes trabalhadoras e a reforma do Estado como tema central
para o crescimento econômico. Na ofensiva conservadora os déficits públicos,
gerados pelos gastos sociais, passaram a ser a causa principal do pequeno
crescimento econômico, assim, a receita passou a ser a austeridade fiscal.
As funções do Estado assumem a cada época histórica, características
específicas. Neste final de século estão sendo redesenhadas novamente as
funções e o conceito de Estado. A articulação entre o Estado e o capital é
orgânica e estrutural, porém, realizada através de um complexo sistema de
mediações, que buscam ao mesmo tempo legitimidade social e a acumulação
capitalista. São pólos contraditórios e em permanente tensão.
2) O processo da globalização e as redefinições nos papéis do Estado:
A complexidade da atual conjuntura histórica, evidenciada pelo processo
intenso de globalização dos mercados, coloca redefinições importantes no papel e
funções do Estado Nacional, especialmente nos países periféricos. A
compreensão dos processos de globalização da sociedade capitalista é uma
exigência para a compreensão das mudanças colocadas pelas reformas de
Estado em curso em todo mundo.
Como se intensifica a globalização capitalista neste final de século? A
conjuntura favorável à ampliação dos direitos sociais nos países centrais perdurou
até a década de 1970, quando a crise do petróleo deflagrou um complexo
processo de redefinições nas relações de poder internacional e de mudanças
tecnológicas. O boicote dos países árabes fez o mundo capitalista entrar em crise
(1974 e 1979). A conjuntura desta fase do capitalismo é muito complexa apenas
destacamos alguns pontos essenciais:
- crise do petróleo levou ao aumento no preço de toda produção industrial e ao
desequilíbrio financeiro dos países compradores de petróleo;
- crise política – a busca do controle do processo produtivo pelos sindicatos e
luta dos países periféricos para mudanças nas relações do mercado mundial,
buscando favorecer os países pobres;
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- criação de um mercado financeiro internacional devido o acúmulo de dólares
da elevação do preço do petróleo – financiamento de novo ciclo de
crescimento econômico na Europa, EUA, Japão e América Latina.
- Crise das dívidas – crise financeira dos Estados e queda do crescimento
econômico.
Para fugir da pressão dos sindicatos fortes dos países centrais e buscando
baratear os custos de produção, agora com maiores recursos tecnológicos, houve
então um processo mais intenso de internacionalização da produção. Esta
internacionalização da produção, ao transgredir as barreiras nacionais, é o cerne
do avanço da globalização.
“ Todos esses processos significaram retirada do Estado, via ruptura de
controles estatais que foram eliminados nos casos de retirada de controle
tarifários e barreiras ao comércio; a partir das desregulamentações, que
eliminaram normas governamentais; como auxilio das desintermediações
financeiras, que permitiram que os agentes econômicos participassem dos
mercados de títulos e moedas sem passar pelas normas que regulavam o
sistema financeiro; e através de perda de controle de determinados setores da
economia, no caso das privatizações. Em uma palavra, tais processos
significaram, na prática, a liberalização generalizada dos mercados, tendência
que vem se desenvolvendo desde o final dos anos setenta(MOLLO,1997,
p.69).”
Os espaços econômicos não coincidem com os espaços nacionais. As
soberanias políticas são suplantadas pela soberania econômica
internacionalizada. Neste amplo processo de redefinição da produção capitalista, o
Estado-Nação é progressivamente corroído pela internacionalização da economia,
que desloca a produção e a base de criação do valor para espaços supra-
nacionais, aliando-se a um sistema financeiro internacional que detém um fluxo de
capital volátil que não esta sob o comando de nenhum banco central, de nenhum
governo. Este capital, livre das amarras nacionais, busca taxas de lucros mais
atrativas e cria um tensionamento para a contabilidade nacional.
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A globalização é o processo de redefinição do padrão de acumulação
capitalista que, redefine as ações do Estado Nação e, cria um sistema complexo
de produção e circulação de mercadorias ao nível mundial. Entra em cena a
produção flexível como eixo desta nova fase da acumulação capitalista.
François Chesnais nos oferece uma interpretação do processo de
globalização articulando-o ao desenvolvimento de uma nova fase do processo de
acumulação, onde o capital financeiro adquire maior peso na definição dos locais
de investimento do capital produtivo. “ É na produção que se cria riqueza, a
partir da combinação social de formas de trabalho humano, de diferentes
qualificações. Mas é a esfera financeira que comanda, cada vez mais, a
repartição e a destinação social dessa riqueza.” O capital financeiro, segundo
Chesnais, esta articulado a um movimento de transferências efetivas de riqueza
da esfera pública, via o ”serviço da dívida pública e as políticas monetárias
associadas a este. Trata-se de 20% do orçamento dos principais países e de
vários pontos de seus PIBs, que são transferidos anualmente para a esfera
financeira. Parte disso assume então a forma de rendimentos financeiros,
dos quais vivem camadas rentistas. (1996,p.15)”
Assim, podemos ver que as dívidas externas que colocaram os países da
América Latina em crise fiscal são na verdade parte do processo endógeno da
ascensão do capital financeiro através da transferência de riqueza da esfera
produtiva de cada país para um setor comandado pelo capital financeiro
internacional. As conseqüências sociais deste processo de fortalecimento do
setor financeiro, feito as custas de fundos públicos canalizados através do serviço
das dívidas externas e internas, refletem-se na perda da capacidade de
investimentos sociais e em infra-estrutura por parte dos Estados. Outra
conseqüência perversa deste processo é a submissão dos Estados aos capitais
especulativos, o que gera um clima de insegurança no sistema produtivo e na
sociedade em geral.
O ataque especulativo sobre as moedas dos países emergentes vem sendo
um demonstrativo da forte insegurança deste modelo de acumulação baseado no
setor financeiro. A recente crise da Ásia, a atual crise na América Latina, coloca
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em evidência o poder fictício de algumas economias e a fragilidade do sistema
mundial de produção, a interligação de todas as economias devido a
internacionalização do capital financeiro e produtivo. A instabilidade econômica
tem repercussões na estabilidade política dos governos. A produção globalizada
acirrou a instabilidade social e o processo de exclusão social aliado a pobreza de
parte significativa da população do planeta.
A dinâmica interna do sistema capitalista, agora sob o comando do capital
financeiro, coloca uma aceleração no tempo de valorização do capital produtivo,
desencadeando uma luta mais intensa pelo aumento da produtividade do trabalho
e de uma concorrência ainda maior entre os diferentes setores produtivos. Cresce
assim a precarização das normas que regem o mercado de trabalho, aumentando
o grau de exploração da força de trabalho, tanto em termos absolutos como
relativos.
O Estado é chamado a atuar conforme este novo ritmo do capital, assim, as
leis trabalhistas, em todo mundo capitalista, passam a ser foco das atenções dos
governos pressionados pelo mercado, a fim de tornar a economia competitiva. A
palavra competitividade passou a ser o mito sagrado do capitalismo deste final de
século.
A aceleração do tempo na esfera da circulação do capital financeiro, o ritmo
intensivo da esfera produtiva e a mídia global do consumo redefinem o conceito de
tempo dentro da sociedade. A velocidade é a meta e a tecnologia é a forma pela
qual se revolucionam constantemente a sociedade capitalista.
A supressão das distâncias entre tempo e espaço criou o mundo
globalizado da informação contínua, dos mercados financeiros interligados ao
tempo todo. É o mundo on line que impera. Nesta paranóia globalizada a pressa é
o comando de todas as esferas sociais. Quem não está inserido na linha do
mercado fica marginalizado do mundo. O mercado é o mundo. É a força suprema
a qual todos os indivíduos, todos os governos devem se curvarem.
Nesta lógica o redesenho do Estado é apenas um elemento da adequação
ao mundo globalizado. É esta a lógica da reforma do próprio conceito de Estado
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Nação, já que, finalmente o capital pode admitir que sua lógica sempre foi
mundial.
A regionalização do mundo em grandes blocos comerciais é um processo
ainda em andamento, do qual temos tendências, mas não temos sua
concretização histórica. Há neste processo de globalização uma possibilidade
emancipatória, pois ao generalizar-se a lógica do capital, generaliza-se também
suas contradições. Pensemos que a tese de Marx sobre a união de todos os
trabalhadores do mundo pode ter agora, início do século XXI, uma base concreta
na história do capitalismo.
A organização de uma política supra nacional, a criação de um livre trânsito
de mercadorias e fatores, os problemas de ordem cultural e étnica, não serão
assimilados passivamente pelos cidadãos dos diferentes pa íses.
É preciso ter claro que o processo de multinacionalização da produção, que
redefiniu a divisão social do trabalho ao nível internacional, quebrou a estática das
vantagens comparativas, apesar de propor um padrão de industrialização para os
países periféricos não quebrou nem anulou a hegemonia econômica e política dos
centros capitalistas.
Ao invés de acabar com a contradição capital – trabalho, a globalização a
estendeu para todos os cantos do mundo. Que mundo estamos construindo? Esta
incógnita é o desafio para os setores de esquerda criarem, ao lado do processo de
globalização, um projeto humanitário que respeite as diferenças e lute contra as
desigualdades. Neste sentido ser de esquerda é ser contra a tese das
desigualdades naturais dos homens e da supremacia do mercado, como nos
coloca Emir Sader: “ Ser de esquerda no mundo de hoje significa participar da
reinvenção concreta de uma nova sociedade, baseada na justiça social e na
solidariedade, na realização prática dos direitos de cidadania sem qualquer tipo de
exclusão(1995,p.195).”
3) Os desafios do trabalhador social neste contexto de final do século:
Cresce no mundo a temática da reformas do Estado. Na década de 1980, a
Inglaterra, no governo Thatcher(1979), nos EUA, no governo Reagan (1980), na
Alemanhã ocidental com Khol (1982) e na Dinamarca com Schluter (1983).
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O que houve de comum nestes governos ditos de direita? A quebra dos
direitos sociais com o corte nos gastos públicos para a área social, o acirramento
de novo tipo de concorrência capitalista, a privatização de esferas antes estatais e
a pressão sobre os países periféricos para a abertura econômica.
E a periferia capitalista, como ficam os povos da América Latina, Extremo
Oriente, África e demais regiões ditas subdesenvolvidas? A receita que vem do
FMI e do Banco Mundial é muito clara: ajustes internos, austeridade nos gastos
públicos e abertura econômica. O que isso representa para estas sociedades? A
sua subordinação ainda mais forte ao grande capital. A guerra agora não é apenas
de armas, mas uma guerra surda travada no sistema financeiro mundial e nas
relações de troca internacionais. Os ajustes liberais são realizados com o sacrifício
da população trabalhadora, que são sentidos em duas ordens: - o corte dos gastos
e investimentos sociais que reduz o acesso da população a bens e serviços
essenciais (habitação, saúde, escola, crédito); - a precarização das normas do
mercado de trabalho, o desemprego e a insegurança dada nesta ordem
econômica.
Colocaremos nossa reflexão a partir da realidade social do Brasil, a proposta
da reforma do Estado e os dados sobre a situação de pobreza, desemprego e as
demandas e debates colocados ao Serviço Social na atual conjuntura.
3.1 – A REALIDADE SOCIAL BRASILEIRA NOS ANOS 90:
No caso brasileiro, após uma década de inflação alta e baixo crescimento
econômico, o governo conseguiu a estabilidade monetária(a partir de 1994), mas o
custo social desta medida vem sendo sentido no em toda sociedade. Para ilustrar
o caso do Brasil, país com 156.3000 habitantes1 o Banco Mundial coloca que, em
1989, 40,9% da população vivia em situação de pobreza, com renda per capta
mensal inferior a US$ 60. O Governo brasileiro coloca que 27% da população está
em situação de pobreza, ou seja 39 milhões de pessoas. O volume de pobres na
América Latina, segundo dados do Banco Mundial e da CEPAL, também tem
crescido nas últimas décadas.2
1 Dados do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – 1992. 2 Ver WORLD DEVELOPMENTE REPORT, 1997, publicações de Bernardo Kliksberg – coord. Do Instituto Interamericano para o Desenvolvimento Social / BID.
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No Brasil as características gerais da pobreza são: maior incidência na
zona rural, embora 75% da população seja urbana, 45,7% dos municípios são de
pequeno porte (até 10 mil habitantes); grandes diferenças regionais – o nordeste é
a região mais pobres, embora nas demais regiões também se registre número
considerável de pobres.
A mortalidade infantil, embora decrescente na última década, em 1990
ainda registrou os seguintes números por mil nascidos vivos: Região Norte: 53,2;
Nordeste: 88,2, Sudeste: 30,0; Sul:26,7; Centro -oeste: 33,0.
Quanto ao perfil epidemiológico, convivem doenças infecto-contagiosas,
colocadas como doenças da pobreza, e, doenças crônico-degenerativas
decorrentes do envelhecimento da população, já que a expectativa de vida em
1990 era de 65 anos.
Calcula -se que existem 20,2 milhões de analfabetos com dez ou mais anos
de idade e, 16,9% das crianças entre 10 e 14 anos já trabalham. A concentração
de renda, em 1990 - dados do IBGE, os 10% mais ricos ficavam com 48,1% da
renda total, os 1% mais ricos com 13,9% do total das rendas, os 10% mais pobres
com apenas 0,8% da renda total e os 50% mais pobres com apenas 12,1 da renda
total.
O próprio governo colocou na Reunião de Copenhague, em 1995, que o
desafio do país é encontrar um modelo de crescimento econômico que permita a
conciliação do imperativo de modernização da economia com a redução das
disparidades regionais e sociais. Esperar que o mercado resolva o problema do
desenvolvimento social num país com enormes diferenças sociais e regionais é
negar o papel central do Estado enquanto promotor de políticas sociais. Neste
sentido se coloca a necessidade de repensar a ação do Estado como elemento de
regulação social e redistribuição de rendas. Poís, o próprio conceito de nação só
pode ser mantido quando há uma perspectiva de integração social, política e
econômica. Assim, num país com graves desigualdades sociais e regionais, o
Estado ainda deve ser o agente articulador de um projeto de desenvolvimento
econômico-social.
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O governo Fernando Henrique Cardoso coloca que a reforma do Estado
deve ser pensada a partir da mudança de suas funções, ele deixa de ser
responsável pela execução do desenvolvimento econômico e social para ser o
regulador do processo de desenvolvimento. O tom privatizante fica expresso
quando o governo coloca que reformar o Estado significa transferir para o setor
privado as atividades que podem ser controladas pelo mercado. Na área social o
governo delega para a sociedade civil e mercado as ações de educação, cultura,
saúde, tecnologia, pesquisa científica, entendendo que o Estado tem a tarefa de
subsidiar estes setores. O discurso da reforma do Estado esta impregnado pela
veiculação dos valores de eficiência e modernidade, embora isso não tenha
efetividade na alteração do quadro social do país, durante o governo FHC.
Na análise sobre os gastos sociais do Brasil, o Banco Mundial em 1988,
declarou que a população mais pobre é a que menos recebe benefícios diretos e
que o atendimento à pobreza tem um caráter emergencial e descontínuo.
A Constituição Federal Brasileira de 1988 criou uma série de direitos
sociais. Com a crise financeira do Estado, embora tenhamos conseguidos os
direitos constitucionais, a grande tarefa do atual governo é propor a reforma do
Estado e o corte dos gastos sociais. A reforma administrativa, já aprovada pelo
Congresso, muda as regras do funcionalismo público, cujo centro é a quebra da
estabilidade e da isonomia salarial dos funcionários públicos, além de possibilitar
ao Estado estabelecer contratos de gestão com o setor privado para a oferta de
serviços sociais. Está em andamento um processo de redução do Estado na área
social. A proposta de publicização é a transferência dos serviços sociais públicos
para a esfera privada, feito a partir de um contrato de gestão, onde o Estado
repassa verba do orçamento para uma instituição pública-não-estatal. O Estado
subsidia os serviços mas não é o responsável pela sua operacionalização. Todo o
discurso do governo coloca que o programa de publicização busca dar mais
autonomia a agilidade para os serviços públicos, e que não é uma privatização já
que as organizações sociais prestadoras dos serviços não podem ser lucrativas.
Porém, para a população usuária será uma mudança privatizante pois os
prestadores de serviços poderão cobrar por eles e, ainda receberão subsídios do
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poder público e receberão em cessão precária os bens e patrimônio público. Os
funcionários públi cos ficarão à disposição das organizações sociais e passarão a
fazer parte do setor privado. O único vínculo dessas Organizações Sociais com o
Estado será o Contrato de Gestão, porém não há como estabelecer que os
recursos para a área social serão mantidos em caráter permanente.
O número de funcionários públicos no Brasil não é grande se comparado a
outros países3. Há no Brasil um funcionário público para cada 157 habitantes. Nos
Estados Unidos, a relação é de 01 funcionário para 86 habitantes. Na França, há
um funcionário para cada 22 habitantes.
A atuação do governo Fernando Henrique Cardoso na área social tem sido
realizada através do Comunidade Solidária, um programa com claro tom
filantrópico, coordenado pela Primeira Dama – Rute Cardoso, que atua com um
Conselho de Notáveis, segundo os critérios da Presidência da República e, não
tem dotação orçamentária própria, mas faz articulações com os Ministérios criando
um sistema de prioridades sociais, definindo regiões onde se deve investir. Este
programa é contrário as normas Constitucionais que criou a Lei Orgânica da
Assistência Social – com um Conselho representativo da sociedade civil e com
fundo para investimento social.
A proposta de reforma da previdência social coloca mudanças sobre o
tempo de trabalho e idade mínima para aposentar, criando maior espaço para a
previdência privada e procurando criar um sistema de capitalização onde se
passaria a ter um total de 20 bilhões anuais como recursos para financiar o capital
industrial e o mercado de capitais.
A estabilidade econômica tem sido mantida através da centralização de
recursos na União, negando o princípio de descentralização/municipalização dado
na Constituição Federal. O governo diminuiu o repasse de verbas para os Estados
e Municípios, embora tenha repassado a responsabilidade pelos serviços sociais
na área da educação e saúde.
A estabilidade monetária tem agravado a situação do desemprego, pois
para atrair capital externo, tem que manter juros altos, o que eleva a dívida
3 Dados divulgados pela imprensa nacional – revista VEJA de 05.02.97 pg.39.
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pública, cria obstáculos ao crescimento econômico. O processo de privatização
tem servido para atrair capital externo, beneficiando o grande capital que tem
investido na compra de setores rentáveis. Os recursos obtidos com as
privatizações não foram canalizados para promover investimentos sociais e sim,
para pagar juros da dívida externa, voltando dessa forma para o setor financeiro
internacional e empobrecendo ainda mais o país. O governo coloca que o setor
informal cresceu no país devido o aumento dos encargos trabalhistas criados pela
Constituição de 1988, e como medida para beneficiar o crescimento econômico
propõe a desregulamentação do mercado de trabalho.
Pelas declarações do governo, a Constituição de 1988 seria um dos fatores
determinantes da falta de capacidade da economia gerar novos empregos, já que
o custo dos encargos sociais foi elevado. Neste raciocínio, que vale para alguns
setores das pequenas e micro-empresas, corroboraríamos para o
desmantelamento do mercado de trabalho, das normas e regulamentações que
limitam a exploração da força de trabalho. O mercado de trabalho nunca foi
homogêneo na sociedade capitalista. As diferenças entre os trabalhadores das
grandes empresas e os trabalhadores do setor competitivo sempre foram
colocadas pelo discurso de direita como pontos de coorporativismo dos setores
organizados das classes trabalhadoras. A lógica de destruição dos direitos
trabalhistas sempre buscou nas diferenças entre os setores do mercado de
trabalho colocar a oposição do trabalhador com sua própria classe, acusando de
privilegiados aqueles que são cobertos pelos direitos trabalhistas.
No Brasil, nas últimas década, mudou a composição setorial do emprego,
crescendo o emprego no setor terciário. A área de serviços exige maior
qualificação da mão de obra, o domínio de novas tecnologias, língua estrangeira e
nível cultural geral mais elevado. Na capacidade de geração de empregos os
setores mais afetados foram: financeiro e o industrial. Os dados da Confederação
Nacional da Industria revela que apenas 40% da força de trabalho industrial possui
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o curso primário completo, 30% são analfabetos e 30% possui alguma instrução,
mas não é capaz de interpretar manuais de trabalho.4
Outro ponto da força de trabalho no Brasil é a diferença de gênero, a
remuneração da força de trabalho feminina é inferior a masculina, sendo que no
nordeste 72,5% das mulheres ganham até 2 salários mínimos (130,00 reais) e na
região sudeste 59% das mulheres ocupadas ganham até 2 salários mínimos.
O processo de privatização também tem favorecido a diminuição de postos
de trabalho. O governo acredita que os 600.000 postos de trabalho eliminados nos
últimos anos do setor público voltarão a crescer no setor privado. Os dados
comprovam que o Plano de Estabilidade Monetária tem sido ineficiente para
ampliar o mercado de trabalho no Brasil, ao contrário, tem aumentado o
desemprego, embora o fluxo de capital externo tenha aumentado nos últimos
anos5. Assim, temos duas hipótese para explicar essa conjuntura: a primeira é que
os capitais externos viriam para o Brasil como investimento de curto prazo, com
caráter de especulação, sendo pouco efetivo na geração de empregos. A
segunda, seria devido as transformações do mundo do trabalho, levando ao
desemprego tecnológico – essa hipótese pode ser comprovada no setor
financeiro, onde, apesar de diminuição dos postos de trabalho se elevou a
participação deste setor na renda nacional, com superávits positivos para o setor
bancário.
As hipótese acima citadas não são excludentes, embora o peso da
especulação financeira seja evidenciada pela alta das taxas de juros e a
dificuldade em reduzir os déficits fiscal do governo. Nas área de modernização
tecnológicas, houve redução de postos de trabalho, combinado com a abertura
comercial, aumentando as importações, facilitadas pelo câmbio valorizado, que
penaliza os setores produtivos do país e dificulta as exportações. Essa política
econômica dificulta o crescimento econômico e a geração de empregos nos país,
4 Dados apresentados pelo governo brasileiro na Cúpula Mundial para o desenvolvimento Social – Copenhague, 1995. 5 Dados da revista América Economia, out/97, colocam que o fluxo líquido de capital externo privado para o Brasil em US$ milhões foram: 2,5 em 1991, 9,1 em 1992, 9,9 em 1993, 9,1 em 1994, 31,8 em 1995 e 35,4 em 1996.
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penalizando as classes trabalhadoras e o setor das pequenas e médias empresas,
expostas a uma concorrência muito intensiva com os produtos importados.
Embora o processo de estabilidade monetária tenha sido um fator positivo
para o país, ainda não se mostrou suficiente para alterar o quadro social e
combater a pobreza.
3.2 – OS DESAFIOS PARA O TRABALHADOR SOCIAL:
E dentro desta conjuntura histórica, como fica o trabalhador social? O
Serviço Social na América Latina encontra-se frente a um duplo desafio:
- o primeiro deles é: Como articular bases de organização popular para a defesa
dos direitos sociais? A dificuldade de ampliar as políticas públicas neste
contexto de cortes de recursos e queda dos investimentos na área social. A
reforma do Estado colocada nos países periféricos tem evidenciado que os
cortes de gastos sociais, tem aumentado as dificuldades na implementação de
políticas públicas voltadas para a redução da pobreza.
- o segundo: a discussão interna da profissão – a formação profissional. A base
teórico-metodológica de interpretação da realidade social num contexto mais
amplo e complexo dado pela globalização, o repensar de seus aportes técnicos
instrumentais, o fazer do serviço social num mundo mais competitivo e com
novas exigências e meios de trabalho. A própria operacionalização da rede de
serviços sociais, públicos e privados, dentro de patamares de qualidade e
eficiência, a exigência de criatividade na proposição de políticas e programas
sociais . Os aportes teóricos para o serviço social compreender e atuar na
realidade social, mantendo os avanços que a reconceituação colocou nos anos
70/80 e ampliando o debate para a conjuntura atual. O desafio de repensar
qual o projeto político – profissional do Serviço Social para o século XXI.. A
esfera do mundo do trabalho do assistente social também mudou e exige
novas práticas de intervenção num contexto de queda de recursos para a área
social.
Com referência ao primeiro desafio, a luta pelas políticas públicas de
assistência social, no caso brasileiro, tem sido levada adiante na década de 1990,
com a pressão que as entidades representativas da profissão fazem junto ao
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governo, primeiro na implantação da Lei Orgânica da Assistência Social (1993) e
agora na busca de manter os recursos para a assistência social. A busca de fazer
da assistência social uma política pública efetiva, voltada para a redução da
pobreza, desvinculada do uso político-eleitoreiro da assistência.
O Estado brasileiro historicamente subordinou a política social aos ditames
da política econômica, mantendo uma estrutura social desigual, onde o
atendimento das questões sociais sempre foi residual e fragmentado.
Desta forma criar uma cultura de direitos sociais, de inclusão social é um
desafio para os trabalhadores sociais, o que pressupõe a criação de uma base de
recursos estáveis para o financiamento da área social. Sem uma reforma
tributária, o Brasil não encontrará solução para o problema fiscal. Sem um projeto
de desenvolvimento econômico-social não há como criar bases de criação de
empregos. A proposta de privatização, abertura econômica e redução do Estado
não tem evidenciado ser fator positivo na criação de empregos e diminuição das
desigualdades sociais. Os países latinoamericanos devem buscar autonomia na
elaboração de seus projetos de desenvolvimento econômico social. A simples
atração de capital externo, feito à base de juros altos, tem sido perversa para a
população trabalhadora e criado um clima de instabilidade social.
Certamente o Estado forte de que uma sociedade democrática necessita,
dentro duma perspectiva progressista, está relacionado com o grau de intervenção
que este Estado possa ter na regulação das desigualdades sociais. Os dados
sobre a qualidade de vida de um país são os melhores indicadores de seu
desenvolvimento e modernidade. O acesso aos serviços públicos interfere na
qualidade de vida da população. Desta forma, urge criar no Brasil, uma cultura
voltada para a eficiência e qualidade dos serviços públicos. Elevar a qualidade dos
serviços públicos significa atender as demandas colocadas pela sociedade ao
Estado. Podemos discutir se o Estado é o melhor executor dos serviços sociais ou
não, o que não podemos abrir mão é do caráter de obrigatoriedade da ação
pública estatal frente as necessidades e os direitos sociais da população.
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Um Estado eficiente, ágil e dinâmico, tem que estar livre das corrupções e
abusos do poder público. Assim, um aspecto central na reforma do Estado é criar
os mecanismos de controle social.
A elevação da eficiência do setor público passa por uma alteração dos níveis
de sobrevivência da população trabalhadora do país, e isso não ocorre sem um
processo interno de redistribuição de rendas. O mercado de trabalho no Brasil,
acusado de excesso de regulamentações, á na verdade um mercado de trabalho
extremamente desregulamentado se formos cobrar a eficiência da fiscalização dos
abusos do trabalho infantil, o trabalho em condições insalubres e a falta de registro
em carterira da previdência social, dentro do grande território nacional. Sem
fiscalização e sem acabar com a impunidade o país não poderá melhorar seu
quadro social e o cumprimento das leis trabalhistas.
Se a estabilidade econômica é um ganho do governo atual, precisamos
avançar na diminuição das desigualdades sociais, este é o grande desafio para o
Brasil e para toda a América Latina.
Quanto ao segundo desafio – a formação profissional, no Brasil a ABESS –
Associação Brasileira de Ensino de Serviço Social, aprovou em 1996 novas
diretrizes para o currículo do curso de serviço social, as quais ainda estão
tramitando pelo Ministério da Educação e Cultura – MEC. A proposta da ABESS é
colocar a questão social como eixo do currículo, apreendida em seu processo
histórico, através de uma perspectiva teórico-metodológica crítica.
A formação profissional deve criar capacidades teórico-metodológicas e
ético-políticas. O fazer do trabalhador social também está sendo redefinido pela
própria complexidade social. Os desafios na implementação de programas sociais
eficientes, utilizando-se de novos aportes tecnológicos, pressupõe que a formação
profissional seja dinâmica.
O mercado de trabalho tem criado uma nova realidade para o trabalhador
social. A exigência de novas habilidades, de visão estratégica e capacidade de
criar sinergias dentro da atuação profissional. Ao mesmo tempo que se contrapõe
a insegurança no mundo do trabalho se cria cada vez mais o trabalhador liberal,
um prestador de serviços. Na área privada, a exigência de padrões de qualidade
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tem sido colocada ao trabalhador social em duas óticas: a qualidade de seu
trabalho – eficiência e eficácia de suas ações; e a qualidade de vida dos usuários
de sua ação profissional. Trabalhar com a instabilidade social criada pela paranóia
do mundo globalizado, pressupõe resgatar o indivíduo em suas diferentes
relações sociais. Os impactos deste conturbado período histórico na vida das
pessoas, na organização das famílias e na sociedade como um todo tem feito
aumentar a violência, solidão e a angústia. Criar espaços para encontros
humanos, para humanizar as relações sociais é um desafio deste tempo onde o
que impera é a lógica fria do mercado. Assim, o trabalhador social é requerido
como um interprete atuante neste mundo de relações sociais tensionadas pela
instabilidade globalizada.
Bibliografias:
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KEYNES, J.M.. Teoria Geral do emprego, do juro e do dinheiro. São Paulo. Abril
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