soraia diniz cordeiro as vozes do tempo: grande … · ainda que eu falasse a língua dos homens e...
TRANSCRIPT
UNIVERSIDDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE COMUNICAÇÃO, TURISMO E ARTES
DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO E TURISMO
SORAIA DINIZ CORDEIRO
As vozes do tempo: grande reportagem sobre a festa do mês mariano na cidade
de Manaíra - PB
João Pessoa, 2013
SORAIA DINIZ CORDEIRO
As vozes do tempo: grande reportagem sobre a festa do mês mariano na cidade
de Manaíra - PB
Grande Reportagem (Trabalho de
Conclusão de Curso) apresentada a
Universidade Federal da Paraíba
(UFPB) como requisito para
obtenção de Grau de curso de
Bacharelado em Comunicação
Social, com habilitação em
Jornalismo, sob orientação da Profª
Dª Joana Belarmino de Sousa
João Pessoa, 2013
SORAIA DINIZ CORDEIRO
As vozes do tempo: grande reportagem sobre a festa do mês mariano na cidade
de Manaíra
Banca examinadora:
Profª Drª Joana Belarmino de Sousa
Orientadora
Profª Ms. Sheila Mendes Accioly
Prfª Drª Suelly Maux
João Pessoa, ____ de ____________ 2013
AGRADECIMENTOS
Agradeço aos meus pais, pelo esforço que fizeram ao longo desses anos, para que eu pudesse
estudar em uma boa universidade.
A minha avó Ana Rodrigues Ferreira (in memória), que cuidou de mim e meus irmãos nos
primeiros anos aqui em João Pessoa.
Ao meu tio Dr. Davi Antas e Silva, que nos momentos que precisei socorreu-me, ao longo
desse curso.
A minha avó Maria das Neves Pereira e Silva, sem sua ajuda na reta final, teria sido muito
mais difícil.
A professora Drª Joana Belarmino de Sousa, que teve paciência comigo todo esse tempo em
que estive sob sua orientação.
A todos os professores que me ensinaram o que é jornalismo e ética na profissão.
A Pollyana, a senhora Maria da Luz e Martinho que me ajudaram na resolução de tantos
problemas de matrículas e laboratório.
A todos os meus colegas que conheci neste curso, em especial a Ana Carolina de Sá, Flávia
Lopes, Juliana Freire e Hedilberto Pessoa.
Ainda que eu falasse a língua dos homens e falasse a língua dos anjos, sem amor eu nada
seria,
Renato Russo
Resumo
Ao observar a carência, de registros sobre a cultura na cidade de Manaíra, houve a
necessidade de produzir uma grande reportagem que abordasse a temática do mês mariano.
Essa festa foi escolhida por ser a mais antiga do local. Representando, assim, parte da cultura
de um município pouco estudado. Trata-se de uma reportagem documental, construída através
da memória das pessoas da cidade. Trazendo os costumes e tradições, que poderão ser
conhecidos, assim, por futuras gerações.
Palavras-chave: grande reportagem, mês de maio, jornalismo cultural, festa mariana, Manaíra
Abstract
By observing the lack, of records on the culture of a news report Manaíra, there was the need
to produce a big report that addressed the thematic of the Marian month. This party was
chosen for being the oldest site. Thus, representing part of culture of a city not known. This is
a feature documentary, constructed through memory of the townspeople. Bringing the customs
and traditions, that can be known, so for future generations.
Keywords: big report, May, cultural journalism, Marian feast, Manaíra
SUMÁRIO
I Re latório de Pesquisa
I.1. Introdução
I.2. Justificativa
I.3 Da metodologia a fundamentação teórica
I.3.1 A metodologia
I.3.2 Fundamentação teórica
I.4. A reportagem documental
I.5. Considerações Finais
REFERÊNCIAS
II A Reportagem Documental
II.1. As Origens
II.2. A Festa
II.3. As Vozes do tempo
II.4. Despedidas
ANEXOS
I.1 Introdução
Neste trabalho, realizo o resgate de memória cultural e religiosa da população manairense.
Hoje, a cidade conta com inúmeras festas, mas, a festa de maio, dedicada a Santa Maria, foi a
primeira a ser comemorada neste lugar.
O município fica a 421 Km da capital do Estado, no alto sertão paraibano. Com uma área
de aproximadamente 352.570 Km². Com altitude de 760 m acima do nível do mar,
proporciona clima ameno em boa parte do ano, com temperatura média de 26 ºc.
Os seus limites são: ao norte – Curral Velho - oeste – Santana de Mangueira - a leste –
São José de Princesa e Princesa Isabel - ao sul Santa Cruz da Baixa Verde no Pernambuco. A
população atual, segundo o IBGE de 2010, é de 10.759 pessoas, sendo que destas, 10.009 se
declaram católicos.
Dentre as festas comemoradas atualmente estão o Carnaval, “Festa do mês Mariano”,
Pentecostes, São João, Padroeira Nossa Senhora das Dores e o aniversário de emancipação do
município.
A reportagem se constituirá a partir da captura das lembranças das pessoas locais, sobre a
“Festa do mês Mariano”, como é conhecida. Em um diálogo aberto, deixo as personagens
falarem de modo coloquial, suas recordações, junto com as impressões sobre mudanças
ocorridas nos dias atuais.
Manaíra é uma cidade pequena, mas carrega em sua história marcas de um dos
momentos mais relevantes da história paraibana, a Revolução de 30, que deixou marcas nessa
população, desde aqueles que viveram no período citado até gerações posteriores. Essas
marcas podem ser recordadas através da destruição que o povoado sofreu, levando anos para
se reconstituir.
O povo de Manaíra sobrevive bravamente a seca como todo sertanejo, e, desde o tempo
em que esta cidade não passava de um pequeno vilarejo pertencente a Princesa Isabel, quando
ainda se chamava Alagoa Nova, o povo comemora “Festa do mês Mariano” também
conhecida como a “Festa de Maio”.
Em minhas observações, constatei que desde o início do século XX, já se tem registros da
festa no povoado, durante várias décadas essa foi a única festa que ocorrera no local, sendo
apenas por ocasião da mesma que as pessoas se reuniam em grande número durante todo o
ano.
Da segunda metade do século XX em diante, foram surgindo mais comemorações,
algumas de pouquíssima duração que se perderam ao longo do tempo. Mas nenhuma outra
representa tanto as raízes culturais da cidade quanto a “Festa do mês Mariano”.
Por esse motivo, eu a escolhi para representar a alegria, a cultura, a religiosidade, de um
povo desconhecido dos registros e documentos, dos quais se faz necessária sua apresentação e
familiaridade para que outras culturas e outras gerações tenham conhecimento de um povo
alegre e vivo.
I.2 Justificativa
O intuito desta reportagem é de resgatar a memória cultural da festa Mariana, na cidade de
Manaíra, Paraíba, avaliar o presente da primeira festividade do município. Onde, nela se
encontra a raiz cultural da cidade. Para tanto, foram realizadas entrevistas com pessoas de
várias faixas etárias e gêneros, comparando costumes do passado com as práticas atuais.
A necessidade desse resgate, se deu pela total ausência desse tipo de registro, no
município. Nenhum arquivo, publicação, enfim, tudo o que se sabe da cultura manairense é
transmitida oralmente. Por isso, a ideia deste trabalho, de registrar a memória cultural do
município.
O trabalho contribuirá com o debate sobre o Jornalismo Cultural na Paraíba, além de
gerar registro de uma cultura popular que corre risco de desaparecer, pelo menos da forma
que foi criada no início do Século XX e, mantida até meados dos anos 80.
A partir da Grande Reportagem, será possível apresentar um pequeno pedaço da Paraíba
aos paraibanos. Com esta pesquisa, da maneira que foi concebida, permitirá ao leitor
familiarizar-se um pouco com a cidade e com o seu povo, conhecendo, assim, a alegria
sertaneja.
A opção por trabalhar com o gênero grande reportagem, se deve as possibilidades que o
mesmo abrange “Sempre ilustrada com fotografias, desenhos ou gráficos, a grande
reportagem exige diagramação competente e deve conter atrativos como mistério, suspense,
calor humano e outros elementos que só um texto criativo será capaz de explorar (FLOSI,
2012, p. 11)”. Desta maneira, foi possível criar um texto narrativo, colocando-me como
personagem e, onde as personagens tem liberdade para se expressar, também, desta maneira.
Manter uma memória de forma documentada, pois, isso se faz necessário para cidade.
Assim, as próximas gerações terão acesso a esse conhecimento que pode perder-se com o
tempo.
Por isso, a prioridade deste trabalho se dá na parte profana da festa. Discorrendo, assim,
dos hábitos culturais locais desde os primórdios da festa aos dias atuais.
I.3 Da metodologia e fundamentação teórica
I.3.1. A metodologia
A metodologia utilizada para realizar a grande reportagem, partiu da pesquisa
documental, em jornais, senso do IBGE de 2010, prefeitura municipal de Manaíra, Fundação
Antônio Antas Diniz (FAAD) e entrevistas abertas. Sendo as entrevistas o principal foco do
trabalho, diante da inexistência de registros sobre o tema abordado.
Os documentos encontrados contribuem basicamente com informações sobre a cidade
como o IBGE e a Fundação Antônio Antas Diniz (FAAD). Na prefeitura municipal de
Manaíra, encontrei a Lei que declara o dia 31 de maio, feriado municipal, este é o único
documento que trata do assunto.
O trabalho foi realizado em duas semanas, do dia 19 de maio ao dia 31 de maio de
2013. As entrevistas foram todas realizadas em áudio. As novenas registradas com
fotografias.
Também foram adquiridas fotografias de arquivos pessoais da população. Para que
dessa maneira o trabalho contasse com imagens de mais de 60 anos atrás.
Nas entrevistas, privilegiou-se sobretudo as pessoas mais idosas, pelo fato das mesmas
terem vivido a “festa do Mês mariano” em todo o seu apogeu, quando eram ainda crianças e
por agora estarem conhecendo as mudanças e o próprio declínio da festa.
A pesquisa documental iniciou-se no mês de janeiro o museu da cidade e tomamos
contato com a obra de Vanderly Antônio Diniz, retratando a história de Manaíra, sua lenda e
seus acontecimentos políticos e geconômicos.
Neste trabalho foram utilizados equipamentos como, gravador de aúdio,
computadores, máquina fográfica, o microssoft word 2003. A reportagem não passou por
nenhum processo de editoração gráfica, optamos por apresentá-la em documento normal do
word, devido ao curto tempo entre a sua confecção do trabalho e a sua defesa.
I.3.2 A fundamentação teórica
O jornal, nestes últimos anos, vem sofrendo bruscas mudanças, devido às novas
tecnologias. O jornalista está sempre se reformulando para atender as exigências do mercado,
que mudam, diminuindo seu espaço. Hoje em dia, é cada vez mais raro encontrarmos grandes
reportagens publicadas em jornais. Apenas jornais de grande porte, ainda investem neste tipo
de matéria.
A época de ouro da grande reportagem durou 20 anos, de 1960 a
1980, florescendo no período o jornalismo literário, técnica de
escrever reportagem com recursos literários, sem, contudo, resolver a
ficção. O jornalismo literário só pode ser praticado na grande
reportagem, que exige tempo e dinheiro para ser produzida, além de
texto diferenciado, que também custa caro.( FLOSI, Edison, 2012, p.
11)
O jornalismo cultural, hoje se apresenta de maneira bem diferente de seu auge. Com
base no jornalismo literário, que expandia o texto quantitativamente e qualitativamente. O
texto que permitia ao jornalista uma grande riqueza de informações, sem se preocupar com
normas de mercado tão enxuto como os dias atuais.
...que Décio de Almeida Prado resumia da seguinte maneira: “não
exigimos que ninguém desça até se pôr à altura do chamado leitor
comum, eufemismo que esconde geralmente a pessoa sem interesse
real pela arte e pelo pensamento. (...) uma publicação que se intitula
literária nunca poderá transigir com a preguiça mental, com a
incapacidade de pensar, devendo a partir, ao contrário, do princípio de
que não há vida intelectual sem um mínimo de esforço e disciplina –
esforço esse, por sinal que não reduz e sim intensifica o prazer. (PIZA,
2011, p.37)
Essa forma de pensar foi o que construiu os 20 anos de glória do jornalismo cultural
brasileiro, entre 1960 e 1980. Apesar das alterações sofridas, com o tempo, esse tipo de
jornalismo se mantem vivo. E continua sendo o caderno mais lido dos jornais que e revistas
que dispõe de bons textos.
Nesse sentido, para a realização deste trabalho, foram utilizados livros, revistas e
documentos fundamentais como aportes teóricos, os quais nos auxiliaram nas definições e
diferenciações sobre reportagem e entrevista.
A rigor, entrevista significa um diálogo entre olho no olho, feito
ente as vistas dos interlocutores. Com o desenvolvimento da
comunicação a distância, o vocábulo perdeu parte de sua acepção
original. Hoje, “entrevistas” são feitas sem esse contato face a
face, pelo telefone, por rádio e até por e-mail e fax. (BELO, 2006,
p.101)
Na reportagem apresentada neste trabalho, a entrevista foi realizada de maneira
original, isto é, olho no olho. Por se tratar de uma grande reportagem, de caráter documental,
sobre uma cultura. Ainda viva, mas constante modificação, o seu passado se faz presente
apenas de forma oral.
Em determinadas reportagens de caráter mais documental, a
entrevista pode não ser a origem principal das informações mas
continua relevante. Um personagem da história uma testemunha dos
fatos ou um especialista no assunto podem dar uma interpretação mais
vívida que o registro documental puro e simples. (BELO, 2006, p.101)
A grande reportagem se destaca, por possibilitar ao jornalista trazer mais informações
ao leitor. Sobre todos os dados aos quais ele acredita ser relevante, de leitura mais agradável a
textos duros, piramidais diários. Dessa maneira esse tipo de abordagem nos traz uma visão
ampla do tema.
Nesse tipo de reportagem, a notícia revela o fato em sua totalidade,
identifica personagens, localiza geograficamente onde ocorrem ou
ainda estão acontecendo, descreve as suas circunstâncias, e os situa
num contexto histórico para dar-lhes perspectivas e noção da sua
amplitude e dos seus significados. (CURADO apud FERREIRA,
2010, p.35).
Os temas abordados pelas grandes reportagens são amplos. Eles podem se referir a
situações específicas do tema abordado. A amplitude de um assunto, por maior que seja, a
grande reportagem possibilitará observações destinadas da mesma situação.
Através da exploração multifacetada de casos específicos, a grande
reportagem aprofunda assuntos cotidianos tornando-os representativos
de acontecimentos mais amplos. (LOPES e SANTOS, 2008, p.18).
Em nosso trabalho as memórias específicas dos moradores de Manaíra foram o lugar
privilegiado de onde partimos para resgatar a hisória da “Festa do mês Mariano”.
I.4 Reportagem documental
A definição para reportagem documental nos mostra como é tênue a linha que há entre
a reportagem documental e a grande reportagem.
É o relato documentado, que possui declarações que ajudam a
esclarecer o assunto discutido. Por aproximar-se da pesquisa, este tipo
de reportagem assume características de cunho pedagógico. Bastante
comum no jornalismo impresso, é utilizado também na televisão e no
cinema. (FERRARI e SODRÉ, 1986).
Confrontando definições anteriores sobre uma grande reportagem, podemos perceber
suas diferenças e suas semelhanças com o documentário propriamente dito. Nessas
circunstâncias temos o documentário, como um produto mais “seco”, mais direto. A grande
reportagem nos permite, de diversas maneiras, enriquecer o texto, com detalhes que só um
bom observador pode colocar. Trazendo para o leitor os detalhes que o documentário, por sua
vez, pode deixar de lado.
A grande reportagem, por permitir a utilização da forma narrativa da literatura,
possibilita informações como a geografia, os perfumes, as cores, o tempo ocorrido, sem ser
necessária a utilização de fatos inverídicos. Para tanto, basta uma um senso aguçado e,
disposição para se fazer presente no local da reportagem.
I.5 Considerações finais
Este resgate inédito da cultura deste lugar mostrou-se bastante instigante. Mas, como
trabalho científico foi sentido bastante dificuldade. Portanto, na total ausência de registros
escritos sobre o tema, a confirmação de informações e datas obtidas enfrentou sérias
dificuldades. O que reforça a importância deste trabalho, por se tratar de um resgate da
memória popular e de suas respectivas imagens que o tempo pode levar.
O único documento que cita a festa é a lei que regulamenta seu feriado. Além disso,
não foi encontrada nenhuma publicação em jornal ou periódico sobre o tema na fase de
prospecção do material de pesquisa. Uma extra dificuldade que me surpreendeu ainda mais
foi a ausência de qualquer tipo de registro por parte da igreja sobre as festas marianas na
paróquia do Divino Espírito Santo em Manaíra. Também não foram proveitosas as entrevistas
com jovens e párocos da cidade, os quais não ofereceram materiais extras ao trabalho
proposto.
Esta grande reportagem não conta com as fotografias dos entrevistados, pois nem
todos estavam de acordo em fotografar. Então, para que não houvesse desequilíbrio, não
foram colocadas as fotografias dos entrevistados que consentiram o registro fotográfico.
Espero que a partir desta reportagem sejam realizados outros trabalhos que registrarem a
cultura do local, dessa e de outras atividades, inclusive dando continuidade a esta pesquisa ou
abrindo novas perspectivas de estudo.
Infelizmente, antes da conclusão deste trabalho, o senhor Pedro fogueteiro faleceu, a
fotografia feita por mim, em sua residência em Princesa Isabel, talvez seja uma das últimas
imagens deste senhor, que há dois anos não tinha mais memória, devido a um acidente
vascular cerebral. Sendo assim, resgatar a memória dos que ainda estão entre nós é
fundamental para que o passado desse povo não se torne um ponto escuro na história em
breve.
REFERÊNCIAS
http://www.ibge.gov.br/cidadesat/xtras/uf.php?coduf=25&search=paraiba
BELO, Eduardo. Livro-reportagem. São Paulo: Editora Contexto, 2006. (Coleção
Comunicação)
DINIZ, Valdeny Antas. A história de Manaíra - De Alagoa Nova à Emancipação Política.
Paraíba. 2011.
FERREIRA, Brunella Menezes. Viagem pela grande reportagem televisiva o desafio do
telejornalismo brasileiro da Rede Globo do Brasil. 2010. Dissertação (Mestrado de
comunicação) – Universidade Fernando Pessoa, Porto.
FLOSI, Edson. Por trás da notícia - o processo de criação das grandes reportagens. São
Paulo: Summus editorial, 2012.
LOPES, Juliana Sampaio; SANTOS, Luana Assiz. Petróleo verde na Bahia. 2008. Memória
(Graduação em Comunicação) – Faculdade de comunicação na Bahia.
PIZA, Daniel. Jornalismo Cultural. 4. ed. São Paulo: Editora Contexto, 2011, (Coleção
Comunicação)
SODRÉ, Muniz; FERRARI, Maria Helena Ferrari. Técnica de reportagem: notas sobre a
narrativa jornalística. São Paulo: Summus editorial, 1986. Novas buscas em comunicação; v.
14.
As vozes do tempo: grande reportagem sobre a festa do mês mariano na
cidade de Manaíra - PB
As origens
A índia Sucurú da tribo dos Cariris, Manaíra, conheceu um índio jovem da tribo dos
Oitis. O rapaz, encantado pela moça, pediu a moça ao seu pai, o cacique Itaporanga, que
negou o pedido, porque, Manaíra era prometida ao cacique da tribo Coremas, o índio Piancó.
Os jovens apaixonados decidiram fugir juntos para a tribo dos Oitis. O pai da moça e
seus guerreiros perseguiam os jovens desde os rios Taperuá e Timbaúba até uma região
conhecida hoje como sítio da Salgada, em Manaíra, onde ocorreu uma batalha pela vida dos
jovens. O cacique dos Oitis, pai do rapaz, reuniu seus guerreiros e foi ao socorro do filho,
mas, estavam despreparados e perderam a guerra. Manaíra e o jovem guerreiro morreram
queimados, por Itaporanga, pela honra de Piancó, unidos por uma mesma corda.
Esta lenda contada pelo historiador Coriolano de Medeiros em uma “Novella
Histórica”, intitulada “Manaíra”, da editora Companhia Melhoramentos, de São Paulo no ano
de 1936, alcançou tanto sucesso na época que, interferiu na escolha do nome do local. Em
1938, Alagoa Nova elevou-se ao patamar de vila, e mudou seu o nome para Manaíra, em
português, “mel cheiroso”.
O senhor Manoel Pereira da Silva é considerado o fundador de Alagoa Nova. Tropeiro
de Goiana, Pernambuco, chegou a fazenda em meados de 1840. Casou-se com a herdeira,
Antônia Ferreira, filha do sesmeiro Joaquim Ferreira. A família Ferreira ficou marcada na
história, também, pelas irmãs Balbina e Catarina que doaram o terreno para a construção da
primeira capela do local.
As sesmarias que constituíam o município eram: Alagoa Nova (1770) de propriedade
de José das Neves e Joaquim Ferreira; Belém (1787) ocupada por Manoel de Souza Barbosa;
Riacho da Onça (1792) de Sebastião Araújo da Silva; a Serrinha, o Oiti e a Balança (1815)
ficou com José dos Santos da Silva; por fim Riacho do Meio (1818) foi concedida a José
Bizerra Leite.
O historiador Coriolano de Medeiros em 1950 publicou o seu segundo Dicionário
Coreográfico da Paraíba, através do Departamento de Imprensa Nacional. Que descreve
Manaíra da seguinte maneira:
“Manaíra (Voc. ind., maná-eira: mel cheiroso) – Antiga Alagoa Nova. Pertence ao município
de Princesa Isabel. O Decreto-lei n.º 1 164, de 15 de novembro de 1938, mudou-lhe o antigo
nome e deu-lhe categoria de vila. Está situada numa planície, à margem de uma lagoa que se
formou ao pé de um contraforte da Borborema chamado Serrinha. Fica mais próxima da
cidade Triunfo, do Estado de Pernambuco, do que da sede, distante 21 quilômetros, tendo
entre ambas uma estrada carroçável (estrada que passa pelos Patos – São Jopsé). Conta uma
igreja, 10 casas comerciais, uma aula pública primária, que, em 1942, matriculou 51 alunos.
Aos domingos realiza feira animada. O distrito é mais agrícola do que pastoril, e cortado
pelo riacho Freguesia, que despeja suas águas no Piancó. A 15 quilômetros da vila, na
Alagoa do Serrote, faz-se exploração de cristal de rocha. História – A vila foi fundada por
Manuel Pereira da Silva, e ia prosperando. As lutas partidárias de 1930, entre políticos de
Princesa e o Estado, visaram a destruição de Manaíra. Ficaram em ruínas 286 prédios,
foram destruídas três instalações para beneficiar algodão, e extinguiu-se-lhe o movimento
comercial por alguns anos. Atualmente, está se reanimando, e é possível prosperar, pois o
distrito tem vida própria, possuindo riquezas naturais, que estão à espera de quem as
explorem. O Recenseamento de 1940 contou-lhe 90 prédios urbanos, 74 suburbanos, 1.308
rurais e a população: urbana 289 habitantes; suburbana, 305; rural, 5.338.” (MEDEIROS
apud Diniz, 2011, p. 4)”.
O historiador Coriolano de Medeiros é de suma importância, pois foi o único a escrever
sobre essa região naquela época. Mas, ele não foi o único a pisar naquelas terras. Segundo
dados recolhidos do livro de Valdeny Antas Diniz:“A HISTÓRIA DE MANAÍRA” - De
Alagoa Nova à Emancipação Política. Duas figuras emblemáticas da cultura nordestina
estiveram de passagem por Manaíra, Pe. Cícero Romão Batista e Virgulino Ferreira mais
conhecido por Lampião.
Pe. Cícero Romão Batista durante suas missões descansou à sombra de um juazeiro e
abençoou a terra. Em 1926 Virgulino Ferreira e seus homens se arrancharam na casa da
senhora Agda Vicente de Arruda, onde conseguiram cuscuz, rapadura e água e seguiram sua
viajem sem causar maiores transtornos.
Transtornos, o povo conheceu em 1930, com a Revolução. Alagoa Nova na época era
território de Princesa Isabel. Com o ataque do governo ao coronel José Pereira, logo, após este
coronel declarar território livre, sob jugo apenas do Governo Federal, resultou na defesa de
propriedades e de suas próprias vidas, por parte de simples agricultores.
No dia 22 de março de 1930, o comando militar paraibano subiu a serra do Pau
Ferrado. Nesse local, travou-se uma batalha que culminou na morte do primeiro manairense,
Silvino Cosme. Foi nessa batalha que o Sargento Clementino Quelé atacou o “Casarão de
Patos”, manteve sob cárcere entre outras pessoas, Alexandrina Diniz (também conhecida
como Dona Xandu) esposa do Coronel Marçal Florentino Diniz e Dona Mitonha esposa de
Luís do Triângulo.
Os civis indefesos como mulheres e crianças fugiram para não serem mortos pelas
forças policiais do governo, enquanto os homens enfrentaram em número inferior as forças do
Estado. Segundo o livro de Valdeny A. Diniz: “A HISTÓRIA DE MANAÍRA” - De Alagoa
Nova à Emancipação Política, somente em Alagoa Nova 286 prédios tornaram-se destroços,
três instalações para beneficiar algodão foram destruídas, causando a extinção do comércio
nos anos seguintes.
O povoado ergueu-se aos poucos. Em 1934, a Festa de Maio passou a atrair público
com suas apresentações do dia 31. Em 1938 o povoado é elevado a categoria de Vila e passa a
ser conhecido por Manaíra. Foram aproximadamente 20 anos, para que Manaíra voltasse ao
vigor anterior na questão de agricultura
A vila é emancipada, Manaíra ganha sua autonomia publicada no jornal A União do
dia 23 de dezembro de 1961. A emancipação de Manaíra ocorrera na capital, João Pessoa, no
dia 21 do mesmo mês. Estavam presentes o Governador do Estado da época, Pedro Gondim,
o Deputado, Nominando Diniz, o Prefeito de Princesa Isabel, Antônio Maia, de Manaíra
destacam-se a presença de Antônio Antas Diniz, Francisco Antas Cordeiro e Luiz Sousa
Primo, entre outros deputados e líderes políticos paraibanos.
Contudo, a origem de uma cidade é sempre contada a partir do ponto de vista político
e econômico. Mas, o que a torna viva são as pessoas que as constituem, mantendo-a,
construindo sobre essa terra os seus sonhos.
A Festa
No dia 19 de maio de 2013, às 17 horas, cheguei em Manaíra. Logo após acomodar-me,
saí pela rua, para ver as pessoas. No meu caminho, à frente, o sol de um vermelho
incandescente, se escondia entre nuvens e serras. A paisagem se reconfigurava a cada minuto.
Entre uma distração e outra, ao cumprimentar um conhecido, eu perdia um quadro desenhado
pela natureza.
A noite foi dedicada a novena que, nesta data ocorrera na capela que eu ainda não
conhecia, a capela dedicada a Padre Cícero Romão. Pessoas de todas as idades lotavam o
local. Os retardatários pediam cadeiras emprestadas aos amigos que moravam ali perto.
Outros, que não tinham a mesma sorte, assistiam a novena em pé.
Para minha surpresa que em minha infância acompanhava com minha avó Ana Rodrigues
às novenas marianas, senti falta da procissão da Santa que vinha de uma casa até a igreja.
Fiquei sabendo que este ano, a santa peregrina estava visitando as residências dos sítios,
encerrando a visitação apenas na Festa de Nossa Senhora das Dores, em setembro. Também
observei outra novidade, esta era a semana dedicada ao culto de Nossa Senhora de Fátima,
fato novo na paróquia manairense.
Ao fim da novena, todos foram convidados a lanchar em uma mesa improvisada, na
varanda de uma casa ali perto. Era tudo bem simples, mas, quando cheguei, não tinha mais
nada, havia sido vendido tudo! Os fogos, disparados para comemorar este ano foram poucos,
houve campanha de doação. Encerrada a noite, as pessoas seguem em pequenos grupos de
familiares e amigos para suas casas, a grande maioria voltará a se encontrar no dia seguinte.
Algum tempo atrás, isso não acontecia, as pessoas seguiam para uma casa previamente
estabelecida. Carregavam a imagem de Nossa Senhora das Dores, em procissão, cantando
ladainhas, às vezes portando velas. Chegando na residência, havia um altar preparado com
velas e flores, em que era posta a santa. O grupo rezava o terço. Por fim, o dono da casa
oferecia um lanche às pessoas que rezavam. No dia seguinte, a família acolhedora, devolvia
para igreja a imagem, no momento da novena. Continuando, assim, o ciclo durante todo o
mês.
As noites em que a novena foi realizada na matriz, me fizeram recordar da época em que
minha mãe fazia uma “lanterna”, com uma vela envolta com papel crepom rosa para mim. Eu
seguia para igreja, de lá encontrava minha avó, Ana Rodrigues Ferreira, mais conhecida como
Anita Rosa, seguíamos pela procissão, cantando ladainhas e, essa era a mais constante:
Treze de Maio
A treze de maio na Cova da Iria
No céu aparece a Virgem Maria
Ave, ave, ave Maria
Ave, ave, ave Maria
Na manhã seguinte, eu saí em busca de mais informação. Fui conversando com as pessoas
que encontrei no caminho. Encontrei um jovem de 20 anos, contei sobre minha matéria, ele
me perguntou _ mas, tem festa em maio? _ porque este ano não houve música, então, ele não
atentou que este é um período de festas. Continuando o percurso, resolvi entrar na casa
paroquial, que fica na praça Padre Cícero, não havia nenhuma informação sequer de festas
anteriores. Mas, não foi em vão minha passagem, lá encontrei a programação deste ano.
Na mesma praça, fica o Museu de Manaíra, da Fundação Antônio Antas Diniz. No museu,
encontrei o Pequeno Resumo extraído da Obra de Valdeny Antas Diniz:“A HISTÓRIA DE
MANAÍRA” - De Alagoa Nova à Emancipação Política. Material que contribuiu bastante
com meu trabalho.
Com o passar do tempo, fui conversando com os amigos e familiares, sobre quem
poderia contribuir com o trabalho. As pessoas sempre dispostas, falavam o que sabiam.
Indicavam pessoas, que viveram o mês mariano e, lembravam bem de tempos passados. Os
meus dias passaram-se assim, durante as manhãs, eu conversava com as pessoas de várias
idades. A noite, participava das novenas, observando e registrando. Com isso, pude comparar
as mudanças do que eu ouvia pela manhã, das minhas lembranças e o que presenciava naquele
momento.
Eu encontrava os entrevistados, normalmente no horário da tarde. O senhor Cícero
Antas, eu o encontrei em sua casa. Fui recebida por Dona Salete, sua esposa, que me fez
aguardar na sala, enquanto ela o avisava da minha presença. Ao entrar na sala, ele logo
cumprimentou-me, eu expliquei o que queria saber e, ele de pronto contou suas recordações.
Já com o senhor Miguel Soares, me informaram que eu o encontraria sentado na
calçada de um bar, pela manhã, bar de um homem conhecido como “Pereira”. Marcamos a
entrevista para o mesmo dia, em sua residência, às 17 horas. Quando cheguei, ele aguardava-
me sentado no sofá observando a rua. Conversamos por mais de trinta minutos,
acompanhados de sua esposa bastante jovem. Apesar de seus 91 anos, ele demonstra ainda
bastante vitalidade física e mental, impressionantes para sua idade.
A advogada Maria das Graças Cabral concedeu uma entrevista em sua casa,
previamente agendada, ao fim de uma novena. Por se tratar de pessoa bem próxima a igreja,
aproveitei a oportunidade, para obter do ponto de vista, o lado religioso da festa.
O senhor Francisco Rodrigues, eu o encontrei à noite, em sua casa. Estava sentado na
calçada com os vizinhos, eu lhe pedi atenção e, ele não me negou. Contou-me tudo o que
lembrava, pois, do senhor Vicente era dos filhos mais jovens e morou fora por muito tempo.
Na noite da novena, realizadas no dia 31 de maio, não lembra em nada, tempos atrás.
Neste ano, apesar da matriz estar cheia, ao término da novena, em minutos a rua ficou deserta.
No início da década de 90, o parque vinha de fora, as pessoas enchiam a praça Padre Cícero
de alegria. As famílias circulando com os filhos, entre os brinquedos e os vendedores de
guloseimas como, maçã do amor, algodão doce, sorvete, etc. Os adultos bebiam em bares,
dançavam na festa organizada naquela noite, até este ano, nunca havia faltado música no dia
31 maio.
Figura 1: momento da coroação em 2013
Crédito: Soraia Diniz
O carrossel de Manoel Vicente de Almeida, conhecido por Mané Vicente, se fazia
presente toda a noite, era passagem obrigatória. Ele era diferente de tudo, o ritmo que girava,
as músicas que tocava. Apesar de pequena, eu lembro de houvir sempre música instrumental,
era apenas a sanfona, o som baixo da vitrola velha, às vezes mesmo tão perto, a música era
abafada pelo som do parque bem mais potente. A força motriz do brinquedo, era um senhor
de idade avançada e seu neto, que ainda criança, ajudava o avô. Espantava-me a força daquele
garoto, que tinha aproximadamente a mesma idade que a minha. O menino fazia girar aquele
brinquedo, com tantas crianças e, eu me perguntava “por que ele também não está
brincando?”
Havia dois momentos em comum para todas as idades. Um deles era quando o senhor
Pedro Raimundo de Souza, conhecido como Pedro Fogueteiro se apresentava, encantando a
homens, mulheres e crianças com suas girândolas. O outro momento, era quando soltavam os
balões. Lembro de Mané Vicente, soltando balões, ele soltava com alegria, mas, que não
durava muito. O prazer de alguns garotos travessos, era derrubar com estilingues os balões,
que caiam aos montes, após a chuva discreta de pedras.
Estas lembranças, naquela praça deserta, com algumas pessoas de passagem após a
novena, pareciam devaneios, todos indo muito apressados para suas casas, afinal não havia
nada para se ver. A segurança no interior não é mesma de outros tempos. É espantoso, o
número de pessoas assustadas e, que olham para o relógio, com medo.
Devido a Lei Federal, o lançamento de balões foi proibido. A Lei Nº 9.605, 12 de
fevereiro de 1998, veio por fim ao risco de queimadas que esses balões poderiam ocasionar.
Fazer e lançar balões eram um traço tão forte da festa quanto das crianças derrubá-los com
estilingue, logo após o lançamento fazendo com que eles caíssem em sua maioria próximo ao
local da festa. O que diminuía bastante o risco de incêndio, mas, não o impossibilitava.
Todos os anos, no dia 31 de maio havia música. Nas duas últimas décadas, os shows
eram em praça pública, patrocinados pela prefeitura. Este ano não ocorreu nenhuma
apresentação. Todos seguiram para suas casas. Eu vi apenas uma criança ainda vestida de
anjinho, sentada na porta de sua casa, com os pais, uma hora após a missa aproximadamente.
Nada lembra festas que seguiam até as três da manhã.
O que houve? Por mais que eu perguntasse, não sabiam, ou, me davam as justificativas
as mais diversas possíveis. Mas, a mais contundente, é a migração das comemorações para a
festa da padroeira em setembro. São apenas nove dias, com o ápice no dia 14 de setembro e
encerramento no dia 15.
O feriado municipal constituído diante da importância da festa, consta na Lei a seguir:
As vozes do tempo
Nestas poucas páginas, os manairenses contam suas memórias sobre a Festa do Mês de
Maio. As coisas que mais os marcaram e suas saudades.
O Senhor Miguel Soares Barbosa (Migué Peba) de 91 anos, nos conta como era a festa, no
tempo em que a cidade ainda era um povoado:
“A festa era boa! Aqui tinha só quatro casinhas. Mas, a festa era muito
falada, vinha gente de todo canto. Vinha padre de Triunfo, quando não, de
Princesa, para celebrar a missa. Era “a Festa de Alagoa Nova”, chamava de
Alagoa Nova naquele tempo. A festa daqui era o carrossel, que povo trazia de
fora, depois apareceu o de Severino Cosme, que eu ajudava carregando as
cadeiras. Os botecozinhos que tinham naquele tempo, eram feitos de folhas de
coqueiro.
Pra cá, vinha gente de Princesa, de Triunfo, nesse tempo só não vinha
gente de Serra porque era tempo de Lampião, era cangaceiro, o povo tinha medo
de vir pra’qui, mas a festa era boa.”
Migué Peba recorda-se também da cachaça:
“A produção de cachaça,daqui, era nos Patos de Irerê.Joaquim Antas era
quem produzia. Vinha em ancoreta, quando chegava aquiera engarrafada e
rotulada. Era um sacrifício, uma pobreza, mas, o povo era sabido naquele
tempo.Os comerciantes naquele tempo eram Antônio Antas, João Severo, Augusto
Toró e João Duarte.”
O senhor sabe quando começou a festa de maio, pergunto:
“O mês de maio, já tinha antes de eu nascer. Só tinha novena, as festas,
mesmo, só começou quando eu já era rapaz.”
Sobre a música Migué conta:
“Desde o começo, a banda Cabaçal sempre tocou. Mas, antes, no meu
tempo era valsa, marcha, chote e, depois de Luiz Gonzaga é que começou o
forró.”
Cícero Antas Filho, (Cíço Antas) de 63 anos, relembra os bailes do mês mariano:
“O baile da elite era o seguinte, o povo que tinha uma roupa, um paletó, uma
gravata, tinham um salão só pra eles. Os que não tinham o paletó e a gravata
funcionava num salão grande pra todo mundo. A gente chamava o “Pé de
Poeira”, era todo mundo o preto, o branco, o que não tinha paletó, o que só tinha
uma camisa, o que não tinha sapato, só tinha uma “alpercata” e fazia a festa.
Quem tinha uma condição melhor ia para o Clube. A gente chamava de Clube,
cabiam poucas pessoas, umas 50 pessoas, agora, onde era o Salão entrava todo
mundo. A diversão era feita por músicos como zabumbeiro, o sanfoneiro e o
pandeiro. Na elite, tinha a banda de Triunfo, tinha o sanfoneiro famoso que era
Duquinha. Tinha o conjunto bom, com vários cantores, com saxes, violonista. Era
no Clube que só entrava quem tivesse a gravata, quem não tivesse não entrava.”
Figura 4: Casal no Clube: Francisco Antas Cordeiro e Benícia Antas Diniz
Créditos: arquivo pessoal de Francisco Antas Cordeiro
“Tinha mesa para tomar uma cerveja, com a namorada, com esposa. Ali
bebia, ali dançava, só pegava a moça pra dançar quando o cara começava a
tocar. Naquele tempo, se tinha namorada você ficava pegado na mão da
namorada. Se não, ela ia sentava no canto dela. A moça voltava a sentar no
banco e, quando começava a tocar novamente. Agente chamava o “bis”, aiamos
até o banco chamava as moças que estavam sentadas, uma a uma, assim o
“caba”chegava ao fim da fila. Os que não sabiam dançar, sobravam (risos). Na
época os ritmos eram, o frevo, o forró, o samba, o bolero, eram essas coisas.”
O senhor Cícero Antas comenta sobre os melhores dançarinos do seu tempo:
“Das mulheres eram Joaninha de Fiel, dançava muito bem, Chicola irmã
dela, Marina de Dudu, Leonor Barbosa. Os homens Jurandir Silva, Migué Peba,
Adalberto Barbosa era o chefe, era quem organizava.”
Como eram organizadas as noites?
“Tinha a noite dos agricultores, das viúvas, eram chamados os
responsáveis de “Noiteiros”. Tinha a noite dos agricultores, dos sítios do Pau
Ferro, a noite do Bom Jesus, Constantino, da Vaca. A noite das viúvas que era
organizada por Joana Barros, Joana Mandú, Joana Rabêlo, Zefa Grande,
Tertuliana, Zefa Roque (parteira).”
A primeira dama da cidade de Manaíra em 1973, Gilda Medeiros de Sousa de 80 anos, esposa
do ex-prefeito Luiz de Sousa Primo (in memoria), comenta sobre atribuições da prefeitura e
seu ponto de vista particular:
Como a prefeitura contribuía para a festa na época de seu marido?
“Naquele tempo, quem pagava o sanfoneiro do Salão era prefeitura, toda
a vida a prefeitura pagava ele não ia tocar de graça.”
Quais as mudanças que ocorreram ao longo do tempo na festa?
“Foram muitas, os balões foram proibidos a bandinha não vem mais.”
Ao senhor Francisco Rodrigues Ferreira (Chico Rosa), de 70 anos, ex-vereador da cidade, nos
conta o que em sua juventude havia uma diversidade de bebidas:
“Tinha Cachaça Serra Grande, Pitu, Aliada, Sarinha depois surgiu a
Altiva, vodka, laranjada, Bacardi, Montilla, Gim.”
Chico Rosa, detalha quem eram os músicos que se apresentavam:
“Do sítio vinham os músicos Assenom e Ciço Martim, eram eles quem
tocavam no Salão. Quando se tratava do sanfoneiro Duquinha, só entrava
branco, não entrava preto. Mas, também Zé de Henrique “descontou” com o
“forró dos pretos”, brancos só do lado de fora. Era sempre no dia 13 maio e
durou até a década de 80.
Os pifeiros, sempre começava as cinco da matina. Eram dois tocando
pífano, um na zabumba, um na caixa e um no pandeiro. Eles passavam o dia
rodando a cidade comendo e bebendo, tocavam novamente meio dia e a noite.
Eles vinham poucas vezes, porque, não era todo mundo que podia pagar.”
Vicente Rosas: o rei da festa
Vicente Rodrigues Ferreira, Vicente Rosas, citado por todos os entrevistados como o melhor
noiteiro durante anos consecutivos. Enquanto ele participou da festa como organizador, não
teve quem tirasse seu posto.
Cícero Antas, narra o que lembra, das festas organizadas por Vicente Rosas:
“Vicente Rosas era um homem de uma certa condição financeira.
Separava uma noite só pra ele. Todo mundo dizia que era a melhor noite, porque
tinha muita bomba. Era umas bombas de quilo, que eu não sei onde mandava
fazer, bomba de tiro, era balão e fogos, nessa parte, ele era muito caprichoso.”
O senhor Francisco Rodrigues Ferreira (Chico Rosa), de 70 anos, filho de Vicente Rosas
conta como era organizada a festa:
“As noites eram organizadas de acordo com as posses. Quem tinha mais
condições financeiras, ficavam responsáveis pelas últimas noites. Pai, sempre foi
o responsável pela última noite. As festas, começavam no dia primeiro e ia até o
dia 31.
Às cinco da manhã, começava o foguetório e as bombas.Nós mesmos fazíamos os
balões e, as bombas era João Miranda.Vinham os fogueteiros, Pedro Fogueteiro,
Butuca, que possuíam mamulengos que funcionavam com pólvora.”
Chico Rosas explica porque Vicente tinha uma noite só pra ele:
Porque ele gostava muito de comemorar e, gastava muito, as pessoas não
queriam compartilhar com ele. Então, ele resolveu reservar uma noite só pra ele,
aí ele fazia do jeito que queria e podia.
O carrossel
Amigo pessoal de Manoel Vicente de Almeida, conhecido por Mané Vicente. O
senhor Cícero Antas, conta como foi a arrecadação de recursos para a construção deste
símbolo, de mais de vinte anos de festas:
Quando começou a ser construído o carrossel de Mané Vicente?
Em 1970
Como foi feito o carrossel de Mané Vicente?
“Ele não tinha dinheiro para comprar, nem os panos, nem os vergalhões
para pregar as cadeiras, nem madeira, nem prego e as outras coisas. Ele mesmo
me disse, ‘olha, a minha sorte, foi compadre Luiz de Sousa. Que era prefeito na
época. Eu sabia onde ele comprava as coisas da prefeitura, em Serra Talhada. Eu
fui lá, onde ele comprava as ferramentas, para a prefeitura. Comprei as
ferramentas lá e, mandei colocar no nome da prefeitura. Quando eu cheguei aqui,
fiz o carrossel. A madeira eu tirei da propriedade dele ali. Os panos eu comprei
fiado na loja dele e, não paguei. Comprei as ferramentas e os vergalhões para
formar o carrossel, fiado, na conta da prefeitura de Manaíra lá em Serra
Talhada. Quando eu fiz o carrossel, foi que eu procurei compadre Luiz e dissea
ele, agora eu vou trabalhar pra lhe pagar. A madeira você me deu da sua
propriedade. As ferramentas, eu comprei no nome da prefeitura, lá, em Serra
Talhada. Os panos, que comprei pra fazer a coberta do carrossel, comprei fiado
ao senhor e, ainda não paguei. Compadre Luiz, respondeu, / “Não Mané, deixa
isso pra lá, faz de conta que foi uma ajuda que eu te dei”’. Então ele dizia, ‘eu
ganhei esse presente de Luiz de Sousa, apesar que foi na marra, na enrolada,
mas, eu não estou devendo’. Ele era engraçado de mais Mané Vicente (risos).”
Quais eram os LPs que tocavam no carrossel?
“Ele gostava de Noca do Acordeom, cantores bregas e de Luiz Gonzaga.”
A igreja
A advogada Maria das Graças Diniz Cabral, de 45 anos, conhecida por todos como Gracinha,
nos diz o que viu mudar dentro da própria igreja com relação a maneira de administrar e
cultivar esse costume:
“De uns 20 anos pra cá, a festa do Mês de Maio sofreu uma queda. Teve
um declínio muito grande, em virtude de muitos fatores. Antigamente os jovens
não tinham a abertura que tem hoje, nem as tecnologias, os computadores, coisas
que tem hoje, que acabam interferindo em suas escolhas.
Nós já tivemos vários administradores na paróquia, que resgataram a festa.
Entre eles podemos citar, Frei João. Ele era um grande líder comunitário. Na
época dele, de 1993 à 1998, ele revolucionou o município com o jeito dele de ver
a comunidade, de juntar, de arrebanhar as pessoas da igreja. Depois que ele saiu,
Frei Aluízio deu continuidade ao seu trabalho, contabilizando assim um período
de dez anos. Eles conseguiram realizar grandes festas. Posteriormente, vieram
outros, que não conseguiram como eles. Hoje nos novenários, como é possível
ver, a maioria das pessoas são mulheres, os homens estão afastados da igreja. Os
jovens, também, estão afastados da igreja. Na minha opinião, falta um líder
comunitário para fortalecer não só a festa, como a igreja.”
Outra pessoa que frequenta a igreja e discorre sobre o assunto é a professora Adalgisa
Pereira Tavares, de 58 anos, conhecida por Gisa:
“As celebrações, a cada noite, são dedicadas as famílias, as pastorais e
aos movimentos, que funcionam na igreja. A participação se dá através da
liturgia, a qual os noiteiros animam com cantos, apresentações e dramatizações,
girândolas, fogos de artifício, etc.. Os paroquianos contribuem de acordo com
sua possibilidade, com alguma quantia para ajudar a igreja nas suas dimensões.
Nesse período, muitos leigos da paróquia e padres de cidades vizinhas,
são convidados para fazerem homílias. Conforme os temas escolhidos pelo
pároco e equipe litúrgica, segundo os documentos da igreja.
Por muitas vezes, no dia 31 de maio, quando vinha algumas bandas de
outras cidades. Era bem participada por pessoas das cidades circunvizinhas
(jovens, adultos, etc.). Essa festa social aconteceuhá algum tempo, depois foi
resgatada, de vez em quando acontece , são contratadas bandas diversificadas
que atraem a população em geral. O povo gosta abeça, especialmente os jovens,
já que não dispões delazer e se divertem pra valer.
Atualmente, percebe-se que ainda há bastante participação na festa
religiosa. Não há mais, porque muitos preferem ficar ligados a mídia, mesmo
assim, permanece o entusiasmo e a dedicação daqueles que participam. Hoje, as
pessoas são convidadas a investir menos nos festejos e doar um pouco mais a
igreja. Onde, suas contribuições são investidasnas dimensões que se fizerem
necessárias. Isto tem ajudado bastante aos que necessitam, como também, aos
trabalhos pastorais.”
Despedidas
O sol já estava alto,quando me despedi da cidade, naquela manhã de junho de 2013. O
transporte veio pegar-me em casa, para seguir até Princesa Isabel, onde eu tomei o ônibus
para João Pessoa. Enquanto o carro pegava outros passageiros em suas casas, eu pensava o
que colocar no papel. Afinal, aos olhos de quem viveu as Festas de Maio e delas tem
recordações tão boas. Realmente, é de se perguntar o que escrever sobre a festa de hoje.
Restou-me a nostalgia das minhas próprias lembranças, a saudade dos entrevistados e
a esperança. A esperança de que a tradição se mantenha viva. Os pais e avôs ensinam a seus
filhos e netos, a igreja conta sempre com a presença das crianças. Mas, o que me chamou
atenção para isso foi um banco da matriz, inteiro tomado por crianças, com apenas um adulto
responsável. Pensei, até que fossem “anjinhos” para a coroação. Assim, como o “anjinho” que
eu encontrei, ainda vestido com suas asas, pelo simples prazer de assim estar.
Como a própria vida, a Festa do mês Mariano tem seus altos e baixos. De tradição
secular europeia, continua viva neste pequeno município. De estrutura de novenário imutável,
ela se transforma junto com as mudanças pela própria cultura local.
Ao chegar em Princesa Isabel as marcas de bala nos prédios da cidade, resquícios do
último assalto a uma agência bancária me chamaram atenção. Me vieram à lembrança as
histórias dos antigos conflitos desta região. A tristeza e o medo que vi no semblante das
pessoas me levaram na pensar: a cultura da festa será inibida pela cultura da violência?
As memórias de Migué Peba, Ciço Antas, Chico Rosas e Gracinhas, serão somente
relíquias de um tempo passado?
Créditos: Arquivo do museu Antônio Antas Diniz
Figura 6: coroação 1950 (externo)
Créditos: Arquivo do museu Antônio Antas Diniz
Figura 7: prossição em 1960
Créditos: Arquivo do museu Antônio Antas Diniz
Figura 8: o senhor Pedro Fogueteiro hoje