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7/24/2019 STJ Namoro qualificado
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Superior Tribunal de Justia
RECURSO ESPECIAL N 1.454.643 - RJ (2014/0067781-5)RELATOR : MINISTRO MARCO AURLIO BELLIZZERECORRENTE : MA B
ADVOGADOS : LILIBETH DEAZEVEDORAFAEL FERREIRA MENDESRECORRIDO : P A DE O BADVOGADOS : CELSO FERREIRA
MNICA MACEDO SANTOS E SOUZAEMENTA
RECURSO ESPECIAL E RECURSO ESPECIAL ADESIVO. AO DE RECONHECIMENTO EDISSOLUO DE UNIO ESTVEL, ALEGADAMENTE COMPREENDIDA NOS DOIS ANOSANTERIORES AO CASAMENTO, C.C. PARTILHA DO IMVEL ADQUIRIDO NESSEPERODO. 1. ALEGAO DE NO COMPROVAO DO FATO CONSTITUTIVO DO
DIREITO DA AUTORA. PREQUESTIONAMENTO. AUSNCIA. 2. UNIO ESTVEL. NOCONFIGURAO. NAMORADOS QUE, EM VIRTUDE DE CONTINGNCIAS E INTERESSESPARTICULARES (TRABALHO E ESTUDO) NO EXTERIOR, PASSARAM A COABITAR.ESTREITAMENTO DO RELACIONAMENTO, CULMINANDO EM NOIVADO E,POSTERIORMENTE, EM CASAMENTO. 3. NAMORO QUALIFICADO. VERIFICAO.REPERCUSSO PATRIMONIAL. INEXISTNCIA. 4. CELEBRAO DE CASAMENTO, COMELEIO DO REGIME DA COMUNHO PARCIAL DE BENS. TERMO A PARTIR DO QUALOS ENTO NAMORADOS/NOIVOS, MADUROS QUE ERAM, ENTENDERAM POR BEMCONSOLIDAR, CONSCIENTE E VOLUNTARIAMENTE, A RELAO AMOROSAVIVENCIADA, PARA CONSTITUIR, EFETIVAMENTE, UM NCLEO FAMILIAR, BEM COMOCOMUNICAR O PATRIMNIO HAURIDO. OBSERVNCIA . NECESSIDADE. 5. RECURSOESPECIAL PROVIDO, NA PARTE CONHECIDA; E RECURSO ADESIVO PREJUDICADO.
1. O contedo normativo constante dos arts. 332 e 333, II, da lei adjetiva civil, no foi objeto dediscusso ou deliberao pela instncia precedente, circunstncia que enseja o noconhecimento da matria, ante a ausncia do correlato e indispensvel prequestionamento.2. No se denota, a partir dos fundamentos adotados, ao final, pelo Tribunal de origem (porocasio do julgamento dos embargos infringentes), qualquer elemento que evidencie, noperodo anterior ao casamento, a constituio de uma famlia, na acepo jurdica da palavra,em que h, necessariamente, o compartilhamento de vidas e de esforos, com integral eirrestrito apoio moral e material entre os conviventes. A s projeo da formao de umafamlia, os relatos das expectativas da vida no exterior com o namorado, a coabitao,ocasionada, ressalta-se, pela contingncia e interesses particulares de cada qual, tal comoesboado pelas instncias ordinrias, afiguram-se insuficientes verificao da affectiomaritalis e, por conseguinte, da configurao da unio estvel.2.1 O propsito de constituir famlia, alado pela lei de regncia como requisito essencial constituio da unio estvel - a distinguir, inclusive, esta entidade familiar do denominado"namoro qualificado" -, no consubstancia mera proclamao, para o futuro, da inteno deconstituir uma famlia. mais abrangente. Esta deve se afigurar presente durante toda aconvivncia, a partir do efetivo compartilhamento de vidas, com irrestrito apoio moral e materialentre os companheiros. dizer: a famlia deve, de fato, restar constituda.2.2. Tampouco a coabitao, por si, evidencia a constituio de uma unio estvel (ainda quepossa vir a constituir, no mais das vezes, um relevante indcio), especialmente se consideradaa particularidade dos autos, em que as partes, por contingncias e interesses particulares (ele,a trabalho; ela, pelo estudo) foram, em momentos distintos, para o exterior, e, comonamorados que eram, no hesitaram em residir conjuntamente. Este comportamento, certo,
revela-se absolutamente usual nos tempos atuais, impondo-se ao Direito, longe das crticas edos estigmas, adequar-se realidade social.
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3. Da anlise acurada dos autos, tem-se que as partes litigantes, no perodo imediatamenteanterior celebrao de seu matrimnio (de janeiro de 2004 a setembro de 2006), novivenciaram uma unio estvel, mas sim um namoro qualificado, em que, em virtude doestreitamento do relacionamento projetaram para o futuro e no para o presente , opropsito de constituir uma entidade familiar, desiderato que, posteriormente, veio a serconcretizado com o casamento.4. Afigura-se relevante anotar que as partes, embora pudessem, no se valeram, tal comosugere a demandante, em sua petio inicial, do instituto da converso da unio estvel emcasamento, previsto no art. 1.726 do Cdigo Civil. No se trata de renncia como,impropriamente, entendeu o voto condutor que julgou o recurso de apelao na origem.Cuida-se, na verdade, de clara manifestao de vontade das partes de, a partir do casamento,e no antes, constituir a sua prpria famlia.A celebrao do casamento, com a eleio do regime de comunho parcial de bens, nahiptese dos autos, bem explicita o termo a partir do qual os ento namorados/noivos,maduros que eram, entenderam por bem consolidar, consciente e voluntariamente, a relaoamorosa vivenciada para constituir, efetivamente, um ncleo familiar, bem como comunicar o
patrimnio haurido. A cronologia do relacionamento pode ser assim resumida: namoro, noivadoe casamento. E, como de sabena, no h repercusso patrimonial decorrente das duasprimeiras espcies de relacionamento.4.1 No contexto dos autos, invivel o reconhecimento da unio estvel compreendida,basicamente, nos dois anos anteriores ao casamento, para o nico fim de comunicar o bemento adquirido exclusivamente pelo requerido. Alis, a aquisio de apartamento, ainda quetenha se destinado residncia dos ento namorados, integrou, inequivocamente, o projeto docasal de, num futuro prximo, constituir efetivamente a famlia por meio do casamento. Da,entretanto, no advm namorada/noiva direito meao do referido bem.5. Recurso especial provido, na parte conhecida. Recurso especial adesivo prejudicado.
ACRDO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TerceiraTurma do Superior Tribunal de Justia, na conformidade dos votos e das notas taquigrficas aseguir, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, na parte conhecida e julgarprejudicado o recurso adesivo, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, Joo Otvio de Noronha, Paulo de TarsoSanseverino e Ricardo Villas Bas Cueva (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.
Braslia (DF), 03 de maro de 2015 (data do julgamento).
MINISTRO MARCO AURLIO BELLIZZE, Relator
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RECURSO ESPECIAL N 1.454.643 - RJ (2014/0067781-5)
RELATRIO
O SENHOR MINISTRO MARCO AURLIO BELLIZZE:
Trata-se de recursos especiais principal e adesivo interpostos por M.
A. B., de um lado, e, de outro, P. A. de O. B., respectivamente, deduzidos em
contrariedade ao acrdo proferido, em de embargos infringentes, pelo egrgio
Tribunal de Justia do Estado do Rio de Janeiro, assim ementado: (e-STJ, fl. 792):
EMBARGOS INFRINGENTES. AO DE RECONHECIMENTO EDISSOLUO DE UNIO ESTVEL, CUMULADA COM PARTILHA DEBENS. PRESENA DOS ELEMENTOS OBJETIVO (NOTORIEDADE)E SUBJETIVO (INTENO DE CONSTITUIR FAMLIA).1. A lei civil identifica a relao estvel pela presena de doiselementos: um de ordem objetiva (convivncia pblica, contnua eduradoura) e outro de ordem subjetiva (a finalidade de constituio defamlia). A relao, por conseguinte, alm de notria no meio social quepassa a ser frequentado pelo casal, que, a partir da, assumem acondio de como se casados fossem, deve ser prolongada no tempo esem soluo de continuidade, ou seja, que o vnculo estabelecido seja
durvel e contnuo, com a inteno de constituir famlia.2.Na verdade, os documentos apresentados demonstram que as partestiveram um relacionamento pblico, contnuo e duradouro, estabelecidocom o objetivo de constituio de famlia, como assim dispe o art.1.723 do Cdigo Civil. Na Polnia, juntos desde fevereiro de 2004,passaram a dividir o mesmo espao, o que afasta a ideia de umrelacionamento fugaz, descompromissado e usual entre estudantes quemoram ss.3. Logo, uma vez caracterizada a unio estvel entre a autora e o runo perodo compreendido entre 28 de janeiro de 2004 a setembro de2006, resta examinar o pedido relativo partilha de bens.4. A contribuio da autora, ainda que imaterial, na aquisio do bem
restou reconhecida, "entretanto no a ponto de justificar a partilha emquinhes iguais do nico imvel do casal', levando-se em consideraoo temo a quo na construo do patrimnio comum.5. No h como se admitir que a opo pelo casamento importe narenncia quanto unio estvel, ao revs, o casamento supervenienteafastou a dvida sobre o propsito mtuo de constituir famlia, como,ali, assim constou no voto vencido,j que a renncia a um direito deveestar amparada em elementos que demonstrem, de forma inequvoca,a inteno do credor em desonerar o devedor do encargo, no seadmitindo, pois, a mera presuno nesse sentido. No se admiterenncia tcita a qualquer direito.6. Parcial provimento aos embargos, nos termos do voto vencido.
Os presentes recursos especiais so oriundos da ao de
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reconhecimento e dissoluo de unio estvel c.c. partilha de bens, promovida, em
3/9/2009, por P. A. de O. B. contra de M. A. B., em que se pretende a declarao
judicial de estabelecimento e de dissoluo de unio estvel alegadamente
estabelecida entre as partes litigantes durante perodo anterior ao casamento
celebrado em setembro de 2006, bem como a correspondente meao dos bens
adquiridos no perodo a ela correspondente (janeiro de 2004 a setembro de
2006). Objetiva-se, ainda, a condenao do ru a pagar aluguel do imvel comum do
casal ante a utilizao exclusiva, desde setembro de 2008, em valor a ser arbitrado
pelojuzo por meio de percia.
Para tanto, a autora noticiou, em suma, que, aps um ano de namoro
com o requerido, este, a trabalho, mudou-se para a cidade de Varsvia, na Polnia
(agosto de 2003). Aduziu a demandante que, em janeiro de 2004, aps concluir a
faculdade de psicologia, tambm foi para a Polnia, a fim de concretizar o propsito,
por ambos manifestado, de constituir famlia. Afirmou a demandante que, em outubro
de 2004, o requerido externou a inteno de casar, formalizando, assim, a unio que j
viviam. Segundo alegado, emjaneiro de 2005, durante o perodo de frias, o casal veio
ao Brasil para visitar os familiares, hospedando-se na casa dos pais da autora, ocasio
em que adquiriu o imvel, ainda em construo, situado na Rua Gilberto Amado, n.
951, apt. 202, Barra da Tijuca, Rio de Janeiro. Narrou a autora, ainda, que, emjulho de
2005, o contrato de trabalho do requerido foi encerrado e o casal, um ms depois,
retornou ao Brasil, vindo a residir, num primeiro momento, na casa do tio do ru, e,
aps a entrega do apartamento (novembro de 2005), no imvel adquirido. De acordo
com a narrativa, em setembro de 2006, "aps mais de dois anos de convivncia, o
casal converteu a unio estvel em casamento, [...], o que corrobora a inteno que
tinham de constituir famlia durante todo o perodo que conviveram".
Por fim, noticiaque, a partir de dezembro de 2007, a relao do casal passou a deteriorar-se,
culminando com a separao de fato do casal em setembro de 2008 (e-STJ, fls. 3-13).
Devidamente citado, o ru M.A. B. rechaou integralmente a pretenso
veiculada na petio inicial. Aduziu, em suma, que, a despeito de namorar com a
requerente na ocasio em que recebeu o convite de trabalho na Polnia, para l
seguiu sozinho, em agosto de 2003. Alegou que, somente no ano seguinte, a autora
foi para o mencionado pas, com passagens de ida e volta compradas, tendo por
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objetivo estudar a lngua inglesa. Afirmou, outrossim, que a demandante apenas no
retornou para o Brasil porque conseguiu cursar um mestrado. Nesse contexto,
sustentou que o relacionamento ento mantido, ainda que sob a mesma residncia,
era de simples namoro, circunstncia absolutamente comum nos tempos atuais que,
por si s, no tem o condo de configurar uma entidade familiar. Ressaltou, ainda,
que, em que pese o estreitamento da relao, diversamente do alegado, no houve
formalizao da unio, mas sim pedido de casamento, momento em que ficaram
noivos, to somente (em outubro de 2004). Asseverou, outrossim, que o apartamento
adquirido em 2005 fruto exclusivo de seu trabalho. Consignou, por fim, que a autora
e o ru, antes do casamento (setembro de 2006), nunca ostentaram socialmente o
status de entidade familiar, nos seguintes termos: As partes simplesmente"namoraram, noivaram e depois se casaram. Escolheram, para o casamento, o regime
da comunho parcial de bens, ficando bvio que a escolha ps um divisor na
patrimnio de cada um, isoladamente conquistado antes dele". (e-STJ, fls. 190-218).
Encerrada a fase instrutria, o Magistrado de piso julgou procedente o
pedido, "para declarar a unio estvel havida entre P. A. de O. B. e M. A. B., no
perodo de 28 de janeiro de 2004 a setembro de 2006". Determinou, outrossim, que
"os bens adquiridos na constncia da unio devero ser partilhados igualmente entre
as partes, na forma prpria ao regime de comunho parcial de bens, em sede de
liquidao de sentena por arbitramento, nos termo do CPC, artigo 475-C". O pedido
de condenao ao pagamento de "aluguel" pelo uso exclusivo do apartamento por
parte do ru restou julgado improcedente (e-STJ, fls. 610-612).
Em contrariedade sentena, ambas as partes interpuseram recurso de
apelao. O egrgio Tribunal de Justia do Estado do Rio de Janeiro, por maioria de
votos, conferiu provimento ao apelo do demandado, para julgar improcedente o pedido
de reconhecimento e dissoluo de unio estvel; e reputou prejudicada a insurgncia
manifestada pela demandante. Ojulgado recebeu a seguinte ementa:
APELAO CVEL. Reconhecimento de unio estvel. Casal queresidiu junto em outro pas por quase dois anos antes de contraremmatrimnio. Aquisio de imvel durante a suposta unio estvel.Sentena de procedncia reconhecendo a unio estvel edeterminando a partilha do bem. Recurso de ambas as partes.Casamento celebrado posteriormente sob o regime da comunho
parcial de bens. Artigo 1659 do CC. Ato que encerra manifestao devontade sobre os bens que cada um adquiriu antes do matrimnio.
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Reforma da sentena. Partes que optaram pelo casamento e abriramno [sic] do direito de converter a suposta unio estvel em casamento(artigo 1.726 do CC). Renncia quanto unio estvel, que nocomporta ressurreio aps o divrcio, onde no houve discussoquanto aos bens adquiridos antes do casamento com recursos prpriosdo varo. DOU PROVIMENTO AO 1 RECURSO, FICANDOPREJUDICADO O 2 RECURSO.
Irresignada, a autora intentou embargos infringentes, aos quais o Tribunal
de origem conferiu parcial provimento, para fazer prevalecer o voto vencido e
restabelecer a sentena de procedncia do pedido de reconhecimento e dissoluo de
unio estvel em perodo anterior ao casamento, determinando-se, por conseguinte, a
partilha do nico bem do casal, entretanto, na seguinte proporo: de 2/3 (dois teros)
para M. A. B. e 1/3 (um tero) para P. A. de O. B., nos termos da ementa
inicialmente transcrita(e-STJ, fls. 790-796).
Nas razes do apelo excepcional, fundado na alnea a do permissivo
constitucional, o recorrente M.A. B. aponta violao dos arts. 332 e 333, II, do Cdigo
de Processo Civil; e 104, 884, 1.639, 1.658 e 1.726 do Cdigo Civil.
Sustenta, preliminarmente, que a Corte estadual concluiu pela presena
do requisito subjetivo da unio estvel, qual seja, a inteno mtua de constituirfamlia, sem a existncia de provas nos autos que conferisse supedneo a tal
constatao.
No mrito, afirma que a convivncia, na Polnia, na mesma residncia,
dos ento namorados, com propsitos distintos e autnomos (ele, a trabalho; ela,
pelos estudos) no evidencia, por si s, a conformao de uma entidade familiar.
Aduz, outrossim, que as partes, ao celebrarem o casamento, bem delimitaram o
regime de bens por eles eleito e o momento no qual haveria a comunicao dos bens
hauridos pelo esforo comum, consubstanciando, pois, ato jurdico perfeito. Ressalta
que a meao do bem adquirido em momento anterior ao casamento somente poderia
ser viabilizada caso houvesse a eleio do regime da comunho de bens ou a
converso da suposta unio estvel em casamento, providncias no levadas a efeito,
de modo livre e consciente, pelas partes, o que caracterizaria, inclusive, renncia pela
parte autora (e-STJ, fls. 1.368-1.394). Conclui, por fim, que a interpretao conferida
pelo Tribunal de origem, alm de desrespeitar o mencionado ato jurdico perfeito,
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ignora o regime de bens voluntariamente eleito pelas partes (e-STJ, fls. 801-819).
Oferecidas contrarrazes (e-STJ, fls. 831-843), P. A. de O. B. manejou,
ainda, recurso especial adesivo, fundado nas alneas ae c, da Constituio Federal,
em que se apontou a violao dos arts. 1.725 do Cdigo Civil; e 5 da Lei n. 9.278/96,
bem como dissenso jurisprudencial.
Em suas razes recursais, a insurgente P. A. de O. B. afirma que, de
acordo com a legislao supracitada, demonstrada e reconhecida a existncia de
unio estvel no perodo indicado na inicial, a partilha dos bens deve se dar em partes
iguais entre os companheiros, "seguindo a mesma proporo no arbitramento da
indenizao a ttulo de aluguel do que for avaliado para o imvel todo, pelo perodo em
que o ru/recorrido estiver ocupando com exclusividade o imvel e enquanto durar o
condomnio" (e-STJ, fls. 853-870).
O recurso especial principal, inicialmente, no foi admitido na origem
(e-STJ, fls. 845-849); o recurso especial adesivo, por tal razo, restou prejudicado
(e-STJ, fl. 898).
Contraposto oAresp n. 313.318/RS por M.A. B., o ento relator, Ministro
Sidnei Beneti, conferiu-lhe provimento para a anlise do recurso especial (e-STJ, fls.951).
Concedida vista ao Parquet Federal, no houve manifestao (e-STJ, fl.
961).
o relatrio.
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RECURSO ESPECIAL N 1.454.643 - RJ (2014/0067781-5)
VOTO
O SENHOR MINISTRO MARCO AURLIO BELLIZZE(RELATOR):
1. De plano, cumpre esclarecer que, em virtude do provimento do agravo
interposto contra a deciso que havia negado seguimento ao recurso especial
principal, curial, por conseguinte, promover, na presente via especial, a apreciao,
tambm, do recurso especial adesivo que restou prejudicado exclusivamente em razo
da inadmisso do principal, independente de recurso da parte.
Justamente em razo da relao de subordinao existente entre os
recursos (do adesivo para com o principal), prevista no art. 500 do CPC, e, ante a no
realizao dojuzo de admissibilidade do recurso acessrio na origem, a ascenso do
principal enseja, necessariamente, por parte desta Corte de Justia, tambm, a anlise
do recurso adesivo.
Nessa linha de entendimento, destacam-se os seguintes precedentes:
RECURSO ESPECIAL. REPORTAGEM TELEVISIVA. UTILIZAO DAIMAGEM DE MULHERES, CONSIDERANDO-AS PROSTITUTAS, SEMAUTORIZAO. MONTANTE DA REPARAO. CASOS IDNTICOS.OBSERVAO DA MDIA DE INDENIZAES FIXADAS.[...]4. Se o recurso especial adesivo no admitido pelo Tribunal deorigem em funo da inadmisso do recurso especial principal(art. 500, III, do CPC), e se apenas a parte que interps o recursoprincipal recorre contra essa deciso, o provimento do agravo,com a determinao de subida dos autos para julgamento dorecurso principal, implica a necessidade de apreciao tambm dorecurso especial adesivo. Precedente.[...]6. Recurso especial principal conhecido em parte e, nessa parte,provido, para reduzir o montante da reparao do dano moral.7. Recurso especial adesivo no conhecido.(REsp 1245527/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRATURMA, julgado em 14/02/2012, DJe 24/02/2012)
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL ADESIVO.PROVIMENTO DO AGRAVO INTERPOSTO CONTRA A DECISOQUE INADMITIU O RECURSO PRINCIPAL. EXAME DE
ADMISSIBILIDADE DO ADESIVO. POSSIBILIDADE. CORREOMONETRIA E JUROS DE MORA DEVIDOS PELA FAZENDA
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PBLICA. LEI 11.960/09, QUE ALTEROU O ARTIGO 1-F DA LEI9.494/97. NATUREZA PROCESSUAL. APLICAO IMEDIATA AOSPROCESSOS EM CURSO DURANTE SUA VIGNCIA. EFEITORETROATIVO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTE EM RECURSOESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVRSIA. RESP N.1.205.946/SP.1. O recurso especial adesivo somente no foi admitido noTribunal de origem em virtude da inadmisso do recurso principal.2. Uma vez provido o agravo interposto contra a deciso que noadmitiu o recurso principal, possvel o exame da admissibilidadedo recurso especial adesivo inadmitido. Precedentes.[...](EDcl no REsp 1285932/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELLMARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/10/2012, DJe08/10/2012). E ainda: AgRg no Ag 1.051.345/SP, 4 Turma, Rel. Min.Aldir Passarinho Junior, DJe de 16/11/2009
2. Feito esse esclarecimento, passa-se, inicialmente, a analisar a
insurgncia veiculada por M. A. B., que, conforme ressair evidenciado, guarda
relao de prejudicialidade com o recurso especial adesivo intentado por P. A. de O. B.
Sobre a questo prefacial aventada, assinala-se que o contedo
normativo constante dos arts. 332 e 333, II, da lei adjetiva civil, no foi objeto de
discusso ou deliberao pela instncia precedente, circunstncia que enseja o no
conhecimento da matria, ante a ausncia do correlato e indispensvelprequestionamento.
No mrito, controverte-se no presente recurso especial, a partir das
circunstncias fticas delineadas na origem - e imutveis na presente via especial -,
sobre a configurao, entre as partes litigantes, de unio estvel, ou de mero namoro
qualificado, relativo ao perodo imediatamente anterior ao casamento destes (de
janeiro de 2004 a setembro de 2006), em que se elegeu, de modo livre e voluntrio, o
regime da comunho de bens.Discute-se, nesse contexto, se, a despeito do estreitamento do convvio
entre as partes, que se deu sob a mesma residncia, em grande medida para viabilizar
a consecuo, cada qual, dos projetos particulares no exterior (trabalho e estudo), a
ponto de ficarem noivos e, posteriormente, de celebrarem o casamento, seria possvel
inferir, nesse perodo, o propsito presente e no futuro de constituir famlia,
pressuposto subjetivo para a configurao da unio estvel.
Assim delimitada a controvrsia, deve-se deixar assente que sua
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apreciao, tal como devolvida nas razes do presente recurso especial, no demanda
o revolvimento da matria ftico-probatria, pois, justamente a partir dos contornos
fticos gizados pela instncia precedente, analisar-se- a presena dos requisitos
legais configurao da unio estvel.
A corroborar a concluso de que a questo centra-se exclusivamente na
valorao jurdica dos fatos, oportuno anotar que o Tribunal de origem, sobre a mesma
moldura ftica, conferiu interpretao jurdica diversa por ocasio dosjulgamentos dos
recursos de apelao e dos embargos infringentes.
Relevante, assim, bem delinear as circunstncias delineadas na origem.
Segundo consta dos autos, M.A. B. e P. A. de O. B. eram namorados,quando o primeiro recebeu o convite de trabalho na Polnia e para l seguiu sozinho,
em agosto de 2003. Somente aps a concluso de seu curso de graduao, e com a
inteno de cursar a lngua inglesa, P. A. de O. B tambm foi para a Polnia, em
janeiro de 2004 (com passagem de ida e volta - e-STJ, fl. 273), circunstncia
naturalmente facilitada, seno induzida pelo fato de seu ento namorado l se
encontrar. P. A. de O. B ainda cursou um mestrado, na rea de sua atuao
profissional, uma das razes para sua permanncia no exterior. Ressai incontroversodos autos que, a partir de ento, passaram a coabitar. Em outubro de 2004, ante o
inegvel fortalecimento da relao, M.A. B. e P. A. de O. B. ficaram noivos (e-STJ, fl.
223). Em janeiro de 2005, M. A. B. adquiriu um apartamento no Rio de Janeiro que,
por bvio, viria a servir de residncia ao casal. Em setembro de 2006, M.A. B. e P. A.
de O. B. casaram-se pelo regime da comunho parcial de bens (e-STJ, fl. 113).
Pela pertinncia, transcreve-se excertos do acrdo que julgou os
embargos infringentes, bem como do recurso de apelao, respectivamente, que, adespeito da disparidade de entendimentos, bem evidenciam os fatos acima
delineados:
[...] No caso em exame, v-se que a autora e o ru iniciaram o namoroem fevereiro de 2002, quando o ru, ao aceitar uma oferta de trabalho,foi morar na Polnia em junho de 2003. Extrai-se dos autos que, emjaneiro de 2004, a autora tambm se mudou para Varsvia, passando aresidir, a partir da, com o ru, contraindo as partes matrimnio em 02de outubro de 2006, sob o regime parcial de bens (fls. 110), eseparando-se em setembro de 2008, sendo certo que o ru, em 22 defevereiro de 2005, adquiriu o imvel situado na Rua Gilberto Amado, n.951, apt. 202.
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De fato, e como destacado no voto vencido da lavra do DesembargadorCEZAR AUGUSTO RODRIGUES COSTA, a deciso de primeiro grauenfrentou a questo com cuidado, aportando, inclusive, para vriosdocumentos que se encontram nos autos e que corroboram com a tesedesenvolvida pela autora da ao, nos seguintes termos: "Dentre oconjunto probatrio constante dos autos, destaco a correspondnciaeletrnica enviada pelo ru aos pais da autora, fl. 26, em que aqueledemonstra sua inteno de constituir famlia ao afirmar que 'estamosns dois apostando no nosso futuro, na nossa vida...." (sic) e aafirmao do prprio ru, em seu depoimento pessoal, confirmando quehavia vivido com a autora no perodo entre o incio de 2004 at o seucasamento em setembro de 2006 (fl. 508)"E mais, com adiante conclui, "O depoimento do ru foi bastanteesclarecedor ao confirmar que vivera com a autora no perodo por elaalegado, ressaltando que quando ela fora para Polnia, o seu amigoque morava com ele sara para que ele e ela vivessem sozinhos no
imvel. Ora, o casal desde ento estabeleceu a famlia convivencial queem um futuro prximo se converteria em casamento". Assim, patenteque desde fevereiro de 2004 a agosto de 2005, ou seja, antes de secasarem, dividiram o apartamento morando como uma famlia noapartamento na Polnia, at que voltaram em definitivo, para o Brasil,onde, aps um perodo de dois meses, vivendo na casa de parentes, semudaram para o apartamento adquirido por ele em janeiro de 2005,que ficara pronto" (fls. 532). [acrdo que julgou os embargosinfringentes - e-STJ, fls. 790-796]
[...] a controvrsia da demanda limita-se ao reconhecimento de unioestvel entre as partes no perodo de janeiro de 2004 a setembro de
2006. A importncia dessa discusso implica na diviso de umapartamento na Rua Gilberto Amado n. 951, Barra da Tijuca, adquiridopelo ru emjaneiro de 2005. [...]Na hiptese dos autos, tem-se que autora e ru residiam com suasrespectivas famlias quando o ru, ao aceitar uma oferta de trabalho, foimorar na Polnia em 06/2003, tendo a autora ido para l, emjaneiro de2004 com o intuito de cursar alguma especializao e l permaneceramat meados de 2005.Em outubro de 2006 (fls. 110), as partes contraram matrimnio, sob oregime da comunho parcial de bens.Com efeito, uma vez escolhido o regime de bens para o casamento daspartes, adotado o de comunho parcial, livre e conscientemente, pelosnubentes, ficou evidente que os bens que cada cnjuge possua antesdo casamento no se comunicaram, por fora do artigo 1659 do CdigoCivil. [...] No caso dos autos, as partes optaram pelo casamento eabriram mo do direito de converter a suposta unio estvel emcasamento (artigo 1.726 do CC). [acrdo que julgou o recurso deapelao - e-STJ, fls. 704-723]
Conforme se denota do excerto inicialmente reproduzido, o Tribunal de
origem, aojulgar os embargos infringentes, entendeu por bem reconhecer a existncia
de unio estvel durante o perodo imediatamente anterior ao casamento de M.A. B. e
P. A. de O. B., basicamente porque demonstrado, no aludido interregno, que o
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relacionamento entabulado entre eles, alm de pblico, duradouro e contnuo, deu-se
sob a mesma residncia. Segundo a fundamentao adotada pela Corte estadual,
ainda, o intuito de constituir famlia teria restado evidenciado, em especial, pela
mensagem, via e-mail, encaminhada por M. aos pais de P., "de que estariam
apostando no futuro", bem como pela confirmao, no depoimento pessoal do
requerido, de que, em tal perodo, efetivamente coabitaram.
Permissa venia , o propsito de constituir famlia, alado pela lei de
regncia como requisito essencial constituio da unio estvel a distinguir,
inclusive, esta entidade familiar do denominado "namoro qualificado" , no
consubstancia mera proclamao, para o futuro, da inteno de constituir uma
famlia. mais abrangente. Esta deve se afigurar presente durante toda a
convivncia, a partir do efetivo compartilhamento de vida, com irrestrito apoio moral e
material entre os companheiros. dizer: a famlia deve, de fato, restar constituda.
No ponto, oportuno citar o esclio de autorizada doutrina, que, em
comentrio ao "objetivo de constituir famlia", como requisito para a constituio da
unio estvel, bem elucida a necessidade da efetiva concretizao da famlia e no
a mera projeo desta para o futuro, bem como, em muitos casos, a irrelevncia
da coabitao:
[...] no qualquer relao amorosa que caracteriza a unio estvel.Mesmo que celebrada em contrato escrito, pblica e duradoura, comrelaes sexuais, com prole, e, at mesmo, com certocompartilhamento de teto, pode no estar presente o elementofundamental consistente em desejar constituir famlia. Assim, o namoroaberto, a 'amizade colorida', o noivado no constituem unio estvel. indispensvel esse elemento subjetivo para a configurao da unioestvel. Para Zeno Veloso (op. cit.) absolutamente necessrio queentre os conviventes, emoldurando sua relao de afeto, haja esseelemento espiritual, essa affectio maritalis , a deliberao, a vontade, adeterminao, o propsito, enfim, o compromisso pessoal e mtuo deconstituir famlia. A presena ou no deste elemento subjetivo serdefinida pelo juiz, diante das circunstncias peculiares de cada casoconcreto. Embora tenha o legislador imposto como elementocaracterizador da unio estvel a mera inteno de constituirfamlia, o certo que ela s ser reconhecida como tal quando,alm de os requisitos a) e b) anteriores forem atendidos, a famliavier a ser efetivamente constituda - no mediante celebraosolene, como se faz no casamento, ou diante do mero objetivo deconstituio de famlia, pois, neste ltimo caso, at mesmo o
noivado poderia se enquadrar. (Carvalho Filho, Milton Paulo de.Cdigo Civil comentado. Coordenador Ministro Cezar Peluso. 6 Edio,
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revisada e atualizada. 2012. Editora Manole. So Paulo. p. 2007/2008)
Efetivamente, tampouco a coabitao, por si, evidencia a constituio de
uma unio estvel (ainda que possa vir a constituir, no mais das vezes, um relevante
indcio), especialmente se considerada a particularidade dos autos, em que as partes,
por contingncias e interesses particulares (ele, a trabalho; ela, pelo estudo) foram, em
momentos distintos, para o exterior e, como namorados que eram, no hesitaram em
residir conjuntamente. Este comportamento, certo, afigura-se absolutamente usual
nos tempos atuais, impondo-se ao Direito, longe das crticas e dos estigmas,
adequar-se realidade social.
Por oportuno, destaca-se precedente desta Corte de Justia, em que, a
despeito da coabitao entre os namorados, por contingncias da vida, inclusive com o
consequente fortalecimento da relao, reconheceu a inexistncia de unio estvel,
justamente em virtude da no configurao do animus maritalis, assim ementado:
RECURSO ESPECIAL - AO DECLARATRIA DERECONHECIMENTO DE UNIO ESTVEL - IMPROCEDNCIA -RELAO DE NAMORO QUE NO SE TRANSMUDOU EM UNIOESTVEL EM RAZO DA DEDICAO E SOLIDARIEDADEPRESTADA PELA RECORRENTE AO NAMORADO, DURANTE OTRATAMENTO DA DOENA QUE ACARRETOU SUA MORTE -AUSNCIA DO INTUITO DE CONSTITUIR FAMLIA - MODIFICAODOS ELEMENTOS FTICOS-PROBATRIOS - IMPOSSIBILIDADE -INCIDNCIA DO ENUNCIADO N. 7/STJ - RECURSO ESPECIALIMPROVIDO.I - Na hiptese dos autos, as Instncias ordinrias, com esteio noselementos fticos-probatrios, concluram, de forma unssona, que orelacionamento vivido entre a ora recorrente, F. F., e o de cujus, L., noconsubstanciou entidade familiar, na modalidade unio estvel, noultrapassando, na verdade, do estgio de namoro, que se estreitou,to-somente, em razo da doena que acometeu L.;II - Efetivamente, no tocante ao perodo compreendido entre 1998 e
final de 1999, no se infere do comportamento destes, tal comodelineado pelas Instncias ordinrias, qualquer projeo no meio socialde que a relao por eles vivida conservava contornos (sequerresqucios, na verdade), de uma entidade familiar. No se podecompreender como entidade familiar uma relao em que no sedenota posse do estado de casado, qualquer comunho de esforos,solidariedade, lealdade (conceito que abrange "franqueza,considerao, sinceridade, informao e, sem dvida, fidelidade", utREsp 1157273/RN, Relatora Ministra Nancy Andrighi, DJe 07/06/2010),alm do exguo tempo, o qual tambm no se pode reputar deduradouro, tampouco, de contnuo;III - Aps o conhecimento da doena (final de 1999 e julho de 2001),
L. e F. F. passaram a residir, em So Paulo, na casa do pai de L.,sem que a relao transmudasse para uma unio estvel, j que
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ausente, ainda, a inteno de constituir famlia. Na verdade, aindaque a habitao comum revele um indcio caracterizador daaffectio maritalis, sua ausncia ou presena no consubstanciafator decisivo ao reconhecimento da citada entidade familiar,
devendo encontrar-se presentes, necessariamente, outrosrelevantes elementos que denotem o imprescindvel intuito deconstituir uma famlia;IV - No ponto, segundo as razes veiculadas no presente recursoespecial, o plano de constituir famlia encontrar-se-ia evidenciado naprova testemunhal, bem como pelo armazenamento de smen com afinalidade nica de, com a recorrente, procriar. Entretanto, tal assertivano encontrou qualquer respaldo na prova produzida nos autos, tomadaem seu conjunto, sendo certo, inclusive, conforme deixaram assente asInstncias ordinrias, de forma unssona, que tal procedimento(armazenamento de smen) inerente ao tratamento daqueles que sesubmetem quimioterapia, ante o risco subseqente da infertilidade.
No houve, portanto, qualquer declarao por parte de L. ou indicao(ou mesmo indcios) de que tal material fosse, em algumaoportunidade, destinado inseminao da ora recorrente, como sugereem suas razes. Bem de ver, assim, que as razes recursais, emconfronto com a fundamentao do acrdo recorrido, prendem-se auma perspectiva de reexame de matria de fato e prova, providnciainadmissvel na via eleita, a teor do enunciado 7 da Smula destaCorte;V - Efetivamente, a dedicao e a solidariedade prestadas pela orarecorrente ao namorado L., ponto incontroverso nos autos, por sis, no tem o condo de transmudar a relao de namoro para ade unio estvel, assim compreendida como unidade familiar.Revela-se imprescindvel, para tanto, a presena inequvoca dointuito de constituir uma famlia, de ambas as partes, desiderato,contudo, que no se infere das condutas e dos comportamentosexteriorizados por L., bem como pela prpria recorrente,devidamente delineados pelas Instncias ordinrias;VI - Recurso Especial improvido.(REsp 1257819/SP, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRATURMA, julgado em 01/12/2011, DJe 15/12/2011)
Na hiptese, da anlise acurada dos autos, tem-se que as partes
litigantes, no perodo imediatamente anterior celebrao de seu matrimnio (dejaneiro de 2004 a setembro de 2006), no vivenciaram uma unio estvel, mas sim um
namoro qualificado, em que, em virtude do estreitamento do relacionamento
projetaram, para o futuro e no para o presente, ressalta-se , o propsito de
constituir uma entidade familiar, desiderato que, posteriormente, veio a ser
concretizado com o casamento.
No se denota, pois, a partir dos fundamentos adotados, ao final, pelo
Tribunal de origem (por ocasio do julgamento dos embargos infringentes), qualquerelemento que evidencie, no aludido interregno, a constituio de uma famlia, naDocumento: 1385925 - Inteiro Teor do Acrdo - Site certificado - DJe: 10/03/2015 Pgina 1 4de 20
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acepo jurdica da palavra, em que h, necessariamente, o compartilhamento de
vidas, com irrestrito apoio moral e material entre os conviventes. A s projeo da
formao de uma famlia, os relatos das expectativas da vida no exterior com o
namorado, a coabitao, ocasionada, ressalta-se, pela contingncia e interesses
particulares de cada qual, tal como esboado pelas instncias ordinrias, afiguram-se
insuficientes verificao da affectio maritalis e, por conseguinte, da configurao da
unio estvel.
Nesse contexto, de se reconhecer a configurao, na verdade, de um
namoro qualificado, que tem, no mais das vezes, como nico trao distintivo da unio
estvel, a ausncia da inteno presentede constituir uma famlia. Quando muito h,
nessa espcie de relacionamento amoroso, o planejamento, a projeo de, no futuro,
constituir um ncleo familiar. Sobre esta diferenciao, especializada doutrina tece as
seguintes consideraes:
[...] para que se configure o incio do namoro basta que duas pessoasum relacionamento amoroso, o que abrange desde encontros casuaisat relacionamentos mais srios, em que h publicidade, fidelidade euma possvel inteno de casamento ou constituio de unio estvelno futuro.A confuso que pode surgir entre o namoro e a unio estvel,no entanto, ocorre nas relaes em que h observncia das regras
morais impostas pela sociedade. So aqueles relacionamentosduradouros, com convivncia contnua do casal, em que h fidelidademtua, pelo menos na aparncia, em que ambos se apresentam nasociedade como namorados. A doutrina divide o namoro simples equalificado. O namoro simples facilmente diferenciado da unioestvel, pois no possui sequer um de seus requisito bsicos.[...]J o namoro qualificado apresenta a maioria dos requisitos tambmpresentes na unio estvel. Trata-se, na prtica, da relao amorosa esexual madura, entre pessoas maiores e capazes, que, apesar deapreciarem a companhia uma da outra, e por vezes at pernoitaremcom seus namorados, no tm o objetivo de constituir famlia. Por essemotivo to difcil, na prtica, encontrar as diferenas entre a unioestvel e o namoro qualificado. Muito embora as semelhanasexistentes ente ambos, o que os diferencia o objetivo precpuo deconstituir famlia - presente na unio estvel e ausente no namoroqualificado. [...]Assim, para a constituio da unio estvel, o casal deve manifestar asua vontade de constituir famlia, vivendo nesse sentido como secasado fosse. Isso significa dizer que deve haver assistncia moral ematerial recproca irrestrita, esforo conjunto para concretizar sonhosem comum, participao real nos problemas e desejos do outro etc.No namoro qualificado, por outro lado, embora possa existir um objetivo
futuro de constituir famlia, no h ainda essa comunho de vida.Apesar de se estabelecer uma convivncia amorosa pblica, contnua e
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duradoura, um dos namorados, ou os dois, ainda preserva sua vidapessoal e sua liberdade. Os seus interesses particulares no seconfundem no presente, e a assistncia moral e material recproca no totalmente irrestrita. (Maluf, Carlos Alberto Dabus; Maluf, AdrianaCaldas do Rego Freitas Dabus. Curso de Direito de Famlia. Curso deDireito de Famlia. 2013. Editora Saraiva. p. 371-374)
Irrepreensvel, assim, o entendimento adotado pela Desembargadora
vogal, por ocasio dojulgamento do recurso de apelao, que, ao acompanhar o voto
do relator por fundamentos diversos, reconheceu, no perodo anterior ao casamento
das partes, a configurao de um namoro qualificado, nos seguintes termos:
Em fevereiro de 2002 as partes comearam a namorar e em maro de
2003 o varo foi para a Polnia trabalhar e estudar. Em fevereiro de2004, Priscila tambm vai para a Polnia com o intuito de cursaralguma especializao dividindo o apartamento com seu namorado. Noano de 2004, mais precisamente em outubro o casal ficou noivo e emfevereiro de 2005 o apelante adquiriu o imvel em questo, cujastratativas foram efetuadas por seu pai. O retorno ao Brasil ocorreu emagosto de 2005 e em outubro do mesmo ano ficaram noivos e emsetembro de 2006 casaram.No caso, o relacionamento das partes era de um jovem casal denamorados, estudantes, que pelas circunstncias, inclusive, financeira,moravam juntos, tendo em vista que a permanncia na Polnia eratemporria. Alis, hoje comum ver jovens convivendo sob o mesmo
teto, mas que o fazem com o objetivo nico de testar o relacionamentoa dois, previamente ao casamento, e no pode ser considerado taltentativa como uma unio estvel.Os elementos constantes dos autos no fazem crer que existia unioestvel entre os namorados, no perodo em que residiram juntos naPolnia, por questes laborativas e estudantis, at o retorno ao Brasil,capazes de apontar, numjuzo de certeza, para a presena de affectiomaritalis. Durante esse tempo de relacionamento o primeiro apelantese comportou como um namorado, que nutre sentimentos pela mulherque tem ao lado, mas no estabelece uma verdadeira comunho devida capaz de reconhecer a existncia de uma unio estvel. necessrio que se esclarea que o artigo 1723 do CC disciplinarequisitos para o reconhecimento da referida unio, tal qual aconvivncia pblica, contnua e duradoura. Fato que a convivncia,at mesmo namorados, tm. Como se sabe, o que tnue diferenciara unio que a lei pretende tutelar com seus respectivos efeitospatrimoniais e o namoro, em que os casais convivem intimamente, semreceio de exposio[declarao de voto da Desembargadora vogal,por ocasio do julgamento do recurso de apelao - e-STJ, fls.711-715]
No se olvida que o relacionamento travado entre os namorados, com o
convvio e com o passar do tempo, evoluiu, estreitando-se a ponto de projetarem, para
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o futuro prximo, a constituio da famlia por meio do casamento, o que, em setembro
de 2006, veio a se concretizar. No ponto, afigura-se relevante anotar que as partes,
embora pudessem, no se valeram, tal como sugere P. A. de O. B., em sua petio
inicial, do instituto da converso da unio estvel em casamento, previsto no artigo
1.726 do Cdigo Civil.
Na verdade, a celebrao do casamento, na hiptese dos autos, bem
explicita o termo a partir do qual os ento namorados/noivos, maduros que eram,
entenderam por bem consolidar, consciente e voluntariamente, a relao amorosa
vivenciada, para constituir, efetivamente, um ncleo familiar. A cronologia do
relacionamento pode ser assim resumida: namoro, noivado e casamento. E, como
de sabena, no h repercusso patrimonial decorrente das duas primeiras espcies
de relacionamento.
Alis, se a entidade familiar j estava constituda, o desejo de
formalizao dessa unio por meio do matrimnio deveria, expressamente, abranger
esse perodo, por meio da converso da unio estvel em casamento. Todavia, essa
no foi a providncia tomada livremente pelas partes. No se trata de renncia, como
impropriamente, entendeu o voto condutor que julgou o recurso de apelao na
origem. Cuida-se, na verdade, de clara manifestao de vontade das partes de, a partir
do casamento, e no antes, constituir a sua prpria famlia.
Por oportuno, releva anotar que a Constituio Federal, ao erigir a unio
estvel ao patamar de entidade familiar, ao lado do casamento, conferiu-lhe, por
conseguinte, absoluta proteo estatal. Inexiste, assim, a preponderncia de um
instituto sobre outro. No obstante, ainda que se tratem de categorias de ncleo
familiar, com efeitos jurdicos prprios, h que se reconhecer uma significativa
distino entre o casamento e a unio estvel. O primeiro, por pressupor a expressa
manifestao de vontade dos nubentes, encerra, desde logo, uma segurana jurdica
que no se verifica, de plano, na segunda. Nessa (na unio estvel), diversamente, por
se tratar de um estado de fato, demanda, para a sua conformao e verificao, a
reiterao do comportamento do casal que revele, a um s tempo e de parte parte, a
comunho integral e irrestrita de vidas e de esforos, de modo pblico e por lapso
significativo.
Na espcie, todavia, o relacionamento vivenciado pelas partes em
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momento anterior ao casamento no apresentou, em sua plenitude, tais
caractersticas, notadamente a referente conformao da affectio maritalis , a obstar,
por conseguinte, a verificao de verdadeira unio estvel.
Por fim, especificamente acerca do regime de bens, denota-se, mais uma
vez, que os nubentes, consciente e voluntariamente, ao celebrarem o matrimnio, bem
definiram o termo a partir do qual haveria a comunicao do patrimnio haurido.
Elegeram a comunho parcial de bens, segundo o qual apenas
"comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constncia do casamento" (art.
1.658, CC). Poderiam, por mera liberalidade no se olvida, caso entendessem j
vivenciar, de fato, uma unio estvel, eleger o regime da comunho de bens, para o
especfico fim de comunicar o (nico) imvel adquirido por M. A. B. antes do
casamento.Assim, todavia, deliberadamente no procederam.
No contexto dos autos, invivel, pois, o reconhecimento da unio estvel
compreendida, basicamente, nos dois anos anteriores ao casamento, para o exclusivo
fim de comunicar o bem adquirido anterior e exclusivamente por M.. Alis, a aquisio
do apartamento, ainda que tenha se destinado residncia dos ento namorados,
integrou, inequivocamente, o projeto do casal de, num futuro prximo, constituirefetivamente a famlia por meio do casamento. Da, entretanto, no advm
namorada/noiva direito meao do referido imvel.
Assim, o recurso especial interposto por M.A. B. merece prosperar, para
o fim de julgar improcedente o pedido de reconhecimento e dissoluo de unio
estvel c.c. partilha do imvel adquirido em perodo anterior ao casamento, e, por
consectrio lgico, o pedido indenizatrio de alugueres.
3. Em relao ao recurso adesivo intentado por P. A. de O. B., que emsntese, insurge-se contra o deferimento da partilha do imvel em partes diferentes
(1/3 para ela; e 2/3 para ele), fundado na menor participao dela na aquisio do bem
(o que, inclusive, contrape-se ao reconhecimento da unio estvel na origem); e
contra a improcedncia do pedido condenatrio alugueres, de se reconhecer, tal
como adiantado, que a insurgncia acessria encontra-se inarredavelmente
prejudicada em face do desfecho conferido ao recurso principal, que, como visto,
redundou na prpria improcedncia do pedido de reconhecimento e dissoluo de
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unio estvel referente ao perodo de relacionamento afetivo anterior ao casamento.
4. Em concluso, na esteira dos fundamentos expostos, dou provimento
ao recurso especial interposto por M. A. B., na parte conhecida, para julgar
improcedente o pedido de reconhecimento e dissoluo de unio estvel c.c. partilha
do imvel adquirido em perodo anterior ao casamento; ejulgar prejudicado o recurso
adesivo manejado por P. A. de O. B.
Em face de tal desfecho, condena-se a demandante P. A. de O. B. a
responder pelas custas processuais e honorrios advocatcios, ora arbitrados em R$
5.000,00 (cinco mil reais), com base no art. 20, 4, do CPC, observada a regra
constante do art. 12 da Lei n. 1.060/50, considerado o benefcio da gratuidade deferido
parte, fl. 181, e-STJ.
o voto.
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CERTIDO DE JULGAMENTOTERCEIRA TURMA
Nmero Registro: 2014/0067781-5 PROCESSO ELETRNICO REsp 1.454.643/ RJ
Nmeros Origem: 00239949520098190209 20092090166297 20092090246402 201424550645239949520098190209
PAUTA: 03/03/2015 JULGADO: 03/03/2015SEGREDO DE JUSTIA
RelatorExmo. Sr. Ministro MARCO AURLIO BELLIZZE
Presidente da SessoExmo. Sr. Ministro RICARDO VILLAS BAS CUEVA
Subprocurador-Geral da RepblicaExmo. Sr. Dr. ANTNIO CARLOS PESSOA LINS
Secretria
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA
AUTUAO
RECORRENTE : M A BADVOGADOS : LILIBETH DE AZEVEDO
RAFAEL FERREIRA MENDESRECORRIDO : P A DE O BADVOGADOS : CELSO FERREIRA
MNICA MACEDO SANTOS E SOUZA
ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Famlia - Unio Estvel ou Concubinato - Reconhecimento / Dissoluo
SUSTENTAO ORAL
Dr(a). LILIBETH DE AZEVEDO,pela parte RECORRENTE: M A B
CERTIDO
Certifico que a egrgia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epgrafe na sesso
realizada nesta data, proferiu a seguinte deciso:A Terceira Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, na parte
conhecida ejulgou prejudicado o recurso adesivo, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, Joo Otvio deNoronha, Paulo de Tarso Sanseverino e
Ricardo Villas Bas Cueva (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.
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