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IV CONALI - Congresso Nacional de Linguagens em Interação
Múltiplos Olhares 05, 06 e 07 de junho de 2013
ISSN: 1981-8211
SUPORTES DE LEIRURA E ENSINO: DO CÓDEX À TELA
Patrícia Biondo Nicolli SOARES (G-CLCA-UENP/CJ)
Rosiney Aparecida Lopes do VALE (ORIENTADORA-CLCA-UENP/CJ)
Introdução
Posto que a escola assume certo significado de ponte entre a criança e o mundo e é
por meio dela que o conhecimento adquirido é transmitido, repensado e produzido, a
intenção de nos apropriarmos das práticas que a escola tem diante do computador como
ferramenta pedagógica apresenta-se pertinente, num momento em que tal uso, dentro e fora
dela, tem crescido, e da qual a tendência é de um ritmo constante, em decorrência dos
novos avanços tecnológicos. Dessa forma, as discussões em torno desse tema justificam-se
pela possibilidade de trazer contribuições para a compreensão da mudança nos perfis dos
leitores, ao longo da história, do códex à tela: seus interesses, modos de ler e compreender.
Lembramos que a escolha do computador como suporte de tela, ocorre por ainda
ser um objeto relativamente recente na escola. Enquanto que no mundo tecnológico, já
assistimos ao surgimento de outros suportes de leitura, como tablets, por exemplo. Os
suportes de leitura e informação estão mudando e se não houver políticas de formação
sobre a implementação do computador na escola e o modo como ele é utilizado, não
observaremos, nas práticas pedagógicas, as significativas mudanças que tal suporte pode
proporcionar.
Nesse contexto, o presente trabalho tem por objetivo fazer uma exposição sobre os
mais variados suportes de leitura, utilizados ao longo da história da humanidade, do códex à
tela. Assim, por meio de uma pesquisa bibliográfica, tendo como referencial teórico de base
Cavallo e Chartier (2002) e Chartier (1998), buscaremos examinar as mudanças ocorridas
nos suportes de leitura, desde a antiguidade clássica até os dias atuais, em que o
computador tem se despontado como uma ferramenta atraente para o ato da leitura,
trazendo não só modificações nas estruturas do suporte material, mas nas maneiras de ler.
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Pretendemos com isso, compreender as práticas do passado e, a partir disso, abrir
um espaço para a reflexão do que se faz hoje em relação à leitura na tela.
Inicialmente, vemos que as práticas de leitura, ao longo da história da humanidade,
têm desempenhado incessantemente a preservação e a multiplicação dos mais variados
textos. Para isso, a figura a se destacar é a figura do leitor, leitor este capaz de dar vida ao
escrito, através da imaginação e de suas experiências de vida.
No tocante a tais suportes de leitura, temos que uma das primeiras particularidades
para o registro de informações deu-se com o rolo de papiro, "volumen", logo em seguida
transformando-se em códex, de maior resistência e praticidade quanto ao manuseio,
também, maior capacidade para armazenar uma quantidade superior de conteúdo.
Por conseguinte, com a imprensa, Gutenberg potencializa a distribuição dos textos
em forma de livros, tornando-o mais acessível e por fim, a expansão da tecnologia digital e
da comunicação virtual por meio do computador desenvolveu novos suportes de leitura que
se somaram ao formato do livro impresso. Novas alternativas, portanto, para o processo de
leitura.
Na sequência, conforme anunciamos, fazemos um recorte que vai desde a
Antiguidade clássica até o mundo contemporâneo, a fim de que possamos ter uma visão
mais abrangente da relação entre o leitor e as práticas de leitura de cada período.
1. Antiguidade Clássica (V a.C. ao IV d.C.):
É patente que a leitura se consolidou, aos olhos da história, como construtora do
conhecimento e da aprendizagem, uma vez que, o texto se perfaz de significações que, por
sua vez, não são interpretadas da mesma forma, pois todos aqueles que leem um texto, não
o leem da mesma maneira, ou seja, cada leitor constrói interpretações distintas do texto.
No contexto da Antiguidade Clássica, a oralidade foi destaque na leitura dos
textos, pois, a vocalização era responsável por empregar sentido à leitura. Como se o
intérprete estivesse emprestando a voz a fim de humanizar as sensações ali presentes. A
leitura em voz alta denota o emprego da alma e torna compreensível tudo aquilo que era
lido.
Nesse sentido, Cavallo e Chartier afirmam:
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Ler é, pois, colocar sua própria voz à disposição do escrito (em última
instância, do escritor). É ceder a voz pelo instante de uma leitura. Voz que
o escrito logo torna sua, o que significa que a voz não pertence ao leitor
durante a leitura. Este último a cedeu. Sua voz submete-se ao escrito, une-
se a ele. Ser lido é consequentemente exercer um poder sobre o corpo do
leitor, até mesmo a grande distancia no espaço e no tempo. O escritor que
consegue fazer-se ler atua no aparelho vocal do outro, do qual
serve, mesmo após sua morte, como de um instrumentum vocale,
isto é, como de alguém ou de alguma coisa a seu serviço, até
mesmo de um escravo. (2002, p. 49)
Sendo assim, tal prática, por seu caráter de entretenimento, nada mais era do que
uma convenção cultural da época baseada na tríade: voz, leitura e escuta, já que a minoria
da população dominava a arte da leitura.
Não obstante, também é possível verificar o domínio da leitura silenciosa, apesar
de ínfima. Sua prática restringe-se a familiarização, ao conhecimento pormenorizado do
texto, bem como, tal prática visa possibilitar uma leitura mais rápida, "o leitor que lê
mentalmente não precisa ativar ou reativar o escrito pela intervenção da voz. A escrita
parece lhe falar simplesmente" (CAVALLO e CHARTIER, 2002, p. 58).
Nessa época, o rolo de papiro, também conhecido como volumen, indicava a
primeira abertura para a futura composição do livro, com a função de conservação do texto.
O rolo, portanto, era o suporte que abrigava os textos literários na Grécia e posteriormente
em Roma.
Por conseguinte, a partir do século III d. C. o livro em formato de rolo, começa a
perder paulatinamente espaço entre os leitores, até total domínio do códice ou códex. Tal
opção, no entanto, se deu pelo fato de apresentar maior resistência e capacidade para
armazenar uma quantidade superior de conteúdo. Ainda a maior praticidade quanto ao
manuseio, e à questão organizacional do escrito.
Assim, Cavallo e Chartier afirmam que:
As práticas de leitura sofrem profundas transformações e o códice
provoca uma modificação na própria noção de "livro". No caso do
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rolo, tal noção mostrava-se bastante estável porque estava ligada a
convenções definidas de técnica e de conteúdo; ela podia, de fato,
imediatamente o objeto a uma obra, estivesse esta última encerrada
num único livro-rolo ou distribuída em vários livros-rolos.(...) o
códice, reunindo num único suporte-livro uma série de unidades
textuais orgânicas (...) ou não orgânicas (...) determinava uma
profunda transformação na noção de livro e de leitura completa (...)
(2002, p.94)
Dessa forma, é notório que o códice determinou, acima de tudo, uma maneira
inovadora de ler os textos. Era possível, por exemplo, fazer anotações às suas margens, ou
seja, pelo fato de se ter uma das mãos livres, era permitido a leitura e a escrita simultâneas.
Em meados dos séculos III - II a. C, a leitura desses livros se intensificou em
Roma, entretanto, permeavam apenas as classes mais abastadas. Dessa forma, é possível
verificar a formação de bibliotecas particulares, constituída em sua grande maioria por
livros provenientes da Grécia, fruto de origem bélica e também por literatura latina. Assim,
com a necessidade expansiva do acesso à leitura, e seu caráter de entretenimento, mesmo
que, ainda restrita a um determinado público seleto, tal propriedade era sinônimo de status,
mesmo que não fossem dotados de uma leitura fluente.
De outro norte, existiam também as bibliotecas públicas, mas suas estruturas
restringiram-se apenas à conservação das obras, uma vez que, seus frequentadores eram os
mesmos que já possuíam seu cantinho particular de leitura em casa, "em Roma, ler ou
estudar é um ‘ornamento’ das classes tradicionalmente cultas que faixas de novos
alfabetizados e novos ricos procuram imitar" (CAVALLO e CHARTIER, 2002, p 76)
Assim, o mundo grego-romano, era dotado de cidadãos engajados na arte da
leitura, seja ela proveniente de prazer, prestígio, status ou apenas hábito.
2. Idade Média – século V ao XV
A Antiguidade deixou resquícios de uma tradição de leitura baseada em quatro funções dos
estudos gramaticais, agora herdados de pela Alta Idade Média, dentre os quais: lectio, leitor
identifica o texto por meio de seus elementos; emendatio, correção do texto original;
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enarratio, interpretação do conteúdo do texto; e por fim judiciun avaliação estética ou
moral do conteúdo do texto. (CAVALLO e CHARTIER, 2002, p.103)
Isso se perfaz em razão de que, como nessa época os manuscritos ainda eram
copiados, e como não havia pausas entre parágrafos ou distinção de letras, pudessem ajudar
o leitor, de forma substancial, na análise do objeto de leitura. Ou seja, exercia função
facilitadora do processo de leitura, já que a razão dos textos era a salvação da alma,
encontrado no Livro de Salmos, assim, dessa forma, não poderia haver dúvidas quanto à
interpretação de seu conteúdo.
Diante disso, nova mudança se acentua em relação ao ato de ler. Contrapondo-se à
Antiguidade Clássica, a ênfase agora é dada à leitura silenciosa.
Cavallo e Chartier entendem que a leitura de si mesmo é uma necessidade e não
incomoda os demais, além de assegurar melhor compreensão do texto. Assim a leitura
internalizada permitia que fosse feita análise mais profunda e completa do sentido do texto.
Dessa forma, para que uma leitura fosse de fato eficiente, devia haver um diálogo
entre leitor e escrito, "do mesmo modo que um homem é composto de corpo, alma e
espírito, o livro também tem de ser entendido do ponto de vista histórico, moral e místico"
(1997, p.113)
Toda essa prática de leitura era dominante, principalmente, no interior dos
mosteiros, em razão dos ofícios ou durante as refeições, por exemplo. Essa leitura
concentrada fazia parte de um processo de meditação durante o período escolástico.
Nesse contexto, a ordem era de que agregar conhecimento era mais importante que
sua compreensão. Entre os séculos XI e XIV as práticas de leitura se desvincularam do
método de "inculcação", até então praticados, e tornaram-se mais abrangentes. Agora, a
escrita, a alfabetização e a leitura tornam-se interdependentes e complementares entre si, e
o espaço escolar é tido como fomentador das práticas de leitura. Assim, em meados do
século XV o método escolástico sucumbe em razão dessa nova prática liberal.
3. Idade Moderna - século XVI ao XVIII
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A invenção da imprensa por Johann Gutemberg, na Inglaterra, em 1442, foi, sem
dúvidas, a mais notável transformação em nossa história cultural. Aperfeiçoar a prensa
agregou praticidade quanto à confecção do livro, feito, até então, artesanalmente.
Esse avanço tecnológico constitui-se de determinadas vantagens tais como: além
de preconizar a uniformidade de conteúdo, trabalha com o tempo de produção e custos
reduzidos, dessa forma, tem-se o consequente aumento da demanda do produto, que por sua
vez, estende-se aos consumidores de maneira bem mais acessível.
Vale ressaltar que a impressão, segundo Chartier (1998), ou seja, o livro "pós-
Gutemberg" tem suas origens nas estruturas fundamentais do códex, e que uma não
necessariamente, excluiu de modo imediato a outra. Diante disso, pode-se assegurar que
não houve uma ruptura, elas ainda coexistiram por muito tempo, em razão, por exemplo, de
haver textos proibidos, cuja regra de reprodução continuavam a ser as cópias manuscritas.
Nesse contexto, o livro tornou-se produto acessível contribuindo assim para o
aumento significativo do número de leitores. Essa nova classe, diferentemente daqueles
pertencentes a Idade Média, aos quais sucumbiam à leitura restrita e padronizada sem fins
de conhecimentos, agora leem para construir uma consciência crítica. De acordo com
Chartier (1998), essa é o postura do leitor denominado extensivo, aquele que lê por si, e que
atribui sentido de acordo com suas vivencias e conhecimentos internalizados.
4. Mundo Contemporâneo – século XIX aos dias atuais
A expansão das tecnologias digitais e das comunicações virtuais através
computador, permitiu a união de novos suportes de leitura ao formato do conhecido livro
impresso. No entanto, não apenas o computador evidenciou-se como nova fonte de
progresso na arte literata, novas alternativas como tablets, celulares, enfim, somaram-se a
esse processo de leitura.
Ler sobre uma tela não é o mesmo que ler um livro impresso. Segundo Chartier, o
texto eletrônico proporciona uma estruturação distinta daquela apreciada pelo leitor do rolo
da Antiguidade ou do leitor medieval, por exemplo. O autor considera ser possível a
interferência do leitor no conteúdo do texto, tornando-o um co-autor.
Nesse sentido, expõe:
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O fluxo sequencial do texto na tela, a continuidade que lhe é dada, o fato
de que suas fronteiras não são mais tão radicalmente visíveis, (...) o texto
que ele carrega, a possibilidade para o leitor de embaralhar, de
entrecruzar, de reunir textos que são inscritos na mesma memória
eletrônica: todos esses traços indicam que uma revolução do livro
eletrônico é uma revolução nas estruturas do suporte material do escrito
assim como nas maneiras de ler. (1998, p. 13)
Como pudemos constatar, antigamente, a leitura em voz alta era razão de
sociabilidade, seja voltada para o entretenimento ou para a aprendizagem escolar.
Posteriormente, a leitura silenciosa busca o conhecimento, a intimidade com o texto. Diante
disso, é evidente que as distintas práticas de leituras ao longo dos tempos, nos permitem
analisar o modo pelo qual se deu a formação do leitor. Os meios que o fizeram evoluir, que
o determinaram como crítico, que o instigaram a tornar-se dinâmico e inter-complementar
de um texto.
Ainda, pelos mais diversificados suportes ao decorrer da história, o volumen, o
códex, o livro e, de uma maneira generalizada, os atuais desenvolvimentos tecnológicos,
tem-se que não há que se falar de um em sentido de exclusão do outro. Todas as evoluções
coexistiram até que em determinado momento, a mais prática prevaleceu, ou seja, a
sociedade se encarregou de selecionar aquilo que era mais ágil as suas necessidades.
Desse modo, cremos que é possível olhar para os suportes de leitura como
vínculos harmoniosos que visam o bem estar e maior comodidade do leitor, elementos que
contribuem para a construção dos sentidos, atendendo as necessidades e interesses de cada
época.
Atualmente, notamos a passagem do livro impresso à tela, que possivelmente
também implica em outras recepções, produções, práticas e representações. Os textos, de
um modo geral, estão sendo adaptados às telas e sendo utilizados inclusive com outras
funções, por exemplo, os textos on line que nos possibilita sermos leitores e autores ao
mesmo tempo.
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Roger Chartier (2001), em Cultura Escrita, Literatura e História, nos fala da
influência da tecnologia nos hábitos de leitura e afirma que ainda utilizamos habilidades de
leitura do texto impresso nos textos em tela e afirma que deve ser dissipada a ilusão “de que
um texto é o mesmo texto embora ele mude de forma”. Diante dessa afirmação indagamos:
quais seriam as novas habilidades de leitura que um texto em tela pressupõe e qual o perfil
desse futuro, já presente leitor?
Pierre Lévy (1999) afirma que ler na tela e ler no texto são igualmente leituras, mas
discorre sobre como o ciberespaço pode modificar o comportamento do leitor diante do
texto em tela, por meio dos links, hiperdocumentos etc. Seriam, então, essas novas
ferramentas de leitura do texto on line que modificam as práticas, modos e representações
de leitura?
Em A aventura do livro: do leitor ao navegador, de Chartier (1998), temos acesso a
argumentos que nos mostram como a estrutura do texto modifica a recepção e produção
deles. Modifica-se o espaço, tempo de leitura, custo de produção entre outras esferas que
permeiam o campo da leitura.
Falamos em acesso ao computador, como possibilidade de aproximar o leitor dos
textos, mas também podemos indagar sobre a qualidade de leitura desse leitor diante do
computador. Para Magda Soares (2002), em Novas Práticas de Leitura e Escrita:
Letramento na Cibercultura, a leitura e a escrita, feita por meio da tela, implica em outra
forma de letramento. Ela levanta a hipótese de um “letramento digital” ao considerarmos as
possíveis “mudanças sociais, cognitivas e discursivas” que a leitura nesse suporte
proporciona. Letramento digital para Soares (2002, p.09) é entendido como “[...] um certo
estado ou condição que adquirem os que se apropriam da nova tecnologia digital e exercem
práticas de leitura e de escrita na tela, diferente do estado ou condição – do letramento –
dos que exercem práticas de leitura e de escrita no papel”.
Compreender as práticas de leitura que a escola tem diante dos textos em tela e sua
representação nos propicia enveredar para possíveis reflexões acerca do letramento digital.
Analisar quais os usos que os estudantes fazem da tela como prática de leitura e escrita
pode nos apresentar suas concepções de leitura e escrita dentro da “cibercultura”. Além
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disso, podemos observar em que medida esse universo pode interferir nas práticas
pedagógicas dos professores ou na relação de ensino-aprendizagem.
As escolas públicas de um modo geral têm recebido computadores instalados em
salas específicas para seu uso. O governo tem selecionado estagiários das próprias escolas
para atuarem como monitores dessas salas. Deparamos-nos, portanto, com possíveis novas
políticas públicas para apropriação desse suporte como instrumento de pesquisa e
aprendizado, que implica necessariamente em leitura e escrita. Apesar do surgimento dos
tabletes, ipad´s, priorizamos aqui o computador desktop como suporte principal, pois ainda
não é recorrente o uso desses outros suportes em escolas públicas.
Feitas as considerações acima, esperamos que os pontos arrolados, embora breves,
tenham sido suficientes para evidenciar o quão fecundos são os campos a serem explorados
no terreno da leitura e das novas tecnologias e o quão diversas são as formas de abordagem,
diversas, mas não menos importantes umas das outras.
É bom lembrar que a história da leitura e dos seus suportes, como também a da
humanidade de maneira geral, é história de adaptação, sempre. A rigor, não há nada que se
possa dizer completamente estranho, por mais que isso possa parecer; o que, na verdade, o
leitor faz
é reconhecer certas características, deduzir outras, empregar a
familiaridade que já possui, sua experiência de leitura pregressa,
num suporte que demandará novas reações. Ao explorar o novo
material e aplicar conhecimentos prévios, o leitor acaba por chegar
a uma nova forma de manipular (navegar!) o objeto novo, que
passa, então, a fazer parte de um universo de possibilidades que
jamais será fechado (RIBEIRO, 2011, p..131).
E nesse contexto, no espaço educativo, as práticas pedagógicas, estarão melhor
centradas, no momento em que for possível realmente “estar trabalhando na direção de
incorporar novos saberes/modos de conhecer (...) Desse modo, aqueles que fazem a ‘cultura
escolar’ devem refletir sobre como incorporar as novas tecnologias.” (GOULART, 2011,
p.55)
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Essa reflexão ganha contornos urgentes, se percebemos que, em pleno século XXI,
ainda é um desafio concretizar o que seria a missão básica da escola: formar cidadãos
autores de suas próprias leituras e da produção de seus próprios textos. (idem, ibidem).
Indubitavelmente, a questão dos suportes de leitura tem relevância no processo de
ensino/aprendizagem; contudo, tal discussão faz sentido, à medida que seja gerida
paralelamente à criação de “condições político-pedagógicas a professores e alunos para
viver com dignidade, criatividade, crítica, ética e responsabilidade social o exercício
cotidiano de ensinar e aprender”. (GOULART, 2011, p.56, 57).
Afinal, realmente, sabemos que o computador, por si só, não vai mudar a
Educação, não vai mudar as concepções de professor/aluno e ensino/aprendizagem, e
também “cada situação de aprendizagem requer uma estratégia diferente, e o computador
pode ser útil em várias dessas ocasiões, bastando para isso que o professor planeje
atividades, mais dirigidas ou menos, conforme o momento. (COSCARELLI, 2011, p. 27).
Não é o suporte, mas o uso que se faz dele. “Não basta trocar de suporte sem trocar nossas
práticas educativas, pois estamos apenas apresentando uma fachada de modernidade,
remodelando o “velho” em novos artefatos”. (CORRÊA, 2006, p.46).
Ou ainda,
Devemos construir uma nova articulação entre tecnologia e
educação- aquilo que chamaríamos de uma visão crítica, apesar do
desgaste da palavra “crítica”-ou seja, compreender a tecnologia
para além do mero artefato, recuperando sua dimensão humana e
social. As tecnologias que favorecem o acesso à informação e aos
canais de comunicação não são por si mesmas, educativas, pois,
para isso, dependem de uma proposta educativa que as utilize
enquanto mediação para uma determinada prática educativa.
(CORREA, 2006, p.46,47)
E tais práticas educativas, possibilitadas por essa nova tecnologia, trazem em seu
bojo o desafio de permitir, além da formação humana, a inclusão social; assunto que
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mereceria um tópico especial. Para o momento, acreditamos, cabe enfatizáramos os usos e
necessidades particulares que configuram esse novo suporte.
“Precisamos de uma nova forma de competência crítica, uma ainda desconhecida
arte de seleção e eliminação de informação, em síntese, uma nova sabedoria.” (SOARES,
2002, p.155)
Nesse contexto, na era digital que se desponta e se consolida, mais uma vez, e não
poderia ser diferente, a missão a ser cumprida tem de ser realizada a várias mãos; o
professor não pode ser visto como um ser isolado e nem tão pouco como o responsável
pelos problemas, ele não é o vilão do cenário, há questões bem abrangentes que permeiam
essa discussão, como bem pontua Coscarelli (2011, p. 31): “Aproveito para alfinetar a
universidade e os centros de formação de professores: o que têm feito para preparar os
professores para essa realidade?”. E muitas outras questões poderíamos também somar a
essas; e não se trata de defender a escola ou o professor, mas tão somente de ampliar a
visão em relação aos problemas que se delineiam.
Em favor disso, podemos citar, por exemplo, a investigação realizada por Santos
(2003), buscando esclarecer modalidades de uso da internet em situações de ensino
fundamental. Sua pesquisa revelou que
“os professores demonstraram interesse e vontade de inovar, mas estavam
de mãos vazias, sem instrumentos teóricos e empíricos para isso, de modo
que o uso da internet ainda é bastante limitado, embrionário e aquém das
possibilidades desse poderoso meio de comunicação e informação”.
(SANTOS, 2003, p.311)
E, ressaltamos, configura-se uma situação histórica na qual não é mais possível
falsear a Educação; os caminhos precisam ser repensados e planos traçados para que, mais
do que discutir conceitos e nomenclaturas, possamos refletir sobre meios para tornar a
escola um espaço que realmente esteja focado em ampliar as possibilidades dos leitores no
uso desse novo suporte, apontando meios para o enfrentamento pedagógico dessa questão e
alargando o universo das práticas sociais necessárias à vida em sociedade. Referimo-nos ao
dever da escola e nesse caso dos professores de, no processo de ensino/aprendizagem,
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articular as referências de mundo que os alunos já possuem com as novas referências,
oportunizando, assim, maior acesso a inclusão social e, consequentemente, maior acesso
aos bens culturais produzidos pela humanidade.
Considerações finais
A rigor, é necessário tornar os leitores/alunos manipuladores de textos e suportes,
exploradores de possibilidades. (RIBEIRO, 2011, p.135). Mesmo sendo fruto de tempos de
computadores e demais instrumentos de comunicação digitais e, principalmente da internet,
nossos alunos, mesmo dominando com maior naturalidade esses recursos, não prescindem
da figura do professor, que faça a mediação entre as informações veiculadas e os modos de
registrar e trabalhar, no sentido de organizar, todo esse arsenal a que serão expostos.
Quanto aos professores, há uma cobrança para que se adaptem a essa nova
realidade, uma cobrança que gera desconforto, na medida em que o seu aprendizado fora
baseado em outros recursos. O novo geralmente assusta, mas não podemos permitir que
numa sociedade em constante mutação, a educação permaneça estática, arcaica e avessa às
novas necessidades de seus atores.1
E a tarefa não é fácil. Realmente são muitas as angústias, as indagações, as dúvidas, os
medos, os anseios e os desejos. De nossa parte, colocamo-nos no mesmo patamar daqueles
que buscam respostas para as suas inquietações (O quê fazer? como fazer?) e vamos
erguendo castelos que ora parecem construídos em terra firme ora sobre areia movediça. E
a ciência é mesmo assim.
Referências
CAVALLO, Guglielmo; CHARTIER, Roger (Orgs.). História da leitura no mundo
ocidental. Trad. Fulvia Moretto, Guacira Machado e José Antônio Soares. São Paulo: Ática,
2002.
CHARTIER, Roger. Cultura Escrita, Literatura e História: conversas de Roger Chartier
com Carlos Aguierre Anaya, Jésus Anaya Rosieque, Daniel Goldin e Antonio Saborit.
Porto Alegre: Artimed, 2001.
1 Estamos nos referindo aos docentes, em sua maioria, que ainda são da mesma geração da década de 90, que
não conviveram com as TIC desde pequenos.
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_________. A Aventura do livro: do leitor ao navegador. São Paulo: Editora Ática, 1998.
CORRÊA, Juliane. Novas tecnologias da informação; novas estratégias de
ensino/aprendizagem. In: COSCARELLI, C. V. (Org.) Novas tecnologias, novos textos,
novas formas de pensar. Belo Horizonte: Autêntica, 2006, 43-50.
COSCARELLI, Carla Viana; RIBEIRO, Ana Elisa (Orgs.) Letramento digital: aspectos
sociais e possibilidades pedagógicas. Belo Horizonte: Autêntica, 2011.
GHAZIRI, S. M. Da leitura no impresso à leitura na tela: novas veredas para a formação
do leitor na escola. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Filosofia e
Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2008.
GOULART, Cecília. Letramento e novas tecnologias. In: COSCARELLI, Carla. V.;
RIBEIRO, Ana. Elisa (Org.) Letramento digital: aspectos sociais e possibilidades
pedagógicas. Belo Horizonte: Autêntica, 2011, p. 42-58.
LÉVY, P. Cibercultura. Tradução de Carlos Irineu da Costa. Rio de Janeiro: Editora 34,
1999.
RIBEIRO, Ana Elisa. Textos e hipertextos na sala de aula. In: COSCARELLI, C. V.
(Org.) Novas tecnologias, novos textos, novas formas de pensar. Belo Horizonte:
Autêntica, 2006, 85-91.
SANTOS, Gilberto Lacerda. A internet na escola Fundamental: sondagem de uso por
professores. Educação e Pesquisa. São Paulo. V.29. p.303-312. Julho/dez.2003.
SOARES, M. Novas Práticas de Leitura e Escrita: Letramento na Cibercultura. Revista
Educação e Sociedade, Campinas; v. 23, n. 81, p. 143 – 160, dez. 2002.