tambores de angola

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Tambores de Angola

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TAMBORES DE ANGOLA

MENSAGEM DO AUTOR ESPIRITUAL

Volto ativa novamente. Se bem no tenha dado ao luxo de ficar na inrcia deste lado de c. Aqui, igualmente, as notcias fazem ibope. Porem a temtica outra, que no aquela costumeira da velha Terra .

Os outros defuntos que compartilham comigo desta ventura quase nirvnica de viver deste lado do vu fazem tambm a sua notcia. Hoje, porm, tentarei falar de assuntos um pouco diferentes daqueles aos quais emprestara a minha pena quando metido nos labirintos da carne.

Como v, meu caro, se abandonei a o palet e a gravata de msculos e nervos, conservei, no entanto, o jeito prprio do escritor e reprter, agora, porem, radicado em outro mundo, quando dizia quando estava a. O bom agora que no me sinto mais escrever queles velhacos de colarinho engomado, que nos julgam pela forma ou gramtica, de acordo com os ditames das velhas academias da Terra. Igualmente, no tenho a obrigao, deste lado do tmulo, de me ater aos rigores das convenes dos escritores terrenos.

Estou mais solto, mais leve e mais fiel aos fatos observados.

Embora conserve os domnios de mim mesmo, a minha distinta e preciosa individualidade de morto-vivo metido reprter e escritor do alm, resolvi, por bem daqueles que me guardam na memria, adotar um pseudnimo para falar aos amigos que ficaram do lado de l do rio da vida.

Assim sendo, meu carssimo, enquanto emprestava sua mo para grafar meus pensamentos, que, desafiando todas as expectativas de meus colegas de profisso, teimam em continuar constantes, sem ser interrompido pela morte ou lanado s chamas do inferno, empresto-lhe igualmente as minhas pobres experincias, compartilhando com voc um pouco das histrias que almejo levar ao correio dos defuntos e dos que se julgam vivos.

Creio que ser proveitoso para ambos, o momento em que estaremos juntos. No mnimo, sentirei mais de perto o calor das humanas vidas, enquanto voc experimentar mais intensamente a presena de um fantasma metido reprter e comentarista do alm-tmulo.

Despeo-me, para breve retornar. Com o carinho de um amigo,

ngelo IncioPREFCIO

Para o bem no h fronteiras...

Num mundo onde a ignorncia e o sofrimento abrem chagas no corao humano, o chamado da espiritualidade ecoa em ns de forma a rasgar o vu do preconceito espiritual.

A seara, de extenso condizentes com as nossas necessidades de evoluo, espera coraes fortalecidas no propsito de servir sem distines.

A humanidade desencarnada, despidas de dogmas e limitaes, abre-se em realizao plena em favor daqueles ainda presos a conceitos inibidores da alma.

Pretos-velhos, doutores, caboclos, pintores, filsofos, cientistas e uma gama infinita de companheiro, chegam a ns demonstrando a necessidade urgente de fazer algo, movimentando em ns mesmos, em favor do prximo, os recursos que promovam a libertao das criaturas.

Ao abrir as pginas desta obra, encontrar coraes simples, annimos, porm envoltos pela fora da f no Criador e sinceramente no corao, em fazer o bem pelo bem.

Joo Cob

(Pai Joo)

FASCINAO

Abril de 1983. O sol se assemelhava a um deus guerreiro, lanando as suas chamas que aqueciam as moradas dos mortais, como dardos flamejantes que ameaavam as vidas dos homens. Fazia intenso calor naquele dia, quando o senhor Erasmino se dirigia para seu escritrio na avenida Paulista, que, nesse momento, regurgitava de gente, com seu trnsito infernal, desafiando a pacincia daqueles que se julgavam possuidores de tal virtude.

Desde muito cedo sentira estranhas sensaes que no sabia definir, embora houvesse gastado seu precioso fosfato na tentativa intil de encontrar explicao para o sentimento esquisito, para as impresses que tentavam domin-lo. Nunca se sentira desta forma e confessava a si mesmo que algo incomodava sobremaneira.

Quando sua me o aconselhou a rezar antes de sair, acabou ignorando-a, pois a velha, acostumada com certas posturas msticas, no fazia l seu gnero. A pobre me tentara de todas as formas convencer o filho desnaturado a se deter um pouco para conversar, para trocarem algumas impresses. Ele recusou terminantemente, alegando a escassez de tempo, em vista das atividades profissionais.

A cabea parecia rodopiar com a sensao de tontura que o dominava aos poucos. Eram impresses novas, diferentes daquelas consideradas normais at ento. Parecia pressentir vultos em torno de si, mas, no conseguindo precisar exatamente o que acontecia, tentou mudar de pensamento, em vo. Comeou a suspeitar que estava ficando louco ou, pelo menos, sofrendo de algum problema neurolgico, tais os sintomas que detectava em si.

J fazia algum tempo que no conseguia dormir direito, parecia acometido de pesadelos e passava a noite acordado, sendo obrigado, pela manh, a tomar algum medicamento, para conseguir trabalhar direito.

Sintomas de melancolia aliados a depresso sucediam-se o completavam-se para estabelecer o clima psquico adequado para a sintonia com mentes desequilibradas.

Erasmino foi-se desgastando psicologicamente pelo incomodo que sofria. Procurou mdicos e psiclogos, gastando muito dinheiro em tentativas que se provaram inteis em seu caso particular.

Aos poucos foi-se achando perseguido pelos colegas de trabalho. Em todos via adversrios gratuitos que, segundo suas suspeitas, o espreitavam para tentar de alguma forma e por motivo ignorado se livrar dele, tomar o seu lugar no emprego ou intervir em sua vida.

A psicose foi a tal ponto que mesmo em relao aos familiares pensou sofrer perseguio. No adiantavam os conselhos da me, e as sesses com o psiclogo j haviam terminado, sem se obter algum resultado mais definido.

Seguindo o conselho de amigos, comeou a freqentar lugares de suspeita moral, entediando-se com as aventuras sexuais, que, de pronto, tornaram sua vida um tormento ainda maior. Foi justamente a partir de tais aventuras que a problemtica comeou a piorar.

_ Erasmino! Erasmino!

Eram sussurros. A princpio distantes e depois mais constantes, em casa, no trabalho ou nas tentativas de diverso.

A noite parecia ouvir vozes que chamavam pelo seu nome. O desespero aumentou quando, determinado dia, ao levantar-se, deparou com um vulto de homem prostrado entrada de seu quarto. A viso se apresentava aos seus olhos estupefatos como sendo de um senhor idoso, todo envolto em roupas esfarrapadas e apresentando os dentes podres, em estranho sorriso emoldurando o rosto. Percebeu ainda, antes de desmaiar, o mau cheiro que exalava da estranha apario, causando-lhe intenso mal-estar.

Entre imagens de pesadelo e da realidade, pde perceber-se em ambiente diferente de onde se encontrava o seu corpo fsico. Parecia algo familiar. No era to desagradvel na aparncia, aquele lugar. As impresses estranhas que sentia vinham de algo que pairava no ambiente, talvez da atmosfera local.

Em meio a vapores que envolviam sua mente, quem sabe do prprio lugar onde se encontrava, percebeu estranha conversa.

Sentado em uma cadeira de espaldar alto, um esprito estava com algum que lhe parecia de certa forma familiar.

_ Ns o queremos exatamente como se encontra. Sua mente est confusa e no acredita muito em nossa existncia. Aos poucos vamos minando-lhe as resistncias psicolgicas, e o caos estabelecer-se-.

Gargalhadas foram ouvidas naquela situao e paisagem mental em que se envolvera. Tal pesadelo parecia no ter fim, quando se sentiu atrado ao corpo pelos gritos de algum.

Quando acordou, secundado pelos familiares aflitos, resolveu contar todo o tormento que vivia h alguns meses.

_ Procurei mdicos, psiclogos e at j fiz uso de alguns medicamentos, mas tudo foi em vo, nada surtiu efeito. Acredito que esteja louco, ou alguma coisa semelhante...

_ Que isso, meu filho? Falou me que tudo ouvia, desconfiada.

_ Parece at caso de mediunidade aventurou a irm.

Erasmino levantou-se furioso com as duas, pois no admitia a hiptese de alguma interferncia espiritual, a tudo julgando como produto de sua prpria mente.

Por mais que procurasse a causa dos males que o acometiam, no conseguia uma explicao lgica, racional.

Os dias se passaram, e o clima era de intranqilidade entre os familiares, devido atitude de Erasmino para com sua irm.

A tenso se estabelecera, em razo das dificuldades em solucionar o caso, que a cada dia parecia mais e mais complicado.

Novamente estava em casa, desta vez preparando-se para sair com alguns amigos, quando, ao entrar na sala, estranho mal-estar o dominou. Parou entre os umbrais da porta. Os amigos, que naquela ocasio j sabiam o que vinha ocorrendo, ampararam-no, conduzindo-o para o sof, providenciando uma bebida para que ingerisse, tentando amenizar a situao.

O efeito da bebida foi como uma bomba. Imediatamente tudo girou sua volta, e um torpor o invadiu de imediato, levando-o quase inconscincia. Comeou a gaguejar, no conseguindo coordenar as idias que lhe afluam cabea. Num misto de pavor e desespero, por desconhecer o que se passava com ele, tentava impedir que sua boca emitisse palavras que j no dominava mais. O transe estabelecido, ouviu sair de sua prpria boca, com entonao diferente da que lhe era prpria, as palavras nem tanto corteses:

_ Miserveis, miserveis!!! falava com estranha voz eu o destruirei, eu farei com que repare o mal que me causou continuava falando, transtornando a todos, que ouviam estarrecidos a voz diferente que saia de sua boca.

_ So todos covardes, tem medo de mim; no sabem o que pretendo nem quem eu sou? continuou a falar voz que fazia uso de suas cordas vocais, causando o desespero da famlia e dos amigos, que tentavam em vo cham-lo pelo nome, pretendendo acorda-lo do transe, sem ao menos saberem o que se passava.

Depois de muitas tentativas, prostrou-se, finalmente, ante os olhos aflitos de sua me e de sua irm, eu eram atendidas pelos amigos.

Olhos esbugalhados, Erasmino chorava como criana, pois conservara a plena conscincia do ocorrido, no conseguindo, no entanto, coordenar as palavras que lhe saiam da boca.

O que ocorreu depois foi um verdadeiro interrogatrio, que os amigos lhe faziam, enquanto a Sra. Niquita, sua me, corria chamando a vizinha para auxilia-la, pois nunca vira o filho em situao semelhante.

_ Sabe, D. Niquita, eu queria muito lhe falar desde h alguns dias, mas a senhora no me dava oportunidade.

_ Eu no sei o que est acontecendo com meu filho, D. Ione, ele est muito diferente, mas o que ocorreu agora foi o mximo que eu poderia agentar. Eu tenho medo do meu prprio filho. Imagine, como posso conviver com tudo isso? tudo to estranho que no me restou outro jeito seno recorrer a sua ajuda falou, chorando.

_ A senhora tem que ter muita f, pois o caso de Erasmino pode ser muito difcil. Eu acho que ele mdium e tem que desenvolver; por isso, ele est levando couro dos espritos. Olha, eu sei de casos em que a pessoa at chegou a ficar louca, por no obedecer aos guias. um caso muito srio.

_ Mas o que eu posso fazer para ajudar o meu filho? Ele no sabe mais o que fazer para ficar livre do problema. Est desesperado.

_ Faz assim, eu hoje vou l na sesso de Me Odete e falo com ela, quem sabe ela pode nos ajudar? Mais tarde, ento, ns duas vamos l e conversamos com ela juntas, talvez at Erasmino nos acompanhe e faa um tratamento l no centro.

_ Voc freqenta esse tipo de lugar? Como voc nunca me falou nada?

_ E a senhora no sabe? Eu sou mdium de bero, e olha que Me Odete me disse que eu sou daquelas bem fortes e que os meus orixs trabalham nas sete linhas.

_ Mas o que significam essas sete linhas? Eu no entendo nada disso.

_ Olha D. Niquita, eu tambm no entendo direito o que isso, no, mas que verdade, , pois Me Odete pessoa muito respeitada no meio e ela no iria mentir para mim. Agora, c pra ns, a senhora podia ir conversando com Erasmino, enquanto eu falo com minha Me de Santo, tentando convenc-lo a ir fazer uma visita l no terreiro. Assim, quem sabe ele melhora...

Durante uma semana Erasmino ficou com profunda depresso, precisando recorrer a medicamentos antidepressivos para tentar se reerguer.

Novamente foram consultados mdicos e um psiclogo amigo da famlia, que em vo tentou os recursos conhecidos para demover Erasmino daquele estado.

D. Niquita, mulher simples, fazia suas oraes rogando ao Alto que enviasse recursos. No sabia mais o que fazer para ajudar o filho, que sofria muito com as coisas estranhas que estavam acontecendo. A famlia se tornara um caos. O pobre filho corria o risco de perder o emprego e os amigos que j no apareciam como de costume. Orou durante noites seguidas, at que do Alto apareceram recursos, mas era necessrio que ela pudesse captar os pensamentos que lhe eram sugeridos.ME ODETE

Ione dirigiu-se a casa daquela que dizia ser a sua Me de Santo. Tentaria algo em benefcio de Erasmino.

Encontrou Me Odete em meio a um ritual de magia e resolveu esperar. Passou-se muito tempo, quando ento foi atendida pela mulher que se dizia conhecedora dos mistrios da vida e da morte.

_ Pois isso, Me Odete, eu queria muito ajudar essa famlia e resolvi recorrer a sua ajuda, a fim de fazer uma consulta para Erasmino. Quem sabe senhora no encontra um jeito para ajudar, eu aposto que caso de mediunidade...

_ Vamos consultar os guias, minha filha. Antes de ele vir aqui vamos fazer uma consulta e ver do que se trata. Voc sabe, s vezes tem casos que nem ns podemos resolver...

_ Como no pode? A senhora no dona dos espritos?

_ Dona? Eu apenas fao contatos com eles e eles me dizem o que fazer conforme o caso, mas dona eu nunca disse que era...

Feitos os preparativos, Odete sentou-se numa cadeira em volta de uma mesa com toalha branca, onde havia uma pequena peneira com conchas dentro e colares em volta. Uma pequena campainha foi acionada. Era o sinal de que Odete estava entrando em contanto com os espritos, seus guias.

Pronunciava palavras numa lngua incompreensvel para Ione, enquanto balanava a campainha. Juntou as pequenas conchas nas mos e jogou-as dentro da peneira.

Estranha sensao dominou as duas, enquanto Odete olhava o resultado da Ueda das conchas. Arrepios intensos percorriam os corpos das duas mulheres, enquanto estranha fora jogou Odete para longe da mesa, para espanto de Ione, que ficou extremamente assustada com o ocorrido. Nunca vira algo assim.

Quando Odete se disps a consultar os espritos sobre o caso de Erasmino, estabeleceu imediatamente a sintonia mental com o caso e atraiu para perto de si a entidade que acompanhava o rapaz.

O esprito aproximou-se com intenso magnetismo primrio, cheio de dio porque algum queria interferir no seu caso.

Tentou de todas as maneiras impedir que Odete participasse do andamento da questo em que estava envolvido com Erasmino. Para isso, utilizou-se de uma fora que se assemelhava sua prpria: os fluidos de Odete e de Ione.

Concentrou-se intensamente e, sugando as energias de ambas, logrou atingir Odete fisicamente e joga-la distante da mesa onde se encontravam as duas.

Foi o suficiente para espantar Ione e colocar fim tentativa. Odete, por sua vez, aconselhou que encaminhassem o jovem para outro lugar.

Existia, em outra localidade, um centro umbandista que era diferente do seu. Diziam que s trabalhavam com foras do bem, com energias superiores. Quem sabe no poderiam ajudar? Ela, afinal, no estava bem de sade e com muitas atividades por realizar, no conseguiria solucionar a problemtica.

Na verdade, o conselho foi uma confisso de sua prpria incapacidade para resolver o problema de Erasmino. Tinha medo. Nunca antes encontrara tanta energia como a que a atingira naquela ocasio. Fez de tudo para encaminhar Ione para outro terreiro.

D. Ione foi embora um tanto decepcionada com o ocorrido, mas de certa forma, ainda continuava querendo ajudar. Procurou o terreiro do qual ouvira falar anteriormente. Diziam que era diferente, mas no importava, iria assim mesmo. E foi o que fez.

Procurou se informar direito e assim que pudesse iria conduzir D. Niquita e Erasmino ao tal lugar. Com prudncia, freqentou algumas sesses antes de indic-lo amiga e, depois de algumas duvidas esclarecidas, resolveu ento indicar o caminho a D. Niquita e famlia.

Foi providencial o caso ocorrido com Odete e Ione. Muitas vezes, circunstancias adversas so emissrias de oportunidade de acerto encaminhadas s vidas das pessoas. Algumas investidas das sombras, ao invs de atrapalhar, costumam ser revertidas em benefcios, conforme as circunstancias.

UM RECURSO DIFERENTE Estvamos visitando um determinado posto de socorro deste lado da vida, em tarefa de estudo, quando nos foi permitido participar da equipe que ajudaria no caso de Erasmino. Tentaramos algo, visando ao reeqilbrio do rapaz, que era tutelado por bondosa entidade, que fora sua av na existncia fsica.

H muito desejvamos fazer estudos a respeito da obsesso e essa era a oportunidade que sempre quisemos ter. No a perderia em hiptese alguma.

Demandamos o lar de D. Niquita com a curiosidade que me era caracterstica, desde que me entendia por gente sobre a Terra, se bem que continue sendo gente, embora outra tem sido a minha residncia nessa nova etapa da vida em que me encontro. Sou agora uma alma do outro mundo, arvorando-se em comentarista e reprter do alm e do aqum, fazendo suas observaes, no como o fazia na crosta, mas agora sob uma nova tica. A tica espiritual.

Encontramos a casa de D. Niquita em intensa agitao, naquela tarde de sbado. A vizinha D. Ione, estava convencendo Erasmino a participar de uma sesso de terreiro, juntamente com duas amigas suas, pessoas extremamente msticas e com argumentos. Diante do desespero de todos, a sugesto foi aceita imediatamente, na esperana de resolver o problema de uma vez por todas.

O companheiro Arnaldo, que conduzia nossa equipe espiritual, falou-nos, sempre com sabedoria:

_ Estamos diante de um caso muito delicado e que requer firmeza por parte dos envolvidos. O nosso irmo Erasmino necessita urgentemente receber auxilio para o seu equilbrio espiritual. Encontra-se abatido psicologicamente e dessa forma, torna-se presa fcil nas mos de seu verdugo do passado, que apenas espreita o momento ideal para desfechar o golpe infeliz que poder levar o nosso amigo loucura definitiva. necessrio no entanto, que respeitemos os posicionamentos da famlia e principalmente o de Erasmino, esperando que ele tome uma posio mais decidida e crie ambiente mental propcio para que possamos interferir em seu beneficio.

_ Mas o que voc acha a respeito da tentativa da me e da vizinha de conduzi-lo a um terreiro de umbanda, para resolver o problema?

_ Tentaremos auxiliar como pudermos, conscientes de que a bondade divina se manifesta conforme os instrumentos de que dispe para trabalhar. No pelo fato de ir a um terreiro de umbanda que o nosso irmo no ser atendido convenientemente. No seu caso, talvez necessite realmente de um choque com vibraes mais intensas para acordar para os problemas da vida. Observemos primeiro e depois ajuizaremos quanto forma de auxiliar o companheiro.

_ Mas no seria mais conveniente induzi-los a procurar um centro de orientao Kardecista, em vez de um terreiro? perguntei curioso.

_ Nos terreiros umbandistas encontramos igualmente os recursos necessrios para atuarmos junto aos nossos irmos. Conheo pessoalmente espritos de extrema lucidez que militam junto aos nossos irmos umbandistas, no servio desinteressado do bem. Os problemas que s vezes encontramos no se referem a Umbanda propriamente como religio, mas desinformao das pessoas, ao misticismo e falta de preparo de muitos dirigentes, o que alias, encontramos igualmente nas casas que seguem a orientao Kardecista.

No se devem confundir as pessoas mal intencionadas, os mdiuns interesseiros com a religio em si. Em qualquer lugar onde as questes espirituais so colocadas como uma forma de se promover, tirar proveito ou manipular a vida das pessoas, envolvendo o comercio ilcito com as esferas invisveis, ocorre desequilbrio e atrada a teno de espritos infelizes.

A Umbanda inspira-nos profundo respeito pelos seus ideais; trabalhemos para que alcance um grau de entendimento maior das leis da vida e que os seus orientadores espirituais encontrem medianeiros que lhes entendam os propsitos iluminativos. Deixemos de lado quaisquer preconceitos e tentemos auxiliar como pudermos.

Calei-me ante as palavras do companheiro espiritual e comecei a rabiscar algumas anotaes que se pareciam de grande utilidade.

Acredito que, a partir daquele momento, eu havia comeado a ter uma nova viso do que se chamava de mistrios da Umbanda e minha viso da vida comeava a modificar-se. Estava acostumado a determinados pontos de vista e me fechava a outras formas de manifestaes religiosas que no aquela que conhecera como sendo a verdadeira. Antes de desencarnar eu tivera contato com a Doutrina Esprita e por influencia de um amigo, pude beber-lhe dos ensinamentos que afinal, muito me auxiliaram quando cheguei aqui, deste lado. Mas no Brasil, existem outras expresses religiosas que tem como base o mediunismo e foi a partir dessa experincia que resolvi ditar algo a respeito. Quem sabe outros como eu, embora a boa inteno no se conservavam com o pensamento restrito, julgando-se donos da verdade? E quem sabe no desconheciam a verdadeira base da Umbanda, como tambm a de outros afros e por isso mesmo os julgavam ultrapassados, primitivos ou coisa semelhante? Afinal, eu no poderia deixar passar aquela oportunidade que para mim, seria de intenso trabalho e aprendizado e quem quisesse poderia se beneficiar de alguma forma com os meus apontamentos. Afinal, eu no havia deixado na sepultura a minha vontade de aprender e a minha curiosidade, s quais devo os melhores momentos que tenho passado no meu mundo de alm.

O final de semana transcorreu com a famlia de Erasmino muito preocupada quanto melhora dele, pois ainda no conseguira sair do abatimento a que se entregara.

Chegamos prximo cama onde ele se encontrava, perdido em suas preocupaes intimas e Arnaldo convidou-me a observar com ateno a regio cerebral de Erasmino.

Acheguei-me por detrs dele e o que vi era um misto de beleza e terror.

Seu crebro parecia uma usina eltrica com imensas reservas de energia que brilhavam em cores variadas, semelhana de luzes multicoloridas na noite de uma cidade grande. Mas, enlaada no crtex cerebral, uma rede tenussima de filamentos fludicos estava presa como se fosse uma teia de aranha que pulsava, envolvendo o centro cerebral, variando a sua tonalidade entre prateado e negro.

Assustado e ao mesmo tempo maravilhado com o que observava, olhei para Arnaldo, que me socorreu imediatamente com a explicao:

_ O nosso amigo encontra-se sob a influencia de entidade espiritual que, de certa forma, entende de mtodos de influenciao mais aperfeioados no campo do magnetismo. Essa malha magntica que envolve o crtex cerebral responsvel pelas imagens mentais que o atormentam constantemente, alm de promoverem a recordao constante de situaes vividas em seu passado espiritual, apesar do cuidado de seus verdugos desencarnados para que isso se d de forma lenta causando o sentimento de angustia e os ataques de depresso, inexplicveis para os mdicos e psiclogos que o atenderam. Mas no somente isso que o atormenta. Observe com mais detalhe o companheiro.

Agucei mais a viso espiritual e pude perceber que da rede magntica partiam delicados fios, invisveis para os encarnados, que se juntavam na regio do plexo solar e se uniam aos feixes de nervos, alastrando-se em varias regies do sistema nervoso. Alm disso, pude observar imensa quantidade de larvas astrais que, em comunidades pareciam absorver-lhe as energias vitais.

_ Essas comunidades de parasitas falou Arnaldo so as responsveis por seu estado debilitado. Atuando com voracidade em seu duplo etrico, absorvem-lhe as reservas de energia, desestruturando-lhe tambm emocionalmente, tornando-o facilmente influencivel por seus perseguidores. Com o sistema nervoso abalado, em virtude dessa influencia, levada a efeito pelos filamentos que se interligam no plexo solar, Erasmino um canal perfeito para a atuao de espritos que guardam desequilbrios semelhantes.

_ Mas ento ele mdium? perguntei.

_ Como no? Ou desconhece o fato de que todo ser humano o de alguma intermedirio das inteligncias desencarnadas? O que acontece que muitos julgam mediunidade apenas as questes relativas ao fenmeno mais aflorado, mas segundo a concepo esprita, todos so invariavelmente mdiuns, pois de alguma forma, o homem sempre sofre as influncias externas ou influencia algum. No caso presente, podemos ver a mediunidade do nosso companheiro se manifestando de maneira desequilibrada, por um processo doloroso que chamamos de obsesso.

_ E se ele desenvolver a mediunidade como alguns aconselham, ser que os problemas passaro?

_ Esse conselho muito utilizado por pessoas que no tem o conhecimento estruturado em bases eminentemente Kardecista, embora em muitos centros ditos espritas vejamos constantemente alguns dirigentes induzirem certas pessoas portadoras de determinados desequilbrios a desenvolverem a mediunidade. Mas todo cuidado pouco. Nesses casos, a prudncia aconselha que se faa um tratamento espiritual, com a afirmao de valores morais slidos, a fim de que o companheiro possa se fortalecer espiritualmente. um irmo enfermo espiritualmente e sua mediunidade guarda a caracterstica de ser atormentada por espritos que querem se vingar de um passado em que tiveram experincias em comum. No se deve desenvolver algo que est enfermo. preciso se reequilibrar para depois se atender ao compromisso assumido na rea medinica, se que ele realmente existe.

_ Mas no podemos fazer alguma coisa para tirar essa influencia que atua sobre ele?

_ No to fcil assim, meu amigo ngelo. De nada adianta retirarmos esses fluidos que se entrelaam no crebro dele, para depois retornarem sob a ao desses espritos, pois eles s conseguem essa influncia porque eles conseguem sintonia com a mente invigilante de Erasmino, com seu passado e com sua insistncia em manter-se nos mesmos padres mentais de seus perseguidores. necessrio que ele desperte para a urgncia da mudana ntima, elevando seu padro vibratrio, a fim de se desligar dessa influenciao daninha. E, para, isso, a Umbanda, com seus rituais e mtodos prprios, ser excelente instrumento de despertamento do nosso irmo. Ele encontra-se com o pensamento muito solidificado em suas prprias concepes de vida e, como voc v, no se encontra sensvel aos apelos mais sutis do Espiritismo, que, no momento propcio, dever falar-lhe a razo. Ademais, a famlia guarda certos pendores paras as manifestaes de mediunidade tal como se do na Umbanda, e convm no violentarmos os nossos irmos. Procuremos ajudar conforme formos solicitados, e a bondade divina haver de conduzir cada um ao seu lugar na grande famlia universal que somos todos ns.

O REDUTO DAS TREVAS

Fizemos uma prece junto a Erasmino e aplicamos-lhe um passe calmante, proporcionando-lhe momentos de mais tranqilidade, at que pudssemos socorrer-lhe mais detidamente.

Nesse meio tempo, a sua genitora parece ter-nos captado a presena e recolheu-se em prece, mentalizando a imagem de Nossa Senhora das Graas, rogando-lhe as bnos para o filho. Suave luz envolveu-lhe o semblante e, juntando-se as energias de Arnaldo, projetou-se sobre a fonte de Erasmino, que adormeceu suavemente.

Observei novamente extasiado o que acontecia diante de meus olhos. Enquanto o corpo do moo se encontrava estendido em sua cama, desdobra-se diante de ns, o esprito dele que, meio atordoado no conseguia divisar-nos a presena. Parecendo um rob, dirigiu-se a esmo para rua como se fosse teleguiado por foras desconhecidas, embora se mantivesse ligado ao corpo fsico por um cordo fludico finssimo, de cor prateada.

Acompanhamo-lo. Seguia por regies inspitas da paisagem espiritual, parecendo dirigir-se a lugar conhecido.

Avistamos ao longe um edifcio construdo com matria astralina e portanto invisvel aos olhos comuns dos homens encarnados.

Muitos pensam que, deste lado da vida, tudo apenas nevoa ou nuvens que pairam pelo espao em meio a fantasmas errantes. Enganam-se. Desafiando a pretensa sabedoria de muitos pseudo-sbios e religiosos do mundo, a vida continua estuante com muitas vibraes ou dimenses que aguardam ser devassadas pelo homem do futuro, para sua elevao espiritual. No mais continentes a serem descobertos, nem paises a serem conquistados, mas um mundo todo diferente em se tratando da matria que o constitui. E falamos matria porque aqui tambm a encontramos, mas vibrando em estados diferentes da matria fsica. Pode-se, quem sabe, cham-la de anti-materia, anti-atomo, anti-eletron. Mas o que importa no so as denominaes ou os vocabulrios j h muito obsoletos com referencia s manifestaes da vida no universo, mas a realidade desta mesma vida eu, para ns, os desencarnados ou os defuntos como somos muitas vezes chamados a pelos colarinhos engomados segue sempre sendo um mundo vibrante com suas construes forjadas na matria sutil do nosso plano ou dimenso. Essas construes encontram-se espalhadas por muitos lugares do Plano Astral e muitas vezes se justapem s construes fsicas que vocs fazem a.

Esse prdio que avistamos fugia ao que comumente se espera de uma construo desse tipo, utilizada para a finalidade que seus habitantes desencarnados o usavam. Geralmente se espera que espritos atrasados habitem regies negras com cheiro cido e com muita sujeira, o que refletiria seu estado ntimo de desequilbrio. Mas at eu me enganei. Embora a paisagem externa no perdesse para as melhores descries de Dante, em sua Divina Comedia, a imponncia do prdio desafiava os melhores arquitetos da Terra e a perfeio de seus detalhes certamente faria inveja aos amantes das aparncias exteriores.

Com a presena de Arnaldo, segui atrs de Erasmino, que se dirigia para o que se poderia chamar de andar trreo do portentoso edifcio. No sabia direito para onde nos dirigamos quando Arnaldo veio com a explicao.

_ No se preocupe, estamos sob o abrigo do bem. Aqui neste prdio posso afirmar que estudam as mesmas foras e energias que ns estudamos. Entretanto, empregam-nas em sentido contrario. A nossa presena no ser percebida, pois mesmo sendo desencarnados como ns, os seus habitantes e trabalhadores, se assim podemos cham-los esto com as mentes embotadas por vibraes infelizes, especializando-se em formas de ataques mentais ou magnticos, para atuarem contra seus irmos encarnados, portanto, permanecem em vibrao diferente da nossa, no nos podendo perceber a presena espiritual. Continuamos invisveis para eles, como para os encarnados. Tudo questo de se compreenderem as dimenses espirituais.

Adentramos a construo atrs de Erasmino, que permanecia sob o domnio de alguma fora misteriosa.

Tudo era limpo. O cho em que pisvamos era de material semelhante ao granito, conforme observara na Terra. Um balco iluminado funcionava como recepo, onde o esprito de uma mulher, de aparncia jovem, recebia outros espritos que ali chegavam com objetivos que eu, no momento nem imaginava. Era a imagem do luxo exagerado. Luminrias pendiam do teto em cores variadas, parecendo cristais. Espritos iam e vinham em varias direes. A cena era de difcil descrio, pela riqueza de detalhes. Alguns desses espritos estavam vestidos conforme o figurino de homens finos do sculo xx, trazendo no semblante a arrogncia de certos magnatas que pude conhecer quando encarnado. Outros se mostravam em trajes de pocas variadas, como se encontrassem ali personagens de tempos histricos diferentes; e outros ainda nem to arrumados assim, mas pareciam seres trevosos, com aparncias terrveis, que, caso se mostrassem aos encarnados, certamente causariam pavor. Era toda uma populao de almas do outro mundo ou deste mundo, que entravam e saam do prdio.

Olhando por aquilo que julguei serem vidraas, pude ver que do lado de fora, intensa tempestade se fazia, dificilmente podendo observar o ambiente externo.

Em frente a algo que se parecia um elevador, havia uma inscrio em vrios idiomas: AQUI TEMOS TODAS AS POSSIBILIDADES DE EXECUTAR SEUS PLANOS DE VINGANA. O DIO E O DESESPERO SO AS FORAS QUE UTILIZAMOS PARA CONDUZI-LO AO SEU OBJETIVO. POR FAVOR, PROCURE NA RECEPO A INFORMAO ADEQUADA PARA O SEU CASO E CONTE COM NOSSO SISTEMA, POIS ELE NUNCA FALHA.

E abaixo da inscrio estava assinado: OS MAGOS DA MENTE.

Todo aquele conjunto arquitetnico fora ento elaborado com a finalidade de abrigar espritos dedicados a planos funestos de vingana. Era toda uma organizao das trevas, com os requintes da modernidade, da tecnologia e os demais recursos que o homem encarnado conhecia na atualidade, mas que certamente iriam alm, com possibilidades que ns mesmos desconhecamos.

Entramos no elevador ou algo parecido, acompanhando o esprito desdobrado de Erasmino, que permanecia sob domnio invisvel. Subimos vrios andares e paramos em local desconhecido, onde havia nova placa com os dizeres: ALA DE CIENCIAS PSICOLOGICAS.

Seguimos Erasmino por extenso corredor, por onde trafegava grande quantidade de espritos, enquanto outros esperavam sentados porta de algumas salas, como se esperassem para ser atendidos. Havia placas de SILENCIO em varias portas como se fossem consultrios de moderno edifcio. O moo desdobrado parou mecanicamente em frente a uma porta, que se abriu assim que ele chegou. Entrou silencioso e ns o acompanhamos.

A sala era imensa, consideradas as propores de outras semelhantes na Terra, com decorao esmerada e uma luminosidade avermelhada envolvendo todo o apartamento. Mveis modernos foram moldados na matria astral, de maneira a lembrar um consultrio de psicanlise da Crosta.

Sentado atrs de algo que se afigurava uma escrivaninha, estava um esprito de aparncia grave, estatura alta, trajando um moderno terno preto que, se visto por algum da Crosta, seria considerado de extremo bom gosto. Era um perfeito gentleman, como o chamariam os encarnados.

Em frente a ele, sentado numa cadeira de recosto, um velho, no to arrumado como o outro, aparentando mais ou menos sessenta anos de idade e mais ao fundo, dois outros espritos de aparncia jovem, impecavelmente trajados com cabelos longos presos atrs, formavam o grupo que ali encontramos.

Tudo me parecia muito estranho, mas Arnaldo pediu-me para observar apenas, pois mais tarde teramos como retornar ali para realizar alguma tarefa que teria relao com o caso.

_ Eis nosso pupilo falou o esprito que parecia comandar a situao. Veja como obedec-nos a influencia. Aos poucos, ir se submetendo ao nosso domnio, at que esteja totalmente nossa merc.

_ Mas vocs iro acabar com ele para mim. Esse miservel no me escapar e espero que tenham condies de fazer o mesmo com aquela bruxa velha que se diz ser me dele falou o outro esprito que parecia mais velho, o responsvel pela desdita de Erasmino.

_ Claro, claro redargiu o outro afinal voc nosso cliente e aqui ns no brincamos em servio. V meus dois amigos ali? apontou para os dois espritos que se mostravam mais jovens. So meus melhores magnetizadores. Elial e Dario. So na verdade, dois excelentes psiclogos e conhecem a fundo os problemas da alma humana. Trabalham diretamente sob o comando central. Veja como atuam e se certifique de que ns cumprimos o que prometemos.

Ainda quando falava, os dois espritos conduziram Erasmino at um div e o fizeram deitar-se. Elial postou-se a um lado, enquanto Dario localizou-se num pequeno assento prximo cabea de Erasmino. O primeiro aplicava-lhe intensas radiaes magnticas na regio do bulbo raquidiano e o outro falava mansamente com um tom montono:

_ Erasmino, Erasmino. Voc ouve apenas a minha voz. Sinta-se em casa, sereno e tranqilo. Sua mente agora a minha mente, seus pensamentos, os meus pensamentos. Voc est cada vez mais sob o meu domnio. Voc est aos poucos perdendo a identidade. Mergulha no passado. No se encontra mais no presente...

Aos poucos, a entidade projetava sobre Erasmino intenso magnetismo, enquanto continuava:

_ Volte ao passado. Volte ao passado. Volte. Volte. Voc est cada vez mais retornando, em outro tempo, outra poca. Lembre-se, voc no se chama mais Erasmino. Seu nome outro. O tempo outro. Estamos em seu passado.

Cenas singulares se desenrolaram, ento. Envolvendo as entidades magnetizadoras, como numa projeo hologrfica, foram se passando cenas e mais cenas, como num filme, mas em sentido contrario. Parecia que estavam mergulhando em memrias do tempo e em todas essas projees que, como uma nevoa, os envolviam, podia-se ver a figura de Erasmino, em varias situaes. Sua mente parecia irradias estranhas vibraes. Contorcia-se sob o poder magntico daqueles espritos, que continuavam sua estranha tarefa:

_ Voc est bem. Muito bem. Mantenha-se agora fixo nessas recordaes. Depois ns iremos mais longe no tempo. Voc se manter nesta situao. Est sob o domnio de nossas vozes...

Os espritos que observavam de longe sorriam, parecendo satisfeitos com o que acontecia.

Ouvimos o dirigente das trevas falar:

_ Temos aqui os modernos recursos de fazer qualquer retornar ao seu passado. Mas no podemos fazer milagres. Temos que ir devagar. Um pouco em cada sesso. Depois que for despertado todo o seu crime, ele estar irremediavelmente em nossas mos. Por ora o ligaremos a alguns fatos desagradveis de seu passado mais recente. Depois, atravs da induo, estar em suas mos. Ns o entregaremos a voc, como nos encomendou.

A um sinal seu, os dois magnetizadores interromperam a estranha terapia do mal. Continuou:

_ Como sabe, nosso trabalho tem um preo.

_ Sim! Sim! Eu sei e estou disposto a tudo para me vingar...

_ Pois bem! Voc tem muitos contatos entre os do submundo e ns temos interesses em comum...

As entidades diablicas discutiam planos de destruio e interferncia no progresso individual e coletivo.

Dario, esprito de aparncia jovem, bem apresentado, olhos azuis intensos e sorriso largo, a um sinal do chefe, conduziu Erasmino para fora daquele prdio, levando-o para outra ala.

Acompanhando-os, entramos em outro ambiente; estava escrita a seguinte frase no portal de entrada: ALA DE IMPLANTES E CIRURGIAS.

Olhei para Arnaldo e a um sinal seu, permaneci calado, observando.

Diante de nossa viso espiritual, surgiu um estranho laboratrio naquela construo das sombras. Aparelhos estavam espalhados por toda a ala, dispostos de maneira extremamente organizada. Espritos vestidos de branco, parecendo enfermeiros e mdicos, transitavam entre a aparelhagem, em perfeita disciplina e silencio. Parecendo um moderno computador, estava sobre uma mesa, um aparelho que mostrava contornos de um corpo humano em trs dimenses e mais afastadas varias macas, o que sugeria uma sala de cirurgia.

Erasmino, esprito que fora para l conduzido, como hipnotizado, sob o domnio de Dario, deitado sobre a maca em decbito ventral, esperava a interveno diablica dos espritos trevosos. A organizao era levada ao Maximo de importncia.

Um dos espritos vestidos de branco aproximou-se de Dario e aps trocar breves palavras, dirigiu-se ao que se assemelhava a um computador. Falando algo por uma espcie de microfone, recebeu as informaes de que necessitava, enquanto a imagem hologrfica de Erasmino aparecia diante de si. Era a extrema tcnica a servio das trevas.

Dirigiu-se, ento, para a maca onde o esprito desdobrado do rapaz se encontrava e comeou uma estranha cirurgia. Pequeno aparelho foi implantado em determinada regio do crebro perispiritual e Erasmino, para produzir impulsos e imagens mentais, caso a pratica de induo falhasse. Eram extremamente rigorosos em suas realizaes e no cometiam nenhuma imprudncia. Tudo previram naquele caso doloroso, mas no sabiam da nossa presena no local, por estarmos em vibrao mais elevada. Seus aparelhos no captavam nossa presena espiritual, nem eles tinham condio de detectar nossa vibrao, por se localizarem em faixa mental inferior, com objetivos ignbeis. As artimanhas das trevas poderiam ser consideradas perfeitas, no fossem suas reais intenes.

Dario falava com o medico das trevas, com voz pausada e educao esmerada. Aps a cirurgia, que no durou mais que alguns minutos, Erasmino foi liberado pela falange do mal, que permanecia em colquio sombrio.

Enquanto conversavam, Erasmino foi retornado pelo mesmo caminho de onde viemos, e acompanhamo-lo de volta, anotando todos os detalhes da situao. Deixamos as perversas entidades no seu estranho concluio, e segui calado o companheiro Arnaldo, que me falava:

_ V, meu amigo, como os espritos trevosos so organizados? Neste prdio, encontra-se um dos postos mais avanados das sombras. Nele trabalham cientistas que se especializaram em doenas virticas, em epidemias e processos requintados de interferncia nas estruturas celulares dos irmos encarnados. Outros, psiclogos, psiquiatras e psicanalistas, os quais, como estes que presenciamos, so especialistas nas questes da mente, nas modernas tcnicas de ficoterapia, com objetivos diablicos, pretendendo atuar diretamente nas mentes de dirigentes mundiais, em pessoas que ocupam cargos importantes no mundo terreno, em religiosos, pastores e dirigentes espirituais, pelo uso do magnetismo, que sabem manipular com maestria. Toda essa organizao utiliza os modernos mtodos desenvolvidos na Terra. Entretanto, fazem-no para prejudicar, atrasando o progresso da humanidade, pois sabem que bem pouco tempo lhes resta para continuarem com seus desequilbrios, espalhando a infelicidade na morada dos homens: em breve podero ser banidos da psicosfera do planeta e no ignoram o destino que podem ter. Os espritos infelizes que lhes contratam os servios especializados, se mantm a eles ligados por processos que no compreendem, pois eles mesmos se enganam com o poder ilusrio que julgam possuir. Tentam fazer-se deuses e so, na verdade, apenas homens, embora desenfeixados do corpo carnal.

_ Mas eu no esperava que estes espritos fossem to requintados em suas aes e mtodos... falei para Arnaldo.

_ Muitos pensam, inclusive os espritas, que as entidades das trevas so espritos que pararam no tempo e que se utilizam ainda de mtodos antiquados de domnio, quais os que se utilizavam na Idade Media da Terra, ou nas civilizaes mais antigas que desapareceram ao longo dos sculos.

No entanto, podemos observar que tais criaturas infelizes, como os homens na Crosta, se disfaram sob o manto enganador das aparncias, das construes suntuosas, sob o abrigo da vaidade e do orgulho mal dissimulados e, como os homens terrestres, guardam sob essa aparncia a sordidez do carter inferior, a servio de intenes inconfessveis.

Tambm as foras das trevas tm o requinte da civilizao.

Calados, seguimos Erasmino de volta ao ambiente domestico onde repousava seu corpo fsico. De olhos esbugalhados, aproximou-se do veiculo de carne e justaps-se a ele, embora permanecesse entre o sono e a viglia.

_ Temos que conduzi-lo imediatamente a tratamento - falou Arnaldo.- Teremos que procurar ajuda em mais de um lugar. Por enquanto, os danos so reversveis, mas teremos que apressar a ajuda.

Oramos juntos e partimos para outros stios procura de socorro.

PRIMEIROS CONTATOS

Dona Niquita resolveu procurar orientao na tenda de Umbanda que Ione freqentava. Embora um pouco apreensiva, pois achava Ione um pouco mstica, no conhecia outra maneira de ajudar seu filho. Venceu as primeiras barreiras criadas pela desinformao e ps-se a caminho.

A tenda umbandista ficava do outro lado da capital, em bairro afastado da regio central. D. Niquita nem ao menos viu o barulho e a confuso do transito, tais as suas preocupaes. Ia acompanhada de Ione, que falava o tempo todo, como se quisesse catequizar a companheira e torna-la umbandista tambm. D. Niquita no estava interessada em outra coisa diferente da melhora do filho. Para ela nada mais importava. Estava disposta a tudo e como boa catlica que era, estava armada com o seu rosrio e uma dezena de nomes de santos na cabea, rezando a Salve-Rainha e dirigindo-se a uma tenda para falar com os guias, como Ione chamava os orientadores espirituais da religio, Umbanda.

Um mistrio envolve de tal forma essa manifestao religiosa que se torna difcil para o leigo saber a sua origem e o seu significado. Seus rituais tornaram-se to misteriosos que os brasileiros com o seu misticismo natural, foram explorados por aqueles que nenhum escrpulo tinham em relao f alheia. Mas essa no caracterstica da Umbanda. Por todo lugar onde h o sentimento religioso, manifestam-se pessoas inescrupulosas, que abusam da f alheia. Protestantes, catlicos, espritas, espiritualistas, esotricos e tambm umbandistas no esto livres do comercio e do abuso das almas alucinadas. Mas, no Brasil, essa terra abenoada onde as pessoas preferem julgar antes e talvez, conhecer depois a Umbanda, por se manifestar, na maioria das vezes, para aqueles possuidores de umas almas mais simples, de uma f menos exigente que os tornam vitimas dos pretensos sbios e donos da verdade, recebeu uma marca, um rotulo, que aos poucos, somente aos poucos vai-se desfazendo. Isso ocorreu tambm devido s manifestaes de sectarismo religioso, antifraterno e anticristo de uma minoria, o que gerou o preconceito contra os rituais da Umbanda, seu vocabulrio, suas devoes.

Esse preconceito meio velado que fazia D. Niquita armar-se contra tudo. Preparou o talo de cheques, pois ouvira falar que nestes lugares se cobrava e muito para realizar um trabalho, quem sabe algum despacho ou eb, como ouvira algum dia na televiso. Mas bem que tinha uma certa inclinao para essas coisas. Embora fosse catlica apostlica romana, de vez em quando recorria s rezas, aos benzimentos e a outras possibilidades que Ione lhe ensinava, mesmo porque Ione uma mdium muito forte, s no desenvolvida. Mas o que importa? Mdium mdium, pensava ela em sua ignorncia das coisas espirituais.

Dentro do carro, olhava para Ione meio desconfiada, imaginando encontrar no centro toda uma parafernlia de instrumentos de culto, animais para serem mortos, velas e defumadores, cnticos estranhos e muita cachaa; afinal, no era assim que falavam nos comentrios de televiso e no era assim que a caridade do povo se referia ao culto? Talvez encontrasse tambm um povo esquisito, vestido com roupas espalhafatosas, com imensos colares extravagantes pendentes no pescoo e fumando charutos.

_ Ai meu Deus! Deixou escapar D. Niquita. Onde me meti?

_ O que foi que a senhora disse, D. Niquita? perguntou Ione, que se distrara.

_ Tudo bem! Tudo bem! Eu fao tudo por meu filho. Estava apenas rezando sozinha mentiu.

Aproximaram-se do local que tinha aspecto agradvel e era localizado em rua arborizada. Antes de chegar, pde ver muitos carros parados em frente a uma casa de aspecto simples, mas de bom gosto. Pararam o carro e desceram. D. Niquita conservava-se pensativa e esperava ver a multido de gente esquisita entrando escondida em algum lugar escuro e de aspecto diferente.

Esta foi a sua primeira decepo. Deparou com pessoas alegres, joviais, efusivas. Foi recebida com imenso carinho, enquanto Ione a apresentava aos amigos que lhe cumprimentavam com um sarav, frase caracterstica de nossos irmos umbandistas.

Adentrou a casa ou tenda, como era chamada pelos freqentadores; ento teve mais uma surpresa e quem sabe uma decepo..

Nada de ambiente escuro, malcheiroso nem de pessoas diferentes. Encontrou pessoas normais. To normais quanto ela mesma. Sorridentes, porm, respeitosas pelo ambiente onde se encontravam. O cheiro de rosas e outras ervas que no pde identificar enchia o ambiente de um agradvel odor, que lhe fazia imenso bem. Foi acalmando-se intimamente. O efeito das ervas aromticas foi aos poucos estabelecendo aquele estado ntimo de intensa tranqilidade.

Cheiro suave e agradvel. Nada do que imaginara anteriormente.

O salo era de uma simplicidade que desafiava tudo que pensara antes. Havia cadeiras dispostas com regularidade para a assistncia; ao fundo, uma mesa que servia de altar, com uma imagem de Jesus de Nazar, duas velas acessas ao lado e copos com gua formavam a maior parte dos utenslios do culto. Tudo simples. Muito simples.

Entre o altar e a assistncia havia uma diviso com um espao relativamente grande, que D. Niquita no sabia para que servia. Ela, porem, estava desarmada, decepcionada com a simplicidade do ambiente.

Ione aproximou-se de D. Niquita e conduziu-a para outra repartio da tenda, um pequeno cmodo onde ela seria entrevistada por um companheiro da Casa.

_ No me deixe sozinha, pelo amor de Deus!

_ Que isso amiga? Fique tranqila! S vamos anotar-lhe os dados para registro.

Entraram no pequeno aposento e pde notar uma escrivaninha com duas cadeiras em frente e um retrato fixo na parede dos fundos. Era de um preto velho, simptico e sorridente, que olhava para o alto como se estivesse fixando as nuvens num cu de anil.

Um senhor a atendeu com expresso de carinho e perguntou-lhe:

_ a primeira vez que vem a uma tenda de Umbanda?

Olhando para Ione, demorou a responder:

_ Sim! Claro! A minha amiga me convidou, sabe? Eu estou com uns probleminhas. Na verdade no sou eu, o meu filho, sabe?

_ No se preocupe senhora; tudo h seu tempo. Eu apenas pergunto para saber quanto conhece a respeito do nosso culto. Como seu primeiro contato com a Umbanda, ns nos colocamos disposio para qualquer esclarecimento s suas duvidas e pedimos que se sinta vontade em nosso meio, pois aqui somos uma famlia. Todos aqui trazemos problemas por solucionar, mas graas a nosso Pai Grande, estamos unidos para tentar tambm auxiliar os outros, na medida do possvel.

Aps a conversa inicial, D.Niquita ficou mais calma. No entanto, pensava em quanto cobrariam para fazer o trabalho para seu filho. Ser que teria dinheiro bastante?

Foi conduzida para o local da assistncia e sentou-se junto companheira Ione. Pde observar tambm que a maioria das pessoas estava de branco e se ajoelhava no cho para orar. Imitou-os no procedimento. Orou. Orou com um sentimento que nunca tivera antes. Lgrimas vieram-lhe face. Foi despertada desse estado elevado de conscincia quando Ione tocou-lhe de leve, entregando-lhe um papel com algo escrito. Levantou-se lentamente, sentou-se e abriu o papel. O que estava escrito bastou para que se desfizesse qualquer barreira que porventura ainda restasse. Leu ento com todo interesse de sua alma. Saciou sua sede e satisfez sua curiosidade. Desarmou-se ante o que estava escrito. Abriu seu corao para as claridades de Aruanda, como dizem os nossos irmos e pde ento compreender que julgara mal aquelas pessoas e que, se estava ali precisando da ajuda delas, no tinha o direito de manter barreira no corao.

O folheto dizia simplesmente:

Meu filho, minha filha. Que as bnos do nosso Pai Maior estejam em sua vida. Sarava.

Voc est numa tenda umbandista. Talvez voc no tenha vindo aqui por livre escolha. Talvez as dificuldades da vida lhe tenham indicado o caminho. Quem sabe a curiosidade natural que invade seu corao. Mas no importa. Voc est aqui. E ns tambm.

Queremos esclarecer a voc que neste recinto reina a disciplina e o respeito por nossos guias e pelas Leis da Umbanda. Aqui se pratica a caridade e por isso mesmo, no se cobra nada pelas oraes e pelos conselhos que aqui so prestados. Somos trabalhadores do Pai Maior e no temos outro objetivo que no seja servir de instrumentos para que os guias realizem seu trabalho. No tratamos de nenhum assunto que possa prejudicar ao prximo. No fazemos despachos, oferendas ou matanas de animais. Nossa lei maior chama-se UMBANDA e para ns, significa unio, caridade, crescimento e integrao com a lei da vida. Seja bem-vindo, vibre harmonia, bem estar e prosperidade e que os guias iluminem sua vida para encontrar a resposta nos seus questionamentos e a soluo para suas dificuldades.

Sarava os guias da Umbanda!

Sarava o Pai Maior!.

_ Ento, havia muito compromisso por parte daquelas pessoas? Isso queria dizer que as informaes que ouvira de uma outra fonte estavam equivocadas? Meu Deus como a gente faz idia errada das pessoas... pensava consigo mesma.

A tenda comeou a encher de gente e logo no havia mais lugar. Comearam, ento a cantar. Os cnticos sagrados da Umbanda realmente contm um profundo significado. Era hora da invocao dos guias e mentores do culto, a qual se realizava atravs dos cantos e das oraes. O cong j estava preparado e os filhos da tenda se encontravam em seus lugares, todos de branco, enquanto as rosas e as folhas aromticas envolviam o ambiente com seus odores balsamizantes. Os hinos sagrados comeavam a vibrar no recinto:

Como cheira a Umbanda! A Umbanda cheira

Cheira cravo e cheira rosas, cheira flor de laranjeira... Vibraes intensas envolviam o ambiente e desde o momento em que chegamos pudemos perceber isso.

Desencarnados e encarnados vinham ali em busca de algo. Chegamos cedo a meu pedido, pois desejava obter informaes e fazer algumas observaes, que para mim, eram muitssimo importantes. O caso Erasmino me inspirava de dedicao e gostaria de participar de todos os lances.

Momentos atrs, quando D. Niquita penetrou no salo principal, j nos encontrvamos l e deste lado da vida as coisas se passavam bastante interessantes.

Fomos apresentados a uma entidade que estava postada junto soleira da porta. O esprito parecia um soldado que estava de prontido para manter a ordem e a disciplina. L fora viramos outros que estavam em pontos estratgicos em torno de todo o quarteiro onde se localizava a construo fsica da tenda. Impunham respeito e zelavam pela disciplina do lugar. Eram perfeitos cavalheiros.

Um deles, a quem fomos apresentados, atendeu-nos solicito e encaminhou-nos ao responsvel espiritual pelos trabalhos da noite.

Aproximou-se de ns um esprito trajando terno azul marinho, alto e de bigode emoldurando a face sorridente. Era o irmo Anselmo. Vinha acompanhado de outro esprito: uma senhora de cor negra, que se vestia com os trajes tpicos da poca do Brasil colnia. Sua aura envolvia-nos a todos e uma bondade profunda irradiava-se de sua presena, tornando-a respeitada por todos os outros espritos que ali trabalhavam. Eram os responsveis pelas atividades daquela tenda de Umbanda, o irmo Anselmo e a irm Euzlia que, sorrindo nos cumprimentaram com um abrao fraternal.

_ Meu nome Arnaldo falou o meu companheiro. Estamos em tarefa de socorro e com certeza j foram informados pelos nossos irmos maiores a respeito de nossa vinda.

_ Claro, meu irmo! falou Anselmo. Somos aqui, todos aprendizes e creio que podero nos auxiliar muito nas tarefas que possamos desenvolver em comum. Esta nossa irm Euzlia, nossa mentora, responsvel por nossas atividades.

_ Que isso, Anselmo? Dessa forma voc me deixa sem jeito redargiu a bondosa entidade. Somos trabalhadores da mesma causa e estamos aqui para fazer o melhor que pudermos para o auxilio a quantos Deus nos envia. Sintam-se em casa, meus filhos.

A partir da, estabeleceu-se um clima de verdadeira fraternidade e amizade entre ns. Anselmo nos orientava com carinho quanto a tudo que perguntvamos, ou melhor, que eu perguntava, pois no abandonara ainda o meu hbito de esprito perguntador. No consegui deixar na Terra a minha curiosidade, que at hoje me acompanha como marca registrada. Afinal, mesmo deste lado da vida tem muita gente que se julga possuidora da verdade, o que um ledo engano. Tambm para esses eu escrevo. Aqui temos tambm muita literatura e algum que se acostumou a ser reprter quando encarnado encontra aqui mil e uma situaes s quais poder se dedicar. E olha que tem muito esprito interessado em nossas noticias.

Mas, deixando de lado essa minha mania de defunto metido a reprter do alm, vamos ao que interessa realmente. Olhei por todo o ambiente e pude notar uma luminosidade azul com reflexos dourados envolvendo a todos que entravam. Curioso, ensaiei uma pergunta para Anselmo, enquanto Arnaldo se afastava com Euzlia para tratar do caso que viemos acompanhar. O meu novo amigo no se fez de rogado e explicou-me solicito:

_ Acho que voc est to interessado nos assuntos da Umbanda que no olhou bem o que acontece sua volta. Quem dera que outros espritos pudessem se dedicar a uma pesquisa, como voc est se propondo fazer e levassem para os nossos irmos da Crosta as informaes corretas.

Enquanto ele falava, eu fui olhando o ambiente com mais ateno. Ao lado da porta de entrada havia dois espritos, que estavam magnetizando todos que passavam por eles. Um assemelhava-se a um ndio pele-vermelha, com uma indumentria jogada sobre o ombro, de porte altivo, srio, porm, sem ser grave. Trazia um recipiente nas mos e espargia uma espcie de mistura de ervas maceradas em todas as pessoas. Do outro lado da porta, um autentico preto velho, porm nem to velho assim. Trazia nas mos um estranho instrumento, que Anselmo identificou como sendo um turbulo ou incensrio, movendo-o em torno das pessoas que entravam na tenda, enquanto o objeto exalava uma fumaa de cheiro adocicado, de forma que ningum que passasse por aquela porta ficasse sem os efeitos do que lhes era ministrado.

_ Esses so companheiros que na Terra se especializaram no cultivo e na manipulao de ervas. Aqui deste lado, alm de irradiarem fluidos de sua aura pessoal, continuam com o mesmo trabalho, auxiliando quanto possam para o beneficio geral falou-me Anselmo. Observe bem aquele companheiro que entra no salo.

Entrava um senhor de semblante grave, estatura alta, acompanhado por uma jovem, que segurava em sua mo. O preto velho e o ndio faziam o que eu chamava de ritual, envolvendo-o em suas vibraes. Aproximei-me mais para melhor observao e pude notar no senhor uma grande quantidade de energias que se mesclavam em tonalidades de cinza e verde escuro, envolvendo-o na regio do chacra frontal e do plexo solar. Trazia impregnado em seu campo urico, algo semelhante a uma lagarta, que parecia sugar-lhe as energias.

Quando a fumaa fludica envolveu-o, comearam a cair no cho algumas postas de uma massa que se assemelhava a carne crua, guardando a peculiaridade de parecer viva, pois mexia-se constantemente. Quando o ndio espargia a gua com propriedades desconhecidas para mim, sobre o senhor, ela caia sobre o parasita e o desfazia, derretendo-o como se fosse um cido que, derramado sobre a estranha criatura, a desmaterializasse.

Fiquei abobalhado com o que vira. Eram verdadeiramente diferentes os mtodos empregados, mas sem sombra de duvida eram eficazes. Anselmo socorreu-me a curiosidade novamente:

_ V, meu amigo, como esses companheiros promovem a limpeza magntica nas auras dos irmos encarnados? Utilizam-se de recursos que conhecem. Voc no ignora que todas as coisas tem magnetismo prprio e aqui deste lado da vida, as estruturas astrais das plantas, com a vibrao que esses espritos conseguem canalizar da natureza, so medicamentos eficazes, que nas mos de quem conhece, se transformam em potentes instrumentos de auxilio, expurgando larvas e criaes mentais inferiores do campo magntico dos companheiros encarnados e mesmo desencarnados. A natureza guarda segredos que estamos longe de compreender em sua totalidade. Aqui nada se perde. Todo conhecimento utilizado para o trabalho de auxilio. Toda experincia aproveitada nas tarefas, porm, obedecemos a um critrio como ver depois.

Comecei a aprender que, em qualquer lado da vida que nos encontremos, nossas experincias, nosso conhecimento, mesmo que sejam incompreendidos por uma multido, podero ser teis no servio ao prximo. Aquele caboclo e aquele preto velho eram espritos de uma sabedoria que desafiava muitos sbios da crosta e mesmo muitos desencarnados. Em sua simplicidade e pureza de intenes, auxiliavam quanto podiam, dando sua cota de contribuio.

Segui Anselmo e observei igualmente o cong, o local onde se encontravam as atenes de todos. Era uma espcie de altar, utilizado para as rezas que se destinavam a encarnados e desencarnados. Anselmo, desta vez, explicou sem que eu perguntasse:

_ Muitas pessoas necessitam ainda de algo que funcione como muletas psicolgicas, a fim de desenvolverem seu potencial. Mas, aqui, o que acontece bem diferente. O altar, os objetos de cultos e todo o simbolismo que utilizamos, como os pontos riscados e cantados, as chamadas curimbas, visam compor o que chamamos de bateria magntica. uma espcie de bateria psquica que concentra as energias de que precisamos para as tarefas que realizamos. Na Umbanda lidamos com fludos s vezes muitos pesados, com magnetismo elementar, e uma grande quantidade de pessoas que vai e vm em busca de recursos no conseguem ainda compreender o verdadeiro objetivo da Umbanda. s vezes, muitos umbandistas tambm no lhe compreendem os mistrios sagrados. Esse altar, o cong, usando terminologia prpria da Umbanda, uma verdadeira aplicao energtica. Todos concentram ai seus pensamentos, suas oraes, suas criaes mentais mais sutis. Ento, quando precisamos de uma cota energtica maior para desenvolver certas atividades, s recorremos a este deposito de energias, pois o altar tambm um imenso reservatrio de ectoplasma, fora nervosa grandemente utilizada por nossos trabalhadores, em vista da natureza das nossas atividades. Os cnticos alem de identificarem cada esprito que se manifesta, servem igualmente como condensadores de energia, uma espcie de mantra, que so palavras consagradas por seu alto potencial de captao energtica. a fora mgica da Umbanda.

Observei o ambiente espiritual da tenda ou do terreiro. medida que o povo cantava em ritmo prprio, parecia que imensa quantidade de energia luminosa ia se formando por cima da assistncia, segundo o ponto cantado. De cores variadas, as energias iam se aglutinando na psicosfera ambiente e depois eram absorvidas pelas auras de quantos ali estavam, alem de se agregarem em torno do cong. O fenmeno era maravilhoso de se ver. Em meio ao redemoinho de energias, espritos que se manifestavam em forma de crianas canalizavam esses recursos para os assistentes, que estremeciam ao receber o toque energtico. Eram os fluidos que os atingiam e desestruturavam as criaes mentais inferiores, os miasmas e os demais parasitas que se encontravam nas auras dos participantes.

No tive coragem de falar nada. Aprendia que tudo ali, naquela, tenda tinha uma finalidade especfica. Anselmo, porm, continuou:

_ Isso no quer dizer que todos aqui saibam o que se passa em nosso plano. Para muitos, tudo isso significa apenas uma forma de se adorar ou de se prestar culto s foras da natureza ou um elo de unio com guias e mentores da Umbanda, mas estamos trabalhando para que nossos mdiuns se esclaream cada vez mais e compreendam as leis que regem as atividades deste lado da vida. J obtivemos muitos resultados e cremos que conseguiremos, com o tempo, sensibilizar a muitos, embora as dificuldades naturais que encontramos por parte de dirigentes, mdiuns e freqentadores que teimam em continuar na ignorncia do que ocorre, transformando tudo em misticismo. Mas no importa! Continuamos a nossa tarefa de espiritualizar a Umbanda e faze-la mais compreendida por nossos irmos.

Aventurei-me, ento, a perguntar a respeito de algo que me chamara ateno desde que chegara na tenda. Quem eram aqueles espritos que pareciam guardar a entrada do local? Pareciam soldados de um exercito de desencarnados.

_ Aqueles so os guardies, meu caro ngelo, so os espritos responsveis pela disciplina e pela ordem no ambiente. Em muitas tendas ou terreiros, so conhecidos como exus. Para ns, so companheiros experimentados em varias encarnaes, em servio militar, em estratgias de defesa ou mesmo simples trabalhadores que se fazem respeitar pelo carter forte e pelas vibraes que emitem naturalmente. Eles se encontram em tarefa de auxilio. Conhecem profundamente certas regies do submundo astral e so temidos pela sua rigidez e disciplina. Formam, por assim dizer, a nossa fora de defesa, pois no ignora que lidamos em um numero imenso de vezes, com entidades perversas, espritos de baixa vibrao e verdadeiros marginais do mundo astral, que s reconhecem a fora das vibraes elementares, de um magnetismo vigoroso e personalidades fortes que se impem. Essa, a atividade dos guardies. Sem eles, talvez, as cidades estariam merc de tropas de espritos vndalos ou nossas atividades estariam seriamente comprometidas. So respeitados e trabalham sua maneira para auxiliar quanto possam. So temidos no submundo astral, porque se especializaram na manuteno da disciplina por vrias e vrias encarnaes.

_ Quer dizer, ento que estes so os chamados exus? Mas quando se fala neles, as pessoas os julgam seres infernais ou assassinos e at mesmo certos umbandistas passam essa idia a respeito deles.

_ Existe muita desinformao e falta de estudo, principalmente nos meios que se dizem umbandistas. Na verdade, prolifera um numero acentuado de manifestaes religiosas de cunho medinico que utilizam do nome da Umbanda para se caracterizarem perante a sociedade dos homens, mas a verdadeira Umbanda uma religio que destituda de misticismo em seus fundamentos, o que mais tarde poderemos esclarecer a voc. Aqui, no entanto, nos deteremos para esclarecer melhor o assunto.

Muitos do prprio culto confundem os exus com outra classe de espritos, que se manifestam revelia em terreiros descompromissados com o bem. Na Umbanda a caridade lei maior e esses espritos com aspectos os mais bizarros, que se manifestam em mdiuns so, na verdade, outra classe de entidades, espritos marginalizados por seu comportamento ante a vida, verdadeiros bandos de obsessores, de vadios, que vagam sem rumo nos sub-planos astrais e que so, muitas vezes, utilizados por outras inteligncias, servindo a propsitos menos dignos. Alm disso, encontram mdiuns irresponsveis que se sintonizam com seus propsitos inconfessveis e passam a sugar as energias desses mdiuns e de seus consulentes, exigindo trabalhos, matanas de animais e outras formas de satisfazerem sua sede de energia vital. So conhecidos como os quiumbas, nos pntanos do astral. So maltas de espritos delinqentes, semelhana daqueles homens que atualmente so considerados na Terra como irrecuperveis socialmente, merecendo que as hierarquias superiores tomem a deciso de expurg-los do ambiente terrestre, quando da transformao que aguardamos no prximo milnio. Os mdiuns que se sintonizam com essa classe de espritos desconhecem a sua verdadeira situao. Depois existe igualmente um misticismo exagerado em muitos terreiros que se dizem umbandistas e se especializam em maldades de todas as espcies, vinganas e pequenos trabalhos, que realizam em conluio com os quiumbas e que lhes comprometem as atividades e a tarefa medinica. So na verdade, terreiros de Quimbanda e no de Umbanda. Usam o nome da Umbanda como outros mdiuns utilizam-se do nome de espritas, sem o serem. H muito que se esclarecer a respeito.

Os espritos que chamamos de exus so na verdade, os guardies, os atalaias do Plano Astral, que so confundidos com aqueles dos quais falamos. So bondosos, disciplinados e confiveis. Utilizam o rigor a que esto acostumados para impor respeito mas so trabalhadores do bem. Como ns, no exigem nem aceitam trabalhos, despachos ou outras coisas ridculas das quais mdiuns irresponsveis, dirigentes e pais de santo ignorantes se utilizam para obter o dinheiro de muitos incautos que lhes cruzam os caminhos. Isso trabalho de Quimbanda, de magia negra. Nada tem a ver com a Umbanda.

O assunto dava para muita conversa e elucidaes, mas a hora no comportava tais possibilidades, pois as atividades iriam comear. Arnaldo e Euzlia aproximaram-se de ns, aps as interessantes elucidaes de Anselmo. Enquanto os dois dirigentes se dirigiam para a mesa ou altar, achegamo-nos de D. Niquita para envolve-la com vibraes mais sutis, enquanto, segundo Arnaldo me contou, um grupo de espritos, os guardies, estava se dirigindo residncia de Erasmino e outro grupo faria investigaes em relao ao lugar que visitamos, o prdio onde trabalhava a falange de espritos que estavam envolvidos com os desequilbrios de Erasmino.

Os cnticos criavam no ambiente uma atmosfera de intensa radiao magntica, pois concentravam na psicosfera da tenda, as energias de todos os presentes. Fascas eltricas cruzavam o ar, ionizando a atmosfera, como se as correntes energticas obedecessem ao ritmo dos hinos cantados. No havia ali atabaques ou tambores como eram utilizados em outros lugares. A um sinal do dirigente, pararam de cantar e todos se concentraram no altar de onde emanava luminosidade singular, parecendo uma nevoa de irradiaes cintilantes. Foi indicado um mdium da corrente para realizar as preces iniciais e novamente recomeou a cntico de invocao das entidades da casa.

Aproximou-se de cada mdium um determinado esprito, que o envolvia em suas vibraes peculiares. O ritmo da musica foi aumentando e pude ver como Euzlia e Anselmo aproximaram-se dos mdiuns com os quais deveriam trabalhar na noite.

Fiquei encantado com o que via. Euzlia transformou-se aos nossos olhos de desencarnados, modificando a sua aparncia perispiritual de tal maneira que, se algum possuidor de vidncia a tivesse visto naquele momento, no a reconheceria. Foi-se encurvando aos poucos e assumiu a personalidade e aparncia de uma velha de mais ou menos setenta anos de idade, enquanto o seu mdium igualmente assumia a mesma postura, demonstrando em seu semblante as caractersticas que o esprito assumira. Por sua vez, Anselmo foi aos poucos modificando a sua aparncia e num exerccio de ideoplastia, assumiu aspectos de um velho calvo, negro e de um sorriso extenso no rosto. A mdium que o recebia, como falavam na tenda, tomou a mesma postura do esprito que se apresentava aos encarnados como Pai Damio, enquanto Euzlia era agora a bondosa Vov Catarina.

Comearam as atividades medinicas da noite e cada mdium dava passividade a um esprito que se manifestava entre os encarnados como preto velho. Era a gira da Umbanda.

D. Niquita foi conduzida por Ione a ajoelhar-se aos ps de Vov Catarina, entidade que se revezava com Pai Damio na direo dos trabalhos.

O olhar bondoso da entidade transparecia atravs dos olhos do mdium que lhe recebia a influencia. Sentada em um banco pequeno, trazia um ramo de alfazema na mo, que lhe fora dado por um jovem que auxiliava com o qual fazia seu benzimento.

D. Niquita comeou a chorar emocionada com as vibraes da entidade, as quais a envolviam. A preta velha comeou a falar naquele linguajar todo simples, que conseguia tocar nos coraes:

_ Deus seja louvado, minha fia! Deus seja louvado! Oc vem tenda de nega veia em busca de ajuda, mas nega veia v mais em seu corao. um corao de me, como nega foi um dia! Oc sofre pelo fio querido. Mas no h de ser nada no, minha fia. Mantenha a f em Deus, nosso Pai Maior e aos poucos as coisa vai miorando. Nis vamo trabai para o nosso Erasmino e temos amigos seu do lado de nega veia que veio ajudar tambm.

A conversa continuava num misto de consolo e de informaes do Plano Espiritual a respeito do caso de Erasmino. D. Niquita chorava sentidamente, enquanto a assistncia continuava cantando os pontos dos guias. Olhei bem o que se passava e pude ver que, enquanto a entidade conversava com a companheira encarnada, caam dela certos resduos fludicos, que eram dissolvidos nas vibraes do ambiente espiritual do lugar. Vov Catarina passava aos poucos seu ramo de alfazema em volta de D. Niquita, dando-lhe um passe e do galho da erva, desprendiam-se fios tenussimos de fluidos lilases, que interagiam com a aura da nossa irm, causando-lhe imenso bem-estar. Eram os recursos da natureza aliados ao amor da entidade e simplicidade de sua tarefa. Uma a uma as pessoas iam se aproximando dos mdiuns incorporados para o momento de conversa fraterna, enquanto, deste lado, os guardies retornavam com informaes preciosas a respeito do caso Erasmino.

Findo o culto, aps as oraes, os espritos responsveis retornaram a forma que tinham, com extrema naturalidade. Dirigimo-nos a aposento contguo para conversamos. Os assistentes retornaram ao seus lares, e D. Niquita, aliviada, retornou igualmente com Ione, que lhe presenteou com um livro interessante, que um mdium da casa lhe deu: O Evangelho segundo o Espiritismo, de Allan Kardec.

Estvamos reunidos na sala, com os mentores da tenda, quando nos foi passado por um dos guardies extenso material capturado no reduto das trevas, onde todo o caso estava sendo tramado.

Aps Euzlia ler o contedo, falou-nos preocupada:

_ O caso de nosso Erasmino exige muito trabalho. Pelo que vejo, nosso irmo vem de um passado espiritual em que se comprometeu largamente com atividades menos dignas no submundo do crime, em regio da Europa. As entidades envolvidas com o caso no o perdoaram, pois se sentiram lesadas com sua atitude, que julgam traidora. Contrataram um agente das sombras e exmios magnetizadores, os quais trabalham no caso mantendo extensa base em regio das sombras, a qual vocs tiveram oportunidade de visitar na companhia de Erasmino, desdobrado. Precisamos de mais ajuda de mdiuns experimentados em atividades deste lado. Temos que desativar esta base o mais urgente possvel. Os guardies conhecem bem o local que j est devidamente mapeado. Quanto a Erasmino, ns o traremos aqui para as devidas orientaes e ele participar de uma atividade diferente. Far parte apenas do grupo de estudos. Faremos a limpeza em sua aura de uma nica vez; depois veremos como proceder para conduzi-lo a uma conscincia mais ampla de sua realidade espiritual.

A companheira mostrou-se conhecedora profunda de casos semelhantes e portou-se com extremo equilbrio em sua proposta de trabalho. Entregou-nos os documentos capturados na base umbralina ou submundo astral, como chamavam e pudemos perceber quanto exigia de ns a tarefa que estvamos empreendendo.

Arnaldo teve a idia de recorrer a dois mdiuns conhecidos, que militavam numa casa esprita de orientao Kardecista. Para l nos dirigimos aps falar com Anselmo e Euzlia. Estes colocaram nossa disposio dois guardies que nos acompanharam com o mximo de interesse no caso.

Euzlia por sua vez, juntamente com Anselmo dirigiu-se ao lar de Erasmino, para desdobr-lo e traze-lo tenda onde seria realizado a limpeza magntica, conforme os trabalhos da casa.

DESDOBRAMENTO Dirigimo-nos para o lar de Francisco, um dos mdiuns que iramos recrutar para as tarefas da noite. A noite estava belssima e o ar balsamizante trazia fluidos da natureza, transportados pela brisa suave. Arnaldo, os guardies e eu encontrvamo-nos em frente a uma residncia modesta, de aspecto agradvel, onde adentramos com o mximo respeito. Os guardies ficaram do lado de fora formando uma corrente de energia no local, para proteger o mdium quando estivesse em desdobramento. Francisco ainda estava acordado, lendo um livro na sala quando chegamos. Arnaldo aps aplicar-lhe um passe na regio frontal, fez-se visvel a ele atravs da vidncia e comunicou-lhe o que estava acontecendo, a nossa necessidade de ajuda para caso em que estvamos envolvidos. Francisco dirigiu-se imediatamente para o quarto de dormir e aps breve prece, colocou-se disposio para o trabalho.

Arnaldo aproximou-se de Francisco e ministrou-lhe um passe magntico no crtex cerebral e outro ao longo da coluna promovendo o seu afastamento do veiculo fsico. Pude notar que, ao afastar-se do corpo em desdobramento, no plano extra-fsico, Francisco esprito possua a faculdade de vidncia. Registrava-nos a presena com naturalidade e com desenvoltura apresentou-se a mim, colocando-se disposio como se estivesse acostumado a tais sadas conscientes. Era o fenmeno da viagem astral, como conhecido nos meios espiritualistas.

_ Boa noite, companheiros - falou Francisco apresentando-se a mim. Acredito que devamos nos dirigir imediatamente para a tarefa, no mesmo? Mas peo-lhe Arnaldo, por gentileza que me d s orientaes devidas; afinal voc no me avisou com antecedncia. Preciso saber os detalhes sobre o caso e como posso ser til.

Arnaldo deu um sorriso de satisfao e abraando Francisco foi lhe colocando a par da situao.

Samos da residncia de Francisco, onde ficou de planto um dos guardies, para qualquer eventualidade, pois era necessrio proteger o corpo do mdium de qualquer investida de espritos infelizes. Quando samos pude ver o trabalho que foi realizado em volta da residncia. Envolvendo a casa, uma coluna de energia que mais parecia uma cortina de fogo, estava formando um manto protetor que, com certeza no poderia ser rompido por entidades levianas ou espritos maldosos. Enfrente ao porto de entrada mais duas entidades que no avistara antes estavam de guarda, auxiliando um dos guardies que viera conosco.

Estranhei todo aquele aparato e antes que perguntasse a Arnaldo ele foi logo falando:

_ Em tarefas desta natureza principalmente quando o medianeiro estiver em desdobramento, natural que protejamos o seu veiculo fsico com os cuidados necessrios, pois qualquer dano causado ao seu corpo ir repercutir no perisprito e, se a tarefa for realizada em regies mais inferiores de se esperar qualquer tentativa de entidades sombrias para impedir sua realizao. Igualmente, o mdium desdobrado dever contar com a assistncia de uma equipe consciente e responsvel deste lado de c da vida; afinal estamos no trabalho do bem e devemos nos preservar de possveis interferncias nas atividades.

Aproveitando o ensejo criado pelas elucidaes de Arnaldo, desejei saber a respeito do desdobramento ou viagem astral e de como Francisco tinha conscincia do que se passava deste lado.

_ Ser que todos os mdiuns que se desdobram tem conscincia disto?

Sorrindo Arnaldo falou:

_ Podemos afirmar que nem todos se igualam no que concerne manifestao do fenmeno medinico. A conscincia deste lado de c no possibilidade de todos. Como Allan kardec escreveu em O Livro dos Mdiuns, a mediunidade orgnica. Podemos entender isto da seguinte forma: quando o esprito reencarna com determinada tarefa a desempenhar com relao mediunidade, o seu perisprito passa a ser submetido a uma natural elevao da freqncia vibratria e por conseguinte, o prprio corpo fsico, que reflete as vibraes perispirituais tambm elaborado com vista s tarefas que desempenhara no futuro, no que se refere mediunidade com Jesus. Dessa forma podemos entender que aquele que preparado para trabalhar tendo inconscincia do fenmeno, dificilmente poder modificar essas disposies, pois seu organismo foi preparado para tal. Igualmente aquele que foi preparado vibratoriamente para ter a conscincia deste lado da vida, quando desdobrado, haver de manifestar esta conscincia no momento propicio quando seus mentores julgarem necessrio, pois traz impressas em seu perisprito as vibraes necessrias que o habilitaro conscincia nas regies espirituais. Mas isso tudo ainda relativo, pois o homem atual ainda se conserva despreparado para certas tarefas e muitas vezes, estar consciente poder dar ensejo a dificuldades maiores, devido `a falta de preparo de muitos que se candidatam ao servio. No caso de Francisco, um velho conhecido nosso de tarefas semelhantes; procura estudar sempre e conservar-se ocupado em tarefas nobres e elevadas. Isto facilita-nos o trabalho, mas no quer dizer que quando ele retornar ao corpo denso ir lembrar-se de tudo, no! No h necessidade disto. bastante que desempenhe as suas tarefas com amor e dedicao. A maioria das pessoas hoje em dia aguarda obter experincias com viagens astrais para se convencerem de que a vida continua alem da matria.

Esperam com isso poder fazer viagens mirabolantes a mundos diferentes, criando uma expectativa que possivelmente nunca ir se concretizar. Querem fazer viagens fora do corpo, mas isso acontece todas as noites quando dormem e mesmo que pudessem realizar tal feito conscientemente, de que adiantaria? Ainda no aprenderam a realizar a viagem para dentro de si mesmos, para se conhecerem; a viagem do auto descobrimento, como da proposta do Espiritismo. Precisam aprender a fazer a viagem da vida, de suas vidas com dignidade e equilbrio; do contrario continuaro perdidos sem se conhecerem e sem conhecerem as leis da vida. H muita conversa em torno disto e o bom mesmo seria que quem quisesse conhecer mais sobre o assunto se reportasse aos escritos de Allan Kardec. O que hoje se imagina mais atualizado a respeito dessas e outras coisas referentes s questes do esprito no passa de adaptao do que dizem os escritos de Kardec. Apenas trocaram os nomes para dar sabor de novidade. O problema humano segue sendo sempre o mesmo.

_ Mas como trocaram o nome? aventurei-me.

_ Basta observar, ngelo. Ao fenmeno medinico to conhecido e explicado pela Doutrina Esprita, os autores modernos apenas para se dizerem diferentes, deram o nome de channeling e aos mdiuns denominaram canais. Aos espritos deram o nome de conscincias extrafisicas; o termo encarnado foi substitudo em alguns casos por intrafisicos. O fenmeno de desdobramento to conhecido desde pocas remotas e classificado por Allan Kardec, hoje recebe vrios apelidos, como projeo da conscincia, bilocao da conscincia, viagem astral e outros nomes estranhos que o homem no cansa de criar, tentando passar a idia de que so coisas diferentes, pois o seu orgulho no lhes deixa admitir que a universalidade do fenmeno e seus desdobramentos no psiquismo humano de h muito foram catalogados pela Doutrina Esprita e se encontram atualssimos em o Livro dos Mdiuns, que constitui o mais moderno tratado de cincias psquicas da humanidade. Mudam apenas os nomes, mas o fenmeno continua sendo o mesmo.

Entendi o exposto e fiquei imaginando como o homem complica as coisas de tal modo que passa a ser vtima de si mesmo, emaranhando-se em conceitos to confusos que ele mesmo no sabe como sair deles.

A conversa estava mesmo interessante, mas a nossa equipe, acrescida da presena de Francisco, dirigiu-se ao lar de Otvio, outro mdium que Arnaldo conhecia e que poderia ser-nos til na tarefa. O procedimento se realizou da mesma maneira, com a formao de um campo de fora em torno da residncia do companheiro encarnado enquanto o outro guardio se colocava de prontido para a proteo do corpo fsico de Otvio que desdobrado, vinha para o nosso lado auxiliar nas tarefas da noite.

Dirigimo-nos todos para a tenda, onde nos aguardavam os amigos espirituais Euzlia e Anselmo com o esprito de Erasmino desdobrado pelo sono fsico.

OS GUARDIES E OS CABOCLOS Erasmino fora trazido para a tenda de Umbanda pela ao de Euzlia que auxiliada tambm por uma equipe de guardies que ficaram em sua residncia, pde traz-lo at ns para as atividades que se realizariam.

Anselmo modificou sua aparncia perispiritual e manifestou-se vidncia de um dos mdiuns da casa, convidando-o ao trabalho como o preto velho Pai Damio, to querido por todos dali.

A equipe estava formada para a primeira parte do trabalho espiritual.

Erasmino foi colocado deitado em frente ao altar, numa maca estruturada com fluidos do nosso plano. Caboclos e pretos velhos adentravam o ambiente sob a orientao de Euzlia, a Vov Catarina da tenda que, bondosamente ia indicando o que fazer. Envolvendo o mdium desdobrado, Anselmo/ Pai Damio procedeu ao fenmeno de incorporao no plano espiritual, quando o perisprito do mdium foi-se ajustando vibratoriamente ao do esprito que o orientava. O fenmeno era maravilhoso de se observar. A aparncia externa do mdium foi aos poucos se modificando at assumir a mesma conformao de Damio, o velho africano que agora assumia as tarefas.

Erasmino, sonolento, no registrava a nossa presena, apenas ficava passivo ante aos acontecimentos. O esprito de um ndio aproximou-se trazendo uma vasilha que continha uma espcie de remdio, que deu a Erasmino para beber. Imediatamente ele vomitou algo visguento e malcheiroso, que Euzlia disse tratar-se de resduos colocados pelas entidades das trevas em seu perisprito, a fim de provocar doenas fsicas, que o distrassem do verdadeiro problema.

Os guardies ou exus foram chamados para realizarem outra tarefa. Acompanhando Francisco e Otvio, iriam conosco at o reduto das trevas, para desativarem a base de operaes deles. Necessitavam de mdiuns encarnados, embora desdobrados, por possurem ectoplasma, energia necessria para a desativao das bases das sombras.

Deixamos Erasmino desdobrado aos cuidados de Euzlia e sua equipe e fomos para a regio astralina onde se localizava a base de operaes das trevas.

Assim que chegamos, pudemos notar intensa movimentao nos arredores. Francisco e Otvio estavam tranqilos e muito seguros na realizao da tarefa. Pensei que os habitantes daquela construo estavam sabendo da nossa visita e que haviam se precavido contra ns. Novamente Arnaldo esclareceu a todos:

_ A movimentao que presenciam resultado dos trabalhos dos guardies, que recrutaram seus amigos para auxiliarem na tarefa. Embora todo o movimento, como vem, comportam-se com a mxima disciplina e executam com rigor a sua tarefa.

Observei mais e vi uma grande quantidade de espritos que se aproximavam furtivamente do prdio. Pareciam comandados por uma equipe que se colocava frente, trazendo algo semelhante a um mapa, ora olhando para o prdio frente, ora para o papel que tinham na mo. Longas fileiras de espritos se colocavam em volta do edifcio das trevas, em movimentos precisos, estudados e com o mximo de silencio. Vestiam-se como soldados e traziam nas mos uma espcie de tridente. Segundo fui informado, eram armas eltricas que descarregavam energia e davam choques nos outros espritos que haviam de ser capturados. Funcionavam com eletromagnetismo. Eram as mais eficazes contra as investidas das sombras. Tudo parecia uma operao de guerra.

Um dos guardies aproximou-se de ns trazendo nas mos instrumentos pequenos, que foram entregues a Francisco e Otvio. Eram duas bombas mentais, conforme esclareceram. Foram ajustadas na freqncia vibratria dos dois mdiuns e assim que retornassem ao corpo fsico, iriam explodir e desativar a base das sombras. Os mdiuns no correriam nenhum risco, pois ns os acompanharamos nas tarefas e eles seriam escoltados de volta ao corpo fsico com segurana.

Por sua vez, os espritos no sofreriam nenhum mal; afinal, eram espritos e o efeito das bombas mentais seria um choque vibratrio to profundo que queimaria as criaes fludicas do edifcio, destruindo a base e desestruturando mentalmente seus habitantes por algumas horas, tempo suficiente para que os guardies os recolhessem com suas redes magnticas e os conduzissem para aos devidos lugares. Toda a operao fora preparada com esmero e nos mnimos detalhes.

Ao longe pude ver ser levantada uma espcie de rede que envolvia todo o prdio. O guardio esclareceu:

_ Trata-se de uma medida de emergncia. No estamos lidando com espritos comuns. So conhecedores de varias tcnicas e tem em suas fileiras muitos que na Crosta foram cientistas, generais ou comandantes de tropas de guerra. A rede para dar mais segurana a todos, principalmente aos mdiuns. Caso alguns desses espritos escapem com conscincia do que est acontecendo, sero prisioneiros da rede, que os manter vibratoriamente desarmados, sugando-lhes as energias. Mas se forem ajudados por fora, aqueles que se aproximarem das redes ficaro a grudados como a mosca no mata-borro e s se libertaro quando ns desligarmos as baterias. Esses espritos so altamente perigosos; convm no arriscarmos.

Fiquei extasiado ante a organizao dos guardies e vi quanto eram teis em qualquer trabalho que se realizasse nas regies inferiores. Eram profundos conhecedores daqueles stios e de seus habitantes. Isso justificava o hino que havamos ouvido na tenda a respeito deles, que dizia mais ou menos o seguinte:

Sete, sete, sete, ele das sete encruzilhadas, uma banda sem exu, no se pode fazer nada. So eles os verdadeiros exus da Umbanda, conhecidos como guardies nos sub-planos astrais ou umbral. Verdadeiros defensores da ordem, da disciplina, formam a policia do mundo astral, os responsveis pela manuteno da segurana, evitando que outros espritos descompromissados com o bem instalem a desordem, o caos, o mal. Tem experincia nesta rea e se colocam a servio do bem, mas so incompreendidos em sua misso e confundidos com demnios e com os quiumbas, os marginais do mundo astral.

Alm, avistava-se a falange de espritos de africanos, antigos escravos que se juntavam aos outros espritos e trazia cada um, um atabaque, espcie de tambor que costumavam utilizar quando estavam nas senzalas, para acompanhar os ritmos de seus cnticos sagrados. Esses espritos formavam uma verdadeira legio. Com os corpos