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Briane Evellise da Silva Bandeira RA:080800 "Teorema da Curva de Jordan" 13/06/2011

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS

Centro de Ciências Exatas e de Tecnologia

Departamento de Matemática

Trabalho de Conclusão de Curso A

Relatório Final

“O Teorema da Curva de Jordan”

Aluna: Laís Alegria dos Santos.Orientador: Prof. Dr. João Nivaldo Tomazella.

� São Carlos �2010

Briane Evellise da Silva Bandeira RA:080800

"Teorema da Curva de Jordan"

13/06/2011

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Sumário

Introdução 8

1 Pré-requisitos 9

2 Conexidade 15

3 Simplexos 19

4 Propriedades de separação de polígonos em R2 23

5 Homeomorfismo entre polígonos em R2 28

6 O Teorema da Curva de Jordan 32

Conclusões 39

Bibliografia 40

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Introdução

O Teorema da Curva de Jordan foi enunciado e demonstrado, primeiramente,em 1887, por Marie Ennemond Camille Jordan (1838-1922), porém, posterior-mente, descobriu-se que sua prova estava errada, e foi apenas quase vinte anosdepois que se chegou a uma demonstração rigorosamente correta.

A maneira de se enunciar tal teorema, bem como a sua demonstração, podevariar dependendo do contexto em que será empregado e da necessidade de cadaautor que irá utilizá-lo. De modo geral, e bem resumidamente, a idéia central doteorema é:

“Uma curva de Jordan separa o plano em duas regiões, uma limitada e outrailimitada, sendo o traço da curva a fronteira comum das duas regiões.”

Nesse contexto, uma curva de Jordan pode ser entendida como uma curvafechada simples (fechada - início coincide com o fim; simples - não cruza a simesma) ou uma curva homeomorfa a S1.

Apesar de possuir um enunciado simplório e de fácil compreensão, a demons-tração do Teorema da Curva de Jordan é um tanto quanto complicada e bemelaborada, exigindo certo conhecimento e rigor matemáticos. Sendo assim, antesde apresentarmos o enunciado e a demonstração do teorema, aqui empregadosem um conceito mais topológico e escritos em outros termos, forneceremos algunspré-requisitos básicos, como definições e teoremas, a fim de que possamos atin-gir o objetivo central deste trabalho: compreender o Teorema da Curva de Jordan.

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Capítulo 1

Pré-requisitos

Inicialmente, forneceremos uma idéia geral de topologia, incluindo definiçõese resultados básicos, além de algumas noções de espaços métricos e funções, quenos acompanharão no decorrer deste trabalho. Entretanto, nem todas as demons-trações serão feitas, detalhadamente, pois fogem do nosso objetivo central.

As informações que serão oferecidas aqui foram baseadas, principalmente, em[2] e [3].

Definição 1.1. Um Espaço Métrico é um par (X, d), onde X é um conjunto nãovazio e d é uma função d : X ×X → R, chamada função distância, satisfazendo:

(D1) d(x, y) ≥ 0 sempre;(D2) d(x, y) = 0 ⇔ x = y;(D3) d(x, y) = d(y, x) sempre;(D4) d(x, y) + d(y, z) ≥ d(x, z) sempre (Desigualdade Triangular).

Exemplo 1.1. Rn com a métrica d(x, y) =√

(x1 − y1)2 + ... + (xn − yn)2, ondex = (x1, ..., xn) e y = (y1, ..., yn), é um espaço métrico.

Definição 1.2. Seja a um ponto de um espaço métrico X e r > 0 um número real.Definimos a bola aberta, B(a, r), e a bola fechada, B(a, r), de centro em a e de raior, como sendo, respectivamente, os conjuntos B(a, r) = {x ∈ X | d(x, a) < r} eB(a, r) = {x ∈ X | d(x, a) ≤ r}.

Uma N -bola padrão é dada pelo conjunto Bn = {x ∈ Rn | d(x0, x) ≤ 1}, ondex0 é a origem de Rn.

Definição 1.3. Seja a um ponto de um espaço métrico X e r > 0 um númeroreal. Definimos a esfera, S(a, r), de centro em a e de raio r, como o conjuntoS(a, r) = {x ∈ X | d(x, a) = r}.

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CAPÍTULO 1. PRÉ-REQUISITOS

Uma N -esfera padrão é dada pelo conjunto Sn−1 = {x ∈ Rn | d(x0, x) = 1},onde x0 é a origem de Rn.

Definição 1.4. Dado um espaço métrico X, dizemos que um conjunto M ⊂ X

é aberto em X se, para cada a ∈ M , existe r > 0 tal que B(a, r) ⊂ M . (Talpropriedade do ponto a caracteriza que x é ponto interior de M . Assim, M ⊂ X

é aberto em X quando todo ponto de M é ponto interior de M).

Exemplo 1.2. Toda bola aberta é um conjunto aberto.De fato, seja B(a, r) uma bola aberta de centro em a e de raio r > 0. Devemos

mostrar que, para todo x ∈ B(a, r), existe uma bola B(x, s) de centro em x e deraio s > 0 contida em B(a, r). Assim, tome x ∈ B(a, r); logo, d(x, a) < r.Tome s = r − d(x, a) > 0. Se y ∈ B(x, s), então d(y, a) ≤ d(y, x) + d(x, a) <

s + d(x, a) < r; logo, y ∈ B(a, r) e, com isso, concluímos que x é ponto interiorde B(a, r) e, como x é qualquer, temos que B(a, r) é um conjunto aberto.

Definição 1.5. (i) Seja M um subconjunto de um espaço métrico X e a ∈M . Dizemos que a é um ponto aderente de M se, para todo r > 0, tem-se queB(a, r) ∩M 6= ∅.

O conjunto de todos os pontos aderentes de M é denominado fecho de M erepresentado por M .

(ii) Seja M um subconjunto de um espaço métrico X e a ∈ X. Dizemos que a

é um ponto de acumulação (ou ponto limite) de M quando toda bola de centro ema contém algum ponto de M , diferente do ponto a; isto é, (B(a, r)−{a})∩M 6=∅,∀r > 0.

O conjunto de todos os pontos de acumulação de M em X é chamado derivadode M e representado por M ′.

Definição 1.6. Dado um espaço métrico X, dizemos que um conjunto M ⊂ X éfechado em X se ele contém todos os seus pontos aderentes. Isto é, dizemos queM é fechado em X quando M = M .

Exemplo 1.3. Toda bola fechada é um conjunto fechado.De fato, seja B(a, r) a bola fechada de centro em a e raio r > 0. Considere

M = B(a, r) e escolha x ∈ M c = X −M (complementar de M). Assim, temosque d(x, a) > r. Tome s = d(x, a)−r > 0 e considere a bola B(x, s) de centro emx e raio s > 0. Se y ∈ B(x, s), então d(x, a) ≤ d(x, y) + d(y, a) e, como B(x, s)

é aberta, temos d(x, a) < s + d(y, a) = d(x, a)− r + d(y, a) =⇒ d(y, a) > r. Logo,y /∈ M . Como y foi tomado de forma geral em B(x, s), segue que B(x, s)∩M = ∅.Assim, x não é ponto aderente de M , ∀x ∈ M c. Portanto, M é fechado.

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CAPÍTULO 1. PRÉ-REQUISITOS

Teorema 1.1. Seja (X, d) um espaço métrico. Então:(1) ∅ e X são conjuntos abertos em (X, d).(2) A união arbitrária de conjuntos abertos em (X, d) é aberta em (X, d).(3) A intersecção de uma número finito de conjuntos abertos em (X, d) é

aberta em (X, d).

Demonstração: (1) Como o conjunto vazio não contém pontos, a exigência deque cada ponto em ∅ seja o centro de uma bola aberta contida nele é, automati-camente, satisfeita. Todo o espaço X também é aberto, uma vez que toda bolaaberta centrada em qualquer um de seus pontos está contida em X.

(2) Sejam {Gα | α ∈ Λ} uma família arbitrária de conjuntos abertos e H =⋃α∈Λ Gα. Se H é vazio, então é aberto por (1). Suponha H não vazio e considere

qualquer x ∈ H. Então x ∈ Gα, para algum α ∈ Λ. Como Gα é aberto, exister > 0 tal que B(x, r) ⊆ Gα ⊆ H. Então, para cada x ∈ H, existe um r > 0 talque B(x, r) ⊆ H. Consequentemente, H é aberto.

(3) Sejam {Gi | 1 ≤ i ≤ n} uma família finita de conjuntos abertos em X eG =

⋂ni=1 Gi. Se G é vazio, então é aberto por (1). Suponha G não vazio e

seja x ∈ G. Então, x ∈ Gj, j = 1, ..., n. Como Gj são abertos, existem rj > 0

tais que B(x, rj) ⊆ Gj, j = 1, ..., n. Seja r = min{r1, r2, ..., rn}. Então, r > 0

e B(x, r) ⊆ B(x, rj), j = 1, ..., n. Assim, a bola B(x, r) centrada em x satisfazB(x, r) ⊆

⋂nj=1 B(x, rj) ⊆ G. Logo, G é aberto. �

Corolário 1.1. Seja (X, d) um espaço métrico. Então:(1) ∅ e X são conjuntos fechados em (X, d).(2) A intersecção arbitrária de conjuntos fechados em (X, d) é fechada em

(X, d).(3) A união finita de conjuntos fechados em (X, d) é fechada em (X, d).

A partir das definições de aberto e fechado, somos capazes de estabeler umarelação entre elas através do seguinte teorema:

Teorema 1.2. Dado um espaço métrico X, M ⊂ X é fechado se, e somente se,M c = X −M é aberto.

Demonstração: (⇒) Suponha que M é fechado. Se x ∈ M c, tal ponto nãopode ser ponto aderente de M ; logo, existe r > 0 tal que B(x, r)∩M = ∅. Assim,B(x, r) ⊂ M c e, daí, x é ponto interior de M c. Portanto, M c é aberto.

(⇐) Suponha que M c é aberto. Se x ∈ M c, existe r > 0 tal que B(x, r) ⊂ M c;logo, B(x, r) ∩M = ∅. Assim, x não é ponto aderente de M e, portanto, M éfechado. �

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CAPÍTULO 1. PRÉ-REQUISITOS

Definição 1.7. Dados um espaço métrico X e M ⊂ X, definimos a fronteirade M em X, FrM , como o conjunto formado pelos pontos x ∈ X tais que todabola aberta de centro em x contém, pelo menos, um ponto de M e um ponto docomplementar X −M . Isto é, FrM = M ∩X −M .

Definição 1.8. Dado um espaço métrico X, M ⊂ X é denso em X se M = X,ou seja, se toda bola aberta em X contém algum ponto de M .

Definição 1.9. Um espaço métrico X é dito separável se existe um subconjuntoenumerável denso em X.

Além dessas noções topológicas, temos também a idéia de conjuntos conexos.Todavia, as definições e resultados referentes a conexidade serão apresentadosmais adiante, em um capítulo específico, devido a sua importância no Teoremada Curva de Jordan.

Para finalizar este capítulo, recordaremos, de modo geral e resumido, algumasnoções básicas de funções, muito utilizadas na maioria dos conteúdos matemáti-cos.

Uma função f : A → B é uma relação que associa elementos de um conjuntoA com elementos de um conjunto B, de modo que, para qualquer elemento a ∈ A,exista um único elemento b ∈ B associado a a - neste caso, representamos porf(a) = b - e, além disso, todo elemento de A deve se relacionar com algumelemento de B. Isso faz com que a relação fique bem definida.

Se f(a1) = f(a2) implica em a1 = a2, para a1, a2 ∈ A, dizemos que a funçãoé injetora. Além disso, quando todos os elementos de B estão relacionados comalgum elemento de A, dizemos que a função é sobrejetora. Assim, se uma funçãoé injetora e sobrejetora, então dizemos que é bijetora.

Dada uma função f , a inversa de f é uma função f−1 : f(B) → A tal quef−1(b) = a ⇔ f(a) = b, para a ∈ A e b ∈ B.

Definição 1.10. Sejam (X, dX) e (Y, dY ) dois espaços métricos. Dizemos quea função f : X → Y é contínua no ponto a ∈ X quando, para todo ε > 0

dado, existe δ > 0 tal que dX(x, a) < δ ⇒ dY (f(x), f(a)) < ε, ∀x ∈ X; isto é,x ∈ B(a, δ) ⇒ f(x) ∈ B(f(a), ε).

Dizemos que f é contínua em X se ela for contínua em todos os pontos de X.

Definição 1.11. Sejam X e Y dois espaços métricos. Se f : X → Y é umafunção bijetora, contínua e com inversa f−1 também contínua, então dizemos quef é um homeomorfismo.

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CAPÍTULO 1. PRÉ-REQUISITOS

Quando existe um homeomorfismo entre X e Y , dizemos que X e Y sãohomeomorfos.

Exemplo 1.4. (i) Sejam t0 ∈ R, M = (t0, t0+2π),S1 = {(x, y) ∈ R2 | x2 + y2 = 1}e p = (cos(t0), sen(t0)) ∈ S1. Então a função exp : M → (S1 − p) definida porexp(t) = (cos(t), sen(t)) é um homeomorfismo entre M e S1 − p.

(ii) f : [0, 1] → [0, 2], definida por f(x) = 2x, é um homeomor-fismo.

(iii) f : (0,∞) → R, definida por f(x) = lnx, é um homeomor-fismo.

O teorema, a seguir, estabelece uma relação entre continuidade e as noçõesde aberto e fechado.

Teorema 1.3. Sejam (X, dX) e (Y, dY ) dois espaços métricos e f : (X, dX) →(Y, dY ). São equivalentes:

(1) f é contínua.(2) f−1(G) é aberta em X para todo aberto G em Y .(3) f−1(F ) é fechada em X para todo F fechado em Y .

Demonstração: Para mostrarmos que (1) ⇔ (2), utilizaremos o seguinte lema:

Lema 1.1. f : (X, dX) → (Y, dY ) é contínua em a ∈ X se, e somente se , paratodo ε > 0, existe δ > 0 com B(a, δ) ⊂ f−1(B(f(a), ε)).

Demonstração: (Lema)

Se f é contínua em a, então, dado ε > 0, existe δ > 0 com dY (f(a), f(x)) < ε sedX(a, x) < δ ⇔ [se x ∈ B(a, δ) ⇒ f(x) ∈ B(f(a), ε)] ⇔ f(B(a, δ)) ⊂ B(f(a), ε)

⇔ B(a, δ) ⊂ f−1(B(f(a), ε)). �

(1) ⇒ (2) Assuma que f é contínua. Seja G ⊂ Y aberto. Queremos mostrarque todo ponto de f−1(G) é ponto interior.

Seja x ∈ f−1(G); logo, f(x) ∈ G e, como G é aberto, B(f(x), ε) ⊂ G,para ε > 0. Sendo f contínua, o Lema 1.1 garante que existe δ > 0 comB(x, δ) ⊂ f−1(B(f(x), ε)) ⊂ f−1(G). Daí, x é ponto interior de f−1(G) e, por-tanto, f−1(G) é aberta.

(2) ⇒ (1) Suponha que f−1(G) é aberta em X, para todo aberto G ⊂ Y .Queremos concluir que f é contínua e, para isso, usaremos o Lema 1.1.

Sejam a ∈ X e B(f(a), ε), para algum ε > 0 dado. Pela hipótese, f−1(B(f(a), ε))

é aberta em X, com a pertencente a tal conjunto. Logo, a é ponto interior e,

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CAPÍTULO 1. PRÉ-REQUISITOS

então, existe δ > 0 de forma que B(a, δ) ⊂ f−1(B(f(a), ε)). Pelo Lema 1.1, f écontínua em a e, portanto, f é contínua.

Se H ⊂ Y , temos que vale f−1(Y − H) = X − f−1(H) e assim, podemosconcluir que (2) ⇔ (3). �

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Capítulo 2

Conexidade

Neste capítulo, apresentaremos alguns resultados referentes a conjuntos conexosou que nos permitam classificar um conjunto, ou um espaço, como conexo. Tra-balharemos, ainda, com a relação entre conexo e conexo por caminhos.

Definição 2.1. Seja X um espaço métrico. Dois conjuntos H, K ⊂ X são sepa-ráveis se H ∩K = H ∩K = ∅. (Nenhum dos conjuntos H e K contém um pontoou um ponto limite do outro).

Evidentemente, se H e K são separáveis e H ′ ⊂ H, K ′ ⊂ K, então H ′ e K ′

são separáveis.

Teorema 2.1. Dados M ⊂ X, M = H ∪ K. Então, (1) H e K são separáveisse, e somente se, (2) H, K são abertos e H ∩K = ∅.

Demonstração: (⇒) Suponha H não aberto. Então, existe x ∈ H tal queB(x, δ) 6⊂ H, para qualquer δ > 0. Daí, x ∈ (M − H) = K ⇒ B(x, δ) ∩ K 6=∅ ⇒ x ∈ K, o que leva-nos à contradição desejada, pois, por hipótese, H e K sãoseparáveis. Portanto, H é aberto.

Analogamente, mostra-se que K é aberto. Além disso, H ∩K = ∅.(⇐) Suponha que existe x ∈ H ∩K. Então, x ∈ H e x ∈ K; daí, existe δ > 0

tal que B(x, δ) ⊂ H e, para qualquer ε > 0, B(x, ε)∩K 6= ∅. Em particular, paraε = δ, B(x, δ) ⊂ H e B(x, δ) ⊂ K, gerando uma contradição, pois, por hípótese,H ∩K = ∅. Logo, H ∩K = ∅.

Analogamente, mostra-se que H ∩K = ∅ e, assim, H e K são separáveis. �

Definição 2.2. Uma cisão de um espaço métrico X é uma decomposição, X =

H ∪K, de X como reunião de dois subconjuntos abertos, disjuntos e não vaziosH e K.

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CAPÍTULO 2. CONEXIDADE

Definição 2.3. Um espaço métrico X é conexo se não admite cisão. Caso con-trário, X é dito desconexo.

Pelo Teorema 2.1, temos que um conjunto M ⊂ X é conexo se, e somente se,M não é a união de dois conjuntos separáveis não vazios.

A definição de espaço conexo apresentada acima expressa a idéia matemáticade conjunto formado por um só pedaço. Contudo, uma outra maneira de expri-mirmos a conexidade de um espaço métrico é dizer que podemos ir de um pontoqualquer do espaço para outro, através de um movimento contínuo, sem sair doespaço. Essa idéia leva-nos ao conceito de conexidade por caminhos.

Definição 2.4. Um caminho num espaço métrico (X, d) é uma aplicação con-tínua p : [a, b] → X, onde [a, b] é um intervalo fechado em R. Se p(a) = P ep(b) = Q, então p é um caminho de P para Q.

Definição 2.5. Um conjunto M ⊂ X é conexo por caminhos se, para cada doispontos P, Q de M , existe um caminho p : [a, b] → M de P para Q, ou de Q paraP .

Teorema 2.2. Se H e K são separáveis, então todo subconjunto conexo M deH ∪K encontra-se em H ou em K.

Demonstração: Suponha que não. Então, M = (M ∩ H) ∪ (M ∩ K), onde(M∩H) e (M∩K) são separáveis e não vazios, pois H e K são separáveis. Assim,M é desconexo, contrariando a hipótese do teorema. �

Teorema 2.3. Seja G uma coleção de conjuntos conexos com um ponto P co-mum. Então a união G∗ de elementos de G é conexo.

Demonstração: Suponha G∗ não conexo. Então, G∗ = H ∪ K, H e K

separáveis e não vazios, com P ∈ H. Como cada g ∈ G é conexo, cada g encontra-se em H ou em K. Assim, g ⊂ H, G∗ ⊂ H e, portanto, K = ∅, contrariando ahipótese de K não vazio. �

Teorema 2.4. A imagem de conexo por uma aplicação contínua é conexo.

Demonstração: Consideremos, primeiro, o caso particular em que, dados(X, dX) e (Y, dY ) dois espaços métricos, f : X → Y é contínua, sobrejetora e X

conexo. Queremos mostrar que Y é conexo.Suponha Y não conexo. Então, Y = U ∪ V , onde U e V abertos, disjuntos e

não vazios. Assim, f−1(Y ) = f−1(U∪V ) = f−1(U)∪f−1(V ). Todavia, Y = f(X)

e, daí, f−1(Y ) = f−1(f(X)) = X. Logo, X = f−1(Y ) = f−1(U) ∪ f−1(V ), com

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CAPÍTULO 2. CONEXIDADE

f−1(U) e f−1(V ) abertos, disjuntos e não vazios, o que é impossível, pois X éconexo.

O caso geral é consequência: dada f : X → Y contínua e dado M ⊂ X

conexo, então f : M → f(M) é uma sobrejeção contínua; logo, f(M) é conexo,pelo que acabamos de provar. �

Os Teoremas 2.3 e 2.4, apresentados acima, continuam válidos se trocarmosconexo por conexo por caminhos.

Teorema 2.5. Todo intervalo fechado em R é conexo.

Demonstração: Suponha que [a, b] = H ∪K, H e K separáveis, com a ∈ H.Seja M = {x | x = a ou [a, x] ⊂ H}. Então, M é limitado superiormente. Seja c

o menor limitante superior de M . Então, c ∈ [a, b], c é um ponto limite de H,c /∈ K e, assim, c ∈ H. Se c < b, então c é um ponto limite de K, o que con-tradiz a hipótese de H e K separáveis. Logo, c = b e, assim, H = [a, b] e K = ∅.Portanto, [a, b] não é a união de dois conjuntos separáveis não vazios quaisquer. �

Apesar de referir-se a intervalos fechados, pois é o que nos interessa no con-texto deste trabalho, o teorema acima é válido para qualquer tipo de intervalo.

Teorema 2.6. Se M é conexo e M ⊂ L ⊂ M , então L é conexo.

Demonstração: Suponha que L = H∪K, H e K separáveis. Seja H ′ = M ∩H

e K ′ = M ∩ K, e assim M = H ′ ∪ K ′. Então H ′ e K ′ são separáveis. Temosque H contém um ponto P de L e tal P é um ponto ou um ponto limite de M .Assim, P é um ponto ou um ponto limite qualquer de H ′ ou de K ′. Mas P nãoé nem um ponto, nem um ponto limite, de K ′ ⊂ K. Assim, P é um ponto ouum ponto limite de H ′. Daí, H ′ 6= ∅. Analogamente, K ′ 6= ∅. Assim, M não éconexo, contrariando a hipótese do teorema. �

Teorema 2.7. Todo conjunto conexo por caminhos é conexo.

Demonstração: Suponha que M seja conexo por caminhos, mas não conexo.Então, M = H∪K, H e K separáveis. Tome P ∈ H, Q ∈ K e seja p um caminhode P para Q em M . Pelos Teoremas 2.4 e 2.5, a imagem |p| = p([a, b]) ⊂ M éconexa. Pelo Teorema 2.2, |p| encontra-se em H ou em K, o que é falso. �

A recíproca do teorema acima, no entanto, não é verdadeira, contrariando aidéia de que espaço conexo é aquele formado por um único pedaço. Por exemplo,seja M o gráfico de f(x) = sen(1/x), com 0 < x ≤ 1/π, em R2, junto com os

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CAPÍTULO 2. CONEXIDADE

pontos (0, 1) e (0,−1). Através dos Teoremas 2.5, 2.3, 2.4 e 2.6, podemos mostrarque M é conexo; porém, também é possível mostrar que não existe um caminho,em M , de (0, 1) (ou (0,−1)) para um outro ponto qualquer de M e, sendo assim,M não é conexo por caminhos.

Teorema 2.8. Um espaço métrico X é desconexo se, e somente se, existe umafunção contínua e sobrejetora f : X → {0, 1}.

Demonstração: (⇒) Suponha X desconexo. Então, X = H ∪K, com H e K

abertos, disjuntos e não vazios. Seja f : X → {0, 1} uma função definida por

f(x) =

0, se x ∈ H

1, se x ∈ K.

Então, f−1({0}) = H e f−1({1}) = K. Como os abertos de {0, 1} são∅, {0} , {1} e {0, 1}, e H e K são abertos de X, segue, pelo Teorema 1.3, quef é uma função contínua.

(⇐) Suponha que exista f : X → {0, 1} contínua. Sejam f−1(0) = H ef−1(1) = K. Assim, H 6= ∅, K 6= ∅ e H ∩K = ∅. Como f é contínua e {0} e {1}são abertos em {0, 1}, temos que H e K são abertos, pelo Teorema 1.3. Alémdisso, H ∪K = f−1({0, 1}) = X. Logo, X é desconexo. �

Definição 2.6. Seja M um conjunto e P ∈ M . O componente conexo de M ,C(M, P ), que contém P é a união de todos os subconjuntos conexos de M quecontêm P ; isto é, é o maior subconjunto conexo de M que contém P .

Todo conjunto C(M, P ) é conexo.

Teorema 2.9. Cada duas componentes conexas (diferentes) de um mesmo con-junto são disjuntas.

Demonstração: Sejam C1 e C2 duas componentes conexas distintas de umconjunto M . Suponha que exista x ∈ C1∩C2. Então, x ∈ C1 e x ∈ (C1∪C2) ⊂ C1,pois C1 é o maior subconjunto conexo de M que contém x. Assim, C2 ⊂ C1.

Analogamente, x ∈ C2 e x ∈ (C1 ∪ C2) ⊂ C2, pois C2 é o maior subconjuntoconexo de M que contém x. Assim, C1 ⊂ C2. Logo, C1 = C2, o que gera umacontradição. �

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Capítulo 3

Simplexos

Para construirmos e compreendermos a demonstração do Teorema da Curvade Jordan, além das noções topológicas apresentadas nos capítulos anteriores, sãonecessários outras idéias e conceitos mais específicos, os quais serão abordadosneste capítulo, juntamente com alguns de seus resultados mais importantes.

Definição 3.1. Sejam x0, x1, ..., xp (p + 1) pontos em Rn. Dizemos que taispontos estão em posição geral quando x1−x0, x2−x0, ..., xp−x0 são linearmenteindependentes.

Exemplo 3.1. (i) 3 pontos não alinhados estão na posição geral de R2.(ii) 4 pontos não alinhados e não coplanares estão na posição

geral de R3.

Definição 3.2. Um subconjunto X de Rn é dito convexo quando, dados doispontos quaisquer de X, o segmento de reta que os une está contido em X. Istoé, para cada x, y ∈ X, o segmento xy = {αx + βy | α, β ≥ 0, α + β = 1} ⊂ X.

O envoltório convexo de X ⊂ Rn é o menor subconjunto convexo de Rn quecontém X. Em outras palavras, é a intersecção de todos os subconjuntos convexosde Rn que contém X.

Definição 3.3. Seja V = {v0, v1, ..., vn} ⊂ Rm um conjunto com (n + 1) pontosem posição geral, com n ≤ m. Então, o n-dimensional simplexo, ou n-simplexo,σn = v0v1...vn, é o envoltório convexo de V .

Os pontos de V são chamados vértices de σn e o envoltório convexo τ de umsubconjunto W de V , W 6= ∅, é chamado face de σn. Assim, se τ é um k-simplexo,então τ é chamado uma k-face de σn.

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CAPÍTULO 3. SIMPLEXOS

Exemplo 3.2. (i) Os 0-simplexos são os pontos de Rn.(ii) Os 1-simplexos são segmentos ligando 2 pontos.(iii) Os 2-simplexos são regiões triangulares.(iv) Os 3-simplexos são tetraedros.

Teorema 3.1. Todo simplexo é conexo por caminhos.

Demonstração: Dados dois pontos quaisquer P e Q de um simplexo, sempre épossível construir um caminho de P para Q, ou de Q para P , pois todo simplexoé convexo. �

Definição 3.4. Um complexo é uma coleção K de simplexos em Rm tal que:(K1) K contém todas as faces de todos os elementos de K.(K2) Se σ, τ ∈ K e σ ∩ τ 6= ∅, então σ ∩ τ é uma face comum de σ e τ .(K3) Cada σ ∈ K encontra-se em um conjunto aberto U que intersepta apenas

um número finito de elementos de K.

Definição 3.5. Para cada i ≥ 0, definimos o i-esqueleto de K, Ki, como oconjunto de todos os simplexos de K que têm dimensão menor ou igual que i.

Exemplo 3.3. (i) O 0-esqueleto de K, K0, é o conjunto de todos os vértices deK.

(ii) O 1-esqueleto de K, K1, é o conjunto de todos os vértices earestas de K.

Definição 3.6. Um complexo K é conexo se não é a união de dois complexosdisjuntos não vazios.

Seja K é um complexo. Então |K| denota a união dos elementos de K (pontos,arestas e faces). Como conjunto, |K| é chamado de poliedro. Assim, se K é umcomplexo finito, então |K| é um poliedro finito.

Definição 3.7. Um polígono é uma 1-esfera poliedral.

Teorema 3.2. Seja K um complexo. Se K é conexo, então |K| é conexo porcaminhos.

Demonstração: Seja v0 ∈ K0. Queremos mostrar que, para cada v ∈ K0,existe um caminho em |K1| de v0 para v.

Seja V o conjunto de todos os vértices v de K que têm essa propriedade e sejaK1 o conjunto de todos os simplexos de K cujos vértices estão todos em V . Então,K1 é um subcomplexo de K e nenhuma aresta de K intercepta |K1| e K0 − V .

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CAPÍTULO 3. SIMPLEXOS

Assim, nenhum simplexo de K intercepta |K1| e K0 − V . Seja K2 = K − K1.Então K2 é um subcomplexo de K e K1 ∩K2 = ∅. Como K é conexo, K2 = ∅.Assim, K1 = K e V é todo K0.

Agora, tome v ∈ σ ∈ K e w ∈ τ ∈ K. Tome um caminho, em σ, de v para umvértice v0 de σ; um caminho, em |K1|, de v0 para um vértice v1 de τ e, finalmente,um caminho, em τ , de v1 para w. Juntos, eles formarão um caminho de v paraw. �

Teorema 3.3. Seja K um complexo. São equivalentes:(1) K é conexo.(2) |K| é conexo por caminhos.(3) |K| é conexo.

Demonstração: (1) ⇒ (2) Pelo Teorema 3.2.(2) ⇒ (3) Pelo Teorema 2.8.(3) ⇒ (1) Suponha que (1) é falsa. Então, K = K1∪K2, onde

K1 e K2 são complexos disjuntos não vazios. Pela condição (K3) da definiçãode complexo, segue que nenhum ponto v de |K| é um ponto limite da união dossimplexos de K que não contêm v. Assim, |K1| e |K2| são separáveis e |K| é nãoconexo. �

Definição 3.8. Uma n-célula é um espaço homeomorfo a um n-simplexo.

Exemplo 3.4. (i) Uma 0-célula é homeomorfa a um ponto.(ii) Uma 1-célula é homeomorfa a um arco ou uma reta.(iii) Uma 2-célula é homeomorfa a um disco.

Definição 3.9. Um arco é uma 1-célula. Uma linha quebrada é um arco poliedral.

Teorema 3.4. Em Rn, todo conjunto aberto conexo U é conexo por linha que-brada.

Demonstração: Seja P ∈ U e seja V a união de {P} e o conjunto de todos ospontos de U que podem ser ligados a P por linhas quebradas em U . Mostremosque V e U − V são abertos. Tome Q ∈ V ⊂ U . Como U é aberto, existe δ > 0

tal que B(Q, δ) ⊂ U . Seja R ∈ B(Q, δ). Como B(Q, δ) é convexa, existe umsegmento ligando R a Q. Logo, R ∈ V , pois basta tomarmos uma composição delinhas quebradas. Portanto, B(Q, δ) ⊂ V (V é aberto). Agora, tome S ∈ U − V .Como S ∈ U e U é aberto, existe δ > 0 tal que B(S, δ) ⊂ U . Seja T ∈ B(S, δ).Como B(S, δ) é convexa, existe um segmento ligando T a S. Então, S /∈ V , pois,do contrário, teríamos uma linha quebrada ligando S a P , o que não ocorre.

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CAPÍTULO 3. SIMPLEXOS

Assim, se U − V 6= ∅, então U é a união de dois conjuntos abertos, disjuntose não vazios, o que é falso, pois, por hipótese, U é conexo. �

Definição 3.10. Uma n-variedade é um espaço métrico separável Xn, em quecada ponto tem uma vizinhança homeomorfa em Rn.

Definição 3.11. Seja K um complexo tal que o espaço M = |K| é uma n-variedade. Então, K é uma n-variedade triangularizável.

Definição 3.12. Sejam σn = v0v1...vn um n-simplexo e P um ponto de σn.Definimos as coordenadas baricêntricas de P como a n-upla (λ0, λ1, ..., λn) talque P = λ0v0 + λ1v1 + ... + λnvn, ti ≥ 0 e

∑ni=0λi = 1.

Dados dois simplexos σn e τn, dizemos que uma função f : σn → τn é linearse as coordenadas de um ponto f(P ) são funções lineares das coordenadas de P .Assim, dizemos que as coordenadas baricêntricas dos pontos P de σn são funçõeslineares de coordenadas cartesianas e vice-versa. Além disso, se pontos, vérticese arestas são levados, respectivamente, em pontos, vértices e arestas, dizemos quef é simplicial.

Sejam K e L complexos e φ : K → L uma bijeção. Para cada v ∈ K, sejav′ = φ(v). Suponha que se v0v1...vn ∈ K, então v′0v

′1...v

′n ∈ L, e vice-versa. Então,

dizemos que φ é um isomorfismo entre K e L (se existe tal φ, então K e L sãoisomorfos).

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Capítulo 4

Propriedades de separação de

polígonos em R2

Com base nas definições apresentadas nos capítulos anteriores, discutiremos,agora, alguns resultados referentes à “caracterização” de polígonos e suas relaçõescom o espaço em que se encontra.

Vale lembrar, também, que N é uma vizinhança de um conjunto M se N

contém um conjunto aberto que contém M . Além disso, para cada complexo K,K será chamado uma triangularização de |K|.

Teorema 4.1. Seja J um polígono em R2. Então, R2−J tem, exatamente, duascomponentes.

Demonstração: Seja N uma vizinhança de J , formada por pequenas vizinhan-ças poliedrais convexas das arestas e vértices de J , exemplificada na Figura 4.1.Mais precisamente, queremos dizer as arestas e vértices de uma triangulação deJ.

Figura 4.1:

Para completar a demonstração do teorema, utilizaremos os seguintes resul-tados:

Lema 4.1. R2 − J tem, no máximo, duas componentes.

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CAPÍTULO 4. PROPRIEDADES DE SEPARAÇÃO DE POLÍGONOS EM R2

Demonstração: A partir de qualquer ponto P de N − J , podemos escolhernossa trajetória em torno do polígono, ao longo de um caminho em N − J , atéchegarmos a qualquer P1 ou P2 (veja Figura 4.2). Disto segue o lema, pois todoponto Q de R2 − J pode ser ligado a algum ponto P de N − J por um segmentolinear em R2 − J .

Figura 4.2:

Lema 4.2. R2 − J tem, pelo menos, duas componentes.

Demonstração: Tome eixos em posição geral, no sentido de que nenhumalinha horizontal contenha mais do que um vértice de J . Isso pode ser feito,porque existe apenas um número finito de direções que precisamos evitar.

Para cada ponto P de R2, seja LP a linha horizontal através de P . O índiceIndP de um ponto P de R2 − J é definido da seguinte maneira: (1) se LP nãocontém vértice de J , então IndP é o número de pontos de LP ∩J que encontram-se à esquerda de P , reduzido módulo 2. Então, IndP é 0 ou 1. (2) Se LP contémum vértice de J , então IndP é o número de pontos de L′∩J que estão à esquerdade P , reduzido módulo 2, onde L′ é uma linha horizontal situada ligeiramenteacima ou ligeiramente abaixo de LP , de modo que nenhum vértice de J encontra-se em L′ ou entre LP e L′. As três possibilidades para J , com relação a L′, sãomostradas na Figura 4.3. Em cada caso, as duas possíveis posições para L′ geramo mesmo índice para P .

Figura 4.3:

A função f : R2 − J → {0, 1}, definida por f(P ) = IndP é contínua. SeIndP = i, então IndP ′ = i, quando P ′ é suficientemente próximo de P . O

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CAPÍTULO 4. PROPRIEDADES DE SEPARAÇÃO DE POLÍGONOS EM R2

conjunto f−1(0) é não vazio, pois cada ponto acima de todo J pertence a f−1(0).Para mostrar que f−1(1) é não vazio, seja Q um ponto de J tal que LQ nãocontém vértice de J . Seja P1 o ponto mais à esquerda de J em LQ. Seja P umponto de LQ, ligeiramente à direita de P1, no sentido de que P /∈ J e nenhumponto entre P1 e P pertence a J . Então, IndP = 1.

Assim, R2 − J é desconexo, pelo Teorema 2.8.E, com isso, provamos o teorema. �

Sabendo que R2 − J tem, exatamente, duas componentes, chamaremos deI (interior de J ) a componente limitada de R2 − J e de E (exterior de J ) acomponente ilimitada de R2 − J .

Teorema 4.2. Seja I o interior de um polígono J em R2. Então, I é um poliedrofinito. Isto é, existe um complexo finito K em R2 tal que |K| = I.

Demonstração: Sejam L1, L2, ..., Ln linhas que contêm as arestas de J . Estaslinhas existem em uma quantidade finita e cada uma intercepta a união das outrasem um número finito de pontos. Note que alguns conjuntos Li∩ I podem não serconexos, mas isso não importa.

Cada linha Li decompõe R2 em dois semi-planos fechados Hi e H ′i e qualquer

intersecção finita de semi-planos é fechada e convexa. Assim,⋃n

i=1 Li decompõeR2 em uma coleção finita de regiões convexas fechadas R1, R2, ..., Rn tais que,para cada j, temos FrRj ⊂

⋃ni=1 Li. Agora, Rj ∩ J ⊂ FrRj para cada j. Segue

que, para cada j, temos Rj ∩ I ⊂ J ou Rj ⊂ I. Então, I é a união dos conjuntosRj que encontram-se em I e, desse modo, é apenas uma questão de notação suporque I =

⋃kj=1 Rj.

Para cada j ≤ k, FrRj é a união de um número finito de 1-simplexos. Es-colhemos o mínimo de triangularizações dos conjuntos FrRj, no sentido que seduas arestas de Rj têm um ponto final em comum, então não são colineares. Paracada j, tomamos um ponto wj de Rj−FrRj e, para cada 1-simplexo vv′ de FrRj,formamos o 2-simplexo wjvv′, conforme a Figura 4.4.

Figura 4.4:

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CAPÍTULO 4. PROPRIEDADES DE SEPARAÇÃO DE POLÍGONOS EM R2

Esse processo gera triangularizações de Rj. A união delas é uma triangulari-zação de I. �

Teorema 4.3. Uma linha quebrada não separa R2. Isto é, se B é uma linhaquebrada em R2, então R2 −B é conexo.

Demonstração: Tome uma vizinhança N de B, conforme a Figura 4.5. Comona demonstração do Lema 4.2, usado na demonstração do Teorema 4.1, cadaponto P de N − B pode ser ligado a qualquer outro ponto P1 ou P2 por umcaminho em N −B. Mas, se P1 e P2 estiverem próximos de um dos pontos finaisda linha, como na figura, então P1 pode ser ligado a P2 por um caminho emN−B. Assim, N−B é conexo e, como na demonstração do Teorema 4.1, R2−B

é conexo.

Figura 4.5:

Teorema 4.4. Sejam X um espaço métrico e U um conjunto aberto. Então,FrU = U − U .

Demonstração: Por definição, FrU = U ∩X − U . Assim, FrU ⊂ U . ComoU é aberto, temos que U ∩X − U = ∅. Além disso, como FrU ⊂ X − U , segueque FrU ⊂ U −U . Agora, se P ∈ U −U , então P ∈ U e P ∈ (X −U) ⊂ X − U .Logo, U − U ⊂ FrU , provando o teorema. �

Teorema 4.5. Seja J um polígono em R2, com interior I e exterior E. Então,cada ponto de J é um ponto limite tanto de I quanto de E.

Demonstração: Seja F = FrI = I − I. Então, F separa R2: R2 − F =

I ∪ (R2− I), onde I e (R2− I) são conjuntos abertos, disjuntos e não vazios; alémdisso, (R2 − I) contém E, F ⊂ J e F é fechado.

Se F 6= J , então F encontra-se em uma linha quebrada B ⊂ J . Assim,R2 − B = I ∪ [R2 − (I ∪ B)], onde os dois conjuntos à direita da igualdade sãoabertos, disjuntos e não vazios e, além disso, [R2 − (I ∪B)] ⊃ E. Assim, R2 −B

é não conexo, o que é impossível pelo Teorema 4.3. �

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CAPÍTULO 4. PROPRIEDADES DE SEPARAÇÃO DE POLÍGONOS EM R2

Teorema 4.6. Sejam J, I e E como no Teorema 4.5. Então, J = FrI = FrE.

Demonstração: Pelo Teorema 4.5, temos que J ⊂ I e J ∩ I = ∅. Assim,J ⊂ I − I = FrI. Além disso, I − I ⊂ J , pois E é aberto. Logo, J = FrI.

Analogamente, mostramos que J = FrE. �

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Capítulo 5

Homeomorfismo entre polígonos em

R2

Agora, queremos mostrar que todos os polígonos estão situados, no plano,exatamente da mesma maneira. Isto é, se J e J ′ são polígonos em R2, entãoexiste um homeomorfismo f : R2 ↔ R2 tal que f(J) = J ′.

Teorema 5.1. Sejam σn = v0v1...vn e τn = w0w1...wn simplexos em Rm. Então,existe um homeomorfismo simplicial

f : σn ↔ τn

f : vi 7→ wi.

Demonstração: Para cada v =∑n

i=0 αivi, com αi ≥ 0 e∑n

i=0 αi = 1, definaf(v) =

∑ni=0 αiwi. Tal f é bijetora. Além disso, f e f−1 são lineares em relação

às suas coordenadas baricêntricas e cartesianas e, portanto, contínuas. �

Teorema 5.2. No Teorema 5.1, se m = n, então existe um homeomorfismog : Rn ↔ Rn tal que g|σn é um homeomorfismo simplicial σn ↔ τn.

Demonstração: A aplicação v 7→ v − v0 é um homeomorfismo Rn ↔ Rn eleva, simplicialmente, cada simplexo a outro simplexo. Além disso, a composiçãode duas destas tais aplicações mantém a mesma propriedade. Assim, podemosassumir, sem perda de generalidade, que v0 é a origem em Rn. Procedemos,analogamente, para w0. Disso, segue que {v1, v2, ..., vn} e {w1, w2, ..., wn} sãolinearmente independentes.

Para cada v =∑n

i=1 αivi ∈ Rn, defina g(v) =∑n

i=1 αiwi. Então, g|σn assumea posição da função f no Teorema 5.1 e, portanto, vale o resultado. �

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CAPÍTULO 5. HOMEOMORFISMO ENTRE POLÍGONOS EM R2

Seja J um polígono em R2 com interior I. Pelo Teorema 4.2, I é um poliedrofinito |K|. Se σ2 ∈ K e σ2 ∩ J consiste de uma ou duas bordas de σ2, então σ2 échamado livre em K.

Por exemplo, na figura abaixo, 1, 3, 4, 6 e 7 são livres, mas 2 e 5 não.

Figura 5.1:

Teorema 5.3. Sejam J um polígono em R2, I o interior de J e K uma triangu-larização de I. Se K tem mais que um 2-simplexo, então K tem um 2-simplexolivre.

Demonstração: O teorema, na forma como foi apresentado, é difícil de provar.Porém, podemos provar, por indução, a afirmação mais forte de que K tem, pelomenos, dois 2-simplexos livres.

Se K tem, exatamente, dois 2-simplexos, então não há nada a provar. As-suma, então, que K tem mais que dois 2-simplexos e, como hipótese de indução,podemos assumir que nossa conclusão vale para cada complexo L que é umatriangularização de uma região do tipo I e tem menos 2-simplexo que K.

Existem, pelo menos, dois 2-simplexos σ, τ de K que têm uma aresta emFr |K|. Se ambos são livres, não há nada a provar. Suponha, então, que σ =

v0v1v2 ∈ K, com v0v1 ⊂ Fr |K|, e τ não é livre. Então, nem v0v2 nem v1v2

encontra-se em Fr |K|, como mostra a figura abaixo.

Figura 5.2:

Os pontos v0 e v2 decompõem o polígono J = Fr |K| em duas linhas quebradasC1 e C2; e |K| = I1 ∪ I2, onde I1 e I2 são os interiores de C1 ∪ v0v2 e C2 ∪v0v2 respectivamente. Seja L1 o complexo formado pelos simplexos de K queencontram-se em I1, juntamente com v0v1v2 e suas faces. Seja L2 o conjunto detodos os simplexos de K que encontram-se em I2. Pela hipótese de indução, cada

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CAPÍTULO 5. HOMEOMORFISMO ENTRE POLÍGONOS EM R2

um dos complexos Li tem dois 2-simplexos livres. Assim, cada um deles temum 2-simplexo livre σi, diferente de v0v1v2. Disso, segue que cada σi é livre nãoapenas em Li mas, também, em K, como queríamos provar. �

Teorema 5.4. Seja J um polígono em R2. Então existe um homeomorfismoh : R2 ↔ R2, tal que h(J) é a fronteira de um 2-simplexo.

Demonstração: Sejam I o interior de J e K uma triangularização de I.Qualquer 2-simplexo livre de K pode ser removido por um homeomorfismo h :

R2 ↔ R2.Dividiremos nossa demonstração em casos.CASO 1. Suponha que v0v1v2 é livre, com v0v1v2 ∩ Fr |K| = v0v2. Tomamos

v3, v4 e v5 como na figura abaixo, de modo que eles e v1 sejam colineares, comv3 e v4 pertos de v1 e v5 respectivamente, tal que a figura toda intercepta Fr |K|apenas em v0v2.

Figura 5.3:

Então, definimos h como a identidade no complemento da figura 5.3, de modoque v0, v2, v3 e v4 fiquem fixados. Agora, defina h(v5) = v1 e estenda h simplicial-mente para cada um dos simplexos v0v4v5, v2v4v5, v0v5v3 e v2v5v3. O efeito de h

é reduzir por um o número de 2-simplexos de K.CASO 2. Suponha que v0v1v2 é livre em K, com v0v1v2∩Fr |K| = v0v1∪v1v2,

e tome a inversa da função h definida no caso 1.Por indução, segue o teorema. �

Teorema 5.5. Sejam J e J ′ polígonos em R2. Então, existe um homeomorfismoh : R2 ↔ R2, J ↔ J ′.

Demonstração: Sejam σ2 e τ 2 dois 2-simplexos. Pelo Teorema 5.4, existemhomeomorfismos

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CAPÍTULO 5. HOMEOMORFISMO ENTRE POLÍGONOS EM R2

f1 : R2 ↔ R2, J ↔ Frσ2,f2 : R2 ↔ R2, J ′ ↔ Frτ 2.

Pelo Teorema 5.2, existe um homeomorfismo

f3 : R2 ↔ R2, σ2 ↔ τ 2.

Defina h : f−12 f3f1. Dessa composição, segue o resultado do teorema. �

Teorema 5.6. Todo polígono em R2 é a fronteira de uma 2-célula em R2.

Demonstração: Segue do Teorema 5.4, visto que uma 2-célula é homeomorfaa um 2-simplexo. �

Teorema 5.7. Seja J um polígono em R2, com interior I, e seja U um conjuntoaberto contendo I. Então, existe um homeomorfismo h : R2 ↔ R2 tal que:

(1) h(J) é a fronteira de um 2-simplexo e(2) h|(R2−U) é a identidade.

Demonstração: Segue da demonstração do Teorema 5.4, pois, nela, podemosescolher nossos homeomorfismos de modo que cada um deles satisfaça a condição(2). �

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Capítulo 6

O Teorema da Curva de Jordan

Baseados em tudo o que foi apresentado nos capítulos anteriores, finalmentesomos capazes de apresentar o Teorema da Curva de Jordan e compreender suademonstração.

Eis o teorema:

Teorema 6.1. O Teorema da Curva de Jordan. Seja J uma 1-esfera topo-lógica em R2. Então, R2 − J é a união de dois conjuntos conexos disjuntos I eE tal que J = FrI = FrE.

Demonstração: A demonstração do teorema acima será construída; isto é,trata-se de uma junção de outros resultados - cada qual demonstrado separada-mente - que, juntos, constituirão a demonstração desejada.

Vamos a ela:

Teorema 6.2. Seja U um conjunto aberto em Rn e sejam P, Q ∈ U . Se P eQ estão em componentes diferentes de U , então U é a união de dois conjuntosabertos disjuntos contendo P e Q, respectivamente.

Demonstração: Cada componente de U é aberta, pois toda B(P, ε) é conexa.Assim, toda união de componentes de U é aberta. Seja CP a componente de U

que contém P . Então, U = CP ∪ (U −CP ), onde U −CP é aberto e contém Q. �

Teorema 6.3. Seja I o interior de um polígono em R2 e sejam P, Q,R e S pontosde FrI, aparecendo numa ordem cíclica em FrI. Seja A um arco de P para R,encontrando-se em I, tal que A∩ FrI = {P, Q}. Então, I −A é a união de doisconjuntos abertos disjuntos UQ e US, contendo Q e S em suas fronteiras.

Demonstração: Pelo Teorema 5.5, podemos supor, sem perda de generalidade,que I é uma região retangular. Além disso, podemos tomar P, Q,R e S como naFigura 6.1.

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CAPÍTULO 6. O TEOREMA DA CURVA DE JORDAN

Figura 6.1:

Sejam Q′ e S ′ pontos de I, próximos de Q e S respectivamente, como ilustradona Figura 6.1 acima. Se Q′ e S ′ estão em uma mesma componente de I − A,então existe uma linha quebrada de Q′ para S ′ em I − A. Assim, existe umalinha quebrada B de Q para S, situada em I −A e interseccionando FrI apenasem Q e S. Todavia, P e R encontram-se em uma mesma componente de I − B,pois A ⊂ I −B e A é conexo, gerando uma contradição. �

Teorema 6.4. Seja J uma 1-esfera topológica em R2. Então, R2 − J não éconexo.

Demonstração: Seja I uma 2-célula poliedral contendo J tal que J ∩ FrI

contém, exatamente, dois pontos P e R. Então, J é a união de dois arcos A1 e A2

de P para R. Tome uma linha quebrada B, de S para Q, em I, interseccionandoFrI apenas em S e Q. Seja T o primeiro ponto de B, na ordem de S para Q,que se encontra em J ; sejam A1 o arco de P para R, em J , que contém T e A2 ooutro arco de P para R em J . Seja X o último ponto de B que se encontra emA1, conforme a figura abaixo.

Figura 6.2:

Lema 6.1. A2 contém um ponto de B, após X, na ordem de S para Q em B.

Demonstração: Suponha que não. Seja B1 = ST o arco de S para T em B;seja B2 = TX o arco de T para X em A1 e seja B3 = XQ o arco de X para Q

em B. Então, B1 ∪ B2 ∪ B3 é um arco de S para Q em I − A2. Assim, S e Q

encontram-se na fronteira de uma mesma componente de I −A2, contrariando oteorema anterior. �

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CAPÍTULO 6. O TEOREMA DA CURVA DE JORDAN

Sejam Y o primeiro ponto de B que se encontra em A2 e segue X em B, naordem de S para Q, e Z um ponto qualquer entre X e Y em B.

Lema 6.2. Z encontra-se em uma componente limitada de R2 − J .

Demonstração: Suponha que não. Então, existe uma linha quebrada B1 deZ para um ponto W de FrI, com B1 ⊂ R2 − J . Podemos supor que B1 ∩FrI = W , pois, caso contrário, uma linha quebrada menor teria as mesmaspropriedades. Considere, primeiro, o caso em que W e S encontram-se em umamesma componente de FrI − {P, R}, ilustrado na figura abaixo.

Figura 6.3:

Neste caso, B contém um arco B2, de Z para Q, que não intercepta A1. Então,segue que W e Q estão na fronteira de uma mesma componente de I −A1, o quecontraria o teorema anterior.

Suponha, agora, que W e Q encontram-se em uma mesma componente deFrI − {P, R}, conforme a figura a seguir.

Figura 6.4:

Seja T o ponto mais baixo de B (linha quebrada de S para Q) que se encontraem A1. Faça a união dos arcos B1, ZX ⊂ QS,XT ⊂ A1 e TS ⊂ SQ. Daí, segueque W e S encontram-se na fronteira de uma mesma componente de I − A2,contrariando, novamente, o teorema anterior.

Desse modo, o Teorema 6.4 está provado. �

Teorema 6.5. Sejam I, P, Q,R e S como nos teoremas anteriores e sejam A1 eA2 arcos disjuntos em I tal que A1 ∩ FrI = {P} e A2 ∩ FrI = {R}. Então, S eQ estão na fronteira de uma mesma componente de I − (A1 ∪ A2).

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CAPÍTULO 6. O TEOREMA DA CURVA DE JORDAN

Demonstração: Tomamos I como uma região triangular, com P e Q os pontosmédios de um par de lados opostos, como na figura a seguir.

Figura 6.5:

Por uma “decomposição em tijolos” do plano, entendemos uma coleção G =

{gi} de discos poliedrais (ou 2-células) tais que: (1)⋃∞

i=1 gi = R2, (2) se doisconjuntos gi e gj se interceptam, então sua intersecção é uma linha quebradasituada na fronteira de cada um deles e (3) cada ponto possui uma vizinhançaque intercepta, no máximo, três dos conjuntos gi.

Uma maneira de obtermos tal coleção é cortar o plano por linhas horizontaise segmentos verticais, de modo a obter uma “parede de tijolos infinita”, comomostra a Figura 6.6.

Figura 6.6:

Em geral, dado um conjunto M em um espaço métrico (X, d), o diâmetro δM

de M é o menor limitante superior dos números d(P, Q), P, Q ∈ M . (Então, δM

pode ser infinito). Sendo assim, se G é uma coleção de subconjuntos de X, entãoa rede de G é o menor limitante superior dos números δg, g ∈ G.

Evidentemente, podemos construir uma decomposição em tijolos G de R2

com uma rede tão pequena quanto quisermos. Em todos os casos, a união desubcoleções quaisquer de G é uma 2-variedade com fronteira.

Em nosso caso, usaremos tijolos que são regiões retangulares, com ladosparalelos às bordas de FrI e diâmetro suficientemente pequeno para que nenhumdeles intercepte A1 e A2, tais que I é a união de uma subcoleção deles.

Seja N a união de todos os tijolos da decomposição que interceptam A1.Então, N é uma 2-variedade com fronteira, tal como o conjunto N ′ = N ∩ I.

Seja J a componente de FrN ′ que contém P . Então, J é uma 1-esfera. SejaB1 a componente de J ∩ FrI que contém P . Então, B1 é uma linha quebradaentre dois pontos T e U , onde T, U ∈ FrI, T encontra-se abaixo de P e R e U

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CAPÍTULO 6. O TEOREMA DA CURVA DE JORDAN

encontra-se acima de P e R. Seja B2 outra linha quebrada entre T e U em J .Sejam V o último ponto de B2 que se encontra em FrI, abaixo de P e R, e W oprimeiro ponto de B2 que segue V e encontra-se em FrI. Então, W está acimade P e R em FrI.

Figura 6.7:

Seja B a linha quebrada entre V e W em B2. Então, B ∩ FrI = {V, W}.Nestas condições, V e W encontram-se na fronteira de uma mesma componentede I − (A1 ∪ A2). Assim, Q e S têm a mesma propriedade. �

Teorema 6.6. Arco não separa R2.

Demonstração: Seja A um arco em R2. Como A é limitado, R2 − A tem,exatamente, uma componente ilimitada. Logo, precisamos mostrar que R2 − A

não possui componente limitada.Se U é uma componente limitada de R2 − A, então FrU ⊂ A e FrU é

fechada. Em um intervalo [a, b], todo conjunto fechado M encontra-se em umintervalo mínimo [a′, b′], com a′, b′ ∈ M , pois o menor limitante superior e o maiorlimitante inferior de M devem pertencer a M ; neste caso, b′ e a′ respectivamente.Disso, segue que cada imagem homeomorfa de [a, b] tem a mesma propriedade;A possui um sub-arco A′ que contém FrU e tem seus pontos finais em FrU .Assim, podemos assumir, sem perda de generalidade, que os pontos finais T, T ′

de A encontram-se em FrU .Agora, incluimos A em uma 2-célula I, de modo que A intercepte FrI em,

exatamente, dois pontos P, R. Como na Figura 6.8, estes podem não ser os pontosfinais T, T ′ de A.

Pelo teorema anterior, existe uma linha quebrada B, de S para Q, tal queB ∩ FrI = {Q,S}, IntB ⊂ I, B ∩ A1 = ∅ e B ∩ A3 = ∅.

Sejam V o primeiro ponto de B, na ordem de S para Q, que se encontra emA2; W o último ponto de B que se encontra em A2; B1 o arco de S para V em B;B2 o arco de V para W em A2; B3 o arco de W para Q em B e B′ = B1∪B2∪B3.

Pelo Teorema 6.3, P e R encontram-se nas fronteiras de componentes distintasde I − B′. Assim, T e T ′ estão em componentes distintas de I − B′. Mas isso é

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CAPÍTULO 6. O TEOREMA DA CURVA DE JORDAN

impossível, pois U é conexo, U ∩ B′ = ∅ e T e T ′ são pontos limites de U . Talcontradição completa a demonstração do teorema.

Figura 6.8:

Teorema 6.7. Seja J uma 1-esfera em R2 e seja U uma componente de R2− J .Então, J = FrU .

Demonstração: Claramente, FrU ⊂ J . Se FrU não é todo J , então FrU

encontra-se em um arco A em J . Como R2 − J tem uma outra componente V ,segue que A separa R2, contrariando o Teorema 6.6. �

Teorema 6.8. Seja J uma 1-esfera em R2. Então, R2 − J tem apenas umacomponente limitada.

Demonstração: Sejam X, Y e Z como na Figura 6.2. Novamente, J = A1∪A2;T é o primeiro ponto de B, na ordem de S para Q, que se encontra em J , T ∈ A1;X é o último ponto de B em A1; Y é o primeiro ponto, depois de X, em B quese encontra em A2; Z é um ponto entre X e Y em B e W é o último ponto de B

que se encontra em A2, como ilustrado na figura abaixo.

Figura 6.9:

Pelo Lema 6.2, temos que Z se encontra em uma componente limitada deR2 − J . Logo, precisamos mostrar que R2 − J não possui outra componentelimitada.

Sejam B1 o arco de S para T em B; B2 o arco de T para X em A1 (se T eX forem, realmente, diferentes; caso contrário, B2 = T = X); B3 o arco de X

para Y em B; B4 o arco de Y para W em A2 (se Y 6= W ) e B5 o arco de W para

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CAPÍTULO 6. O TEOREMA DA CURVA DE JORDAN

Q em B. Seja B′ =⋃5

i=1 Bi. Então, P e R são pontos limites de componentesdiferentes de I−B′. Assim, se U é uma componente limitada de R2−J , diferenteda componente que contém Z, segue que U ∩ B′ = ∅ e, então, FrU não podeconter P e R. Assim, FrU encontra-se em um arco de J , o que é impossível, peloTeorema 6.6. �

Com isso, completamos a demonstração do Teorema da Curva de Jordan.

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Bibliografia

[1] MOISE, E. E.; Geometric Topology in Dimensions 2 and 3, Springer-Verlag, New York, 1977.

[2] LIMA, E. L.: Espaços Métricos, Instituto de Matemática Pura e Aplicada,Rio de Janeiro, Projeto Euclides, 1977.

[3] SHIRALI, S., VASUDEVA, H. L.; Metric Spaces, Springer-Verlag, 2006.

[4] Disponível em:<http://www.sedentario.org/colunas/duvida-razoavel/dentro-ou-fora-2-15872>Acessado em: 02 de Junho de 2010.

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