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UNIVERSIDADE DE MARÍLIA
FERNANDO VIDOTTI FAVARON
CONFLITOS JURÍDICOS DERIVADOS DAS RELAÇÕES DE CONSUMO NAS CONCESSÕES DE SERVIÇOS PÚBLICOS:
UMA PERSPECTIVA INTEGRADA
MARÍLIA
2008
FERNANDO VIDOTTI FAVARON
CONFLITOS JURÍDICOS DERIVADOS DAS RELAÇÕES DE CONSUMO NAS CONCESSÕES DE SERVIÇOS PÚBLICOS:
UMA PERSPECTIVA INTEGRADA
Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em Direito da Universidade de Marília, como exigência parcial para a obtenção do grau de Mestre em Direito, sob orientação do Prof. Dr. Paulo Roberto Pereira de Souza.
MARÍLIA 2008
Autor: FERNANDO VIDOTTI FAVARON Título: CONFLITOS JURÍDICOS DERIVADOS DAS RELAÇÕES DE CONSUMO NAS CONCESSÕES DE SERVIÇOS PÚBLICOS: UMA PERSPECTIVA INTEGRADA Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em Direito da Universidade de
Marília, área de concentração Empreendimentos Econômicos, Desenvolvimento e
Mudança Social, sob a orientação do Prof. Dr. Paulo Roberto Pereira de Souza.
Aprovado pela Banca Examinadora em 1º de agosto de 2008
_______________________________________ Prof. Dr. Paulo Roberto Pereira de Souza
Orientador
________________________________________ Profa. Dra. Marlene Kempfer Bassoli
Examinadora
________________________________________ Prof. Dr. Angel Rafael Mariño Castellanos
Examinador
Dedicatória Dedico este trabalho aos meus pais, José e Maria, cujos nomes, por si só, espelham a família cristã; Aos meus irmãos, Cristiane e Frederico, pela convivência diária nestes anos de produção científica; À minha esposa Gleice, mulher honrada e de qualidades incomparáveis, esteio da edificação do amor, carinho e dedicação na criação de nossa nova família.
Agradecimentos Fundamentalmente a DEUS a realização deste trabalho, pois ELE me deste, em razão de sua grande misericórdia, vida renovada e também a oportunidade de aprimorar meus conhecimentos jurídicos por meio deste trabalho; Ao Prof. Dr. Paulo Roberto Pereira de Souza pela orientação desta dissertação e grande inspirador de novos conceitos do Direito; Na vida nenhum caminho é longo demais quando os amigos nos acompanham, por isso, em razão da presença ininterrupta, meus sinceros e generosos agradecimentos a Glauco Molina e José Vicente Godoi Junior.
CONFLITOS JURÍDICOS DERIVADOS DAS RELAÇÕES DE CONSUMO NAS CONCESSÕES DE SERVIÇOS PÚBLICOS:
UMA PERSPECTIVA INTEGRADA Resumo: O tema proposto consiste no enfrentamento de questões jurídicas passíveis de serem originadas no dia a dia dos cidadãos, de onde se busca equacionar as demandas sociais com a depuração dos conflitos de interesses por meio da processualística e dos meios alternativos para resolução de conflitos. O tema fez surgir várias problemáticas que poderiam ser consideradas no centro de atenção teóricos e práticos, entre elas algumas conduziriam a pesquisas estritamente dogmáticas e outras de natureza sócio-jurídica. Os objetivos da pesquisa são identificar os fatores que mais incidem negativamente no grau de viabilidade da processualística com o objetivo de dar segurança aos empreendimentos econômicos e também aos usuários. Também visa a contextualização do direito material, objeto dos conflitos jurídicos derivados das relações de consumo em face da concessão de serviço público e a caracterização dos meios, instrumentos e institutos utilizáveis para a resolução dos conflitos jurídicos. Tais conflitos derivam essencialmente da maneira em que são compreendidos os direitos das partes. Enquanto alguns defendem que os concessionários devem agir com certa liberdade e autonomia porque são apoiadas pelos poderes do Estado, outros defendem o valor dos direitos reconhecidos aos consumidores num sistema jurídico que tem como centro o cidadão. Portanto, há que se destacar a intervenção do Poder Público sob a forma de regulação e fiscalização na concessão de serviço público, ou seja, um controle das atividades econômicas. A resolução dos conflitos depende dos mecanismos disponíveis, isto é, dos meios e recursos que as partes têm a disposição no Direito para representar e defender seus interesses, sobretudo porque a resolução incide sobre o empreendimento econômico e as estruturas sociais. Esta pesquisa está voltada objetivamente para oferecer soluções práticas, tendo em vista as constantes reclamações advindas da população usuária de serviço público. Palavras-chave: Conflitos Jurídicos, Concessão, Serviço Público, Consumidor, Processo, Métodos Alternativos.
DERIVED JURIDICAL CONFLICTS OF THE CONSUPTION RELATIONSHIPS IN THE CONCESSIONS OF PUBLIC SERVICES:
AN INTEGRATED PERSPECTIVE Abstract: The proposed theme consists of the affronting of complex subjects and that are original of the day by day of the citizens, from where she look for to set out the social demands with the purification of the conflicts of interests through the procedural and of the alternative ways for resolution of conflicts. The theme made to appear several problems that they could be considered in the theoretical and practical center of attention, among them some would drive to researches strictly dogmatic and another of partner-juridical nature. The objectives of the research look for to identify the factors that more happens negatively in the degree of viability of the procedural with the objective of giving safety to the economical enterprises and also to the users. It also aims to contextualization of substantive law, object of legal conflicts arising in relations of consumption in the face of the concession of public service and characterization of resources, instruments and institutions used for the resolution of legal conflicts. Such conflicts arise mainly from the way they are understood the rights of the parties. While some argue that the dealers have to act with a certain freedom and autonomy because they are supported by branches of government, others argue the value of the rights granted to consumers in a legal system that has as a citizen center. Therefore, we must highlight is the intervention of the Public Authorities in the form of regulation and supervision in the granting of public service, or a control of economic activities. The resolution of conflicts depends on the mechanisms available, that is, the means and resources which the parties have the provision in law to represent and defend their interests, especially since the resolution focuses on the enterprise economic and social structures. This research is focused objectively to offer practical solutions in view of the constant complaints stemming from the user population of public service. Keywords: Juridical Conflicts, Concession, Public Service, Consuming, Procedure, Alternative Methods.
SUMÁRIO INTRODUÇÃO..............................................................................................................10 1 A CONCESSÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS........................................................12 1.1 O PAPEL DO ESTADO ............................................................................................12 1.2 SERVIÇO PÚBLICO.................................................................................................14 1.2.1 Serviço Público e Atividade Econômica ..................................................................18 1.3 CONCESSÃO............................................................................................................21 1.3.1 Evolução Histórica ..................................................................................................21 1.3.2 Evolução Político-Econômica..................................................................................23 1.3.3 Definição e Conceito...............................................................................................27 1.3.4 Natureza Jurídica.....................................................................................................29 1.4 OUTORGA E CONTROLE DE SERVIÇOS PÚBLICOS..........................................31 1.4.1 Licitação .................................................................................................................34 1.4.2 Fiscalização.............................................................................................................36 1.5 CONTRATOS ADMINISTRATIVOS .......................................................................37 1.5.1 Conceituação...........................................................................................................37 1.5.2 Características .........................................................................................................40 1.5.3 Espécies ..................................................................................................................43 1.5.4 Equilíbrio Econômico-Financeiro............................................................................44 2 RELAÇÕES DE CONSUMO DERIVADAS DAS CONCESSÕES DE SERVIÇOS PÚBLICOS E OS CONFLITOS JURÍDICOS .............................................................47 2.1 PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL DO CONSUMIDOR ..........................................47 2.1.1 A Constituição Federal de 1988...............................................................................50 2.1.2 Código de Defesa do Consumidor ...........................................................................52 2.1.3 Os Princípios Fundamentais de Proteção do Consumidor ........................................54 2.2 PRESSUPOSTOS DAS RELAÇÕES DE CONSUMO ..............................................58 2.2.1 Fornecedor ..............................................................................................................58 2.2.2 Produto ...................................................................................................................60 2.2.3 Serviço....................................................................................................................61 2.2.4 Consumidor.............................................................................................................63 2.3 RELAÇÕES DE CONSUMO E AS CONCESSÕES DE SERVIÇOS PÚBLICOS ....65 2.3.1 Aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor nas Concessões de Serviços Públicos ...........................................................................................................................67 2.3.1.1 Taxa .....................................................................................................................69 2.3.1.2 Tarifa ...................................................................................................................71 2.3.1.3 Preço Público .......................................................................................................72 2.4 USUÁRIO-CONSUMIDOR ......................................................................................73 2.5 PRESTABILIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO CONCEDIDO .................................76 2.6 AS AGÊNCIAS REGULADORAS COMO INSTRUMENTO DE REGULAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS CONCEDIDOS...................................79 2.6.1 Agências Reguladoras como Forma de Controle da Atividade Econômica...............80 2.6.2 Finalidade ...............................................................................................................82 2.6.2.1 Regulação ............................................................................................................83 2.6.2.2 Fiscalização..........................................................................................................85 2.7 CONFLITOS JURÍDICOS.........................................................................................86 2.7.1 Ineficiência na Prestação do Serviço Público Concedido .........................................87 2.7.2 Vício na Prestação do Serviço Público Concedido...................................................88
3 MÉTODOS PARA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS JURÍDICOS DECORRENTES DAS CONCESSÕES DE SERVIÇOS PÚBLICOS ........................91 3.1 DO PROCESSO ADMINISTRATIVO ......................................................................91 3.1.1 Princípios Aplicáveis ao Processo Administrativo ...................................................93 3.1.2 Mecanismo Não Jurisdicional para Solucionar Conflitos .........................................94 3.2 DO PROCESSO JUDICIAL ......................................................................................96 3.2.1 Processo e Interesse Público....................................................................................97 3.2.2 Finalidade e Efetividade do Processo.....................................................................100 3.2.3 Novas Técnicas para Resolução de Conflitos e a Ordem Jurídica Justa..................102 3.2.3.1 Tutelas Diferenciadas .........................................................................................106 3.2.3.2 Tutela Inibitória..................................................................................................109 3.2.3.3 Tutela Mandamental...........................................................................................111 3.2.3.4 Tutela Executiva Lato Sensu...............................................................................114 3.2.4 Facilitação da Defesa dos Direitos dos Usuários-Consumidores ............................116 3.2.4.1 Responsabilidade Objetiva .................................................................................118 3.2.4.2 Inversão do Ônus da Prova .................................................................................123 3.2.4.3 Desconsideração da Personalidade Jurídica do Concessionário de Serviço Público......................................................................................................................................124 3.2.5 Defesa Jurisdicional dos Usuários-Consumidores..................................................126 3.2.5.1 Direitos Difusos .................................................................................................129 3.2.5.2 Direitos Coletivos...............................................................................................130 3.2.5.3 Direitos Individuais Homogêneos.......................................................................133 3.3 DOS MECANISMOS ALTERNATIVOS PARA SOLUCIONAR CONFLITOS.....135 3.3.1 Conciliação ...........................................................................................................137 3.3.2 Mediação ..............................................................................................................140 3.3.3 Arbitragem............................................................................................................143 CONCLUSÃO..............................................................................................................148 REFERÊNCIAS...........................................................................................................151
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INTRODUÇÃO
A temática a ser discutida nesta pesquisa, além de ser atual, é de interesse de toda
coletividade que se utiliza dos serviços públicos concedidos à iniciativa privada, tendo
despertado o interesse na discussão acerca desta matéria, conjugada com o Direito do
Consumidor e os mecanismos postos à disposição para a resolução de eventuais conflitos daí
decorrentes.
Metodologicamente decidiu-se por uma pesquisa com duas faces. A primeira
dogmática e a segunda sócio-jurídica, razão pela qual serão utilizados como métodos jurídicos
o dogmático, o sistêmico e o histórico e as técnicas de revisão de documentos.
Busca-se compreender qual direito deve ser protegido em um eventual conflito
jurídico em que se encontram interesses privados e os coletivos, ou seja, interesses do
concessionário de serviço público e dos usuários consumidores.
É sabido que os valores individuais e sociais contemporâneos se distanciam em muito
daqueles que podem ser encontrados ao longo da história e por isso, os conflitos jurídicos
surgem em uma velocidade vertiginosa, acompanhando a evolução do mundo globalizado.
Com a problematização do tema se busca encontrar respostas para os seguintes
questionamentos: quais os fatores que mais incidem negativa ou positivamente no grau de
viabilidade que a processualística dos conflitos jurídicos derivados das relações de consumo
em face de concessão e permissão de serviço público assegura aos empreendimentos
econômicos? Qual o grau de incidência que os diferentes fatores dos conflitos jurídicos
derivados das relações de consumo em face da concessão de serviço público produzem para
assegurar à viabilidade dos empreendimentos econômicos?
Explorar-se-á as distinções fundamentais acerca dos conceitos de usuário de serviço
público e consumidor, motivando, assim, determinar a possibilidade de se utilizar das
prerrogativas existentes no Código de Defesa do Consumidor.
Destaca-se, ainda, a discussão sobre as funções das Agências Reguladoras como
mecanismos de regulação da atividade econômica e fiscalização dos serviços públicos
concedidos, assumindo papel que até então era exercido pela Administração Pública na
qualidade de poder concedente.
Serão abordados, também, os conflitos decorrentes da má prestação do serviço
público, opondo o usuário e o concessionário, em virtude do descumprimento das regras
estabelecidas, ao se disponibilizar serviços viciados ou ineficientes.
11
Instalado o conflito jurídico decorrente da concessão de serviço público, será
demonstrado quais ferramentas jurídicas o usuário poderá se utilizar para resolvê-lo, tanto na
esfera judicial, extrajudicial e administrativa, razão pela qual se propõe este trabalho
demonstrar estas possibilidades para solução do mesmo.
Debater a temática relativa aos conflitos jurídicos derivados da concessão de serviço
público resulta sempre de importância e se justifica pelas implicações que isso tem para o
desenvolvimento econômico, para a sociedade, para a população usuária e para própria
eficiência e responsabilidade dos poderes públicos que a autorizam.
É da tarefa científica determinar os fatores que mais incidem negativamente no grau
de viabilidade dos mecanismos utilizados para solucionar os conflitos, além de se ponderar os
interesses dos concessionários e os direitos dos usuários de modo a garantir o
desenvolvimento econômico com sustentabilidade social.
Tratar-se-á de sinalizar a utilização, pelas partes conflitantes, das questões processuais
combinadas com materiais e jurídicas com sociológicas, desde uma perspectiva não formalista
senão integralista.
Resumidamente, busca-se uma contribuição de como se resolver um conflito jurídico
originado da ineficiência da prestação do serviço público pelo concessionário, utilizando-se os
instrumentos próprios e adequados para o restabelecimento da ordem jurídica-social.
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1 A CONCESSÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS
Prefacialmente, mister discorrer sobre o papel do Estado e o conceito, natureza
jurídica, antecedentes e evolução da concessão, bem como realizar as devidas comparações e
distinções com as figuras da permissão e autorização, ressaltando que elas se referem à gestão
ou execução dos serviços públicos, sendo atividades que devem atender às necessidades
fundamentais da população e para isso são assumidas pelo Poder Público.
1.1 O PAPEL DO ESTADO
O Estado, criado com o objetivo de constituir uma sociedade política, determina e
regula as regras de convivência de seus membros no sentido de alcançar o bem comum, razão
pela qual relevante discorrer sobre seu papel social, especialmente para esta dissertação que
discutirá pontos relativos à concessão de serviços públicos e sua execução pelos particulares.
Segundo Hans Kelsen1 os deveres do Estado na verdade são obrigações de seus
órgãos, na medida que a existência dessas obrigações não implique em uma auto-obrigação,
mas uma imputação.
A finalidade estatal passa pela ordem e defesa de seu povo e instituições, promovendo
desenvolvimento, progresso e bem estar para a sociedade, sendo tudo isso verdadeiramente o
papel maior do Estado, ou seja, são elementos formadores que determinam sua estrutura
finalística.
Segmentos da doutrina adotam o entendimento, entre outros, de que o papel do Estado
possa ser sistematizado em duas partes, os fins objetivos e os fins subjetivos. Dentre eles
Dalmo de Abreu Dallari2 ensina que os primeiros tratam do papel que o Estado representa no
desenvolvimento da humanidade e os segundos acerca da relação entre o Estado e o desejo de
realização dos fins individuais.
Conclui-se, portanto, que o Estado possui um papel de grande importância para toda
sociedade, conseqüência do atendimento dos anseios de seus indivíduos, na promoção do bem
comum e do desenvolvimento de seu povo por meio das diversas atribuições diretas e
indiretas que lhe são conferidas. 1 KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do estado. Tradução: Luis Carlos Borges. 2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1992, p.199. 2 DALLARI. Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. 27.ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p.104-5.
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O Estado para cumprir seu papel é investido de poder e, em razão disso, seus atos
obrigam a todos os que se sujeitam a sua longa manus, espelhando a imagem de ordem que é
o próprio fundamento do poder estatal, razão pela qual esta característica se irradia sobre a
universalidade de seu povo.
Daí porque o legislador houve por bem inserir no texto constitucional, por meio da
Emenda n° 19/1998, especificamente no caput do Art. 37, o princípio da eficiência, também
nominado princípio da máxima efetividade, sendo, pois, um preceito fundamental a ser
observado pela Administração Pública Direta ou Indireta, em qualquer nível de poder,
juntamente com os princípios da legalidade, pessoalidade, moralidade e publicidade.
Como se vê, o Estado deve garantir o respeito a tais princípios que balizam e ordenam
o sistema jurídico no âmbito da Administração Pública, proporcionando, dessa forma, fiel
cumprimento a seus fins, entre eles a prestação dos serviços públicos com qualidade,
objetivando a satisfação do interesse público.
Para Alexandre de Moraes3 o princípio da máxima efetividade impõe à Administração
Pública Direta e Indireta e a seus agentes buscar o bem comum, com o exercício imparcial,
claro e eficaz de suas competências, primando pela qualidade e adotando critérios legais e
morais para a justa utilização dos recursos públicos, garantindo o desenvolvimento social.
Observa-se, portanto, que o Estado desempenha papel fundamental na eficiência do
serviço público, uma vez que a contínua e ávida observância dos preceitos contidos no Art. 37
da Constituição Federal fundamenta o fim precípuo da Administração Pública que é a defesa
do bem comum.
O Estado, por muito tempo buscou controlar a prestação dos serviços públicos,
conseqüência de seu monopólio, sendo obrigado a realizar grandes investimentos para o
custeio e manutenção da estrutura básica criada para atender a demanda social, tendo
ocorrido, em dado momento histórico, o estrangulamento da capacidade estatal de gerir
convenientemente todas as áreas por si administradas.
Isto se deu em vista da evolução pela qual passou a sociedade, devendo-se reconhecer
que o Estado não mais reunia condições para atender suas finalidades constitucionalmente
atribuídas, deixando de preservar o bem estar dos seus indivíduos, motivando, assim, a
outorga de alguns serviços públicos ao particular no intuito de desonerar o erário público e
beneficiar a coletividade com serviços de qualidade.
3 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 17.ed. São Paulo: Atlas, 2005, p.300.
14
Sob esta ótica é que a delegação de serviços públicos não privativos assumiu posição
de destaque junto à Administração Pública, eis que, visando alcançar sua máxima efetividade,
entendeu o Poder Público ser esta uma das maneiras para a execução de serviços públicos
com qualidade, razão pela qual Fernanda Stracke Moor4 afirma que “a tendência atual da idéia
de Estado é no sentido de um Estado nem mínimo, nem máximo, mas essencial”.
A Constituição Federal de 1988, neste aspecto, ressalvou alguns casos em que a
Administração Pública não pode delegar ao particular a prestação de serviços públicos, tais
como os de segurança nacional e de relevante interesse coletivo, insculpido no caput do Art.
173, fundamento pelo qual o Estado poderá executar indiretamente a prestação do serviço, via
de concessão, entre outras formas de delegação.
Assim, resulta importante a averiguação histórica do serviço público e sua prestação
pelo Estado, analisando-se os aspectos político e econômico do instituto e seus reflexos na
ordem jurídica e social até os dias atuais discorrendo sobre sua atribuição ao particular.
1.2 SERVIÇO PÚBLICO
O serviço público manifesta-se como a forma em que o Estado presta atividades à
coletividade e estas se referem aquelas que sejam indispensáveis ao atendimento das
necessidades gerais e que poderiam ser prejudicadas se não houvesse a intervenção estatal,
devendo estar submetida ao direito público, ou seja, a questão primordial é o interesse
público, já que o Estado pode prestar outros serviços, porém privados e que irão se submeter
ao direito público já que prestados pela Administração.
Celso Antônio Bandeira de Mello5 considera serviço público a atividade prestada pelo
Estado, de forma direta ou indireta, que proporcione utilidade ou comodidade material que
atenda os interesses da coletividade em geral, podendo ser usufruído diretamente pelos
administrado que se submetem ao regime de direito público. Este entendimento é amparado
nos elementos materiais e formais do serviço público. Dizem-se materiais aqueles que se
caracterizam pelo oferecimento de comodidade ou utilidade material, já que são colocados à
4 MOOR, Fernanda Stracke. Considerações sobre o regime público na prestação de serviços delegados e a perspectiva dos direitos dos cidadãos frente aos serviços essenciais. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, n.55, jul-set. 2005, p.108. 5 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 24.ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p.655-6.
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disposição dos administrados e utilizados de maneira voluntária pelos mesmos e os formais
referem-se a submissão do serviço público ao regime administrativos e os princípios que dele
decorrem, o que exclui a prestação de serviços particulares.
À propósito, o autor conceitua serviço público assim:
Serviço Público é toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material fruível diretamente pelos administrados, prestado pelo Estado ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de direito público - portanto consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais - instituído pelo Estado em favor dos interesses que houver definido como próprios no sistema normativo.6
Segundo Hely Lopes Meirelles7 o conceito de serviço público não é pacífico na
doutrina, que ora propõe uma noção orgânica, só considerando como tal o que é prestado com
órgãos públicos, ora apresenta uma conceituação formal, tendente a identificá-lo por
características extrínsecas, ora oferece um conceito material, visando a defini-lo por seu
objeto. O conceito de serviço público, segundo seu entendimento, é mutável e varia ao sabor
das necessidades e contingências políticas, econômicas, sociais e culturais de cada
comunidade, em dado momento histórico, como acentuam os modernos publicistas. Eis sua
conceituação, verbis: “Serviço Público é todo aquele prestado pela administração ou por seus
delegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou
secundárias da coletividade ou simples conveniência do Estado”.
Popularmente costuma-se conceituar serviço público como tudo aquilo que o Estado
faz, ou pelo menos, toda atividade administrativa por ele desempenhada. No entanto, para o
Direito, os vários tipos de atividades desenvolvidas pelo Estado são perfeitamente distintas
entre si, vez que cada qual está sujeito a um regime diverso, merecedor de cuidado especial.
“Serviço público é a atividade de interesse coletivo prestada diretamente pelo Poder
Publico ou por terceiros mediante concessão ou permissão, mas sempre atendendo à
regulamentação e à fiscalização do poder concedente”, assim definido por José Carlos de
Oliveira8 que também apresenta os princípios que ajudam a individualizar esta particular
forma de atividade estatal, tais como a continuidade, que se trata da forma ininterrupta pela
qual o serviço deve ser prestado; a regularidade, sobre o cumprimento de regras pré-
estabelecidas à prestação do serviço; a uniformidade, referindo-se a igualdade no
6 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 24.ed. São Paulo: Malheiros. 2007, p.656. 7 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 28.ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p.319. 8 OLIVEIRA, José Carlos de. Concessões e permissões de serviços públicos. Bauru: Edipro, 1996, p.42.
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oferecimento das prestações aos usuários; a generalidade que garante a todos sem exceção a
utilização do serviço, podendo ainda realizar exigências sobre ele; e finalmente a
obrigatoriedade, que ser refere ao serviço pela por sua própria natureza tanto na sua prestação
como na sua exigibilidade pelos usuários.
Por sua vez, assevera Marçal Justen Filho9 que um dos mais tradicionais problemas do
Direito reside na determinação do conceito de serviço público, especialmente em face da
atividade econômica, assim, trata-se de conceituar, perante o modelo constitucional, a
natureza das atividades que se desenvolvem em setores onde é difícil distinguir o público do
privado.
Esclarece Miguel Reale10 que existem certos serviços que, por sua própria natureza, no
estágio atual da evolução histórica não podem deixar de ser considerados serviços públicos,
havendo os delegáveis e os indelegáveis, não obstante, porém, todos os esforços dos
tratadistas empenhados em fixar as notas determinantes do que seja esta atividade.
Neste sentido, compreende-se que a atividade considerada serviço público em um
determinado país não terá a mesma qualificação em outros, tendo em vista as normas
constitucionais consagradoras deste ou daquele ordenamento social e econômico.
Para que o serviço seja considerado público, não basta que seja criado sobre esta
denominação, há que se observar seu núcleo semântico, material e o conceito constitucional
do que ele realmente seja, devendo caracterizar-se como instrumento para a realização do bem
comum e seu desempenho deverá configurar a satisfação do interesse público, conforme o
entendimento de Carlos Fulgêncio da Cunha Peixoto,11 alertando que a execução do serviço
público constitui o principal dever do Estado.
Segundo a doutrina, os serviços públicos se classificam como serviços públicos
propriamente ditos e serviços de utilidade pública. Os serviços públicos propriamente ditos
são os privativos do Poder Público e somente por este, podem ser executados, como é o caso
da segurança nacional, segurança pública e do Judiciário. Nesta esteira, Diógenes Gasparini12
esclarece que os serviços públicos privativos da Administração não podem sofrer interrupção,
visto que são imprescindíveis à vida e a coexistência dos indivíduos na sociedade.
9 JUSTEN FILHO, Marçal. Concessões de serviços públicos. São Paulo: Dialética, 1997, p.54. 10 REALE, Miguel. Concessão e permissão de serviço público. Revista de Direito Público. São Paulo, v.6, 1968, p.85. 11 PEIXOTO, Carlos Fulgêncio da Cunha. Concessão de serviço público e sua natureza jurídica. Revista dos Tribunais. São Paulo, ano 55, v.368, jun.1966, p.28. 12 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p.296.
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Conforme classificação elaborada por Hely Lopes Meirelles,13 serviços públicos
podem ser uti universi ou gerais e uti singuli ou individuais, onde os primeiros não possuem
beneficiários determinados, são indivisíveis na sua utilização e geralmente mantidos por meio
de tributos e os segundos se prestam a indivíduos determinados, podendo sua utilização ser
dividida e mensurada entre os particulares, sendo remunerado por tarifas.
De acordo com este entendimento conclui-se que os serviços públicos privativos ou
gerais não podem ser objeto de delegação ao particular pela Administração, cabendo a ela,
única e exclusivamente a execução dos mesmos, enquanto os não privativos ou individuais,
podem ser concedidos à iniciativa privada para sua prestação.
Como visto, os serviços de utilidade pública são aqueles individuais ou não privativos
da Administração Pública e por isso, passíveis de serem delegados ao particular, são também
indispensáveis ao atendimento das atividades inadiáveis da comunidade, razão pela qual
foram disciplinados no Art. 10 da Lei nº 7.783/89 (Lei de Greve) como sendo essenciais.
Esclarece Oswaldo Aranha Bandeira de Mello14 que o Estado utiliza, quando
necessário, para a realização dos serviços públicos, o poder de império sobre as pessoas e do
domínio eminente sobre as coisas em regime jurídico especial, resguardando-se sempre os
direitos dos particulares, conforme a ordenação jurídica. Portanto, para a consecução de seu
fim, o Estado utiliza-se de meios próprios para a execução de serviços públicos.
Importante determinar que o serviço público será sempre aquele cujas tarefas e
encargos transcendem o indivíduo e o interesse particular, à partir daí tem-se a organização
dos diversos serviços entre eles o poder político e o poder jurídico que são meios para a
realização dos objetivos fundamentais do Estado Democrático.
A Constituição Federal enumera de maneira exemplificativa as atividades a serem
desenvolvidas pelo Estado na condição de serviços públicos, não havendo forma exauri-las,
visto que a conceituação de serviço público dependerá da observância de fatores que
demonstrem as necessidades da coletividade, esclarecendo Elaine Cardoso de Matos Novais15
poder ser estes determinados por aspectos temporais, políticos, sociais e culturais, bem como
outras que possam caracterizar uma atividade como necessária à coletividade.
13MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 28.ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p.322. 14 MELLO, Oswaldo Aranha Bandeira de. Natureza jurídica da concessão de serviço público. Revista de Direito Público. São Paulo, ano V, v.19, jan-mar.1972, p.13. 15 NOVAIS, Elaine Cardoso de Matos. Serviços públicos e relação de consumo: aplicabilidade do código de defesa do consumidor. Curitiba: Juruá, 2006, p.56.
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Diante disso é que se pode dizer que os serviços não são públicos e estão nesta
condição por necessidade atual da coletividade, tendo motivado a Constituição Federal,
vislumbrando esta situação, por não conceituá-los, ao contrário, apenas indica referenciais
quanto a estes que possibilitam a criação de novos e a supressão daqueles que não mais
enquadrarem-se nas necessidades sociais.
É possível concluir que serviço público se constitui na atividade prestada pelo Estado,
de forma direta ou por delegação ao particular que esteja apto a realizá-lo, submetendo-se ao
regime público, visando o atendimento das necessidades sociais e que proporcionem aos
administrados utilidade material passível de fruição direta do cidadão, excluindo-se os
serviços no âmbito dos Poderes Legislativo e Judiciário.
1.2.1 Serviço Público e Atividade Econômica
O despontar do liberalismo econômico preconizava uma divisão entre o domínio da
atividade econômica próprio da iniciativa privada e o domínio da atividade estatal. Com o fim
da 1ª Guerra Mundial ocorre um processo de aceleração da intervenção do Estado na
economia, deixando de ser mero espectador e passando a tomar uma posição efetiva diante do
processo econômico, promovendo o crescimento da economia, superando as crises
econômicas e protegendo os fracos. Serve-se para tanto, do planejamento e do exercício direto
da atividade econômica, tradicionalmente, considerada como domínio privado.
No tocante à intervenção do Estado no processo econômico, uma distinção primordial
se pode fazer com relação àquela exercida pelo particular e que repousa no princípio da
legalidade. Enquanto para o particular prevalece a licitude, isto é, liberdade de ação onde não
esbarre numa vedação legal, para o Estado existe apenas a possibilidade de ação, mediante
autorização legal, onde a atividade econômica está sujeita aos pressupostos constitucionais,
pautados nos imperativos da segurança nacional ou de relevante interesse coletivo.16
A ordem econômica está prevista no Art. 170 e seus seguintes da Constituição da
República Federativa do Brasil e se desempenha, em regra, como fiscalizadora do mercado,
assegurando a toda sociedade existência digna, observando os princípios da soberania
nacional, livre concorrência, defesa do consumidor, busca de pleno emprego, entre outros.
16 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 24.ed. São Paulo: Malheiros. 2007, p.774-5.
19
Ao tratar dos pontos que devem determinar a atividade econômica, João Bosco
Leopoldino da Fonseca17 destaca três tópicos: os princípios, o tratamento protecionista
oferecido a empresa com capital nacional e, finalmente, o papel do Estado na ordem
econômica.
A conceituação e distinção de atividade econômica e serviço público, num primeiro
momento difícil, pode ser superada por meio do posicionamento de Eros Roberto Grau18 ao
sublinhar a impossibilidade de contrapor de modo absoluto os dois conceitos, porquanto
serviço público é uma modalidade de atividade econômica, logo atividade econômica é um
gênero que contém duas espécies, o serviço público e a atividade econômica (em sentido
estrito). Isto significa que serviço público é um conceito que não pode ser diferenciado de
modo absoluto de atividade econômica, por apresentar caracteres econômicos, sendo possível
apenas a diferenciação de serviço público da concepção mais restrita de atividade econômica.
A distinção entre serviço público e atividade econômica também pode ser
compreendida como sendo o primeiro exercido preferencialmente pelo Estado ou sob sua
fiscalização, seguindo o regime de direito público e a segunda, conforme prevê a Constituição
Federal, é, em regra, atribuição aos particulares onde o Estado não tem poder de gerência,
seguindo, portanto, o regime de direito privado.
Por seu turno Marçal Justen Filho19 afirma que atividade econômica em sentido estrito
peculiariza-se pela possibilidade de exploração econômica lucrativa, segundo princípios
norteadores da atividade empresarial. O núcleo de seu conceito é a racionalidade econômica,
visando a obtenção do lucro segundo princípio do utilitarismo, assim, pressupõe a utilização
especulativa da propriedade privada, visando a realização dos interesses dos particulares,
tendo como parâmetros a exploração empresarial, a livre iniciativa e a livre concorrência,
onde os sujeitos organizam os fatores da produção para obtenção de resultados que não foram
predeterminados pelo Estado, havendo a apropriação privada do lucro.
A extensão do conceito depende das concepções sobre a dimensão e função do Estado
e da margem de liberdade de atuação reconhecida aos particulares, assim, a consagração da
liberdade privada conduz a existência de uma atividade econômica, podendo ser
compreendida como tudo aquilo que não seja excluído constitucionalmente do âmbito de
liberdade privada, dessa forma, ainda que o Estado, na condição de ente público desempenhe 17 FONSECA, João Bosco Leopoldino. Direito econômico. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p.82. 18 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na constituição de 1988: interpretação e crítica. 10.ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p.136-7. 19 JUSTEN FILHO, Marçal. Concessões de serviços públicos. São Paulo: Dialética, 1997, p.56.
20
atividade econômica, estará sujeito ao regime próprio do direito privado, competindo em
igualdade de condição com os particulares.
Importante ressaltar o papel dos princípios constitucionais nas atividades econômicas,
pois com seu status de base legal conseguem nortear e sustentar as demais normas jurídicas
que são de obediência obrigatória e funcionam como ordem de conduta social.
É certo que a Constituição Federal de 1988 consagrou o princípio da subsidiariedade
da intervenção estatal no domínio econômico, estabelecendo o regime capitalista com base na
propriedade privada dos meios de produção, no livre exercício das atividades econômicas e na
abstenção da intervenção do Estado no domínio econômico, ficando este incumbido de
disciplinar o exercício da atividade econômica privada e respeitados os princípios.
Segundo o Art. 173 da Constituição “[...] a exploração direta de atividade econômica
pelo Estado só será permitida quando necessária [...]” para a garantia da coletividade e
estabelecimento da segurança nacional, além de sempre estar em igualdade de condições com
os particulares, pois se assim não for, o Estado não poderá exercer tal encargo econômico.20
Admite-se, excepcionalmente, que o Estado desempenhe diretamente atividades
econômicas. Dessa maneira, é pacífico que o Estado exerça a intervenção direta no domínio
econômico de duas formas, a primeira quando desempenha atividade econômica e a segunda
quando presta serviços públicos. A atividade de natureza econômica se sujeita a regime
próximo do direito privado, mesmo que apliquem-se os princípios gerais do direito público. Já
o desempenho do serviço público submete-se a regras inerentes ao direito público.
Como citado, o monopólio estatal não se coaduna com as disposições constitucionais
em vigor, excetuando-se os casos previstos no Art. 177 da Constituição Federal que autorizam
o monopólio da União com o escopo fundamental de garantir a ordem econômica e financeira
e, sobretudo, a soberania nacional, segundo Manoel Gonçalves Ferreira Filho.21
A intervenção do Estado na atividade econômica pode ocorrer como agente normativo
e regulador, característica determinante do Poder Público, mediante incentivos à atividade
privada, estimulando, por exemplo, por meio de incentivos fiscais, e, em casos excepcionais,
atuará empresarialmente, mediante pessoas criadas para tal fim.
20 FONSECA, João Bosco Leopoldino. Direito econômico. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p.198. 21 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 24.ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p.354.
21
1.3 CONCESSÃO
1.3.1 Evolução Histórica
Para a completa compreensão da temática concessão de serviço público, necessário
evoluir por seus antecedentes históricos que datam da Idade Média, onde já se apresentava
esta figura na forma das concessões senhoriais e reais.
De acordo com Odete Medauar,22 as primeiras ocorreram quando houve a necessidade
de transferir a administração dos feudos e também para a exploração de atividades em
domínios particulares do senhor feudal, razão pela qual foram utilizadas formas contratuais
que garantissem o empenho dos executantes da atividade diante de remuneração traçada neste
ato, por meio de atribuição de terras ou rendas pelo senhor feudal, fiscal das atividades, dando
ordens e instruções, e o concessionário, chamado vassalo, exercendo no todo ou em parte os
poderes do senhor sobre seus subordinados.
Discorre a autora citada sobre a existência de indícios, ainda no século XVII, de que o
termo concessão tenha sido utilizado para denominar atos de benevolência do soberano, que
normalmente diziam respeito à transferência de prerrogativas e derrogação de normas.
Também poderia significar a venda de cargos públicos, transferindo-se ao comprador todos os
privilégios e prerrogativas do órgão para o particular, sendo aí necessária uma concessão.
Muitas são as épocas e situações em que a concessão aparece nas relações entre ente
público e particular. Todavia, as conotações atuais de concessão se iniciaram na Europa,
sobretudo na França, a partir do o século XVIII, onde surgiu para serviços que exigiam
grandes investimentos financeiro e pessoal técnico especializado, vez que, já naquela época, o
Poder Público não reunia condições para assumir tal encargo.
Contudo, as duas Guerras Mundiais contribuíram para que a figura da concessão
caísse em declínio mundialmente, graças à instabilidade econômica e às tendências
estatizantes difundidas pelo mundo, resultando na nacionalização e criação de empresas
estatais que assumiram em grande parte as concessões do setor privado.
Para José Carlos de Oliveira,23 conhecer os antecedentes deste instituto é importante
para que possa o legislador, na observância das dificuldades enfrentadas no passado e diante
22 MEDAUAR, Odete (Coord.). Concessão de serviço público. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p.11. 23 OLIVEIRA, José Carlos de. Concessões e permissões de serviços públicos. Bauru: Edipro, 1996, p.17.
22
do exercício das atividades de interesse público pela iniciativa privada, valer-se de tais
conhecimentos para implementar seu real objetivo que é o de proporcionar aos usuários um
serviço de qualidade, por meio da cobrança de tarifas módicas, investimentos nos serviços e a
justa remuneração do capital injetado pelo particular.
No Brasil a concessão de serviços públicos foi influenciada pelo modelo inglês que
apresentava sofisticação e qualidade nos serviços públicos oferecidos, pois, segundo Egon
Bockmann Moreira,24 a ocorrência se deu quase em paralelo, já que a concessão não é
instituto novo no Direito Administrativo brasileiro, tendo seu momento inicial no tempo do
Império, em razão da conjuntura econômica da época, diante do exercício de serviços
públicos pela atividade privada, principalmente diante da ocorrência da prestação de serviços
de infra-estrutura.
Tornando luminoso o assunto, José Carlos de Oliveira25 assevera que em 1835 o
Governo Imperial aprovou a concessão de favores a quem se dispusesse a construir um
“caminho de ferro”, partindo do Rio de Janeiro com destino às províncias localizadas em São
Paulo e Minas Gerais. Este intento foi efetivado, porém, somente no ano de 1849, quando
ocorreu o primeiro contrato de concessão no Brasil, onde o Barão de Mauá obteve a
autorização e o privilégio de zona, consistente na garantia de que não haveria outra ferrovia
no trecho que pretendia construir, assim, por meio da utilização de capital, em 1854, nasceu a
primeira ferrovia brasileira.
A expansão das concessões dos serviços públicos aos particulares continuaram de
maneira regular e promissora, migrando para as mais diversas áreas dos serviços necessários
ao bem estar coletivo e que ainda não haviam sido realizados pela falta de recursos do Estado
até o advento das duas Grandes Guerras, ou seja, o efeito mundial, como acima mencionado,
contaminou e causaram mudanças no quadro econômico brasileiro que, somado ao início da
inflação no primeiro governo de Getúlio Vargas, afugentou o capital privado, ocasionando,
consequentemente, a restrição da figura da concessão de serviços públicos.
Como se vê, o paranorama histórico das concessões de serviços públicos no Brasil
reflete uma influência significativa das experiências anteriormente utilizadas no direito
europeu, passando pelas crises nacionais e internacionais, tendo encontrado fundamento para
sua aplicabilidade a partir do momento em que o Estado necessitou assumir os encargos
24 MOREIRA, Egon Bockmann. Contrato de concessão de serviço público: sua compreensão contemporânea. Revista Trimestral de Direito Público. São Paulo, v.44, 2003, p.135. 25 OLIVEIRA, José Carlos de. Concessões e permissões de serviços públicos. Bauru: Edipro, 1996, p.19.
23
sociais e econômicos da sociedade, surgindo novas modalidades de administração de serviços
públicos visando o atendimento do interesse coletivo.
No entanto, para a satisfação do interesse público, o Estado, que não possuía as
condições necessárias para os investimentos em serviços públicos, dentre as quais os aportes
financeiro e técnico, se viu obrigado a transferir, por meio de outorga ao particular, a
execução de alguns serviços com a garantia de que estes sejam prestados com eficiência e
continuidade, caracterizando, portanto, a figura da concessão de serviço público.
1.3.2 Evolução Político-Econômica
Em conjunto com os aspectos históricos, se deve destacar os fundamentos político-
econômico da concessão dos serviços públicos ao particular, pois esta modalidade de
administração facultada ao Poder Público reforça a idéia do sistema ou regime de governo
adotado por uma nação, consubstanciado nos ideais do liberalismo, onde se convergem teorias
socioeconômicas, ideologias e políticas que visam a criação de um Estado mínimo.
Diante da evolução ocorrida, Bento Costa Lima Leite de Albuquerque Júnior e Márcio
Mota Miranda Grandes, afirmam que:
[...] entre a metade e o fim do século XVIII ocorreram, sucessivamente, primeiro na Inglaterra e depois em grande parte da Europa, duas mudanças que foram decisivas para a evolução política do mundo ocidental. A primeira é a grande transformação econômica e tecnológica que ficou conhecida como Revolução Industrial. A segunda é um amplo movimento de cunho intelectual que gerou, simultaneamente, o Iluminismo e o Enciclopedismo que tinha por base o racionalismo de Descartes.26
Não se pode olvidar que a Revolução Industrial ocorrida no século XVIII criou uma
divisão social bem nítida e demarcada, opondo a burguesia e o proletariado, sustentando o
regime capitalista que foi um importante passo para se conquistar o poder político na França
com a Revolução de 1789, agarrado ideologicamente nos princípios liberais, ou seja, a
existência da liberdade econômica, da propriedade privada e da igualdade perante a lei.
Importante ainda a lição apresentada pelos autores acima citados no que tange ao
segundo movimento, a partir do qual a ordem burguesa, lastreada nos ideais Iluministas,
somente alcançaria os objetivos perquiridos se:
26 ALBUQUERQUE JÚNIOR, Bento Costa Lima Leite de. MIRANDA, Márcio Mota. Democracia, liberalismo e socialismo. Disponível na Internet em: http://www.achegas.net/numero/cinco/bento_e_marcio.htm. Acesso em: 13 de janeiro de 2007.
24
[...] (a) no campo político, controlar, submeter e em seguida reduzir os poderes do absolutismo monárquico; (b) no campo social, superar e banir os privilégios corporativos da Idade Média que beneficiavam a nobreza, o clero e as corporações de oficio; (c) no campo econômico, assegurar o livre mercado, o que implicava a liberdade de produzir e comerciar, sem a interferência do poder político; e, finalmente, (d) no campo jurídico, garantir a estabilidade das normas legais e do Direito, livres do poder regulador do absolutismo, sem as quais o mercado não poderia prosperar. Esse conjunto de concepções, crenças e aspirações constituíram um amplo movimento de idéias que ficou conhecido como liberalismo. Essa grande inflexão no curso da evolução histórica da humanidade teve que se adaptar às condições objetivas peculiares de cada país, adotando matizes próprios e diferentes em cada um deles.27
De acordo com Paul Hugon,28 Adam Smith apontava que o desenvolvimento da
sociedade dependeria de um regime liberal e da divisão do trabalho, o que facultaria o
crescimento do capitalismo, visto que a circulação de capitais proporcionaria melhores
condições a todos, principalmente aos trabalhadores.
A teoria do liberalismo muito prematuramente se mostrou ineficiente, visto que a
busca pela solução dos diversos problemas sociais, criou uma falsa idéia de liberdade entre as
pessoas, conforme lecionada Sahid Maluf.29
A falsa idéia do liberalismo em ser a solução para o Estado, gerou, em contrapartida,
uma divisão ainda maior das camadas sociais, pois poucos detinham grandes fortunas e
muitos foram relegados a condições de servidão, assim, todas as promessas feitas por esta
idéia econômica foram somente executadas para aqueles que amontoavam capital a cada dia,
tornando as diferenças insustentáveis.
O Estado por sua vez assumiu um papel de expectador, onde a idéia liberal era a de
que se este não interviesse na economia esta iria funcionar com eficiência, pois se defendia a
idéia de que não é condição de estabilidade e distribuição de renda justa a intervenção
governamental no plano econômico, eis que existindo concorrência, produtores e
consumidores individuais não exerceriam influência sobre os preços e o mercado, deste modo,
segundo a teoria do livre mercado, o sistema econômico tende a um equilíbrio natural com
pleno emprego dos fatores de produção, onde a economia é guiada por leis naturais, auto-
reguladoras, não havendo a necessidade da intervenção do Estado.
27 ALBUQUERQUE JÚNIOR, Bento Costa Lima Leite de. MIRANDA, Márcio Mota. Democracia, liberalismo e socialismo. Disponível na Internet em: http://www.achegas.net/numero/cinco/bento_e_marcio.htm. Acesso em: 13 de janeiro de 2007. 28 HUGON, Paul. História das doutrinas econômicas. 14 ed. São Paulo: Atlas, 1995, p.107. 29 MALUF, Sahid. Teoria geral do estado. 24.ed. São Paulo: Saraiva, 1998, p.130.
25
No que tange ao Estado liberal, Arianne Brito Rodrigues Cal30 afirma que:
[...] o Estado liberal foi construído para favorecer e sustentar uma classe – burguesia – que assumira o poder e, por meio de seus atos, passava a comandar e dirigir a máquina estatal a favor de si mesma. O pensamento “sociedade como um todo”, fazia parte pura e simplesmente de um discurso ideológico que, sem dúvida, beneficiava a própria classe dominadora sob o argumento de um bem geral e coletivo [...] Referida ideologia pregava que o Estado não deveria interferir nos negócios privados, fazendo com que aquele reduzisse cada vez mais a sua participação na vida dos cidadãos, introduzindo a chamada economia liberal, tendo por lema a célebre frase francesa laisser faire, laisser passer.
Conforme ensina Celso Ribeiro Bastos,31 as idéias de Adam Smith não puderam se
tornar uma realidade e os trabalhadores, que deveriam ter sido beneficiados com elas,
passaram a sofrer ainda mais duramente o desnível social, ensejando uma atuação decisiva do
Estado que passou a ser Social, intervindo na vida da sociedade e garantindo o atendimento de
suas necessidades fundamentais. Neste sentido, afirma que esta alteração de mentalidade se
deu graças às diversas crises econômicas ocorridas no século XX, que demonstravam “[...] ser
os mecanismos auto-reguladores da economia insuficientes para promover harmonicamente o
desenvolvimento da riqueza nacional.[...]”.
Visando eliminar os desequilíbrios, o Estado Social revestiu-se de poderes
regulatórios em um primeiro momento, assumindo, posteriormente, a realização das mais
variadas atividades econômicas, acarretando-le uma sobrecarga de obrigações e encargos
diante da criação de empresas públicas para o atendimento das necessidades da sociedade.32
No entanto, as dimensões assumidas pelo Estado e a manutenção do sistema fez com
que a máquina estatal sofresse uma sobrecarga, ficando demonstrado que seria necessária a
redução do tamanho do Estado com a desregulamentação e liberalização da economia,
envolvendo a privatização das empresas estatais, assegurando ao mercado estabilidade
econômica, a promoção plena e o eficiente aproveitamento dos recursos produtivos.
É neste cenário que surge o neoliberalismo. Elucida Paul Hugon33 que o Estado “[...]
deverá interferir nas próprias condições internas do mercado, de agente passivo que devia ser,
de acordo com a concepção dos clássicos do século XIX, transforma-se em um dos mais
ativos agentes econômicos”.
30 CAL, Arianne Brito Rodrigues. As agências reguladoras no direito brasileiro. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p.18. 31 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de teoria do estado e ciência política. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p.70. 32 Idem ibidem, p.70. 33 HUGON, Paul. História das doutrinas econômicas.14 ed. São Paulo: Atlas, 1995, p.153.
26
Para Regis Fernandes de Oliveira,34 defensor da escola neoliberal, há muito tempo não
se estuda o Estado sob o prisma da não interferência na economia. O Estado passou a atuar
em todos os setores da vida pública, não só no campo dos serviços públicos, mas também
intervindo no domínio econômico. Afirma que há aqueles que reduzem seu papel a mero
prestador de serviços, enquanto outros tratam de postular uma grande atuação do Estado como
produtor de bens e distribuidor de riquezas.
De acordo com Frei Beto35, “[...] milhares de pessoas consideram o neoliberalismo
estágio avançado de civilização, assim como os contemporâneos de Aristóteles encaravam a
escravidão como um direito natural e os teólogos medievais consideravam a mulher um ser
ontologicamente inferior ao homem [...]”.
Observa-se, portanto, que a política do liberalismo verte-se diretamente à iniciativa
privada, pois ao governante cabe, fundamentalmente, apenas administrar a Justiça e a defesa
da nação, velando, também, pelo direito de propriedade de cada membro da sociedade.
O neoliberalismo, ao contrário, atribui ao Estado a intervenção direta na sociedade,
sendo que passa a tomar para si obrigações que assume de maneira ampla, prestando serviços
fundamentais à sociedade, isto gera uma sobrecarga à Administração Pública diante da
realização de investimentos expressivos para manter-se no mercado e acarreta uma estagnação
na economia diante da falta de concorrência.
As alterações ocorridas na sociedade foram de grande importância para que o Estado
assumisse um papel mais ativo na vida dos indivíduos, assim, as dificuldades impostas pelo
regime liberal foram decisivas para que ficasse claro o papel da Administração Pública no
atendimento ao interesse social.
No entanto, o Estado ao tomar para si a exclusividade na prestação dos serviços
público, pode, diante de suas deficiências, não prestá-los da maneira esperada, desvirtuando
seu fundamento maior que é a garantia do interesse público, dessa feita, necessitou outorgar
poderes a particulares diante da concessão de serviços públicos, assumindo as funções de
regulador e fiscalizador, garantindo, entretanto, que os serviços sejam prestados em
atendimento às necessidades da sociedade.
34 OLIVEIRA, Regis Fernandes de. Empresa, ordem econômica e constituição. Revista dos Tribunais. São Paulo. Ano 87, v.758, dezembro de 1998, p.16. 35 FREI BETO. O que é neoliberalismo. Disponível na Internet em: http://www.adital.com.br/site/noticia.asp. Acesso em: 13 de janeiro de 2007.
27
1.3.3 Definição e Conceito
O Estado, no Art. 175 da Constituição Federal, demonstra o monopólio que exerce na
execução dos serviços públicos, sendo-lhes o titular, podendo somente, na forma da lei,
concedê-los ao concessionário, que temporariamente tem a possibilidade de atuar perante
terceiros como se fosse o próprio Estado, que tem o poder-dever de retomar os serviços
concedidos, a qualquer tempo, caso se faça necessário, devendo ainda intervir sempre nas
atividades de prestação de serviços ou modificar as regras relativas à sua prestação, buscando
sempre o melhor para a sociedade, já que este é o fundamento maior do serviço público.
A Lei nº 8.987/95, em seu Art. 2º, II, define concessão de serviço público como sendo
“a delegação de sua prestação, feita pelo poder concedente, mediante licitação, na modalidade
de concorrência, à pessoa jurídica ou consórcio de empresas que demonstre capacidade para
seu desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado”.
De acordo com Marçal Justen Filho36 a concessão não produz modificação do regime
jurídico que preside a prestação do serviço público, não acarretando sua transformação para
serviço privado. A outorga da concessão não representa modalidade de desafetação do
serviço, retirando-o da órbita pública e inserindo-o no campo do direito privado. Assim, não
se atribui o direito de propriedade ao concessionário, já que na concessão o Estado continua a
ser o titular do poder de prestação do serviço.
O conceito de concessão envolve a conjugação de diferentes aspectos, entre os quais
está a manutenção do serviço público, o direito de propriedade, temporariedade da delegação,
não se admitindo concessões por tempo indeterminado.
Deste modo, ao conceituar concessão, Miguel Reale37 afirma ser esta uma espécie cuja
manifestação seja sempre a de incumbir um serviço público a uma pessoa de direito privado
que o exercerá em seu nome. Assim, esta pode ser considerada um elemento de sub-rogação
no exercício de um serviço público, que reputa de livre iniciativa, subordinando-a a certas
regras e requisitos, dada sua reconhecida utilidade pública.
José Carlos de Oliveira38 conceitua concessão como sendo o exercício privado de
serviços públicos, uma modalidade de gestão, com o objetivo de atender ao interesse coletivo,
36 JUSTEN FILHO, Marçal. Concessões de serviços públicos. São Paulo: Dialética, 1997, p.66. 37 REALE, Miguel. Concessão e permissão de serviço público. Revista de Direito Público. São Paulo, v.6, 1968, p.79. 38 OLIVEIRA, José Carlos de. Concessões e permissões de serviços públicos. Bauru: Edipro, 1996, p.17.
28
por meio de atividade realizada por particular que age nas funções do Estado, visando
proporcionar serviços geradores de satisfação dos cidadãos, obtendo, simultaneamente uma
contraprestação pecuniária de seu investimento, o que é feito pelos próprios usuários.
Celso Antônio Bandeira de Mello,39 em brilhante doutrina, conceitua concessão de
serviço público como sendo:
[...] o instituto através do qual o Estado atribui o exercício de um serviço público a alguém que aceita prestá-lo em nome próprio, por sua conta e risco, nas condições fixadas e alteráveis unilateralmente pelo Poder Público, mas sob garantia contratual de um equilíbrio econômico-financeiro, remunerando-se pela própria exploração do serviço, em geral e basicamente mediante tarifas cobradas diretamente dos usuários do serviço.
Ao discutir o exercício do concessionário do serviço público que se dá em nome
próprio, o autor distingue a relação jurídica mantida entre este e o Estado da seguinte maneira:
[...] Enquanto na concessão instaura-se uma relação jurídica por força da qual o concessionário é investido em titulação para prestar serviços ao público, nos simples contratos de prestação de serviços o contratado se vincula a prestar dados serviços ao Estado apenas.40
Para Carlos Fulgêncio da Cunha Peixoto41 a palavra concessão é empregada em várias
acepções, porém, no Direito Administrativo significa uma delegação de serviço público por
parte do Estado ao particular, logo, ela não é empregada somente como uma forma de
organização e funcionamento dos serviços públicos, mas, verdadeiramente, uma ocupação de
domínio.
Esclarece Oswaldo Aranha Bandeira de Mello42 que concessão é um ato
administrativo em que o Poder Público incumbe uma pessoa, natural ou jurídica, o exercício
de um serviço público, o que não afasta seu caráter público, porém, passa a ser de total
responsabilidade do chamado concessionário.
A figura da concessão assume papel importante para o Poder Público, pois
proporciona a este uma divisão de suas funções que, em razão de oportunidade econômica e
política, não poderia ser por si gerida, outorgando seus poderes específicos, diante de cautelas
necessárias, para que o particular possa desempenhar suas funções satisfatoriamente.
39 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 24.ed. São Paulo: Malheiros. 2007, p.686. 40 Idem ibidem, p.687. 41 PEIXOTO, Carlos Fulgêncio da Cunha. Concessão de serviço público e sua natureza jurídica. Revista dos Tribunais. São Paulo, ano 55, v.368, jun.1966, p.27. 42 MELLO, Oswaldo Aranha Bandeira de. Natureza jurídica da concessão de serviço público. Revista de Direito Público. São Paulo, ano V, v.19, jan-mar.1972, p.18.
29
Em razão disso é porque se diz que a outorga para a concessão de serviços públicos
deve ser condicional, temporal e pessoal, diante do fato de que o concessionário deve
enquadrar-se nas condições exigidas pelo Poder Público, a prestação do serviço tem tempo
determinado de duração e não pode ser atribuída a terceiros estranhos à relação entre o
concessionário e o Poder Público.43
Dessa forma, pode-se entender que a concessão de serviço público é caracterizada pela
transferência, por vontade própria do Poder Público, daqueles serviços que sejam de sua
competência, conforme determinação do ordenamento jurídico, excluindo-se, entretanto, os de
execução exclusiva do Estado, tais como segurança pública, saúde pública e educação
pública, objetivando, com isso, a mantença da soberania nacional.
1.3.4 Natureza Jurídica
A concessão de serviço público, quanto à sua natureza jurídica, é cercada de
discussões teóricas quanto ao fato de constituir-se de ato unilateral ou plurilateral da
Administração Pública, sendo o primeiro compreendido como um ato de própria vontade do
Estado e o segundo como um contrato administrativo.
Conforme ensina Carlos Fulgêncio da Cunha Peixoto,44 a natureza jurídica deste
instituto suscitou as mais vivas controvérsias entre as diferentes doutrinas que procuram
explicar seu regime, dividindo-se entre a teoria configurada por um ato unilateral do Estado e
a outra por um contrato de direito público.
A primeira corrente doutrinária, minoritária, nascida na Alemanha no século XIX e
defendida por Fritz Fleiner, acreditava na regulação unilateral por vontade do Estado. Assim,
a maioria dos contratos administrativos chamados de direito público, eram considerados
ordens unilaterais, cuja legitimidade está afastada do consentimento do interessado. A
segunda, conforme o entendimento da doutrina dominante, entre os quais Hely Lopes
Meirelles, Celso Antônio Bandeira de Mello, Carlos Fulgêncio da Cunha Peixoto, Oswaldo
Aranha Bandeira de Mello e Themístocles Cavalvanti, concessão deve ser definida como um
contrato de direito administrativo, bilateral e oneroso, já que sua existência dependem do
acordo de vontade do poder concedente e do concessionário. 43 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 24.ed. São Paulo: Malheiros. 2007, p.706-7. 44 PEIXOTO, Carlos Fulgêncio da Cunha. Concessão de serviço público e sua natureza jurídica. Revista dos Tribunais. São Paulo, ano 55, v.368, jun.1966, p.30.
30
Para a classificação destas teorias, Oswaldo Aranha Bandeira de Mello45 aponta a
necessidade de se aludir o critério histórico e a classificação sistemática de seus elementos
fundamentais, porquanto considera o agrupamento das teorias básicas para a enunciação de
suas razões lógicas. Assim, a teoria do ato unilateral é defendida pela importância dada à
autoridade do Estado, enquanto na contratual, valoriza-se a liberdade do particular.
O tratamento jurídico atribuído à concessão, conforme esclarece Odete Medauar,46 sob
o ponto de vista organizacional, é o de descentralização do serviço público ou de um serviço
descentralizado já que sua execução é atribuída a outra pessoa jurídica que o realiza
controlado pelo Estado, razão pela qual, à exemplo do direito francês, no Brasil se tem um
contrato administrativo por natureza que irá associar o contratado à organização e
funcionamento de um serviço público.
Em que pese as divergências doutrinárias, o texto do inciso I, parágrafo único, do Art.
175 da Constituição Federal, bem como o Art. 1º da Lei nº 8.987/95, estabelecem a natureza
contratual deste instituto, ou seja, a concessão de serviço público deverá sempre ocorrer
mediante a celebração de um contrato administrativo.
Esta teoria contratualista entende que o concessionário não se encontra em posição de
inferioridade em relação ao concedente e lhe reconhece a livre manifestação de sua vontade,
constituindo-se de elemento indispensável para validade e eficácia da concessão, sendo que se
a efetivação dos direitos e obrigações do concessionário para o concedente depende da sua
declaração, é porque a vontade de ambos se integram assumindo direitos e obrigações
recíprocos mediante o consenso contratual.
Na concessão não há alienação de serviço público, nem sobre ele se contrata apenas o
exercício de determinada função que é delegada a terceiros, consistindo em simples contrato
sobre a forma de prestação de certa atividade com a conseqüente outorga dos poderes
necessários para que ela se efetive, logo, o serviço público a ser instituído é conseqüência do
contrato que regula o modo de seu exercício e confere os meios convenientes para isso.
Os contratos de direito público devem se reger de maneira formal por regras idênticas
às de direito privado e materialmente por normas diversas é aceitar que a concessão não se
pode reger pelo contrato, pois, as normas fundamentais que regulam esse instituto jurídico
devem ser sempre as mesmas, tanto no aspecto formal como material, visto que o seu conceito
45 MELLO, Oswaldo Aranha Bandeira de. Natureza jurídica da concessão de serviço público. Revista de Direito Público. São Paulo, ano V, v.19, jan-mar.1972, p.23. 46 MEDAUAR, Odete (Coord.). Concessão de serviço público. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p.13.
31
é fornecido pela teoria geral do direito e a distinção entre contrato de direito público e de
direito privado deve estar apenas no objeto e no fim da relação jurídica.
Portanto, pode-se concluir que dentre as duas teorias mais importantes sobre a
natureza jurídica da concessão de serviços públicos, a que prepondera é aquela que trata o
assunto como um acordo de vontades, ou seja, um contrato de direito público, tendo
alcançado mais força após a promulgação da Constituição Federal que em seu Art. 175
abraçou de forma clara esta teoria.
1.4 OUTORGA E CONTROLE DE SERVIÇOS PÚBLICOS
A concessão de serviços públicos parte da premissa sobre a existência daqueles que,
em virtude de sua forma, convém que permaneçam socializados e mantidos sob o poder total
do Estado, mas também há os que interessam ao Poder Público delegar, por meio de
concessão, para que sejam exercidos pelo particular, consistindo a escolha do método que
definirá o cumprimento das atividades, observando-se as circunstâncias objetivas e a natureza
dos empreendimentos econômicos.
O Poder Público no exercício de suas atribuições, como visto anteriormente, nem
sempre é capaz de desempenhar seu papel de maneira adequada, seja por falta de pessoal
qualificado, seja por falta de recursos, inviabilizando a realização de ações de importância
para a coletividade. Esta a razão pela qual existe uma grande aceitação e aplicação da forma
de delegação de alguns serviços públicos, vez que obedientes a alguns pressupostos como a
necessidade e utilidade social do serviço, regras que garantirão o melhor desempenho do
serviço, a continuidade e o controle.
Conforme ilustra José Carlos de Oliveira47 deve-se buscar a vontade da coletividade e
esta ter consciência de seu papel e compreender a necessidade da delegação por parte do
Poder Público, além de problemas ocorridos ao longo da história, como desvio de finalidade,
falta de investimentos e o uso indevido das empresas estatais, buscando alcançar os objetivos
propostos por meio de um modelo eficiente e economicamente viável para a sociedade que
receberá serviços de melhor qualidade e não verá o desvio das funções do Estado.
Para a outorga na prestação de serviço público é necessário que exista um processo de
abertura contínuo e voltado para análise das reais vantagens ou desvantagens de ser abrir à 47 OLIVEIRA, José Carlos de. Concessões e permissões de serviços públicos. Bauru: Edipro, 1996, p.44.
32
livre concorrência serviços de interesse geral, ocorrendo por meio da realização de um estudo
individual de cada caso que apontará as condições da abertura, as regras a que se sujeita o
concessionário e os direitos do usuário.
Assim, quando o ente público outorga poderes ao particular para que se incumba de
executar serviço público, surgem com este ato jurídico, direitos e obrigações recíprocas,
cabendo ao concessionário o direito de executar o serviço, assegurada a seu favor uma
equação financeira estabelecida por ocasião da outorga da concessão, sendo dever do cedente
o direito de obrigar o concessionário a executar o serviço público, tendo como fim o alcance
do interesse coletivo.
Por se tratar de atividade de interesse coletivo, a concessão de serviços públicos deve
atender as premissas da igualdade de acesso, modicidade tarifária e adequação dos serviços às
novas realidades tecnológicas, sem perder de vista o necessário equilíbrio financeiro, real
necessidade para a continuidade do serviço concedido.
O direito de exercer a concessão constitui um direito único e não vários direitos (legais
ou regulamentares) ordenado pelos órgãos competentes, seja antes, no momento em que se faz
ou depois da concessão atribuída. Esclarece Oswaldo Aranha Bandeira de Mello48 que todas
essas faculdades são instrumentos conferidos ao concessionário para exercer o serviço público
que, se por um lado é um direito dele, por outro, é uma obrigação que lhe incumbe, pois
assumiu tal encargo.
Em nosso sistema, conforme ensina Toshio Mukai,49 podem-se vislumbrar no instituto
da concessão vários instrumentos que caracterizam sua outorga e refletem a relação jurídica
existente entre concedente e concessionário, assim, a lei autoriza a concessão e delimita a
amplitude do contrato a ser firmado, sendo que o procedimento licitatório, por sua vez, define
algumas condições contratuais prévias.
Marçal Justen Filho50 esclarece que somente ocorrerá a outorga que delegará serviços
públicos a particulares se estes sujeitarem-se ao princípio da legalidade, podendo a
Administração Pública atuar apenas mediante prévia autorização legislativa, assim, a
concessão e demais figuras de delegação devem previamente estar previstas em lei, editada
pela pessoa política em cuja órbita se encontrar a competência para a prestação do serviço.
48 MELLO, Oswaldo Aranha Bandeira de. Natureza jurídica da concessão de serviço público. Revista de Direito Público. São Paulo, ano V, v.19, jan-mar.1972, p.36. 49 MUKAI, Toshio. Concessão e permissão de serviço público. Revista da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo. São Bernardo do Campo, v.6, tomo II, nov. 2000, p.284. 50 JUSTEN FILHO, Marçal. Concessões de serviços públicos. São Paulo: Dialética, 1997, p.81.
33
Não importará a figura da concessão em alienação de poderes públicos. Outorgar
serviço público por via de concessão não significa que o Estado tenha demitido de si os
poderes que lhe são natos, razão esta porque a concessão se exterioriza pela manutenção do
serviço como público e da titularidade estatal sobre ele. Para tanto, é necessário que se realize
o controle na execução de serviço público onde se evitam abusos e arbitrariedades, sendo
dever do concessionário obedecer às regras que caracterizam a atividade.
De outro lado, importante papel é aquele exercido pelos usuários dos serviços públicos
concedidos no exercício de controle, exigindo do concessionário a execução do serviço
conforme o prometido nos termos do contrato administrativo firmado. Além deste controle,
considerado privado, não se afasta o dever do Estado de exercer o controle estatal, que é
autônomo, dotado de responsabilidade e com a faculdade de exigir do concessionário o
cumprimento de seus deveres.
A definição de controle propriamente dito encontra-se no Art. 27 da Lei nº 8.987/95 e
deriva da titularidade das ações que assegurem, de modo permanente, a preponderância das
deliberações sociais e o poder de eleger a maioria dos administradores, portanto, não deriva
somente da titularidade das participações societárias, segundo Marçal Justen Filho.51
Egon Bockmann Moreira52 esclarece que deve haver sempre o respeito pelos
interesses legítimos de cada parte, eis que o fim a ser atingido pelo contrato de concessão é a
satisfação do interesse público inerente à adequada prestação do serviço que compõe o seu
objeto. Para tanto, a Administração estabelece metas a ser atingidas e o particular formula
uma proposta que possibilite a execução delas, sendo que o particular tem o direito ao lucro
razoável que deverá estar determinado no contrato de concessão, tendo por base a equação
alcançada entre investimentos, receitas e despesas contratuais.
O controle é corolário do poder estatal, significando, no ensinamento de Toshio
Mukai,53 ao mesmo tempo a garantia do concessionário no cumprimento das determinações
contratuais, como também a certeza do Estado de que aquele mantém a execução do serviço
conforme o contratado.
A outorga pelo Estado, delegando a prestação de serviços públicos à iniciativa
privada, tem grande importância para a sociedade, posto que é a própria Administração
51 JUSTEN FILHO, Marçal. Concessões de serviços públicos. São Paulo: Dialética, 1997, p.287. 52 MOREIRA, Egon Bockmann. Contrato de concessão de serviço público: sua compreensão contemporânea. Revista Trimestral de Direito Público. São Paulo, v.44, 2003, p.136. 53 MUKAI, Toshio. Concessão e permissão de serviço público. Revista da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo. São Bernardo do Campo, v.6, tomo II, nov. 2000, p.293.
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Pública quem garantirá que sejam executados devidamente em atendimento às necessidades
sociais, de maneira que o cumprimento de suas finalidades deve gerar benefícios à sociedade
que recebe um serviço de melhor qualidade e tem condições de atuar diretamente no controle
destes, bem como ao concessionário a quem é garantido o equilíbrio econômico do contrato,
e, finalmente, ao Estado que se desincumbe da prestação de um serviço que por muitas vezes
pode se lhe tornar oneroso, adquirindo condições de realizar outros de melhor qualidade e que
atenda o interesse público.
1.4.1 Licitação
A licitação é o meio pelo qual a Administração Pública busca alcançar a melhor
proposta para os diversos tipos de contratação ou negócio que vier a realizar, no sentido de
proteção ao erário público e, consequentemente, respeito ao interesse público, de acordo com
as disposições contidas nos Arts. 37, XXI e 175 da Constituição Federal.
Compreende-se por finalidade da licitação, ou seja, o motivo específico pelo qual a
licitação é instaurada, o alcance da proposta mais vantajosa para a Administração Pública,
garantindo aos participantes igualdade de condições no certame, sempre visando o
atendimento do interesse coletivo.
José Carlos de Oliveira54 afirma que toda concessão de serviço público será objeto de
prévia licitação, observando-se os princípios da legalidade, moralidade, publicidade,
igualdade, vinculação ao instrumento convocatório e julgamento por meio de critérios
objetivos, previstos no ato convocatório e termos da proposta, evitando-se o subjetivismo no
julgamento desta. É da natureza da licitação o respeito ao princípio da isonomia visando
garantir igual oportunidade aos interessados na contratação, ainda ao Estado a oportunidade
de selecionar, conforme a isonomia constitucional, a proposta que lhe seja mais vantajosa.
O procedimento licitatório no caso das concessões de serviços sempre ocorrerá na
modalidade de concorrência pública, aplicando-se as legislações específicas (Lei nº 8.987/95)
no que couber, não afastando ainda a possibilidade, em determinados casos, de aplicação da
modalidade de leilão prevista no Programa Nacional de Desestatização. A adoção desta
modalidade é justificada para que se possa atrair o maior número de interessados.55
54 OLIVEIRA, José Carlos de. Concessões e permissões de serviços públicos. Bauru: Edipro, 1996, p.69. 55 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 28.ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p.372-3.
35
Nesta hipótese, segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro,56 a licitação será ordenada em
cinco fases, o edital, a habilitação, a classificação, a homologação e a adjudicação. A
composição destas exigências fixa as condições de sua realização e habilita os interessados a
participarem da concorrência pública ou leilão para apresentação de suas propostas.
A Lei nº 8.987/95, em seu Art. 18, traça as normas concernentes ao edital,
estabelecendo que o mesmo deverá ser elaborado pelo poder concedente observada a
legislação, inclusive sobre licitações e contratos, aplicando-se subsidiariamente o Art. 40 da
citada lei, no que couber.
O edital deverá conter a descrição dos requisitos e condições necessárias à prestação
adequada do serviço, bem como os prazos para recebimento das propostas acompanhadas da
documentação exigida, julgamento da licitação e assinatura do contrato, além da justificativa
do poder concedente da conveniência da outorga do serviço público à gestão privada.
Em vista do princípio da continuidade do serviço, o poder concedente deve recusar
aqueles concorrentes que manifestarem propostas inviáveis seja financeiramente ou em seu
modo de execução, pois, esclarece Hely Lopes Meirelles57 não se tratar de faculdade
discricionária da Administração, mas sim um poder vinculado às condições objetivas da
proposta, onde dados concretos da realidade inviabilizam a oferta, não podendo o concedente,
entretanto, rejeitar proposta por mera suspeita de inexequibilidade, inviolabilidade técnica,
econômica ou jurídica sem que sejam apontados os motivos da eliminação.
As regras contidas na legislação respectiva demonstram a necessidade por se
resguardar os dos dois princípios básicos da licitação: da igualdade e o do sigilo da proposta.
Porém, como em qualquer ato, seja público ou particular, poderão eles conter vícios. Para
Marçal Justen Filho58 existem dois tipos de vícios apresentados no edital de licitação, os
relativos à sua função de divulgar e aqueles relativos à função normativa.
É inerente, também, ao processo licitatório o respeito ao princípio da publicidade,
onde todos os atos e procedimentos administrativos, quando se relacionarem às questões de
interesse geral da comunidade deverão ser abertos ao conhecimento de qualquer sujeito,
destinando a facultar a realização de fiscalização sobre a atividade administrativa e forma de
desmotivar a prática de irregularidades.
56 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 20 ed. São Paulo: Atlas, 2007, p.360. 57 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 28.ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p.304-5. 58 JUSTEN FILHO, Marçal. Concessões de serviços públicos. São Paulo: Dialética, 1997, p.218.
36
É garantia constitucional o acesso de qualquer pessoa, física ou jurídica, cidadão ou
não, às informações acerca do processo licitatório, como se encontra enunciado no Art. 22 da
Lei nº 8.987/95, que impôs neste sentido disciplina ampla. Todavia, determinadas
informações devem ser mantidas em sigilo em virtude de sua natureza, visando resguardar o
próprio interesse público.
1.4.2 Fiscalização
A justificação do poder de fiscalizar encontra-se na necessidade que a Administração
Pública possui de controlar a execução do contrato e evitar surpresas prejudiciais ao interesse
público, respeitando-se a liberdade do concessionário. A fiscalização deve ser realizada
somente com o fim a que ela se destina, ou seja, o atendimento do interesse público, sem
prejudicar qualquer das partes.
O Estado é competente para supervisionar e fiscalizar o cumprimento das normas
regulamentares, devendo assegurar a continuidade e comodidade das prestações avençadas,
velando pela atualização dos serviços concedidos que deva ser promovida pelo concessionário
enquanto corresponder ao processo de exploração da atividade pública que lhe foi concedida.
Como em outros atos, a fiscalização pode ser alvo de inconveniências, assim sendo os
órgãos fiscalizadores devem atentar para o fato de transformá-la em instituto excessivamente
burocratizado, em detrimento da finalidade pública, tendo sido alvo de apontamentos por
Marçal Justen Filho59 que afirma dever estar a lei preocupada em institucionalizar a
fiscalização, promovendo uma espécie de devido procedimento fiscalizatório, evitando-se que
as atividades de fiscalização fiquem à livre escolha do poder concedente, impedindo excessos
e negligência em suas funções.
De acordo com José Carlos de Oliveira60 sujeitam-se as concessões de serviços
públicos à permanente fiscalização do poder concedente responsável pela delegação, controle
este realizado com a cooperação dos usuários, como já citado, pois o poder concedente, ao
outorgar o serviço público, passa a garantir ao usuário que o concessionário irá prestá-lo da
forma convencionada visando o interesse da coletividade.
Para tanto, a fiscalização do serviço público será realizada por meio de órgão técnico
59 JUSTEN FILHO, Marçal. Concessões de serviços públicos. São Paulo: Dialética, 1997, p.301. 60 OLIVEIRA, José Carlos de. Concessões e permissões de serviços públicos. Bauru: Edipro, 1996, p.80.
37
mantido pelo poder concedente ou por entidade a ele conveniada, formando-se uma comissão
composta de representantes do poder concedente, da concessionária e dos usuários, sempre
respeitando as regras individualizadas para cada setor.
A condição de integrante de comissão de fiscalização não produz somente faculdades
ao garantir que são criados também encargos, abrindo-se a oportunidade para se ter acesso a
informações eventualmente sigilosas, assumindo nestes casos o dever de utilizar-se delas de
maneira adequada, não podendo divulgá-las livremente, sob pena de imposição às regras da
Lei nº 8.429/92 que trata da improbidade administrativa.61
Dentre as atribuições do órgão fiscalizador, está a capacidade de ordenar as atividades
do concessionário na busca do cumprimento dos objetivos elencados no contrato e nas leis
regulamentares, necessitando-se de um órgão estruturado para velar pelo cumprimento das
obrigações assumidas pelo concessionário junto ao poder concedente e visando a satisfação
do interesse público por meio dos direitos dos usuários.
Esclarece José Carlos de Oliveira62 que os limites do poder de fiscalizar dependerá do
contrato, observando-se o dever de não onerar, dificultar ou impedir o cumprimento do
contrato sem fundamento justo. Assim, o contrato é a associação de duas partes por meio do
qual o concessionário realiza seu interesse e perseguirá o interesse público objeto do contrato,
e da mesma forma, o poder concedente deve cumprir o convencionado, fiscalizando o
concessionário quanto ao cumprimento de suas obrigações, e não mais que isso, tudo em
conformidade com o avençado.
O dever de fiscalização pressupõe, por seu turno, que o concessionário de serviço
público deve facilitá-la, permitindo que o façam em qualquer época, seja em relação a obras,
equipamentos, instalações integrantes do serviço e registros contábeis, respeitando-se, porém,
a forma de fiscalização do órgão concedente ou outros competentes para tal mister, o que
deve estar explicitado no contrato de concessão.
1.5 CONTRATOS ADMINISTRATIVOS
1.5.1 Conceituação
61 JUSTEN FILHO, Marçal. Concessões de serviços públicos. São Paulo: Dialética, 1997, p.301. 62 OLIVEIRA, José Carlos de. Concessões e permissões de serviços públicos. Bauru: Edipro, 1996, p.80.
38
No Direito Privado, o conceito de contrato remete ao ajuste firmado entre as partes
que manifestam livremente seu desejo de celebrar um contrato, determinando para isto,
bilateralmente, as condições pela qual se dará o acordo, impossibilitando a qualquer delas o
descumprimento de sua parte, sem que com isso tenha que prestar a indenização avençada e
devida à outra parte.
Foi neste cenário que os contratos nasceram, primeiramente para atendimento das
necessidades privadas dos indivíduos e somente após migrou para o direito público, surgindo
a figura do contrato administrativo, diante da necessidade da Administração Pública quanto à
regulamentação de suas relações, seja no campo do ato jurídico ou das relações contratuais, o
que denomina Marçal Justen Filho63 de contrato-ato ou contrato-relação.
Não pode a Administração Pública deixar de realizar o atendimento do interesse
público. No entanto, ela nem sempre tem o pessoal especializado e nem as condições de
fornecer o produto ou o serviço público e, visando a garantia do bem da coletividade, tem o
administrador a opção de contratar com terceiro.
Neste sentido, o contrato administrativo, trata-se de acordo de vontades, porém
apresentando diferenças marcantes em relação ao contrato privado, principalmente pelo fato
de se a Administração Pública uma das partes, o que enseja regime jurídico diferenciado ao
contrato que passará a ser público, independentemente se quem contrata com a Administração
é um particular, seja pessoa física ou jurídica.
No contrato administrativo deverá a Administração primar pelo atendimento dos
interesses da coletividade, diferentemente dos contratos particulares, onde há a busca pela
satisfação pessoal, visando alcançar o interesse público e não somente deste ou daquele
indivíduo. O Código de Defesa do Consumidor garantirá ao contrato o cumprimento da ordem
social, assim, as partes terão liberdade para contratar, porém, sofrerão a intervenção do Estado
se assim não o fizerem para o cumprimento do regramento consumerista.
Todo contrato administrativo, seja ele firmado com um particular ou não, estará
sujeito à incidência na relação contratual à aplicação do princípio da boa-fé objetiva que é
intrínseco ao mesmo, garantindo a almejada segurança e equilíbrio contratual.
O legislador dispôs sobre este instituto na Constituição Federal, em seu Art. 175, I, ao
discorrer sobre o encargo do Poder Público à prestação do serviço público, diretamente ou em
sede de concessão, devendo atuar em conformidade com a lei, mormente no que tange à
63 JUSTEN FILHO, Marçal. Concessões de serviços públicos. São Paulo: Dialética, 1997, p.15.
39
figura do contrato, que apesar da omissão no texto constitucional, trata-se de contrato
administrativo, regido pelas normas de direito público.
O contrato administrativo trata-se da avença que a Administração realiza quando da
necessidade do atendimento do interesse público, importando salientar quanto as
possibilidades em que ele se dará, e nesta esteira, Celso Antônio Bandeira de Mello64
esclarece que o mesmo pode ocorrer de duas maneiras, quando a Administração necessita
contratar sob a égide do direito privado, tem-se o Contrato de Direito Privado da
Administração e quando contrata em atendimento às normas do direito público tem-se o
Contrato Administrativo propriamente dito.
Por sua vez, Maria Sylvia Zanella Di Pietro,65 discorrendo sobre o assunto, traça as
diferenças entre o Contrato Administrativo com paralelo no Direito Privado e o Contrato
Administrativo com base no objeto. Daí conclui que o Contrato Administrativo “[...] visa à
prestação de serviço público, não no sentido restrito de ‘atividade exercida sob regime
jurídico exorbitante’, mas no sentido mais amplo, que abrange toda a atividade que o Estado
assume [...]”. De outro lado, o Contrato Administrativo Privado tem “[...] por objeto a
utilização privativa de bem público de uso comum ou uso especial [...]”, ou seja, o Estado, em
atendimento ao interesse geral, celebra o contrato com o particular que visa seus próprios
interesses, cabendo àquele agir de maneira a zelar pelo cumprimento do avençado, celebrado
sob regime jurídico administrativo.
Em que pese tal diferenciação, leciona Lucia Valle Figueiredo66 que o sistema jurídico
brasileiro dispensa tratamento paritário a ambos, cabendo ao Poder Judiciário atender as mais
diversas situações, sejam elas públicas ou privadas, em virtude da existência de Jurisdição
única, na observância da competência e apresentando resultados que lhes sejam cabíveis.
Assim, o contrato celebrado pela Administração Pública, seja ele regido pelo Direito
Privado ou pelo Direito Público, deverá ater-se ao atendimento das normas legais, cumprindo
o protocolo e preenchendo as qualidades que lhe garantirão existência e manutenção, sempre
em busca da satisfação do interesse social.
Contudo, quando se tem um ajuste entre os entes da Federação (Municípios, Estados,
Distrito Federal e União), visando a manutenção da ordem federativa, não é possível a
64 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 24.ed. São Paulo: Malheiros. 2007, p.600. 65 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 20 ed. São Paulo: Atlas, 2007, p.240. 66 FIGUEIREDO, Lucia Valle. Curso de Direito administrativo. 3.ed. São Paulo: Malheiros. 1998, p.439.
40
celebração de contrato administrativo, visto que a faculdade que possui a Administração de
alterar ou extinguir unilateralmente o contrato seria irrealizável em respeito à outra parte que
também se trata de Administração Pública, detentora da mesma prerrogativa.
A Administração deve valer-se de sua condição de administrador, e como tal, privar
pela manutenção de sua soberania, assim, sempre que necessário contratar deverá agir visando
o atendimento dos interesses da coletividade e para isto agirá conforme o estabelecido pela
lei, impondo aos interessados a aceitação de suas condições, e a este poder exercido pelo
administrador, Maria Sylvia Zanella Di Pietro67 dá o nome de verticalidade.
Quando surge a necessidade pública de se prestar algum serviço ou ainda na obtenção
de produto, a Administração, valendo-se de sua soberania, determinará se tem as condições de
atender o interesse público através de suas próprias ações ou se precisará valer-se da prestação
de terceiros para tal fim. Embora em alguns casos seja dispensada, é regra para a contratação
com terceiros que cumpra o determinado pela Lei nº 8.666/93, ofertando aos interessados, por
meio de edital, a celebração do contrato.
Desde a elaboração até o término do contrato, a Administração deve respeitar o
equilíbrio contratual entre as partes, evitando ao particular que o contrato caracterize
prestação excessivamente onerosa ou ainda que se transforme em uma ao longo de sua
execução, garantindo a manutenção do contratado sem que o particular sinta em demasia o
peso da soberania da Administração.
Tem a Administração Pública, no exercício de seu poder, o condão de alterar ou até
mesmo extinguir o pactuado no contrato administrativo, podendo fazer isto de maneira
unilateral e independente do previsto nas cláusulas contratuais, a chamada instabilidade que se
dá apenas em sede dos contratos administrativos, numa demonstração clara da desigualdade
existente entre as partes, diferenças estas necessárias para a manutenção da ordem social,
numa demonstração de pleno exercício de sua soberania.
1.5.2 Características
O contrato administrativo possui características que lhe são próprias, tendo em vista
ser a Administração Pública uma das partes contratantes, não importando qual sua natureza,
será sempre merecedor de atenção visto que se trata de uma avença que busca exclusivamente 67 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 20 ed. São Paulo: Atlas, 2007, p.233.
41
o atendimento do interesse público, e neste sentido, deve ser fiel ao previsto na legislação,
ignorando vontades que representem o atendimento de interesses individuais, sendo
importante para o presente estudo estabelecer estas características, posto que à partir daí será
possível vislumbrar o contrato de concessão de serviço público e suas especificidades.
Ficou claro, diante do analisado até o momento, que é imprescindível a presença da
Administração Pública num dos pólos da relação jurídica para que ocorra a formalização de
um contrato administrativo, eis que, em atendimento ao interesse público, tornará notório seu
interesse em contratar e aqueles que preencherem os requisitos necessários para tal e tiverem
interesse, se candidatarão e concorrerão ao preenchimento do outro pólo contratual.
Para a maioria dos doutrinadores a presença da Administração Pública se trata da
maior característica do contrato administrativo, tendo em vista o exercício de sua soberania.
No entanto, Diógenes Gasparini68 entende que não se trata de característica do contrato, visto
que é necessária a presença da Administração em todos os atos que ela participe, assim, não
se trata de uma característica, mas algo inerente às suas atividades.
O atendimento ao interesse público é a mola propulsora de todas as atividades da
Administração Pública, pois, sem a finalidade pública, ficam deficientes quaisquer contratos
firmados por ela, sendo que este fim pode também ser considerado inerente ao exercício
estatal, não havendo que se falar em atividade administrativa que não vise o atendimento do
interesse público, garantindo a todos os contratos administrativos esta característica.
Assim como nos contratos privados, deve o contrato administrativo seguir as
formalidades legais, atendendo às regras expressas, se apresentando na forma escrita sempre e
tornando conhecido da população que é a maior interessada em sua criação e execução. O
atendimento às formalidades legais também caracteriza os contratos administrativos, sendo
que podem se dar através de autorização legislativa ou da autoridade competente, motivação e
licitação, modalidade esta necessária a existência do contrato de concessão de serviço público.
Nos contratos de concessão, que normalmente prevêem períodos longos de execução,
será imprescindível a demonstração do tempo de vigência, das possibilidades de reajuste, em
virtude de sua longevidade, bem como de possíveis adaptações tecnológicas para manter
sempre o nível de atendimento ao interesse público.
Nos casos de concessão deverá ser do conhecimento de todos e daquele que contrata
com a Administração, já no edital de licitação, a forma em que o contrato será firmado,
68 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p.642.
42
devendo constar da minuta do mesmo. Márcia Walquiria Batista dos Santos69 esclarece que
em casos extremos poderá ocorrer mudanças na minuta contratual, quando for necessário ao
interesse público e em respeito ao princípio da igualdade, desde que antes da assinatura e com
o consentimento do contratado.
A minuta contratual constante do processo licitatório, normalmente traz a forma como
o contrato administrativo deverá ser celebrado entre a Administração e o vencedor do
certame, suas cláusulas encontram-se preparadas antes mesmo de saber com quem será
celebrado o contrato, razão pela qual são considerados, contratos de adesão. A Administração
detém o poder de criar o instrumento contratual, o que fica demonstrado desde o edital com a
presença da minuta, garantindo ao interessado o direito de desejar ou não contratar com a
Administração, por não tratar-se de ato impositivo.
À Administração é permitida a inclusão de cláusulas exorbitantes no contrato
administrativo, porém, quando verificadas em contratos privados, esclarece Hely Lopes
Meirelles70 estas são ilícitas ao desigualarem as partes na execução do contrato. No caso dos
contratos em questão não possuem ilicitude mesmo desnivelando a relação, numa
demonstração da supremacia exercida pelo ente público, que precisa valer-se de instrumentos
nem sempre justos com os indivíduos para o atendimento do interesse público.
Ao contrato administrativo que visa a concessão de serviço público, é necessária a
realização de processo licitatório que se trata da escolha pela Administração da proposta que
mais se enquadre no exigido no edital, assim, será vencedor aquele que apresentar o perfil
ideal para contratar com a mesma, razão pela qual é necessário que se estabeleça ao contrato
administrativo a característica intuitu personae, visto que se o contratado foi o vencedor do
certame, não deve repassar a outro seu dever de executar o contrato, conforme o
convencionado, o que será motivo para a Administração rescindir unilateralmente o contrato.
Assim, a celebração de um contrato administrativo representará sempre ato da
Administração, que soberana, tem a necessidade de contratar com particular para a prestação
de serviço público, atendendo às formalidades legais e requisitos necessários ao contrato
administrativo visando sempre a satisfação do interesse público.
69 MEDAUAR, Odete (Coord.). Concessão de serviço público. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p.70. 70 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 28.ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p.207.
43
1.5.3 Espécies
O contrato administrativo se dará em virtude do atendimento do interesse público,
assim, a Administração Pública optará por uma modalidade de acordo que esteja em
consonância com o resultado esperado, devendo respeitar sempre a legislação e somente será
viável quando propender o atendimento do interesse público que viabilizará sua existência
conforme a Lei nº 8.666/93.
A divisão dos contratos administrativos pode ser caracterizada conforme seu fim em:
Contrato de Concessão é aquele que se configura pela delegação de poderes feita pela
Administração Pública ao particular, podendo ocorrer conforme o fim a que se destina, sendo
divido nas espécies de Concessão de Serviço Público, tema do presente estudo; Concessão de
Obra Pública decorrente da Administração que confia ao particular a execução e exploração
de obra pública; Concessão de Uso de Bem Público, onde é transferido ao particular o uso do
bem público, sempre em atendimento ao interesse público.
Contrato de Serviço, também chamado de Contrato de Prestação ou Locação de
Serviços, fundamentado no Art. 6º, II, da Lei de Licitações, se dá quando a Administração
necessita realizar atividades fora de suas capacidades, precisando contratar particular que os
preste, não há delimitação daqueles serviços que podem ser prestados, estes sempre serão
permitidos desde que legais e estejam em plena harmonia com o interesse público. Hely
Lopes Meirelles71 atenta apenas para a necessidade de, quando da contratação, se observar
quais as características dos serviços, se comuns, técnicos profissionais ou artísticos.
Contrato de Obra Pública, regulado pelo Art. 6º, VIII, da Lei de Licitações, advém
sempre que a Administração Pública, em atendimento ao interesse público, tiver a
necessidade de realizar ações nos bens imóveis de seu patrimônio, sejam os destinados ao uso
da sociedade ou ao atendimento de suas funções administrativas. Para tal, diante de sua
incapacidade técnica, carecerá de realizar a contratação dos serviços de construção civil de
particular, regularmente inscrito nos órgãos respectivos, para a realização de, quando for o
caso, construção, reforma ou ampliação do bem público.
Contrato de Fornecimento, aquele disposto nos Arts. 6º, VIII; 14 a 16 da Lei de
Licitações, certamente o que possui maior semelhança com o contrato de compra e venda do
Direito Privado. Nele a Administração adquirirá o bem móvel necessário à sua manutenção ou 71 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 28.ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p.251
44
a realização de suas obras. Por se tratar da tradição de bens necessários ao consumo, pode se
dar em única parcela ou ainda, conforme a necessidade, em prestações sucessivas, até o
atendimento de sua finalidade.
Contrato de Empréstimo Público se dá quando a Administração não possuindo
recursos financeiros disponíveis, ou ainda quando os possuir sejam direcionados a atividades
essenciais, necessita de valor para o atendimento de situação inesperada e forçosa, poderá
tomar emprestada a quantia de entes públicos ou privados, nacionais ou internacionais.
Diógenes Garparini72 explana que este deverá observar o previsto no Art. 48, II da CF, bem
como as normas do Banco Central do Brasil e aquelas pertinentes do Senado Federal.
Contrato de Gestão foi introduzido no sistema jurídico por meio da alteração do Art.
37 da Constituição Federal pela EC 19/98, ganhando o texto um novo parágrafo, o 8º, que
trata da ampliação da autonomia gerencial, financeira e orçamentária, concedida pela
Administração Pública Direta, na forma de contrato, aos entes da Administração Direta,
Indireta ou ainda particulares. Maria Sylvia Zanella Di Pietro73 leciona que “o objetivo do
contrato é o de estabelecer determinadas metas a serem alcançadas pela entidade em troca de
algum benefício outorgado pelo Poder Público”.
Ainda é possível verificar a existência de outras modalidades de contrato, quais sejam,
de Função Pública, de Gerenciamento, Termo de Parceria, Convênios e Consórcios, porém, ao
presente estudo não resta maior importância, de forma que aqui foram apresentados,
sucintamente, aqueles que para o momento possuem maior interesse, ressaltando a relevância
do Contrato de Concessão de Serviço Público, tratado de maneira especial neste capítulo.
1.5.4 Equilíbrio Econômico-Financeiro
O direito de uma equação econômico-financeira está constitucionalmente estabelecido
no inciso XXI do Art. 37 e no inciso III do Art. 175 ao garantir o cumprimento das obrigações
assumidas e uma política tarifária que conjugue o atendimento dos interesses sociais e a justa
compensação do serviço prestado por meio da concessão ou permissão. Além das prescrições
constitucionais, os Arts. 9º a 11 da Lei nº 8.987/95 disciplinam sobre o restabelecimento,
manutenção e aferição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato.
72 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p.732. 73 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 20 ed. São Paulo: Atlas, 2007, p.312.
45
A relação fundamental para se definir o equilíbrio econômico configura-se pelo ato da
fixação dos encargos ao concessionário e o lucro almejado por este, onde se deve estabelecer
uma medida eqüitativa a fim de evitar abusos e, consequentemente, fixar uma igualdade de
equilíbrio entre os contratantes.
Lucia Valle de Figueiredo74 é incisiva ao tratar do equilíbrio econômico dos contratos
administrativos, incluindo-se os de concessão, afirmando que os direitos do contratado devem
obedecer três cláusulas fundamentais, “a intangibilidade da equação econômico-financeira, o
direito ao objeto contratual inalterável e o recebimento do processo avençado”. Assevera,
ainda, que “[...] a equação econômico-financeira do contrato caracteriza-se pelo equilíbrio
entre as obrigações assumidas e as importâncias a serem recebidas”.
Segundo Hely Lopes Meirelles75 o equilíbrio econômico do contrato administrativo é:
[...] a relação estabelecida inicialmente pelas partes entre os encargos do contratado e a retribuição da Administração para a justa remuneração do objeto do ajuste. Essa relação encargo-remuneração deve ser mantida durante toda a execução do contrato, a fim de que o contratado não venha a sofrer indevida redução nos lucros normais do empreendimento. Assim, ao usar de seu direito de alterar unilateralmente as cláusulas regulamentares do contrato administrativo, a Administração não pode violar o direito do contratado de ver mantida a equação financeira originariamente estabelecida, cabendo-lhe operar os necessários reajustes econômicos para restabelecimento do equilíbrio financeiro.
Portanto, em se alterando os termos da igualdade com o aumento dos encargos, o
Estado, para manter a proporcionalidade, deverá recompor economicamente o concessionário
quando modificar a grandeza de seus ônus. Inviável seria a imposição de sobrecarga ao
concessionário sem que o Estado efetuasse uma compensação por isto.
Sem embargo, o poder concedente não pode proteger o concessionário, como um pai
que ampara seus filhos nos momentos difíceis de qualquer insucesso econômico ou
diminuição de seus lucros, pois a empresa que se dispõe a concorrer no intuito de assumir o
controle de determinados serviços concedidos pelo Estado, deve ter ciência que correrão por
sua própria conta e risco a administração e gestão da concessão, sendo natural que se sujeite
aos perigos de qualquer empreendimento industrial ou comercial.
Todavia, necessário conhecer quais são os riscos da atividade econômica a serem
cobertos. A diferenciação encontra dois pontos fundamentais. O primeiro ordinário,
correspondente aos riscos normais e o segundo extraordinário, subdividindo-se em
74 FIGUEIREDO, Lucia Valle. Curso de direito administrativo. 3.ed. São Paulo: Malheiros. 1998, p.450-1. 75 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 28.ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p.209.
46
administrativa e econômica, onde naquele os riscos correm inteiramente por conta do poder
concedente e neste os riscos são derivados de situações excepcionais e imprevisíveis, sendo os
prejuízos partilhados pelo concedente e concessionário.
Em relação à área administrativa e econômica e visando a proteção do concessionário
aplicam-se as teorias do fato príncipe e da imprevisão. Tratando do assunto, Celso Antônio
Bandeira de Mello76 leciona que no caso da primeira teoria o poder concedente deverá
indenizar totalmente o concessionário quando por ato próprio de agravar a situação
econômica da concessão em detrimento do concessionário, repercutindo na economia
contratual. Vislumbrando a invocação da teoria da imprevisão, o concedente deverá indenizar
parcialmente os prejuízos sofridos pelo concessionário de fato ou ato que se julgue
imprevisível, ocasionados por forças externas a vontade dos contratantes.
As tarifas recebidas pelo concessionário para pagamento pelos serviços utilizados,
devem assegurar os termos econômicos que as partes assumiram ao compor a equação
econômico-financeiro inserta na proposta entregue à época da licitação, tendo sido previsto
que todos os custos da concessão e a remuneração justa ao concessionário estariam cobertos
pela valoração do preço público fixado.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro77 defende tal posicionamento, eis que na celebração do
contrato a Administração Pública garante seja “assegurada” a contraprestação pelos serviços
prestados pelo concessionário, “[...] porque nem sempre é ela que paga; em determinados
contratos, é o usuário do serviço público que paga a prestação devida, por meio da tarifa; é o
que ocorre nos contratos de concessão de serviço público”.
Outrossim, o concessionário deve suportar aqueles prejuízos advindos de sua própria
autonomia, ou seja, aqueles que tenham causa a própria ineficiência ou imperícia derivadas de
eventual estimativa inexata quanto à captação ou manutenção daqueles mesmos usuários que
se utilizavam dos serviços, além de outras expectativas frustradas que gerariam outras fontes
de renda. Impossível seria o poder concedente eximir todos os concessionários dos riscos, de
natureza própria, peculiar a estes empreendimentos econômicos, vez que seu amparo não
pode ir além do resguardo e cujo vínculo só é justificável para atender o interesse público.
76 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 24.ed. São Paulo: Malheiros. 2007, p.628-9. 77 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 20 ed. São Paulo: Atlas, 2007, p.256-7.
47
2 RELAÇÕES DE CONSUMO DERIVADAS DAS CONCESSÕES DE SERVIÇOS
PÚBLICOS E OS CONFLITOS JURÍDICOS
Com o desenvolvimento da sociedade, modificaram-se também as relações sociais,
passando a serem mais complexas. Na observância de tal situação verificou o legislador a
necessidade de criação de normas que atendessem especificamente estas relações cada vez
mais massificadas.
A novidade encontra-se no fato de que as relações de consumo, tão antigas e
desniveladas, receberam tratamento diferenciado com o advento da Constituição Federal de
1988, de forma que, o consumidor, antes desrespeitado, passou a receber atenção especial,
merecendo a qualificação de vulnerável e lhe sendo garantido as mais diversas prerrogativas
de proteção.
Portanto, foi a Constituição Federal de 1988 que trazendo em seu texto as normas de
proteção ao consumidor, possibilitou fosse inaugurado no Brasil um novo tempo, dando-se
abrigo aos consumidores e com isso garantindo maior segurança jurídica nas relações de
consumo que passaram a apresentar um equilíbrio mais próximo do ideal.
2.1 PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL DO CONSUMIDOR
Ao se inferir nesta discussão, importe frisar que a Constituição Federal dispõe como
um de seus princípios a garantia da igualdade entre os cidadãos e por isso, o texto
constitucional não deixou de observar sua aplicabilidade nas relações ocorridas entre
consumidores e fornecedores, eis que vinham ganhando espaço e na mesma velocidade,
injustiças, razão pela qual também dispensou ao consumidor proteção inédita, possibilitando
que a relação de consumo se tornasse paritária.
Aos prestadores de serviços públicos concedidos acarretam obrigações especiais,
notadamente pelo essencial caráter público da atividade, razão pela qual Roberto Augusto
Castellanos Pfeiffer78 indica que a Constituição Federal, em seu Art. 37, § 6º, determina que
as pessoas jurídicas de direito público e privado que prestarem serviços públicos serão
78 PFEIFFER, Roberto Augusto Castellanos. Serviços públicos concedidos e proteção do consumidor. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, ano 9, n.36, out-dez 2000, p.167.
48
responsabilizadas pelos danos que seus agentes causarem a terceiros, ficando assegurado o
direito de regresso quando tratar-se de dolo ou culpa, resultando que a aplicação da
responsabilidade objetiva é norma constitucional, ficando o prejudicado com a
responsabilidade de comprovar somente que o dano tenha efetivamente ocorrido, seu
montante, o nexo causal entre a ação ou omissão do agente e o prejuízo sofrido sem que seja
necessário investigar a culpa ou dolo do concessionário. Esta regra tem aplicação equiparada
ao do Art. 22 do Código de Defesa do Consumidor, estabelecendo claramente a obediência
dos serviços públicos concedidos às normas de proteção ao consumidor.
Dentre os objetivos da Constituição Federal está o alcance da igualdade entre todos,
com uma sociedade livre, justa e solidária, trazendo em seu bojo os princípios garantidores
dos direitos e garantias fundamentais ao indivíduo, por meio da soberania popular, da
cidadania, da dignidade da pessoa humana, de valores sociais do trabalho e da livre-iniciativa.
A conjugação de tais elementos tem em vista o desenvolvimento nacional, a erradicação da
pobreza e a marginalização e redução das desigualdades sociais entre outros objetivos, logo, o
advento do Código de Defesa do Consumidor deu-se para coroar as alterações pelas quais a
sociedade passou à partir da Constituição, garantindo a proteção do consumidor.79
Neste sentido, os precedentes constitucionais buscaram a garantia da prestação de
atividades estatais que pudessem proporcionar o benefício material e ainda a utilização direta
por parte dos indivíduos para a satisfação de toda a coletividade. Estas são prestadas na forma
de serviços públicos que podem ser desenvolvidas pelo próprio Estado de maneira direta
quando reúne condições de efetivá-los ou ainda por meio de outras pessoas que por ele sejam
delegadas, mas a atuação estatal é prevista constitucionalmente, fiscalizando estas atividades
para que os interesses da coletividade sejam atendidos. É a Constituição Federal quem
determina a competência dos diversos entes públicos, atribuindo claramente quais os serviços
públicos que devem ser prestados pela União, Estados e Municípios.
As alterações se deram em virtude da necessidade crescente que o Estado, enquanto
Estado Social, sentiu de desincumbir-se diante do acúmulo de atividades que tinha assumido e
que vinha cumprindo com ineficiência. Elaine Cardoso de Matos Novais80 ensina que foi
necessária a quebra dos monopólios para que permanecessem competitivas as atividades
estatais, momento em que surgiram as parcerias entre ele e o setor privado. A diminuição da
máquina administrativa, com a distribuição de funções e a diminuição de gastos diretos, 79 NOVAIS, Elaine Cardoso de Matos. Serviços públicos e relação de consumo: aplicabilidade do código de defesa do consumidor. Curitiba: Juruá, 2006, p.42. 80 Idem ibidem, p.51.
49
possibilita uma melhor atuação por parte dos entes públicos, que de maneira desburocratizada
e mais eficiente mantém-se mais próximo dos indivíduos e conseqüente de suas necessidades.
A norma do Art. 5º, XXXII da Constituição Federal coloca a proteção do consumidor
numa posição importante dentro do ordenamento pátrio, com aspecto de concretude e
preponderância, alcançando o status de um dos princípios da ordem econômica e, assim como
as demais, é uma norma de grande importância e serve como critério de interpretação. Desse
modo, o Art. 170, V da Constituição que trata da proteção do consumidor, per si limitou a
livre-iniciativa com o objetivo de assegurar a todos uma existência digna com apoio nos
preceitos da justiça social.
O texto constitucional, ao determinar como direito fundamental a proteção do
consumidor e ainda a criação de legislação específica, primou pelo atendimento dos interesses
da sociedade, visto que ao garantir ao consumidor tratamento diferenciado garantiu-lhe uma
desmarginalização social e ainda maneiras de lhe assegurar o acesso à justiça.81
Lembra Elaine Cardoso de Matos Novais82 que a observância da Constituição Federal
diante das normas de proteção ao consumidor não deve se restringir aos dispositivos em que o
texto esteja expressamente tratando do tema, mas ao contrário, já no preâmbulo e nos artigos
iniciais é possível esta verificação, com a determinação da instituição de um Estado
Democrático que garanta aos indivíduos e, conseqüentemente, a toda coletividade, os direitos
sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e
a justiça que constituem valores supremos e incontestáveis da sociedade brasileira.
Com o atual ordenamento constitucional se proporciona aos indivíduos a garantia de
liberdade e igualdade que transcenda ao campo do hipotético, visando o alcance de uma
sociedade justa, onde todos os indivíduos tenham seus direitos atendidos, garantindo-lhes uma
vida mais digna, menos desigualdades, melhores condições para si e sua família. São estes
alguns dos objetivos a serem alcançados pelo Estado, enquanto ente responsável pelo
desenvolvimento de seu povo e visando este fim, legisla para que as normas determinem as
regras a serem seguidas, impondo deveres e obrigações.
Neste sentido, o Código de Defesa do Consumidor não é o único a garantir isto à
coletividade, vez que por ser um microssistema, atua de maneira expressa nos interesses
ligados às relações de consumo, existindo aqueles que, em que pese aparentemente serem
81 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p. 27. 82 NOVAIS, Elaine Cardoso de Matos. Op. cit., p.76.
50
assim qualificados não o são, como o que ocorre com os serviços públicos, previstos na
Constituição Federal e com as mesmas garantias das relações de consumo, demonstrando a
influência que uma área do Direito exerce sobre as demais.
2.1.1 A Constituição Federal de 1988
O legislador constituinte ao formular as regras que visam garantir os direitos
individuais e coletivos (Art. 5º XXXII) inovou ao se atentar para as novas teorias e conceitos
abrangendo a proteção jurídica do consumidor, eis que até então nada estava posto à
disposição do hipossuficiente para garantir seus direitos, motivando, dessa forma, a
regulamentação constitucional.
Para Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer83 não por acaso a Constituição Federal
trouxe em seu conteúdo a proteção do consumidor, isto graças ao fato deste estar ligado aos
ideais igualitários e democráticos que não podem divorciar-se do direito social da economia
capitalista, sendo trazido na legislação constitucional no Art. 5º, XXXII, como um dos
direitos fundamentais e no Art. 170, V, inserido entre os princípios da ordem econômica que
regula juridicamente o mercado, razão pela qual considera o sistema social e promocional
diante de seu caráter distributivo.
Afirma Cláudia Lima Marques84 que o Código de Defesa do Consumidor nasceu da
Constituição Federal de 1988, constando de sua lista de direitos fundamentais e foi à partir daí
que reconheceu-se a importância desse novo sujeito de direito, o consumidor, assegurando-se
sua proteção e determinando que fosse legislado sobre seus direitos, conforme o previsto no
Art. 48 do ADCT, podendo-se afirmar que o diploma constitucional é a origem da codificação
tutelar dos consumidores no Brasil.
Os autores do anteprojeto do Código de Defesa do Consumidor, muito claramente,
demonstram em linhas gerais que a legislação consumerista terá sempre o condão de proteção
do consumidor, sendo que atuará visando o reequilíbrio das relações de consumo numa
tentativa de nivelar as posições ocupadas por consumidor e fornecedor, visto que as mudanças
83 PFEIFFER, Roberto Augusto Castellanos. Serviços públicos concedidos e proteção do consumidor. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, ano 9, n.36, out-dez 2000, p.170. 84 MARQUES, Cláudia Lima. Direitos básicos do consumidor na sociedade pós-moderna de serviços: o aparecimento de um sujeito novo e a realização de seus direitos. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, ano 9, n.35, jul-set 2000, p.71.
51
sofridas por estes ao longo do tempo acabaram por tornar o consumidor vulnerável ao poderio
do fornecedor, sendo necessárias normas capazes de impedir ou mesmo regrar as práticas que
poderiam tornar esta situação ainda mais desigual.85
A Constituição Federal tratou assim de criar uma norma protetiva, na forma de
legislação especial objetivando modificar o sistema geral existente até então, criando-se um
Código para tutelar uma parcela específica da sociedade, o consumidor, dando efetividade ao
princípio da igualdade à partir de tratamento desigual aos desiguais, em busca da isonomia
para o sujeito mais vulnerável nas relações de consumo.
Muitos são os momentos em que regra constitucional visa a proteção dos
consumidores. Seus princípios e garantias buscam a satisfação das mais variadas
necessidades, porém, conforme esclarece Gilberto José Capeletto,86 houve uma grande
dificuldade inicial, eis que muitas críticas foram construídas à partir de uma falsa idéia da que
ela era pródiga em direitos e pobre em deveres, quando analisada pelos mais conservadores.
Neste sentido José Geraldo Brito Filomeno87 acrescenta que a regra constitucional ao
tratar da concessão dos serviços públicos impõe que a lei disponha expressamente quanto aos
direitos dos usuários dos serviços públicos de responsabilidade do Poder Público, mas por
delegação, prestados pelas empresas concessionárias ou permissionárias, conforme o Art. 175,
II da Constituição Federal.
Alexandre de Moraes88 afirma que a ótica da proteção ao consumidor no ordenamento
jurídico nacional tem permitido a aplicação dos métodos interpretativos constitucionais e dos
efeitos de controle de constitucionalidade incidente sob as normas regentes das relações de
consumo, devendo-se buscar a efetividade da Constituição Federal ao interpretar o direito do
consumidor com a integração do ordenamento jurídico-constitucional inclusive em relação ao
consumidor destinatário da prestação jurisdicional.
Não se pode questionar o avanço engendrado pela constitucionalização dos direitos do
consumidor, tendo se desenvolvido de maneira gradativa, almejando sempre a eficácia na
proteção do hipossufiente na relação consumerista, observando, igualmente, quando existir a
prestação dos serviços sob o regime de concessão por empresas concessionárias. Por isso que 85 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p.6-7. 86 CAPELETTO, Gilberto José. Direitos dos consumidores e regulação dos serviços públicos. Revista Marco Regulatório da AGERGS. Porto Alegre, n.4, 1º semestre de 2001, p.33. 87 FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de direitos do consumidor. 7.ed. São Paulo: Atlas, 2004, p.29. 88 MORAES, Alexandre de. Consumidor e direito à prestação eficiente e célere. Revista do Advogado. São Paulo. Ano XXVI, n.89, dez.2006, p.13.
52
o conteúdo normativo do Art. 48 dos Atos das Disposições Constitucionais e Transitórias
determinou que, no prazo de 120 dias, fosse elaborado um Código que visasse a proteção e
defesa do consumidor.
2.1.2 Código de Defesa do Consumidor
De acordo com entendimento retro lançado, inquestionável a relevância da criação do
inédito instrumento para defender os interesses dos consumidores, permitindo-se alcançar
direitos antes não consagrados, tornando-se, evidentemente, uma regra normativa na defesa da
ordem pública e social.
Adriano Perácio de Paula89 afirma que o Código de Defesa do Consumidor possui
espectro de potencial aplicação que ao ser comparado às demais áreas do direito, excluindo-se
a soberania do direito constitucional, ao demonstrar a particular situação que o distingue por
sua condição devido o alargamento de incidência de suas regras o que garante ser uma
legislação de especial amplitude, justificando sua condição de norma de interesse social, por
seu alcance e, também é norma de ordem pública por refletir uma exigência constitucional,
esta a razão pela qual as normas deste diploma legal, mesmo que aproveito ao indivíduo
isoladamente possuem orientação de cunho coletivo, social e público.
Trata-se de um diploma que visa o exercício efetivo da concretização dos direitos
sociais, enredando-se nas garantias constitucionais dos mais fracos na sociedade, devendo
realizar sua finalidade legislativa de proteção efetiva, dessa forma, não deve ser analisado
como sistema de consumo, mas sim como a norma protetiva que visa proteger o consumidor,
sujeito de direitos especiais, através dos deveres legais impostos aos fornecedores.
Esclarece Cláudia Lima Marques90 que a ética normativa do Código de Defesa do
Consumidor baseia-se na harmonia, relacionada à cooperação que deve existir entre
consumidores e fornecedores para se alcançar uma sociedade melhor, na boa-fé, quanto à
reflexão que cada um deve fazer em relação ao outro, suas igualdades e desigualdades, e
finalmente o equilíbrio, que é o ponto de encontro, onde ambos podem realizar suas
89 PAULA, Adriano Perácio de. O consumidor equiparado e o processo civil. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, ano 9, abr-jun 2000, p.114. 90 MARQUES, Cláudia Lima. Direitos básicos do consumidor na sociedade pós-moderna de serviços: o aparecimento de um sujeito novo e a realização de seus direitos. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, ano 9, n.35, jul-set 2000, p.62.
53
expectativas, transformando o mercado nacional em um modelo de lealdade, respeito,
alcançando os direitos efetivos necessários aos consumidores.
O Código de Defesa do Consumidor, sob a ótica de José Geraldo Brito Filomeno,91 é
muito mais que um corpo de normas, é um elenco de princípios epistemológicos e
instrumental adequado aquela defesa, assim, é um verdadeiro microssistema jurídico, já que
contém princípios peculiares, sendo interdisciplinar e multidisciplinar. É lei de ordem pública
e interesse social, sendo seus preceitos inderrogáveis e aplicáveis às relações verificadas no
mundo fático, sem que a proteção à parte mais vulnerável da relação de consumo signifique
transgressão ao direito, caracterizando-se o tratamento diferenciado um meio para se manter o
equilíbrio e a harmonia das relações sociais visando à garantia da ordem econômica.
É amplo o tema que abrange a proteção do consumidor, acompanhando as tendências
e a crescente evolução da sociedade, mormente das relações de consumo, daí porque surgiu a
necessidade de se realizar a codificação destas, tendo sido feito sistematicamente com a
adaptação das normas de defesa do consumidor e a agregação de outras presente nos demais
institutos quando pertinentes, consoante o disposto no Art. 7° que possibilita o emprego de
outras normas quando cabíveis.92
Por tratar-se de norma de ordem pública o Código de Defesa do Consumidor impõe
deveres legais às partes, retirando assim o poder do consumidor de, querendo, liberar o
fornecedor de seu dever, já que isto faz parte da regra legal e uma vez determinado torna-se
indisponível, dessa forma, o dever não é direito subjetivo do fornecedor, mas império da
norma, uma obrigação imposta que permanece à vontade das partes.
Não se questiona que o Código de Defesa do Consumidor é uma lei de função social
que modificou profundamente as relações jurídicas relevantes na sociedade, ao visar a tutela
dos indivíduos considerados vulneráveis, resguardando-os das práticas abusivas do livre
mercado, interessando mais intimamente à sociedade que aos particulares, já que positivou
uma série de direitos assegurados aos tutelados e impôs deveres aos outros agentes da
sociedade que fornecem os produtos ou prestam os serviços.
Assevera Gilberto José Capeletto93 que o Código de Defesa do Consumidor, quando
observado sob o aspecto dos serviços públicos, não possibilitou aos usuários os mesmos
91 FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de direitos do consumidor. 7.ed. São Paulo: Atlas, 2004, p.31. 92 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p.167. 93 CAPELETTO, Gilberto José. Direitos dos consumidores e regulação dos serviços públicos. Revista Marco Regulatório da AGERGS. Porto Alegre, n.4, 1º semestre de 2001, p.34.
54
resultados em comparação com os obtidos pelos consumidores do livre mercado e muitas são
as razões pelas quais isto não ocorreu. Exemplifica com a estruturação do PROCON, que na
condição de departamento do governo, acabou por tirar do mesmo a autonomia necessária
para a atuação nos casos em que o prestador de serviço é o próprio Estado, seja na forma da
administração direta ou como empresa de economia mista.
Ronaldo Porto Macedo Júnior94 citando Antônio Herman de Vasconcelos e Benjamin
adota uma posição extensiva, em relação a que todos os serviços públicos podem ser
recepcionados pelo Código de Defesa do Consumidor, trazendo de diferencial ao que já era
previsto pela Constituição Federal de 1988 e a Lei nº 8.987/95, inovando na medida em que o
âmbito da responsabilidade civil do Estado, aquele considerado fornecedor, é mais amplo do
que a prevista na Constituição.
O Código de Defesa do Consumidor tem como princípio o dever de solidariedade, eis
que, atuando no campo dos serviços públicos, visa garantir aos usuários a ampliação do seu
grau de participação qualitativa, visando o equilíbrio contratual no que tange aos direitos e
obrigações.
Certamente é unanimidade considerar o Código de Defesa do Consumidor um
microssistema, dada sua forma, tendo se estabelecido unidade às regras que disciplinam as
relações de consumo, atuando no sistema em contato com as demais normas sem com elas
guardar relação de subordinação, ao contrário, sua característica de funcionalidade facilita sua
aplicação, ficando clara a intenção do legislador em proteger a parte mais vulnerável das
relações de consumo, ou seja, o consumidor.
2.1.3 Os Princípios Fundamentais de Proteção do Consumidor
A cultura pátria acostumou-se ao longo do tempo com as desigualdades nas relações
de consumo, compreendendo em maior escala os deveres do que os direitos que são
garantidos constitucionalmente, fundamento pelo qual a visão trazida pela Constituição
Federal e pelo Código de Defesa do Consumidor propõe que este estigma seja modificado,
passando a assegurar direitos ao consumidor e impor deveres ao fornecedor.
94 MACEDO JUNIOR, Ronaldo Porto. A proteção dos usuários de serviços públicos: a perspectiva do direito do consumidor. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo. ano 10, n.37, jan-mar 2001, p.81.
55
Nesta esteira, o direito do consumidor torna-se efetivo por meio das garantias
asseguradas pelos princípios fundamentais que regem as relações de consumo, imposições
que determinam e coordenam o respeito aos direitos do consumido juntamente com os
princípios decorrentes do microssistema consumerista, possibilitando uma nova fase ao
permitir que os consumidores alcancem suas expectativas.
O respeito aos princípios significa um alcance dos valores fundamentais da ordem
jurídica, não objetivando regular situações específicas, ao contrário, existem para ordenar
todo o mundo jurídico.
A Constituição Federal e o próprio Código de Defesa do Consumidor são fontes de
princípios e normas de ordem pública e interesse social que norteiam as relações de consumo,
visando proporcionar o atendimento das necessidades dos consumidores, destacando-se, entre
outros, os princípios da boa-fé objetiva, da isonomia, da transparência, da equidade, do acesso
à justiça e, especificamente, do serviço público eficiente.
Ensina Cláudia Lima Marques95 que o princípio da boa-fé, em sua visão objetiva,
representa um grande patamar de respeito a outra parte da relação, mesmo que se trate de um
ente despersonalizado, o que garante a toda e qualquer pessoa o mesmo tratamento por parte
do contratante. Citando Karl Larenz, afirma que tal princípio forma a base do tráfico jurídico,
ou seja, a base de todas as vinculações jurídicas, o princípio máximo das relações contratuais,
o que foi inovado pelo Código de Defesa do Consumidor ao impor, de forma expressa, em seu
Art. 3º, § 2º, que todas as relações de consumo que envolvessem prestação de serviços
onerosos no mercado, devessem manter, conforme o Art. 4º, III, um nível mínimo de boa-fé
na conduta das partes.
O dever da boa-fé é inerente a todas as fases do contrato, iniciando-se na fase pré-
contratual onde acontece o acerto entre consumidor e fornecedor, sendo que tudo o que nesta
etapa for convencionado deverá ser cumprido no futuro do contrato, passando-se pela fase
executória onde se busca a cooperação e lealdade para a harmonia das relações entre
consumidor e fornecedor, terminando na fase pós-contratual, em face da existência de riscos
descobertos após a prestação principal nos produtos e serviços.
95 MARQUES, Cláudia Lima. Direitos básicos do consumidor na sociedade pós-moderna de serviços: o aparecimento de um sujeito novo e a realização de seus direitos. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, ano 9, n.35, jul-set 2000, p.87.
56
De acordo com Elaine Cardoso de Matos Novais96 o princípio da boa-fé impõe que as
relações de consumo sejam pautadas pela lealdade e idoneidade na conduta das partes, o que
possibilitará maior segurança ao contrato, visto que consumidor e fornecedor de produtos e
serviços deverão se pautar em condutas que lhes garantam o alcance de seus interesses, sem
que com isso invada o campo de direito do outro, em uma demonstração de atendimento ao
princípio da solidariedade recíproca.
A existência da boa-fé objetiva nas relações de consumo representa a obtenção de uma
condição de confiança recíproca entre as partes, assegurando que cada uma delas agirá
pensando na relação como um todo, garantindo a segurança contratual necessária.
O princípio da isonomia, nominado também de princípio da vulnerabilidade, encontra
assento no Art. 4º, I do Código de Defesa do Consumidor, tratando de garantir proteção
diferenciada ao consumidor, eis que não há como se negar a superioridade da condição
técnica, econômica e jurídica do fornecedor na relação.
Desse modo, o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor em face do
fornecedor garante o tratamento diferenciado, ou seja, visa eliminar ou diminuir a
desigualdade existente entre ambos, atribuindo-se tratamento desigual aos desiguais.
A condição de vulnerabilidade do consumidor será observada a partir da demonstração
do presumível desconhecimento das características técnicas do produto ou serviço colocado
no mercado, do exercício do poder econômico pelo fornecedor e também da situação jurídica,
e não exclusivamente à condição de hipossuficiência financeira do consumidor que deverá ser
observada no caso concreto para sua caracterização.
No mesmo caminho constitucional, o código consumerista assegura importância do
consumidor e oferece condições para sua proteção, dentre as quais se destaca o princípio da
transparência que impõe uma conduta de lealdade e respeito do fornecedor, obrigando-o à
clara e correta informação do produto ou serviço colocado à disposição do consumidor.
De acordo com Jorge Alberto Quadros de Carvalho Silva97 o princípio da
transparência é:
[...] essencialmente democrático ao reconhecer que na sociedade o poder não é exercido só no plano da política, mas também no da economia adquiriu importância especial no Código de Defesa do Consumidor para
96 NOVAIS, Elaine Cardoso de Matos. Serviços públicos e relação de consumo: aplicabilidade do código de defesa do consumidor. Curitiba: Juruá, 2006, p.105. 97 SILVA, Jorge Alberto Quadros de Carvalho. Código de defesa do consumidor anotado e legislação complementar. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p.68-9.
57
controlar o abuso do poder econômico de quem passou a exigir visibilidade e lisura nas relações jurídicas de consumo. [...] a transparência que se espera do fornecedor não deverá estar presente somente no momento da conclusão do negócio jurídico. Deverá existir durante a oferta e publicidade ao longo da execução do contrato e até mesmo depois desta [...].
O princípio da equidade decorre da necessidade de promover o equilíbrio contratual
das relações de consumo, eis que, por longo tempo, o fornecedor agiu com superioridade ao
consumidor, tornando-se de interesse público o tratamento paritário, razão pela qual motivou
o legislador a edificar garantias para se pontuar o equilíbrio esperado, impondo deveres ao
fornecedor e o aumento dos direitos do consumidor.
Para que tal princípio prevaleça, é importante destacar que após a promulgação da
Constituição Federal de 1988 a visão das relações de consumo mudaram, haja vista que uma
terceira força adentra ao mercado, o consumidor, tendo o Estado garantido a ele proteção
direta e efetiva, razão pela qual o princípio da equidade ou do equilíbrio contratual assume
relevante papel nesta relação.
O princípio do acesso à justiça, com previsão constitucional específica (Art. 5º,
XXXV), também encontra razão em vários dispositivos do Código de Defesa do Consumidor,
assegurando proteção e defesa dos interesses individuais e coletivos dos consumidores ao
promover a facilitação deste intento.
Elaine Cardoso de Matos Novais98 esclarece que se deve entender por acesso à justiça,
não somente o acesso aos órgãos do Poder Judiciário, mas o conhecimento dos direitos de
cada um, entre outros que possam incentivar o consumidor a ter as informações necessárias
quanto a possibilidade e o momento em que deve valer-se deste e quando for o caso ingressar
em Juízo.
Dentre os deveres do Estado está a eficiência na prestação dos serviços públicos que
lhe são inerentes, visando garantir maior qualidade na atividade pública, razão pela qual
Alexandre de Moraes99 ensina que a Constituição Federal de 1988, mormente após a Emenda
Constitucional nº 19/98, passou a proclamar que a administração pública direta, indireta ou
fundacional deve obedecer aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência.
98 NOVAIS, Elaine Cardoso de Matos. Serviços públicos e relação de consumo: aplicabilidade do código de defesa do consumidor. Curitiba: Juruá, 2006, p.110. 99 MORAES, Alexandre de. Consumidor e direito à prestação eficiente e célere. Revista do Advogado. São Paulo. Ano XXVI, n.89, dez.2006, p.14.
58
Daí porque a existência do princípio da eficiência do serviço público,
compreendendo-se na prestação de serviço que produz o efeito desejado, com bom resultado,
no exercício de atividades que se dão sob o manto da igualdade, da objetividade e
imparcialidade.
Agindo segundo o princípio da eficiência, o fornecedor agirá em respeito à adequação
do serviço, previsto no Art. 4º, II “d” e V do Código de Defesa do Consumidor, sem que a
segurança e qualidade sejam violadas, cabendo aos próprios fornecedores adequarem-se às
exigências e necessidades do mercado. No caso do Estado prestador de serviço, tal princípio
se efetivará por meio da fiscalização exercida pelos órgãos responsáveis.
2.2 PRESSUPOSTOS DAS RELAÇÕES DE CONSUMO
2.2.1 Fornecedor
Conforme o disposto no Art. 3º do Código de Defesa do Consumidor, fornecedor é
toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, ainda os entes
despersonalizados que desenvolvam atividades de produção, montagem, criação, construção,
transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou
prestação de serviços.
O termo fornecedor, na visão de José Geraldo Brito Filomeno100 foi utilizado de
maneira apropriada pelo Código de Defesa do Consumidor e compreende aqueles que
propiciam a oferta de bens e serviços no mercado de consumo, atendendo as necessidade
sociais, não importando a que título, se na produção de bens ou prestação de serviços.
O fornecedor não deve valer-se de sua situação contratual para abusar do consumidor,
impondo-lhe normas que poderão acarretar-lhe gastos desnecessários, ou que destruam o seu
patrimônio, bem como, expor-lhe a situação constrangedora quando tentar cumprir com suas
obrigações contratuais, de forma que o contrato deve ser interpretado de forma clara e
abrangente, já que o princípio da boa-fé aplicados às relações de consumo entre fornecedor e
consumidor funciona como princípio limitador da autonomia da vontade.
Certamente a conduta que a sociedade espera de um fornecedor de produtos e serviços
está balizada pela boa-fé e pela confiança, razão esta porque o Código de Defesa do 100 FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de direitos do consumidor. 7.ed. São Paulo: Atlas, 2004, p.51.
59
Consumidor, ao adotar sua política das relações de consumo, buscou proporcionar isto cada
vez mais próximo da realidade, assim, o fato de tratar de maneira desigual consumidor e
fornecedor somente demonstra a aplicação do princípio constitucional da isonomia que prevê
tratamento desigual aos desiguais.
No código consumerista não existe qualquer discriminação ou mesmo “terrorismo”
sobre a figura do fornecedor, o que poderia desestimular investimentos no setor produtivo,
criando um caos comercial, ao contrário, dispensa tratamentos diferenciados que possibilitam
a harmonização da relação de consumo, garantindo o atendimento das necessidades de ambas
as partes, alcançando o equilíbrio almejado.101
O princípio da boa-fé, em conformidade com o Art. 4º, I do Código de Defesa do
Consumidor, regula a conduta do fornecedor de serviços e neste sentido Cláudia Lima
Marques102 afirma que este deve atuar em atividade necessariamente legal, cooperativa,
informativa, transparente, cuidando do nome e do patrimônio daquele que o escolheu como
parceiro, os consumidores, presumidamente vulneráveis na relação.
Destarte, deve-se distinguir o fornecedor ou prestador de serviço público daqueles que,
por delegação estatal, presta serviço público. Aquele que desempenha função pública por
determinação constitucional, ou seja, o Estado, presta serviço público por ser seu dever e o faz
sem o interesse de lucro. Com relação ao concessionário, presta também um serviço público,
porém, sua atividade se resume em uma operação econômica que visa primordialmente o
lucro, observando-se, contudo, a satisfação do interesse público.
Os encargos do fornecedor, na concessão de serviço público, encontram-se previstos
no Art. 31 da Lei nº 8.987/95, além da prestação adequada do serviço, da prestação de contas
acerca dos bens e serviços prestados entre outros, quando da contratação de mão-de-obra,
deve fazê-lo pelas regras do direito privado e conforme a legislação trabalhista, de modo que
não se estabelece qualquer vínculo entre seus empregados e o poder público concedente.
Ao Estado, enquanto produtor de bens ou prestador de serviços aplica-se o
ensinamento do Art. 37, § 6º da Constituição Federal, ou seja, cabe a ele a manutenção da
ordem pública e a satisfação do interesse social, e, conforme o Código de Defesa do
Consumidor, o fornecedor responde independente de culpa pelos danos causados pelo fato do
101 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p.67. 102 MARQUES, Cláudia Lima. Direitos básicos do consumidor na sociedade pós-moderna de serviços: o aparecimento de um sujeito novo e a realização de seus direitos. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, ano 9, n.35, jul-set 2000, p.88.
60
produto ou do serviço, logo o Estado-fornecedor, por si ou por seus delegados, quando incidir
em alguma falta, tornar-se-á responsável pela devida reparação do dano.
Rodolfo de Camargo Mancuso,103 citando Antonio Herman de Vasconcellos e
Benjamin, entende ser uma inovação a regra trazida pelo Art. 22 do Código de Defesa do
Consumidor, sendo que fica estabelecido ao Estado a obrigação especial de adequação,
eficiência e segurança para os serviços públicos, não importando qual seja sua forma de
prestação ou sujeito que o forneça, repetindo a regra geral imposta aos demais fornecedores,
constante do Art. 4º, II, d, do mesmo dispositivo.
Considera-se fornecedor, portanto, aquele que prove, abastece, guarnece, dá, ministra,
facilita ou ainda proporciona uma atividade, tendo inovado o Código de Defesa do
Consumidor ao incluir no rol de fornecedores as pessoas jurídicas de direito público,
conforme previsto no Art. 175 da Constituição Federal, expressando este sentido no Art. 22,
impondo aos órgãos públicos, suas empresas, concessionárias ou permissionárias o dever de
fornecer um serviço que fosse adequado, eficiente, seguro e quando se tratassem dos
essenciais que respeitassem a continuidade.
2.2.2 Produto
O fornecimento de produtos é critério caracterizador de desenvolvimento de atividades
tipicamente comerciais, como a comercialização, a produção, a importação, devendo existir a
necessidade de habitualidade, pois é a regra do Art. 3º do Código de Defesa do Consumidor.
Consiste o produto, assim como o serviço, o objeto do interesse almejado pela relação
de consumo entre consumidor e fornecedor, bem porque o citado dispositivo refere-se a bem,
móvel ou imóvel, material ou imaterial, razão pela qual existem críticas por parte de alguns
autores a cerca da utilização do termo bem em detrimento de produto.
O uso do termo bem, defendido por José Geraldo de Brito Filomeno104 dá-se em
relação à abrangência deste ser maior que a de produto com base no Direito Civil, dessa
maneira compreende-se por bem aquilo que possa propiciar uma utilidade ao homem, com
quantidade limitada na natureza e que possua valoração econômica e possibilidade de
domínio humano. 103 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Manual do consumidor em juízo. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p.98. 104 FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de direitos do consumidor. 7.ed. São Paulo: Atlas, 2004, p.57.
61
Entre os que acolheram a escolha do termo produto pelo legislador tem-se Maria
Antonieta Zanardo Donato citada por Elaine Cardoso de Matos Novais105 esclarecendo que a
utilização do termo é economicamente correta, já que indica a totalidade de bens existentes
em uma época, dessa forma dá-se a adequação do sistema jurídico ao econômico, ocorrendo
coesão esperada pelo legislador.
Apesar de o legislador ter deixado um campo muito amplo para a averiguação do que
venha a ser produto, é importante que se faça a distinção deste com os serviços, dessa forma,
os primeiros são adquiridos e os segundos são prestados. Os produtos independem de serem
móveis que podem ser transportados e imóveis que não possibilitam este movimento, ou
ainda, se materiais, que são tangíveis, ou os imateriais que se encontram no campo da
intangibilidade.
Considera-se impróprio ao uso e ao consumo o produto que seja inadequado ou que
tenha seu valor diminuído, conforme o Art. 18, § 6º do Código de Defesa do Consumidor,
assim é dever legal de toda cadeia de fornecedores evitar que o produto tenha vícios, e se este
apresentar algum que possa chegar dessa maneira ao consumidor.
À parte de todas as classificações de produto contempladas pelo Código de Defesa do
Consumidor, este garante ao consumidor o direito de reparação quanto a qualquer dano
causado mesmo que o produto não tenha sido obtido por meio de pagamento, assim é
desnecessária a obrigatoriedade de remuneração para que seja considerado objeto da relação
de consumo, o que importa é a existência da relação consumidor-fornecedor.
2.2.3 Serviço
No Brasil, a partir do século XX, ocorreram grandes alterações na forma em que os
serviços públicos eram prestados, pois tinha o Estado, de maneira direta ou por meio das
empresas públicas ou de economia mista, o total controle de todos os serviços públicos.
Ocorre, porém, que por falta de recursos e pessoal capacitado, passou-se a conceder a
realização destes às empresas com capital exclusiva ou preponderantemente privado.
105 NOVAIS, Elaine Cardoso de Matos. Serviços públicos e relação de consumo: aplicabilidade do código de defesa do consumidor. Curitiba: Juruá, 2006, p.121.
62
Para Luiz Antonio Rizzatto Nunes,106 ao comentar os dispositivos materiais do Código
de Defesa do Consumidor, buscou o legislador definir serviço de maneira exaustiva, porém
não foi o que ocorreu, haja vista a presença da palavra “qualquer” no §2º do Art. 3º do
dispositivo citado, amplificando sua aplicabilidade a toda atividade fornecida ou “prestada no
mercado de consumo”.
Portanto, de acordo com o § 2º do Art. 3º do Código de Defesa do Consumidor,
serviço é a atividade fornecida no mercado de consumo mediante remuneração, que pode ser
direta ou indireta. A interpretação literal do citado dispositivo compreende que serviços
remunerados seriam aqueles que tivessem como recompensa a paga em pecúnia, assim,
aqueles que não tivessem remuneração, os considerados uti universi, prestados a todos os
cidadãos através de recursos arrecadados em impostos, estariam excluídos da obrigação de
adequação e eficiência.107
A doutrina pátria ainda não chegou a um consenso sobre a necessidade de
remuneração para caracterizar o serviço, mas é certa a afirmação feita por Elaine Cardoso de
Matos Novais108 com base no Art. 3º, caput, in fine, do Código de Defesa do Consumidor, de
que os serviços sem contraprestação imediata podem ser objetos da relação de consumo
quando o fornecedor possa, a partir dele, obter vantagens que de maneira indireta possa lhe
gerar lucros, baseando-se este entendimento na idéia de que nada no mercado é oferecido
gratuitamente e que qualquer serviço gratuito tem o objetivo de alcançar outros benefícios.
Na prática, a identificação dos serviços acaba por se tornar complicada já que os
prestados gratuitamente, mediante remuneração indireta, possuem uma contraprestação
escondida, o que gera o direito do consumidor ao recebimento de proteção legislativa, logo,
mesmo que a princípio o consumidor não tenha despendido gastos, a relação criada entre ele e
o fornecedor será a mola propulsora para outros ganhos por parte deste.
Tratando de serviço público e valendo-se de conceito doutrinário clássico, Márcia
Cadore109 esclarece que são serviços públicos propriamente ditos aqueles privativos do Poder
Público, exigindo deste ato de império e medidas compulsórias em relação aos administrados,
sendo essenciais e necessário. Se consideram serviços de utilidade pública aqueles em que a 106 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao código de defesa do consumidor: direito material (arts. 1º a 54). São Paulo: Saraiva, 2000, p.98. 107 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. 4.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p.486. 108 NOVAIS, Elaine Cardoso de Matos. Serviços públicos e relação de consumo: aplicabilidade do código de defesa do consumidor. Curitiba: Juruá, 2006, p.129. 109 CADORE, Márcia. Serviços públicos delegados: consumidor ou usuário do serviço público? Revista Marco Regulatório da AGERGS. Porto Alegre, n.8, mar. 2005, p.89.
63
Administração reconhece sua conveniência aos membros da coletividade e realiza de maneira
direta sua prestação, ou concorda com que sejam prestados por terceiros, delegando seus
poderes, nas condições reguladas e sob seu controle.
Desse modo, serviço pode ser compreendido como uma atividade prestada no mercado
de consumo visando o atendimento de uma finalidade da qual o consumidor é destinatário,
podendo ser prestados, mediante remuneração direta ou indireta, de forma durável ou não
durável, segundo disciplinado no Art. 26 do Código de Defesa do Consumidor.
2.2.4 Consumidor
Observando-se o conteúdo normativo do Art. 2º do Código de Defesa do Consumidor,
toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final
será considerado consumidor. O direito do consumidor está ligado ao desenvolvimento das
relações econômicas, buscando a proteção da parte vulnerável nas relações de consumo, esta
ocorrendo por meio da intervenção estatal, sem a qual não seria possível, visto que a iniciativa
privada, por si só, não teria tanto interesse em beneficiar os consumidores.
Desde há muito tempo que a incansável corrida para se proteger o pólo mais fraco na
relação de consumo foi caracterizada pela resistência de inúmeros seguimentos de nossa
sociedade que se mostravam contrários à defesa do consumidor, tendo que os pressupostos de
liberdade e igualdade não se harmonizavam à devida proteção, ao contrário, pois as regalias
eram estendidas a somente uma das partes da relação contratual, ou seja, o fornecedor.
O Código de Defesa do Consumidor, para Adriano Perácio de Paula,110 conferiu
autoridade ao consumidor para o exercício de sua cidadania, numa importante vertente das
relações sociais e econômicas, aplicando-se este conceito e suas regras a qualquer pessoa, na
condição de destinatário final dos produtos e serviços colocados no mercado de consumo.
Extrai-se do conceito empregado por José Geraldo Brito Filomeno111 que consumidor
trata-se de toda pessoa, física ou jurídica, que contrata bem ou serviço, atuando individual ou
coletivamente e encerrando a relação de consumo. A amplitude deste conceito, alcançando
pessoas jurídicas e a coletividade, demonstra que a legislação pátria buscou garantir a 110 PAULA, Adriano Perácio de. O consumidor equiparado e o processo civil. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, ano 9, abr-jun 2000, p.111. 111 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p.32.
64
proteção ao consumidor, tendo em vista sua condição de vulnerabilidade, os consumidores
passaram a ser amparados nos mais diversos interesses, facultando o equilíbrio sócio-
econômico das relações de consumo.
Cláudia Lima Marques112 ensina que o Código de Defesa do Consumidor possibilitou
o surgimento de novos consumidores, denominados de equiparados, com iguais direitos
fundamentais à proteção, inclusive os processuais, mudando o Direito Civil com o surgimento
dos novos direitos subjetivos do consumidor.
Pode-se dizer que consumidor é a figura daquele que adquire um bem ou utiliza um
serviço para uso próprio e de sua família, mantendo sempre o atributo da vulnerabilidade
esperada nas relações de consumo, o que caracteriza sua figura de destinatário final, previsão
expressa do Art. 2º do codex citado que restringiu a definição de consumidor.
O texto do Art. 2º do Código de Defesa do Consumidor acabou por gerar dificuldade
na interpretação da figura do consumidor quando condicionou fosse este qualificado como
destinatário final que a rigor é aquele que interrompe a circulação do produto ou serviço sem
lhe dar destinação econômica. Daí o surgimento de duas teorias, a primeira é a finalista que
restringe o conceito de consumidor, exigindo que este seja aquele que adquire o produto ou
serviço com a finalidade exclusiva de atendimento de suas necessidades e a segunda,
maximalista, possibilita a ampliação deste conceito, permitindo que seja aplicado a todos
aqueles que adquirem produtos ou contratam serviços.
O Superior Tribunal de Justiça já decidiu pela aplicação de ambas, permitindo que se
realize uma análise do caso em concreto para tal, pois o que determinará consumidor é a
demonstração da vulnerabilidade, ensejando a aplicação do diploma consumerista.113
A interpretação de consumidor deve levar em conta a situação fática, já que igualando
todos a esta condição, haveria uma banalização da regra protetiva do Código de Defesa do
Consumidor e deixaria de existir a proteção garantida aos desiguais, razão pela qual Cláudia
Lima Marques114 concorda com o posicionamento da interpretação finalista das normas para
se chegar ao conceito de consumidor, ou seja, destinatário final é aquele que retira o bem do
mercado ao adquiri-lo ou utilizá-lo, colocando um fim na cadeia de produção. 112 MARQUES, Cláudia Lima. Direitos básicos do consumidor na sociedade pós-moderna de serviços: o aparecimento de um sujeito novo e a realização de seus direitos. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, ano 9, n.35, jul-set 2000, p.84. 113 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Resp. nº 705.203-SP, Segunda Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, Brasília, 11 de outubro de 2005. Disponível na internet em http://www.stj.jus.br. Acesso em: 08 de abril de 2008. 114 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. 4.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p.279.
65
Desse modo, para a autora supra cabe ao direito brasileiro limitar conceito de
consumidor, definindo quem realmente seria o destinatário nas relações contratuais, sendo
necessário em razão da técnica utilizada pelo Código de Defesa do Consumidor que
multiplica seu campo de aplicação, dividindo os indivíduos entre os consumidores (Art. 2º) e
os que lhe seriam equiparados (Art. 2º, parágrafo único), motivo pelo qual as normas
protetivas não são aplicáveis somente aos consumidores stricto sensu, mas a todas as
eventuais vítimas do evento danoso.115
De maneira didática, José Geraldo Brito Filomeno116 observa a necessidade de
conceituar o consumidor sob vários aspectos. Sob o ponto de vista econômico, consumidor é
todo indivíduo que se faz destinatário da produção de bens, seja ele ou não o adquirente. Sob
o ponto de vista psicológico, consumidor é o sujeito sobre o qual se estudam as reações a fim
de se individualizar os critérios para a produção e as motivações internas que o levam ao
consumo. Segundo o ponto de vista sociológico, considera-se consumidor qualquer indivíduo
que pertença a uma determinada categoria e que frui ou se utiliza de bens e serviços. Se
abstraindo os enfoques feitos anteriormente e visando somente a acepção jurídica do termo,
consumidor é a pessoa física, indivíduo ou coletividade que contrate para consumo final.
Portanto, em vista das duas correntes doutrinárias citadas, finalista e maximalista,
deve-se entender o conceito e caracterização do consumidor segundo sua condição de
vulnerabilidade, determinante no desequilíbrio contratual, razão esta da existência das normas
de proteção para compensar estas desigualdades e manter o equilíbrio da relação de consumo.
2.3 RELAÇÕES DE CONSUMO E AS CONCESSÕES DE SERVIÇOS PÚBLICOS
Destaca-se, inicialmente, que as relações entre prestador de serviço público concedido
(concessionário) e usuário-consumidor, advindas das concessões de serviços públicos, geram
relações de consumo entre os mesmos, consoante se demonstrará adiante.
A situação jurídica do usuário do serviço público é atingida pela funcionalização
inerente à relação jurídica de direito público, de forma que o prestador do serviço desenvolve
função que se reflete na atuação do próprio usuário que somente usufruirá do serviço em
115 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. 4.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p.266. 116 FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de direitos do consumidor. 7.ed. São Paulo: Atlas, 2004, p.34.
66
termos compatíveis com a consecução do serviço público, não podendo agir de forma a
dificultar ou impedir a incidência dos princípios norteadores do serviço público, ao contrário,
deve colaborar para a realização destes.117
A relação de consumo advinda das concessões importa na fiscalização por parte do
Estado e seus representantes e a prestação do serviço pelo concessionário, cabendo ao usuário
a abstenção de condutas que possam prejudicar o desenvolvimento do serviço e praticar
condutas que garantam seu bom desenvolvimento.
Analisando-se o Art. 2º do Código de Defesa do Consumidor, fica claro que as
relações de consumo não estão automaticamente atreladas a uma relação contratual, vez que
apesar de toda a clareza contida na norma legal, parte da doutrina e da jurisprudência resiste a
compreender que há relação de consumo mesmo que não tenha uma relação de contrato de
consumo stricto sensu.118
Esclarece Cláudia Lima Marques119 que mesmo não sendo o Código de Defesa do
Consumidor legislação criada visando proteger este tipo de relação, cabe a Administração
Pública cumpri-la fielmente, visando a manutenção do contrato. Segundo a norma do Art. 3º
do Código de Defesa do Consumidor a relação de consumo entre os usuários (consumidor-
destinatário final) e empresas concessionárias pode ser considerada uma relação de consumo
como as demais previstas no sistema legal.
As relações de consumo advindas dos serviços públicos merecem atenção redobrada
por parte da legislação protetiva, já que dizem respeito às necessidades que não afetam a um
indivíduo somente, mas a coletividade em geral, logo, a observância de aspectos como
segurança, saúde, presteza e adequação merecem um cuidado maior, seja do Estado enquanto
prestador seja daqueles que forem delegados aos serviços públicos.
A busca pela igualdade nas relações de consumo é uma constante, principalmente
quando uma das partes é o Estado que deve atuar com a máxima lisura e adequação,
atendendo sempre os interesses da coletividade, quando na figura de fornecedor se enquadra
nas regras da legislação consumerista agindo com igualdade e observando, conforme a
vontade unilateral da partes, os valores a serem cobrados pelos serviços, o que não ocorre com
os serviços remunerados por taxa, onde exerce seu poderio, se impondo unilateralmente, já
117 JUSTEN FILHO, Marçal. Concessões de serviços públicos. São Paulo: Dialética, 1997, p.132. 118 MACEDO JUNIOR, Ronaldo Porto. A proteção dos usuários de serviços públicos: a perspectiva do direito do consumidor. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo. ano 10, n.37, jan-mar 2001, p.83. 119 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. 4.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p.485.
67
que é autorizado a agir dentro dos parâmetros legais, conforme o princípio do interesse
público em detrimento do particular, impondo sua vontade ao consumidor.
A Lei nº 8.987/95 dispõe sobre o regime dos serviços públicos prestados por meio de
delegação, expressando de maneira clara em seu Art. 7º que os usuários de serviço público
têm o direito de receber do poder concedente o serviço prestado de forma adequada, contendo
as informações que sejam úteis aos seus interesses individuais e de toda coletividade, o que
lhe facultará o exercício da liberdade de escolha quando da contratação do mesmo.
Pode-se, afirmar, portanto, que a Lei nº 8.987/95 e o Código de Defesa do Consumidor
atuam de maneira harmônica, alinhavados, ainda, com a regra constitucional do Art. 175,
demonstrando que o legislador visou em ambos os casos a proteção do usuário-consumidor,
um completando o outro naquilo que for necessário ao atendimento do interesse público.
Assim, quando da efetivação do disposto na Emenda Constitucional 19/98, criando lei
que regule especificamente a proteção dos usuários de serviços públicos, sem a necessidade
de exclusão das demais normas pertinentes, mormente o Código de Defesa do Consumidor,
ensejando a aplicabilidade subsidiária destas em relação àquela.
Para arrematar, importante frisar a iniciativa do Estado de São Paulo ao criar a Lei nº
10.294/99 que dispõe sobre a proteção e defesa do usuário de serviços públicos no território
paulista, demonstrando compreensão e aceite ao disposto na Emenda Constitucional 19/98,
tomando rápida medida para disciplinar a tutela das garantias dos usuários-consumidores.
2.3.1 Aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor nas Concessões de Serviços
Públicos
Ao se observar a regra descrita no Art. 22 do Código de Defesa do Consumidor é
possível extrair que o serviço público prestado pelo Estado ou por meio de delegação ao
particular, deve ser adequado, eficiente e seguro, além da continuidade àqueles considerados
essenciais.
Para Ronaldo Porto Macedo Júnior120 é possível vislumbrar a existência de quatro
vertentes de posicionamento sobre o tema. A primeira onde há uma fuga aos problemas
120 MACEDO JUNIOR, Ronaldo Porto. A proteção dos usuários de serviços públicos: a perspectiva do direito do consumidor. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo. ano 10, n.37, jan-mar 2001, p.77
68
existentes na aplicação do CDC aos serviços públicos, ou seja, há um esquecimento das
questões a cerca da aplicação do serviço público à luz do CDC; a segunda em que há a defesa
de uma aplicação extensiva do Art. 22, apto a ser aplicado a todos os serviços públicos de
maneira indistinta; a terceira visa uma aplicação extensiva, porém mitigada, pois o Art. 3, §2º
do CDC condiciona a existência de uma relação de consumo à prestação de um serviço
remunerado, com exceção do serviço público gratuito; e, finalmente, a quarta tem como
fundamento a interpretação restritiva, uma vez que os serviços públicos remunerados por taxa
não estão no âmbito de incidência do CDC.
Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer121 elucida que o caput do Art. 7º da Lei nº
8.987/95 confere aos usuários de serviço público além de outras garantias, aquelas conferidas
aos consumidores pelo Código de Defesa do Consumidor, afirmando que entre estes diplomas
existe uma intercambialidade, já que visam um único fim, o da proteção do consumidor,
esclarecendo, ademais, que os direitos do usuário não poderão ser interpretados de modo a
restringir o alcance daqueles estabelecidos no Código de Defesa do Consumidor, devendo ser
o disposto na Lei nº 8.987/95 ser interpretado em conjunto com este.
Importante para o desenvolvimento desta dissertação a referência feita por Cláudia
Lima Marques122 ao V Congresso Brasileiro de Direito do Consumidor, ocorrido em 2 de
maio de 2000 na capital mineira, apresentando para conhecimento a conclusão nº 2 que foi
naquela oportunidade aprovada de maneira unânime. Desta feita, sua a transcrição é
imprescindível, verbis:
2. Aplicam-se as normas do CDC aos serviços públicos executados mediante o regime da concessão cabendo ao intérprete potencializar a utilização das normas do Código em conjunto com as regras protetivas do consumidor, existentes nas leis específicas que regulam cada um dos serviços.
O atendimento que o Código de Defesa do Consumidor tem dispensado às concessões
de serviços públicos tem sido de grande importância, suficiente para se evitar conflitos ou
ainda alcançar a solução daqueles existentes, vez que o aval recebido da Constituição Federal
deu ao diploma consumerista importância significativa para a realização de tal fim, tendo em
vista sua contemporaneidade e busca pela eficiência, o que lhe garantiu ainda, após a edição
da legislação específica sobre o tema que sua observação não poderá ser desprezada.
121 PFEIFFER, Roberto Augusto Castellanos. Serviços públicos concedidos e proteção do consumidor. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, ano 9, n.36, out-dez 2000, p.165. 122 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. 4.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p.488.
69
Diante da realidade do direito pátrio, mesmo que o Código de Defesa do Consumidor
não tivesse citado em seu Art. 3º, caput, a figura das pessoas jurídicas de direito público, os
serviços públicos estariam amparados pelo mesmo, atuando com grande valia para dirimir
quaisquer conflitos e equiparar os usuários aos consumidores, lhes conferindo proteção.
Assim, pelo fato de o Poder Público possuir status diferenciado e encontrar-se em
posição diversa dos demais fornecedores, deve-se aplicar o diploma protetivo ao consumidor,
observando-se se atua em relação a seus objetivos elementares, visando assegurar o interesse
social ou outras modalidades de serviços públicos.
Neste sentido esclarece Elaine Cardoso de Matos Novais123 que quando o Estado atuar
em atividade comercial e industrial estará sujeito às regras do Código de Defesa do
Consumidor, mesmo que atue indiretamente por meio de concessionários ou outros
delegados, uma vez que a forma de remuneração é a tarifa, preço público cobrado pelo
serviço. No caso de serviço público cobrado por meio de taxa, há uma imposição do serviço
pelo Estado, que obriga o indivíduo ao pagamento compulsório, mesmo pelo potencial uso, o
que impede a relação de consumo, diante do exercício do poder estatal.
Todavia, os pressupostos de aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor aos
serviços públicos encontram certa divergência nos entendimentos doutrinários, onde se
discute a forma de remuneração dos mesmos, razão pela qual se deve distingui-las para
extração de uma justificativa concreta.
2.3.1.1 Taxa
A aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor à prestação dos serviços
públicos é indiscutível, como acima tratado, todavia, comportando alguns entendimentos
doutrinários e jurisprudenciais que defendem uma posição mais restrita, ou seja, as regras de
proteção ao consumidor são aplicáveis apenas a alguns dos nominados serviços públicos,
sofrendo distinção a partir da remuneração que incide sobre cada um deles, se taxa ou tarifa.
É sabido que a prestação dos serviços públicos é de competência do Estado, por si ou
por delegação. Todavia, há serviços públicos que são de caráter geral e, dessa forma,
123 NOVAIS, Elaine Cardoso de Matos. Serviços públicos e relação de consumo: aplicabilidade do código de defesa do consumidor. Curitiba: Juruá, 2006, p.172.
70
prestados diretamente pelo Poder Público sem que se possa individualizar ou identificar os
usuários, também conhecidos como serviços uti universi ou próprio, sendo que sua
remuneração é feita mediante o pagamento de taxa, sendo instituída por um imposição estatal,
mediante uma lei que a regule, independentemente da vontade do destinatário.124
O Poder Público disponibiliza os serviços próprios que entende serem essenciais à
coletividade, impondo tal prestação e impingindo o caráter obrigatório do pagamento pelo
usuário, independe de haver efetivamente utilizado o serviço colocado à sua disposição, não
importando, também, a capacidade contributiva do indivíduo, haja vista ser a taxa uma
espécie de tributo com objetivo de remunerar o serviço público específico e divisível.
O sistema pátrio, no Art. 145, II da Constituição Federal e no Art. 77 do Código
Tributário Nacional, dispõe que a taxa se destina a garantir o serviço público, específico e
divisível, ou seja, uma contrapartida por sua prestação. O serviço é considerado específico
diante da possibilidade que tem de destacar-se em unidade autônoma de intervenção, utilidade
ou necessidade pública. Já quanto ao fato de ser divisível diz respeito à sua utilização, já que
pode ser fracionado, servindo a cada um dos usuários.
A definição de taxa, conforme acima aludido, já encontra pacificação jurisprudencial,
tendo a Corte Suprema da Justiça decidido pela unificação do entendimento ao editar a
Súmula 545 que dispõe sobre a compulsoriedade deste tributo, condicionando sua cobrança a
lei orçamentária que previamente a autorize.
A atuação estatal nestes casos visa o bem estar da coletividade, já que a cobrança da
taxa, sendo um tributo, é revertida em benefícios para a coletividade, razão porque o serviço é
cobrado seja usufruído efetivamente ou em potencial. O uso do serviço não é compulsório,
porém o pagamento da taxa é obrigatório.125
Em que pese não haver um posicionamento majoritário quanto a possibilidade de a
taxa ser uma forma apta de remuneração dos serviços públicos, tendo em vista o fato de neste
caso o consumidor não poder opor-se ao pagamento por tratar-se de uma espécie de tributo,
Gláucia Aparecida Ferraroli Cazzaniga entende que se deva buscar:
[...] uma interpretação mais benéfica para o cidadão ao avaliar que, se os próprios tributaristas discutem acerca do que vem a ser taxa ou tarifa, a
124 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Resp. nº 705.203-SP, Segunda Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, Brasília, 11 de outubro de 2005. Disponível na internet em: http://www.stj.jus.br. Acesso em: 08 de abril de 2008. 125 NOVAIS, Elaine Cardoso de Matos. Serviços públicos e relação de consumo: aplicabilidade do código de defesa do consumidor. Curitiba: Juruá, 2006, p.164.
71
divisão dos serviços públicos em próprios e impróprios com base nesse fundamento é falha, sendo mais conveniente abrandar este critério em prol do consumidor”.126
Deste prisma e à lume dos posicionamentos referidos, quando o Estado prestar
serviços remunerados por taxa, deve ele respeitar os princípios previstos no Art. 37 da
Constituição Federal e também no Art. 22 do Código de Defesa do Consumidor, devendo
prestá-lo de maneira adequada, eficiente e contínua, sendo permitida a aplicação subsidiária
do código consumerista quando os princípios invocáveis sejam comuns ao Direito
Administrativo e Direito Tributário.
2.3.1.2 Tarifa
A tarifa é cobrada por um serviço que se funda na vontade do indivíduo em solicitá-lo
e distingui-se da taxa porque não se trata de imposição estatal e somente irá incidir quando o
indivíduo assim desejar, normalmente utilizada na manutenção do serviço, sendo responsável
pela cobertura de eventuais despesas com a execução da atividade.
Os serviços públicos remunerados por tarifa são denominados pela doutrina de uti
singuli ou impróprios, ou seja, aqueles colocados à disposição dos usuários para que os
utilizem “se e quando desejarem”,127 eis que é possível aferir a utilização do serviço prestado
a cada usuário-consumidor, uma vez que são determináveis.
A Ministra do Superior Tribunal de Justiça, Eliana Calmon, em Recurso Especial de
sua relatoria, pontificou que os serviços públicos uti singuli são aqueles remunerados por
tarifas e as relações entre o Poder Público e os usuários são de Direito Privado, aplicando-se
do Código de Defesa do Consumidor na medida em que usuário se identifica com
consumidor. Por tal razão se funda no entendimento de que somente os serviços remunerados
por tarifa podem ser regidos pelo codex do consumidor por dar direito de escolha ao usuário,
um dos preceitos fundamentais de acordo com o Art. 6º da norma de proteção retro citada.128
Em recente decisão do Supremo Tribunal Federal, seguindo o entendimento firmando
naquela Corte acerca da constitucionalidade da cobrança de tarifa quando a prestação se dá
126 NOVAIS, Elaine Cardoso de Matos. Serviços públicos e relação de consumo: aplicabilidade do código de defesa do consumidor. Curitiba: Juruá, 2006, p.149. 127 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 12.ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p.301. 128 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Resp. nº 705.203-SP, Segunda Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, Brasília, 11 de outubro de 2005. Disponível na internet em: http://www.stj.jus.br. Acesso em: 08 de abril de 2008.
72
por intermédio de concessionária de serviço público, acolheu-se a alegação de que “toda vez
em que o serviço público puder ser delegado a terceiros - os quais obviamente não o prestarão
por obrigação que lhes é constitucionalmente imposta, mas porque querem explorar o serviço
público - a contraprestação que lhes será devida pelos usuários tratar-se-á de tarifa”.129
Ainda neste sentido, noutra recente decisão do Supremo Tribunal Federal, agora tendo
como relator o Ministro Cezar Peluso, ficou averbado, dentre outras partes, o seguinte:
[...] A partir do momento em que o serviço público passa a ser prestado por uma concessionária, a forma da respectiva remuneração transmuda-se em tarifária (preço público), como é da essência dos serviços concedidos, a teor do que dispõe o Art. 175, II, da Lex Mater, até porque, ao se afirmar que determinado serviço só pode ser remunerado mediante taxa, se está, concomitantemente, negando-lhe a possibilidade de ser concedido [...].130
Importante o previsto no Art. 106 da Lei n° 9.472/97, que trata dos serviços de
telecomunicações, esclarecendo Kazuo Watanabe131 que as demandas que visem a revisão de
tarifa telefônica, independente de tratar-se de ação individual ou coletiva, devem dizer
respeito ao benefício global de todos os usuários quando estes estiverem em mesmas
condições, assim, é regra que a estrutura tarifária tenha “natureza unitária.”
Portanto, ao não se sujeitar aos princípios constitucionais do Direito Tributário e
Administrativo quando a remuneração dos serviços públicos ocorrer mediante o pagamento de
tarifa, induz-se à conclusão de que o Código de Defesa do Consumidor deve ser aplicado, em
sua totalidade, para proteger os direitos dos usuários-consumidores nestes casos, consoante a
uníssona doutrina e jurisprudência.
2.3.1.3 Preço Público
O preço público também se caracteriza por uma remuneração paga pelo usuário-
consumidor, na forma de contraprestação pecuniária, ao se utilizar de um serviço público
divisível e específico, firmado mediante contrato administrativo.
129 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE nº 503.759-MS, Rel. Min. Carmen Lúcia, Brasília, 02 de outubro de 2007. Disponível na internet em: http://www.stf.jus.br. Acesso em: 08 de abril de 2008. 130 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. AI nº 678.004-SC, Rel. Min. Cesar Peluso, Brasília, 04 de outubro de 2007. Disponível na internet em: http://www.stf.jus.br. Acesso em: 08 de abril de 2008. 131 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p.805.
73
Segundo Hely Lopes Meirelles132 preço público “é a contraprestação pecuniária do
objeto da licitação, podendo ser global ou unitária, fixa ou reajustável, único ou com
aditamento de parcelas variáveis”.
O preço público representará o retorno pecuniário, ao Estado, do valor do bem, serviço
ou atividade, conforme o instrumento de licitação, sendo ele fixado pela Administração
Pública “[...] definitiva e unilateralmente, sem levar em consideração qualquer variação da
oferta e da procura”.133
Portanto, a principal distinção entre preço público e tarifa está na receita, ou seja,
enquanto no primeiro a receita é do Estado, na segunda a receita é do particular, ou seja, do
concessionário de serviço público, conforme estabelecido na própria Lei nº 8.987/95 em seu
Art. 9º, aplicando-se, também, o Código de Defesa do Consumidor.
2.4 USUÁRIO-CONSUMIDOR
Uma vez compreendida e aceita a extensão da aplicação das regras de proteção ao
consumidor às concessões de serviços públicos, a conceituação de usuário e consumidor se
faz necessária, visto que, enquanto se aguarda legislação específica que trate da defesa dos
usuários de serviços públicos, o Código de Defesa do Consumidor vem sendo usado
exemplarmente no atendimento aos dois sujeitos, legitimando os usuários a alcançar a devida
proteção de seus direitos, podendo-se afirmar que novamente os costumes se tornaram regra.
A Lei nº 8.987/95 em seu Art. 7º dispõe do elenco de todos os possíveis usuários do
serviço público, o que não significa dizer que todos os relacionados possam ser considerados
efetivamente usuários. Esta a razão pela qual o rol não é exaustivo, possuindo índice
exemplificativo dos direitos e poderes que o legislador considerou de maior importância.
Marçal Justen Filho134 assegura que outros usuários poderão ser reconhecidos, tendo em vista
os princípios que disciplinam este campo, o regulamento específico do serviço público ou as
peculiaridades do caso concreto.
Apesar de tratar-se de uma relação de consumo, o usuário do serviço público não deve
ser considerado um consumidor assim como o conceituado pelo direito privado, entendimento
132 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 28.ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p.297. 133 Idem ibidem, p.618-9. 134 JUSTEN FILHO, Marçal. Concessões de serviços públicos. São Paulo: Dialética, 1997, p.133.
74
este de Antônio Carlos Cintra do Amaral135 que afirma “[...] igualar estes dois conceitos seria
um equívoco generalizado, mesmo que se considerasse o ponto de vista econômico, porém,
tratando-se da ótica jurídica ambos possuem conotação diversas”.
A relação de consumo no direito privado, prossegue o autor, é aquela onde o
fornecedor é obrigado a prestar serviço ao consumidor, sendo que o Estado atua simplesmente
na regulamentação da relação contratual, visando a proteção da parte hipossuficiente, não
sendo responsável pelo cumprimento das obrigações, o que é feito somente pelo fornecedor.
Tal conclusão é possível já que a Constituição Federal dispensou tratamento diferenciado para
o usuário de serviço público e o consumidor do Código de Defesa do Consumidor, tendo
ficado comprovado com a Emenda Constitucional 19/98 que determinou ao Congresso
Nacional a elaboração de lei específica para os usuários de serviço público, reconhecendo que
não se equiparam os dois sujeitos por serem juridicamente diversos.136
Com posição contrária, Leon Frejda Szklarowsky conceitua consumidor com base no
Art. 2º do Código de Defesa do Consumidor e, citando o direito português, afirma que é:
[...] todo aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados ao uso não profissional, por pessoa que exerça com caráter profissional uma atividade econômica que vise a obtenção de benefícios.137
Em prosseguimento, afirma que:
Sem dúvida, aplica-se o Código de Proteção e Defesa do Consumidor, ainda que se trate de contrato administrativo, quando a contratante é a Administração, no sentido que lhe dá a Lei nº 8.666/93, sendo ela consumidora ou usuária, porque adquire ou utiliza produto ou serviço, como destinatária final. A lei não faz distinção entre as pessoas jurídicas que adquirem bens ou usufruem serviços. Não há por que se lhe negar a proteção do CPDC, já que o Estado consumidor ou usuário é a própria sociedade representada ou organizada.138
De acordo com Cláudia Lima Marques139 o termo consumidor vem sendo utilizado de
maneira genérica no mundo globalizado atual, uma vez que incluiu clientes e consumidores
econômicos que nem sempre são jurídicos neste conceito à partir da criação das agências de
135 AMARAL, Antonio Carlos Cintra do. Distinção entre usuário de serviço público e consumidor. Revista Diálogo Jurídico. Salvador, Centro de Atualização Jurídica, n.13, abril-maio de 2002. Disponível na internet em: http://www.direitopublico.com.br. Acesso em: 12 de fevereiro de 2008. 136 Idem ibidem. 137 SZKLAROWSKY, Leon Frejda. O código de proteção e defesa do consumidor e os contratos administrativos. Jus Navigandi. Teresina, ano 3, n. 30, abril de 1999. Disponível na internet em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=470. Acesso em: 12 de fevereiro de 2008. 138 Idem ibidem. 139 MARQUES, Cláudia Lima. A regulação dos serviços públicos altera o perfil do consumidor. Revista Marco Regulatório da AGERGS. Porto Alegre, n.1, fev. 1999, p.2.
75
regulamentação e do processo de privatização, tendo por finalidade precípua a segurança e a
qualidade dos serviços públicos, ficando caracterizada, assim, a figura do consumidor do
serviço público desestatizado. Afirma ainda que não existe discussão quanto a diferença entre
os serviços públicos e as relações privadas, tornando equiparados os conceitos de usuário de
serviço público e consumidor. Assim, enquanto não criada a legislação específica para
proteção dos usuários de serviços públicos, estes serão considerados consumidores.
Neste sentido, Fernando Costa de Azevedo citado por Elaine Cardoso de Matos
Novais,140 afirma que “todo e qualquer usuário de serviço público será sempre um
consumidor”.
Segundo Cesar Augusto Guimarães Pereira141 muitas são as similitudes entre os
conceitos de usuário e consumidor, apontando que a principal distinção entre ambos reside no
poder que o usuário exerce sobre o Estado, prestador dos serviços necessários ao atendimento
das necessidades sociais, ao passo que o consumidor não possui mecanismos para exigir que
os serviços lhes sejam colocados à disposição. O usuário pode solicitar que o serviço público
venha a ser prestado, em função do regime de Direito Público, diferentemente do consumidor
que só poderá usufruir daqueles serviços que estiverem postos à sua disposição, pois depende
da iniciativa privada.
Apesar de certa divergência doutrinária, entende-se que no presente estágio da
legislação consumerista e também a dos serviços públicos, sobretudo sob à luz da
Constituição Federal, as definições de consumidor e usuário se confundem na sua vertente
prática, podendo existir distinções puramente semânticas, ou seja, apesar do Código de Defesa
do Consumidor não citar claramente a palavra usuário, ele foi claro ao incluir os serviços
públicos no rol daqueles que estariam abrangidos pelas relações de consumo.
Durante toda esta pesquisa, abraçando o entendimento de que usuário e consumidor
encontram-se em situação de igualdade perante o sistema pátrio, será utilizado o termo
usuário-consumidor, em consonância com a Lei n° 8.987/95 e acréscimos normativos da Lei
nº 9.791/99, conforme demonstrado pelos autores do anteprojeto do código consumerista que
conferiu proteção ao usuário de serviço público.142
140 NOVAIS, Elaine Cardoso de Matos. Serviços públicos e relação de consumo: aplicabilidade do código de defesa do consumidor. Curitiba: Juruá, 2006, p.193. 141 PEREIRA, Cesar Augusto Guimarães. Usuários de serviços públicos: usuários, consumidores e os aspectos econômicos dos serviços públicos. São Paulo: Saraiva, 2006, p.56. 142 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p.22.
76
Para destruir tais discussões definitivamente é porque se aguarda norma referente à
defesa do usuário de serviço público que venha regulamentar, específica e detalhadamente, os
direitos e deveres dos usuários, permitindo, ainda, quando necessário, que se valham das
regras de proteção ao consumidor, o que ratifica estar o diploma atual em perfeita
consonância com os serviços públicos.
2.5 PRESTABILIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO CONCEDIDO
Dispõe o Art. 7º da Lei nº 8.987/95 sobre os padrões de prestabilidade a que teria
direito o usuário do serviço público delegado por meio da concessão, razão pela qual o caput
do dispositivo afasta qualquer conflito com o Código de Defesa do Consumidor, sendo certo
que ambos podem e devem ser aplicados em conjunto.
Dessa maneira, importante destacar a regra do Art. 22, caput do Código de Defesa do
Consumidor que prevê as responsabilidades do Estado quando nas relações de consumo,
motivação pela qual os serviços públicos por ele prestado ou por seus representantes, devem
obedecer os princípios de adequação, eficiência e segurança e, quando forem essenciais,
deverão ainda ter a característica da continuidade.
Portanto, ao usuário-consumidor é garantida a prestação de um serviço adequado, no
sentido de satisfazer condições de regularidade, continuidade, segurança, eficiência,
atualidade, generalidade, cortês e mediante o pagamento de tarifas módicas; o recebimento de
informações de como o serviço deve ser prestado, possíveis alterações e atualizações,
devendo ser feito pelo concessionário prestador do serviço como pelo poder concedente que
deve realizar a fiscalização; obter e utilizar o serviço quando julgar necessário, observadas as
normas do poder concedente, não lhe sendo imposto o uso do serviço, dando-lhe liberdade
para escolher entre este ou aquele serviço; informar o Poder Público e a concessionária sobre
irregularidades no serviço quando detectadas por ele; quando da prática de atos ilícitos por
parte da concessionária comunicar as autoridades competentes para que o serviço público seja
normalizado ou sejam tomadas as medidas necessárias.
A prestação do serviço adequado refere-se à imposição do princípio da universalização
e, segundo Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer,143 deve-se possibilitar o acesso universal ao
143 PFEIFFER, Roberto Augusto Castellanos. Serviços públicos concedidos e proteção do consumidor. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, ano 9, n.36, out-dez 2000, p.169.
77
consumo de serviços públicos concedidos, reforçando o caráter distributivo do direito do
consumidor que visa a melhoria do serviço já prestado aos consumidores inseridos no
mercado, possibilitando a prestação do mesmo serviço àqueles que ainda entrarão nele, em
atendimento às classes de consumidores, com todas as suas diferenças e peculiaridades.
Para considerar adequado um serviço ele deve atender o consumidor em suas
necessidades e satisfação, razão pela qual Elaine Cardoso de Matos Novais144 adverte que
devem ser observados em qualquer tempo do contrato os atributos de regularidade, ou seja,
prestação correta do serviço, atualização constante, aplicação das regras de isonomia,
oferecendo serviço de igual qualidade a todo usuário-consumidor, tratamento digno e
atendimento eficaz e a modicidade das tarifas a toda coletividade atendida.
Márcia Cadore145 afirma que o conceito de serviço público adequado previsto no Art.
6º, § 1º da Lei nº 8.987/95 não destoa do previsto no Código de Defesa do Consumidor em
seu Art. 22, devendo as normas serem compatibilizadas em consonância com o princípio da
proporcionalidade para que não haja o sacrifício de direitos, além de que a norma protetiva
dos consumidores não pode ser aplicada diretamente ao usuário do serviço público, que
devido a natureza do interesse coletivo tutelado, sofre a incidência do Direito Administrativo.
É neste sentido que o Superior Tribunal de Justiça tem decidido pela observância do
princípio da proporcionalidade no atendimento dos interesses dos usuários-consumidores, do
concessionário e do Poder concedente. Em Recurso Especial julgado pelo Tribunal permitiu-
se o corte no fornecimento de energia elétrica de Município inadimplente. No caso presente, o
concessionário manteve o fornecimento em alguns prédios em respeito ao interesses
essenciais da população, porém, em relação aos demais não poderia garantir a prestação do
serviço com os mesmos padrões de qualidade, o que tornaria a relação desequilibrada
economicamente em desatendimento à ordem jurídica justa.146
Por sua vez, a eficiência dos serviços encontra-se inserida no Art. 37 da Constituição
Federal, sendo um dever imposto a todo e qualquer agente público no sentido de que o mesmo
realize suas atribuições com presteza, perfeição e rendimento funcional, caracterizando assim
o serviço adequado, que deve ser prestado a título de urgência, já que as necessidades da
144 NOVAIS, Elaine Cardoso de Matos. Serviços públicos e relação de consumo: aplicabilidade do código de defesa do consumidor. Curitiba: Juruá, 2006, p.238. 145 CADORE, Márcia. Serviços públicos delegados: consumidor ou usuário do serviço público? Revista Marco Regulatório da AGERGS. Porto Alegre, n.8, mar. 2005, p.92. 146 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Resp. nº 302.620-SP, Segunda Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Brasília, 16 de fevereiro de 2004. Disponível na internet em: http://www.stj.jus.br. Acesso em: 03 de junho de 2008.
78
comunidade não podem esperar a boa vontade do Poder Público que tem a obrigação de
cumprir com aquilo que lhe compete com rapidez e a continuidade necessárias, já que isto
significa que o serviço será prestado a todos a qualquer tempo e da mesma forma.
O serviço será considerado eficiente se a Administração Pública prestá-lo de maneira
diligente, visando sempre o atendimento dos interesses da coletividade, dessa forma, ensina
Elaine Cardoso de Matos Novais147 que não interessa a população se o serviço é colocado a
disposição quando ele não atende às regras de funcionamento, cumprindo sua finalidade,
dessa maneira, ele deve estar em conformidade com a norma legal e deve ser exercido com
eficiência atendendo aos fins propostos quando da sua criação.
Igualmente, será considerado seguro quando sua prestação não caracterizar riscos aos
usuários, assim, representará um serviço ineficiente em potencial aquele que colocado à
disposição da coletividade seja capaz de atentar contra sua segurança, em virtude de defeitos
em sua prestação, importante que se adotem técnicas que visem diminuir ao máximo os riscos
do serviço, pois é impossível que estes sejam totalmente evitados, quando se leva em
consideração as circunstâncias exteriores. Dessa maneira, é possível divisar que serviço
seguro será aquele onde os benefícios e eficiência possam ser suficientes para suportar
prováveis riscos em sua utilização.
Compõe o serviço público prestado a continuidade, sendo um dos principais deveres
do concessionário, já que o desrespeito a este dever gera ao consumidor, mormente aquele de
serviços essenciais, o direito a reparação de possíveis danos materiais e morais bem como a
aplicação das sanções administrativas cabíveis ao caso, sendo que a regra é de que as
atividades da Administração Pública, mesmo as delegadas, devem ser realizadas de maneira
ininterrupta, para que não haja prejuízos para a coletividade.
À luz do Art. 1º, IV da Constituição Federal, compreende-se o valor da prestação
adequada do serviço público concedido, o mesmo ocorrendo na Lei nº 7.783/89 ao dispor que
serviço essencial é aquele indispensável ao atendimento das atividades inadiáveis da
comunidade, logo, o não cumprimento deste, assim como ocorre com os serviços públicos em
geral, leva a compreender que a sua prestação sem continuidade gera responsabilidade da
pessoa jurídica pela prestação indevida.
O princípio da continuidade foi dividido por Héctor Jorge Escola da seguinte forma:
147 NOVAIS, Elaine Cardoso de Matos. Serviços públicos e relação de consumo: aplicabilidade do código de defesa do consumidor. Curitiba: Juruá, 2006, p.241.
79
O princípio da continuidade pode revestir-se de caráter absoluto ou relativo, dependendo das características e condições da necessidade ou exigência que se procura satisfazer com a prestação do serviço público. A continuidade em termos absolutos deve ser exigida nos serviços públicos destinados a atender necessidades permanentes, a exemplo do fornecimento de água, gás, ou energia elétrica. Em outros casos, a continuidade é relativa, porquanto o serviço visa a atender necessidades intermitentes, as quais existem em certos momentos, mas não em outros. 148
Tal princípio prevê que o serviço seja mantido pelo Poder Público, devendo prestá-lo
de maneira regular e correta, observando sempre os interesses da coletividade, desse modo
poderão os usuários-consumidores contar sempre com sua continuidade, na certeza de que lhe
será garantido um serviço público que esteja dentro das normas legais e que verdadeiramente
demonstre ser possível ao Estado oferecer aos indivíduos tratamento digno e diligente.
2.6 AS AGÊNCIAS REGULADORAS COMO INSTRUMENTO DE REGULAÇÃO E
FISCALIZAÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS CONCEDIDOS
O ordenamento pátrio dedicou tratamento especial aos usuários-consumidores, como
já apreciado nesta dissertação, tendo o Estado, no exercício de suas funções, atribuído a
regulação e fiscalização dos serviços públicos concedidos às Agências Reguladoras.
As Agências Reguladoras estão disciplinadas pela Constituição Federal em seus Arts.
21, XI e 177, § 2º, III, dispositivos estes que, respectivamente, autoriza a criação de “órgão
regulador” e indica os órgãos reguladores do monopólio estatal, em atendimento ao interesse
público, visto que com as crescentes concessões de serviços públicos a Administração
Pública, necessitou criar órgão que fosse capaz de assegurar sua devida prestação.
A natureza jurídica das Agências Reguladoras encontra assento no regime das
autarquias em regime especial, sendo parte integrante da administração pública indireta, o que
certamente as obriga observar com rigor os princípios constitucionais que regerem a
administração pública, em que pese a autonomia para realização do trabalho de fiscalização e
controle dos serviços públicos outorgados à iniciativa privada.
Entre as garantias previstas no ordenamento está a de se manter o equilíbrio entre as
partes, razão pela qual as Agências Reguladoras aplicam subsidiariamente as normas contidas
148 NOVAIS, Elaine Cardoso de Matos. Serviços públicos e relação de consumo: aplicabilidade do código de defesa do consumidor. Curitiba: Juruá, 2006, p.246.
80
no Código de Defesa do Consumidor, adequando os benefícios alcançados pelos
consumidores das relações de consumo aos usuários de serviços públicos, com as medidas de
modicidade da tarifa, qualidade, adequação, eficiência entre outros que devem também estar
presentes nos serviços públicos.
As Agências Reguladoras desempenham papel de grande importância nas relações
advindas dos contratos de concessão, porém é certo que a totalidade dos objetivos traçados em
sua criação ainda não puderam ser alcançados, tendo em vista a necessidade da sociedade e
sistema jurídico se adaptarem à sua atuação, no entanto, é de reconhecer os avanços
alcançados até o momento, consoante o sentir de Kazuo Watanabe.149
O reconhecimento do papel das Agências Reguladoras é fator de grande importância
para a efetividade da fiscalização. Na prática, se pode considerar bons os resultados
alcançados pelas Agências Reguladora. Assim, ao conseguir que os serviços públicos sejam
fiscalizados e regulados, o Estado, por meio da atuação das Agências Reguladoras, garante o
cumprimento do contrato sem a necessidade de onerar-se e, principalmente, facultando ao
usuário-consumidor melhores serviços, cumprindo com uma de suas finalidades que é
desenvolvimento da sociedade com justiça social.
2.6.1 Agências Reguladoras como Forma de Controle da Atividade Econômica
De acordo com o conteúdo acima apresentado, pode-se concluir que o Estado,
segundo a doutrina liberal, atendendo o monopólio que exerce, atuará diretamente na
atividade econômica para o alcance do interesse público e garantia do bem estar social, sendo
que tal participação será relativa aos serviços públicos, ou seja, as atividades fins do Estado.
Desse modo é importante compreender que o Estado pode intervir na economia de
duas maneiras, segundo ensina o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Eros Roberto
Grau,150 uma quando age no domínio econômico, outra quando age sobre o domínio
econômico, ou seja, quando o Estado atua no domínio econômico ele procede como uma
empresa, quando atua sobre o domínio econômico, age como agente normativo por meio das
Agências Reguladoras, estabelecendo regras a serem adotadas. 149 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p. 804. 150 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na constituição de 1988: interpretação e crítica. 10.ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p.94.
81
O fato de ser o Estado, enquanto ente regulador, o responsável pela fiscalização da
prestação adequada do serviço, acaba por onerar o Poder Público que já realizou a delegação
da prestação do serviço público para se desencumbir de obrigações em excesso e evitar a má
prestação do serviço, dessa maneira, organiza as respectivas Agências Reguladoras.
Para atender os fins propostos, as Agências Reguladoras devem ser independentes,
tanto quanto ao poder concedente como quanto ao concessionário, eis que o objetivo da
função pública é a satisfação do interesse da sociedade.
Apesar de agirem com grande valia, as Agências Reguladoras, por mais sérias e
organizadas que sejam, necessitam do apoio de outros órgãos. Elucida Cláudia Lima
Marques151 que órgãos como o Ministério Público e o Procon, responsáveis pela fiscalização
das relações de consumo, não atuam como deviam em conjunto as agências, num sistema de
parcerias, dificultando a realização da fiscalização ideal, sendo certo que a atuação das
Agências Reguladoras não deve excluir as atividades a serem desenvolvidas por estes órgãos
e demais que possam compor o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor.
Exerce a sociedade também um poder de controle sobre as Agências Reguladoras,
sendo que este poder é político e demanda uma expansão de mecanismos de controle, pois, de
acordo com Ronaldo Porto Macedo Júnior152 isto pode se dar com a aplicação dos princípios
do código consumerista em relação ao direito de participação que no Art. 6º dispõe do
“equilíbrio de obrigações e deveres numa perspectiva não exclusivamente econômica, mas de
igualdade de direitos, do poder de fiscalização, do poder de participação poderia ser um
caminho”, o princípio de informação para obrigar as Agências Reguladoras prestarem
informações adequadas sobre o mercado de consumo, garantindo o controle e a transparência
da responsabilidade dos administradores públicos na prestação de serviços públicos.
Ensina Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer153 que o Estado, ao criar as Agências
Reguladoras, pode reestruturar o seu papel na área da prestação dos serviços públicos, de
maneira que ao deixar de fiscalizar o exato cumprimento dos termos dos contratos de
concessão passou a ter mais condições de realizar uma regulação de mercado o que não
poderia fazer a contento antes, tendo em vista as inúmeras atribuições que lhe competiam.
151 MARQUES, Cláudia Lima. A regulação dos serviços públicos altera o perfil do consumidor. Revista Marco Regulatório da AGERGS. Porto Alegre, n.1, fev. 1999, p.3. 152 MACEDO JUNIOR, Ronaldo Porto. A proteção dos usuários de serviços públicos: a perspectiva do direito do consumidor. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, ano 10, n.37, jan-mar 2001, p.91. 153 PFEIFFER, Roberto Augusto Castellanos. Serviços públicos concedidos e proteção do consumidor. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, ano 9, n.36, out-dez 2000, p.172.
82
A Agências Reguladoras possuem papel determinante para a boa execução dos
serviços públicos, vez que ao atuarem como órgãos independentes agem imparcialmente na
defesa do interesse público, prestam importante colaboração ao Estado, à sociedade e mesmo
ao concessionário, desonerando o primeiro, facultando a prestação eficiente do serviço à
segunda e finalmente garantindo ao terceiro que seja mantido o equilíbrio econômico-
financeiro.
2.6.2 Finalidade
A criação das Agências Reguladoras visa, com a fiscalização e regulação dos serviços
públicos prestados pelos concessionários, atingir a eficiência esperada por todos e prevista no
texto constitucional, assim a execução destes desencadeará uma série de outros benefícios que
culminarão com um funcionamento mais adequado da máquina estatal, com a melhora das
condições de cada pessoa, e consequentemente com o crescimento de toda sociedade.
As Agências Reguladoras surgiram no Brasil, segundo Juliano Heinen,154 com a
finalidade de regular as atividades que são de responsabilidade do Estado, mas que foram
delegadas a particulares por meio da concessão, permissão ou autorização de serviço público.
Esclarece Ronaldo Porto Macedo Júnior155 que as Agências Reguladoras destinam-se
ao equilíbrio dos contratos de serviço, atuando no sentido de monitorar o processo de
negociação contratual entre os prestadores de serviços e os usuários do mesmo, tem a função
de um terceiro imparcial que regula a relação com a clara intenção de reequilibrar os
interesses opostos, tornando maior a função estatal nos setores regulados.
Dentre os fins a que se destinam as Agências Reguladoras demonstram Arnoldo Wald
e Luiza Rangel de Moraes156 que a promoção da eficiência do serviço público concedido
encontra posição de destaque, além, busca a garantia da manutenção do equilíbrio-econômico
entre a concessionária e toda a sociedade, não somente entre esta e os usuários. O atendimento
destas finalidades garante ao Estado uma economia estável, visto que o desonera da prestação
de tais serviços que poderiam acarretar prejuízos à máquina estatal. 154 HEINEN, Juliano. Agências reguladoras e o seu “poder” de regular(mentar). Santa Cruz do Sul: IPR, 2004, p.274. (Série Monografias Jurídicas 10, v.II) 155 MACEDO JUNIOR, Ronaldo Porto. A proteção dos usuários de serviços públicos: a perspectiva do direito do consumidor. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, ano 10, n.37, jan-mar 2001, p.87. 156 MORAES, Luiza Rangel de; WALD, Arnoldo. Agências reguladoras. Revista de Informação Legislativa. Brasília, ano 36, n.141, jan-mar 1999, p.153.
83
Estando investida dos poderes conferidos pela Administração Pública para atuar de
maneira independente e imparcial, visa um serviço público eficiente que garantirá o equilíbrio
nas relações contratuais, desempenhando papel relevante para a sociedade, mas não o faz
sozinha, visto que para desempenhar sua função satisfatoriamente necessita da ajuda da
sociedade que terá representantes escolhidos para atuar junto às Agências Reguladoras, seja
fiscalizando ou regulando o serviço público.
Isso ocorrerá a partir do momento em que se compreender, verdadeiramente, o papel
das Agências Reguladoras, criadas essencialmente para desafogar a máquina administrativa
dos Ministérios setoriais do Governo Federal que não possuíam condições para exercer a
função regulatória e de fiscalização das políticas públicas por eles desenvolvidas.
As Agências Reguladoras, no entender de Enrique Saravia,157 padecem de vícios na
sua criação em razão da falta de experiência e cultura regulatória, como por exemplo a
exagerada defesa de concorrência para assegurar a proteção dos direitos básicos dos usuários.
Mesmo assim, diante de uma gestão democrática, podem atender os “pressupostos de
cidadania participativa” que pautam a atividade pública.
Segundo Othon Moreno de Medeiros Alves158, as Agências Reguladoras ainda não
atingiram a plenitude do papel para o qual foram criadas, uma vez que ainda não possuem
“autonomia decisória plena” e sofrem influência, invariavelmente, do Poder Executivo. No
entanto, seu “caráter potencialmente transformador” é esperança de que em um futuro breve
atuem com verdadeira autonomia, transformando a relação Estado e usuário-consumidor,
passando estes a figurar em patamar de igualdade no cumprimento pleno do papel daquelas.
Portanto, as Agências Reguladoras objetivam, por meio da regulação e da fiscalização,
garantir que os serviços públicos concedidos sejam executados corretamente para se alcançar
o interesse público e velar pelo cumprimento do contrato de concessão de serviço público.
2.6.2.1 Regulação
As Agências Reguladoras em atendimento ao dever estatal de fiscalizar os serviços
públicos, são investidas de poderes que lhe garantem condições de exercer a regulação de
157 SARAVIA, Enrique. A triste solidão das agências reguladoras. Revista Conjuntura Econômica. São Paulo, v.61, n.6, junho 2007, p.20-1. 158 ALVES, Othon Moreno de Medeiros. Agência reguladoras e proteção do consumidor de serviços de telecomicações. Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro, v.226, out-dez. 2001, p.228.
84
maneira independente em conjunto com a própria sociedade. Seu escopo maior é o alcance do
interesse público, que será obtido por meio de um serviço público concedido executado com
eficiência e economia, possibilitando o equilíbrio econômico-financeiro do mercado, e
consequentemente, facultando à sociedade condições de desenvolvimento.
A criação das Agências Reguladoras se deu para que a Administração Pública
transferisse seu poder de fiscalizar e, segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro,159 no que
concerne à concessão de serviços públicos, este poder de regulação deve ser observado sob
duas vertentes, a primeira quanto à efetiva execução da atividade concedida regulamentada
pelas cláusulas regulamentares, e a segunda quanto a manutenção do equilíbrio financeiro
necessário ao contrato, através das cláusulas contratuais.
A Administração Pública deve zelar pelo atendimento dos fins sociais, seja no que se
refere à prestação de um serviço que condiz com as expectativas e necessidades da sociedade,
acompanhando constantemente as atividades prestadas pela concessionária, se estão
respeitando o contrato firmado, se tem atendido as evoluções técnicas e se a remuneração
cobra é condizente com o previsto, ou ainda, observar se o concessionário a remuneração do
concessionário, tem alcançado a compensação pelos serviços prestados.
A regulação exercida pelas Agências Reguladoras deve respeitar os preceitos
constitucionais, mesmo na inexistência de legislação que as discipline de maneira genérica,
sendo assim, Maria Sylvia Zanella Di Pietro160 remete à observância do disposto no Art. 5º,
XXXV da Constituição Federal que garante o acesso à justiça, desta feita, as decisões das
agências reguladoras, quando passíveis de reforma serão levadas ao exame Jurisdicional.
Agindo de maneira imparcial devem as Agências Reguladoras atuarem com lisura e
dentro dos padrões legais, razão pela qual Luis Roberto Barroso161 leciona que a regulação
será exercida através de um conjunto de afazeres que se resumem em garantir o equilíbrio
contratual através do controle de tarifas, facultar a quantos indivíduos for possível a utilização
do serviço, promover a concorrência naqueles locais onde não haja monopólio, realizar de
maneira integra a fiscalização do cumprimento dos termos do contrato e finalmente atuar
como árbitro quando da ocorrência de conflitos entre as partes envolvidas na concessão do
serviço público.
159 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 20 ed. São Paulo: Atlas, 2007, p.435. 160 Idem ibidem, p.437. 161 BARROSO, Luis Roberto. Constituição e Ordem Econômica e Agências Reguladoras. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico, Salvador, Instituto de Direito Público da Bahia, n.1, fevereiro 2005. Disponível na internet em: www.direitodoestado.com.br. Acesso em: 28 de fevereiro de 2008.
85
A atuação independente e imparcial das agências reguladoras lhes confere crédito
junto a todos os interessados na execução do serviço público, seja o Estado, concessionária e
eventuais usuários, obtendo o equilíbrio entre eles, visto que, através da regulação dos direitos
e deveres inerentes ao contrato de concessão de serviço público, tem possibilidade fiscalizar o
serviço e quando for o caso editar normas regulatórias que lhe sejam pertinentes, alcançando a
segurança social.
2.6.2.2 Fiscalização
As Agências Reguladoras através de suas prerrogativas e atividades realizará
constante fiscalização da execução do serviço público concedido, para garantir que o preceito
constitucional que determina a proteção do consumidor esteja sendo cumprido fielmente.
Neste sentido as agências atuarão junto às empresas concessionárias exigindo que estas
estejam agindo em conformidade com as normas consumeristas, não deixando de observar o
respeito às mesmas, garantindo-lhe que a remuneração de seus serviços seja compatível com a
execução realizada.
É dever do poder concedente realizar a devida fiscalização do serviço público
concedido, cuidando para que o concessionário cumpra fielmente os termos avençados no
contrato, porém, que se esta fiscalização for deficiente é de total responsabilidade da
concessionária a responsabilidade pelo cumprimento do contrato, conforme o Art. 25 da Lei
n° 8.987/95, cabendo a ela responder pela execução do serviço concedido e por todos os
prejuízos causados, seja ao poder concedente, ao usuário ou aos terceiros.162
Esta a razão pela qual é imprescindível a existência das Agências Reguladoras, já que
o poder concedente é diretamente interessado no contrato. O Art. 4º, II do Código de Defesa
do Consumidor traz o princípio do dever governamental que busca a efetiva tutela do
consumidor nas relações de consumo, uma vez que a presença estatal nestas, garante, seja
quando atua diretamente ou por intermédio de seus representantes, um mercado com produtos
e serviços adequados à qualidade esperada pela coletividade, com segurança, desempenho e
durabilidade, visando sempre o bem estar desta e o atendimento dos interesses dos indivíduos.
162 CAPELETTO, Gilberto José. Direitos dos consumidores e regulação dos serviços públicos. Revista Marco Regulatório da AGERGS. Porto Alegre, n.4, 1º semestre de 2001, p.43.
86
Prova da atuação das Agências Reguladoras na fiscalização dos serviços públicos
concedidos ao particular, são as multas aplicadas, no ano de 2007, a cinco concessionárias que
descumpriram as metas de qualidade no serviço prestado e também por deixarem de fornecer
informações solicitadas no prazo estabelecido pela Agência de regulação.163
A função fiscalizadora das Agências Reguladoras não exclui a atuação dos demais
órgãos do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, pois, sendo o usuário-consumidor a
parte vulnerável na relação de consumo, há que se primar pelo cumprimento da norma legal,
deve, aliás, serem realizadas parcerias para uma fiscalização eficiente e que garanta o
cumprimento do estipulado entre Administração Pública e o concessionário, sempre visando o
atendimento ao interesse público.
2.7 CONFLITOS JURÍDICOS
Uma vez não atingido os resultados esperados pela atuação das Agências Reguladoras
poderão se instalar, eventualmente, determinados conflitos jurídicos originados das relações
de consumo nas concessões de serviços públicos, ocasionando um distanciamento do objetivo
maior do instituto que é a adequada e eficiente prestabilidade do serviço público pelos
concessionários legalmente habilitados.
Semanticamente, conflito deriva da palavra latina conflictus com a dimensão de
choque entre duas coisas, embate de duas forças contrárias.164 Conflito jurídico decorrente da
concessão de serviço público pode ser compreendido como sendo uma colisão de interesse
existente entre o usuário-consumidor e o concessionário de serviço público, originado da má
prestação do serviço.
Importante frisar que os conflitos jurídicos dessa espécie podem ser discutidos, entre
outras formas, segundo sua natureza e os interesses dos usuários-consumidores, partindo-se
da premissa que é direito do usuário-consumidor exigir do concessionário a prestação de um
serviço público que atenda aos termos do contrato e, consequentemente, da sociedade.
163 AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA. Boletim Energia. n.281. Brasília, 10-16 de agosto de 2007. Disponível na internet em: www.aneel.gov.br/arquivos/pdf/boletim281.htm. Acesso em: 11 de junho de 2008. 164 TÓPICOS POLÍTICOS. Conflito, o que é? Disponível na internet em: www.topicospoliticos.blogspot.com/2004/10/conflito-o-que.htm. Acesso em: 14 de agosto de 2008.
87
2.7.1 Ineficiência na Prestação do Serviço Público Concedido
Já é sabido que a Administração Pública e os delegatários de serviços públicos, devem
prestar um serviço público em conformidade com a norma legal, segundo os princípios supra
indicados, devendo atender as necessidades da coletividade com a prestação adequada,
eficiente e segura.
O não cumprimento destes preceitos inevitavelmente acarretará prejuízos aos usuários,
atingindo a coletividade como um todo. Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer165 esclarece que
os danos causados gerarão plena incidência de responsabilidade objetiva, trazendo ao
consumidor os benefícios do Art. 37, § 6º da Constituição Federal e do Art. 20 do Código de
Defesa do Consumidor.
O Código de Defesa do Consumidor inovou a idéia de ineficiência, concentrando-se
na funcionalidade e adequação do serviço público o que possibilitou a real satisfação do
mesmo e não mais a realização de subjetiva diligência por parte do fornecedor, dessa maneira,
a regra é que seja prestado, sempre, um serviço adequado e eficiente, conforme o prescrito em
lei e o que se espera dentro de um padrão justo e razoável para o atendimento do usuário e
consequentemente da coletividade.
O descumprimento ao dever de prestação do serviço público adequado, seja quanto ao
dever de continuidade e o de universalidade, assim como ocorre em qualquer relação de
consumo, gera ao usuário-consumidor o direito de pleitear, administrativa e judicialmente, sua
devida satisfação. Ainda, poderá exigir que o fornecedor seja compelido a cumprir a
obrigação conforme o avençado e realize a reparação dos danos que eventualmente tenham
sido causados pela prestação do serviço ineficiente, conforme o parágrafo único do Art. 20 do
Código de Defesa do Consumidor, neste caso este será utilizado para a responsabilização do
ente estatal e daqueles que atuarem em seu nome.166
Cumpre ressaltar que o tratamento dispensado pelo Código de Defesa do Consumidor
à Administração Pública é privilegiado em detrimento aos fornecedores de serviços privados,
já que estes, no caso de fornecimento de serviço inadequado se sujeitarão, a critério do
consumidor, a reexecutar o serviço, restituir a quantia paga ou ainda realizar o abatimento no
preço pago. Na realidade, o que pareceria privilégio trata-se de uma situação mais gravosa 165 PFEIFFER, Roberto Augusto Castellanos. Serviços públicos concedidos e proteção do consumidor. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo, ano 9, n.36, out-dez 2000, p.171. 166 Idem ibidem, p.171.
88
encoberta, pois, o fornecedor particular limita-se a responder dentro das medidas alternativas
ao consumidor e previstas no Art. 20, já os entes públicos deverão refazer o serviço e
devolver os valores indevidamente cobrados, sendo sua prestação cumulativa.167
A responsabilidade do ente estatal fornecedor de serviço público quando causar danos
ao usuário é a objetiva, em conformidade com o Art. 14 do Código de Defesa do Consumidor,
independente de ser o próprio ente quem presta o serviço ou este seja realizado por particular.
O serviço público concedido, portanto, será considerado ineficiente quando gerar
efeitos negativos aos indivíduos, uma vez que é um dever do Poder Público ou por seus
concessionários, prestar o serviço com perfeição e funcionalidade.
2.7.2 Vício na Prestação do Serviço Público Concedido
Na relação de consumo, manifesta o consumidor sua vontade legítima de alcançar
determinado fim tendo em vista a publicidade, a oferta realizada pelo fornecedor e o império
das normas do Código de Defesa do Consumidor que darão esta segurança, porém, o sistema
tem que se moldar conforme as necessidades atuais da sociedade, ou seja, a proteção ocorrerá
de maneira massificada, diante do grande número do atingidos, impedindo a subjetividade
anterior, já que agora há uma despersonalização, um anonimato das relações de consumo.
Considera-se eivado de vício o serviço “[...] que se mostre impróprio, inadequado para
os fins que razoavelmente dele se espera, bem como aquele que não atenda as normas
regulamentares de prestabilidade”, conforme o Art. 20, § 2º do Código de Defesa do
Consumidor.
Ensina Zelmo Danari168 que a verificação da existência de vício na prestação de um
serviço, principalmente, o público, gera uma situação de insegurança na relação de consumo,
o que desvaloriza o serviço. Nem sempre os prejuízos sofridos pelo consumidor restringem-se
ao campo financeiro, estendendo-se aos mais variados campos da sociedade, o que faz com
que o serviço concedido viciado crie uma insegurança social e enseje possíveis conflitos.
167 NOVAIS, Elaine Cardoso de Matos. Serviços públicos e relação de consumo: aplicabilidade do código de defesa do consumidor. Curitiba: Juruá, 2006, p.287. 168 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p.184.
89
Infelizmente, muitos são os exemplos de serviço público concedido viciado, o que
gera por parte dos usuários-consumidores descrença e receio na utilização dos mesmos, a
exemplo, tem-se que uma família ao sair de férias, opta trafegar por uma estrada que possui
várias praças de pedágio onde são cobrados valores nada módicos, dando a supor que em
contrapartida será fornecido serviço perfeito. Ocorre que o motorista percebe que a estrada,
por falta de manutenção, encontra-se bastante deteriorada, e mesmo esforçando-se ao máximo
não pode evitar um acidente devido a um grande buraco no asfalto, acarretando-lhe
incontáveis prejuízos morais e materiais.
O serviço considerado prestado não se restringe às obrigações que signifiquem o
alcance de um resultado, mas também aquelas que serviram de meio para se chegar a este,
exigindo-se do fornecedor a prestação de um serviço adequado para os fins que razoavelmente
dele se espera, mesmo que não se possa em alguns casos exigir que o serviço alcance um
resultado certo.
Esclarece Cláudia Lima Marques169 que a regra do Art. 20 concentra a imputação da
responsabilidade pelo vício do serviço naqueles que efetivamente realizaram a prestação deste
ao consumidor, devendo cumprir o dever de qualidade e adequação do serviço, de forma que
o fornecedor é o responsável, sendo irrelevante sua culpa, bem como a de seus prepostos e
auxiliares. A regra do citado dispositivo concentra-se responsabilização pela qualidade do
serviço e no resultado obtido à partir desta, e não na atuação direta ou indireta do fornecedor,
e de toda a cadeia de envolvidos na prestação do serviço, sendo assim, o sistema adotado pelo
Código de Defesa do Consumidor objetiva a caracterização do vício, que gerou um resultado
falho e na resultante violação de um dever legal.
Cumpre ressaltar que o texto consumerista quando define serviço impróprio como
aquele que seja inadequado ao fim esperado e não atenda as normas regulares de
prestabilidade, assim há um dever de qualidade, de adequação do serviço, concentrando-se a
responsabilidade pelo serviço prestado indevidamente na qualidade do serviço e não na
atuação direta ou indireta do fornecedor, o que institui a solidariedade entre todos aqueles que
estejam envolvidos no fornecimento do serviço.
Cláudia Lima Marques170 afirma que idéia de vício do serviço trazida pelo Código de
Defesa do Consumidor, é geradora da rescisão do contrato, facilita a satisfação do consumidor
169 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. 4.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p.1003. 170 Idem ibidem, p.998.
90
e agiliza o processo de cobrança da prestação ou da reexecução do serviço, “[...] isto porque
concentra-se na funcionalidade, na adequação do serviço prestado e não na subjetiva
existência da diligência normal ou de uma eventual negligência do prestador de serviços e de
seus prepostos”.
O sistema do Código de Defesa do Consumidor abandonou a tradicional
responsabilidade assentada na culpa, adotando a presunção geral desta, concluindo-se com
imposição de responsabilidade legal do fornecedor, seja ele o que possui com o consumidor
vínculo contratual ou ainda com uma cadeia de fornecedores. Deve ele, em conformidade com
o disposto na regra protetiva prestar serviços com dever de qualidade, que não cumprido,
acarreta efeitos contratuais e extracontratuais, conforme as regras dos Arts. 12 a 27.
Ao fornecedor do produto ou serviço aplica a regra da presunção absoluta de culpa
diante do dever de qualidade que possui, sendo afastada somente quando houver a prova de
causa alheia, devendo o fornecedor demonstrar que o vício se deu em virtude do mau uso do
produto, culpa exclusiva de terceiro ou caso fortuito externo à sua atividade e posterior à
entrega ao consumidor.
O Código de Defesa do Consumidor inovou ao introduzir a noção de vício de serviço
em seu Art. 20, já que no sistema civil utilizado anteriormente não existia remédio jurídico
para a falha na execução do serviço, vez que ocorria somente a decretação de um
inadimplemento contratual.
91
3 MÉTODOS PARA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS JURÍDICOS DECORRENTES
DAS CONCESSÕES DE SERVIÇOS PÚBLICOS
A existência de uma situação de conflito não se trata de uma anomalia neste
seguimento de concessão de serviço público, devendo-se observar tal circunstância como
sendo uma das condições fundamentais para o desenvolvimento de qualquer nação a partir da
criação de um sistema eficaz para a resolução dos conflitos, daí porque relevante tratar dos
mecanismos existentes no sistema jurídico pátrio.
3.1 DO PROCESSO ADMINISTRATIVO
A conceituação de processo remete-se ao conjunto de atos que visam o atendimento de
uma relação jurídica, onde as partes, cada uma com suas razões, necessitam de alcançar uma
tutela satisfatória do Estado que, no exercício monopólio jurisdicional, criou tal instrumento
para a obtenção da satisfação do interesse daquele que demonstrar a razão em seu pedido.
No entanto, o processo deixou de ter natureza exclusivamente jurídica e, em benefício
da sociedade, surgiu em outras esferas representando o meio utilizado para o atendimento de
situações em que exista a necessidade de, por meio de procedimento formalizado, realizar o
julgamento de alguma situação de conflito.
É o que se dá no âmbito dos processos administrativos. Apesar de não tratar-se de um
instrumento idêntico ao que visa o alcance da Jurisdição, tem o mesmo objetivo, assim, por
meio de uma seqüência de atos, o procedimento, visa o julgamento necessário.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro171 demonstra de maneira clara quais pontos possuem
relevância para a diferenciação de processo judicial e processo administrativo. No primeiro
existem os interesses das partes que provocam o Estado-juiz para a apresentação de solução
com base no que lhe foi apresentado, seu julgamento deve ser imparcial e estar amparado
legalmente; no segundo a relação se dá entre um administrado e a própria Administração,
sendo que a iniciativa do processo é de qualquer um dos dois, é a própria Administração quem
atua como juiz, fazendo-o dentro dos ditames legais irá decidir quanto a seus próprios
interesses, esta decisão não terá força de coisa julgada.
171 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 20 ed. São Paulo: Atlas, 2007, p.577.
92
O fato de a decisão prolatada pela Administração Pública, seja ela favorável ou não a
si, não possuir força de coisa julgada, abre a possibilidade para aquele que se sentir
prejudicado em seu interesse, pleiteie seu direito novamente na seara administrativa ou no
Poder Judiciário, por meio de processo judicial, visando alcançar a tutela pretendida, agora de
maneira definitiva, tendo em vista que a decisão judicial ser detentora da imutabilidade
esperada em virtude da coisa julgada material.
O processo administrativo alcançou o reconhecimento da Constituição Federal de
1988 ao estar incluído no princípio do devido processo legal, não apenas àqueles ligados ao
Poder Público, mas em todas as esferas, com o intuito de democratizá-lo, primando pela
igualdade das partes.
Especificamente, a Lei nº 9.784/99 dita as normas relativas ao processo administrativo
de competência da Administração Pública Federal, porém pouco se fez nas demais esferas de
Poder. Pioneiro, o Estado de São Paulo editou a Lei nº 10.177/98, criando o processo
administrativo, onde se destaca a prévia oitiva das partes, a ampla defesa e o contraditório.
Destarte, aqueles entes federativos que não possuam legislação estadual própria sobre
a matéria devem observar a norma federal e a Constituição Federal para o processamento e
solução de eventuais conflitos no âmbito administrativo.
A evolução da sociedade, a atuação estatal cada vez mais necessária nas relações
sociais, entre outros fatores, tudo isto contribuiu para que a Administração Pública a cada dia
e sobre os mais diversos motivos aumentasse sua atuação, passando a intervir na vida dos
indivíduos. Se faz necessário que os administrados lancem mão de seus recursos que visem o
equilíbrio na relação com a Administração, alcançando a proteção necessária e o
conhecimento de todos os atos administrativos.172
A garantia de proteção dos indivíduos e a participação destes nos atos da
Administração foram responsáveis pela existência de um processo administrativo, no entanto,
Odete Medauar173 leciona que se faz necessário observar que, em virtude do próprio
desenvolvimento da sociedade, tais finalidades se ampliaram e devem ser observadas em
conjunto para que haja a garantia de atendimento dos fins a que se destina o processo
administrativo.
172 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 24.ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p.482. 173 MEDAUAR, Odete. A processualidade no direito administrativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p.61.
93
Portanto, o processo administrativo visa garantir que possíveis atos administrativos
não causem prejuízos aos administrados, atuando, fundamentalmente, no sentido de verificar
se a Administração operou conforme o determinado legalmente, se agiu fora das normas ou
ainda se será campo necessário futuros contenciosos judiciais no caso do administrado sentir a
necessidade de alcançar uma decisão diversa daquela alcançada no âmbito administrativo.
3.1.1 Princípios Aplicáveis ao Processo Administrativo
A ciência jurídica funda-se em princípios que lhe norteiam as normas e estes são as
bases de sua compreensão e aplicação, pois, assim como no processo judicial, o processo
administrativo também é regido por princípios, em conformidade com o Art. 37 da
Constituição Federal de aplicação obrigatória e outros advindos da doutrina, jurisprudência e
legislação ordinária.
Dentre os princípios que regem o processo administrativo, além do dispositivo
constitucional acima referido, a norma infraconstitucional, por meio da Lei nº 9.784/99, em
seu Art. 2º, parágrafo único, também estabelece aqueles que são de aplicação obrigatória,
especialmente os princípios da legalidade objetiva, oficialidade, informalismo e publicidade.
Diógenes Gasparini174 menciona que a legalidade objetiva do processo administrativo
deve ser seguida desde a instauração processual que se dará com base nos ditames legais,
impedindo que a Administração haja à margem do permitido, causando prejuízos à
coletividade, razão pela qual não só ao administrado interessa que este princípio seja
respeitado, mas é importante a todos, visto que atenderá ao interesse social.
O princípio da oficialidade ou impulsão determina que, mesmo sendo instaurado pelo
administrado, compete à Administração a condução e movimentação do processo, razão pela
qual ocorrerá responsabilização dos agentes públicos que vierem a agir contrariamente ao
princípio da oficialidade, deixando de dar andamento ao processo indevidamente.175
O princípio do formalismo moderado ou informalismo versa sobre a aplicação dos
ritos procedimentais no processo administrativo evitando o rigor exagerado das formas,
buscando meios simplificados de atendimento às postulações dos administrados, garantindo
uma rápida solução ao litígio instalado, por meio de uma “interpretação flexível e razoável a 174 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 12.ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p.936. 175 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 28.ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p.658-9.
94
formas, para evitar que estas sejam vistas como um fim em si mesmas, desligadas das
verdadeiras finalidades do processo”.176
No que tange ao princípio da publicidade, com previsão expressa na Constituição
Federal em seu Art. 5º, XXXIII, bem como no Art. 2º, parágrafo único, incisos V e X da Lei
nº 9.784/99, o direito de acesso às informações do processo administrativo é mais amplo que
no judicial, onde somente partes e procuradores o exercem, garantindo maior publicidade dos
atos a qualquer interessado, seja individual ou coletivo, não conferindo, entretanto, a
oportunidade de abuso de direito.177
Além destes princípios, considerados como obrigatórios ou critérios para o processo
administrativo, segundo a própria norma regulamentadora (Lei nº 9.784/99), importante
ressaltar, dentre outros, o princípio constitucional da garantia de ampla defesa e do
contraditório, da gratuidade e da economia processual.
Segundo reza o Art. 5º, LV da Constituição Federal, é garantido a todos o princípio da
ampla defesa e do contraditório aplicável em qualquer espécie de processo, seja judicial ou
administrativo, garantindo às partes não só a ampla produção de provas e de defesa, mas
também um acompanhamento de todos os atos do processo de modo a que exerça plenamente
seu direito.
No processo administrativo o princípio da gratuidade se faz presente para que se evite
o ônus financeiro ao interessado, dando maior acessibilidade ao processo, não se tratando de
uma garantia absoluta, sendo que tal benefício se dará, segundo Celso Antônio Bandeira de
Mello,178 somente “[...] nos procedimentos restritivos ou ablativos de direito ”, ressalvando
que “[...] se haverá de garantir é a modicidade das taxas ou emolumentos porventura cobrados
para acobertar despesas por ele suscitadas”.
3.1.2 Mecanismo Não Jurisdicional para Solucionar Conflitos
Em tempos onde se busca maior efetividade do processo judicial, por meio de
mecanismos que possam garantir, ao mesmo tempo, uma resposta jurisdicional num prazo
176 MEDAUAR, Odete. A processualidade no direito administrativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p.122. 177 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 20.ed. São Paulo: Atlas, 2007, p.582 178 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 24.ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p.490.
95
razoável e a também a segurança jurídica, o processo administrativo é um mecanismo que
pode se tornar eficaz para a resolução de eventuais conflitos a partir do momento que são
respeitados os princípios a ele inerentes, conforme os acima mencionados, desaguando,
invariavelmente, na economia processual.
A opção por um método não jurisdicional para a resolução de conflitos no âmbito das
Agências Reguladoras foi motivada, de acordo com Luiz Ricardo Trindade Bacellar,179 por
três motivos principais, quais sejam:
[...] absoluta inviabilidade de impor a todo o Poder Judiciário um aprofundamento e especialização em setores de alta complexidade para atender a um pequeno número de demandas; a falta de confiança no Poder Judiciário para decidir as questões de forma técnica; a necessidade que as questões sejam decididas de forma rápida e eficiente.
A título exemplificativo se pode mencionar o Art. 19, XVII e XVIII da Lei nº
9.472/97 que autoriza a Agência Reguladora de Telecomunicação a proceder a composição
administrativa de conflitos de interesses e reprimir as infrações ao direito do usuário, sempre
visando o interesse público e pautada em uma atuação independente, imparcial, impessoal e
seguindo os ditames legais.
Importante ressaltar que os processos administrativos junto às Agências Reguladoras
devem observar, estritamente, as regras e os princípios atinentes à ordem pública, devendo
obediência, sobretudo, à Constituição Federal para alcançarem a eficiência esperada pelos
usuários-consumidores.
Frise-se, outrossim, que a grande maioria dos processos administrativos, apesar de
serem postulados individualmente, representam demandas relativas ao interesse de uma
coletividade de usuários de serviços públicos, consoante se verifica pelos diversos
processados junto aos órgãos de defesa do consumidor.
Todavia, não havendo a possibilidade de se solucionar os conflitos por meio dos
processos próprios ou administrativos, está o administrado (usuário-consumidor) legitimado a
lançar mão das regras processuais em vigor para ajuizamento de ação judicial, observando-se
os princípios processuais constitucionais, dentre os quais se destaca o direito de ação, sem
olvidar os meios alternativos para a resolução do conflito, consoante adiante discutido.
179 BACELLAR, Luiz Ricardo Trindade. Solução de controvérsias pelas agências reguladoras. Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro, n.236, abr-jun.2004, p.165.
96
3.2 DO PROCESSO JUDICIAL
Um grande desafio para os processualistas modernos é a de encontrar um verdadeiro e
eficiente caminho que possa agilizar a resposta jurisdicional sobre determinado conflito
jurídico, inclusive aqueles decorrentes das relações de consumo originados pela ineficiente
prestação de serviço público concedido, utilizando-se das tutelas diferenciadas ou mesmo
preventivas com o objetivo de tutelar de imediato e não provisoriamente o bem da vida lesado
ou sob ameaça de lesão.
Deste modo, esta tendência para se enfrentar a questão do formalismo processual já foi
defendida por Cândido Rangel Dinamarco180 assim:
[...] é preciso romper preconceitos e encarar o processo como algo que seja realmente capaz de alterar o mundo, ou seja, de conduzir as pessoas à ordem jurídica justa, eis que a maior aproximação do processo ao direito, que é uma vigorosa tendência metodológica hoje, exige que o processo seja posto a serviço do homem, com o instrumental e as potencialidades de que dispõe e não o homem a serviço de sua técnica.
Indubitável, portanto, de que esta é a trilha a ser perquirida, afastando-se dos rígidos
postulados existentes. Ressalte-se, contudo, que esses novos caminhos não se constituem em
uma apologia do abandono irresponsável das regras processuais existentes, mas, apenas e tão
somente, meios para se buscar novas práticas que visam a efetividade processual e,
consequentemente, a manutenção ou restabelecimento da ordem jurídica justa.
A ordem jurídica justa poderá ser alcançada ao se fazer cumprir o Escopo Pedagógico
do processo ou da jurisdição, pois este se encontra dentre aqueles que proporcionam a
manutenção do equilíbrio social ao se ter consciência dos direitos e deveres impostos a cada
cidadão e a garantia de ter a Justiça efetiva como uma verdadeira ferramenta de resolução de
conflitos adequadamente.
A longa manus do Estado, via de seu poder constituído, o Poder Judiciário, deve
demonstrar a toda sociedade sua força, por meio de decisões judiciais que atribua significativo
ônus àquele que eventualmente venha transgredir as normas de conduta em vigor,
estabelecendo, em conseqüência, a fixação e manutenção da ordem social, espelhando a tão
almejada confiança que os cidadãos depositam na máquina estatal.
180 DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 5.ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p.297.
97
O abrandamento das sanções impostas pelo Estado não se coaduna com o escopo
pedagógico da jurisdição, razão esta que determina, em certos momentos, a descrença da
população em relação ao Poder Judiciário, pois as penalidades impostas nas mais diversas
áreas do Direito não são suficientes para coibir os abusos contra as normas, o que acaba
causando um movimento contrário, ou seja, não se teme a ação da Justiça.
As decisões judiciais devem, primeiramente, resolver os conflitos existentes, e, num
segundo momento, desestimular comportamentos que possam violar o ordenamento jurídico,
desencadeando uma verdadeira revolução nos hábitos da sociedade, haja vista que os
resultados obtidos por meio da intervenção jurisdicional possam ser eficientes na mantença de
uma sociedade harmônica e supressão dos conflitos.
Quando se fala em alcançar a Justiça plena deve-se ter a idéia de que uma decisão
justa não é aquela que privilegia uma das partes ou o interesse do particular, mas, sobretudo, o
interesse público, a ponto de satisfazê-lo e empregar maior confiança à administração da
Justiça, garantido pelo due process of law albergado na Constituição Federal.
3.2.1 Processo e Interesse Público
A existência do ser humano no estágio atual implica afirmar que a vida em sociedade é
complexa e gera relações interpessoais entre seus indivíduos, razão pela qual o Estado se
interessa e preza, a priori, pela manutenção da ordem social desde quando assumiu o
monopólio de comando, tendo lançado mão de regras de conduta social como mecanismo
para coordenar, controlar e regular os atores sociais. Por isso é que o interesse público se faz
presente nas relações sociais.
Das relações sociais se pode extrair a necessidade da existência de normas jurídicas
que visam dar efetividade ao controle social, resultando no aparecimento da relação jurídica
decorrente de uma ligação entre sujeitos regulada pelas normas de conduta, motivando o
Estado, por força do interesse geral, garantir aos seus tutelados meios próprios para se chegar
ao fim colimado que é a pacificação social.
O instrumento encontrado pelo Estado para fazer valer sua posição de agente
controlador é o processo, mecanismo constituído, em sua essência, de uma relação jurídica e
procedimentos coordenados, objetivando alcançar um resultado útil que satisfaça não somente
98
a parte envolvida, mas, especialmente, o interesse de toda a coletividade.
Num contexto abreviado, trata-se o processo de uma categoria que remete à essência
do direito processual, sendo uma relação jurídica que tem por fim a satisfação jurisdicional do
Estado. Isto não impede, contudo, que a efetividade esteja garantida e que sempre a atuação
estatal por meio do processo seja o único meio viável e hábil para a solução do conflito.
Cássio Scarpinella Bueno181 esclarece ser o processo um meio destinado a atingir
determinado fim. Se este se destina a lides regidas pelo direito público ou material público,
precisa ser adaptado para atingir tal objetivo, o mesmo aplica-se quanto ao direito privado,
como ocorre nas relações de consumo, dessa maneira, o processo deve se adequar para o
atendimento das expectativas, adaptando-se para alcançar o fim almejado pelos interessados.
José Geraldo Brito Filomeno182 remete-se ao conceito de que processo é o instrumento
utilizado para a consecução de um provimento judicial competente e necessário à satisfação
do interesse de alguém, assim, o usuário-consumidor quando necessário poderá valer-se da
via processual para conseguir sua pretensão. Grande foi a inovação da legislação consumerista
ao permitir que os interesses dos consumidores passassem a ser interesses coletivos e difusos,
facilitando a proteção do interesse público.
A proteção processual coletiva dos consumidores resultou em grandes benefícios a
estes, já que a condição de desigualdade entre eles e o fornecedor, quando individualmente
observados, fica ainda mais latente, dessa forma, o agrupamento de consumidores que visem
o mesmo resultado lhes possibilita maiores chances na disputa por seus interesses.
Luiz Manoel Gomes Júnior183 traz o ensinamento de Hélio Tornaghi para determinar o
conceito de interesse público:
[...] O interesse público é mais facilmente compreendido quando confrontado com o particular. Esse é o que decorre da utilidade para uma só pessoa ou para determinadas pessoas; aquele é o que provém da vantagem para um número indeterminado de pessoas. No interesse particular é sempre possível apontar os interessados; ao público, ao contrário, qualquer pessoa poderá estar ligada. O interesse público nunca é individual; é sempre coletivo, social [...].
181 SALLES, Carlos Alberto de (Org.). Processo civil e interesse público: o processo como instrumento de defesa social. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p.25. 182 FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de direitos do consumidor. 7.ed. São Paulo: Atlas, 2004, p.318. 183 CHUEIRI, Miriam Fecchio; FERREIRA, Jussara Suzi Assis Borges Nasser; GOMES JUNIOR, Luiz Manoel. Segredo de justiça: aspectos processuais controvertidos e liberdade de imprensa. Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil. Porto Alegre, ano IV, n.22, jan-fev 2008, p.93.
99
O interesse público remete ao interesse da sociedade, da coletividade como um todo,
que possui seus valores, anseios e necessidades, que são a tradução dos direitos que possui,
muitos deles com características de indisponibilidade. Caberá à Administração Pública o
atendimento, de maneira satisfatória, destes direitos, mas sabe-se que nem sempre isto ocorre
da maneira como a coletividade espera, quando os órgãos estatais não satisfazem as
necessidades da sociedade, tratando-se de um direito de todos a saída é a via jurisdicional.
Esclarece Marçal Justen Filho184 que para se configurar interesse público não basta a
verificação de seu titular, assim “[...] é atribuído ao Estado por ser público e não é público por
ser atribuído ao Estado”. Neste sentido nem todo serviço em que o Estado encontra-se no pólo
passivo caracteriza de interesse público, sendo do conhecimento da própria sociedade que os
órgãos estatais exercem inúmeras atividades de características privadas, sem que exista
qualquer interesse público a ser atendido.
Não é a Administração Pública titular do interesse público, mas é ela quem
determinará as prioridades e colocará e executará as atividades suficientes ao atendimento das
necessidades da sociedade, prossegue o autor afirmando que ao Estado não se admite a
obtenção de quaisquer vantagens, devendo atuar unicamente para a observância do bem
comum, resguardando o interesse público em todas as situações, em garantia de sua
supremacia, mesmo nas situações em que este sobrepor-se a outros.
A concessão de serviço público deve primar, desde seu início, pelo atendimento do
interesse público, a eficiência do serviço prestado demonstrará o foco da Administração que é
a satisfação das necessidades da coletividade, dessa maneira, o ente público, dentro da
realidade apresentada deverá apurar qual o conteúdo do interesse público a ser atingido, e
partindo de interesses concretos determinará os fins específicos buscados, ocorre que nem
sempre isto é possível, trazendo a insatisfação e muitas vezes ocasionando mesmo prejuízos
aos usuários e o meio processual torna-se o único capaz de solucionar os conflitos.
José Geraldo Brito Filomeno185 ensina que se admitem todas as espécies de ações que
sejam capazes de garantir a adequada e efetiva tutela do interesse público nas relações de
consumo, dependendo dos legitimados que se valerão de institutos novos para tal fim, de
modo que o importante é a busca permanente de proteção da sociedade.
Sendo o processo instrumento capaz de alcançar um provimento judicial em busca da
efetiva justiça, o Estado, dessa forma, visa a satisfação do interesse público, corroborado pelo 184 JUSTEN FILHO, Marçal. Concessões de serviços públicos. São Paulo: Dialética, 1997, p.33. 185 FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de direitos do consumidor. 7.ed. São Paulo: Atlas, 2004, p.361.
100
ensinamento de Cássio Scarpinella Bueno186 que afirma ser o processo constituído da lide
qualitativa do interesse das partes, razão pela qual o fim é alcançado pelos mais diversos
meios, porém, em se tratando de lide como o Poder Público, pode ser observado um desvio na
produção das normas pelo fato de ser o próprio ente estatal quem cria as mesmas.
A par do apresentado, fica evidente que o atendimento ao interesse público significa a
satisfação das necessidades da coletividade que, formada pelos mais diversos tipos de
sujeitos, possui os mais variados interesses, e para que se mantenha a ordem e a paz social, o
Estado, no exercício de sua soberania, busca atender aqueles que garantam o bem-estar geral.
Neste sentido, o Poder estatal, atento às necessidades sociais, disponibiliza à
coletividade meio que lhes dê a oportunidade de reivindicar os direitos que possam ter sido
lesados, seja pela inexecução ou pela prestação indevida, é, a partir daí, que o processo
assume papel importante para a garantia do atendimento ao interesse público.
Diante disso e pelo preceito fundamental presente no Art. 5º, inciso XXXII da
Constituição Federal, aos consumidores, entre eles os usuários de serviços públicos, será
garantida pelo Estado a devida proteção de seus direitos, daí porque a existência do interesse
público na resolução dos conflitos desta natureza.
3.2.2 Finalidade e Efetividade do Processo
O caminho percorrido pela jurisdição ao longo do tempo é tema de debates entre os
processualistas, eis que ela nem sempre atende os interesses sociais e não alcança a almejada
paz social, isto graças a maneira como o processo tem se colocado a serviço desta finalidade,
pois, sabendo-se que a sociedade está em constante desenvolvimento, exigi-se adaptações
constantes dos mais variados setores.
Certo de que o processo trata-se do meio pelo qual o Estado busca a resolução dos
conflitos de maneira justa - pressupõe-se que seja uma das formas mais justas na resolução de
conflitos - para a manutenção da paz social, José Roberto dos Santos Bedaque187 elucida
quanto a suas finalidades, ou seja, a de atribuir ao instrumento processual as condições de agir
sempre visando a igualdade entre as partes, garantia de que cada uma delas se valha de meios 186 SALLES, Carlos Alberto de (Org.). Processo civil e interesse público: o processo como instrumento de defesa social. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p.31. 187 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. São Paulo: Malheiros, 2006, p.77.
101
lícitos para a formação do julgamento, e ainda que o iter processual se dê conforme o direito
material, alcançando resultado satisfatório ao final e no tempo justo para tal.
Antônio Carlos de Araújo Cintra et al188 afirmam que a efetividade do processo
significa a plena busca para se eliminar conflitos e garantir a pacificação social, sendo
necessária a presença dos escopos da jurisdição, ou seja, sociais, políticos, jurídicos, e superar
os óbices que constituem ameaçar a boa e efetiva prestação jurisdicional.
Cumpre ao Poder Judiciário garantir bons resultados no exercício da atividade
jurisdicional, haja vista tratar-se de um comando previsto na Constituição acerca do conteúdo
programático da efetividade processual.
Neste sentido, Hely Lopes Meirelles189 entende que o dever de eficiência corresponde
à realização das atribuições do agente público com presteza, perfeição, rendimento funcional
e com resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades,
inclusive no que diz respeito aos juízes e demais serventuários da justiça em geral que devem
buscar o bem comum com o exercício imparcial, transparente, participativo, eficaz,
qualitativo e sem burocracia, de suas competências, com a melhor utilização possível dos
recursos públicos e maior rentabilidade social.
Luiz Fux190 cita a questão da prontidão desejada no andamento processual e que esta
se ajusta à moderna exegese do princípio da "justiça adequada", porquanto ao preceito
constitucional de que "nenhuma lesão escapará à apreciação judicial" há de corresponder à
tutela célere do direito material. O decurso do tempo diante do direito evidente sem resposta
por si só representa uma "lesão".
A efetividade processual será alcançada com a aplicação dos princípios
constitucionais, razão pela qual José Roberto dos Santos Bedaque191 ensina que a celeridade
somada a estes princípios resultará em um processo efetivo, ressaltando que a fuga de um
processo moroso em demasia não significa dizer que serão desconsiderados os preceitos
fundamentais do processo, demonstrando que em nome da Justiça e da almejada paz social
este deverá passar por modificações visando se tornar mais célere e, consequentemente,
efetivo, porém mantendo um modelo que garanta às partes o exercício de seu direito.
188 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do Processo. 24.ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p.47. 189 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 28.ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p.444/6. 190 FUX. Luiz. Tutela de segurança e tutela da evidência. São Paulo: Saraiva, 1996, p.309. 191 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. São Paulo: Malheiros, 2006, p.49.
102
Tal princípio encontra-se encartado no direito de prestação da jurisdição que varia
conforme a natureza da tutela de que se necessita. O direito à jurisdição não é senão o de obter
uma justiça efetiva e adequada, sendo certo que satisfazer tardiamente o interesse da parte
significa violar o princípio de acesso à justiça.
Dessa forma, o acesso à Justiça, para não se transformar em mera garantia formal,
exige efetividade, tendo íntima vinculação com a questão temporal do processo, a ocorrência
de uma indefinição do litígio pelo decurso excessivo do tempo não contempla à parte o devido
processo legal, ao contrário acarreta um resultado proveniente de indevido processo.
3.2.3 Novas Técnicas para Resolução de Conflitos e a Ordem Jurídica Justa
Em razão da ineficiência dos tradicionais instrumentos colocados à disposição para
resolução dos conflitos jurídicos e, consequentemente, o não cumprimento do objetivo maior
do Estado que é a pacificação social com distribuição de Justiça, gera-se um quadro de
insatisfação por toda sociedade, mesmo que haja instituições sólidas e sob os auspícios do
Regime Democrático de Direito.
Os direitos dos cidadãos, segundo Humberto Theodoro Júnior,192 “saíram do âmbito
das meras declarações solenes para entrar no campo das missões práticas que ao Estado
cumpre implementar”, razão pela qual esta nova postura irá refletir no Estado Democrático de
Direito, como acima salientado, gerando uma evolução do papel estatal, e, especificamente
para esta dissertação, mecanismos concretos e efetivos para resolução dos conflitos jurídicos,
permitindo-se a adoção de novas técnicas para cumprimento deste objetivo.
Para Cândido Rangel Dinamarco193 a técnica processual é um dos escopos do
processo e por isso não pode deixar de ser observada à luz dos institutos processuais que
passaram por inovações metodológicas, assentada em “[...] uma releitura capaz de dar-lhes
modernidade e melhor utilidade social e política”.
O Estado ao inserir no rol dos direitos fundamentais a proteção do consumidor,
demonstrou a necessidade de se colocar em prática os preceitos do Estado Democrático de
Direito, garantindo aos indivíduos uma prestação jurisdicional mais justa e eficiente, e, 192 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Celeridade e efetividade da prestação jurisdicional: insuficiência da reforma das leis processuais. Revista de Processo. São Paulo, ano 30, n.125, jul.2005, p.61. 193 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 3.ed. v.I. São Paulo: Malheiros, 2003, p.136-7.
103
contemporâneo, o Código de Defesa do Consumidor, em consonância com os demais
diplomas, possui técnicas que facultam ao consumidor e ao usuário de serviço público
pleitear judicialmente a resolução de eventuais conflitos.
A temática moderna da efetividade do processo passa pela implementação de novas
técnicas processuais, atribuindo-se tratamento diferenciado a determinados casos concretos, o
que Luiz Fux194 denomina de "direito evidente", sendo que tal expressão vincula-se àquelas
pretensões deduzidas em juízo nas quais o direito da parte revela-se evidente, tal como o
direito líquido e certo que autoriza a concessão do mandamus ou o direito documentado do
exeqüente. Os julgamentos prima facie são constantes na common law, onde os momentos de
criação judicial são mais frutíferos. A tutela do direito evidente pertence ao campo da justiça
e não estritamente ao campo do direito.
O processo atual impõe que o aplicador do direito cumpra os ditames rígidos da lei na
mesma medida em que deva atender as necessidades prementes da sociedade que passa por
alterações numa velocidade vertiginosa. Por isso, certamente que o processo tradicional não
possui condição de acompanhar esta marcha, dependendo de adaptações e da aplicação de
novas técnicas que sejam capazes de torná-lo mais célere, eficiente e acessível a todos.
O alcance de uma ordem jurídica justa, processualmente falando, será possível com a
adoção de mecanismos diferenciados que garantirão nova roupagem ao processo, tornando-o
acessível aos indivíduos, atentando-se para a necessidade de se operarem de maneira
consciente, visto que a busca de uma Justiça por demais acessível pode marginalizá-la a ponto
de levá-la ao descrédito. O processo de fácil acesso e baixo custo pode incitar nas pessoas o
abandono da autocomposição, favorecendo “os espíritos belicosos à prática do ‘demandismo’
caprichoso e desnecessário”, conforme adverte Humberto Theodoro Júnior.195
Nesta esteira, vislumbrando a proteção do usuário-consumidor de serviços públicos, se
podem prever as conseqüências da marginalização do processo, já que não mais haveria
necessidade dos órgãos de proteção e fiscalização, como as Agências Reguladoras, o Procon e
outros que prestam serviços importantes na solução de conflitos nas relações de consumo e
evitam o acúmulo de processos levados à Justiça.
José Carlos Barbosa Moreira196 alerta para a necessidade de se agir com sabedoria e
194 FUX. Luiz. Tutela de segurança e tutela da evidência. São Paulo: Saraiva, 1996, p.305. 195 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Celeridade e efetividade da prestação jurisdicional: insuficiência da reforma das leis processuais. Revista de Processo. São Paulo, ano 30, n.125, jul. 2005, p.74. 196 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Efetividade do processo e técnica processual. Revista de Processo. São Paulo, n.77, jan-mar. 1995, p.170-1.
104
moderação, visto que a efetividade processual é necessária para o atendimento dos interesses
sociais, porém, não se pode colocá-la como uma forma auto-suficiente e solitária de alcançar
a pacificação social. Esclarece que ao se tomar atitudes que visem somente o alcance da
pretensão, pode haver a desconsideração de valores essenciais à sociedade, como o respeito
aos interesses alheios, podendo ocasionar um inevitável desequilíbrio do sistema jurídico.
O Poder Judiciário deve, urgentemente, para contribuir eficazmente com esta
mudança, assumir novo papel, fazendo com que os preceitos constitucionais sejam cumpridos
e, neste sentido, Marcos Jorge Catalan197 esclarece que isto deve se dar em atendimento às
necessidades sociais, visto que os indivíduos buscam soluções efetivas de seus conflitos, na
certeza de que a ordem jurídica justa será alcançada, em cumprimento aos mais nobres
preceitos que proporcionarão a devida humanização da Justiça.
A nova realidade processual exige a adoção de técnicas suficientes a atender os
interesses gerais, sendo que o papel desenvolvido pelos órgãos da Justiça será determinante
para se alcançar este novo tempo, com o compromisso de cumprir fielmente os dispositivos
legais e garantir que a paz social seja mantida através de uma boa prestação jurisdicional.
É com razão a assertiva de Ovídio Araújo Baptista da Silva198 de que se o julgador
somente decidir quando existirem elementos a lhe propiciar um “juízo de certeza”, em
detrimento do direito evidente, "certamente fará com que a sentença se tenha tornado inútil e
tardia, dado que o direito, que exigia proteção imediata, por exposto a um dano irreparável, ao
encerrar-se a demanda, provavelmente não terá mais condições de realizar-se concretamente”.
As novas técnicas adotadas pelo sistema jurídico visam proporcionar ao processo a
consecução de seu fim maior que é a pacificação social, diante de possibilidades diversas às já
conhecidas e muitas vezes ineficientes práticas do Poder Judiciário. A ordem jurídica justa é
algo possível desde que haja um compromisso de todos os setores da sociedade. Sobre o tema
Humberto Theodoro Júnior199 discorre quanto os caminhos úteis para o aprimoramento da
Justiça e entende que de nada vale uma “lei bonita” sem a devida conscientização do
Judiciário como um todo, sendo necessário demonstrar aos “órgãos auxiliares da necessidade
de modernização, impor-lhes normas destinadas a romper a rotina, a ineficiência, o
anacronismo, a lerdeza e a injustiça, que a tanto equivale a justiça tardia”. 197 CATALAN, Marcos Jorge. O princípio da congruência e o acesso à ordem jurídica justa: reflexões sobre o tema na legalidade constitucional. Revista de Processo. São Paulo, ano 32, n.147, maio 2007, p.80. 198 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Curso de processo civil. 3.ed. v.III. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p.55. 199 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Celeridade e efetividade da prestação jurisdicional: insuficiência da reforma das leis processuais. Revista de Processo. São Paulo, ano 30, n.125, jul. 2005, p.72.
105
De acordo com Darci Guimarães Ribeiro200 o direito contemporâneo se preocupou
muito mais com a segurança jurídica do que com a efetividade processual, sendo a
verossimilhança um mecanismo que quebra os paradigmas até então existentes, pois,
alinhando-se com o instrumento processual, garante maior satisfação do direito. Todavia a
aplicabilidade do juízo de verossimilhança não é procedimento fácil, haja vista a antiga crença
pelos magistrados, desde os tempos mais remotos e baseada na herança cartesiana, que a
decisão judicial deve se basear sempre na certeza do fato, contrariando os juízos fundados na
aparência ou verossimilhança do direito postulado.
Repetidas vezes durante esta dissertação se pontuou acerca da necessidade de combate
aos procedimentos que, por terem sido criados em uma fase processual diversa da que se vive
na atualidade, não mais atendem aos ditames do direito subjetivo material, colocando em
xeque a jurisdição, pois a forma e o tempo em que se efetua sua prestação não mais se
coadunam com a real finalidade da Justiça.
É de se destacar o entendimento de Ricardo Mendonça Nunes201 para o qual a
aplicação dos chamados “‘mecanismos aceleratórios do processo’, cujo escopo maior é
conferir celeridade na prestação judicial sem, contudo, abandonar a segurança do
procedimento tradicional”, remete à conclusão que as tutelas lastreadas na cognição sumária
nada mais são do que mais um instrumento de aceleração do provimento jurisdicional.
Outro ponto na ótica das novas técnicas é a fungibilidade procedimental, sendo
mecanismo eficiente para a solução daquelas situações que nem sempre podem ser resolvidas
pelo procedimento tradicional em vista das constantes mutações pelas quais a sociedade
passa, logo, a adoção desta medida autoriza o atendimento de questões que possuam
semelhança sem a necessidade de serem idênticas, podendo-se alcançar a ordem jurídica justa.
Às situações que não podem ser objetivamente atendidas, atribui a doutrina o nome de
zona de penumbra, conforme ilustra José Roberto dos Santos Bedaque,202 devendo o
aplicador do direito ter sempre em conta a necessidade de atendimento aos preceitos
constitucionais, visando a instrumentalidade processual e, consequentemente, sua efetividade.
200 RIBEIRO, Darci Guimarães. A instrumentalidade do processo e o princípio da verossimilhança como decorrência do “due process of law”. Revista de Processo. São Paulo, n.75, jul-set. 1994, p.184-5. 201 NUNES, Ricardo Mendonça. Tutela da evidência: fundamentos teóricos. Disponível na internet em: http://jusvi.com/doutrinasepecas /ver/18453. Acesso em: 09 de abril de 2007. 202 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. São Paulo: Malheiros, 2006, p.121.
106
A fungibilidade do procedimento não existe no sistema processual por sua própria
autonomia, mas, sobretudo, para atender a necessidade de uma justiça mais prática e eficiente,
tangenciando sobre as rígidas regras processuais que engessam todo o procedimento,
autorizando os julgadores saírem de uma posição de inércia e passividade, passando-se a
tomar frente ao direito invocado quando se depararem com a dúvida objetiva quanto ao
instrumento adequado para a defesa dos interesses subjetivos de direito material.
Nota-se que a fungibilidade não é nova no sistema processual brasileiro, uma vez já é
utilizada no direito recursal, e como lá, para sua eficácia, deve ser observada a existência de
dúvida objetiva na medida postulada e também o preenchimento dos pressupostos necessários
para a obtenção da tutela, ou seja, no primeiro caso é necessária estar configurada a dúvida
fundada e razoavelmente comprovada, sendo que no segundo há de se demonstrar a existência
dos requisitos da medida postulada.
Em sede de arremate, devem ser aplicados meios que garantam ao processo judicial
uma reestruturação, não somente com a criação de leis ordenando esta ou aquela medida,
sendo necessário que os estudiosos do direito se preparem para este exercício, deixando para
trás o rigor e o formalismo costumeiros e passando a desenvolver novas técnicas processuais
que se dêem num tempo justo e com respeito aos preceitos fundamentais, garantindo o
atendimento de suas finalidades e o efetivo alcance da ordem jurídica justa.
Para tanto, discutir-se-á adiante tutelas que representam um avanço neste sentido e que
são aplicáveis aos processos de uma forma geral, mas, sobretudo, para o avanço desta
pesquisa, aos conflitos originados nas relações jurídicas entre usuários-consumidores e os
concessionários de serviços públicos.
3.2.3.1 Tutelas Diferenciadas
A busca pela solução mais eficiente de conflitos jurídicos levou os estudiosos do
direito a desenvolver mecanismos processuais que garantissem o atendimento salutar daquelas
situações que não recebiam o tratamento eficaz por meio do ordenamento comum, pois, como
já visto anteriormente em relação ao excesso de formalismo processual, novos meios de
atendimento aos interesses e necessidades dos indivíduos foram criados em busca do efetivo
cumprimento dos escopos do processo, ensejando o surgimento das tutelas diferenciadas.
107
Para André Luiz Vinhas da Cruz203 a conceituação das tutelas diferenciadas depende
da compreensão acerca das tutelas comuns e a partir daí traçar as diferenças entre ambas,
importando dizer como cada uma delas é prestada. Partindo desta premissa, pode-se
considerar tutela comum como aquela prestada por meio dos métodos tradicionais que se
encontram disponíveis aos interessados, nos moldes do procedimento comum, ordinário ou
sumário, no processo de conhecimento.
Sempre que for necessário para o exaurimento da prestação jurisdicional, as tutelas
diferenciadas deverão ser aplicadas. Isto ocorrerá quando o processo tradicional não for
suficiente para o atendimento de todo tipo de pretensão. A incidência destas tem sido muito
grande, já que muitas são as necessidades da sociedade que passa por constantes alterações e
as relações não são imunes, solicitando uma tutela adequada e eficiente.
As tutelas diferenciadas, elucida Humberto Theodoro Júnior,204 representam os novos
tempos, sendo a maleabilidade adquirida ao longo da história. Apesar de ainda não apresentar,
na prática, o ideal esperado pela sociedade, vai ganhando gradativamente o status de
“prestação jurisdicional moderna” e para que isto se torne realidade efetiva é necessário que
os operadores do direito, aspirando a ordem justa, se empenhem na utilização destes novos
recursos que garantirão efetividade ao processo.
Rogério Aguiar Munhoz Soares205 elucida que a tutela diferenciada significa avanço
no ordenamento pátrio, visto que não há a necessidade de se prender a formalismos
rebuscados para alcançar a efetividade processual, ao contrário, as “alternativas ao
demandante em face do processo de cognição exauriente” proporcionam novos meios de
garantia aos interesses dos indivíduos.
Extrai-se, portanto, a compreensão de que as ditas tutelas diferenciadas são aquelas
criadas para viabilizar uma prestação jurisdicional mais eficiente e célere, ao contrário do que
acontece com os procedimentos comuns, especialmente aqueles com efeito condenatório, se
desenvolvendo métodos específicos para o atendimento de conflitos, que em certas situações,
excedem àquelas pretensões do direito material.
203 CRUZ, André Luiz Vinhas da. As tutelas de urgência e a fungibilidade de meios no sistema processual civil. São Paulo: BH Editora, 2006, p.32. 204 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Novos rumos do direito processual civil: efetividade da jurisdição e classificação das ações – ação executiva lato sensu – tutela de urgência. Revista Dialética de Direito Processual. São Paulo, n.26, maio 2005, p.62. 205 SOARES, Rogério Aguiar Munhoz. Tutela jurisdicional diferenciada: tutelas de urgência e medidas liminares em geral. São Paulo: Malheiros, 2000, p.136.
108
Contribuindo para o aclaramento do tema, discorre Rogério Aguiar Munhoz Soares:206
[...] todas as tutelas jurisdicionais operam no plano normativo, mas há algumas que operam precipuamente no plano dos fatos e são tutelas que podem ser atuadas desde logo a partir de cognição sumária. A exacerbação da necessidade de atuação destas últimas tem demonstrado que é preciso desenvolver tais tutelas, por si mesmas diferencias daquelas que apenas atuam no plano normativo (condenatória, constitutiva e declaratória) e em função das quais o processo de conhecimento, eminentemente declaratório, foi construído.
Foi a própria sociedade, em decorrência da evolução que vem passando ao longo dos
tempos, que determinou o surgimento das tutelas diferenciadas, ditas especiais, pois necessita
que a resolução de eventuais conflitos se dê pela forma da urgência e presteza, logo, o
procedimento comum acabou tornando-se inviável diante de sua morosidade e forma pouco
prática para restabelecimento da ordem social.
Segundo Cândido Rangel Dinamarco207 a tutela jurisdicional diferenciada “[...] é a
proteção concedida em via jurisdicional mediante meios processuais particularmente ágeis e
com fundamento em uma cognição sumária”. Neste sentido, deve o magistrado aplicar aos
casos concretos mecanismos que possibilitem uma dinâmica processual diferenciada daquela
que costumeiramente era colocada à disposição, fundada num plano cognitivo exauriente.
Tais decisões, fundadas em sentenças condenatórias não mais se alinham com as
modernas e necessárias metodologias empregadas para a manutenção ou restabelecimento da
ordem social mediante a consecução do processo, pois a simplificação dos procedimentos é
medida de inteira aplicação da justiça, possibilitando, na prática, a tutela efetiva do Estado.
Toda pretensão jurisdicional está fundada no bem da vida, objeto central do direito
material, razão pela qual se busca receber ou reparar aquilo que, por agressão de outrem, a
esfera jurídica fora maculada, logo, a tutela jurisdicional deve ser eficiente para devolver o
status quo ao lesado em tempo razoável e com força normativa, daí porque se diz diferenciada
a tutela que preza pela maior celeridade na prestação de um resultado efetivo.
Luiz Guilherme Marinoni208 leciona que as “[...] tutelas diferenciadas são necessárias
para assegurar o exercício do direito à adequada tutela jurisdicional [...]”, elas representam o
206 SOARES, Rogério Aguiar Munhoz. Tutela jurisdicional diferenciada: tutelas de urgência e medidas liminares em geral. São Paulo: Malheiros, 2000, p.141. 207 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 3.ed. v.III. São Paulo: Malheiros, 2003, p.737-8. 208 MARINONI, Luiz Guilherme. A reforma do CPC e a efetividade do processo (tutela antecipatória, tutela monitória e tutela das obrigações de fazer e de não fazer). Revista Gênesis – Revista de Direito Processual Civil. Curitiba, ano I, n 1, jan-abr. 1996, p.89.
109
poder do Estado, proibindo que os indivíduos busquem a autotutela, e para isso deve oferecer
meios adequados e eficientes para o alcance da ordem jurídica justa, através de “[...] um
procedimento estruturado de modo a lhe fornecer uma tutela efetiva, não meramente formal
ou abstrata, do seu direito [...].”
Arrematando o assunto, Humberto Theodoro Júnior209 afirma que as tutelas
diferenciadas não criam novas ações ou procedimentos, apenas dão nova roupagem àqueles já
existentes, ou seja, “alteram o ritmo natural dos procedimentos clássicos”.
A tutela jurisdicional surgiu para o bem do homem, para cumprir o fim deve fornecer
à sociedade meios de solução dos conflitos, porém, em razão das grandes alterações sofridas
ao longo do tempo e por nem sempre o legislador conseguir atender de pronto as exigências
sociais, motivando a edificação das tutelas diferenciadas, campo amplo de aplicação, já que
estas, de maneira eficiente e rápida, garantem o exaurimento necessário ao processo.
3.2.3.2 Tutela Inibitória
O interesse social se volta para a satisfação das necessidades dos indivíduos,
necessidades estas que, quando ameaçadas ou mesmo lesadas, devem buscar o amparo da
proteção jurisdicional. Mais simples, porém, seria se antes de remediar qualquer situação
fosse possível a prevenção do mal, sendo esta a natureza jurídica da tutela inibitória, ou seja,
inibir o ato lesivo incidente sobre a esfera jurídica da pessoa.
A Constituição Federal em seu Art. 5º, XXXV, ao garantir aos indivíduos o direito à
tutela adequada, passa a abonar a tutela preventiva, bem como o Art. 84 do Código de Defesa
do Consumidor, o que dá à tutela inibitória um caráter mandamental, visto que por meio de
uma ordem coage o réu ao cumprimento do determinado na sentença.
A parte deve demonstrar o risco que poderá sofrer diante da continuação ou repetição
do evento danoso, e para isso não encontra grandes dificuldades, pois que se trata de algo que
já ocorreu em outro momento e como se busca a prevenção, o pedido se exaure à partir do
momento em que a proteção é concedida afastando o perigo do dano.
209 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Novos rumos do direito processual civil: efetividade da jurisdição e classificação das ações – ação executiva lato sensu – tutela de urgência. Revista Dialética de Direito Processual. São Paulo, n.26, maio 2005, p.59.
110
Cândido Rangel Dinamarco210 preceitua que a tutela inibitória, denominada de tutela
preventiva, é aquela que visa proteger o direito contra ameaça de violação, através da
cominação de medidas processuais ou condutas que vinculem as atitudes do obrigado.
Fazendo remição ao Direito do Consumidor brasileiro, o jurista italiano Giuseppe
Tarzia211 leciona sobre os efeitos da tutela inibitória no sentido de que ela é um instrumento
de proteção aos consumidores, uma vez que a decisão judicial fará coisa julgada erga omnes,
possibilitando a defesa de interesses coletivos pertencente a um mesmo grupo, categoria e ou
classe de pessoas.
A função preventiva da tutela inibitória lhe garante a característica de prevenir que
ocorra a repetição, continuação ou mesmo prática do evento danoso, diversamente da tutela
ressarcitória que visa a compensação do dano ocorrido, assim Luiz Guilherme Marinoni212
esclarece que tutela preventiva “destina-se a garantir a integridade do direito em si”.
As relações sociais cada vez mais massificadas exigem do sistema jurisdicional meios
que lhe assegurem os direitos sem a necessidade da utilização do velho e desacreditado
processo de conhecimento, entre eles a tutela inibitória atua de maneira contemporânea visto
que atua na prevenção do dano, sobretudo aquele que não possua conteúdo patrimonial.
O usuário-consumidor tem direito a inibir conduta de fornecedor visando resguardar
sua segurança, assim, no caso de ser anunciado produto ou serviço capaz de causar danos aos
seus usuários, como um agrotóxico, com informações insuficientes quanto aos riscos em sua
utilização, pode, por meio da ação inibitória, impedir seja este comercializado ou mesmo
retirá-lo do mercado, evitando que o fornecedor não viole os direitos do consumidor lhe
causando maiores prejuízos.
Demonstrou mais uma vez seu pioneirismo o Tribunal de Justiça gaúcho, em
julgamento recente de Agravo de Instrumento interposto pela Renault do Brasil S.A. em face
de Ação Coletiva movida pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, não
acolhendo o recurso porque a atitude da montadora feriu os preceitos do Código de Defesa do
Consumidor, causando danos aos consumidores, tendo deferido liminar proibindo a
comercialização de veículos que contivessem “denominação de lançamento do próximo ano
210 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 3.ed. v.I. São Paulo: Malheiros, 2003, p.154. 211 TARZIA, Giuseppe. La tutela inibitória contro le clausole vessatorie. Revista de Processo. São Paulo, ano 29, n.114, mar-abr 2004, p.142. 212 MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória: individual e coletiva. 2.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p.28.
111
sem que efetivamente esse veículo seja produzido no ano mencionado, pena de incidência de
multa diária de R$ 10.000,00 por veículo comercializado, montante que deverá ser revertido
em favor do fundo de reconstituição de bens lesados, nos termos da Lei nº. 7347/85”.213
Neste caso, o Tribunal fundamentou sua decisão nos Arts. 461, §§ 4º e 5º do Código
de Processo Civil, no Art. 84, § 4° do Código de Defesa do Consumidor e no Art. 12 da Lei nº
7.347/85 que garantem a tutela por meio da ordem mandamental, uma vez que seus efeitos se
prolongam no tempo e se adequa à tutela inibitória, evitando-se que novos danos sejam
causados aos consumidores, inibindo novas condutas ilícitas da empresa fornecedora.
Adotando uma posição preventiva o legislador atua no sentido de que é mais
vantajoso manter a paz social do que buscar seu restabelecimento após a ocorrência do dano,
pois, certamente haverá maior efetividade processual, posto que os conflitos serão resolvidos
sem a necessidade dos muitas vezes sofríveis e cansativos ressarcimentos e reparações que
acabam por invadir o patrimônio dos indivíduos.
3.2.3.3 Tutela Mandamental
A busca pela efetividade e satisfação dos resultados processuais encontra-se
demonstrada nos Arts. 461 e 461-A do Código de Processo Civil, sendo, nas sentenças
relativas a não-fazer, fazer e entrega de coisa, dispensada a execução da decisão,
demonstrando o legislador seu interesse em adaptar à realidade do sistema pátrio novas
técnicas em busca de uma ordem jurídica justa.
Sobre a tutela mandamental leciona Luiz Guilherme Marinoni214 que esta surgiu à
partir da necessidade de se garantir o cumprimento das obrigações de não-fazer, fazer e
entrega de coisa impostas na sentença, assim, os Arts. 461 e 461-A do Código de Processo
Civil, garantindo a prestação jurisdicional. A combinação destes dispositivos com o Art. 84
do Código de Defesa do Consumidor possibilita ainda que o juiz, ex officio, a qualquer tempo,
imponha ou modifique o valor da multa, podendo também, caso seja necessário, aplicar nova
medida executiva, observando-se, contudo, o princípio da proporcionalidade.
213 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. AI nº 70019547140, Décima Câmara Cível, Rel. Des. Luiz Ary Vessini de Lima, Porto Alegre, 25 de outubro de 2007. Disponível na internet em: http://www.tj.rs.gov.br. Acesso em: 10 de maio de 2008. 214 MARINONI, Luiz Guilherme. As novas sentenças e os novos poderes do juiz para a prestação da tutela jurisdicional efetiva. Revista Gênesis – Revista de Direito Processual Civil. Curitiba, n.29, jul-set. 2003, p.552.
112
O princípio da proporcionalidade objetiva garantir aos indivíduos o atendimento de
suas necessidades por meio de uma solução justa, em conformidade com as normas
constitucionais, viabilizando a harmonia do sistema e buscando a manutenção da ordem
jurídica justa, neste sentido atuará o juiz com poderes ampliados, podendo prestar de maneira
mais adequada a tutela jurisdicional, o que resulta em processos mais ágeis e eficientes.
Dentre as importantes tutelas diferenciadas utilizadas no sistema processual civil
pátrio, estão aquelas contidas no Art. 461 e 461-A do Código de Processo Civil que dá um
tratamento diverso às tutelas das obrigações de fazer e não-fazer com intuito único de se obter
a efetividade do provimento jurisdicional. Neste sentido, pode-se afirmar que:
A tutela ressarcitória na forma específica sempre foi admitida pelo direito material. O que faltava eram técnicas processuais capazes de conferir-lhe real efetividade. O que não existia, em outras palavras, eram os arts. 461 e 461-A do CPC e 84 do CDC. [...] Essa modalidade de ressarcimento, segundo o direito material, pode se dar mediante um fazer ou a entrega de coisa da mesma espécie da destruída.215
Kazuo Watanabe216leciona sobre a aplicação do Art. 84, § 4° do Código de Processo
Civil, na utilização desta tutela específica para a defesa do consumidor, assim discorre sobre a
ampliação dos poderes do juiz, permitindo que este se valendo de sua discricionariedade
aplique, ao caso concreto, a medida necessária alcançar o “[...] equilíbrio entre o direito e a
execução respectiva [...]”. Para que esta ampliação de poderes não passe somente de letra em
benefício à celeridade do processo, os juízes devem estar treinados para por em prática, seus
conhecimentos jurídicos em conformidade com a realidade social, tutelando os consumidores
em consonância com a ordem jurídica justa.
Os doutrinadores capixabas Flávio Cheim Jorge e Marcelo Abelha Rodrigues assim
destacaram a importância desta tutela:
[...] Para tanto, na tentativa de conseguir com que o processo deva proporcionar a quem tem direito tudo aquilo e somente aquilo que o jurisdicionado tem o direito de obter, foi que o legislador criou mecanismos no art. 461, tais como medidas coercitivas, incremento dos poderes do juiz, tentativa da obtenção do resultado prático equivalente caso não seja viável a tutela específica, e, principalmente, de considerar a conversão da obrigação em perdas e danos como medida subsidiária ao resultado prático equivalente, salvo quando essa for a escolha do credor (art.461, §1º). [...]217
215 MARINONI, Luiz Guilherme. A tutela específica do consumidor. Jus Navigandi. Teresina, ano 8, n. 251, mar. de 2004. Disponível na internet: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp. Acesso em: 03 de junho de 2008. 216 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p. 862-3. 217 SHIMURA, Sérgio; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (coord.). Processo de execução. v.2. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p.361.
113
A mandamentalidade, por meio da imposição de multa, buscará inibir a prática de
ilícito. Exemplificando o exposto, supõe-se que em uma grande cidade é concedido à
iniciativa privada a prestação da coleta de lixo doméstico. Quando da concessão, foram
traçadas metas, a médio prazo, para garantir ao aterro sanitário municipal a conservação
ambiental necessária, com a coleta de lixo reciclável. No entanto, a empresa logo demonstra
sua falta de interesse em cumprir tal parte do contrato e, por omissão, deixa que o aterro se
transforme num local propício a todos os tipos de doenças, retirando qualquer possibilidade
de se ter um meio ambiente sustentável.
A sociedade, por meio do Ministério Público ou outro legitimado, ajuízam demanda
requerendo seja a situação solucionada com urgência, podendo ocasionar na caducidade do
contrato de concessão, o que oneraria a Administração Pública, visto que lhe seria oneroso
retomar a execução do serviço. O juiz da causa analisando a situação determina a aplicação
dos Arts. 461 e 461-A do Código de Processo Civil e Art. 84 do Código de Defesa do
Consumidor impondo medida coercitiva com o pagamento de multa, visando o cumprimento
do determinado judicialmente, em busca da ordem jurídica justa sem a necessidade do longo
tempo percorrido normalmente pelos processos.
A imposição da multa tem por escopo assegurar o atendimento efetivo dos termos da
sentença, tendo os Tribunais decidido que a Administração Pública também está sujeita a seu
cumprimento, visto que ela atua como meio coercitivo, impondo a satisfação de uma medida
antecipatória ou de sentença definitiva de obrigação de fazer ou entregar coisa, nos termos dos
Arts. 461 e 461-A do Código de Processo Civil. Com base neste entendimento é a
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, conforme os precedentes seguintes: AgRg no
Ag 646240/RS, 1ª Turma, Min.José Delgado, DJ de 13.06.2005; RESP 592132/RS, 5ª Turma,
Min. Jospe Arnaldo da Fonseca, DJ de 16.05.2005; AgRg no RESP 554776/SP, 6ª Turma,
Min. Paulo Medina, DJ de 06.10.2003; AgRg no REsp 718011/TO, 1ª Turma, Min. José
Delgado, DJ de 30.05.2005.218
Esclarece Luiz Guilherme Marinoni219 que a imposição da multa na tutela
mandamental tem efeito de dar efetividade à tutela, não visa simplesmente condenar à simples
entrega de dinheiro, como se esta fosse a única finalidade do processo, não há condenação da
218 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Resp. nº 770.295-RS, Primeira Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Brasília, 10 de outubro de 2005. Disponível na internet em: http://www.stj.jus.br. Acesso em: 08 de abril de 2008. 219 MARINONI, Luiz Guilherme. As novas sentenças e os novos poderes do juiz para a prestação da tutela jurisdicional efetiva. Revista Gênesis – Revista de Direito Processual Civil. Curitiba, n 29, jul-set. 2003, p.555.
114
parte e simples um meio de lhe impor o cumprimento da sentença, porém, não o fazendo esta
se converterá em sanção punitiva pecuniária, com a execução forçada. A multa, na verdade,
busca desestimular o inadimplemento, o Poder Público quando demandado também estará
sujeito à tutela mandamental.
Esta medida dá ao juiz, na sentença, poderes para compelir a parte vencida, no menor
espaço de tempo, a satisfazer a obrigação avençada, sob pena de multa diária. Assim, não
restam dúvidas que a sentença mandamental possui grande força, representando inovação no
processo, sendo de grande relevância também ao usuário-consumidor que dela poderá se valer
para garantir o cumprimento da obrigação, pois, infelizmente o que se vê na prática é um
desrespeito ao Poder Judiciário, o que acaba por relegar o processo à inutilidade.
3.2.3.4 Tutela Executiva Lato Sensu
É também forma moderna de prestação da tutela jurisdicional a tutela executiva lato
sensu, facultando ao magistrado de, no próprio processo de conhecimento, dar efetividade ao
direito, visto que, quando esta é processada separadamente corre sérios riscos de não alcançar
seu fim. A técnica permite ainda que o juiz aplique, caso necessário, a multa, coagindo a parte
vencida a cumprir o avençado na sentença, dando ensejo a uma nova forma de compreensão
do processo, mais eficiente em atendimento às reais necessidades da sociedade.
Diferentemente das ações condenatórias, onde se busca o reconhecimento do direito
subjetivo violado e, posteriormente, obrigando o vencedor a executar a decisão para satisfazer
sua pretensão, nesta modalidade de tutela, a sentença condenatória constituir-se-á em título
autorizador para o fiel cumprimento da ordem judicial, facultando ao magistrado impor, nos
mesmos autos, medidas executivas amplas.
Humberto Theodoro Júnior220 discorre sobre o tema para demonstrar a tendência atual
do Direito ao se aplicar as novas tutelas que garantirão efetividade à prestação jurisdicioanal,
abandonando técnicas tradicionais e rígidas da sentença condenatória que permitirão ao juiz
maior autonomia processual por meio de “[...] atos necessários a compelir o obrigado a
realizar a prestação devida, ou a substituí-lo nessa implementação, sem necessidade alguma
de ulterior processo autônomo de execução.”
220 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Novos rumos do direito processual civil: efetividade da jurisdição e classificação das ações – ação executiva lato sensu – tutela de urgência. Revista Dialética de Direito Processual. São Paulo, n.26, maio 2005, p.34.
115
O conteúdo da sentença executiva não será diverso do conteúdo da condenatória visto
que ambas exigem um seguimento da atividade jurisdicional, sendo neste ponto a distinção
entre ambas. A primeira será cumprida de forma simplificada, expedindo-se de pronto o
respectivo mandado judicial para cumprimento do teor da decisão prolatada. No caso da
segunda, após a sentença, será necessário, para satisfação do direito, o ajuizamento de ação de
execução autônoma, causando uma morosidade na efetividade da prestação jurisdicional.
Neste sentido é o entendimento de Edson Ribas Malachini221 ao afirmar que a “[...]
eficácia executiva da sentença se exerce sem que haja necessidade da prática de um ato
material sequer: a sentença, por si só, uma vez que se torna imutável (com o trânsito em
julgado), produz o resultado esperado coma a propositura da demanda [...].” Exemplo disso é
o que se dá na prestação de declaração de vontade prevista no Art. 641 do Código de Processo
Civil e nas Ações de Despejo onde se operam efeitos imediatos da sentença executiva.
A sentença executiva lato sensu significará uma garantia adicional para o
cumprimento do conteúdo da sentença condenatória, por meio da qual o juiz determinará a
forma como a sanção judicial se constituirá. Desse modo, ao deixar de cumprir a condenação,
o réu incorrerá, inicialmente, em atos expropriatórios de natureza civil e prosseguirá segundo
as regras processuais. Caso ocorra a inexequibilidade da sentença por não haver meios de
solvê-la e, dessa maneira, não satisfazer a função executiva da Justiça, restará ainda ao
obrigado responder pelo delito de desobediência da ordem judicial.
As vantagens oferecidas aos usuários-consumidores pela tutela executiva lato sensu
encontram-se albergadas no Art. 84 do Código de Defesa do Consumidor e permitem uma
resposta mais efetiva à violação de suas garantias constitucionalmente estabelecidas, pois,
faculta ao juiz a adoção das medidas que reputar necessárias para a obtenção do resultado
prático específico.
Para Kazuo Watanabe222, a grande vantagem da tutela executiva lato sensu será a
possibilidade de garantir que na própria ação de conhecimento seja executada a ordem
judicial, dispensando ação autônoma de execução.
Na prática os resultados, entre outros, são:
a) eliminação da propositura da execução forçada por meio de nova petição inicial, após a sentença;
221 MALACHINI, Edson Ribas. As ações (e sentenças) condenatórias, mandamentais e executivas. Revista de Processo. São Paulo, ano 30, n.125, jul. 2005, p.46. 222 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p. 865.
116
b) abolição da citação executiva: a ordem de cumprimento e a assinatura de prazo de pagamento, se for o caso, se fazem na própria sentença;
c) desaparecem os embargos à execução, bem como os embargos de retenção por benfeitorias, porque, sendo unitário o procedimento, toda a matéria de defesa haverá de ser produzida antes da sentença;
d) a prova de pagamento ou de outras causas de extinção da dívida, para encerramento da execução, far-se-á por meio de simples petição do executado;
e) as argüições de falta de pressupostos processuais ou de ausência de condições de procedibilidade, também serão veiculadas por simples petição executado.223
Conclui-se, portanto, que as tutelas executivas lato sensu, doutrinariamente, podem ser
úteis na resolução de conflitos jurídicos, não tendo alcançado, porém, os resultados práticos
almejados, dependendo de maior aprofundamento sobre a temática, especificamente, no que
tange aos direitos dos usuários-consumidores de serviços públicos, em que pese as reais
vantagens que possui sobre a ação autônoma de execução da sentença condenatória.
3.2.4 Facilitação da Defesa dos Direitos dos Usuários-Consumidores
O Código de Defesa do Consumidor ao garantir a tutela do interesse público
demonstrou a preocupação com os interesses transindividuais, já que estes passaram a ser algo
presente na vida da sociedade, fazendo com que o legislador garantisse sua proteção judicial e
entre os interesses tutelados a figura do consumidor mereceu atenção especial em virtude do
crescente número de relações de consumo que surgiam e em contrapartida da grande diferença
entre consumidor e fornecedor, bem como quanto à realidade cada vez mais presente de que
este poderia ser o causador de prejuízos para um número, muitas vezes indeterminado, de
pessoas respectivamente.
Sendo o consumidor a parte frágil da relação de consumo, o legislador garantiu-lhe
que no Código de Defesa do Consumidor fossem viabilizados meios eficazes de prevenção e
reparação dos possíveis danos sofridos em decorrência das relações de consumo, dessa
maneira, demonstrou-se a garantia do interesse público, possibilitando aos próprios
consumidores e aos órgãos de defesa a chance de valerem-se da tutela jurisdicional para
assegurar a resolução de conflitos daí decorrentes.
223 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Novos rumos do direito processual civil: efetividade da jurisdição e classificação das ações – ação executiva lato sensu – tutela de urgência. Revista Dialética de Direito Processual. São Paulo, n.26, maio 2005, p.49.
117
Leciona Ada Pellegrini Grinover224 que o Código de Defesa do Consumidor
possibilitou grande alteração na situação dos consumidores, já que estes eram relegados a uma
posição “[...] pulverizada, isolada, enfraquecida perante a parte contrária que não é como ele,
um litigante meramente eventual [...]”, assim a adoção de novas técnicas possibilitaram ao
ordenamento uma ampliação na forma de garantir a proteção do consumidor, parte vulnerável
na relação de consumo.
Kazuo Watanabe225 ensina que o legislador na observância dos diversos conflitos
surgidos em virtude da evolução da sociedade, em busca do atendimento das pretensões de
fazer e não fazer que nasceram à partir da economia baseada nas relações jurídicas coletivas e
prestação de serviço, criou mecanismos processuais que pudessem moldar-se a exigência do
direito e que pudessem satisfazer o interesse público.
O advento da Constituição Federal, esclarece José Marcelo Menezes Vigliar,226
inaugurou nova fase no sistema jurídico pátrio, até então somente o indivíduo era considerado
centro de atribuição jurídica e a legislação era baseada nesta proteção, mas diante das
necessidades de uma sociedade massificada, foi necessária a adaptação de tutelas que
pudessem garantir a defesa dos interesses coletivos, inclusive com a criação do Código de
Defesa do Consumidor.
Vivendo em sociedade o homem está sujeito aos mais variados tipos de relações de
consumo, desde as mais simples, como quando compra um doce na padaria, quanto as mais
complexas, ao realizar grandes negócios. Em todos os casos, porém, será necessário um
regramento que garanta a segurança jurídica, diminuindo ou resolvendo conflitos, assim, com
a aplicação das mesmas, presta o Estado a tutela jurisdicional necessária, visto que o
consumidor encontra-se em posição inferior e para que as relações não se tornem ainda mais
desequilibradas, as regras consumeristas visam lhes atribuir paridade.
Aceita a importância da tutela jurisdicional, tem-se a instrução de José Roberto dos
Santos Bedaque227 de que esta atenderá realmente aos ensejos da coletividade à partir da
disponibilização, por parte do Estado, de instrumento apto a garantir a tutela formal e a
proteção real de seu direito, em conformidade com aquilo que ocorreria se houvesse a
satisfação advinda da execução natural da norma. 224 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p. 788. 225 WATANABE, Kazuo. Da cognição no processo civil. 2.ed. Campinas: Bookseller, 2000, p.51. 226 VIGLIAR, José Marcelo Menezes. Tutela jurisdicional coletiva. 2.ed. São Paulo: Atlas, 1999, p.29. 227 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência. 2.ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p.13.
118
A busca pela instrumentalidade e efetividade processuais possibilitou o surgimento de
uma nova mentalidade, pois a sociedade, cada vez mais adaptada às relações em massa, aspira
por novos tempos e neste sentido Kazuo Watanabe228 afirma que não serão somente as
normas, bem como os mecanismos processuais adequados a resolver satisfatoriamente os
conflitos que, milagrosamente, serão capazes de corrigir anos e anos de desigualdades, assim,
afirma que “ao invés do paternalismo do Estado, tenhamos uma sociedade civil mais bem
estruturada, mais consciente e mais participativa, enfim, uma sociedade em que os
mecanismos informais e não oficiais de solução dos conflitos de interesses sejam mais
atuantes e eficazes do que os meios formais e oficiais.”
Portanto, as garantias processuais dos usuários-consumidores correspondem ao
próprio exercício do Estado, que soberano, impõe seu monopólio à coletividade com base no
determinado pela legislação, sendo seu poder-dever adaptar-se às novas exigências sociais
para o atendimento e solução dos conflitos, atuando por meio do instrumento processual que
deve ser célere e eficiente, afastando-se do formalismo rigoroso para atender de maneira
satisfatória aos interesses tutelados com a apresentação de resultados justos e úteis.
3.2.4.1 Responsabilidade Objetiva
Visando garantir proteção ainda maior ao consumidor, o diploma consumerista optou
pela adoção da responsabilidade objetiva dos fornecedores de produtos ou serviços, o que lhe
acarreta, mesmo que inexistente a culpa, a responsabilização pelos danos causados aos
consumidores ou terceiros na relação de consumo, desse modo, assume o fornecedor o dever
de zelar pela segurança do interesse público.
Como regra, a responsabilidade do Código de Defesa do Consumidor é objetiva,
conforme os Arts. 12 e 14, somente podendo ser exonerada a obrigação de indenizar na
hipótese de comprovação das situações elencadas no § 3º do Art. 14 ficando aí estabelecida a
responsabilidade subjetiva do fornecedor.
José Geraldo Brito Filomeno229 elucida que tal instrumento se dá em virtude da
manutenção da segurança dos consumidores, pois os fornecedores ao colocarem o produto ou
228 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p. 791. 229 FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de direitos do consumidor. 7.ed. São Paulo: Atlas, 2004, p.330.
119
serviço à disposição no mercado devem garantir as expectativas de fruição normal dos
mesmos, não podendo os consumidores, diante de sua vulnerabilidade, exercer controle
ostensivo e técnico sobre os produtos e serviços oferecidos e disponibilizados no mercado.
A responsabilidade objetiva adotada pelo Código de Defesa do Consumidor impõe
relação de solidariedade a todos os participantes na produção do produto ou prestação do
serviço, visto que atualmente não há produto ou serviço que não seja oriundo de uma cadeia
produtiva, o que levou o legislador a estipular que aqueles que tenham participado desta seja
de forma direta ou indireta responderão pelos possíveis danos causados ao consumidor.
Pela existência de uma relação de prestação de serviço público, sob o regime de
concessão, a responsabilidade existente entre concessionário e usuário-consumidor é objetiva,
conforme as regras acima estampadas, diversamente da responsabilidade existente entre o
Poder concedente e a empresa concessionária quanto aos danos causados aos usuários-
consumidores ou terceiros, onde aquele responde subsidiariamente em relação a esta, haja
vista que o Estado é responsável pelos atos de seus concessionários à partir do momento em
que entregou a execução do serviço público.
Neste sentido é o que entende Romeu Felipe Bacellar Filho,230 pois cabe ao Estado a
manutenção do bem comum e o atendimento do interesse público, resguardando a ordem
jurídica justa por meio do cumprimento dos princípios constitucionais, ensejando sua
responsabilização subsidiária em função de práticas lesivas, omissivas ou comissivas, dos
concessionários de serviços públicos que vierem causar danos aos usuário-consumidor.
Importante a opinião de Toshio Mukai231 quanto a responsabilidade decorrente da
relação entre concessionário de serviço público e Administração Pública, em que pese o teor
do texto constitucional que não prevê exceções à regra da responsabilidade objetiva. No
entanto, entende que por ser uma relação contratual trata-se de responsabilidade subjetiva,
tendo em vista a existência prévia de vínculo entre as partes, sendo este determinante para a
ocorrência do dano.
A Ministra do Superior Tribunal de Justiça, Eliana Calmon, no Recurso Especial n°
705.203-SP, esclarece que se exige dos concessionários de serviços públicos a execução com
eficiência, de forma contínua e com qualidade (Art. 22 do CDC), visto serem regidos pelas
230 BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. Responsabilidade civil extracontratual das pessoas jurídicas de direitos privado prestadores de serviço público. Interesse Público – Revista Bimestral de Direito Público. São Paulo, ano 2, abr-jun. 2000, p.46. 231 MUKAI, Toshio. A responsabilidade contratual das empresas concessionárias de serviço público é objetiva? Interesse Público – Revista Bimestral de Direito Público. São Paulo, v.28, jun. 2004, p.44-6.
120
regras de responsabilidade objetiva, respondendo pelos prejuízos ocasionados ao usuário-
consumidor decorrentes de defeitos, acidentes ou paralisações. No caso em questão, a
recorrente, pessoa jurídica inadimplente, pleiteou em Juízo a não interrupção do fornecimento
de energia elétrica em face de empresa concessionária de serviço público. O recurso não foi
provido, visto não haver a concessionária tomado atitude que pudesse lesar a usuária,
portanto, legal a suspensão do fornecimento neste caso, visto que trata-se de cobrança por
serviço já usufruído, visando a manutenção do equilíbrio financeiro da relação.232
Em relação à maneira que será apurada a responsabilidade do Estado, esclarece
Antonio Herman de Vasconcellos e Benjamin que esta poderá variar quanto ao modo ou sua
forma de ocorrência, neste sentido se vale do ensinamento dado por:
Se for vício de qualidade por insegurança, aplica-se o art. 14. Se for vício de qualidade por inadequação, afastadas as opções do art. 20, cabe tão-somente indenização, informada pelo disposto no art. 23 (culpa presumida). Isto porque o dispositivo só confere duas alternativas ao consumidor (ao contrário do que sucede no art. 20): execução específica ou indenização. 233
O Estado, conforme a legislação protetiva, tem o dever de prestar serviços ou oferecer
produtos de maneira a atender as necessidades dos indivíduos, por este motivo, em sede de
responsabilidade civil do mesmo, foi adotada a Teoria do Risco Administrativo, onde os
riscos são assumidos pelo Estado, que garantirá aos indivíduos a satisfação de seus interesses
e a reparação pelas prováveis lesões que possa sofrer, mantendo o equilíbrio com base no bem
comum, cabe ao usuário somente a demonstração entre o nexo de causalidade e o dano
patrimonial sofrido, sem a necessidade de demonstrar-se a culpa do ente estatal.
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça proveu de maneira unânime o
Recurso Especial n° 647.710/RJ interposto em face de decisão do Tribunal de Justiça do Rio
de Janeiro que reformou a sentença de primeiro grau que concedeu indenização a filho de
usuária-consumidora falecida em acidente automobilístico ocorrido em rodovia concedida
após atropelamento de animal. O Tribunal carioca entendeu pela inexistência de nexo causal
ao caso, visto que seria praticamente impossível à concessionária e mesmo ao Poder Público
concedente o controle de animais no trecho sob concessão.234
232 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Resp. nº 705.203-SP, Segunda Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, Brasília, 11 de outubro de 2005. Disponível na internet em http://www.stj.jus.br. Acesso em: 08 de abril de 2008. 233 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Manual do consumidor em juízo. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p.96. 234 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Resp. nº 647.710-RJ, Terceira Turma, Rel. Min. Castro Filho, Brasília, 30 de junho de 2006. Disponível na internet em: http://www.stj.jus.br. Acesso em: 10 de junho de 2008.
121
A Administração Pública e, consequentemente, a concessionária de serviço público,
conforme o Art. 37, § 6° da Constituição Federal e Art. 14 do Código de Defesa do
Consumidor, assumem os riscos da execução do serviço público, respondendo pelos ilícitos a
que derem causa, independente se para isso contribuíram por meio de atitude comissiva ou
omissiva, visto que ao usuário-consumidor se torna extremamente difícil demonstrar o nexo
de causalidade entre as conduta da concessionária e do Poder Público concedente e o dano
sofrido, nesta esteira surge a necessidade da aplicação da regra da inversão do ônus da prova,
cabendo aos responsáveis demonstrarem que atuaram diligentemente.
Neste sentido, ensina Celso Antônio Bandeira de Mello235 que:
O concessionário gere o serviço por sua conta, risco e perigos. Daí que incumbe a ele responder perante terceiros pelas obrigações contraídas ou por danos causados. Sua responsabilidade pelos prejuízos causados a terceiros ligados à prestação do serviço governa-se pelos mesmos critérios e princípios retores da responsabilidade do Estado, pois ambas estão consideradas conjuntamente no mesmo dispositivo constitucional, o Art. 37, § 6º [...]. Isto significa, conforme opinião absolutamente predominante no Direito brasileiro, que a responsabilidade em questão é objetiva, ou seja, para que seja instaurada, prescinde-se de dolo ou culpa da pessoa jurídica, bastando a relação causal entre a atividade e o dano. Entretanto, nos casos de danos por omissão, para engajamento da responsabilidade é necessário que tenha havido omissão culposa ou dolosa, a qual, todavia, há de ser havida como presumida, admitindo, entretanto, prova em contrário.
É o entendimento de Zelmo Denari236 ao elucidar que a adoção da Teoria do Risco,
pode, num primeiro momento, demonstrar ter o Estado recebido tratamento privilegiado em
relação aos demais fornecedores, sujeitos às regras do Art. 20 do Código de Defesa do
Consumidor, no entanto, a aplicação da responsabilidade objetiva quando da lesão ocasionada
pela Administração Pública ao usuário-consumidor é passível, independente de culpa, de
compeli-la a restabelecer o mesmo à situação anterior à lesão, assim, é de se compreender que
“[...] a responsabilidade do Estado pelo funcionamento dos serviços públicos não decorre da
falta, mas do fato do serviço público [...]”.
Ao tratar da responsabilidade civil do Estado, Marçal Justen Filho,237 ensina que esta
pode ser retratada por meio de ato comissivo que representa o exercício de uma atividade
incompatível materialmente com o dever de diligência. Em se tratando de ato omissivo
necessário se faz tomar um maior cuidado, posto que a simples inação não é capaz de produzir
235 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 24.ed. São Paulo: Malheiros. 2007, p.736-7. 236 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p.228. 237 JUSTEN FILHO, Marçal. Concessões de serviços públicos. São Paulo: Dialética, 1997, p.139.
122
a responsabilidade civil do Estado. Desta maneira, o dever que o Estado possui é jurídico já
que diz respeito a comportamento e resultado certo, sofrendo as conseqüências da
responsabilidade civil quando deixar de evitar.
A determinação da responsabilidade deve se dar através da existência de regra que
indique a atuação do Estado, demonstrando o fundamento investigado por meio da
previsibilidade do evento danoso, gerando, consequentemente, ao agente público, o dever de
ofício de adotar medidas de cunho preventivo que visem evitar possíveis danos, ou seja, se
agir contrariamente será omisso e negligente.
Neste sentido, aquele que toma para si a responsabilidade da prestação de um serviço,
seja o próprio Estado, seja o concessionário do serviço público, deve obedecer a tudo o que
for necessário e adequado para o cumprimento satisfatório deste, evitando quaisquer danos às
pessoas e ao patrimônio, esclarece Marçal Justen Filho238 que “[...] A ausência da estruturação
adequada do serviço, propiciando a ocorrência do dano, retrata um elemento subjetivo
defeituoso. Não é necessário investigar a existência de uma vontade psíquica no sentido da
ação ou omissão causadoras do dano [...]”.
A princípio, o fornecedor seria o único responsável pelos danos causados ao
consumidor, mas o Código de Defesa do Consumidor, visando evitar injustiças e a
discriminação exagerada desta classe determinou, em seu Art. 25 § 1º, a possibilidade de
solidarizar os responsáveis pelo dano, assim, Rodolfo de Camargo Mancuso239 esclarece que
o sistema de responsabilidade objetiva adotado pela legislação do consumidor determina a
solidariedade ampla dos partícipes de todo o ciclo de produção, caracterizando a
responsabilidade pelos danos causados ao consumidor dos vários fornecedores que tenham
participado, direta ou indiretamente, da relação de consumo ou serviço.
A adoção da regra da responsabilidade objetiva pelo Código de Defesa do Consumidor
significa grande avanço para as relações de consumo, visto possibilitar ao consumidor
contratar com maior segurança, compelindo o fornecedor sempre realizar ações que visem a
melhora de seus produtos e serviços.
Em sede de concessão de serviço público a extensão dessa responsabilidade ao Estado
faz com que o serviço prestado tenha maiores condições de atendimento do interesse público,
visto que além da responsabilidade solidária de concessionária e Administração, esta ainda
tem o dever de fiscalizar a boa execução dos serviços. 238 JUSTEN FILHO, Marçal. Concessões de serviços públicos. São Paulo: Dialética, 1997, p.138. 239 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Manual do consumidor em juízo. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p.80.
123
O que se espera, portanto, com a gradação da responsabilização do concessionário de
serviço público e do Estado, é garantir a recomposição da situação anterior ao dano causado,
de forma que ao usuário-consumidor não haja prejuízo, garantindo o equilíbrio das relações
sociais e a manutenção da ordem jurídica justa.
3.2.4.2 Inversão do Ônus da Prova
O Código de Defesa do Consumidor, dentre os direitos que garantiu aos
consumidores, consagrou no Art. 6º, VIII, o princípio da inversão do ônus da prova que visa,
fundamentalmente, proteger o consumidor considerado vulnerável, poupando-o de possíveis
custas necessárias à demonstração de seu direito.
A legislação processual geral adota a regra de que aquele que alega tem o dever de
prová-lo (Art. 333 do CPC), porém, em sede de direito do consumidor isto se dá de maneira
inversa, tendo o Juiz condições de decidir pela inversão do ônus da prova, desincumbido o
consumidor quando ficar demonstrado sua hipossuficiência ou ainda quando os fatos alegados
presumirem-se verdadeiros.
A justificação para a adoção de tal princípio segundo José Geraldo Brito Filomeno240
relaciona-se a produção em massa, que inviabiliza ao consumidor leigo os conhecimentos,
inclusive técnicos que lhe garantam a isenção de fraudes, vícios e outras informações
suficientes a evitar quaisquer prejuízos. Esta razão pela qual fica claro que o consumidor
vulnerável não é somente aquele que não possua condições econômicas, podendo
perfeitamente ser aquele que, apesar de sua condição financeira abastada, não possui o
conhecimento necessário para evitar o dano.
A alegação do consumidor deverá ser analisada pelo juiz da causa que, após a
verificação da verossimilhança dos fatos e sua incapacidade financeira, poderá, já que não se
trata de um ato obrigatório, inverter o ônus da prova, que, segundo José Luiz Ragazzi241 deve
ocorrer no período de tempo que antecede o despacho saneador, mais precisamente no
momento em que este se dá, assim, o réu terá condições de defender-se de maneira justa.
Dentre os avanços proporcionados pelo Código de Defesa do Consumidor tem-se a
questão da inversão do ônus da prova, adotando exemplo prático pode ser lembrado o 240 FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de direitos do consumidor. 7.ed. São Paulo: Atlas, 2004, p.321. 241 RAGAZZI, José Luiz. A tutela antecipada nas relações de consumo. 1.ed. São Paulo:Editora Juarez de Oliveira, 2002. p.60.
124
ocorrido há pouco tempo, quando que a montadora alemã Volkswagen teve que realizar um
recall de uma série do veículo Fox, por não ter se apercebido que uma pequena argola
utilizada para puxar o banco traseiro era capaz de decepar os dedos da pessoa que o
manuseasse. Levando-se em conta que o fabricante deve ater-se a rígidos padrões de
qualidade, e não o fazendo põe em risco o consumidor, não se admite que além de lesado este
deve ter o dever de provar que agiu sem culpa, e, no caso em questão, demonstrar que não era
sua intenção perder parte de seu dedo.
Assim, o fato do fabricante ter colocado no mercado um produto que causasse risco à
saúde do consumidor é suficiente para a adoção da responsabilidade objetiva que associada à
inversão do ônus da prova, exclui a possibilidade da alegação de que o consumidor agiu com
culpa. Saliente-se que isto não se aplica a qualquer caso, devendo ficar demonstrada a
verossimilhança dos fatos alegados ou sua hipossuficiência, conforme a norma consumerista.
Diferentemente não ocorre nas concessões de serviço público, onde a inversão da
prova é mecanismo de valia na defesa dos direitos dos usuários-consumidores, tendo o
Tribunal Regional Federal da 2ª Região se pronunciado neste sentido ao julgar Recurso de
Agravo de Instrumento em Ação Declaratória de Nulidade de Cláusula Contratual de
concessão de telefonia fixa onde se previa a fixação unilateral de percentual de reajuste
tarifário sem demonstração técnica, destacando a possibilidade da inversão do ônus da prova
por meio da Teoria do Ônus Probatório Dinâmico, nos termos do Art. 6°, VIII do Código de
Defesa do Consumidor.242
Incumbe, portanto, ao fornecedor ou prestador de serviços, inclusive os públicos, se
defender provando a inverdade do alegado ou demonstrando que o consumidor possui meios
de custear o processo, com exceção do disposto no Art. 38 do Código de Defesa do
Consumidor, onde a inversão do ônus da prova é regra e não uma faculdade do juiz em
determiná-la, haja vista que a veracidade das informações cabe a quem as veicula.
3.2.4.3 Desconsideração da Personalidade Jurídica do Concessionário de Serviço Público
A desconsideração da personalidade jurídica consiste no fato de atribuir aos sócios as
responsabilidades patrimoniais da empresa, facultando que os possíveis credores, quando da 242 BRASIL. Tribunal Regional Federal da Segunda Região. AI. nº 69511, Sexta Turma, Rel. Des. Poul Erik Dyrlund, Rio de Janeiro, 11 de novembro de 2005. Disponível na internet em: http://www.trf2.gov.br. Acesso em: 11 de junho de 2008.
125
cobrança do débito, executem o patrimônio pessoal dos sócios naquilo que se estender a
capacidade do capital da sociedade. O ordenamento pátrio visando o atendimento do princípio
da vulnerabilidade, incluiu a desconsideração da personalidade jurídica no Código de Defesa
do Consumidor, inovando, também, neste sentido.
Segundo Osmar Vieira da Silva243 a desconsideração da personalidade jurídica não
ocorre “[...] quando há discordância entre a norma legal e o ato praticado, e sim quando os
atos da pessoa jurídica conflitam com os próprios objetivos atribuídos a esta, ou seja, quando
a um desvio da finalidade da sociedade”.
O Código de Defesa do Consumidor com sua contemporaneidade característica e,
principalmente, por seu escopo maior que é a proteção do consumidor, considerado parte
vulnerável na relação de consumo, adotou o conteúdo disposto no Art. 28 para tratar da
desconsideração da personalidade jurídica que, segundo José Geraldo Brito Filomeno,244 já
vinha sendo adotado pela jurisprudência antes do advento do Código, pois havia a
necessidade de separação da empresa da pessoa do empresário visando fim lícito.
A norma não imputa ao juiz sua adoção, sendo-lhe uma faculdade, esclarecendo Sônia
Maria Vieira de Mello245 que cabe a ele decidir por sua aplicação caso seja demonstrado que o
fornecedor incidiu nas condutas previstas no caput do Art. 28 do Código consumerista, entre
as quais “[...] abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação
dos estatutos ou contrato social que traga qualquer prejuízo ao consumidor [...]”.
Em análise ao § 5º do citado dispositivo legal, verifica-se que o legislador desejou
alargar o alcance da norma ao incluir no texto os termos “sempre que sua personalidade for,
de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores” o que
acaba por dispensar os requisitos do caput do citado artigo, uma vez que a própria autonomia
patrimonial do fornecedor ou prestador de serviço é suficiente para caracterizar situação de
embaraço às prerrogativas do consumidor.246
O instituto da desconsideração da personalidade jurídica foi introduzida no código
consumerista com o fito de prevenir e reprimir as possíveis fraudes ou atitudes ilícitas do
fornecedor ou prestador de serviço, significando uma modalidade indireta de proteção e, ao 243 SILVA, Osmar Vieira da. Desconsideração da personalidade jurídica: aspectos processuais. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p.106. 244 FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de direitos do consumidor. 7.ed. São Paulo: Atlas, 2004, p.331. 245 MELLO, Sônia Maria Vieira de. O direito do consumidor na era da globalização: a descoberta da cidadania. Rio de Janeiro: Renovar, 1998, p. 117-8. 246 GUIMARÃES, Flávia Lefèvre. Desconsideração da personalidade jurídica no código do consumidor: aspectos processuais. São Paulo: Max Limonad, 1998, p.83-4.
126
mesmo tempo, um instrumento processual para fazer cumprir o direito material subjetivo,
alcançando-se, consequentemente, em determinados casos, a efetividade da prestação
jurisdicional.
Nesta esteira, já havia se pronunciado Flávia Lefèvre Guimarães247 afirmando que o
texto do Código de Defesa do Consumidor garante “efetiva e eficaz” proteção ao seu tutelado,
visando alterar o sistema de consumo que não protegia o consumidor adequadamente,
tornando-o passível de sofrer prejuízos com as práticas ilícitas e abusivas dos fornecedores e
prestadores de serviços economicamente mais fortes.
Esclarece Marçal Justen Filho248 que é pessoal a responsabilidade assumida pelo
concessionário de serviço público nos eventuais danos ocorridos em virtude da prestação do
mesmo, pois, com base no Art. 37, § 6º da Constituição Federal, sua responsabilidade é
objetiva, de modo que responderá duplamente quando causar algum dano, seja pelo regime
público, quando relacionado às atividades públicas, ou pelo regime privado, quando forem
estranhas a este plano.
Desse modo, os concessionários de serviços públicos estão abrangidos pela norma do
Art. 28 do Código de Defesa do Consumidor, encontrando-se sujeitos à desconsideração da
personalidade jurídica sempre que violarem os direitos dos consumidores, parte esta
vulnerável na relação de consumo, respondendo com os bens patrimoniais dos sócios naquilo
que exceder ao patrimônio da pessoa jurídica, inclusive no caso dos consórcios formados para
exploração e prestação de serviço público, nos termos do § 3º do artigo acima mencionado.
3.2.5 Defesa Jurisdicional dos Usuários-Consumidores
Após todo enfrentamento esposado e ainda sob este prisma, nada mais perene do que
analisar o acesso à justiça pelos usuários-consumidores de serviços públicos, pois, como já
analisado, é um dos princípios e garantias do processo, seja a nível constitucional ou
infraconstitucional.
A garantia constitucional do direito de ação (Art. 5º, XXXV Constituição Federal)
consiste em assegurar aos cidadãos o acesso ao Poder Judiciário, com suas pretensões a serem
247 GUIMARÃES, Flávia Lefèvre. Desconsideração da personalidade jurídica no código do consumidor: aspectos processuais. São Paulo: Max Limonad, 1998, p.47. 248 JUSTEN FILHO, Marçal. Concessões de serviços públicos. São Paulo: Dialética, 1997, p.276.
127
apreciadas por este. Assim, a garantia à universalidade de processo e da jurisdição, torna-se o
primeiro passo para o acesso à justiça.
Os interessados em resolver qualquer espécie de conflito, têm ao seu dispor o
verdadeiro direito ao processo, corporificado em regras formais do direito processual, mas,
sobretudo, na garantia constitucional do devido processo legal, acima já demonstrada.
Mauro Cappelletti249 ensina que o acesso à justiça não se resume apenas em uma
garantia constitucional. Vai além. Afirma que deve ser observado como sendo um requisito
fundamental, ou seja, “o mais básico dos direitos humanos”, diante de um sistema jurídico
moderno e igualitário que pretenda garantir e não somente atribuir direito extensivo a todos os
cidadãos. Ademais, sua preocupação com a efetividade da tutela jurisdicional já havia sido
discutida, pois, segundo seu entendimento, o acesso à justiça não pode ser entendido apenas
como um direito social fundamental, mas, sobretudo, como ponto central da moderna
processualística.
Destarte, resulta claro a importância de se estabelecer novas dinâmicas processuais
com o firme propósito de garantir o verdadeiro acesso à justiça a todos aqueles que porventura
necessitarem, bem como tutelas efetivas e ágeis no sentido de se obter uma prestação
jurisdicional adequada aos interesses social, político e econômico.
Kazuo Watanabe250 se mostra preocupado com o tema em discussão, vez que faz
referência direta à facilitação do acesso à justiça pela população mais carente sendo que a
criação dos Juizados Especiais de Pequenas Causas, atualmente Juizados Especiais Cíveis
(Lei n° 9.099/95) objetivava propiciar a resolução dos conflitos jurídicos desta camada social
e não resolver “a crise da justiça, sua morosidade e ineficiência”, porém, não é o que se
enxerga nos dias de hoje, pois da forma que estão estruturados, com a ampliação de sua
competência, os Juizados perderam a sua função primária que era a de facilitar o acesso à
justiça e a celeridade na resolução das lides.
Adstrita a discussão acerca da proteção jurisdicional do consumidor, o direito de
acesso à justiça ganha relevo especial, haja vista que a partir do advento da Constituição
Federal em vigência, entre os deveres do Estado brasileiro está a defesa do consumidor, além
de figurar junto aos princípios da atividade econômica.
249 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Tradução: Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Fabris, 1988, p.12/3. 250 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p.817-8.
128
Assim, o legislador ordinário ficou encarregado da regulamentação, o que culminou na
edição do Código de Defesa do Consumidor, norma diretiva aplicada às relações de consumo,
contendo, inclusive, uma parte processual a ser utilizada nas ações para tutelar o direito dos
consumidores, restando o Código de Processo Civil como norma de aplicação subsidiária.
Observando-se a parte processual do Código de Defesa do Consumidor é de se
concluir que o acesso à justiça está delineado sob dois prismas, a tutela individual e a coletiva,
sendo que esta última ganhou importância significativa a partir de então, sendo ferramenta
essencial na resolução de conflitos de interesses em suas mais variadas esferas jurídicas.
O Código de Defesa do Consumidor trouxe ao sistema jurídico brasileiro uma
inovação quanto o acesso à justiça pelos usuários-consumidores de serviços públicos, como
em toda órbita consumerista, passa também pela legitimação do Ministério Público a intervir
na defesa e proteção do consumidor consoante imposição dos Arts. 127, caput e 129, III da
Constituição Federal e Arts. 81 e 82 da Lei n° 8.078/90.
À respeito, Hugo Nigro Mazzilli251entende que o Ministério Público deve fazer a
defesa dos interesses difusos e coletivos e pode também fazê-la com relação aos interesses
individuais homogêneos, pois o espírito do legislador constituinte foi o da proteção social do
consumidor, edificada antes mesmo da vigência do Código de Defesa do Consumidor que
veio garantir o caráter de ordem pública e interesse social das relações de consumo.
O Código de Defesa do Consumidor ao legitimar concorrentemente o Ministério
Público seguiu a orientação da Lei n° 7.347/85 (Ação Civil Pública) para a defesa dos
interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, ratificando que estes últimos não
deixam de ser de interesse coletivo lato sensu, pois, desde que tenha repercussão coletiva, a
defesa deverá ser sempre realizada.252
Portanto, o acesso à justiça por se tratar de uma garantia constitucional deve receber a
importância que realmente possui, como a criação de normas e mecanismos que autorizem os
usuários-consumidores a discutirem suas pretensões em Juízo, demonstrando o grande avanço
ocorrido por meio da garantia constitucional, porém, há a necessidade de que esta regra tenha
efetividade, observando-se as tutelas individuais e coletivas, na forma de uma prestação
jurisdicional que realmente seja capaz de satisfazer os interesses dos mesmos.
251 MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo. 14.ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p.162. 252 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE. nº 163.231-SP, Pleno, Rel. Min. Maurício Corrêa, Brasília, 26 de fevereiro de 1997. Disponível na internet em: http://www.stf.jus.br. Acesso em: 03 de junho de 2008.
129
3.2.5.1 Direitos Difusos
A tutela difusa, em que pese a novidade de seu tratamento pelo ordenamento jurídico
brasileiro, é algo inerente às necessidades básicas do ser humano, dessa feita, está relacionada
com a vida da coletividade em geral, com o alcance e manutenção de direitos, que, quando
lesados, acarretam danos a um sem número de indivíduos.
Os direitos difusos são os transindividuais, consoante disposto no Art. 81, I do Código
de Defesa do Consumidor. Neles há a indeterminação absoluta dos titulares, de modo que um
indivíduo não possui ligação com os demais, são direitos indivisíveis, ou seja, todos os
tutelados mesmo que sem ligação entre si possuem os mesmos direitos, assim, o benefício ou
a lesão, alcançará a todos por igual. Frise-se que dos direitos difusos não podem fazer parte do
patrimônio de um indivíduo. A defesa jurisdicional se dará sempre através da substituição
processual, de modo que o sujeito ativo não será o sujeito de direito material, sendo o objeto
para ele indisponível.253
José Marcelo Menezes Vigliar254 elucida que esta característica de indivisibilidade
reporta aos interesses análogos de uma categoria de pessoas, que pode ser ou não numerosa, o
que dificulta a quantificação destas e a quem o direito realmente pertença, o que impele a
tutela geral, dessa maneira, os direitos são considerados “de todos e de ninguém com
exclusividade”.
Importante ressaltar a opinião de Rodolfo de Camargo Mancuso255 quanto ao equívoco
que normalmente ocorre em relação à conceituação dos direitos difusos. Isto se dá em relação
ao fato de se acreditar que os interesses difusos estejam necessariamente relacionados a
coletividade de expressão numérica, no entanto, por tratar-se de um direito em potencial estes
tem o condão de proteger e mesmo que hipoteticamente vise alcançar número indeterminado
de indivíduos, na realidade pode estar atingindo uma pequena parcela, ou mesmo somente um
deles, diante de sua necessidade.
Prossegue o autor esclarecendo quanto a sua anteposição ao conceito formalizado pelo
Art. 81 do Código de Defesa do Consumidor:
253 ZAVASCKI, Teori Albino. Defesa de direitos coletivos e defesa coletiva de direitos. Revista de Processo. São Paulo, ano 20, n.78, abr-jun 1995, p.34-5. 254 VIGLIAR, José Marcelo Menezes. Tutela jurisdicional coletiva. 2.ed. São Paulo: Atlas, 1999, p. 71. 255 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Manual do consumidor em juízo. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p.32.
130
[...] são interesses metaindividuais que, não tendo atingido grau de agregação e organização necessário à sua afetação institucional junto a certas entidades ou órgãos representativos dos interesses já socialmente definidos, restam em estado fluido, dispersos pela sociedade civil como um todo (v.g., o interesse à pureza do ar atmosférico), podendo, por vezes, concernir a certas coletividades de conteúdo numérico indefinido (v.g., os consumidores). Caracterizam-se: pela indeterminação dos sujeitos, pela indivisibilidade do objeto, por sua intensa litigiosidade interna e por sua tendência à transição ou mutação no tempo e no espaço. 256
Os interesses difusos são tutelados pelo ordenamento de maneira que uma única
demanda coletiva é suficiente para beneficiar todos os consumidores, pois, conforme o Art.
103, I do Código de Defesa do Consumidor, a sentença que a julgar fará coisa julga erga
omnes.
Por sua vez, na execução de serviços públicos, deve o concessionário se adaptar ao
atendimento da universalidade dos usuários-consumidores e daqueles que o são em potencial,
não há como prestar um serviço público visando o atendimento deste ou daquele usuário, o
que enseja a tutela difusa de seus interesses.
Em que pese as conceituações divergentes doutrinariamente, pode-se afirmar que os
interesses difusos são aqueles de caráter transindividual, de natureza indivisível e que
possuem como titulares pessoas indeterminadas que se ligam por circunstâncias de fato, o que
enseja a proteção jurisdicional voltada para as obrigações de fazer ou não fazer, por visarem
qualidade e a quantidade de bens e serviços.
3.2.5.2 Direitos Coletivos
As relações entre os homens passam a cada dia por alterações de grande expressão,
dentre elas a criação de agrupamentos visando alcance de objetivos comuns com mais
facilidade, de modo que o ordenamento jurídico necessitou adaptar-se para a efetiva tutela dos
interesses coletivos, instituindo mecanismos capazes de proteger direitos que, embora
indivisíveis, pertencem a uma coletividade de titulares.
Os direitos coletivos, conforme o Art. 81, II do Código de Defesa do Consumidor,
igualmente aos difusos são transindividuais e indivisíveis, porém há uma determinação
relativa de seus titulares, já que estes, apesar de não possuírem ligação individual entre si,
256 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Manual do consumidor em juízo. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p.33.
131
estão ligados em uma relação jurídica-base. São direitos insuscetíveis de apropriação
individual, não se transmitem e não se renunciam ou transacionam. Também neste caso, como
nos direitos difusos, há a substituição processual do sujeito de direito material, vedando ao
sujeito ativo a realização de acordos, a renúncia, a confissão e a admissão do ônus da prova
legal, os titulares coletivos da relação jurídica material poderão alterar-se, o que se dá com
certa informalidade, sendo para isto suficiente, que haja a adesão ou exclusão do sujeito à
relação jurídica-base.257
Ao tratar do assunto, Ivone Cristina de Souza João258 faz remição ao Art. 5º, XXXV
da Constituição Federal que garante a todos a tutela jurisdicional, inclusive a coletiva, mas
destaca, também, outra norma constitucional, a do Art. 129 que dispõe como uma das funções
do Ministério Público a defesa dos direitos transindividuais e indivisíveis, regulada pela Lei
nº 7.947/85, denominada Lei da Ação Civil Pública.
O citado diploma contém os mecanismos capazes de regular as demandas preventivas,
cominatórias, reparatórias e cautelares dos direitos e interesses difusos e coletivos, de grande
importância para a defesa dos consumidores, sendo que na mesma esteira o Código de Defesa
do Consumidor, em seus Arts. 81 a 104, dedicou atenção à tutela jurisdicional dos
consumidores.
Neste sentido, Cesar Augusto Guimarães Pereira259 traz o ensinamento de Eduardo
Talamini que dessa forma se expressa sobre a matéria:
A ação civil pública há de refletir, cada vez mais, a efetiva participação de esferas da sociedade civil nos desígnios da nação – e não a simples atuação de órgãos da própria estrutura estatal (como o Ministério Público), por mais relevantes que sejam as funções destes.
Ainda leciona o autor que a homogeneidade dos interesses coletivos pressupõe a
existência de similitude de acontecimentos e direitos, no que toma por base o ensinamento de
Araújo Filho, no sentido de que “[...] a lei exigiu que o pedido formulado seja genérico,
permitindo a desconsideração das peculiaridades da situação pessoal de cada um”. 260
Ensejará a tutela coletiva dos direitos o vínculo existente entre os indivíduos, é o que
dispõe o Art. 103, II do Código de Defesa do Consumidor, que garante à sentença eficácia 257 ZAVASCKI, Teori Albino. Defesa de direitos coletivos e defesa coletiva de direitos. Revista de Processo. São Paulo, ano 20, n.78, abr-jun 1995, p.34-5. 258 JOÃO, Ivone Cristina de Souza. O processo civil coletivo, o processo civil individual e o consumidor. Revista da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo. São Bernardo do Campo, v.5, nov. 1999, p.88. 259 PEREIRA, Cesar Augusto Guimarães. Usuários de serviços públicos: usuários, consumidores e os aspectos econômicos dos serviços públicos. São Paulo: Saraiva, 2006, p.10. 260 Idem ibidem, p.12.
132
ultra partes, ensejando, em face da natureza indivisível da tutela, sejam todos os membros
beneficiados, mesmo aqueles que não integrem efetivamente o grupo, categoria ou classe que
ajuizou a demanda.
Esclarece Kazuo Watanabe261 que ao incluir as tutelas coletivas no diploma
consumerista o legislador buscou, primordialmente, o atendimento à ordem jurídica justa,
visto que ao tratar “molecularmente” os conflitos acabou por afastar o a “técnica tradicional
de solução atomizada”, garantindo o desafogamento do Judiciário, tendo em vista os inúmeros
conflitos que serão abrangidos, sendo a tutela, inevitavelmente, prestada de maneira mais
adequada e eficiente.
Fica claro, portanto, que a ação civil pública é um meio de proteção da tutela da
coletividade, e não é somente o Ministério Público que figura como legitimado, a sociedade
deve estar atenta para seus direitos, em consideração ao escopo educativo da jurisdição, o que
facultará uma defesa mais eficiente do interesse público.
No caso das ações coletivas não há possibilidade de defesa individual do direito, mas a
legislação possibilitou o acesso à justiça através da legitimação de pessoas jurídicas de direito
público interno e entidades ou associações que visem a proteção do direito coletivo
demandado em Juízo.
José Geraldo Brito Filomeno262 ilustra que no ano de 1996 a Promotoria de Defesa da
Cidadania de São Paulo ajuizou ação civil pública em face da Companhia Paulista de Trens
Metropolitanos, em razão desta colocar em risco a segurança, saúde e a vida dos usuários-
consumidores, apresentando a execução do serviço de transporte público muitos problemas,
necessitando de urgente reparo. Foi requerida liminar que impunha multa diária ao poder
concedente, porém, foi o pedido negado, causando revolta geral nos usuários-consumidores
que incendiaram diversas composições da empresa. Instalou-se o caos no tráfego de São
Paulo, visto que além das irregularidades já apresentadas houve esta nova interrupção,
forçando a utilização de meios alternativos de locomoção, dando ensejo ao ajuizamento de
nova ação civil pública pelo Ministério Público, desta vez no intuito de que a Administração
Pública garantisse os subsídios que compensassem os gastos extraordinários com transporte
que os usuários-consumidores estavam realizando no deslocamento de suas residências até o
trabalho enquanto os trens metropolitanos não estivessem funcionando regularmente.
261 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p.828. 262 Idem ibidem, p.106.
133
Ivone Cristina de Souza João263 discorrendo sobre a importância da tutela coletiva cita
o ensinamento de Celso Antonio Pacheco Fiorillo que conclui:
Não obstante as vantagens irrefutáveis trazidas pelas ações coletivas, no sentido de se buscar isonomia, efetividade, adequação, acesso à justiça, entre outras garantias, tais ações vieram, precipuamente, resguardar direitos e bens jurídicos que, em virtude da dimensão de seus titulares e indivisibilidade do seu objeto, não conseguiam obter uma real e justa tutela jurisdicional, pelo simples fato de que o aparato processual disponível para tutelar tais bens se mostrava incapacitado para protegê-los, posto que de cunho individual e liberal.
A sociedade vem passando por diversas alterações ao longo do tempo, o
comportamento de seus integrantes, que antes eram voltados somente para seus interesses
próprios, atualmente tem sofrido uma pressão muito grande em virtude da massificação das
relações sociais e a adaptação deve se dar em todos os setores.
Os interesses coletivos têm papel de destaque sobre os interesses individuais, e o
Estado, visando a manutenção da paz social, tem o dever de garantir que as necessidades
públicas sejam atendidas com presteza e eficiência, o que enseja a existência de uma tutela
que atenda especificamente as necessidades transindividuais de natureza indivisível, onde
classe ou grupo de pessoas possuam a titularidade do direito.
3.2.5.3 Direitos Individuais Homogêneos
A defesa individualizada dos indivíduos refere-se ao tratamento que cada um receberá
dentro da sua esfera de direitos, pois a massificação das relações atuais possibilitou a
homogeneidade dos direitos, assim, cada um será titular de direitos individualmente ao
mesmo tempo em que outras pessoas também o serão, possibilitando aos interessados que sua
pretensão seja mais prontamente atendida, graças às demonstrações de adaptação da tutela
jurisdicional para o alcance da efetividade processual.
Conceitua Teori Albino Zavascki264 os direitos individuais como homogêneos,
individuais e não transindividuais, o que considera um erro já que se trata de uma “antinomia
afirmar possível a existência de direitos individuais transindividuais”. Conforme o Art. 81, III
263 JOÃO, Ivone Cristina de Souza. O processo civil coletivo, o processo civil individual e o consumidor. Revista da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo. São Bernardo do Campo, v.5, nov. 1999, p.89. 264 ZAVASCKI, Teori Albino. Defesa de direitos coletivos e defesa coletiva de direitos. Revista de Processo. São Paulo, ano 20, n.78, abr-jun 1995, p.34-5.
134
do Código de Defesa do Consumidor, deve haver uma verificação do sujeito e da relação
existente entre ele e o objeto de direito, este sim divisível, de modo que os indivíduos podem
sofrer conseqüências diferenciadas ao mesmo tempo. Prossegue o autor afirmando que estes
são suscetíveis de sucessão, seja por ato inter vivos ou mortis causa, com exceções, também
se sujeitam a renúncia e transação com ressalvas, quem realiza a defesa em Juízo geralmente é
o próprio titular, sendo que o terceiro poderá ser representado, e finalmente, pode dar-se a
mutação do pólo ativo na relação de direito material, se admitida e mediante ato ou fato
jurídico típico e específico.
Os direitos individuais homogêneos necessitam ter a mesma origem para serem
considerados comuns conforme o texto legal, não há necessidade, como na tutela coletiva de
que um grupo seja atingido, no caso presente basta que os consumidores estejam ligados pelo
produto ou serviço. Como no caso de produto anunciado nos diversos meios de comunicação,
inclusive o televisionado, tendo o mesmo apresentado defeito que coloque em risco os
consumidores, pessoas de todas as partes do Brasil podem ter sofrido danos e
consequentemente buscarão a tutela de seus direitos.
Esclarece José Marcelo Menezes Vigliar265 que os interesses individuais homogêneos
tratam-se, em sentido lato, de interesses coletivos, tendo titulares determináveis e
invariavelmente determinados, com a característica de que tais interesses derivam de uma
situação fática e são passíveis de sofrerem divisão.
Os direitos individuais, por se encontrarem integrados ao patrimônio dos titulares, têm
a característica de exclusividade, motivo pelo qual somente é admitido que os próprios
titulares do direito demandem em juízo, razão pela qual “[...] sua defesa implica a tutela
coletiva de interesses eminentemente individuais com o espoco de propiciar uma proteção
molecular no lugar de demandas individuais [...].”266
A regra da legitimidade processual comporta exceção, segundo o inciso XXI do Art.
5º da Constituição Federal, facultando às organizações associativas de atuar em juízo na
defesa dos interesses de seus associados quando autorizadas expressamente pelos mesmos.
Defluiu-se, portanto, que nos interesses individuais homogêneos há a possibilidade de
uma defesa unitária mediante análise das condições para o efetivo exercício do direito, porém,
estes podem ser considerados de menor importância, quando vistos sob o ponto de vista das
265 VIGLIAR, José Marcelo Menezes. Tutela jurisdicional coletiva. 2.ed. São Paulo: Atlas, 1999, p.78. 266 NOVAIS, Elaine Cardoso de Matos. Serviços públicos e relação de consumo: aplicabilidade do código de defesa do consumidor. Curitiba: Juruá, 2006, p.224.
135
individualidades interessadas, mas se tratam de interesses comuns à coletividade, recebem a
observância merecida do que se pleiteados isoladamente, eis que pouco eficiente seriam.
3.3 DOS MECANISMOS ALTERNATIVOS PARA SOLUCIONAR CONFLITOS
Uma ponderação que deve ser enfrentada com rigor é a de que o sistema judicial
brasileiro está no limite de suas capacidades, para não se dizer que está acima delas, o que
certamente resultaria em um colapso do Poder Judiciário, decorrente da falta de investimento
e interesse do Estado em resolvê-lo.
Os reflexos desta sobrecarga do Poder Judiciário em solucionar os conflitos de
interesse que lhe chega às mãos transcendem às cercanias do processo e seus sujeitos, vai
além, influi diretamente no campo econômico, pois gera repulsa dos investidores estrangeiros
interessados em manter algum tipo de negócio no país com o temor de que, se necessário, a
justiça brasileira não resolverá com eficácia seu conflito eventualmente existente.
Para Mauro Cappelletti267 “embora a atenção dos modernos reformadores se concentre
mais em alternativas ao sistema judiciário regular que nos próprios sistemas judiciários, é
importante lembrar que muitos conflitos básicos envolvendo direitos de indivíduos ou grupos,
necessariamente continuarão a ser submetidos aos tribunais regulares”.
Para que tal conclusão tenha uma evolução prática, aponta o autor que no começo do
século passado algumas reformas foram implementadas, tal como a oralidade processual e a
concentração de procedimentos, mas não apenas isso, criaram meios alternativos para solução
de conflitos, destacando-se o juízo arbitral e as câmaras de conciliação.
Por seu turno, a ministra do Superior Tribunal de Justiça Fátima Nancy Andrighi268
entende que diante de um compromisso internacional chancelado pelo Supremo Tribunal
Federal, é dever do Poder Judiciário brasileiro apoiar as iniciativas para implantação e
implementação dos meios alternativos para resolução de conflitos, tendo este movimento se
iniciado a partir da denominada crise do processo.
267 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Tradução: Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Fabris, 1988, p.76. 268 ANDRIGHI, Fátima Nancy. Formas alternativas de solução de conflitos. Biblioteca Digital do Superior Tribunal de Justiça. Brasília, 03 de abril de 2003. Disponível na internet em: http://bdjur.stj.gov.br. Acesso em: 12 de fevereiro de 2008, p.3.
136
Em prosseguimento, a eminente ministra adverte que já é hora de se democratizar a
justiça brasileira, sob pena de se quebrar o pilar da democracia ante a mantença de um sistema
jurisdicional ineficiente que não atende a sua função precípua que é a promoção da paz social,
necessitando afastar-se da idéia romana de que somente os juízes investidos das prerrogativas
jurisdicionais são detentores do poder de julgar.
Finaliza seu entendimento ao afirmar que para implementação dessas novas técnicas,
via dos meios alternativos para solução de conflitos, será necessária:
[...] uma revolução de mentalidade e pela assunção de um nova postura de todos membros dos vários segmentos jurídicos, bem como da própria sociedade, e se consubstancia na conscientização de que o árbitro, o mediador e os conciliadores também são capazes de solucionar conflitos jurídicos com as mesmas condições técnicas de um juiz de direito investido nas funções jurisdicionais. Precisamos experimentar um novo modelo de Justiça participativa que redundará na necessária e imperiosa democratização da Justiça.269
Ademais, movido pelo avanço do assunto destacado pela doutrina, o legislador
ordinário criou mecanismos normativos para autorizar, expressamente, a aplicação dos meios
alternativos (privados) para a solução de conflitos originados à partir de contratos celebrados
com a Administração Pública.
Destaca-se, especialmente, a vigência da Lei nº 11.079/04 que instituiu normas para
contratação de parceria público-privada com a Administração Pública e também a Lei nº
11.196/05 que acrescentou dispositivos na Lei nº 8.987/95, tendo em comum a possibilidade
de serem adotados métodos privados para resolução de disputas originadas a partir de um
contrato de concessão de serviço público ou de contratação em regime de parceria público-
privada em toda esfera de Poder, uma vez que são contratos administrativos de concessão.
Ao adotar estas regras, o Brasil deu um passo significativo ao encontro do
desenvolvimento institucional, motivando a iniciativa privada a investir em projetos de infra-
estrutura, entre eles os serviços públicos, representando uma maior segurança de que o
contrato com a Administração Pública será respeitado e que os conflitos instalados serão
solvidos de forma mais célere, diferentemente do que ocorre no Poder Judiciário.
Portanto, as soluções alternativas de resolução de conflitos são meios próprios e
eficientes para pacificar as controvérsias porventura ocorrentes, reconhecidos pelas normas
vigentes, doutrina e jurisprudência, inclusive, como mencionado acima, as decorrentes das 269 ANDRIGHI, Fátima Nancy. Formas alternativas de solução de conflitos. Biblioteca Digital do Superior Tribunal de Justiça. Brasília, 03 de abril de 2003. Disponível na internet em: http://bdjur.stj.gov.br. Acesso em: 12 de fevereiro de 2008, p.8.
137
concessões de serviços públicos, sendo uma forma mais econômica e célere no atendimento
dos anseios da sociedade.
3.3.1 Conciliação
A conciliação, por se tratar de um dos mecanismos de composição de conflitos, é
espelho da busca pela pacificação da ordem social, tornando-se medida que se desdobra em
vários aspectos positivos, dentre os quais se destaca o alcance de resultados imediatos para os
conflitos e a economia processual, esta não adstrita apenas ao quesito tempo, mas também
financeiro, desonerando o Estado e possibilitando que este realize novos investimentos.
O instituto da conciliação encontra-se no sistema processual brasileiro desde o período
colonial, fase esta em que os juízes se obrigavam a proceder a conciliação entre as partes
litigantes. Ultrapassado este momento histórico e chegando-se ao período imperial, a
exigência de conciliação foi avançando, tendo a Constituição Imperial de 1824, em seu Art.
161, determinado que anteriormente à resolução das lides nos tribunais, havia a
obrigatoriedade de se tentar conciliar as partes por meio de juízes de paz, previsão esta
adotada pelo Código Comercial de 1850, vindo a ser suprimido do sistema jurídico com o
advento da Constituição Imperial de 1889.270
Atualmente, a legislação brasileira obriga a conciliação extrajudicial nos casos
relacionados ao Direito do Trabalho, uma vez que a Lei n° 9.958/00 acrescentou o Art. 625-
“A” a “H” à Consolidação das Leis do Trabalho regulamentando as comissões de conciliação
prévia na esfera trabalhista, razão pela qual se torna um procedimento de destaque para a
contensão dos litígios judiciais, sem que com isso afete a garantia constitucional de acesso à
justiça.
Joaquim Falcão271 leciona que as partes litigantes ao se conciliarem guardam a
oportunidade de se aproximarem da satisfação de seus direitos, visto que nestes casos não
existe pretensão vencida, garantindo o cumprimento dos termos pactuados, razão pelo qual
“Todo o sistema judicial sai ganhando com a conciliação. Diminuir a demanda por sentenças
é potencializar a atuação dos juízes sobre os casos que mais dependem da sua apreciação”.
270 BARBI, Celso Agrícola. O papel da conciliação como meio de evitar o processo e de resolver conflitos. Revista de Processo. São Paulo, ano 10, n.39, jul-set 1985, p.119. 271 FALCÃO, Joaquim. Movimento pela conciliação. Revista Jurídica Consulex. Brasília, ano X, n.232, set. 2006, p.39.
138
Ao se tratar de mecanismos de resolução de conflitos pautados na conciliação, torna-se
evidente a efetividade da justiça, bem como da celeridade processual com o desafogamento
do sistema judiciário, vez que não houve a necessidade de se discutir o mérito da demanda,
logo, a cognição plena não será necessária e, via de conseqüência, o tempo de duração do
litígio será ideal, garantindo uma ordem jurídica justa.
Por seu turno, Ada Pellegrini Grinover272 adverte para se observar e respeitar os
princípios constitucionais que garantem o acesso à justiça, não devendo a conciliação ser
“imposta” a partir do momento em que o processo judicial não seja capaz e eficiente para a
solução dos conflitos, uma vez que o objetivo maior da conciliação é garantir a satisfação
plena dos direitos das partes, o que certamente não será alcançado em detrimento dos ditames
constitucionais.
Frise-se que a conciliação ora discutida é, por óbvio, a extraprocessual ou
extrajudicial, pois se encontra no rol das formas alternativas de resolução de conflitos, por
meio da qual as partes realizam a transação, facilitando cada uma delas o consenso que
impedirá o prosseguimento da discussão, tendo o conciliador importância ímpar, visto que
atuará como pacificador em respeito aos direitos dos interessados, primando sempre pela
imparcialidade, sem formar qualquer tipo de juízo de valor.
Na prática a conciliação extraprocessual trilha caminho que lhe conferirá vulto na
solução dos conflitos, visto que a conciliação processual possui ainda maior campo de
abrangência, no entanto, os juízes não recebem o devido preparo para tal e ao investirem-se na
figura de conciliador o fazem apenas para cumprimento de protocolo, visto que o simples
questionamento às partes quanto a possibilidade de acordo certamente não é suficiente para se
obter uma conciliação.
Tratando da “inabilidade” apresentada pelo Poder Judiciário, esclarece Sebastião
Ribeiro Martins273 que:
Somente a mediação eficaz do agente do Estado, preparado, habilidoso na arte de dialogar e transigir, sensível aos problemas das partes, contribuirá efetivamente para a plenitude da conciliação e a concretização ideal da justiça conciliativa ou coexistencial, que incentiva a harmonia das pessoas após a homologação do acordo e concorre para a agilização da prestação jurisdicional.
272 GRINOVER, Ada Pellegrini. Conciliação. Revista de Processo. São Paulo, ano 11, n.41, jan-mar 1986, p. 198. 273 MARTINS, Sebastião Ribeiro. O novo instituto da conciliação no código de processo civil. Gênesis – Revista de Direito Processual Civil. Curitiba, n. 6, set-dez 1997, p.686.
139
Certamente se o grande objetivo dos meios alternativos para solução dos conflitos é o
alcance da paz social sem a necessidade de sobrecarregar ainda mais a máquina judiciária,
assim, é preferível que esta ocorra na forma extrajudicial, sendo conduzida por quem não irá
julgar a causa futuramente, pois, sem a necessidade de se formar convencimento, o
conciliador poderá atuar com maior neutralidade.274
O êxito alcançado com a conciliação extraprocessual promovida por alguns órgãos de
proteção do consumidor em todo território nacional é uma mola que estimula as soluções de
conflitos fora da esfera do Poder Judiciário. Os índices alcançados pelo Procon de Vinhedo,
interior de São Paulo, são significativos (83% de casos solucionados) e já se tornaram
referência do atendimento dos consumidores da região pela qualidade e agilidade na resolução
dos conflitos. Destaca-se, também, a cadeira que possui no Conselho de Consumidores da
CPFL, concessionária de serviço público de energia elétrica.275
Outras experiências práticas já despontam no cenário brasileiro. Exemplo disso é o
novo órgão de defesa do consumidor criado pela Câmara Municipal de Juiz de Fora, Estado
de Minas Gerais, denominado Sedecon, atuando para pacificar os conflitos consumeristas,
inclusive os decorrentes da má prestação de serviços públicos concedidos, tendo-se como
propósito maior a “conciliação e educação”.276
Como já asseverado, a possibilidade de aplicação da conciliação privada nos casos de
vícios e ineficiência do serviço público concedido decorre do próprio permissivo legal (Art.
23-A da Lei nº 8.987/95 e Art. 11, III da Lei nº 11.079/04) e também da aplicabilidade do
Código de Defesa do Consumidor, possibilitando os órgãos de proteção atuarem na
conciliação de conflitos.
Fátima Nancy Andrighi,277 ao tratar da conciliação extrajudicial, mencionada o
exemplo das empresas de telefonia (concessionária de serviço público), onde a maioria das
ações que chegam à Justiça versam sobre o mesmo assunto, ou seja, indenização por cobrança
indevida. Daí porque sua proposta de criação de uma “Câmara de Conciliação”, em parceria
274 GRINOVER, Ada Pellegrini. Conciliação. Revista de Processo. São Paulo, ano 11, n.41, jan-mar 1986, p. 200. 275 PROCON TEM 83% DOS CASOS SOLUCIONADOS. Cosmo on line. Campinas. Disponível na internet em: http://cosmo.com.br/cidades/campinas/integra.asp?id=201327. Acesso em: 05 de junho de 2008. 276 MORATORI, Debora. Na luta pelos seus direitos. Acessa.com. Juiz de Fora, 29 de novembro de 2002. Disponível na internet em http://jfservice.com.br/negocios/arquivo/mercados/2002/11/29-sedecon. Acesso em: 05 de junho de 2008. 277 ANDRIGHI, Fátima Nancy. Centros de parceria e conciliação. Biblioteca Digital do Superior Tribunal de Justiça. Brasília, maio de 2000. Disponível na internet em: http://bdjur.stj.gov.br. Acesso em: 05 de junho de 2008, p.3.
140
com órgãos privados, objetivando que as pretensões jurisdicionais repetidas por ali passem,
obrigatoriamente, antes de serem apresentadas ao Poder Judiciário.
Portanto, facultar a realização da conciliação extrajudicial compreende um grande
avanço ao sistema jurisdicional, pois pode ser ela uma das responsáveis por um possível
desafogamento do Judiciário, o que proporciona ao Estado economia de tempo e de dinheiro,
e à sociedade, a maior beneficiária do instituto, confiança na Justiça, tornando uma realidade
o alcance da paz social.
3.3.2 Mediação
O instituto da mediação também se apresenta como um dos meios alternativos para
solução de conflitos apesar de não existir, até a presente data, lei federal que a regulamente,
figurando apenas em determinados setores como sindicatos, agências reguladoras,
associações, núcleos de prática jurídica dos cursos de direito e, em alguns casos, nas justiças
estaduais por meio de regulamentação administrativa, sendo aplicadas as experiências teóricas
e científicas conhecidas por meio da doutrina especializada.
A mediação é um importante instrumento de pacificação social com justiça aplicada
de forma a satisfazer as partes litigantes, pois, em tese, não há vencedor ou vencido, não há
uma decisão de procedência ou improcedência, impõe-se a busca verdadeira de um ponto
convergente entre a pretensão resistida ali discutida, sendo o mediador não um juiz, um
árbitro, mas essencialmente um esteio que figurará para controlar e ajudar na busca da solução
do conflito, sempre se posicionando em um campo da neutralidade.
Conforme acima analisado, aos serviços públicos concedidos à iniciativa privada é
aplicável a norma consumerista para resolução dos conflitos daí decorrentes, assim, a
mediação e o Direito do Consumidor se unem com o objetivo de encontrar uma justa e efetiva
solução jurídica para dirimir a controvérsia passível de ocorrer na relação entre o usuário-
consumidor e o concessionário.
O próprio Código de Defesa do Consumidor nos seus Arts. 55 a 60 pretensiona que as
relações de consumo alcancem um estado de amadurecimento que resultará no escopo
educativo, razão pela qual a mediação é um dos caminhos para se atingir esta finalidade, uma
vez que possui método mais apropriado para a resolução de conflitos, pois devem as partes
141
envolvidas se desarmarem e, efetivamente, desejarem evitar o litígio promovendo a
pacificação da relação existente.
Nesse passo, importante frisar que a mediação somente alcançará os frutos pretendidos
se houver uma predisposição inequívoca das partes para se evitar o conflito, diminuí-lo ou
chegar-se ao consenso, reconstruindo uma relação jurídica destruída por posicionamentos
divergentes, com o objetivo único de resolução pacífica de conflitos.
Segundo Guiomar Marotti Dumont278 “A opção pela mediação beneficia quem está em
qualquer situação de conflito, porque o mediador é um facilitador que ajuda na busca de
respostas e soluções que deverão ser encontradas pelas próprias partes envolvidas. Auxilia as
partes a rever seus valores [...]”.
No Brasil a mediação ainda vem ganhando corpo, pois, como já mencionado, a
legislação ordinária que regulamentará o instituto ainda encontra-se em tramitação no
Congresso Nacional, diferentemente do direito estrangeiro onde a mediação é muito utilizada
há certo tempo.
Além da aproximação das partes litigantes e a composição do conflito, outros
objetivos são visíveis quando se trata da mediação, entre eles a diminuição do tempo
processual, do custo sobre uma demanda e do volume das ações judiciais, acumulando
vantagens distintas e por certo mais eficientes do que o modelo tradicional e ainda oficial
seguido pelo Poder Judiciário.
Todavia, em razão da inexistência de norma específica sobre a mediação de conflitos e
também pela falta de afinidade cultural com esta disciplina, podem ocorrer desvios de conduta
por parte daqueles que se intitulam mediadores, como num caso verídico ocorrido no Estado
do Ceará, onde um cidadão recebeu intimação para comparecer ao Tribunal Arbitral e de
Mediação para solucionar um conflito cuja importância econômica era de R$ 150,00 (cento e
cinqüenta reais). Ocorre que o custo total desta mediação saiu por mais de R$ 230,00
(duzentos e trinta reais), em razão de uma ação indevida e intimidadora do citado Tribunal
que descumpre a função de mediação, caracterizando-se como “verdadeiros escritórios de
cobrança”, segundo o Presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB-CE.279
278 LIMA, Fernanda Maria Dias de Araújo; FAGUNDES, Rosane Maria Silva Vaz; PINTO, Vânia Maria Vaz Leite (Org.). Manual de mediação: teoria e prática. Belo Horizonte: New Hampton Press, 2007, p.74. 279 CEARÁ. Tribunal de Justiça. Justiça alternativa: mediação de conflitos: solução ou problema? Fortaleza, 08 de outubro de 2007. Disponível na internet em: http://www.tjce.jus.br/noticias/noticias_le_noticia.asp? Acesso em: 05 de junho de 2008.
142
No que tange a mediação e os serviços públicos especificamente, merece destaque o
pioneirismo da Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Estado
do Rio Grande do Sul, pois o Conselho Superior desta instituição, em 20 de agosto de 2002,
resolveu aprovar o “Regulamento para Procedimentos de Mediação de Conflitos” que dispõe
acerca dos métodos a serem adotados na resolução das controvérsias havidas entre usuários-
consumidores, poder concedente e os delegatários de serviços públicos daquela jurisdição.280
Por tais vantagens e benefícios que países como a Espanha, Argentina e Peru adotaram
o caráter obrigatório da mediação anterior ao ajuizamento de ação judicial, sendo que os
resultados demonstraram a correção da medida, ocasionando uma diminuição de processos
judiciais e um aumento dos procedimentos via mediação.281
Em recente viagem aos Estados Unidos para participar de um curso acerca do sistema
judiciário da Flórida, específico para advogados, juízes e promotores de justiça brasileiros,
ministrado na University of Florida, pude constatar todos estes fatos in loco, surpreendendo
positivamente a todos os participantes pela importância dada à mediação naquele país, tendo
sido traduzida em números muito expressivos em comparação com o Brasil.
A mediação, como se vê, apesar de ainda não figurar no sistema brasileiro por meio de
lei federal específica, já encontra previsão em determinados segmentos da sociedade,
inclusive no âmbito das Agências Reguladoras de serviços públicos, como demonstrado, daí
porque é importante a educação e a informação da população sobre tal método alternativo
para a resolução de conflito.
Observa-se, todavia, que a mediação deve ganhar, na prática, a efetividade que ainda
não possui no Brasil, apesar de todas as demonstrações de sua viabilidade, tomando-se como
pressuposto de mudança a criação da lei federal que regulamente o assunto e a alteração da
postura cultural dos usuários-consumidores e dos delegatários de serviços públicos de
buscarem, invariavelmente, amparo no Poder Judiciário ou, na impossibilidade, acomodar-se
e não garantirem a tutela de seus direitos.
280 AGÊNCIA ESTADUAL DE REGULAÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS DELEGADOS DO RIO GRANDE DO SUL. Resolução 123. Porto Alegre, 20 de agosto de 2002. Disponível na internet em: www.agergs.rs.gov.br. Acesso em: 11 de junho de 2008. 281 A MEDIAÇÃO PRÉVIA OBRIGATÓRIA PARA A SOLUÇÃO DE CONFLITOS. Jornal Valor Econômico. São Paulo, 18 de maio 2006. Disponível na internet em: http://www.mediar-rs.com.br/ext_not.asp?id=143. Acesso em: 05 de junho de 2008.
143
3.3.3 Arbitragem
Por meio da Lei nº 9.307/96, a arbitragem foi inserida no ordenamento jurídico
brasileiro, tendo representado um avanço por se tratar de uma técnica extrajudicial hábil para
a solução de conflitos envolvendo direitos disponíveis, pois as partes detêm a prerrogativa de
investir terceiros com poderes para julgar e garantir resultados satisfatórios na controvérsia,
evitando a necessidade de acionar o Poder Judiciário que nem sempre atende as necessidades
das partes no tempo justo e esperado para tal.
O citado dispositivo legal foi reconhecido como constitucional pelo Supremo Tribunal
Federal – à partir da Emenda Constitucional n° 45/2004 a competência passou a ser do
Superior Tribunal de Justiça – no julgamento do Agravo Regimental da Homologação de
Sentença Estrangeira nº 5.206 em 12.12.2001, tendo se decido que não havia afronta ao
disposto no Art. 5º, XXXV da Constituição Federal. Segundo esclarece Fernando da Fonseca
Gajardoni282 ocorre justamente o contrário, uma vez que há permissão para se optar por via
diversa da judicial. As partes, ao decidirem pela via extrajudicial, excluem o conflito da
apreciação do Poder Judiciário.
É sabido que a justiça estatal encontra-se em descompasso com as expectativas da
sociedade atual, tanto legislativa quanto administrativamente, não conseguindo atingir seus
objetivos primários de manter a ordem social por meio de uma prestação jurisdicional efetiva.
Neste sentido, Sebastião José Roque283 trata das deficiências qualitativas da Justiça,
delineando a situação vivida atualmente aqui no Brasil como “dramática, caótica e lastimável”
tendo em vista a impossibilidade de solução dos conflitos de maneira adequada e num tempo
justificável, contribuindo para a descaracterização do processo como sendo um mecanismo de
interesse público.
Por sua vez, a arbitragem pode se tornar um mecanismo capaz de vencer todos estes
obstáculos da Justiça estatal, razão pela qual Mauro Cappelletti284 esclarece que o juízo
arbitral caracteriza-se por procedimentos informais onde os julgadores devem possuir
conhecimentos técnicos ou a formação jurídica, além de que as decisões dali oriundas ficam
sujeitas a estreita possibilidade de interposição de recursos. 282 GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Arbitragem nos tribunais estatais: 10 anos de jurisprudência. Revista do Advogado. São Paulo. Ano XXVI, n.87, set.2006, p.53. 283 ROQUE, Sebastião José. Arbitragem: a solução viável. São Paulo: Ícone, 1997, p.26. 284 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Tradução: Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Fabris, 1988, p.82.
144
Tecnicamente, muitas são as vantagens da arbitragem em face dos procedimentos
judiciais, pois, de acordo com José Carlos de Magalhães,285 “[...] o processo arbitral é flexível,
permitindo às partes definir prazos que lhes convêm, a forma e a ordem de produção de
prova”, isto garante a esta forma de solução de conflitos a efetividade que se espera do
sistema jurisdicional.
Quando as partes optam pela aplicação da arbitragem, investem de poderes o árbitro,
motivo pelo qual Alessandra Fachada Bonilha286 ressalta a importância que este exerce, ao
assegurar que ele é a figura central do sistema arbitral, visto que o exercício da arbitragem
requer a confiança das partes, devendo o árbitro agir sempre com o máximo de lisura, dentro
dos preceitos legais, além disso, ter um comportamento ético acima de tudo, em decorrência
de ser investido de poderes que lhe facultam a decisão de interesses alheios, o que não pode
ser transgredido em hipótese alguma.
Os árbitros, muitas vezes, detêm maiores condições para realizarem um julgamento
mais próximo do ideal justamente por serem escolhidos pelas próprias partes litigantes que
também escolhem o procedimento a ser adotado, possibilitando uma ligação mais estreita
entre os seus sujeitos. Já em relação aos juízes togados, por não poderem agir fora dos limites
determinados no procedimento judicial, atuando de maneira solitária e com sobrecarga de
função, não dedicam um tempo maior à apreciação do feito tampouco desenvolvem um
contato mais próximo com as pessoas interessadas.
Paulo Salvador Frontini287 muito acertadamente discorre sobre as razões que
viabilizaram a aplicação da arbitragem no sistema pátrio e o porquê esta tende a alcançar
números cada vez mais satisfatórios:
Ora, é intolerável que a entrega da prestação jurisdicional definitiva se efetive após uma espera de muitos e muitos anos – às vezes cinco, ou mais, hipótese freqüente quando a matéria é alçada ao exame dos Tribunais Superiores. Quando a decisão final sobrevém, a realidade socioeconômica é outra e a situação das Partes já está fortemente alterada. Daí a inafastável conclusão: nenhuma decisão judicial, por mais acertada que seja sob o aspecto técnico-jurídico, é justa, se proferida depois de alguns anos de tormentosa espera, repleta de angústias e incertezas.
285 MAGALHÃES, José Carlos de. A arbitragem e o processo judicial. Revista do Advogado. São Paulo, ano XXVI, n.87, set.2006, p.64. 286 BONILHA, Alessandra Fachada. Ética na arbitragem: árbitros, advogados e partes. Revista do Advogado. São Paulo. Ano XXVI, n.87, set.2006, p.15. 287 FRONTINI, Paulo Salvador. Arbitragem e execução da sentença arbitral: apontamentos sobre os reflexos da Lei nº 11.232/2005 no âmbito do cumprimento forçado da sentença arbitral. Revista do Advogado. São Paulo. Ano XXVI, n.87, set.2006, p.79.
145
No que se refere à aplicação da arbitragem na Administração Pública e,
consequentemente, nas concessões de serviços públicos, apesar de toda discussão a este
respeito, o assunto ficou superado com a aprovação das Leis nº 11.079/04 e n° 11.196/05 ao
autorizarem o emprego de mecanismos privados para resolução de disputas relacionadas ao
contrato administrativo, tendo destacado a arbitragem como um destes meios.
Antes, porém, a Lei n° 9.478/97, em seu Art. 20, já fazia previsão de que a Agência
Nacional do Petróleo, em Regimento Interno, disporia sobre os procedimentos para a
resolução de conflitos existentes entre agentes econômicos e usuários-consumidores, com
ênfase na arbitragem. No mesmo sentido, a Lei n° 9.472/97 que dispõe sobre a organização
dos serviços de telecomunicações e a Lei n° 10.233/01 que criou a Agência Nacional de
Transporte Terrestre, também dispunham sobre a resolução de conflitos via arbitragem.
Desse modo, a possibilidade de aplicação dos meios alternativos para a resolução de
conflitos no âmbito da Administração Pública, inclusive a arbitragem, pode ser qualificada
como um avanço da legislação brasileira, porém, para viabilizar seu uso e garantir seu
sucesso, alguns princípios do Direito Administrativo deverão ser mitigados no intuito de
compatibilizar o Direito Público com o Direito Arbitral.
Afirma Selma Maria Ferreira Lemes288 que os investidores, em toda parte do mundo,
inclusive no Brasil, por aportarem capital privado em empreendimentos públicos e de grande
vulto, exigem a arbitragem como mecanismo para resolução de conflitos nos contratos
administrativos de concessões, tal como ocorrido na construção do Eurotúnel e ampliação da
Rodovia dos Imigrantes em São Paulo.
Atenta a este assunto, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que a
arbitragem é válida para os contratos firmados com empresas públicas ou sociedades de
economia mista, no julgamento do Recurso interposto pela AES Uruguaiana que contratou
junto à Companhia Estadual de Energia Elétrica-CEEE a comercialização de energia elétrica e
no contrato se estabeleceu a arbitragem como mecanismo para resolução de conflitos. A
interposição do recurso foi motivada pela negativa da empresa estatal de serviço público em
cumprir o contrato e se sujeitar ao juízo arbitral internacional para resolução do conflito
instalado naquela oportunidade.289
288 LEMES, Selma Maria Ferreira. O uso da arbitragem na administração pública. Disponível na internet em: http://www.arbitragem.com.br/artigos2.htm. Acesso em: 05 de junho de 2008. 289 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Resp. nº 612.439-RS, Segunda Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Brasília, 25 de outubro de 2005. Disponível na internet em: http://www.stj.jus.br. Acesso em: 10 de junho de 2008.
146
Ocorre, todavia, que a arbitragem na Administração Pública ainda é cercada de
resistências que em nada contribuem para a imagem do Brasil em face da comunidade
internacional. Exemplo desse conservadorismo foi o impedimento pela Justiça paranaense da
instauração de procedimento arbitral entre a Companhia Paranaense de Energia e a UEG
Araucária sob alegação de que a cláusula de arbitragem é nula por versar o litígio sobre
direito indisponível, o que por certo não ocorre.290
No âmbito do Direito do Consumidor tal possibilidade já existe desde o advento da
Lei n° 8.078/90 que, textualmente, em seu Art. 4°, V, incentiva os métodos alternativos de
solução de conflitos de consumo, ressalvando que a adoção deste mecanismo, nos contratos
de adesão, sempre dependerá da decisão do consumidor, não podendo lhe ser imposta tal
cláusula, sob pena de nulidade em razão da abusividade da mesma.
Portanto, a aplicabilidade da arbitragem nas concessões de serviços públicos tem
respaldo da legislação em vigor, seja no âmbito do Direito Administrativo ou no do Direito do
Consumidor, razão pela qual sua efetividade prática depende agora de uma abertura cultural
do povo brasileiro, tal qual acontece nos países europeus, conforme já mencionado.
Esta mudança cultural já atingiu a Argentina, país sul-americano que vislumbrou a
grande inovação que seria a solução das controvérsias consumeristas mediante a arbitragem,
ao criar os Tribunais de Arbitragem de Consumo. Neste modelo as partes envolvidas podem
aderir voluntariamente e acordam que o meio competente para processar e julgar o conflito é
o Tribunal Arbitral daquela jurisdição, sendo que deste não caberá recurso.291
No Brasil, encontra-se em desenvolvimento e criação os Tribunais Arbitrais onde, se
procederá a justiça privada e independente, como forma de difundir e aplicar a Lei de
Arbitragem, tal como o Tribunal Arbitral de São Paulo (TASP), fundado em 1998.
Apesar de investir-se de todas as vantagens possíveis em face do processo judicial a
técnica da arbitragem ainda não conseguiu chegar ao seu ápice, encontrando diversas
dificuldades para consolidar-se no ordenamento pátrio. Há que se realizar uma observação
mais apurada acerca da viabilidade deste instituto, conforme leciona Antonio Carlos
Rodrigues do Amaral.292
290 PARANÁ. Tribunal de Justiça. AI nº 142.683-1, Rel. Des. Leonardo Lustosa, Curitiba, 26 de junho de 2003. Disponível na internet em: http://www.tj.pr.gov.br. Acesso em: 10 de junho de 2008. 291 CASELLA, Paulo Borba. Arbitragem para consumo. Disponível na internet em: http://www.arbitragem.com.br/artigos2.htm. Acesso em: 05 de junho de 2008. 292 AMARAL, Antonio Carlos Rodrigues do. Arbitragem: a prática internacional e os perigos da inexperiência brasileira. Revista do Advogado. São Paulo. Ano XXVI, n.87, set.2006, p.23.
147
Nesta esteira, o que parecia ser uma solução um tanto quanto benéfica às partes e para
a ordem jurídica como um todo, por ser um procedimento relativamente rápido e pouco
dispendioso, encontrou um entrave substancial. O custo é muito alto. Os honorários do árbitro
geralmente ultrapassam sobremaneira os custos de um pleito judicial, pelas vias ordinárias, o
que acaba por afastar os cidadãos desta prática.
O entrave encontrado pelos altos custos pode ser resolvido, segundo Selma Maria
Ferreira Lemes293 com a criação de órgãos investidos de independência e imparcialidade, que
agissem com honestidade e lisura, capazes de gerenciar processos e principalmente solucionar
conflitos que dissessem respeito às relações de consumo, isto seria possível com a criação de
parcerias entre estes, a Administração Pública e entidades representantes dos consumidores e
dos fornecedores, garantindo a realização da arbitragem a custos módicos ou mesmo com a
isenção destes.
Desde os idos anos de 1985 o Direito Europeu se preocupa com os mecanismos que
possam vir a facilitar o acesso à Justiça pelos consumidores, criando proteção aos mesmos e
possibilitando maior familiaridade com o sistema, tendo sido criada a “Rede Extrajudicial
Européia”, estendendo-se a arbitragem inclusive ao comércio eletrônico. Exemplo disso é que
Portugal é líder no ranking da arbitragem quando se trata de resolução de conflitos
consumeristas.294
O instituto da arbitragem, apesar de ainda difundido timidamente no Brasil, é, de um
modo geral, bastante utilizado no direito estrangeiro, tendo alcançado avanço significativo
quanto a solução de conflitos visando desonerar o Poder Judiciário, e, seguindo estes moldes,
o sistema brasileiro vem passando por adaptações que garantirão, futuramente, a eficaz
aplicação do mesmo.
Desse modo, é necessário que se realize o devido treinamento daquelas pessoas que
queiram e possam se investir na figura de árbitros, se comprometendo a atuar de maneira
confiável e justa, visando a resolução dos conflitos com agilidade e eficiência, o que garantirá
às partes o atendimento de seus direitos sem que corram o risco de vê-los perecidos pela
morosidade apresentada no Jurisdicional.
293 LEMES, Selma Maria Ferreira. O uso da arbitragem nas relações de consumo. Disponível na internet em: http://www.2oabsp.org.br/asp/esa/comunicacao. Acesso em: 05 de junho de 2008. 294 Idem ibidem.
148
CONCLUSÃO
O objetivo central desta dissertação, diante de todo quadro teórico demonstrado e
segundo a metodologia utilizada, foi apresentar um ponto de vista integrado entre os
mecanismos utilizados para a resolução dos conflitos jurídicos ocorrentes no âmbito das
concessões de serviços públicos e tendo como parte interessada os usuários-consumidores.
A opção pela concessão dos serviços públicos pelo Estado, inicialmente, parecia a
solução necessária, no entanto, quando se passa ao campo da realidade fática percebe-se que a
prática às vezes pode ser bem diversa da teoria, pois o Estado, apesar da existência das
Agências Reguladoras, ainda não se encontra habilitado para realizar uma fiscalização
apropriada para verificar se o serviço público está sendo prestado pelos concessionários nos
padrões previstos contratualmente e também se o equilíbrio econômico-financeiro é o ideal.
Ficou demonstrado que na prática, atualmente, não há distinção entre o usuário de
serviço público e consumidor de produtos e serviços das relações privadas, uma vez que ainda
não se criou a legislação ordinária específica para regular e regulamentar a proteção dos
direitos dos usuários de serviços públicos concedidos, daí porque a equiparação entre usuários
e consumidores e a conseqüente aplicação do código consumerista, razão pela qual se adotou
nesta dissertação o termo usuário-consumidor.
Deste modo, a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor para a resolução de
conflitos oriundos da prestação de serviços públicos concedidos (uti singuli) é amplamente
aceita pela doutrina e jurisprudência pátria, haja vista a hipossuficiencia e vulnerabilidade do
usuário-consumidor em face do concessionário prestador de serviço público e pela
remuneração do serviço ocorrer mediante o pagamento de tarifa.
Todavia, a citada aplicabilidade comporta algumas exceções, entre elas estão os
serviços públicos prestados exclusivamente pela Administração Pública e por ela
indelegáveis, remunerados por taxa, decorrentes de natureza compulsória e da imposição
estatal sustentada por seu poder de polícia (uti universi), tais como a segurança nacional, a
segurança pública, saúde pública, educação pública.
Verificou-se que os conflitos surgem em decorrência da forma ineficiente e muitas
vezes inadequada em que o serviço público é prestado pelo concessionário, descumprindo o
contrato administrativo firmado com o poder concedente, bem como pelo não atendimento do
interesse público, sobrelevando os fins comerciais e infringindo as regras estampadas na Lei
nº 8.987/95 e no Código de Defesa do Consumidor.
149
Ficou demonstrada a importância das Agências Reguladoras no plano teórico-legal,
porém, em razão do pouco tempo de existência, as atribuições das Agências Reguladoras
ainda não puderam alcançar a plenitude de seu papel e os resultados práticos esperados pelos
usuários-consumidores, considerando, ainda, a cultura do povo brasileiro que não as
visualizaram como uma conquista na defesa de seus direitos.
Demonstrou-se a possibilidade de tutelar os direitos do usuário-consumidor pela via
administrativa, conforme autorização da Lei nº 9.784/99 e Art. 5º, LV da Constituição
Federal. Nesta impossibilidade surge o processo judicial como mecanismo pelo qual o Estado
garantirá a ordem social.
Como decantado, o processo judicial não mais atende as necessidades oriundas da
sociedade de massa que, de forma universalizada, passou a exigir um processo que atendesse
direta e eficazmente os conflitos que surgissem, para acompanhar a velocidade em que se
alteram as relações sociais, motivando o surgimento e aplicação de tutelas jurisdicionais
diferenciadas que se adaptassem às mais diversas necessidades dos usuários-consumidores.
Devidamente constatado ficou que as novas técnicas criadas para a resolução de
conflitos são meios capazes de produzir uma resposta jurisdicional efetiva, seja por meio das
tutelas individuais ou das coletivas, buscando alcançar a proteção jurídica do usuário-
consumidor, responsabilizando os concessionários pelos vícios e ineficiência na prestação do
serviço público.
Com relação à responsabilidade, ficou determinado que o concessionário responde
objetivamente pelos danos causados ao usuário-consumidor, sem a necessidade de
demonstração de culpa, diferentemente de sua relação contratual com o poder concedente que
se dá por meio da responsabilidade subjetiva.
Demostrou-se que o acesso à justiça e os mecanismos jurisdicionais de solução de
conflitos são eficientes, todavia, considera-se relativa a eficácia dos resultados práticos, uma
vez que a rigidez do sistema processual atual contamina todo o procedimento, tornando-o
moroso e desumanizado.
Desta feita, os meios alternativos para a resolução de conflitos ganharam contornos
nunca dantes observados no sistema jurídico, evoluindo de maneira promissora para se
atender aquela demanda de conflitos que não foram alvos de processo administrativo ou
judicial.
Viu-se, entretanto, que os métodos alternativos de resolução de conflitos ainda não
atingiram o ponto ideal em razão do pouco tempo da existência da lei específica de
arbitragem, pela não regulamentação da mediação, mas, fundamentalmente, pela cultura do
150
povo brasileiro de resolver os conflitos perante o poder constituído da Justiça, não estando,
ainda, adaptados a essas outras modalidades alternativas.
Importante constatação foi a de que os meios alternativos de resolução de conflitos
podem ser aplicados às concessões de serviços públicos e, em geral, na Administração
Pública, por expressa determinação legal e reconhecimento do Superior Tribunal de Justiça.
Portanto, afirma-se que a resolução dos conflitos decorrentes das concessões de
serviço público ainda encontra-se distante do patamar almejado, uma vez que os passos para
disponibilizar mecanismos úteis e eficientes não operam em conformidade com as atribuições
assumidas pelo poder estatal, deixando de garantir o alcance e manutenção da ordem jurídica
justa.
151
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