textos sobre mobilidade urbana.2015

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TEXTOS SOBRE MOBILIDADE URBANA Cidades lentas Velocidade e amplidão são valores políticos. Como consequência, o transporte público não é priorizado nos orçamentos ou nas políticas urbanas WASHINGTON FAJARDO 30 SEP 2015 - 14:02 BRT O planejamento urbano modernista inaugurou dois valores para as cidades, no mundo, no início do século XX: a velocidade e a amplidão. Conse- quências diretas do advento do automóvel, mas também frutos da crença na tecnologia e na ciên- cia que transformavam a vida, através da Revolu- ção Industrial, da industriosidade, como diz Wal- ter Benjamin, e que produziram grandes concen- trações urbanas, a velocidade e a amplidão vira- ram marcas indeléveis de um espírito do tempo, que origina-se em Europa mas caracteriza-se OSWALDO CORNETI/ FOTOS PÚBLICAS como identidade da “cidade americana”. As metrópoles utópicas seriam então cidades livres do solo, mas não apenas o território, mas o cidadão também o seria. E é nesse aspecto que perdura em nós, brasileiros, o anseio pela velocidade: como princípio individual, como ética pessoal. Brasília não é então um assombro da coletividade nacional mas um território no qual este novo homem brasi- leiro poderia realizar as suas proezas: os cruzamentos livres, as não-interseções, a axialidade e os edifícios na paisagem são monumentos ao não-encontro. Mesmo as superquadras desprovidas de espaços rés-do-chão configuram-se espaços de ingenuidade absoluta, considerando o atrito do corpo social um julgo a ser vencido. Daí as piadas: lá não há esquinas ou botequins. Lá não há o roçar que nos embala. Tais ideias da capital predominam ainda nas grandes cidades brasileiras, nas suas expansões, nas suas bordas e periferias, sejam elas as informais ou nos condomínios. Predominam na cabeça de cada brasileiro. Velocidade e amplidão converteram-se valores políticos. Como consequência o transporte público não é priorizado nos orçamentos ou nas políticas urbanas. Sua realização assim como sua gestão, sua eficiência, são considerados, de modo paradoxal, sonhos utópicos, porque precisam ser feitos lentamente, porque são conquistados paulatinamente. As diversas tramas de prazer que temos na cidade, ao caminhar, ao conversar com os amigos no bar, ao caminhar até o trabalho, ao chegar a tempo para beijar os filhos, passam a ser conquistas épicas das quais não merecemos dispor Porque são também espaços públicos de encontro e de atrito. Essa é a ironia do urbanismo modernista. Logo, as diversas tramas de prazer que temos na cidade, ao caminhar, ao conversar com os amigos no bar, ao apreciar uma vitrine, ao encontrar alguém de surpresa, ao caminhar até o trabalho, ao chegar a tempo para assistir a novela e beijar os fi- lhos, passam a ser conquistas épicas das quais não merecemos dispor. Dispostos estamos a morrer pela velocidade individual mas não quere- mos nos deter sobre as práticas aborrecidas que poderiam nos prover de melhor transporte público e melhor cidade. É necessária uma profunda revisão dos nossos valores urbanos e suas origens modernas. Não nos libertare- mos do passado oligárquico e escravista através de novos territórios tecnicamente eficientes, mas sim pelo lento flanar pela cidade onde poderemos viver e existir juntos. Esbarrando-nos. A calçada pode nos prover mais democracia, mais economia, mais desenvolvimento. Entretanto, curiosamente, os movimentos de busca por cidades mais humanas, sobre cidade “para as pessoas” estão sendo uma vez mais controlados como ali- cerces de um novo debate ideológico, como anti-tese à cidade “empresa”, e, estranhamente, como antagônicos a processos de planejamento ou de provimento de novas infraestruturas urbanas, baseadas em concessões ou em parcerias público-privadas.

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Page 1: Textos Sobre Mobilidade Urbana.2015

TEXTOS SOBRE MOBILIDADE URBANA

Cidades lentas Velocidade e amplidão são valores políticos. Como consequência, o transporte público não é priorizado nos

orçamentos ou nas políticas urbanas WASHINGTON FAJARDO 30 SEP 2015 - 14:02 BRT

O planejamento urbano modernista inaugurou dois valores para as cidades, no mundo, no início do século XX: a velocidade e a amplidão. Conse-quências diretas do advento do automóvel, mas também frutos da crença na tecnologia e na ciên-cia que transformavam a vida, através da Revolu-ção Industrial, da industriosidade, como diz Wal-ter Benjamin, e que produziram grandes concen-trações urbanas, a velocidade e a amplidão vira-ram marcas indeléveis de um espírito do tempo, que origina-se em Europa mas caracteriza-se

OSWALDO CORNETI/ FOTOS PÚBLICAS

como identidade da “cidade americana”.

As metrópoles utópicas seriam então cidades livres do solo, mas não apenas o território, mas o cidadão também o seria. E é nesse aspecto que perdura em nós, brasileiros, o anseio pela velocidade: como princípio individual, como ética pessoal. Brasília não é então um assombro da coletividade nacional mas um território no qual este novo homem brasi-leiro poderia realizar as suas proezas: os cruzamentos livres, as não-interseções, a axialidade e os edifícios na paisagem são monumentos ao não-encontro. Mesmo as superquadras desprovidas de espaços rés-do-chão configuram-se espaços de ingenuidade absoluta, considerando o atrito do corpo social um julgo a ser vencido. Daí as piadas: lá não há esquinas ou botequins. Lá não há o roçar que nos embala. Tais ideias da capital predominam ainda nas grandes cidades brasileiras, nas suas expansões, nas suas bordas e periferias, sejam elas as informais ou nos condomínios. Predominam na cabeça de cada brasileiro. Velocidade e amplidão converteram-se valores políticos. Como consequência o transporte público não é priorizado nos orçamentos ou nas políticas urbanas. Sua realização assim como sua gestão, sua eficiência, são considerados, de modo paradoxal, sonhos utópicos, porque precisam ser feitos lentamente, porque são conquistados paulatinamente.

As diversas tramas de prazer que temos na cidade, ao caminhar, ao conversar com os amigos no bar, ao caminhar até o trabalho, ao chegar a tempo para beijar os filhos, passam a ser conquistas

épicas das quais não merecemos dispor

Porque são também espaços públicos de encontro e de atrito. Essa é a ironia do urbanismo modernista. Logo, as diversas tramas de prazer que temos na cidade, ao caminhar, ao conversar com os amigos no bar, ao apreciar uma vitrine, ao encontrar alguém de surpresa, ao caminhar até o trabalho, ao chegar a tempo para assistir a novela e beijar os fi-lhos, passam a ser conquistas épicas das quais não merecemos dispor. Dispostos estamos a morrer pela velocidade individual mas não quere-mos nos deter sobre as práticas aborrecidas que poderiam nos prover de melhor transporte público e melhor cidade.

É necessária uma profunda revisão dos nossos valores urbanos e suas origens modernas. Não nos libertare-mos do passado oligárquico e escravista através de novos territórios tecnicamente eficientes, mas sim pelo lento flanar pela cidade onde poderemos viver e existir juntos. Esbarrando-nos. A calçada pode nos prover mais democracia, mais economia, mais desenvolvimento. Entretanto, curiosamente, os movimentos de busca por cidades mais humanas, sobre cidade “para as pessoas” estão sendo uma vez mais controlados como ali-cerces de um novo debate ideológico, como anti-tese à cidade “empresa”, e, estranhamente, como antagônicos a processos de planejamento ou de provimento de novas infraestruturas urbanas, baseadas em concessões ou em parcerias público-privadas.

Page 2: Textos Sobre Mobilidade Urbana.2015

A demonização dos mecanismos de mercado que podem porventura gerar mais investimentos em ampliação da malha de transporte público, a velocidade coletiva, só produzem mais desigualdade, e mais segregação, onde a luta por espaço público se converte em, uma vez mais, e repetidamente, na manutenção do status quo brasileiro, do julgo individual sobre o público, e a consolidação da velocidade privada, seja ela pelo carro ou pela "bike", nada mais que a nossa manifestação de viés modernista. É necessário destituir o planejamento urbano do seu exclusivo caráter finalístico e doutrinário, ou utópico, e convertê-lo à sua essência projetual essencial de ser um meio pelo qual podemos chegar em melhores cidades, mais justas, compreendendo, contudo, que a melhor cidade que temos é a cidade que temos. É ela, imperfeita, complexa, mestiça, que contém todas as respostas, competindo a nós fazermos melhores perguntas. Quem sabe com a lentidão individual possamos perceber a cidade que nos cerca como boa, culturalmente vas-ta, econômica e ambientalmente resiliente, e, podendo enxergá-la melhor, compreenderemos que o planeja-mento urbano avançado deva usar dos mecanismos do mercado necessários para produzir infraestruturas melhores, que possam, coletivamente, nos conduzir juntos, nas nossas desigualdades, coletiva e velozmente a uma condição melhor, quando então descobriremos que é aqui mesmo, no chão carregado da história dura do Brasil, que pode surgir uma sociedade mais justa.

Washington Fajardo é arquiteto e urbanista, presidente do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade e do Conselho Municipal de Proteção do Patrimônio Cultural

http://brasil.elpais.com/brasil/2015/09/29/opinion/1443559908_994679.html

9 razões do porquê os EUA são mais dependentes do automóvel que a Europa

16 e 17 ABR 2014 - por Equipo Plataforma Arquitectura © photographerglen / La Citta Vita, via Flickr

Deparamo-nos com um artigo de The Atlantic Cities com uma interessante análise do porquê as cidades estadunidenses são mais dependentes do automóvel do que as europeias.

O artigo explica que entre os anos 1920 e 1960, as políticas adotadas a respeito do automóvel nos Estados Unidos serviram de modelo para grande parte da Europa ocidental. Mas no final de 1960, muitas cidades europeias começaram a reorientar suas políticas para frear o uso do automóvel promovendo o uso do transporte público, da bicicleta e de se locomover a pé.

Durante as últimas duas décadas, em um contexto onde as cidades dos EUA são muito dependentes do automóvel, com grande expansão dos seus subúrbios e um sistema de transporte cada vez mais insustentável, inverteu-se as posições e os planejadores desse país começaram a observar as políticas de transporte europeias.

Page 3: Textos Sobre Mobilidade Urbana.2015

Os números mostram a necessidade de uma mudança. Em 2010, os estadunidenses fizeram 85% de suas viagens diárias em automóvel, em comparação com a Europa, onde o automóvel é utilizado entre 50 e 65% das viagens diárias. As longas distâncias somente explicam em parte a diferença, porque a realidade é que nos Estados Unidos 70% das viagens de uma milha (aprox. 1.5 km) são feitas com automóvel, enquanto na Europa as viagens dessa mesma distância são feitas 70% a pé, em bicicleta ou em transporte público.

A seguir, 9 razões de porquê os EUA é mais dependente do automóvel que a Europa.

1. A motorização massiva: A motorização massiva ocorreu antes nos Estados Unidos do que na Europa, facilitada principalmente pela produção em cadeia que fez com que comprar um automóvel fosse mais barato, enquanto que a propriedade de automóvel na Europa se limitava principalmente a elite endinheirada. Por outro lado, sobre tudo nos anos seguintes a Segunda Guerra Mundial, a classe média estadunidense tinha um maior poder aquisitivo para comprar um automóvel do que a classe media europeia.

2. Infraestrutura: Como resultado da motorização massiva precoce, as cidades estadunidenses foram as primeiras em adaptar-se ao automóvel em uma grande escala. Os planejadores e engenheiros estadunidenses desenvolveram as normas iniciais para a construção de rodovias, pontes, túneis, intersecções, sinais de trânsito, autopistas e estacionamentos. As inovações se estenderam rapidamente por todo o país. As cidades europeias também começaram a se transformar para receber aos automóveis, porém muito mais lentamente, já que a Segunda Guerra Mundial também influenciou nesse aspecto.

3. Impostos sobre os veículos: Os relacionados ao automóvel têm sido mais altos na Europa. Hoje um galão de benzina custa o dobro na Europa comparado aos Estados Unidos. Por outro lado, na Europa os impostos fiscais do combustível, normalmente contribuem com o fundo geral, quer dizer, o gasto destinado à construção de rodovias deve ser justificado e competir com os outros gastos do governo. Em muitos estados dos EUA, grande parte dos impostos fiscais do combustível são destinados diretamente à construção de rodovias, assegurando um fluxo constante de fundo para esse item.

4. Sistema interestatal: Na década de 50 o governo dos EUA fez um grande investimento no Sistema Interestatal de Rodovias que logo atravessou a maioria das áreas urbanas do país. Isso facilitou a expansão suburbana e modificou bairros no centro das cidades que perderam seu caráter de pedestre. No outro lado do Atlântico, vários governos europeus também proporcionaram subsídios para as rodovias, mas em geral em um nível inferior ou por períodos mais curtos de tempo. Por outra parte, as rodovias europeias geralmente unem as cidades em vez de atravessá-las.

5. Os subsídios do governo: Durante os últimos 40 anos, os impostos sobre a gasolina, os pedágios e as taxas de registro dos automóveis acobertaram somente 60 ou 70% dos gastos nas rodovias dos EUA. O resto tem sido pago mediante impostos não relacionados ao transporte. Essas subvenções têm diminuído o custo e aumentado a demanda do automóvel privado nos EUA. Nos países europeus, os motoristas costumam pagar mais impostos e taxas do que o gasto que os governos têm com as rodovias.

6. Enfoque tecnológico: As respostas políticas aos problemas gerados pelo automóvel nos EUA se concentraram nas mudanças tecnológicas em vez de promover uma mudança de comportamento. Por exemplo, as respostas a contaminação do ar ou a segurança consistiam em soluções tecnológicas – tais como conversores catalíticos, combustíveis mais limpos e reformulados, cintos de segurança e airbags – que permitem que as pessoas continuem dirigindo como de costume. Os países europeus incorporaram esses requisitos tecnológicos, mas também reduziram a quantidade de estacionamentos e aplicaram outras políticas públicas que fomentam mudanças no comportamento.

7. O transporte público: O apoio do governo ajudou aos sistemas de transporte europeus a lidar com o aumento do número de automóveis com mais êxito. Especialmente depois da Segunda Guerra Mundial, os sistemas de transporte dos Estados Unidos, que eram de propriedade privada, aumentaram suas tarifas, perderam passageiros, ou foram a falência. Por exemplo, muitas cidades viram seus sistemas de bonde desaparecer por completo nos anos 50 e 60 (embora nos últimos anos este sistema tenha ressurgido).

8. A pé ou de bicicleta: Somente algumas poucas cidades dos Estados Unidos implementaram desde os anos 70 serviços para pedestres e ciclistas. Em contraste, muitas cidades europeias, como Amsterdã e Copenhagen, implementaram redes inteiras de ciclovias e acalmaram o tráfego em suas ruas, o que permite um fácil percurso em bicicleta entre qualquer ponto de origem e destino em uma cidade ou região. Além disso, as leis de transito europeias protegem aos pedestres e ciclistas, frequentemente colocando a responsabilidade de um acidente no motorista, enquanto as leis dos Estados Unidos, a polícia, os tribunais e os juízes em geral não conseguem processar ou penalizar os motoristas que matam pedestres ou ciclistas.

Page 4: Textos Sobre Mobilidade Urbana.2015

9. Leis de zoneamento: Existem muitas diferenças entre os sistemas de planejamento do uso do solo nos Estados Unidos e na Europa. Os europeus tendem a permitir uma maior mescla de usos nas suas zonas residenciais, mantendo as distâncias mais curtas. Por exemplo, na Alemanha, uma zona residencial pode incluir consultórios médicos, cafés e edifícios residenciais. Nos Estados Unidos, ao contrário, as zonas residenciais, frequentemente proíbem outros usos. Outro fator é que nos Estados Unidos se estabelece um número mínimo de estacionamentos para o desenvolvimento de projetos imobiliários, enquanto na Europa o que se impõem é o número máximo.

Equipo Plataforma Arquitectura. "9 razões do porquê os EUA são mais dependentes do automóvel que a Europa (Parte I)" 16 Abr 2014. ArchDaily Brasil. Acessado 23 Set 2015. http://www.archdaily.com.br/188995/9-razoes-do-porque-os-eua-sao-mais-dependentes-do-automovel-que-a-europa-parte-i Equipo Plataforma Arquitectura. "9 razões do porquê os EUA são mais dependentes do automóvel do que a Europa (Parte II)" 17 Abr 2014. ArchDaily Brasil. Acessado 23 Set 2015. http://www.archdaily.com.br/br/600011/9-razoes-do-porque-os-eua-sao-mais-dependentes-do-automovel-do-que-a-europa-parte-ii

23/09/2015 20h28 - Atualizado em 23/09/2015 21h29

Em outras metrópoles, Haddad seria um 'visionário', diz 'Wall Street Journal' Jornal americano falou das ações do prefeito de SP pela mobilidade urbana. Reportagem ressalta a polarização provocada pelas ações do executivo. Do G1 São Paulo

Reportagem do The Wall Street Journal destaca a gestão Haddad em SP (Foto: Reprodução/WSJ)

O jornal norte-americano "The Wall Street Journal" publicou nesta quarta-feira (23) uma reportagem sobre o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, e seu trabalho de ampliação das ciclovias, defesa do uso de bicicletas e redução do volume de automóveis, entre outras medidas – que está polarizando a cidade.

"Se o prefeito altamente impopular de São Paulo, Fernando Haddad, fosse o chefe de San Francisco, Berlim ou alguma outra metrópole, ele seria considerado um visionário urbano", escreveu o WSJ.

Segundo o jornal, "o ambicioso plano para converter o tráfego sufocante de 12 milhões de veículos em uma zona amigável para bicicletas é elogiada por muitos, mas deixa motoristas espumando de raiva".

"O prefeito é frequentemente fotografado pedalando ao longo dos novos trechos de ciclovias, às vezes ostentando um terno de negócio e um capacete." O jornal diz que Haddad enfrenta baixos índices de popularidade (20% de aprovação) e muita resistência de setores da sociedade.

Avenida Paulista A reportagem também fala das ações de Haddad para fechar a Avenida Paulista aos domingos e transformar a via em um local de lazer. O WSJ lembra que o prefeito enfrenta questionamentos sobre suspeita de superfaturamento nas obras nas ciclovias e de sua atenção para um tema considerado por críticos "um luxo de baixa prioridade em uma cidade voltada para o aumento da criminalidade, com escolas e hospitais públicos com pouco dinheiro".

O WSJ ouviu alguns especialistas para comentar o trabalho do prefeito paulistano. "Quando você pressiona o status quo, o status quo empurra para trás", disse a ex-secretária de transportes de Nova York, Janette Sadik-Khan. Ela considera que Haddad está "preparando o terreno para uma São Paulo mais sustentável".

Já para Vilma Peramezza, presidente de uma associação de bairros de São Paulo que quer mais estudos sobre o impacto das ciclovias, a política de mobilidade é questionável. "O automóvel tem sido sempre um objeto de desejo e também uma necessidade. Depois de fazer uma cidade que vive ao lado do carro, eles querem mudar isso?", questiona.

http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2015/09/em-outras-metropoles-haddad-seria-um-visionario-diz-wall-street-journal.html

Prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, na inauguração de ciclovia da Av Paulista (Foto: Caio Kenji/G1)

Page 5: Textos Sobre Mobilidade Urbana.2015

Número de ciclistas aumentou com implantação de ciclovias na capital Pesquisa feita pela Ciclocidade realizou mapeamento inédito do perfil de quem utiliza a bicicleta na cidade 22/09/2015 12:40

De Secretaria Executiva de Comunicação

Os resultados da pesquisa “Perfil de quem usa bicicleta na cidade de São Paulo”, divulgada nesta segunda-feira (21) durante a Semana da Mobilidade 2015, revelaram que 40% dos ciclistas começaram a pedalar há menos de um ano nas áreas central e intermediária da cidade, possivelmente influenciados pela expansão da malha cicloviária. O mapeamento, inédito na capital e um dos mais abrangentes realizados, foi elaborado pela Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo (Ciclocidade) em parceria com a ONG Transporte Ativo, Observatório das Metrópoles e apoio do banco Itaú.

“Isso [o estudo] é prova de que o cicloativismo estava certo. O que se dizia? Não dá para ter ciclista sem infraestrutura. A oferta de infraestrutura vai gerar demanda pela ciclovia. Então aqueles que criticavam democraticamente dizendo que estavam sendo feitas ciclovias para ninguém vão ter que rever os seus conceitos, porque naquele dia era verdade e um ano depois já não é mais. Nós não podemos trabalhar com o planejamento da cidade de um dia. Nós temos que planejar a cidade para 10, 20 anos e é isso o que está sendo feito em São Paulo hoje”, disse o prefeito Fernando Haddad na manhã desta terça-feira (22).

Além de traçar um perfil dos usuários, a pesquisa tem o objetivo de trazer informações que possam subsidiar a formulação de políticas públicas voltadas a quem utiliza a bicicleta como meio de transporte na cidade.

Questionados sobre quando a bicicleta começou a ser usada como meio de transporte, 29% dos entrevistados disseram utilizá-la há mais de 5 anos, enquanto 19% pedalam há menos de 6 meses. Mais de 70% dos ciclistas afirmam usar a bicicleta pelo menos 5 vezes por semana, indicando que a bicicleta é, de fato, o principal meio de transporte para muitos paulistanos. Esse resultado se repete entre homens e mulheres.

A pesquisa revelou ainda que 62% dos paulistanos pedalam mais de 5km no principal deslocamento feito por bicicleta no dia e, como forma de melhorar seus deslocamentos diários, 50% dos entrevistados sugeriram a implantação de mais vias exclusivas para ciclistas na cidade. Entre os entrevistados que disseram nunca usar ciclovias em suas viagens, 80% estão na periferia.

“Tem muita gente que acha que a Prefeitura já fez muita ciclovia, mas na verdade não é isso. Precisa haver uma política permanente de ampliação, com conexão entre as ciclovias, por isso que a pesquisa revela essa insatisfação”, disse o secretário municipal de Transportes, Jilmar Tatto.

Quase 40% dos ciclistas da capital ganham entre 0 e 2 salários mínimos (R$ 1.576), índice semelhante ao número de entrevistados que têm entre 25 e 34 anos. Ciclistas de 35 a 44 anos compõem a segunda faixa etária mais presente, com cerca de 27%.

“Essa pesquisa está muito alinhada aos nossos três eixos de atuação, que é a participação pública, que faz o relacionamento com o poder público, a área de pesquisa, que faz a coleta de dados para subsidiar as políticas públicas, e a área de cultura e informação, que faz a parte de eventos”, disse o diretor de participação e coordenador executivo da Ciclocidade, Daniel Guth.

A intenção da pesquisa era saber quem utiliza a bicicleta como meio de transportes na cidade, por qual motivo, quanto tempo gastam em seus trajetos, qual a distância percorrida nos deslocamentos, como avaliam os seus percursos, as estruturas viárias e cicloviárias, além de propor melhorias.

Também estiveram presentes na apresentação o secretário municipal de Cultura, Nabil Bonduki, a superintendente de Relações Institucionais e Governamentais do Itaú Unibanco, Luciana Nicola, o diretor da Transporte Ativo, Zé Lobo, a coordenadora de pesquisas da Ciclocidade, Ana Carolina Nunes e a arquiteta da CET Suzana Nogueira.

Metodologia

No período de 10 a 28 de agosto foram aplicados 1.804 questionários às pessoas que estavam andando de bicicleta no período de 6h e 12h e entre 16h e 20h em todas as regiões da cidade, do centro à periferia, tanto em vias contempladas por ciclovias ou ciclofaixas quanto em ruas ainda sem infraestrutura, mas que são usadas com frequência por ciclistas. Também foram realizadas abordagens em bicicletários públicos e com usuários dos sistemas de bicicletas compartilhadas.

Dois questionários foram aplicados, um sobre a idade, renda, profissão, motivação para o uso da bicicleta, tempo e perfil dos deslocamentos. O segundo avaliou as condições e segurança do percurso, sugestão de melhorias, quilometragem do principal deslocamento e se o usuário indicaria o percurso a um idoso ou a uma criança.

Page 6: Textos Sobre Mobilidade Urbana.2015

Semana da Mobilidade 2015

Neste ano, a Semana tem como tema “Mobilidade: seja você a mudança na cidade” e pretende mostrar a mudança de postura dos paulistanos na busca pela redução dos acidentes e a democratização do sistema viário. Durante toda a semana, e também até o final do mês de setembro, serão realizadas atividades em parceria com outras secretarias municipais e entidades privadas, com temas variados como circulação de bicicletas, segurança no trânsito, além de audiências para debater a mobilidade em São Paulo.

A Semana da Mobilidade é uma iniciativa prevista pelo Código de Trânsito Brasileiro, realizada pelos órgãos que compõem o Sistema Nacional de Trânsito.

http://www.capital.sp.gov.br/portal/noticia/6047#ad-image-0

Brasil perde R$ 156,2 bilhões do PIB com a morosidade do trânsito em São Paulo 02 de outubro de 2015

José Tadeu Arantes | Agência FAPESP – Quanto custa ficar parado no trânsito em São Paulo? Esta per-gunta foi respondida com precisão. “Hoje, pessoas que trabalham fora de casa gastam em média 100 minutos do dia na ida e volta entre os locais de moradia e de trabalho. Considerando as características estruturais da Região Metropolitana de São Paulo e os padrões de mobilidade verificados em outras cidades do país, seria possível reduzir esse intervalo de tempo em até meia hora.

O aumento de produtividade resultante faria o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, que atingiu o patamar de R$ 5,5 trilhões em 2014, crescer aproximadamente 2,83% -- ou seja, R$ 156,2 bilhões. E isso acarretaria um adicional de R$ 97,6 bilhões no consumo da população brasileira.”

No Município de São Paulo, que concentra a maior parte da frota, a média é de 1 veículo para menos de 2,2 habitantes (foto: Léo Ramos/FAPESP)

O raciocínio é do economista Eduardo Haddad, professor titular do Departamento de Economia da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP). Ele coordenou a pesquisa “Mobilidade, acessibilidade e produtividade: nota sobre a valoração econômica do tempo de viagem na Região Metropolitana de São Paulo”.

A pesquisa contou com o apoio da FAPESP por meio do projeto de auxílio regular “Modelagem integrada de sistemas econômicos metropolitanos” e de uma bolsa de pesquisa no exterior “Sistemas econômicos urbanos”.

“Os maiores obstáculos para que a redução do tempo nas locomoções seja obtida, com todo o benefício econômico que isso acarretaria, é a grande dependência ao uso do automóvel e o tamanho descomunal da frota de veículos em circulação na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP). Essa frota, que se tornou excessiva para a infraestrutura viária existente, alcançou, em julho de 2015, o montante de 8.357.762 veículos [Fonte: Departamento Nacional de Trânsito – Denatran]”, disse Haddad à Agência FAPESP.

Como a população da RMSP foi estimada em 21.090.791 habitantes em agosto de 2015 [Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE], a combinação dos dois números fornece a média de 1 veículo para 2,5 habitantes. No município de São Paulo, que concentra a maior parte da frota, a média é de 1 veículo para menos de 2,2 habitantes.

Apenas para efeito de comparação, a população da cidade de Nova York foi estimada em 8.491.079 habitantes em 2014 [Fonte: City of New York – Department of City Planning]. Portanto, o número de veículos na Região Metropolitana de São Paulo é quase igual ao número de pessoas na cidade de Nova York.

A frota da Região Metropolitana de São Paulo distribui-se em 5.267.392 veículos no município de São Paulo e 3.090.370 veículos nos demais municípios que compõem a RMSP. “Na última década, a população do município de São Paulo aumentou 6,6%, enquanto sua frota de automóveis de passeio cresceu 48,2%. No mesmo período, a rede viária (avenidas e ruas) do município praticamente não mudou, o que significa que passou a ser ocupada por um número muito maior de veículos. O número de automóveis de passeio por quilômetro quadrado no município aumentou de 3.765, em 2005, para 5.579, em 2015”, informou o pesquisador.

Horários de pico

Page 7: Textos Sobre Mobilidade Urbana.2015

A maior concentração de veículos, gerando lentidão do tráfego ou congestionamentos, ocorre nos dois horários de pico, no início da manhã e no final da tarde, que são justamente os horários de deslocamento da grande maioria dos trabalhadores. De acordo com os dados do último Censo Demográfico do IBGE, de 2010, dos 6,36 milhões de trabalhadores atuantes no município de São Paulo, quase 1 milhão residia fora da capital paulista. Na mesma data, 170 mil trabalhadores paulistanos precisavam se deslocar em sentido contrário, para alcançar seus locais de trabalho em outros municípios.

“Na maior parte das sub-regiões que compõem a RMSP, a oferta de empregos é menor do que a população em idade ativa. A grande exceção ocorre no chamado ‘centro expandido’, compreendido entre as vias marginais dos rios Tietê e Pinheiros. Com mais de 1 milhão de postos de trabalho excedentes, o ‘centro expandido’ é a principal bacia de empregos da RMSP, tornando-se, assim, o ponto focal dos deslocamentos diários dos trabalhadores, com lentidão ou congestionamentos nas principais vias que o conectam às demais áreas”, afirmou Haddad.

Além disso, o município de São Paulo apresenta um terceiro horário de pico, pois muitos trabalhadores aproveitam a hora do almoço para cuidar de seus interesses pessoais. E, como grande parte utiliza o automóvel para se deslocar, isso provoca um expressivo adensamento do trânsito nesse horário.

Um quadro comparativo dos tempos médios de deslocamento em várias regiões metropolitanas do mundo foi composto, em 2014, pelo Toronto Region Board of Trade, do Canadá. E mostrou que o tempo médio de deslocamento em São Paulo é maior do que em Tóquio, Nova York, Londres, Paris e Madri, e ligeiramente menor do que em Xangai, na China. A Cidade do México é o lugar onde essa variável alcança o maior valor: 142 minutos. Mas é preciso levar em conta que 4 milhões de trabalhadores se deslocam diariamente para a Cidade do México a partir de outros municípios – um número quatro vezes maior do que o registrado em São Paulo.

A pesquisa coordenada por Eduardo Haddad procurou quantificar o impacto econômico da morosidade do trânsito na Região Metropolitana de São Paulo. “Primeiro estabelecemos as características estruturais da RMSP, considerando dados como área do território, área urbanizada, tamanho da população, níveis de renda da população, preços dos imóveis nas várias sub-regiões, quantidade e densidade dos postos de trabalho, salário médio dos trabalhadores etc. Depois, levando em conta essa estrutura, estimamos um tempo de locomoção que poderíamos classificar como ‘normal’. Esse tempo é da ordem de 70 minutos. Mas o tempo real excede em aproximadamente meia hora o valor esperado, chegando a cerca de 100 minutos. O diferencial é o que se chama no jargão técnico de ‘excesso de fricções de mobilidade’”, explicou o pesquisador.

Fricções de Mobilidade O passo seguinte foi calcular como esse “excesso de fricções de mobilidade” afeta a produtividade dos trabalhadores [são definidos como “trabalhadores”, no caso, todas as pessoas que trabalham fora de casa]. E como sua eventual eliminação se traduziria em acréscimo de produtividade e correspondente aumento do PIB e do consumo.

“Sabemos que maior tempo de deslocamento acarreta menor produtividade, porque as pessoas tendem a chegar mais tarde e sair mais cedo do trabalho, e já chegam aos locais de trabalho cansadas, devido ao esforço despendido no trânsito”, argumentou Haddad.

Isso é fácil de perceber. Mas existe também outro fator, não tão facilmente perceptível, mas talvez até mais importante. “É que tempos de deslocamento mais curtos geram um mercado de trabalho mais denso, isto é, com maior número de trabalhadores potenciais a uma dada distância de cada local de trabalho. E isso acarreta um dos efeitos benéficos da chamada ‘economia de aglomeração’, que é o fato de os trabalhadores terem mais opções para encontrar os empregos de sua preferência e de as firmas terem mais opções de contratar os trabalhadores de que necessitam”, prosseguiu o pesquisador.

Tempos de deslocamento mais curtos aumentam as opções de escolha tanto dos trabalhadores quanto das firmas, favorecendo os dois lados da moeda do mercado de trabalho. E isso aumenta a produtividade.

“Nossos cálculos permitiram estabelecer que, se a meia hora a mais no tempo de deslocamento dos trabalhadores fosse eliminada, o ganho médio de produtividade seria de aproximadamente 15,7%. Dependendo da maior ou menor distância entre os locais de residência e os locais de trabalho, o adicional de produtividade variaria de 12,6% a 18,9%. E esse acréscimo de produtividade causaria um aumento de 2,83% no PIB nacional, com o correspondente crescimento no nível de consumo dos trabalhadores”, disse Haddad.

“A cidade de São Paulo absorveria aproximadamente 50% de todo esse benefício, com um aumento de 10,94% do PIB municipal. Considerando a Região Metropolitana de São Paulo em seu conjunto, teríamos um aumento de 12,89% do PIB regional e de 18,53% do consumo dos habitantes”, informou o pesquisador.

Integração de modelos de grande escala O que sua pesquisa fez foi aquilo que, na linguagem técnica, é chamada de “integração de modelos de grande escala”. No caso, foram integrados três modelos: o modelo de demandas de viagens, que combina informações sobre os deslocamentos das pessoas com o levantamento da infraestrutura física da rede (rotas de ônibus, de metrô, de automóveis etc.); o modelo de produtividade, estabelecendo relações quantitativas entre estrutura da cidade, características dos trabalhadores e produtividade; e o modelo macroespacial de equilíbrio geral computável, que transforma produtividade em impactos de ordem superior, como PIB e consumo.

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“Para fazer esse levantamento, cruzamos dois grandes conjuntos de dados: os dados do último Censo Demográfico do IBGE, de 2010; e os dados da Pesquisa de Origem e Destino, realizada pelo Metrô de São Paulo em 2007, compatibilizados com os valores de 2010”, detalhou Haddad. A pedido da Agência FAPESP, o pesquisador extrapolou posteriormente os resultados com base em estimativas numéricas de 2014, produzindo um quadro bem próximo da situação atual.

http://agencia.fapesp.br/brasil_perde_r_1562_bilhoes_do_pib_com_a_morosidade_do_transito_em_sao_paulo/21984/

Frota de veículos cresce mais rápido que a estrutura viária no país ANDRÉ MONTEIRO - DE SÃO PAULO - 20/08/2014 02h00

A frota de veículos nas maiores cidades do país cresceu bem mais que a estrutura viária nos últimos anos.

De 2003 para 2012, enquanto a frota aumentou 92%, a extensão de ruas subiu 16%.

A informação é de pesquisa inédita da ANTP (Associação Nacional de Transportes Públicos), que comparou dados de 438 municípios com mais de 60 mil habitantes.

A entidade usou dados oficiais para estimar a frota que efetivamente está em circulação e a quilometragem do sistema viário. O cálculo é baseado no tamanho e no crescimento das cidades e não inclui novas obras como de viadutos, por exemplo.

Segundo o engenheiro e sociólogo Eduardo Vasconcellos, coordenador do trabalho, a malha viária já está estabelecida e cresce conforme o aumento da população.

Com isso, a explosão da frota, principalmente de carros (70%) e motos (209%), explica os congestionamentos cada vez maiores nos grandes centros e que já chegam também ao interior do país.

"Um aumento de 5% da frota causa um impacto muito maior no trânsito, pois a relação entre fluxo e tempo de percurso não é linear. Em cinco ou seis anos a cidade entope", diz Vasconcellos. Ele avalia que a experiência nos países mostra que a saída não passa por gastar milhões para abrir mais ruas e avenidas, que inevitavelmente vão lotar. Cita como exemplo a cidade de Los Angeles, nos EUA, que tem grande quantidade de vias expressas mas sempre figura entre as campeãs de lentidão.

O caminho, diz, é fomentar o transporte coletivo e, principalmente, acabar com o estímulo oficial concedido ao transporte individual –como a redução de impostos para a compra de novos veículos e subsídio à gasolina.

A pesquisa aponta que a gasolina subiu 38% em dez anos, menos que a inflação de 160% do INPC/IBGE.

"Descontando o gasto com a compra e manutenção, o custo de usar o carro em um mesmo deslocamento é equivalente à tarifa do transporte público nas nossas cidades. Na Europa, essa relação é de cinco vezes", diz.

Para Vasconcellos, a melhoria do transporte coletivo é urgente, mas enquanto "o custo de usar o carro for igual ao ônibus, a maioria das pessoas vai ficar no carro".

ENTREVISTA Folha - Equanto a população cresceu 16%, a frota de carros subiu 70% e a de motos, 209%. O que levou a esse cenário? Eduardo Vasconcellos - A facilidade de aquisição de veículos, de financiamento, e os estímulos e subsídios. Sempre houve um apoio completo do Estado brasileiro à indústria automobilística, e agora à indústria de motocicletas também. Então na medida que é mais fácil comprar os veículos, e também não é caro usá-los, isso aumenta muito o uso de automóveis e motocicletas. Tem outro dado que levantamos há alguns anos, mas que vale para hoje, que é o custo dos

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três modos. A gente comparou o custo de fazer um deslocamento em uma cidade média brasileira usando a moto, o automóvel ou o ônibus. O custo de desembolso de usar o automóvel, que é gasolina e estacionamento, é praticamente igual a uma tarifa de ônibus. O custo da moto é um terço. Então o estímulo é muito grande para não usar o ônibus, e além disso você tem todas as facilidades para comprar os veículos. É uma política determinada do governo federal, não é deste, vem desde 1930 o apoio indiscriminado do uso do automóvel e, agora, da motocicleta. Todos os governos, independente das cores ideológicas, adotaram este procedimento. Infelizmente, para quem defende o fortalecimento do transporte coletivo, é uma má notícia. Como você acha que será o cenário nos próximos dez anos? As ações de políticas públicas estruturais do Estado brasileiro continuam exatamente iguais, não mudou nada. O índice de motorização da população brasileira ainda é pequeno perto dos países ricos, então o mercado para automóveis e motocicletas ainda é muito grande. O Brasil é visto como uma das grandes fronteiras, é de longe o que tem mais potencial de crescimento para a indústria automobilística, tirando a Índia e a China. Portanto, a tendência geral do Brasil sem dúvida nenhuma vai ser a mesma nos próximos dez anos. Hoje não existe nenhum grupo político que queira mudar essa situação, então a previsão é que isso continue, principalmente nas cidades menores. Já está acontecendo no interior do Estado de São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas, está crescendo muito a motocicleta e o automóvel, e caindo a participação do ônibus. Agora, nas grandes cidades, em que o congestionamento tende a ser muito grande, vai haver pressões para usar menos o automóvel. Isso já está acontecendo em São Paulo, começa acontecer no Rio, Belo Horizonte também. Então nas grandes cidades o uso do automóvel pode ser um pouco menor do que vem sendo em função de uma série de restrições, mas vai depender do momento político, de cada prefeito. Mas, no geral, o Estado brasileiro adotou o modelo de privatização da mobilidade. A gestão Haddad tem um discurso de incentivo ao transporte público e promove ações como as faixas de ônibus, promete fazer corredores. Isso será suficiente para atrair o usuário do carro? A prefeitura atual de São Paulo é uma das exceções do que falei. Ela está procurando coisas novas na linha de incentivar mais o transporte público, está buscando muitas soluções. Não quer dizer que acertou com tudo, mas tem essa motivação que não existe muito no Brasil. Outra coisa muito importante, que aprendemos com os europeus, e que vale para a gente, é o seguinte: o custo de desembolso é o que move as pessoas para tomar a decisão de usar o carro, a moto ou o ônibus. Depois que ela comprou o veículo não pensa mais na manutenção, essas coisas. Só pensa na gasolina, no caso da moto e do carro, mais um eventual estacionamento, no caso do carro, e a tarifa do ônibus. O que acontece em São Paulo e no Brasil todo é que o custo de desembolso de usar a moto é um terço da tarifa do ônibus. E o custo do automóvel é no máximo igual ou 10% a mais, então é praticamente igual ao custo de subir num ônibus. Então o desestímulo a usar o ônibus é enorme. Na Europa se usa menos o automóvel porque lá o custo de usar um automóvel e o transporte público é cinco vezes. Nos países ricos onde custa mais caro usar, as pessoas fazem a conta e uma parte grande delas não usa o automóvel durante a semana. No Brasil, toda a política para ajudar o automóvel foi para diminuir o custo de usar. É muito importante melhorar a condição do transporte coletivo. Não é só qualidade, é importante também a regularidade, a previsibilidade. O metrô é muito apreciado porque você entra e sabe que 31 minutos depois chega ao destino. É super previsível, e isso vale muito, não é só o custo. Os ônibus de São Paulo são imprevisíveis, é o grande problema. Então investir na qualidade, faixa exclusiva, corredor, é muito importante para melhorar a previsibilidade, mas enquanto o custo de desembolso do automóvel for igual ao do ônibus, a maioria das pessoas permanecerá no automóvel. O efeito será limitado, não será suficiente. Mas nenhum político quer discutir esse problema, essa é a grande dificuldade. Se você fala em cobrar alguma coisa do automóvel, parece que você está extorquindo. Cada modo de transporte consome espaço, energia, tempo e dinheiro, além de causar impactos como acidentes de trânsito e poluição. Os europeus fazem a conta de quanto custa entrar em um automóvel sozinho e andar 10 km dentro de Londres, por exemplo. Isso custa caro para a sociedade, então o governo cobra um preço mais alto para você usar esse privilégio de andar de carro numa cidade como Londres. Você defende a cobrança de pedágio urbano como em Londres? A lógica é que o sistema público de vias custou uma fortuna, e você está entrando nele com uma caixa metálica, que é sua, e que vai ocupar 40 m² para conseguir circular, enquanto no ônibus se consome bem menos espaço público, até 2 m². No Brasil, nós não cobramos de quem usa automóvel o verdadeiro custo que significa isso, mas temos que cobrar. Não é questão de perseguir os automobilistas, não vai ser proibido andar de carro, você vai andar onde não tem congestionamento, à noite, no fim de semana. Então todas as faixas exclusivas são muito importantes para garantir velocidade e regularidade aos ônibus, mas para as pessoas realmente saírem do carro você tem que cobrar, de quem quer insistir em usar, o verdadeiro preço disso para a sociedade. Pode ser de uma parte delas, não precisa ser todo mundo. Agora, como cobrar isso é uma outra discussão. No mundo inteiro, na Europa, há muitas experiência, de todos os tipos. Tem países que optam por cobrar muito pelo carro, outros cobram caríssimo pela licença para dirigir. Alguns cobram muito mais pela gasolina, três vezes mais do que cobramos, e tem países que dificultam extremamente o estacionamento, você paga muito caro para estacionar. E tem país que adotou o pedágio, mas foram só dois, nas cidades de Estocolmo e Londres. Não precisa ser pedágio necessariamente, cada local tem que discutir qual forma é mais justa. Tem cidades que podem operar bem com o rodízio, ou pode ser uma mistura de várias coisas. Se aqui fosse a Europa, para ir do aeroporto de Congonhas até a avenida Paulista, que é o lugar mais caro do Brasil, provavelmente se pagaria R$ 80 para estacionar. Mas no estacionamento subterrâneo do Trianon hoje você paga, se for mensalista, e com o novo preço, só R$ 12. Isso para parar a cem metros do Masp, com seu carro, sozinho. Enquanto for R$ 12 eu vou de carro, nunca vou subir num ônibus. A hora que for R$ 80, e não estou falando que tem que ser R$ 80, precisa calcular o custo social, a coisa muda.

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Então as viagens estão muito baratas em todos os sentidos. A gasolina está uns 30% abaixo do preço, não sei dizer quanto exatamente, mas além disso o estacionamento é barato. Se você sai em São Paulo de carro, aleatoriamente, a probabilidade que você terá de pagar para estacionar no destino é de 10%. Em 90% dos casos você não pagará, seja na rua, seja dentro de loja ou shopping. O que significa que a sua chance de ter que pagar estacionamento é muito pequena, na média. Na Europa, a chance é de 70%, então é muito difícil você sair com seu carro e não ter que pagar para estacionar. Na região metropolitana de São Paulo a cada dia um milhão e meio de automóveis estacionam nas ruas de graça. Ou seja, você estaciona o seu veículo em cima de uma faixa de asfalto que custou muito caro para construir e cuja função é circular, e não estacionar, mas você coloca seu carro em cima, deixa ele lá o dia inteiro, e não paga nada. Quem pagou para construir este espaço que você está usando de depósito para o seu automóvel? Todo mundo pagou por isso, mas só você tem essa possibilidade. Então tem um monte de iniquidades que viraram supostos direitos, mas na verdade são privilégios. Chegamos ao ponto de, numa palestra, pessoas falarem que ficaram com vergonha porque seu ônibus estava atrapalhando o trânsito. Ou do pedestre que vai atravessar na faixa e agradece o motorista que para. Está tudo errado, essa subserviência é culpa de um processo de exclusão social, falta de democracia, de educação, de cidadania etc.

http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/08/1503030-frota-de-veiculos-cresce-mais-rapido-que-a-estrutura-viaria-no-pais.shtml

Nº de paulistanos que usam carro diariamente cai de 56% para 45% JULIANA DIÓGENES - O ESTADO DE S. PAULO 22 Setembro 2015 | 10h 00

Segundo pesquisa para o Dia Mundial Sem Carro, os moradores de SP gastam, em média, oito minutos a menos nos deslocamentos

SÃO PAULO - A 9ª Pesquisa sobre Mobilidade Urbana feita pelo Ibope para o Dia Mundial Sem Carro, nesta terça-feira, 22, indica que caiu 11 pontos porcentuais o número de motoristas que usam o automóvel todos os dias ou quase todos os dias na capital paulista. Em 2014, 56% dos paulistanos diziam usar o carro diariamente, ante 45% neste ano.

A pesquisa foi encomendada pela Rede Nossa São Paulo em parceria com a Federação do Comércio de Bens, Servi-ços e Turismo do Estado de São Paulo (Fecomercio-SP). Foram entrevistados 700 moradores da capital, acima de 16 anos, entre os dias 28 de agosto e 5 de setembro. Os núme-ros foram apresentados na manhã desta terça-feira, 22, no Sesc Consolação.

Em 2014, 56% dos paulistanos diziam usar o carro diariamente

Os moradores de São Paulo gastam, em média, oito minutos a menos nos deslocamentos em comparação com o ano anterior, indicou o estudo. Somente entre os que usam o carro todos os dias, o tempo médio de locomoção diária é de 2h48 - uma queda de cinco minutos em relação aos números de 2014.

Por outro lado, os usuários do transporte público passaram a gastar dez minutos a mais nos deslocamentos. Quase a metade dos paulistanos (48%) gasta pelo menos duas horas por dia, considerando o total.

Segundo Maurício Broinizi, coordenador da Secretaria Executiva da Rede Nossa São Paulo, a tendência é de que mais paulistanos deixem o automóvel em casa porque o tempo de deslocamento entre quem se locomove de carro e de transporte público é quase igual. "O que está dando para perceber é que, talvez, o tempo de deslocamento dos ônibus tenha realmente melhorado em relação à locomoção de carro. O tempo que se gasta no trânsito está quase empatando."

Bicicleta. O levantamento apontou que, em 2007, 34% afirmavam que não usariam bicicleta na capital "de jeito nenhum". O número de pessoas que recusava a locomoção por bicicleta vem caindo ao longo dos anos: em 2014, eram 24% e, em 2015, 13%. Entre os que não usam bicicleta, 44% declararam que usariam caso houvesse mais segurança, outros 18% se tivesse mais sinalização nas ruas e 13%, mais ciclovias (em 2014, o número era 26%).

Caso houvesse uma boa alternativa de transporte, 80% afirmaram que deixariam de usar o carro, contra 71% no ano passado.

Lotação. Em relação ao ano passado, cresceu a percepção de que a lotação é maior. A pesquisa mostrou que 59% disseram que a lotação aumentou no último ano, 30% afirmaram que está igual e 8% acreditam que diminuiu. Em 2014, 39% disseram que a lotação havia crescido, 54% declararam que estava igual e 7%, que reduziu.

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Transporte público. A avaliação do transporte público é mais negativa entre os que declararam utilizar carro "todos os dias" ou "quase todos os dias" (4,1) em relação aos usuários do próprio serviço, que deram nota de 5,1.

A diferença também é grande no item "tempo gasto para se deslocar": a nota média entre os que usam carro todos os dias ou quase é 3,3, e de 5,2 entre os que não usam.

Ônibus. As notas em relação ao serviço dos coletivos de São Paulo continuam abaixo da média (5,5).

Mas, de acordo com a pesquisa, "houve significativa melhora" no porcentual de notas 9 e 10 nos itens como limpeza, conservação e manutenção dos terminais (passou de 5% para 13%), cordialidade e respeito por parte de motoristas e cobradores (de 5% para 10%), limpeza, conservação e manutenção dos ônibus (de 4% para 10%), tempo de duração da viagem (de 2% para 8%), entre outros.

Entre os entrevistados, 90% são a favor da construção de faixas e corredores de ônibus. "É um dado significativo porque no começo teve muita reclamação e, agora, os usuários de carros estão respondendo favoravelmente", afirmou Broinizi.

Áreas problemáticas. As áreas mais citadas foram saúde (55%), segurança pública (37%), educação (33%), desemprego (33%), trânsito (29%), transporte coletivo (27%), abastecimento de água (21%) e poluição (17%). Os itens 'trânsito' e 'transporte público' vêm caindo ao longo dos anos. Hoje são, respectivamente, a 5ª e 6ª preocupações dos paulistanos.

Em 2014, a preocupação do paulistano com desemprego era de 11%. Uma pergunta inédita na pesquisa apontou que 62% dos entrevistados - ou alguém que mora no mesmo domicílio - já tiveram problemas de saúde em função da poluição de São Paulo.

http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,numero-de-paulistanos-que-usam-carro-diariamente-cai-11-pontos-porcentuais,1766533

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“Carro mata mais que arma de fogo em São Paulo, mas não é mais notícia”

Especialista diz que desafio de ampliar de restringir carros é "cultural, não é técnico" Bicicletas e ciclovias conquistam espaço nas ruas da América Latina

HELOÍSA MENDONÇA São Paulo 4 SEP 2015 - 21:08 BRT

Uma pequena volta pelas ruas da maior metrópole da América Latina é suficiente para perceber que o auto-móvel continua sendo "o rei de São Paulo". Ainda que o prefeito Fernando Haddad tenha sido apelidado de "rei da tinta" por ter criado novos quilômetros de ciclo-via pela cidade, as áreas destinadas às bicicletas repre-senta menos de 1% do espaço público, explica Carlos Aranha, especialista em mobilidade urbana e integrante do Conselho Municipal de Política Urbana, coletivo li-gado à Prefeitura com participação de integrantes do poder público e da sociedade civil para o debate do te-ma. Aranha também atua na Rede Nossa São Paulo, o conjunto de ONGs e instituições civis que tem acompa-nhado de perto e cobrado a gestão municipal. No mo-mento em que se reacende o debate sobre ciclovias e

O ativista Carlos Aranha. / VICTOR MORIYAMA

segurança com a morte nesta sexta de uma ciclista em São Paulo dias após o choque com um ônibus, ele rebate: "Questionar as ciclovias ou o uso da bicicleta diante de uma morte no trânsito é tão absurdo quanto culpar o comprimento da saia de uma vítima pelo seu estupro".

Pergunta. Quais as soluções para que os diversos modais de transporte possam conviver juntos ?

Resposta. Para todos os dilemas existem decisões técnicas e decisões políticas, embasamentos dos dois lados. Quando você fala que vai reduzir a velocidade nas marginais para melhorar o trânsito, isso é totalmente técnico. Já quando se fala nessa redução para evitar mortes, claro que há um embasamento técnico, - porque quanto menor a velocidade, menor o impacto em um acidente, isso é provado – mas tem também o político. Você pode dizer: não importo da cidade matar 600 pessoas atropeladas por ano, eu prefiro manter altas velocidades por um motivo X, já que não acredita no embasamento. Quando falo de motivação política, é no sentido de política pública, de pensar o que é melhor para o bem comum. Quando Nova York, por exemplo, lançou o programa Vision Zero, de zerar as mortes no trânsito, a decisão foi de política pública. Depois, também perceberam que a medida ajudou na fluidez do trânsito, no congestionamento. Se você comparar São Paulo com Nova York você percebe que a nossa cidade ainda está atrasada. P. Que políticas ainda precisam ser implementadas aqui?

R. O Vision Zero têm 3 pilares: primeiro, a redução de velocidade máxima, se-gundo, a geometria das ruas, quanto elas se mostram convidativas para a velo-cidade. Por exemplo, no caso da marginais, as pessoas estranham tanto 50 km/h, porque ela tem cara de rodovia, ela te convida a correr mais. São muitas faixas, são largas, espaço livre grande, os raios das curvas foram feitos pensando na velocidade. Se você simplesmente reduz a velocidade, sem mudar a geografia

Questionar as ciclovias ou o uso da bicicleta diante de uma morte no trânsito é tão absurdo quanto culpar o comprimento da saia de uma vítima pelo seu estupro

da rua, (o chamado Traffic Calming- moderação do Tráfego) com elementos na rua que falam para os motoristas que é preciso andar mais devagar, as pessoas vão estranhar. Por isso digo que está correto o que está sendo feito aqui em São Paulo, mas ainda está incompleto. Por exemplo, a rua Avanhandava, no pé da Augusta, recebeu um tratamento de Traffic Calming. Todo mundo que entra nela reduz a velocidade. Ela tem um piso de concreto intertravado que faz um barulho, tem a calçada no mesmo nível da rua, árvores 'entrando' no meio da rua, você sente que é um local para tomar cuidado, para baixar a velocidade, por isso é importante a geometria. Já o terceiro pilar usado em Nova York é a fiscalização de trânsito constante. Eles realmente atuam com dureza na penalização das infrações de trânsito. Levam isso a sério todos os dias da semana, durante todos os horários. O que acontece hoje em São Paulo é que a fiscalização é feita principalmente em dias úteis no horário comercial. A Polícia Militar tem um efetivo muito pequeno e prioriza infrações que não necessariamente atentam contra a vida. É muito comum ver no relatório da CET multas de rodízio, de zona azul, já o desrespeito a faixa de pedestres há muito poucas infrações. Não é porque não acontece, mas porque não está sendo punido.

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Hoje atropelamos e matamos 2 pessoas por dia com carro em SP. Isso não é notícia porque virou algo natural, não se indignam, e não é. Isso é uma carnificina urbana diária. Apesar da imensa violência urbana que temos na cidade, hoje carro mata mais que arma de fogo na cidade de SP. Só que já não é notícia

P. E os radares?

R. Eles são um grande problema no Brasil. As pessoas reduzem só para o radar, cumprem e depois voltam a acelerar o carro. Na prática não adianta nada, teríamos que ter fiscalização 24 horas por dia, para todas as infrações, em especial para as que atentam contra a vida. É preciso incluir também a lei seca aí, ela tem o mesmo problema do radar. Todo mundo sabe onde a Blitzs é montada, tem twitter e outras formas de descobrir. Mas nos locais onde ela realmente funciona, ela acontece de forma aleatória. Nos Estados Unidos, por exemplo, os policiais ficam escondidos. Como no Brasil há essa previsibilidade é fácil burlar. Dos três pontos do Vision Zero, estamos terríveis ainda na fiscalização, começando a discutir a geometria das ruas e estamos efetivos na redução de velocidade.

P. Alguns setores alegaram que essa redução tinha por trás um interesse na arreca-dação de dinheiro com multas de alta velocidade...

R. Conceitualmente esse argumento é uma grande besteira. Afinal, dinheiro de multa não é arrecadação livre, ele já tem desti-no orçamentário previsto. Então ele já vai para um fundo que tem várias atribuições, entre elas investimento em educação de trânsito (que sentimos um pouco de falta de mais investimentos), não vão transferir para construir um hospital, e tudo isso é transparente. Acho que quem faz esse tipo de acusação precisa mostrar. E se realmente tivesse acontecendo algum desvio a sociedade teria que saber, porque seria gravíssimo, mas você falar da boca da fora, que é uma tentativa de arrecadação não faz sentido.

P. Nos últimos anos, a mobilidade melhorou?

R. Se for considerar que estamos entre as 5 maiores metrópoles do mundo e que São Paulo é a maior cidade do Brasil, cujo trânsito mais mata no mundo, não é difícil constatar que estamos vergonhosamente décadas atrasados. Por outro lado, se considerarmos, o tipo de individualismo e egoísmo que se manifesta na popula-ção e especial na mídia paulistana, no momento que você tenta colocar uma agen-da mais progressista, eu diria que finalmente estamos conseguindo avançar. Esta-mos tentando compensar um atraso de décadas, de políticas erradas, que sempre privilegiaram o carro, o que é burro tanto do ponto de vista de política pública

E não é à toa que quem não leva a mobilidade urbana a sério apelida o atual prefeito de 'rei da tinta' e 'suvinil', porque é tão simples redistribuir o espaço público, que chega a parecer errado. E não é

quanto do conceito técnico, porque você trava a cidade inteira. E foi sempre o que São Paulo fez, convidar a todos a usarem carros, a ter seu próprio carro. E criou também um trânsito muito perigoso, ruas perigosas, em que você não vê idosos, não vê crianças, nem deficientes. Você vê pessoas sempre com medo, acuadas, com cuidado para atravessar, para virar porque está todo mundo com sua pressa e seus motores ameaçando a vida. Não é à toa que temos 7.000 atropelamentos por ano. Agora a agenda que vem sido colocada pela atual gestão é progressista no sentido de proteção a vida e de equalizar os modos possíveis de transporte na cidade. Quando você começa a investir nos modos ativos de deslocamento, pedestre e bicicleta majoritariamente, e no transporte público, você começa a dizer que você vai usar o carro se você quiser, mas você tem ótimas opções. Pra fazer isso, inevitavelmente você precisa tirar espaço físico do carro.

Outra opção que considero errada é adesão do monotrilho suspenso, porque já nasce saturado, com a capacidade menor do que a demanda daqueles bairros sugerem. E também estão atrasados. O metrô é importante e todos defendem tanto sem muita ressalva porque ele não atrapalha tanto o carro

P. E qual o maior desafio para realizar esse redesenho do espaço público?

R. Do ponto de vista técnico é muito fácil. O grande desafio é a questão da opini-ão pública de uma cultura que já está instaurada. Hoje temos 17.000 km de ruas asfaltadas na cidade de São Paulo, que há 20 anos atrás era para todos, você entu-pia de carros individuais, ônibus , bicicletas...Para que você consiga equalizar o transporte público é necessário dividir e fazer espaços exclusivos para que funcio-ne melhor. O exemplo mais óbvio é o ônibus, é um veículo que poluí duas ou três vezes mais que um carro, só que ele carrega 100 vezes mais que um carro. Então você tem que dar uma faixa exclusiva, não só uma, mas duas, para permitir ultra-passagem. Começou, mas ainda estamos tímidos. O desafio é de opinião pública, cultural, não é técnico. E não é à toa que quem não leva a mobilidade urbana a sé-rio apelida o atual prefeito de rei da tinta e suvinil, porque é tão simples redistri-buir o espaço público, que chega a parecer errado. E não é. Quando você pinta

uma faixa branca e diz aqui é só passa ônibus é o caminho correto. Pinta de vermelho para a bike, você está fazendo política pública. É tão simples que revolta as pessoas, elas acham que talvez tivessem que criar minhocões pela cidade inteira para resolver o trânsito e não vai. É só você ver qualquer iniciativa semelhante no mundo para ver que não dá certo. Los Angeles, por exemplo, passou décadas investindo em viadutos e túneis e não adiantou, o trânsito continua travado. Agora eles estão começando a ver que precisam investir em transporte coletivo público de qualidade. Não existe nenhuma cidade grande no mundo que tenha resolvido seu problema de mobilidade urbana investindo no transporte individual motorizado.

P. Apesar disso, ainda parte da população ainda desconfia sobre a eficácia das ciclovias e de um redesenho urbano. No mês passado, a morte de um pedestre em uma ciclovia gerou um debate grande...

Claro que o ciclista tem que tomar cuidado com o pedestre, não

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R. Na escola de jornalismo, se aprende que um avião decolar e pousar não é notí-cia, já se explodir no ar, aí sim é. Hoje atropelamos e matamos 2 pessoas por dia com carro em SP. Isso não é notícia porque virou algo natural, não se indignam, e não é. Isso é uma carnificina urbana diária. Apesar da imensa violência urbana que temos na cidade, hoje carro mata mais que arma de fogo na cidade de SP. Só que já não é notícia. O código de trânsito é claro, há um artigo que diz que a hierarquia da rua prevê que o maior sempre será responsável pelo menor, da mesma forma que o caminhão precisa ter cuidado com os carros ao redor, o carro cuida da moto, a moto da bicicleta, a bicicleta do pedestre, todos juntos cuidam do pedestre. Isso

importa se ele está atravessando fora da faixa, nada justifica uma morte ou você ferir uma pessoa. O que temos hoje na cidade é uma inversão total disso, o automóvel é o rei da cidade e todos têm medo dele

resolve tudo, claro que o ciclista tem que tomar cuidado com o pedestre, não importa se ele está atravessando fora da faixa, nada justifica uma morte ou você ferir uma pessoa. O que temos hoje na cidade é uma inversão total disso, o automóvel é o rei da cidade e todos têm medo dele. Aí você tem um modo de deslocamento que sempre existiu, que antes de qualquer ciclo-via, já havia um índice de 300 mil ciclistas na cidade por dia, e que agora começa a ganhar relevância porque é uma novidade pra cidade, vem gerando discussão. O plano da Prefeitura é implementar 400 km de ciclovia, isso significa menos de 2% des-sas ruas, toda essa polêmica entorno de 2% de ruas que estão ganhando uma parte delas para criar uma infraestrutura dedicada aos ciclistas como um convite para que as pessoas usem a bicicleta como meio de transporte. Se você considera a área do es-paço público, viário de muro a muro, tudo que está implementado de ciclovia representa menos de 1% desse espaço e, se você somar com todas as faixas exclusivas de ônibus e corredores, você não passa de 1% do espaço público da cidade. Não estou contando parques, estou falando de área viária. E se isso gera ainda tanta polêmica e grito é porque as pessoas ainda acredi-tam que nós ainda temos alguma solução possível na crença do transporte individual motorizado.

Você pode dizer: não importo da cidade matar 600 pessoas atropeladas por ano, eu prefiro manter altas velocidades por um motivo X, já que não acredita no embasamento. Quando falo de motivação política, é no sentido de política pública, de pensar o que é melhor para o bem comum.

P. Nesta sexta, a morte de uma modelo que se chocou com um ônibus enquanto pedalava também na av. Faria Lima voltou a reacender o debate sobre a segurança das ciclovias. Como avalia?

R. Questionar as ciclovias ou o uso da bicicleta diante de uma morte no trânsito é tão absurdo quanto culpar o comprimento da saia de uma vítima pelo seu estupro. Ciclovias existem justamente para dar segurança e conforto às pessoas. Nada priva o condutor do automóvel da sua obrigação prevista em lei: o cuidado irrestrito do maior pelo menor, sempre, em qualquer situação. Me preocupa bastante ver tanto alvoroço em torno das mortes que envolvem uma bicicleta (foram 3 casos este ano em São Paulo) e nenhuma menção às 30.000 ocorrências de trânsito, com 1.500 mortes, sempre causadas por automóveis, na mesma cidade, todo ano.

P. E qual a situação do metro? R. No sistema brasileiro temos um caso peculiar, já que o transporte ferroviário é responsabilidade estadual e o transporte sobre pneus dentro da cidade é responsabilidade do município. Com isso você fica dependendo da boa vontade do político eleito da cidade e do estado de terem um diálogo e ajudar. Mas dado essa ressalva dessa separação, o metrô de São Paulo é pífio, a evolução é muito lenta. O que temos na prática hoje é um sistema de ônibus carregando duas vezes mais o que o metrô carrega. As viagens de ônibus em SP chegam a 10 milhões por dia e o metrô mal chega a 4,5 milhões. Então, conside-rando as características do metrô de transporte de massa de altíssima capacidade e com mais espaço de carregar mais gente em menos tempos é claro que deveria carregar mais gente. Teríamos que ter uma rede muito maior do que ela hoje. Se você pega o planejamento dos anos 90 de SP, hoje teríamos que ter uma rede com o dobro de tamanho, e o que vemos atualmente é o contrário. Vemos estações serem inauguradas com 5, 7, 10 anos de atraso. Outra opção que considero errada é adesão do monotrilho suspensa, porque já nasce saturado, com a capacidade menor do que a demanda daqueles bairros sugerem. E tam-bém estão atrasados. O metrô é importante e todos defendem tanto sem muita ressalva porque ele não atrapalha tanto o carro. http://brasil.elpais.com/brasil/2015/09/02/politica/1441231171_842602.html