trab. história da medicina
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DAVID QUEIROZ BORGES MUNIZFERNANDA M. LAMOUNIER FERNANDES
PROFESSOR CHARCOT
BELO HORIZONTE2005
DAVID QUEIROZ BORGES MUNIZFERNANDA M. LAMOUNIER FERNANDES
PROFESSOR CHARCOT
Trabalho realizado pelos alunos do 6º período para o curso de História da Medicina da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais.
BELO HORIZONTE2005
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PROFESSOR CHARCOT
David Queiroz Muniz*Fernanda M. Lamounier Fernandes*
Resumo
Jean-Martin Charcot, um grande médico francês do século 19, foi considerado o pai da
neurologia. Através de seus estudos no hospital Salpêtrière, descreveu várias doenças
neurológicas, incluindo a Doença de Parkinson e a esclerose múltipla. Considerado ter uma
personalidade severa e autoritária, tinha uma forma única de lecionar. Dentre seus vários
alunos estão o Babinski, Freud, Binet, Janet. Tinha também uma grande paixão pelos animais,
incluindo a “Rosalie”, uma macaquinha que fora presente de Dom Pedro II a Charcot. O
imperador do Brasil, além de amigo, foi um dos pacientes notáveis do neurologista.
Palavras chaves: Charcot, história da medicina, história da neurologia.
*Alunos do 6º período da Faculdade de Medicina da UFMG
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I – INTRODUÇÃO
Nosso interesse em realizar o ensaio de História da Medicina sobre o neurologista
francês Jean-Martin Charcot partiu de uma curiosidade ingênua sobre como um médico- e
professor- foi capaz de agregar discípulos tão talentosos, ter seu nome imortalizado em
epônimos em variadas áreas da medicina e ter se tornado uma lenda em seu próprio tempo.
Ao longo desse trabalho, explicitar-se-á que Charcot era o homem certo, no lugar e
momentos certos.
A guinada na medicina parisiense, e na carreira médica de Charcot, ocorreram quando
ele foi nomeado médico do Salpêtrière em 1862. Ele passaria o resto de sua vida nesta
instituição.¹²
De porão de miséria humana a berço da neurologia, o local no qual Charcot dedicou os
anos mais produtivos de sua vida, não foi apenas pano de fundo, paisagem estática. Foi
personagem fundamental na biografia desse importante ícone da medicina.
“To take away from neurology all the discoveries made by Charcot would
be to render it unrecognizable.”
Joseph Babinski ¹²
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II - SALPÊTRIÈRE
Salpêtrière( derivado de “salt pepper”, o principal ingrediente da pólvora) foi
construído como arsenal de pólvora de Luis XIII no século XVI. Em 1656 foi amalgamado
com outros hospitais como um asilo para pedintes, prostitutas, idosos e loucos, sendo o
Salpêtrière designado primariamente para mulheres e prostitutas. Com a construção dos novos
edifícios em 1680, tornou-se o maior asilo da Europa. No século XVIII foi transformado em
hospital com uma equipe médica oficialmente nomeada.¹²
Em 1862, aos 37 anos de idade Charcot foi nomeado médico-sênior em Salpêtrière.
Dentre os predecessores de Charcot lá estiveram Leon Jean Baptiste Cruveilhier (1791-1874)
e Ernest-Charles Lasègue(1816-1883), mas foi sob a liderança carismática de Charcot que a
neurologia clássica francesa foi fundada. ²
Quando Charcot entrou no Salpêtrière, este era um grande asilo de miséria humana,
mas também uma fonte de casos única na história da neurologia. Com cerca de 5000 internos,
dos quais cerca de 3000 sofriam de transtornos neurológicos ou epilepsia, era uma mina de
ouro intocada de material clínico para estudos neurológicos e psiquiátricos. O primeiro passo
de Charcot foi estabelecer um laboratório de patologia . Ele reorganizou o serviço clínico,
introduzindo oftalmoscopia, fotografia e microscopia.¹²
O interesse de Charcot por neurologia foi provavelmente inspirado por Duchenne, por
quem ele nutria grande admiração. Charcot convocou a assistência do seu colega Alfred
Vulpian para trazer ordem ao caos de Salpêtrière. Juntos eles estudaram os pacientes
sistematicamente e os catalogaram em tipos distintos. ¹²
Em julho de 1881, o parlamento francês liberou a soma de 200000 francos para o
estabelecimento de uma nova cadeira clínica em doenças do sistema nervoso, designada
especificamente para Charcot. Neurologia, como especialidade, foi formalmente iniciada em
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1882, quando Charcot assumiu essa posição, estabelecendo o Salpêtrière como uma
instituição de ponta dedicada ao tratamento de doenças do sistema nervoso. ¹²
Charcot possuía todos os predicados necessários para um excelente chefe- era um
clínico de extraordinária habilidade que era apaixonadamente devotado ao ensino e dedicado
à pesquisa. ¹²
Em 1882, Charcot abriu em Salpêtriè aquilo que viria a se tornar a maior clínica
neurológica da Europa em seu tempo. Ele praticava ostensivamente o método clínico-
anatômico, correlacionando os sintomas observados nos pacientes doentes e as lesões
descobertas na autópsia. ²
Em sua período imensamente produtivo(1862-1870), Charcot compôs uma série de
descrições clínicas maestrais. Ele elucidou a atrofia neuromuscular do adulto descrita por
Guillaume Benjamin Amand Duchenne de Boulogne(1806-1875) em 1849 e François-
Amilcar Aran(1817-1861) em 1850, demonstrando que a doença poderia atacar também os
cordões laterais da medula espinhal. No mesmo período descreveu uma complicação severa
na tabes dorsalis, conhecida como articulação de Charcot. Ele forneceu uma descrição clínico-
anatômica da esclerose múltipla inigualável em sua época. ²
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III – EPÔNIMOS QUE LEVAM SEU NOME ²:
.Doença de Charcot: rara doença do sistema nervoso central com degeneração dos
nervos que conduzem sinais para os músculos.
.Edema de Charcot: edema local e muito doloroso com aspecto azulado das
extremidades, visto nas paralisias histéricas.
.Febre de Charcot: febre intermitente devido a colangite e obstrução biliar(cálculos
impactados); freqüentemente associada com icterícia e desconforto abdominal.
.Articulação de Charcot: doença degenerativa com destruição progressiva dos ossos e
articulações do pé.
.Síndrome de Charcot I: distúrbio intermitente da marcha causada por angiopatia
obliterativa com circulação reduzida de sangue para a musculatura das pernas.
.Tríade de Charcot I: a combinação de nistagmo, tremor de ação e distúrbio da fala.
.Tríade de Charcot II: a combinação de icterícia; febre, usualmente com rigor; e dor do
quadrante superior do abdome.
.Vertigem de Charcot: síncope da tosse. Uma rara condição em que vertigem ou
síncope, causadas por um ataque de tosse, resulta em espasmo laríngeo e fechamento da glote.
.Zonas de Charcot: zonas histerogênicas.
.Aneurisma de Charcot-Bouchard: microaneurisma de vasos cerebrais perfurados que
podem provocar hemorragias intracranianas.
.Cristais de Charcot-Leyden: cristais incolores, hexagonais, pontiagudos e
freqüentemente com aspecto de agulha encontrados no escarro de pacientes com asma
brônquica ou nas fezes de pacientes com colite ulcerativa.
.Doença de Charcot-Marie-Tooth: síndrome caracterizada por lenta e progressiva
fraqueza dos músculos distais de braços e pés; a doença mais comum de um grupo de
condições chamadas neuropatias hereditárias motoras e sensoriais.
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.Cristais de Charcot-Neumann: Cristais de fosfato observados no sêmen.
.Síndrome de Charcot-Weiss-Baker: ataques de síncope transientes com bradicardia,
queda na pressão arterial e perda de consciência.
.Síndrome de Charcot-Wilbrand: síndrome neuro-oftalmológica que consiste em
agnosia visual(agrafia) e incapacidade de revisualizar imagens.
.Paralisia de Erb-Charcot: uma rara síndrome que consiste em sífilis espinhal com
parestesia, fraqueza espástica, e cansaço nas pernas associado com dor, distúrbios de
esfíncter, reflexos profundos exacerbados, atrofia muscular, transtornos sensórios e
paraplegia.
.Geroderma de Souques-Charcot: uma variante da doença de Hutchinson-Gilford, que
consiste em pele frouxa, seca e brilhante; atrofia subcutânea, hábitos eunucóides e deficiência
intelectual.
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IV- O PROFESSOR
Foram suas incomparáveis qualidades como professor, escritor e organizador que
contribuíram para a grandiosa reputação desse talentoso clínico. Como palestrante falava de
forma pausada e articulada, freqüentemente ficando em silêncio por vários minutos enquanto
observava o paciente que estava sendo demonstrado no auditório. A discussão do estado
neurológico progredia durante as minuciosas observações dos sinais físicos do paciente. ²
Nas manhãs das terças-feiras, eram ministradas suas famosas demonstrações clínicas,
e, nas sextas, suas bem preparadas palestras relacionadas a casos clínicos. ²
Os experimentos de Charcot na hipnose e suas demonstrações clínicas eram abertas ao
público leigo, atraindo famosos e aristocratas. Nesse momento de sua carreira era conhecido
como “Caesar de Salpêtrière”. ²
Charcot era famoso por seu estilo didático teatral. Ele substituiu as tradicionais rondas
hospitalares no Salpêtrière por demonstrações clínicas e entrevistas aos pacientes no anfiteatro
do hospital. Esses espetáculos dramáticos de histeria atraíram a atenção de intelectuais não-
médicos, e atiçaram a curiosidade pública ao ponto de a histeria entrar em voga. Apesar de
Charcot ser acusado de voyeurismo e exploração, a ele cabem os créditos por adicionar a
palavra neurologia ao vocabulário cotidiano da população parisiense.¹¹
Em suas lições, Charcot mimetizava os sinais clínicos de certas doenças- a assimetria
da face na paralisia facial, a rigidez na doença de Parkinson, e vários tipo de tiques, espasmos,
posturas e trejeitos. Suas palestras eram cuidadosamente preparadas e a performance era
dramática. Charcot se colocava de pé ao lado do paciente em um palco com holofotes em um
anfiteatro de 600 lugares- todos ocupados- e demonstrava cada sinal para a platéia
hipnotizada, incluindo muitas visitas internacionais. ¹²
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Ele reforçava a importância primordial da observação, exemplificada no “misterioso
silêncio de Charcot”- onde ele submetia seus pacientes a um lento e sistemático escrutínio por
vários minutos sem dizer uma palavra.
Charcot concebeu o método anatomo-clínico para ensinar e o conceito de localização,
levando seus estudantes de um ponto importante de um caso ao de outro, usando ilustrações
desenhadas com giz colorido para ilustrar a lesão. Arte e ilustração se tornaram uma
ferramenta central do seu método anatomo-clínico. A arte de fotografia, na qual foi
introduzido por Duchenne, também foi extensamente usada por Charcot para capturar as
mudanças no estado neurológico dos pacientes. ¹²
Charcot se tornou uma lenda em sem próprio tempo e foi eleito para várias sociedades
médicas e neurológicas da Europa e foi condecorado com muitas honras. ¹²
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V- OS DISCÍPULOS
Alguns de seus estudantes foram Pierre Marie, Joseph Jules Babinsky, Wladimir
Michailowich Bekhterev, Desiré-Maglourie Bourneville e George Albert Edouard Gilles de la
Tourette. Em 1885 Sigmund Freud foi um de seus estudantes, e foi o emprego da hipnose por
Charcot em uma tentativa de descobrir as bases orgânicas da histeria que estimularam o
interesse de Freud nas origens psicológicas das neuroses. ²
Alfred Binet, Pierre Janet e Sigmund Freud ficaram impressionados com Charcot e
usaram a hipnose à sua própria maneira. Discordavam de seu professor que acreditava se
tratar de um fenômeno neurológico. Eles a consideravam um estado psicológico.(7)
Na Salpêtrière, Janet completou a tese para seu diploma de médico, L'état mental des
hystériques (O estado mental dos histéricos) publicada em 1892, na qual ele tenta classificar
formas de histeria segundo as manifestações envolvidas de paralisia, sonambulismo e
amnésia. Procurando relacionar a histeria com teorias psicológicas da época, ele considerou a
histeria, juntamente com a hipnose, essencialmente de origem psicológica e um produto de
"sugestão". No prefácio da tese, escrito por Charcot, este solidariza-se com Janet no pedido de
união dos esforços da psicologia e da medicina. Nessa obra, associou, à epilepsia e à histeria,
também o que denominou psicastenia, objeto de Les obsessions et la psychasthénie, publicada
no ano seguinte, 1903, expressão que se incorporou ao vocabulário psiquiátrico.(8)
Impressionado com a propriedade terapêutica da conversa no estado de hipnose, em
1885 Freud utilizou uma bolsa de estudos obtida do governo, para passar algumas semanas na
Salpêtrière, em Paris, onde aprendeu técnicas com o psiquiatra Jean-Martin Charcot, o qual
realizava experiências com doentes mentais utilizando a hipnose. Relatou a Charcot o sucesso
obtido com a conversa com o paciente, como substituto à hipnose, porém Charcot estava
interessado nas propriedades da hipnose mesma. No mesmo ano, 1885, escreveu o "Projeto
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para uma Psicologia Científica". Em 1886 casou com Martha Bernays e iniciou especialidade
em "doenças nervosas".(9)
Seguindo os passos de seu professor, Babinsky também se interessou na patogênese da
histeria e foi o primeiro a apresentar critérios aceitáveis para diagnóstico diferencial para
separar histeria de doenças orgânicas. Charcot achava que tinha descoberto uma nova doença
que nomeou histero-epilepsia, um distúrbio da mente e do cérebro, que combinava aspectos
de histeria e epilepsia. Os pacientes apresentavam uma variedade de sintomas, incluindo
convulsões, contorsões, desmaios, e perda transiente de consciência. (10)
Babinksy acreditava que Charcot havia inventado, e não descoberto, a histero-
epilepsia. Os pacientes chegavam ao hospital com queixas vagas de estresse e
desmoralização. Charcot os persuadiu de que eram vítimas da histero-epilepsia e deveriam se
juntar aos outros sob seus cuidados. O interesse de Charcot nos seus problemas, o
encorajamento dos atendentes e o exemplo de outros na mesma enfermaria predispuseram os
pacientes a aceitar a visão de Charcot e eventualmente a demonstrarem os sintomas
esperados. Babinsky acreditava que esses sintomas se assemelhavam à epilepsia por causa de
uma decisão municipal de abrigar em conjunto pacientes epiléticos e histéricos. Os pacientes
histéricos já vulneráveis a sugestão e persuasão, começaram a imitar os ataques epiléticos que
repetidamente testemunharam. Babinsky eventualmente venceu a discussão. De fato ele
persuadiu Charcot de que médicos poderiam induzir uma variedade de distúrbios físicos e
mentais, especialmente em mulheres jovens, inexperientes e emocionalmente pertubadas. Não
havia histero-epilepsia. Esses pacientes não eram acometidos por uma doença, mas por uma
idéia. Com esse entedimento, Charcot e Babinsky dividiram o tratamento em dois estágios
consistindo de isolamento e contra-sugestão.(10)
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VI – CHARCOT: VIDA E FATOS CURIOSOS
Jean-Martin Charcot nasceu em Paris, em 29 de novembro de 1825, filho de
um construtor de carruagens, e faleceu em 16 de agosto de 1893, aos 68 anos, já consagrado
mundialmente como o pai da Neurologia, na província de Morvan, no interior da França ¹.
Desde a infância manifestou uma personalidade reservada, e ainda garoto já demonstrava seu
interesse pela medicina. Charcot decidiu pela carreira médica ainda muito jovem, formando-
se em 1856, tornando-se “Mèdicin dês hôpitaux de Paris”². Em 1862, aos 37 anos, foi
indicado como médico Sênior do Hospital Salpêtrière, hospital no qual foi funcionário desde
da época de estudante. Este hospital era um grande asilo, como ele mesmo descreveu como
um “grande asilo da miséria humana”, com um grande número de pacientes de diferentes
idades, geralmente portadores de doenças crônicas, particularmente do sistema nervoso.
Juntamente com seus assessores e discípulos, Charcot impulsionou o desenvolvimento da
neurologia como uma sub-especialidade da medicina interna, através da descrição de
inúmeras enfermidades neurológicas¹.
Apesar do seu notório reconhecimento mundial como o pai da neurologia, no início de
sua carreira, ele se dedicou a medicina geral. O seu primeiro trabalho foi sobre a artrite
gotosa, no qual ele detectou os altos níveis de ácido úrico como fator desencadeante para as
crises de gota. Além disso ele descreveu a estrutura lobular do fígado, rins e pulmão e
introduziu a prática de medir a temperatura diária dos pacientes internados³. O seu foco foi
direcionado especificamente para a neurologia por volta de 1860.
Sua personalidade severa e autoritária era tão notória que os neurologistas alemães
deram a ele o apelido de em Napoleonkopf (cabeça de Napoleão)4. Axel Munthe descreve
Charcot como “um homem de baixa estatura, o peito atlético e o pescoço de um boi, um
homem imponente. Um rosto branco, de barba feita, olhos penetrantes, lábios cruéis, máscara
de um imperador Romano”³. Além disso, descreve o neurologista como um homem temido
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pelos pacientes e assistentes e indiferente com relação ao sofrimento alheio. Axel Munthe
assistiu às aulas e demonstrações de Charcot em Salpêtrière e sua opinião poderia ter sido
influenciada pela sua relação um pouco tumultuada com Charcot. Munthe interferiu no
tratamento de uma das pacientes favoritas de Charcot. Segundo conta em seu livro, ele levou a
paciente para a casa no intuito de ajudá-la a escapar da ditadura de Charcot em Salpêtrière.
Quando o neurologista ficou sabendo, não só expulsou Munthe de Salpêtrière como proibiu
sua entrada no local. Para Munthe, Salpêtrière era uma confusão, uma mistura de verdade e
fraude²- 3, no qual o método de tratamento de histerias, a hipnose, era um grande teatro. Opinião
compartilhada pelo colaborador e discípulo de Charcot, Pierre Marie, que caracterizou o
método de hipnotismo como um "leve ponto fraco" do grande mestre¹.Outros, incluindo Freud,
descrevem Charcot como um homem simpático, cortês com seus auxiliares e gentil com seus
pacientes.
André Brouillet, em 1887, retratou uma das famosas palestras de Charcot. Nela podemos ver
Babinski segurando a paciente, Tourette sentado no meio, outros nomes da neurologia como
Raymond, Brisaud e Bournville. O filho de Charcot pode ser visualizado perto da janela com os braços
cruzados³.
Figura 1 - Un Leçon Clinique à la Salpêtrière, André Brouillet. Retirado de (http://www.nlm.nih.gov/hmd/emotions/psychosomatic.htm)
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Uma outra característica notória de Charcot era sua determinação e sua dedicação ao
trabalho. Seu único prazer era a música e Beethoven se tornou seu compositor favorito. Terça-
feira pela manhã era o tempo dedicado por ele a música e não era permitido ninguém
mencionar qualquer palavra relacionada a medicina2.
Em 1890, a saúde de Charcot começou a se deteriorizar. Ele sofreu diversos ataques de
angina e morreu repentinamente devido a um edema pulmonar em 1893. O seu funeral foi
realizado na capela de Salpêtrière, onde foi erguida uma estátua de bronze em sua
homenagem. Porém, em 1942, a estátua foi destruída durante a invasão nazista em Paris.
Um dos discípulos de Charcot foi seu filho, que se tornou médico devido à influência
autoritária de Charcot, quando na verdade queria ser um oficial naval. Jean Baptiste Charcot
foi um ilustre filho de um ilustre pai. Ele formou-se em Medicina em 1895 e trabalhou com
seu pai em Salpêtrière antes de se mudar para o Intituto Pasteur5. Em 1901 largou a medicina
para se tornar um velejador em seu famoso navio “Pourquoi pas?”. A Ilha Charcot na Antártida foi
nomeada por Jean Baptiste em homenagem a seu pai. Ambos receberam o reconhecimento ao ter suas
fotos estampadas em selos na França, ambos médicos, pai e filho, recebendo essa condecoração por
motivos diferentes, Jean-Martin Charcot por sua contribuição na neurologia e Jean Baptiste
Charcot por suas viagens exploratórias no Ártico e Antártica. No primeiro selo pode-se ver
Jean-Martin Charcot e o Salpêtrière ao fundo, o segundo é a representação de Jean Baptiste
Charcot e seu navio “Porquoi pas?” 5.
Figura 2- Selos de Jean-Martin e Jean Baptiste Charcot. Fonte – HAAS, L. 2001.
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VIII – CHARCOT E DOM PEDRO II
Charcot e Dom Pedro II, além da relação de amizade, mantinham uma relação médico
paciente. Dom Pedro II era um convidado especial de Charcot nos jantares realizados sempre
ás terças-feiras no Boulevard Saint-Germain.
Figura 3 – Charcot e Dom Pedro II – Fonte: TEIVE et al., 2001
Uma das características compartilhadas entre eles era a afeição por animais4. Apesar dos seus
trabalhos consistirem no estudo post-mortem, correlacionado com a clínica, Charcot nunca
permitiu a dissecação de animais em sua clínica. Ele tinha dois cachorros “Carlo”, um
labrador e “Sigurd”, e seu animal de estimação favorito era a pequena macaca chamada
“Rosalie” 4. Relatos históricos sugerem que “Rosalie” veio da América do Sul,
provavelmente um presente de Dom Pedro II a Charcot.
Em 1887, Dom Pedro II, em uma de suas visitas a Paris foi examinado por Charcot,
que diagnosticou que o Imperador estava sofrendo de uma astenia física e psicológica4.
Após a Proclamação da República e a morte de sua esposa um ano depois, Dom Pedro II,
mudou-se para Paris e suas visitas à casa de Charcot tornaram-se freqüentes. O
dignóstico de pneumonia que evoluiu com a morte de Dom Pedro II foi feito por Charcot,
assim como o atestado de óbito do imperador que foi preenchido pelo neurologista, por
Mota Maia e Bouchard em 1891.
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Figura 4 – Atestado de óbito de Dom Pedro II - Fonte: TEIVE et al., 2001
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IX - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
[1] TEIVE, HÉLIO A.G. O papel de Charcot na doença de Parkinson. Arq. Neuro-Psiquiatr., mar. 1998, vol.56, n.1, p.141-145. ISSN 0004-282X.
[2] WHO NAMED IT? (online). Oslo, 2001. Disponível na Internet: http://www.whonamedit.com/doctor.cfm/19.html
[3] HIERONS, Raymond. Charcot and his visits to Britain. British Medical Journal, dez. 1993, vol.307, n.6919, p.1589-1591.
[4] TEIVE, Hélio A. Ghizoni, ALMEIDA, Sérgio M., ARRUDA, Walter Oleschko et al. Charcot e o Brasil. Arq. Neuro-Psiquiatr. jun. 2001, vol.59, no.2A [citado 02 Dezembro 2005], p.295-299. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0004-282X2001000200032&lng=pt&nrm=iso>. ISSN 0004-282X.
[5] HAAS, LF. Jean Martin Charcot (1825-93) and Jean Baptiste Charcot (1867-1936). J Neurol Neurosurg Psychiatry, out. 2001, vol.71, n.524. Disponível em: <http://jnnp.bmjjournals.com/cgi/content/extract/71/4/524?maxtoshow=&HITS=10&hits=10&RESULTFORMAT=&andorexactfulltext=and&searchid=1133490494161_3921&stored_search=&FIRSTINDEX=0&sortspec=relevance&volume=71&firstpage=524&resourcetype=1&journalcode=jnnp>.
[6] TEIVE, Hélio A.G., ARRUDA, Walter O. e WERNECK, Lineu C. Rosalie: a pequenina macaca brasileira de Charcot. Arq. Neuro-Psiquiatr. set. 2005, vol.63, no.3a [citado 02 Dezembro 2005], p.707-708. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0004-282X2005000400031&lng=pt&nrm=iso>. ISSN 0004-282X.
[7] PEOPLE AND DISCOVERIES. (online). Disponível na Internet:http://www.pbs.org/wgbh/aso/databank/entries/bhchar.html
[8] RESUMOS BIOGRÁFICOS. (online). Disponível na Internet: http://www.cobra.pages.nom.br/ec-janet.html
[9] RESUMOS BIOGRÁFICOS (online). Disponível na Internet: http://www.cobra.pages.nom.br/ecp-freud.html
[10]WHO NAMED IT? (online). Oslo, 2001. Disponível na Internet: http://www.whonamedit.com/doctor.cfm/370.html
[11]HUMAN INTELLIGENCE. (online). Disponível na internet: http://www.indiana.edu/~intell/charcot.shtml
[12] JAY, V. The legacy of Jean-Martin Charcot. Arch Pathol Lab Med. Vol 124, Janeiro 2000
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