trabalho conclusão curso · trabalho conclusão curso . wesam ashour identidades, ... romance para...
TRANSCRIPT
Wesam Ashour
Identidades, Tradução e Paratradução
em Nur Na Escuridão de Salim Miguel
Florianópolis
2018
Universidade Federal de Santa Catarina
Centro de Comunicação e Expressão
Letras Francês
Trabalho Conclusão Curso
Wesam Ashour
Identidades, Tradução e Paratradução
em Nur Na Escuridão de Salim Miguel
Trabalho Conclusão do Curso de Graduação em
Letras Francês do Centro de Comunicação e
Expressão da Universidade Federal de Santa
Catarina como requisito para a obtenção do Título
de Bacharel em Letras Francês
Orientadora: Profª. Drª. Luciana Rassier
Florianópolis
2018
Wesam Ashour
Identidades, Tradução e Paratradução
em Nur Na Escuridão de Salim Miguel
Este Trabalho Conclusão de Curso foi julgado adequado para obtenção do Título de bacharel
em Letras Francês e aprovado em sua forma final pelo Programa
Florianópolis, 09 de Julho de 2018.
________________________
Prof. Dr. Gilles Abes
Coordenador do Curso
Banca Examinadora:
________________________
Prof.ª Dr.ª Luciana Wrege Rassier
Orientadora
Universidade Federal de Santa Catarina
________________________
Prof. Dr. Ronaldo Lima
Universidade Federal de Santa Catarina
________________________
Doutoranda Sheila Cristina dos Santos
PGET- Universidade Federal de Santa Catarina
AGRADECIMENTOS
Esse Trabalho de Conclusão de Curso é o resultado de três anos de conhecimento e
aprendizagem. Foi uma longa e gratificante jornada, fundamentada nos valores éticos e
morais que me foram ensinados desde cedo por meus familiares. Por isso, agradeço meus
pais, irmãos, irmãs e familiares, por todo o apoio moral e emocional, mesmo a uma grande
distância.
Agradeço, também, a todos os professores que me guiaram pela jornada acadêmica.
Vencer a barreira da língua foi muito difícil, mas todos os professores e servidores fizeram o
possível para que eu pudesse aprender e caminhar lado a lado com os meus colegas.
Em especial agradeço à Profa. Dra. Luciana Rassier, minha orientadora, por toda a
dedicação e o profundo conhecimento, fundamentais para a realização deste trabalho; também
lhe agradeço pela extrema paciência, atenção e tempo dedicado a corrigir minha redação em
língua portuguesa, o que me proporcionou um imenso aprendizado: é complexo redigir um
trabalho dessa magnitude em uma língua estrangeira.
Aos fiéis amigos que a vida me proporcionou em tão pouco tempo, e aos colegas, sou
imensamente grato pelo carinho, apoio e paciência. Longe da minha família, foram vocês que
me deram amparo e fizeram parte - uma grande parte - do meu processo de aprendizado na
UFSC.
Por fim, quero agradecer ao Brasil, pelo acolhimento dado a um estrangeiro e por me
proporcionar a oportunidade de estudar, trabalhar, evoluir e crescer neste lindo país.
“Tout homme a le droit de partir, c'est son pays qui doit le persuader de
rester - quoi qu'en disent les politiques grandiloquents”
Amin Maalouf, Les désorientés
RESUMO
O presente Trabalho de Conclusão de Curso propõe uma reflexão sobre a tradução e a
paratradução de Nur na Escuridão (1999), do escritor líbano-brasileiro Salim Miguel (1924-
2016), romance que aborda a história de uma família libanesa que migrou para o Brasil em
1927. Após um recapitulativo das ondas de migração do Líbano para o Brasil, apresento as
grandes linhas da narrativa literária em questão. Na sequência analiso na tradução desse
romance para o árabe, publicada no Líbano em 2013, a partir de quinze trechos do diário do
protagonista, intercalados ao relato do narrador. Por fim, proponho a tradução em língua
francesa desses quinze trechos.
Palavras-chave: Identidade. Tradução Literária. Paratexto. Paratradução. Salim Miguel.
RÉSUMÉ
Dans ce travail de fin d’études (Trabalho de Conclusão de Curso) je m’intéresse à la
traduction et à la paratraduction de Nur na Escuridão (1999), de l’écrivain libano-brésilien
Salim Miguel (1924-2016), un roman qui raconte l’histoire d’une famille libanaise qui migre
au Brésil en 1927. Après um bref panorama des vagues de migration du Liban vers le Brésil,
je présente les grandes lignes du récit. Ensuite, j’analyse, dans la traduction en arabe de ce
roman, publiée au Liban en 2013, quinze extraits du journal du protagoniste, qui sont
intercalés au récit du narrateur. Enfin, je propose la traduction de ces quinze extraits en langue
française.
Palavras-chave: Identité. Traduction Littéraire. Paratexte. Paratraduction. Salim Miguel.
ABSTRACT
This Course Conclusion Work proposes a reflection on the translation and paratranslation of
Nur no Escuridão (1999), by the Lebanese-Brazilian writer Salim Miguel (1924-2016), a
romance that tells the story of a Lebanese family who migrated to the Brazil in 1927. After a
recapitulative of the waves of migration from Lebanon to Brazil, I present the main lines of
the literary narrative. Next, I analyze the translation into Arabic, published in Lebanon in
2013, from fifteen excerpts from the protagonist's diary, inserted in the story of the narrator.
Finally, I propose the French translation of these fifteen excerpts.
Keywords: Identity. Literary Translation. Paratext. Paratraduction. Salim Miguel.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Mapa do Líbano.......................................................................................................13
Figura 2 - Printscreen com informações sobre a tradução........................................................23
Figura 3 - A contracapa do livro Nur no convite para o lançamento do livro no Líbano.........24
Figura 4 - Capas de edições de Nur (português - árabe)...........................................................25
Figura 5 - A contracapa do livro de Nur, edição em árabe.......................................................26
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 11
2 Do Líbano ao Brasil: migrações .............................................................................. 13
3 Do Brasil ao Líbano: o romance Nur na escuridão .............................................. 17
4 Brasil-Líbano-Brasil: Tradução e Paratradução .................................................. 21
4.1 Análise do paratexto da edição libanesa ..................................................................... 21
4.2 Análise de tradução de Nur na escuridão em árabe .................................................. 27
4.3 Tradução em francês de trechos de Nur na escuridão: proposta e comentários ........ 42
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................... 55
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 57
1 INTRODUÇÃO
Dentre as disciplinas cursadas no decorrer de minha formação no curso de letras Francês, as
cadeiras relacionadas à tradução e à literatura foram as minhas favoritas. Sendo de nacionalidade
síria, atuando profissionalmente como professor de inglês e de árabe, e cursando a graduação em
Francês, as culturas e as línguas em contato fazem parte de meu percurso pessoal e profissional.
No início da graduação, na disciplina de Literatura Ocidental, apresentei um trabalho sobre
o livro Les désorientés (Os desorientados), de Amin Maalouf, um escritor franco-libanês. A obra
conta a história de um grupo de amigos que viviam no Líbano e que fugiram para a França, EUA e
Brasil quando a guerra civil libanesa começou. O livro aborda a história dos imigrantes e o impacto
que a migração causa nas pessoas, mudando suas vidas e suas ideias. No final da graduação, na
disciplina Literatura Francesa IV, ministrada pela Profa. Dra. Luciana Rassier em 2017.2,
apresentei um trabalho sobre outro livro do mesmo autor, Les identités meurtrières, que também
trata de identidades em contexto de migração. Nessa disciplina, estudamos vários textos literários a
partir da perspectiva identitária, como por exemplo um romance com elementos autobiográficos de
Amélie Nothomb, escritora belga, que nasceu no Japão.
Chegado o momento de refletir sobre a elaboração deste Trabalho de Conclusão de Curso,
optei pela redação em língua portuguesa devido a minha condição de estrangeiro no Brasil, pois
aprofundar e exercitar a redação acadêmica nesta língua estrangeira seria um grande desafio, mas
também a oportunidade de um aprendizado muito útil para uma melhor inserção profissional.
Quanto à escolha do objeto de estudo, as questões identitárias me interessavam muito, devido ao
meu percurso de vida. Assim, a Profa. Dra. Luciana Rassier sugeriu que eu lesse Nur na escuridão
(1999), de Salim Miguel (1924-2016), romance de autor brasileiro nascido no Líbano, que narra a
história de uma família libanesa que imigrou para o Brasil em 1927. Ao finalizar a leitura de tal
obra, me identifiquei completamente com o assunto, uma vez que a obra relata caso similar ao meu:
um imigrante sírio no Brasil. Pude entender os sentimentos daquela família, seu medos e vivências.
Além disso, pela proximidade com meu país de origem, pude visitar o Líbano mais de 30 vezes.
Assim decidi aprofundar meu estudo nesse livro como objeto de análise de meu Trabalho de
Conclusão de Curso.
Várias razões legitimam a escolha desse objeto de estudo: a grade curricular da graduação
em letras-Francês também possui disciplinas de literaturas escritas ou traduzidas em língua
portuguesa; Salim Miguel foi um dos escritores mais relevantes de Santa Catarina, como atestam
vários prêmios recebidos e a indicação de obras suas como leitura obrigatória para o vestibular da
Universidade Federal de Santa Catarina (Nur na escuridão em 2005; Nós em 2017 e 2018); a
tradução em árabe desse romance, lançada em 2013, ainda não foi estudada; no âmbito deste
12
trabalho, fiz leituras e/ou traduções envolvendo não só minha língua materna (o árabe), como três
línguas estrangeiras: francês, português e inglês.
Em um primeiro momento, interesso-me pelas ondas de migração do Líbano para o Brasil, a
partir do século XIX. Essas migrações têm números impressionantes: há mais de 12 milhões de
libaneses ou descendentes de libaneses que vivem no Brasil - quase o triplo do número de Libaneses
que residem no Líbano, conforme reportagem veiculada pelo Globo Reporter (GLOBO.COM,
2017). Em um segundo momento apresento o romance Nur na Escuridão de Salim Miguel, a partir
de alguns artigos acadêmicos sobre essa obra.
A seguir, parto dos conceitos de paratexto (Genette, 1982; 2009) e paratradução (Yuste-
Frías, 2015) para analisar a tradução para o árabe de Nur na escuridão, intitulada الكورة البرازيل ذهاباً و
,feita por Yussef Mismar. Em Nur existem quinze trechos retirados do diário do protagonista ,اياباً
inseridos no relato do narrador. Eu analiso e a tradução destes trechos do português para árabe. Na
sequência, proponho uma primeira versão de tradução desses trechos em língua francesa.
2 Do Líbano ao Brasil: migrações
O topônimo árabe Loubnan (لبنان) deriva do idioma fenício, “montanha branca”, e faz
referência às montanhas do Líbano, algumas das quais permanecem cobertas de neve durante todo o
ano (WORLD CULTURE ENCYCLOPEDIA, 2018). Com uma superfície de pouco mais de dez
mil quilômetros quadrados, e cerca de 4 milhões de habitantes, esse país se situa no Oriente Médio,
tendo fronteira com a Síria ao norte e ao leste; com o Mar Mediterrâneo a oeste; e com a Palestina
ao sul, conforme podemos visualizar na figura abaixo:
Figura n° 1: Mapa do Líbano.
Fonte: Canal Monde (2018)
Historicamente, caracteriza-se por ser um território de encontro de culturas, como sintetiza
o parágrafo de introdução ao verbete Liban da Encyclopédie Larousse on line:
Héritier de la Phénicie, point de convergence des civilisations de la Mésopotamie, de l'Égypte
et de la Grèce, le Liban devient romain et byzantin avant d'être conquis par l'islam au milieu
du viie siècle. Éternel refuge des minorités, il est constitué d'une mosaïque de communautés
religieuses, chrétiennes et musulmanes, et devient, durant les croisades, le siège d'un royaume
chrétien, le royaume latin de Jérusalem. L'autorité de l'islam y est rétablie, à la fin du XIIIe
siècle, par les Mamelouks d'Égypte (LAROUSSE, 2018).
Os cananeus, primeiros colonizadores do país, falavam uma língua semítica. Na era
helenística, além do aramaico, falava-se grego. Posteriormente, o latim tornou-se comum, mas a
14
invasão árabe no oitavo século introduziu e assegurou a hegemonia do idioma árabe. Do século 16
até o início do século 20, o território ficou sob o domínio otomano; na década de 1920, iniciou-se o
Mandato francês, e, em 1946, após a Segunda Guerra Mundial, a independência tornou-se efetiva.
O papel das “escolas francesas” na difusão da língua e da cultura, em consonância com os interesses
políticos da França, são o objeto de vários estudos, como a tese de doutorado de Esther Moeller
(2011). Atualmente, os libaneses falam árabe embora uma maioria, especialmente os das classes
alta e média, fala francês. O inglês tem se tornado cada vez mais importante (WORLD CULTURE
ENCYCLOPEDIA, 2018). Portanto, hoje em dia, a língua oficial do Líbano é o árabe, mas o
francês e o inglês são amplamente falados.
A natureza da diversidade cultural e histórica do Líbano resulta das diferentes civilizações
que influenciaram o país ao longo dos séculos. No caso específico das relações com o Brasil, a
figura-chave é a do imperador Dom Pedro II (1825-1891), cuja viagem ao Líbano em 1876 é
analisada por estudiosos como Roberto Khatlab (DANIEL, 2015).
A Avenida Brasília é uma grande avenida na cidade libanesa de Kamed al-Lauz. Kamed al-
Lauz não é uma cidade latino-americana, mas é povoada por muçulmanos sunitas no coração do
vale de Bekaa, no Líbano, uma região conservadora na fronteira com a Síria. Nesta e em outras
cidades libanesas, como Sultan Yaacoub e Ghazze, a maioria da população é composta por
“brasilibaneses”, um neologismo que se refere a cidadãos bi-nacionais (MARSI, 2017). Nesses
lugares, que podem ser considerados enclaves brasileiros no Líbano, a distância geográfica e
cultural entre o mundo árabe e a América Latina é relativizada de maneira radical. De modo
análogo, esses indivíduos, cujo percurso de vida se inscreve no contato entre línguas e culturas,
tornam fluídas as fronteiras identitárias, cujo processo é semelhante àquele que Amin Maalouf
descreve no capítulo inaugural de Les identités meurtrières:
Depuis que j’ai quitté le Liban em 1976 pour m’installer em France, que de fois m’a-t-on
demandé, avec les meilleures intentions du monde, si je me sentais « plutôt français » ou
« plutôt libanais ». Je réponds invariablement : « L’un et l’autre ! » Non par quelque souci
d’équilibre ou d’équité, mais parce qu’en répondant différemment, je mentirais. Ce qui fait
que je suis moi-même et pas un autre, c’est que je suis ainsi à la lisière de deux pays, de deux
ou trois langues, de plusieurs traditions culturelles. C’est précisément cela qui définit mon
identité (MAALOUF, 1999: 07)
A comunidade de libaneses e de descendentes de libaneses no Brasil, que agrupa quase dez
milhões de indivíduos, supera a população do Líbano, que tinha 3,5 milhões de habitantes em 2010,
chegando a cerca de quatro milhões nos dias de hoje (Comunidade libanesa no Brasil, 2010). Esse
fato resulta de décadas de ondas migratórias, a primeira das quais foi liderada pela comunidade
cristã libanesa que fugiu do domínio otomano no final do século XIX (MARSI, 2017).
Em trechos encontrados no site Tayyar referentes ao livro Migração Libanesa: Realidade e
Perspectivas الهجرة اللبنانية، واقع و آفاق, de Haytham Juma, Diretor Geral do Ministério de Expatriados,
são descritas cinco etapas da migração libanesa, de 1860 até 2002. No entanto, é possível adicionar
uma sexta fase, que começou após 2005 e continua até hoje, tendo como principais causas as
condições políticas e de segurança e a diminuição das oportunidades de emprego para a juventude
libanesa.
A primeira onda de migração aconteceu do século 19 até a Primeira Guerra Mundial,
quando muitos libaneses emigraram para os Estados Unidos da América, o Brasil e a Argentina,
especialmente após a visita do segundo imperador do Brasil, Dom Pedro II, a Beirute. Outros
grupos foram para países como o Egito, o Canadá e a Austrália, Haytham Juma afirma em seu livro:
A primeira fase começa em Jum'a em meados do século XIX e se estende ao início da
Primeira Guerra Mundial em 1914. Esta etapa testemunhou o crescimento da emigração do
Líbano e da Síria para os Estados Unidos da América, Brasil e Argentina e outra pequena
onda para o Egito, composta de intelectuais. Uma terceira onda também chegou ao Canadá,
México, Austrália, Nova Zelândia e Senegal na África. Uma das razões para essa migração
tem sido a deterioração das condições políticas e econômicas. A notícia do sucesso dos
primeiros imigrantes nas Américas ajudou a aumentar a imigração e encorajar os libaneses
a partirem para esses países. O número de migrantes do Monte Líbano neste período foi
estimado em cerca de 100.000, cerca de um quarto da população do Líbano na época.
(JUMA, s.d.)1
Também de acordo com MARSI (2017), o papel de Dom Pedro II que falava o idioma árabe,
foi fundamental, pois ele incitou a comunidade cristã libanesa sitiada a buscar fortuna na América
Latina. Vale sublinhar que o clima mais exuberante do continente americano era um poderoso fator
para os agricultores de Bekaa, sufocados pela economia feudal libanesa.
A segunda onda de migrações foi entre as duas guerras mundiais: destinos como Austrália
e Estados Unidos tornaram-se de difícil acesso para os imigrantes, que começaram a imigrar
principalmente para a América Latina e a Àfrica Ocidental, segundo Haytham Juma:
A segunda fase durou de 1914 até o final da Segunda Guerra Mundial. Durante a Primeira
Guerra Mundial, a fome matou muitos libaneses. Assim como a propagação da peste e a
imposição de recrutamento compulsório pelos otomanos. Durante os anos das guerras, o
movimento migratório foi interrompido pelo bloqueio naval imposto ao Líbano. Depois que
a guerra terminou, os libaneses emigraram após a notícia do enriquecimento rápido dos
emigrantes e das oportunidades para uma vida melhor. Os Estados Unidos e a Austrália
impuseram restrições de imigração, o que fez com que os migrantes se destinassem à
América Latina e à África Ocidental (JUMA, s.d.).
Conforme sublinha Truzzi, o registro oficial da nacionalidade dos migrantes foi durante
muito tempo impreciso. Inicialmente, os libaneses e os sírios eram incluídos na categoria “outras
1 Todas as traduções de citação em árabe são minhas.
16
nacionalidades”, e depois: “Os imigrantes dessa etnia aparecem registrados como turcos (sobretudo
até o final da Primeira Guerra Mundial) e depois, ora como Libaneses (a partir de 1920), ora como
sírios (a partir de 1922)” (TRUZZI, 1997, p.39).
Já a terceira onda aconteceu entre a Segunda Guerra Mundial e a guerra civil libanesa nos
anos 1970. Essa imigração foi principalmente para o Golfo Arábico, Estados Unidos e Austrália.
Juma (s.d.) afirma que este movimento cresceu nas décadas de 1960 e 1970, por causa do aumento
dos preços, que se deu pelo boom do petróleo. Além disso, os imigrantes libaneses também
buscavam uma mudança qualitativa no nível cultural, e, por isso, partiram para esses locais.
Segundo Marsi (2017), após a Segunda Guerra Mundial uma nova onda de migração
predominantemente muçulmana deixou o Líbano na esperança de uma vida melhor. Nas décadas
que se seguiram, os conflitos que devastaram o país - a guerra civil de 15 anos iniciada em 1975 e a
guerra mais curta, mas brutal, com Israel em 2006 - contribuíram a reforçar a crescente comunidade
líbano-brasileira.
A quarta onda, que aconteceu durante a guerra civil no Líbano (1975-1990), foi a maior:
cerca de 800.000 pessoas deixaram o país, dirigindo-se aos cinco continentes. Haytham Juma (s.d.)
comenta que a inflação e baixos salários também foram algumas das razões para que essa migração
em massa ocorresse.
Essas razões econômicas foram também as principais razões da quinta onda de migração.
Essa fase ocorreu entre o fim da Guerra Civil e a libertação do Líbano, entre 1990 e 2002. Nesse
período, o Líbano passou por uma fase de certa estabilidade; porém, a falta de oportunidade de
emprego fez com que muitos jovens libaneses buscassem estabilidade financeira e novas
oportunidades empregatícias em diversos outros países (JUMA, s.d.) Muitos imigrantes libaneses e
sírios, ao chegarem ao Brasil, trabalharam no comércio. No entanto, eles investiram muito na
educação de seus filhos; muitos deles tornaram-se advogados, médicos e engenheiros, conforme
aponta Oswaldo Truzzi:
Paralelamente à expansão de seus interesses em atividades comerciais e industriais, o
acesso de imigrantes e descendentes de sírios e libaneses nas chamadas profissões liberais
(advocacia, medicina e engenharia) constituiu a outra alternativa de ascensão sócio-
econômica trilhada com bastante êxito por significativas parcelas da colônia (TRUZZI,
1991, p.82).
3 Do Brasil ao Líbano: o romance Nur na escuridão
Salim Miguel (1924-2016) nasceu no Líbano e chegou ao Brasil aos três anos de idade.
Foi um dos líderes do "Grupo Sul", movimento artístico e literário que modificou o meio
cultural de Santa Catarina nas décadas de 1940 e 1950. Além disso, exerceu diversas funções
no campo das letras, e foi um dos editores da revista literária carioca Ficção, no fim dos anos
1970. De 1983 a 1996, ocupou cargos de chefia na Editora da UFSC e na fundação cultural de
Florianópolis:
Homem de cultura e de ação, homem de palavra e da palavra, Salim Miguel atua
desde a década de 1940 escrevendo, lendo, criando projetos, consolidando parcerias.
Escritor, jornalista, editor, redator, crítico literário, roteirista, dono de livraria,
diretor da Agência Nacional de Santa Catarina e da Editora da Universidade Federal
de Santa Catarina, superintendente da Fundação Cultural Franklin Cascaes, esse
respeitado intelectual é múltiplo e uno (RASSIER, 2011, s.p.).
Seu livro de estreia, Velhice e outros contos, foi lançado em 1951. Dentre os mais de
trinta livros que publicou, destacam-se os romances A voz submersa (São Paulo: Global,
1984), Primeiro de abril: narrativa da cadeia e Nur na escuridão (Rio de Janeiro: Topbooks,
1999). Este último recebeu prêmios de melhor romance pela Associação Paulista de Críticos
de Arte e pela Jornada Nacional de Literatura de Passo Fundo (GLOBAL, 2018).
De acordo com Rassier:
Dentre os escritores brasileiros de origem libanesa mais consagrados (Raduan
Nassar, Milton Hatoum e Alberto Moussa), Salim Miguel é o único a ter passado os
primeiros anos da infância no Líbano e também o único cuja obra aborda não só a
instalação e a vida da família de migrantes no Brasil, mas também trata em detalhe
da vida pregressa no Líbano e da viagem até o continente americano [...] (RASSIER,
2015A, p. 420).
Nur na escuridão é uma narrativa ficcional na qual se identificam dados biográficos da
vida do autor. Esse romance conta a história de uma família que migrou do Líbano para o
Brasil em 1927, histórias de amor, tristeza, saudades e medo. O casal Yussef e Tamina
vivenciam um misto de esperança pela possibilidade de iniciar uma nova vida e de medo
desse lugar desconhecido e distante chamado Brasil. Esse romance trata das questões dos
imigrantes, de todo o caminho que está cheio de riscos, emoções e esperanças. As
dificuldades começam no momento em que as pessoas tomam a decisão de emigrar e
18
continuam até o último minuto de suas vidas. O momento em que a família de protagonistas
chega ao litoral do Rio de Janeiro é narrado nesses termos:
Tarde, quase noite. A terra cresce, avança, se aproxima. Começa-se a perceber o
contorno das praias, pássaros sobrevoam o navio, a água verde-azulada indo-e-vindo
torna-se escura, as elevações e depressões dos terrenos se entremostram no lusco-
fusco, um miúdo casario, as diferentes tonalidades de verde das árvores, manchadas,
de repente, pelo colorido de uma flor que não demora vai se perder na escuridão que
rápido se fecha (MIGUEL, 2004, p. 76)
Muitas histórias são contadas sobre as dificuldades de comunicação no começo, pois
nem Yussef nem sua esposa, Tamina, falavam português. Como exemplo, podemos tomar o
trecho em que Yussef encontra outros libaneses em um boteco:
Comeram uns bolinhos no boteco, tomaram uma pinga e foi preciso esclarecer o que
era aquela bebida queimante, pinga, escandindo as sílabas o patrício repita, pin-ga,
queria que eles repetissem, extraída da cana-de-açúcar, também chamada caninha,
cachaça, aguardente, nada havia de parecido no Líbano, melhor, havia, era uma
espécie de arak, sem o tom leitoso, iguais os efeitos para quem não sabia parar. Ali
com a pinga, começava a primeira lição de português e de Brasil (MIGUEL, 2004,
p. 34)
As diferenças culturais entre o que o patriarca da família, Yussef, viveu no Líbano e o
que ele viveu no Brasil são claramente mostradas em Nur. Um exemplo da identidade híbrida
desses migrantes é o fato de que Yussef é chamado por diferentes nomes durante a narração
da história, dependendo de onde e com quem ele está, conforme aponta Luciana Rassier no
artigo "Identidade e imigração em Nur na escuridão, de Salim Miguel":
Ao longo do romance, várias alusões são feitas à maneira pela qual Yussef é
chamado, traço identitário revelador da posição que seu interlocutor adota na
relação. Assim, já no capítulo inicial, quando Yussef fala a outros libaneses na igreja
ortodoxa do Rio de Janeiro, o narrador sublinha que seu nome pode variar: « E tu
Yussef (ou José, dependendo do perguntador […]) » (p. 21), « (na igreja o pai volta
a ser Yussef) » (p. 23). É em São Pedro de Alcântara que começa a deformação de
seu nome para o equivalente em língua portuguesa (Yussef/Josef – p. 98). Ao longo
do tempo, os epítetos se multiplicam: seu José, seu Zé, seu Zé Miguel, seu Miguel,
seu Zé Gringo, seu Zé Turco, Zé Turco. Até Tamina acaba por interpelá-lo de
diferentes maneiras: Yussef, José, e por um nome híbrido, Yusé (p. 181). No
entanto, quando ela está preocupada, é em sua língua materna que ela o chama: « (às
vezes, entre eles, na intimidade, quando está preocupada, é Yussef) » (p. 123), « a
mãe, mais prática, preocupada, costuma repetir: José, precisas cobrar […] um horror
as dificuldades, a fome, a miséria, onde vamos parar, Yussef? » (p. 125).
(RASSIER, 2011, s.p.)
Durante toda a narrativa, Yussef questiona-se sobre a decisão de migrar, indagando-
se se teria sido ou não a melhor escolha. O romance termina com a morte do patriarca,
cercado por sua família. Essa morte representa, de certo modo, o fim do contato com o Líbano
e com a língua árabe, já que ele era o único na família que ainda dominava o idioma: “Quero
ir pra minha bait, minha casa, pra minha terra/Maksuna, por que a tagarrada, emigrar não
melhora” (MIGUEL, 2004, p. 255).
Cabe salientar que Salim Miguel escolheu uma palavra em árabe para utilizar no
título do romance: Nur, que significa “luz” em português. Sobre esse termo, Ana Cláudia de
Oliveira da Silva afirma, em "Oriente/Ocidente: memórias da imigração no relato de Salim
Miguel":
Nur, vocábulo árabe que compõe o título e significa luz, será a primeira palavra
aprendida no novo país por Yussef: palavra que jamais esqueceria e [que] lhe abre as
portas do novo mundo (p.2). A luz será uma busca constante em meio à escuridão do
passado, das memórias incompletas, perdidas no mais fundo do tempo, no escuro
abismo (p.15). Esforço empreendido não apenas pelas personagens que rememoram,
mas também pelo narrador, que procura, com pertinente monotonia, em busca de
uma ilusória eficácia, [...] unir os fios, harmonicamente se possível (p.166) (SILVA,
2011, p.2).
Os capítulos de Nur não estão em ordem cronológica, como Elisângela Brito Martins
Pessanha escreve em "O papel da família no processo de integração dos imigrantes libaneses:
uma leitura de sua voz e dois irmãos":
Em Nur na escuridão, os elementos autobiográficos se misturam à ficção. O
romance não apresenta uma narrativa cronológica, embora comece com a chegada
da família ao porto da Praça Mauá, quando o autor tinha três anos de idade. Em
várias instâncias de flashback, o narrador relata dados da vida de seus pais no
Líbano - o modo como se conheceram; as dificuldades do início do casamento; os
motivos da viagem e os problemas enfrentados; os conselhos dos parentes para que
desistissem - para só então narrar efetivamente a história da família Miguel no
Brasil, a sua passagem por Magé, São Pedro de Alcântara e Biguaçu, até
estabelecer-se em Florianópolis. (PESSANHA, 2011, p. 25)
Sendo uma vertente do gênero literário biográfico, ou ainda, um subgênero das
biografias, a autobiografia é caracterizada pela narração da própria vida do autor, é uma
narração das experiências individuais do autor. Esse gênero literário pode ser definido como:
“Narrativa em prosa que uma pessoa real faz de sua própria existência, quando focaliza sua
história individual, em particular a história de sua personalidade” (LEJEUNE, 2008, p.14).
Ainda, de acordo com Darde (2012), na autobiografia existe a história de uma pessoa, escrita
por ela mesma, e focada na formação da identidade do autor.
Um dos recursos que o escritor Salim Miguel utiliza para criar um jogo complexo entre
ficção e realidade é a inserção, ao longo do romance, de quinze trechos do diário que o
patriarca, Yussef, escreveu em árabe e que foi traduzido para o português após sua morte. É o
20
estudo e a tradução desses trechos que me interessam mais especificamente nas próximas
partes deste trabalho.
4 Tradução e Paratradução
No âmbito deste trabalho, parto do princípio que a tradução vai muito além do simples
aspecto, ampliando visões de mundo, como afirma Flávia Westphalen: “O processo da
tradução, por sua vez, lida com fenômenos culturais e linguísticos diversos, buscando
transcender a palavra escrita, captar o não-dito e depois reproduzi-lo na concretude das
palavras da língua alvo” (2010, p .333). No que diz respeito à tradução literária, considero-a
como um processo criativo. Portanto, a análise que faço da tradução em árabe não se restringe
a apontar diferenças ou aspectos que eu consideraria como “erros” da tradução. Meu objetivo
é aguçar meu olhar sobre desafios e modificações presentes na tradução para, a partir dessa
aprendizagem, trabalhar na tradução desses trechos para a língua francesa.Em uma primeira
etapa do estudo da tradução árabe de Nur na escuridão, interessei-me pela análise do
paratexto. Esse conceito, desenvolvido por Gérard Genette em Seuils (1987), refere-se a
elementos que constituem um livro mas que são externos ao texto literário. O “epitexto”
remete a elementos externos ao objeto livro (“privados”, como diários, correspondências ou
“públicos”, como entrevistas do autor, artigos acadêmicos ou de imprensa, informações no
site da editora, etc) enquanto que o “peritexto” faz parte do objeto livro (título, texto de
contracapa, texto de orelha, ilustrações, capa, prefácio, etc). Conforme aponta Rodrigo da
Costa Araújo, em resenha da tradução brasileira da obra de Genette, publicada em 2009, com
o título de Paratextos editoriais: “Ao delimitar a obra, o paratexto funciona ainda como a sua
porta de entrada, estabelecendo a ponte entre um dentro e um fora, mais precisamente,
instaurando os acessos ao seu interior, provocando, assim, estranhamentos e descobertas”
(ARAÚJO, 2010, p.03). Portanto, os elementos paratextuais podem alterar a recepção de um
texto ou sua interpretação pelo público. Yuste-Frías sublinha o papel fundamental da
“paratradução”, ou seja, do paratexto nas traduções, que pode influenciar o modo como um
novo público percebe a literatura traduzida (2015, p. 322).
4.1 Análise do paratexto da edição libanesa
A editora libanesa "Dar Saer el Mashreq" (دار سائر المشرق - Casa de Todo o Oriente)
publica livros em árabe, inglês e francês. Em seu site, disponível apenas em árabe, encontram-
se as seguintes informações sobre a tradução de Nur na escuridão. Em uma faixa azul existe a
menção “Nossas publicações” seguida da indicação dos três idiomas publicados pela editora
22
(árabe, francês e inglês). Logo abaixo, em uma faixa amarela, aparece o título da tradução. A
seguir, há uma coluna à direita da tela, com as seguintes rubricas, que traduzo abaixo:
Autor: Salim Miguel.
Biografia do autor: (nada consta)
Edição: primeira.
Editora: Saer El Mashreq.
(uma linha em branco)
Preço: 13 dólares
Um pouco mais abaixo, a palavra فحواه (“conteúdo”, “resumo”) introduz um curto
texto, que traduzo a seguir:
Este é o fim da história de Yussef Meghal,
que deixou o Líbano com sua família em
1927 e nunca mais voltou. Seu filho, Salim,
escritor e premiado jornalista, acompanhou
seu pai na aventura de emigração de Kfar
Saron quando tinha três anos de idade. Como
seu pai, ele sente nostalgia de suas origens.
Depois de sete décadas, Salim Meghal
escreve a história da imigração da família
para o Brasil e está ansioso para traduzi-la
para o árabe e publicá-la no Líbano. Trata-se
da saga ou do mito do desenraizamento dos
libaneses e de sua nostalgia permanente pela
terra dos pais e dos avós.
إنها نهاية حكاية يوسف ميغال الذي غادر مع عائلته لبنان
، ولم يعد إليه قط. رواها ابنه سليم الكاتب والصحافي البارز 1927سنة
الحائز على العديد من الجوائز والذي رافق والده في مغامرة الهجرة من
كفر صارون وله من العمر ثالث سنوات. على غرار أبيه، يحّن سليم
البدايات، ويكتب قصة هجرة العائلة إلى البرازيل بعد سبع ميغال إلى
عقود، ويحرص على ترجمتها إلى العربية ونشرها في لبنان. إنها ساغة
.أو أسطورة اقتالع اللبنانيين وحنينهم الدائم إلى أرض اآلباء واألجداد
(Fonte: site da editora Dar Saer El
Mashreq)
Abaixo, o printscreen em questão:
Figura n° 2: Printscreen com informações sobre a tradução.
Fonte: site da editora Dar Saer El Mashreq.
O responsável pela tradução dessa obra é o libanês naturalizado brasileiro Youssef H.
Mousmar. Nascido na cidade de Hermel em 05/04/1943, o tradutor emigrou para o Brasil no
final de 1969. De acordo com sua biografia (BIOGRAFIA, 2018) Youssef realiza traduções
juramentadas, dá aulas de árabe e atua em várias organizações culturais líbano-brasileiras.
Escreveu também, em 1980, o primeiro dicionário árabe-português/ português-árabe.
Na pesquisa em sites em língua portuguesa, há informações esparsas mas relevantes
sobre o lançamento da edição libanesa de Nur na escuridão. Assim, em “Salim Miguel
publica livro no Líbano”, publicado no site das Agência de Notícias Brasil-Árabe, o próprio
escritor líbano-catarinense indica que a publicação foi possível graças à articulação feita por
Roberto Khatlab, diretor do Centro de Estudos e Culturas da América Latina da Universidade
Saint-Esprit de Kaslik (DANIEL, 2013). Outro dado que deve ser destacado é que a tradução
recebeu bolsa de apoio do Ministério da Cultura através da Fundação Biblioteca Nacional do
Brasil – sendo que poucos são os países de língua árabe contemplados com esse incentivo,
conforme afirma Isaura Daniel em “Mais tradução de livros brasileiros para o exterior”
(2011).
O lançamento da edição libanesa aconteceu em 07 de março de 2013, durante a Feira
do Livro Libanês, evento anual, em Antelias أنطلياس, localidade próxima a Beirute. No
convite, reproduzido no blog do crítico de música Antônio Carlos Miguel, filho de Salim
Miguel, o nome do tradutor aparece na imagem da capa do livro, conforme imagem abaixo:
24
Salim Miguel
El koura el Brasil
Ida e Volta
Romance
Traduzido do Português por
Youssef H. Mousmar
Dar Saer El Mashreq
Figura n° 3: A contracapa do livro Nur no convite para o lançamento do livro no Líbano.
Fonte: Blog de Antônio Carlos Miguel (2013).
Mas na capa da tradução, não consta o nome do tradutor.
A capa da edição original em português apresenta, na parte superior, desenhos em
estilo oriental, e, na parte inferior, uma fotografia em preto e branco do porto do Rio de
Janeiro, que remete à época da chegada da família de protagonistas ao Brasil. Já a capa da
tradução em árabe traz à direita a figura do Cristo Redentor, mundialmente conhecida e
associada ao Brasil e ao Rio de Janeiro, e, à esquerda, ruínas de uma construção antiga, como
podemos constatar nas imagens abaixo:
Figura n° 4: Capas de edições de Nur (português - árabe).
Fonte: Miguel (2004), Migal (2013).
O título em árabe não é a tradução de Nur na escuridão. É " ًالكورة البرازيل ذهاباً و ايابا"
que significa em português "El Koura, o Brasil, ida e volta", indicando claramente que o livro
é sobre migração. Optei por traduzir a palavra “ ًايابا ” por volta, e não por “retorno”, pois ًايابا é
a expressão empregada para designar percursos de “ida e volta” em viagens.
No processo de tradução, os editores desempenham um grande papel na mudança de
alguns aspectos, dependendo do público que desejam alcançar, ou do objetivo de escolher
alguns escritores específicos e livros específicos para serem traduzidos, especialmente quando
a questão é a capa do livro e o título. Esses elementos paratextuais são uma chave
fundamental para indicar ao leitor de que tipo de livro se trata. No verbete Tradução de
Viagens, Deslocamentos, Espaços (2016), Lilian De Paula comenta que as modificações dos
títulos de livros correspondem à intenção de “Adaptar para melhor agradar e informar (2016,
p.322). Isso é o que podemos ver na tradução árabe do romance Nur na escuridão. O título -
"El Koura, O Brasil, Ida e Volta" باً ايا و ذهاباً البرازيل الكورة. - foi completamente modificado, e
indica o nome do país de destino, "Brasil", e o nome de uma famosa região libanesa, de onde
a família de personagens é originária.
Na capa do livro em árabe há o nome do escritor Salim Miguel no topo, em letras
brancas; mais abaixo, em letras vermelhas e maiores, o título. Mais abaixo, em letras menores,
26
o gênero “romance”. Na parte inferior da capa, são indicados os prêmios “Prêmio Zaffari &
Bourbon & Prêmio da Associação Paulista dos Críticos de Arte (APCA)”.
Já na contracapa, há dois textos em árabe e uma foto de Salim Miguel. O primeiro
texto é retirado do último capítulo do livro (XXX - Sementes), que narra o delírio de Yussef,
pouco antes de morrer, no qual o patriarca mistura passado e presente, e os idiomas árabe e
português
[...] geme, chama, treme-lhe a voz, oms, oms, quer a mãe perto, qual, a mulher,
Tamina, ou aquela mãe de quem tão pouco fala. Chama pelas duas? Mistura palavras
de português e árabe, diz: quero ir pra minha bait, minha casa, pra minha
terra/Maksuna, por que a tagarrada, emigrar não melhora ... se perde, cala um
tempo [...] e de repente eia uma única palavra que repetia, garib, repetindo-a para
todos que vinham visitá-lo nos últimos tempos, dizia para os filhos, para amigos e
parentes, por mais que a pessoa lute por se adaptar, ela continua, mesmo sem querer,
ás vezes sentindo-se estrangeira, logo recua, envergonhado, não, garib como, se aqui
é minha querida maksuna? (Miguel, 2004, p. 255)
Figura n° 5: A contracapa do livro de Nur, edição em árabe. Fonte: Migal (2013).
O segundo texto a mesma apresentação do livro que consta no site da editora,
conforme evoquei anteriormente.
4.2 Análise de tradução de Nur na escuridão em árabe
A fim de definir o objeto exato deste trabalho, eu li na íntegra o romance Nur na
escuridão em português e também sua tradução. Depois, efetuei uma releitura cotejando,
parágrafo a parágrafo, as duas narrativas. Percebi que alguns trechos não foram traduzidos,
sendo o exemplo mais relevante o capítulo "Biguaçu", que foi suprimido na edição libanesa.
Esse título remete a um vilarejo próximo a Florianópolis, onde a família de libaneses se
instala durante certo tempo. Sobre a importância desse capítulo, Rassier comenta:
Ainsi, le toponyme Biguaçu, en lettres capitales, figure-t-il dans le titre du chapitre
dix-huit, lequel s’ouvre sur un bref paragraphe de synthèse : « 1932/1943 : em
Biguaçu. A família aumenta. Os filhos crescem. Tempo de definição de vida.
Período conturbado. No Estado. No país. No mundo » (MIGUEL, 2004, p. 109).
S’ensuit un paragraphe unique qui s’étend sur trois pages et qui porte sur les
habitants, les anecdotes, les lieux et la topographie du village. Le lien très étroit
entre Biguaçu et l’identité de la famille de migrants est ensuite mis en évidence dans
ces deux phrases : « Nesta Biguaçu, mítica e real, se fixou a família. Se formou a
família. Biguaçu passou a ser a terra dos Miguéis » (MIGUEL, 2004, p. 112). En
effet, l’univers de ce village fait l’objet de deux chapitres qui correspondent à
presque un tiers du roman. « Fios » est constitué par une suite de dix-neuf histoires
courtes, commençant toutes par la même expression (« Nítida a cena »). Le chapitre
suivant, « Perfis » présente neuf fragments numérotés dont les titres renvoient à des
habitants de Biguaçu,[…] (RASSIER, 2015 B, p. 161).
No romance em português, vocábulos em árabe mostram a ligação de Yussef ao
passado. Ana Maria Lisboa de Mello escreve em "Memórias e Traços Identitários em Nur na
Escuridão":
No momento da morte de Yussef, a língua materna, o árabe, torna-se quase tão
presente quanto no momento de sua chegada ao Brasil e os primeiros anos de vida
longe de sua terra. [...] sente-se até um garib, um estrangeiro, apesar de todo tempo
vivido no Brasil, mas foi incorporando à sua identidade a cultura de acolhida, da
Biguaçu onde fez amigos. [...] A rememoração do passado, quando efetuada
oralmente pelo pai ou em excertos de sua autobiografa, traz consigo os sentimentos
do imigrante apartado de sua terra e o estranhamento experimentado nos seus
deslocamentos pelo país de destino. No romance, os vocábulos árabes são os que
melhor que expressam sentimentos pungentes e indeléveis, próprios da condição dos
que vivem em um entre lugar cultural (MELLO, 2014, p.180).
Não há indicação na tradução de que algumas palavras estão em árabe na edição
brasileira. A tradução de alguns elementos da cultura brasileira também merece nossa
atenção, como a palavra “pinga”, que é traduzida para o árabe diretamente como “arak
brasileiro”. (MIGUEL, 2004, p.35).
28
Analisei, no romance em português e na tradução em árabe, os quinze trechos em
que o diário de Yussef aparece. Observei modificações no registro da língua e no vocabulário;
o alongamentos das frases em árabe; a transformação de trechos em discurso e/ou indireto,
etc. Nos quadros de análise a seguir, justaponho o trecho em português e a sua tradução em
árabe, e comento os aspectos que me pareceram mais relevantes.
Trecho 1 (Capítulo II - Abrigo):
“Um homem abriu a porta, perguntou, em
árabe, o que desejava. Gostaria, por favor,
que me indique uma pousada onde possa
passar a noite, pois chegamos hoje de viagem
e não conhecemos a língua daqui – respondi-
lhe. De que parte você é e qual seu nome?
Sou de sua cidade e seu parente – respondi,
lhe dizendo meu nome. Ele então
efusivamente, abraçou-me, dizendo: seja
bem-vindo, entra, entra, está em sua casa.
Perdão, meu parente, mas não estou só.
Minha família está comigo. Onde estão?
Naquele carro. Ele chamou o motorista,
dizendo-lhe que trouxesse o veículo até perto
da entrada. Minha esposa, meus filhos e
meu cunhado desceram e nosso parente
pagou a corrida. Entramos em sua casa, ele
chamou pela esposa e filhos para nos
apresentar. Também a família nos deu boas-
vindas” (MIGUEL, 2004, p. 29)2
"و فتح الباب رجل موجهاً لي هذا السؤال باللغة
العربية: ماذا ترغب؟ فأجبته: أريد من فضلك أن تدلني على
نزل يمكن أن أقضي فيه هذه الليلة, ألننا وصلنا اليوم من
السفر و ال نعرف لغة البالد.
قال: من أي بالد أنت؟ وما اسمك؟ أجبته أنا من
قول اسمي, عانقني الرجل بلدتك و أحد أقاربك. و قبل أن أ
بحرارة عارمة و قال: مرحبا بك! أدخل, أدخل, أنت في
بيتك! فقلت له: اسمح لي يا قريبي فأنا لست وحدي, لقد
أتيت مع أسرتي.
قال: و أين هي أسرتك اآلن؟ فقلت: إنها في تلك
السيارة هناك. عندها نادى السائق و قال له: تقدم بسيارتك
حتى باب المدخل.
مام المدخل نزل الجميع من السيارة, و بدأ التعارف, و أ
شقيق زوجتي, ابن عميفقدمت له زوجتي و أوالدي و
بعدها دفع قريبنا أجرة السيارة و أمر السائق باالنصراف,
ثم رحب بنا و دخلنا جميعاً الى منزله, و استدعى زوجته و
ه أبناءه و كان لقاء تعارف بين العائلتين, فرحبت بنا أسرت
أجمل ترحيب"
(MIGAL, 2013, p. 36)
Em português há um único parágrafo, mas em árabe há frases com recuo. As
palavras sublinhadas em árabe são expressões que indicam o discurso indireto: “ele disse:, eu
disse, etc.”. Em português, diz-se que ele veio com sua esposa, filhos e cunhado. Em árabe há
2 Nas citações, o grifo é meu.
um detalhe adicional: seu cunhado é seu primo (em árabe, ele é o filho do irmão de seu pai,
especificamente).
Na tradução árabe, observamos que o verbo está conjugado no modo imperativo
(“entra, entra”). Em árabe, o verbo está conjugado no presente. أدخل
Trecho 2 (IV. Conhecer):
“De manhã, meu parente quis saber mais
notícias da terra natal. Depois do desjejum,
convidou-me a ir com ele aos correios e
telégrafos, onde enviou um telegrama á
minha irmã. Pedi-lhe, então, que fosse
comigo até a Alfandega, para trazermos a
bagagem que eu havia deixando no depósito”
(MIGUEL, 2004, p.39)
أخبار الوطن. من"في صباح الغد أراد قريبي معرفة المزيد
بعد الفطور دعاني للذهاب برفقته إلى مكتب البريد و
التلغراف كي أرسل برقية إلى شقيقتي. فطلبت منه أن يذهب
ك لجلب حقيبة تركتها هناك في معي إلى مكتب الجمار
المستودع"
(MIGAL, 2013, p.47)
Aqui podemos ver claramente que em árabe temos três frases longas, enquanto
podemos ver muitas nove frases curtas em português. Em árabe, existem alguns erros
ortográficos من.
Trecho 3 (V. Gente)
“No terceiro dia, minha irmã veio ver-nos e
levar-nos para sua casa. Indescritível sua
alegria ao encontrar-nos. Beijava-me e à
minha esposa e às crianças. Sentava-se
alguns segundos, para voltar a levantar e
afogar-nos com seus beijos. Que irmã
afetuosa, sensível e amorosa! Arrumamos
nossas coisas, agradecemos tudo que
haviam feito por nós e nos despedimos,
indo para a estação do trem, onde adquirimos
os bilhetes” (MIGUEL, 2004, p.41)
"في اليوم الثالث جاءت أختي لرؤيتنا و أخذتنا إلى بيتها.
و بحرارةكانت فرحتها ال توصف عندما التقت بنا. قبلتني
قبلت زوجتي و أطفالي جلست لبضع ثوان ثم قامت و عادت
لعناقنا و تقبيلنا من جديد. يا لها من شقيقة حنونة و محبة!
أحسنوا وضبنا أغراضنا و شكرنا أصحاب المنزل الذين
ثم و أعلنا لهم عن تقديرنا كل ما فعلوه معنا.استقبالنا
إلى محطة القطار و اتجهنا برفقة شقيقتيودعناهم و ذهبنا
مباشرة إلى مركز شراء التذاكر"
(MIGAL, 2013, p. 49)
30
No trecho “Beijava-me e à minha esposa e às crianças”, na tradução árabe há mais
uma palavra descrevendo esse beijo como um beijo mais carinhoso - que em árabe se diz um
beijo “quente” بحرارة. Na tradução árabe há mais duas frases que não estão no livro original
em português: é indicado que Yussef e sua família foram para a estação de trem com a irmã
dele “برفقة شقيقتي”, e também que eles agradeceram à família por tê-los recebido e por tudo
o que fizeram por eles “و أعلنا لهم عن تقديرنا كل ما فعلوه معنا”
Trecho 4 (VI. Amor):
“Larguei meus amigos e os folguedos e corri
para casa, que ficava bem próxima de onde
eu brincava. Quando me acercava da porta da
entrada vi, junto a ela, duas mulheres
paradas, uma de cada lado e, no meio,
uma menina pequena, a qual tinha nas
mãos uma carta que lia com toda
correção.
Estaquei e fiquei ouvindo sua leitura
escorreita, sua voz suave e maviosa. Quando
aquela voz soou em meus ouvidos, senti
como se uma corrente elétrica percorresse
todo meu corpo. Acometeu-me um
estremecimento e as batidas do meu coração
se aceleraram. Quanto mais ela se
aprofundava na leitura e eu em ouvi-la, mais
aumentava o ritmo das minhas pulsações.
Magra, cútis morena, olhos cor de mel, nos
quais resplandecia a luz da inteligência. O
cabelo castanho caía-lhe pelos ombros,
cobrindo-lhe as costas até a cintura. A beleza
fulgurava em seu rosto. O pescoço
assemelhava-se ao de uma gazela ligeira”
(MIGUEL, 2004, p. 45)
"تركت أترابي الذين كنت ألهو معهم و ركضت
و لما وصلت إلى نحو المنزل القريب الذي كنت ألعب فيه.
الباب األمامي رأيت أمامه امرأتين واقفتين و بينهمل فتاة
. توقفت و صغيرة في يدها رسالة تقرأها بكل جوارحها
رحت أصي إلى قرائتها الواضحى الهادئة, فأخذ صوتها
ي, فأشعر كما لو أن تياراً كهربائياً تغلغل ينساب في مسمع
في أنجاء جسمي. لقد انتابني شعور طاغ بالعطف و الود, و
راحت دقات قلبي تتسارع كلما أمعنت في القراءة.
فتاة رقيقة, سماء البشرة, عسلية العينين اللتين
, و شعر كستنائي ناعم يتدلى على يشع منهما نور الذكاء
ا ليصل إلى خصرها. كان الجمال كتفيها و يغطي ظهره
عنق غزال يطفخ من وجهها المرتفع فوق عنق ناعم يشبه
."لطيف
(MIGAL, 2013, p.53)
No romance em português, o personagem-narrador dá destaque à menina, enquanto
que a tradução árabe é mais descritiva, sem emoções, o que seria em português: "quando
cheguei vi duas mulheres com uma menina lendo uma carta" و لما وصلت إلى الباب األمامي رأيت
A descrição dos “olhos cor .أمامه امرأتين واقفتين و بينهمل فتاة صغيرة في يدها رسالة تقرأها بكل جوارحها
de mel” foi traduzida para o árabe literalmente, o que não faz sentido. A descrição da menina
em português é toda escrita no passado, enquanto o tempo presente é usado na tradução árabe.
A metáfora utilizada para comparar o pescoço da menina ao de “uma gazela ligeira” foi
traduzida para o árabe como " uma gazela gentil", o que não faz sentido. Como em outros
trechos, as frases em árabe mais são longas do que as frases em português.
Trecho 5 (VII. Nome):
“Acho que quem ler isto me acusará de
mentir ou exagerar.
Mas volto a jurar, por tudo que é mais
sagrado, que tudo se passou exatamente
dessa forma.
Três meses após nosso casamento, um
feriado depois do almoço, coloquei meu
travesseiro sobre a esteira no meio da casa e
recostei-me para fazer a sesta. O sono
venceu-me e dormi. Sonhei.
Vi um ancião venerável entrar em minha
casa. Sua idade, cerca de oitenta anos. Alto e
elegante, o rosto fulgurava como de um
jovem. Tinha uma barba alva como a neve do
Líbano. O aspecto era de um Santo. Chamou-
me pelo nome:
Yussef!
Que desejais, senhor?
Tua esposa está grávida e dará a luz a um
menino, ao qual chamarás Salim.
E depois de um breve silencio:
"أعتقد أن من يقرأ هذا سوف يتهمني بالكذب أو
المبالغة. لكني أعود و أقسم بكل ما هو مقدس أن كل هذا
حصل فعالً و بهذا الشكل بالضبط: بعد ثالثة أشهر على
زفافنا, و في يوم عطلة و بعد تناول الغداء, وضعت
وسادتي على حصيرة في وسط البيت و استلقيت عليها
غلب علي النوم و غفوت. و رأيت في الحلم ألستريح قليالً, فت
رجالً عجوزاً تظهر عليه مالمح الوقار يدخل منزلي. كان
طويل القامة و أنيقاً, كأنه في الثمانين من عمره لكنه متوهج
الوجه كأنه فتى في عز الشباب, مع أن لحيته بيضاء كثلج
باسمي قائالً: نادنيلبنان, فبدا لي كقديس,
يوسف!
ب يا سيدي؟ماذا ترغ
باسم ستناديهزوجتك حامل و ستلد صبياً و
سليم! و بعد صمت طويل, عاود كالمه و قال:
الطفل سليم! سمال تنس,
و عندما هم بالخروج عاد و كرر األمر نفسه, و حينها
شعرت كأنني أستنشق رائحة بخور تعبق في الهواء. و
عندما استيقظت من النوم قصصت على زوجتي ذلك الحلم
فضحكت و قالت لي إنه مجرد حلم. و بعد يومين رويت
قصة الحلم لجاري اسكندر و أنا أقول له: ))دعنا ننتظر
32
Não te esqueças. Chama o menino de Salim.
E quando ia partir, voltou a lembrar-me.
Quando saiu, aspirei e senti como se o
perfume do incenso permeasse o ar.
Ao acordar contei o sonho a minha esposa,
que riu, dizendo-me que era apenas um
sonho.
Dias depois contei meu sonho ao meu
vizinho Iskandar e lhe disse:
Vamos aguardar para ver se se concretiza”
(MIGUEL, 2004, p. 50)
لنرى إذا كان ذلك سيتحقق فعالً!(("
(MIGAL, 2013, p.60)
Como em outros trechos, as frases em árabe são mais longas do que as frases em
português. Podemos ver que em português o verbo “contar” é utilizado duas vezes, enquanto
que na tradução árabe há sinônimos. Na frase “ao qual chamarás Salim”, em português é
usado o verbo ''chamar'' para dar nome a um bebê recém-nascido, enquanto em árabe há um
verbo específico para dizer isso, mas o tradutor traduziu o verbo ''chamar'' literalmente ستناديه
سم ,
Trecho 6 (IX. Partida):
“Para que país tem a intenção de viajar? –
inquiriu.
Para o México.
A entrada naquele país é muito difícil, para
quem tem qualquer problema de inflamação
na vista. Devo avisá-lo de que, em lá
chegando e sendo examinado por um médico
governamental, se o diagnóstico for alguma
doença ocular, principalmente inflamação,
sua entrada será impedida pelo governo, que
o deportará no mesmo navio em que fez a
travessia” (MIGUEL, 2004, p. 58).
السفر؟ الجواب: إلى تنوي"إلى أي بلد
المكسيك!
إن الدخول إلى ذلك البلد صعب جداً على أي شخص يعاني
مشكلة في عينيه. و يجب االعتراف كذلك أن من يتمكن في
الوصول إلى هناك ال بد من إعادة فحصه رسمياً على يد
طبيب حكومي, فإذا اكتشف الطبيب مرضاً في العينين يمنع
سفينة دخول المصاب إلى البالد و يأمر بعودته على ال
نفسها"
(MIGAL, 2013, p.69)
Na pergunta “Para que país tem a intenção de viajar?”, em árabe o tradutor usou um
verbo que significa em português “pretender” تنوي . O trecho “principalmente inflamação”
não é traduzido.
Na tradução árabe, uma passagem que não pertence ao diário de Yussef, e que está
no corpo da narrativa, é anexada a esse trecho do diário: ( الحقيقة أن الغاية من السفر الى المكسيك كانت
برازيل. تبحر السفينة للعبور الى الواليات المتحدة، و لكن بما أنه ال يمكن التصريح بذلك، كان البد من تغيير وجهة السفر باتجاه ال
o que corresponde à ,(.من بيروت في اتجاه االسكندرية بعد أن تتم مراسم الوداع التي سيقوم بها األهل و األصدقاء
seguinte passagem: “O destino nem era o México. Pelo México, chegar aos Estados Unidos.
Só que tal explicação nem podia ser dita. Solução: Brasil. O navio partia de Beirute. A
primeira parada em Alexandria. A despedida dos parentes e amigos é assim relatada”
(MIGUEL, 2004, p. 59). Essa passagem aparece entre o sexto e o sétimo trechos do diário de
Yussef. Na edição libanesa, esses dois trechos são apresentados em um único, já que tal
transição é inserida entre eles, como se fosse parte do diário.
Trecho 7 (IX. Partida):
“No outro dia, todos parentes e amigos já
tinham conhecimento data e horário de nossa
viagem. Reuniram-se para as despedidas.
Ah, que instante de majestade, aquele da
despedida! A pessoa dá adeus aos familiares,
parentes, amigos, vizinhos; às casas, aos
solos, às pedras, ao céu, à água, a tudo aquilo
a que se afeiçoou na mocidade. Nasceu,
cresceu, desabrochou, tendo sempre ante os
olhos a sua visão, sempre aspirando seu ar. É
uma hora portentosa e triste!
Mais de sessenta minutos levamos dizendo
adeus, os olhos mareados não podendo
conter as lágrimas, que rolavam livres pelas
faces, o coração batendo desalentado. Ao
entrarmos, os lenços brancos agitaram-se em
"آه كم هي مهيبة لحظة الوداع! عندما يقول
لبيوت, لألرض, االنسان وداعاً لعائلته, ألصدقائه, لجيرانه, ل
للحجارة, للسماء, للماء, و لكل من و ما شعر نحوه بحنان, و
لكل ما يربطه بطفولته و شبابه, حيث ولد و كبر و كان
دائماً يمتع عينيه بتلك المناظر,و نفسه بذلك النسيم. إنها
ساعة مذهلة من الحزن المهيب!
مضت ساعة وال كلمة تسمع إال و لها عالقة
ون زائغة دامعة, و القلوب حزينة تخفق بأسى. بالوداع. العي
و ما إن توجه أفراد العائلة نحو الباخرة حتى ارتفعت
المناديل البيض ملوحة بالوداع. فيرفع يوسف منديله و يلوح
! الوداع! هللا يكون معنا و يوفقنا الوداعبه و هو يردد: ))
لنجتمع معكم مرة أخرى((."
(MIGAL, 2013, p.69)
34
despedidas. Levantei o meu, bradando:
adeus, adeus, que Deus permita que
voltemos a nos reencontrar”.” (MIGUEL,
2004, p. 59).
As duas primeiras frases não são traduzidas para o árabe. Já a última frase, que faz
parte do diário de Yussef, em árabe é atribuída ao narrador, o que significaria em português:
"Yussef dizia: Adeus! Adeus! الوداع "
Trecho 8 (IX. Partida):
“Fixávamos as montanhas até que
desaparecessem de nossas vistas enevoadas
pelas lágrimas, produtos da amargura da
separação. O navio ia rápido e logo com a
graça de Deus estávamos entre céu e mar. Ao
chegar a noite, um marinheiro francês veio
até nós, falando também em árabe: - venham
jantar”.” (MIGUEL, 2004, p. 59 )
"لقد ثبتت أنظارنا محدقة بمنظر الجبال من خالل الدموع
التي غشت أعيننا, حتى اختفت عنا, فهيمنت علينا مرارة
الرحيل ع بالدنا. أبحرت بنا السفينة بسرعة, و بعناية هللا,
ما بين البحر و السماء. و مع هبوط الليل, تقدم منا بحار
ليدعونا ية فرنسي و تكلم معنا بالعربية إلى جانب الفرنس
"إلى العشاء
(MIGAL, 2013, p.70)
O convite do marinheiro francês é traduzido em discurso indireto (ele veio nos
convidar para jantar). ليدعونا إلى العشاء
Trecho 9 (X. Opção):
“Nossos papéis haviam ficado com o diretor
da companhia. Três dias após nossa chegada,
mandou chamar-me.
- Analisei sua documentação e verifiquei que
não está de acordo – disse-me. – Primeiro,
sua viagem era para o México e, agora, está
indo para o Brasil.
Relatei o que me acontecera com o médico
"كنا قد تركنا أوراقنا و مستنداتنا لدى مدير
أيام, فقال: ))لقد الشركة, الذي استدعاني بعد وصولنا بثالثة
دققت في المستندات ولم أجدها مراعية لألصول, فأنت أوالً
كنت توجهاً إلى المكسيك, و ها أنت ذاهب اآلن إلى
البرازيل((. عندها, أوضحت له ما جرى عند طبيب العيون
في طرابلس, و كيف حولت الرحلة من المكسيك إلى
ال: ))لقد البرازيل, بناء على اقتراح بعض األصدقاء. ق
أخطأوا في نصحك يا صديقي, و اآلن عليك أن تجدد
أوراقك هنا, و إال فلن تستطيع أن السفر((. أجبت: ))حسناً,
em Trípoli e como transferi a documentação,
por sugestão dele e dos funcionários.
- Meu amigo, eles cometeram um erro com
você. Aconselho-o a renovar seus
documentos aqui, sob pena de não poder
viajar.
- Muito bem, faça como achar mais
conveniente.
Iniciamos então as providências para os
novos documentos, que ficaram prontos em
dois dias. A companhia mandou-me a conta:
400 francos. E eu possuía 600, assim, só me
sobraram 200 francos.
Fiquei pensando no que iria fazer. De que
maneira chegaríamos ao país estranho, sem
conhecer o idioma e onde talvez não
conseguisse encontrar os parentes: ou, quem
sabe, não tivessem possibilidade de ajudar-
nos. Esta pequena importância seria
suficiente?
Disse-me minha esposa: - Não te preocupes,
vou mandar imediatamente um telegrama
para meu irmão, nos Estados Unidos,
contando-lhe o que aconteceu e ele nos
mandará o que puder.
- De maneira alguma. Deus nos ajudará.
- Não, vou escrever ao meu irmão. Vem
comigo até o diretor.
Fomos até lá e expusemos a situação. Ele nos
pediu o nome e o endereço da pessoa em
questão. Fornecemos-lhe: depois de 10 dias
chegava a resposta, acompanhada de 1.000
francos.
أفعل ما تراه مناسباً, لذلك عملنا على تجديد أوراقنا,
فأنجزت خالل يومين, و كانت الشركة قد طلبت مني أربع
(, 600(, و إذ كنت أملك ستمئة فرنك )400مئة فرنك )
(.200فبقي معي فقط مئتي فرنك )
بدأت أفكر في ما يجب فعله, كيف أتصرف
عندما أصل إلى البلد الجديد, و نحن ال نجيد اللغة و ال
نعرف مكاناً نقصده؟ هل سنلتقي بأقاربنا فوراً؟ و هل
سيقدرون على مساعدتنا؟ و هل المبلغ الضئيل المتبقي
رتي بقولها: ))ال سيكفينا بعض الوقت؟ قاطعت زوجتي حب
تقلق, سأرسل فوراً برقية إلى أخي في الواليات المتحدة,
أخبره فيها عن مصابنا, و أطلب منه مساعدة مالية((. رغم
رفضي األولي للفكرة, أصرت زوجتي, فدخلنا مكتب المدير
و وضعناه في جو ما حدث معنا, فما كان منه إال أن دون
... و بعد عشرة أيام, عنوان أخ زوجتي, و أرسل البرقية
(. 1000وصلنا الرد مرفقاً بأألف فرنك )
في هذه األثناء, أبلغتنا الشركة وصول السفينة, و أنه علينا
االستعداد للسفر في اليوم التالي. و في الساعة الخامسة من
, صعدنا إلى السفينة التي كانت 1927نيسان 30بعد ظهر
( مسافر من 2000ضخمة, وصل عدد ركابها إلى ألفي )
فأبحرت بنا إلى أميركا الجنوبية"جميع األجناس,
(MIGAL, 2013, p.73)
36
A companhia nos informou que o navio em
que partiríamos havia chegado. Deveríamos
estar prontos no dia seguinte.
Em 30 de abril de 1927, às 5 horas da tarde,
embarcamos. O navio moveu-se, zarpou. Era
enorme e o número de passageiros atingia
2.000, de todo tipo de pessoas. Direção:
América do Sul”.” (MIGUEL, 2004, p. 61).
Na tradução árabe, os diálogos são apresentados dentro de parênteses. A primeira
frase em português é escrita de forma passiva “Nossos papéis haviam ficado”, mas em árabe
está na forma ativa, o que significaria em português: “Deixamos nossos papéis e
documentos”. Yussef diz ao diretor que o destino foi mudado do México para o Brasil por
causa do que aconteceu com o médico em Trípoli, e com base na sugestão dos funcionários.
Em árabe, a sugestão é feita por alguns amigos. Yussef usa o verbo “fazer” no imperativo
"Faça", quando se dirige ao diretor. Em árabe este verbo é conjugado na primeira pessoa do
singular, "faço", no presente. Todos os números mencionados nesta parte são escritos em
palavras e em numerais na tradução árabe. Quando Tamina insiste em enviar uma carta ao
irmão, sua fala é transcrita: “- Não, vou escrever ao meu irmão. Vem comigo até o diretor.”
Em árabe, sua fala não é transcrita, é Yussef que indica: "Minha esposa insistiu". A última
frase é destacada, separada do texto: "Direção: América do Sul". Mas em árabe temos a frase:
"O navio navegou conosco para a América do Sul". فأبحرت بنا إلى أميركا الجنوبية"
Trecho 10 (XII. Temor):
“Soou a campainha para o almoço. Pensei em
minha esposa, com fome. Graças a deus ela
iria alimentar-se, consequentemente, ao bebe.
Sentamo-nos à mesa e, quando a refeição foi
servida, ela disse, enjoada:
- A comida do navio chegou aqui antes de
nós. Não consigo digerir isto. Macarrão,
macarrão, só macarrão.
- Mas tens que comer, por ti e por causa da
Esta parte não foi traduzida para o árabe.
nossa filhinha.
Ela tentou engolir um pouco e levantou-se da
mesa insatisfeita”.” (MIGUEL, 2004, p.80)
Esta parte não foi traduzida para o árabe.
Trecho 11 (XIII. Mascate):
“- De quem é filha a tua mulher?
- Então não sabes quem é ela e filha de
quem? Mas se tu és a causa da minha
felicidade. Tu foste quem interveio para que
eu tivesse essa companheira fiel, essa jóia
preciosa, esposa perfeita.
- Mas meu irmão, eu te deixei uma criança,
ainda. Como posso ser a causadora da tua
felicidade:
- Ouve, então! Lembras-te do teu
companheiro de viagem, quando vieste para
cá, o tempo que perderam em Marselha por
haverem sido enganados por um dos outros
companheiros?
- Sim, claro.
- Pois minha esposa é exatamente a filha do
teu companheiro”. (MIGUEL, 2004, p. 84)
Esta parte não foi traduzida para o árabe.
Esta parte não foi traduzida para o árabe.
Trecho 12 (XVI. Gringo):
“Minha casa ficava perto da igreja local, que
estava em construção. Dos habitantes da
cidade, se não todos, pelo menos 90% eram
"كان منزلي قرب الكنيسة التي كانت ما تزال قيد اإلنشاء. و
تسعون في المئة من السكان كانوا من التابعية األلمانية,
غالبيتهم ال تتكلم البرتغالية, و لكنها مطيعة طاعة عمياء
38
de origem alemã. Poucos deles falavam o
português. Era um povo devoto, sincero,
cheio de fé e de uma obediência cega ao
dirigente religioso”. (MIGUEL, 2004, p. 96)
لمرشدها الروحي"
(MIGAL, 2013, p.103)
“Era um povo devoto, sincero” não é traduzido para o árabe. Em português, diz-se
que poucos deles falam português, enquanto em árabe o tradutor usou outra maneira de dizer
isso, indicando que a maioria deles não fala essa língua.
Trecho 13 (XVIII. Biguaçu):
“Aluguei, então, uma casa na cidade, rua
principal, mudando meu comércio e minha
família para lá. Os negócios estavam ruins e
as despesas superavam os ganhos. Pensei em
viajar e vender no interior, para ajudar.
Arrumei minha mala, coloquei-a no dorso do
cavalo e saí pelo vasto mundo de Deus,
através do sertão. Saía na segunda-feira pela
manhã e retornava no sábado à noite,
vendendo o que me era possível. Passava o
domingo em casa e me preparava a próxima
viagem”. (MIGUEL, 2004, p. 112)
Esta parte não foi traduzida para o árabe.
Esta parte não foi traduzida para o árabe.
Trecho 14 (XXIX. Mortes):
“... senti um frio no corpo do menino e tive
certeza de que havia perigo. Tomei-lhe a mão
e constatei que estava gelada, e sem pulso.
Fui tomando de uma espécie de loucura e
"أحسست بقشعريرة برودة في جسم الصبي,
وكنت متأكداً أن هناك خطر على حياته. أمسكت بيده
حظت أنها كانت باردة و من غير نبض, و مسي نوع من فال
gritei:
- Por amor de Deus, doutor, o menino está
em perigo, talvez até mesmo morto!
O médico tomara o outro pulso e reconheceu
a verdade, passando a dar-lhe todo tipo de
substâncias reanimadores, injeções e
oxigênio. Mas não havia resultado algum e a
criança era somente um corpo imóvel. Perdi
a noção das coisas e comecei a golpear-me
no rosto, na cabeça, gritando e batendo nas
portas, correndo de um lado para o outro
como um louco, até que caí no chão.
[...] “Oh, Deus, que tragédia imensurável,
que dolorosa desgraça! Perdi meu filho, meu
amor e amor da família toda. Agora, meu
medo maior é o de perder minha esposa,
rainha do meu lar, seja pela morte ou pela
loucura”
[...] “Acompanharam-me, e um lá chegando,
vi minha esposa jogada ao lado do corpo do
menino, como se estivesse morta e as freiras
fazendo esforço para reanimá-la. Os irmãos
choravam lágrimas ardentes. Oh, hora
apavorante, dolorosa, pungente! Esqueci
minhas dores e penas. Senti-me perto de
minha esposa e, quando ela, voltando a si,
abriu os olhos, tinha a cabeça recostada em
meu ombro:
- Yussef, que fizeste à nossa criança, ao
nosso Samir, nosso filho querido? – gemeu
ela.
Só pude responder com soluços e lágrimas.
[...] ‟Um mês passado após nossa desgraça,
الجنون فصرخت: كرمى هلل, و حباً باهلل ساعدوني. الطفل
في خطر. إنه يموت, و قد يكون قد فارق الحياة!
أسرع الطبيب و أمسك بمعصم يد الطفل
األخرى, و أخذ يجس نبضه ثم اعترف بالواقع و بدأ بإعطاء
الحقن و األوكسجين. لكن كل الطفل كل المواد المنشطة و
ذلك لم يعط أي نتيجة و بقس الطفل جسماً هامداً بال حراك.
ثم فقدت األمور مسارها, و رحت ألطم وجهي, و رأسي, و
أصرخ, و أخبط على األبواب, و أركض من جانب إلى آخر
كالمجنون حتى سقطت على األرض.
ه "يا إلهي! يا لها من مأساة تفوق التقدير! ما هذ
المصيبة المؤلمة! لقد فقدت ولدي! فقدت حبيبي! و حبيب
أسرتي بأكملها! و الخوف األكبر اآلن أن أفقد زوجتي! ملكة
بيتي. وال أدري إذا كنت سأفقدها بالموت أو بالجنون"
"رافقوني إلى حيث جثمان ولدي حتى وصلت
أمامه, فوجدت زوجتي مرمية إلى جانب جثمان الطفل كما
ثة ميتة و بالقرب منها الراهبات اللواتي يبذلن ما لو كانت ج
في استطاعتهن إلنعاشها. و كان أشقاؤه يبكون و يذرفون
الدموع الحارة. يا لها من ساعة مروعة, و مؤلمة, و مؤثرة!
لقد أنستني تلك الساعة كل آالمي و كل ما تعرضت له من
معاناة. جلست بالقرب من زوجتي و وضعت رأسها على
و احتضنتها إلى أن استعادت وعيها, و فتحت عينيها, كتفي,
و أخذت باالنتعاش شيئاً فشيئاً, و راحت تستريح على كتفي,
و تسألني: ماذا فعلت بطفلنا يا يوسف؟ طفلنا سمير؟ ابننا
الحبيب؟ ثم راحت تتأوه و تئن. و هنا لم أستطع الجواب
على أسئلتها إال عبر التنهدات و الدموع, فقلت: و هل يمكن
ألي أب أن يتنبأ بما سيأتي؟"
بعد شهر من المصيبة التي حلت علينا أصيبت
تمينة بمرض الوهن العصبي, و لزمت السرير ألنها لم تعد
قادرة على الوقوف على رجليها أو ألن رجليها لم تعودا
قادرتين على حملها. و صار من الضروري كلما أرادت أن
تمشي أو تتحرك من مكان إلى آخر أن تدعو الطبيب الذي
40
ela adoeceu com debilidade nervosa.
Guardou o leito, pois não podia ficar em pé,
andar ou mesmo mexer-se. Chamamos o
médico, que era diretor do hospital. Ele
conhecera meu filho, que havia sido colega
do seu...”
(MIGUEL, 2004, p. 246-247)
هو مدير المستشفى. فهو يعرف ابني الذي هو صديق ابنه و
زميله في الدراسة."
(MIGAL, 2013, p.191)
No começo desta parte do diário, Yussef está conversando com o médico “- Por amor
de Deus, doutor, o menino está em perigo”. Enquanto na tradução árabe, o discurso de Yussef
era para as pessoas em geral, o que significaria em português: "Me ajudem, meu filho está
morrendo". Ele usa um adjetivo (“talvez até mesmo morto”). No entanto, em árabe, o
tradutor usou um verbo ("está morrendo"). Na tradução árabe para a pergunta da mãe "Yussef,
que fizeste à nossa criança, ao nosso Samir, nosso filho querido? – gemeu ela." o verbo
"fizeste" não é conjugado, então não sabemos se ela está se perguntando ou perguntando ao
marido. Em português, diz-se que ela “gemeu” essa pergunta. Mas em árabe, essa frase "–
gemeu ela" é traduzida como uma sequência da história: Tamina fez sua pergunta e depois
gemeu. Duas frases são acrescentadas na versão em árabe, que significam em português:
"Algum pai pode prever o que vai acontecer?" ; "Agora é necessário chamar o médico toda
vez que ela quiser se mover ou andar". Na tradução árabe, dizem que o filho do médico é
amigo e colega do filho de Yussef. mas em português está escrito que eram apenas colegas.
Trecho 15 (XXIX. Mortes):
“A compra de terreno para construção de
uma casa” [...]
“Um dia, estávamos deitados quando ela me
disse:
- Nunca moramos em uma casa que fosse
nossa. Todos esses anos pagamos aluguel.
Com isso, já ultrapassamos o valor de duas
ou três casas. Temos que conseguir um
"شراء أرض لبناء منزل
كنا في أحد األيام مستلقيين على السرير عندما
قالت لي تمينة: لن نسكن أبداً في منزل تعود ملكيته إلينا إذا
بقينا على هذه الحالة يا يوسف. فخالل كل هذه السنوات التي
مضت كنا ندفع ايجاراً , و ما دفعناه بدل اإليجارات تجاوز
ثمن منزليين أو ثالثة منازل. و لذلك فإن علينا أن نشتري
قطعة أرض و نقوم ببناء منزل عليها. أال ترى أن ذلك
terreno e construir. Não achas que seria
melhor para nós?
- Há muitos como nós, morando de aluguel.
O pensamento, contudo, cresceu em sua
mente e ela não esquecia o assunto, dizendo
sempre:
- Devemos construir uma casa para nós.
[...] - Então, querida, estás contente no novo
lar?
- Peço a Deus e espero que aqui moremos
com saúde e felicidade. Mas, como posso
estar completamente feliz depois da tragédia
que nos atingiu, levando nosso amado Samir.
Ah, se estivéssemos morando em uma
simples tapera, feita de palha, mas
tivéssemos conosco aquele anjo.
[...] - Deixem-me, pois vou ao encontro do
meu querido Samir. Não há esperanças nesta
vida.
[...] Pranteei-a e prantearei enquanto vivo for.
Não se afasta de minha memória ou de meu
coração, eu, órfão de seu amor, amor que
nutri desde a infância, neste meu coração que
jamais poderá pertencer a outra” (MIGUEL,
2004, p. 247).
سيكون أفضل لنا؟ أجبتها:
"إن هناك كثيراً من الناس يعيشون مثلنا و
يدفعون إيجاراً ".
مع ذلك أخذت الفكرة تنمو و تكبر في رأسها ولم
تنس أبداً هذا الموضوع و صارت تقول باستمرار:
"يجب علينا أن نبني منزالً يكون ملكاً لنا".
"هل أنت اآلن سعيدة في المنزل الجديد يا
عزيزتي؟"
أجابت: "أطلب من هللا أن نعيش هنا في صحة و
سعادة, ولكن كيف يمكن أن أكون سعيدة تماماً بعد المأساة
التي حلت بنا و قضت على ابننا الحبيب سمير؟ أواه لو كنا
نعيش في كوخ بسيط مصنوع من القش, و بقي يعيش معنا
ذلك المالك!"
"اسمحوا لي أن أذهب للقاء ولدي العزيز سمير,
فليس لي آمال في هذه الحياة بعده."
لقد حزنت عليها و سوف أعيش في حداد "
ما دمت حياً, و لن يبتعد طيفها عن ذاكرتي و قلبي. فأنا يتيم
حبها. الحب الذي غذيته و رعيته و حملته في قلبي و ال
يمكن أن يكون لغيرها أبداً."
(MIGAL, 2013, p.193)
Em português, a conversa entre Yussef e Tamina foi narrada em diálogo, com a
transcrição da fala das personagens (“- Nunca moramos em uma casa que fosse nossa. Todos
esses anos pagamos aluguel. Com isso, já ultrapassamos o valor de duas ou três casas. Temos
que conseguir um terreno e construir. Não achas que seria melhor para nós?” - Há muitos
como nós, morando de aluguel.”). No entanto, na tradução, algumas frases são apresentadas
como diálogos:.
42
"عزيزتي؟ يا الجديد المنزل في سعيدة اآلن أنت"هل
التي المأساة بعد تماماً سعيدة أكون أن يمكن كيف ولكن, سعادة و صحة في هنا نعيش أن هللا من: "أطلب أجابت
ذلك معنا يعيش بقي و, القش من مصنوع بسيط كوخ في نعيش كنا لو أواه سمير؟ الحبيب ابننا على قضت و بنا حلت
!"كالمال
Outras são apresentadas em discurso indireto:
بقينا إذا إلينا ملكيته تعود منزل في أبداً نسكن لن: تمينة لي قالت عندما السرير على مستلقيين األيام أحد في كنا
ثمن تجاوز تاإليجارا بدل دفعناه ما و, ايجاراً ندفع كنا مضت التي السنوات هذه كل فخالل. يوسف يا الحالة هذه على
أفضل سيكون ذلك أن ترى أال. عليها منزل ببناء نقوم و أرض قطعة نشتري أن علينا فإن لذلك و. منازل ثالثة أو منزليين
:أجبتها لنا؟
".إيجاراً يدفعون و مثلنا يعيشون الناس من كثيراً هناك"إن
4.3 Tradução em francês de trechos de Nur na escuridão: proposta e comentários
A tarefa de traduzir trechos de uma narrativa literária de uma língua estrangeira
(português) para outra língua estrangeira (francês) foi bastante complexa e exigente, e
corresponde, de modo mais específico, ao estudo de língua francesa que efetuei durante este
curso de graduação. Evidentemente, o estudo da tradução desses trechos para minha língua
materna, o árabe, me propiciou uma primeira reflexão aprofundada, que foi muito útil para eu
fazer minha proposta de tradução em francês. Abaixo, comento de maneira breve alguns dos
aspectos que me pareceram relevantes.
Trecho 1 (Capítulo II - Abrigo):
“Um homem abriu a porta, perguntou, em
árabe, o que desejava. Gostaria, por favor,
que me indique uma pousada onde possa
passar a noite, pois chegamos hoje de viagem
e não conhecemos a língua daqui – respondi-
lhe. De que parte você é e qual seu nome?
Sou de sua cidade e seu parente – respondi,
lhe dizendo meu nome. Ele então
efusivamente, abraçou-me, dizendo: seja
bem-vindo, entra, entra, está em sua casa.
Perdão, meu parente, mas não estou só.
Minha família está comigo. Onde estão?
"Un homme a ouvert la porte, il a demandé
en arabe ce qu'il voulait. Je voudrais que
vous me disiez une auberge où nous pouvons
passer la nuit s’il vous plaît, parce que nous
sommes arrivés aujourd'hui d’un voyage, et
nous ne connaissons pas la langue ici, a-t-il
répondu. De quelle partie êtes-vous et quel
est votre nom ? Je suis de ta ville et de ta
famille, dis-je en lui disant mon nom. Il m'a
embrassé alors avec effusion en disant :
bienvenue, entrez, entrez, faites comme chez
vous. Désolé, mon parent, mais je ne suis pas
Naquele carro. Ele chamou o motorista,
dizendo-lhe que trouxe-se o veículo até perto
da entrada. Minha esposa, meus filhos e meu
cunhado desceram e nosso parente pagou a
corrida. Entramos em sua casa, ele chamou
pela esposa e filhos para nos apresentar.
Também a família nos deu boas-vindas”
(MIGUEL, 2004, p. 29)
seul. Ma famille est avec moi. Où ils sont ?
Dans cette voiture-là. Il a appelé le
chauffeur, lui disant d'amener le véhicule à
l'entrée. Ma femme, mes fils et mon beau-
frère sont descendus et notre parent a payé la
course. Nous sommes entrés chez lui, il a
appelé sa femme et ses enfants à nous
présenter. Aussi la famille nous a accueillis"
Em português, "por favor" está no início da frase, mas em francês preferi colocar
essa expressão no final da frase: "s'il vous plaît". Para traduzir o advérbio "efusivamente",
encontrei a frase francesa "avec effusion". Traduzi a expressão "está em sua casa" por outra
expressão em francês "Faites comme chez vous", que dá o mesmo sentido, que permite que a
outra pessoa se sinta confortável como se estivesse em sua própria casa.
Trecho 2 (Capítulo IV. Conhecer):
“De manhã, meu parente quis saber mais
notícias da terra natal. Depois do desjejum,
convidou-me a ir com ele aos correios e
telégrafos, onde enviou um telegrama àSa
minha irmã. Pedi-lhe, então, que fosse
comigo até a Alfandega, para trazermos a
bagagem que eu havia deixando no depósito”
(MIGUEL, 2004, p.39)
"Dans la matinée, mon parent a voulu savoir
plus de nouvelles de la patrie. Après le
déjeuner, il m'a invité à l'accompagner à la
poste et au télégraphe, où il envoya un
télégramme à ma sœur. Je lui ai demandé
d'aller avec moi à Alfandega pour apporter
les bagages que j'avais laissés dans
l'entrepôt"
Eu traduzi a “terra natal" por "patrie". Para a expressão "ir com ele" escolhi o verbo
"accompagner".
Trecho 3 (Capítulo V. Gente)
“No terceiro dia, minha irmã veio ver-nos e
levar-nos para sua casa. Indescritível sua
"Le troisième jour, ma sœur est venue nous
voir et nous emmener chez elle. Sa joie de
44
alegria ao encontrar-nos. Beijava-me e à
minha esposa e às crianças. Sentava-se
alguns segundos, para voltar a levantar e
afogar-nos com seus beijos. Que irmã
afetuosa, sensível e amorosa! Arrumamos
nossas coisas, agradecemos tudo que haviam
feito por nós e nos despedimos, indo para
estação do trem, onde adquirimos os
bilhetes” (MIGUEL, 2004, p.41)
nous rencontrer est indescriptible. Elle nous
a embrassés, moi et aussi ma femme et
mes enfants. Elle restait assise quelques
secondes pour se relever et nous noyer avec
ses baisers. Quelle sœur affectueuse, sensible
et aimante! Nous avons emballé nos affaires,
nous les avons remerciés pour tout ce qu'ils
nous avaient fait et nous avons dit au revoir
à la gare, où nous avons acheté les billets "
Em português, Yussef diz que sua irmã beijou, a ele, sua esposa e filhos "Beijava-me
e à minha esposa e às crianças", ao traduzir para o francês, preferi "Il nous a embrassés, moi
et aussi ma femme et mes enfants" o que significa "ela nos beija". Na última parte deste
trecho, traduzi o verbo "nos despedimos" por "nous avons dit au revoir", o que significaria
literalmente "Nós dissemos adeus".
Trecho 4 (Capítulo VI. Amor):
“Larguei meus amigos e os folguedos e corri
para casa, que ficava bem próxima de onde
eu brincava. Quando me acercava da porta
da entrada vi, junto a ela, duas mulheres
paradas, uma de cada lado e, no meio, uma
menina pequena, a qual tinha nas mãos uma
carta que lia com toda correção. Estaquei e
fiquei ouvindo sua leitura escorreita, sua voz
suave e maviosa. Quando aquela voz soou
em meus ouvidos, senti como se uma
corrente elétrica percorresse todo meu corpo.
Acometeu-me um estremecimento e as
batidas do meu coração se aceleraram.
Quanto mais ela se aprofundava na leitura e
eu em ouvi-la, mais aumentava o ritmo das
"J'ai quitté mes amis et mes soirées et j'ai
couru chez moi, qui était très proche de
l'endroit où je jouais. En m’approchant de
la porte d’entrée, j’ai vu deux femmes debout
à côté d'elle, une de chaque côté, et au milieu
une petite fille qui avait une lettre à la main
qu'elle lisait à chaque correction. Je me suis
levé et j'ai écouté sa lecture, sa voix douce et
posée. Quand cette voix a sonné dans mes
oreilles, j'ai senti comme si un courant
électrique circulait dans mon corps. Cela
m'a donné un frisson et les battements de
mon cœur se sont accélérés. Plus elle
plongeait dans la lecture et je l'entendais,
plus mon rythme cardiaque augmentait. Une
minhas pulsações. Magra, cútis morena,
olhos cor de mel, nos quais resplandecia a
luz da inteligência. O cabelo castanho caía-
lhe pelos ombros, cobrindo-lhe as costas até
a cintura. A beleza fulgurava em seu rosto. O
pescoço assemelhava-se ao de uma gazela
ligeira” (MIGUEL, 2004, p. 45)
peau fine et brune, des yeux couleur de miel,
où brillait la lumière de l'intelligence. Ses
cheveux bruns tombaient sur ses épaules,
couvrant son dos jusqu'à la taille. La beauté
brillait sur son visage. Le cou ressemblait à
celui d'une gazelle légère"
Na expressão "próxima de onde" para se referir ao lugar onde ele costumava brincar,
eu usei “proche de l'endroit". Já para a expressão "Quando me acercava", utilizei outra forma
que é mais usada em francês "En m’approchant".
Trecho 5 (Capítulo VII. Nome):
“Acho que quem ler isto me acusará de
mentir ou exagerar. Mas volto a jurar, por
tudo que é mais sagrado, que tudo se passou
exatamente dessa forma. Três meses após
nosso casamento, um feriado depois do
almoço, coloquei meu travesseiro sobre a
esteira no meio da casa e recostei-me para
fazer a sesta. O sono venceu-me e dormi.
Sonhei. Vi um ancião venerável entrar em
minha casa. Sua idade, cerca de oitenta anos.
Alto e elegante, o rosto fulgurava como de
um jovem. Tinha uma barba alva como a
neve do Líbano. O aspecto era de um Santo.
Chamou-me pelo nome: Youssef! Que
desejais, senhor: Tua esposa está grávida e
dará a luz a um menino, ao qual chamarás
Salim. E depois de um breve silencio: Não te
esqueças. Chama o menino de Salim. E
quando ia partir, voltou a lembrar-me.
"Je pense que quiconque lire ceci m'accusera
de mentir ou d'exagérer. Mais je jure de
nouveau, pour tout ce qu'il y a de plus sacré,
que tout s'est passé exactement comme ça.
Trois mois après notre mariage, un férié
après le déjeuner, j'ai mis mon oreiller sur le
tapis au milieu de la maison et je me suis
couché pour faire une sieste. Le sommeil m'a
surmonté et j'ai dormi. J'ai rêvé. J'ai vu un
vieil homme vénérable entrer dans ma
maison. Son âge, environ quatre-vingts ans.
Grand et élégant, son visage brillait comme
celui d'un jeune homme. Il avait une barbe
blanche comme la neige du Liban.
L'apparence était d'un Saint. Il m'a appelé par
mon nom : Youssef! Que voulez-vous,
monsieur ? Votre femme est enceinte et
donnera naissance à un garçon que vous
appellerez Salim. Et après un bref silence :
46
Quando saiu, aspirei e senti como se o
perfume do incenso permeasse o ar. Ao
acordar contei o sonho a minha esposa, que
riu, dizendo-me que era apenas um sonho.
Dias depois contei meu sonho ao meu
vizinho Iskandar e lhe disse: Vamos aguardar
para ver se se concretiza” (MIGUEL, 2004,
p. 50)
N'oublie pas. Appelez le garçon de Salim. Et
quand il était sur le point de partir, il m'a
rappelé à nouveau. Quand il est parti, j'ai
aspiré et senti comme si le parfum de
l'encens imprégnait l'air. Au réveil, j'ai
raconté le rêve à ma femme, qui a ri, en me
disant que c'était juste un rêve. Quelques
jours plus tard, j'ai parlé de mon rêve à mon
voisin Iskandar et je lui ai dit: Attendons de
voir si ça va arriver"
Trecho 6 (Capítulo IX. Partida):
“Para que país tem a intenção de viajar? –
inquiriu. Para o México. A entrada naquele
país é muito difícil, para quem tem qualquer
problema de inflamação na vista. Devo
avisá-lo de que, em lá chegado e sendo
examinado por um médico governamental, se
o diagnóstico for alguma doença ocular,
principalmente inflamação, sua entrada será
impedida pelo governo, que o deportará no
mesmo navio em que fez a travessia”
(MIGUEL, 2004, p. 58)
"Dans quel pays comptez-vous voyager? Il a
demandé. Au Mexique. L'entrée dans ce pays
est très difficile, pour toute personne qui a un
problème Inflammation à l’œil. Je dois
l'avertir qu'en arrivant là- bas et en étant
examiné par un médecin du gouvernement, si
le diagnostic est une maladie oculaire,
surtout une inflammation, son entrée sera
entravée par le gouvernement, Dans le
même bateau sur lequel vous avez fait le
croisement"
Para "inflamação na vista" utilizei "inflammation à l’œil".
Trecho 7 (Capítulo IX. Partida):
“No outro dia, todos parentes e amigos já
tinham conhecimento data e horário de nossa
viagem. Reuniram-se para as despedidas. Ah,
que instante de majestade, aquele da
"L'autre jour, tous les parents et amis avaient
déjà connu la date et l'heure de notre voyage.
Ils se sont réunis pour des adieux. Ah, quel
moment de majesté, celui d'adieu ! La
despedida! A pessoa dá adeus aos familiares,
parentes, amigos, vizinhos; às casas, aos
solos, às pedras, ao céu, à água, a tudo aquilo
a que se afeiçoou na mocidade. Nasceu,
cresceu, desabrochou, tendo sempre ante os
olhos a sua visão, sempre aspirando seu ar. É
uma hora portentosa e triste! Mais de
sessenta minutos levamos dizendo adeus, os
olhos mareados não podendo conter as
lágrimas, que rolavam livres pelas faces, o
coração batendo desalentado. Ao entrarmos,
os lenços brancos agitaram-se em
despedidas. Levantei o meu, bradando:
“adeus, adeus, que Deus permita que
voltemos a nos reencontrar”.” (MIGUEL,
2004, p. 59)
personne dit au revoir aux parents, à la
famille, aux amis, aux voisins ; aux maisons,
aux solos, aux pierres, au ciel, à l'eau, à tout
ce qu'il a pris dans sa jeunesse. Il est né, a
grandi, s'est déplié, Ayant toujours devant ses
yeux sa vision, respirant toujours dans son
air. C'est une heure prodigieuse et triste !
Plus de soixante minutes s'étaient écoulées,
en disant au revoir, les yeux étourdis,
incapable de retenir les larmes qui roulaient
librement à travers les joues, le cœur battant
de désespoir. Comme nous sommes entrés,
les mouchoirs blancs ont agité au revoir. J'ai
élevé le mien en criant : "au revoir, au revoir,
que Dieu nous permette de nous revoir".
Para "Ah, que instante de majestade", eu havia colocado "Ah, quel moment de
majesté", e depois modifiquei para “majestueux. Como em francês é necessário utilizar o
pronome pessoal sujeito, traduzi"Nasceu" por "Il est né".
Trecho 8 (Capítulo IX. Partida):
“Fixávamos as montanhas até que
desaparecessem de nossas vistas enevoadas
pelas lágrimas, produtos da amargura da
separação. O navio ia rápido e logo com a
graça de Deus estávamos entre céu e mar. Ao
chegar a noite, um marinheiro francês veio
até nos, falando também em árabe: - venham
jantar”.” (MIGUEL, 2004, p. 59)
"Nous fixions les montagnes jusqu'à ce
qu'elles disparaissent de nos yeux, brouillées
par les larmes, un produit de l'amertume de la
séparation. Le bateau allait vite et bientôt
avec la grâce de Dieu nous étions entre le
ciel et la mer. Quand la nuit est venue, un
marin français est venu à nous, parlant aussi
en arabe: "Venez dîner"
48
Novamente, traduzi "vistas" por "yeux".
Trecho 9 (X. Opção):
“Nossos papéis haviam ficado com o diretor
da companhia. Três dias após nossa chegada,
mandou chamar-me. - Analisei sua
documentação e verifiquei que não está de
acordo – disse-me. – Primeiro, sua viagem
era para m México e, agora, está indo para o
Brasil. Relatei o que me acontecera com o
médico em Trípoli e como transferi a
documentação, por sugestão dele e dos
funcionários. - Meu amigo, eles cometeram
um erro com você. Aconselho-o a renovar
seus documentos aqui, sob pena de não poder
viajar. - Muito bem, faça como achar mais
conveniente. Iniciamos então as providencias
para os novos documentos, que ficaram
prontos em dois dias. A companhia mandou-
me a conta: 400 francos. E eu possuía 600,
assim, só me sobraram 200 francos. Fiquei
pensando no que iria fazer. De que maneira
chegaríamos ao país estranho, sem conhecer
o idioma e onde talvez não conseguisse
encontrar os parentes: Ou, quem sabe, não
tivessem possibilidade de ajudar-nos. Esta
pequena importância seria suficiente?
Disse-me minha esposa: - Não te preocupes,
vou mandar imediatamente um telegrama
para meu irmão, nos Estados Unidos,
contando-lhe o que aconteceu e ele nos
mandará o que puder. - De maneira alguma.
Deus nos ajudará. - Não, vou escrever ao
"Nos papiers étaient restés chez le directeur
de l'entreprise. Trois jours après notre
arrivée, il m'a cherché. "J'ai regardé votre
documentaire et j'ai trouvé que vous n'étiez
pas d'accord", a-t-il dit. "D'abord, votre
voyage était pour le Mexique, et maintenant
vous allez au Brésil. J'ai rapporté ce qui était
arrivé au docteur à Tripoli et comment j'ai
transféré la documentation à sa suggestion et
au personnel. "Mon ami, ils ont commis une
erreur avec vous. Je vous conseille de
renouveler vos documents ici, sinon vous ne
serez pas en mesure de voyager. "Très bien,
fais ce que tu veux." Nous avons ensuite
commencé les arrangements pour les
nouveaux documents, qui ont été achevés
dans les deux jours. La compagnie m'a
envoyé la facture : 400 francs. Et j'en avais
600, il ne me restait plus que 200 francs. Je
me demandais ce que j'allais faire. Comment
nous pourrions atteindre le pays étrange sans
connaître la langue et où il ne pourrait pas
trouver les parents: Ou, qui sait, ils ne
pourraient pas nous aider. Cette petite
importance suffisait ? Ma femme m’a dit :
"Ne vous inquiétez pas, je vais
immédiatement envoyer un télégramme à
mon frère aux Etats-Unis, lui disant ce qui
s'est passé, et il nous enverra ce qu'il peut."
"Pas du tout. Dieu nous aidera. "Non, je vais
meu irmão. Vem comigo até o diretor.
Fomos até lá e expusemos a situação. Ele nos
pediu o nome e o endereço da pessoa em
questão. Fornecemos-lhe: depois de 10 dias
chegava a resposta, acompanhada de 1.000
francos. A companhia nos informou que o
navio em que partiríamos havia chegado.
Deveríamos estar prontos no dia seguinte.
Em 30 de abril de 1927, às 5 horas da tarde,
embarcamos. O navio moveu-se, zarpou. Era
enorme e o número de passageiros atingia
2.000, de todo tipo de pessoas. Direção:
América do Sul”.” (MIGUEL, 2004, p.61)
écrire à mon frère. Viens avec moi au
directeur. Nous sommes allés là-bas et
exposé la situation. Il nous a demandé le nom
et l'adresse de la personne en question. Nous
vous fournirons : après 10 jours la réponse
arrivait, accompagnée de 1.000 francs. La
compagnie nous a informés que le bateau sur
lequel nous partions était arrivé. Nous
devrions être prêts le lendemain. Le 30 avril
1927, à cinq heures de l'après-midi, nous
avons embarqué. Le navire a déménagé, a
navigué loin. C'était énorme et le nombre de
passagers atteignait 2 000, de toutes sortes
de personnes. Direction: Amérique du Sud"
Para a expressão "mandou chamar-me", escolhi inicialmente "il m'a cherché", o que
seria: “ele me procurou”.
Trecho 10 (Capítulo XII. Temor):
“Soou a campainha para o almoço. Pensei em
minha esposa, com fome. Graças a deus ela
iria alimentar-se, consequentemente, ao bebe.
Sentamo-nos á mesa e, quando a refeição foi
servida, ela disse, enjoada: - A comida do
navio chegou aqui antes de nós. Não consigo
digerir isto. Macarrão, macarrão, só
macarrão. - Mas tens que comer, por ti e por
causa da nossa filhinha. Ela tentou engolir
um pouco e levantou-se da mesa
insatisfeita”. (MIGUEL, 2004, p.80)
"La sonnette a sonné pour le déjeuner. J'ai
pensé à ma femme, affamée. Dieu merci, elle
allait se nourrir, par conséquent, au bébé.
Nous nous sommes assis à la table, et quand
le repas a été servi elle a dit nauséeuse, "La
nourriture du bateau est venue ici avant nous.
Je ne peux pas digérer ça. Nouilles, nouilles,
seulement des nouilles. "Mais tu dois
manger, pour toi et pour notre petite fille."
Elle a essayé d'avaler un peu et s'est levée de
la table insatisfaite"
50
Em português, formamos o diminutivo através de um sufixo ("filhinha"), em francês,
usei o adjetivo "pequeno" para dar a mesma idéia, "petite fille".
Trecho 11 (Capítulo XIII. Mascate):
“- De quem é filha a tua mulher? - Então não
sabes quem é ela e filha de quem? Mas se tu
és a causa da minha felicidade. Tu foste
quem interveio para que eu tivesse essa
companheira fiel, essa jóia preciosa, esposa
perfeita. - Mas meu irmão, eu te deixei uma
criança, ainda. Como posso ser a causadora
da tua felicidade? - Ouve, então! Lembras-te
do teu companheiro de viagem, quando
vieste para cá, o tempo que perderam em
Marselha por haverem sido enganados por
um dos outros companheiros? - Sim, claro. -
Pois minha esposa é exatamente a filha do
teu companheiro”. (MIGUEL, 2004, p. 84)
"De qui est fille ta femme ?" "Alors tu ne sais
pas qui elle est, et dont la fille? Mais si tu es
le cousin de mon bonheur. Tu es celui qui est
intervenu pour que je puisse avoir cette fidèle
copine, ce précieux bijou, épouse parfaite.
"Mais mon frère, je t'ai laissé un enfant,
encore. Comment puis-je être la cause de
votre bonheur ? - Écoutez, alors ! Vous
souvenez-vous de votre compagnon de
voyage, lorsque vous êtes venu ici, du temps
que vous avez perdu à Marseille parce que
vous avez été trompé par l'un des autres
camarades ? - Oui, bien sûr. "donc, ma
femme est exactement la fille de votre
compagnon."
Em português o escritor usou um substantivo "haverem sido enganados" enquanto
em francês, achei mais adequado ser traduzido desta maneira usando um verbo "avez été
trompé".
Trecho 12 (Capítulo XVI. Gringo):
“Minha casa ficava perto da igreja local, que
estava em construção. Dos habitantes da
cidade, se não todos, pelo menos 90% eram
de origem alemã. Poucos deles falavam o
português. Era um povo devoto, sincero,
cheio de fé e de uma obediência cega ao
"Ma maison était près de l'église locale, qui
était en construction. Parmi les habitants de
la ville, sinon tous, au moins 90% étaient
d'origine allemande. Peu d'entre eux parlaient
portugais. C'était un peuple dévot, sincère,
plein de foi et d'obéissance aveugle au chef
dirigente religioso”. (MIGUEL, 2004, p. 96) religieux."
Trecho 13 (Capítulo XVIII. Biguaçu):
“Aluguei, então, uma casa na cidade, rua
principal, mudando meu comércio e minha
família para lá. Os negócios estavam ruins e
as despesas superavam os ganhos. Pensei em
viajar e vender no interior, para ajudar.
Arrumei minha mala, coloquei-a no dorso do
cavalo e saí pelo vasto mundo de Deus,
através do sertão. Saía na segunda-feira pela
manhã e retornava no sábado à noite,
vendendo o que me era possível. Passava o
domingo em casa e me preparava a próxima
viagem”. (MIGUEL, 2004, p. 112)
"J'ai alors loué une maison dans la ville, rue
principale, en changeant mon commerce et
ma famille là-bas. Les affaires étaient
mauvaises et les dépenses l'emportaient sur
les gains. J'ai pensé à voyager et vendre à
l'intérieur, pour aider. J'ai emballé mon sac,
je l'ai mis sur le dos du cheval, et je suis sorti
à travers le vaste monde de Dieu à travers le
désert. Je partais lundi matin et revenais
samedi soir, en vendant tout ce que je
pouvais. Je passerais le dimanche à la
maison et me préparerais pour le prochain
voyage."
Para traduzir "o que me era possível", acrescentei o pronome indefinido "tout ce que
je pouvais".
Trecho 14 (Capítulo XXIX. Mortes):
“Senti um frio no corpo do menino e tive
certeza de que havia perigo. Tomei-lhe a mão
e constatei que estava gelada, e sem pulso.
Fui tomado de uma espécie de loucura e
gritei: - Por amor de Deus, doutor, o menino
está em perigo, talvez até mesmo morto! O
médico tomara o outro pulso e reconheceu a
verdade, passando a dar-lhe todo tipo de
substancias reanimadores, injeções e
oxigênio. Mas não havia resultado algum e a
"J'ai senti un froid dans le corps du garçon et
j'étais sûr qu'il y avait du danger. Je lui ai pris
la main et j'ai trouvé qu’elle était froide, et
pas de pouls. J'ai pris une sorte de folie et j'ai
crié : «Pour l'amour de Dieu, docteur, le
garçon est en danger, peut-être même mort !
Le médecin a pris l'autre pouls et a reconnu
la vérité, lui donnant toutes sortes de
substances de réanimation, injections et
oxygène. Mais il n'y avait pas de résultat et
52
criança era somente um corpo imóvel. Perdi
a noção das coisas e comecei a golpear-me
no rosto, na cabeça, gritando e batendo nas
portas, correndo de um lado para o outro
como um louco, até que caí no chão. „Oh,
Deus, que tragédia imensurável, que dolorosa
desgraça! Perdi meu filho, meu amor e amor
da família toda. Agora, meu medo maior é o
de perder minha esposa, rainha do meu lar,
seja pela morte ou pela loucura”
Acompanharam-me, e um lá chegando, vi
minha esposa jogada ao lado do corpo do
menino, como se estivesse morta e as freiras
fazendo esforço para reanimá-la. Os irmãos
choravam lágrimas ardentes. Oh, hora
apavorante, dolorosa, pungente! Esqueci
minhas dores e penas. Senti-me perto de
minha esposa e, quando ela, voltando a si,
abriu os olhos, tinha a cabeça recostada em
meu ombro: - Yussef, que fizeste à nossa
criança, ao nosso Samir, nosso filho querido?
– gemeu ela. Só pude responder com soluços
e lágrimas. “Um mês passado após nossa
desgraça, ela adoeceu com debilidade
nervosa. Guardou o leito, pois não podia
ficar em pé, andar ou mesmo mexer-se.
Chamamos o médico, que era diretor do
hospital. Ele conhecera meu filho, que havia
sido colega do seu.”
(MIGUEL, 2004, p. 246)
l'enfant n'était qu'un corps immobile. J'ai
perdu la notion des choses et j'ai commencé à
me frapper au visage, la tête, en hurlant et en
frappant aux portes, courant comme un fou
jusqu'à ce que je suis tombé sur le sol. Oh !
Mon Dieu, quelle tragédie incommensurable,
quel malheur douloureux! J'ai perdu mon fils,
mon amour et mon amour pour toute la
famille. Maintenant, ma plus grande peur est
de perdre ma femme, la reine de ma maison,
soit par la mort soit par la folie. "" Ils m'ont
accompagné, et quelqu'un qui vient là a vu
ma femme couchée à côté du corps du
garçon, comme si elle était morte et les
religieuses faisant un effort pour la ranimer.
Les frères ont pleuré des larmes de feu. Oh,
heure horrifiant, douloureux, piquante ! J'ai
oublié mes douleurs et mes peines. Je me
sentais proche de ma femme, et quand elle a
repris ses esprits, elle ouvrit les yeux, la tête
appuyée sur mon épaule : «Youssef, qu'avez-
vous fait à notre enfant, à notre Samir, notre
fils bien-aimé? Elle gémit. Je ne pouvais
répondre qu'avec des sanglots et des larmes.
»Un mois après notre malheur, elle tomba
malade d'une faiblesse nerveuse. Il gardait le
lit, car il ne pouvait pas se tenir debout,
marcher ou même bouger. Nous avons
appelé le médecin, qui était le directeur de
l'hôpital. Il avait rencontré mon fils, qui avait
été un de ses collègues."
Trecho 15 (Capítulo XXIX. Mortes):
“A compra de terreno para construção de
uma casa.
Um dia, estávamos deitados quando ela me
disse: - Nunca moramos em uma casa que
fosse nossa. Todos esses anos pagamos
aluguel. Com isso, já ultrapassamos o valor
de duas ou três casas. Temos que conseguir
um terreno e construir. Não achas que seria
melhor para nós? - Há muitos como nós,
morando de aluguel. O pensamento, contudo,
cresceu em sua mente e ela não esquecia o
assunto, dizendo sempre: - Devemos
construir uma casa para nós. „- Então,
querida, estás contente no novo lar? - Peço a
Deus e espero que aqui moremos com saúde
e felicidade. Mas, como posso estar
completamente feliz depois da tragédia que
nos atingiu, levando nosso amado Samir. Ah,
se estivéssemos morando em uma simples
tapera, feita de palha, mas tivéssemos
conosco aquele anjo” “- Deixem-me, pois
vou ao encontro do meu querido Samir. Não
há esperanças nesta vida.” Pranteei-a e
prantearei enquanto vivo for. Não se afasta
de minha memória ou de meu coração, eu,
órfão de seu amor, amor que nutri desde a
infância, neste meu coração que jamais
poderá pertencer a outra” (MIGUEL, 2004,
p. 247)
Acheter un terrain pour construire une
maison.
Un jour, nous étions allongés quand elle m’a
dit : « Nous ne vivons jamais dans une
maison qui était la nôtre. Toutes ces années,
nous payons un loyer. Avec cela, nous avons
déjà dépassé la valeur de deux ou trois
maisons. Nous devons obtenir des terres et
construire. Ne pensez-vous pas que ce serait
mieux pour nous ? "Il y en a beaucoup
comme nous qui vivent à louer. La pensée,
cependant, a grandi dans son esprit et elle n'a
pas oublié le sujet, en disant toujours, "Nous
devons construire une maison pour nous-
mêmes. "Alors, ma chérie, es-tu heureuse
dans ta nouvelle maison ?" - Je prie à Dieu et
j'espère que nous vivrons ici avec santé et
bonheur. Mais comment puis-je être
complètement heureux après la tragédie qui
nous a frappés, en prenant notre bien-aimé
Samir. Ah, si nous logions dans une simple
grange, faite de paille, mais nous avions cet
ange avec nous. - Laissez-moi, car je vais
rencontrer mon cher Samir. Il n'y a aucun
espoir dans cette vie. » J'ai pleuré et je
pleurerai pendant que je vis. Ce n'est pas loin
de ma mémoire ou de mon cœur, moi,
orphelin de son amour, nourri depuis
l'enfance, dans ce cœur qui ne peut jamais
appartenir à une autre"
54
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este Trabalho de Conclusão de Curso foi resultado de muita aprendizagem, leitura e
pesquisa de artigos acadêmicos nas línguas francesa, portuguesa e árabe, durante seis meses.
Pude abordar na prática os conceitos de tradução, especificamente entre a língua portuguesa e
francesa e entre português e árabe. Tive a oportunidade de aprofundar meu conhecimento
sobre o Líbano e o processo de migração de libaneses, principalmente para o Brasil. Além
disso conheci um dos principais romances do renomado escritor líbano-catarinense Salim
Miguel, uma narrativa literária que se passa principalmente no estado de Santa Catarina, onde
moro desde que vim da Síria para o Brasil, há três anos.
Ainda que os migrantes libaneses e seus descendentes estejam inseridos nos mais
diversos campos profissionais no Brasil, como advogados, médicos, empresários e políticos e
sejam responsáveis por uma grande parte da vida econômica e política do país, poucos
brasileiros tem ciência da origem dessas pessoas. Um dos objetivos desse trabalho foi analisar
aspectos de traduções da obra de um desses migrantes libaneses, que fez muito pela literatura
catarinense e brasileira.
Outro objetivo foi estudar a única tradução do livro Nur na escuridão para o árabe - a
primeira e única tradução dessa obra - usando meu profundo conhecimento na minha língua
materna. Espero, portanto, que este trabalho de conclusão possa servir como referência para
futuros estudos da obra Nur na escuridão e sua tradução.
Além da introdução e das considerações finais, este trabalho foi dividido em três
partes. Iniciei com breve panorama da história da migração libanesa para o Brasil, o que me
levou a ler vários artigos acadêmicos sobre o assunto, a selecionar alguns deles, e a traduzir
trechos de artigo em árabe para o português. A seguir, apresentei de maneira sucinta as
grandes linhas do percurso do escritor Salim Miguel e do romance Nur na escuridão. Esse
romance me permitiu compreender melhor aspectos da história do Brasil, aspectos culturais e
históricos do Estado de Santa Catarina e da cidade de Florianópolis. Além disso, foi o
primeiro romance que li integralmente em língua portuguesa, que para mim é uma língua
estrangeira.
O estudo do paratexto e da paratradução foi particularmente instigante. Percebi o
papel fundamental desses elementos para a recepção da narrativa, e o efeito que têm no leitor.
Depois disso, analisei e comentei a tradução português-árabe de trechos do diário do
protagonista, que são intercalados ao relato do narrador do romance. Essa análise me fez
refletir sobre a importância de se conhecer as duas culturas, a de “partida” e a de “chegada”,
para efetuar uma tradução literária. Também constatei, na prática, os desafios da tradução
literária. Tanto os elementos da paratradução quanto as escolhas linguísticas feitas pelo
tradutor, fazem da edição libanesa uma narrativa que privilegia o aspecto histórico, enquanto
que a narrativa de Salim Miguel tem um alto grau de elaboração literária. Após analisar e
cotejar todos os quinze trechos, ficou evidente que as modificações mais frequentes são o
alongamento das frases, a transformação de diálogos diretos em diálogos indiretos e a
supressão de três dos quinze trechos do diário dessa personagem. Finalizei propondo uma
primeira versão da tradução desses quinze trechos da obra Nur na escuridão para o francês.
Efetuar a tradução de um texto literário em língua estrangeira (português) para outra língua
estrangeira (francês) foi uma tarefa muito desafiadora.
Como sequência deste trabalho, gostaria de revisar e refletir sobre minha tradução em
língua francesa, mas também contactar o tradutor da edição libanesa, para uma possível
entrevista, já que gostaria de aprofundar meus estudos sobre essa tradução árabe de Nur na
escuridão.
56
REFERÊNCIAS
Agência Senado. Comunidade libanesa no Brasil é maior que população do Líbano. 2010.
Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2010/04/22/comunidade-
libanesa-no-brasil-e-maior-que-populacao-do-libano>. Acesso em: 15 jun. 2018.
ARAUJO, Rodrigo da Costa. De Textos e de Paratextos. Niterói: Palimpsesto, 2010.
BAUDOIN, Jean-Michel. Genres de texte et activité: le cas de l'autobiographie. 26. ed.
Genève: Clf, 2004. Disponível em: <http://clf.unige.ch/numeros/26/>. Acesso em: 22 maio
2018.
BIOGRAFIA: Youssef H. Mousmar. Youssef H. Mousmar. Disponível em:
<http://arabeportugues.com.br/biografia/>. Acesso em: 12 jul. 2018.
CANAL MONDE. Carte géographique et touristique du Liban. Disponível em:
<http://www.canalmonde.fr/r-annuaire-tourisme/monde/guides/cartes.php?p=lb>. Acesso em:
17 jun. 2018.DANIEL, Isaura. Livro aborda viagens de Dom Pedro II ao mundo
árabe. 2015. Disponível em: <https://anba.com.br/livro-aborda-viagens-de-dom-pedro-ii-ao-
mundo-arabe/>. Acesso em: 15 jun. 2018.
DANIEL, Isaura. Mais tradução de livros brasileiros no exterior. Disponível em:
<https://www.sinditamaraty.org.br/comunicacao/noticias/72-brasil/informacoes-uteis/1275-
mais-traducao-de-livros-brasileiros-no-exterior>. Acesso em: 29 jun. 2018.
DANIEL, Isaura. Salim Miguel publica livro no Líbano. 2013. Disponível em:
<https://anba.com.br/salim-miguel-publica-livro-no-libano/>. Acesso em: 29 jun. 2018.
DARDE, A. Autobiografia: Explorando o gênero e a relação do autor com o texto em que
escreve e se inscreve. In: Jornada UFRGS de Estudos Literários, 2, 2012. Porto Alegre.
Anais... Porto Alegre: Editora do Instituto de Letras, 2012. Disponível em:
<https://www.ufrgs.br/ppgletras/IIjornadaestlit/artigos/estrangeira/DARDEAugusto.pdf>.
Acesso em: 02 jul. 2018.
DYKE, Joe. How the Lebanese conquered Brazil: Success came through hard work and
perseverance. 2014. Executive Magazine. Disponível em: <http://www.executive-
magazine.com/business-finance/society/lebanese-conquered-brazil>. Acesso em: 10 maio
2018.
Embaixada do Líbano no Brasil. Turismo no Líbano. Disponível em:
<http://www.brasilia.mfa.gov.lb/brasilia/portuguese/tourism1>. Acesso em: 17 maio 2018.
GENETTE, Gérard. Paratextos Editoriais. São Paulo: Ateliê Editorial, 2009, 376 p.
GENETTE, Gérard. Palimpsestes. La littérature au second degré. Paris: Seuil. 1982.
GLOBAL, Editora. Salim Miguel. Disponível em:
<http://globaleditora.com.br/autores/biografia/?id=136>. Acesso em: 10 maio 2018.
GLOBO.COM. Comunidade libanesa no Brasil é quase o triplo da população do
Líbano. 2017. Disponível em: <https://glo.bo/2mubfli>. Acesso em: 25 jun.
2018.LAROUSSE. Encyclopédie: Liban : histoire. Disponível em:
<http://www.larousse.fr/encyclopedie/divers/Liban_histoire/187612>. Acesso em: 10 jun.
2018
LEJEUNE, Philippe. Definir autobiografía. In MOURÃO, Paula(org). Autobiografia. Auto-
Representação. Lisboa: Edições Colibri, 2003
MARSI, Federica. A street in Lebanon that is always Brazil: With more than 7 million
Lebanese Brazilians, thousands who left for Latin America in years past and their offspring
have come home. 2017. Middle East Eye. Disponível em: <http://www.middleeasteye.net/in-
depth/features/roots-brazilian-enclave-lebanon-240526445>. Acesso em: 10 maio 2018.
MELLO, A. M. L.. Memórias e traços identitários em ‘Nur na escuridão’. Revista Organon,
v. 29, p. 171-183, 2014.
MIGAL, Salim. Qura el Brasil: Thaban wa Iiaban. Beirute: Dar Elmacheq, 2013.
58
MIGUEL, Salim. Brésil, avril 1964: la dictature s’installe. Paris: L’Harmattan, 2007,
tradução francesa de Luciana Wrege Rassier e Jean-José Mesguen.
_____________. Primeiro de abril, narrativas da cadeia. Rio de Janeiro: José Olympio,
1994.
_____________. Nur na escuridão. 4. ed. Rio de Janeiro: Topbooks, 2004. 258 p.
MIGUEL, Antônio Carlos. Nur no Líbano. 2013. Disponível em:
<http://g1.globo.com/musica/antonio-carlos-miguel/platb/2013/03/02/nur-no-libano/>. Acesso
em: 29 jun. 2018.
MOELLER, Esther. Les écoles françaises au Liban 1909-1943 : lieux de la « mission
civilisatrice » ? Disponível em: <https://journals.openedition.org/dhfles/2130>. Acesso em:
15 jun. 2018.
PESSANHA, Elisângela Brito Martins. O papel da família no processo de integração dos
imigrantes libaneses: uma leitura de Nur na escuridão e Dois irmãos. Uniabeu, Belford Roxo,
v. 5, n. 10, p.17-35, maio 2012. Trimestral.
RASSIER, Luciana Wrege. Identidade e imigração em Nur na Escuridão. Revista Litteris,
Brasil, n. 8, set. 2011. Semestral. Disponível em: <
https://docs.wixstatic.com/ugd/3d3c16_25158e31ea754245a8d3d6331ecc73fb.pdf>. Acesso
em: 15 jun. 2018, s.p.
RASSIER, Luciana Wrege. Salim Miguel, escritor do mundo. Revista Litteris, Brasil, n. 8,
p.1-5, set. 2011, s.p.
_____________. Diálogos interamericanos: literaturas migrantes e memória em Abla Farhoud
e Salim Miguel. Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 50, n. 4, p. 416-423, out.-dez. 2015- A.
Disponível em:
<http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/fale/article/view/22657/13815>
Acesso em : 15 jun. 2018.
_____________. Migration, altérité et espace dans les œuvres d’Abla Farhoud et de Salim
Miguel. Interfaces Brasil/Canadá. Canoas, v. 15, n. 2, 2015-B, p. 146-166. Disponível em:
<https://periodicos.ufpel.edu.br/ojs2/index.php/interfaces/article/view/7283/5102> Acesso em
: 15 jun. 2018.
SILVA, Ana Cláudia de Oliveira da. Oriente/Ocidente: memórias da imigração no relato de
Salim Miguel. In: CONGRESSO INTERNACIONAL DA ABRALIC, 12., 2011,
Curitiba. Centro, Centros – Ética, Estética. Curitiba: Ufpr, 2011. p. 1 - 7. Disponível em:
<http://www.abralic.org.br/eventos/cong2011/AnaisOnline/resumos/TC0823-1.pdf>. Acesso
em: 10 maio 2018.
TAYYAR (Líbano). Tari5 el hijra el lubnanieh. A história da migração libanesa. 2016.
Disponível em: <https://www.tayyar.org/News/Lebanon/60417/مراحلها--اللبنانية-الهجرة-تاريخ-
.Acesso em: 17 maio 2018 .<األوائل-المهاجرين-ومعاناة-وأسبابها
TRUZZI, Oswaldo (Ed.). Patrícios Sírios e Libaneses em São PAulo. São Paulo: Editoa
Hucitec, 1997. 254 p.
TRUZZI, Oswaldo M.S., 1957- De mascates a doutores: sírios e libaneses em São Paulo/
Oswaldo M.S Truzzi. – São Paulo: Editora Sumaré: FAPESP; Brasília, DF: CNPq, 1991. –
(Série Imigração; v. 2)
TRUZZI, Oswaldo (Ed.). Patrícios Sírios e Libaneses em São Paulo. São Paulo: Editoa
Hucitec, 1997. 254 p.
WESTPHALEN, Flávia. Tradução. In: BERND, Zilá (org.) Dicionário das mobilidades
culturais: percursos americanos. Porto Alegre: Literalis Editora, 2010, p.333-354.
WIKIPEDIA. Verbete sobre o tradutor. يوسف المسمار. Disponível em:
<https://ar.wikipedia.org/wiki/%D9%8A%D9%88%D8%B3%D9%81_%D8%A7%D9%84%
D9%85%D8%B3%D9%85%D8%A7%D8%B1>. Acesso em: 29 jun. 2018.
60
WORLD CULTURE ENCYCLOPEDIA. Lebanon. Disponível em:
<http://www.everyculture.com/Ja-Ma/Lebanon.html>. Acesso em: 17 maio 2018.
YUSTE-FRÍAS, José. (2015) Paratraducción: la traducción de los márgenes, al margen de la
traducción. DELTA: Revista de Documentação de Estudos em Lingüística Teórica e
Aplicada, vol. 31,2015, p. 317-347. Disponível em:
<http://www.joseyustefrias.com/files/DELTA-2015_JYF_Paratraduccion(1) .pdf>. Acesso
em: 17 maio 2018.