tractebel energia ap043 2011
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Contribuições da Tractebel Energia S.A. à
Audiência Pública ANEEL 43/2011
Introdução
O presente documento visa apresentar a análise e as contribuições da Tractebel Energia S.A.
(“TBLE”) à Audiência Pública ANEEL no 43/2011 (“AP”), que propõe modificações à Resolução
ANEEL 129/2004 – procedimentos para reembolso do custo de combustíveis de
empreendimento que utilize carvão mineral nacional, por intermédio da Conta de
Desenvolvimento Energético (CDE).
A referida AP se respalda em premissas e teses desenvolvidas pela SRG/ANEEL na Nota Técnica
no 034/2011 (“NT”), cujo conteúdo será avaliado ao longo do presente documento sob os
seguintes enfoques:
1. Aspectos técnicos
2. Aspectos jurídico-regulatórios
3. Aspectos operativos e comerciais
4. Aspectos relativos ao mercado
Não obstante o apresentado no presente documento, a TBLE destaca que apoia
incondicionalmente as contribuições encaminhadas pela Associação Brasileira dos Produtores
Independentes de Energia Elétrica – APINE à referida AP.
1. Aspectos Técnicos
A análise técnica da TBLE à proposta ANEEL é explorada em detalhes no documento
apresentado no Anexo, que avalia a NT sob os seguintes aspectos:
Consistência dos dados apresentados pela NT, ou seja, verificação da fidelidade dos
dados do documento e da planilha base;
Contexto da eficiência térmica das plantas termelétricas a carvão nacional em
comparação com o praticado no mundo;
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Contexto do preço de comercialização do carvão nacional em comparação com dados
internacionais de custo e preço deste insumo;
Aspectos ambientais relevantes no tocante às usinas termelétricas a carvão nacional.
Ademais, é relevante registrar que a NT calcula a denominada “necessidade contratual de
venda da energia”, que na sua visão é o preço mínimo de venda da garantia física da usina,
suficiente para cobrir os custos operativos e investimentos. Nessa investida, a NT conclui,
equivocadamente, que as usinas beneficiárias da CDE podem comercializar a sua produção por
valores entre 50 a 250 R$/MWh.
Tal conclusão decorre do uso de premissas inconsistentes e do uso de um modelo de avaliação
econômica bastante simplificado, que não retrata com precisão o negócio da geração
termelétrica a carvão.
Tal “necessidade contratual” é obtida pela média histórica dos Preços de Liquidação das
Diferenças (PLDs) limitados ao Custo Variável Unitário (CVU) da usina, ou seja, não está
vinculado à recuperação dos custos e riscos associados ao processo de produção e
comercialização de energia. Além da representação simplista e equivocada da recuperação dos
custos, a metodologia de cálculo incorpora uma penalização no preço supracitado referente a
uma suposta “ineficiência” decorrente da média de desempenho destas usinas (não é
considerada a tecnologia das usinas e o ponto ótimo de operação das mesmas).
Mais detalhadamente, o modelo de cálculo utilizado necessita ser revisado em diversos
aspectos, os quais são detalhados na Secção 3 deste documento. Não obstante, cabe aqui
registrar que a referida NT não considera qualquer avaliação sobre o comportamento do
mercado; isto é, não se atém ao fato de que essas usinas podem ou não competir com as
demais fontes e assim assegurar a rentabilidade competitiva, conforme prevê a regulamentação
vigente.
Com base no acima exposto e no documento em anexo, o qual discorre em profundidade cada
um dos temas, podemos concluir que a NT baseou-se em diversas premissas equivocadas e, em
alguns casos, tendenciosas, inclusive rotulando negativamente o processo de produção de
energia elétrica baseado no carvão mineral nacional. Tal conjunto de premissas, da forma como
concebido, e sem considerar as particularidades locais de produção de energia elétrica a partir
do carvão mineral nacional, levam a conclusões equivocadas e, assim, a NT não pode servir de
base para propor alterações na regra de reembolso da CDE – as quais causarão prejuízos
imotivados e irreparáveis aos agentes.
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2. Aspectos Jurídico-Regulatórios
A CDE foi criada pela Lei no 10.438/2002 (artigo 13), com duração de 25 anos, visando o
desenvolvimento energético e a competitividade das fontes eólica, PCH, biomassa, gás natural e
carvão mineral nacional. A Lei foi regulamentada pelo Decreto no 4.541/2002 (artigos 28 a 44).
Segundo este arcabouço regulatório, as usinas movidas a carvão mineral nacional têm direito
ao reembolso de até 100% dos combustíveis primário e secundário. A legislação delegou a
ANEEL o poder de ajustar o nível de reembolso do gerador, respeitada a sua “rentabilidade
competitiva” e observada a obrigatoriedade de compra mínima de carvão estipulada nos
contratos de combustíveis vigentes em 2002.
A regulamentação vigente dispõe que a CDE deve reembolsar as despesas de combustíveis
relativas a qualquer ordem de despacho centralizado (seja por ordem de mérito ou
inflexibilidade), ou seja, o reembolso é feito às despesas de combustível comprado pelo agente
gerador.
A ANEEL, através da Resolução ANEEL no 129, de 20 de dezembro de 2004, decorrente da
Audiência Pública no 041/2004, regulamentou a legislação ajustando o percentual de reembolso
em 100%, válido a partir de 1º de janeiro de 2005. Conforme esta resolução, o desempenho
exigido para que o gerador obtenha reembolso pleno de seus custos de combustível é, a partir
de 1º de janeiro de 2006:
95,00% da programação de geração de referência do ano anterior e
97,50% da programação de geração de referência dos dois anos anteriores.
Decorrente destas condições, a TBLE fez a opção pela CDE para todas as usinas termelétricas a
carvão mineral e firmou contratos de compra de carvão com as empresas mineradoras, válidos
por 5 anos, estando o pagamento condicionado ao efetivo reembolso pela Eletrobrás dos
recursos da CDE. Os contratos contêm, adicionalmente, cláusula de eficácia pela qual podem
ser rescindidos caso o reembolso não seja integral.
A partir de então, a TBLE vem adotando ações efetivas para melhorias da disponibilidade e
eficiência das usinas para o SIN, adaptação às exigências ambientais e prolongamento da vida
útil, através de investimento total de R$ 325 milhões em seu parque termelétrico, sendo R$ 190
milhões apenas nos últimos 3 anos. Ressalte-se que tais investimentos foram efetuados tendo
em conta a manutenção das atuais condições de reembolso da CDE por um período compatível
para recuperação dos mesmos. Adicionalmente, não se pode esquecer que estas usinas foram
adquiridas em processo de privatização e demandaram investimentos vultosos que ainda não
foram amortizados.
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A premissa da “rentabilidade competitiva” estabelecida na legislação deve ser entendida como
“conseguir vender a energia da usina no mercado, recuperar todos os custos da usina, sejam
eles variáveis ou fixos, pagar tributos e remunerar os investimentos”.
A análise jurídica da TBLE à proposta da ANEEL se apoia em parecer jurídico contratado pela
APINE, o qual é apresentado pela associação nesta AP. Em síntese, este parecer explora a
natureza jurídica da CDE, como um subsídio para a manutenção e desenvolvimento da indústria
de carvão mineral e que para atingimento desse objetivo, necessita assegurar ao gerador a sua
rentabilidade competitiva. Também, no parecer, é avaliada a competência da ANEEL para: (i)
ajuste do percentual de reembolso na forma proposta e (ii) instituição de critérios de
eficientização aos empreendimentos termelétricos beneficiários da CDE.
Com base na análise jurídica apresentada no parecer, apresentamos a seguir as seguintes
considerações:
(i) a CDE foi inserida no projeto de lei de conversão da Medida Provisória nº 14/2001, visando
incentivar o desenvolvimento energético dos Estados e promover incentivos à produção de
energia elétrica a partir de carvão mineral nacional;
(ii) a CDE tem natureza de subsídio para a cobertura de até cem por cento do custo de
combustível de empreendimentos termelétricos que utilizem apenas essa fonte, em operação
em 6 de fevereiro de 1998;
(iii) o poder regulamentar da ANEEL quanto ao ajuste do percentual de reembolso da CDE ao
gerador está limitado a critérios que considerem a rentabilidade competitiva dos
empreendimentos enquadrados no art. 13, I, b, da Lei no 10.438/2002 e preservem o atual
nível de produção da indústria de carvão mineral nacional;
(iv) equipara, sem motivação e respaldo em lei, as usinas beneficiárias da CDE a termelétricas
“convencionais”, aniquilando, por via regulatória, estímulo previsto pelo legislador aos
empreendimentos termelétricos a carvão mineral;
(v) a ANEEL não apresenta qualquer motivação para a regra de transição proposta, trazendo
critérios de redução gradativa do reembolso da CDE que afrontam os standards legais e a
exigência de proporcionalidade e razoabilidade dos atos administrativos;
(vi) a alteração normativa de forma intempestiva e desproporcional afronta o princípio da
proteção da confiança;
(vii) não há previsão legal para que a ANEEL utilize a CDE para instituir mecanismos de
eficientização aos empreendimentos termelétricos que utilizem apenas carvão mineral nacional
em operação em 6 de fevereiro de 1998.
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Em suma, baseado no acima exposto, resta claro de que não há condições suficientes e
tampouco sólidas para que a proposta de Resolução Normativa seja aprovada, uma vez
que a mudança da regra de reembolso proposta extrapola os limites do poder regulamentar da
agência e cria, sem previsão legal, critérios de eficientização.
3. Aspectos Operacionais e Comerciais
Sob o ponto de vista operacional e comercial, a proposta apresentada pela ANEEL traz as
seguintes inovações:
(1) Estabelecimento de um mecanismo para “incentivo” à eficiência, por meio da redução
do percentual de reembolso para plantas consideradas ineficientes e
(2) Alteração da “regra comercial” do reembolso, com distinção da cobertura do custo de
combustíveis nos casos de despacho por ordem de mérito e por inflexibilidade.
Como mecanismo de “incentivo” à eficiência (na prática uma penalização à ineficiência), a NT
propõe que o percentual de reembolso seja reduzido, mesmo para usinas eficientes, aplicando-
se a seguinte regra:
I – 90% a partir de janeiro de 2012;
II – 80% a partir de janeiro de 2013;
III – 70% a partir de janeiro de 2014;
IV – a partir de janeiro de 2015, o reembolso (RCDE) será conforme a expressão a seguir:
Onde E é a energia gerada e CVUeficiente refere-se ao CVU da usina com 35% de eficiência
energética líquida, conforme os preços dos combustíveis principal e secundários e os custos
variáveis da central termelétrica. A eficiência energética líquida corresponderá à energia líquida
produzida pela quantidade energética dos combustíveis consumidos (primário e secundários),
conforme a seguir:
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Onde:
Eelétrica: energia líquida gerada [MWh]
Qcomb: quantidade do combustível consumido [m³ ou t]
PCI: poder calorífico inferior do combustível [MWh/m³ ou MWh/t]
i: combustível consumido (carvão mineral, óleo combustível, óleo diesel)
Em resumo, a proposta sugere a criação de um limitador de reembolso para os anos 2012,
2013 e 2014 (90%, 80% e 70%) para todas as usinas, independentemente de eficiência, e, a
partir de janeiro de 2015, cria um limitador de reembolso que é função de um CVU teórico
associado a uma planta eficiente. Ou seja, a partir de 2015, a central geradora a carvão
beneficiária da CDE se equipararia à condição de “competitividade” de uma usina termelétrica
qualquer.
Aqui cabe mencionar que, no que tange à aplicação de limitador de reembolso (fase de
transição) e à equiparação da Usina Termoelétrica (UTE) beneficiária da CDE a uma planta
qualquer, a proposta não se apoia em qualquer sustentação técnica ou econômica e, mais
importante, não leva em consideração a necessidade de assegurar a rentabilidade competitiva
das usinas. Na pretendida equiparação com outras usinas, esquece a NT de analisar as
assimetrias competitivas, visto que estas têm condições de competitividade favorecidas por
outros mecanismos (leilões específicos, VN diferenciados, contratos de self-dealing etc.) ou
subsídios (PPT, incentivos fiscais, condições de financiamento), que não se aplicam às UTEs a
carvão em discussão, conforme será detalhado mais a frente.
A “regra comercial” de reembolso proposta pela ANEEL para o regime permanente pode ser
sintetizada conforme segue:
Em caso de despacho por inflexibilidade (seja por razão de mínima compra de
carvão/gestão dos estoques, razão de segurança energética ou razão elétrica), a CDE
assumiria parte do custo de geração – aquele associado à diferença entre o PLD e o
CVU “eficiente” e
Em caso de despacho por mérito, todo o custo de geração da UTE (incluindo o custo
de combustíveis) seria assumido integralmente pelo agente gerador.
A figura a seguir ilustra as duas situações acima.
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Em síntese, em relação à regra atual, a usina passará a ter um acréscimo de custo igual ao PLD
quando é despachada por inflexibilidade e igual ao custo do combustível integral quando é
despachada por mérito.
Cabe ressaltar que, caso a UTE não fosse participante da CDE, o reembolso do custo de
geração associado à geração inflexível (restrições elétricas ou restrições de segurança
energética) seria integral, via ESS (Encargo de Serviços de Sistema), conforme segue:
Para melhor visualização dos impactos da proposta em discussão sobre o fluxo de caixa do
agente gerador, considere-se um ano típico, com predominância de PLD baixo no primeiro
semestre (período úmido) e PLD superior no segundo semestre, conforme apresentado nos
casos a seguir.
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No primeiro caso, visando otimizar os recursos da CDE (como é normalmente feito pelo
Operador Nacional do Sistema - ONS, por orientação da ANEEL), pressupõe-se despacho nulo
no primeiro semestre e despacho por mérito no segundo semestre. Contata-se que, muito
embora o gerador esteja obrigado a comprar a cota mínima de combustível o ano inteiro, não
obterá nenhum reembolso pela CDE o que geraria para o agente um custo (CVU integral no
segundo semestre e PLD no primeiro semestre), sem receita compatível. Além disto, o agente
terá grande impacto de caixa para honrar as compras de combustível por 6 meses, podendo
este ônus se prolongar caso não seja despachado no segundo semestre (vide o ocorrido no ano
2011).
No segundo caso, em que se pressupõe despacho “flat” o ano inteiro (em volume equivalente à
aquisição mensal de carvão), constata-se que o gerador seria reembolsado parcialmente apenas
no primeiro semestre. No entanto, tal despacho estaria contrário à lógica da otimização
energética, o que não incentivaria o melhor uso dos recursos da CDE.
Pode-se observar que as inovações propostas pela ANEEL alteram por completo a atual política
de reembolso, sem relação direta com as possibilidades de eficientização das plantas existentes.
O pretendido sinal econômico que induziria à modernização das centrais termelétricas, com
consequente redução do gasto total da CDE, não é alcançado pela proposta apresentada.
Pelo contrário, a restrição de cobertura dos custos associados ao consumo de combustíveis
afeta a rentabilidade competitiva dos geradores, pois ao se revogar os atuais incentivos
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proporcionados pela CDE e manter a compra mínima, estariam eles mesmos assumindo a
sustentabilidade da cadeia produtiva do carvão mineral nacional.
No limite, isto poderia levar à adoção de medidas extremas como a contratação de carvão
mineral importado (saída efetiva da CDE) ou até mesmo à desativação das usinas termelétricas,
o que comprometeria os níveis de produção da indústria do carvão e traria impactos sobre a
segurança do SIN.
No que se refere à segurança energética da região Sul, verifica-se que entre os anos de 2011 e
2015 existe um desequilíbrio crescente no balanço estático1 de energia (garantia física das
usinas subtraído da projeção de carga), ou seja, há um aumento da dependência energética
das usinas desta região e também do intercâmbio da região Sudeste. Tal análise evidencia a
relevância das termelétricas a carvão para a operação do sistema pelo ONS. Diversos fóruns
coordenados pelo ONS destacam que a região Sul mostra-se vulnerável em termos de
disponibilidade de oferta:
As conclusões do Plano Anual da Operação Energética 2011 (PEN 2011 vol 1)
destacam: “Com relação à Região Sul, devido a forte dependência de importação de
grandes blocos de energia de outras regiões do SIN, o que sempre envolve riscos
associados ao sistema de transmissão, as avaliações para situações de secas severas
nessa região, concomitantes com eventuais indisponibilidades prolongadas no sistema
elétrico de importação, poderão resultar em insuficiência de oferta local para o pleno
atendimento da carga”.
O PEN 2011 vol 2 menciona: “No subsistema Sul aproximadamente 12% das situações
em 2011 e 47% em 2012 requerem geração térmica superior às inflexibilidades. A
partir de 2013, a maioria das séries apresenta geração térmica superior às
inflexibilidades”.
Já o Plano Decenal 2020 (2011, versão preliminar) aponta que: “devido ao aumento de
carga, a dependência de importação da região Sul para o atendimento a ponta se
intensifica a partir de 2017 e, na pior situação analisada, 10,24% da sua demanda
depende de intercâmbio para ser atendida”.
Por fim, importa destacar que o Decreto 4.541/2002 estabelece, em seu artigo 34: “§ 3º A
despesa a ser considerada para fins de reembolso da CDE é aquela que decorre da otimização
do sistema interligado, observados os contratos de compra mínima de combustível”.
Sendo assim, como a despesa a ser considerada para fins de reembolso da CDE é aquela que
decorre da otimização do sistema interligado, todos os custos de combustíveis associados a
1 O Plano Anual da Operação Energética 2011 apresenta a composição detalhada do Balanço Estático
Regional da região Sul.
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qualquer motivo de despacho (excluindo exportação) devem ser reembolsados. Ou seja, não há
embasamento legal para mudança na regra comercial, que reduza ou mesmo torne nulo o
reembolso sob qualquer circunstância de despacho, quando este é feito visando a otimização
energética ou o atendimento dos contratos de compra mínima de combustível.
Importante também analisar a planilha produzida pela SRG para a determinação do preço
contratual necessário para as UTEs, que em última instância busca refletir a “rentabilidade
competitiva” da usina, que se baseia em cálculos demasiadamente simplificados e pautados em
premissas teóricas, fora da realidade de mercado:
num primeiro exame dos resultados destacados na NT, pode-se verificar que diversos
aspectos seriam passíveis de ajustes (ex.: pontos de referência como “barra da usina” e
“centro de gravidade”, os quais provavelmente criaram distorções na apreciação do
consumo interno, perdas e na própria interpretação do CVU, da geração e da energia
garantida que deveriam ser sempre referidos ao centro de gravidade);
as análises simplesmente desconsideraram os principais custos fixos associados à
operação e inversões de uma usina (pessoal, O&M fixo, capex de manutenção, conexão
e encargos setoriais, taxas e tributos, remuneração do capital investido, riscos, ...);
as simulações adotaram o período de 2003 a 2011, resultando em hipóteses que
superestimam o reembolso da CDE. Ou seja:
não considera a atualização monetária do PLD, tampouco as mudanças
regulatórias que o elevaram (PLD mínimo com base nos custos de Itaipu);
considera produção linearizada independente do PLD, aumentando a geração
em situações de baixo PLD (onde o reembolso é maior) e reduzindo a geração
em situações de alto PLD (onde o reembolso é menor);
não aloca de forma eficiente a produção nas unidades do Complexo Jorge
Lacerda adotou-se critérios de 40%, 36%, 17% e 7%, respectivamente, para
as unidades UTLC, UTLB, UTLA2 e UTLA1, enquanto os números que refletem
a realidade são da ordem de 60%, 22%, 12% e 7%, respectivamente;
inclui nos cálculos o período atípico pós-racionamento com elevada participação
hidrelétrica e PLD muito baixo.
destaca-se que comumente o ONS define a programação do despacho das usinas
termelétricas fora da faixa de melhor rendimento das unidades geradoras (em especial,
no atendimento às restrições elétricas, inflexibilidades e variações de carga) e assim, o
histórico do consumo específico (tanto do combustível primário quanto do secundário)
acaba não representando, em termos médios, o padrão de eficiência esperado;
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por trabalhar com valores médios de 2003 a 2011 e por não supor hipótese de
contratação da usina no mercado, distorce o impacto da compra de energia de
substituição quando a usina não é despachada ou quando é despachada abaixo da
garantia física;
os valores de referência e os parâmetros para a modernização estão fora da escala
atual das unidades de produção ou muito otimistas, invalidando as conclusões quanto à
expectativa de redução do CVU ou ganho de garantia física;
não considera qualquer avaliação sobre o comportamento do mercado atual e futuro,
adotando a falsa premissa de que as usinas possam trabalhar como “Merchant”;
adota metodologia de empilhamento de custos que não permite considerar
adequadamente cálculos de tributos, contratos de energia e substituição termelétrica.
Por conseguinte, os resultados apresentados pela NT não permitem sustentar as propostas
contidas na AP 43 para redução do reembolso. Adicionalmente, expõe os agentes proprietários
dessas UTEs, numa caracterização depreciada das usinas a carvão mineral nacional, terminando
pela afirmação de uma “necessidade contratual” ínfima – incompatível com a realidade do
mercado e da operação e inversões nas UTEs.
A NT apresenta uma informação denominada “necessidade contratual de venda da energia”,
que na sua visão é o preço mínimo de venda da garantia física da usina, suficiente para cobrir
seus custos operativos e investimentos. Entretanto, verifica-se que tal preço é obtido,
simplesmente, pela média histórica dos PLDs limitados ao CVU da usina, ou seja, não está
vinculado à recuperação dos custos e riscos associados à construção ou aquisição da usina e na
sua produção e comercialização de energia.
Além da representação simplista e equivocada da recuperação dos custos, a metodologia de
cálculo incorpora uma penalização no preço supracitado referente a uma suposta “ineficiência”
decorrente da média de desempenho destas usinas (não é observada a tecnologia das usinas e
o ponto de operação das mesmas, o qual é definido em função da otimização energética do
Sistema Interligado Nacional - SIN, definido pelo ONS). Também analisa alternativas de
repotencialização de usinas de pequeno porte, adotando parâmetros de usinas de grande porte,
sem qualquer razoabilidade técnica e econômica.
4. Aspectos Relativos ao Mercado
Sob o ponto de vista de mercado, convém analisar a competitividade no mercado de geração
de energia elétrica brasileiro. Neste contexto, percebe-se que o governo tem estabelecido
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condições especiais, incentivos e diversos subsídios para que determinadas fontes de energia
tornem-se competitivas, tanto em relação às usinas novas quanto para as existentes.
No caso das usinas novas, observam-se as seguintes condições especiais:
Obras de infraestrutura instaladas nas áreas geográficas compreendidas pela SUDAM
(Amazônia Legal) e pela SUDENE (Nordeste, parte do estado de Minas Gerais e parte do
estado do Espírito Santo):
– Caso optem pelo regime de Lucro Real, há redução da alíquota do Imposto de Renda
de 25% para 6,25% por um período de 10 anos.
– Depreciação acelerada dos bens, no próprio ano de aquisição (operação).
– Isenção do AFRMM (Adicional de Frete para Renovação da Marinha Mercante) no
transporte de equipamentos.
Usinas na Amazônia e projetos estruturantes com custos de investimentos em reforços na
rede de transmissão rateados entre todos os agentes consumidores e geradores.
Pequenas Usinas (eólicas, PCH, biomassa e óleo diesel até 30 MW):
– Desconto (50% ou 100%) na tarifa de uso do sistema de distribuição/transmissão,
além de acesso reservado ao mercado consumidor especial (demanda entre 500 kW e
3000 kW)
– Se o faturamento for inferior a R$ 48 milhões ao ano, o agente pode optar pelo regime
de Lucro Presumido, onde a carga de Imposto de Renda e Contribuição Social sobre o
Lucro Líquido (CSLL) cai de 34% do Lucro Tributável para 3,08% do Faturamento (o
que corresponde a um ganho de aproximadamente 24% do faturamento).
– PIS/COFINS no regime de incidência cumulativo, em que a alíquota cai de 9,25% para
3,65% do faturamento (sem crédito).
– As usinas eólicas têm isenção de IPI e ICMS para aquisição do conjunto turbina-
gerador.
Financiamento do BNDES:
– Volume máximo de captação é de 50% para termelétricas a carvão/óleo e 70% para
hidrelétricas.
– Remuneração básica do BNDES requerida para geração termelétrica a carvão/óleo é
1,8% a.a. enquanto que para as demais fontes é 0,9% a.a.
– Custo financeiro para as demais fontes é dado apenas pela TJLP (Taxa de Juros de
Longo Prazo), enquanto que para as termelétricas a carvão e óleo é dado pelo mix 50%
TJLP + 50% TJ462 (sendo que a TJ462 é a Taxa de Juros da Medida Provisória 462, ou
seja, TJLP + 1,0% a.a.).
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– Prazo máximo de amortização de 20 anos para hidrelétricas, 16 anos para eólicas e 14
anos para carvão. Para a usina hidrelétrica de Belo Monte foi concedido um prazo de
amortização especial de 30 anos.
Financiamento Eletrobrás, através da RGR. Linha de crédito com taxa subsidiada de 6,42%
para pequenas usinas, eletrificação rural, programas de combate ao desperdício e de uso
eficiente (Procel).
O REIDI (Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infraestrutura) propicia
alíquota zero para PIS/COFINS na aquisição e importação de máquinas e equipamentos,
materiais de construção e serviços utilizados ou incorporados nas obras destinadas ao ativo
imobilizado. É destinado a projetos de infraestrutura (energia e gás).
Acesso ao gás natural monopolizado e/ou verticalizado, sendo que o acesso ao combustível
dificultado aos demais geradores.
Os leilões de energia nova são segmentados por fonte, sendo que os contratos para as
hidrelétricas são na modalidade quantidade e com 30 anos de duração, enquanto que as
termelétricas possuem contratos de disponibilidade com 15 anos de duração.
O mecanismo de minimização de risco de despacho é diferenciado por fonte:
hidrelétricas/PCHs participam do MRE, enquanto que as termelétricas têm seus custos de
combustível (parcela flexível) repassados à distribuidora.
Ainda com relação às termelétricas novas, o contrato de disponibilidade prevê mecanismo
para a minimização de risco de câmbio e preços do combustível, com repasse para as
distribuidoras.
Assim, conclui-se pelo exposto que os projetos vencedores nos últimos leilões de energia nova
situam-se principalmente no Norte e Nordeste e foram alavancados por incentivos e/ou
subsídios significativos. Como resultado, houve a redução artificial do preço da energia no longo
prazo, associada à expansão, com impacto direto sobre o Valor de Valor Anual de Referência
(VR) - limite máximo de preço da energia existente e sobre o mix de preço das distribuidoras.
No caso de usinas existentes, têm-se:
Usinas termelétricas movidas a carvão mineral nacional têm o direito ao reembolso do
combustível pela CDE, observada a compra mínima de combustível, por não serem
competitivas em comparação à fonte hidrelétrica, da mesma forma que outras fontes
também não são.
Caso tenham optado, as usinas termelétricas movidas a gás natural têm direito ao gás do
Programa Prioritário de Termelétricas (PPT), a preços subsidiados e por longo prazo.
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Contratos de self-dealing assinados antes do Novo Modelo (2004) e com preços acima do
VN de uma fonte convencional hidrelétrica.
Conforme mencionado, a fonte termelétrica não é competitiva quando comparada à fonte
hidrelétrica, o que é agravado pela atual possibilidade de renovação das concessões de geração
que expiram a partir de 2014. Caso tal hipótese se confirme, definitivamente não há espaço
algum para que as UTEs a carvão mineral nacional subsistam, caso a regra de reembolso da
CDE seja alterada, conforme sugerido pela NT.
Acrescente-se que o espaço para a venda de energia das UTEs tem se tornado pequeno e as
perspectivas futuras tendem a ser ainda mais restritivas. Para competir no ACR, as UTEs
existentes deverão competir (via leilões A-1 ou de ajuste) com usinas hidrelétricas de baixo
custo e com teto de preço definido pelo governo (com viés de baixa, limitado pelo preço da
energia nova subsidiada e pelo preço do ACL). No último leilão A-1 para o período de entrega
de 2011 a 2013, o governo estabeleceu teto de preço de 105 R$/MWh. No último leilão de
ajuste para o ano de 2012, o preço médio foi da ordem de 73 R$/MWh, refletindo a expectativa
de PLD. Conclui-se, portanto, que tais níveis de preço inviabilizam as UTEs a carvão, não
propiciando receita suficiente para remunerar os custos fixos da usina, investimentos, encargos
e tributos e, ainda, arcar com o menor valor entre o PLD e o CVU - que não mais seriam
reembolsados pela CDE, se a resolução proposta prosperar. Estima-se que somente o PLD
médio para os próximos anos situe-se na faixa de 70 R$/MWh, enquanto o CVU da usina mais
barata da TBLE é da ordem de 123 R$/MWh.
No ACL a situação não é diferente. Esse mercado sofre grande influência da expectativa do
PLD, que por sua vez apresenta viés de baixa em função da atual situação de sobre-oferta no
Sistema Interligado Nacional (SIN). Ou seja, se a contratação da energia é feita com base no
PLD e tem-se que pagar o mínimo entre CVU e PLD, a contratação no mercado livre torna-se
ainda mais inviável.
A alternativa final seria manter a usina sem contrato, atuando como Merchant. Neste caso, sua
única fonte de receita seria o PLD (ou PLD + margem, se conseguir firmar contratos no curto
prazo), a qual seria insuficiente para pagar o menor valor entre o PLD e o CVU e ainda
remunerar todos os demais custos – especialmente porque uma UTE a carvão tem custos fixos
elevados, ao contrário de usinas a óleo e a gás ciclo simples.
No contexto de um mercado predominantemente hidrelétrico, as UTEs a carvão mineral não são
competitivas e, dessa forma, necessitam de condições especiais para se viabilizar. É justamente
por conta dessas características que a implantação de novos empreendimentos se apoia em um
vasto conjunto de instrumentos de mitigação de risco e concessão de subsídios. A situação não
é diferente para as usinas existentes, agravada pelas atuais condições de mercado com
perspectivas de preços baixos em função da possível renovação das concessões de geração.
15
Considerações Finais
A proposta da ANEEL para modificação da Resolução 129/2004 altera profundamente a atual
política de cobertura dos custos de combustíveis propiciada pela CDE. A restrição do reembolso
afeta o equilíbrio econômico dos geradores e inviabiliza a manutenção de seus ativos
termelétricos, podendo levar à adoção de medidas extremas como a contratação de carvão
mineral importado (saída efetiva da CDE) ou até mesmo à desativação das plantas, o que
impactaria a cadeia produtiva do carvão mineral nacional e a segurança eletro-energética do
SIN.
É importante registrar que regras podem e devem ser aperfeiçoadas sempre que necessário,
observando o interesse público e assegurando o equilíbrio aos agentes que tomam suas
decisões baseadas nas mesmas. A presente proposta em discussão não se trata de um
aperfeiçoamento e sim uma profunda alteração nas regras. Isto cria uma instabilidade
regulatória que abala profundamente a confiança dos agentes envolvidos, sobretudo no que
concerne à decisão de modernização de usinas e mesmo de investimentos em novas usinas. Em
resumo, o objetivo de estimular melhorias não se materializará. A alteração proposta se
assemelharia a retirar os benefícios dos projetos já desenvolvidos com base nos incentivos da
SUDAN, SUDENE, desconto nas tarifas de uso, entre outros.
Apesar da ANEEL ter se apoiado nos atributos de eficiência e atualidade, ressaltados na NT
como essenciais ao serviço adequado, estes devem estar sempre referidos às condições
específicas que nortearam a implantação de cada usina, às suas características de projeto e ao
ciclo de vida útil das instalações. Não parece razoável generalizar padrões de eficiência e
tampouco propor o término prematuro da operação de usinas, por conta de um natural e
contínuo avanço tecnológico.
Sendo assim, a TBLE propõe a manutenção da atual regra para o reembolso, uma vez que a
despesa a ser considerada para fins de reembolso da CDE é aquela que decorre da otimização
do sistema interligado (Decreto 4.541/2002, artigo 34). Como todas as razões de despacho
decorrem da otimização do sistema (decisão centralizada do ONS), não há amparo legal e
tampouco lógica em restringir o reembolso para situações de despacho específicas.
Adicionalmente, propõe-se que ANEEL, num contexto de política energética e ancorada nos
recursos da CDE, desenvolva ações integradas com o MME com o propósito de definir uma
Política Energética consistente para o uso carvão mineral nacional como insumo para a
produção de energia elétrica. Para a modernização, propõe-se a adoção de mecanismos de
incentivo baseado no inciso IV do art. 3º. da Lei que criou a CDE.
16
ANEXO I – Aspectos Técnicos
A. Motivações da NT034/2011-SRG/ANEEL
Na leitura do referido documento observa-se a preocupação da Agência com os seguintes
temas que foram os motivadores principais (drivers) da proposta de modificação da Resolução
Normativa 129/2004 atualmente em vigor:
em comparação com as usinas mais modernas do mundo e utilizando a melhor
tecnologia disponível, as usinas térmicas a carvão nacionais, participantes do
mecanismo da CDE, são “antiquadas” e “ineficientes”.
A referência adotada é a UTE Nordjylland, localizada na cidade de Aalborg, península da
Jutlândia, Dinamarca. Esta usina possui o título de “usina a carvão mais eficiente do mundo”,
com rendimento líquido de projeto de 47%. Compara-se a eficiência desta usina com a
“eficiência líquida operacional” das usinas a carvão nacional. O resumo contundente dessa
afirmação é explicitado através do gráfico 1, aqui reproduzido:
o preço do carvão mineral brasileiro, em especial o proveniente de minas subterrâneas,
é “muito caro” quando comparado aos preços “internacionais” de carvão mineral
A referência, neste caso, é o carvão produzido nos Estados Unidos, com base em dados do
relatório intitulado “Annual Coal Report 2009”, produzido pela EIA/USA que, na tabela 28,
17
apresenta o preço médio FOB dos carvões americanos produzidos em minas abertas e minas
subterrâneas. Também para ilustrar essa constatação, a Agência coloca o gráfico 2, a seguir
reproduzido:
o Meio Ambiente é muito agredido na mineração subterrânea e na baixa eficiência das
usinas a carvão, pelo aumento das emissões atmosféricas em comparação com usinas
eficientes
A NT034/2011 toma como base o fato da UTE Figueira (COPEL) estar com sua Licença
Ambiental vencida desde 2000, aguardando manifestação do IAP (órgão ambiental estadual do
Paraná, responsável pela fiscalização ambiental naquele estado).
Também o documento tece comentários negativos em relação ao processo de extração e
produção de carvão nas minas subterrâneas do estado de Santa Catarina, como pode ser
observado no parágrafo 25, reproduzido abaixo:
O que fica claro e explícito no documento é o objetivo de reduzir o valor do desembolso anual
com carvão mineral pela CDE, reduzindo os encargos associados a esse mecanismo de
subvenção. O documento cita o dispêndio de R$ 592 milhões em 2010 e a expectativa de que,
após a implementação das “medidas saneadoras” preconizadas na NT034/2011, haja redução
18
em R$ 278 milhões no desembolso da CDE, representando economia de 47% ao se tomar
como base o ano de 2010. Os argumentos anteriores são utilizados como justificativas para as
mudanças propostas visando atingir esse objetivo.
B. Da Análise dos Argumentos Apresentados na NT034/2011-SRG/ANEEL
Para abordagem adequadamente abrangente e didática dos pressupostos adotados pela
Agência faz-se necessário dividir a análise nos seguintes aspectos, avaliando:
a consistência dos dados apresentados pela NT (verificação da fidelidade dos dados do
documento e da planilha base utilizada na NT);
o contexto da eficiência térmica das plantas termelétricas a carvão nacional em comparação
com o praticado no mundo;
o contexto do preço de comercialização do carvão nacional em comparação com dados
internacionais de custo e preço deste insumo;
os aspectos ambientais relevantes no tocante às usinas termelétricas a carvão nacional.
Assim, tem-se:
B.1. Avaliação da consistência dos dados apresentados na NT034/2011-SRG
Em primeiro lugar, fez-se apanhado dos dados divulgados na planilha base que deu origem aos
gráficos e à análise numérica, tendo sido encontradas algumas inconsistências menores, como
segue:
a) Aba “Histórico-Eletrobras”
São apresentados dados de geração bruta, consumo de carvão e de combustíveis secundários
no período compreendido entre janeiro de 2006 e dezembro de 2010, derivando dados de
consumos específicos a partir da razão entre a geração bruta e o respectivo combustível
consumido.
Aqui, vale destacar: em usinas termelétricas a carvão mineral não faz sentido criar conceitos
como “consumo específico de Óleo Diesel” e “consumo específico de Óleo Combustível”,
atrelados à geração (MWh), dado que o consumo de combustível secundário não está associado
à geração e sim ao regime de partidas e paradas das unidades geradoras e à necessidade de
sustentação de chama em operações especiais (tais como variação na qualidade do carvão
mineral, sopragem com vapor da caldeira em baixa geração, etc...).
19
Vale lembrar que nossas UTE estão, usualmente, operando na sua geração mínima
(atendimento da inflexibilidade), o que aumenta a frequência de utilização de combustível
secundário para sustentação de chama (correção de instabilidades de combustão).
Os dados referentes às UTE da TBLE apresentam pequeno desacordo em alguns meses de
2006, onde a geração bruta e o consumo de carvão para exportação não foram segregados da
geração e do consumo para o SIN (com reembolso via CDE), havendo duplicação de dados de
geração e consumo em maio-junho/2009 e equívoco na informação referente ao consumo de
carvão no CTJL em out/2010. No entanto, verificou-se impacto irrelevante para o presente
estudo.
Cabe ressaltar que no mês de abril/2009 consta na planilha que Charqueadas consumiu
214.072 litros de óleo diesel. Nos nossos arquivos, que submetemos mensalmente à Eletrobrás,
nesse mesmo mês, temos registro de que consumimos o total de apenas 185 litros de óleo
diesel em Charqueadas.
b) Aba “Cota carvão”
Apenas a observar que foi adotado critério de rateio da cota anual por usina em Jorge Lacerda
que, aparentemente, não reflete nossa realidade. Foram usados os critérios de 40%, 36%, 17%
e 7%, respectivamente, para UTLC, UTLB, UTLA2 e UTLA1. Os números que entendemos mais
adequados são, na média: 60%, 22%, 12% e 7%, respectivamente.
c) Aba “Carvão geral”
Essa parte da planilha é a que apresenta elementos com maior imprecisão, tendo sido
fundamental para as conclusões da Agência.
Logo de início verifica-se que os dados da “usina de referência” (Nordjylland) estão equivocados
no tocante à data de entrada em operação comercial (1998 e não 2002) e à potência instalada
(411MW e não 535 MW).
Os consumos específicos foram obtidos dos dados históricos da ELETROBRAS (ver item “a”),
ressaltando-se que tanto o OD quanto o OC de Jorge Lacerda estão colocados apenas na
coluna da UTLA1.
Nas UTEs da TBLE os preços de carvão estão atualizados para valores válidos para o ano de
2011.
O preço do combustível da usina de Nordjylland esta declarado de forma errada, a Agência
adotou o preço médio do carvão norte-americano FOB, base 2009, assumindo PCI de 3.000
kcal/kg. Entretanto, na transformação para o consumo específico da “usina de referência” foi
utilizada conversão linear para PCI de 6.019 kcal/kg, ou seja: um carvão que já não retrata,
20
fielmente, o carvão utilizado por essa usina teve seu preço linearizado na relação de seu
conteúdo energético, fazendo com que o preço do carvão dessa usina atingisse os R$ 136,32/t.
Esta relação “preço x conteúdo energético” não é, necessariamente, linear (como veremos mais
adiante, nesse mesmo documento, na abordagem sobre os fatores que determinam preços
internacionais de carvão energético).
Quanto ao valor correto do custo desse combustível, entende-se que deveria ser adotado o
“preço do carvão posto na usina”, na Dinamarca, o qual, infelizmente, não se conhece. A título
de comparação, o carvão energético (steam coal) colocado nos portos de Amsterdã, Roterdã e
Antuérpia (CIF ARA), em junho deste ano, estava cotado entre R$ 212,00/t a R$ 221,00/t com
PCI de 6.000 kcal/kg (dólar a R$1,70).
O próprio preço médio FOB do carvão norte-americano que a NT utilizou nos seus cálculos está
equivocado na sua transformação para Reais. Considerando a conversão dólar/real em 1,70
(explicitado pela Agência na NT034/2011 - parágrafo 45), resulta em valores de R$ 12,48/MWh
para mina a céu aberto e R$ 29,96/MWh para mina subterrânea e não R$ 11,32/MWh e R$
27,17/MWh, respectivamente, como indicado no mesmo parágrafo 45.
No “custo operativo atual” temos outras inconsistências: a Agência utilizou o valor do CVU
declarado pelos Agentes ao ONS e, descontando a parcela equivalente ao consumo de carvão +
combustíveis líquidos, baseados na média de 5 anos, supôs que os valores residuais,
resultantes dessa subtração, seriam o “O&M atual” das usinas, esquecendo-se que o CVU
declarado ao ONS refere-se ao MWh líquido gerado no centro de gravidade do SIN e o consumo
específico de combustíveis adotado está relacionado a MWh bruto.
Portanto, não foi considerada a parcela referente ao consumo interno das usinas mais perdas
sistêmicas. Consequentemente, a parcela real do custo de “O&M atual” é efetivamente menor
do que o valor adotado pela Agência. Além disto, aparentemente a Agência não percebeu que
os custos de O&M derivados da análise acima são apenas os custos variáveis, ou seja, aqueles
diretamente atrelados à geração da usina.
Basicamente: custos variáveis de O&M de rotina (produtos químicos, fundidos de moagem,
produção de água, gases especiais, material de consumo etc...) e custos variáveis associados às
revisões programadas das unidades geradoras - o denominado “ciclo de revisões programadas”
que cada unidade geradora sofre ciclicamente, em intervalo médio de 8 a 9 anos, visando a
recomposição das suas condições operativas devido ao desgaste provocado pelo despacho da
planta (recuperação e/ou substituição dos equipamentos e componentes sujeitos à desgaste e
vida útil).
Também cabe fazer menção aos dados das emissões apresentados pela Agência onde, em
Jorge Lacerda, por exemplo, busca-se o maior valor de cada um dos parâmetros indicados no
relatório encaminhado à Agência, quando da fiscalização ocorrida em maio/2008.
21
O mais correto é se utilizar a média ponderada dos valores informados pelo Agente. O mesmo
se aplica à UTE Charqueadas, onde os dados de emissão, após a instalação do dessulfurizador e
dos filtros de manga não foram atualizados na planilha.
Nas linhas denominadas “Investimento” também se observa que a NT adotou o custo de Capex
de USD 1.810/KW instalado como referência para a modernização das usinas brasileiras.
Segundo a própria ANEEL, esse número foi obtido do resultado do Leilão A-5 da Usina de
Pecém, no Ceará, e informado pelo Proponente (no caso, MPX).
Exemplificando as diferenças: o número que dispomos para a UTE Seival (338MW), quando em
estudo pela TBLE, indicava Capex da ordem de USD 3.200/KW instalado, 80% acima do
indicado no documento de referência da ANEEL; já a UTE Oriental (600 MW), projetada para
ser instalada no Nordeste (Paraíba) tinha Capex previsto pela Promon Engenharia da ordem de
USD 2.237/KW instalado, utilizando carvão colombiano de boa qualidade e aproveitando os
mesmos incentivos fiscais do Nordeste.
Em resumo, o que muda no caso brasileiro está associado ao regime regional de incentivos
fiscais, às taxas de importação e impostos, sendo que a baixa qualidade do carvão brasileiro
(alto teor de cinzas e baixo conteúdo energético) impacta em maiores custos de equipamentos,
financiamentos, portuários, aduaneiros etc...
Daí, depreende-se que os outros dados derivados dos acima indicados contêm erros que se vão
se multiplicando na medida em que os números são cruzados entre si nas fórmulas adotadas na
NT.
B.2. Avaliação do contexto da eficiência térmica das plantas termelétricas a carvão
nacional em comparação com o praticado no mundo
A questão da eficiência térmica de uma usina termelétrica a combustível fóssil merece sucinta
análise conceitual antes de se analisar os dados da Agência.
A eficiência de um processo termodinâmico é determinada pela razão entre a quantidade de
energia útil entregue pelo sistema (energia útil) pela quantidade de energia total entregue ao
sistema (energia entrante). Ela pode ser expressa de diversas maneiras, a mais comum é a
percentual. Uso de unidades como kcal/KWh ou Btu/KWh também são muito utilizados para
medir eficiência de usinas termelétricas.
Além disso, quando se fala de usinas com combustíveis fósseis, a eficiência pode ser medida
em relação ao poder calorífico superior (PCS) ou poder calorífico inferior (PCI) do combustível
utilizado. Também pode ser referida à geração bruta ou geração líquida do processo. Assim,
pela combinação desses parâmetros, podemos ter quatro tipos principais de medição de
eficiência térmica de uma usina termelétrica. Os valores não são iguais, mas são equivalentes
22
quando efetuada a conversão correta. O que não se pode fazer é comparar diretamente, por
exemplo, uma eficiência bruta medida ao PCS com uma eficiência líquida medida ao PCI.
Para efeito dessa avaliação, estaremos, doravante, falando em termos de “eficiência líquida ao
PCI”, na barra da usina. Deste modo, as perdas sistêmicas da transmissão até o centro de
gravidade do SIN não estarão sendo consideradas.
Isso permite a comparação dos valores de eficiência das UTE nacionais a carvão com outras
usinas existentes no mundo. Outros conceitos a serem abordados são: a “eficiência de projeto”
e a “eficiência operacional”.
A primeira, também denominada “eficiência de placa”, é estática e basicamente mede a
eficiência de uma planta operando na sua melhor condição de desempenho. A eficiência de
projeto é afetada por uma série de fatores como a natureza e qualidade do combustível, tipo de
turbina, temperatura de operação, tipo de sistema de resfriamento do vapor, condições
climáticas etc...
A eficiência operacional, por sua vez, é definida tomando-se como base a eficiência média anual
da planta. Um importante fator que influencia a eficiência operacional é o regime operacional
da usina. Usinas que operam em regime de carga parcial ou em operação de ponta (fora da
base) apresentam queda acentuada da eficiência operacional.
Para reforçar os conceitos acima, tome-se o comportamento da eficiência operacional das
usinas do Complexo Jorge Lacerda onde, em momentos de geração elevada, apresentam um
consumo específico de carvão (t/MWh) inferior a quando operam com geração baixa.
Exemplificando, utilizamos a própria tabela de geração e consumo de carvão da planilha-base
da NT, no mês de maio/2007, o Complexo Jorge Lacerda gerou 171.138 MWh, com um
consumo específico de 0,66 t/MWh e com suas usinas operando nos seguintes regimes de fator
de capacidade – UTLA: 25%; UTLB 60% e UTLC 4%, ou seja, a UTLA operando com 2
unidades na mínima (25 MWmed+ 33 MWmed = 58 MWmed), a UTLB com 2 unidades na
mínima (2 x 80 MWmed) e a UTLC praticamente desligada o mês todo. Já no mês de
setembro/2010, o mesmo Complexo gerou 542.552 MWh, com um consumo específico de 0,61
t/MWh (uma redução de quase 8% no consumo específico em relação ao caso anterior), e com
suas usinas praticamente lotadas (UTLA:167 MWmed; UTLB: 248 MWmed; UTLC 343 MWmed).
A operação das usinas de Jorge Lacerda em geração baixa é muito comum quando o ONS as
despacha por razões puramente elétricas (controle de tensão).
O gráfico 3, a seguir, apresenta a eficiência líquida das usinas nacionais (conforme dados
informados na NT034/2011) em comparação com a eficiência líquida média das usinas a carvão
de alguns países reconhecidamente grandes consumidores de combustíveis fósseis e que dispõe
de uma grande frota de usinas termelétricas a carvão:
23
Eficiência Líquida Média de Usinas a Carvão
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
40%
45%
Dinam
arca
Holan
da
Áustri
a
Alem
anha
Irlan
da
Espan
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Franç
a
Portu
gal
Reino
Unido
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Eslov
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Países
Efi
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nc
ia líq
uid
a
Gráfico 3: Comparativo da eficiência líquida média de usinas a carvão no mundo
(fontes: DOE/NETL 2007 e Ecofys/Holanda 2008 – modificado para eficiência líquida).
O gráfico 4, a seguir, informa a respeito do comportamento da eficiência líquida operacional e
idade das plantas norte-americanas a carvão. Cada ponto azul ou vermelho representa uma
usina a carvão da frota americana:
Gráfico 4: Eficiência e idade das plantas norte-americanas a carvão (fonte DOE/NETL – 2007).
Pode-se observar que quase metade da frota de usinas a carvão americana foi colocada em
operação entre as décadas de 1950 e 1960, sendo que essas usinas foram responsáveis por
24
25% da geração de energia elétrica a carvão dos EUA em 2007 (lembrando-se que 49% da
geração total de energia nos EUA é produzida utilizando-se o carvão mineral como fonte
energética). Por outro lado, a dispersão em termos de eficiência líquida também é grande,
apresentando variações significativas e não tendo correlação direta entre idade e eficiência das
usinas.
Se a meta de 35% de eficiência líquida fosse aplicada às usinas americanas, como pretende a
ANEEL, pelo menos 80% da frota americana de usinas a carvão estaria fora dessa
especificação. Um detalhe importante: a usina mais eficiente apresentada no gráfico 5 data da
década de 1960, ratificando que não existe, necessariamente, vínculo direto entre idade e
eficiência térmica.
A tabela 1, a seguir, apresenta os mesmos dados norte-americanos de outra forma:
Tabela 1: Eficiência líquida e idade das usinas norte-americanas a carvão (Fonte: DOE/NETL –
2007).
Aqui, cabe observar o range de eficiências das usinas norte-americanas e a eficiência média de
suas plantas subcríticas em comparação com as que temos no Brasil e, ainda, o número de
unidades da frota norte-americana e a data da sua entrada em operação comercial.
25
A constatação é de que nossas plantas termelétricas, em modo geral, não estão muito aquém
das norte-americanas, nem européias, quer seja em idade e/ou eficiência térmica. No caso da
TBLE, a eficiência líquida média das 3 usinas em Jorge Lacerda está situada ao redor de 31,0%
contra 31,3% na média das plantas norte-americanas subcríticas.
Em termos da usina de Nordjylland, adotada como referência pela NT, com eficiência líquida de
47%, cabe citar que a mesma é uma unidade de co-geração, fornecendo calor e eletricidade e
sua eficiência elevada está muito atrelada à tecnologia adotada (ultra supercrítica - USC) – e às
características peculiares da sua água de resfriamento (muito frias, abaixo de 10º C). O carvão
utilizado por essa usina apresenta PCI de 6.000 kcal/kg e teor de cinzas de 12,6% (a.r. - as
received). O Anexo Ia do presente documento apresenta em detalhes os dados técnicos
principais da usina e cópia de folder da Vattenfall, atual proprietária da usina. Aliás,
interessante questionar o porquê da ANEEL também não utilizar para esse estudo outras usinas
de referência também citadas no documento “Fossil Fuel Power Generation: case studies of
recently constructed coal and gas-fired power plants”, mesma fonte bibliográfica onde foi
buscar o exemplo da usina de Nordjylland.
Por exemplo, cita-se a usina de Suratgarth, localizada em Rajasthan, na Índia. Esta usina foi
considerada referência nesse documento da EIA pelo fato de operar com carvão de elevado
teor de cinzas (teor típico de cinzas de 30% no carvão recebido). Trata-se de cinco unidades
geradoras de 227 MW cada, perfazendo um total de 1.135 MW de potência instalada, que
entraram em operação entre 1998 e 2002. Possuem caldeiras subcríticas, como as adotadas no
nosso país, e são também de carvão pulverizado. Foram projetadas para queimar carvões com
até 45% de cinzas. A eficiência líquida de projeto dessas unidades é de 37,1% e o PCI do
carvão utilizado situa-se entre 3.800 kcal/kg a 4.200 kcal/kg a.r., muito semelhante aos carvões
utilizados em Jorge Lacerda, entretanto com menor teor de cinzas (40% em Jorge Lacerda
contra 30% nessa usina).
Ou então, a usina de Majuba, situada próxima a Amersfoot, África do Sul, consistindo de três
unidades de 612 MW cada, com aero-condensadores e três unidades de 669 MW cada,
refrigeradas com torre úmida, totalizando 4.110 MW, também citada na mesma fonte como
usina de referência, para locais com clima semi-desértico e utilizando carvões com alto teor de
cinzas (ao redor de 30% a.r.). A eficiência líquida dessas plantas é de 35% (aero-
condensadores) e 37% (torre úmida). O PCI do carvão utilizado nessa usina situa-se entre
4.500 kcal/kg a 5.900 kcal/kg.
Estas são duas citações de usinas apresentadas pela Agência Internacional de Energia como
exemplos de usinas termelétricas que apresentam características tecnológicas, construtivas e
com qualidade de combustível mais próximo à nossa realidade. Os anexos Ib e Ic apresentam
os dados técnicos principais das mesmas.
26
Assim, a adoção da usina de Nordjylland como referência pela NT para ancorar sua tese
afigura-se inaceitável. A própria Agência Internacional de Energia (EIA) adotou diversos
modelos diferentes de usinas como referência, justamente em função da heterogeneidade do
escopo e porque não é possível comparar usinas com características técnicas e combustíveis tão
distintos.
Em resumo, apresentamos a tabela 2, a seguir, com dados de eficiência de nossas plantas e
dados de outras plantas no mundo:
Tabela 2: Comparação de eficiência operacional e de projeto de usinas mundiais (fontes: IEA
2007; Ecofys 2008; DOE/NETL 2007 e TBLE 2011).
Cinzas (as
received)
kcal/kg %
Nordylland 6.000 12,6 47,0% 47,0%
Candiota III 2.800 53,0 36,5% 36,5%
Jorge Lacerda C 3.916 40,0 35,8% 36,9%
Majuba 5.200 30,0 34,0% 36%*
Suratgarth 4.000 30,0 33,9% 37,1%
Média Europa nd nd 33,0% nd
Média EUA** nd nd 31,3% nd
Jorge Lacerda B 3.916 40,0 30,4% 31,4%
Jorge Lacerda A2 3.916 40,0 29,4% 36,1%
Jorge Lacerda A1 3.916 40,0 25,0% 30,6%
Charqueadas 2.533 50,0 20,5% 24,5%
observações:* - refere-se a média entre as unidades com aero-condensadores e torre úmida
** - refere-se somente as unidades norte-americanas subcríticas
Eficiência
Operacional
Eficiência de
projetoUsina
PCI
B.3. Avaliação do contexto do preço de comercialização do carvão nacional em
comparação com dados internacionais de custo e preço deste insumo
Da NT da ANEEL têm-se, nos parágrafos 44 e 45, os seguintes comentários:
27
A tese então adotada pela ANEEL baseia-se em duas premissas básicas:
o carvão mineral é uma “commodity” energética mundial;
sendo uma “commodity” energética, seu preço relativo é determinado, no tempo e no
espaço, pelo conteúdo energético intrínseco.
Para o bom entendimento destas afirmações, faz-se necessário abordar, mesmo que
superficialmente, alguns conceitos de teoria econômica, que estabelece que o preço de um
produto é definido pela relação entre procura e oferta. Se existem muitos compradores de um
determinado produto, o preço tende a subir, ocorrendo o contrário na via inversa. Outro
conceito importante neste caso é a elasticidade-preço da demanda, que mede o “apetite” dos
compradores em relação a variações no preço do produto ofertado que, no caso do carvão
energético é baixo no curto prazo. Um produto é considerado uma “commodity” exatamente
quando seu valor agregado não é percebido como relevante para o mercado e o que importa ao
comprador é o seu preço unitário, dado que as características do produto entre os concorrentes
são muito semelhantes. Sendo o mercado aberto, com muitos compradores e muitos
vendedores, caracteriza-se regime de livre concorrência. Se um determinado produtor aumenta
seu preço de uma unidade monetária, imediatamente outro, com preço mais baixo, assume a
posição vendedora.
No cenário internacional, o carvão energético é uma “commodity” que se caracteriza por
apresentar vários países produtores e um número razoável de países consumidores. Trata-se da
maior reserva fóssil energética mundial. Mesmo assim, não se pode dizer que o carvão
energético participa de um pleno mercado de livre concorrência. Do lado dos países produtores
têm-se quatro grandes exportadores – Austrália, Indonésia, África do Sul e Colômbia – que
dominam mais de 70% do comércio internacional de carvão energético (fonte:
28
www.worldcoal.com, 2008). Os Estados Unidos e o Canadá, juntos, têm uma participação
pouco expressiva no mercado mundial de carvão energético (3,6%), sendo mais atuante no
mercado de carvão metalúrgico. Apesar de ser, hoje, o segundo maior produtor de carvão do
mundo (EUA) é considerado um “vendedor de oportunidade” no mercado internacional de
carvão energético. Do lado dos principais consumidores estão Japão (20%), Coréia do Sul
(12%), países do Bloco Europeu (22%) e, ultimamente, a China e Índia, que juntos
representam mais de 60% do mercado consumidor de carvão energético. A China é caso à
parte, pois, além de grande importadora do produto, é, atualmente, o maior produtor de carvão
mineral do mundo.
Ora, nesse mercado, é o apetite de consumo dos principais compradores que, em suma, define
preços de comercialização. Se o Japão aumentar em alguns pontos percentuais suas compras
neste mercado, ter-se-á, automaticamente, aumento significativo de preços, por exemplo, na
Europa (e vice-versa: dados de 2004 indicam que, naquela oportunidade, o tamanho do
mercado japonês era o dobro do mercado europeu participante do mercado internacional).
Basta a ocorrência de uma enchente na região produtora de carvão da Austrália, por exemplo,
como ocorreu recentemente, que participa sozinha com ¼ do mercado internacional de carvão,
para termos volatilidade importante nos preços dessa “commodity”.
Em resumo, o que se quer demonstrar, em contraposição à tese da NT, é que não tem
qualquer sentido comparar, no caso do carvão energético, as realidades do mercado
internacional (que tem sua dinâmica de preços associada à relação de produção/consumo entre
alguns poucos países produtores e consumidores) com o mercado brasileiro (regional e local,
onde existem limitadas opções e alternativas do lado da oferta e, menos ainda, do lado da
demanda). Esse mercado é único, praticamente indivisível na sua associação mina-usina,
estando o preço final do produto intimamente relacionado às características da jazida em
explotação, à qualidade da matéria-prima e à qualidade requerida para o produto final.
O gráfico 6, adiante, ilustra quanto ao comportamento dos preços do carvão no mercado
internacional no período recente (2002/2010). Análise meramente visual já incita
questionamentos como: Qual a necessidade e o interesse de se vir a entrar nesse “mercado
internacional”?; Qual a volatilidade de preços a que estaremos sujeitos?; Qual seria a relação
dessa volatilidade com a evolução dos preços no mercado interno?; Qual serão os reflexos do
acidente nuclear de Fukushima nos preços internacionais do carvão energético?.
29
Gráfico 6: Evolução dos preços carvão FOB Richards Bay, África do Sul, 2002-2010 (fonte:
Bloomberg).
Mesmo no caso norte-americano, que foi adotado pela NT como exemplo de “mercado
internacional” (o que não necessariamente é), vamos observar, no seguimento desse
documento, que a variabilidade de preços é significativa e leva em conta diversos outros fatores
não menos importantes que os que foram até aqui elencados.
A NT relativizou, para baixo (parágrafos 44 e 45), o fato de que num mercado restrito e
regionalizado, como o nacional, o preço de comercialização de um determinado tipo de carvão
está intimamente associado ao custo da sua disponibilização no ponto de consumo. Além do
custo de transporte, é o processo de mineração e beneficiamento do carvão que vai balizar seu
preço de mercado. Quanto mais fácil a lavra, mais barato tende a ser o produto, acontecendo o
mesmo com relação ao beneficiamento. Quanto menos operações de movimentação, menos
custos serão agregados. Tudo isso será determinante no estabelecimento do preço final ao
consumidor, assumindo relevância os aspectos geológicos, geográficos, tecnológicos,
mercadológicos etc...
Comparar, pura e simplesmente, preços médios dos carvões norte-americanos (país que detém
as maiores reservas de carvão mineral conhecidas do mundo) com os preços dos carvões
nacionais não se afigura razoável. Em 2009, os Estados Unidos produziram nada mais nada
menos do que cerca de um bilhão de toneladas enquanto que cerca de 5 milhões de toneladas
foram produzidas em minas brasileiras naquele mesmo ano.
Ainda, é interessante registrar algumas outras ilustrações, como segue.
30
Na tabela 28 do relatório “Annual Coal Report 2009”, fonte utilizada pela Agência ao buscar
dados dos “preços médios dos carvões internacionais”, temos:
Ao ser elaborada a NT, não se tomou o cuidado de observar que esses são preços FOB mina,
não representando o preço efetivamente pago pelos geradores norte-americanos pelo carvão
mineral nos EUA.
Na tabela 34 do mesmo relatório, que reproduzimos parcialmente por questões didáticas, temos
a informação mais importante, de quanto o gerador efetivamente paga pelo carvão CIF/CIP
usina:
31
Verifica-se que o preço médio, expresso em “short tons”, passa de USD 33,24/st para USD
44,47/st, ou seja: aumento de 34% do preço FOB para o preço CIF/CIP. Se analisada mais
cuidadosamente, esta tabela revela que em determinados estados americanos, o preço médio
do carvão mineral pago pelos geradores chega a atingir a marca de USD 207,98/st (Nova
Jersey). Assim, a variabilidade de preços é muito grande, indicando que a composição do preço
32
do carvão mineral deve levar em conta diversos outros fatores, tais como impostos, frete,
qualidade do produto, tipo de beneficiamento exigido, etc...
Outro fator preponderante é a espessura da camada minerável e a profundidade em que esse
carvão se encontra da superfície. Conforme a publicação “Geologia, Tectônica e Recursos
Minerais do Brasil - L. A. Bizzi, C. Schobbenhaus, R. M. Vidotti e J. H. Gonçalves (eds.) CPRM,
Brasília, 2003”, a maior jazida brasileira está assim caracterizada:
No mesmo documento, os autores dão conta de que a camada de terreno superficial até a
primeira camada minerável de carvão é de apenas 12 metros em Candiota. No caso da Jazida
Sul Catarinense, a mesma publicação afirma que:
33
Se observado o que consta do relatório norte-americano com relação às suas camadas
mineráveis de carvão, tem-se, na tabela 5 da mesma publicação, as seguintes informações:
Observa-se que enquanto a camada típica da Jazida Sul Catarinense apresenta espessura
minerável média de 1,6 metros e a de Candiota 4,5 metros (chegando a 6 metros em alguns
locais), a média das camadas mineráveis das principais camadas de carvão norte-americanas é
de 437 polegadas ou 11 metros. Candiota ainda é economicamente compensada pela
relativamente fina cobertura estéril, inferior a 50 metros.
Outro ponto a se destacar é a economicidade alcançada pela produção de carvão mineral em
larga escala. No caso da mina de Candiota, a produção média é de 1,2 milhão de toneladas/ano
enquanto que a maior produtora catarinense atinge produção da ordem de 500 mil
toneladas/ano. No caso dos carvões norte-americanos, a tabela 32 do relatório anual de 2009
indica o que segue:
34
Ou seja: as minas subterrâneas norte-americanas que produzem acima de 1 milhão de
toneladas/ano apresentam preço médio FOB do carvão de USD 49,97/st enquanto que naquelas
que produzem menos de 1 milhão de toneladas o preço chega a atingir USD 71,31/st (100 mil a
200 mil toneladas/ano).
O mesmo se aplica às minas a céu aberto, onde de USD 17,65/st para minas produzindo acima
de 1 milhão/ano o preço chega a atingir USD 62,37/st para minas que também produzem entre
100 mil a 200 mil/st por ano.
Portanto, o ponto de inflexão norte-americano parece se situar acima de 1 milhão de toneladas;
aliás, o preço médio apresentado pelos carvões norte-americanos leva a crer que a produção de
carvão naquele país se sustenta nas grandes minas (economia de escala), especialmente no
caso das minas a céu aberto.
A título de curiosidade, a mina a céu aberto que mais produziu carvão dos Estados Unidos em
2009 atingiu 89 milhões de toneladas métricas de carvão (North Antelope Rochelle
Mine/Wyoming) ou o equivalente a 19 anos da produção média de carvão energético brasileira,
em tonelagem. A mina subterrânea americana que mais produziu carvão no mesmo período
atingiu 10 milhões de toneladas métricas (Enlow Fork Mine/Pennsylvania) ou o equivalente a
dois anos da produção nacional média. Ainda: existem aproximadamente 40 minas individuais
nos EUA produzindo, anualmente, mais do que toda a produção brasileira de carvão energético.
Cabe também salientar, no âmbito dessa avaliação sobre os preços do carvão mineral, que é do
maior interesse do gerador que o preço do seu insumo combustível seja o menor possível:
quanto menor o preço, mais competitivo será o gerador na pilha de despacho do ONS e,
portanto, menos sujeito ao risco de exposição ao PLD estará sujeito o gerador. Nesse sentido, a
TBLE efetuou auditorias de preços em 2007, com anuência da própria Eletrobrás, visando
responder a pleitos de aumento real de preços dos seus fornecedores de carvão mineral. Os
reajustes concedidos e autorizados pela Eletrobrás foram, portanto, balizados levando-se em
conta essas auditorias realizadas por auditor independente - Martinelli Auditores – empresa de
auditoria com sede em Joinville/SC e escritórios em São Paulo/SP, Porto Alegre/RS,
Florianópolis (SC), Curitiba/PR, Criciúma/SC e Chapecó/SC, que está entre as 10 maiores
empresas de auditoria do Brasil (www.martinelliauditores.com.br).
35
B.4. Avaliação dos aspectos ambientais relevantes no tocante às usinas
termelétricas a carvão nacional
Com respeito à questão ambiental, tal como citada no documento da ANEEL, apresenta-se os
seguintes argumentos:
todas as usinas termelétricas a carvão da TBLE estão devidamente licenciadas pelos órgãos
ambientais competentes (FATMA e FEPAM) e são certificadas pelas normas NBR:ISO 9001 e
NBR:ISO 14001;
a qualidade do ar nas regiões de influência de nossas usinas é considerada “boa” ou “muito
boa” de acordo com padrões da CETESB;
a UTCH está operando com sistema dessulfurizador desde setembro/2010, abatendo MP e
SO2 de acordo com a Resolução CONAMA 008/1990;
todas as mineradoras catarinenses contam com TAC assinado e em andamento junto à
Justiça Federal, Ministério Público e FATMA, sendo que todas as empresas que fornecem
carvão mineral para o parque termelétrico da TBLE estão devidamente certificadas pela
NBR:ISO 14001 em atendimento à exigência contratual por ela formalizada;
as emissões anuais de gases do efeito estufa pelas termelétricas brasileiras (a gás natural e
óleo, inclusive) é inferior a 2% das emissões anuais do país (fonte: Mckinsey, 2009 citando
o MCT).
C. Considerações Finais
No ANEXO Id e ANEXO Ie, adiante, apresentamos o desempenho operacional das usinas a
carvão da TBLE e os montantes investidos nessas usinas desde a privatização, onde podemos
observar que são valores expressivos e focados na melhoria do desempenho operacional e
ambiental das unidades geradoras, especialmente a partir do momento em que a segurança
jurídica e regulatória permitiu ao Gerador programar o seu futuro, com o advento da CDE e da
RN 129/2004.
36
ANEXO Ia – Dados Técnicos adicionais da UTE Nordjylland, Dinamarca:
37
ANEXO Ib – Dados técnicos adicionais da UTE Suratgarth, Índia
38
ANEXO Ic – Dados Técnicos adicionais da UTE Manjuba, África do Sul
39
ANEXO Id – Dados Operacionais das Usinas da TBLE
Disponibilidade interna, Taxa Equivalente de Indisponibilidade Forçada (ONS) e Fator de
Capacidade.
Usina
Ano Disp. TEIFa FC Disp. TEIFa FC Disp. TEIFa FC Disp. TEIFa FC Disp. TEIFa FC
1994 nd nd nd nd nd nd 86,8 7,0 39,2 nd nd nd nd nd nd
1995 nd nd nd 86,3 1,4 29,0 94,9 3,2 61,0 nd nd nd 91,9 2,6 50,0
1996 80,5 0,1 54,3 68,5 4,6 46,0 86,8 3,4 70,0 nd nd nd 80,5 3,2 61,0
1997 81,0 0,0 49,3 75,3 5,3 46,0 80,3 1,3 57,2 77,2 0,5 52,5 78,2 1,5 52,7
1998 82,2 0,0 39,5 90,1 0,1 34,0 91,6 0,4 44,7 94,0 0,2 50,7 91,6 0,3 45,2
1999 95,7 0,7 49,1 81,5 2,2 60,7 97,1 0,5 81,5 76,9 0,3 62,7 85,6 0,7 67,1
2000 88,1 0,0 56,9 88,0 0,7 60,3 88,7 0,0 71,5 91,3 0,1 75,9 89,7 0,0 70,4
2001 95,8 0,1 47,9 81,1 7,4 46,5 85,4 0,3 57,8 89,6 0,0 66,2 87,4 1,3 58,8
2002 92,9 0,5 41,2 86,5 4,9 51,4 87,5 7,7 61,9 48,3 0,7 37,3 70,7 3,6 47,7
2003 85,3 0,5 27,7 78,6 0,3 36,9 88,2 0,3 49,9 83,4 1,5 62,4 84,4 0,8 51,2
2004 91,1 1,8 43,8 83,0 1,0 56,0 78,7 0,9 57,0 91,1 1,5 73,0 85,9 1,3 62,7
2005 69,7 27,6 39,0 90,6 0,3 52,7 69,2 1,0 51,9 79,7 0,1 63,2 77,2 2,8 55,8
2006 79,3 1,3 43,2 74,3 0,0 45,4 90,7 0,3 67,6 88,9 4,8 72,5 86,3 2,3 64,1
2007 92,7 0,9 53,8 71,8 1,0 45,0 94,6 0,3 73,1 79,4 14,3 59,9 84,1 6,6 61,1
2008 75,2 8,2 44,1 92,0 1,3 59,4 89,8 0,8 65,7 84,8 2,3 69,2 86,7 2,2 64,3
2009 57,9 8,2 41,3 95,9 6,7 33,7 83,2 0,8 51,3 91,3 1,5 68,1 86,6 1,7 55,0
2010 74,2 17,5 35,2 96,0 0,9 67,8 85,0 2,2 70,8 87,1 5,6 69,9 86,7 4,1 66,8
TOTALUTCH UTLA UTLB UTLC
Taxa Equivalente de Indisponibilidade Forçada das Usinas a Carvão da Tractebel Energia (dados consolidados com o ONS)
0
10
20
30
40
50
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010
Ano
TEIFa
Média das Usinas a Carvão
40
ANEXO Ie – Investimentos da TBLE nas Usinas a Carvão
Investimentos da Tractebel Energia nas Usinas a Carvão 2000-2010
-
50.000
100.000
150.000
200.000
250.000
300.000
350.000
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010
Ano
R$ x mil
Charqueadas
Jorge Lacerda A
Jorge Lacerda B
Jorge Lacerda C
Complexo Jorge Lacerda Total
Investimento Total Anual
Investimento Total Acumulado
Valores históricos
Usina
Ano UTCH UTLA UTLB UTLC CTJL Total Cumulativo
2000 2.637 1.271 1.087 2.725 5.083 7.719 7.719
2001 490 2.976 1.739 1.488 6.203 6.693 14.412
2002 490 1.439 3.831 3.900 9.170 9.661 24.073
2003 346 2.541 2.483 1.242 6.266 6.612 30.685
2004 15 1.273 3.666 1.420 6.359 6.374 37.059
2005 20 1.267 8.933 2.534 12.734 12.753 49.812
2006 52 38.082 884 973 39.938 39.991 89.803
2007 - 37.152 5.621 2.537 45.309 45.309 135.112
2008 20.106 2.247 8.298 12.930 23.475 43.581 178.693
2009 35.417 17.369 24.482 14.569 56.420 91.837 270.531
2010 15.524 18.259 12.721 8.405 39.385 54.908 325.439
Investimentos (R$ x mil)