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Tradições

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  • Coleo Antnio de Morais S ilvaE S T U D O S D E L N G UA P O R T U G U E S A

    Academia Bras ile irade Letras

  • Tr a d i e s C l s s i c a s da L n g ua Po rt u g u e s a

  • Ac a d e m i a B r a s i l e i r a d e L e t r a s

    P a d r e P e d r o A d r i o

  • Coleo Antnio de Morais S ilvaE S T U D O S D E L N G UA P O R T U G U E S A

    Tradies Clssicas da Lngua Portuguesa

    R i o d e J a n e i r o 2 0 1 0

    2.a Edio

  • C O L E O A N T N I O D E M O R A I S S I LVA

    A C A D E M I A B R A S I L E I R A D E L E T R A S

    Diretoria de 2010Presidente: Marcos Vinicios Vilaa

    Secretria-Geral: Ana Maria MachadoPrimeiro-Secretrio: Domcio Proena Filho

    Segundo-Secretrio: Luiz Paulo HortaTesoureiro: Murilo Melo Filho

    C O M I S S O D E L E X I C O G R A F I A D A A B L

    Eduardo PortellaEvanildo Bechara

    Alfredo Bosi

    PreparaoAline Rodrigues Gomes

    RevisoVania Maria da Cunha Martins Santos

    Denise Teixeira VianaPaulo Teixeira Pinto FilhoJoo Luiz Lisboa Pacheco

    Sandra PssaroProduo editorial

    Monique Mendes

    Editorao eletrnicaEstdio Castellani

    Projeto grficoVictor Burton

    Catalogao na fonte:Biblioteca da Academia Brasileira de Letras

    A343 Adrio, Pedro. Tradies clssicas da lngua portuguesa / Padre Pedro Adrio ; apresentao Evanildo Bechara. 2.a ed. Rio de Janeiro : Academia Brasileira de Letras, 2010. 402 p. ; 23 cm. (Coleo Antnio de Morais Silva. Estudos de lngua portuguesa ; 12)

    ISBN 978-85-7440-183-6

    1. Lngua portuguesa. I. Bechara, Evanildo, 1928-. II. Ttulo III. Srie.CDD 469.83

  • Apresentao

    Evanildo Bechara

    A atmosfera de humildade que, por toda a vida, envolveu a figura humana e a sua atividade de professor de Lngua Portuguesa do Seminrio de Olinda, impede-nos de dissertar, ainda que brevemente, sobre o autor de Tradies Clssicas da Lngua Portuguesa.

    Nem nos arquivos e documentos daquele Seminrio nem no depoimento de con-temporneos de Ordem e de trabalho, como ocorreu com a entrevista ao ilustre Padre Arnaldo Cabral, a quem chegamos pela mediao da ilustre colega e amiga Prof.a Dr.a

    Nelly Carvalho, glria do magistrio superior pernambucano. O Padre Arnaldo s nos disse da extrema humildade do religioso e da excessiva competncia do professor. Tambm no nos foi possvel localizar com certeza seu torro natal em Pernambuco; na opinio do nosso entrevistado, seria talvez Vitria de Santo Anto. Pela prpria informao do autor, provindo de famlia muito pobre e, acolhido pelo Seminrio de Olinda, nele encontrou os recursos para ascenso cultural, chegando a integrar o quadro de professores do to conceituado Seminrio. Na dedicatria estampada no livro peremptrio: Ao querids-simo Seminrio de Olinda, ao qual tudo devo (...). A essa instituio tambm deve o seu mestre de vernculo: (...) onde aprendi do meu excelente mestre de portugus, o virtuoso e ilustrado sacerdote Cnego Alfredo Xavier Pedrosa, a amar com ardor a lngua-ptria.

    Sada em 1945, em Porto Alegre, pelo Editor J. Pereira da Silva, mas impressa nas Oficinas Grficas do Dirio da Manh, no Recife, a obra no mereceu, que saibamos, rese-nha crtica ou nota bibliogrfica. O editor utilizou todas as pginas da capa do livro para transcrever opinies de abalizados fillogos e gramticos (Joo Ribeiro, Mrio Barreto, Eduardo Carlos Pereira) e escritores (Machado de Assis, Rui Barbosa, Joaquim Nabuco,

  • VIII Padre Pedro Adrio

    Ronald de Carvalho, Cludio de Sousa) sobre a lio dos clssicos, a pureza de sua lingua-gem, a lngua portuguesa nos seus tesouros e no descaso de seu uso; mas nada se adianta acerca do Autor, da natureza de sua obra e dos seus propsitos.

    Correu, como puro boato bibliogrfico, que Pedro Adrio, com o pseudnimo de Lcio Navarro, escrevera a obra Legtima Interpretao da Bblia, publicada pela Campanha de Instruo Religiosa Brasil-Portugal, no Recife, e que teve a 2.a edio em 1960. Indagado por ns sobre tal atribuio, Padre Arnaldo Cabral rejeitou a hiptese pelo fato de Pedro Adrio nunca se ter preocupado com temas teolgicos. Era, antes de tudo, um professor de Lngua Portuguesa.

    A razo da proposta encontraria justificativa, talvez, na declarao feita por D. Ant-nio de Almeida Morais Jnior, prefaciador do livro de Lcio Navarro, segundo a qual seu autor era um mestre da lngua (pg. 4). Ora, os seminrios sempre foram celeiros de excelentes professores cultores da lngua e de excelente magistrio. Por outro lado, h profundas diferenas de estilo entre os dois autores. s vezes lhes falta a esses profes-sores o arcabouo terico para chegar a melhores descries e explicaes, como ocorre aqui e ali com Pedro Adrio, mas revelam profundo conhecimento dos fatos de lngua, haurido na apurada leitura dos bons escritores.

    Na conversa inicial com seus alunos e com os possveis leitores das Tradies Clssicas, o padre Pedro Adrio justifica sua posio no s em relao s fontes literrias, mas ainda sobre seu ponto de vista em relao a alguns emprstimos lexicais e sintticos, especial-mente galicismos, que sempre foram os grandes viles perseguidos pelos vernaculistas da constante bibliografia do Autor e dos fillogos que lhe servem de guia, Mrio Barreto e S Nunes, entre outros. A estima fervorosa dos clssicos algumas vezes o faz trazer para as pginas deste seu livro construes que se tornaram obsoletas a partir do sculo XVIII, como, por exemplo, a combinao da preposio per/por com o pronome objetivo direto em sintaxes do tipo pelo fazer mais claro (Rui Barbosa), em lugar de para faz-lo mais claro, fato lembrado no 479 das Tradies, ou, ainda, meros usos ortogrficos, como fazem-o, vel-o, por fazem-no, v-lo, comentados no 300. Por outro lado, acertou em criticar a lio dos gramticos hoje infelizmente dominante , pela qual se condena a constru-o tempo dos alunos sarem, em favor de tempo de os alunos sarem [691].

    Pedro Adrio pertenceu a uma gerao de professores muito lidos nos autores clssicos e modelares, que incutiram nos alunos as opulncias e galas da linguagem, e neles, alunos, incentivavam a permanncia dessas riquezas. Tais mestres tinham a conscincia de que os idiomas se alteram no tempo, mas as lies do vernaculismo clssico eram boas demais para se desprezarem. No captulo introdutrio sobre O critrio de certeza no estudo da lngua portuguesa levanta trs razes bsicas (a lgica; a autoridade dos gramticos e fillogos; o uso constante dos bons autores, e no os desvios que aqui ou ali neles encon-

  • Tradies Clss icas da Lngua Portuguesa IX

    tramos). Embora nem sempre seus comentrios vistos com a lio de tericos modernos meream hoje nossos aplausos, a verdade que Pedro Adrio soube reuni-los para dar unidade a uma obra gramatical de bom mrito, til a todos aqueles que querem escrever fazendo que seus textos, passando pelo crivo do bom senso, revivam as tradies clssicas que nos legaram os melhores representantes da literatura brasileira e portuguesa.

    Conhecemos no Recife notveis professores de lngua portuguesa que no economi-zaram elogios obra de Pedro Adrio, e foi por presente generoso de um deles, Adauto Pontes, que passamos a conhecer estas Tradies Clssicas. O inicial propsito dos fundado-res da Academia Brasileira de Letras de salvaguardar essas tradies vernaculares justifica o desejo de pr ao alcance do pblico estudioso uma obra cujo maior empenho, nas palavras do seu Autor, ser apenas como bem intencionado esforo em prol da divulgao das riquezas do nosso idioma. l-la e beneficiar-se de suas lies.

  • Tradies Clss icas da Lngua Portuguesa

    Editor: J. Pereira da SilvaCAIXA POSTAL 1145

    Porto Alegre Rio Grande do Sul1945

    PA D R E P E D RO A D R I O(Professor de Portugus no Seminrio de Olinda, Pernambuco)

  • Seminrio de Olinda,

    Pernambuco

  • NIHIL OBSTAT

    RECIFE, I8 VI 1943

    Cnego Eustquio de Queiroz,

    Censor

    IMPRIMI POTEST

    RECIFE, I9 VI 1943

    Michael, Archiep. Olinden,

    et Recifen

  • Ao queridssimo

    SEMINRIO DE OLINDA,

    ao qual tudo devo e onde aprendi do meu excelente

    mestre de portugus, o virtuoso e ilustrado sacerdote

    CNEGO ALFREDO XAVIER PEDROSA,

    a amar com ardor a lngua ptria, ofereo, dedico e

    consagro este modesto trabalho.

    O AUTOR

  • Algumas Palavras ao Leitor

    Encarregado das ltimas classes de portugus no Seminrio de Olinda, desde fevereiro de 1940, tnhamos, de ento por diante, que compulsar, frequentemente os autores clssicos da nossa lngua, a fim de nos no afastarmos, no ensino daquela matria, da moderna orientao que vem tomando a cincia da linguagem. Vamos, por outro lado, que esse contnuo abeberar-se das genunas fontes do vernculo no era penso que pudssemos impor aos nossos alunos, assoberbados com o estudo de muitas outras disciplinas, acrescendo a inconvenincia de que nem sempre os livros que haveriam de manusear seriam bem edificantes e educativos para seu esprito de adolescentes, ocupados, sobretudo, com a prpria formao eclesistica. Da a ideia de enfeixarmos em livro os bons ensinamentos que a lio dos grandes autores, a pouco e pouco, nos ia deparando.

    E assim, foi pensando em nossos alunos que trabalhamos com ardor na composio deste livro. Da se v que no traz ele grande utilidade, nem para os mestres nem para os que so principiantes ainda no estudo da lngua.

    No para os mestres, assaz familiarizados com a literatura clssica, pois em geral apontamos fatos, ti-ramos dedues, firmamos doutrinas que sobejamente j lhes so conhecidas. No para os principiantes, pois o livro supe um tal qual conhecimento da nomenclatura gramatical, de que no so senhores aqueles que aprendem ainda as noes mais elementares.

    Aos nossos alunos, portanto, e, mediante eles, a quantos, sem serem profundos conhecedores dos segredos do idioma ptrio, gostariam de ter uma ideia geral das riquezas que se encontram nos bons autores, nosso modesto trabalho dedicado.

    Tivemos, sobretudo, o fito de vulgarizar e divulgar alguns tesoiros ocultos nas obras dos nossos clssicos, infelizmente mui pouco lidos e consultados. Quisemos, demais disto, contribuir de alguma maneira, para desfazer o preconceito de que, na lngua verncula, tudo incerto e discutido. De to contnuas e acerbas dis-

  • 8 Padre Pedro Adrio

    cusses que tem havido sobre assuntos de gramtica, no nosso pas e em Portugal, pode nascer, desgraadamente tem nascido alguma desconfiana para com o estudo da linguagem portuguesa. E desta desconfiana, mais desgraadamente ainda, o propsito em alguns de fazerem mui pequeno cabedal das consideraes dos fillogos e preceitos gramaticais. Propusemo-nos, ento, mostrar que se h controvrsias no estudo de portugus (o que comum tambm a muitos outros ramos do conhecimento humano) no deixa de haver a muita e muita coisa indiscutvel: pode-se discutir aquilo que vem sendo usado, desde trs, quatro ou cinco sculos at o dia de hoje, pelos escritores mais esmerados e escrupulosos do nosso idioma?

    No negamos a possibilidade de serem encontrados no nosso livro alguns pontos de que outros acharo razes para discordar; no exclumos a hiptese de termos cado em muitos erros e desacertos, e cordialmente agradeceremos crtica serena e desapaixonada dos entendidos, que nos quiser fazer a caridade de os assina-lar; mas podemos dizer que, tendo sempre em nada nossa opinio pessoal, procuramos colher os ensinamentos aqui ministrados, no campo do incontroverso ou, pelo menos, do solidamente comprovado.

    por isto que no tocamos em certas questes como a do infinito pessoal e impessoal, aperceber = perceber, si, consigo como tratamento para 2.a pessoa, todo ele como objeto direto etc. sobre as quais no encontramos citaes em nmero suficiente para presentarmos doutrina que se mostrasse arrimada numa slida e legtima tradio.

    por isto que, como ao leitor no passar despercebido, somos parco na apresentao dos estrangeiris-mos viciosos. Foi, at, nosso plano primeiramente, dar uma longa enumerao de tais vcios de linguagem, corroborando, no que fosse possvel, to teis e proveitosos ensinamentos que se encontram nos livros: Es-trangeirismos, de Cndido de Figueiredo; Vcios de Linguagem, de Sandoval de Figueiredo; e Dicionrio das Dificuldades, de Vasco Botelho para os quais remetemos os leitores desejosos de maiores informaes sobre o assunto.

    Entretanto verificamos, para logo, que esta larga enumerao no nos era possvel, uma vez que, pelo ttulo e natureza da obra, havamos de documentar cada termo condenado com as citaes clssicas, mais ou menos interessantes, que o evitaram, e estas nem sempre nos apareceram bem mo. Alguns estrangeirismos, geralmente condenados, tivemos que pass-los para a categoria dos termos j nacionalizados. E enquanto a alguns que os clssicos tm de feito at hoje evitado, resolvemos silenciar, com temor do futuro. O leitor estranhar, por exemplo, no encontrar, no meio dos estrangeirismos rejeitados, alguns como detalhe, massacre, elite etc. At hoje, ao que nos consta, no tm logrado estes a mesma aceitao dos bons autores que outros galicismos j lograram, e por um motivo bem bvio. Em vez daquelas palavras de origem francesa, temos termos vernculos muito mais sonoros, mais eufnicos e mais elegantes: em vez de detalhe, por-menor, mincia, minudncia, miudeza, particularidade; em vez de massacre, morticnio, carnificina, carniceria, hecatombe, mortandade; em vez de elite, gema, escol, fina flor, nata, beijinho etc.

    A troca dos velhos termos, que j possuamos, pelos vindos de fora, nenhuma vantagem traz, decerto, no caso para as belezas do estilo. Mas, por outro lado, so aquelas francesias empregadas com demasiada insis-tncia, e amplamente divulgadas pelo uso; cada dia se vo tornando mais velhas na nossa lngua (e h sempre

  • Tradies Clss icas da Lngua Portuguesa 9

    certa condescendncia com os velhos galicismos) por isto j h teoristas que as aprovam, como p. ex. Afonso Costa (Questes Gramaticais, Rio, 1908, pg. 178), apadrinhava detalhe e massacre. Alm de que, se massacre pode ser bem substitudo, o mesmo no se d com o verbo massacrar, que no tem correspondentes no nosso idioma, salvo chacinar, que no tem logrado muito uso.

    H, por isto, quem condene massacre e admita massacrar, o que no achamos congruente. E j se fala muito em tendncia das elites, pensamento das elites etc., quando os outros substitutos desta palavra elite no comportam o plural. No que respeita s flexes, para acentuar ainda mais a dvida, nem so muito comuns nem so de todo estranhas nossa lngua; se temos talhe, no nos repugnava o deta-lhe se possumos lacre, h lugar tambm para o massacre; se temos apetite, dinamite e mais tantas doenas terminadas em ite, podamos ter tambm elite. Diante de tais consideraes, resolvemos calar, que era o melhor, pois no havamos prometido enumerar todos os estrangeirismos viciosos, seno alguns poucos deles. Na aula, desde que ensinamos a gente da nossa gerao, podemos aconselhar aos alunos que prefiram sempre a tais termos, os outros vernculos que os substituem, pois, sobre serem mais nossos, so mais belos e mais sonoros. Mas num livro que pode ser compulsado daqui a muitos anos e que procura registrar velhas, persistentes e arraigadas tradies, o melhor era no arriscar nenhuma afirmao imprudente, que pudesse mais tarde tornar-se doutrina antiquada. Sirva isto de amostra para que se veja quanto delicada, por vezes, a questo dos estrangeirismos.

    Outra estranheza que por certo mostrar o leitor ser a de ver que, entre os sincretismos, documentamos esta ou aquela forma com a s citao de um autor quinhentista ou seiscentista. Da no infira que julgamos o simples fato de ser usada uma forma por escritor daqueles tempos, cabal justificativa para ser ela usada nos dias de hoje. Que assim no pensamos, bem se poder ver logo na Introduo (n.o 13), onde citamos vrios termos usados por clssicos antigos, os quais so hoje plebesmos inelegantes, que no podem ter lugar no dialeto literrio. Deu-se apenas o seguinte. Resolvemos, por questo de simetria, s registar sincretismos de que achssemos docu-mentao para ambas as formas e por isto deixamos de acrescentar muitos outros, com a curiosa circunstncia de que, na maioria dos casos, no encontrvamos citao para a forma mais usual nos nossos dias. Por isto, quando deparamos, s nos antigos, justificao de formas que sabamos serem usuais atualmente ou no destoarem do estilo moderno, no nos quisemos privar da satisfao de consignar o sincretismo.

    No faltar quem nos acuse de tendncias arcaizantes e lusitanizantes. Mas estas correm mais por conta da opulncia dos mestres do vernculo, cuja linguagem tentamos descrever. Estes sabem, como Camilo, p. ex., trazer balha oportunamente, com elegante naturalidade, sem exagero, sem preciosismo, todo o material que possa servir para enriquecer o idioma: o falar antigo e o moderno, o falar erudito e o popular, o falar brasileiro e o portugus, e s vezes at, alm do falar nacional, o falar provinciano.

    Quanto ortografia, procuramos seguir aquela que est em vigor agora no momento de entrar o livro para o prelo; por falta, porm, de material tipogrfico, usamos o acento grave em substituio ao trema, bem como nos vemos forados a omitir alguns acentos no versal e no versalete.

    Outras objees, que podero surgir no esprito dos mais variados tipos de leitores, no nos dado ora prever, para as solucionar dantemo.

  • 10 Padre Pedro Adrio

    Queremos, sim, chamar a ateno para um pensamento que lhes pode trazer a leitura de todo o livro: o quanto est longe do nimo dos nossos grandes escritores a ideia de desagregao, de separatismo, que se tem pomposamente batizado com o nome de lngua brasileira. Nas mais autorizadas esferas do dialeto literrio, a tendncia para aproveitarem, os autores brasileiros, os tesouros que a lngua ostenta em Portugal, bem como os autores portugueses, aquilo que vem a lngua adquirindo no Brasil. Sirva este livro, entre outros fins colimados, para mostrar um congraamento entre escritores lusos e nacionais, de que s resulta maior enriquecimento para a lngua to bela, que nosso patrimnio comum.

    Terminando este antelquio que j vai bastante longo, a est, caro leitor, nosso pequeno trabalho, em que no pretendemos fazer ostentao de sabena ou de erudio. ele, de sua natureza, to simples que no h margem para pretenses de mostrar engenho ou perspiccia. No nos foi preciso talento para este trabalho to banal de respigarmos, aqui e acol, alguns milhares de citaes. Se nosso livro, portanto, no desmerecer de todo perante o julgar complacente de algum leitor benvolo, ser apenas como bem-intencionado esforo em prol da divulgao das riquezas do nosso idioma.

    Sirva ele de incentivo para outros estudiosos que podero realizar obra melhor, mais substanciosa e mais duradoura. E, se quiser algum recompensar as fadigas do nosso empreendimento, no h mister qualificar de valioso o nosso trabalho, que a tanto no aspiramos; contentamo-nos com o qualificativo de til, o que nos compensar amplamente as viglias empregadas em bem servir a esta lngua riqussima e admirvel que a nossa lngua portuguesa.

    Seminrio de Olinda, janeiro de 1945PADRE PEDRO ADRIO

  • Lista dos Autores e Obras Citadas

    SCULO XVI

    GIL VICENTE (falecido mais ou menos em 1536), portugus.Teatro (Coleo Lusitnia), Livraria Chardron de Lelo & Irmo, Porto.

    BERNARDIM RIBEIRO (viveu na primeira metade do sculo XVI), portugus.Menina e Moa (Coleo Lusitnia), Livraria Chardron, Porto.clogas (Jano e Franco), Livraria Civilizao, 1940, Porto.

    FRANCISCO S DE MIRANDA (1495-1558), portugus.Obras Completas, Livraria S da Costa, 1937, Lisboa.

    FERNO LOPES DE CASTANHEDA (falecido provavelmente em 1559), portugus.Histria do Descobrimento e Conquista da ndia pelos Portugueses, na Tipo-grafia Rolandiana, 1833, Lisboa.

    Dr. ANTNIO FERREIRA (1528-1569), portugus.Poemas Lusitanos, Livraria S da Costa, 1939, Lisboa.

    JOO DE BARROS (1496-1570), portugus.Dcada 1.a livro IV.o, Editor Domingos Barreira, 1941, Porto.Panegricos, Livraria S da Costa, 1937, Lisboa.

    GARCIA DE ORTA (falecido em 1570), portugus.Colquios dos Simples e Drogas da ndia, Edio dirigida e anotada pelo Conde de Ficalho, Imprensa Nacional, 1891, Lisboa.

    FRANCISCO DE MORAIS (viveu entre 1500 e 1572), portugus.Palmeirim de Inglaterra, Livraria Avelar Machado, 1940, Lisboa.

  • 12 Padre Pedro Adrio

    DAMIO DE GIS (1501-1562), portugus.Crnica do Serenssimo Senhor Rei D. Emnuel, na Real Oficina da Universi-dade. 1790, Coimbra.

    LUIZ DE CAMES (1524-1580), portugusOs Lusadas.Teatro (Comdias dos Anfitries, El-rei Seleuco e Filodemo), Coleo Lusit-nia, Livraria Chardron de Lelo & Irmo, Porto.

    FREI TOM DE JESUS (1529-1582), portugus.Trabalhos de Jesus, 5.a edio, em casa do editor A. J. Fernandes Lopes, 1865, Lisboa.

    FERNO MENDES PINTO (1509-1583, segundo a melhor opinio), portugus.Peregrinao, Coleo Lusitnia. Livraria Lelo & Irmo, 1941, Porto.

    FREI HEITOR PINTO (falecido em 1584), portugus.Imagem da Vida Crist, Livraria S da Costa, 1940, Lisboa.

    D. FREI AMADOR ARRAIS (falecido em 1600), portugus.Dilogos, na Tipografia Rolandiana, 1846, Lisboa.

    PADRE JOO DE LUCENA (1550-1600), portugus.Antologia Portuguesa, organizada por Agostinho de Campos, Livrarias Aillaud e Bertrand, 1921, Lisboa.

    DIOGO DO COUTO (1544-1616) portugus.O Soldado Prtico, Livraria S da Costa, 1937, Lisboa.

    SCULO XVII

    FREI BERNARDO DE BRITO (1569-1617), portugus.Monarquia Lusitana, na Impresso Craesbeeckiana, 1690, Lisboa.

    FRANCISCO RODRIGUES LOBO (falecido em data incerta, posterior a 1623), por-tugus.

    Crte na Aldeia, 1937, Lisboa.O Condestabre de Portugal D. Nunalvres Pereira, editor Jorge Rodrigues, 1627, Lisboa.Poesias, Livraria S da Costa, 1940, Lisboa.

    FREI LUIZ DE SOUSA (1555-1632), portugus.Vida do Arcebispo D. fr. Bertolameu dos Mrtires, na Tipografia Rolandiana, 1850, Lisboa.Anais de D. Joo III.o, Livraria S da Costa, 1938, Lisboa.

  • Tradies Clss icas da Lngua Portuguesa 13

    CNEGO MANUEL SEVERIM DE FARIA (1583-1655), portugus.Notcias de Portugal, na Oficina de Antnio Gomes, 3.a edio, 1791, Lisboa.

    PADRE JACINTO FREIRE DE ANDRADE (1597-1657), portugus.Vida de D. Joo de Castro, Tipografia da Academia Real de Cincias de Lisboa, 1835, Lisboa.

    DIOGO DE PAIVA DE ANDRADE SOBRINHO (1567-1660), portugus.O Casamento Perfeito, a paginao citada a mesma do livro A Inquietao do Casamento (Editora Guanabara, Rio), de Joo Ribeiro, que insere esta obra.

    D. FRANCISCO MANUEL DE MELO (1621-1666), portugus.Aplogos Dialogais, na Oficina de Matias Pereira da Silva e Joo Antunes Pedro-so, 1721, Lisboa.Carta de Guia de Casados, inserto no livro A Inquietao do Casamento, de Joo Ribeiro.Cartas Familiares, Livraria S da Costa, 1937, Lisboa.

    FREI MANUEL DE ESPERANA (falecido em 1670), portugus.Excertos, coligidos por Solidnio Leite, 1918, Rio.

    PADRE ANTNIO DE S (1620-1670), brasileiro.Sermo de Nossa Senhora das Maravilhas, na Oficina de Manuel Fernandes da Costa, 1732, Lisboa.

    FREI ANTNIO DAS CHAGAS (falecido em 1682), portugusCartas Espirituais, Livraria S da Costa, 1939, Lisboa.

    FREI EUSBIO DE MATOS (1629-1692), brasileiro.Estante Clssica da Revista de Lngua Portuguesa, Rio.

    PADRE ANTNIO VIEIRA (1608-1697), portugus.Sermes, Livraria Chardron, 1908, Porto.

    PADRE MANUEL BERNARDES (1644-1710), portugus.Nova Floresta, Livraria Chardron, 1909, PortoPo Partido em Pequeninos para os Pequeninos da Casa de Deus, editor Domin-gos Barreira, 1940, Porto.Pginas Escolhidas, Editora Educao Nacional, 1941, Porto.

    MANUEL BOTELHO DE OLIVEIRA (1636-1711), brasileiro.Msica do Parnaso, Anurio do Brasil, Rio.

    PADRE FRANCISCO DE SANTA MARIA (1653-1713), portugus.Ano Histrico; Dirio Portugus, na Oficina e custa de Domingos Gonalves, 1744, Lisboa.ARTE DE FURTAR, de autor discutido, 1926, Companhia Melhoramentos de So Paulo.

  • 14 Padre Pedro Adrio

    SCULO XVIII

    MATIAS AIRES RAMOS DA SILVA DE EA (nascido em 1705), brasileiro.Reflexes sobre a Vaidade dos Homens ou Discursos Morais sobre os efeitos da Vaidade, na Oficina de Francisco Luiz Ameno, 1752, Lisboa.

    SEBASTIO DA ROCHA PITA (1660-1738), brasileiro.Histria da Amrica Portuguesa, 2.a edio, editor Francisco Artur da Silva, 1880, Rio de Janeiro.

    PADRE ANDR DE BARROS (1675-1754), portugus.Vida do Apostlico Padre Antnio Vieira, Tipografia do Dirio, 1837, Bahia.

    FREI ANTNIO DE SANTA MARIA JABOATO (1695-1764), brasileiro.Novo Orbe Serfico Braslico, 1858, Rio.

    PEDRO ANTNIO JOAQUIM CORREIA GARO (1724-1772), portugus.Obras Poticas, na Impresso Rgia, 1825, Lisboa.

    FREI JOS DE SANTA RITA DURO (1737-1784), brasileiro.Caramuru, Livraria Garnier, 4.a edio, Rio.

    BASLIO DA GAMA (1740-1785), brasileiro.Obras Poticas, Livraria Garnier, Rio.

    CLUDIO MANUEL DA COSTA (1729-1789), brasileiro.Obras, na Oficina, de Luiz Sco Ferreira, 1768, Coimbra.

    PADRE ANTNIO PEREIRA DE FIGUEIREDO (1725-1797), portugus.Traduo da Bblia Sagrada.

    FREI ANTNIO DO SACRAMENTO (portugus).Ventura do Homem Predestinado, Editora Vozes, 1938, Petrpolis (a primeira edio foi de 1763).

    ANTNIO DINIZ DA CRUZ E SILVA (1731-1799), portugus.O Hissope, obra inserta no livro Satricos Portugueses, de Joo Ribeiro, Edio Garnier, 1910, Rio.

    FREI GASPAR DA MADRE DE DEUS (1715-1800), brasileiro.Memrias para a Histria da Capitania de S. Vicente, Edies Melhoramentos, de So Paulo, 3.a edio, 1920, S. Paulo.

    MANUEL MARIA BARBOSA DU BOCAGE (1765-1805), portugus.Sonetos, Edies Cultura, 1942, S. Paulo.Poesias, (tomo VI.o), em casa do editor A. J. F. Lopes, 1853, Lisboa.

    TOMAZ ANTNIO GONZAGA (1744-1807), portugus.Marlia de Dirceu, Livraria S da Costa, 1937, Lisboa.

  • Tradies Clss icas da Lngua Portuguesa 15

    NICOLAU TOLENTINO DE ALMEIDA (1741-1811), portugus.Stiras, vem no livro Satricos Portugueses, de Joo Ribeiro, Garnier, Rio, 1910.

    PADRE ANTNIO PEREIRA DE SOUSA CALDAS (1762-1804), brasileiro.Salmos de Davi vertidos em ritmo portugus, na Oficina de P. N. Rougeron, 1820, Paris.

    FILINTO ELSIO (pseudnimo do PADRE FRANCISCO MANUEL DO NASCI-MENTO. 1734-1819), portugus.

    Obras Completas, na Oficina de A. Bobe, 1819, Paris.Poesias, Livraria S da Costa, 1941, Lisboa.

    SCULO XIX

    JOO BATISTA LEITO DE ALMEIDA GARRETT (1799-1854), portugus.Cames, Empresa da Histria de Portugal, 1904, Lisboa.Frei Luiz de Sousa. Um Auto de Gil Vicente (Coleo Lusitnia), Livraria Char-dron, Porto.Arco de Santana, Empresa Lusitana Editora, (Coleo Seleta), Lisboa.Viagens na Minha Terra (Coleo Lusitnia), Livraria Lelo & Irmo, Porto.Alfageme de Santarm. D. Filipa de Vilhena (Coleo Lusitnia), Livraria Char-dron, Porto.Fbulas. Folhas cadas, na Imprensa Nacional, 1859, 4.a edio, Lisboa.Portugal na Balana da Europa, Empresa da Histria de Portugal, 1904, Lisboa.Helena, 2.a edio, Parceria Antnio Maria Pereira, 1898, Lisboa.

    D. ROMUALDO DE SEIXAS (1787-1860), brasileiro.Coleo das Obras de D. Romualdo de Seixas, na Tipografia de Santos & Cia., 1839, Pernambuco.

    JOO FRANCISCO LISBOA (1812-1863), brasileiro.Obras Completas de Joo Francisco Lisboa, 1864, Maranho.Vida do Padre Antnio Vieira, 5.a edio, B. L. Garnier, Editor, 1891, Rio.

    MANUEL ODORICO MENDES (1799-1864), brasileiro.Eneida, inserta no livro Verglio Brasileiro, Odorico Mendes, na Tipografia de W. Remquet & Cia., Rua Garancire, 5, 1858, Paris.Odisseia de Homero, Livraria Leite Ribeiro, 1923, Rio.

    ANTNIO GONALVES DIAS (1823-1864), brasileiro.Poesias, Livraria Garnier, 1926, Rio.

  • 16 Padre Pedro Adrio

    LUIZ AUGUSTO REBELO DA SILVA (1822-1871), portugus.A Mocidade de D. Joo V.o, Sociedade Editora Portugal-Brasil, Artur Brando & Cia., 5.a edio, Lisboa.A Casa dos Fantasmas, Empresa Lusitana Editora (Coleo Seleta), 3.a edio, Lisboa.dio Velho no cansa, 3.a edio (Coleo Seleta), Empresa Lusitana Editora, Lisboa.Contos e Lendas, 3.a edio, Sociedade Editora Portugal-Brasil, Artur Brando & Cia., Lisboa.De Noite Todos o Gatos so Pardos, 3.a edio, Empresa Lusitana Editora (Co-leo Seleta), Lisboa.Lgrimas e Tesouros, Livraria Civilizao Editora, 1938, Porto.

    FRANCISCO SOTERO DOS REIS (1800-1871), brasileiro.Curso de Literatura Portuguesa e Brasileira, 1866, Maranho.

    ANTNIO FELICIANO DE CASTILHO (1800-1875), portugus.A Noite do Castelo. Os Cimes do Bardo, Sociedade Tipogrfica Franco-Portu-guesa, 1864, Lisboa.Quadros Histricos de Portugal, Livraria Civilizao Editora, 1938, Porto.As Gergicas de Verglio, 2.a edio, Companhia Editora Nacional, 1938, S. Paulo.Tartufo, por ordem e na tipografia da Academia Real de Cincias de Lisboa, 1870.Colquios Aldees, Editora Vecchi, 1939, Rio.Fausto, 3.a edio, Livraria Teixeira, S. Paulo.Felicidade pela Agricultura, 1849, Ponta Delgada.As Sabichonas (de Molire), Editora Casa Mandarino, Rio.Mil e Um Mistrios, Livraria Civilizao, 1938, Porto.O Avarento (de Molire), por ordem e na tipografia da Academia Real de Cin-cias de Lisboa, 1871.

    ALEXANDRE HERCULANO DE CARVALHO E ARAJO (1810-1877), portugus.Eurico, o Presbtero, 11.a edio, Tipografia Matos Moreira & Pinheiro, 1893, Lisboa.O Monge de Cister, 11.a edio, Livraria Aillaud e Bertrand, Paris-Lisboa.Lendas e Narrativas, 18.a edio, Livrarias Bertrand e Francisco Alves.O Bobo, 9.a edio, Livrarias Aillaud Bertrand e Francisco Alves.Poesias, 9.a edio, Livrarias Aillaud e Bertrand, Paris-Lisboa.Composies Vrias, Aillaud, Alves Bastos & Cia., Lisboa.Cenas de um ano da minha vida e Apontamentos de Viagem, Livraria Bertrand, 1934, Lisboa.

  • Tradies Clss icas da Lngua Portuguesa 17

    ANTNIO AUGUSTO TEIXEIRA DE VASCONCELOS (1816-1878), portugus.O Prato de Arroz Doce (Coleo Seleta), Empresa Lusitana, Lisboa.

    CAMILO CASTELO BRANCO (1825-1890), portugus.Amor de Perdio, l6.a edio, Magalhes & Moniz Ltda. Editores, Porto.A Queda dum Anjo, Parceria Antnio Maria Pereira, 7.a edio, 1925, Lisboa.Amor de Salvao, 7.a edio (Coleo Lusitnia), Livraria Chardron, Porto.Romance de um Homem Rico, (Coleo Lusitnia), Livraria Lelo, Porto.A Filha do Doutor Negro, 5.a edio, parceria Antnio Maria Pereira, 1926, Lisboa.Doze Casamentos Felizes, 7.a edio, parceria Antnio Maria Pereira, 1926, Lisboa.Estrelas Propcias, 3.a edio, parceria Antnio Maria Pereira, 1904, Lisboa.Riquezas do Pobre e Misrias do Rico. Livro de Consolao, 3.a edio, Livraria Chardron, Porto.Agulha em Palheiro, 7.a edio, parceria Antnio Maria Pereira, 1921, Lisboa.Horas de Paz, 3.a edio, parceria Antnio Maria Pereira, 1903, Lisboa.O Carrasco de Vtor Hugo Jos Alves, (Coleo Lusitnia) Livraria Chardron, 3.a edio, Porto.Histria de Gabriel Malagrida pelo Padre Paulo Mury, traduo de Camilo, Livraria Editora de Matos Moreira & Cia., 1875, Lisboa.As Trs Irms, 8.a edio, parceria Antnio Maria Pereira, 1922, Lisboa.No Bom Jesus do Monte (Coleo Lusitnia), Livraria Chardron, Porto.Delitos da Mocidade, 3.a edio, parceria Antnio Maria Pereira, 1918, Lisboa.

    JOS MARIA LATINO COELHO (1825-1895), portugus.Orao da Coroa, Tipografia da Academia, 1880, Lisboa.Arte e Natureza, 1.o milhar, Empresa Literria Fluminense Lda, Lisboa.Ferno de Magalhes, 4.a edio, Empresa Literria Fluminense Lda, Lisboa.Estante Clssica da Revista de Lngua Portuguesa (Vol. IX.o), 1922, Rio.

    DR. FRANCISCO DE CASTRO (1857-1901), brasileiro.Estante Clssica da Revista de Lngua Portuguesa (Vol. IV.o), 1921, Rio.Polmica Pessoal, Companhia Tipogrfica do Brasil, 1894, Rio.

    JOAQUIM MARIA MACHADO DE ASSIS (1839-1908), brasileiroHelena, W. M. Jackson Editores, 1938, Rio.Quincas Borba, W. M. Jackson. Editores, 1938, Rio.Papis Avulsos, Livraria Garnier, 1882, Rio.A Mo e a Luva, Livraria Garnier, Rio.Histrias sem Data, B. L. Garnier, Livreiro Editor, 1884, Rio.Novas Relquias, Editora Guanabara, Rio.

  • 18 Padre Pedro Adrio

    Americanas, B. L. Garnier, 1875, Rio.Pginas Recolhidas, Garnier, Rio.Memrias Pstumas de Braz Cubas, W. M. Jackson Editores, 1937, Rio.A Semana, Garnier, 1910, Rio.

    SCULO XX

    ERNESTO CARNEIRO RIBEIRO (1838-1920), brasileiro.A Redao do Projeto do Cdigo Civil e a Rplica do Dr. Rui Barbosa, Oficinas dos Dois Mundos, 1905, Bahia (para maior comodidade, citamos esta obra sob o ttulo de Trplica).Pginas de Lngua e Educao, Irmos Pongetti, 1939, Rio.

    D. SILVRIO GOMES PIMENTA (1840-1922), brasileiro.Vida de D. Antnio Ferreira Vioso, 2.a edio, Tipografia Salesiana, 1892, Ni-teri.Cartas Pastorais, Editores Leite Ribeiro & Maurlio, 1921, Rio.A Educao dos Filhos, Tipografia de S. Francisco, 1926, Bahia.

    CONSELHEIRO ALFREDO RUI BARBOSA (1849-1923), brasileiro.A Redao do Cdigo Civil, Rplica s defesas da Redao do projeto da Cmara.Cartas de Inglaterra, Livraria Acadmica Saraiva & Cia., 1929, S. Paulo.Orao aos Moos, Flores & Mano, Rio.Discursos e Conferncias, Empresa Literria e Tipogrfica Editora, 1907, Porto.A Gnese da Candidatura do Sr. Venceslau Braz, Tipografia, Litografia e Papela-ria de Almeida Marques & Cia., 1915, Rio.Runas de um Governo, Editora Guanabara, 1931, Rio.Figuras Brasileiras, Atlntida Editora, Rio.Colunas de Fogo, Editora Guanabara, 1933, Rio.O Divrcio e o Anarquismo, Editora Guanabara, 1933, Rio.Finanas e Poltica da Repblica, Companhia Impressora, 1892, Rio.Coletnea Literria, 4.a edio, Companhia Editora Nacional, 1940, S. Paulo.Esfola da Calnia, a paginao a da Revista de Lngua Portuguesa, nmero de setembro de 1931.A Grande Guerra, Editora Guanabara,1932, Rio.

    CNDIDO DE FIGUEIREDO (1846-1925), portugus.Os Meus Seres, Livraria Clssica Editora, 1928, Lisboa.Combates sem Sangue, Livraria Clssica Editora, 1925, Lisboa.

  • Tradies Clss icas da Lngua Portuguesa 19

    Problemas de Linguagem, Livraria Clssica Editora, 1921, Lisboa.Falar e Escrever, Livraria Clssica Editora (1.o volume 1937; 2.o 1941; 3.o 1929), Lisboa.

    CARLOS DE LAET (1847-1927), brasileiro.Heresia Protestante, Editor A. Campos, 1907, S. Paulo.

    JOS JLIO DA SILVA RAMOS (1853-1930), brasileiro.Pela Vida Fora, Edio da Revista de Lngua Portuguesa, 1922, Rio.

    MRIO BARRETO (1879-1931), brasileiro.Novssimos Estudos da Lngua Portuguesa, Livraria Francisco Alves, 1914, Rio.Atravs do Dicionrio e da Gramtica, Civilizao Editora S/A, 1936, Rio.Fatos da Lngua Portuguesa, Livraria Francisco Alves, 1916, Rio.

    LAUDELINO FREIRE (1873-1937), brasileiro.Notas e Perfis, Edio da Revista de Lngua Portuguesa.

    ANTERO DE FIGUEIREDO, portugus.O ltimo Olhar de Jesus, Livraria Aillaud e Bertrand, 6.a edio, 1929, Paris-Lisboa.Jornadas em Portugal, 5.a edio, Livrarias Aillaud e Bertrand, Paris e Lisboa.Leonor Teles, 5.a edio, Livrarias Aillaud e Bertrand, 1925, Lisboa.Recordaes e Viagens, Livrarias Aillaud e Bertrand, 1925, Paris-Lisboa.Senhora do Amparo, 3.a edio, Livrarias Aillaud e Bertrand, 1920, Paris-Lisboa.

    JOS DE S NUNES, brasileiro.Aprendei a Lngua Nacional, 1.o vol, Livraria Acadmica Saraiva & Cia., 1938, S. Paulo, 2.o volume, Editora S. C. J., 1940, TaubatLngua Verncula (4.a Srie), 1.a edio, Livraria Acadmica Saraiva & Cia., 1938, S. Paulo.

    JOO LDA, brasileiroA Quimera da Lngua Brasileira, 1939, Manaus.

  • Abreviaturas dos Nomes dos Autores

    A. Barros Padre Andr de BarrosA. de S Padre Antnio de SA. Ferreira Dr. Antnio FerreiraAntero Antero de FigueiredoArrais D. Fr. Amador ArraisArte Autor da Arte de FurtarBaslio Baslio da GamaB. Brito Frei Bernardo de BritoBernardes Padre Manuel BernardesBernardim Bernardim RibeiroBocage Manuel Maria Barbosa du

    BocageBotelho Manuel Botelho de OliveiraCaldas Padre Antnio Pereira de Sousa

    CaldasCamilo Camilo Castelo BrancoCames Luiz de CamesCndido Cndido de FigueiredoCastanheda Ferno Lopes de

    CastanhedaCastilho Antnio Feliciano de CastilhoChagas Frei Antnio das Chagas

    Cludio Cludio Manuel da CostaCouto Diogo do CoutoCruz e Silva Antnio Diniz da Cruz

    e SilvaD. Gis Damio de GisDuro Frei Jos de Santa Rita DuroE. C. Ribeiro Ernesto Carneiro RibeiroE. Matos Frei Eusbio de MatosEsperana Frei Manuel da EsperanaF. Castro Dr. Francisco de CastroFilinto Filinto ElsioF. M. Melo D. Francisco Manuel de

    MeloF. Morais Francisco de MoraisF. M. Pinto Ferno Mendes PintoGaro Pedro Antnio Joaquim CorreiaGarrett Joo Batista Leito de Almeida

    GarrettGaspar Frei Gaspar da Madre de DeusG. Dias Antnio Gonalves DiasGil Gil VicenteGonzaga Tomaz Antnio Gonzaga

  • 22 Padre Pedro Adrio

    Herculano Alexandre Herculano de Carvalho e Arajo

    H. Pinto Frei Heitor PintoJaboato Frei Antnio de Santa Maria

    JaboatoJacinto Padre Jacinto Freire de AndradeJ. Barros Joo de BarrosLaet Dr. Carlos Maximiano Pimenta

    de LaetLatino Jos Maria Latino CoelhoLaudelino Laudelino FreireLda Joo LedaLisboa Joo Francisco LisboaLucena Padre Joo de LucenaM. Aires Matias Aires Ramos da Silva

    de EaM. Assis Joaquim Maria Machado de

    AssisM. Barreto Mrio BarretoO. Mendes Manuel Odorico MendesOrta Garcia de OrtaPaiva Diogo Paiva de Andrade SobrinhoPereira Padre Antnio Pereira de

    Figueiredo

    Pita Sebastio da Rocha PitaRebelo Luiz Augusto Rebelo da SilvaR. Lobo Francisco Rodrigues LoboRui Conselheiro Alfredo Rui

    BarbosaSacramento Frei Antnio do

    SacramentoS Miranda Francisco S de MirandaS Nunes Jos de S NunesSeixas D. Romualdo de SeixasSeverim Cnego Manuel Severim de

    FariaSilva Ramos Jos Jlio da Silva RamosSilvrio D. Silvrio Gomes PimentaS. Maria Padre Francisco de Santa

    MariaSotero Francisco Sotero dos ReisSousa Frei Luiz de SousaT. de Jesus Frei Tom de JesusTolentino Nicolau Tolentino de

    AlmeidaT. Vasconcelos Antnio Augusto

    Teixeira de VasconcelosVieira Padre Antnio Vieira

  • Abreviaturas das Obras e Peridicos Citados

    A. AmericanasA. D. Aplogos DialogaisA. de P. Amor de PerdioA. de S. Amor de SalvaoA. D. G. Atravs do Dicionrio e da

    GramticaA. D. J. Anais de D. Joo IIIA. em P. Agulha em PalheiroA. e N. Arte e NaturezaA. H. Ano HistricoA. I. lbum Imperial (revista)Alf. de S. Alfageme de SantarmA. L. N. Aprendei a Lngua NacionalA. P. Antologia PortuguesaArc. de S. Arco de SantanaArte Arte de FurtarAv. O AvarentoB. O BoboB. S. Traduo da Bblia SagradaC. CaramuruC. A. Colquios AldeesCam. Cames

    C. das O. Coleo das ObrasC. D. E. Crnica do Serenssimo

    Senhor Rei D. EmanuelC. de F. Colunas de FogoC. de I. Cartas de InglaterraC. de P. O Condestabre de Portugal

    D. Nunalvres PereiraC. dos F. A Casa dos FantasmasC. E. Cartas EspirituaisC. e L. Contos e LendasC. F. Cartas FamiliaresC. L. Coletnea LiterriaC. L. P. B. Curso de Literatura

    Portuguesa e BrasileiraC. na A. Corte na AldeiaC. P. O Casamento PerfeitoC. Past. Cartas PastoraisC. S. D. I. Colquios dos Simples e

    Drogas da ndiaC. S. S. Combates sem SangueC. U. A. Cenas de um Ano da minha

    Vida

  • 24 Padre Pedro Adrio

    C. V. Composies VriasC. V. H. J. A. O Carrasco de Vtor

    Hugo Jos AlvesD. DilogosD. C. F. Doze Casamentos FelizesD. da M. Delitos da MocidadeD. e A. O Divrcio e o AnarquismoD. e C. Discursos e ConfernciasD. 1.a 1. IV Dcada 1.a, livro IVD. N. T. G. S. P. De noite Todos os

    Gatos so PardosE. EneidaE. C. Estante ClssicaEcl. clogasE. da C. Esfola da CalniaE. dos F. A Educao dos FilhosE. P. Eurico, o PresbteroEst. P. Estrelas PropciasExc. ExcertosF. FaustoF. B. Figuras BrasileirasF. de M. Ferno de MagalhesF. D. N. A Filha do Doutor NegroF. e E. Falar e EscreverF. F. C. Fbulas. Folhas CadasF. L. P. Fatos da Lngua PortuguesaF. L. S. Frei Luiz de SousaF. pela A. Felicidade pela AgriculturaF. P. R. Finanas e Poltica da RepblicaG. As Gergicas de VerglioG. C. B. V. A Gnese da Candidatura

    do Sr. Venceslau BrazG. G. A Grande GuerraH. HelenaH. A. P. Histria da Amrica

    PortuguesaH. de P. Haras de Paz

    H. do D. Histria do Descobrimento e Conquista da ndia pelos Portugueses

    H. G. M. Histria de Gabriel Malagrida

    Hiss. O HissopeH. P. Heresia ProtestanteH. S. D. Histrias sem DataI. V. C. Imagem da Vida CristJ. do B. Jornal do Brasil (dirio do Rio)J. do C. Jornal do Commercio

    (do Rio de Janeiro)J. em P. Jornadas em PortugalL. LusadasL. e N. Lendas e NarrativasL. e T. Lgrimas e TesourosL. T. Leonor TelesL. V. Lngua VernculaM. de C. O Monge de CisterM. de D. Marlia de DirceuM. D. J. A Mocidade de D. Joo V.o

    M. do P. Msica do ParnasoM. e L. A Mo e a LuvaM. e M. Menina e MoaM. H. C. S. V. Memrias para a

    Histria da Capitania de S. VicenteM. L. Monarquia LusitanaM. P. B C. Memrias Pstumas de Braz

    CubasM. S. Os Meus SeresM. U. M. Mil e um. MistriosN. B. J. M. No Bom Jesus do MonteN. de P. Notcias de PortugalN. do C. A Noite do CasteloN. E. L. P. Novssimos Estudos da

    Lngua PortuguesaN. e P. Notas e PerfisN. F. Nova Floresta

  • Tradies Clss icas da Lngua Portuguesa 25

    N. O. S. B. Novo Orbe Serfico Braslico

    N. R. Novas RelquiasO. ObrasO. C. Obras CompletasO da C. Orao da CoroaOd. Odissia de HomeroO. M. Orao aos MoosO. P. Obras PoticasO. V. N. C. dio Velho no cansaP. PoesiasP. A. Papis AvulsosP. A. D. O Prato de Arroz DocePan. PanegricosP. B. E. Portugal na Balana da EuropaP. de I. Palmeirim de InglaterraP. de L. Problemas de LinguagemP. E. Pginas EscolhidasP. R. Pginas RecolhidasPer. PeregrinaoP. L. Poemas LusitanosP. L. E. Pginas de Lngua e EducaoP. P. Polmica PessoalP. P. P. Po Partido em PequeninosP. V. F. Pela Vida ForaQ. B. Quincas BorbaQ. de A. A Queda de um AnjoQ. H. P. Quadros Histricos de

    PortugalQ. L. B. A Quimera da Lngua

    BrasileiraR. RplicaR. de C. Revista de Cultura (peridico)R. de G. Runas de um GovernoR. do P. Riquezas do Pobre e Misrias

    do Rico

    R. e V. Recordaes e ViagensR. H. R. Romance de um Homem

    RicoR. L. P. Revista de Lngua Portuguesa

    (peridico)R. V. H. Reflexes sobre a Vaidade dos

    HomensS. SermesSab. As SabichonasSat. StirasS. de D. Salmos de DaviS. do A. Senhora do AmparoS. N. S. M. Sermo de Nossa Senhora

    das MaravilhasSon. SonetosS. P. O Soldado PrticoT. TeatroTart. TartufoT. de J. Trabalhos de JesusT. I. As Trs IrmsTr. TrplicaU. O. J. O ltimo Olhar de JesusV. A. P. A. V. Vida do Apostlico Padre

    Antnio VieiraV. de P. Vozes de Petrpolis (revista)V. D. J. C. Vida de D. Joo de

    CastroV. do A. Vida do Arcebispo D. fr.

    Bertolameu dos MrtiresV. D. V. Vida de D. Antnio Ferreira

    ViosoV. H. P. Ventura do Homem

    PredestinadoV. M. T. Viagens na Minha TerraV. P. A. V. Vida do Padre Antnio

    Vieira

  • 26 Padre Pedro Adrio

    OBSERVAES SOBRE A MANEIRA DE CITAR

    No havendo indicao especial nas citaes, fica entendido que o algarismo romano indica o volume, e o arbico, a pgina. Havendo antes do nmero alguma indicao em abreviatura, entende-se:

    c. = cantocap. = captulocol. = colunae. = estrofeed. = ediointr. = introduo

    l. = livron.o = nmeropg. = pginapr. = prefciosupl. = suplementov. = verso

    O trao indica que se passa, nas citaes, para autores de outro sculo.

  • Introduo

    I.o O CRITRIO DE CERTEZA NO ESTUDO DA LNGUA PORTUGUESA

    1 O mais elementar cuidado que h de tomar, quem deseja entender no estudo de uma disciplina qualquer, formar ideia bem clara sobre o critrio de certeza, vigente no ramo de conhecimentos que procura adquirir. Tal critrio, claro que no o mesmo para todas as cincias. O fsico se convence do valor de suas teorias porque v, com os prprios olhos, o resultado das suas experincias. O historiador, ao contrrio, no lhe sendo possvel mais presenciar os sucessos passados, firma-se no testemunho de escritores tidos por insuspeitos; conclui e assevera, no porque viu, como o fsico, mas porque outros bem informados disseram. O matemtico est certo da verdade dos seus teoremas, porque a isto chegou pela segurana do clculo e do raciocnio.

    Eis a j trs critrios diversos: a experimentao, o testemunho e a lgica. To ridcu-lo seria o autor de um compndio de fsica ou de matemtica, que afirmasse que corpos dessemelhantes caem com igual rapidez no ar rarefeito ou que os ngulos verticalmente opostos so iguais, simplesmente porque grandes fsicos ou clebres matemticos j o tm asseverado, como um historiador que quisesse provar unicamente pelo raciocnio que os gregos lutaram contra os persas e saram vencedores no estreito de Salamina.

    Antes de mais nada, a precauo que deve tomar quem deseja saber, com segurana, o que est certo ou no na lngua portuguesa, adotar um critrio seguro que lhe sirva de guia no decurso das suas observaes e pesquisas. Muna-se o leitor desta fiel balana que h de pesar, com exatido, o que e o que no boa linguagem portuguesa, e colocar-se-

  • 28 Padre Pedro Adrio

    em terreno bem firme, superior a infinitas questinculas sobre o vernculo que se agitam por a afora; ao revs, por uma desprecauo neste sentido que muita gente boa titu-beia, se desorienta e contradiz. Mas onde haveremos to seguro critrio?

    2 Examinemos os diversos critrios que se possam adotar no estudo da nossa lngua: a l-gica, a autoridade dos fillogos e o uso. Ou haveremos de condenar uma expresso qualquer, porque ela peca contra a lgica, s admitindo o que nos parea razovel segundo o nosso discurso, ou porque contra ela milita a autoridade de gramticos eminentes que se nos apre-sentam como os grandes entendidos no assunto; ou ento porque se insurge contra ela o uso daqueles que se utilizam da lngua portuguesa para veculo de suas ideias.

    3 Vamos primeiramente lgica. Que nos ensina ela?Que o sujeito composto deve levar o verbo para o plural. Entretanto frases como esta:

    PASSAR O CU E A TERRA, em todas as pocas da lngua, foram tidas como corretas e portuguesas.

    Que o sujeito no singular deve ter o verbo no singular tambm. Todavia ningum condenar o provrbio: No princpio TUDO SO FLORES.

    Que a dupla negao equivale a uma afirmativa. NO QUERO NADA logicamente de-veria exprimir quero alguma coisa; em portugus significa nada quero.

    Que no se deve deixar palavra sem ligao na frase. Apesar disto os anacolutos so frequentes no nosso idioma: QUEM com muitas pedras bole, CAI-LHE ALGUMA na cabea.

    Que, desde que o verbo exprime uma ao que o sujeito pratica e o objeto recebe, j no se pode inverter o papel dos membros da orao, ficando o mesmo o sentido da frase. Entretan-to EU ESQUECI O CHAPU E ESQUECEU-ME O CHAPU exprimem a mesma coisa.

    Que, servindo as palavras para exprimir as ideias, no se devero empregar palavras que nenhum sentido encerrassem. H, no entanto, no frasear luso-brasileiro, muitas palavras chamadas expletivas ou de realce, que o sentido da frase perfeitamente dispensa: Que belo dia QUE est fazendo hoje!

    Que uma partcula de negao, colocada em frase que no a possua, deve servir para lhe dar um sentido inteiramente contrrio. Mas tanto dizemos: Que grande sbio foi Pasteur! como Que grande sbio NO foi Pasteur! sem que o sentido da frase sofra alterao alguma.

    Que no se empregue o tempo futuro para exprimir uma ao presente, nem o tempo presente para indicar uma ao que j passou. Mas isto o que fazemos frequentemente: Que ESTAR pensando agora o nosso amigo? Csar DECIDE-SE, ATRAVESSA o Rubico e MARCHA contra Roma.

    Que um sujeito da 3.a pessoa deve levar o verbo para a 3.a. Contudo na frase: FUI EU QUEM FIZ, o sujeito QUEM, que da 3.a, tem o verbo na 1.a.

  • Tradies Clss icas da Lngua Portuguesa 29

    4 Muitos outros exemplos poderamos apontar; so estes, porm, suficientes para que se veja, saciedade, como pode estar sujeito a enganos, quem quiser formular regras de vernaculidade, baseando-se simplesmente nas estreitas exigncias da lgica. sabido mas nunca ser demasiado o repeti-lo diz o grande fillogo vienense Meyer Lubcke na sua Introduo ao Estudo da Glotologia Romnica que a lgica nada tem que ver com a glotologia; se frequentemente coincidem, tambm a mido seguem caminhos diferentes.

    Que adianta condenarmos uma expresso pelo fato de no se nos afigurar razovel, se o uso geral da lngua, desde os seus incios at hoje, o uso dos homens cultos emparelha-do com o da arraia-mida, o uso dos grandes e pequenos escritores, juntamente com o dos no escritores, a consagrou? No isolar-se um indivduo no crculo de suas opini-es, o pretender que a lngua, que de todos, se ajuste ao modo de ver e de interpretar de um s? Nos domnios da linguagem, portanto, a lgica das teorias h de ser subordinada a uma lgica bem mais imperiosa: lgica dos fatos consumados.

    5 Tempos houve em que predominou esse critrio do razovel entre os gramticos. Hoje porm, todos os grandes mestres da filologia portuguesa tm seguido orientao bem diversa. No obstante, alguns resqucios de regras ditadas pela lgica contra o testemunho dos fatos, ainda fazem impresso nos estudiosos da nossa lngua. Ainda h quem considere um erro crasso empregar dois verbos de regime diverso com o mesmo complemento: proibido SUBIR E DESCER DOS BONDES em movimento (veja-se o n.o 697). Ainda h quem evite e condene a contrao da preposio com o sujeito das subordina-das infinitivas ou com o artigo que o vem acompanhando: Sa antes DELE CHEGAR. So horas DO TREM PARTIR (veja-se n.o 691). Ainda h quem estranhe o emprego de MEIO advrbio flexionado, p. ex: homens MEIOS mortos (veja-se o n.o 332), a elipse do EM antes do pronome relativo, aps certas expresses que trazem ideia de tempo: no dia QUE che-guei (veja-se o n.o 824) o uso das partculas comparativas TO, MAIS acompanhadas de adjetivo, no em forma normal, mas em grau superlativo: MAIS NFIMO, TO MNIMO (veja-se o n.o 292). Construes so estas, no entanto, se bem um pouco renhidas com a lgica, de uso legtimo e corrente na boa linguagem portuguesa.

    6 O segundo critrio, a que nos poderamos socorrer, seria a autoridade dos gram-ticos e fillogos.

    Seria errnea uma expresso que grandes e eminentes vultos da filologia luso-brasilei-ra condenassem; acertada, aquela em prol da qual militassem respeitveis autoridades.

    Em grande confuso se veria desde logo, quem quisesse seguir s esta norma diretriz no estudo da nossa lngua, pois os gramticos no raro discutem e no raro ateimam porfiosamente nas suas discusses.

  • 30 Padre Pedro Adrio

    No h a negar o valor que tm as opinies daqueles que, estudando a fundo os documentos da antiga e moderna linguagem, emitem parecer em que traduzem a im-presso que lhes deixaram inteligentes e prolongadas leituras. Mas, como j se tem dito e redito de sobejo, no aos gramticos e fillogos que compete legislar como a lngua deve ser; eles a descrevem simplesmente tal qual ela . Para a grande maioria daqueles que se no podem dar ao trabalho de estar manuseando obras e mais obras da literatura, ou que, antes de poder faz-lo, j precisariam ter noes bem firmes e assentadas sobre o vernculo, pois so obrigados a compor e redigir, oferecem eles, os fillogos, a grande vantagem de condensar, concatenar e resumir os conhecimentos que lhes advieram de suas laboriosas investigaes, apresentando aos leitores ou discpulos um caminho j bastante andado. Pode acontecer, porm, que alguns menos escrupulosos, aferrando-se a regrinhas pessoais, desprezem ou ocultem certos fatos lingusticos ou citaes valiosas que contra elas claramente deponham. Ou, sendo to vastos e complexos os fatos da ln-gua, pode suceder que a um fillogo, embora muito lido e versado nos autores, escapem certas particularidades que outros lhe apontam ou para as quais, leituras posteriores lhe chamam mais nitidamente a ateno. Da se tem visto, com grande edificao, que respeitveis autoridades filolgicas, depois de haverem emitido certas opinies, por um nobre sentimento de amor verdade, chegaram a retrat-las.

    Foi o que se deu para darmos um s exemplo, mas este bem expressivo com o extraordinrio mestre da lngua que j tivemos no Brasil, o Sr. Mrio Barreto. Seguindo ao autorizado gramtico Jlio Ribeiro, ele havia condenado a expresso deram onze horas; o certo havia de ser somente deu onze horas. Este seu testemunho fora aproveitado pelos ilus-tres fillogos Antenor Nascentes e Carlos Gis para justificarem a condenao da frase referida. Mas no seu livro Atravs do Dicionrio e da Gramtica, pgina 304, Mrio Barreto se penitencia desse erro e cita frases de Frei Luiz de Sousa, Vieira, Garrett, Castilho, Antnio Ribeiro de Saraiva, Mendes Leal, Rebelo da Silva, Andrade Corvo e Pinheiro Chagas em abono da construo estigmatizada.

    Por a se v o perigo de adotar-se uma opinio, simplesmente porque um fillogo eminente a esposou. Mrio seguiu a Jlio Ribeiro, outros j seguiram a Mrio e certa-mente muitos e muitos professores, baseando-se em uns ou em outros, transmitiram o preconceito aos seus alunos.

    Pode, portanto, uma construo ajuntar, contra si, grande quantia de gramticos e fillogos, e ser, no entanto, de legtimo cunho vernculo.

    A opinio dos mestres da lngua, s por si, no vale como critrio de certeza. A lngua j existia antes de doutrinarem eles; falece-lhes autoridade para alter-la; incumbe-lhes ensin-la e descrev-la tal qual a encontram nos seus estudos e pesquisas e no como eles quereriam que ela fosse, para atingir a perfeio. Valem muito suas

  • Tradies Clss icas da Lngua Portuguesa 31

    opinies, quando documentam as prprias asseres com os fatos da linguagem; mas neste caso a garantia de certeza est nos fatos que apresentam, que no no peso da sua autoridade.

    E observemos de passagem mais fcil, para eles, documentar a legitimidade que a condenao de uma palavra ou sintaxe qualquer. Para legitimar, basta citar os autores graves que a perfilharam. Para condenar, no suficiente demonstrar que os bons autores usaram de outras expresses em vez daquela que se pretende proscrever; possui a nossa lngua ampla variedade de recursos e o fato de uma concordncia, regncia ou colocao ser aceita, no exclui a possibilidade de outras variantes serem corretas e legtimas tambm.

    7 Resta-nos por conseguinte adotar, como critrio de certeza, o uso. Cada lngua possui o seu patrimnio de vocbulos, locues, construes sintticas, modismos e torneios de expresso que se vo transmitindo, de gerao a gerao, pela literatura e pela tradio oral. A se nos apresenta ela em plena pujana de seus tesoiros adquiridos pela origem da lngua-me, pela influncia regular de lnguas estranhas, pelos hbitos e praxes introduzidos no falar quotidiano. a que a iremos procurar para lhe conhecermos os segredos, os recursos e as opulncias.

    8 Mas ainda no achamos toda a soluo para o problema do critrio de certeza, com o admitirmos o uso por norma diretriz nos estudos lingusticos. No meio do uso, introduz-se o abuso. H o uso dos que escrevem a primor e dos que manejam bem de-sastradamente o idioma.

    O uso que vale como lei, em gramtica, o dos escritores que, levados por amor acendrado ao idioma, o dignificaram nas suas lucubraes, elevando-o a um alto grau de perfeio; o uso daqueles que melhor, mais elegantemente e com maior fidelidade ndole da lngua, dela souberam utilizar-se, para exprimir as suas ideias; em suma, o uso daqueles que se podem apresentar como modelos seguros juventude das escolas, sendo-lhe postos mo como guias exemplares na exteriorizao dos pensamentos e a que por isto ns chamamos os autores clssicos da lngua.

    9 Estabelecido este princpio do uso clssico por norma de vernaculidade, no h fugir a duas objees que se apresentam espontaneamente ao esprito do leitor: 1.o Havemos de admitir como modelos aqueles que melhor manejaram o idioma, mas como saberemos quais os que o manejaram melhor? 2.o Ainda mesmo que saibamos qual a seleo que havemos de fazer entre os autores, como poderemos aceitar a infalibilidade dos clssicos, se, ao manusearmos as obras daqueles que so apontados unanimemente

  • 32 Padre Pedro Adrio

    como tais, encontramos, nos antigos, expresses arcaizadas que no nos dado hoje usar, modos de falar tidos j agora por deselegantes e, nos antigos e modernos, s vezes, at erros crassos que todos os fillogos condenam e todos os que se esmeram em falar bem o nosso idioma cuidadosa e repugnadamente evitam?

    10 A primeira objeo, fcil desmoron-la desde que atentamente se considere na histria do portugus. Este no mais do que o latim que nele se transformou, como se transformou tambm no francs, no espanhol, no italiano etc. Mas no assim da noite para o dia que uma lngua se transmuda em outra diversa. Durante muitos sculos, os habitantes da Pennsula Ibrica falaram alguma coisa que no era, nem o latim, nem o portugus de hoje, mas um dialeto de transio.

    Por todo esse tempo, o portugus propriamente no existia. Dos fins do sculo XV para o sculo XVI que a evoluo se completou, dando-se ento, por assim dizer, o nascimento da lngua portuguesa. Surgem ento, nos sculos XVI e XVII, grandes escritores, que providencialmente se tornam os plasmadores do idioma nascente; eles cristalizam, divulgam, aperfeioam nos seus livros, lidos ainda hoje com agrado, a lin-guagem colhida no seio do povo e dos homens cultos do seu tempo, linguagem sada dos moldes do latim popular, mas que tomou, no novo idioma, suas flexes prprias, seu tom original, sua feio caracterstica. Acontece tambm que, embora contnua tenha sido a influncia do francs na nossa lngua desde o perodo arcaico, mesmo assim nesses sculos XVI e XVII, chamados com razo o perodo ureo do portugus, no havia ainda a invaso dos galicismos, a mania de afrancesar.

    Se os grandes escritores desses sculos enriquecem com termos novos o vocabulrio popular, eles os vo buscar nas fontes genunas do mais puro latim clssico, estudo que era moda entre os letrados daquele tempo, alm de que a maioria dos escritores de ento surgem da carreira eclesistica, a quem a lngua oficial da Igreja no podia ser estranha.

    Os neologismos que ento aparecem, opulentando o nosso lxico, no destoam da ndole da lngua portuguesa, porque a aproximam ainda mais da lngua-me; e h or-gulho, entre os homens de letras da poca, em expressar-se numa lngua que a latina com pouca corruo. Assim que, os escritores desses dois sculos so, por sua natu-reza, escritores modelares, pois a linguagem corrente na poca era pura e genuinamente portuguesa, bastando que sejam notveis como escritores, para logo os consagrarmos como clssicos e dignos de toda a considerao da nossa parte. Sem negarmos o valor de muitos outros, avultam entre eles Luiz de Cames, a quem tanto deve a nossa lngua pela ampla difuso do seu imortal poema os Lusadas; Joo de Barros, S de Miranda, Fr. Heitor Pinto, Gil Vicente, Antnio Ferreira, D. frei Amador Arrais, Bernardim Ribeiro

  • Tradies Clss icas da Lngua Portuguesa 33

    para o sculo XVI; e Fr. Luiz de Sousa, Padre Manuel Bernardes, Padre Antnio Vieira, D. Francisco Manuel de Melo e Padre Jacinto Freire de Andrade para o sculo seguinte, que todos se mostraram opulentos, castios e escorreitos cultores do idioma, a cujo brilho e esplendor fizeram servir seus primorosos engenhos.

    Do sculo XVIII comea uma poca de declnio. No ostentam mais os escritores desse tempo a opulncia dos antigos e, pior ainda, a influncia francesa torna-se avassa-ladora e absorvente; chovem os galicismos e vai-se descurando a pureza e correo dos primrdios. Contudo h vozes que clamam bem alto pela pureza da lngua e entre elas avulta Filinto Elsio, que se esmera por escrever com o primor e a correo dos seiscen-tistas.

    No sculo XIX, bom nmero de escritores portugueses e brasileiros, reagindo bri-lhantemente contra os estrangeirismos, as inovaes descabidas, o abastardamento da lngua e o mau gosto reinante, inspiram-se nos bons autores antigos e apresentam, com as roupagens do estilo moderno, as galas e riquezas da antiga linguagem. Seus nomes so bem conhecidos: Castilho, Herculano, Latino Coelho, Rebelo, Camilo, Garrett, Macha-do de Assis, Gonalves Dias, Lisboa, Francisco de Castro e muitos outros.

    No sculo XX, a reao do sculo anterior continua; grandes fillogos teram armas em prol da correo e magnificncia do idioma, e h escritores que seguem galhardamen-te a esteira dos antigos, no sendo lcito esquecer, entre eles, por exemplo, Rui Barbosa, Carlos de Laet e D. Silvrio Gomes Pimenta.

    No difcil, portanto, encontrar quais os que melhor souberam manejar o nosso idioma; a histria deste, bem claramente os aponta para que os sigamos e imitemos.

    11 Passamos segunda objeo que um pouco mais sria. De fato encontramos, uma que outra vez, nos clssicos, extravagncias que no so para imitar.

    Filinto Elsio emprega frequentemente CUJO em vez de que relativo, mas isto s se ouve no frasear do povo inculto: Logo lhe perguntou se tinha ali a carta de Verneuil, CUJA lhe en-tregou Madama dEmbleville (Filinto O. C. XI-462). Garrett usa CHEFE DE OBRA que um galicismo de arrepiar cabelos: Eu hei de perder os meus CHEFES DE OBRA? (Garrett. V. M. T. I-28). Deste mesmo erro no ficou isento o nosso D. Romualdo de Seixas. Gonalves Dias usa a nclise em verbo de modo finito, depois da negativa: Tambm me no lembra... por que razo da morte me queixo, que vejo e NO V-ME to sem compaixo. Tal falha se encontra tambm nos escritos de Odorico Mendes e nas primeiras crnicas de Carlos de Laet. Castilho peca pela repetio do artigo no superlativo relativo: Quer-se tudo em seu lugar e o brdio, o MAIS BEM SERVIDO (Castilho. Av. 167). Igualmente caiu no emprego desta construo afrancesada o Sr. Alexandre Herculano: Trs anos de ordinrio NA poca da vida, A MAIS APTA para os estudos que requerem o uso da memria, se gastam com o desta lngua (Hercu-

  • 34 Padre Pedro Adrio

    lano C. V. 44). Pode acontecer que, para o futuro, tal emprego se torne por tal forma generalizado que se chegue a perdoar o galicismo, como j bacorejou ao eminente Silva Ramos; para isto ter infludo bastante o exemplo de to conspcuos escritores como foram Herculano e Castilho; entretanto no deixar de ter sido um vcio de linguagem no tempo em que eles escreveram. Machado de Assis baralha dois tratamentos diversos, o que considerado por todos grosseira incorreo gramatical: VOCS aqui esto comigo, dou-lhes tudo; alm da minha conversao, VIVEIS em paz, ainda os que sois inimigos, lobos e cordei-ros, gatos e ratos (M. Assis Sem. 141). Rui que tanto fugia aos estrangeirismos emprega MEETING onde podia empregar comcio:... como se fecha de noite, no recinto dos teatros, o registro do gs para assassinar o povo indefeso e afogar em sangue os MEETINGS abolicionistas (Rui D. e C. 191). O Sr. Tenrio de Albuquerque enumera vrios galicismos de Camilo Castelo Branco, entre os quais se encontram BOUDOIR, DEBUTAR, MADEMOISELLE, PENVEL, RENDEZ-VOUS, SOIRE, etc.

    Em menor proporo decerto, mas acontece-lhes aos escritores o que se d com os jogadores de xadrez, de futebol ou de bilhar: os melhores, os mais destros, os mais per-feitos caem sempre em alguma falha. O mesmo passa na nossa vida moral: os homens mais honestos e conceituados esto sujeitos sempre a alguma fraqueza.

    Neste mundo, em nada se h de encontrar a perfeio absoluta; a triste condio dos humanos. No h escritor, por mais profundo conhecedor da lngua, que no tenha, uma vez ou outra, seus deslizes. So inadvertncias que escapam ao correr da pena e que uma meticulosa reviso no se encarregou, depois, de corrigir; o efeito da poderosa influncia da conversao ou dos outros escritores, que nem sempre primam num portu-gus genuno; pode ser em alguns casos o desejo de surpreender e recrear o leitor ou de introduzir, com a ampla autoridade de que goza, alguma novidade na linguagem. Algu-mas vezes at, o erro no do autor, mas do tipgrafo, que, inadvertidamente, adulterou o texto, contribuindo assim para lanar confuso.

    Tais falhas escandalizam, decepcionam, claro, os estudiosos que, desde que tomam tais e tais autores por mestres do dizer, desejariam ver neles o dom de infalibilidade no meneio da lngua, o que tornaria muito mais fcil o estudo desta, exigindo-se, em tal hiptese, muito menos leituras e muito menor precauo. Mas que se h de fazer seno aceitar os fatos tais quais se nos apresentam? Na falta de escritores fecundos e, ao mesmo tempo, infalveis, escolhemos, por modelos, aqueles em que o erro muito mais raro e que, alm disto, mais vastos conhecimentos revelaram dos recursos da lngua.

    Recolhemos os grandes tesouros que eles nos deparam em seus livros, para pr em circulao o ouro que nos oferecem, se bem, quando menos esperamos, surja a moeda falsa que preciso desprezar. E havemos de concluir desta falibilidade dos artistas da palavra, no que seja intil inspirarmo-nos nestes modelos, seno que o testemunho

  • Tradies Clss icas da Lngua Portuguesa 35

    de um ou outro escritor no basta, em geral, para firmar doutrina em portugus. Se se fosse admitir, como prova de vernaculidade, uma s citao, bastaria, por vezes, um erro tipogrfico para apadrinhar uma enormidade lingustica. Andar catando, um por um, os descuidos ou singularidades, para destruir as regras de gramtica, seria introduzir a mais completa anarquia no seio da nossa lngua.

    Admitimos, por norma, no o testemunho de um clssico, mas o uso dos clssicos. a tradio que se firmou na lngua e no a voz insulada e falvel de um ou outro escritor que pode legitimar uma locuo, vocbulo ou maneira de dizer; o exemplo de vrios autores clssicos que se confirmam e corroboram na aceitao dos dizeres peculiares ao idioma. O que porventura se encontrar nesta ou naquela obra clssica, aberrando clara-mente da praxe dos autores modelares, pode constituir tipo curioso de excentricidade filolgica; jamais constituir uso clssico, pois o emprego espordico de uma expresso repudiada dos bons autores no se pode batizar com o nome de legtima tradio. Tais aberraes denunciam-se facilmente, a quem seja bem lido nos clssicos, pelo exotismo berrante com que se presentam, em confronto com o uso geral dos mestres autorizados da linguagem.

    Este uso geral, sim, que canoniza e consagra.Ora, h inmeras particularidades da lngua portuguesa que gozam do abono de vrios

    escritores clssicos, em todas as pocas da sua existncia como autnoma e independente, isto , desde o sculo XVI at os nossos dias; so expresses que vm vigorando desde cin-co sculos na escrita dos melhores e mais ldimos representantes do linguajar portugus.

    Constituem tradies abalizadssimas que a ningum lcito destruir ou rejeitar, pois vm acompanhando a lngua em toda a sua histria, no discurso de toda a sua evoluo.

    Pouco importa que a alguma orelha mais caprichosa, elas soem mal. Escusado insurgir-se algum contra fatos que so de ontem e de hoje e sero de amanh, porque tm sido de todas as pocas da lngua portuguesa.

    No decurso de todo este livro, ter ocasio, o leitor, de ver e apreciar, frequentes vezes, tal concordncia admirvel entre os antigos e modernos escritores clssicos no usarem certas e determinadas expresses que se mostram assim, por este uso constante, como genuna e indiscutivelmente vernculas.

    12 H muita coisa, porm, que se encontra nos melhores escritores antigos e no mais em uso entre os modernos. Devero tais expresses ser canonizadas como lcitas e aconselhveis? At que ponto so os antigos dignos da nossa imitao?

    Merecem os velhos autores ser imitados em tudo aquilo que bem se ajusta com as exigncias e com a estilstica do frasear moderno.

  • 36 Padre Pedro Adrio

    A moda na linguagem tem muito de semelhante com a moda no vestir; cada poca, na histria de um povo, concebe a elegncia, seja no vestir, seja no dizer, sua feio; e o que julgado elegante num tempo pode ser considerado ridculo, extico, estapafrdio noutro, o que no impede, entretanto, bastas vezes, a reabilitao inesperada de uma moda por longo tempo desprezada e esquecida pelo desuso. O escritor no est obriga-do a empregar s e exclusivamente as expresses que correm no seu tempo; mas o est a usar da elegncia, tal qual a concebe a sua poca.

    Desde que a expresso antiga ouvida com prazer e sem escndalo na linguagem mo-derna, pode ser readmitida no uso, pois pertence ao patrimnio da lngua; e os mestres do bem falar e escrever tm, de feito, ressuscitado inmeras formas de dizer injustamente relegadas ao olvido; toam bem no falar de hoje e se apresentam aparentemente como neo logismos, sendo, ao contrrio, velhos tesouros ocultos no rico escrnio da nossa ln-gua e postos novamente em circulao.

    Quando a frase ou a palavra antiga reaparece assim nos bons autores de hoje, j isto bom sinal de que bem merece o ressurgimento. Mas desde que se pode supor que nem todo o oiro de bom quilate que se encontra nos quinhentistas e seiscentistas j foi trazido novamente ao uso corrente, ainda h decerto muita expresso antiga que possa empregar-se com vantagem nos tempos atuais, mesmo que se no encontre nos escritores clssicos de pocas mais recentes.

    13 Ao lado destas, porm, h muitas outras que seria escandalosa e ridcula imprudn-cia querer ressuscitar e introduzir no falar de hoje. curioso observar como esto neste caso muitas formas sincrticas, usadas pelos melhores clssicos de antanho, hoje, porm, tidas como deselegantes, errneas e absurdas na linguagem literria e no falar das rodas cultas, mas que se conservaram por tradio oral nos meios populares.

    O nosso povo ainda diz como diziam os bons escritores antigos: ADONDE = onde (Jaboato N. O. S. B. II-53); AMEDRENTAR (Filinto P. 101); AMENH (Couto S. P. 102); ANRIQUE (Sousa V. do A. I-222); ANTRE ELES (F. Morais P. de I. 43); BER-TOLAMEU (Jacinto V. D. J. C. 146); CATERINA (Sousa V. do A. I-233); CONCRUSO (F. Morais P. de I. 80); CONTIA = quantia (Sousa A. D. J. II-217); CORENTA (Couto S. P. 102); DEREITO (Couto S. P. 6); DESPOIS (Bernardes P. E. 234); DEVAO (B. Brito M. L. I-55); DIXE do verbo dizer (D. Gis C. D. E. I-II); EMPARO = amparo (Sousa V. do A. II-93); ENTONCES (Gil T. 143); FREMOSO (A. Ferreira P. L. 96); FROL = flor (H. Pinto I. V. C. III-43); FRUITA (Sousa V. do A. I-136); HAI do verbo haver (D. Gis C. D. E. I-98); INGRS (Cames T. 26); LANOL (F. M. Melo A. D. 22); MARGULHO (F. M. Melo A. D. 455); MENH (S Miranda O. C. 234); PIADOSO (A. Ferreira P. L. I-73); PREFEIO (Severim N. de P. I-57); SALAMO (Severim N. de P. I-1); SALUO

  • Tradies Clss icas da Lngua Portuguesa 37

    (H. Pinto I. V. C. II-66); SALVAGE (F. Morais P. de I. 34); SANCRISTO (Bernardes P. E. 281); SEMBRANTE (Sousa V. do A. II-89); SOJIGAR = subjugar (A. Ferreira P. L. II-97); SOMANA (D. Gis C. D. E. I-38); SUSTANCIOSO (R. Lobo C. na A. 38); TODALAS COUSAS (F. Morais P. de I. 31); TREIO (F. M. Melo A. D. 314); TROCER (F. Lobo C. na A. 57); VARGES = vrzeas (Bernardes P. E. 273) etc., etc.

    Tais formas que j estiveram em moda entre as pessoas cultas, no o esto mais hoje; e um escritor que se preze, no querendo escandalizar pelo plebesmo, atualmente as evita, para no destoar da elegncia e distino, tal-qualmente as concebe o tempo em que escreve.

    14 E aquilo que os modernos empregam, mas no se encontra nos antigos, porque veio depois com a incessante evoluo da linguagem? Havemos de seguir os modernos quando empregam maneiras de dizer que os antigos cuidadosamente evitaram? Se a tradio constante dos bons escritores, desde os primeiros tempos da lngua at hoje, que forma o indiscutvel, segue-se da que se estabelea a confuso sobre as formas mo-dernas em cujo abono tal tradio no pode ainda ser invocada? Quem quer escrever cor-retamente a lngua no pode aceitar, de mo beijada, quantas inovaes por a apaream nas gazetas e na literatura, que so s vezes estrangeirismos inteis e pedantescos, filhos da ignorncia dos recursos do vernculo e de uma ridcula e desfrutvel xenomania.

    Mas desde que h entre os escritores modernos, tambm zelosos defensores da pureza da linguagem, temos que confiar deles uma orientao segura que nos indique o que se h de admitir ou evitar. No podemos aceitar, como prova de vernaculidade, uma ou outra citao isolada, pois facilmente pode mesmo o bom autor cair em deslize, mxime influenciado pelo ambiente literrio em que vive e contra o qual tem que reagir seriamente para escrever um portugus genuno. Mas desde que vrios escritores modernos de reconhecida autoridade patrocinam certo vocbulo ou maneira de dizer, temos que admiti-los. Ainda no h tradio bem slida e firmada no caso; h, porm, o incio bem fundamentado de uma tradio futura que ser inevitvel. O prestgio destes autores, cada vez maior proporo que se vo tor-nando mais antigos, o prestgio destes autores, tidos j hoje e, com maioria de razo, amanh, como espelhos de todos na linguagem, levar outros bons autores que neles se iro abeberar, a escrever da mesma maneira. E a tradio, uma longa e invencvel tradio, vir a consagrar definitivamente tais vocbulos e tais maneiras de dizer.

    15 Resumindo:Temos que admitir um critrio seguro para sabermos o que legtimo e o que no ,

    em portugus; sem isto cairemos nas maiores incoerncias. Este critrio no a lgica, pois rigidez de suas normas a lngua propriamente no atende; nem a opinio dos gra-mticos que no engendram leis, apenas apontam, coordenam, discriminam os fatos da

  • 38 Padre Pedro Adrio

    linguagem. H de ser o uso dos bons autores clssicos: ou dos antigos juntamente com os modernos, se uma expresso chega a lograr este belo consenso, acompanhando assim a lngua em todo o seu evolver; ou dos antigos somente, se este uso bem se casa com a elegncia do falar de hoje; ou dos modernos somente, mas em nmero suficiente para indicar que o fato dar forosamente em legtima tradio.

    E assim encerrando estas consideraes, vamos logo satisfazendo natural pergunta do leitor: e o que que se encontra nos clssicos? o que lhe indicaremos, em traos gerais, em todo o restante deste modesto e despretensioso trabalho.

    II.o CARACTERSTICAS DA LINGUAGEM CLSSICA

    16 O que h notvel nos clssicos e os extrema dos mais autores resume-se em trs qualidades:

    1.o OPULNCIA NO LXICO.

    Conhecedores profundos da lngua, a cujo estudo se dedicam com ardor, desencavam-lhe os tesouros, pondo-os em circulao e apresentam abundante vocabulrio, repleto sempre de instrutivas surpresas para o leitor, ainda o no pouco versado nos segredos do idioma.

    Se a nossa lngua apresenta, nos seus vocbulos, inmeras variantes e mltiplos recur-sos para exprimir as ideias, aqueles cujo conhecimento do lxico no vai muito longe, restringem-se, de ordinrio, ao emprego do que mais usual, com desprezo ou desco-nhecimento do mais inusitado. Os clssicos, no. Se uma palavra se apresenta sob diver-sas formas, ele as empregam todas; os sincretismos pululam nos seus escritos. Se mudou de significao com o decorrer dos tempos, revivem eles a acepo antiga. Se caiu em desuso e no destoa da linguagem moderna, pem-na em uso novamente. Partculas que se equivalem so usadas alternadamente. E mantm assim o leitor maravilhado a cada passo com alguma novidade que surde do, quase se diria, inesgotvel tesoiro do idioma, evitando, com a opulncia, o montono e desenxabido das repeties.

    2.o GENUINIDADE.

    A abundncia que ostentam, entretanto, no anrquica nem viciosa. Dela so exclu-dos os estrangeirismos injustificados, as inovaes destoantes. Se necessria a palavra

  • Tradies Clss icas da Lngua Portuguesa 39

    estrangeira a fim de exprimir ideia nova, para a qual no dispunha o nosso lxico de meios de expresso, adotam o neologismo, acomodando-o, quanto possvel, feio e ao gnio do idioma. Se h, porm, na abundante prata de casa, meios com que expressar a ideia, refugam o estrangeirismo desnecessrio que s serviria de abastardear e corromper a linguagem corrente. Evitam o intrometido galicismo, as flexes que no so prprias da nossa lngua, as regncias no consagradas pela tradio, os modismos e idiotismos que no so nossos, e s tm valor expressivo no falar de outros pases. Quando, porm, o estrangeirismo j se naturalizou, fez-se de casa, confundiu-se perfeitamente com os vocbulos do nosso lxico, ento no hesitam em consagr-lo pelo uso e aproveit-lo tambm como material para sua riqueza e opulncia.

    3.o VARIEDADE SINTTICA.

    Limitar-se ao normal, empregando s a ordem direta, dando matematicamente, a cada ideia, a expresso correspondente, usando s a concordncia regular, a re-gncia mais comum, a funo ordinria dos membros da frase revelar muito senso de disciplina gramatical, no resta dvida, mas tambm renunciar ao prazer e ao direito de usar uma frase mais harmoniosa, mais deleitosa ao ouvido, e, sobretudo, mais enrgica e elegante no revestir os conceitos. O escritor clssico, liberto das peias de uma estreita rigidez sinttica, sujeita-se disciplina gramatical no evitar o solecismo grosseiro, mas no no preferir o regular, quando o irregular se lhe afigura mais expressivo e galante.

    A ordem pode ser direta ou inversa conforme soa melhor a orao. A colocao dos pronomes oblquos, sem ser arbitrria ou escandalosa, feita com variedade maior que a da conversao ou a do comum dos escritores. A elipse frequente representa o intuito de primar pela elegncia na economia das palavras, sem embargo de que o frequente pleo-nasmo revela tambm a elegncia no frisar e encarecer bem, quando se faz mister, a ideia que se transmite ao leitor. O anacoluto, rompendo audaciosamente com a regularidade da construo normal, encanta pelo imprevisto e pelo caloroso da expresso.

    H, assim, nos seus escritos, extrema variedade nos modos de dizer, variedade com que se apresenta a lngua em toda a sua robustez, atraente, malevel, harmoniosa, abun-dante, opulenta, prenhe de surpresas para quantos tm a dita de a ouvir manejar com segurana e perfeio.

    17 Entretanto estas trs qualidades que acima apontamos no brilham com igual intensidade em todos os autores clssicos.

  • 40 Padre Pedro Adrio

    Camilo e Garrett foram mais notveis pela opulncia e variedade do seu dizer do que pela genuinidade. Machado de Assis, muito menos opulento do que eles, foi, no entanto, mais cuidadoso quanto pureza da linguagem. Rebelo da Silva no teve tanto gosto em reviver os dizeres antigos como tiveram seus compatrcios e contemporneos Castilho, Garrett, Camilo e Herculano, nem como o nosso D. Silvrio. Rui notabilizou-se por uma modalidade de opulncia de que muitos outros no cogitaram: a criao de termos novos, de legtimo cunho vernculo. Este mesmo Rui, sim, juntamente com Herculano, porm mui raros com eles (tirante os trs grandes expoentes do perodo ureo, Vieira, Bernardes e Fr. Luiz de Sousa), mui raros podero rivalizar no belo equilbrio das trs qualidades da linguagem clssica opulncia, pureza e variedade possudas em elevado grau, com este cego genial que foi Antnio Feliciano de Castilho, o qual no nos admi-ra, se por algum for considerado o mais perfeito, o mais completo, o mais autorizado clssico moderno da lngua portuguesa.

  • Primeira Parte: Opulncia Lxica

  • CAPTULO I

    ACEPES DE SABOR CLSSICO

    18 Esto sujeitas as palavras, nas lnguas vivas, a evoluo contnua, no s no seu elemento material ou snico, mas tambm na sua significao. A associao de ideias, o gracejo, a ironia, a influncia estrangeira, o gosto das metforas, os ditos que se vo introduzindo no seio do povo, a confuso de um termo com outro parecido, se vo encarregando de gerar semelhantes alteraes semnticas. E assim, o sentido das pa-lavras no raro alarga-se, restringe-se, inclina-se para o lado bom ou para o lado mau, encarado sob um ou sob outro aspecto em diversas regies ou em vrias pocas da histria da lngua, e s vezes vai sofrendo mudanas sucessivas e paulatinas, at dar em significao visivelmente diversa. Da se gera, fartas vezes, certa diferenciao entre o sentido primitivo da palavra, aquele com que ela se apresenta desde os tempos antigos, nos mais autorizados documentos da linguagem literria, e o sentido mais usual nos dias de hoje, aquele em que ela se emprega mais geralmente em nossa poca, nos jornais, nos discursos, nos livros, nas palestras.

    Reviver o sentido tradicional, embora o menos comum atualmente, mostrando assim conhecimento da nossa literatura, comunicar elegantemente, palavra hoje corrente, um sabor de novidade com lhe no deixar esquecer a significao antiga, eis o que chamamos dar a uma palavra a acepo de sabor clssico.

    margem da linguagem falada, to fcil em alterar o sentido das palavras, sobretudo em esquecer vocbulos e construes genuinamente nossas, ou pela pobreza de recursos lxicos de que se usa lanar mo na conversao quotidiana ou s vezes pela preferncia dada a novidades exticas e a desajustados estrangeirismos, margem da linguagem falada e da dos escritores que tmida e pobremente se limitam a segui-la de perto, est a linguagem dos clssicos, menos esquecedia, mais conservadora, mais atenta em no permitir que mergulhem no esquecimento os antigos usos da lngua ou, em outros ter-mos, mais amiga da tradio.

    Este amor tradio de maneira alguma envolve desprezo ou desconhecimento do sentido que tm as palavras na linguagem moderna.

    Nem tambm importa a legitimao de arcasmos semnticos. H palavras atualmente correntes que tiveram outrora um sentido, o qual est hoje completa e irrevogavelmente

  • 44 Padre Pedro Adrio

    em desuso. FAZENDA j significou, sentimento, ao, procedimento: fez FAZENDA de bom cavaleiro (citado por Morais). MESURA j quis dizer generosidade: MESURA seria, senhor, de vos amercear de mi (Cancioneiro do Vaticano). CATAR: olhar, observar. Quem ao diante no CATA, atrs cai e malbarata (provrbio antiqussimo). Certo, no so arcasmos deste feitio que vamos aqui recomendar; as acepes de sabor clssico que ns apresentamos so autorizadas pelo uso de escritores, tanto antigos como modernos.

    19 No se objete que lanar a confuso no seio da lngua, o empregar uma palavra em sentido diverso daquele em que geralmente se emprega, fazendo-a tomar assim um duplo sentido. A grande maioria das palavras da nossa lngua tm mais de um sentido: temos abundncia e variedade, mas com economia de som. Se a cada ideia nova tivesse forosamente que corresponder uma nova palavra, como til e conveniente para variar o fraseado e evitar a montona repetio dos termos, empregar, no mesmo trabalho, vrios sinnimos quando mister exprimir vrias vezes a mesma ideia, tarefa exaustiva e quase poderia dizer-se impossvel, seria aprender o vocabulrio da lngua. Um termo pode ter significados diversos sem da se gerar confuso, pois o contexto da frase ser-ve bem para mostrar o sentido em que ele se emprega. Quando se fala no CABO de S. Agostinho, no CABO que passou a sargento, no CABO da vassoura, no CABO do navio que puxam os marinheiros, no feito que se consumou ao CABO de muitos dias, todos j entendem em que sentido a palavra CABO tomada. Alm disto, o significado clssico, longe de ser confuso e enig-mtico, tendo, na maioria dos casos, perfeita analogia com o significado mais em voga, facilmente se depreende pela simples leitura das palavras que o ostentam, e, quando assim no fosse, a esto os dicionrios a quem cabe expor discriminadamente as vrias significaes do mesmo vocbulo, at mesmo as arcaicas, quanto mais as que vigoram ainda no uso literrio.

    Mas no percamos tempo em defesas desnecessrias; os prprios exemplos que vamos apontar de persistncia do sentido antigo ou de emprego de sentido, meramente liter-rio, enquadrados na tradio pelo uso de alguns sculos, de to ilustres escritores, falaro por si mesmos, mostrando a variedade de recursos que eles sabem haurir dos tesouros da nossa lngua.

    20 ACABAR COM ALGUM = induzir, convencer, conseguir de algum, fazer algum resolver-se a.

    O Cavaleiro da Fortuna se meteu entre les... e nem isto pde ACABAR COM LES (F. Morais P. de I. 43) os mritos e privana da Senhora... ACABAM COM DEUS que seja mais cedo ouvido (Arrais D. 33) aproveitou-se o demnio dste instrumento e em poucas palavras ACABOU COM EVA que... estendesse a mo onde no devera (B. Brito M. L. I-3) o meu amor e a vossa obrigao no pode ACABAR CONVOSCO a que

  • Tradies Clss icas da Lngua Portuguesa 45

    corteis pelo sono? (Vieira S. V. 156) tanto fz que ACABOU COM o corregedor que no bulisse nem tocasse no negcio (Sousa V. do A. II-40) nada se podia ACABAR COM LE para ste efeito (Jaboato N. O. S. B. II-146) ACABAMOS COM LE... que nos acompanhasse na vingana (Castilho Q. H. P. I-206) ACABOU COM LE que a fechasse em uma das arcas (Silvrio V. D. V. 26).

    21 ACABAR CONSIGO = resolver-se a.No posso ACABAR COMIGO a t-la por tais (H. Pinto I. V. C. II-66) no posso ACABAR

    COMIGO tresladar escrituras inteiras onde basta especificar a su(b)stncia (Sousa A. D. J. II-81) como ACABARIA ELA CONSIGO suportar a vista dum monstro? (Filinto O. C. X-223) em meus escritos no posso ACABAR COMIGO que me resolva ao fastio de inteiros, os derreter (Castilho N. do C. 200) ningum pde ACABAR CONSIGO em o deixar (Silvrio V. D. V. 250) o inolvidvel mestre talvez ACABASSE CONSIGO no ser mais realista que o rei (S Nunes L. V. 138) no pode-mos ACABAR CONOSCO ocultar o nosso espanto (Rui C. de I. 152).

    22 ACORDAR-SE = recordar-se.ACORDA-TE de tua morte e no pecars (H. Pinto I. V. C. II-89) agora encomendo eu muito a

    V. Mc., me sofra como seu despertador e que SE ACORDE do prometido a Deus (Chagas C. E. 69) a estatura soberba, o saio negro, o morrio, a negra cr das plumas, nenhum SE ACORDA de os jamais ter visto (Castilho N. do C. 22) de v-lo SE ACORDAM (Garrett Cam. 103).

    23 APELIDO = nome prprio. APELIDAR = chamar (referindo-se no alcunha mas ao prprio nome, designao prpria).

    O cabo que coo nome se APELIDA da cidade Fartaque ali sabida... (Cames L. c. X.o e. 100) nem so dignos de ser chamados homens, nem lhes convm tal APELIDO (H. Pinto I. V. C. I-57) do APELIDO Belarmino, concordando com a inocncia e pureza dste santo cardeal... (Bernardes N. F. I-8) quem teve unhas to farpantes para destruir um reino que APELIDAVA seu, piores as teria para o agarrar, ainda que lhe constasse que era alheio (Arte 97) saindo pelas portas que tem no sul, lhe fica o bairro de S. Bento... APELIDA-SE do nome dste glorioso patriarca pelo suntuoso templo e convento que tem na entrada dle (Pita H. A. P. 36) vi que se chamava Depreval: APELIDO sbre o qual maquinalmente estive a refletir (Filinto O. C. X-56) uns reinos prometeu-nos, que ou Hespria ou Itlia APELIDAVA (O. Mendes E. l. III.o. v. 187) e a isto se APELIDA o meu mundo (Castilho F. 40) tda economia interna e externa do curso de humanidades, que APELIDAMOS Seminrio Menor, continuava a cargo do Reitor (Silvrio V. D. V. 140).

    24 APELIDAR = convocar.APELIDARAM tda a companhia dos soldados que os judeus levavam para guarda, porque ningum

    se atrevesse a querer defender o Senhor (T. de Jesus T. de J. II-68) ...APELIDANDO em seu favor

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    a terra tda (B. Brito M. L. I-49) tomada esta determinao, APELIDA toda sua terra, congrega a maior massa de gente (Castilho Q. H. P. I-110) a ptria convoca e APELIDA, em seu amparo e defenso, a todos os seus filhos extremosos (Latino E. C. 132).

    25 APETITE = desejo, paixo, ambio.No pequeno trabalho vencer os APETITES (J. Barros Pan. 103) como o salteador, o APETITE

    do louvor humano (Arrais D. 27) o entendimento ficar prostrado aos ps dos seus APETITES (Couto S. P. 69) santifiquem as vontades alheias, se no se atrevem, nem tm valor para mortificar os APETITES prprios (Vieira S. XI-40) S. Filipe Nri tinha atado o APETITE da honra, fama e fazenda (Bernardes N. F. III-103) tu, inclinado aos APETITES, fste fazendo pouco caso das inspiraes do santo anjo (Sa-cramento V. H. P. 51) fz com que lhe viessem APETITES de viver (Filinto O. C. IX- 109) com a limpeza vem o bom gosto e com ste o APETITE de andar mais bem vestido (Castilho C. A. 102) em vo se agitar... tudo que mesquinho e efmero no homem... as misrias da baixeza... os APETITES dos partidos (Rui C. L. 104) outros, muito ao contrrio estudam... os APETITES dos plutocratas (Laet R. de C. ano XIV n.o 167 pg. 181) faria aliana com ste rei, se um especial aplo lhe no viesse despertar na sua alma de poltico... o APETITE de aumentar o seu reino (Antero L. T. 30).

    26 APONTADO = atilado, pechoso, correto, alinhado, cuidadoso.Dom Nunalvres... semelhante ao sagaz corteso mais APONTADO, nenhum quer que, em o ser, se lhe

    adiante (R. Lobo C. de P. 19) trajava de negro, no muito APONTADO no asseio, mas muito longe de desleixado (Camilo N. B. J. M. 45) sua questo no restabelecer a boa linguagem do projeto, mas demonstrar quanto se enganava o comum da gente em me supor bem APONTADO no escrever (Rui R. n.o 354 pg. 162)... trs autores mais bem APONTADOS no falar e escrever (E. C. Ribeiro P. L. E. 122) boas letras... expresso consagrada pelos autores mais bem APONTADOS no dizer castio (S Nunes A. L. N. II-210).

    27 APOSENTAR = alojar, dar aposento. APOSENTAR-SE = tomar aposento, alojar-se, estabelecer-se.

    Quando le j tornou, estava a crte APOSENTADA naquela cidade (Bernardim M. e M. 132) pesa-lhe que to longe o APOSENTASSE das terras europias abundantes, a ventura (Cames L. c. VI.o e I.a) tornando-se, APO