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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES – UCAM
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PÓS-GRADUAÇÃO “LATU SENSU”
DOCÊNCIA DO ENSINO SUPERIOR - UM DESAFIO
PROFISSIONALIZAÇÃO DOCENTE NO ENSINO SUPERIOR:
FORMAÇÃO X PRÁTICA
Por: Sueli Gimenes
Orientador:
Professor Marcelo Martins Saldanha Da Gama
Rio de janeiro, RJ
Julho/2010
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES – UCAM
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PÓS-GRADUAÇÃO “LATU SENSU”
DOCÊNCIA DO ENSINO SUPERIOR - UM DESAFIO
PROFISSIONALIZAÇÃO DOCENTE NO ENSINO SUPERIOR:
FORMAÇÃO X PRÁTICA
Apresentação de monografia como condição
prévia para a conclusão do Curso de Pós –
Graduação “Latu Sensu” em Docência do
Ensino Superior.
Rio de janeiro, RJ
Julho/2010
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”Não é bastante ensinar uma especialidade. Através dela o
indivíduo pode tornar-se uma espécie de máquina útil,
mas não uma personalidade harmoniosa.
É essencial que o profissional adquira compreensão e
sensibilidade, viva para valores ... tenha o senso do belo
e do moralmente bom.
Se tal não acontecer, com todo seu conhecimento
especializado, ele parecerá mais um animal treinado do
que um ser humano”.
(Albert Einstein)
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RESUMO
O presente trabalho é uma pesquisa bibliográfica que retrata o perfil dos docentes
do ensino superior no Brasil do século XXI, bem como as mudanças e os desafios
encontrados por eles ao longo do tempo, feitas através de uma breve retrospectiva
histórica e da análise crítica da situação atual, nos levando a repensar a educação
superior como um todo e também o nosso papel nesse importante cenário.
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METODOLOGIA
Para desenvolvimento deste trabalho, optou-se pela pesquisa bibliográfica,
que discute a importância da formação pedagógica do professor universitário, bem
como o perfil dos docentes do ensino superior no século XXI.
Para tanto, foi utilizado como respaldo teórico os estudos dos autores
Masetto, Zabalza, Pimentel, Aranha e Saviani, entre outros; também foram utilizadas
tabelas e índices divulgados pelo INEP e pelo MEC, bem como pesquisa na
legislação brasileira, feita através de documentos oficiais (CF, LDB, PNE, Decretos e
Portarias).
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SUMÁRIO
Introdução ............................................................................................... 7
I – Histórico Sobre O Ensino Superior No Brasil .......................... 8
II – Perfil Do Profissional Docente Do Ensino Superior ......................... 21
III – Desafios Da Docência Do Ensino Superior ..................................... 25
Conclusão ............................................................................................... 28
Bibliografia .............................................................................................. 30
Anexos .................................................................................................... 32
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INTRODUÇÃO
Este trabalho versa sobre o tema Docência do Ensino Superior - um desafio,
tendo como foco principal a reflexão sobre a Profissionalização Docente do Ensino
Superior: Formação x Prática, buscando saber quem é o docente do ensino superior
do século XXI e qual a importância da formação pedagógica para a sua prática de
ensino, como meio de propiciar um caminho de qualificação do seu trabalho, unindo
teorias apropriadas à prática exercida.
Esta pesquisa se justifica por ser um estudo sobre o perfil do profissional
docente do ensino superior no século XXI, levantando a questão da formação deste
profissional como formador de vários outros profissionais e, por esta razão, tendo
um papel importante e determinante no mercado de trabalho e em toda nossa
sociedade, como um todo. Seu conhecimento teórico aliado à prática do ensino
deveria ser base para o seu trabalho enquanto docente, mas, apesar desta
necessidade, muito pouco se tem feito para a formação deste profissional, bastando
apenas que ele tenha conhecimento aprofundado de determinado conteúdo para
que se torne um professor de ensino superior, pouco ou nada sendo exigido em
termos pedagógicos, o que provoca falhas no sistema e a necessidade premente de
solucioná-las.
Os principais objetivos deste estudo são no primeiro capítulo fazer um breve
histórico das universidades no Brasil; no segundo capítulo: analisar o perfil do
docente do século XXI, refletindo sobre as concepções de conhecimento pedagógico
como formador de professores, frente às novas exigências da formação em relação
aos termos legais, às pesquisas, à produção recente na área e às exigências do
mundo contemporâneo; e no terceiro capítulo identificar os desafios dos professores
no século XXI, refletindo teórica e criticamente sobre eles, buscando e apontando
alternativas viáveis para a solução de alguns dos problemas apresentados,
oferecendo subsídios para a melhoria do seu trabalho como um todo.
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I – HISTÓRICO SOBRE O ENSINO SUPERIOR NO BRASIL
Foi ainda no período colonial, em 1553, que na Bahia os Jesuítas
estabeleceram o primeiro curso de ensino superior do Brasil, com a criação do Curso
de Ciências Naturais, que compreendia Artes e Teologia. Naquela época todas as
escolas e cursos de ensino superior funcionavam em estabelecimentos isolados,
chamados cátedras e somente em 1909 passaram a receber status de Universidade
no Brasil.
Com a transferência da metrópole portuguesa para o Rio de Janeiro, em
1808, tornou-se necessário implementar condições mínimas de infra-estrutura para
um contingente de, aproximadamente, 15 mil pessoas que chegaram com a corte. D.
João VI cria, então, a Faculdade de Medicina da Bahia em fevereiro de 1808,
durante sua rápida passagem pela região, e em novembro do mesmo ano funda a
Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, logo após a sua chegada.
A preocupação com o ensino superior no Brasil começou no século XIX com a
organização de escolas profissionais (Dantes, 1980). Com a Proclamação da
República, as discussões sobre a Educação, especificamente sobre as
universidades, começam a surgir com mais força.
Na década de 20, sob a influência da Associação Brasileira de Educação e da
Academia Brasileira de Ciências, desenvolveu-se amplo debate sobre ensino
estabelecendo-se que caberia às Universidades, além de manter escolas para
formar profissionais a serviço da Sociedade, promover o desenvolvimento da ciência
e da cultura, usufruindo de autonomia tanto nas atividades didáticas, científicas e
culturais que desenvolveriam como em sua administração.
No início da década de 30 foi criado, pelo governo Vargas, o Ministério da
Educação e Saúde e implantada uma reforma da educação estabelecendo que o
ensino superior poderia ser oferecido em universidades e institutos isolados,
particulares ou oficiais, mantidos por governo federal e por estados (Sampaio, 1991).
Além das escolas profissionais cada universidade deveria incluir uma "Faculdade de
Educação e Letras que teria como seus principais objetivos", a formação de
professores para o ensino secundário e a promoção da ciência. O corpo docente das
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universidades era formado por professores catedráticos vitalícios escolhidos
mediante concurso de títulos e provas e auxiliados por assistentes indicados por
eles, e por eles demissíveis ad nutum. Neste período, em que pese às dificuldades,
segundo Aranha (1996, p. 201): “Os decretos de Francisco Campos imprimem uma
nova orientação, voltada para maior autonomia didática e administrativa, interesse
pela pesquisa, difusão da cultura, visando ainda ao benefício da comunidade”.
Cria-se também, em 1931, o Estatuto das Universidades Brasileiras, através
do Decreto Federal nº. 19.851 e a União Nacional dos Estudantes (UNE) junto com
seu estatuto, cujo conteúdo em nada coincidia com as propostas do então
presidente Getúlio Vargas. Defendia-se a universidade aberta para todos; diminuição
da taxas de exame e matrícula; exercício da liberdade de pensamento, cátedra,
imprensa e tribuna; independência das universidades frente ao Estado, com eleições
para seus dirigentes pelos discentes e docentes, representados pelo conselho
universitário que deveria ser paritário; a livre associação dos estudantes dentro da
universidade; a participação discente na elaboração dos currículos; além da
necessidade de criação de monitorias e estágios.
Segundo Aranha (1996, pp. 204-205), devido ao processo de industrialização,
podemos observar ainda neste período, a ênfase no ensino profissionalizante, onde
a partir das “Leis Orgânicas” de Gustavo Capanema, ministro do Estado Novo,
criam-se o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) e Serviço Nacional
de Aprendizagem Comercial (SENAC), também se regulamenta o curso de formação
de professores, com diretrizes nacionais, trazendo consigo um certo otimismo
referente a valorização da carreira docente, que de fato não se concretiza.
Com o fim do Estado Novo e a retomada do Estado de direito, a constituição
de 1946 reflete o processo de redemocratização do país, garantindo os direitos
individuais de expressão, reunião e pensamento, apesar de, segundo Cunha (2000,
p.107), a organização educacional permanecer a mesma. Onde a estrutura do
ensino médio dividida entre o ensino propedêutico (para as elites) e o ensino
profissional (para a classe trabalhadora), de maneira discriminatória já definia quem
seria conduzido ao ensino superior.
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Considerava-se como responsabilidade das universidades elevar os seus
padrões de ensino e promover o desenvolvimento da ciência. As primeiras agências
oficiais em apoio à pesquisa, ao aperfeiçoamento de docentes e à formação de
pesquisadores surgiram apenas em 1951, com a criação do Conselho Nacional de
Pesquisa (CNPq) e da Coordenação do Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível
Superior (Capes).
Com a volta de Getúlio Vargas ao poder (1950-1954), algumas medidas foram
adotadas para equivalência dos cursos profissionais a secundário, para que fosse
possível a progressão no sistema educacional, sendo tais medidas ampliadas na Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de 1961. Elas foram adotadas
devido ao número de trabalhadores que aumentava consideravelmente, porém o
número de trabalhadores ditos qualificados ainda era muito pequeno.
O número de instituições de ensino superior aumentou rapidamente
alcançando, em 1960, 247 escolas públicas e 103 particulares. No mesmo período o
número de matrículas passou de 26.761 para 93.202, mas ainda menos de um aluno
por mil habitantes.
Contudo, ocorreu a expansão do ensino médio e, consequentemente, o
aumento da demanda pelo ensino superior que foi respondida pela pelo governo
federal. Que segundo Cunha (2000, p.171) ocorreu de três maneiras: a) A criação de
novas faculdades onde não as havia ou onde só existiam instituições privadas; b) A
gratuidade de fato dos cursos das instituições federais de ensino superior, mesmo a
legislação prevendo a cobrança de taxas; c) A “federalização” das faculdades
estaduais e privadas, reunindo-as, posteriormente, em universidades custeadas e
controladas pelo MEC.
Em resumo, o “populismo” com a “federalização” foi responsável pela
ampliação do ensino superior gratuito e pela criação das universidades federais que
hoje existem no país. Inclusive no segmento militar, com a criação do Instituto
Tecnológico de Aeronáutica (ITA) em 1947, que significou uma inovação acadêmica,
seguindo os padrões dos EUA. O modelo do ITA influenciou na modernização do
ensino superior no Brasil, principalmente na criação da Universidade de Brasília.
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A Universidade de Brasília foi criada com o intuito de atender a necessidade
de formar para burocracia governamental de especialistas bem qualificados, além de
servir como modelo, criando um paradigma moderno para o ensino superior tal qual
o ITA, mas só que mais amplo, abrangendo mais áreas do conhecimento que
pudessem influenciar nos rumos das universidades do país.
Devido à necessidade de modernização das universidades e o estímulo à
formação do docente-pesquisador (principalmente na USP desde a sua criação)
foram criadas neste período: a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência
(SBPC) e as agências governamentais, CNPq e Capes.
Desde a redemocratização do país em 1946 é retomada a luta dos “pioneiros
da educação nova”. Em 1948 é apresentado pelo ministro Clemente Mariani um
anteprojeto da LDB à Câmara dos Deputados que segundo Hilsdorf (2002, p.110)
era de orientação liberal e descentralizadora. Por ter sofrido grande oposição,
liderada por Gustavo Capanema, que defendia o controle da educação pela União, o
projeto foi “engavetado” e só retomado em meados da década seguinte com a
apresentação de substitutivos por Carlos Lacerda, sob orientação privatista. O
processo de aprovação desta LDB foi longo e conflituoso, só sendo aprovada (Lei nº.
4.024) junto com o substitutivo Lacerda, em 20 de Dezembro de 1961.
Todo este conflito desencadeou uma verdadeira “Campanha em Defesa da
Escola Pública”, encampada principalmente pela UNE e os movimentos populares
de base. Estes movimentos, juntos com intelectuais, foram quem realmente
apresentaram inovações para educação e cultura, como: Centros Populares de
Cultura da UNE, o Movimento de Educação de Base da CNBB, o Método de
Alfabetização de 40 horas de Paulo Freire, entre outras iniciativas.
Com o Golpe militar de 1964, todas estas iniciativas foram desativadas. E a
bandeira da Reforma Universitária, defendida pelo Movimento Estudantil foi
incorporada pelo Estado, mas de maneira desvirtuada. A tendência do controle
privado do ensino público, que já podíamos observar com a aprovação da LDB de
1961, principalmente no substitutivo Lacerda de caráter liberal, vetando o monopólio
do ensino pelo Estado e defendendo a iniciativa privada, são ampliadas pelo regime
militar e sustentada até os dias atuais.
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Durante a ditadura militar a educação sofreu duas grandes reformas, em 1968
e 1971, precedidas porém pelos acordos MEC-Usaid (Ministério da Educação e
Cultura e United States Agency for International Development) onde o Brasil
receberia apoio técnico e financeiro para implementar as reformas. Sendo que tais
reformas visavam atrelar o sistema educacional brasileiro ao modelo econômico
dependente de interesse norte-americano, onde para tal são geradas mudanças na
LDB.
Outro grande impacto para educação em decorrência do Golpe, foi a
reestruturação da representação estudantil, com a “extinção” da UNE, evitando a
organização dos estudantes nacionalmente, “permitindo” a atuação dos Diretórios
Acadêmicos (DA`s) e dos Diretórios Centrais dos Estudantes (DCE`s), mas só no
âmbito dos curso e das universidades, respectivamente, sem exercerem ação
política, tidas como subversivas. Ainda para manter sobre controle a juventude
brasileira são instituídas, segundo Aranha (1996, p.211), disciplinas de caráter
ideológico e manipulador, no caso do ensino superior a disciplina EPB (Estudos de
Problemas Brasileiros).
A Lei nº. 5.540/68, “Lei da Reforma Universitária” foi baseada nos estudos do
Relatório Atcon (Rudolph Atcon, teórico norte-americano) e no Relatório Meira Matos
(coronel da escola superior de Guerra) e aprovada de cima para baixo, evidenciando
a concepção de que a carreira docente e a organização da universidade não se
ajustavam ao desenvolvimento científico e à expansão do ensino superior. O
sistema autoritário da cátedra vitalícia fechava oportunidades de carreira e não
estimulava cooperação entre as várias disciplinas, cada vez mais essenciais ao
desenvolvimento científico e tecnológico; a repetição das mesmas cadeiras básicas
em várias unidades resultava em uma multiplicação de instalações e de docentes
trabalhando isoladamente na mesma disciplina com grandes diferenças em recursos
e desempenho.
Esta situação culminou com a reforma aprovada pelo governo federal em
1968 estabelecendo, entre outras, as seguintes inovações: abolição da cátedra
vitalícia; implantação do sistema de institutos em substituição a faculdades;
instituição do departamento como unidade mínima de ensino e pesquisa;
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organização do currículo em etapas básica e de formação profissional; flexibilidade
do currículo e sistema de créditos; e criação de colegiados horizontais.
Acabando com a cátedra, o vestibular é unificado e passa a ser
classificatório, aglutina as faculdades em universidade, visando uma maior
produtividade com a concentração de recursos, cria o sistema de créditos,
permitindo a matrícula por disciplina, além de, segundo Aranha (1996, p. 214), a
nomeação dos reitores e diretores de unidade (esta agora dividida em
departamentos) dispensa a necessidade de ser do corpo docente da universidade,
podendo ser qualquer pessoa de prestígio da vida pública ou empresarial.
A reforma ainda fragmenta as Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras,
resultando na criação das Faculdades ou Centros de Educação e ainda
desencadeando segundo Cunha (2000, p. 182) na estruturação das universidades
brasileiras em quatro modelos básicos: a) a agregação dos departamentos em
alguns poucos centros; b) a reunião dos departamentos em número maior de
institutos, faculdades ou escolas; c) a ligação dos departamentos diretamente à
administração superior, sem instâncias intermediárias; e d) a superposição dos
centros às faculdades, aos institutos e às escolas.
A partir desta década houve um processo de privatização sem precedentes
do ensino no país, caracterizando a educação enquanto um grande negócio,
desresponsabilizando o Estado de seu dever, destinando verba pública para a
iniciativa privada. Tal posicionamento tem continuidade nas décadas seguintes.
A crise econômica dos anos 80 e as incertezas criadas pelos altos índices de
inflação refletiram-se no ensino superior. O número de inscrições em exame
vestibular baixou de 1,8 milhões em 1980 para 1,5 milhões em 1985, voltando a 1,8
milhões em 1989; o número total de vagas aumentou apenas de 404.814 em 1980
para 466.794 em 1989; o número de matrículas foi 1.377.286 em 1980 e 1.367.609
em 1985, chegando a 1.518.904 em 1989, um crescimento inferior ao da população
(MEC/INEP, 2000). Durante esse período o sistema privado implantou 19
universidades e aumentou em 43,6% as suas matrículas e em 57% a sua oferta de
vagas; o sistema público instituiu dez universidades (uma federal, sete estaduais e
duas municipais) aumentando as matrículas em 13,7% e as vagas em 10,2% graças
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a estados e municípios, uma vez que a rede federal se manteve paralisada. Apesar
de tal paralisia do sistema federal, a sua despesa com pessoal nas instituições de
ensino superior mais do que duplicou entre 1980 e 1990 (O estado atual..., 1994).
Nas universidades federais o número de docentes aumentou em apenas 3,8%, mas
os docentes em tempo integral passaram de 20% no final dos anos 70 para 81% em
1989.
Nunca na história do país foram abertas tantas universidades particulares
como nos anos 80 e 90, bem como, praticada a isenção fiscal para empresário da
educação, inclusive o “Projeto Universidade para Todos” (ProUNI) aprovado em 13
de setembro do corrente ano, por Medida Provisória, pelo atual presidente Lula,
segue a mesma lógica.
Brasil na década de noventa a reforma educacional através da Lei de
Diretrizes e Base (LDB) para educação nacional e do Plano Nacional de Educação
(PNE), apresentou-se numa perspectiva de dar forma às políticas neoliberais,
caracterizadas principalmente pela privatização, entendendo esta, como a entrada
desenfreada de recursos não-públicos para manter as atividades próprias da
universidade.
Estas políticas, segundo Romano (1999), estão fundamentadas no próprio
liberalismo, doutrina que pode trazer consigo atitudes libertárias e democratizantes,
que se contraponham ao absolutismo, mas pode trazer também teses contrárias a
democracia, baseadas na defesa da propriedade privada, mercado soberano e
liberdade somente para alguns, “os proprietários”, em detrimento das proposições
apresentadas pela sociedade organizada.
Em decorrência das políticas adotadas na década de 90, principalmente pelo
Governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC), o Ensino Superior sofreu o impacto
do sucateamento das universidades públicas pelos cortes de verbas, a não abertura
de concursos públicos para professores e funcionários técnico-administrativos, pela
continuidade da expansão do ensino superior privado e das matrículas delas
decorrentes, pela destinação de verba pública para as faculdades particulares, pela
multiplicação das fundações privadas nas Instituições de Ensino Superior (IES)
públicas e por ausência de uma política efetiva de assistência estudantil.
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Os efeitos sociais provocados por estes ajustes e reformas, impostos pelos
agentes financeiros internacionais para proteger interesses econômicos, são brutais
e perversos. Pois enormes contingentes populacionais são excluídos e perdem
vários benefícios essenciais já citados anteriormente.
Na perspectiva de implementar tais ajustes e reformas, o então Ministro da
Educação do Governo de FHC, Paulo Renato de Souza, pronunciou-se no ano de
1996, sobre os três pilares de sua política para reforma Universitária, que trazem em
si as recomendações do Banco Mundial, sendo eles: 1) Avaliação Institucional e
Exame Nacional de Cursos (Provão); 2) Autonomia Universitária; e 3) Melhoria do
Ensino, através do Programa de Gratificação e estímulo à Docência/GED). Pilares
estes que apontam para a consolidação do projeto neoliberal que tem a sua maior
expressão nas propostas apresentadas para “autonomia universitária”, que em
resumo consolidam a intenção de privatização da universidade pública brasileira,
descomprometendo o Estado com o seu financiamento.
Contudo, podemos observar que a reforma universitária gestada e
implementada na década de 90 no Brasil e prossegue no início do século XXI,
encontra-se articulada a outras reformas (Estado, Previdência, Trabalhista e
Sindical) para ajustes estruturais e seguem as diretrizes dos organismos
multilaterais, sendo elas: 1) proliferação das instituições privadas de ensino e as
vagas delas decorrentes; 2) ofertas do ensino superior, regida basicamente pela
demanda do mercado; 3) diminuição do financiamento estatal para as universidades
públicas, 4) incremento das receitas das universidades, através da contribuição dos
estudantes e vendas de serviços, 5) desenvolvimento das assistências técnicas
(consultorias), como nova função acadêmica, vinculando assim a universidade a
setores produtivos, em busca de captar recursos privados; 6) utilização dos
concursos, exemplos vestibulares, como nova forma de acesso a recursos públicos
e 7) não abertura de concurso público, flexibilizando as formas de contratação
(contrato temporário e CLT), acabando, assim, com o funcionalismo público (RJU).
A reforma universitária nos moldes propostos pelos organismos internacionais
e pelo Governo Federal, ainda não foi implementada na sua totalidade, devido à
ação dos movimentos sociais organizados de estudantes, professores e técnicos. E
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que infelizmente as proposições do atual governo, pouco diferem do modelo
anteriormente adotado.
Afirma-se isto, inicialmente, com base no documento apresentado pelo Grupo
de Trabalho Interministerial, constituído pelo Decreto de 20 de Outubro de 2003, que
mantém a perspectiva reducionista de autonomia financeira, desrespeitando o artigo
207 de Constituição Federal, legitimando as fundações privadas nas universidades,
diminuição dos recursos públicos via orçamento (Lei de Diretrizes Orçamentárias) do
Estado e ampliação das parcerias e convênios com as instituições privadas, além
propor um “Pacto da Educação Superior para o Desenvolvimento Inclusivo”,
semelhante à proposta de contrato de gestão do governo FHC.
Bem como, nas propostas e ações do Governo Lula (através de Leis, Projetos
de Lei, Medidas Provisórias e Relatórios) que ferem a Autonomia Universitária,
desrespeitando o artigo 207 de Constituição Federal. Sendo elas: a) Legalização das
fundações privadas nas universidades, através da sua regulamentação (Decreto Nº
5.205/2004; b) Estímulo à ampliação das parcerias e convênios com as instituições
privadas; c) As Parcerias Público Privado que permitem a destinação de verbas
públicas para a iniciativa privada e desta para o setor público; d) O Projeto de Lei de
Inovação Tecnológica, que repassa a responsabilidade de produção de
conhecimento para o setor privado; e) O Programa Universidade para Todos –
ProUni (MP Nº 213), que regulamenta a “compra” das vagas ociosas nas
universidades particulares, destinando desta forma verba pública para salvar os
empresários deste setor; f) O Projeto de Emenda Constitucional (PEC 217) da
Deputada Selma Schons (PT-PR) que prevê a cobrança de impostos a ex-alunos de
universidades públicas; e g) O Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior –
SINAES (Lei Nº 10.861, de 14 de Abril de 2004), que pouco difere do antigo
“Provão”, mantendo a utilização de critérios burocráticos e meritocrático e o
ranckeamento dos curso.
A Reforma Universitária no Governo Lula já está sendo implementada à
revelia das discussões com a sociedade, de maneira antidemocrática, contrariando
os anseios de boa parte dos Movimentos Sociais organizados e pouco
acrescentando ou modificando a situação do ensino superior no País.
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Segundo Cristovam Buarque, ex-ministro da Educação do Brasil, apesar da
criação do sistema universitário federal brasileiro, que teve início em 1968 e foi
reafirmado em 1985, com a implantação da isonomia total e a criação de um sistema
comum de avaliação, a universidade brasileira ainda não é um sistema integrado.
A idéia do governo federal é apresentar uma proposta de criação do sistema
universitário brasileiro, em que pese a inter-relação e a interdependência de seus
diversos componentes, sua interação com o desenvolvimento da ciência, da
tecnologia, da cultura em geral, evidenciando, também, a relação entre a
universidade e o setor privado e as instituições governamentais. Esse sistema
universitário brasileiro possibilitará que seja definido, com maior clareza, o futuro da
construção do saber superior no Brasil, ao longo das próximas décadas do século
XXI.
Buarque também afirma que, nesse quadro, ao mesmo tempo adverso e
estimulante, em que o Brasil e sua universidade ingressam num novo século, tem-se
agora um governo historicamente comprometido com a transformação da
universidade numa instituição de ponta em termos mundiais. Para tal, será
necessário: atender às necessidades emergenciais de uma instituição heróica, mas
abandonada; organizar um sistema universitário que se tornou caótico devido ao
crescimento descontrolado do setor privado, simultâneo ao encolhimento do setor
público; e refundar a universidade segundo exigências do momento histórico pelo
qual passa a humanidade.
No entanto, mesmo diante de considerações dessa complexidade, o atual
sistema de Ensino Superior brasileiro se organiza e, regido pela LDB, da mesma
forma que se classificam de acordo com o tipo de financiamento, as instituições de
ensino superior podem ser identificadas de acordo com a sua organização
acadêmica (definidas em lei, Decreto n. 3.860 de 9 de julho de 2001), ou seja:
• Universidades
• Centros universitários
• Faculdades e Faculdades integradas
• Institutos e escolas superiores
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• Centros de educação tecnológica
Diante dessas classificações, é importante entender, então, o significado, a
missão, e o caráter de cada uma das categorias apresentadas. Essa variada
diversificação ocorre, pois o setor educacional procura responder a alguns fatores,
tais como a necessidade de acompanhar as transformações no mercado de
trabalho, a massificação do ensino, os altos custos que o desenvolvimento de
pesquisas envolve, o que impossibilita que todas as instituições consigam manter o
desenvolvimento da pesquisa e sua relação com o ensino.
Necessidades diferenciadas remetem a respostas também distintas, não só
em termos dos produtos e serviços, mas também dos arranjos institucionais ou
modelos capazes de promover tais ofertas. Dessa forma, o modelo único de
universidade que reúne a pesquisa, extensão (humboldtiano), que se mostrou
bastante adequado às sociedades durante um determinado momento histórico,
tornou-se inviável para o conjunto das instituições.
Diante do entendimento da inviabilidade de um sistema único, procura-se,
então, entender a conceituação de cada um dos modelos propostos pelo Ministério
da Educação, através da LDB. A Lei estabelece que a educação abrange os
processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana,
no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e
organizações da sociedade civil e, ainda, nas manifestações culturais.
A LDB estabelece, prioritariamente, que a educação superior tem por
finalidade:
I. estimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito científico e do
pensamento reflexivo;
II. formar diplomados, nas diferentes áreas do conhecimento, aptos para a
inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da
sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua;
III. incentivar o trabalho de pesquisa e investigação científica, visando ao
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desenvolvimento da ciência e da tecnologia e, ainda, da criação e difusão da cultura
e, desse modo, desenvolver o entendimento do homem e do meio em que vive;
IV. promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos
que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino,
de publicações ou de outras formas de comunicação;
V. suscitar o desejo permanente de aperfeiçoamento cultural e profissional e
possibilitar a correspondente concretização, integrando os conhecimentos que vão
sendo adquiridos numa estrutura intelectual sistematizadora do conhecimento de
cada geração;
VI. estimular o conhecimento dos problemas do mundo presente, em
particular os nacionais e regionais, prestar serviços especializados à comunidade e
estabelecer com esta uma relação de reciprocidade;
VII. promover a extensão, aberta à participação da população, visando à
difusão das conquistas e benefícios da criação cultural e da pesquisa científica e
tecnológica geradas na instituição.
Atendendo a esses objetivos, organiza-se a educação superior no Brasil, que
será ministrada em instituições de Ensino Superior, públicas ou privadas, com
variados graus de abrangência ou de especialização, a partir dos interesses
institucionais de cada IES.
Diversos Pareceres do Conselho Nacional de Educação reconhecem a
variedade desses objetivos, os quais podem ser: oferta de ensino de graduação em
uma ou múltiplas áreas, envolvendo um ou mais objetivos educacionais, tais como
formação geral ou especializada, formação profissional voltada para o mercado de
trabalho, formação acadêmica e em pesquisa; oferta de formação em pós-
graduação lato ou stricto sensu; oferta de cursos seqüenciais e de extensão;
desenvolvimento de atividades práticas e de pesquisa integradas à formação em
nível de graduação, como instrumento para preparação de profissionais críticos e
aptos ao permanente autodesenvolvimento intelectual; desenvolvimento de
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pesquisas voltadas para o desenvolvimento regional; desenvolvimento de pesquisas
nas áreas tecnológicas, básica e humanística, destinadas a promover o avanço do
conhecimento em campos específicos do saber, em colaboração com a comunidade
científica e intelectual internacional; prestação de diferentes serviços à comunidade,
de acordo com a sua competência e capacidade; diferentes combinações desses e
de outros objetivos.
O mesmo Parecer define ainda que o perfil ou missão institucional definido
pelas instituições deverá permitir sua classificação em um dos diferentes tipos de
estabelecimento de ensino superior previstos pela legislação. A avaliação deverá
respeitar o perfil ou sua missão definidos pelas próprias instituições.
Em cinco décadas, ou seja, de 1960 até os dias atuais, o ensino superior
brasileiro contou com significativas mudanças tanto com relação ao seu
funcionamento quanto em sua configuração, tais como: titulação dos docentes,
institucionalização da pesquisa e da produção intelectual, qualidade da formação
oferecida, diversidade de oferta de cursos, dentre outros. Estamos no caminho certo,
mas ainda há muito por ser feito, modificado, reconstruído em tudo que se refere à
docência do ensino superior mas, principalmente, no que diz respeito à formação
destes profissionais, basta vontade do poder público e ação por parte de todos os
envolvidos neste processo.
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II - PERFIL DO PROFISSIONAL DOCENTE DO ENSINO SUPERIOR
A docência superior é um processo complexo que se constrói ao longo da
trajetória docente e que envolve, de forma intrinsecamente relacionada, a dimensão
pessoal (sua própria história de vida), a profissional (os vários caminhos construídos
pela Profissão) e a institucional(os diversos contextos em que atua ou atuou). Os
esforços que eles realizam para aquisição, desenvolvimento e aperfeiçoamento de
competências profissionais subentendem um grupo interagindo, centrado em
interesses e necessidades comuns, em um contexto institucional concreto. Portanto,
os desafios da docência superior decorrem de sua complexidade e da multiplicidade
de questões/pressupostos que a constituem.
Quando se busca entender a docência superior e o papel dos docentes, é
necessário, como afirma Zabalza (2004), levar em consideração as transformações
pelas quais o cenário universitário está passando, em razão das mudanças do
mundo contemporâneo. Entre as mais significativas, notam-se: de um bem cultural,
a universidade passou a ser um bem econômico; de um lugar reservado a poucos,
tornou-se um lugar para o maior número possível de pessoas; de um bem
direcionado ao aprimoramento de indivíduos, tornou-se um bem cujo beneficiário é o
conjunto da sociedade; e, ainda, transformou-se em mais um recurso do
desenvolvimento social e econômico dos países, submetendo-se às mesmas leis
políticas e econômicas; faz parte das dinâmicas sociais e está sujeita aos mesmos
processos e às mesmas incertezas do âmbito político, econômico ou cultural que
afetam todas as instituições sociais.
A partir de então, é possível questionar: em razão dessas transformações,
como fica o exercício da docência? Os professores apresentam condições
formativas para enfrentar as novas demandas que a sociedade impõe à
universidade? Esta última, por sua vez, em termos de organização estrutural, de
recursos humanos e financeiros está preparada para enfrentar as demandas? Como
considerar de forma integrada as peculiaridades e as necessidades oriundas das
instituições e dos professores que nela trabalham? A produção pode se compor
como acadêmico-científica e também como pedagógica? Qual o novo conceito de
formação que está sendo gerado? O professor está consciente de que sua função
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como formador é apenas uma das dimensões de uma formação que se constitui
como permanente? Quanto a sua própria formação, ela é vista por ele como um
processo? Como fica a relação entre conhecimento específico e pedagógico? Essas
são questões retomam e sintetizam algumas das idéias acerca da formação docente
na universidade. Assim, tendo em vista as questões colocadas sobre a formação
dos professores do ensino superior, torna-se necessário refletir sobre como se
aprende a ser docente nesse nível de ensino. Esta reflexão aponta alguns
elementos essenciais para a construção das competências necessárias e desejáveis
para a atuação docente na universidade. Outras questões daí decorrentes voltam-se
para o entendimento de: Como estes sujeitos se formam como professores?Qual o
processo de aprender a ser professor?Como se constrói o conhecimento
pedagógico compartilhado na docência superior? Qual a importância de uma rede
de interações nesse processo?
Os fios teóricos constituem-se a partir de conceitos como: trajetórias de
formação, concepções de docência, processos de aprender a ser professor,
conhecimento pedagógico compartilhado e rede de interações e mediações em
constante consonância com as conceituações relativas a como se constrói o
conhecimento pedagógico necessário para este aprender.
A consciência da responsabilidade pela formação de futuros profissionais, bem
como do compromisso com a cultura acadêmica, embora existentes, não são
levados em conta na formação docente, uma vez que a progressão na carreira estão
calcadas na titulação e na produção científica, enfatizando a área de conhecimento
específico e a função de ser pesquisador, o que parece não garantir um ensino de
qualidade e o conhecimento de ser professor.
O que os docentes pensam sobre ensinar e aprender está relacionado às
suas experiências e a sua formação profissional, o que exige que pensemos sobre
quem ensina e quem aprende no processo de formação. As crenças e concepções
teóricas implícitas que os professores têm acerca de seu fazer pedagógico podem
sinalizar a maneira como eles processam as informações e como percebem as
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formas de intervenção didática, como marco de referência para sua prática,
construindo seu conhecimento pedagógico de forma compartilhada.
Esse conhecimento pedagógico é um conceito base, por tratar-se de um
conhecimento amplo, implicando no domínio do saber fazer (estratégias
pedagógicas) e do saber teórico e conceitual e suas relações.
Nesse sentido, compreender o processo de construção de conhecimento
pedagógico compartilhado é tão fundamental, quanto compreender o aprender a
aprender, o que equivale a ser capaz de realizar aprendizagens, em diferentes
situações e contextos que favoreçam a aquisição de estratégias cognitivas,
considerando-se as condições individuais de cada sujeito na sua interação com
pares. Esse processo implica em trocas cognitivas e socioculturais entre
ensinantes/aprendentes, sendo possível destacarem-se condições a serem levadas
em conta pelos professores, ao longo de suas trajetórias de formação.
A primeira aponta para a necessidade dos professores, além de considerarem
seus domínios específicos, investirem na dimensão pedagógica da docência, sendo
que esta envolve atividades e valores traduzidos em: sensibilidade frente ao aluno;
valorização dos saberes da experiência; ênfase nas relações interpessoais;
aprendizagem compartilhada; integração teoria/prática; o ensinar enfocado a partir
do processo de aprender do aluno, tudo isso voltado para o desenvolvimento do
aluno como pessoa e profissional.
A Segunda indica a importância da transposição didática na prática educativa
do professor, contudo, a organização departamental das Instituições de Ensino
Superior, especialmente as das federais, pode dificultar esta intenção, na medida em
que um mesmo professor desenvolve a mesma disciplina para diferentes cursos,
para os quais não tem formação específica.
E a terceira diz respeito as entidades educacionais de ensino superior que
tem sua própria cultura, sua própria maneira de compreender e manifestar a teoria
assumida em ação, que são um conjunto de procedimentos básicos, identificados
através das regras educacionais que têm funções tanto cognitivas, quanto sociais:
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definição da rotina e organização das aulas, da escolha dos conteúdos, da
avaliação, compondo o processo de formação.
Assim, os limites do processo de formação vêm continuamente sendo
remarcados e redimensionados pela reflexão sobre o saber, o saber-fazer e suas
relações e é isto que o professor de ensino superior muitas vezes ainda não tem,
mas que precisa com urgência resgatar, em prol de uma educação mais consciente
e de qualidade. É um problema estrutural, que precisa ser revisto e reavaliado com a
maior brevidade possível, para que os professores não percam sua identidade
docente e consigam cumprir o ofício que lhes cabe: ensinar.
.
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III – DESAFIOS ENFRENTADOS PELOS DOCENTES DO ENSINO SUPERIOR
Muitos desafios foram e ainda estão sendo enfrentados pelos professores de
ensino superior no Brasil. Uma das críticas mais comuns dirigidas aos cursos
superiores diz respeito à didática dos professores universitários, ou seria melhor
dizer, à falta dela. É frequente no meio acadêmico encontrar-se queixas no sentido
de que o professor sabe a matéria, porém não sabe como transmiti-la ao aluno, de
que não sabe como conduzir a aula, não se importa com o aluno, é distante, por
vezes arrogante, ou que não se preocupa com a docência, priorizando seus
trabalhos de pesquisa. Ao mesmo tempo, amplia-se cada vez mais a exigência de
que os professores universitários obtenham os títulos de mestre ou doutor. No
entanto, é questionável se esta titulação, do modo como vem sendo realizada, possa
contribuir efetivamente para a melhoria da qualidade didática no ensino superior.
Os programas de pós-graduação, de maneira geral, tendem a priorizar em
suas atividades a condução de pesquisas, tornando-se responsáveis, mesmo que
não intencionalmente, por reproduzir e perpetuar a crença de que para ser professor
basta conhecer a fundo determinado conteúdo ou, no caso específico do ensino
superior, ser um bom pesquisador.
Segundo MASETTO, 1998, são três os fatores que contribuem para que na
cultura universitária a tarefa de ensinar e conseqüentemente a formação
pedagógica dos professores sejam deixadas em segundo plano:
1) A formação para a docência universitária constituiu-se historicamente como
uma atividade menor. Inicialmente, havia a preocupação com o bom desempenho
profissional, e o treinamento profissional, acreditava-se que poderia ser dado por
qualquer um que soubesse realizar bem determinado ofício. Acreditava-se e
acredita-se até hoje que quem soubesse fazer, saberia automaticamente ensinar,
não havendo preocupações mais profundas com a necessidade do preparo
pedagógico do professor. Posteriormente, com a crescente aproximação das
universidades do modelo humboldtiano, voltado à produção de conhecimentos, a
preocupação com a formação de professores para o magistério superior centrou-se
na preparação para a condução de pesquisas e, da mesma maneira, o pedagógico
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continuou a ser negligenciado, como se as atividades realizadas com os alunos de
graduação não se configurassem como produção de conhecimento, mas,
simplesmente, repetição do que já havia sido realizado por outros.
2) Também decorrência dessa ênfase na condução de pesquisas, os critérios
de avaliação de produtividade e qualidade docente concentram-se, hoje, na
produção acadêmica destes professores. Ou seja, ensino e pesquisa passam a ser
atividades concorrentes, e como os critérios de avaliação premiam apenas a
segunda, uma cultura de desprestígio à docência acaba sendo alimentada no meio
acadêmico, comprometendo, como ressalta Pimentel (1993, p. 89), a almejada
indissociabilidade ensino-pesquisa-extensão.
É possível, portanto, concluir que a prática usual nas universidades concorre
para esta desvalorização do ensino, transmitindo em sua cultura valores díspares
para as duas atividades (ensino e pesquisa).
3) Inexistência de amparo legal que estimule a formação pedagógica dos
professores universitários.
A título de exemplo, é válido mencionar que a legislação brasileira sobre
educação, mais especificamente a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional) é omissa em relação à formação pedagógica do professor universitário.
Num acompanhamento detalhado dos diversos momentos de discussão da LDB (cf.
SAVIANI, 1998, p. 144), é possível observar-se que na proposta inicial do então
senador Darcy Ribeiro, a preocupação com a formação pedagógica dos professores
universitários era contemplada:
art. 74 – A preparação para o exercício do magistério superior se faz, em nível
de pós-graduação, em programas de mestrado e doutorado, acompanhados da
respectiva formação didático-pedagógica, inclusive de modo a capacitar o uso das
modernas tecnologias do ensino.
No entanto, num processo de “enxugamento” do texto da LDB – além, é claro,
das pressões feitas por diversos setores da sociedade cujos interesses podem ser
contrariados com a exigência de maior capacitação docente –, omitiu-se do texto
final a necessidade de formação pedagógica do professor universitário,
configurando-se o texto final como segue:
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“Art. 66 - A preparação para o exercício do magistério superior far-se-á em
nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de mestrado e doutorado.”.
Assim, não encontrando amparo na legislação maior, a formação pedagógica
dos professores universitários fica a cargo dos regimentos de cada instituição
responsável pelo oferecimento de cursos de pós-graduação, refletindo, e ao mesmo
tempo regulamentando, a crença na não necessidade de que esta formação seja
oferecida.
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CONCLUSÃO
Concluindo este trabalho pode-se dizer que a partir das mudanças impostas
pela Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996), o processo de
formação do docente do ensino superior tem assumido um papel cada vez mais
relevante nas discussões acadêmicas. Uma nova ordem se configura e é necessária
uma reorientação dos projetos pedagógicos, bem como, a maneira de conceber um
ensino de qualidade conectado com o tempo e com o espaço.
As reformas educativas levadas a efeito em nosso país desde o final da
década de 1970, com o objetivo de adequar o sistema educacional ao processo de
reestruturação produtiva e aos novos rumos do Estado, vêm reafirmando a
centralidade da formação dos profissionais da educação, debatem-se diferentes
propostas para a formação, fundadas em projetos políticos e perspectivas históricas
diferenciadas, o que faz com que a formação desses profissionais seja tratada ou
como elemento impulsionador e realizador dessas reformas, ou como elemento que
cria condições para a transformação da própria escola, da educação e da sociedade.
“Estamos naquela hora de autoconsciência em que, sós,
olhamos para o horizonte e perguntamo-nos para onde ir (...).
Tanto tempo conduzidos como cegos, levados por mãos alheias,
precisamos dar agora nossas próprias passadas na direção que
escolhermos, na tentativa de modificar a radiosa história da
nossa educação, que atravessou o império, a primeira e a
segunda repúblicas, a nova (?) república e ameaça atravessar
esse tal Brasil Novo de novidades tão antigas” (MORAIS,
1991:13)
Ser professor é ter um novo olhar para toda riqueza que existe no interior e
fora das instituições. É um caminho tortuoso, de lutas, de acertos e desacertos, mas
que os professores formadores têm de travar, sabendo-se que a profissionalidade
docente é algo que nos compromete com a qualidade dos processos de
aprendizagem. Dessa forma, o processo formativo do professor encontra na prática
profissional, não só o contexto de consolidação de um mundo de crenças próprio,
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mas também o campo permanente de construção de sua personalidade. É por isso
que na formação de um professor se registra um processo de articulação da teoria
com a prática, em que a atividade de conhecimento se torna objeto de reflexão. A
profissionalização do docente do ensino superior se faz necessária para que se
tenha qualidade na educação.
“Uma visão “pedagógica” do tema da formação é, para alguns,
extremamente ingênua e idealista. Mesmo assim, é
imprescindível revisar as atuais práticas formativas e buscar no
âmbito pedagógico novas luzes que permitam iluminar esse
cenário que é a universidade, cada vez mais rica em recursos,
mas cada vez menos certa em relação ao significado do que
nela se faz. Ainda que seja apenas para recuperar a tradição
crítica da pedagogia e dos pedagogos, é valido o esforço e o
risco de ser tachado de inoportuno no atual desdobramento das
iniciativas e dos discursos impregnados de prolixidade e
hipérboles sobre a importância da formação.” (ZABALZA, 2004,
p.37)
Passamos por um momento bastante difícil, onde as tensões existentes entre
o sistema público e privado, as questões de financiamento da educação superior, a
autonomia universitária e a necessidade de constante avaliação para garantia da
qualidade estão sempre na pauta das agendas do setor político e educacional do
país.
Precisamos todos nos empenhar: governo, gestores das instituições de
ensino superior, dirigentes universitários, docentes e pesquisadores, no sentido de
honrar os compromissos assumidos, cada um fazendo a sua parte, minimizando os
problemas há muito existentes e tentando fazer deste país um Brasil melhor para
todos nós brasileiros, com uma educação de qualidade, com profissionais que
assumem seu importante papel, procurando se aprimorar e oferecer a toda
população uma educação de excelência.
Mudança é a palavra de ordem e ainda há muito por ser feito ...
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BIBLIOGRAFIA
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31
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• www.inep.gov.br – data do acesso: 24/05/2010
• http://www.scielo.br – data do acesso: 20/6/2010
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ANEXO I
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ANEXO II
34
ANEXO III
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ANEXO IV