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UNIVERSIDADE DO OESTE DE SANTA CATARINA
ÁREA DE CIÊNCIAS DAS HUMANIDADES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
MESTRADO EM EDUCAÇÃO
ANDRÉIA APARECIDA SIMÃO
TRANSFORMAÇÕES DO MUNDO DO TRABALHO E FORMAÇÃO DO
TRABALHADOR: O SUJEITO APRENDENTE
Joaçaba
2016
ANDRÉIA APARECIDA SIMÃO
TRANSFORMAÇÕES DO MUNDO DO TRABALHO E FORMAÇÃO DO
TRABALHADOR: O SUJEITO APRENDENTE
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Educação, Mestrado em Educação, da
Universidade do Oeste de Santa Catarina, como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre em Educação.
Orientadora: Profa. Dra. Luiza Helena Dalpiaz
Joaçaba
2016
ANDRÉIA APARECIDA SIMÃO
TRANSFORMAÇÕES DO MUNDO DO TRABALHO E FORMAÇÃO DO
TRABALHADOR: O SUJEITO APRENDENTE
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Educação, Mestrado em Educação, da
Universidade do Oeste de Santa Catarina, como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre em Educação.
BANCA EXAMINADORA
_______________________________________
Profa. Dra. Luiza Helena Dalpiaz (Orientadora)
Universidade do Oeste de Santa Catarina – Unoesc
___________________________________________
Prof. Dr. Domingos Leite Lima Filho (Examinador)
Universidade Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR
_______________________________________
Prof. Dr. Luiz Carlos Lückmann (Examinador)
Universidade do Oeste de Santa Catarina – Unoesc
_______________________________________
Prof. Dr. Elton Luiz Nardi (Suplente)
Universidade do Oeste de Santa Catarina – Unoesc
AGRADECIMENTOS
“Fazer-se um ser aprendente é aprender a aprender [...] é estar
vivo e aberto ao mundo, nele intervindo a vontade pela confiança exuberante de conhecer o que se oculta e aguarda
revelação” (Paulo R. do Carmo e Vilmar F. de Souza).
Aos ensinamentos das pessoas que fizeram a diferença nesse meu processo de
construção de saber:
Aos meus pais, Dario e Antoninha, aprendi a saber ser e amar o próximo
incondicionalmente.
Ao Giolvane, meu amor, amigo e grande companheiro, por mostrar-me todos esses
longos dias a enfrentar as adversidades com paciência e a me reconhecer enquanto esposa, mãe,
profissional e estudante.
À pequena Heva, que me ensinou a cada dia a importância da compreensão, do amor e
da felicidade com as pequenas coisas.
À Paula, por doar seu escutar às minhas empolgações em cada nova leitura.
Ao Roger, por me ensinar que não há obstáculos quando a ajuda ao outro vem do
coração.
A Idelmar e Vanessa, amigos, onde tudo começou, aprendi que a amizade ultrapassa os
encontros e chega ao incentivo, apoio, admiração.
À Professora Luiza, mais que orientadora, por indicar o caminho para que eu pudesse
mergulhar intensamente na escrita; “alma” maravilhosa que encontrei nesse percurso.
Ao Professor Paulino Eidt, com quem aprendi a importância de ver com humildade,
além dos limites pré-estabelecidos.
Ao Professor Domingos Leite Lima Filho e Professor Luiz Carlos Lückmann, que me
mostraram a possibilidade e disponibilidade em contribuir com este trabalho.
Aos professores do Programa de Mestrado em Educação, por conduzirem, em cada
componente, o processo para ser pesquisador.
Às profissionais da área de Recursos Humanos da empresa onde se realizou a pesquisa,
que mostraram através da acolhida, do respeito ao conhecimento científico que a aquisição de
conhecimentos pode sim ser compartilhada.
Aos profissionais que participaram da pesquisa, por mostrarem a alegria em dividir a
aprendizagem adquirida diariamente com as experiências pessoais e profissionais.
Obrigado por me fazerem sujeito aprendente.
A meus pais Dario e Antoninha.
Aos meus filhos Roger e Heva.
Ao meu esposo Giolvane.
A minha orientadora Profa. Dra. Luiza Helena Dalpiaz.
RESUMO
A dissertação aborda o tema da formação do trabalhador no contexto das transformações do
mundo do trabalho. O problema de pesquisa foi construído em um campo de tensões, dada a
interface entre duas áreas distintas do conhecimento: psicologia organizacional e educação. O
objetivo é analisar questões que emergem da relação entre transformações do mundo do
trabalho e constituição do sujeito aprendente. O modelo de gestão taylorista/fordista
caracteriza-se pela decomposição do processo de trabalho em tarefas fragmentadas e repetitivas,
com forte controle hierárquico e separação entre planejamento (gerente) e execução da tarefa
(operário). Nesse modelo, o trabalhador é especializado, individualizado e sua formação se
particulariza pelo treinamento através de instruções escritas referentes à tarefa. O modelo
toyotista, ou modelo de produção flexível, caracteriza-se pela produção por demanda, pelo
fluxo contínuo de produção, pelo trabalho em células e em equipe. Esse modelo convoca um
trabalhador polivalente e multifuncional formado na perspectiva da pedagogia de competências.
O trabalho de campo foi construído junto a uma empresa de grande porte, do ramo alimentício,
da região do Meio-Oeste catarinense. O objetivo foi evidenciar perspectivas singulares de
diferentes atores sociais que compõem o cenário organizacional, mediante entrevistas
compreensivas com cinco atores sociais, que ocupam diferentes cargos em diferentes setores.
O conteúdo das entrevistas foi integralmente transcrito. A sistematização e análise de dados
observou pressupostos da análise de conteúdo. Considerando a empresa como lócus de
aprendizagem, os resultados do trabalho de campo mostram três questões emergentes sobre a
constituição do sujeito aprendente no contexto organizacional: novas tecnologias e novas
exigências, formação profissional e avaliação do trabalhador no processo de trabalho. Esse
conjunto de resultados levou a formular três hipóteses: o sujeito aprendente aprende a aprender
ao longo da vida considerando o real do trabalho; a formação do sujeito aprendente contém
potencialmente duas possibilidades, seja consolidar a exploração da mais valia do trabalhador,
seja produzir condições para construir formas individuais e coletivas de cidadania; atualmente,
na organização há simultaneidade entre os modelos de gestão taylorista/fordista e toyotista cujo
efeito são exigências complementares para a formação do trabalhador.
Palavras-chave: Formação do trabalhador. Sujeito aprendente. Educação na empresa.
Transformações do mundo do trabalho. Educação e trabalho.
ABSTRACT
This dissertation adresses the theme of worker formation in the context of the transformations
of the work environment. The research problem was built in a field of tensions, given the
interface between two distinct branches of knowledge: organizational psychology and
education. The goal is to analyze emerging issues from the relation between working
environment transformations and the formation of the learner subject. The taylorist/fordist
management model is characterized by the decomposition of the work process in fragmented
and repetitive tasks, which have intense hierarchical control and segregation of planning
(manager) and execution (worker). In this model the worker is specialized, individualized and
his formation is specified through training using written instructions concerning his task.
Toyotism, also known as the flexible production model, is characterized by on-demand
production, continuous production flow, work in cells and teamwork. This model calls for a
multipurpose and multifunctional worker, formed in view of the skills of pedagogy. The field
work was built jointly with a large-sized company of the food industry from the midwest of
Santa Catarina. This work aimed to evidence singular perspectives from different social actors
which make up the organizational scenario. It was made through comprehensive interviews
with five social actors which occupy different posts in different sectors of the company. The
content of this interviews were fully transcribed. The systematization and data analysis
observed assumptions from the content analysis. Considering the company as learning locus,
the field work results show three emerging issues on the formation of the learnig subject in the
organizational context: new technologies and new requirements, professional formation and
worker evaluation in the work process. This result set led to formulate three hypothesis: The
learning subject learns to learn throughout life, considering his work reality; the formation of
the learning subject contains potentially two possibilities, either to consolidate the exploitation
of the surplus value of the worker, or to produce conditions for building individuals and
collective ways of citizenship; currently in the organization there is simultaneity among the
management models taylorist/fordist and toyotist whose effects are complementary demands
for worker formation.
Keywords: Worker formation. Subject learner. Education in the company. Transformations of
work environment. Education and work.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AI - 5 Ato Institucional Nº 5
AID Agency for International Development
Alca Área de Livre Comércio das Américas
Ande Associação Nacional de Educação
Anped Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação
BID Banco Internacional de Desenvolvimento
Cedes Centro de Estudos Educação e Sociedade
Cefet Centro Federal de Educação Tecnológica
Cepal Comissão Econômica para a América Latina e Caribe
CFE Conselho Federal de Educação
Ciesp Centro das Indústrias do Estado de São Paulo
CPB Confederação de Professores do Brasil
Edurural Programa de Extensão e Melhorias para o Meio Rural
ESG Escola Superior de Guerra
FMI Fundo Monetário Internacional
GEPPeC Grupo de Pesquisa Educação, Políticas Públicas e Cidadania
GT Grupo de Trabalho
Idort Instituto de Organização Racional de Trabalho
Ipes Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais
LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
LNT Levantamento das Necessidades de Treinamento
MEC Ministério da Educação
Mercosul Mercado Comum do Sul
Mobral Movimento Brasileiro de Alfabetização
MTb Ministério do Trabalho e Emprego
TEM Ministério do Trabalho e Emprego
OCDE Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico
OECE Organização Europeia para Organização Econômica
OIT Organização Internacional do Trabalho
PAT Programa Anual de Treinamento
PCNs Parâmetros Curriculares Nacionais
PDI Plano de Desenvolvimento Individual
Peti Programa de Erradicação do Trabalho Infantil
Piaac Programa Internacional para Avaliação das Competências dos Adultos
Pice Política Industrial e de Comércio Exterior
Planfor Plano Nacional de Educação Profissional
PND Plano Nacional de Desestatização
PNE Plano Nacional de Educação
PNQ Plano Nacional de Qualificação Social e Profissional
PPA Plano Plurianual
PPGEd Programa de Pós-Graduação em Educação
Prodasec/
Pronasec
Programas de Ações Socioeducativas e Culturais para as Populações
Carentes do Meio Urbano/e do Meio Rural
Proeja Programa de Integração da Educação Profissional ao Ensino
Projovem Programa Nacional de Inclusão do Jovem
Pronatec Programa Nacional de Acesso ao ensino Técnico e ao Emprego
Prouni Programa Universidade para Todos
RH Recursos Humanos
Sebrae Serviço Brasileiro de Apoio à Micro e Pequenas Empresas
SEC Sistema de Educação Corporativo
Senac Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial
Senai Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
Senar Serviço Nacional de Aprendizagem Rural
Senat Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte
Sesc Serviço Social do Comércio
Sest Serviço Social do Transporte
Sesi Serviço Social da Indústria
Sine Sistema Nacional de Emprego
T&D Treinamento e Desenvolvimento
UCs Universidades Corporativas
Unesco Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura
URV Unidade Real de Valor
Usaid United States Agency of International Development
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO..................................................................................................... 10
2 TRANSFORMAÇÕES DO MUNDO DO TRABALHO E MODELOS DE
GESTÃO ............................................................................................................... 13
2.1 MODELO TAYLORISTA/FORDISTA .................................................................. 18
2.2 MODELO TOYOTISTA ........................................................................................ 26
3 ELEMENTOS DA FORMAÇÃO DO TRABALHADOR NO BRASIL ............ 33
3.1 ENSINO DE OFÍCIOS ........................................................................................... 35
3.2 FORMAÇÃO TÉCNICA E PROFISSIONAL ........................................................ 47
3.3 TRABALHO E POLÍTICAS PARA FORMAÇÃO DO TRABALHADOR ........... 65
4 FORMAÇÃO POR COMPETÊNCIAS E O SUJEITO APRENDENTE .......... 83
4.1 EDUCAÇÃO EMPRESARIAL E FORMAÇÃO POR COMPETÊNCIAS: A
APRENDIZAGEM COMO UMA ESTRATÉGIA EMPRESARIAL ...................... 83
4.2 SUJEITO APRENDENTE: UMA CATEGORIA EM ELABORAÇÃO .................. 94
5 SUJEITO APRENDENTE E EDUCAÇÃO NA EMPRESA: QUESTÕES
EMERGENTES .................................................................................................. 101
5.1 ESCUTA SINGULAR DE TRABALHADORES ................................................. 101
5.2 NOVAS TECNOLOGIAS E NOVAS EXIGÊNCIAS........................................... 106
5.3 FORMAÇÃO PROFISSIONAL ........................................................................... 109
5.4 AVALIAÇÃO DO TRABALHADOR NO PROCESSO DE TRABALHO ........... 114
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 120
REFERÊNCIAS .................................................................................................. 123
APÊNDICES ....................................................................................................... 135
10
1 INTRODUÇÃO
A presente dissertação vincula-se ao Programa de Pós-Graduação em Educação
(PPGEd), Mestrado em Educação, Linha de Pesquisa “Educação, Políticas Públicas e
Cidadania”, Grupo de Pesquisa “Educação, Políticas Públicas e Cidadania” (GEPPeC). No
grupo, essa dissertação filia-se à Linha de Pesquisa “Trabalho, Educação e Desenvolvimento
Social”.
No plano científico, a construção do problema de pesquisa é fruto de um campo
(BOURDIEU, 1989) constituído de tensões dada a interface entre duas áreas distintas de
conhecimento: psicologia organizacional e educação. Na primeira, realizei minha formação
inicial e prática profissional até este momento; na segunda, desenvolvo a presente dissertação.
Inicialmente chamada psicologia industrial ou do trabalho, a psicologia organizacional,
oriunda da ciência psicológica, relaciona questões do trabalho do sujeito nas organizações, com
vistas a promover a saúde do trabalhador e sua satisfação em relação ao trabalho; faz interface
com problemas organizacionais ligados à gestão de recursos humanos, nas chamadas funções
clássicas, como recrutamento e seleção de pessoas, estudo de cultura e clima organizacional,
treinamento e desenvolvimento, avaliações de potencial, entre outros (GOULART; SAMPAIO,
1998).
Nesse contexto, este trabalho está centrado nos recursos humanos de organizações
empresariais, na área de treinamento e desenvolvimento. Meu objetivo é trabalhar sobre as
condições de aprendizagem do sujeito no contexto organizacional. Em consequência, busquei
o Mestrado em Educação, para tentar compreender como se constitui o sujeito aprendente no
contexto das transformações do mundo do trabalho.
No plano epistemológico, a elaboração desse problema de pesquisa emerge de um
trabalho fundamentado no método de problematização de práticas profissionais, construído a
partir das noções de crise do praticante e tensão paradigmática (DALPIAZ, 2015). Nessa
perspectiva, há uma ruptura paradigmática, pois o praticante torna-se mestrando pesquisador
de sua própria prática, para construir conhecimento científico. O pesquisador comumente
dissociado do problema que investiga problematiza sua prática reconhecendo-se implicado no
contexto organizacional que interroga. Para Dalpiaz (2005, p. 68), a implicação “produz uma
hipótese: a pergunta do sujeito singular contém uma interrogação sobre o respectivo campo de
prática social e área de conhecimento.”
Na presente dissertação, de forma exploratória, busco problematizar e esboçar uma
noção de sujeito aprendente, considerando o contexto das transformações do mundo do trabalho
11
e os dois modelos clássicos de gestão da produção e do trabalho. O modelo taylorista/fordista,
da produção em massa e do consumo de massa, caracteriza-se pela decomposição do processo
de trabalho em tarefas fragmentadas e repetitivas, com forte controle hierárquico e separação
entre planejamento (gerente) e execução da tarefa (operário) (TAYLOR, 1990; FORD, 1967).
Nesse modelo, o trabalhador é especializado, individualizado e sua formação se particulariza
pelo treinamento mediante instruções escritas referentes à tarefa. O modelo toyotista, ou modelo
de produção flexível, caracteriza-se pela produção por demanda, pelo fluxo contínuo de
produção, pelo trabalho em células e em equipe (OHNO, 1997). Esse modelo convoca um
trabalhador polivalente e multifuncional formado na perspectiva da pedagogia de competências
(RAMOS, 2011).
Em consequência, a pergunta da pesquisa é a seguinte: quais questões emergem da
relação entre transformações do mundo do trabalho e constituição do sujeito aprendente? Essa
pergunta desdobra-se nas seguintes questões de pesquisa:
a) Quais são as bases das transformações do mundo do trabalho e dos modelos de gestão
empresarial?
b) Que elementos sócio-históricos e conceituais particularizam a formação do trabalhador
no Brasil?
c) Que aspectos conceituais caracterizam a formação por competências e o sujeito
aprendente?
d) Quais questões emergem sobre o sujeito aprendente considerando perspectivas
singulares de diferentes atores sociais que compõem o cenário organizacional?
O objetivo geral da pesquisa é analisar questões que emergem da relação entre
transformações do mundo do trabalho e constituição do sujeito aprendente. Esse objetivo
desdobra-se nos seguintes objetivos específicos:
a) compreender bases das transformações do mundo do trabalho e dos modelos de gestão
empresarial;
b) apresentar elementos sócio-históricos e conceituais que particularizam a formação do
trabalhador no Brasil;
c) mostrar aspectos conceituais que caracterizam a formação por competências e o sujeito
aprendente;
d) evidenciar questões que emergem sobre o sujeito aprendente considerando perspectivas
singulares de diferentes atores sociais que compõem o cenário organizacional.
Em termos metodológicos, trata-se de uma pesquisa exploratória e qualitativa
(MINAYO, 1996), que articula três procedimentos de investigação: pesquisa bibliográfica,
12
pesquisa documental e trabalho de campo. Este foi realizado através de entrevistas
compreensivas (KAUFMANN, 2013), pelas quais busquei evidenciar indícios (GINZBURG,
1989) de diferentes pontos de vista complementares (ARDOINO, 1998) de atores sociais de
uma empresa de grande porte, do ramo alimentício, da região do Meio-Oeste catarinense. As
entrevistas foram gravadas após acordo, de cada informante, expresso pela assinatura do Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido. O conteúdo das entrevistas foi integralmente por mim
transcrito. A sistematização e análise de dados observou pressupostos da análise de conteúdo
(BARDIN, 1977).
A presente dissertação está organizada em cinco seções. Na primeira, apresento
elementos que contextualizam a formulação do sujeito aprendente como problema de pesquisa,
na interface entre os campos da psicologia organizacional e da educação. Na segunda, explicito
características das transformações do mundo do trabalho e dos modelos clássicos de gestão
empresarial: taylorista/fordista e toyotista. Na terceira, abordo a formação do trabalhador no
Brasil ressaltando aspectos sócio-históricos e conceituais a partir de três aspectos: ensino de
ofícios; formação técnica e profissional; educação, trabalho e tecnologia. Na quarta seção,
mostro elementos conceituais que compõem a formação por competências e o sujeito
aprendente. A quinta seção é dedicada ao trabalho de campo realizado e respectivos
procedimentos metodológicos, assim como a sistematização e análise de dados referentes às
questões emergentes sobre o sujeito aprendente. Nas considerações finais, teço reflexões nas
quais procuro entrelaçar evidências da pesquisa que me permitem formular hipóteses sobre o
sujeito aprendente no contexto das transformações do mundo do trabalho, assim como projetar
tendências da continuidade da minha trajetória como pesquisadora no campo da educação.
13
2 TRANSFORMAÇÕES DO MUNDO DO TRABALHO E MODELOS DE GESTÃO
Para discutir as transformações do mundo do trabalho, procuro, inicialmente, definir as
duas categorias transformação e trabalho, considerando sua polissemia em diferentes
perspectivas. Com origem no latim transformatio-onis, significa “transformação, mudança de
forma, metamorfose.” (SOUZA, 1992, p. 1036). No sentido etimológico, transformação
significa “transfigurar, converter.” (CUNHA, 1999, p. 782). Para a língua portuguesa, é “ato ou
efeito de transformar (-se); metamorfose.” Para álgebra, transformação é “a que transforma um
conjunto em outro de tal modo que todos os elementos deste segundo são imagens de, pelo
menos, um elemento do primeiro.” O verbo transformar significa “dar nova forma, feição ou
caráter a; tornar diferente do que era; mudar, alterar, modificar, transfigurar, metamorfosear.”
(FERREIRA, 2010, p. 2069).
Na biologia, transformação refere-se à metamorfose para designar uma mudança na
forma e na estrutura corporal (tecidos, órgãos), assim como o crescimento e diferenciação, dos
estágios juvenis e larvais de diversos animais. A metamorfose “transcorre com profundas
transformações do indivíduo já em franca atividade no meio ambiente, após o seu nascimento
ou eclosão.” (SOARES, 1993, p. 284).
A psicologia trata transformação através da situação do sujeito que é social partindo da
história singular de cada um. Segundo Freud (2011, p. 35), “[...] as expectativas subjetivas do
indivíduo representam um papel difícil de avaliar; elas se mostram dependentes de fatores
puramente pessoais de sua experiência particular, de sua atitude mais ou menos esperançosa
em relação à vida [...]” Experiências essas que transcendem a constituição psíquica influenciada
pela constituição da civilização e da cultura; porém, de acordo com Freud (2011), cultura do
homem e civilização não se separa, uma vez que a cultura
abrange, por um lado, todo o saber e toda a capacidade adquiridos pelo homem com
o fim de dominar as forças da natureza e obter seus bens para a satisfação das
necessidades humanas e, por outro, todas as instituições necessárias para regular as
relações dos homens entre si e, em especial, a divisão dos bens acessíveis. (FREUD,
2011, p. 37).
O homem necessita, além das forças da natureza para sobreviver, das relações
interpessoais que o constituem em sociedade, pois “as relações mútuas entre os homens são
profundamente influenciadas pela medida de satisfação dos impulsos possibilitada pelos bens
existentes.” (FREUD, 2011, p. 37). O sujeito transforma-se em razão da indissociabilidade do
14
social e do cultural. Isso se traduz num desenvolvimento humano ligado às condições sócio-
históricas que entrelaçam a função material.
Segundo Luria (1991, p. 9), “as formas principais de atividade psíquica do homem
surgem nas condições da história social, desenvolvem-se no processo de atividade material
surgido ao longo da história, baseiam-se nos meios que se formaram no processo de trabalho,
de emprego dos instrumentos de trabalho e da linguagem.” Assim se dá o entrelaçamento do
social e do cultural na constituição psíquica, a partir das transformações da sociedade
(CROMBERG, 2001).
Para Marx (1996), a transformação é operada pelo homem por meio do processo de
trabalho no qual o material da natureza é adaptado às necessidades humanas pela mudança de
forma. “Durante o processo de trabalho, o trabalho se transforma de ação em ser, de movimento
em produto concreto.” (MARX, 1996, p. 214). O trabalho é uma forma social. Quando homens
trabalham uns para os outros, o resultado das relações de produção é a divisão da sociedade em
classes, na qual a burguesia detém os meios de produção e o proletariado, a força de trabalho.
A estruturação da sociedade ocorre na promoção de interesses da classe dominante, ou seja, da
burguesia que explora o proletariado (MARX; ENGELS, 1999a). “A transformação social
ocorre na medida em que as contradições que se manifestam na base material da sociedade
dêem origem a determinadas formas de consciência e, conforme essa consciência, os homens
atuem no sentido de transformar ou de conservar a realidade social.” (SILVA, 2003, p. 2). O
homem modifica o estado de um sistema em outro pelo processo de trabalho, pois é essa
atividade do homem que opera uma transformação (MARX, 1996).
Para Weber (1998), a transformação está associada às ações sociais. De acordo com
Weber (1998, p. 3), ação social significa “uma ação que, quanto a seu sentido visado pelo agente
ou os agentes, se refere ao comportamento de outros, orientando-se por este, em seu curso.”
Conforme esse autor, a ação individual do homem fundamenta-se nas relações sociais e
influencia a vida em sociedade. Segundo Weber (1998, p. 17), “uma relação social pode ter um
caráter inteiramente transitório, bem como implicar permanência, isto é, que exista a
probabilidade de repetição contínua de um comportamento correspondente ao sentido.” A ação
social acontece por intermédio das relações entre os indivíduos e dos processos de comunicação
de uns com os outros. Orientados pela ação social, os indivíduos determinam seus
comportamentos circunstanciados no modo de vida, correspondente ao prestígio derivado da
descendência ou profissão (WEBER, 1998).
Durkheim (1999, p. 14) enfatiza a divisão do trabalho como propulsora da evolução da
sociedade, destacando que a divisão do trabalho é “condição necessária do desenvolvimento
15
intelectual e material das sociedades; é a fonte da civilização”, pois é ela responsável “por
aumentar ao mesmo tempo a força produtiva e a habilidade do trabalhador.” Transformação,
para Durkheim (1999, p. 16), está na força do desenvolvimento social, uma vez que “as
sociedades tendem cada vez mais a considerar um dever para o indivíduo desenvolver sua
inteligência, assimilando as verdades científicas que são estabelecidas”, aumentando a
independência do indivíduo em relação às diferentes funções exercidas, transformando assim a
interação social.
Para Bourdieu (1989), transformação está associada às trajetórias sociais, nas quais o
indivíduo incorpora ou adquire capitais (econômico, cultural, simbólico e social) e forma o seu
habitus. Segundo Bourdieu (1989, p. 61), o habitus “é um conhecimento adquirido e também
um haver, um capital (de um sujeito transcendental na tradição idealista) o habitus, a hexis,
indica a disposição incorporada, quase postural -, mas sim o de um agente em ação.” A posição
ocupada pelo sujeito na estrutura social o faz incorporar um conjunto específico de disposições
para a ação que o orientam ao longo do tempo, nas mais diversas situações sociais.
Em síntese, transformação refere-se a um processo de mudança de forma e estrutura
entre elementos distintos e interdependentes: o corpo e ambiente da biologia, a experiência
particular e a cultura da psicologia, o homem e a natureza na educação. Ao mesmo tempo, de
um ponto de vista sociológico, em geral, a transformação é abordada desde quatro perspectivas
diferentes: transformação da realidade pela consciência de contradições da sociedade de classes
(Marx), transformações das relações sociais pela ação social (Weber), desenvolvimento social
(Durkheim), trajetórias sociais e incorporação do habitus (Bourdieu).
A essência humana não é, então, dada ao homem; não é uma dádiva divina ou natural;
não é algo que precede a existência do homem. Ao contrário, a essência humana é
produzida pelos próprios homens. O que o homem é, é-o pelo trabalho. A essência do homem é um feito humano. É um trabalho que se desenvolve, se aprofunda e se
complexifica ao longo do tempo: é um processo histórico. (SAVIANI, 2007, p. 154).
Em termos etimológicos, a palavra trabalho é originária do latim tripaliare – torturar,
derivado de tripalium “instrumento de tortura composto de três paus; da ideia inicial de ‘sofrer,
passou-se à de ‘esforçar(se), lutar, pugnar’ e, por fim, ‘trabalhar’ – trabalho.” Trabalho é
derivado do verbo trabalhar, que significa “ocupar-se em algum mister, exercer o seu ofício.”
(CUNHA, 1999, p. 779).
Na língua portuguesa, a palavra trabalho refere-se à “aplicação das forças e faculdades
humanas para alcançar um determinado fim: o trabalho permite ao homem certo domínio sobre
16
a natureza; [...] atividade coordenada, de caráter físico e/ou intelectual, necessária à realização
de qualquer tarefa, serviço ou empreendimento.” (FERREIRA, 2010, p. 2063).
Pinto (2007) e Gorz (1982) assinalam que trabalho, como atividade laboral assalariada,
é visto pelo homem como atividade obrigatória, nem sempre desejável, uma vez que a
associação à origem da palavra traz o sentido de tortura, uma questão de sobrevivência. Para
Saviani (2000), o trabalho é uma ação intencional adequada a finalidades, instaurando-se
quando seu agente – o homem – antecipa mentalmente a finalidade da ação, extraindo da
natureza intencionalmente os meios de sua subsistência.
Segundo Marx (1996, p. 202), “o trabalho é um processo de que participam o homem e
a natureza, processo em que o ser humano com sua própria ação, impulsiona, regula e controla
seu intercâmbio material com a natureza.” Para Gorz (1982), trabalho está relacionado à
evolução do homem que supre suas necessidades ante o meio. No trabalho, encontra-se o
sentido de transformação de bens necessários ao bem-estar do homem.
Em síntese, na origem o termo trabalho vincula-se à ideia de tortura e sofrimento. O
trabalho implica ação do homem sobre a natureza, através de atividades físicas e intelectuais,
pela aplicação de forças e faculdades humanas, tendo em vista intencionalidades adequadas a
finalidades. O trabalho constitui-se na transformação de bens necessários ao bem-estar do
homem para sua sobrevivência.
De acordo com Marx (1996, p. 208), o processo de trabalho
é atividade dirigida com o fim de criar valores-de-uso, de apropriar os elementos
naturais às necessidades humanas, é condição necessária do intercâmbio material
entre o homem e a natureza; é condição natural eterna da vida humana, sem depender,
portanto, de qualquer forma dessa vida, sendo antes comum a todas as suas formas
sociais.
No processo de trabalho, a atividade do homem opera uma transformação no objeto
subordinada a determinado fim, por meio de instrumental de trabalho. O processo extingue-se
ao concluir o produto. O produto é um material da natureza adaptado às necessidades humanas
através da mudança de forma. O trabalho está incorporado ao objeto sobre o qual atuou. O que
se manifestava em movimento, do lado do trabalhador, revela-se agora qualidade fixa, na forma
de ser, do lado do produto (MARX, 1996).
Dessa forma, a noção de modo de produção supõe que o homem se defronte com “a
natureza como uma de suas forças” (MARX, 1996, p. 202), utilizando seu corpo para apropriar-
se dos recursos, modificar a natureza para produzir, além de seu sustento os seus bens.
Transforma a si mesmo, pois o homem produz a partir de seu conhecimento, seu aprendizado,
17
sua experiência. Ele imprime ao produto produzido não somente o método de execução, mas a
sua subjetividade, esta que no modo de produção capitalista fica alienada (MARX, 1996).
Segundo Catani (1984), o modo de produção está diretamente relacionado às relações
que se estabelecem entre os homens a partir de suas vinculações ao processo de produção, com
a intenção de produzir e reproduzir sua vida material e aos meios necessários à produção. O
capitalismo se constitui não somente da produção de mercadorias, mas também do trabalho do
homem. Sua força de trabalho se constitui como mais valia, objeto de troca. Assim, tanto a
mercadoria quanto a força de trabalho tornam-se socialmente uteis e se caracterizam como
reconhecidos como elementos da divisão social do trabalho.
Para Marx (1996, p. 121), “[...] os homens só se apropriam do produto do trabalho
alheio, alienando o produto do próprio trabalho”, ou seja, o produto a ser produzido é de outrem,
na mecanização do seu próprio ser, pois a divisão social do trabalho “tanto especializa seu
trabalho quanto pluraliza suas necessidades.”
Max Weber (2013) formula sua concepção de trabalho a partir da teologia protestante,
relacionando-o diretamente com o conceito de vocação profissional. No “espírito capitalista”,
há articulação de uma ética de vida em torno da dedicação ao trabalho e da busca da riqueza,
estes um dever moral. Para Weber (2013, p. 21), o trabalho na sociedade capitalista se
caracteriza pela organização racional do trabalho livre, “a separação entre negócios e vida
doméstica, que é completamente dominante na vida econômica hodierna” e a implementação
da contabilidade racional, ou seja, a separação entre empreendimentos empresariais e pessoais,
originando a classe burguesa ocidental ligada estritamente à divisão do trabalho.
Segundo Saviani (2007, p. 158),
o avanço das forças produtivas, ainda sob as relações feudais, intensificou o
desenvolvimento da economia medieval, provocando a geração sistemática de
excedentes e ativando o comércio. Esse processo desembocou na organização da
produção especificamente voltada para a troca, dando origem à sociedade capitalista.
Nessa nova forma social, inversamente ao que ocorria na sociedade feudal, é a troca
que determina o consumo.
Para análise do capitalismo, em geral, consideram-se duas correntes: a histórica,
representada por Karl Marx, e a culturalista, representada por Max Weber (CATANI, 1984).
Marx parte das condições históricas, da Revolução Industrial e define o capitalismo como sendo
a produção intensiva de mercadorias. Consoante Marx (1996, p. 166), “todo capital novo, para
começar, entra em cena, surge no mercado de mercadorias, de trabalho ou de dinheiro, sob a
forma de dinheiro que, através de determinados processos, tem de transformar em capital.”
18
De acordo com Weber, “existe capitalismo onde quer que a provisão industrial das
necessidades de uma comunidade seja executada pelo método de empresa, pelo estabelecimento
capitalista racional e pela contabilidade do Capital.” (CATANI, 1984, p. 8). O capitalismo
constituiu-se a partir do modo de pensar as relações socioeconômicas originadas do
protestantismo de Lutero e do calvinismo. Assim, o espírito do capitalismo é “um complexo de
elementos associados na realidade histórica que unimos em uma totalidade conceitual a partir do
ponto de vista de sua significação cultural” (WEBER, 2013, p. 51), que valoriza o trabalho e a
vocação em busca da salvação individual. Segundo Catani (1984, p. 18):
o capitalismo seria a cristalização objetiva destas premissas teológicas e éticas, segundo as quais o homem, em virtude de seu trabalho e da riqueza criada por este
trabalho, encontra um modo sensível e concreto de conquistar sua salvação individual.
Acabou-se por cristalizar no modo de produção capitalista a ideia de que o importante
neste mundo é trabalhar para criar riqueza, e criar riqueza não para o desfrute pessoal
e esbanjamento, mas sim para que se crie novamente trabalho.
Na sequência, apresento características que revelam mudanças na forma e na estrutura
de cada um dos dois modelos clássicos de gestão que indicam particularidades de
transformações do mundo do trabalho no sistema capitalista: modelo taylorista/fordista e
toyotista. Tais modelos contextualizam a formação de trabalhadores, tema que é objeto de
análise desta dissertação.
2.1 MODELO TAYLORISTA/FORDISTA
O século XIX foi uma era de invenções e descobertas, com significativo
desenvolvimento científico nos campos da matemática, física, química, biologia, elétrica e
metalurgia. Esse contexto lançou as bases para os avanços tecnológicos do século XX. A
industrialização como atividade econômica básica veio a se estabelecer somente no final do
século XIX e se caracterizou pela mecanização das atividades de trabalho que produziram
efeitos tanto na organização e gestão da produção quanto na organização social do trabalho.
Para Gorz (1982) e Giddens (1991), a industrialização abrange, também, a vida cotidiana do
trabalhador, nos planos material e subjetivo, assim como sua capacidade física e intelectual.
Em consequência, houve aumento da capacidade produtiva em quantidade, especificidade e
diversidade, desenvolvimento de meios de transporte e de comunicação, assim como expansão
de fronteiras de mercados nacionais e diversificação de produtos no mercado internacional
19
(PINTO, 2007). Conforme Giddens (2008), a urbanização constitui o processo de expansão do
capitalismo industrial.
O desenvolvimento tecnológico produziu a necessidade de reorganizar tanto os espaços
fabris quanto as ações de trabalho, da produção e da administração. Na época, estudiosos
buscavam estabelecer sistemas de organização, com o objetivo de aumentar a qualidade do
produto com menor tempo para a realização de tarefas complexas (PINTO, 2007). Nesse
sentido, Frederick Winslow Taylor, em seu livro Os Princípios da Administração Científica,
publicado em 1911, mostra como poderia haver um aumento expressivo da produtividade
através da “decomposição de cada processo de trabalho em movimentos componentes e da
organização de tarefas de trabalho fragmentadas segundo padrões rigorosos de tempo e estudo
do movimento.” (HARVEY, 2011, p. 121).
Chamado o “Pai da Organização Científica do Trabalho”, Taylor nasceu em
Germantown na Filadélfia, Estados Unidos. Aos dezoito anos foi trabalhar como aprendiz em
uma oficina mecânica próximo à sua casa. Aos vinte e dois anos conseguiu emprego, como
operário, nas oficinas de construção de máquinas Midvale Steel Company. Em seguida, dado o
seu preparo no curso colegial ocupou o cargo de contador, logo trabalhou como torneiro por
apresentar maior rendimento que os outros operários e assumiu a função de mestre dos tornos,
mais tarde chefe da seção. Em 1885, forma-se em Engenharia no Stevens Institute
(GERENCER, 1982). Ainda muito jovem, Taylor interrogava-se sobre a melhor forma de
trabalhadores realizarem o seu trabalho.
Taylor queria que os homens sobre sua direção realizassem durante um dia de trabalho
uma produção aceitável, e impôs a si próprio o trabalho de encontrar um método
adequado para fazer um trabalho, ensinar o trabalhador a realiza-lo e fixar as
condições em que o referido trabalho deveria desenvolver-se, fixar o tempo-padrão
para realização do dito trabalho e, por fim, pagar ao trabalhador um prêmio em forma
de salário extraordinário, se fizesse o serviço como especificado. (GERENCER, 1982,
p. 16).
Taylor1 observa que a produção real do trabalhador era menor que sua capacidade
produtiva. Se por um lado a habilidade adquirida com a experiência no trabalho aumentava a
produtividade, por outro a troca de operação e deslocamento no espaço levava a perder tempo
e diminuir a produtividade (PINTO, 2007). Com um cronômetro nas mãos, Taylor tinha como
1 O pensamento de Taylor teve a influência do estudo dos movimentos de Frank Bunker Gilbreth (1890), que
também abordava a divisão do trabalho, e de obras de Ure e Babbage – escritores da metade do século XIX –
considerados reveladores por Marx (HARVEY, 2011).
20
objetivo promover racionalizações e melhorias, pois a preocupação era “simplificar o fluxo
horizontal dos processos de produção.” (HARVEY, 2011 p.123).
Cronometrando o tempo de cada movimento do trabalhador na execução de atividades,
subdivididas em tarefas simples, levaria ao tempo “real” gasto para realizar cada operação. Tais
resultados possibilitariam que as gerências exigissem do trabalhador “o cumprimento da
‘quantidade ideal’ de trabalho diário, ou seja: nem muito, evitando prejudicar a saúde dos
trabalhadores e pô-los de licença, nem pouco, a fim de não se perder sequer um segundo do
tempo de sobre-trabalho não pago que lhes seria extraído em cada produto.” (PINTO, 2007, p.
30). Taylor buscava uma resposta ao problema específico de como controlar melhor o trabalho
alienado, essa força de trabalho comprada e vendida (BRAVERMAN, 1987 apud NAVARRO;
PADILHA, 2006).
Anteriormente cabia às gerências a habilidade e a função de gerenciar a produção,
apenas fixando tarefas, sem interferir no modo como seriam fabricados os produtos. Taylor
inverte esta prática, para ele a gerência poderia se tornar um empreendimento limitado e
frustrado se as decisões sobre o trabalho ficassem com o trabalhador. Com Taylor se estabelece
a divisão técnica do trabalho em termos de prática e de conhecimento, reduzindo o poder
operário sobre a produção e limitando sua autonomia (GORZ, 1982).
Nesse sentido, institui-se a separação entre concepção, gerência, execução e controle do
processo de trabalho, assim como relações sociais hierárquicas (NAVARRO; PADILHA, 2006;
HARVEY, 2011). Nesse contexto, cabia às gerências o controle total do tempo, da atividade e do
trabalhador, formando um “exército de trabalhadores braçais e não-qualificados militarmente
enquadrados.” (GORZ, 1982). Taylor entendia que não precisava de pessoas excepcionais para o
trabalho, assim não necessitava de um “organismo completo” (FLEURY; VARGAS, 1983).
Na administração científica, a iniciativa do trabalhador (que é seu esforço, sua boa
vontade, seu engenho) obtém-se com absoluta uniformidade e em um grau muito
maior do que é possível sob o antigo sistema; e em acréscimo a esta vantagem
referente ao homem, os gerentes assumem novos encargos e responsabilidades, jamais
imaginados no passado. À gerência é atribuída, por exemplo, a função de reunir todos
os conhecimentos tradicionais que no passado possuíram os trabalhadores e então
classificá-los, tabulá-los, reduzi-los a normas, leis ou fórmulas, grandemente úteis ao
operário para execução de seu trabalho diário. Além de desenvolver deste modo uma
ciência, a direção exerce três tipos de atribuições que envolvem novos e pesados encargos para ela. Estas novas atribuições podem ser agrupadas nos quatro títulos
abaixo:
Primeiro – Desenvolver para cada elemento do trabalho individual uma ciência que
substitua os métodos empíricos.
Segundo – Selecionar cientificamente, depois treinar, ensinar e aperfeiçoar o
trabalhador. No passado ele escolhia seu próprio trabalho e treinava a si mesmo como
podia.
21
Terceiro – Cooperar cordialmente com os trabalhadores para articular todo trabalho
com os princípios da ciência que foi desenvolvida.
Quarto – Manter a divisão equitativa de trabalho e de responsabilidades entre a direção
e o operário. A direção incumbe-se de todas as atribuições, para as quais esteja mais
bem aparelhada do que o trabalhador, ao passo que no passado quase todo o trabalho
e a maior parte das responsabilidades pesavam sobre o operário. (TAYLOR, 1999, p.
40-41).
O modelo de gestão taylorista promove a separação entre direção/gerência e operários
estabelecendo funções próprias e complementares, assim como relações sociais baseadas em
uma estrutura hierárquica cujo domínio do processo de trabalho era atribuído às chefias.
A ideia da tarefa é, quiçá, o mais importante elemento na administração científica. O
trabalho de cada operário é completamente planejado pela direção [...] e cada homem
recebe, na maioria dos casos, instruções escritas completas que minudenciam a tarefa
de que é encarregado e também os meios usados para realizá-la. [...] na tarefa é
especificado o que deve ser feito e também como fazê-lo, além do tempo exato
concebido para a execução. [...] A administração científica, em grande parte, consiste em preparar e fazer executar essas tarefas. (TAYLOR, 1999, p. 42).
Tendo em vista a separação do planejamento/preparação e a execução dos processos
industriais, há necessidade de preparar o operário para a produção do produto, ou seja, realizar
um planejamento, “instruir o homem sistematicamente, sobre como realizar o trabalho da
melhor maneira.” (TAYLOR, 1990, p. 52). Através de instruções escritas define-se quem vai
fazer o que de acordo com a especialidade ou função particular, compondo um trabalho
combinado (TAYLOR, 1990). As fichas de instrução contêm quantidades, meios e resultados
esperados. Além do treinamento para repetir movimentos por longos períodos, o trabalhador é
treinado para cumprir ordens (PINTO, 2007).
A partir de métodos experimentais e padronizados, há redução na quantidade de
operações desnecessárias, no tempo de execução, em gastos de energia física e mental dos
trabalhadores, na ociosidade dos equipamentos, nos intervalos entre as operações (PINTO,
2007). De acordo com Taylor (1990, p. 26), “o objetivo mais importante de ambos, trabalhador
e administração, deve ser a formação e o aperfeiçoamento do pessoal da empresa, de modo que
os homens possam executar em ritmo mais rápido e com maior eficiência os tipos mais elevados
de trabalho.” Esse método da administração científica institui no trabalhador um
(des)conhecimento interessado pela gerência, associado “ao controle do ritmo de trabalho e à
sua intensificação, de modo a propiciar às gerências a identificação de possibilidades de
aumentar a extração de mais-valia aos trabalhadores.” (PINTO, 2007, p. 37).
O modelo de gestão taylorista/fordista tem como base os pressupostos científicos de
Taylor, os quais, em síntese, caracterizam-se pelos seguintes aspectos: execução de atividades
22
pela subdivisão em tarefas simples, racionalização do tempo, simplificação do fluxo do
processo de produção, separação direção/gerência e trabalhadores, planejamento de atividades
e instruções escritas para os operários das operações a realizar.
A partir dos elementos do modelo de gestão taylorista, o fordismo estabelece sua
plataforma na organização do trabalho. Também nascido nos Estados Unidos, Henry Ford, filho
de fazendeiros, em tenra idade, já pensava que “o trabalho, para mínimos resultados, requeria
um esforço excessivo.” (FORD, 1967, p. 25). A vida na fazenda fez com que pensasse em
melhorar o transporte, pois o trabalho era muito rude e feito à mão, o que o levou a estudar
mecânica. O incentivo para estudar os carros automotores foi um encontro, aos 12 anos de idade
com um locomóvel na estrada de Detroit, construído pela Nichols, Shepard & Company, de
Bettle Creek, e um relógio que ganhara de presente, a partir daí montava e desmontava relógios.
Aos 16 anos entrou como aprendiz nas oficinas Drydock. Nesse tempo, já pensava em produção
em larga escala (FORD, 1967).
Em 1879 começou a trabalhar como técnico de montagem e consertos de locomóveis na
empresa Westinghouse Company. Essas máquinas eram pesadas, com alto custo e poderiam ser
adquiridas somente por fazendeiros de grandes posses. Ford já pensava em construir um carro
leve, a vapor, porém, segundo ele, o trabalho na Westinghouse confirma a ideia de que “o vapor
não servia para acionar carros leves.” (FORD, 1967, p. 29). Interessou-se pelas máquinas a gás
e, em 1885, realizou reparos em um motor Otto nas oficinas da Eagle Iron Works, em Detroit.
Com o ideal de produzir um motor revolucionário (PINTO, 2007), após vários experimentos,
fica pronto seu primeiro automóvel em 1892, mas somente em 1893 “o conjunto estava
suficientemente harmônico para funcionar com relativa satisfação [...] – correndo nas estradas.”
(FORD, 1967, p. 32). O seu calhambeque à gasolina foi o primeiro e por muito tempo o único
automóvel de Detroit.
A sua primeira fábrica de carros foi em sociedade com outros fabricantes – Detroit
Automobile Company. Com suas investigações, entende que o automóvel passou da sua fase
inicial – mover-se – para a fase correr; a velocidade era seu objetivo (FORD, 1967). Um de
seus carros venceu um famoso campeonato em 1903, o que lhe trouxe um efeito positivo.
Algumas semanas depois fundou a Ford Motor Company, que veio a ser por muito tempo a
maior fabricante mundial de veículos automotores (PINTO, 2007). Em sua empresa, assumiu
funções de vice-presidente, desenhista, engenheiro-chefe, inspetor e diretor-geral; mesmo tendo
se tornado um homem de negócios, nunca abandonou a pesquisa dos veículos que fabricava
(MONTELLO, 1995 apud PINTO, 2007).
23
Conforme foram sendo fabricadas as peças, Ford percebeu a necessidade de
aperfeiçoamento na montagem, pois o operário se deslocava com muita frequência de seu posto
de trabalho. Em consequência, organizou princípios de montagem para que o trabalho viesse
até o operário e não ao contrário, pois “operários mal dirigidos gastam mais tempo a correr atrás
do material e da ferramenta do que a trabalhar.” (FORD, 1967, p. 65). Os três princípios de
montagem de Ford (1967, p. 65) são os seguintes:
1o Trabalhadores e ferramentas devem ser dispostos na ordem natural da operação de
modo que cada componente tenha a menor distância possível a percorrer da primeira
à última fase.
2o Empregar planos inclinados ou aparelhos concebidos de modo que o operário
sempre ponha no mesmo lugar a peça que terminou de trabalhar, indo ela ter à mão
do operário imediato por força de seu próprio peso sempre que isto for possível.
3o Usar uma rede de deslizadeiras por meio das quais as peças a montar se distribuam a distancias convenientes.
Como resultado, obtivera economia de pensamento dos trabalhadores e redução ao
mínimo movimento, pois o trabalhador deveria fazer só uma coisa, com um só movimento.
Ford estabelece uma única atividade para cada trabalhador, ou seja, um profissional
especialista-estático e o que se movimenta é a ferramentaria. Assim, setoriza a fabricação,
passando-a para ambientes separados, como se fossem minifábricas, dando a cada seção a tarefa
de uma peça (FORD, 1967).
O objetivo de Ford era a produção em massa, pois incutiu nos seus contemporâneos o
consumo de massa de produtos padronizados; dessa forma, contrapondo-se aos industriais
automobilísticos da época, sendo esse aspecto que o diferenciava do taylorismo (PINTO, 2007;
HARVEY, 2011). Segundo Harvey (2011, p. 121),
o que havia de especial em Ford (e que, em última análise, distingue o fordismo do
taylorismo) era a sua visão, seu reconhecimento explícito de que produção de massa,
significava consumo de massa, um novo sistema de reprodução da força de trabalho,
uma nova política de controle e gerência do trabalho, uma nova estética e uma nova
psicologia, em suma, um novo tipo de sociedade democrática, racionalizada,
modernista e populista.
A ideia básica de Ford (PINTO, 2007, p. 41) era padronizar os produtos e fabricá-los
em grande escala, centenas ou milhares por dia, obtendo assim custos de produção reduzidos e
contrabalançados pelo aumento do consumo. Elevando a renda salarial em função do aumento
das vendas, o seu produto poderia ser adquirido pelos próprios operários. “A verdadeira função
dos negócios é produzir tendo em vista o consumo e não o dinheiro ou a especulação.” (FORD,
1967, p. 18). A produção de massa viabiliza redução nos preços dos produtos, aumento dos
24
salários e do número de trabalhadores de várias camadas da população, surgindo um “novo
surto econômico” (AZEVEDO, 2011 apud PEREIRA; COSTA; MACIEL, 2008). Objetivando
a produção em massa, tudo gira em torno do artigo a ser produzido: “a fábrica, a organização,
a venda, as combinações financeiras devem vir depois do artigo.” (FORD, 1967, p. 22). Ele
enfatiza o planejamento “quem se aventura a produzir antes que o estudo dele esteja completo,
perderá seu tempo.” (FORD, 1967, p. 22).
O sistema de produção fordista exige disciplina do trabalhador para operação de um
sistema de linha de montagem de alta produtividade, com longas horas de trabalho rotinizado,
exigindo pouca habilidade manual e com excessivo controle do trabalhador (HARVEY, 2011).
Nessa relação de produção, o homem e a máquina se integram. O pensamento de Ford é que o
trabalho tem que ser individual, sem necessidade de relações cordiais entre as pessoas e os
serviços: “quando trabalhamos, precisamos trabalhar; quando nos divertimos, devemos nos
divertir. O que não pode é conduzir juntas as duas coisas.” (FORD, 1967, p. 73).
As esteiras mecânicas levam a ferramentaria ao encontro do operário para a realização
do trabalho, estabelecendo uma rotina que transforma o trabalho numa repetição de
movimentos. O homem estático movimenta apenas os membros necessários para a aceleração
da produção com menor perda de tempo. Assim, as atividades são elevadas a um nível extremo
de limitação e simplificação e, a partir de um dado momento, o operário torna-se um apêndice
da máquina (PINTO, 2007, p. 45). De acordo com Ford (1967, p. 82),
o operário toma a peça sempre do mesmo modo, dá sempre as mesmas voltas e a faz
cair sempre no mesmo ponto. A operação não requer força muscular, nem inteligência.
O trabalho consiste em mover os braços de um lado para o outro, e o peso do gancho
é insignificante.
O trabalho repetitivo pode ser executado por qualquer pessoa sem experiência, pois nesse
modelo o trabalho é muito especializado e pouco qualificado, estando o operário sob forte controle
hierárquico (PEREIRA; COSTA; MACIEL, 2008). O resultado da linha de montagem foi a
desqualificação do operariado e a intensificação do trabalho, uma vez que esses dois fatores,
integrados ao aumento da produtividade e à inovação tecnológica, baratearam o automóvel e o
transformaram num bem de consumo em massa (FLEURY; VARGAS, 1983).
No fordismo, a gerência deve se voltar ao comando da produtividade, organizando os
operários de tal forma que extraiam deles a extrema produção. O líder, ou o mestre como chama
Ford, responde pelos homens sob seu comando e o contramestre, ou supervisor pela equipe e o
25
chefe de seção, ou gerente responde pelo departamento, sabendo cada um deles o que se passa
em seu raio de ação.
Não há programas de encarreiramento, de acordo com Ford (1967), não havendo títulos,
o homem irá focar sua atenção no trabalho e não corre o risco de priorizar a promoção. Para
Ford (1967, p. 75), o “hábito de pôr o trabalho em segundo plano e no primeiro a preocupação
de ser bem visto, faz mal ao trabalho com elevar a vitória pessoal à altura de uma coisa
importante.” No entanto, em postos de liderança os profissionais são contratados com uma
formação específica (FORD, 1967). Porém a maioria dos contratados são não especialistas, ou
seja, trata-se de mão de obra sem qualificação e que em horas ou dias aprendem seu ofício
(FORD, 1967). Ford realizava uma seleção automática, não recusava ninguém por condições
físicas; para ele, a melhor maneira é elevar os “inválidos” a um grau de produtividade igual aos
homens normais colocando-os em trabalhos adequados à sua condição (FORD, 1967). O
fordismo buscava um operário que separasse a mente do corpo e o harmonizasse com a linha
de montagem.
A divisão taylorista havia possibilitado que se distribuíssem os trabalhadores e suas
ferramentas efetivamente ao longo de uma linha, ao padronizar o trabalho em
atividades cujas operações eram uniformizadas. Pode-se dizer, nesse sentido que o
sistema taylorista foi incorporado e desenvolvido pelos dispositivos organizacionais
e tecnológicos fordista, na medida em que, no lugar dos homens responsáveis pelo
deslocamento de materiais e objetos de trabalho, máquinas automáticas passaram a se encarregar por tal, suprindo o trabalho humano numa produção cuja cadência contínua
impunha uma concentração dos movimentos dos trabalhadores somente dentro do raio
de ação que efetivamente transformava as matérias-primas em produtos acabados.
(PINTO, 2007, p. 44).
No taylorismo-fordismo, há necessidade de pouco conhecimento teórico, cultural e
social para o exercício da função. De acordo com Quartiero e Bianchetti (2005, p. 26):
Esse modelo, caracterizado pela intensificação do trabalho, pelo controle do tempo de
produção, pela extrema especialização e fragmentação da tarefa, vai prescindir de uma
formação mais consistente, pois ao trabalhador não é exigida reflexão sobre o seu
fazer, apenas atenção. O importante é saber fazer e não porque fazer, princípio que
organiza os cursos realizados por esses trabalhadores em que os conteúdos giram em
torno de aspectos disciplinares e de ajustamento ao modelo organizacional.
A reprodução do trabalho e o conhecimento se sustentam na organização de trabalho
taylorista-fordista, auxiliado pela estabilidade do ambiente externo permitindo a concepção do
trabalho e sua efetiva realização (EBOLI, 2002). Sob as responsabilidades das lideranças
(chefes, contra-mestres) ficavam a análise e interpretação do ambiente dos negócios, das
26
normas, dos manuais para realização das atividades que deveriam ser seguidos por todos
(TAYLOR, 1990; EBOLI, 2002).
O trabalho operário no taylorismo/fordismo caracteriza-se pela integralização da
subsunção2 da subjetividade operária à lógica do capital, uma vez que as operações produtivas
na linha de montagem reduziam-se ao “aspecto físico maquinal.” (GRAMSCI, 1985 apud
ANTUNES; ALVES, 2004). Ao operário bastava ter o físico em constante movimento de
repetição acompanhando o movimento da máquina ou por vezes sendo extensão dela. Gorz
(1982) sustenta a tese de que é a matéria que trabalha o operário, e a esta empresta seu corpo,
seu cérebro e seu tempo.
Segundo Saviani (2007, 2013), a gestão taylorista/fordista baseada na padronização e
na repetição implica um modelo de educação do trabalhador caracterizado por uma pedagogia
tecnicista, centrada no treinamento e na instrução.
2.2 MODELO TOYOTISTA
As últimas décadas foram marcadas pela transnacionalização e os desdobramentos da
globalização que ultrapassam limites econômicos intensificando sistemas de produção e
transferências financeiras, disseminando informações e imagens através dos meios de
comunicação social e o deslocando massas de pessoas para trabalho, turismo ou refúgios
(SANTOS, 2002).
Para Giddens (1991, p. 70), a globalização refere-se às relações sociais intensificadas
mundialmente, unindo acontecimentos independentes da distância, acontecimentos locais
“podem se deslocar numa direção anversa às relações muito distanciadas que os modelam.”
Santos (2002) destaca que Froebel, Heinrichs e Kreye foram os primeiros autores a se
posicionarem, no início da década de oitenta, sobre a emergência de uma nova divisão
internacional do trabalho, centrada numa produção econômica globalizada por empresas
multinacionais, as quais constituem o centro da nova economia mundial. De acordo com Santos
(2002, p. 29), esta se caracteriza como uma
economia dominada pelo sistema financeiro e pelo investimento à escala global;
processos de produção flexíveis e multilocais; baixos custos de transporte; revolução
nas tecnologias de informação e de comunicação; desregulação das economias
nacionais; preeminência das agências financeiras multilaterais; emergência de três
grandes capitalismos transnacionais: o americano, baseado nos EUA e nas relações
privilegiadas deste país com o Canadá, o México e a América Latina; o japonês,
2 Termo utilizado por Marx; indica e caracteriza a relação entre trabalho e capital (ANTUNES; ALVES, 2004).
27
baseado no Japão e nas suas relações privilegiadas com os quatro pequenos tigres e
com o resto da Ásia; e o europeu, baseado na União Europeia e nas relações
privilegiadas desta com a Europa de Leste e com o Norte de África.
Esse contexto de transformações impacta os processos de produção. O taylorismo e o
fordismo mesclam-se com experiências decorrentes de outras partes do mundo: Suécia na
“Terceira Itália” (kalmarismo); nos EUA no Vale do Silício; na Alemanha e ainda a experiência
japonesa – o toyotismo desenvolvido na Toyota Motor Company (ANTUNES, 2011). Esse
sistema surgiu em meio a uma economia com crescimento lento e um mercado interno em
pequena expansão. O toyotismo substituiu as economias de escalas da produção fordista, por
“uma crescente capacidade de manufatura de uma variedade de bens e preços baixos em
pequenos lotes” (HARVEY, 2011, p. 148), sendo seu principal objetivo a produção de um
número maior de modelos em pequenas quantidades, pois “é a demanda que deve fixar o
número de veículos de cada modelo.” (GOUNET, 1999, p. 26).
O toyotismo emerge de um conjunto de situações (CORIAT, 1992 apud ANTUNES,
2011): 1) a introdução da experiência têxtil na indústria automobilística japonesa, em que o
trabalhador operava simultaneamente várias máquinas; 2) a necessidade do aumento de
produção com um número reduzido de trabalhadores, em consequência da crise financeira dos
anos 1970; 3) as técnicas de gestão dos supermercados americanos originaram o kanban3, pois
o objetivo era redução de estoques – produzir somente o necessário; 4) a expansão da
ferramenta kanban para as empresas subcontratadas e fornecedoras, a qual se torna um método
fácil, rápido e essencial em uma organização flexível da produção, determinada pela demanda,
uma vez que “a produção é puxada pela demanda e o crescimento, pelo fluxo.” (GOUNET,
1991, p. 26).
O Sistema Toyota de Produção se sustenta em dois pilares: just in time e autonomação
(OHNO, 1997). “Just in time significa que, em um processo de fluxo, as partes corretas
necessárias à montagem alcançam a linha de montagem no momento em que são necessários e
somente na quantidade necessária” (OHNO, 1997, p. 26), podendo a empresa chegar ao estoque
zero. O fluxo de produção refere-se à transferência de materiais (OHNO, 1997). No modo
convencional da produção automotiva, “[...] o material é transformado em componente, o
componente é então montado com outros numa unidade, e isto flui na direção da linha de
montagem final. O material avança dos processos iniciais para os finais, formando o corpo do
carro.” (OHNO, 1997, p. 26).
3 Kanban é uma ferramenta do Sistema Toyota de Produção e será apresentada na sequência desta seção.
28
O fluxo de produção pensado por Ohno vai na direção inversa, torna o final da linha de
montagem como ponto inicial: “um processo final vai para um processo inicial para pegar
apenas o componente exigido na quantidade necessária no exato momento necessário.”
(OHNO, 1997, p. 27). Nesse contexto, “cada elo na corrente just-in-time está conectado e
sincronizado. Por essa razão, os níveis gerenciais são drasticamente reduzidos.” (OHNO, 1997,
p. 27).
A autonomação veio sendo implantada nas fábricas de automóveis da Toyota desde
1947. Em primeiro momento, esse mecanismo foi desenvolvido na fabricação têxtil da mesma
companhia, em uma máquina de tecer autoativada: um dispositivo implantado na máquina
podia distinguir entre condições normais e anormais, parando o tear instantaneamente em caso
de peça com defeito (OHNO, 1997). Trata-se de máquinas que podem evitar problemas como
a produção em massa de produtos defeituosos “autonomamente” (OHNO, 1997). A
“autonomação é um neologismo criado a partir da junção das palavras autonomia e automação,
[...] permitindo a máquina funcionar autonomamente (independente da supervisão humana).”
(PINTO, 2007, p. 74). Segundo Ohno (1997, p. 28), “inteligência humana, ou um toque humano
é dado às máquinas”, pois adapta a elas os movimentos simples do operador humano (OHNO,
1997). Segundo Harvey (2011, p. 148),
Esses sistemas de produção flexível permitiram uma aceleração do ritmo da inovação
do produto, ao lado da exploração de nichos de mercado altamente especializados e
de pequena escala – ao mesmo tempo que dependeram dela. Em condições de recessivas e de aumento da competição, o impulso de explorar essas possibilidades
tornou-se fundamental para a sobrevivência. O tempo de giro – que sempre é uma
chave da lucratividade capitalista – foi reduzido de modo dramático pelo uso de novas
tecnologias produtivas (automação, robôs) e de novas formas organizacionais (como
o gerenciamento de estoques “just-in-time”, que corta dramaticamente a quantidade
de material necessária para manter a produção.
Esse mecanismo permite que apenas um operário conduza várias máquinas; logo, reduz-
se o número de operários, aumentando a eficiência da produção e mudando o significado da
gestão (OHNO, 1997). A implementação da autonomação fica sobre a responsabilidade de
gerentes e supervisores de cada área, os quais realizam o planejamento da produção. Segundo
Ohno (1997), a autonomação corresponde à habilidade e ao talento individual, ao passo que o
just-in-time é o envolvimento da equipe no trabalho para atingir um objetivo preestabelecido.
Ohno conjuga à fábrica um conjunto de técnicas de gestão de estoques utilizadas, na
época, pelos supermercados americanos: os produtos que o consumidor retirava da prateleira
para compra era reposto imediatamente (PINTO, 2007). Na Toyota, esse método se deu a partir
do fluxo contínuo da produção.
29
A linha de produção seriada fordista consiste numa sequência de funções/operações
parciais e separadas, que se dispõe linearmente e ordenadamente desde a primeira metamorfose da matéria-prima até a confecção da última. Na produção toyotista, com
a reagregação das várias operações em postos de trabalho multifuncionais, chamados
“células de produção”, o layout do espaço da produção é reformulado, mas essa
produção ainda ocorre num fluxo contínuo do consumo dos materiais empregados até
a fase de acabamento final do produto (PINTO, 2007, p.78).
A ferramenta utilizada para operar o Sistema Toyota de Produção é o Kanban (significa
cartazes). Trata-se de um dispositivo mecânico que conduz caixas (carregadas de peças ou
materiais requisitados pelos postos) do posto de trabalho posterior para o anterior, no sentido
inverso da produção; as caixas contêm cartazes informativos sobre a quantidade necessária para
alimentar os postos seguintes; ao mesmo tempo, outras caixas circulam no sentido normal do
fluxo produtivo. Esse dispositivo mecânico possibilita o fluxo de informações e de materiais
(PINTO, 2007). Segundo Ohno (1997, p. 46), no Kanban:a
a forma mais frequentemente usada é um pedaço de papel dentro de um envelope de
vinil retangular. Neste pedaço de papel a informação pode ser dividida em três
categorias: (1) informação de coleta, (2) informação de transferência, e (3) informação
de produção. O Kanban carrega a informação vertical e lateralmente dentro da própria
Toyota e entre a Toyota e as empresas colaboradoras.
Em consequência do Kanban, o espaço fabril foi reformulado com novo layout cujo
objetivo era “viabilizar a produção em fluxo contínuo, evitando o deslocamento desnecessário
de trabalhadores e insumos.” (PINTO, 2007, p. 79). Os postos de trabalhos saíram do formato
departamento e se constituíram em células, ou seja, grandes conjuntos abertos que uma etapa
definia de todo o processo produtivo. Uma equipe de trabalho assegura, por completo, a
montagem e o acabamento de um veículo. O trabalhador é polivalente, pois é responsável por
várias atividades (PINTO, 2007).
A celularização trouxe para a linha de produção um formato sinuoso, como a forma da
letra “U”, em que se dispõe um conjunto de postos de trabalhos. A matéria-prima ou produto
semiacabado entra por um lado, é trabalhado ao longo do percurso sinuoso e sai pelo outro lado.
“O conjunto de células acabam formando, quando se encaixam, uma série de ‘Us’, um normal
e o próximo invertido, daí a alusão a uma linha sinuosa.” (CORIAT, 1994 apud PINTO, 2007,
p. 80). Assim, obtém-se um fluxo contínuo com redução da quantidade de trabalhadores,
insumos e processos. Segundo Pinto (2007, p. 81),
30
A combinação entre autonomação, polivalência e celularização, promoveu uma
realocação das máquinas por trabalhador, estabelecendo, portanto, não apenas uma
nova racionalização das operações de cada posto no processo produtivo, mas uma
nova sincronização dos postos e das células entre si, visando uma diminuição tanto do
acúmulo de estoques em cada máquina (ou em cada célula), bem como perdas de
tempo no decorrer do transporte dos produtos ao longo da fábrica.
A redução do número de operários provoca necessidade de desenvolvimento intensivo de
habilidades concentrando no mesmo local várias funções de trabalho: “um operador, muitas
máquinas em processos diferentes.” (OHNO, 1997, p. 32). A diversidade de funções contempla
desde a programação das máquinas, planejamento e coordenação da produção, manutenção dos
equipamentos, controle da qualidade dos produtos até a produção direta: transformação dos
insumos e matéria-prima em produto intermediário ou acabado (PINTO, 2007).
O sistema Toyota transforma o operador “unifuncional para o multi-funcional.”
(OHNO, 1997, p. 34). De acordo com Pinto (2007, p. 76), “a ideia era permitir que os
trabalhadores adquirissem o conhecimento, executassem e passassem a se responsabilizar por
várias fases do processo produtivo total, o que lhes possibilitaria desenvolver múltiplas
capacidades.” A multifuncionalidade levou a desespecialização dos trabalhadores:
Se Taylor havia decomposto atividades complexas em operações rigorosamente
impostas dentro dum roteiro único de execução (o “the one best way”), tendo Ford se
empenhado no automatismo, ambos tiveram como objetivo atacar o saber dos
trabalhadores mais qualificados e, assim, diminuir seus poderes sobre a produção,
com aumento do controle gerencial da intensidade do trabalho, como um todo. Ohno
perseguiu os mesmos objetivos, partindo, entretanto, no sentido inverso: procurou desenvolver a “desespecialização” e, ao exigir de todos os trabalhadores a
polivalência, desautorizou o poder de negociação detido pelos mais qualificados,
obtendo por essa via o aumento do controle e a intensificação do trabalho. (PINTO,
2007, p. 77).
Desenvolvido desde os anos 1950, o toyotismo produz a reorganização do trabalho
interno às plantas, sustentada em uma rede de subcontratações entre empresas fortalecendo as
relações de produção (PINTO, 2007). De acordo com Pinto (2007, p. 53),
o sistema toyotista de organização tinha como fundamento uma metodologia de
produção e de entrega mais rápidas e precisas que os demais, associada justamente à manutenção de uma empresa “enxuta” e “flexível”. Isso era obtido pela focalização
no produto principal – gerando desverticalização e subcontratação de empresas que
passavam a desenvolver e a fornecer produtos e atividades -, com utilização de uma
força de trabalho polivalente – agregando em cada trabalhador atividades de
execução, controle de qualidade, manutenção, limpeza, operação de vários
equipamentos simultaneamente, dentre outras responsabilidades.
No sistema toyotista, a descentralização da produção desenvolveu relações de
subcontratação com diferentes empresas fornecedoras cujo processo de terceirização se
31
submetia ao sistema de produção da empresa contratante. Esse conjunto de transformações
econômicas refere-se ao que Harvey (2011) denomina como a acumulação flexível, a qual
objetiva a flexibilização dos processos de trabalho, dos mercados, dos produtos e do consumo.
Os setores de produção tornam-se inteiramente novos, na forma de fornecer serviços, na
inovação comercial, tecnológica e organizacional (HARVEY, 2011).
Na gestão flexível, “a flexibilidade da produção exige flexibilidade do trabalho e dos
trabalhadores.” (GOUNET, 1999, p. 30). O modelo de gestão toyotista produz a ampliação do
conteúdo do cargo, aumentando a diversificação de tarefas que o trabalhador desenvolve,
incluindo parcial ou gradualmente a delegação de responsabilidade (FLEURY, 1980). Em
decorrência, instaura-se a necessidade de modificação do perfil profissional: “ao nível das
qualificações esta mudança veio fortalecer o papel da empresa na contribuição, no domínio da
inovação, dos modelos de formação e de qualificação perspectivando novas estratégias de
gestão da mão-de-obra.” (LOPES, 1995 apud PEREIRA; COSTA; MACIEL, 2008, p. 37).
No modelo de gestão flexível, os trabalhadores são convocados a desenvolver
competências e competitividade (CORIAT, 1992 apud ANTUNES, 2001). Gerir competências
para realizar multitarefas implica desenvolver a formação profissional. Desenvolver
competências no trabalhador supõe abordar conhecimentos, habilidades e atitudes, tendo em
vista a obtenção de resultados operacionais (FLEURY; FLEURY, 2001). Esse modelo de
gestão desenvolve um modelo de educação do trabalhador pela pedagogia das competências4
(SAVIANI, 2013; RAMOS, 2001).
No toyotismo, o processo de produção caracteriza-se por uma fábrica racionalizada a
partir do relacionamento intrafábrica e entre empresas, para “reconstituir a hegemonia do
capital, instaurando, de modo pleno, a subsunção real da subjetividade operária, pela lógica do
capital.” (ANTUNES; ALVES, 2004, p. 345). Em outros termos, o toyotismo produz uma
forma de hegemonia do capital fundamentada na “articulação entre consentimento operário e
controle do trabalho.” (ANTUNES; ALVES, 2004, p. 344). Nos termos de Saviani (2013, p.
440), essa subsunção corresponde ao efeito do princípio da qualidade total na subjetividade do
sujeito, ou seja, significa “conduzir os trabalhadores a ‘vestir a camisa da empresa’. A busca da
qualidade implica, então, a exacerbação da competição entre os trabalhadores que se empenham
pessoalmente no objetivo de atingir o grau máximo de eficiência e produtividade da empresa.”
Nesta seção, procurei caracterizar os dois modelos clássicos de gestão e apresentar
indícios do impacto de tais transformações do mundo do trabalho para a formação de
4 Na seção quatro da presente dissertação, apresentarei aspectos que caracterizam a pedagogia das competências.
32
trabalhadores. O modelo taylorista/fordista, da produção em massa e do consumo de massa,
caracteriza-se pela decomposição do processo de trabalho em tarefas fragmentadas e repetitivas,
com forte controle hierárquico e separação entre planejamento (gerente) e execução da tarefa
(operário). Nesse modelo, o trabalhador é especializado, individualizado e sua formação se
particulariza pelo treinamento através de instruções escritas referentes à tarefa.
O modelo toyotista, ou modelo de produção flexível, particulariza-se pela produção por
demanda, pelo fluxo contínuo de produção, pelo trabalho em células e em equipe. Esse modelo
convoca um trabalhador polivalente e multifuncional formado na perspectiva da pedagogia de
competências.
Na sequência, abordo elementos da trajetória sócio-histórica da formação do trabalhador
no Brasil, tendo em vista a indicação de pistas do contexto de emergência do sujeito aprendente,
tema desta dissertação.
33
3 ELEMENTOS DA FORMAÇÃO DO TRABALHADOR NO BRASIL
Na educação, segundo Saviani (2007), o homem não garante sua existência somente
com a natureza, mas agindo sobre ela, transformando-a e adequando-a às suas necessidades,
assim a essência humana é definida pelo trabalho. “Isto faz com que a vida do homem seja
determinada pelo modo como ele produz sua existência.” (SAVIANI, 1994). Essa produção
leva à formação do homem, ou seja, realiza um processo educativo, pois o homem para produzir
sua existência precisar conhecer e aprender. Assim, a origem da educação encontra-se na
própria origem do homem (SAVIANI, 2007).
O contexto do mundo do trabalho influencia diretamente na educação do trabalhador.
Este estabelece relação com o conhecimento de equipamentos e máquinas numa posição de
usuário exigindo desenvolvimento de capacidades cognitivas complexas (KUENZER, 2003).
Demanda escolaridade e formação técnico-profissional para a preparação para o trabalho e
desenvolvimento de competências adquiridas mediante relações sistematizadas com o
conhecimento, disponibilizadas por escolas ou por cursos de educação profissional
(KUENZER, 2003; FRIGOTTO, 2005).
Ao longo dos anos, essas relações vêm sendo reestruturadas, principalmente, sob o impacto
da economia mundial através do processo histórico do desenvolvimento do capitalismo e,
consequentemente, das transformações do mundo do trabalho. A partir dos anos de 1990, emerge
demanda em preparar o trabalhador para o mundo do trabalho, pois os modelos de gestão
neoliberais exigem do trabalhador competências incluindo formação e atitudes voltadas para a
competitividade, produtividade e agilidade na execução dos processos produtivos. Observa-se um
reordenamento das relações educativas através da noção de competências dispostas pelas relações
de produção centralizadas na empregabilidade e flexibilidade dos processos.
Ao longo da história, a educação redefine seu perfil reprodutor/inovador da
sociabilidade humana. Adapta-se aos modos de formação técnica e comportamental
adequados à produção e à reprodução das formas particulares de organização do
trabalho e da vida. (SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA, 2007, p. 9).
A mundialização do capital gera mudanças no perfil das organizações e, consequentemente,
no perfil do trabalhador. Essas mudanças exigem reformulações na preparação do trabalhador para
a empregabilidade, uma vez que esse profissional precisa estar qualificado, focado no aprender a
aprender, atendo-se à flexibilidade das relações sociais e de trabalho.
Assim como a educação redefine seu papel, o trabalhador precisa transpor os muros de
seu conhecimento, embarcando sua subjetividade e sociabilidade no cognitivo para articular-se
34
em multitarefas e atender aos preceitos da sociedade aprendente. De fato, qualificar somente
sua mão de obra não se sustenta mais no mundo tecnologicamente modificado; é necessário
desenvolver as atitudes, o comportamento, a ordem cultural e social. Com a globalização da
economia, a palavra de ordem é competência, frente às dimensões da qualificação, logo se
estabelece um debate entre qualificação e competência. De acordo com Ramos (2001, p. 60),
“confrontarmos o conceito de qualificação com a noção de competência, não implica defender
uma oposição universal entre eles, mas alertar sobre uma tensão permanente que as une e as
afasta dialeticamente.”
A educação do trabalhador é fundamental nas estratégias empresariais para que as
organizações se mantenham competitivas. Os modelos de gestão atuais estão voltados ao
trabalhador, focando sua atenção no aumento da produtividade a partir de um perfil profissional
flexível, pautados em padrão de qualidade, com autonomia na sua qualificação, performando
um trabalhador combinado com o conjunto de habilidades e atitudes (técnicas e
comportamentais) as quais levam à compreensão da aquisição do conteúdo do trabalho. De
acordo com Kuenzer (2011, p. 14),
compreender como este movimento de educação por intermédio do processo de trabalho se dá, e de que forma ele pode contribuir para a superação das relações
capitalistas de produção ensinando o trabalhador a se organizar, a resistir, e, deste
modo, favorecendo o surgimento de novas formas de organização do trabalho e de
disciplinamento, é uma tarefa absolutamente necessária a todos os que, de alguma
forma, estejam comprometidos com os interesses da classe trabalhadora.
Essas técnicas empresariais ultrapassam os muros das organizações e chegam em
diferentes espaços, sendo um deles a escola, trazendo “repercussões educacionais importantes,
uma vez que a escola passa a preparar para o trabalho [...]” (BIANCHETTI; PALANGANA,
2000 apud PEREIRA; COSTA; MACIEL, 2008, p. 36) em alguns momentos visualizando
somente a inserção do indivíduo nesse mercado. Segundo Pereira, Costa e Maciel (2008, p. 36),
a prioridade é educar no trabalhador as atitudes, as disposições, as formas de
comportamento, de conduta e de aceitação das relações sociais vigentes. Não por
acaso, em termos formais, logo se passou a manifestar uma espécie de homogeneização, inclusive no nível do organograma e das denominações dos
cargos—funções, tanto na organização das fábricas quanto na das escolas.
Contudo, a educação no Brasil acompanhou esses sistemas e não ficou aquém dos
aspectos da produção capitalista tentando corresponder ao seu próprio programa de
industrialização.
35
3.1 ENSINO DE OFÍCIOS
Para situar a formação do trabalhador no Brasil, há de se compreender a educação no
país, que passa por vários processos de transformações, pois articula com as questões políticas,
econômicas e sociais, desde a colonização extrativista e agrária até o processo de
industrialização e urbanização.
Nas primeiras décadas do século XVI, chegam em nossa terra os portugueses ávidos
por colonizar esse novo território conquistado. As primeiras atividades na colônia foram a
extração do pau-brasil5, por vez uma “exploração rudimentar que não deixou traços apreciáveis,
a não ser na destruição impiedosa e em larga escala das florestas nativas.” (PRADO JÚNIOR,
1986, p. 25). Cortada e trazida pelos índios, a mercadoria era embarcada em navios que se
aproximavam da costa e próximo da mata onde se encontrava o produto.
Segundo Prado Junior (1986, p. 25), “é graças, aliás, a presença relativamente numerosa
de tribos nativas no litoral brasileiro que foi possível dar à indústria um desenvolvimento
apreciável.” Os índios trabalhavam em troca de miçangas, tecidos e peças de vestuário; também
obtinham canivetes, facas e outros pequenos objetos. Quando precisavam apressar os serviços,
ofereciam aos índios ferramentas mais importantes e difíceis de conseguir, como serras e
machados (PRADO JÚNIOR, 1986). Assim não foi difícil perceber o que trazia satisfação para
o povo nativo e extrair um trabalho de servidão sob o sistema de troca. A exploração do pau-
brasil perde o interesse em razão do esgotamento da madeira nas matas brasileiras, iniciando a
rápida decadência do negócio6.
Em 1549, com o nomeado governador geral Tomé de Souza, chegam os primeiros jesuítas,
chefiados por Manuel da Nóbrega (SAVIANI, 2013). Foram criadas escolas, colégios e seminários,
com o intuito, segundo Dom João III (1992 apud SAVIANI, 2013), de que o povo habitante “fosse
doutrinado e ensinado nas coisas da nossa santa fé”, para que a população habitante da terra
conquistada tivesse a mesma educação religiosa de Portugal. Foi através da tríade – colonização,
religião e educação – que o Brasil se inseriu no chamado mundo ocidental (SAVIANI, 2013).
Enquanto colônia, que significa “espaço que se ocupa, mas também terra ou povo que se
pode trabalhar ou sujeitar” (SAVIANI, 2013, p. 26), o país passava por uma verdadeira “aculturação
5 Espécie vegetal semelhante à outra já conhecida no Oriente e de que se extraía uma matéria corante empregada
na tinturaria. Nome científico de Caesalpinia echinata (PRADO JÚNIOR, 1986, p. 25). 6 Mesmo após o esgotamento do pau-brasil nas matas, continua-se a exploração esporádica sob o regime do monopólio
real, com pequena exportação com duração até início do século XIX (PRADO JÚNIOR, 1986, p. 25-27).
36
da população colonial nas tradições e nos costumes do colonizador”, sendo a base da educação
catequética, pois “tinha na catequese a sua ideia-força.” (SAVIANI, 2013, p. 31).
A partir do ano de 1530, o cenário econômico do país muda. Iniciado por uma estratégia
de povoamento e colonização, dividiu-se a costa brasileira em capitanias, as quais foram doadas
a titulares que se apoderaram de regalias e poderes soberanos (PRADO JÚNIOR, 1986). Inicia-
se, efetivamente, a ocupação da terra, com a vinda de Martin Afonso de Souza (MAZZEO,
1988). Cabia a esses criar vilas e povoações, nomear autoridades administrativas e juízes para
seus territórios, assim como receber taxas e impostos, distribuir terras; sendo conservados pela
Coroa os direitos de suserania (direito ou poder para exercer autoridade) semelhantes aos que
vigoravam na Europa feudal (DEL PRIORI; VENANCIO, 2010; MAZZEO, 1988; PRADO
JÚNIOR, 1986). Apesar de o Estado garantir a posse das terras (MAZZEO, 1988), os donatários
das capitanias arcariam com as despesas de transporte e estabelecimentos de povoadores
(PRADO JÚNIOR, 1986).
Essas primeiras empresas colonizadoras de tipo mercantil, como as trata Prado Junior
(1986) e Mazzeo (1988), trazem como principal perspectiva de negócio a cultura da cana-de-açúcar
– produto de grande valor comercial na Europa da época. Para o cultivo, contou-se com o clima
favorável do Brasil e, em primeiro momento, com a mão de obra indígena por serem numerosa e
pacífica no litoral (PRADO JÚNIOR, 1986). Como a monocultura açucareira contava com grande
população para disponibilizar mão de obra, a escravidão torna-se necessária, segundo Prado Júnior
(1986, p. 34), “o português, como qualquer outro colono europeu, não emigra para os trópicos, em
princípio, para se engajar como simples trabalhador assalariado do campo”; logo, as empresas têm
o problema e a solução idênticos às colônias tropicais e subtropicais da América (PRADO JÚNIOR,
1986). Com a indústria açucareira, envolvia-se, além de senhores e escravos, um grupo
diversificado de trabalhadores especializados e agregados. A esses mestres de açúcar, purgadores,
caixeiros, calafates, caldeireiros, carpinteiros, pedreiros, barqueiros incluíam-se também
mercadores, roceiros, artesãos, lavradores; todos compunham pequenos ou grandes proprietários
(DEL PRIORI; VENANCIO, 2010).
As populações tribais não viviam em sociedades estruturadas em classes, as quais se
apropriavam coletivamente da caça, pesca, frutos e plantas nativas, bem como algumas culturas,
como o milho e a mandioca, tratando de uma economia natural e de subsistência7 (SAVIANI,
2013). “Eram indivíduos livres, com direitos iguais, que viviam sobre a base da propriedade comum
7 Economia “Natural porque ‘capaz de satisfazer às necessidades dos membros do grupo social sem nenhuma
troca’; de subsistência porque ‘orientada no sentido de satisfazer às necessidades restritas do grupo local’”.
(FERNANDES, 1989 apud SAVIANI, 2013, p. 33).
37
da terra.” (PONCE, 2001 apud SAVIANI, 2013, p. 35). Logo, a relação de trabalho do indígena
com os colonizadores dura pouco tempo. Crescia entre os índios o interesse pelos objetos
anteriormente já recebidos pelos seus serviços, tornando-os mais exigentes (PRADO JÚNIOR,
1986). De acordo com Prado Júnior (1986, p. 35),
[...] se o índio por natureza nômade, se dera mais ou menos bem com o trabalho
esporádico e livre da extração do pau-brasil, já não acontecia o mesmo com a disciplina, o método e os rigores de uma atividade organizada e sedentária como a
agricultura. Aos pouco foi sendo necessário força-lo ao trabalho, manter vigilância
estreita sobre ele e impedir sua fuga e abandono da tarefa em que estava ocupado.
A característica dos indígenas afetou em grande proporção o desenvolvimento do
trabalho, uma vez que os “gentios” não tiveram uma boa adaptação com o estilo de trabalho
dos colonizadores, mostrando, “além da resistência ao trabalho, mau trabalhador de pouca
resistência física e eficiência mínima.” (PRADO JÚNIOR, 1986, p. 36). Do trabalho forçado,
escravizado, os nativos se defenderam com valentia, eram guerreiros, defendiam suas tribos.
Havendo lutas prolongadas entre colonos e índios, assaltos às propriedades, prisões de índios
capturados. Em 1570 é apresentada a primeira carta régia que estabelece o direito à escravidão
dos índios, limitada aos aprisionados em “guerra justa”, porém a abolição indígena total será
em meados do século XVIII (PRADO JÚNIOR, 1986).
Os portugueses, já com longa experiência em tráfico de pessoas da África, para
trabalharem em diversos serviços no Reino europeu e nas ilhas Madeira e Cabo Verde (também
colônias portuguesa), resolveram o problema do trabalho no Brasil (PRADO JÚNIOR, 1986).
Substituíram a mão de obra indígena pela africana. Os africanos chegavam ao Brasil nos navios
em condições precárias: mal alimentados, acumulados para que se aproveitasse o máximo de
espaço, longas semanas de confinamento e precariedade na higiene, chegando com vida ao
destino uma estimativa de 50%, muitos doentes (PRADO JÚNIOR, 1986). O valor do escravo
era muito alto, somente regiões ricas e prósperas podiam comprar.
A produção escravista instalada na América e, portanto, no Brasil, não se constitui em
um modo de produção distinto do capitalista, mas, ao contrário, estrutura-se como um
tipo específico de capitalismo. Um capitalismo de extração colonial e escravista que
objetiva o mercado externo, grandes lucros e, fundamentalmente, que utiliza a mais-
valia que expropria do escravo para investir na produção açucareira e agrária, em
geral. (MAZZEO, 1988, p. 11).
A educação no Brasil dessa época está baseada num prolongamento da cultura europeia,
porém acrescida de traços culturais indígenas e africanos (MAZZEO, 1988), enfatizados pela
aculturação catequética, dominadas pelos jesuítas. “As relações de produção escravista e o
38
predomínio do latifúndio (com seu consequente baixo nível técnico, no que se refere às
atividades agrícolas) darão à superestrutura brasileira seu caráter histórico-particular”
(MAZZEO, 1988, p. 13), ou seja, uma sociedade que já nasce econômica e ideologicamente
dominada pelos centros capitalistas mundialmente desenvolvidos (MAZZEO, 1988). Assim se
estrutura o Brasil agrário mercantil, que vai desde a extração do pau-brasil, a cultura do açúcar,
do tabaco, do algodão.
A aprendizagem do ofício pelo escravo era realizada no ambiente de trabalho, em muitos
casos, de forma dura e cruel. Muitos ficavam amarrados uns aos outros ou em cepos com
grandes correntes de ferro exercitando o ofício de tacheiros e caldeireiros, onde o caldo de cana
era posto a ferver. Esse formato provinha de castigos por fugas, ou para conseguir a obediência,
a alta qualificação ou mesmo a identificação com os objetivos do senhor (CUNHA, 2005). Essa
aprendizagem não seguia padrões ou regulamentações, sem atribuições de tarefas próprias para
aprendizes, não sendo necessariamente crianças e adolescentes, mas indivíduos que
“demonstrassem disposição para a aprendizagem em termos tanto técnico (força, habilidade e
atenção) quanto sociais (lealdade ao senhor e ao seu capital, na forma das instalações,
instrumentos de trabalho, matéria-prima, mercadorias e à conservação de si próprio, também
capital).” (CUNHA, 2005, p. 32).
O século XVIII, de acordo com Saviani (2013, p. 78), vem contrastado pela dominante
atmosfera religiosa e “a visão racionalista pautada pela lógica e o anseio por mudanças e o peso
das tradições; entre fé e ciência.” Na metrópole, acontece uma “revolução nos estudos
universitários com forte ênfase em ciências e história natural” (DEL PRIORI; VENANCIO,
2010, p. 107) trazendo abertura para as ciências modernas. Numa visão político-social, o reino
português passa por reformas – as chamadas “reformas pombalinas” – cujo cunho mercantilista,
que implicava o aproveitamento da riqueza advinda do ouro do Brasil (época da mineração do
ouro), intencionava a modernização instalando indústrias e modernizando o comércio
(SAVIANI, 2013). Marquês de Pombal8 institui nove princípios básicos do novo Estado: “o
desenvolvimento da cultura geral, o incremento das indústrias, o progresso das artes, o
progresso das letras, o progresso científico, a vitalidade do comércio interno, a riqueza do
comércio externo, a paz política, a elevação do nível de riqueza e bem-estar.” (SAVIANI, 2013,
p. 81).
8 Sebastião José de Carvalho e Melo, Marquês de Pombal, nomeado ministro por D. José I, responsável pela
Secretaria do Exterior e da Guerra, assumindo mais tarde a Secretaria de Estado dos Negócios do Reino,
consagrando-se tanto na política quanto na historiografia (SAVIANI, 2013).
39
Os princípios de Pombal fortificavam-se na independência comercial de Portugal com
a retirada da Inglaterra de seus negócios. Como afirma Saviani (2013, p. 103), colocar Portugal
“no nível do Século das Luzes” (século XVIII). Nesse contexto, verificava-se o
“desenvolvimento da sociedade burguesa centrada no modo de produção capitalista.”
(SAVIANI, 2013, p. 103).
Esse desenvolvimento ocorreu através da “instrução pública com a criação das aulas
régias de primeiras letras, racionalização das aulas de gramática latina, grego, retórica e
filosofia e à modernização da Universidade de Coimbra pela introdução dos estudos das
ciências empíricas.” (SAVIANI, 2013). Introduziu a Aula do Comércio voltada à burguesia
mercantil e a formação do perfeito comerciante e o Colégio dos Nobres especificamente para a
nobreza, para que pudessem ter uma formação de base mercantilista para a integração na nova
sociedade, aproximando a nobreza às novas condições econômicas, sociais e políticas
(SAVIANI, 2013).
As reformas pombalinas no Brasil se deram a partir da aprovação do Alvará Régio de
1759, que determinou o fechamento de colégios jesuítas de Portugal e de todas as colônias. Ao
mesmo tempo, introduziu, no Brasil, as mesmas aulas régias ou avulsas de Latim, Grego,
Filosofia e Retórica, que, segundo Saviani (2013, p. 82), privilegiam os estudos das chamadas
“humanidades”, correspondendo ao ensino secundário. Estas se desenvolveram em ritmo lento,
por resistências e falta de recursos financeiros. As reformas pombalinas objetivavam a criação
de escolas úteis aos fins do Estado substituindo os interesses eclesiásticos (SAVIANI, 2013),
visando, portanto, racionalizar o processo de produção e envio de riquezas para a metrópole.
O reflexo recai no desenvolvimento das ciências e tecnologia no Brasil com a criação
das companhias de comércio para abertura de mercado dos produtos agrícolas da região
nordeste, incentivando novas técnicas na agricultura (CARDOSO; NOVAIS; D’AMBROSIO,
1985). Nesse período de exploração na mineração do ouro e consequente enriquecimento da
colônia, os ourives tiveram suas lojas fechadas, alegando a prevenção na sonegação de
impostos. Como consequência, houve decadência na formação de mão de obra especializada.
As instituições de ensino de ofícios manufatureiros surgiram a partir de diferentes
iniciativas: associações civis, providência do ministro do Império, de presidentes de província,
assembleias provinciais legislativas, de iniciativas de sociedades constituídas de particulares,
membros da burocracia do estado (civil, militar e eclesiástica), da nobreza e da burguesia
latifundiária e mercantil, sendo todas as iniciativas marcadas pela forte presença do Estado
(CUNHA, 2005).
40
Juntamente com a ampliação do Estado em seu segmento administrativo, judiciário,
fiscal e militar, desenvolve-se o ensino de ofícios artesanais e manufatureiros também voltado
à formação de força de trabalho (CUNHA, 2005). Nas oficinas, os aprendizes eram menores
(com idade de 8 a 12 anos) que aprendiam e praticavam os mais diversos ofícios, além de
desenho e as primeiras letras, através do método de ensino mútuo e disciplina rígida e
controlada. Os alunos mais adiantados atuavam também como professores dos demais
(CUNHA, 2005).
A educação no período colonial e imperial esteve pautada no ensino de ofícios artesanais
e manufatureiros (CUNHA, 2005). Eram os escravos (índios e africanos) que realizavam a
produção artesanal e manufatureira assumindo funções como carpinteiros, ferreiros, pedreiros,
tecelões e outros, pois os homens livres, para se diferenciarem dos escravos, não exerciam essas
atividades. “Aí está a base do preconceito contra o trabalho manual, inclusive e principalmente
daqueles que estavam socialmente mais próximos dos escravos: mestiços e brancos pobres.”
(CUNHA, 2000, p. 90).
O desenvolvimento da educação artesanal se dá de modo não sistemático, mas prático,
dentro da própria oficina pelo mestre de ofício a um jovem aprendiz que iniciava ajudando em
pequenas tarefas. Era necessário que o mestre de ofício obedecesse a critérios como número
máximo de aprendizes e tempo de aprendizagem estabelecidos pelas corporações de ofícios9.
A educação manufatureira ministrada nas escolas de aprendizes estava orientada tanto para
processos artesanais (sapataria, alfaiataria) quanto industriais (tornearia mecânica, serralheria)
(CUNHA, 2005).
A partir de 1850, de forma patriarcal, alguns empresários passaram a oferecer aos
trabalhadores comida, roupa para o trabalho e moradia, configurando “tanto uma escola para os
pobres quanto uma unidade de produção.” (CUNHA, 2005, p. 107). Oferecia-se estudo,
música, dança e também costura e bordado para as moças. Entre os funcionários encontrava-se
um médico, um professor de dança e costureiras, porém com disciplina rígida e pagamento de
salários somente aos que exerciam os cargos de mestre e contramestre (CUNHA, 2005). Os
funcionários não qualificados trabalhavam em troca de comida e uniforme, passando a receber
salários somente a partir de 1863 (CUNHA, 2005).
O resultado do desinteresse dos homens livres pelo trabalho manual resultou em
trabalho e aprendizagem compulsório. Os ofícios eram ensinados a crianças e jovens sem
perspectiva de futuro, sem escolhas (escravos, meninos de rua, crianças deixadas nas Casas de
9 Associações que reuniam trabalhadores (artesãos) de uma mesma profissão (CUNHA, 2005).
41
Roda10, delinquentes, cegos, surdos, mudos e outros desafortunados) (CUNHA, 2005). De
acordo com Celso Suckow da Fonseca (CUNHA, 2005, p. 24), “o ensino necessário à indústria
tinha sido, inicialmente, destinado aos silvícolas, depois fora aplicado aos escravos, em seguida
aos órfãos e aos mendigos. Passaria, em breve a atender, também a outros desgraçados.”
Observa-se que os objetivos da preparação da mão de obra pelo ensino de ofícios mesclam-se
a objetivos ideológicos, parecendo obra de caridade, destinada a amparar os desvalidos
(CUNHA, 2005).
Havendo opção de escolha, poderiam seguir pelo comércio, cuja aprendizagem
independia de aprendizado sistemático, ou buscar uma educação secundária, podendo ser a
superior, desde que esta enfatizasse as letras, conteúdo complementar ao aviltamento manual,
geralmente oferecida em colégios jesuítas, a exemplo da Companhia de Jesus, que valorizava a
atividade intelectual, sendo o ensino literário e de base clássica (CUNHA, 2005). A
aprendizagem sistemática de ofícios tomou forma escolar somente após a vinda da família real
para o Brasil, período de transição para a formação do Estado nacional, em que foi criada a
primeira escola para o ensino de ofícios manufatureiros (CUNHA, 2005).
As primeiras instituições de ensino superior foram criadas no Rio de Janeiro e na Bahia.
No Rio de Janeiro, foi implantada a Academia da Marinha – anatomia e cirurgia, a Academia
Real Militar – curso de agricultura, de desenho técnico e a Academia de Artes. Na Bahia, foram
instituídas as cadeiras de cirurgia e economia política, os cursos de agricultura e química
(CUNHA, 2005).
A função dessas instituições era formar pessoal nas artes da guerra, na produção de
mercadorias e na prestação de serviços (CUNHA, 2005). A Academia Militar, por exemplo,
formava especialistas nas artes bélicas e também engenheiros para trabalhos de topografia,
mineração, construção de estradas, pontes, portos, entre outras obras de engenharia civil
(CUNHA, 2005). De acordo com Cunha (2005, p. 70), a finalidade do ensino superior, nesse
período, era a “formação de quadros de alta qualificação para a produção e a burocracia do
Estado.” Já o ensino secundário funcionava em várias cidades com as “aulas régias” de
humanidades, sendo desenvolvido ao longo do tempo, “por ampliação e diferenciação, mas
sempre em virtude do ensino superior.” (CUNHA, 2005, p. 70). Em paralelo, o Estado
procurava desenvolver a formação da força de trabalho para o processo produtivo: os artífices
para as oficinas, fábricas e arsenais (CUNHA, 2005).
10 Consistia numa janela de hospital, convento ou casa de caridade, na qual se fixava um cilindro com aberturas
nos lados (roda) que girava sobre um eixo vertical. As crianças eram abandonadas aí para serem cuidadas por
entidades de caridade (CUNHA, 2005).
42
Segundo Cunha (2000b, p. 4), o legado do Império em relação ao ensino de ofícios
manufatureiros se deteve
às iniciativas voltadas para o ensino de ofícios, tanto as Estado quanto as de entidades
privadas, eram legitimadas por ideologias que proclamavam ser a generalização desse
tipo de ensino para os trabalhadores livres condição de: a) imprimir neles a motivação
para o trabalho; b) evitar o desenvolvimento de ideias contrárias à ordem política, que
estava sendo contestada na Europa; c) propiciar a instalação de fábricas que se
beneficiariam da existência de uma oferta de força de trabalho qualificada, motivada
e ordeira; e d) favorecer os próprios trabalhadores, que passariam a receber salários mais elevados.
Com o aumento da produção manufatureira, inicia a organização de sociedades civis ao
amparo de órfãos e/ou a oferecer ensino de artes e ofícios, com recursos de quotas pagas por
sócios ou doações de benfeitores e uma parcela do Estado (CUNHA, 2005). A partir dessas
sociedades foram criados os Liceus de Artes e Ofícios, que tinham como objetivo oferecer
estudo de belas-artes e sua aplicação necessária aos ofícios e indústrias para indivíduos,
nacionais ou estrangeiros (CUNHA, 2005). Os cursos nos Liceus eram oferecidos para sócios,
seus filhos e todo e qualquer cidadão livre ou liberto, vedado apenas aos escravos.
As aulas eram gratuitas e noturnas, com dois tipos de alunos: os chamados efetivos, que
cursavam o curso todo, e os amadores, que cursavam parte do ensino regular (CUNHA, 2005).
As disciplinas ministradas dividiam-se em dois grupos: ciências aplicadas e artes. Nas ciências
aplicadas, seguiam: aritmética, álgebra, geometria, química e mecânica; nas artes, o enfoque
era desenho do corpo humano, geométrico, de ornatos, flores e animais, de máquinas,
arquitetura civil, arquitetura naval e outros (CUNHA, 2005). Somente em 1889 conseguiram-
se recursos para a criação das primeiras oficinas e a oferta de cursos ligados à produção fabril
(CUNHA, 2005).
No século XIX, o cultivo do café era o principal produto de exportação. As lavouras
cafeeiras se estendiam do sul fluminense ao Vale do Paraíba expandindo para o oeste paulista.
Porém não houve nenhuma mudança na estrutura latifundiário-escravista, pois continuava a
exportação de produtos agrários sob mão de obra escrava (MAZZEO, 1988). Economicamente,
o café representa investimentos em sua própria produção, uma vez que os capitais gerados no
país não mais refluem a Portugal, tornando a economia dinâmica e moderna (MAZZEO, 1988).
A economia cafeeira é responsável pela modernização do país. Além da mecanização no
beneficiamento do café, há a implantação de estradas de ferro, trazendo rapidez no escoamento
do café com menores custos e influenciando a urbanização e a industrialização no Brasil
43
(SAVIANI, 2013; MAZZEO, 1988). Essa modernização dá início à desagregação da estrutura
escravista (MAZZEO, 1988).
A produção cafeeira em larga escala enfrenta problema de mão de obra, pois o número
de escravos era insuficiente para atender à demanda de trabalho. Um dos obstáculos foi a guerra
que a Inglaterra declarou ao tráfico de escravos através da promulgação do Bill Aberdeen, lei
que autorizava à marinha do Reino Unido a interceptação dos navios negreiros, com
perseguições, afundamento e julgamento da tripulação pelo tribunal inglês (DEL PRIORI;
VENÂNCIO, 2010; MAZZEO, 1988). “Esses impedimentos encareciam o preço do escravo.
Neles estão as origens materiais da abolição da escravatura, da introdução do trabalho
assalariado e da imigração estrangeira, na produção agroexportadora brasileira.” (MAZZEO,
1988, p. 25).
Como tentativas para organizar o problema da mão de obra e estabelecer a ampliação
das área de plantio do café, alguns cafeicultores mecanizaram as lavouras. Máquinas agrícolas
foram importadas e também fabricadas no Brasil favorecendo a economia de mão de obra
(CUNHA, 2005). O governo da Província de São Paulo concedeu benefícios para incentivar a
fabricação de equipamentos agrícolas11. A empresa privelegiada pelo incentivo tinha algumas
cláusulas no contrato, como a manutenção de um certo número de meninos brasileiros
aprendizes, proporcionando alimentação e instrução religiosa, elementar e industrial. Em
contrapartida, não poderiam manter em seu quadro funcional o trabalho escravo ou africanos
livres (CUNHA, 2005).
O empresariado industrial mantinha seu foco nos resultados financeiros e não ao
“recrutamento e treinamento da força de trabalho.” (STEIN, 1979, p. 63). Entendiam que “os
trabalhadores eram dóceis, ignorantes e carentes de orientação.” (STEIN, 1979, p. 63). Até
meados do século XIX, o recrutamento e treinamento nas fábricas têxteis eram de trabalhadores
escravos. Com o mercado limitado, havia pouca possibilidade ou nenhuma de se tornar
proprietário de terras inexploradas. Os trabalhadores ficavam imobilizados em função da
“industrialização de outros setores da economia, a carência de escolas primárias e técnicas e a
lentidão das inovações na indústria têxtil.” (STEIN, 1979, p. 63).
De acordo com Stein (1979, p. 64):
Nem o escravo nem o trabalhador assalariado brasileiro tinham grandes habilidades
mecânicas. Os proprietários das fábricas precisavam de técnicos competentes e estavam dispostos a contratar homens e mulheres no exterior para manejar suas
11 Para conhecer lista com alguns equipamentos agrícolas fabricados e seus respectivos fabricantes, ver Cunha
(2005, p. 103).
44
máquinas e treinar operários brasileiros de ambos os sexos. O governo imperial
facilitou a entrada dessses imigrantes, fornecendo, pelo menos, transporte gratuito por
trem. Alguns observadores, inclusive, condicionavam o êxito de uma fábrica ao
emprego de trabalhadores têxteis estrangeiros. Acreditava-se na época que essa mão-
de-obra especializada, complementando o emprego de rapazes e moças do campo que
recebiam salários mais baixos, e a criação de escolas de ofício iria possibilitar a
formação de operários, mecânicos e “manufaturas inteiramente nacionais”. Na
Inglaterra, primeiro, e depois no continente europeu, onde a revolução industrial criara
um numeroso contingente de artesãos, mecânicos e técnicos especializados em fiação
e tecelagem do algoodão, os empresários brasileiros foram buscar na nata da sua mão-
de-obra para colocar as suas fábricas em funcionamento e treinar os seus trabalhadores.
O período Imperial no Brasil foi marcado por campanhas abolicionistas. Uma vez
assinalada a decadência da escravidão, a abolição era tida como inevitável e seguiu uma
transição gradual e segura (SAVIANI, 2013). Surgiram “vários projetos emancipacionistas
visando à liberdade dos nascituros e à obrigatoriedade da alforria dos escravos, pelos quais se
oferecesse o respectivo preço.” (PRADO JÚNIOR, 1986, p. 173). Depois houve a proibição do
tráfico (1850), Lei do Ventre Livre (1871), que estabeleceu um regime de tutela aos filhos de
escravos, considerando livres os nascidos a partir da data da lei. A transição continuou com a
Lei dos Sexagenários (1885), que libertava os escravos com idade acima de sessenta anos.
Finalmente chegou a Abolição com a Lei Áurea (1888) (PRADO JÚNIOR, 1986; SAVIANI,
2013).
Após a abolição, os negros buscaram moradia em áreas precárias, periferias,
principalmente das grandes cidades – a exemplo de São Paulo e Rio de Janeiro. Muitos ficaram
trabalhando nas próprias colônias com seus senhores em troca de alimentação. Abandonados,
sem uma lei de reforma que proporcionasse assistência e garantias de proteção na transição para
o sistema de trabalho livre (FERNANDES, 2008), estavam a cargo de si mesmos para sua
manutenção e segurança sem qualquer apoio, seja de seus senhores, do Estado, da Igreja ou
outra qualquer instituição que tivessem por objeto prepará-los para o novo regime de
organização da vida e do trabalho (FERNANDES, 2008).
Numa economia essencialmente agrária e rural, em regiões do país onde já não havia
prosperidade, foi realizada a emigração do negro para o leste e sul do país, os senhores vendiam
seus escravos livrando-se de obrigações onerosas ou incômodas (FERNANDES, 2008;
SAVIANI, 2013). Em terras prósperas pela exploração do café, havia, segundo Fernandes
(2008), duas possibilidades para corrigir a crise gerada pela transformação da organização do
trabalho: a primeira estava em lugares onde se encontrava a produção em baixos níveis, onde
se mantinha a tradição, os escravos libertos obrigavam-se a optar por reintegrar-se ao sistema
de produção com as condições muito próximas, senão as mesmas às anteriores ou a fazer parte
45
da “massa de desocupados e de semi-ocupados da economia de subsistência do lugar ou de
outra região.” (FERNANDES, 2008, p. 31). A segunda possibilidade encontrava-se em lugares
de níveis altos de produção, com elevado padrão econômico e de organização do trabalho, em
que os ex-escravos precisavam concorrer com “os chamados trabalhadores nacionais”
(incluídos os ex-escravos libertos), os quais se mantiveram até então fora das atividades
produtivas e, principalmente, com mão de obra imigrante europeia, já habituada ao novo regime
de trabalho (FERNANDES, 2008; SAVIANI, 2013).
Os efeitos dessa concorrência foram altamente prejudiciais aos antigos escravos, que
não estavam preparados para enfrentá-la. Mas correspondiam aos interesses dos
proprietários de terras e donos de fazendas, tanto quanto aos mecanismos normais da
ordem econômica emergente. Em consequência, ao contrário do que se poderia supor,
em vez de favorecer, as alternativas da nova situação econômica brasileira solapavam,
comprometiam ou arruinavam, inexoravelmente, a posição do negro nas relações de
produção e como agente de trabalho. (FERNANDES, 2008, p. 32).
O destino do escravo estava ligado diretamente ao da lavoura, pois “a posição do negro
no sistema de trabalho e sua integração à ordem social deixam de ser matéria política”
(FERNANDES, 2008, p. 30), não sendo mais possível aliar o mecanismo político-econômico
com o trabalho servil, por desinteresse do Estado. Descobriu-se que não havia necessidade da
inserção do negro no mercado de trabalho em relação a duas situações concomitantes: os
brasileiros brancos com capacidade de trabalho e os imigrantes europeus que juntos atenderam
à necessidade de mão de obra (FERNANDES, 2008). Nesse momento, não houve uma visão
do Estado sobre o futuro do negro, uma vez que as alternativas de mão de obra vieram por
outros meios. De fato, as transformações da organização do trabalho são nítidas nesse período
de transição da mão de obra escrava para a livre. De acordo com Saviani (2013, p. 159), atribui-
se à educação “a tarefa de formar o novo tipo de trabalhador para assegurar que a passagem se
desse de forma gradual e segura, evitando-se eventuais prejuízos aos proprietários de terras e
de escravos que dominavam a esconomia do país.”
A participação da educação nesse momento de transição ocorre numa ligação entre
emancipação e instrução (SAVIANI, 2013). O objetivo era instruir, principalmente as crianças
libertas pela Lei do Ventre Livre, para se transformarem em trabalhadores úteis, através de
escolas agrícolas, fazendas-escolas ou colônias agrícolas. A emancipação do escravo exigia a
instrução para que a diminuição do “abismo da ignorância” afastasse o “instinto da ociosidade”
(SAVIANI, 2013, p. 163). “A libertação gradativa dos escravos deveria ser acompanhada da
presença da escola para ‘transformar os ingênuos e os homens livres, parasitas da grande
46
propriedade e da natureza pródiga, em trabalhadores submetidos à regra do capital.”
(SCHELBAUER, 1998 apud SAVIANI, 2013, p. 163).
A nova demanda do trabalho livre fez com que os escravos livres migrassem para os
grandes centros em busca de oportunidades de trabalho. Viraram urbanos e não tinham um
trabalho específico, aumentando o nível de pobreza. Portanto, “a cidade alcançava, em termos
de organização do trabalho livre e da integração da ordem social competitiva, posição simétrica
à que teve no século XIX, em termos da organização do trabalho escravo e da integração da
ordem social escravista.” (FERNANDES, 2008, p. 40).
Porém, a mão de obra sobressalente e agente do trabalho livre era o imigrante que em
contingente era maior que a população negra e representou para o Brasil “um tipo original de
corrente povoadora” constituída de trabalhadores braçais (PRADO JÚNIOR, 1986), “cujo
afluxo e fixação no país serão provocados e estimulados por uma política oficial e deliberada
de povoamento ou pela iniciativa privada de particulares interessados na obtenção de mão-de-
obra.” (PRADO JÚNIOR, 1986, p. 183).
A competição econômica entre negros e imigrantes se estabelece. Concorrem aos
empregos, à ocupação das cidades, ficando o negro e o mulato destituídos do artesanato urbano
ou do comércio, exercendo tarefas pesadas, mal remuneradas e degradantes A competição foi
impactante para o negro e o mulato porque contavam com a posição de homens livres, porém
não contavam com a concorrência dos grupos étnicos (FERNANDES, 2008). Segundo
Florestan Fernandes (2008, p. 41):
Enquanto o branco da camada dominante conseguia proteger e até melhorar sua
posição na estrutura de poder econômico, social e político da cidade e enquanto o
imigrante trocava sucessivamente de ocupações, de áreas de especialização
econômica e de posições estratégicas para a conquista de riquezas, de prestígio social
e de poder, o negro e o mulato tinham de disputar eternamente as oportunidades
residuais com os componentes marginais de sistema – com os que ‘não serviam para
outra coisa’ ou com os que “estavam começando bem por baixo”.
Iniciada a imigração com países como Alemanha e Suiça desde 1824, porém com pouco
sucesso em razão de inviabilidade econômica e o obstáculo na atração da população alemã que
era da religião protestante para o Brasil onde a religião oficial era a católica (PRADO JÚNIOR,
1986). Com a unificação da Itália e a reordenação de sua economia, foi possível propor oferta
de trabalho no Brasil e obter trabalhadores dispostos à emigração (CUNHA, 2005). Era
subsidiado o transporte e a subsistência dos imigrantes durante o primeiro ano; logo, um país
auxiliou o outro, uma vez que na Itália havia excedente de população agrícola e no Brasil a falta
(CUNHA, 2005; PRADO JÚNIOR, 1986; SAVIANI, 2013).
47
A imigração, principalmente a europeia, teve fundamental participação na economia do
país. Traziam de seus países, além da vontade de crescer economicamente, a de desenvolver-se
enquanto povo que, recém-saídos da guerra (Segunda Guerra Mundial), tinham o compromisso
de se reerguer como ser humano, sujeito de suas próprias qualidades enquanto trabalhadores.
Estavam mais bem preparados, qualificados para trabalhar a terra, na indústria, conheciam os
direitos enquanto trabalhadores livres, assalariados, trazendo novas experiências para esse país
essencialmente agrário e até então escravagista (MAZZEO, 1988). Eram a esperança nacional
de progresso, sendo o agente natural do trabalho livre (FERNANDES, 2008).
Vem com o imigrante a grande transformação do regime de trabalho no país, pois a
remuneração passa a ser com o pagamento de salários e não mais com a divisão do produto
(PRADO JÚNIOR, 1986). Os imigrante vinham da Europa com contratos já assinados. É
considerável que a modernização nacional se dá pela produção cafeeira, sendo esta responsável
pela transformação do capital industrial que passa do trabalho escravo para o assalariado
(MAZZEO, 1988). De acordo com Mazzeo (1988, p. 27), “a indústria nacional nasceu das
fissuras da economia exportadora de café.”
3.2 FORMAÇÃO TÉCNICA E PROFISSIONAL
Iniciado o período republicano (1889), a estrutura social é modificada por três processos
sociais e econômicos: a imigração estrangeira, a urbanização e a industrialização (CUNHA,
2000b). Na época, surgem defensores de projetos socialistas, constituindo partidos políticos,
sindicatos e jornais. O trabalhador é exaltado como principal elemento da sociedade, abrindo
espaço para o movimento operário (DEL PRIORE; VENANCIO, 2010). O movimento operário
foi influenciado pelos imigrantes europeus, que trabalhavam nas lavouras cafeeiras e trouxeram
ideias revolucionárias, assim como reivindicações de melhores condições de trabalho. As
atividades cafeeira e ferroviária absorviam mão de obra tanto para a agricultura quanto para
“tarefas mecânicas de manutenção, reparo e substituição de peças das locomotivas e vagões,
emergindo o gérmen de atividades industriais.” (SAVIANI, 2013, p. 188).
Nesse período de expansão do capitalismo, a preparação do profissional se caracterizava
pela relação empírica com a produção, ou seja, com experiência adquirida no trabalho. Ao
mesmo tempo, a escola estava designada como espaço do processo educativo que formava
aptidões e comportamentos necessários para a época (SHIROMA; MORAES;
EVANGELISTA, 2007).
48
A aceleração industrial no Brasil se deu na forma de “grande indústria”, deixando de
seguir a ordem clássica: do artesanato passa pela manufatura para a grande indústria (SAVIANI,
2013). Logo, a burguesia industrial dos anos de 1920 se orienta pelo modelo fordista
submetendo o trabalhador aos preceitos da fábrica e ao controle entre lazer e ócio, além da
produção em massa (SAVIANI, 2013). Os produtos alimentícios e a fabricação de tecidos,
seguidos de bebidas e vestuário, ainda eram a atividade industrial manufatureira de maior
relevância.
Nessa década, foi criado o Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp), que
tinha como premissas: a criação de serviço de informações sobre preços de mercado no mundo;
um centro de estatísticas; constituição de uma biblioteca especializada, enviando aos sócios
síntese de cada livro; inauguração de um centro de exposições; instalação de laboratório de
análise de materiais e desenvolvimento de sistema de normas para a produção. O Ciesp tinha
como objetivo transformar a classe industrial em formadora de opinião (CIESP, 2013).
Resultante de um acordo entre o Liceu de Artes de Ofícios de São Paulo e a Estrada de
Ferro Sorocabana, a São Paulo Railway, a Companhia Paulista de Estradas de Ferro e a
Companhia Morgiana de Estradas de Ferro, criou-se em 1924 a Escola Profissional Mecânica,
como iniciativa pioneira de ensino sistemático de ofícios voltados para as ferrovias (CUNHA,
2000b). O objetivo de maior impacto na criação dessa Escola Profissional era preparar o
trabalhador para que ele desse “resposta técnica” em relação à redução da jornada de trabalho
de 10 para 8 horas, ou seja, melhor aproveitamento do tempo no alcance de produtividade,
aplicando o taylorismo na formação profissional. O curso tinha duração de 4 anos; cada empresa
encaminhou dois aprendizes para frequentar o curso. Além da instrução teórica realizada no
Liceu, o curso contava com estágios práticos realizados nas oficinas da São Paulo Railway
(CUNHA, 2000b).
Objetivando desenvolver a preparação do trabalhador com foco na “resposta técnica”, a
Escola utilizou como modelo de aprendizagem as séries metódicas12, consideradas “muito mais
que um meio de aquisição de técnicas de trabalho, um instrumento disciplinador e formador do
caráter dos jovens aprendizes.” (CUNHA, 2000b, p. 132). Segundo Cunha (2000b, p. 132),
“[...] as séries metódicas vieram a substituir os padrões artesanais de aprendizagem de ofícios,
e eram perfeitamente compatíveis com o taylorismo [...]” Assim como a burguesia industrial
12 As séries metódicas foram desenvolvidas em 1875 por Victor Della Vos, diretor da Escola Técnica Imperial de
Moscou, “para enfrentar a necessidade de formação de grande quantidade de trabalhadores qualificados para
apoiar a expansão das ferrovias da Rússia.” (CUNHA, 2000b, p. 132).
49
focava a atividade manufatureira no modelo de gestão fordista direcionada à quantidade de
produtos fabricados, a formação da mão de obra focava o aprendizado nos preceitos tayloristas.
[...] a substituição, no ensino de ofícios, o método tradicional pela aprendizagem
metódica era vantajoso porque exigia apenas um instrutor para orientar todo um grupo
de aprendizes, o que possibilitava o preparo de maior número de profissionais em
menor período de tempo. As oficinas, então criadas para fins específicos de
aprendizagem, proporcionavam, também, ambiente propício ao menor dispêndio de
energia e maior aproveitamento da força de trabalho disponível. (CUNHA, 2000b, p.
133-134).
A outra inovação de grande relevância foi a utilização de testes psicológicos para a
seleção e orientação dos candidatos aos cursos, assim como também foi utilizado para a seleção
e orientação de profissionais. A Psicotécnica em articulação com o taylorismo foi introduzida
para auxiliar na obtenção do máximo rendimento com menor desperdício, pois era
indispensável colocar o trabalhador certo no trabalho certo, exigindo “o estudo de aptidões
físicas e psíquicas dos operários, o que valia, também, para o encaminhamento dos aprendizes
para os ofícios tidos como os mais adequados a cada um.” (CUNHA, 2000b, p. 133). Com a
Psicotécnica se conseguiu estender/destinar o ensino de ofícios aos mais aptos, deslocando a
dimensão assistencial configurada até então nos Liceus.
Os anos 1930 tiveram fundamental importância na nova etapa do capitalismo brasileiro.
Lembrando que a primeira metade dessa década foi marcada pela diminuição, em nível
internacional, do preço do café levado pela depressão econômica que sucedeu a crise de 1929
(MAZZEO, 1988; DEL PRIORE; VENANCIO, 2010). O resultado do crasch de 1929
proporcionou a ampliação e diversificação dos setores da burguesia brasileira produzindo um
novo quadro econômico e político nas atividades rurais e industriais (MAZZEO, 1988).
A revolução burguesa no Brasil é marcada pela Revolução de 1930, uma vez que o
poder sai das mãos dos latifundiários e vai para as mãos dos industriários modernistas
(MAZZEO, 1988). De acordo com Mazzeo (1988, p. 31), “a Revolução de 1930 não representa
um rompimento revolucionário com a dependência e a subordinação do capitalismo nacional
frente aos polos desenvolvidos do capitalismo”; representa um marco no desenvolvimento do
capitalismo no Brasil em relação à modernização (MAZZEO, 1988). Nesse período, acontece
a transição da burguesia agrária para a burguesia industrial.
Esse processo que, de um lado, desloca o eixo do poder rural para o urbano, de outro,
reforça o caminho autocrático e prussiano-colonial do país, porque põe à margem as
massas populares, nos moldes de uma “revolução pelo alto”, sem romper com a
dependência estrutural da economia brasileira. O que consagrou chamar de revolução
não passou de mais um golpe de Estado, comandado pela facção modernizadora da
50
burguesia nacional, de onde emergirá, mais uma vez, a solução bonapartista,
representada por Getúlio Vargas. (MAZZEO, 1988, p. 33).
Ao longo da década de 1930, o Estado apresenta-se intervencionista e centralizador.
Estrutura-se, politicamente, para subsidiar o desenvolvimento produtivo, garantindo “a
repressão ao movimento operário e popular, representado pela legislação trabalhista autocrática
e corporativista e pelo aparelho repressivo de uma polícia violenta e brutal.” (MAZZEO, 1988,
p. 34). Dessa forma, toma como suas tarefas que a burguesia não dará conta de realizar, ou seja,
a edificação de bases para industrialização em massa e consequentemente um proletariado
moderno (MAZZEO, 1988). Nesse período, é criado o Instituto de Organização Racional de
Trabalho (IDORT), 1931, com o “objetivo de difundir a ideia de racionalização, promover
eficiência e aumentar a produtividade na produção. Trata-se de uma sociedade civil, sem fins
lucrativos, vinculada ao movimento internacional de difusão do taylorismo.” (CORREIA;
ALMEIDA, 2013, p. 36; CUNHA, 2000b). Também são instituídos o Conselho Nacional do
Comércio Exterior, 1934, para dar continuidade a atividade agroexportadora e o Conselho
Nacional do Petróleo, 1938, para regulamentar e estruturar a exploração do petróleo
(MAZZEO, 1988).
Nos anos 1930, a educação estava focada na educação rural, no sentido de conter a
migração do campo para a cidade e na formação técnico profissional, visando solucionar o
problema das agitações urbanas (SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA, 2007, p. 16). Nessa
época, o “emergente processo de industrialização demandava políticas educacionais que
assegurassem uma educação moderna, capaz de incorporar novos métodos e técnicas e que
fosse eficaz na formação do perfil de cidadania adequado a esse processo.” (SHIROMA;
MORAES; EVANGELISTA, 2007, p. 19). Em 30 de junho de 1931, é regulamentada a
profissão de contador e organizado o ensino comercial pelo Decreto n. 20.158 (SAVIANI,
2013).
O período pós-guerra (II Guerra Mundial) é considerado positivo para a economia
nacional, dado o processo de aceleração e modernização industrial, com o aumento de
exportações (MAZZEO, 1988; PRADO JÚNIOR, 1986), a produção agrícola é ultrapassada
pela fabril, passando a ser a principal atividade econômica (DEL PRIORE; VENANCIO, 2010).
Surge a indústria de base, com a fabricação de máquinas e ferramentas pesadas, destinadas à
siderurgia, à metalurgia e à indústria química (DEL PRIORE; VENANCIO, 2010). O progresso
se fez às custas da “massa trabalhadora do país, que suportou todo o ônus daqueles sacrifícios
(por efeito, em particular, das restrições alimentares e do encarecimento considerável da vida)
[...]” (PRADO JÚNIOR, 1986, p. 304).
51
A Era Vargas, compreendida aqui nos dois mandatos, 1930 a 1945 e 1951 a 1954,
caracteriza-se pela intensa urbanização. Getúlio Vargas cria, para os trabalhadores das cidades,
o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio. Estabelece a jornada de oito horas na indústria
e no comércio, já reivindicada pelo movimento operário desde o século XIX e consolida as Leis
Trabalhistas (DEL PRIORE; VENANCIO, 2010).
A intervenção estatal de Getúlio Vargas abrange diferentes âmbitos da vida nacional.
Economicamente, “consiste no crescimento da indústria de base, produtora de aço ou de fontes
de energia, como o petróleo e a eletricidade” (DEL PRIORE; VENÂNCIO, 2010, p. 268),
predominando a iniciativa estatal e a exportação dos produtos agrícolas como recursos para o
crescimento econômico. O planejamento e implantações de importantes alterações na educação
ocorrem na gestão do Ministro da Educação e da Saúde – Gustavo Capanema. Houve a
ampliação de vagas e unificação de conteúdo das disciplinas do ensino secundário e
universitário; criação do ensino profissionalizante unificado em instituições como SEnai13
(Decreto-lei n. 4.048 -1942), Senac14 (Decreto-lei n. 8.621 – 1946) e Sesc15 (Decreto-lei
n. 9.853 – 1946) (DEL PRIORE; VENANCIO, 2010; SAVIANI, 2013). Além da Lei Orgânica
do Ensino Industrial (Decreto-lei n. 4.073 – 1942), Lei Orgânica do Ensino Comercial (Decreto-
lei n. 6.141 – 1943), Lei Orgânica do Ensino Agrícola (Decreto-lei n. 9.613 – 1946), as
Reformas Capanema subdividiram o ramo profissional em industrial, comercial e agrícola
(SAVIANI, 2013).
No Governo Provisório (1930), dá-se a criação do Ministério do Trabalho e do
Ministério da Educação e Saúde Pública. O Ministério do Trabalho tinha como principal
responsabilidade conduzir/controlar “questão social”. O Mistério da Educação e Saúde Pública
respondia pela formação física, moral e intelectual da população (CUNHA, 2000c). O sistema
federal de escolas de aprendizes artífices, “a mais importante base o desenvolvimento do ensino
profissional” (CUNHA, 2000c, p. 19), foi transferido para o Ministério da Educação juntamente
com todos os órgãos do Ministério da Justiça e Negócios Interiores e do Ministério da
Agricultura, Indústria e Comércio.
Três decretos promulgados expressaram a linha política de Francisco Campos, então
Ministro da Educação: a) a integração do ensino religioso, em nível nacional, ao currículo das
escolas primárias, secundárias e normais; b) a reforma do ensino secundário em relação à
finalidade, duração e estrutura direcionado aos exames vestibulares, focando “a formação do
13 Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai). 14 Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac). 15 Serviço Social do Comércio (Sesc).
52
homem para todos os grandes setores da atividade nacional, constituindo no seu espírito todo
um sistema de hábitos e comportamentos que habilitem a viver por si mesmo e a tomar em
qualquer situação as decisões mais convenientes e seguras” (CUNHA, 2000c, p. 21); c) o ensino
superior passou a ser gerido pelo Estatuto das Universidades Brasileiras com duas formas de
organização: a universidade e o instituto isolado, sendo a universidade oficial - mantida pelo
Governo Federal ou Estadual - ou a livre, mantida por fundações ou associações particulares
(CUNHA, 2000c).
Em 1934 e 1935 respectivamente, foram criadas as Universidades de São Paulo e do
Distrito Federal. No Distrito Federal, o modelo para desenvolver a força de trabalho veio
pautada em diminuir a diferença curricular entre escolas pós-primárias para futuros operários,
das escolas secundárias para futuros burocratas e profissionais liberais (CUNHA, 2000c).
Surgiram as escolas técnicas secundárias que ofereciam cursos industriais e comerciais, além
dos cursos secundários (CUNHA, 2000c). Importante ressaltar que esses modelos vieram
seguindo o pensamento e a ação de Anísio Teixeira; porém, após sua saída em 1935, os ensinos
profissional e secundário voltaram aos padrões anteriores (CUNHA, 2000c).
A Constituição de 1937 responsabiliza o Estado, as empresas e os sindicatos a formar
profissionais das classes menos favorecidas e assim atribui às empresas o dever de formar os
aprendizes em escolas (CUNHA, 2000c), conforme Artigo 129 (BRASIL, 1937):
A infância e à juventude, a que faltarem os recursos necessários à educação em
instituições particulares, é dever da Nação, dos Estados e dos Municípios assegurar,
pela fundação de instituições públicas de ensino em todos os seus graus, a
possibilidade de receber uma educação adequada às suas faculdades, aptidões e
tendências vocacionais. O ensino pré-vocacional profissional destinado às classes
menos favorecidas é em matéria de educação o primeiro dever de Estado. Cumpre-lhe dar execução a esse dever, fundando institutos de ensino profissional e
subsidiando os de iniciativa dos Estados, dos Municípios e dos indivíduos ou
associações particulares e profissionais. É dever das indústrias e dos sindicatos
econômicos criar, na esfera da sua especialidade, escolas de aprendizes, destinadas
aos filhos de seus operários ou de seus associados. A lei regulará o cumprimento
desse dever e os poderes que caberão ao Estado, sobre essas escolas, bem como os
auxílios, facilidades e subsídios a lhes serem concedidos pelo Poder Público.
O Ministério da Educação, em 1938, por intermédio da divisão do Ensino Industrial,
elaborou um anteprojeto que estipulava a criação de escolas de aprendizes industriais que
seriam mantidas e dirigidas por indústrias e sindicatos dos empregados (CUNHA, 2000c).
Ingressariam nas escolas trabalhadores entre 14 e 18 anos em cursos com duração de 8 a 16
horas semanais concomitantes ao exercício profissional. Sob a responsabilidade dos sindicatos,
também foram implantados projetos para a formação de menores não trabalhadores (de 11 a 14
53
anos). O objetivo era desenvolver nos aprendizes a destreza manual, estudando desenho e
ciências, assim melhorando os conhecimentos de cultura geral (CUNHA, 2000c).
O Decreto-lei n. 1.238, de 2 de maio de 1939, estipulava as empresas como
mantenedoras dos cursos de aperfeiçoamento profissional para adultos e menores (CUNHA,
2000c). O Decreto-lei pretendia “assegurar aos trabalhadores, fora do lar, condições mais
favoráveis e higiênicas para sua alimentação e assegurar-lhes, ao mesmo tempo, o
aperfeiçoamento da educação profissional.” (CUNHA, 2000c, p. 30). A regulamentação desse
decreto-lei teve forte influência da XXV Conferência Geral da Organização Internacional do
Trabalho em Genebra, cujo tema principal era a aprendizagem, enfatizando a clara comunicação
dos direitos e deveres dos aprendizes e dos empregadores como relevante fator de sucesso da
formação profissional (CUNHA, 2000c).
As Leis Orgânicas, nos anos 1940, contemplaram o ensino técnico – profissional,
industrial, comercial e agrícola. As camadas mais favorecidas da população procuravam a
formação no ensino secundário e formação superior. Os trabalhadores precisavam de uma
formação rápida para se inserirem no mercado de trabalho. Eram encaminhados para o ensino
primário e profissional, pois, para atender a essa demanda, o governo criou o Serviço Nacional
dos Industriários e, em seguida, o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SHIROMA;
MORAES; EVANGELISTA, 2007; SAVIANI, 2013).
Para o SENAI16, a formação de trabalhadores não se reduziria nem à sua “capacidade
eficiente de leitura nem à utilização prática das operações matemáticas elementares”,
mas à sua capacidade de compreensão dos fenômenos que cercam os homens todos
os dias, “seus deveres para consigo e para com a sociedade.” (SHIROMA; MORAES;
EVANGELISTA, 2007, p. 25).
Gustavo Capanema esteve à frente do Ministério da Educação durante o governo
Getúlio Vargas, entre 1934 e 1945. Em 1941, a Lei Capanema reformou todo o ensino nacional
e passou a considerar o ensino profissional como de nível médio, passando, exclusivamente, ao
ensino primário o conteúdo geral. A lei orgânica do ensino industrial de 1942 estipulou a
obrigatoriedade dos empregadores em manter menores em atividades de formação profissional,
sendo a aprendizagem conduzida “metodicamente em escolas mantidas pela indústria junto às
oficinas ou nas suas proximidades, durante o horário de trabalho e sem prejuízo do salário.”
(CUNHA, 2000c, p. 37). A lei orgânica distinguia as escolas de aprendizagens (aprendizes
16 O Senai se desvincula da educação geral, devolve-a para o estado e se restringe à formação especializada de
nível técnico.
54
empregados) com as escolas industriais (destinadas aos menores que não trabalhavam)
(CUNHA, 2000c). Segundo Cunha (2000c, p. 37):
Os cursos industriais [básicos] são destinados ao ensino, de modo completo, de um
ofício cujo exercício requeira a mais longa formação profissional. Por outro lado, os
cursos de aprendizagens são destinados a ensinar, metodicamente aos aprendizes dos
estabelecimentos industriais, em período variável, e sob regime de horário reduzido,
o seu ofício.
O Senai foi criado por determinação do presidente da República, porém sua
administração era realizada pela Confederação Nacional da Indústria, entidade privada, que,
por determinação do governo, deveria criar um regimento interno e submetê-lo ao Ministério
da Educação (CUNHA, 2000c). Regimento posteriormente aprovado pelo decreto n. 10.009 de
16 de abril de 1942. Inicialmente, as indústrias participantes deveriam estar enquadradas na
Confederação Nacional da Indústria, havendo um jogo de troca, as contribuintes recebiam do
Senai cursos para os aprendizes, porém eram obrigadas a matricular no mínimo 5% e no
máximo 15% de operários para a demanda de formação profissional (CUNHA, 2000c).
A metodologia de ensino instituída pelo Senai, desde o início, foram as séries metódicas,
então chamadas de Método de Ensino Individual, utilizadas na Escola Profissional Mecânica
nos anos 1920. O ponto de partida do método exigia delimitação no ensino de um ofício com o
entendimento do todo (CUNHA, 2000c); pode-se dizer que o ensino deveria ser das partes para
o todo, com a aprendizagem das operações separadamente. Dessa forma, associava-se a divisão
técnica do trabalho (taylorismo) com o processo de aprendizagem (CUNHA, 2000c). O Método
de Ensino Individual colocava o educando no centro do processo e o professor atuava como
guia e orientador da aprendizagem. Segundo Kalil (1971 apud CUNHA, 2000c, p. 67):
Nos dias atuais, é muito mais importante ensinar o educando a aprender por si só e a
prepará-lo, convenientemente, dando-lhe condições que o possibilitem a situar-se
satisfatoriamente em um mundo que se transforma rapidamente e de maneira
contínua, em face aos avanços tecnológicos, do que apenas acumular conhecimentos.
Por tudo isso, a aprendizagem deve se revestir de um dinamismo tal, em que
predomina, nas atividades discentes, o ativismo, ao invés da aprendizagem passiva,
onde o educando, apenas, se limita a receber as informações do docente.
Com base em Kalil (1971), o Senai adota o método de instrução individual que tem
como características: a) cada aluno inicia e termina a aprendizagem quando está preparado, sem
interferência do nível de adiantamento dos outros alunos; b) o docente deve ter condições de
atender individualmente os alunos e ao mesmo tempo dar atenção ao grupo todo; c) a assistência
deve ser recebida por cada aluno sem interferência do progresso dos outros; d) o progresso de
55
cada aluno deve ser mediante suas aptidões, esforço e interesse, sem prejuízo aos demais
(CUNHA, 2000c). Pelo método de ensino, procurava-se acompanhar as mudanças
organizacionais no mundo do trabalho e as exigências para uma mão de obra qualificada e
especialista, com alto padrão de produtividade a partir do melhor aproveitamento do tempo e
medido pela avaliação.
O então eleito presidente Jucelino Kubitschek (1956 – 1961) pautou seu governo nas
liberdades democráticas e no desenvolvimento industrial. A diferença deste para o modelo
anterior (getulista) são os bens duráveis, principalmente a indústria automobilística e
multinacional, constituída como “respiro” econômico diante das crises do setor agroexportador.
A forma de crescimento industrial desse governo se institui na “associação de empresas
privadas brasileiras com multinacionais e estatais” (energia e insumos industriais) (DEL
PRIORE; VENANCIO, 2010, p. 268.). O Plano de Meta – “50 anos em 5” é um sucesso, em
particular pela expansão de infraestrutura (estradas, transportes, hidrelétricas), ampliação da
fronteira agrícola em direção a Goiás e Mato Grosso e a construção de Brasília (DEL PRIORE;
VENANCIO, 2010).
A primeira LDB - Lei 4.024 - data de 20 de dezembro de 1961. O Conselho Federal de
Educação (CFE), contando com Anísio Teixeira, que também elaborou o Plano Nacional de
Educação (PNE), o qual estava previsto no inciso 2º do artigo 92 da LDB (BRASIL, 1961).
Sobre educação e trabalho a Lei faz referência ao artigo 31, do ensino primário gratuito para
trabalhadores e seus filhos, que este deverá ser mantido por empresas industriais, comerciais e
agrícolas, em que trabalhem mais de 100 pessoas (previsto no artigo 168 da Constituição -
1946). As empresas industriais e comerciais são obrigadas a ministrar, em cooperação,
aprendizagem de ofícios e técnicas de trabalho aos empregados de menores idades, dentro das
normas estabelecidas pelos diferentes sistemas de ensino (artigo 51). Cita no artigo 108 a
cooperação do poder público com as empresas e entidades privadas para o desenvolvimento do
ensino técnico e científico (BRASIL, 1961) (previsto no Artigo 168 da Constituição – 1946).
Sobre o ensino técnico industrial, a LDB/1961 inclui a equivalência dos cursos técnicos
aos cursos secundários, para ingresso em cursos superiores, a instalação de cursos pré-técnicos
pelas escolas com duração de um ano, em caráter obrigatório (CUNHA, 2000c). Conforme
artigo 49, parágrafo 4º: “nas escolas técnicas e industriais, poderá haver, entre o primeiro e o
segundo ciclos, um curso pré-técnico de um ano, onde serão ministradas as cinco disciplinas de
curso colegial secundário.” (BRASIL, 1961). Torna-se obrigatório o estágio para a diplomação
para a conclusão do curso técnico (Portaria de 7 de março de 1962). De acordo com Cunha
56
(2000c), a influência da LDB/1961 no ensino técnico industrial teve relevância apenas na
validação do diploma para o ingresso em cursos superiores.
No Governo Kubitschek, assim como se estimulava a ideologia política nacionalista, ao
mesmo tempo seguia com o projeto de industrialização através da desnacionalização da
economia até o esgotamento do modelo de substituição de importações (SAVIANI, 2013). A
primeira etapa do modelo direcionava a substituição dos bens de consumo não duráveis, como
indústrias têxteis e alimentícias, que foram instaladas rapidamente, por precisar de investimento
menor; a segunda substitui bens de consumo duráveis como indústrias automobilísticas,
eletrônicas e de eletrodomésticos, que pelo alto investimento necessitou de concurso de
empresas internacionais (SAVIANI, 2013). Assim, já não havia mais dependência das
manufaturas importadas, não tinha mais sentido lutar pela industrialização, pois o ciclo das
substituições das importações se cumpriu. De acordo com Saviani (2013), a contradição de
interesses aparece quando se completa o objetivo.
Nessas condições, unem-se a favor da continuidade da industrialização empresários
nacionais e internacionais, a classe média, os operários e a força da esquerda, porém com razões
diferentes (SAVIANI, 2013). Em virtude do processo de aceleração da industrialização, era
indispensável a formação de mão de obra técnica. Em 1959, as Escolas Industriais e Técnicas
são transformadas em autarquias com o nome de Escolas Técnicas Federais, com autonomia
didática e de gestão. Esse governo marca o aprofundamento da relação do Estado com a
economia.
Os anos 1960 vêm com um quadro político marcante e radical. Jânio Quadros (1961)
assume a Presidência sob a herança do desenvolvimentismo e a contradição entre modelo
econômico e ideologia política. Favorável às propostas do Fundo Monetário Internacional
(FMI), toma como medidas anti-inflacionárias a desvalorização da moeda, a reforma do sistema
cambial, arrocho salarial, congelamento dos subsídios para importações de produtos como trigo
e a gasolina (MAZZEO, 1988). Segundo Mazzeo (1988, p. 43), “estas medidas tiveram um
efeito contrário ao esperado”, elevando ainda mais as taxas de inflação, causando protestos
populares. A solução favorável é encontrada junto ao FMI, negociando a dívida externa com os
credores internacionais (MAZZEO, 1988). Outra articulação desastrosa para Janio Quadros foi
o “golpe da renúncia”, este visava instituir um governo ditatorial, seria um golpe de Estado
aceito pelo consenso nacional, permitindo dirigir o país acima das classes sociais e dos partidos
políticos. Ao renunciar o governo comoveria as massas, levaria as Forças Armadas ao comando
de ministros reacionários e voltaria como ditador (MAZZEO, 1988).
57
Após o fracasso do golpe, João Goulart assume a presidência (1961 a 1964) com uma
política de conciliação nacional, “equilibrando-se entre as pressões dos setores populares e
democráticos e as dos grupos vinculados ao capital estrangeiro e ao imperialismo.” (MAZZEO,
1988, p. 44). Estabelece o presidencialismo em 1963, com vitória no plebiscito contra o
parlamentarismo. Com objetivo de conter a inflação e assegurar o desenvolvimento industrial,
implementa o Plano Trienal, as Reformas de Base, visando ampliar o mercado interno,
conservar o salário real dos trabalhadores e uma reforma agrária de longo prazo, prospectando
a modernização dos produtos da agricultura (MAZZEO, 1988). Em meio à crise política, o
salário-mínimo é aumentado em 100%, o que fez do governo de João Goulart uma república
sindicalista na visão do meio empresarial e de importantes segmentos das forças armadas, que
já haviam postado seu descontentamento (DEL PRIORE; VENANCIO, 2010).
No âmbito educacional, realizou-se o simpósio sobre a reforma da educação e o Fórum
“A educação que nos convém”. Esses eventos foram organizados pelo Instituto de Pesquisas e
Estudos Sociais (IPES), criado por um grupo de empresários do Rio de Janeiro e de São Paulo,
articulado com empresários multinacionais e com a Escola Superior de Guerra (ESG). Seu
objetivo eram ações ideológica, social e político-militar, no sentido de desagregar as
organizações que assumiam a defesa dos interesses populares (SAVIANI, 2013). O objetivo do
simpósio foi “discutir as linhas mestras de uma política educacional que viabilizasse o rápido
desenvolvimento econômico e social do país” (SAVIANI, 2013, p. 343), a partir da elaboração
de um “documento básico” e do texto de João Roberto Moreira “Delineamento geral de um
plano de educação para a democracia do Brasil” (SAVIANI, 2013).
O conteúdo do “documento básico” estava orientado para o desenvolvimento econômico,
com enfoque nos novos estudos da economia da educação, em que os investimentos no ensino se
voltariam para garantir o aumento da produtividade e da renda (SAVIANI, 2013). No texto
levantava-se a possibilidade para as três bases da educação: de que a escola primária, o ensino
médio e o ensino superior ajustariam seus objetivos em capacitar para realizar atividade prática,
preparar profissionais necessários ao desenvolvimento econômico e social, a partir da análise da
demanda efetiva de mão de obra qualificada e formar mão de obra especializada de acordo com
as necessidades das empresas, além de preparar os quadros dirigentes do país (SAVIANI, 2013).
Segundo Saviani (2013, p. 343),
A orientação geral traduzida nos objetivos indicados e a referência a aspectos
específicos como a profissionalização do nível médio, a integração dos cursos
superiores de formação tecnológica com as empresas e a precedência do Ministério
do Planejamento sobre o da Educação na planificação educacional são elementos que
integrarão as reformas de ensino do governo militar.
58
Dos 11 temas tratados no Fórum “A educação que nos convém”, dois abrangem
educação e trabalho com ênfase no ensino superior: os temas: VII – “Universidade tecnologia
e empresa”, cujo conferencista foi o ministro Lucas Lopes, e o tema X – “Vinculação da
universidade e da empresa” conferido pelo professor Theophilo de Azeredo Santos. Em âmbito
geral, o conteúdo das conferências suscita um conjunto de sugestões para o encaminhamento
da política educacional do país, foca elementos da teoria do capital humano; a educação como
formadora de recursos humanos para o desenvolvimento econômico; ao primeiro grau de
ensino, sugere a sondagem de aptidões e iniciação para o trabalho; a formação de mão de obra
técnica, no ensino médio, de acordo com o mercado de trabalho; introdução de novos cursos e
com curta duração, no ensino superior, para atendimento aos profissionais qualificados;
introdução das novas tecnologias e meios de comunicação de massa como recursos
pedagógicos; proposta de programa de alfabetização centrado nas ações das comunidades
locais. Logo são instituídas reformas educativas pela lei da reforma universitária, a lei
relacionada ao ensino de 1º e 2º graus e a criação do Movimento Brasileiro de Alfabetização
(Mobral), oriundas da concepção pedagógica articulada pelo IPES (SAVIANI, 2013).
O Golpe Militar de 1964 vem munido de planejamento próprio para o desenvolvimento
do país apoiado pela maioria dos empresários brasileiros, expressando o direcionamento
político e econômico pretendido pela burguesia, confirmando sua tendência reacionária (DEL
PRIORE; VENANCIO, 2010; MAZZEO, 1988). O projeto “consiste em retomar o modelo
implantado em fins da década de 1950, aquele definido como tripé, baseado na associação entre
empresas nacionais, privadas e estatais.” (DEL PRIORE; VENANCIO, 2010, p. 278).
Implementaram várias de suas propostas como a diminuição do valor real dos salários e a
abertura da economia aos investimentos estrangeiros, concedendo abertura de crédito para
empresas estrangeiras e suprimindo para as pequenas e médias empresas nacionais, levando
muitas ao processo de falência (DEL PRIORE; VENANCIO, 2010; MAZZEO, 1988).
Segundo Mazzeo (1988), o processo de alargamento do desenvolvimento econômico se
dá em duas etapas: de 1964 a 1968, em que o foco é conter o processo inflacionário, através de
esquemas que proporcionaram o alargamento de prazos. Houve o congelamento de créditos e
alguns preços ficaram fixos. A segunda etapa inicia em 1968 e vai até 1975, período de maior
violência do período militar e maior repressão política da história do país, mas também de
aceleração do crescimento econômico: o momento do “milagre econômico brasileiro”
(MAZZEO, 1988; DEL PRIORE; VENANCIO, 2010; SAVIANI, 2013). A economia é dirigida
pelo capital financeiro internacional, e esse ritmo de desenvolvimento tem como consequência
59
a alteração da composição social no país. Surge uma classe média beneficiada pela política do
“milagre”; sofisticada, “consumidora das mercadorias produzidas por um imenso parque
industrial, voltado à produção de bens de consumo, como automóveis de luxo, cigarros de
padrão internacional, vários modelos de geladeiras e eletroeletrônicos.” (MAZZEO, 1988). Em
contrapartida, havia limitações e/ou inexistência de bens de consumo populares. De acordo com
Mazzeo (1988, p. 50):
O modelo econômico era direcionado apenas a 20% da população. Cerca de 30% tinha
acesso aos bens de consumo de forma parcial, isto é, podiam comprar uma pequena
parte do que era produzido. O restante da população do país, 50%, estava
simplesmente à margem da estrutura econômica do “milagre”. Em realidade, o
privilégio dos monopólios internacionais ocasionava uma progressiva pauperização
das massas trabalhadoras.
Em 1970, os militares empenham-se na legitimação do novo regime. Lançada a
campanha “Brasil, grande potência” pelo presidente, o general Emílio Garrastazu Médici, e a
abertura da Transamazônica (DEL PRIORE; VENANCIO, 2010). Em 1974, a economia
brasileira retorna em crise, em razão das consequências mundiais – crise do capitalismo
internacional – o aumento do custo do petróleo, crise fiscal do Estado e da política de
endividamento externo (DEL PRIORE; VENANCIO, 2010; SHIROMA; MORAES;
EVANGELISTA, 2007). Ao longo de 1978 e 1979, consolida-se o processo de abertura
política, revoga-se o AI-517, suspendendo a censura e decretada a anistia aos presos políticos.
Foi longo o período que se seguiu ao AI-5, chamado “anos de chumbo”, marcado por prisões
arbitrárias, torturas e deportações de cidadãos críticos ao regime autoritário (GIAMBIAGI et
al., 2011). Esse contexto favoreceu a política inflacionária do governo, no controle de preços e
contenção dos salários, bem como mudanças na condução das políticas sociais.
Quanto às questões sociais, o Estado passou a tratá-las como questões políticas,
direcionando-se para o desenvolvimento de programas e ações nas áreas mais pobres do país
como: áreas rurais, periferias urbanas e os estados do nordeste (SHIROMA; MORAES;
EVANGELISTA, 2007). Inúmeros projetos foram então implantados, tais como: Pólo
Nordeste, Programa de Extensão e Melhoria para o Meio Rural (Edurural), Programas de Ações
Socioeducativas e Culturais para as Populações Carentes do Meio Urbano/ e do Meio Rural
(Prodasec/Pronasec), Programa de Educação Pré-Escolar (SHIROMA; MORAES;
EVANGELISTA, 2007). Assim, a educação inseria-se em menor escala no projeto
17 AI-5 – Ato Institucional n. 5, de 13 de dezembro de 1968. Suspendeu as garantias constitucionais, fechou o
Congresso por tempo indeterminado e cassou mandatos de políticos opositores ao regime (GIAMBIAGI et al.,
2011).
60
desenvolvimentista e tecnocrático passando a “instrumento para atenuar, em curto prazo, a
situação de desigualdade regional e de pobreza gerada pela cruel concentração de renda
decorrente do modelo econômico.” (SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA, 2007, p. 36).
A mobilização do campo educacional, ao final dos anos 1970, aparece a partir do
surgimento da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd)
(1977), do Centro de Estudos Educação e Sociedade (Cedes) (1978) e da Associação Nacional
de Educação (Ande) (1979), cujo objetivo era congregar educadores independente de sua
vinculação profissional; da filiação das entidades de professores das escolas públicas de 1º e 2º
graus à Confederação de Professores do Brasil (CPB) (SAVIANI, 2013).
A organização dos educadores na referida década pode, então, ser caracterizada por
meio de dois vetores distintos: aquele caracterizado pela preocupação com o
significado social e político da educação, do qual decorre a busca de uma escola
pública de qualidade, aberta a toda a população e voltada precipuamente para as necessidades da maioria, isto é, a classe trabalhadora; e outro marcado pela
preocupação com o aspecto econômico-corporativo, portanto, de caráter
reivindicativo, cuja expressão mais saliente é dada pelo fenômeno das greves [...]
(SAVIANI, 2013, p. 404).
Em meio a essas mudanças sociais, surge uma classe trabalhadora mais moderna;
proletariado urbano especializado para as cidades. Para o campo, o “camponês” passa a “boia
fria” que, segundo Mazzeo (1988, p. 50), “é a expressão do proletariado rural, fruto da
modernização das relações de produção capitalistas no campo.”
Nesse período de Regime Militar (1964-1985), o capitalismo da época reforça o “[...]
vínculo estrito entre educação e mercado de trabalho, se estabelece a integração da política
educacional aos planos gerais de desenvolvimento e segurança nacional, defesa do Estado,
repressão e controle político-ideológico da vida intelectual e artística do país.” (SHIROMA;
MORAES; EVANGELISTA, 2007, p. 29). De acordo com Saviani (2013, p. 364), “foram
alteradas as bases organizacionais, tendo em vista ajustar a educação aos reclamos postos pelo
modelo econômico do capitalismo de mercado associado dependente, articulado com a doutrina
da interdependência.”
As reformas de ensino empreendidas pelo regime militar apoiaram-se nas reformas do
ensino superior e do ensino de 1o e 2o graus partindo das recomendações de agências
internacionais e relatórios vinculados ao governo norte-americano e ao Ministério da Educação
nacional, através de contratos de cooperação (SAVIANI, 2013). Segundo Shiroma, Moraes e
Evangelista (2007, p. 28) “tratava-se de incorporar compromissos assumidos pelo governo
brasileiro na Carta de Punta del Leste (1961) e no Plano Decenal de Educação da Aliança para
61
o Progresso – sobretudo os derivados dos acordos entre MEC e a AID (Agency for International
Development), [...] Acordos MEC-USAID.”
O novo regime trouxe a educação para a formação de “capital humano” objetivando a
vinculação entre educação e mercado de trabalho, estímulo à aquisição de bens de consumo,
integração da política educacional aos planos gerais de desenvolvimento e segurança nacional
– perspectiva economicista em relação à educação (SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA,
2007), visando assegurar a estrutura do conhecimento do homem-profissional.
No regime militar, atribuiu-se abertura para o capital multinacional e também
estabeleceu uma estrita relação entre educação, trabalho e desenvolvimento baseada na teoria
do capital humano. O conceito de capital humano surgiu na década de 1950, nos Estados
Unidos, com Theodore W. Schutz, economista e, na época, professor da Universidade de
Chicago. Esse autor considera que a qualificação do homem por meios educacionais promove
o aumento da produtividade no trabalho e, em consequência, o lucro do capital
(SBARDELOTTO, 2013). A teoria do capital humano adquire “força impositiva ao ser
incorporada à legislação na forma dos princípios da racionalidade, da eficiência e
produtividade, com os corolários do ‘máximo resultado com mínimo de dispêndio’ e ‘não
duplicação de meios para fins idênticos’” (SAVIANI, 2013, p. 365).
Assim como as bases educacionais no Brasil estavam de acordo com as americanas,
também o modelo organizacional era importado. O estreitamento dos laços do Brasil com os
Estados Unidos deu-se a partir do reforço da presença de empresas internacionais, adotando-se
o modelo econômico associado-dependente. Logo, as ideias relacionadas à organização
racional do trabalho (taylorismo, fordismo) foram difundidas, assim como o enfoque sistêmico
e o controle do comportamento (behaviorismo). Estas configuram, no campo educacional, à
pedagogia tecnicista: havia a necessidade de demanda de preparação de mão de obra para essas
empresas com foco na elevação geral da produtividade (SAVIANI, 2013).
A Lei n. 5.692/71 trata no artigo 1º sobre “o ensino de 1º e 2º graus tem por objetivo
geral proporcionar ao educando a formação necessária ao desenvolvimento de suas
potencialidades como elemento de auto-realização, qualificação para o trabalho e preparo para
o exercício consciente da cidadania.” (BRASIL, 1971). Essa política educacional estendeu-se a
todas as escolas do país, por meio da pedagogia tecnicista de tendência produtivista (SAVIANI,
2013). Aponta dois importantes objetivos segundo Shiroma, Moraes e Evangelista (2007, p.
31):
62
O primeiro era o de assegurar a ampliação da oferta do ensino fundamental para
garantir a formação e qualificação mínimas à inserção de amplos setores das classes
trabalhadoras em um processo produtivo ainda pouco exigente. O segundo, o de criar
as condições para uma formação de uma mão-de-obra qualificada para os escalões
mais altos da administração pública e da indústria que viesse a favorecer o processo
de importação tecnológica e de modernização que se pretendia para o país.
A concepção pedagógica tecnicista sustenta a reordenação do processo educativo
tornando-o objetivo e operacional (SAVIANI, 2013). Assim ocorre no processo de fabricação
de produto, o inverso do processo artesanal, é o trabalhador quem se adapta ao processo de
trabalho, e não os instrumentos de trabalho que se dispõem em função do trabalhador
(SAVIANI, 2013). Logo, “o trabalhador ocupa seu posto na linha de montagem e executa
determinada parcela do trabalho necessário para produzir determinados objetos.” (SAVIANI,
2013, p. 381). O produto é resultado da organização do processo, e os resultados produzidos
são consequências das ações de diferentes sujeitos, sendo estes estranhos ao resultado. A partir
dessa perspectiva, buscou-se planejar uma educação dotada de doses organizacionais racionais,
mecanizando o processo e objetivando minimizar interferências subjetivas capazes de pôr em
risco a eficiência (SAVIANI, 2013).
A política educacional do regime militar está apoiada nas leis de reforma do ensino
superior e do 1º e 2º graus. A Lei n. 5.540/68, a qual descreve no artigo 1º que “o ensino superior
tem por objetivo a pesquisa, o desenvolvimento das ciências, letras e artes e a formação de
profissionais de nível universitário.” (BRASIL, 1968).
Segundo Saviani (2013, p. 373), “a incorporação das ideias pedagógicas tecnicistas na
organização do sistema de ensino foi empreendida pelas iniciativas de reforma que começaram
com o ensino superior a partir de estudos desenvolvidos no âmbito do então Conselho Federal
de Educação (CFE)”, baixado o Decreto-Lei n. 53, de 18 de novembro de 1966, completado
pelo Decreto-Lei n. 252, de 28 de fevereiro de 1967 (SAVIANI, 2013). Ambos os decretos
tratam da “reestruturação das universidades brasileiras” focados na pesquisa e formação
profissional. A reforma universitária é tratada na Lei n. 5.540, promulgada em 28 de novembro
de 1968, esta instituiu-se a partir de projeto elaborado por um Grupo de Trabalho (GT) criado
pelo governo por decreto de 2 de julho de 1968, em meio à crise estudantil tendo as principais
universidades tomadas pelos alunos (SAVIANI, 2013).
Segundo Saviani (2013, p. 374),
[...] o projeto de reforma universitária precisava responder a duas demandas
contraditórias: de um lado, a demanda dos jovens estudantes ou postulantes a estudantes universitários e dos professores que reivindicavam a abolição da cátedra,
a autonomia universitária, mais verbas para desenvolver pesquisas e mais vagas para
63
ampliar o raio de ação da universidade; de outro lado, a demanda dos grupos ligados
ao regime instalado com o golpe militar de 1964 que buscavam vincular mais
fortemente o ensino superior aos mecanismos de mercado e ao projeto político de
modernização em consonância com os requerimentos do capitalismo internacional.
Dos anos 1970 para os anos de 1980, a tendência produtivista esteve na mira de críticas,
porém a Lei 5.692/1971 continua como foco/referência para a política educacional (SAVIANI,
2013).
Aos anos de 1980 foi atribuído, pelos economistas, o caráter de “década perdida”
(SHIROMA; MORAES; EVANGELIISTA, 2007; SAVIANI, 2013). Nesse período, 60% da
população brasileira viviam abaixo da linha de pobreza. O quadro educacional era dramático,
com percentual alto em reprovação ou exclusão ao longo da 1ª série do 1º grau; o analfabetismo,
professores leigos e crianças fora da escola somavam alto índice, além de crianças fora da faixa
etária no 1º grau (SHIROMA; MORAES; EVANGELIISTA, 2007).
O regime militar finda em 1985, dando início à “Nova República”. Esse novo período
tem como principais atributos, segundo Shiroma, Moraes e Evangelista (2007), a ambiguidade
e a incoerência; a conciliação conservadora focando a transição para a democracia através do
esquema de alianças na condução do processo político; o conservantismo civilizado e a
democracia. Cresce o desequilíbrio financeiro do setor público e da dívida externa e como
iniciativa o governo Sarney implementa, em 1986, o Plano Cruzado e o “choque heterodoxo”,
ambos com curto sucesso (SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA, 2007). Lança mais dois
planos econômicos: Plano Bresser (1987) e Plano Verão (1989), “embora frustrantes do ponto
de vista do combate à inflação, esses planos colaboraram para que se verificassem momentos
de rápido crescimento.” (GIAMBIAGI et al., 2011, p. 97).
A comunidade educacional, com perspectivas e contribuições aprovadas na IV CBE18 em
1986 com o tema: A educação e a Constituinte, marcou presença no capítulo sobre Educação da
nova Constituição, cujas conclusões foram incorporadas quase na íntegra aos debates da época
(SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA, 2007; SAVIANI, 2013). Promulgada em 1988, a
Constituição Cidadã constitui-se em marco fundamental de mudanças na educação brasileira
(SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA, 2007), respeitando a “direção indicada pelo consenso
produzido entre os educadores a partir de meados de 1970 e que encontrara nos anos 1980 as
condições para florescer.” (SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA, 2007, p. 42).
18 Conferência Brasileira de Educação (CBE, instituída pelas entidades: Associação Nacional de Educação (Ande),
Centro de Estudos, Educação e Sociedade (Cedes) e Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em
Educação (ANPEd). A primeira CBE foi no ano de 1980, seguida de outras cinco, ocorridas nos anos de 1982,
1984, 1986, 1988 e 1991.
64
A Constituição Federal estabelece em seu artigo 205: “A educação, direito de todos e
dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade,
visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho.” (BRASIL, 1988). A Carta Magna prevê o Plano Nacional de
Educação com o objetivo de articular o sistema nacional de educação definindo diretrizes,
objetivos, metas e estratégias que assegurem a manutenção e o desenvolvimento do ensino
conduzindo a: erradicação do analfabetismo; universalização do atendimento escolar; melhoria
na qualidade do ensino; formação para o trabalho; promoção humanística, científica e
tecnológica do país; estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em educação
como proporção do produto interno bruto (BRASIL, 1988).
A década de 1980 é marcada por um conjunto de fatores que contribuíram para a emersão
de propostas pedagógicas contra-hegemônicas. Surgiram “tentativas de elaborar propostas
suscetíveis de orientar a prática educativa numa direção transformadora.” (SAVIANI, 2013, p. 415).
De acordo com Saviani (2013), essas propostas se agrupam em duas modalidades: a educação
autônoma, centrada no saber do povo e na autonomia de suas organizações, a concepção libertadora
de Paulo Freire e outra focando o conhecimento sistematizado valorizado pelo acesso das camadas
populares, porém pautada pela centralidade da educação escolar.
Duas tentativas de propostas surgem na modalidade de educação autônoma: a)
pedagogias da “educação popular”: educação do povo e pelo povo, para o povo e com o povo
contrapondo à caracterizada como da elite e pela elite, para o povo, contra o povo (SAVIANI,
2013); b) pedagogias da prática: trabalha com o conceito de classe, sendo o saber gerado na
prática social, o qual era repelido pela escola, porém este é o saber que constitui a matéria-
prima do processo de ensino (SAVIANI, 2013).
Nas pedagogias da prática, encontra-se a proposta formulada por José Carlos Libâneo:
a) a pedagogia crítico-social dos conteúdos sustenta a primazia dos conteúdos, em que é papel
primordial da escola difundir conteúdos vivos, concretos, indissociáveis das realidades sociais,
uma vez que os conteúdos do ensino são os culturais universais, revalidados com as realidades
sociais em que vivem os alunos (SAVIANI, 2013). Isso permite “estabelecer a relação
conteúdos-realidades sociais [...] como forma de colocar a educação a serviço da transformação
social” (SAVIANI, 2013, p. 420); b) pedagogia histórico-crítica: tem sua base psicológica e a
psicologia histórico-cultural de Vygotsky. Para essa pedagogia, “a educação é entendida como
o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é
produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens” (SAVIANI, 2013, p. 422), ou
seja, parte-se da prática social para chegar à prática educativa.
65
No início dos anos 1990, surge o “planeta geofinanceiro” da mundialização (DEL
PRIORE; VENANCIO, 2010, p. 293): empresas multinacionais, concentração de múltiplas
operações, fusões, aquisições nos setores da comunicação, bancos, automotivo e da eletrônica.
Segundo Del Priore e Venâncio (2010, p. 294), “a mundialização transforma a economia global
em outros aspectos, também abre os ex-países comunistas para o capitalismo, acelera o
crescimento do comércio mundial, faz desabrochar os mercados emergentes.” A mundialização
da economia traz um redirecionamento no comportamento econômico, político e social do país.
Nesse contexto, a formação dos trabalhadores sofrerá profundas transformações, das quais
apresentarei alguns indícios na sequência.
3.3 TRABALHO E POLÍTICAS PARA FORMAÇÃO DO TRABALHADOR
Historicamente, a globalização decorre de longa data19; contemporaneamente é
confundida com a mundialização do capitalismo (MELO, 2013). Desde a metade do século XX,
países dos continentes europeu e americano atuam na abertura e internacionalização da
comercialização de produtos, embarcada na política neoliberal. O neoliberalismo20 passa a
“orientar as decisões governamentais em grande parte do mundo capitalista, o que inclui desde
as nações do Primeiro e do Terceiro Mundo até algumas das mais convulsionadas sociedades
da Europa Oriental.” (GENTILI, 1996). Segundo Gentili (1996, p.10):
Os governos neoliberais não só transformam materialmente a realidade econômica,
política, jurídica e social, também conseguem que esta transformação seja aceita como
a única saída possível (ainda que, às vezes, dolorosa) para a crise. Desde muito cedo,
os intelectuais neoliberais reconheceram que a construção desse novo senso comum
(ou, em certo sentido, desse novo imaginário social) era um dos desafios prioritários
para garantir o êxito na construção de uma ordem social regulada pelos princípios do
livre-mercado e sem a interferência sempre perniciosa da intervenção estatal. Não se
tratava só de elaborar receitas academicamente coerentes e rigorosas, mas, acima de
tudo, de conseguir que tais fórmulas fossem aceitas, reconhecidas e válidas pela sociedade como a solução natural para antigos problemas estruturais.
19 A globalização ocorre desde “a era das grandes navegações, dos séculos XV ao XVI, interligando o Velho, o
Novo e o Novíssimo Mundo, tornaram a lógica mercantil da época na primeira fase da globalização: as nações
europeias como metrópoles e as colônias mercados fornecedores-consumidores.” (MELO, 2013). 20 “Conjunto de ideias políticas e econômicas capitalistas que defende a mínima participação do estado na
economia. De acordo com esta doutrina, deve haver total liberdade de comércio (livre mercado), pois este
princípio garante o crescimento econômico e o desenvolvimento social de um país. Surgiu na década de 1970,
através da Escola Monetarista do economista Milton Friedman, como uma solução para a crise que atingiu a
economia mundial em 1973, provocada pelo aumento excessivo no preço do petróleo.” (NEOLIBERALISMO,
2004).
66
Em termos econômico-políticos, a necessidade de reorganização para retomada do
crescimento econômico remete ao Consenso de Washington21, cujo objetivo foi a discussão de
reformas consideradas necessárias para países da América Latina (SAVIANI, 2013). Os
resultados da reunião foram resumidos por Williamson em dez pontos (GIAMBIAGI;
ALMEIDA, 2003, p. 9):
1) disciplina fiscal; 2) reorientação dos gastos públicos; 3) reforma tributária; 4)
liberalização financeira; 5) taxas de câmbio unificadas; 6) taxas de câmbio
competitivas; 7) liberalização do comércio; 8) abertura para o financiamento externo
direto; 9) privatização; 10) desregulamentação.
Os rumos tomados pela política mundial seguem os princípios do neoliberalismo e se
consolidam no Consenso de Washington. “Esse novo pensamento hegemônico convergia em
um denominador comum: ‘o ataque ao estado regulador e a defesa do retorno ao estado liberal
idealizado pelos clássicos’” (FIORI, 1998 apud SAVIANI, 2013, p. 428). Tais políticas, em
primeiro momento impostas pelas agências internacionais de financiamento, são assumidas
pelas elites econômicas e políticas dos países da América Latina perdendo o caráter de
imposição (SAVIANI, 2013).
No Brasil, os anos 1990 inauguram com a presidência de Fernando Collor de Mello,
eleito pelo voto direto e pelos meios de comunicação de massa “numa operação de autêntico
marketing eleitoral (GIAMBIAGI et al., 2011). Sua estada no governo foi curta, encerrando em
1992 por renúncia em razão do processo de impeachment, ocorrido por questões de crise
econômica, comportamentos hostis ao Congresso e ampliação da corrupção (DEL PRIORE;
VENANCIO, 2010). Em seu lugar assumiu a Presidência o vice-presidente Itamar Franco.
Segundo Giambiagi et al. (2011, p. 135):
Enquanto o país se debatia em tentativas de combate à inflação, a indústria deixava
de acompanhar os avanços tecnológicos e organizacionais em rápida propagação nas
economias desenvolvidas. A retração do investimento prejudicaria particularmente a
indústria de bens de capital.
As reformas propostas nessa primeira metade dos anos de 1990 levaram à “ruptura com
modelo brasileiro de crescimento com elevada participação do Estado e proteção tarifária.”
21 Conjunto de políticas para serem adotadas pelos países da América Latina, formulado por economistas de
instituições financeiras como FMI, Banco Mundial e o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos em
Washington D.C., em novembro de 1989. Descrito pelo economista John Williamson do International Institute
for Economy, tornou-se a política oficial do Fundo Monetário Internacional em 1990. O objetivo era promover
o “ajustamento macroeconômico” dos países em desenvolvimento que passavam por dificuldades
(GIAMBIAGI; ALMEIDA, 2003).
67
(GIAMBIAGI et al., 2011, p. 132). O período de 1990 a 1994 registrou o processo de
privatização e de abertura econômica inseridos no contexto da nova Política Industrial e de
Comércio Exterior (Pice) para o incentivo à competição e à competitividade (GIAMBIAGI et
al., 2011). Observa-se, entretanto, que “a recuperação do atraso industrial era vista pelo governo
não apenas como uma prioridade per se, mas também como uma condição necessária para se
obter a estabilidade duradoura dos preços.” (GIAMBIAGI et al., 2011, p. 136). Como resultados
da Pice, tem-se a competição sobressaindo a competitividade, o que se justifica, no âmbito
interno, pela legitimidade das urnas, o contexto internacional pró-reformas, a insatisfação do
público quanto aos serviços prestados por algumas estatais e a própria crise do estado; o
governo enfatizaria uma estratégia maior de privatização, “sob a crença de que haveria aumento
da competição e, assim, aumento da eficiência” (GIAMBIAGI et al., 2011, p. 136): no âmbito
externo, a reforma tarifária e de comércio exterior.
Entre os anos de 1990 e 1994, priorizou-se o Plano Nacional de Desestatização (PND)
com a privatização de 33 empresas federais, sendo petroquímica, fertilizantes e siderurgia os
principais setores (GIAMBIAGI et al., 2011). Os objetivos do PND eram: “1) contribuir para o
redesenho do parque industrial; 2) consolidar a estabilidade; 3) reduzir a dívida pública (via
aceitação de títulos como moeda de privatização).” (GIAMBIAGI et al., 2011, p. 137). Além
do PND, a política de comércio exterior marcou forte presença nesse governo, com a adoção
do câmbio livre e a intensificação do programa de liberalização de importações, substituindo o
controle quantitativo das importações pelo controle tarifário (GIAMBIAGI et al., 2011).
Politicamente foi um período conturbado em consequência de renúncia do presidente e
fracasso dos dois planos econômicos que tentaram estabilizar preços. Segundo Giambiagi
(2011, p. 159), o “Plano Collor I possuía um grave erro de concepção, enquanto o Collor II foi
pouco representativo, tendo sido atropelado pelos próprios acontecimentos políticos.” O
objetivo da estabilização vai acontecer por meio do Plano Real (GIAMBIAGI et al., 2011).
O Plano Real foi originalmente concebido como um programa em três fases: a
primeira tinha como função promover um ajuste fiscal que levasse ao
“estabelecimento do equilíbrio das contas do governo, com o objetivo de eliminar a principal causa da inflação brasileira”; a segunda fase visava “a criação de um padrão
estável de valor denominado Unidade Real de Valor — URV”; finalmente, a terceira
concedia poder liberatório à unidade de conta e estabelecia “as regras de emissão e
lastreamento da nova moeda (real) de forma a garantir a sua estabilidade.”
(GIAMBIAGI et al., 2011, p. 142).
Os anos de 1990 são reconhecidos por historiadores como a “década de
transformações”, por ter sido uma época de transição (GIAMBIAGI et al., 2011) tanto
68
internamente, principalmente nas questões políticas, quanto externamente, em razão de toda a
movimentação da mundialização da economia e, consequentemente, do mundo do trabalho. De
acordo com Giambiagi et al. (2011), internamente essas transformações se dividem em três
etapas: 1) de 1991 a 1994, o binômio privatização/abertura da economia para o capital
internacional insere um choque de competição representando mudança no modelo econômico
vigente, obrigando a modernização do setor privado; 2) de 1995 a 1998, ocorre mudança de
comportamento do setor privado em virtude da estabilização associada ao Plano Real,
possibilitando a comparação de preços pelo consumidor, obrigando a disputa pelas empresas
que intensificou os benefícios da competição com a introdução dos produtos importados; 3) de
1999 a 2002, há a mudança de regime – cambial, monetário e fiscal. Esses três elementos
atuaram na defesa dos principais desequilíbrios macroeconômicos integralmente, havendo
melhora na balança comercial e baixa significativa na inflação. Como resultados, esse trio de
mudanças trouxe modernidade na economia, competitividade em relação ao início dos anos
1990 e um conjunto de políticas macroeconômicas adequadas. Porém, não levaram ao
crescimento econômico (DEL PRIORE; VENANCIO, 2010).
Os anos de 1994 a 2002 seguem com a bandeira focada no Plano Real. As medidas
econômicas implantadas nesse período são voltadas à internacionalização da economia,
privatização de empresas estatais, desregulamentação de mercados e controle de gastos
públicos (DEL PRIORE; VENANCIO, 2010). São liberados incentivos para atrair
investimentos de capital estrangeiro; em contrapartida, para manter a estabilidade econômica,
tem-se o retorno do endividamento externo e do crescimento do desemprego (DEL PRIORE;
VENÂNCIO, 2010). Em 2001, a economia foi atingida pela crise de energia, o “contágio”
argentino, que diminuiu a entrada de capitais, e os atentados terroristas de 11 de setembro, que
abalaram fortemente os mercados mundiais (GIAMBIAGI et al., 2011).
O mercado de trabalho de 1995 a 2002 vem embalado pelas mudanças no plano
econômico e, paralelo a elas, segue uma série de crises financeiras em outros países em
desenvolvimento que afetam o fluxo de capitais (RAMOS; BRITTO, 2004). A taxa de
desemprego varia constantemente durante o período, tendo atingido nível baixo pós-Plano Real
e altíssimo nível no início de 1998 e ao longo de 1999, retornando a baixar o índice no ano de
2000 (RAMOS; BRITTO, 2004). Os postos de trabalho formais e os informais tiveram
crescimento lento de 1991 ao primeiro semestre de 1994, com acentuado aumento do final de
1994 ao final de 1996; de 1997 a meados de 1999, ficou estagnado, volta o crescimento, com
grande geração líquida de meados de 1999 ao final de 2000, estagnando novamente em 2001,
seguido de crescimento em 2002 (RAMOS; BRITTO, 2004). Os anos 2000, 2001 e 2002
69
mostraram alto índice de crescimento de vagas de empregos. Esse crescimento se deu devido à
expansão no setor de serviços e o crescimento demográfico da população em idade ativa
(PIA)22. Contudo, há de se considerar o crescimento das relações informais de trabalho nesses
últimos doze anos (o trabalho assalariado sem carteira e trabalho por conta própria) (RAMOS;
BRITTO, 2004).
O período dos governos Collor até Fernando Henrique é caracterizado por um processo
de abertura comercial, cujo objetivo é acompanhar a globalização dos mercados. Essa nova
ordem mundial é baseada no “Novo Regionalismo”, cuja característica é a integração de países
mediante acordos das zonas de livre comércio, uniões aduaneiras e mercados comuns
(AVERBUG, 1999). O Brasil envolveu-se com o Mercado Comum do Cone Sul (Mercosul)23,
pela necessidade de integrar com os mercados da Argentina, Uruguai, Paraguai e com a Área
de Livre Comércio das Américas (Alca), que inclui 34 países do hemisfério exceto Cuba.
O neoliberalismo e a mundialização vão impactar profundamente a formação do
trabalhador. A competitividade para o emprego passa com ênfase a focalizar competências; a
busca de qualificação pelo próprio indivíduo; a conquista do status de empregabilidade para o
acesso ao emprego. A escola não mais assegura a preparação da mão de obra na ocupação de
postos de trabalho definidos por um mercado direcionado ao pleno emprego (SAVIANI, 2013).
O indivíduo deve buscar estar competitivo para o mercado de trabalho. Segundo Saviani (2013,
p. 430),
a educação passa a ser entendida como um investimento em capital humano individual
que habilita as pessoas para a competição pelos empregos disponíveis. O acesso a
diferentes graus de escolaridade amplia as condições de empregabilidade do indivíduo
o que, entretanto, não lhe garante emprego, pelo simples fato de que, na forma atual
do desenvolvimento capitalista, não há emprego para todos: a economia pode
conviver com altas taxas de desemprego e com grandes contingentes populacionais
excluídos do processo.
A teoria do capital humano retorna e é mantida hegemônica nos anos de 1990, alimenta
a busca de produtividade na educação assumindo a forma do neoprodutivismo24 (SAVIANI,
2013). Este, por sua vez, não abrange por completo a mão de obra disponível, considerando
22 População em Idade Ativa (PIA): classificação etária que compreende o conjunto de todas as pessoas aptas a
exercer uma atividade econômica. População Economicamente Ativa (PEA) compreende ao potencial de mão
de obra que o setor produtivo pode contar (RAMOS; BRITTO, 2004). 23 O processo de integração do Mercosul foi oficializado no ano 1991, através do Tratado de Assunção
(AVERBUG, 1999). 24 Saviani (2013) referencia a nova fase das ideias pedagógicas com movimentos precedentes, ordenando suas
categorias centrais como: neoprodutivismo, neoescolanovismo, neoconstrutivismo e neotecnicismo. Neste
estudo, essas categorias vêm embarcadas no processo de reestruturação da formação do trabalhador.
70
aqueles que atingem a idade para ingressar na População Economicamente Ativa (PEA), em
consequência aparece a categoria da exclusão. Segundo Saviani (2013), essa categoria aparece
por não haver lugar para todos em razão da automação no processo produtivo.
Nesse contexto, aumenta deliberadamente o número de trabalhadores excluídos do
processo de emprego, configurando a “pedagogia da exclusão”. Esta tem o objetivo de preparar
o indivíduo, mediante cursos de vários tipos, para aumentar sua empregabilidade tanto para
emprego formal quanto para microempresário, trabalho voluntário, terceirizado, autônomo e
outros (SAVIANI, 2013).
Essa nova lógica de busca de informação, de conhecimentos, de qualificação pauta o
“aprender a aprender”, que objetiva a atualização constante “exigida pela necessidade de ampliar a
esfera da empregabilidade.” (SAVIANI, 2013, p. 432). Não havendo mais segurança no emprego,
é necessário o investimento, pelo trabalhador, “no desenvolvimento do seu potencial de
adaptabilidade e de empregabilidade.” (FONSECA, 1998, p. 307 apud SAVIANI, 2013, p. 432).
Uma vez que o saber atual “não é sinônimo de sucesso no futuro”, é preciso a “capacidade de
adaptação e de aprender a aprender e a reaprender.” (SAVIANI, 2013, p. 432).
a adaptação à sociedade atual exige novos tipos de raciocínio, o desenvolvimento da
capacidade de comunicação e a recuperação de funções cognitivas deterioradas pelo
trabalho de tipo puramente mecânico, buscando atingir níveis flexíveis de operação
simbólica. Portanto, a adaptação à sociedade cognitiva “exige abandonar a segurança
do conhecido, do familiar e do habitual e voltar-se para uma aventura do inédito e do
imprevisível.” (FONSECA, 1998, p. 320 apud SAVIANI, 2013, p. 432).
Tais orientações são evidenciadas nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs)
propostos pelo MEC em 1997, visando alargar a esfera da educação com maiores exigências
para a escola. É o momento de “capacitar para adquirir novas competências e novos saberes.”
(SAVIANI, 2013, p. 433). Os PCNs fundamentam o princípio de que
a formação dos estudantes em termos de sua capacitação para a aquisição e o
desenvolvimento de novas competências, em função de novos saberes que se
produzem e demandam um novo tipo de profissional, preparado para poder lidar com
novas tecnologias e linguagens, capaz de responder a novos ritmos e processos. Essas
novas relações entre conhecimento e trabalho exigem capacidade de iniciativa e
inovação e, mais do que nunca, “aprender a aprender.” (BRASIL; SEF; MEC, 1997b,
p. 27).
Esse discurso neoconstrutivista valoriza conhecimentos centrados na experiência
cotidiana e compõe um elo com a “pedagogia das competências” (SAVIANI, 2013). Utiliza o
construtivismo como background, em que “as competências vão identificar-se com os próprios
71
esquemas adaptativos construídos pelos sujeitos, na interação com o ambiente, num processo
de equilibração e acomodação.” (SAVIANI, 2013, p. 437). Esses esquemas operam como
“mecanismos adaptativos do comportamento humano ao meio material e social.” (RAMOS,
2003 apud SAVIANI, 2013, p. 437). Portanto, a pedagogia das competências implica para o
sujeito flexível tomar a iniciativa e responsabilizar-se com êxito, tanto individual quanto
coletivamente, pelas condições sociais e/ou de trabalho e comportamentos flexíveis
(ZARIFIAN, 1999; SAVIANI, 2013).
Enquanto no tecnicismo o trabalhador se adaptava aos processos de trabalho, pautados
na eficiência e produtividade, no neotecnicismo, há o deslocamento de processos para
resultados, o foco é nos resultados. De acordo com Saviani (2013, p. 439), “é pela avaliação
dos resultados que se buscará garantir a eficiência e produtividade.” A presença do
neotecnicismo alimenta a orientação pela “qualidade total” apoiada na “reconversão produtiva
promovida pelo toyotismo” (SAVIANI, 2013, p. 439), isto é, a produção em pequena escala
direcionada para atender a uma demanda de mercado específica com alto padrão de exigências
(SAVIANI, 2013).
A formação do trabalhador na perspectiva neoliberal envolve a “capacidade flexível de
adaptação individual e polivalente às demandas do mercado de trabalho.” (GENTILI, 1996, p.
13). O trabalhador é responsável pelo seu desenvolvimento profissional, sua formação e sua
carreira, nas áreas técnica, social, cultural e comportamental (PEIXOTO, 2008).
As práticas educativas desenvolvidas e delineadas pelo neoescolanovismo alargam-se
por diferentes campos além da escola: desde organizações não governamentais, entidades
religiosas e sindicais, esportivas e ambientes empresariais (SAVIANI, 2013). O neotecnicismo
promove esse alargamento do espaço de aprendizagem e formação do trabalhador de
“pedagogia corporativa”, que se propaga no âmbito do ensino superior apoiado pela política
educacional (SAVIANI, 2013). Além da oferta das mais variadas modalidades de cursos em
diferentes tipos de instituições (públicas e privadas), verifica-se a diversificação nas chamadas
“universidades corporativas”, em grandes empresas que promovem a formação de profissionais
de suas equipes25 (SAVIANI, 2013).
O Ministério do Trabalho e Emprego (MTb) desenvolveu o Plano Nacional de Educação
Profissional (Planfor) implantado em 1996. O Plano teve como base orientações de organismos
25 Na próxima seção desta dissertação, abordarei os temas: educação empresarial e formação por competências.
72
internacionais (Banco Mundial, FMI26, BID27, CEPAL28, Unesco), para os quais a educação é
o start para o desenvolvimento econômico, cultural e social do país e, principalmente, para
ganhar competitividade internacional. A elaboração do Plano também considerou indicações
da Declaração Mundial sobre Educação para Todos (Conferência de Jomtien, 1990), cujo
Artigo 8 prevê: “Políticas de apoio nos setores social, cultural e econômico são necessárias à
concretização da plena provisão e utilização da educação básica para a promoção individual e
social.” (UNICEF, 1990, p. 6).
Segundo Peixoto (2008, p. 62),
os objetivos do Plano se estruturavam segundo a oferta de educação profissional em uma perspectiva continuada, de modo a contribuir para a redução do desemprego e do
subemprego da PEA, combater a pobreza e a desigualdade social, além de aumentar
a produtividade, a qualidade e a competitividade do setor produtivo.
O Planfor tem como objetivo a oferta de educação profissional permanente,
considerando demandas do mercado de trabalho, para qualificar ou requalificar, pelo menos
20% da PEA maior de 14 anos de idade (CODEFAT, 1998). O Plano visa contribuir para:
a) aumento da probabilidade de obtenção de trabalho e de geração ou elevação de
renda, reduzindo os níveis de desemprego e subemprego; b) aumento da probabilidade
de permanência no mercado de trabalho, reduzindo os riscos de demissão e as taxas
de rotatividade; c) elevação da produtividade, da competitividade e renda.
(CODEFAT, 1998).
Os fundamentos do Planfor para a educação profissional, segundo Peixoto (2008, p. 60),
“configurou-se na capacidade de aprendizagem contínua do trabalhador em incorporar os
princípios da polivalência e da multifuncionalidade, em conformidade com as atuais exigências
do processo produtivo e tecnológico.” Nesse sentido, as ações do Programa preveem como
estratégias a qualificação, requalificação e a formação continuada organizando de forma que
haja um distanciamento da preeminência de “treinamento” (PEIXOTO, 2008). No entanto,
outras pesquisas demonstram contradições em relação aos fundamentos do Planfor:
Levando em conta as novas exigências de qualificação e considerando, ainda, a
educação profissional como um instrumento para o desenvolvimento da cidadania de
uma força de trabalho que, no país, majoritariamente não possuía mais do que quatro
anos de escolaridade básica e tinha poucas chances de voltar à escola, o Planfor
propôs-se a desenvolver, pelas ações de qualificação, habilidades básicas, específicas
e de gestão. A melhoria de competências básicas e a elevação de escolaridade foram
26 Fundo Monetário Internacional (FMI). 27 Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). 28 Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (Cepal).
73
propostas por meio de treinamento de habilidades básicas em cursos de
qualificação stricto sensu e, ainda, de cursos de alfabetização e supletivos de ensinos
fundamental e médio no âmbito do Planfor. (BULHÕES, 2004, p. 42).
Para o desenvolvimento do Planfor, o governo federal orientou-se estrategicamente pela
conjunção de uma Rede de Educação Profissional articulada aos sistemas de ensino técnico
federal, estadual e municipal; as universidades públicas e privadas; o Senai, Sesi29, Senac, Sesc,
Senar30, Senat31, Sest32, Sebrae33; os sindicatos de trabalhadores; as escolas e fundações de
empresas; as organizações não governamentais e a rede de ensino profissional livre. Nesse
sentido, as políticas públicas voltadas para a formação do trabalhador passam por reformulação
incluindo a participação de diversos atores sociais, quando, até então, a atuação do MTb era
restrita a poucas ações no Sine34 (PEIXOTO, 2008).
No contexto do Planfor, foram lançados dois programas sociais: o Bolsa-Escola
associado ao Ministério da Educação, que visava garantir benefícios às famílias com crianças
na escola; Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti), vinculado à área de assistência
social.
Em relação à educação profissional, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDBEN), Lei n. 9.394 de 20 de dezembro de 1996, preconiza:
Art. 39. A educação profissional, integrada às diferentes formas de educação, ao
trabalho, à ciência e à tecnologia, conduz ao permanente desenvolvimento de aptidões
para a vida produtiva.
Parágrafo único. O aluno matriculado ou egresso do ensino fundamental, médio e
superior, bem como o trabalhador em geral, jovem ou adulto, contará com a
possibilidade de acesso à educação profissional. Art. 40. A educação profissional será desenvolvida em articulação com o ensino
regular ou por diferentes estratégias de educação continuada, em instituições
especializadas ou no ambiente de trabalho.
Art. 41. O conhecimento adquirido na educação profissional, inclusive no trabalho,
poderá ser objeto de avaliação, reconhecimento e certificação para prosseguimento ou
conclusão de estudos.
Parágrafo único. Os diplomas de cursos de educação profissional de nível médio,
quando registrados, terão validade nacional.
Art. 42. As escolas técnicas e profissionais, além dos seus cursos regulares,
oferecerão cursos especiais, abertos à comunidade, condicionada a matrícula à
capacidade de aproveitamento e não necessariamente ao nível de escolaridade
(BRASIL, 2005, p. 20).
29 Serviço Social da Indústria (Sesi). 30 Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar). 31 Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (Senat). 32 Serviços Social do Transporte (Sest). 33 Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). 34 Sistema Nacional de Emprego (Sine).
74
Nos termos do Decreto n. 2.208/97 (BRASIL, 1997a), o objetivo da educação
profissional é a qualificação, a reprofissionalização e atualização de trabalhadores, em qualquer
nível de escolaridade, para melhoria do desempenho na atuação profissional e inserção no
mercado de trabalho. Dispõe da preparação do trabalhador para enfrentar as demandas do
mundo do trabalho em compatibilidade com a complexidade tecnológica, o grau de
conhecimento técnico e nível de escolaridade (BRASIL, 1997a).
Segundo Saviani (2013), a década de 1990, no campo da educação, houve destaque para
os debates sobre “Estado e educação” e “trabalho e educação”. Na VI Conferência Brasileira
de Educação, realizada em 1991, cujo tema central foi “Política nacional de educação”, a
relação com o mundo do trabalho foi abordada em dois simpósios realizados no interior do
referido evento (SAVIANI, 2013).
Em um simpósio sobre o tema “Trabalho e educação”, foi abordada a qualificação dos
trabalhadores frente às mudanças nos processos produtivos geradas pela inserção da tecnologia.
Tratou-se da mudança no perfil do trabalhador para o modelo flexível de produção, tal perfil
constituído para a qualificação: conhecimento, experiência, autoridade e possibilidades
materiais (MACHADO, 1992). Isso porque “o saber do homem é o saber de um ser ativo,
consciente e objetivante, ou seja, não só concebe de forma abrangente (conhecendo as
alternativas existentes), mas realiza as soluções escolhidas, reconhecendo-se responsável por
elas.” (MACHADO, 1992, p. 10).
Em um segundo simpósio, analisou o impacto das novas tecnologias na reorganização
das formas do trabalho considerando um novo modelo de gestão em substituição ao paradigma
fordista. O modelo flexível, segundo Neves (1992, p. 26), abarca os novos padrões do trabalho
definindo trabalhadores polivalentes “chamados a realizar tarefas variadas e multi-qualificadas
e consequente desenvolvimento de um maior conhecimento e domínio sobre o conjunto do
processo produtivo.” Esse remodelamento da gestão busca responder aos desafios do mercado
mundial que exige maior competitividade, qualidade do produto e atendimento às demandas do
consumidor, a partir de processo produtivo flexível e integrado (NEVES, 1992).
No discurso das reformas educacionais dos anos 1990 a 2000, evidencia-se novo
desafio: “não basta apenas educar, é preciso aprender a empregar convenientemente os
conhecimentos adquiridos” (SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA, 2007, p. 11), o foco
está no desenvolvimento de capacidades de comunicação, raciocínio lógico-formal,
criatividade, articulação de conhecimentos múltiplos e diferençados de modo a capacitar o
educando ao enfrentamento de desafios, pois no âmbito do trabalho é a década dos modelos
neoliberais substituindo o fordismo pelo toyotismo. Sob essas novas condições, tornaram-se
75
centrais as requalificações dos profissionais, pois “deveriam ter um preparo polivalente apoiado
no domínio de conceitos gerais, abstratos, de modo especial aqueles de ordem matemática.”
(SAVIANI, 2013, p. 429). Adaptados os conceitos da teoria do capital humano para o
neoliberalismo, encontra-se enfaticamente a contribuição da educação para o processo
econômico-produtivo (SAVIANI, 2013).
Em 1º de janeiro de 2003, o país inicia uma nova fase de mudanças políticas, sociais e
econômicas. Assume a presidência Luiz Inácio Lula da Silva, compondo o governo com ex-
militantes de grupos guerrilheiros, ascendendo a geração revolucionária da década de 1960
(DEL PRIORE; VENANCIO, 2010). Até então, os últimos dois governos (de 1989 a 2002)
regeram políticas neoliberais: econômicas e sociais. No novo governo, desaparece a
“revolução” dando lugar a posturas reformistas, criando formas de proteger o sistema
econômico nacional, na tentativa de diminuir os impactos negativos da globalização (DEL
PRIORE; VENANCIO, 2010).
O governo recebe críticas em relação à sua política econômica, principalmente à política
de exportações, que em outras décadas foram alvo de condenação dos grupos de esquerda.
Entendia-se que “não teria sentido exportar alimentos enquanto, internamente, a população
pobre ‘passa fome’” (DEL PRIORE; VENANCIO, 2010, p. 295). Entre 2002 e 2005, exportam-
se, inicialmente, produtos minerais e agrícolas cujo aumento de produtividade se dá em função
do desenvolvimento tecnológico. Contrapondo-se ao passado, em que o aumento da produção
se dava através da área plantada, obtém-se “o melhoramento genético e o uso de gestões
empresariais avançadas no campo.” (DEL PRIORE; VENANCIO, 2010, p. 295). Assim, o
agronegócio abre caminhos para a progressiva industrialização dos produtos agrícolas, gerando
novos empregos rurais e urbanos (DEL PRIORE; VENANCIO, 2010).
Inicia uma nova realidade política de mercado para o Brasil, tanto interna quanto
externamente. Entre outros fatores, deve-se essa nova situação ao crescimento da economia
chinesa; a avidez das economias emergentes por produtos dos quais o Brasil se tornara um
grande produtor; exploração do etanol; descobertas do petróleo pré-sal (GIAMBIAGI et al.,
2011). Esses fatores fazem com que se dinamize ainda mais a economia brasileira aumentando
a exportação (diminui as exportações para os Estados Unidos e aumenta para os países
Asiáticos, principalmente China), reflexo das mudanças geopolíticas ocorridas que fazem do
Brasil um fornecedor-chave no mercado mundial (GIAMBIAGI et al., 2011).
O período de 2003 a 2010 foi marcado pela consolidação do processo de estabilização
econômica e por avanços sociais (GIAMBIAGI et al., 2011), por meio de um conjunto
diversificado de políticas públicas. Nesse contexto, em relação às políticas de educação
76
profissional, destacam-se as seguintes: modificação de diretrizes e bases da educação nacional
referente à educação profissional (BRASIL, 2004); Programa Universidade Para Todos
(Prouni) (BRASIL, 2005a); Programa de Integração da Educação Profissional ao Ensino Médio
na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos (Proeja) (BRASIL, 2005a); Projeto Escola de
Fábrica (BRASIL, 2005c); alterações para redimensionar, institucionalizar e integrar as ações
da educação profissional técnica de nível médio, da educação de jovens e adultos e da educação
profissional e tecnológica (BRASIL, 2008a); criação dos Institutos Federais de Educação,
Ciência e Tecnologia e institucionalização da Rede Federal de Educação Profissional e
Tecnológica (BRASIL, 2008b); Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem)
(BRASIL, 2008c); Plano Nacional de Qualificação Social e Profissional (PNQ) (BRASIL,
2011).
A modificação de diretrizes e bases da educação nacional referente à educação
profissional (BRASIL, 2004) se desenvolve no âmbito de cursos e programas de qualificação
profissional abrangendo a formação inicial e continuada de trabalhadores, a partir do
aperfeiçoamento, especialização e atualização, com o objetivo de desenvolver aptidões para a
vida produtiva e social; assim como na educação de nível médio técnico profissional, graduação
e pós-graduação profissional tecnológica. A premissa norteadora do princípio educativo é
centrada no trabalho, associando a prática com a teoria (BRASIL, 2004).
O Prouni concede bolsas de estudo integrais e de 50% ou de 25% para estudantes de
cursos de graduação e sequenciais de formação específica, em instituições privadas de ensino
superior, com ou sem fins lucrativos (BRASIL, 2005).
O Programa de Integração da Educação Profissional ao Ensino Médio na Modalidade
de Educação de Jovens e Adultos (Proeja) contempla cursos de formação profissional: formação
inicial e continuada de trabalhadores; educação profissional técnica de nível médio. Os cursos
e programas articulam-se ao ensino fundamental e ao ensino médio e podem ser utilizados por
instituições públicas e privadas (vinculadas ao “Sistema S”) (BRASIL, 2005a). Atendo-se em
qualificar e requalificar profissionais da “população adulta de baixa escolaridade por intermédio
de uma rede específica de cursos de curta duração, completamente dissociados da educação
básica e de um plano de formação continuada.” (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005, p.
1096). A perspectiva do programa é buscar a “superação da dualidade trabalho manual e
intelectual, assumindo o trabalho na sua perspectiva criadora e não alienante.” (PORTAL
MEC).
O Projeto Escola de Fábrica tem por finalidade prover formação profissional inicial e
continuada a jovens de baixa renda, mediante cursos ministrados em espaços educativos
77
específicos, instalados no âmbito de estabelecimentos produtivos urbanos ou rurais. Os jovens
participantes desse Projeto devem ter idade entre dezesseis e vinte e quatro anos, renda familiar
mensal per capita de até um salário-mínimo e meio e estar matriculados na educação básica
regular da rede pública ou na modalidade de Educação de Jovens e Adultos, prioritariamente
no ensino de nível médio (BRASIL, 2005c). As unidades de ensino (através de ONGs,
instituições públicas e outras) podem ser implantadas nas empresas, que aplicam o programa
curricular elaborado pelas instituições, seguem a orientação técnico-pedagógica, porém a
certificação dos alunos é proveniente das instituições parceiras, ou pode ficar também a encargo
dos Cefets (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005). Cabe às empresas a infraestrutura
física, os instrutores (funcionários e técnicos), os custos da implantação das unidades
formadoras, a alimentação, uniforme e transporte para os alunos (FRIGOTTO; CIAVATTA;
RAMOS, 2005).
Quanto à Lei referente às alterações para redimensionar, institucionalizar e integrar as
ações da educação profissional técnica de nível médio, da educação de jovens e adultos e da
educação profissional e tecnológica (BRASIL, 2008a) destaco os seguintes aspectos a seguir: a
Lei no artigo 36-A destaca que o Ensino Médio em atendimento à formação geral do educando
pode prepará-lo para o exercício das formações técnicas, seguido do parágrafo único em que “a
preparação geral para o trabalho e, facultativamente, a habilitação profissional, poderão ser
desenvolvidas nos próprios estabelecimentos de ensino médio ou em cooperação com
instituições especializadas em educação profissional.” (BRASIL, 2008a). No artigo 36-B, há a
determinação da articulação da educação profissional técnica de nível médio com o ensino
médio. O artigo 37 determina que a educação de jovens e adultos deve ser prioritariamente
articulada com a educação profissional. Também é disposto no artigo 39 que educação
profissional e tecnológica, cumprindo os objetivos da educação nacional, integra-se aos
diferentes níveis e modalidades de educação e às dimensões do trabalho, da ciência e da
tecnologia, além de constar no parágrafo 1o que “os cursos de educação profissional e
tecnológica poderão ser organizados por eixos tecnológicos, possibilitando a construção de
diferentes itinerários formativos, observadas as normas do respectivo sistema e nível de
ensino.” (BRASIL, 2008a).
Criação dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia e institucionalização
da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica (BRASIL, 2008b). Os Institutos
Federais exercerão o papel de instituições acreditadoras e certificadoras de competências
profissionais (BRASIL, 2008b). O artigo. 6o I descreve que os Institutos Federais devem
“ofertar educação profissional e tecnológica, em todos os seus níveis e modalidades, formando
78
e qualificando cidadãos com vistas na atuação profissional nos diversos setores da economia,
com ênfase no desenvolvimento socioeconômico local, regional e nacional.” (BRASIL, 2008b).
O Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem), implantado pela Secretaria
Geral da Presidência da República em parceria com o Ministério da Educação, o Ministério do
Trabalho e Emprego e o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
(FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005), objetiva, através de curso, elevar do grau de
escolaridade de jovens “visando à conclusão do ensino fundamental, qualificação profissional
voltada a estimular a inserção produtiva cidadã e o desenvolvimento de ações comunitárias com
práticas de solidariedade, exercício da cidadania e intervenção na realidade local.” (BRASIL,
2008c). A intencionalidade do Programa é reinserir o jovem na escola, identificando
oportunidades de trabalho, capacitando-os para o mundo do trabalho juntamente com a
“identificação, elaboração de planos e o desenvolvimento de experiências de ações
comunitárias; a inclusão digital como instrumento de inserção produtiva e de comunicação.”
(FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005, p. 1102).
O PNQ integra o Plano Plurianual (PPA) (2008-2011) e faz parte do Sistema Nacional
de Emprego (Sine). Tinha como objetivo “articular diretrizes procedimentos e ações de
qualificação social e profissional, colocando-se como uma estratégia de integração das políticas
de emprego, trabalho, renda, educação e desenvolvimento.” (PEIXOTO, 2008, p. 79). Para o
MTE no PNQ, a noção de qualificação implica dimensões epistemológica, social e pedagógica
(PEIXOTO, 2008). De acordo com Peixoto (2008, p. 81):
É necessário ainda pontuar que ao apresentarmos o PNQ, observamos que a noção de
qualificação defendida está em consonância com a discussão difundida pela OIT, em
que a Qualificação Social e Profissional refere-se ao direito, elemento indispensável
para a garantia do trabalho decente. Logo, a qualificação é posta como uma forma que
permite a inserção e a atuação cidadã no mundo do trabalho, refletindo na vida e no
trabalho dos indivíduos.
A educação profissional ajusta-se ao PNQ estrategicamente como elemento para as
mudanças do sistema produtivo e o projeto de desenvolvimento do país (PEIXOTO, 2008).
Nesse sentido, a concepção de educação profissional que fundamentou tanto a Planfor quanto
o PNQ está nas bases da “capacidade de aprendizagem contínua do trabalhador em incorporar
os princípios da polivalência e da multifuncionalidade, em conformidade com as atuais
exigências do processo produtivo e tecnológico.” (PEIXOTO, 2008, p. 126).
Segundo Frigotto, Ciavatta e Ramos (2005, p. 1096):
79
A qualificação e a requalificação, sejam na forma de cursos ou de módulos, deveriam
também ser organizadas com o fim de constituir itinerários formativos
correspondentes às diferentes especialidades ou ocupações pertencentes aos setores
da economia e promover, simultaneamente, a elevação de escolaridade dos
trabalhadores. Nessa medida, seria fundamental que esses cursos obtivessem
aprovação legal por meio do fornecimento de créditos e certificados escolares
reconhecidos pelo MEC e pelo MTE e, dessa forma, fossem vinculados aos processos
regulares de ensino e também reconhecidos e considerados pelas empresas em
negociações, convenções e contratos coletivos.
A política de educação profissional deste período se caracteriza por programas focais e
contingentes (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005, p. 1087) numa abordagem
fundamentada na politecnia, ou seja, o trabalho como princípio educativo (SAVIANI, 2007).
A “politecnia” associa-se a trabalho produtivo e à formação intelectual referindo-se “à
disponibilidade para os diversos trabalhos e suas variações” (SAVIANI, 2007, p. 162) e
constitui o trabalhador pluriprofissional, uma vez que a “tecnologia” fundamenta teoria e
prática. Para Saviani (2007, p. 164), politecnia diz respeito “aos fundamentos científicos das
múltiplas técnicas que caracteriza a produção moderna.” Portanto, o foco de análise do perfil
do trabalhador para os modelos de gestão empresarial na atualidade enfatiza as competências
do trabalhador com foco em resultados.
Em 2007, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE)35
lança o Programa Internacional para a Avaliação das Competências dos Adultos (Piaac)
(ÁVILA, 2011). A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)
atua nos âmbitos internacional e intergovernamental e reúne os países mais industrializados do
mundo e alguns países emergentes para o intercâmbio de informações e alinhamento de
políticas, com o objetivo de potencializar seu crescimento econômico e colaborar com o
desenvolvimento de todos os demais países membros (MINISTÉRIO DA FAZENDA, 2016). Em
2012, o Brasil inicia sua participação como key partner (parceiro-chave) e, em de 2015, assinou
um Acordo Marco de Cooperação com a OCDE que estabelece um novo patamar no
relacionamento bilateral do Brasil (MINISTÉRIO DA FAZENDA, 2016).
O objetivo macro do PIAAC é assistir aos governos na avaliação, monitoração e análise
do nível e da repartição de competências entre as suas populações de adultos, bem como da
extensão do uso de competências em contextos diversos, assim como avaliar os conhecimentos
35 A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) foi criada no dia 30 de setembro
de 1961 para substituir a Organização Europeia para a Cooperação Econômica (OECE), formada em 1947 com
o objetivo de administrar o Plano Marshall no processo de reconstrução dos países europeus envolvidos na
Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945). A sede da OCDE está localizada na cidade de Paris, França
(MINISTÉRIO DA FAZENDA, 2016).
80
e as competências profissionais da população adulta. Enfoca as habilidades-chave para o
progresso da vida econômica e social do século XXI (MECD, 2013).
Alguns objetivos específicos focam o indivíduo: identificação do interesse, da atitude e
da capacidade dos indivíduos em utilizar a tecnologia e as ferramentas de comunicação para a
busca e utilização da informação, bem como o foco na comunicação interpessoal, além das
habilidades requeridas na atividade de trabalho (MECD, 2013). Num composto amplo,
objetiva-se determinar o nível e a distribuição da competência nas habilidades-chave do
processo de informação para subgrupos da população adulta; melhor entendimento dos fatores
associados à aquisição, desenvolvimento, manutenção e perda das competências com a idade e
o entendimento da relação entre a capacidade e as habilidades de processamento de informações
e os resultados econômico e social (MECD, 2013).
O desenvolvimento do trabalhador, nesse período, mantém-se a partir das políticas
neoliberais apoiadas na noção de competência fixada em gestão por resultados em articulação
às políticas de educação para o trabalho. Insere a perspectiva interdisciplinar integrando
conhecimento científico e tecnológico, contemplando a competência técnica (ORTIGARA,
2012).
As políticas educacionais do Governo da Presidente Dilma Roussef 36 (2011-2016), em
geral, dão continuidade ao governo Lula. Em relação à educação e trabalho do governo Dilma,
foi estabelecido pela Lei n. 12.513/2012 o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e
ao Emprego (Pronatec) (BRASIL, 2011). Ao longo do período, o Pronatec vem substituindo
Planfor (1996) e PNQ (2003), que estavam voltados ao financiamento dos cursos de
qualificação profissional, desvinculados da escolarização e sob a responsabilidade das
comunidades locais. São objetivos do Pronatec (BRASIL, 2011):
I - expandir, interiorizar e democratizar a oferta de cursos de educação profissional
técnica de nível médio presencial e a distância e de cursos e programas de formação
inicial e continuada ou qualificação profissional;
II - fomentar e apoiar a expansão da rede física de atendimento da educação
profissional e tecnológica;
III - contribuir para a melhoria da qualidade do ensino médio público, por meio da
articulação com a educação profissional;
IV - ampliar as oportunidades educacionais dos trabalhadores, por meio do
incremento da formação e qualificação profissional; V - estimular a difusão de recursos pedagógicos para apoiar a oferta de cursos de
educação profissional e tecnológica.
36 Para fins da presente dissertação, limitei a abordagem do período do governo Dilma a abordar somente o que
teve mais destaque, pois, por tratar-se de governo ainda recente, isso exigiria um trabalho complementar de
levantamento de dados que está além dos propósitos da presente dissertação.
81
VI - estimular a articulação entre a política de educação profissional e tecnológica e
as políticas de geração de trabalho, emprego e renda. (Incluído pela Lei nº 12.816, de
2013).
O Pronatec é direcionado a estudantes de ensino médio da rede pública, incluindo a
educação de jovens e adultos; trabalhadores; beneficiários dos programas federais de
transferência de renda; estudante que tenha cursado o ensino médio completo em escola da rede
pública ou em instituições privadas na condição de bolsista integral (BRASIL,
2011). Consolidado em 2012 para formação de mão de obra por meio de cursos técnicos e
instituições habilitadas pelo MEC oferecendo cursos na rede pública ou privada de ensino,
estendendo-se a todas as regiões do Brasil.
O V Plano Nacional de Educação (PNE) (2014-20124) estabelece como uma de suas
diretrizes para o ensino médio e profissional (BRASIL, 2014):
- meta 10: oferecer, no mínimo, 25% (vinte e cinco por cento) das matrículas de
educação de jovens e adultos, nos ensinos fundamental e médio, na forma integrada à
educação profissional.
- meta 11: triplicar as matrículas da educação profissional técnica de nível médio, assegurando a qualidade da oferta e pelo menos 50% (cinquenta por cento) da
expansão no segmento público.
Essas metas integram a formação profissional para jovens e adultos mediante cursos
delineados de acordo com as características do público e das especificações da população em
relação ao local de inserção, incluindo a modalidade de ensino a distância (MEC; SASE, 2014).
Ao discutir as implicações do mundo do trabalho na formação do trabalhador,
compreende-se a importância da educação para a nova ordem mundial. O contexto da educação
pautado nos elementos sócio-históricos para a constituição da formação do trabalhador no
Brasil é marcado por pleno desenvolvimento industrial, passando pelos estilos gerencias
decorrentes. A relação entre educação, educação profissional e desenvolvimento econômico
ganha centralidade nos discursos das políticas educacionais, atribuindo espaço de conquista à
formação dos indivíduos enquanto cidadãos, não apenas para a atuação no mercado de trabalho,
mas também na incorporação ao modelo atual de gestão empresarial, pautado no aumento da
demanda por qualificação, na qualidade de aquisição de conhecimentos e informação, o que
alarga os domínios da educação.
Na presente seção, procurei apresentar elementos da trajetória sócio-histórica da
formação do trabalhador no Brasil, desde a educação catequética do período colonial até
recentes políticas públicas que compõem o cenário nacional nesses tempos de mundialização
neoliberal. Na sequência, abordo duas perspectivas para a formação do trabalhador.
82
Inicialmente, o modelo de formação por competência, que emerge do contexto da educação
empresarial. Depois, indico elementos conceituais convergentes a partir dos quais venho
elaborando e construindo a categoria de sujeito aprendente.
83
4 FORMAÇÃO POR COMPETÊNCIAS E O SUJEITO APRENDENTE
Esta seção é dedicada à formação do trabalhador considerando duas perspectivas
distintas, as quais correspondem a cada uma das duas subseções a seguir. Por um lado, partindo
da problematização da educação empresarial no contexto do modelo de gestão toyotista, mostro
que nesse modelo é a formação por competências que caracteriza a perspectiva educativa desse
cenário organizacional. Por outro lado, indico elementos teóricos com os quais elaboro a
categoria de sujeito aprendente tendo em vista estabelecer parâmetros para analisar efeitos de
transformações do mundo do trabalho na formação do trabalhador.
4.1 EDUCAÇÃO EMPRESARIAL E FORMAÇÃO POR COMPETÊNCIAS: A
APRENDIZAGEM COMO UMA ESTRATÉGIA EMPRESARIAL
Historicamente, o mundo corporativo caracteriza-se em razão de dois modelos clássicos
de gestão: o modelo taylorista/fordista e o modelo toyotista. Esses modelos têm influência direta
na constituição de modelos para a formação do trabalhador respectivamente: treinamento e
pedagogias de competências.
Sob influência do toyotismo, novas formas de organização e gestão do trabalho
demandam “o domínio do conhecimento articulado ao desenvolvimento das capacidades
cognitivas complexas.” (KUENZER, 2003). Potencializa o campo educacional e reforça a
sociedade do conhecimento, das competências e da empregabilidade individualizando e
responsabilizando o sujeito pelo desenvolvimento de suas competências (FRIGOTTO, 2009).
As competências são reconhecidas pelo mercado para tornarem o sujeito com alto desempenho
e máxima produtividade (FRIGOTTO, 2009).
As relações entre educação e mundo do trabalho têm experimentado várias influências
através das transformações evidenciando especificidades entre a concepção de escola como
lócus de ensino e aprendizagem e a empresa como campo de aplicação de conhecimentos
(QUARTIERO; BIANCHETTI, 2005).
O treinamento, segundo Chiavenato37 (1998, p. 494), “obedece a um programa
preestabelecido e atende a uma ação sistemática visando à adaptação do homem ao trabalho.”
37 Idalberto Chiavenato é Doutor e Mestre em Administração pela City University of Los Angeles-CA, EUA,
Especialista em Administração de Empresas pela FGV-EAESP, Graduado em Filosofia/Pedagogia, com
especialização em Psicologia Educacional pela USP e em Direito pela Universidade Mackenzie
(CHIAVENATO, 1998). O recurso a esse autor dá-se em razão de ser um estudioso renomado na área de
Administração de Recursos Humanos.
84
Assim, institui-se nas empresas a área de Treinamento e Desenvolvimento (T&D). O segundo
princípio de Taylor traz um ciclo (ainda utilizado na Administração de Recursos Humanos) da
seleção científica, o treinamento sistemático das instruções técnicas, o ensinar e aperfeiçoar o
trabalhador, uma vez que, anterior aos princípios, o trabalhador escolhia seu próprio trabalho e
treinava a si mesmo como podia (TAYLOR, 1990).
Treinamento, para a língua portuguesa, origina de treinar, tornar apto, capaz, habilitar
para determinada tarefa ou atividade (FERREIRA, 2010). Desenvolvimento, segundo a língua
portuguesa, constitui o ato de desenvolver; crescimento, aumento, progresso (FERREIRA,
2010). Para Chiavenato (1998), desenvolvimento se estabelece a partir da educação visando
ampliar, desenvolver e aperfeiçoar o homem para seu crescimento profissional em uma carreira
na empresa ou para que se torne mais eficiente e produtivo no seu cargo. Seus objetivos são em
médio prazo, visando proporcionar conhecimentos além dos exigidos no cargo atual,
preparando-o para assumir funções mais complexas.
As áreas de T&D “habituaram-se a entregar cursos ao público interno por força de
demandas concretas, oferecendo programas cujo objetivo principal era desenvolver habilidades
específicas que enfatizassem necessidades individuais e sempre dentro do escopo tático”
(EBOLI, 2002, p. 187), ou seja, treinamento sistemático das atividades voltadas para a
fabricação do produto (TAYLOR, 1990; FORD, 1967); o foco é somente no desempenho do
funcionário em uma dada atividade.
No novo modelo de organização do trabalho, a sociedade da informação, a da
aprendizagem, surge no ambiente empresarial a necessidades de respostas rápidas que garantam
a competitividade e sobrevivência da organização (EBOLI, 2002), definindo alto padrão de
resultados em curto espaço de tempo combinado ao desempenho de alta performance das
pessoas.
O modelo toyotista de organização e gestão do trabalho caracteriza-se pelo
enriquecimento das tarefas, a satisfação do consumidor, qualidade do produto, saúde no
trabalho, responsabilidade social e gestão ambiental. No entanto, a necessidade de formação
profissional torna a educação o elemento central nas discussões sobre o presente e o futuro do
trabalho (QUARTIERO; BIANCHETTI, 2005). É sobre esse contexto que as organizações
criam espaços de educação sedimentando a proposta de educação empresarial38, também
38 O tema Educação Empresarial surge primeiramente no ambiente organizacional, para depois ganhar espaço no
ambiente acadêmico. Tem seu início na Administração de Empresas inserindo-se na Educação por vias de
Trabalho e Educação e na Psicologia Organizacional. Esta, por sua vez, insere-se na Administração de Recursos
Humanos mediante os testes psicológicos utilizados na seleção de pessoas, os quais abrem caminhos para a
inclusão em outros subsistemas (EBOLI, 2004).
85
chamada de educação corporativa que representa uma nova dimensão da função T&D nas
organizações (EBOLI et al., 2006). A educação corporativa consiste em processos de ensino-
aprendizagem desenvolvidos pela empresa; objetiva estabelecer cultura de aprendizagem
permanente para a aquisição de novas competências vinculadas às estratégias empresariais
(EBOLI et al., 2006; QUARTIERO; BIANCHETTI, 2005). É a partir da educação corporativa
que se desenvolve a educação e formação em relação às práticas de trabalho (cadeia produtiva;
sistema da qualidade), com funcionários, clientes, fornecedores e comunidade em geral.
A educação corporativa será fundamental nesse processo como energia geradora de
sujeitos modernos, capazes de refletir criticamente sobre a realidade organizacional,
de construí-la e modificá-la continuamente em nome da competitividade e do sucesso.
Além disso, favorece a inteligência e o alto desempenho da organização na busca
incansável de bons resultados. (EBOLI, 2002, p. 188).
A busca por resultados leva em seu escopo a influência do taylorismo nos processos de
T&D. Observa-se o quanto as empresas desenvolvem seus sistemas de aprendizagens com
ênfase no saber fazer, sistematizando o aprendizado técnico com foco no produto. Porém, traz
como pano de fundo os discursos: da padronização de processos; das avalições de desempenho;
da preocupação com impacto ambiental; da carreira do profissional; da formação por
competências para a polivalência; do trabalho em equipe; da gestão da liderança, entre outros.
Articulações essas que remetem aos processos das organizações flexíveis (toyotismo).
A empresa voltada para a gestão flexível é impulsionada pela competitividade apoiando-
se nos objetivos da educação corporativa: a) aprendizagens voltadas à gestão do negócio da
empresa; b) considerar o modelo de Universidade Corporativa como processo de aprendizagem
e como vantagem competitiva; c) desenvolvimento de currículos para a formação que
desenvolvam cidadania corporativa, estrutura contextual e competências básicas; d) oportunizar
a formação de pessoas que possam compor o grupo de profissionais no futuro; e)
desenvolvimento de várias formas de promoção da aprendizagem, além do tradicional mediado
por um instrutor ou professor; f) envolvimento de líderes da organização com aprendizado; g)
financiamento compartilhado, corporativo e autofinanciamento; h) sistematizar avaliação de
resultados e investimento (EBOLI et al., 2006).
Para o desenvolvimento da educação na empresa, é importante que haja os
questionamentos: por que fazer? O que fazer? Como fazer? Uma vez que parte da resposta
desses pontos a eficácia do programa de educação corporativa com um dos fundamentos: a
valorização das pessoas (EBOLI et al., 2006). Esta, por sua vez, estimula e potencializa a
inteligência empresarial no âmbito da aprendizagem contínua em todos os níveis: empresa,
86
liderança e pessoas com foco a alcançar alto padrão de desempenho e resultados (EBOLI et al.,
2006).
A economia pós-fordista, a partir da teoria do capital humano, instiga a produtividade
na educação atingindo configuração nas bases didático-pedagógicas e pautadas no lema
aprender a aprender do núcleo das ideias pedagógicas escolanovistas (SAVIANI, 2013), as
quais “deslocam o eixo do processo educativo do aspecto lógico para o psicológico; dos
conteúdos para os métodos; do professor para o aluno; do esforço para o interesse; da disciplina
para a espontaneidade” (SAVIANI, 2013, p. 431), sendo o mais importante a assimilação de
conhecimentos. Para o escolanovismo, segundo Saviani (2013, p. 432),
“aprender a aprender” significava adquirir a capacidade de buscar conhecimentos por
si mesmo, de adaptar-se a uma sociedade que era entendida como um organismo em
que cada indivíduo tinha um lugar e cumpria um papel determinado em benefício de
todo o corpo social.
É necessário conhecer a visão da empresa, tudo e quem se relaciona com ela. Entende-
se que o trabalhador precisa conhecer o processo produtivo desde o saber fazer ao para que
fazer, configurando o seu envolvimento desde o início do processo. Trata-se, agora, “de
capacitar para adquirir novas competências e novos saberes, pois as ‘novas relações entre
conhecimento e trabalho exigem capacidades de iniciativa e inovação e, mais do que nunca,
‘aprender a aprender’’ num contínuo ‘processo de educação permanente’”. (BRASIL, 1997
apud SAVIANI, 2013, p. 433). No contexto atual, o emprego é categorizado pela
competitividade, “o ‘aprender a aprender’ liga-se à necessidade de constante atualização
exigida pela necessidade de ampliar a esfera da empregabilidade.” (SAVIANI, 2013, p. 432).
Para o sucesso do sistema de educação corporativa (SEC), Eboli (2006, p. 6-7) sugere
sete princípios:
1. Competitividade: valoriza a educação como forma de desenvolver o capital
intelectual dos colaboradores, transformando-os em fator de vantagem competitiva diante dos concorrentes, ampliando assim sua capacidade de competir. Significa
buscar continuamente elevar o patamar de competitividade empresarial por meio da
instalação, desenvolvimento e consolidação das competências críticas empresarias e
humanas.
2. Perpetuidade: entende a educação não apenas como um processo de
desenvolvimento e realização do potencial existente em cada colaborador, mas
também como um processo de transmissão da herança cultural, a fim de perpetuar a
existência da empresa.
3. Conectividade: privilegia a construção social do conhecimento, estabelecendo
conexões e intensificando a comunicação e a interação. Objetiva ampliar a quantidade
e qualidade da rede de relacionamentos com o público interno e externo.
87
4. Disponibilidade: busca oferecer e disponibilizar atividades e recursos educacionais
de fácil acesso e uso, fazendo com que a aprendizagem possa ocorrer a qualquer hora
e em qualquer lugar.
5. Cidadania: estimula o exercício da cidadania individual e corporativa, formando
atores sociais capazes de refletir criticamente sobre a realidade organizacional, de
construí-la e modificá-la e de atuar pautados por posturas éticas e socialmente
responsáveis.
6. Parceria: estabelece parcerias internas com líderes e gestores e parcerias externas
com instituições educacionais a fim de desenvolver continuamente as competências
dos colaboradores.
7. Sustentabilidade: busca ser um centro gerador de resultados para a empresa, procurando sempre agregar valor ao negócio. Pode significar também a busca de
fontes alternativas de recursos que permitam um orçamento próprio e auto-
sustentável.
A educação corporativa atua sobre a conectividade para a competitividade. É importante
que o indivíduo desenvolva maturidade e autoconhecimento, os quais o autorizem a
conscientização e a internalização do que significam a aprendizagem e o desenvolvimento
contínuo para que adquira as competências (técnicas e comportamentais) associadas ao sucesso
profissional e da empresa. À empresa cabe criar condições para o desenvolvimento de líderes
eficientes, visualizando profundas mudanças de estruturas, sistemas, políticas internas, práticas
para o desenvolvimento de valores e da cultura organizacional (EBOLI, 2002).
É fundamental que as práticas de T&D e de educação corporativa favoreçam uma
atuação profissional impregnada de personalidade, criando condições para o
desenvolvimento do conhecimento criador, do e empreendedorismo e o florescimento
de líderes eficientes. Mais e mais pode-se perceber a necessidade de as empresas
deixarem de encarar o desenvolvimento de pessoas como algo pontual, treinando-as
em habilidades específicas. A postura voltada à aprendizagem contínua e ao
autodesenvolvimento é um estado de espírito, um processo de constante crescimento
e fortalecimento de indivíduos talentosos e competentes. Cabe às organizações,
entretanto, criar um ambiente favorável para sua manifestação. (EBOLI, 2002, p.
190).
O papel da liderança se sobressai no êxito do sistema de educação corporativo. O líder
desenvolvendo sua aprendizagem e atuando como “professor” é o primeiro elo para aliar a
educação às estratégias da empresa. Os líderes educadores atuam como representantes internos
da aprendizagem; promovem aprendizagens em vários momentos na empresa; ministram cursos
e seminários e atuam como orientadores (EBOLI, 2005, p. 121). São fundamentais o
envolvimento, a responsabilização pela educação, a aprendizagem da equipe e o
comprometimento com o sistema. A construção de um excelente lugar para trabalhar e
consequentemente aprender se motiva em um ambiente onde a equipe tenha condições de
questionar opiniões e perceber o líder preocupado com o progresso de todos.
88
Eboli (2005, p. 120) propõe sete papéis para o líder desempenhar e atuar como liderança
educadora:
visionário: apontar a direção do SEC;
patrocinador: promover o encorajamento nos colaboradores;
controlador: participar ativamente no controle do desenvolvimento de
competências;
especialista: idealizar e desenvolver novos programas educacionais;
professor: ensinar nos programas educacionais;
aprendiz: mostrar também sua vontade de aprender, frequentando cursos;
comunicador: divulgar e promover interna e externamente o SEC.
Da perspectiva da educação corporativa, abrem-se como espaço favorável as
Universidades Corporativas (UCs). O surgimento conceitual de universidade corporativa
estabeleceu a passagem do tradicional centro de T&D para a educação ampla e abrangente de
todos os integrantes da organização (EBOLI, 2000). “As UCs estão para o conceito de
competência assim como os tradicionais centros de T&D estiveram para o conceito de cargo.”
(EBOLI, 2002, p. 192). É da universidade corporativa que emerge a modalidade de educação
corporativa (EBOLI, 2002).
Em linhas gerais, verifica-se a produção de conhecimentos em nível ideológico,
institucional e tecnológico (EBOLI, 2004). A ideologia vigente é transmitida pela escola
clássica direcionada à formação da classe dominante enquanto que as classes instrumentais são
privilegiadas pelo modo de fazer com os aspectos técnicos e profissionais – Escola
Profissionalizante (EBOLI, 2004). É importante observar que as UCs, ao desenvolverem os
mais diversos públicos (internos – profissionais – e externos – fornecedores, cliente e sociedade
em geral) e categorias profissionais (todas as categorias profissionais envolvidas na empresa)
englobam os dois enfoques (EBOLI, 2004).
Nesse contexto, identifica-se a existência dos dois modelos de aprendizagem na empresa
estando eles tensionados em relação às propostas taylorista-fordista e a pós-fordista. A
educação empresarial utiliza como pano de fundo o clássico T&D, obtendo como start a
aprendizagem das atividades a serem desenvolvidas nos cargos incluindo o desenvolvimento
de competências em todas as categorias profissionais focando o aprender a aprender.
Permite a identificação com os objetivos operacionais, pois o trabalhador torna-se capaz
de realizar as operações a partir da aquisição de competências as quais entrelaçam à sua
singularidade, subjetividade e todas as suas competências em um novo sistema de relações
sociais, focando cada vez mais o desempenho do trabalhador sobre os resultados operacionais
(RAMOS, 2001). O pano de fundo das competências é a padronização tanto para processos
89
quanto para resultados, impulsionados pela necessidade de novas estratégias competitivas, pois
cumpre um papel de ordenação das relações sociais de trabalho interna e externamente às
organizações.
O elo do neoliberalismo com a pedagogia das competências se estabelece pelo processo
da empregabilidade configurado em competitividade, designando a educação permanente e
particularizando aspectos da pedagogia do aprender a aprender, uma vez que
a “pedagogia das competências” apresenta-se como outra face da “pedagogia do
aprender a aprender”, cujo objetivo é dotar os indivíduos de comportamentos flexíveis
que lhes permitam ajustar-se às condições de uma sociedade em que as próprias
necessidades de sobrevivência não estão garantidas. Sua satisfação deixou de ser um
compromisso coletivo, ficando sob a responsabilidade dos próprios sujeitos que,
segundo a raiz etimológica dessa palavra, se encontra subjugados à “mão invisível do
mercado.” (SAVIANI, 2013, p. 437).
Seguindo no enfoque das competências, Zarifian (1999) a entende como forma de tomar
iniciativa e responsabilizar-se com êxito, tanto em nível do indivíduo quanto de um grupo,
mediante uma situação profissional. Tanguy e Ropé (1997) assinalam que é o conjunto de
conhecimentos, qualidades, capacidades e aptidões que habilitam o sujeito para a discussão, a
consulta, a decisão de tudo o que concerne a um ofício, supondo conhecimentos teóricos
fundamentados, acompanhados das qualidades e da capacidade que permitem executar as
decisões sugeridas. Para Eboli (2002), são resultantes de três fatores básicos: conhecimentos –
compreensão de conceitos e técnicas – o saber fazer; habilidades – aptidão e capacidade de
realizar atividades associadas à experiência e ao aprimoramento progressivo – o poder fazer;
atitudes – estrutura postural, o modo de agir em relação a fatos, o seu ambiente e as outras
pessoas – o querer fazer. Esse conjunto de habilidades técnicas e condutas é, então, chamado
de competências, as quais Rabaglio (2014) vai definir como conhecimentos, habilidades e
atitudes.
Para Fleury e Fleury (2001), competência constitui “um saber agir responsável e
reconhecido, que implica mobilizar, integrar, transferir conhecimentos, recursos e habilidades,
que agreguem valor econômico à organização e valor social ao indivíduo.” Segundo Caaillaud
et al. (1997 apud RAMOS, 2001), competências constituem um aprimoramento do modelo de
qualificação, por se tornar mais fácil a adaptação do sistema sociotécnico às designações
econômicas do século XXI. Já Ferreti (1997 apud RAMOS, 2001) considera uma atualização
do conceito de qualificação em razão da velocidade em que anda a valorização do profissional
e a competitividade no capitalismo.
90
De acordo com Frigotto (2009), a noção de competências deriva da Teoria do Capital
Humano e redimensiona-se nos moldes neoliberais. Caracteriza a produtividade capitalista no
desenvolvimento do profissional a partir de sua formação educacional, sua qualificação para se
manter competitivo e atuante no mercado de trabalho. A Teoria do Capital Humano associa “a
capacidade produtiva e competitiva das empresas à qualificação, conferida pela escolaridade,
de seus recursos humanos.” (RAMOS, 2001, p. 237). Assim, a responsabilização do indivíduo
pela sua formação é inerente a ele, não mais do Estado, pois “é o indivíduo que terá de exercer
sua capacidade de escolha visando adquirir os meios que lhe permitam ser competitivo no
mercado de trabalho [...] a educação passa a ser entendida como um investimento em capital
humano individual [...]” (SAVIANI, 2013, p. 430).
O debate que envolve a qualificação, segundo Ramos (2001), oriunda da sociologia,
relaciona-se à existência de práticas educativas que legitimam o conjunto de regras do trabalho
qualificado, organiza as relações formais de trabalho, uma vez que a noção de competência,
originada nas ciências cognitivas, centraliza aspectos psicológicos para questionar e organizar
práticas sociais. É possível afirmar que os modelos de qualificação e de competência andam
lado a lado, pois não há consenso sobre deslocamentos.
Consoante a análise de Ramos (2001), dizer que a noção de competência atualiza o
conceito de qualificação é desconsiderar a existência de um novo signo, é não o justificar. Em
um debate em torno do significado histórico-social, Schwartz (1995 apud RAMOS, 2001)
atribui à qualificação três dimensões: conceitual, social e experimental. Como conceitual,
encontram-se os processos de formação, o valor dos diplomas; como social, as relações sociais
estabelecidas entre o conteúdo das atividades e o reconhecimento social; como experimental,
no sentido do conteúdo específico do trabalho em si, ao conjunto de saberes, tácitos e empíricos
constituindo a eficiência produtiva. Portanto, qualificação e competência andam lado a lado,
constituídas de técnica, estruturas sociais, relações de trabalho, subjetividade e complexidade
na formação do trabalhador. Segundo Ramos (2001, p. 124),
se compreendida nos seus limites, a noção de competência não negaria o conceito de
qualificação, mas expressaria de forma mais precisa, sua dimensão experimental, por
meio da qual as características subjetivas do trabalhador se manifestam e se
modificam mais diretamente.
A noção de competências, ordenada nas relações de trabalho, possui um forte apelo
econômico. Articula-se à ideia de flexibilização na produção, conceito de qualidade total e
qualificação do profissional, constituindo a “base empírica para que o conceito de qualificação
91
fosse tomado como princípio de eficiência produtiva.” (RAMOS, 2001, p. 171). O processo
produtivo constitui-se eficiente com trabalhadores bem preparados. Ramos (2001) analisa essa
relação a partir de alguns autores que traduzem os modelos de competência em relação direta
com estratégias produtivas a partir da inovação de tecnologias e gestão de recursos humanos.
Para Mertens (1996 apud RAMOS, 2001), é importante enfatizar as competências-chave
da organização aproveitando todo o conhecimento, habilidade e a atitude dos profissionais para
alcançar o potencial produtivo da organização. Zarifian (1999) contempla que a noção de
competências não é influenciada pelas inovações tecnológicas, mas pelas mudanças emergentes
na organização de trabalho e nas relações sociais ocorridas internamente. Considera que a
organização é responsável por qualificar os profissionais em suas atividades de trabalhos, pois
“os efeitos sobre os conteúdos profissionais são indiretos e se devem à superação da
organização prescrita nos procedimentos de trabalho.” (ZARIFIAN, 1999 apud RAMOS, 2001,
p. 174). Assim, salienta a manutenção de princípios do fordismo: poucas inovações, sem
prescrição de procedimentos de trabalho e a aproximação da lógica industrial e da lógica de
serviço (RAMOS, 2001). Para Valle (1999 apud RAMOS, 2001), o desempenho do trabalhador,
seja de ordem técnica, seja subjetiva ou social, está cada vez mais voltado para os resultados
operacionais.
A análise de Ramos (2001, p. 176) pontua que
a competência é tomada como categoria ordenadora das relações sociais de trabalho
internas às organizações produtivas. Portanto, apropriada à gestão da flexibilidade
técnica e organizacional do trabalho. Mas a competência cumpre também o papel de
ordenar as relações sociais de trabalho externamente às organizações produtivas, no
sentido de gerir condutas e reconfigurar valores ético-políticos dos trabalhadores no
processo permanente de adaptação à instabilidade social.
Está na base constitutiva das competências a relação de formação para a
empregabilidade, pressupondo o potencial do indivíduo em pleno desenvolvimento,
responsabilizando-o pelo seu sucesso ou insucesso profissional, comprometendo-o além da
formação, uma vez que esse sujeito traz sua singularidade, seus valores, sua constituição ética
e moral. Muito além da qualificação, do processo de cognição, está a adaptabilidade e os
relacionamentos do indivíduo chegando às consequências afetivo-emocionais das relações de
trabalho, que, segundo as relações flexíveis, as competências devem dar conta.
A formação por competências implica diferentes esferas de atividades para o sujeito,
como a noção de conhecimentos, de desempenho e de carreira. Estas encontradas nos domínios
da esfera educativa e da esfera do trabalho, uma vez que elas se articulam, pois saberes,
92
conhecimentos e qualificação se estabelecem tanto por uma esfera quanto pela outra. Conforme
Tanguy e Ropé (1997, p. 17), “o uso da noção de competência não deixa de evocar o da noção
de formação”, uma vez que a atividade de formação, ao se desenvolver, deslocou-se dividindo
lugares especializados nessa função: da escola também para a empresa. Havendo a aproximação
da escola com a empresa por meio de vários tipos de cooperações, de reorganização de
conteúdos de ensino, os modos de transmissão dos saberes e das avaliações (TANGUY; ROPÉ,
1997).
Para Ramos (2001, p. 21), “a noção de competência tem ordenado as relações de
trabalho e as relações educativas, considerando-se os contextos econômico-político e
sociocultural contemporâneos”, uma vez que mobiliza não somente o profissional em busca de
qualificação, mas o contexto escolar e a sociedade em geral mobilizados para a conquista de
um lugar na demanda capitalista. Zarifian (1999) analisa que ao sistema educativo cabe
estabelecer conhecimentos, validá-los por diplomas e desenvolver as capacidades do indivíduo;
à empresa cabe utilizar esse conhecimento combinando-o com a experiência profissional e de
aprendizagem ao longo da vida, desenvolvendo as habilidades.
Ao analisar as relações educativas sob a ótica da noção de competências, Ramos (2001)
focaliza as dimensões psicopedagógicas e socioeconômicas da competência. Na dimensão
psicológica, o ensino baseado em competências e orientado pela área cognitiva, afetiva e
psicomotora traz os conhecimentos, as habilidades e destrezas intelectuais. Malglaive (1995
apud RAMOS, 2001) associa capacidade ao termo competência, que são potencialidades para
realizar qualquer ato de qualquer nível, sendo inatas ou adquiridas. Essas potencialidades que
são imanentes da atividade humana não são reduzidas, pois reafirmam-se nas capacidades e
competências através da natureza: psíquica, cognitiva e de conhecimento; da origem:
nascimento, biografia e educação. Malglaive (1994 apud RAMOS, 2001, p. 232) entende que
o recurso ao termo competência seria muito mais uma tentativa de fazer face aos
problemas gerados pela complexidade das atitudes profissionais e, então, à evolução
pela qual a própria noção de objetivos estaria passando, qual seja: do controle normal
da aquisição de conhecimentos à determinação de conteúdos de formação ordenados
pelas atividades – mais frequentemente profissionais – para quais eles são
supostamente preparados.
A compreensão de competências a partir da dimensão psicológica de Malglaive (1994
apud RAMOS, 2001) está baseada na epistemologia genética de Piaget, o que traz o
entendimento para o âmbito pedagógico. No espaço psicopedagógico, as capacidades, são
saberes em uso “compreendido como a ação do pensamento sobre os saberes que orientam uma
93
ação material ou simbólica, estruturante de novos saberes” (RAMOS, 2001, p. 232), os quais
incluem “o saber teórico formalizado e saber prático.” O saber teórico desdobra-se em saber
técnico (o que fazer) e saber metodológico (como fazer); já o saber prático é o conhecimento
não formalizado, o que vem da ação, mantendo relações com o que e como fazer (RAMOS,
2001). Logo “a ideia que se difunde quanto à apropriação da noção de competência pela escola
é que ela seria capaz de promover o encontro entre formação e emprego” (RAMOS, 2001, p.
221), estabelecendo a estreita relação entre desenvolvimento da estrutura psicológica implicada
na formação pedagógica.
As dimensões socioeconômicas das competências estão diretamente relacionadas às
relações sociais de produção, pois “a integração social promovida pelos processos educativos
institucionalizados passou a incluir o aprendizado de conteúdos científicos e culturais
estruturantes das ocupações e profissões.” (RAMOS, 2001, p. 237). Influenciada pelas
transformações do mundo do trabalho, a dimensão educacional se estrutura de acordo com
padrões advindos.
Nas demandas flexíveis, por sua vez, está a busca pela máxima eficiência, compondo
da qualificação do profissional para a aquisição de melhores postos de trabalhos e
empregabilidade competitiva a partir de um ambiente de trabalho que preza as relações
pessoais, trabalho coletivo, centralização de controle nas atividades e não nas pessoas, porém a
individualização está na responsabilidade de cada profissional pelo seu trabalho e pela sua
qualificação. O objetivo é a combinação de um conjunto de habilidades técnicas e condutas
necessárias designadas pela empresa na constituição do trabalhador (KUENZER, 2011).
A noção de competência corrente no Brasil se articula à educação profissional
perspectivando reorientar as práticas pedagógicas, transmitir conteúdos voltados à construção
dessas competências. O entendimento da educação profissional como qualificação ou
habilitação para o exercício de uma atividade profissional, via de complementação da educação
geral, pode abranger ambientes como escolas, instituições especializadas ou campo de trabalho
(RAMOS, 2001). O sentido da articulação entre ensino básico e profissionalizante se dá a partir
das novas formas de produção com a valorização das competências “introduzindo no modo de
produzir e de educar, um humanismo que possibilitaria integrar a formação para o trabalho num
projeto mais ambicioso de desenvolvimento da pessoa humana.” (RAMOS, 2001, p. 132). Essa
nova realidade do processo industrial passa a exigir do trabalhador não somente seu
conhecimento empírico/científico, mas sua subjetividade.
Do ponto de vista do mundo do trabalho, verifica-se a constituição de um trabalhador
combinado em um conjunto de habilidades, de técnicas, de condutas que levam às competências
94
com as quais o trabalhador estará à frente com a inovação, criatividade e flexibilidade. Porém,
exige-se um profissional altamente competitivo, pois a instabilidade do emprego dita os rigores
para a formação desse trabalhador. Do ponto de vista da educação, a formação e a aprendizagem
surgem a partir do trabalhador, compondo um sujeito de sua própria formação. “Depositando a
capacidade e, em grande medida, a responsabilidade de se tornarem sujeitos aprendentes ao
longo da vida como condição do seu sucesso.” (SILVA, 2008).
O aporte da pedagogia das competências à formação do trabalhador está associado a
signos e significados da nova lógica do capitalismo e, principalmente, ao campo individual,
preparando o sujeito para a empregabilidade, sem desassociar-se da noção de qualificação.
Afinal, principalmente em termos de relações sociais, “não é por acaso que a noção de
competência surge nos meios empresariais e é incorporada na educação sob o propósito de
conectá-la aos desafios das instabilidades do mercado de trabalho” (FRIGOTTO; CIAVATTA;
RAMOS, 2009, p. 6), uma vez que o perfil do trabalhador é determinado pelo deslocamento de
processos para resultados.
4.2 SUJEITO APRENDENTE: UMA CATEGORIA EM ELABORAÇÃO
Nesta seção, apresento elementos que compõem uma concepção de sujeito aprendente.
Essa concepção encontra-se em elaboração e exige pesquisa complementar e subsequente. No
entanto, para fins da presente dissertação, procuro explicitar a ideia que elaborei até o momento.
Para formular essa concepção, considero, por um lado, a problemática que relaciona as
transformações do mundo do trabalho e seus efeitos na formação do trabalhador, em particular
no contexto brasileiro. Por outro lado, articulo elementos conceituais de alguns autores nos
quais encontro, até este momento, certa possibilidade de articulação para compor a categoria
de sujeito aprendente.
No mundo capitalista, as transformações do mundo do trabalho produzem
transformações na sociedade, levando a reorganização no estilo de vida das pessoas e das
comunidades, na organização e na gestão das organizações, no perfil dos profissionais, no modo
de produzir e de consumir. Consequentemente, tais transformações influenciam os sistemas
educativos e os processos formativos (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2003). Os meios de vida
produzidos pelo trabalho significam que o homem, além de transformar a natureza, transforma
também a si mesmo. Esse processo de transformação consiste em uma atividade prática que “é
o ponto de partida do conhecimento, da cultura e da conscientização.” (FRIGOTTO;
CIAVATTA; RAMOS, 2014, p. 2).
95
Ao abordar elementos da formação do trabalhador no Brasil, evidencia-se um contexto
considerado a partir dos anos de 1990, caracterizado pela mundialização e marcado por um
sistema neoliberal que tem entre seus fundamentos o modelo de gestão toyotista. Nesse
contexto, em geral, as organizações empresariais estão focadas em resultados e na
competitividade. Em consequência, instituiu-se a demanda de trabalhadores cuja
empregabilidade depende diretamente de sua capacidade de adaptabilidade, individual e
flexível, ao sistema vigente. Nesse sentido, propaga-se a ideia do aprender a aprender, na
perspectiva da pedagogia das competências. Conforme mostrado na seção anterior da presente
dissertação, essa perspectiva da aprendizagem se constitui como uma estratégia empresarial
com vistas ao seu objetivo último que é o lucro capitalista.
Para formular a concepção de sujeito aprendente, considero que “é a partir do trabalho,
em sua cotidianidade, que o homem torna-se ser social, distinguindo-se de todas as formas não
humanas.” (ANTUNES, 2011, p. 142). Historicamente, as relações do homem, do trabalho e da
educação estão pautadas em variantes culturais, políticas e econômicas, pois “[...] trabalho e
educação são atividades especificamente humanas” (SAVIANI, 2007, p. 152), as quais se
transformam ao longo de gerações.
Tais transformações são geradas pelo próprio homem por meio do seu trabalho para
saciar necessidades básicas, desde o mundo primitivo que trabalhava com pedras e lascas de
árvores até o mundo do trabalho industrializado e informatizado (SAVIANI, 2007).
[...] a essência humana não é, então, dada ao homem; não é uma dádiva divina ou
natural; não é algo que precede a existência do homem. Ao contrário, a essência
humana é produzida pelos próprios homens. O que o homem é, é-o pelo trabalho. A
essência do homem é um feito humano. É um trabalho que se desenvolve, se
aprofunda e se complexifica ao longo do tempo: é um processo histórico. (SAVIANI,
2007, p. 154).
O trabalho como produção humana se constitui em uma prática educativa, pois “é pela
ação vital do trabalho que os seres humanos transformam a natureza em meios de vida. Se essa
é uma condição imperativa, socializar o princípio do trabalho como produtor de valores de uso,
para manter e reproduzir a vida, é crucial e educativo’” (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS,
2014, p. 1).
Tendo como fundamento o conceito marxiano de trabalho vivo, entendo o trabalho como
prática educativa, pois o trabalhar implica o sujeito na sua totalidade na ação de transformação:
96
[...] ato que se passa entre o homem e a natureza. Nele, o próprio homem desempenha,
diante da natureza, o papel de uma força natural. As forças de que seu corpo é dotado,
braços e pernas, cabeça e mãos, ele as põe em movimento, a fim de assimilar matérias,
dando-lhes uma forma útil à sua vida. Ao mesmo tempo que ele age, por meio desse
movimento, sobre a natureza exterior e modifica-a, ele modifica sua própria natureza
e desenvolve as faculdades que ali repousam. (MARX, 1867/ 1969 apud
HAMRAOUI, 2014, p. 45).
Tendo como fundamento esse conceito de trabalho vivo de Marx, Dejours (2012, p. 24)
define o trabalho desdobrando sentidos do “fato de trabalhar”:
[...] os gestos, os saber-fazer, no engajamento do corpo, a mobilização da inteligência,
a capacidade de refletir, de interpretar e de reagir a diferentes situações, é o poder de
sentir, de pensar, de inventar etc. Em outros termos [...] o trabalho não é, em primeira instância, a relação salarial ou empregatícia, é o “trabalhar”, ou seja, um modo
específico de engajamento da personalidade para enfrentar uma tarefa definida por
constrangimentos (materiais e sociais).
Consoante Dejours (2012), o trabalhar implica uma ação que leva a distinguir e articular
o trabalho prescrito e o trabalho efetivo, pois há sempre uma distância entre ambos a ser
enfrentada. Segundo Dejours (2012, p. 25), “trabalhar é vencer, preencher o hiato entre o
prescrito e o efetivo. Ora, o que se deve colocar em ação para vencer esse hiato não pode ser
previsto de antemão.” Ou seja, “o caminho a ser percorrido [...] deve ser a cada momento
inventado ou descoberto pelo sujeito que trabalha.” No cotidiano, o trabalhador está todo tempo
confrontado com situações inesperadas, as mais diversas: “[...] panes, incidentes, anomalias de
funcionamento, incoerências organizacionais, imprevistos, provenientes tanto da matéria, das
ferramentas e das máquinas, como os demais trabalhadores, colegas, chefes, subordinados, da
equipe, da hierarquia, dos clientes [...]” (DEJOURS, 2012, p. 24). Em outros termos, “o trabalho
define-se como o que o sujeito deve acrescentar as prescrições para poder alcançar os objetivos
para os quais foi designado.” (DEJOURS, 2012, p. 25).
Esse autor também analisa o trabalho vivo a partir de outra dupla de conceitos
contraditórios: o sofrimento e o prazer no trabalho.
O sofrimento não é apenas uma consequência última da relação como real, é ainda
proteção da subjetividade rumo ao mundo em busca de meios para agir sobre o mundo,
para transformar este sofrimento encontrando os meios de superação da resistência do
real. Assim, o sofrimento será ao mesmo tempo impressão subjetiva do mundo e
origem do movimento de conquista do mundo. (DEJOURS, 2012, p. 26).
Para este autor, a superação do sofrimento supõe a construção de uma sociabilidade
laboral na qual se estabelecem formas de reconhecimento que criam condições para a
transformação do sofrimento em prazer: “apenas quando obtenho o reconhecimento da utilidade
97
e da qualidade do meu trabalho é que tenho a satisfação intensa da minha relação com o
trabalho”. Ou seja, “trata-se de um longo percurso: é na passagem [...] pelo desafio do real, que
o sofrimento, pela descoberta de soluções que o sofrimento se transforma finalmente em
prazer.” (DEJOURS, 2009, p. 53). Nessa perspectiva, o autor relaciona o reconhecimento com
o problema do pertencimento e da construção de identidade individual e coletiva:
[...] o reconhecimento me confere o pertencimento a uma equipe, a uma coletividade,
a uma profissão. O reconhecimento confere, portanto, em troca do meu sofrimento,
um pertencimento que exorciza a solidão. Em resumo, o reconhecimento permite
aquele que trabalha transformar o seu sofrimento em desenvolvimento de sua identidade. Ora, a identidade é alicerce da saúde mental. [...] o trabalho, por meio da
ação do reconhecimento, constitui uma segunda chance para edificar e desenvolver
nossa identidade e adquirir assim uma melhor resistência psíquica em face dos
desafios da vida. (DEJOURS, 2009, p. 53).
Considerando o trabalho como trabalho vivo, Dejours mostra que também a
organização, enquanto espaço de materialização das formas de gestão de trabalho, constitui-se
em uma forma concebida e operacionalizada pelo homem, logo se trata de uma forma social
contraditória: “toda a organização do trabalho é uma construção humana. Ela só se desenvolve
com o consentimento e a colaboração de milhões de homens e mulheres. O trabalho pode gerar
o pior, até suicídio, mas ele pode gerar o melhor: prazer, autorrealização e emancipação.”
(DEJOURS, 2009, p. 53).
Para compor a categoria de sujeito aprendente ao conceito de trabalho vivo e sua
dimensão educativa, associo a problemática das transformações da sociedade contemporânea e
seus efeitos na educação em na formação. Conforme documento europeu, a educação e a
formação compõem um cenário que é fruto de “três choques motores que transformam de modo
profundo e duradouro o contexto da atividade econômica e o funcionamento das nossas
sociedades”: a sociedade da informação, a civilização científica e técnica e a mundialização da
economia, as quais contribuem para a construção de um caminho “rumo à sociedade cognitiva”
(COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS, 1995, p. 9).
A educação e a formação vão cada vez mais ser consideradas como os principais
vectores de identificação, integração, promoção social e realização pessoal. É através
da educação e da formação, adquiridas no sistema educativo institucional, na empresa,
ou de modo mais informal, que os indivíduos poderão assegurar o seu futuro e a sua
realização. [...] A capacidade de aprender e a aquisição dos saberes fundamentais
passarão a situar cada vez melhor os indivíduos nas relações sociais. A posição de
cada um no espaço do saber e da competência será, portanto, decisiva. Esta posição
relativa, que se pode designar como "relação cognitiva", vai cimentar cada vez melhor
as nossas sociedades. A faculdade de renovação e a inovação dependerão dos laços que se estabelecerem entre a produção do saber na investigação e a sua transmissão
através da educação e da formação. Finalmente, a comunicação tornar-se-á
98
indispensável, tanto para a produção das ideias como para a sua circulação.
(COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS, 1995, p. 6).
Consoante Assmann39 (2007, p. 129), o aprendente é um “agente cognitivo (indivíduo,
grupo, organização, instituição, sistema) que se encontra em processo ativo de estar
aprendendo. Que/quem realiza experiências de aprendizagem.” Com base em documentos
europeus, para esse autor, na sociedade do conhecimento ou sociedade aprendente, a educação
e a formação são frutos de uma construção com e para além da escola, na perspectiva de um
processo ao longo da vida. Segundo Assmann (2007, p. 19), “com a expressão sociedade
aprendente pretende-se inculcar que a sociedade inteira deve entrar em estado de aprendizagem
e transformar-se numa imensa rede de ecologias cognitivas.”
As interfaces dos agentes cognitivos (humanos e/ou maquínicos) são tantas que o
próprio agenciamento ou a ambientação dos potenciais cognitivos se transformou em tarefa fundamental nas tecnologias e, por decorrência óbvia, dos contextos
educacionais. [...] a noção de ecologia cognitiva coloca desafios epistemológicos
(formas de conhecer), mas sobretudo pedagógicos (ambientação e clima propício às
experiências). [...] uma pedagogia cognitivamente ecológica propiciadora de
vivências do estar aprendendo. (ASSMANN, 2007, p. 152).
À noção de sociedade aprendente o autor articula, também, o termo organização
aprendente para caracterizar a dimensão educativa que particulariza a organização, ou seja,
“aquela na qual os agentes envolvidos estão habilitados a buscar, em todos os níveis, individual
e coletivamente, aumentar a sua capacidade de criar resultados aos quais estão orientados ou,
no caso de sistemas humanos, pelos quais estão efetivamente interessados”, incluindo [...] “a
criatividade individual e coletiva capaz de inventar e assumir mudanças” (ASSMANN, 2007,
p. 86). Em outros termos, trata-se de considerar que o sujeito aprende na e com as organizações.
De acordo com Fernández (2001, p. 55), o conceito de sujeito aprendente se refere a
uma posição subjetiva na qual se articula sujeito cognoscente/epistêmico (epistemologia
genética – Piaget) e o sujeito desejante (psicanálise – Freud) “sobre o organismo herdado,
construindo um corpo sempre em intersecção com o outro (conhecimento-cultura...) e com
outros (pais, professores e meios de comunicação).” Para essa autora, o sujeito aprendente está
relacionado, de forma complementar e indissociável, com o sujeito ensinante. Fernández (2001,
p. 53) chama a atenção para o fato que “os termos ensinante e aprendente não são equivalentes
39 Agradeço ao Prof. Dr. Roque Strieder, do Programa de Pós-Graduação em Educação da Unoesc, por indicar a
referência de Hugo Assmann para conceituar o sujeito aprendente em momento inicial de minha pesquisa
bibliográfica, em que buscava rumos para a base conceitual da presente dissertação.
99
a aluno e professor. Estes últimos fazem referência a lugares objetivos em um dispositivo
pedagógico, enquanto aqueles indicam o modo subjetivo de situar-se.”
Para poder aprender, o sujeito precisa apelar simultaneamente às duas posições,
aprendente e ensinante. Necessita conectar-se com o que já conhece e autorizar-se a
"mostrar", a fazer visível aquilo que conhece. Além disso, o pensar é sempre um apelo
ao outro, uma confrontação com o pensamento do outro. Embora sendo um processo
intra-subjetivo, acontece na intersubjetividade. (FERNÁNDEZ, 2001, p. 59).
Nessa perspectiva, a autora considera o aprendente desde uma posição subjetiva ativa,
ou seja, “o sujeito não só é ativo frente à construção do conhecimento que vai ‘incorporar’ (isto
é, enquanto aprendente), mas também o é enquanto transforma a situação na qual está
aprendendo e o próprio ensinante.” (FERNÁNDEZ, 2001, p. 61). Fernández (2001) também
indica que a posição de aprendente articula uma tríade: informação, saber e conhecimento. Para
fins da presente dissertação, em termos de uma abordagem exploratória, entendo os três termos
nos seguintes sentidos: informação refere-se ao dado objetivo e exterior ao sujeito (MONTEIL,
1985 apud CHARLOT 2000); saber emerge da “relação de um sujeito com o mundo, com ele
mesmo e com os outros. É relação com o mundo como conjunto de significados, mas, também,
como espaço de atividades, e se inscreve no tempo” (CHARLOT, 2000, p.
78); conhecimento está associado ao repertório científico historicamente acumulado e
socialmente reconhecido como tal.
A articulação entre os três elementos da tríade indicada compõe o que Delors (1998, p.
104) chama de “paisagem educativa complexa”.
[...] deixar de considerar as diferentes formas de ensino e aprendizagem como independentes umas das outras e, de alguma maneira, sobrepostas ou concorrentes
entre si, e procurar, pelo contrário, valorizar a complementaridade dos espaços e
tempos da educação moderna. (DELORS, 1998, p. 104).
Considerando o contexto da sociedade aprendente constituído pela paisagem educativa
complexa indicada, ao sujeito aprendente associo também a noção da educação ao longo da vida.
A educação ao longo de toda a vida é uma construção contínua da pessoa humana, do
seu saber e das suas aptidões, mas também da sua capacidade de discernir e agir. Deve
levá-la a tomar consciência de si própria e do meio que a envolve e a desempenhar o papel social que lhe cabe no mundo do trabalho e na comunidade. (DELORS, 1998,
p. 106).
Nos termos de Delors (1998), a educação ao longo da vida é pluridimensional e implica
quatro pilares distintos e articulados:
100
• Aprender a conhecer, combinando uma cultura geral, suficientemente vasta, com a
possibilidade de trabalhar em profundidade um pequeno número de matérias. O que também significa: aprender a aprender, para beneficiar-se das oportunidades
oferecidas pela educação ao longo de toda a vida.
• Aprender a fazer, a fim de adquirir, não somente uma qualificação profissional mas,
e uma maneira mais ampla, competências que tornem a pessoa apta a enfrentar
numerosas situações e a trabalhar em equipe. Mas também aprender a fazer, no âmbito
das diversas experiências sociais ou de trabalho que se oferecem aos jovens e
adolescentes, quer espontaneamente, fruto do contexto local ou nacional, quer
formalmente, graças ao desenvolvimento do ensino alternado com o trabalho.
• Aprender a viver juntos desenvolvendo a compreensão do outro e a percepção das
interdependências — realizar projetos comuns e preparar-se para gerir conflitos — no
respeito pelos valores do pluralismo, da compreensão mútua e da paz. • Aprender a ser, para melhor desenvolver a sua personalidade e estar à altura de agir
com cada vez maior capacidade de autonomia, de discernimento e de responsabilidade
pessoal. Para isso, não negligenciar na educação nenhuma das potencialidades de cada
indivíduo: memória, raciocínio, sentido estético, capacidades físicas, aptidão para
comunicar-se (DELORS, 1998, p.101-102).
Nesse sentido, o sujeito aprendente aprende “ao longo de toda a sua vida no seio do
espaço social constituído pela comunidade a que pertence” (DELORS, 1998, p. 111), na
perspectiva “do exercício de uma cidadania ativa.” (DELORS, 1998, p. 105). Em termos da
formação do trabalhador, considero que a organização empresarial se constitui em lócus de
aprendizagem, pois o sujeito aprendente aprende na e com a organização.
Na próxima seção, apresento o trabalho de campo realizado em uma empresa de grande
porte, do ramo alimentício, no qual procurei problematizar perspectivas singulares de diferentes
atores sociais que vivenciam as transformações do mundo do trabalho e nesse contexto
aprendem no e com o trabalho.
101
5 SUJEITO APRENDENTE E EDUCAÇÃO NA EMPRESA: QUESTÕES
EMERGENTES
Na presente seção, apresento o trabalho de campo. Inicialmente mostro a metodologia
e o conjunto de procedimentos pelos quais procurei problematizar o sujeito aprendente e a
educação na empresa, a partir de perspectivas singulares de diferentes atores sociais que
compõem o cenário organizacional. Na sequência, formulo um conjunto de resultados que se
constituem em indícios de questões que emergem de tais práticas singulares. O termo indício
está sendo aqui empregado no sentido de Ginzburg (1989, p. 177):
[...] o mesmo paradigma indiciário usado para elaborar formas de controle social
sempre mais sutis e minuciosas pode se converter num instrumento para dissolver as
névoas da ideologia cada vez mais, obscurecem uma estrutura social como a do
capitalismo maduro. [...] se a realidade é opaca, existem zonas privilegiadas – sinais, indícios – que permitem decifrá-la.
Os indícios estão organizados em três subseções que se constituem cada uma em
hipóteses de análise. Estas sinalizam para potenciais pesquisas subsequentes a presente
dissertação, tendo em vista aprofundar o tema da formação do trabalhador na perspectiva do
sujeito aprendente.
5.1 ESCUTA SINGULAR DE TRABALHADORES
O problema do sujeito aprendente foi abordado de forma exploratória, pela via da
pesquisa qualitativa a qual propicia condições para: “incorporar a questão do significado e da
intencionalidade como inerentes aos atos, às relações, e às estruturas sociais, sendo essas
últimas tomadas tanto no seu advento quanto na sua transformação, como construções humanas
significativa.” (MINAYO, 1996, p. 10, grifo nosso). Assim, trata-se de analisar transformações
do mundo do trabalho considerando diferentes perspectivas de sujeitos singulares implicados
na organização empresarial, em diferentes funções, ou seja, a partir de diferentes pontos de vista
complementares (ARDOINO, 1998).
O trabalho de campo foi realizado em uma empresa de grande porte, do ramo
alimentício, da região do Meio-Oeste catarinense. Nos últimos anos, a empresa passou por um
amplo processo de modificação e modernização na fabricação de produtos e modelo de gestão;
aumento expressivo do número de produtos ofertados no mercado; ampliação da visibilidade
102
pública da empresa em âmbito nacional. Recentemente recebeu prêmios, considerados
importantes pelo setor os quais evidenciam o reconhecimento da empresa pelos consumidores.
A empresa é especializada em laticínios40 e conta com quatro décadas de presença no
mercado. A sede da empresa se situa em cidade do Meio-Oeste catarinense, com filial no Oeste
do estado e unidades terceirizadas no Paraná e Goiás. São mais de 1,4 mil colaboradores diretos
e 9 mil produtores de leite nos três estados, os quais participam atualmente da produção de mais
de 200 produtos. A empresa monitora a procedência e a qualidade de sua principal matéria-
prima, acompanhando as práticas de produção desde a extração do leite até o processamento e
entrega do produto industrializado no ponto de venda.
A missão da empresa é “oferecer alimentos com qualidade e inovação, adicionando
valor aos clientes, colaboradores, acionistas e a sociedade com responsabilidade
socioambiental.” A visão é “ser reconhecida como indústria alimentícia de alta qualidade,
posicionando-se entre as maiores do segmento lácteo, com resultados empresariais acima da
média do setor.” Seus valores pautam em “respeito, comprometimento, trabalho em equipe,
motivação e honestidade.” A política da empresa expressa-se em um: “modelo de gestão:
oferecer aos clientes produtos diferenciados com base em inovações tecnológicas, matéria-
prima selecionada e elevado nível de serviço.”
Segundo dados públicos disponibilizados no site, a empresa desenvolve estratégias de
sustentabilidade para preservação do meio ambiente referentes a resíduos tóxicos e tratamento
da água, além de desenvolver projetos sociais de educação ambiental. Também conta com
política de segurança alimentar através da fiscalização de diferentes etapas do processo
produtivo tendo em vista a qualidade dos produtos para o consumidor. No âmbito de segurança
no trabalho, a empresa busca promover a integridade física de colaboradores em relação às
situações de risco e emergência.
O trabalho de campo foi realizado considerando pressupostos da metodologia da
entrevista compreensiva, nos termos propostos pelo sociólogo francês Jean-Claude Kaufmann
(2013). A entrevista compreensiva produz uma ruptura progressiva com o senso comum em um
processo circular que compreende diferentes elementos articulados entre si: a escuta atenta, o
recuo do pesquisador, compreensão e análise crítica. A palavra é considerada como um sistema
em rede que expressa valores do sujeito, na construção da singularidade, na relação com o outro
e na sua imersão cultural e social.
40 As informações aqui apresentadas são uma síntese por mim elaborada a partir de dados provenientes do site da
empresa, o qual não será explicitado para preservar o anonimato da fonte.
103
Em minha prática profissional como psicóloga em organizações, tenho experiência com
a realização de entrevistas e, em particular, a entrevista comportamental com foco em
competências. Trata-se “uma técnica de investigação comportamental em que se procura
identificar no perfil do candidato comportamentos específicos que são pré-requisitos para o
sucesso do cargo que está sendo selecionado.” (RABAGLIO, 2014, p. 43). Em outros termos,
esse tipo de entrevista trabalha em base de um resultado esperado a partir do perfil do cargo
que é pré-estabelecido, padronizado: se trabalha com “perguntas específicas para investigação
de competências específicas.” (RABAGLIO, 2014, p. 49).
A entrevista compreensiva como metodologia de pesquisa em educação exigiu a
elaboração de um roteiro com tópicos referentes a uma síntese de ideias presentes nas revisões
bibliográfica e documental (Apêndice A). Com esse roteiro, procurei elaborar um esquema de
ideias para compreender o ponto de vista singular de cada informante, em relação às
transformações do mundo do trabalho no contexto da sua própria prática. Segundo Kaufmann
(2013, p. 74-75),
a grade de perguntas é um guia muito flexível no quadro da entrevista compreensiva.
Uma vez redigidas, é raro que o investigador tenha que lê-las ou ordená-las uma após
a outra. É um simples guia para fazer os informantes falarem em torno de um tema,
sendo que seu ideal é o de estabelecer uma dinâmica de conversação mais rica do que
a simples resposta às perguntas, evitando que se fuja do tema e, de certa forma, se
esqueça da grade. Mas para alcançar isso é necessário que ela tenha sido anteriormente redigida com atenção, totalmente assimilada, praticamente decorada. Certos
pesquisadores elaboram sua grade de forma muito geral, às vezes sob a forma de temas
simples.
Para esse autor, a entrevista compreensiva supõe que o pesquisador consiga construir
uma situação de troca: “para atingir as informações essenciais, o pesquisador deve se
aproximar, de fato, do estilo da conversa sem se deixar levar por uma verdadeira conversa: a
entrevista é um trabalho, exigindo um esforço constante.” (KAUFMANN, 2013, p. 79-80). Tal
estilo de conversa exige um cuidado sociopolítico:
o ideal é romper a hierarquia sem cair numa equivalência das posições: cada um dos
dois parceiros mantém um papel diferente. O pesquisador é o condutor do jogo [...] O
informante se surpreende por ser ouvido profundamente [...] Ele não é vagamente
interrogado a respeito de sua opinião, mas por aquilo que possui um saber precioso
que o entrevistador não tem [...] para encontrar a pergunta certa, não há outra solução que não seja a de se colocar intensamente na escuta do que é dito e de refletir a respeito
enquanto o informante fala (KAUFMANN, 2013, p.80-81).
Para entrar na empresa, realizei um processo de negociação com colegas psicólogas
vinculadas ao setor de Gestão de Pessoas. A base da negociação foi o projeto-proposta de
104
pesquisa, no qual explicitei de forma sintética a problemática, os objetivos e a metodologia de
trabalho. Na sequência, também apresentei o roteiro das entrevistas na forma de questões,
considerando solicitação que me foi feita pelas referidas colegas.
Estas selecionaram e agendaram os trabalhadores que seriam entrevistados
considerando o critério de heterogeneidade de funções que eu tinha proposto. Segundo
Kaufmann (2013, p. 74), “mais do que constituir uma amostra, trata-se de escolher bem os seus
informantes.” Não tive acesso aos critérios da empresa para escolha dos entrevistados. Nesse
contexto, entendo pertinente observar que minha posição é de agente externo em relação ao
contexto do campo, o que determina limites significativos de acesso a informações referentes
aos processos de trabalho da empresa.
As entrevistas foram realizadas com cinco sujeitos que ocupam diferentes cargos em
diversos setores. A seguir, apresento elementos de perfil de cada informante, considerando a
ordem das entrevistas realizadas: E1, E2, E3, E4, E5.
E1 (Analista de Gestão de Pessoas) - trabalha na empresa há nove anos, tem formação
no curso de Tecnólogo em Processos Gerenciais e Pós-Graduação em Gestão de Pessoas. Sua
carreira profissional na empresa iniciou com trabalhos na recepção, onde ficou quatro anos. Há
cinco anos trabalha no setor de Gestão de Pessoas, área de Treinamentos, no cargo de Analista
de Gestão de Pessoas.
Eu tinha esse objetivo em trabalhar na gestão de pessoas e fiquei esse tempo na
recepção, e da recepção tive a oportunidade de iniciar no setor e hoje faz cinco anos
que estou trabalhando na área de treinamentos. [...] quando eu entrei na parte de
Gestão de Pessoas, eu entrei estruturando essa parte de treinamentos (E1, p. 1).
E2 (Operador de Produção) – trabalha na empresa há seis anos. Cursou o ensino
fundamental incompleto. Iniciou no cargo de Operador de Produção, trabalhando durante esse
período em dois setores da empresa.
Eu comecei há seis anos, em 2010. Eu trabalhei sempre na agricultura, sempre fui
agricultora e optei por vim trabalhar na empresa. [...] fiz a seleção lá embaixo e passei.
Entrei para o setor do creme e manteiga, trabalhei dois anos, daí surgiu que eles
precisassem que eu fosse trabalhar na osmose, setor da osmose. [...] e lá já estou há
três anos e meio. Em outubro, dia vinte um vai para seis anos de empresa. [...] eu tenho só até a quarta série. Estudei até o quarto ano e parei, por ter que ajudar o pai e a mãe
na roça e assim foi ficando os estudos de lado (E2, p. 1).
E3 (Coordenador de Almoxarifado) – possui curso técnico no Senai e graduação em
Administração de Empresas, trabalha há dois anos na empresa. Iniciou sua carreira como
105
Analista Administrativo, passando a Supervisor de Almoxarifado e, nesse momento, está no
cargo de Coordenador de Almoxarifado.
Após a formatura eu trabalhava em uma empresa de sistemas, de suporte de sistemas
era um Analista de Sistemas e surgiu uma oportunidade aqui. [...] eu entrei como
Analista Administrativo, depois de cinco meses eu já passei para Supervisor de
Almoxarifado e, após mais uns seis meses, se não me engano, já estava com uma
posição de Coordenação de Almoxarifado. A mudança, realmente foi dada por mim,
mas a principal questão foi desde aquele período da faculdade, por causa daquelas
pessoas específicas que demonstraram que não é somente a teoria dentro da sala de aula, que é muito mais a conversa simples, uma troca de experiência, um evento em
específico que você convive, [...] você vê que tudo é uma questão de conhecimento,
quanto mais conhecimento é algo que acaba agregando ao ser humano. [...] eu
realmente vim para ser a diferença. [...] já vai fazer dois anos agora dia 11 de agosto
que eu estou aqui (E3, p. 1).
E4 (Operador de Produção) – trabalha na empresa há vinte anos. Possui ensino médio
incompleto. Atualmente encontra-se na função de Operador de Empilhadeira; anteriormente
trabalhou na área de carregamento.
[...] na verdade eu sou agricultor. Como eu tinha investido em vacas leiteiras, na
época, não fui bem-sucedido, eu acabei optando por trabalhar como funcionário. Dei
meu nome na empresa, fui chamado, [...] e mesmo assim eu concilio a vida na
agricultura. Trabalho na empresa que trabalha com leite, eu ainda vendo leite para a
empresa [...] foi difícil no começo porque vim da agricultura, estava lá meio sozinho,
de repente você está numa empresa fechada [...]. Então a gente já se sente um
pouquinho tímido em relação à juventude que tinha, que trabalhava no mesmo setor.
Fiz dois anos de segundo grau só e parei (E4, p. 1-2).
E5 (Gerente de Produção) - profissional da empresa há doze anos. Iniciou sua carreira
profissional como Auxiliar de Produção, depois passou a Supervisor de Produção; atualmente,
atua como Gerente de Produção. Formado no curso de Tecnólogo em Processos Gerenciais e
especialista em Engenharia de Produção, supervisiona uma equipe de cinco supervisores e uma
média de quatrocentos funcionários.
[...] eu tinha dezoito anos naquela época, foi na antiga sede que fica na cidade.
Comecei como auxiliar de produção na linha de queijos, depois disso fui passando em
outros setores, creme de leite, pasteurização e depois saí da empresa e fiquei dois anos
fora, fui morar na Alemanha, trabalhei lá dois anos. [...] eu voltei como auxiliar de
produção e fui subindo até que em um rearranjo dentro da organização surgiu uma
vaga de supervisor de produção. [...] passei a trabalhar em turno, como supervisor de
produção. Trabalhei aproximadamente uns dois anos como supervisor de produção e
depois em um novo rearranjo da organização surgiu essa vaga de gerência em um dos
blocos de produção. [...] entrei assim que conclui o ensino médio, como auxiliar de produção, tinha apenas saído do segundo grau. Eu fiz a graduação cinco anos depois.
E a pós-graduação mais uns cinco anos depois (E5, p. 1).
106
Todos os sujeitos foram previamente consultados sobre sua disponibilidade para realizar
a entrevista e seu acordo foi expresso pela assinatura de um Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (Apêndice B). Para fins de registro, as entrevistas foram gravadas em um aparelho
smartfhone. Observei que essa técnica não constrangeu os informantes.
O conteúdo das entrevistas foi integralmente por mim transcrito. Eu nunca tinha
realizado um trabalho de transcrição e me dei conta que esse exige uma atenção redobrada para
muitos detalhes do discurso do informante. Em consequência, necessitei reescutar as gravações
muitas vezes, para ter condições de entender o que estava sendo dito. Trata-se de um trabalho
longo e exaustivo e que requer persistência.
A sistematização e a análise de dados foram realizadas com base nos momentos da
análise de conteúdo, nos termos propostos por Bardin (1977): a pré-análise, a exploração do
material, o tratamento dos resultados, inferência e a interpretação. Para Kaufmann (2013, p.
119), “o tratamento não consiste simplesmente em extrair o que está nas gravações e ordená-
lo. [...] é preciso fazer os fatos falarem, encontrar indícios, se interrogar a respeito da mínima
frase.” Trata-se de um trabalho minucioso, que requer concentração. Em relação ao conteúdo
sistematizado, observei que a entrevista compreensiva leva a produção de um material que
permite, ao mesmo tempo, acumular dados objetivos significativos sobre a prática singular do
sujeito, assim como perceber implícitos do discurso do entrevistado. Na sequência, apresento
resultados das referidas sistematização e análise de dados, organizados em três subseções com
o objetivo de evidenciar particularidades da educação na empresa considerando efeitos de
transformações do mundo do trabalho no sujeito aprendente.
5.2 NOVAS TECNOLOGIAS E NOVAS EXIGÊNCIAS
As transformações do mundo do trabalho e as consequentes modificações dos modelos
de produção e de gestão repercutem no conjunto diversificado de setores da empresa. A
industrialização abrange, além dos locais de trabalho, também a vida cotidiana do trabalhador.
A gradativa substituição do trabalho manual pela mecanização e depois pela automação leva o
trabalho humano a ser substituído paulatinamente pela máquina. Esse contexto de constantes
mudanças produz diferentes exigências, tanto técnicas quanto sociais, implicando o trabalhador,
sujeito aprendente, na sua totalidade existencial-profissional.
107
Essa mudança foi muito grande, os processos tecnológicos, eu acompanhei muita
troca de equipamentos, a gente tinha uma fábrica muito manual, agora tem uma
fábrica muito automática. Você não vê o leite desde a entrada até a hora que ele está
na caixinha (E5, p. 6).
[...] noventa por cento era tudo manual, todo mundo entrava batendo caixinha. Tinha
que montar a caixinha, colocar o leite dentro [...] todo mundo começou ali. [...] ainda
falta uns dois robôs, mas setenta por cento está automatizada. Você só põe o material
na máquina na hora que embala o leite, faz a caixinha, monta, cola. Tem o robô que
paletiza. [...] tem quatro máquinas que ainda é manual. Mas a caixinha já vem pronta,
você só paletiza. Quando começou nós tínhamos que montar a caixinha, colocar o leite dentro e paletizar, agora é plastificado. Hoje já a máquina monta a caixinha,
coloca o leite dentro, a outra máquina plastifica, então o manual é só paletizar, outras
partes é robôs, tem quatro ou cinco robôs fazem tudo. A máquina continua, a máquina
encaixotadeira, plastificadeira e o robô termina a paletização (E4, p. 2).
Aqui na empresa mudou bastante [...] quando eu entrei, nós pegávamos os potes de
creme encaixotava, agora já é uma máquina que traz o pote, a máquina monta o
fardinho, já sai pronto, não precisa ser manual. [...] só precisa ser guardado ali no
pallet. [...] ficou bem mais organizada, porque ali iria precisar mais pessoas para fazer
esse serviço. Agora uma das pessoas pode cuidar a máquina, a outra já vai fazer outro
serviço. [...] são vários produtos num setor e continuou os mesmos funcionários (E2, p. 5).
A passagem do modelo fordista para o modelo toyotista instaura um ambiente de
numerosas e contínuas modificações no processo de trabalho. Nesse contexto em movimento
do trabalho vivo (MARX, 1996), o sujeito aprendente confrontado com novas máquinas e
equipamentos desenvolve um saber próprio (FERNÁNDEZ, 2001) referente a competências
técnicas – (re)aprender a fazer (DELORS, 1998), para conseguir realizar a tarefa para a qual
está designado. Em outros termos, formas de organização e de gestão do trabalho produzem
situações imprevistas que convocam em ato a capacidade de iniciativa e de criatividade do
trabalhador (DEJOURS, 2012).
Hoje eu cheguei, a pressão do filtro da desnatadeira, eu nunca tinha aberto e lavado,
porque eles instalaram faz poucos dias. Então eu tive que fechar os registros, abrir,
lavar esse filtro com água, bem lavadinho com a esponjinha e montar de novo. [...] eu
já aprendi [...] já é uma experiência de como que eu tenho que fazer (E2, p. 11).
Eu não tive um curso de LNT41, eu não tive um curso PAT, que me direcionasse e
dissesse assim: você tem que fazer dessa forma, é esse o procedimento. O
procedimento que a gente tem hoje fui eu que criei. Na minha percepção está
funcionando muito bem, porém se eu conseguir aprimorar mais, vai ficar melhor (E1,
p. 13).
No modelo taylorista/fordista, as relações sociais entre os trabalhadores são
consideradas “desnecessárias” para a produção em série de bens de consumo de massa. No
modelo toyotista, o processo de produção flexível está baseado em posto de trabalho em células
41 Levantamento de Necessidades de Treinamento (LNT); Planejamento Anual de Treinamento (PAT).
108
e no trabalho em equipe. O sujeito aprendente da sociedade do conhecimento (ASSMANN,
2007), diante da necessidade de compreender sobre novas práticas técnicas, pode encontrar em
colegas, sejam superiores, sejam pares hierárquicos, a fonte para apropriação de novos
conhecimentos (FERNÁNDEZ, 2001), através de laço social construído com base no
reconhecimento do outro (DEJOURS, 2012). Nesse sentido, a aprendizagem do trabalhador
acontece a partir de relações sociais em uma dinâmica que Delors (1998) chama de aprender a
fazer.
Hoje a gente visita fábricas, vai em outras unidades. Tem fornecedores que estão
sempre em conversa, a gente tem colegas de profissão. A gente sempre está trocando
figurinhas. [...] A partir do momento que você cria empatia, você não tem mais tantos
obstáculos. Se você tem, você busca ajuda de alguém que tenha aquele conhecimento.
[...] A partir do momento que você criou empatias em um grupo, as soluções aparecem
(Gerente de Produção: E5, p. 7-8).
Quem me ensinou, me ensinou bem mesmo, sabe, foi um professor que se precisava
explicar dez vezes, o colaborador que trabalhava comigo, ele explicava; não faltou de
ele ensinar nenhuma vez (E2, p. 7).
[...] eu aprendi muita coisa com as meninas, a como você se comportar diante de
algum conflito [...] você a única pessoa que não é formada em psicologia, no meio de
quatro psicólogas!!! Você só tem a aprender!!! (E1, p. 13).
No taylorismo/fordismo, há decomposição do processo de trabalho e o trabalhador
realiza sua tarefa repetitiva de forma fragmentada e isolada, na cadeia de produção em massa.
As mudanças provocadas pelo modelo flexível de organização e gestão do trabalho
constrangem o sujeito aprendente a desenvolver diversas competências simultâneas tendo em
vista construir uma prática profissional polivalente e multifuncional.
[...] a gente não tem só uma função específica [...] até pelo tamanho da empresa e
como é o nosso setor de Gestão de Pessoas [...] a gente atende todos os colaboradores
da empresa. [...] tem várias atividades que precisa desenvolver, não é específico numa
área só. [...] além da descrição de cargos, avaliação de desempenho e organogramas da empresa; parte de treinamentos que envolvem orçamentos, alimentação PAT (E1,
p. 1).
Taylor cronometrou o tempo necessário para cada movimento do trabalhador na
realização de tarefas compartimentadas. No trabalho flexível, há uma condensação do tempo
por razões diversas e associadas. As novas tecnologias produtivas (automação, robotização) e
organizacionais (just-in-time) reduziram drasticamente tanto o número de trabalhadores quanto
o volume de materiais necessários para a produção (HARVEY, 2011). Nesse contexto, o sujeito
aprendente é capturado por uma exigência de reaprender a gerir um tempo, pessoal e
109
profissional, no qual cada unidade cronológica é cada vez mais ocupada por atividades
diversificadas e simultâneas.
A gente tem um ditado, dos funcionários aqui dentro, “que a empresa tem o tempo
certo dela”, como tudo tem seu tempo, a empresa também tem o tempo certo dela.
Eles têm projeto, tem, mas o projeto demora 2, 3 anos para se firmar, mas se firma.
[...] realmente a gente não tem muito tempo, a gente até gostaria de aprender mais
uma com a outra, mas cada uma no seu ritmo de trabalho, a demanda é muito grande.
[...] é que não dá tempo, a gente não tem tempo suficiente para aprender o que a outra
está fazendo (E1, p. 8).
Hoje, é a administração do tempo. [...] como trabalhar o tempo. Você está sempre
ocupado. Sempre tem uma prioridade. Acho que esse é o maior desafio, trabalhar com
o tempo. O tempo que você tem, mas saber as priorizações, não só do trabalho
profissional, mas o pessoal. O que você quer? O que te move? O que você precisa?
Qual é o teu combustível? Então para mim o tempo. O teu tempo, usar seu tempo,
gastar teu tempo em coisas que vão te trazer benefícios tanto profissional como
pessoal, administrar esse tempo. [...] o processo não para. Está sempre em andamento.
Não pode parar, a empresa trabalha vinte e quatro horas por dia, 365 dias no ano (E5,
p. 7).
[...] o foco é a família. [...] chego às nove, nove e cinco em casa. Ali a gente vai se organizando. [...] E o dia que está de folga já vira o domingo da gente, você já quer
ficar mais tranquilo, não tem aquele horário para cumprir (E2, p. 4).
As transformações do mundo do trabalho modificam o ambiente da organização e a
gestão do trabalho a realizar: “[...] colocaram uma máquina nova lá na fábrica, não foi orçado
porque até então não tinham ideia de que iriam comprar. Compraram e as pessoas precisam ser
treinadas.” (E1, p. 5). Novas exigências produzem, em consequência, demandas e necessidades
para formação profissional, tema que abordarei a seguir.
5.3 FORMAÇÃO PROFISSIONAL
A formação para a empregabilidade emerge como uma exigência do contexto atual do
mundo do trabalho, pois o trabalhador necessita de escolaridade e formação técnico-
profissional para o desenvolvimento de diferentes competências (FRIGOTTO, 2005). A
formação para o trabalho é adquirida através de relações sistematizadas com conhecimentos
disponibilizados em diferentes espaços formativos. Nesse contexto, o trabalhador estabelece
relação com conteúdos referentes a equipamentos, ferramentas, máquinas, entre outros, que
exigem capacidades cognitivas complexas (KUENZER, 2003).
As transformações do mundo do trabalho compõem um cenário da sociedade do
conhecimento (ASSMANN, 2007), em que o sujeito aprendente se encontra em processo
110
contínuo de modificação do mundo e de si mesmo, em diferentes instancias de experiência,
pessoal e profissional ao longo de toda a sua vida (DELORS, 1998).
É um aprendizado constante, isso todo dia. Que começa desde o momento que você
acorda da cama e você pega alguma notícia em específica que você vai ler, que você
agrega alguma coisa de atualidade, alguma coisa de história [...] dificilmente vou estar
sem estar estudando alguma coisa (E3, p. 9).
Todo o momento está tendo mudanças, você tem que estar muito atualizado. [...] se
manter atualizado. [...] as mudanças são muito rápidas, e é você não ficar obsoleto,
não parar no tempo. E não se acomodar, [...] sempre estar fazendo coisas novas,
networking com o mercado. Estar sempre antenado com tudo o que está acontecendo.
Esse é o maior desafio de qualquer profissional que está dentro de uma indústria, não
se tornar obsoleto (E5, p. 5-6).
No contexto do trabalho flexível, a formação do trabalhador é realizada de duas formas
complementares, seja ofertada pela própria empresa, seja providenciada pelo próprio
trabalhador. No entanto, dados do trabalho do campo evidenciam certo predomínio da
responsabilização do sujeito aprendente em relação ao seu processo formativo, considerando
necessidades e demandas emergentes da respectiva atividade profissional. Esse voluntarismo
expressa, a meu ver, um impacto de valores vigente no ambiente organizacional competitivo
toyotista que valoriza uma atitude constantemente proativa do trabalhador.
A empresa está dando oportunidade de disponibilizar um gerente uma hora
semanalmente, para que ele venha dar o treinamento, disponibilizar a hora do
funcionário, ao invés de ele estar trabalhando, ele está estudando. Ela disponibiliza
todo o material (E1, p. 1).
Na época que eu estava na recepção eu estava fazendo faculdade e fui atrás de conhecimentos para a recepção. [...] Uma das coisas eu busquei por conta própria:
cursos de telefonista, de secretariado; mas algumas oportunidades, a empresa me deu,
na parte de recepção. [...] A maioria dos treinamentos que eu fiz foi mesmo por conta
própria, alguns a empresa me proporcionou pela empresa, mas eu não fico esperando
a empresa me oferecer (E1, p. 12).
Na questão de conhecimento, sempre busco, não espero a empresa me dizer, você tem
que fazer isso. Vou de acordo com a minha necessidade, então se eu quero ser a melhor
pessoa na parte de treinamento eu vou em busca de mais conhecimento, até em casa,
vai ler artigos, buscar na internet, vai buscar conhecimento, uma palavrinha diferente
que você nunca escutou, vai pesquisar o que significa (E1, p. 12).
Quando inicia uma turma o gerente encaminha para nós o nome de pessoas que
tenham esse perfil; indicam pessoas que tenham perfil de liderança e que futuramente
possam vir a exercer cargo de liderança e a gente prepara essas pessoas (E1, p. 9).
Ao referido ambiente competitivo se soma visível clima organizacional que pressiona o
trabalhador a buscar, incessantemente, diferentes oportunidades a agregar a sua trajetória formativa.
Observo, em consequência, certo ativismo que leva o sujeito aprendente a acumular diferentes e
111
sucessivos cursos, cujo fio condutor de articulação nem sempre é evidente, indicando assim uma
superposição quantitativa dissociada do contexto singular profissional.
[...] tem a prova final do FLT e na semana que vem tem a formatura, a direção vem,
tem os diretores executivos e demais diretores, eles vêm, dão feedback. Entrega
certificado (E1, p. 10).
Estou fazendo Planejamento e Gestão Estratégica. [...] é on-line. [...] é encaminhada
a parte da grade curricular para o Diretor imediato, o gerente imediato e eles vão
verificar essa questão se é benefício para a empresa e até quarenta por cento de ajuda com o custo da mensalidade desse curso eles acabam cedendo, que é o meu caso, que
eu também tenho esse auxílio (E3, p. 6).
A empresa entrou com cinquenta por cento e eu como profissional entrei com
cinquenta por cento. [...] você sabe né, é muito mais para mim do que para a empresa.
Mas eles investiram. Sempre tem essa participação da empresa junto. [...] eles
pagaram quarenta por cento da minha pós-graduação (E5, p. 3).
O trabalho de campo me levou a observar uma concomitância entre pressupostos de
modelos de gestão que, por definição, são distintos, por exemplo, em um contexto
organizacional caracterizado principalmente por um processo de trabalho que vai sendo
modernizado pelo uso crescente de novas tecnologias, evidenciam-se situações educativas nas
quais o sujeito aprendente está sendo formado em dispositivos de tipo marcadamente fordista,
pois centrados na qualificação para a execução de tarefas.
Esse treinamento tem cronograma, disciplinas, as disciplinas que vão ser abordados,
o material didático. A gente controla tudo no RH, desde frequência, atividades que
são solicitadas [...] (E1, p. 9).
Aqui a gente faz uma reciclagem, o Técnico de Segurança faz uma vez por ano uma
reciclagem. Mas só dentro da empresa. [...] faz uns dezessete anos que a gente fez o
curso de Operador de Empilhadeira pelo Senai (E4, p. 1).
A gente faz essa análise para ver realmente se a gente está dando treinamento para
ensinar o funcionário, para ajudar o funcionário no processo, na atividade dele, ou se
a gente simplesmente vai dar o treinamento porque o funcionário nunca teve
treinamento, ou só porque o gerente resolve (E1, p. 5).
[...] é obrigação da empresa também treinar todos os funcionários. [...] em “Boas
práticas de fabricação”. Toda a quinta-feira de manhã e de tarde o pessoal da qualidade
repassa esse treinamento de uma hora e meia, [...] faz uma avaliação final para ver se o funcionário realmente entendeu, para que eles sempre tenham isso ativo na memória.
Porque “Boas práticas de fabricação”, é um dos temas que precisa ser e estar revisando
com os funcionários o tempo todo (E1, p. 4).
Descrição de cargos junto com avaliação de atendimento, então a parte técnica é essa
descrição que a gente avalia. O operador de TBA a gente tem toda a descrição, a parte
de requisitos tem os conhecimentos e treinamentos que precisa ter para essa função,
para que ele precisa desenvolver. No caso, atitudes é igual para todo mundo, é padrão
(E1, p. 6).
112
O princípio da repetição de procedimentos e de gestos próprios ao modelo taylorista/fordista,
de certa forma, é transposto e se reproduz no modelo toyotista pelo menos em algumas organizações.
Essa aparente contradição se evidencia em dados do campo que mostram indícios de estratégias
educativas que têm como objetivo explicitar particularidades do trabalho prescrito (DEJOURS, 2012)
da empresa em pauta, trabalho esse considerado escopo tático que garante competitividade e
sobrevivência da empresa no mercado. Tais indícios também mostram, a meu ver, que em tais
situações o sujeito aprendente se encontra submetido a dispositivos formativos caracterizados pela
transmissão mecanicista de conhecimentos, tendo em vista a expectativa de reprodução de discursos
e de práticas organizacionais padronizadas.
[...] um PDI, Plano de Desenvolvimento Individual. O que que é esse PDI? Você faz
junto com o nosso RH, onde se faz entrevista, quando é superior, no caso o Diretor,
onde ele passa as competências que nós precisamos melhorar. [...] em cima disso é
montado um plano de desenvolvimento, onde o RH monta uma estrutura que você vai desenvolver essas habilidades. [...] E essa parte do PDI é só comportamental. (E5, p.
2).
[...] não tinha um registro de treinamento. Às vezes, tinha setor que dava treinamento
e não era registrado. Hoje para nós aqui na empresa é muito importante que seja
comprovado que o treinamento foi realizado. Então hoje a gente trabalha todos os
treinamentos que são dados internamente, sejam eles in company, empresas que vêm
dar o treinamento, ou os próprios colaboradores, os facilitadores, a gente utiliza um
padrão de registro de treinamento. Esse padrão é feito em todos os lugares, filiais,
matriz. Tudo o que é treinamento, [...] tudo o que for orientação que você dá para o
funcionário, treinamento que você vai ensinar algo a ele, você registra. Então tem tudo registrado, a gente tem tudo isso arquivado, a gente lança no sistema (E1, p. 2).
O ano passado em outubro a gente fez o LNT e por determinação da direção e para
ajudar nós no RH ficou determinado que só serão realizados os treinamentos que
foram orçados. [...] a gente encaminhou e-mail a todos os gerentes de área, para que
os mesmos passassem para nós as necessidades de treinamentos do setor, porque
melhor do que ninguém é o gerente para saber qual é a necessidade do funcionário
(E1, p. 5).
Mas eu me preparando, a empresa me dando essa oportunidade, eu estarei preparado
para o mercado. [...] eu senti que as oportunidades estavam aparecendo, as
oportunidades estavam vindo e eu sabia que eu tinha que me preparar para essa demanda, para atender a essas expectativas que em mim estavam sendo depositadas.
A graduação e a pós-graduação veio de encontro a isso. Deu para atender esses
anseios. Se eu não tivesse a graduação, não estaria onde eu estou (E5, p. 4-7).
[...] formação de líderes. O FLT. É um projeto que foi implantado em 2012. Todas as
gerências, seja operacional ou administrativo vão estar indicando essas pessoas e nós
do setor de RH vamos chamar individualmente, cada um para explicar o processo para
pedir se é isso realmente que eles querem, se eles querem esse compromisso a mais
na vida deles. A gente joga todas as alternativas, para ver se realmente a pessoa quer,
porque se é uma pessoa que não tem interesse ela já vai falar de cara. Assim como
acontece na entrevista, e dessas entrevistas individuais a gente vai analisar se realmente a gente vê essa pessoa com o perfil (E1, p. 9).
113
No modelo de gestão taylorista/fordista, há explicitamente uma separação entre as
funções de planejamento/preparação e a execução de processos organizacionais. Nesse modelo,
a liderança está concentrada no controle da produção em detrimento dos trabalhadores. No
modelo toyotista, em um contexto flexível caracterizado pelo fluxo contínuo de produção, na
educação corporativa executivos atuam como líderes educadores para desenvolvimento de
diferentes competências de trabalhadores em diferentes tipos de dispositivos formativos
(EBOLI, 2005). Assim, o sujeito aprendente é encorajado pelo líder a desenvolver suas
diferentes competências, sendo acompanhado e avaliado. A liderança corporativa articula a sua
prática educativa, objetivos, estratégias e metas do negócio da empresa. Nesse sentido, sua
intervenção contém elementos de controle social de ações dos trabalhadores, sejam explícitos,
sejam implícitos.
Um dos projetos que a gente tem e está com ele e já está indo para a quarta turma é
da escola de liderança que tem aqui dentro. Hoje a gente tem o FLT – Formação de
líderes (nome da empresa). Como que funciona o FLT? É um projeto que foi
implantado em 2012, quando começou a estruturação da Gestão de Pessoas. O curso
tem duração de 1 ano, o projeto é sempre uma vez por semana, é feito aqui nessa
unidade, participam pessoas, funcionárias que tem perfil de liderança (E1, p. 9).
É, vejo que o gerente é um professor. [...] acho que você tem que ser um professor,
precisa estar orientando todo dia. [...] às vezes tem que ser um pouco mais duro, saber
como trata cada pessoa. Cada pessoa você tem um jeito de falar, claro sempre com
educação. Tem pessoas que você tem que ser um pouco mais firme senão ela não
entende a mensagem que você está falando. Tem outras que se você for um pouco
mais firme, elas vão achar que você está agredindo ela. Esse dia a dia de um gerente
é muito mais do que olhar só números (E5, p. 4).
Depois inicia o treinamento e os nossos facilitadores são os próprios gerentes da fábrica e do administrativo. Qual é a ideia de colocar eles? Porque hoje eles estão
como gerentes, mas tiveram todo o crescimento profissional dentro da empresa. Todos
os gerentes com exceção a um ou dois que já entraram com cargo de gerência logo no
início, os demais iniciaram como assistente administrativo, como operador de
máquinas e hoje estão no cargo de gerência. A ideia é colocar eles dando treinamento
para as próprias pessoas que futuramente possam a vir liderar, para eles verem que a
empresa oferece, dá oportunidade para o funcionário (E1, p. 9).
Hoje nós somos instrutores. A gente recebe um tema, pode ser disciplina, organização,
trabalho em equipe. A gente recebe esse tema, trabalha esse tema. Tem o apoio do RH
com isso e depois a gente joga isso para o nosso dia a dia. E traz eles, esse pessoal, os
escolhidos que a gente vê que tem potencial para ser líder e passa para eles uma linguagem de como é ali dentro da fábrica. Como que é a organização, como que tem
que ser, porque é assim. Faz eles ver dentro da fábrica, tudo o que está sendo falado,
toda essa temática que você está trabalhando. Porque você está trabalhando isso. E faz
de uma maneira prática do dia a dia deles. Por isso, então você sai da teoria e você dá
exemplos: você lembra aquele dia, você lembra assim como faz, vocês já viram isso,
viram que funciona? Junta aquelas competências que tem que desenvolver neles com
o dia a dia de uma empresa (E5, p. 4).
114
[...] eu tenho uns três ou quatro colaboradores já que, em todo esse processo, desse
período que eu adquiri a liderança que a gente conversa dos quatro, tem um que já
iniciou a graduação, tem três que estão planejando para fazer isso. Eu continuo tanto
incentivando, até trazendo eu próprio materiais para eles, alguns impressos, alguns
materiais da minha pós-graduação que eu estou fazendo. [...] para você inspirar
alguém, fazer dar o melhor de si. Para ela fazer um bom trabalho que ela vai até sendo
reconhecida (E3, p. 4).
Muitas pessoas não têm o perfil para líder. O líder, ele já nasce com um pouco da
liderança, não adianta a gente dizer que não. Mas aquele que está lá com a liderança
escondida, que nem ele está acreditando nele, acaba aflorando. É o caminho. É o aflorar, acaba aguçando neles (E5, p. 4).
No modelo de produção flexível, trabalhar em equipe se constitui em um dos pressupostos
do processo de trabalho. Esse tipo de sociabilidade organizacional coloca o sujeito aprendente
diante de dois problemas simultâneos: por um lado, a aprendizagem técnica – o saber-fazer, ao
mesmo tempo o trabalhador está situado em uma forma social complexa que exige o
desenvolvimento de aprendizagens referentes ao saber viver juntos (DELORS, 1998).
Saber ouvir as outras pessoas. Já notei que é bastante, que mudou para isso. Que as vezes
foca só num serviço e esquece de ouvir, de se colocar no lugar daquela pessoa que está ali
do lado. [...] você ser uma pessoa sempre do bem. Nunca tentar jogar a culpa em outra pessoa
que acho que não existe isso. Se você errou, é você quem vai assumir. [...] tem que ser
humilde primeiramente, entender o outro e trabalhar em equipe, junto. Precisando de ajuda,
ajuda e o dia que eu precisar, ele também vai me ajudar (E2, p. 8).
A análise de dados do trabalho de campo mostra diversos elementos que evidenciam uma
indissociabilidade entre a trajetória do sujeito aprendente e a organização, ou seja, “quando a
empresa investe no funcionário, ela investe para que o funcionário venha a dar um retorno na
própria atividade, seja ela técnica ou de desenvolvimento pessoal mesmo” (E1, p. 5). Na próxima
seção, abordo o problema da avaliação do trabalhador no processo de trabalho.
5.4 AVALIAÇÃO DO TRABALHADOR NO PROCESSO DE TRABALHO
No modelo de produção e gestão taylorista/fordista, o ambiente e as condições de
trabalho exigem do trabalhador ações em série, repetitivas e padronizadas, condicionadas por
unidades de tempo pré-determinadas e cronometradas; a avaliação do trabalhador está centrada
no produto. O modelo de produção e gestão flexível requer do trabalhador “esforço físico e
comportamental [...] ritmo intensificado, pressão constante por metas e resultados, assim como
aumento de responsabilidades [...] sobrecarga que afeta singularmente a sua vida.”
(CIMBALISTA, 2008, p. 2). Esse modelo toyotista tem como estratégia organizacional a
115
formação por competências; nessa perspectiva, a avaliação do trabalhador considera “sua
individualidade e peculiaridades, criativas e organizacionais.” (CIMBALISTA, 2008, p. 6).
No contexto do trabalho flexível, o trabalhador está submetido a um conjunto de
objetivos e metas que são apreciados por modelos de avaliação de desempenho. Esses modelos
se traduzem, em geral, por instrumentos de medidas quantitativas conforme padrões de
qualidade exógenos ao trabalhador. No contexto da mundialização, as metas organizacionais
são constituídas por diferentes planos acumulados que se articulam entre si, produzindo uma
trama opressiva que pressiona as condições de trabalho e mesmo a saúde do trabalhador
(DEJOURS, 2012). Conforme evidencia o trabalho de campo, a avaliação individual do
trabalhador contém parâmetros referentes aos planos do respectivo setor (célula), da unidade
local e da empresa. Em consequência, o sujeito aprendente aprende a aprender (DELORS,
1998), a constantemente se (re)administrar em um tecido social tenso e contraditório,
trabalhando no hiato entre o trabalho prescrito e o trabalho efetivo (DEJOURS, 2012), como
condição de sobrevivência física, material e subjetiva.
A gente trabalha com metas setoriais, então a gente procura repassar todas essas metas
até o chão da fábrica para eles entenderem, qual é o sentido de eles estarem fazendo
tal função deles (E5, p. 1).
Todos eles têm metas setoriais. A empresa tem metas globais que se desdobram em metas
setoriais. E vai sempre escalonando, até chegar. Hoje a gente tem só até nível de supervisão.
A gente faz as ações e feedbacks em cima dessas metas, claro que tem a parte pessoal que
não está nas metas, e depois eles com isso fazem o feedback que entra um pouco mais nessa
parte comportamental com os funcionários deles (E5, p. 2).
A gente hoje tem feedbacks, são devolutivas que a gente tem a cada tempo, isso não
é feito para mim, eu faço com os meus supervisores e eles fazem com o chão de
fábrica. [...] Sempre que você falar em uma organização, vejo que não tem como não
se pautar em desempenho. [...] tem que ter o desempenho financeiro da empresa, tem
que ter tua parte comportamental. [...] fazer aquele time trabalhar em prol do resultado.
Vai trazer resultado para todo mundo (E5, p. 2).
[...] a gente precisa entregar anualmente é 15 horas por colaborador. [...] que é a meta
da empresa. Então 15 horas por colaborador operacional e liderança. [...] todo mês a
gente passa os indicadores, [...] a gente não tem uma meta mensal. [...] claro que
quanto mais treinamento tiver para nós é melhor porque daí vai chegar em dezembro, a gente vai atingir a meta. [...] a gente tem que batalhar até dezembro para alcançar a
meta, tem que chegar no azul (E1, p. 4).
[...] a avaliação de desempenho a gente trabalhava só com dez componentes e era
comportamental, era mais o comportamento do funcionário que a gente avaliava.
Então uma vez por ano, o gerente ia lá avaliava dava feedback para o funcionário, mas
dentro do comportamento dele. Hoje a gente está com o modelo de avaliação de
atendimento, [...] onde tem três situações na avaliação: a atividade, o que a pessoa faz
na função, item por item; a parte de requisitos que entra a parte de desenvolvimento,
de conhecimento, treinamento, escolaridade, conhecimento na área, a parte de atitudes
que entra a parte comportamental. Então hoje a nossa avaliação, antes tinha uma avaliação só a parte comportamental e hoje a gente avalia três em um (E1, p. 5).
116
No modelo taylorista/fordista, o processo de produção em série supõe um conjunto de
gestos individuais que somados constituem o todo da organização. O modelo toyotista
fundamenta-se em atividades realizadas em equipe, as quais supõem uma captura produtivista
da necessidade do trabalhador de “implicar-se”, ou seja, de se engajar no trabalho e se
reconhecer como parte e mesmo como a própria organização. Para Lourau (2004, p. 189), o ato
de implicar-se corresponde ao conceito de sobreimplicação. Este refere-se ao “sobretrabalho
exigido pela produção de uma mais-valia, de uma rentabilidade suplementar.” Para esse autor:
A sobreimplicação é composta igualmente de virtudes exigidas dos empregados,
hierarquizadas em grades de avaliação [...] se trata de exigir um suplemento do
espírito, garantia de um sobretrabalho diretamente produtor de identificação com a
instituição e indiretamente produtor de mais-valia em favor do empregador – e não
em favor do trabalhador coletivo, cuja cooperação repousaria minimamente, ainda e
sobretudo, na resistência. É a autogestão ou a co-gestão da alienação [...] a
sobreimplicação não só produz sobretrabalho, estresse rentável, doença, morte e mais-
valia como também cash-flow – benefício absolutamente nítido consagrado ao
reinvestimento e, portanto, ao crescimento indefinido da empresa-instituição.
(LOURAU, 2004, p. 192-193, 195).
O sujeito aprendente sobreimplicado internaliza uma identificação com a organização e
se projeta como parte organicamente constitutiva da instituição que, paradoxalmente, beneficia-
se da mais-valia assim produzida. A meu ver, nessa perspectiva da sobreimplicação que se situa,
também, o fundamento toyotista da responsabilização individual do trabalhador.
Quem quer crescer ajudando a empresa, tanto como profissional quanto como ser humano, pode ter certeza que vai crescer. Mas realmente vale a questão de você
agarrar a oportunidade que tu tens, vai de você ter comprometimento com aquilo que
tu fazes e acabar literalmente gostando daquilo que faz (E3, p. 8).
[...] antes era foco literalmente em produção, hoje como a gente está em mudança de
sistema, isso muda muita coisa, porque envolve planejamento, você tem que focar em
qualidade, você tem que focar no teu consumidor final, você tem que focar em
atendimento e não ter ruptura de mercado. Você precisa focar em estratégias
financeiras também que são muito importantes para a saúde financeira da empresa.
Outra questão muito interessante [...] é a gestão do teu patrimônio humano. Porque
sem o patrimônio humano, de nada vai adiantar se você tem máquinas a nível mundial, que são as top [...] de mercado se você não tem um colaborador operando aquela
máquina, que esteja motivado, que esteja disposto a buscar, ser um diferencial, que
seja comprometido com a marca que está lá na prateleira do mercado, que ele tenha
orgulho de ir lá no mercado comprar aquele produto e dizer: esse produto é da minha
empresa (E3, p. 6).
Agora vistam essa camisa e lembrem que vocês também são colaboradores Top of
mind porque vocês também são totalmente responsáveis pela qualidade do produto
que está chegando no consumidor e está fazendo ser a marca mais lembrada, uma das
marcas mais lembradas de Santa Catarina (E3, p. 6-7).
117
Eu vi nascer essa empresa. [...] para mim é uma grande família, sinceramente, eu tenho
minha família. Nossa, aqui é a minha vida. Se você tem um problema e aqui eu
esqueço, sinceramente é meu esconderijo. Mas eu sou muito feliz. O que eu nunca
vou me arrepender é de ter vindo trabalhar aqui (E4, p. 5).
A emergência do modelo de produção e gestão toyotista instaurou uma mudança
paradigmática. O trabalho fragmentado da linha de montagem do taylorismo/fordismo foi sendo
substituído pela organização flexível. Esta exige do trabalhador compreensão sobre o
significado do seu próprio trabalho, assim como demanda responsabilização individualizada
em relação às atividades realizadas no círculo de qualidade no contexto produtivo (DEJOURS,
2012). Assim, processos avaliativos de competências para obter resultados provocam a
emergência de prescrições do trabalho polivalente a ser assumido pelo sujeito aprendente.
Porque eu tenho que varrer isso aqui? [...] qual é o resultado de eu entrar com calçado
fechado? Qual o resultado de eu fazer a higienização? Eu vejo que dentro de uma
indústria de alimentos todos são qualidade. E eu mais do que nunca. Ah! A empresa
tem garantia da qualidade? Tem, são todos. Não é uma pessoa, duas, três que faz isso funcionar. Estamos falando aqui de mais de dois milhões de litros de leite por dia.
Impossível que o setor qualidade vai olhar tudo isso daqui. São as pessoas. Quando se
fala em indústria de alimentos, todo mundo faz parte do processo de qualidade (E5, p.
5).
Hoje o que o mercado de trabalho exige é comprometimento, ele exige
responsabilidade (p. 2) [...] entreguem corretamente, foquem nas metas que a gente
tem no setor. Recebam corretamente, olhem, verifiquem, especifiquem a qualidade do
produto que vocês estão recebendo. [...] vocês são especialistas de qualidade, vocês
são especialistas de materiais aqui dentro e com isso vocês agregam a
responsabilidade de entregar com qualidade e garantir a qualidade do nosso produto final (E3, p. 7).
De seis em seis meses eles fazem avaliação. Eles chamam lá numa sala e vão dizer
qual são os pontos que estão bons, qual que tem que melhorar. Esses são de seis em
seis meses [...] quando a gente começa a trabalhar é avaliado de quarenta e cinco dias
e nos noventa dias que eles aprovam se vai continuar na firma ou não [...] a gente tenta
até melhorar mais (E2, p. 3).
[...] a avaliação das pessoas que eles fazem anualmente [...] toda firma exige que por
mais que você se esforce, nem sempre [...] o ideal para a empresa. Já fomos
comunicados várias vezes, a tendência é sempre melhorar (E4, p. 5).
Na avalição, no feedback que a gente dá para o funcionário, a gente induz o
funcionário a ter essa percepção de que para ele crescer tanto em pontuações da
avaliação como profissionalmente, financeiramente ele tem que seguir a linha de
raciocínio da avaliação (E1, p.5).
A avaliação demonstra muita coisa para você chegar para um funcionário e falar: olha
você está nesse nível aqui, para você crescer, para você ser um operador top, digamos
[...] você tem que passar por isso [...] hoje, você está com o ensino fundamental, você
tem que terminar teu ensino médio. A empresa está precisando disso aqui de
conhecimentos (E1, p. 7).
Nós somos a qualidade, todos. Eu me vejo assim. Todos desde a pessoa aqui da
portaria, quando se fala de indústria de alimentos, principalmente. O processo de
118
qualidade começa aqui na portaria, é um motorista que está entrando sem calçado,
uma pessoa que está entrando com a vestimenta que não é certa. A pessoa que está
limpando o pátio tem que saber que aquele pó tem que limpar, porque tem que limpar
(E5, p. 5).
No modelo taylorista/fordista, não há programas de encarreiramento, para que não se
corra o risco de perder o foco do trabalho priorizando promoções (FORD, 1967). O modelo de
organizações flexíveis contempla estratégias avaliativas que produzem incentivos ao
desenvolvimento de objetivos do trabalhador, nos quais convergem e se associam expectativas
pessoais e organizacionais. Assim, a trajetória do sujeito aprendente contém uma possibilidade
para que o trabalho “transforme o trabalhador [...] permite-lhe progredir, aprimorar-se, realizar-
se. Essa é a primeira abordagem do prazer no trabalho.” (DEJOURS, 2009, p. 51). Nessa
perspectiva, o trabalho é constitutivo do processo de construção da identidade individual e
coletiva do sujeito aprendente.
[...] consegui direcionar o foco. Eu tinha esse objetivo em trabalhar na gestão de
pessoas. [...] eu adoro o que eu faço. [...] não vejo nada que venha atrapalhar o meu
pessoal do que eu quero para mim, do que eu desejo dentro da empresa que de repente se distancie. Eu acho que a gente sempre consegue dá um jeitinho para as situações
(E1, p. 11).
Do fluxo contínuo da produção (taylorista/fordista) ao trabalho articulado entre as diferentes
células (toyotismo), percebo a distinção entre trabalho em grupo e trabalho em equipe. No trabalho
em grupo, os trabalhadores realizam funções similares no mesmo ambiente, sem depender um do
outro. No trabalho em equipe, todos trabalham para atingir um mesmo objetivo, cada trabalhador
depende um do outro para chegar ao resultado organizacional previsto. O trabalho em células
concentra etapas definidas de todo o processo produtivo. Nesse contexto, o sujeito aprendente
necessita aprender a ser (DELORS, 1998) sujeito coletivo polivalente que opera em razão de
objetivos comuns compartilhados e simultâneos.
[...] tem que cuidar da higiene [...] o setor sempre bem organizado para ficar melhor
para trabalhar. Tem as fichas, eu chego no setor eu vou verificar se tudo está
organizado, vou marcar conforme. [...] cada dia tem uma ficha para ser preenchida. É preenchida a temperatura de soro, é levado no laboratório de duas a três análise
durante o turno para fazer a acidez, gordura e ph e ali nós vamos controlar (E2, p. 2).
[...] processos de almoxarifado [...] é um dos passos fundamentais literalmente para o
produto final, porque toda a parte de embalagem primária, a parte dos ingredientes
que a gente recebe para fazer iogurte, para fazer os leites especiais, as folhas de
alumínio [...] estão ali para envolver o nosso produto. Se a gente não tem uma
qualidade na logística interna e para você atender às produções, para você atender às
fábricas, ali já começa a ter alguma coisa de errado (E3, p. 7).
119
[...] se você faz o teu serviço bem feito, com certeza você está cuidando da empresa,
da qualidade desde o início ao final, porque não adianta ela produzir o produto bom e
você no armazenamento ir lá e fazer de qualquer jeito, então já não está incluído na
qualidade que a empresa exige. Todo o setor é muito importante (E4, p.3).
No modelo flexível, a avaliação do trabalhador no processo de trabalho leva a
compreender que trabalhar implica o sujeito aprendente na sua singularidade e totalidade. A
avaliação explicita exigências do trabalho prescrito e convoca a produção do sobretrabalho para
gerar a mais-valia que beneficia a organização. No entanto, a trajetória do sujeito aprendente
percorre territórios e cenários do mundo do trabalho que contém potencialmente um campo de
possibilidades extremas e distintas: seja uma trama opressiva e alienante, seja o prazer no
trabalho e a construção de identidade individual e coletiva.
120
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O problema de pesquisa abordado nesta dissertação foi construído em um campo de
tensões, dada a interface entre duas áreas distintas do conhecimento: psicologia organizacional,
na qual realizei minha formação inicial e prática profissional, e educação, na qual desenvolvi a
presente dissertação. O problema de pesquisa é fruto de um trabalho de problematização de
minha trajetória profissional e se traduz na seguinte pergunta: quais questões emergem da
relação entre transformações do mundo do trabalho e constituição do sujeito aprendente?
A pergunta de pesquisa gerou a necessidade de contextualizar as transformações do
mundo do trabalho e os dois modelos clássicos de gestão da produção e do trabalho. A revisão
bibliográfica propiciou condições para estabelecer bases dos dois modelos, assim como
explicitar indícios referentes a impactos de tais modelos na formação do trabalhador.
O modelo taylorista/fordista, da produção em massa e do consumo de massa,
caracteriza-se pela decomposição do processo de trabalho em tarefas fragmentadas e repetitivas,
com forte controle hierárquico e separação entre planejamento (gerente) e execução da tarefa
(operário). Nesse modelo, o trabalhador é especializado, individualizado e sua formação se
particulariza pelo treinamento mediante instruções escritas referentes à tarefa. O modelo
toyotista, ou modelo de produção flexível, caracteriza-se pela produção por demanda, pelo
fluxo contínuo de produção, pelo trabalho em células e em equipe. Esse modelo convoca um
trabalhador polivalente e multifuncional formado na perspectiva da pedagogia de competências.
A abordagem de elementos sócio históricos e conceituais da formação do trabalhador
no Brasil contemplou aspectos da longa trajetória que inicia com a educação catequética do
período colonial até recentes políticas públicas que compõem o cenário nacional nesses tempos
de mundialização neoliberal. Essa trajetória foi desdobrada em três particularidades
complementares: ensino de ofícios; formação técnica e profissional; educação, trabalho e
tecnologia.
Também procurei caracterizar conceitualmente a formação por competências e o sujeito
aprendente. A teoria das competências deriva da teoria do capital humano. As competências se
articulam à ideia de flexibilização da produção e do processo de trabalho, à gestão da qualidade
total para garantia de eficiência produtiva. O modelo de formação por competências tem relação
direta com a gestão de recursos humanos como estratégia produtiva, no contexto de inovação
tecnológica nas organizações.
Nesta dissertação, aponto indícios conceituais com vistas à formulação de uma noção
de sujeito aprendente. A meu ver, essa noção pode ser pensada como uma constelação de ideias
121
distintas articuladas entre si. O sujeito aprendente corresponde a uma posição material e
subjetiva que opera o trabalho vivo, o qual se constitui em uma prática educativa. O trabalho
vivo refere-se à ação do sujeito que, ao transformar o mundo, transforma a si mesmo em uma
perspectiva da educação ao longo da vida. O trabalho vivo no contexto da mundialização e do
neoliberalismo, enquanto prática educativa, contém um campo paradoxal de possibilidades:
seja como alienação e adoecimento, seja como autorrealização e emancipação.
O problema do sujeito aprendente foi abordado, em termos metodológicos, em trabalho
de campo construído junto a uma empresa de grande porte, do ramo alimentício, da região do
Meio-Oeste catarinense. Em uma perspectiva exploratória e qualitativa, realizei entrevistas
compreensivas com cinco atores sociais, que ocupam diferentes cargos em diferentes setores.
Meu objetivo foi evidenciar perspectivas singulares de diferentes atores sociais que compõem
o cenário organizacional. O conteúdo das entrevistas foi integralmente por mim transcrito. A
sistematização e análise de dados observou pressupostos da análise de conteúdo.
Considerando a empresa como lócus de aprendizagem, em que o sujeito aprendente
aprende na e com a organização, os resultados do trabalho de campo mostram três questões
emergentes sobre a constituição do sujeito aprendente no contexto organizacional. Uma questão
se refere às novas exigências produzidas pelas novas tecnologias que se traduzem nas seguintes
evidências: o trabalho vivo implica o trabalhador na sua totalidade existencial-profissional; o
desenvolvimento de um saber próprio do trabalhador referente a competências técnicas; a
capacidade de iniciativa e de criatividade, em ato, do trabalhador ante situações imprevistas; o
laço social construído com base no reconhecimento de outro e como fonte para apropriação de
novos conhecimentos; o desenvolvimento de diversas competências simultâneas; a gestão do
tempo pessoal e profissional.
Outra questão emergente se relaciona à formação profissional realizada no contexto
organizacional que se expressa nos seguintes indícios: a formação para o trabalho é adquirida
através de relações sistematizadas com conhecimentos disponibilizados em diferentes espaços
formativos; os conteúdos que exigem capacidades cognitivas complexas; o processo contínuo
de modificação do mundo e de si mesmo, em diferentes instâncias de experiência, pessoal e
profissional ao longo de toda a sua vida; o predomínio da responsabilização do trabalhador em
relação ao seu processo formativo, considerando necessidades e demandas emergentes da
respectiva atividade profissional; o ativismo que leva o trabalhador a acumular diferentes e
sucessivos cursos em uma superposição quantitativa dissociada do contexto singular
profissional; os dispositivos de tipo marcadamente fordista centrados na qualificação para a
execução de tarefas; os dispositivos formativos caracterizados pela transmissão mecanicista de
122
conhecimentos, tendo em vista a expectativa de reprodução de discursos e de práticas
organizacionais padronizadas; a liderança corporativa cuja intervenção contém elementos de
controle social de ações dos trabalhadores, sejam elementos explícitos, sejam implícitos; o
trabalhar em equipe que produz uma sociabilidade organizacional que associa aprendizagem
técnica e desenvolvimento de aprendizagens referentes ao saber viver juntos; a
indissociabilidade entre a trajetória do trabalhador e da organização.
Uma terceira questão emergente diz respeito à avaliação do trabalhador no processo de
trabalho que se explicita nas seguintes evidências: os instrumentos de medidas quantitativas
conforme padrões de qualidade exógenos ao trabalhador, considerando metas organizacionais
constituídas por diferentes planos acumulados que se articulam entre si, produzindo uma trama
opressiva que pressiona as condições de trabalho e mesmo a saúde do trabalhador; a captura
produtivista da necessidade do trabalhador de “implicar-se”, ou seja, de se engajar no trabalho
e se reconhecer como parte e mesmo como a própria organização que se beneficia da mais-valia
assim produzida; os processos avaliativos de competências que provocam a emergência de
prescrições do trabalho multifuncional a ser assumido pelo trabalhador; o trabalho como
constitutivo do processo de construção da identidade individual e coletiva do trabalhador; o
aprender a ser sujeito coletivo polivalente que opera em função de objetivos comuns
compartilhados e simultâneos.
Esse conjunto complexo de resultados do trabalho de campo me leva a formular três
hipóteses sobre as condições para constituição do sujeito aprendente na organização, no
contexto das transformações do mundo do trabalho. A primeira: o sujeito aprendente aprende a
aprender ao longo da vida considerando o real do trabalho. A segunda: a formação do sujeito
aprendente contém potencialmente duas possibilidades, seja consolidar a exploração da mais
valia do trabalhador, seja produzir condições para construir formas individuais e coletivas de
cidadania. A terceira: atualmente, na organização, há simultaneidade entre os modelos de gestão
taylorista/fordista e toyotista cujo efeito são exigências complementares para a formação do
trabalhador. Essas três hipóteses sinalizam sentidos da continuidade de pesquisas que pretendo
empreender no campo da educação, na sequência da presente dissertação.
123
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2016.
135
APÊNDICE A – Roteiro de entrevista
ROTEIRO ENTREVISTAS
Política de RH da empresa
Características e principais eixos orientadores.
Processo de qualidade total.
Plano de treinamento e desenvolvimento.
Demandas emergenciais para a formação (treinamentos não previstos no Plano).
Perfil profissional (descrição de cargos).
Avaliação de desempenho.
Contexto do mundo do trabalho na empresa, na atualidade
Mudanças vivenciadas no cotidiano.
Exigências e desafios.
Dificuldades.
Realizações – satisfações pessoais.
Formação profissional dos trabalhadores da empresa
Formação anterior ao ingresso do trabalhador na empresa.
Formações promovidas pela empresa (com instituições externas).
Formações promovidas pela própria empresa.
Formação realizada por iniciativa do trabalhador (gerenciamento de si mesmo/da
carreira).
Formas de incentivo à formação de trabalhadores.
Formações realizadas: benefícios para a empresa e para o trabalhador.
Aprendizagens realizadas na prática profissional dentro do processo de trabalho na
própria empresa:
Saber ser (relacionamentos interpessoais e sociais).
Saber fazer (aprendizagens realizadas com os colegas e com o próprio processo de
trabalho).
136
APÊNDICE B – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
ÁREA DAS CIÊNCIAS DAS HUMANIDADES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
MESTRADO EM EDUCAÇÃO
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Prezado/a colega,
Você está sendo convidado/a a participar da pesquisa EDUCAÇÃO NA EMPRESA E
TRANSFORMAÇÕES DO MUNDO DO TRABALHO: O SUJEITO APRENDENTE,
cujo objetivo é analisar efeitos das transformações do mundo do trabalho no sujeito aprendente
da educação empresarial. Sua colaboração neste trabalho é MUITO IMPORTANTE, mas a
decisão de participar é VOLUNTÁRIA, o que significa que você terá o direito de decidir se
quer ou não participar, bem como de desistir de fazê-lo a qualquer momento. Garantimos que
será mantida a CONFIDENCIALIDADE das informações e o ANONIMATO. Ou seja, o seu
nome e o nome da empresa na qual você trabalha não serão mencionados em qualquer hipótese
ou circunstância, mesmo em publicações científicas. A sua participação não acarretará em
custos para você, nem para a empresa e, também, não será disponibilizada nenhuma
compensação financeira.
O ÔNUS quanto à sua participação refere-se a certo desconforto no sentido de dispor
de tempo, entre uma e duas horas, para conversar sobre aspectos do roteiro temático a serem
propostos pela entrevistadora. Se houver concordância, a entrevista será gravada. O RISCO
pode ser dimensionado como leve, pois o relato de sua experiência junto à empresa poderá
desencadear reflexões e mobilizar sentimentos em relação à sua prática profissional. Como
BENEFÍCIO de sua participação nesta pesquisa, você contribuirá com a produção de
conhecimentos sobre a constituição do sujeito aprendente na educação empresarial.
Em caso de dúvida(s), você poderá entrar em contato com a mestranda e/ou com sua
orientadora, respectivamente: Andréia Aparecida Simão, (49) 9196-5342,
[email protected]; Luiza Helena Dalpiaz, (49) 3551-2003,
[email protected]; ou com a instituição: Unoesc, Programa de Pós-Graduação em
Educação, Rua Getúlio Vargas, n. 2125, Bairro Flor da Serra, 89.600-000, Joaçaba, SC, (49)
3551-2003, [email protected].
Eu _________________________________________________________portador/a
do CPF n. ______________________ ou RG n. ____________________________
declaro estar esclarecido/a sobre os termos e consinto por minha livre e espontânea vontade em
participar desta pesquisa e assino o presente documento em duas vias de igual teor e forma,
ficando uma em minha posse.
Data da entrevista: _____ / _____ / 2016.
Assinatura do/a entrevistado/a: ____________________________________________
Assinatura da entrevistadora: ______________________________________________