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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS Departamento de Comunicação Social Vitória Barros de Oliveira A CONSTRUÇÃO TRANSMIDIÁTICA DO UNIVERSO DE THE WALKING DEAD Belo Horizonte 2013

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  • 1

    UNIVERSIDADEFEDERALDEMINASGERAISDepartamentodeComunicaoSocial

    VitriaBarrosdeOliveira

    ACONSTRUOTRANSMIDITICADOUNIVERSODETHEWALKINGDEAD

    BeloHorizonte2013

  • 2

    VitriaBarrosdeOliveira

    ACONSTRUOTRANSMIDITICADOUNIVERSODETHEWALKINGDEAD

    MonografiaapresentadaaocursodeComunicaoSocialdaUniversidadeFederaldeMinasGerais,comorequisitoparcialparaaobtenodottulodebacharelemComunicaoSocial.

    Orientador:Pfa.DraGeaneCarvalhoAlzamoraCoOrientadora:NataliaMouraPachecoCortez

    BeloHorizonte2013

    VitriaBarrosdeOliveira

  • 3

    ACONSTRUOTRANSMIDITICADOUNIVERSODETHEWALKINGDEAD

    MonografiaapresentadaaocursodeComunicaoSocialdaUniversidadeFederaldeMinasGerais,comorequisitoparcialparaaobtenodottulodebacharelemComunicaoSocial.

    _________________________________________________ProfessoraDra.GeaneCarvalhoAlzamora(Orientadora)

    _________________________________________________ProfessoraMa.NataliaMouraPachecoCortez

    _________________________________________________ProfessorDr.NsioAntnioTeixeiraFerreira

    _________________________________________________ProfessoraDra.JoanaZillerdeAraujoJosephson

    BeloHorizonte2013

    AGRADECIMENTOS

  • 4

    O meu obrigada todas as pessoas que me inspiraram (E continuam a fazlo) durante minha trajetria

    acadmica.

    Minhame,quesempreapoiouminhaescolhaprofissionalequesempretorcepormim.

    Geane,quesetornoumeumaiorexemplodentrodauniversidade,eminhainspirao.

    Natlia,pelaforaepacinciaduranteaorientaodestetrabalho.

    Jssica, Lucianna, Augusto e os colegas que, em um momento ou outro, me mostraram o jeito certo de

    lidarcomtodaessabagagemqueestouadquirindo.

    RESUMO

  • 5

    O trabalho teve, como objetivo, investigar a construo transmiditica do universo de The

    Walking Dead. Durante sua realizao foram observadas a srie televisiva, os quadrinhos, os

    websdios, os livros e os games que compem o chamado material cannico de The Walking Dead, de

    onde extraiuse os elementos considerados na anlise. Utilizouse dos conceitos de Cultura da

    Convergncia(Jenkins, 2008), Cultura Participativa (Jenkins, 2008 Walsh, 2003) e Narrativas

    Transmiditicas (Scolari, 2009), alm de lanar mo de uma srie de metodologias anteriormente

    desenvolvidas por Bona e Souza (2013), Scolari (2009) e Gambarato (2013). Assim, criase uma

    metodologia prpria de anlise, capaz de comprovar que o projeto transmdia, alm de elucidar a

    articulao entre as diversas mdias que o compem, assinalando os elementos que fazem parte de sua

    construo, o que a caracteriza como sendo transmiditica e configurada a partir do engajamento dos

    fs.

    Palavraschave: Narrativas transmiditicas, cultura participativa, cultura da convergncia, The Walking

    Dead.

  • 6

    ABSTRACT

    This project had, as objective, investigating how was constructed of the transmedia universe in The

    Walking Dead. During its realization, there were observed the tv show, comics, websodes, books and

    the games that construct this called canonical material of The Walking Dead, from which there was

    extracted the elements considered during the analisys. It was used the concept of Convergence Culture

    (Jenkins, 2008), Participative Culture (Jenkins, 2008 Walsh 2003) and Transmedia Storytelling

    (Scolari, 2009), also adopting a set of methodologies previously developed by Bona and Souza (2013),

    Scolari (2009) and Gambarato (2013) , in order to create an analisys metodology capable of verify that

    the project is transmedia, also elucidating the links between the many medias that compose it, making

    the elements that were used to create it, what features it as being transmedia and also configured the fan

    involviment.

    Keywords:transmediastorytelling,participativeculture,convergenceculture,TheWalkingDead

    SUMRIO

  • 7

    1INTRODUO9

    2NARRATIVASTRANSMIDITICASECULTURADACONVERGNCIA

    CONSTRUINDOERECONSTRUINDOUNIVERSOS....12

    2.1CulturadaConvergncia:NovasDemandasdeConsumo..13

    2.2TransmediaStorytelling:UniversoFragmentado..17

    3METODOLOGIASDEANLISEPARANARRATIVASTRANSMIDITICAS...23

    3.1VerificaodePertencimentodaFranquiacomoTransmdia.24

    3.2AnlisepelovisdaSemitica..28

    3.3PropostadeAnlisedaNarrativacomoumTodo.32

    4ACONSTRUODOUNIVERSOTRANSMDIADETHEWALKINGDEAD.39

    4.1Verificao:TheWalkingDeadtransmdia?....39

    4.2OMapadoUniversoTransmiditicodeTheWalkingDead....45

    4.3OselementosqueconstroemTheWalkingDead...49

    4.3.1.PremissaePropsito.49

    4.3.2.AudinciaeMercado....50

    4.3.3.PlataformasdeMdiaeGneros..53

    4.3.4.Narrativa.56

    4.3.5.Construodomundo..57

    4.3.6.Extenses.59

    4.3.7.Personagens....59

    4.3.8.Estrutura....60

    4.3.9.Aexperinciadousurio..62

    4.3.10.Esttica......64

    4.4Consideraesarespeitodaanlise.65

    5CONCLUSO...67

  • 8

    REFERNCIAS....72

    ANEXOS...76

  • 9

    1INTRODUO:

    A presente monografia tem, como objetivo, responder seguinte pergunta: Como se d a

    construo transmiditica do universo de The Walking Dead?. Para tanto, desenvolveuse uma

    metodologia de anlise das narrativas transmiditicas, a partir de metodologias anteriormente

    elaboradas por Bona e Souza (2013), Scolari (2009) e Gambarato (2013), baseada na experincia

    narrativadafranquiaemquesto.

    A construo dessa metodologia um ganho, alm representar um desafio, para o trabalho,

    uma vez que se vai alm da proposta inicia,l de demonstrar como se constri o universo da srie.

    Percebeuse a necessidade dessa elaborao, uma vez que no h ainda uma forma ideal de anlise

    para narrativas transmiditicas. Cada narrativa pode ser composta de elementos diferentes, portanto, a

    metodologia deve se adaptar a cada objeto escolhido. Deste modo, a escolha dos autores foi norteada

    pela afinidade que suas prprias metodologias apresentavam, em relao abordagem do trabalho,

    bem como pela possibilidade de adaptao, a fim de enquadrlos nas peculiaridades e nos elementos

    quecompemTheWalkingDead.

    O processo tambm envolveu uma pesquisa a fim de descobrir os materiais oficiais que

    compem a franquia, dando especial ateno ao que contivesse narrativas seriam estes os episdios

    da srie televisiva, os quadrinhos, os websdios, os livros e os games. Todos estes foram

    experienciados em sua completude, a fim de que pudessem servir, como um todo, para a anlise

    pretendida.

    O primeiro captulo apresenta os conceitoschave para a anlise, em especial o de Cultura da

    Convergncia (Jenkins, 2008) e Cultura Participativa (Jenkins, 2008 Walsh,2003) , dos quais parte a

    idia de narrativa transmiditica, como sendo uma consequncia de ambas. Sendo Cultura da

    Convergncia esse fluxo de contedos, fruto da cooperao entre os diversos mercados miditicos, e

    tambm referindose ao comportamento migratrio dos consumidores, que se dispoem a navegar por

    esses meios, perseguindo as formas de entretenimento que os agrade (Jenkins 2008). E, sendo a cultura

  • 10

    participativa essa comunidade comprometida com interesses comuns em trabalhar, de forma unida, a

    fim de reunir, organizar e at mesmo produzir novos materiais a respeito daquilo que os atrai, vemos

    como a narrativa transmiditica surge como uma forma de entretenimento na era da convergncia, para

    consumidoresquetenhamessetipodedemanda.

    Nela, as histrias so contadas atravs de mltiplas mdias, expandindo seu universo narrativo

    de forma a oferecer diversas entradas para o universo do qual a histria faz parte, no sendo somente

    uma adaptao de uma mdia para a outra, mas permitindo que cada uma contribua para a construo

    desse universo (Scolari, 2009). Cada um desses fragmentos possui elementos inditos e os produtores

    fazem uso de diversos recursos, a fim de atrair o pblico, e utilizam o melhor que cada meio tem a

    oferecer,paracontaraquelapartedahistria.

    O captulo dois apresenta as metodologias dos autores Bona e Souza (2013), Scolari (2009) e

    Gambarato (2013), que realizaram anlises similares pretendida, ou seja, que propuseram maneiras

    de se analisar uma narrativa transmiditica. Bona e Souza apresentam uma metodologia de verificao,

    que tem como objetivo confirmar se o objeto de estudo escolhido , de fato, uma narrativa

    transmiditica. Para isso, propem o uso de uma tabela comparativa, tendo como objeto de anlise a

    prpria srie The Walking Dead, onde se observa a interao entre as mdias e apresena de elementos

    inditos em cada uma delas, o que seria uma forma de contribuio para o universo ficcional. Scolari

    apresenta uma abordagem baseada na anlise semitica de cada uma das mdias, de forma a montar um

    mapa do universo ficcional da srie por ele analisada, no caso, entitulada 24. Assim, ele organiza as

    mdias, que antes estariam espalhadas, a fim de perceber a ordem cronolgica dos acontecimentos e

    compreender melhor como se d a construo do universo ficcional da srie. Por fim, Gambarato

    (2013) sugere um questionrio que tem, como objetivo, verificar os elementos que compem a

    narrativatransmiditica,aprofundandoaanlisedaconstruodesseuniverso.

    Com base nessas perspectivas, buscouse desenvolver uma metodolgia prpria a fim de

    analisar a construo da narrativa transmiditica de The Walking Dead. Tendo por referncia o

    trabalho de Bona e Souza (2013), foi verificado que, de fato, a srie pertence ao grupo de narrativas

  • 11

    que se encaixam nessa categoria. A anlise proposta por Scolari (2009) permitiu a criao de dois

    mapas para a srie: um que demonstra a relao de simultaneidade dos acontecimentos, permitindo que

    o espectador tenha uma viso, de diversos ngulos, de um mesmo acontecimento e outro que ilustra as

    relaes entre as diversas mdias que compem a srie. Por fim, atravs da aplicao do questionrio

    de Gambarato (2013) a este estudo, foi possvel perceber como os produtores da srie trabalham os

    elementos da narrativa, a fim de tanto articular os acontecimentos quanto de engajar o pblico,

    incentivandooaconsumirmaisarespeitodasrie.

    A questo das narrativas transmiditicas tem sido alvo de grande interesse, tanto no campo da

    pesquisa quanto entre os prprios produtores. cada vez mais comum encontrar seriados, filmes, livros

    e jogos que no se limitam apenas a sofrerem adaptaes entre si, mas sim como formas de acessar

    diferentes aspectos de um universo, enriquecendoo. Sucessos de pblico como Harry Potter,

    Lost, Pokmon e at mesmo a novela brasileira Cheias de Charme se expandem atravs dos

    meios, tanto para conseguir atrair e diversificar o pblico, quanto para desenvolver e aprofundar a

    narrativa.

    Durante meu percurso acadmico, o tema atraiu minha ateno a ponto de motivar pesquisas

    prprias que me permitiram chegar at The Walking Dead, que me pareceu um exemplo interessante de

    construo de narrativa transmiditica. Assim, fui capaz de me aprofundar em seu universo e na forma

    como foi produzido, de modo a confirmar minhas suposies a seu respeito, alm de poder apresentar

    comunidade uma metodologia prpria de anlise que capaz de refletir meus interesses a respeito do

    assunto.

    2NARRATIVAS TRANSMIDITICAS E CULTURA DA CONVERGNCIA

    CONSTRUINDOERECONSTRUINDOUNIVERSOS

    Cada vez mais percebese o uso das narrativas transmiditicas, como recurso para se contar e

    expandir uma narrativa. O surgimento de novas mdias, bem como seu consumo, possibilitou um

  • 12

    aumento, tanto na produo de histrias que se desdobram a partir de narrativas transmiditicas,

    quanto no interesse e no engajamento do pblico, que passou a consumir o contedo de suas sries,

    livros, filmes, quadrinhos e games favoritos entre as vrias mdias onde se apresentam, e a participar de

    formamaisativanasuaproduo.

    A indstria tem se mostrado, por um lado, conservadora em especial no que diz respeito

    proteo dos direitos autorais e do lucro que deles advm, mas tambm tem realizado suas tentativas

    em se adaptar essa demanda crescente. Afinal, tratase de uma estratgia altamente lucrativa, j que o

    consumo se expande por diversos meios e at por diversos pblicos. Muitas produtoras esto

    buscandoespalhareacelerarocontedodemdiapeloscanaisdedistribuiocomessafinalidade.

    SegundoScolari(2009):

    Narrativas transmiditicas no s afetam o texto, mas tambm incluem transformaes nos processos de produo e consumo. Pesquisadores e produtores visualizam novas oportunidades de negcios para o mercado miditico medida que as novas geraes de consumidores desenvolvem as habilidades para lidar com o fluxo de histrias e se tornam caadoresdeinformaesemmltiplasfontes(SCOLARI,2009,p.589traduonossa)

    Alm disso, as estratgias transmiditicas tendem a reforar os laos afetivos entre fs e suas

    histrias preferidas, uma vez que as pessoas passaram a desejar aprofundarse naquilo de que gostam,

    bem como desejam que a fico seja maior do que apenas duas horas no cinema, ou uma experincia

    de uma hora semanal na TV. Os consumidores querem um aprofundamento do universo ficcional e

    queremparticipardele .1

    Dentre essas tentativas da indstria do entretenimento, h aquelas que se mostraram

    malsucedidas e aquelas que conseguiram chegar mais prximas da proposta de Henry Jenkins(2008),

    no que diz respeito a como deve ser e o que conter uma histria contada na forma de narrativa

    transmiditica. As organizaes parecem ter se dado conta das possibilidades estratgicas da

    transmdia e, desde ento, existem cada vez mais universos ficcionais que usam tal recurso, inclusive no

    cinema, como o caso de Harry Potter e Matrix, e tambm na televiso, como no thriller 24 ou no

    seriadodesuspenseLost.

    1JENKINS,Henry.CulturadaConvergncia.EditoraAleph,2008.p.149

  • 13

    Na pesquisa em questo propese analisar um desses exemplos de franquias que usam o

    recurso da transmdia: The Walking Dead. Este surgiu a partir de uma histria em quadrinhos e tem

    alcanado enorme sucesso pelo mundo inteiro. Ele aparenta se encaixar no modelo transmiditico, uma

    vez que diferentes mdias so usadas, de forma complementar, para contar a histria e tambm conta

    comaparticipaoativadosfs.

    Com o propsito de compreender as noes essenciais que envolvem uma narrativa

    transmiditica, bem como a cultura colaborativa que define a resposta do pblico, propese relacionar

    osconceitosdeculturadaconvergncia,culturaparticipativaenarrativastransmiditicas.

    2.1CulturadaConvergncia:NovasDemandasdeConsumo

    As Narrativas Transmiditicas e o engajamento dos fs a partir de seus desdobramentos so

    parte de um movimento que Jenkins(2006) denomina como Cultura da Convergncia. Segundo ele, o

    termorefereseao:

    fluxo de contedos atravs das mltiplas plataformas de mdia, cooperao entre mltiplos mercados miditicos e ao comportamento migratrio dos pblicos dos meios de comunicao que vo a quase qualquer parte em busca das experincias de entretenimento que desejam(...)(essa convergncia)no ocorre por meio de aparelhos(...) a convergncia ocorre dentro dos crebros dos consumidores individuais e suas interaes sociais uns com os outros(JENKINS,2008,p.29).

    A convergncia altera a lgica pela qual a indstria miditica opera, bem como a lgica pela

    qual os consumidores processam e consomem essas formas de entretenimento. Tratase de um

    processo corporativo, que diz respeito produo dos meios e contedos, e tambm de um processo

    deconsumidordecartercomunitrio.

    Podese dizer que esse aumento na disponibilidade e no acesso mdias interconectadas,

    especialmente no ambiente online, estabeleceu as condies para essa convergncia, criando um

    comportamento miditico, corporativo e social que Jenkins(2008) define como sendo a Cultura da

    Convergncia, de acordo com o que j havia sido discutido anteriormente por Pierre Lvy(1998):

    autores e leitores, produtores e espectadores, criadores e intrpretes iro se dissolver e formar um

    'circuito' de expresso, com cada participante trabalhando para 'sustentar a atividade' dos outros. Na

    cultura da convergncia, a circulao de contedos depende no somente dos produtores, mas tambm

  • 14

    eprincipalmentedasrespostasdosconsumidores,

    A respeito da participao dos fs, que caracteriza a cultura da convergncia, Dineheart (2008)

    comenta que o consumidor transforma a histria de acordo com suas habilidades cognitivas,

    descentralizando a atividade autoral. Ou seja, esse consumidor, na era da cultura da convergncia, quer

    prolongar seu envolvimento com as mdias e, por isso, so levados produzir e a avaliar os produtos

    miditicos a partir de cooperativas de conhecimento. Assim, produtores e consumidores dos contedos

    miditicospassamainteragirdeacordocomumnovoconjuntoderegras.

    O entretenimento na era da convergncia integra mltiplos textos que no podem ser contidos

    em uma s mdia, e, inclusive, so melhor consumidos quando aproveitam o potencial dos diferentes

    meios. E, medida que uma histria evolui, ela tambm cresce dentro do f, que se motiva a buscar

    mais informaes e at a produzir novos materiais em outras mdias, mesmo que o filme, o quadrinho, o

    livro,asrieouojogojtenhamacabado.

    Esse participante ideal da cultura da convergncia um indivduo com capacidade de unir seu

    conhecimento ao de outros numa empreitada coletiva, que compartilha e compara sistemas de valores

    por meio da avaliao de dramas ticos envolvendo os programas que assistem e as atitudes mostradas

    pelosenvolvidos,gerandocontedosedisponibilizandoestesnosambientesonline.

    Os indivduos, ou fs, se juntam nessas comunidades ativas de construo coletiva do

    conhecimento, entendidas como fandoms. Fandom , segundo Jenkins (2008), o "termo utilizado para

    se referir subcultura dos fs em geral, caracterizada por um sentimento de camaradagem e

    solidariedade com outros que compartilham os mesmos interesses." diferente, portanto, de fanbase,

    que se refere, na linguagem popular dos prprios fandoms, como o conjunto total de fs de uma srie,

    mesmoaquelesquenoparticipamativamentedasdiscussesedaproduodenovoscontedos.

    Essas interaes so necessrias, j que pode haver mais informaes sobre um determinado

    assunto do que algum sozinho possa recordar. E h diversos aspectos que podem ser lidos e

    interpretados de acordo com a vivncia e cultura de cada indivduo que, unidos, ampliam o espectro de

    interpretao de uma fico. Esse consumo miditico se torna algo coletivo, uma vez que esses

    indivduos se renem no espao virtual que d conta de romper as barreiras geogrficas, temporais e,

  • 15

    inclusive, de armazenar as informaes trocadas e organizlas e subordinam sua expertise pessoal

    parafinscomunitrios.

    E isso tambm foge ao controle dos produtores, uma vez que esse processo de interpretao,

    por mais que seja intencional por parte dos autores que chegam a deixar pistas propositais no

    determinaondeessepblicovaibuscarasrespostas.

    Os fs, por sua vez, buscam ativamente novas informaes, novos produtos e, envolvemse

    com outras pessoas para fazlo. notrio como alguns consumidores, em geral mais jovens,

    tornamse verdadeiros caadores e coletores de informaes, obtendo prazer em procurar e

    disponibilizarosantecedentesdospersonagensepontosdeenredos.

    Nessa Cultura Participativa, a comunidade inteira assume a responsabilidade em ajudar os

    companheiros do fandom, mesmo que, algumas vezes, no queiram fazlo deliberadamente. Mas h

    uma recompensa intelectual e at em status na comunidade, de modo que muitos fs se colocam como

    aqueles que desejam realizar esse trabalho, uma vez que se supe que cada pessoa tenha algo a

    contribuir.

    Esse ajuntamento comunitrio, que leva os indivduos a trabalharem juntos, cada um

    contribuindo com o que sabe e juntando as "peas", a fim de desenvolver um conhecimento

    aprofundadosobreumdeterminadoassunto,achamadaintelignciacoletiva.

    DeacordocomacitaodePierreLvy(1998):

    "A inteligncia coletiva referese a essa capacidade das comunidades virtuais de

    alavancar a expertise combinada de seus membros(...)ir, gradualmente, alterar o modo

    como a cultura de massa opera(...) a cultura de conhecimento serve como 'motor invisvel

    e intangvel' para a circulao e a troca de produtos de massa"(LVY, apud Jenkins,

    2008,p.56)

    A respeito da inteligncia coletiva, utilizada para reunir os fragmentos das histrias transmdia,

    notrio que cada um de ns constri a prpria mitologia pessoal, a partir de pedaos e fragmentos de

    informaes extrados do fluxo miditico e transformado em recursos, atravs dos quais

    compreendemos nossa vida cotidiana. No se trata, portanto, apenas de conhecimento compartilhado,

  • 16

    que o material cannico na srie de fico e que de domnio at mesmo da fanbase, mas de uma 2

    soma das informaes que cada pessoa foi capaz de reter e que pode ser acessada mediante um

    questionamentoespecfico.

    Nesse trabalho coletivo de construo do conhecimento, todas as pessoas sentem como se

    tivessem contribudo para o resultado. Mas, segundo Peter Walsh (2003), o problema dessas

    comunidades de conhecimento a ausncia de procedimentos fixos sobre o que fazer com esse

    conhecimento reunido. Ou seja, cabe ao participante aplicar suas prprias regras e metodologias. A

    questo que a inteligncia coletiva no se baseia em um sistema hierrquico como conhecemos, ou

    seja, baseado na educao formal. Ao contrrio, nessas comunidades, o conhecimento proveniente da

    experinciarealdevidapodeser,numcertograu,atmaisvalorizado.

    Nessas comunidades, esse trabalho conjunto necessrio, uma vez que o texto transmdia

    pressupe referncias aos outros produtos da franquia ou mesmo a personagens que fazem parte da

    cultura geral. Entretanto, enquanto algumas aluses podem ser notadas primeira vista, outras

    tornamse claras s quando voc conversa sobre o filme com os amigos, juntando informaes de

    mltiplasfontesou,atmesmo,podemexigirqueseassistaofilmeframeaframe.

    2.2TransmediaStorytelling:UniversoFragmentado

    Um dos grandes problemas enfrentados pelos estudos das narrativas transmiditicas est na

    definio do conceito, uma vez que se trata de uma estratgia que tem sido utilizada com mais

    frequncia apenas recentemente, e tambm porque sua aplicao pode ocorrer de maneiras to

    variadas que se torna difcil sua conceituao. Long (2007) chega a sugerir que o termo deveria ser

    usado como adjetivo, levandose em conta que a transmdia uma forma caracterstica de construo

    denarrativa.

    Adotase, neste trabalho, a conceituao de Scolari (2009) a respeito das Narrativas

    Transmiditicas,comosendo:

    2 Jenkins define canon como o grupo de textos que a comunidade de fans aceita como legitimamente parte do mundo ficcional(2008: 281 apud Gambarato 2013). Tambm se refere a: (Long 2007: 334, 1634 Dena 2009: 56, 98123 apud Gambarato).

  • 17

    [...] um tipo particular de narrativa que se expande atravs de diferentes linguagens(verbal, icnica, etc) e meios (cinema, quadrinhos, televiso, videogames, etc). TS no somente uma adaptao de uma mdia para outra[...] as diferentes mdias e linguagens participam e contribuem para a construo do mundo narrativo transmiditico (SCOLARI, 2009, p.587 traduonossa )3

    Segundo ele, o consumidor que deseja viver essa experincia plena que o universo ficcional

    oferece, deve "coletar", atravs dos meios, esses diversos fragmentos da histria e juntlas em um

    "todo atraente". Muito embora cada pedao deste seja independente e sirva de "porta de entrada" para

    esse universo ficcional, s possvel ter uma viso do todo, ou uma viso completa, se o espectador

    tiverointeresseemprocurartodososfragmentos.

    O meios devem ser utilizados para contar a histria, que se articularo de forma suplementar

    entre eles, a fim de criar diversas entradas para o mundo ficcional, por onde diversas categorias de

    fs podero entrar, de acordo com seus gostos ou o tipo de envolvimento que desejam ter com a

    narrativa. Enquanto um consumidor, que deseja explorar o mundo onde a histria se passa, pode ter

    seu primeiro contato atravs do jogo da franquia, outro consumidor, mais casual, pode conhecla

    atravs do filme ou seriado televisivo. J o f mais assduo ir atrs desses outros fragmentos,

    consumiroutrosprodutos,mesmoquesejamlbunsdefigurinhasoubonecosarticulveis.

    De acordo com Jenkins (2008), as narrativas transmiditicas tambm pressupem a

    participao do consumidor, capaz de discutir o que encontra com outros fs, comparar descobertas,

    compartilhar teorias. Esse tipo de atividade se tornou possvel em larga escala graas internet e seus

    grupos de discusso, onde fs podem se reunir em comunidades especficas a respeito de algum

    interesse em comum e debatlo exausto, inclusive assumindo esse papel de guiar os outros

    membrosatravsdessesfragmentos,apontandooseatfornecendoumaordemquepossamseguir.

    nesse aspecto que a transmdia se torna to interessante como estratgia de marketing,

    podendose dizer que h fortes motivaes econmicas por trs da produo de narrativas transmdia.

    3 TSisaparticularnarrativestructurethatexpandsthroughbothdifferentlanguages(verbal,iconic,etc.)andmedia(cinema,comics,television,videogames,etc.).TSisnotjustanadaptationfromonemediatoanother.Thestorythatthecomicstellisnotthesameasthattoldontelevisionorincinemathedifferentmediaandlanguagesparticipateandcontributetotheconstructionofthetransmedianarrativeworld.Thistextualdispersionisoneofthemostimportantsourcesofcomplexityincontemporarypopularculture.(SCOLARI,2009,p.587)

  • 18

    Scolari (2009) explica que as narrativas transmiditicas so vendidas como um produto por si s,

    expresso pelos seus personagens, tpicos e caractersticas estticas, que vendem por fazerem parte

    daquela franquia adorada por um grupo de consumidores. E esses consumidores vo a quase toda

    parteafimdeexpandiraexperinciadesseprodutomiditicodequegostam.

    Esseconsumoafetivo,Jenkins(2008)definecomosendo:

    uma nova configurao da teoria de marketing[...] que procura entender os fundamentos emocionais da tomada de deciso do consumidor como uma fora motriz por trs das decisesdeaudinciaedecompra(JENKINS,2008,p.96)

    Os fs, envolvidos emocionalmente com suas sries favoritas, no desejam que a experincia

    fique restrita ao cinema, tv, ao papel... Desejam prolongla e qualquer novo material bemvindo,

    mesmo que eles tenham que crilo por conta prpria, atravs de fanfictions , videos caseiros, cosplays 4

    ,mashups etodootipodecontedogeradoporfs.5 6

    interessante oferecer contedos diferentes, at mesmo com abordagens diferentes, uma vez

    que cada mdia possui um pblico especfico e diverso entre si. Enquanto TV e filmes, em geral,

    possuem um pblico mais diversificado, quadrinhos e games so um nicho de mercado. "Uma boa

    franquia transmdia trabalha para atrair mltiplas clientelas, alterando um pouco o tom do contedo de

    acordo com a mdia.", como discute Jenkins( 2008, p.139). Sabendo aproveitar esse potencial, o

    melhor que cada mdia tem a oferecer para contar seu fragmento da histria, possvel expandir o

    potencialdafranquia.

    As histrias pensadas de forma transmiditica so concebidas desde o princpio para que seus

    fragmentos se articulem de modo a permitir entradas diferentes para seu universo, de acordo com o

    4Fanfic:Ficoescritaporfscomoumaextensodeumtrabalhoqueadmiram,especialmenteprogramastelevisivos,geralmentedisponibilizadasnainternetoupublicadasemrevistasfeitasporfs.TheAmericanHeritageDictionaryoftheEnglishLanguage,disponvelem:acessadoem24nov.20135Cosplay:abreviaodecostumeplay,umaatividadenaqualosparticipantesusamroupaseacessriosafimderepresentarumpersonagemouidiadeumtrabalhodefico.TheAmericanHeritageDictionaryoftheEnglishLanguage,disponvelem:acessadoem24nov.20136Mashup:Vdeoeditadoapartirdemaisdeumafonte,paraquepareavirdeumas.TheAmericanHeritageDictionaryoftheEnglishLanguage,disponvelem:acessadoem24nov.2013

    http://www.google.com/url?q=http%3A%2F%2Fwww.thefreedictionary.com%2Ffanfic&sa=D&sntz=1&usg=AFQjCNHRrbL_JhZP-DucwQz5nBAB2LHGjAhttp://www.google.com/url?q=http%3A%2F%2Fwww.thefreedictionary.com%2Ffanfic&sa=D&sntz=1&usg=AFQjCNHRrbL_JhZP-DucwQz5nBAB2LHGjAhttp://www.google.com/url?q=http%3A%2F%2Fwww.thefreedictionary.com%2Ffanfic&sa=D&sntz=1&usg=AFQjCNHRrbL_JhZP-DucwQz5nBAB2LHGjA

  • 19

    contato e o tipo de consumidores, afinal, preciso que o universo seja vasto o bastante para que possa

    ser desenvolvido e ampliado de diferentes formas, e seus personagens, complexos e fortes o bastante

    para suportar diversas transies, assim como a concepo de bons ambientes que no sejam

    facilmenteesgotveisemumanicaobra,

    Deste modo, por exemplo, o autor pode dar um panorama geral da histria no filme, se

    aprofundar em algum personagem especfico no livro, inserir o espectador no universo ficional atravs

    do game e ainda narrar universos alternativos nos quadrinhos. Isso sem esgotar as possibilidades para

    que os fs participem tambm da narrativa, criando suas prprias verses do que viram e at mesmo

    expandamouniversoqueera"cnon".

    por isso que podese afirmar que os "furos" nas histrias transmdia no so,

    necessariamente, algo ruim, como apontam os crticos. Afinal, so nesses furos, nesses momentos em

    que no se sabe o que aconteceu, que os fs podem trabalhar e desenvolver ainda mais o potencial da

    narrativaatravsdeespeculaesoumesmoemmateriaisprprioscomofanfictionsoufanzines .7

    preciso levar em conta que nenhuma das obras, numa narrativa transmiditica "ideal",

    reproduz todos os elementos do que foi apresentado em outra mdia, mas oferece pontos onde as

    narrativas se aproximam, ou elementos de identificao. Isso garante, que a histria possa ser

    identificada como parte desse todo que o universo ficcional da srie, do livro, do quadrinho, etc. So

    certos elementos comuns a toda a obra, que identificam e colocam todos os fragmentos numa mesma

    categoria. Isso permite que algum que no f, mas que tenha um pequeno conhecimento a respeito

    desse universo, seja capaz de identificar esses elementos e dizer: "essa histria parte daquela srie

    'X'". Podese dizer que os uniformes de Harry Potter ou de Star Trek, as msicas de Star Wars ou

    os Troopers e at as arenas de Hunger Games atuam como elementos identificadores, viabilizando a

    conexodosdiversosfragmentos,percebidoscomopartedeummesmouniverso.

    Aesserespeito,JanetMurray(1999),queexplicaque:

    para tornar esses universos ainda mais reais, narradores e leitores comeam a criar artifcios que formam um contextocaminhos identificados por cores, cronologia, rvores genealgicas, mapas, relgios, calendrios e por a afora. Tais artifcios permitem ao espectador apreender os densos espaos psicolgicos e culturais(representados por histrias modernas) sem se

    7Formaabreviadadefanmagazine.Umarevistacriadaporfs.

  • 20

    perder(...)acrescentando informaes e retratando partes do universo, a fim de que o todo se tornemaisconvincenteemaiscompreensvel(MURRAY,1999,p.253258)

    Essa identificao imediata pode chegar ao ponto de que certos personagens no precisam ser

    identificados ou reapresentados, uma vez que j fazem parte do repertrio dos espectadores como

    elemento presente na histria ou atravs da base cultural do indivduo. E isso permite, tambm, que a

    histria no precise se demorar em descries ou apresentaes, podendo ir "direto no centro da

    ao".

    Muitas vezes, ao analisar franquias como a de Matrix, para dar conta da imensido e da

    complexidade desses universos, os produtores recorrem a cocriaes: "as empresas colaboram desde

    o incio para criar contedos considerados adequados cada um dos setores, permitindo que cada

    meio de comunicao gere novas experincias ao consumidor e aumente os pontos de acesso

    franquia (JENKINS, 2008, p.149). Como a idia que cada meio seja utilizado da melhor maneira

    para contar seu fragmento da histria, o ideal tambm que quem produz esse material domine o meio

    com o qual est trabalhando do melhor modo. Alm disso, diretores famosos, escritores reconhecidos,

    quadrinistas renomados so chamados a contribuir com o projeto, uma vez que tendem a chamar mais

    ateno do pblico potencial, que deseja ver em que esto trabalhando desta vez. O pblico especfico

    josconheceepodeseinteressarpelomaterialdevidoaoestilodosautores.

    Mas esse pblico tambm tem expectativas com relao ao que se torna material "canon", ou

    seja, o material vindo diretamente dos autores originais e que pode ser considerado oficial. Sendo que

    o universo est fragmentado em diversos meios, muitos fs podem sentir receio em acessar esse

    material, justamente por questionarem se ele pode ser considerado algo que o autor original pensou ou

    que, ao menos, passou pelo seu crivo. Seno, o que diferenciaria esse material de outros produzidos

    porfs,quepodemseratmelhoresemtermostcnicos?

    Por isso, importante que haja uma coordenao das partes envolvidas na narrativa

    transmiditica de modo que uma parte apresente sempre material indito, mas, ao mesmo tempo, que

    apresente elementos de ligao ou que a identifiquem como parte do universo daquela narrativa. Assim,

    deixam claro que se trata de um mesmo material, uma vez que o espectador deseja acrescentar mais

  • 21

    informaes que possa considerar confiveis ao seu repertrio sobre a fico que acompanha, tendo a

    certeza de que aquilo realmente poderia ter acontecido, mesmo que no tenha sado das mos do

    criadoroficial.

    Afinal, as narrativas transmiditicas so capazes de fornecer os recursos para que esses

    consumidorespossamutilizar,afimdecriaremsuasprpriasficesarespeitodoquevem.

    Deste modo, Murray(1999) observa que essas obras tendem a atrair trs tipos de

    consumidores: um grupo de espectadores comprometidos ativamente, que precisam encontrar suspense

    e satisfao a cada um dos episdios um pblico a longo prazo, que busca padres coerentes na

    histria como um todo e um espectador navegante, que tem prazer em acompanhar as conexes entre

    asdiversaspartesdahistriaeemdescobrirmltiplosarranjosdomesmomaterial.

    Esse f engajado comea no s a assistir, ler, ouvir, e jogar sua fico favorita, como tambm

    passa a produzir material a respeito dela. Axel Bruns (2008) define esse consumo como sendo

    Produsage: um tipo de contedo guiado pelo usurio que se d em ambientes como a wikipedia, open

    sourcesoftwaresenablogosfera.

    Esse usurio se concentra especialmente em ambientes online e passa a evoluir seus

    conhecimentos juntamente com outros indivduos, criando locais onde esse material possa ser

    despejadoeacessadoporquemcompartilhedessesinteresses.

  • 22

    3METODOLOGIASDEANLISEPARANARRATIVASTRANSMIDITICAS:

    O conceito de Transmidia Storytelling, que se baseia em peculiaridades relativas construo

    de um universo narrativo que permeia diferentes mdias e linguagens, ainda recente. Por causa disso,

    as metodologias de anlise ainda no se consolidaram, o que traz problemas, tanto do ponto de vista

    do planejamento transmdia, para quem atua profissionalmente nessa rea, quanto do ponto de vista

    analtico,paraquemsededicaacademicamenteaotema.

    Por se tratar de um fenmeno complexo, envolvendo mltiplas dimenses como narrativa,

    marketing, negcios e tecnologia, estabelecer uma metodologia unificada que seja capaz

    de reunir todas essas diferentes facetas, no uma tarefa fcil (GAMBARATO, 2013,

    online).

    Segundo a autora, dada a complexidade do conceito, muitas vezes conflitante entre os prprios

    autores que o discutem que caminha por diversos campos, envolvendo desde estudos de caso,

    anlises semiticas, narratologia, sociologia e at economia, marketing e branding, utilizandose de

    mtodos quantitativos e qualitativos, estudos comparativos, anlise de narrativa, anlise do discurso e

    estratgia (Gambarato, 2013) so propostas para a realizao de uma anlise da narrativa

    transmiditica, voltadas, em geral, a somente alguns dos aspectos que compem a narrativa. Mas h,

  • 23

    ainda,anlisesquepretendemabarcaroprojetotransmiditicocomoumtodo.

    Neste captulo, so abordados diferentes tipos de metodologia, a fim de angariar elementos que

    sejam capazes de compor uma metodologia prpria de anlise transmdia. Para tanto, foram tomadas

    como referncia tanto outras anlises realizadas no mbito acadmico, quanto a projetos de narrativa

    transmiditica.

    Ao longo deste captulo, so apresentadas trs dessas metodologias. Essas propostas serviram

    como referncia para a anlise que fundamenta esta investigao, levando em conta especificamente o

    projeto que envolve a narrativa de The Walking Dead. Essas metodologias, usadas como referncia,

    vo desde uma anlise mais especfica, centrada na transmdia nessa srie, at uma metodologia mais

    complexa, que tenta abarcar todas as especificidades dessa forma de narrativa, levando em conta

    desdeasemitica,anarratologia,atividadedefsatosaspectoseconmicosenvolvidos.

    3.1VerificaodePertencimentodaFranquiacomoTransmdia:

    Este mtodo foi desenvolvido especialmente para a anlise da srie The Walking Dead por

    Bona e Souza (2013). O objetivo era analisar os quadrinhos, a srie de TV e o TellTale game,

    conhecidos como as primeiras produes relativas ao universo da srie, a fim de determinar se se trata

    mesmodeumanarrativatransmiditica,comoseprope.

    A anlise foi feita, de forma comparativa, entre o primeiro volume dos quadrinhos, o primeiro

    episdio da srie televisiva, o primeiro websdio e o primeiro captulo do vdeo game, que tem como

    diferencial o fato de ser um episdio jogvel, onde o espectador tem a funo de decidir, durante

    toda a histria, o que o personagem dir e que decises tomar, diante dos fatos que se desenrolam.

    O websdio, por sua vez, analisado em sua totalidade (seis episdios) por compreender uma histria

    porinteiro.

    Para realizar a anlise comparativa entre os meios acima citados, os autores desenvolveram um

    quadro de anlise, baseado em estudos j realizados por Santos e Mielniczuk (2011) a fim de estudar o

    seriado televisivo Lost, bem como a dissertao de mestrado de Long (2007), que analisou as

  • 24

    produesdaJimHansonCompany.

    O quadro tem, como objetivo, verificar o grau de colaborao de cada produto miditico em

    relao mdia principal, de acordo com a anlise dos eventos apresentados em cada uma delas.

    Tambm procura responder s quatro perguntas propostas por Long (2007) a fim de constatar a

    narrativa transmdia [...] e so elas: A extenso cannica? A extenso mantm as caractersticas do

    universo? A extenso responde questes deixadas por textos anteriores? A extenso levanta novas

    questes?(LONG,2007apudBonaeSouza,2013).

    Oquadroporelesconstrudosegueabaixo:

    Fonte:BONA,RafaelJosSOUZA,MarinaPacheco.2013,ANARRATIVATRANSMDIANAERADA

  • 25

    CONVERGNCIA:ANLISEDASTRANSPOSIESMIDITICASDETHEWALKINGDEAD

    Obtevese, como resultado, a seguinte tabela que rene a anlise realizada, de acordo com as

    perguntaslevantadaspelaprimeiratabela,tornandomaistangveisasobservaes:

    Fonte:BONA,RafaelJosSOUZA,MarinaPacheco.ANARRATIVATRANSMDIANAERADA

    CONVERGNCIA:ANLISEDASTRANSPOSIESMIDITICASDETHEWALKINGDEAD

    Verificouse, de acordo com os autores, que a srie de tv e a websrie se desenvolvem a partir

    de fatos prexistentes na srie em quadrinhos, os chamados fatos secundrios, provenientes de uma

    narrativa maior. Os elementos secundrios so aqueles que ganham forma a partir de um universo

    narrativo maior, e que exploram pontos de vista ainda no abordados por ele., segundo Souza (2011

    apud Bona e Souza, 2013, online). A presena desses elementos secundrios, que desenvolvem melhor

    a histria, corrobora com a idia desenvolvida por Jenkins (2008), em que, na narrativa transmiditica,

    o avanar de uma narrativa por diversas mdias, sendo que cada novo texto contribui de maneira

    distintaevaliosaparaotodo.

    Verificase tambm, atravs da anlise da tabela, que todos os meios apresentam contedo

    indito e compreensvel de forma isolada, contribuindo para um entendimento total do universo que

    compe The Walking Dead. Essas caractersticas esto de acordo com as definies de diversos

    outros autores, como Jenkins(2008) e Scolari(2009), a respeito daquilo que diferencia uma narrativa

    transmiditicadeumameraadaptaodeumahistriaemdiversosmeios.

    Esse tipo de observao pde ser apontada graas marcao nos quadros, podendo, assim,

  • 26

    demonstrar que h relaes que se estabelecem entre as diversas mdias. A TV, a websrie e os

    quadrinhos, como se pode observar pelas marcaes, possuem relaes entre si. J o game no se

    desenvolvedosfatossecundriosHQenemumprodutosecundrio.

    Os autores apontam que a construo desse tipo de universo paralelo importante, j que

    viabilizam a disseminao da franquia, alm de explorar melhor personagens e histrias do mesmo

    universo. Do mesmo modo, a ligao entre os produtos secundrios importante na gerao de

    diversospontosdeacessofranquia.

    Esse tipo de mtodo permite a validao de uma determinada franquia, como pertencente

    ideia de transmdia. Atravs desses parmetros estabelecidos, com base na teoria, uma histria

    transmdiaaparecerianoquadrocomopontosdeligao,ouseja,comcaractersticasemcomum.

    Entretanto, esse tipo de anlise no torna possvel a observao detalhada do que ocorre, ou

    seja, como se constri a transmdia no objeto observado. No sabemos, sem explicaes posteriores,

    porque o game reconhecido como parte do universo de The Walking Dead se no parte da narrativa

    dosquadrinhos?ComoawebsrieampliaoquenarradopelaTV?

    Esse tipo de anlise permite apenas inferncias, alm de traar uma comparao entre as mdias

    que compem o universo narrativo sem, no entanto, se aprofundar na relao que estabelecem,

    limitandoseaverificarse,defato,afranquiaanalisadatransmiditica.

    Essa uma etapa importante para a validao de uma pesquisa na rea, mas uma anlise mais

    aprofundada pode se fazer necessria, uma vez que h muitas peculiaridades em uma narrativa

    transmdia. Como dito no incio do captulo, elas podem ser analisadas desde o vis da semitica at

    por um vis econmico e, portanto, necessria uma metodologia que seja capaz de abarcar esse

    diferencialnessaformadenarrativa.

    Ento, considerase que a primeira etapa para uma anlise de narrativa transmiditica seria uma

    verificao como esta, onde se comprova se o produto analisado realmente se encaixa nesse modelo

    de narrativa. Assim, a primeira etapa da anlise, neste trabalho, ser a comprovao de que The

    Walking Dead seria mesmo uma narrativa transmiditica, como se supe. De fato, a prpria aplicao

    da metodologia, neste caso, nos trouxe a resposta, uma vez que os autores usam a srie em sua anlise.

  • 27

    Oaprofundamentodessaquestosedarnoprximocaptulo.

    3.2AnlisepelovisdaSemitica:

    Em tentativa similar, voltada para a construo do universo transmiditico em uma srie

    televisiva, Scolari (2009) desenvolve uma metodologia de anlise transmdia baseada na ideia de

    verificao por tabela, mas se aprofundando mais na anlise semitica envolvida na construo da srie.

    Essa abordagem prov diferentes abordagens de semiticas aplicadas, como a semitica da televiso,

    docinema,doteatro,dosquadrinhos,etc.

    Levando em conta que a narrativa um construto cognitivo, criado pelo intrprete em resposta

    ao texto (Chatman, 1978), o primeiro passo aps a definio de um conjunto de categorias de anlise,

    esclareceraestruturadanarrativatransmiditica(Scolari,2009).

    Ele descreve, neste quadro, os componentes da srie 24, de acordo com sua cronologia,

    levando em conta todos os produtos oficiais que faam parte da narrativa da srie. Ele chama a tabela

    deMapadoMundoNarrativode24,deacordocomoEixoDiegticoTemporal:

    Quadro3:MundoNarrativode24,deacordocomoEixoDiegticoTemporal

  • 28

    Fonte:Scolari,2009

    Scolari explica que, dada a complexidade da srie, no fcil considerar apenas um episdio

    como um texto nico e talvez seja possvel considerar mesmo uma temporada inteira como tal (2008

    p. 597). Atravs da tabela, possvel observar a riqueza e complexidade da narrativa da srie.

    Diversas mdias e diversas narrativas compem aquilo que, somado, se torna o universo que

    compreendeasrie24,equesetornafacilmenteexpansvelgraasaessaestruturaradial.

    Podese assumir que a srie televisiva corresponderia ao cerne do universo ficcional da srie

    24, e a sucesso de temporadas, bem como suas prequelas , corresponderiam a toda uma 8

    macrohistria. Mas, a srie tambm possui microhistrias intersticiais , representadas por todos os 9

    8 Uma prequela (em ingls: prequel) um Obra cinematogrfica ou literria cuja histria ou enredo serve de antecedente a uma j existente. "prequela", in Dicionrio Priberam da Lngua Portuguesa [em linha], 20082013, http://www.priberam.pt/dlpo/prequela[consultadoem22112013].9Intersticial:Intervaloqueseparadoisrgosoudoiscorposcontguosmasnounidos."interstcio",inDicionrioPriberamdaLnguaPortuguesa[emlinha],20082013,http://www.priberam.pt/dlpo/interst%C3%ADcio[consultadoem22112013].

    http:/hhttp:/hhttp:/h

  • 29

    produtos da franquia como jogos, novels, quadrinhos... Que preenchem os espaos deixados entre as

    temporadas(2008p.598)eexpandemahistriaemoutrasmdias.

    A srie, por sua vez, seria com um complexo dispositivo semitico, uma vez que capaz de 10

    ser construdo e tambm construir seu leitor, para gerar mltiplos consumidores (trans)miditicos

    implcitos. (Scolari, 2008, p.597) Atravs da observao desses consumidores, possvel tambm

    notarasdiversasentradasparaouniversoficcional,deacordocomascompetnciasdecadapblico.

    E esses consumidores podem ser divididos em categorias, de acordo com o relacionamento

    que estabelecem com essas mdias que consomem, a forma como as consomem:e a anlise pode

    prosseguirporaqui,nascategoriasdeconsumidores

    Single Text Consumers: interpretam e consomem apenas uma mdia, sem levar em conta a geografia

    do universo que compe a narrativa. Isso possvel porque cada uma dessas unidades textuais age

    como uma porta de entrada para o universo ficcional, que independente e pode ser entendido sem

    que o consumidor tenha que acessar as outras mdias. Tende a ter um contato mais espordico, sendo

    umconsumidorocasional.

    Single Media Consumers: O espectador pode vir a conhecer e consumir o universo da srie atravs

    da mdia onde ele se apia. Por exemplo: ele pode vir a conhecelo acompanhando a srie toda semana

    pelatvoucomprandoodvd.

    Transmedia Consumers: So fs dedicados, capazes de processar as diversas representaes da

    srie, nas diversas mdias e em seus mltiplos textos, sendo capazes de interpretar reas mais extensas

    douniversoficcionalenquantoreconstroemtodoouniversoficcional.

    Notase que esse tipo de estrutura, das sries transmdia, permite a entrada de diversas

    categorias de pblico, com diversos nveis de interesse e envolvimento, o que ampliaria o espectro dos

    segmentosdeaudincia.

    10ParaMouillaud(1997),odispositivonocomandaapenasaordemdosenunciados,masaprpriaposturadoleitor.Seriaumamatrizqueorientaosmodosdeinterpretao,ondeosmodosdeproduooperammecanismosdesignificaoqueincidemsobreaformacomoosreceptoresvoserelacionarcomodiscursoecodeterminaosvnculosqueosreceptoresestabelecemcomumaofertadiscursiva.

  • 30

    Ao observar essa complexa construo do universo narrativo da srie, Scolari (2008) postula

    que possvel identificar ao menos quatro estratgias para a expanso do universo narrativo. Seriam

    elas:

    Criao de microhistrias intersitiais, que enriquecem a narrativa preenchendo os espaos entre as

    temporadasepossuemprofundasligaescomamacrohistria

    Criao de histrias paralelas, ou seja, histrias que se desvelam ao mesmo tempo em que ocorre a

    narrativaprincipal.Podemsedesenvolveretornarsespinoffs 11

    Criao de histrias perifricas: possuem um relacionamento mais ou menos fraco com a

    macrohistria,agindocomosatlites.Tambmpodemevoluirnaformadespinoffs

    Criao de plataformas de contedo usergenerated, como blogs, wikis... So espaos opensource

    quepodemserconsideradosmquinasdefazerhistrias,ajudandoaenriquecerouniversoficcional.

    Dessa anlise, surgem categorias de consumidores das diversas entradas para o universo,

    demonstrando que no apenas os fs dedicados podem compreender o mundo ficcional apresentado,

    mas mesmo os fs espordicos so capazes de se entreter j que cada uma dessas entradas

    independente e autointeligvel. Tambm surgem propostas de estratgias para a expanso do universo

    narrativo, que podem ser utilizadas em anlises a fim de perceber se a srie que se prope

    transmiditicaapresentaelementosnessascategorias.

    Aesserespeito,Scolariconcluique

    as futuras pesquisas nesse mbito devem refinar a definio de transmedia storytelling, e

    analisar mais experincias transmdia a fim de estabelecer propriedades, limites e

    possibilidadesdessetipoespecficodeestruturanarrativa(SCOLARI,2008p.601).

    A estrutura proposta pela tabela de Scolari muito til no caso de histrias encadeadas

    11 Spinoffssosadasmiditicascomoseriestelevisivas,quadrinhosevideogame,derivadasdehistriaspreexistentes.Nospinoff,concentraseemumnovoprotagonistaque,namdiaoriginal,eraumpersonagemsecundrio.(Gambarato,2013)

  • 31

    temporalmente,cujaestruturafortementeancoradanopassardotempo,comoocasode24.

    Nesse ponto, em meu trabalho, levantase o questionamento do que se levaria em conta na

    hora de encadear os fatos que ocorrem no universo ficcional de The Walking Dead? De que forma

    essa anlise semitica contribuiria para a anlise desta srie, especificamente, possibilitando uma viso

    domapadouniversodasrie,almdasespecificidadesdeseupblico.

    3.3PropostadeAnlisedaNarrativacomoumTodo:

    A fim de obter uma anlise completa de uma narrativa transmiditica, focada no somente em

    um dos aspectos passveis de anlise, como o caso da proposta de Scolari(2009) e a semitica,

    ReniraGambarato(2013)propeumaanlisedotodocomplexoquecompeatransmdia.

    Percebendo a complexidade da abordagem do tema, que j comea na prpria definio do

    termo, e percebendo a imensido de vises pelos quais se pode perceber uma transmedia storytelling,

    a proposta dessa metodologia delinear um modelo analtico que possa ser aplicado em uma anlise

    da narrativa transmiditica, a fim de extrair uma viso geral, um panorama do projeto transmiditico

    (2013,online).

    O modelo, ento, prope uma aproximao que facilte as pesquisas, tanto individuais quanto

    em grupo, de modo a organizar melhor essa aproximao e anlise, j que o projeto to complexo e

    repletodeabordagens.umaformaobjetivadeanlisedeamostrasdenarrativastransmiditicas.

    A autora ressalta, no entanto, que esse no um modelo restritivo, uma vez que outras

    perguntas e respostas podem ser adicionadas, alm de permitir o uso de mtodos quantitativos ou

    qualitativos, de acordo com a abordagem que se deseja, alm da disponibilidade dos dados. Graas a

    isso, mais adiante, poderei realizar algumas modificaes, excluses e adies ao modelo, de acordo

    com o que se apresenta na construo de The Walking Dead. Afinal, a cada momento a indstria

    surge com novos modelos e novas formas de abordagem de suas histrias e, nem sempre, um autor

    pode prever essas novas atividades. Cabe s pesquisas posteriores, de certo modo, levar em conta

    essasnovidadeseadaptar,expandiroucorrigiromodeloatualproposto.

  • 32

    A metodologia proposta por Gambarato (2013) tambm se apresenta como uma ferramenta

    extremamente funcional e didtica de analisar uma narrativa transmiditica. Partindo de uma srie de

    perguntas, que se encaixam dentro de dez categorias que seriam os componentes de uma narrativa

    transmiditica. Ao responder a essas perguntas, possvel construir um quadro analtico completo da

    narrativaemquesto.

    As dez categorias teriam sido baseadas em dez questes propostas pela professora Elizabeth

    Strickler, que direcionariam a estrutura do modelo analtico, embora incopore tambm aspectos

    especficos.(2013,p.15)OquestionrioobtidoporGambarato(ano)segueabaixo:

    2.3.a.PremissaePropsito

    a.1.Sobreoqueoprojeto?Qualocernedoprojeto?

    a.2.umprojetoficcional,noficcionaloumisto?

    a.3.Qualopropsitofundamental?entreter,ensinarouinformar?venderumproduto?

    2.3.b.AudinciaeMercado

    b.1.Qualopblicoalvodoprojeto?Quemopretensoespectador/usurio/jogador?

    b.2.Quetipodeespectador(realtime,reflective,ounavigational )queoprojetoatrai?12

    b.3.Quetipodeentretenimentointeressaaudincia?

    b.4.Comquetipodetecnologia/dispositivosessegrupodepessoasseenvolve?

    b.5.Porqueesteprojetoosatrai?

    b.6.Existemoutrosprojetoscomoeste?Elestiveramxitoematingirseupropsito?

    b.7.Qualomodelodenegciosdoprojeto?(Porintncia:free,premium,oufreemium ?13

    b.8.Combasenoprojeto,elefoibemsucedido?Porqu?

    2.3.c.PlataformasdeMdiaeGneros

    c.1. Que tipo de plataformas de mdia(filme, livro, quadrinhos, jogos e alm)esto envolvidos no

    12Janet Murray argumenta que a histria dever funcionar para dois ou trs tipos de usurios, paralelamente: o ativamente engajado realtime viewer, que desfruta de cada episdio, a audincia reflectiva de longo prazo, que procura coerncia na histria, e o usurio navegador, que aprecia as conexes entre as diferentes partes da histria e osmltiplosarranjosdomaterial.(Murray1997:257Jenkins2008:119apudGambarato2013).13 Free, Premium (disponvel apenas para venda), and Freemium (mistura de free e premium) (Pratten 2011 Shmilovici2011apudGambarato2013).

  • 33

    projeto?

    c.2. Quais dispositivos(computador, console de videogame, tablet, celular, etc) so requeridos

    peloprojeto?

    c.3. Como cada plataforma participa e contribui para o projeto como um todo? Quais suas

    funesnoprojeto?

    c.4.Quaissoascaractersticasdistintivasdecadaplataformademdia?

    c.5.Identifiqueosproblemasquesoespecficosdecadameio:

    c.6.Cadameiorealmenterelevanteparaoprojeto?Halgumquesejadesnecessrio?

    c.7. Quais gneros (ao, aventura, detetive, fico cientfica, fantasia e adiante) presentes no

    projeto?

    2.3.d.Narrativa

    d.1.Quaissooselementosnarrativos(Comoenredo,tema,personagens,etc)doprojeto?

    d.2.Qualpoderiaserosumriodanarrativa?

    d.3. Quais so os principais eventos ou desafios com os quais o espectador/usurio/jogador

    temquelidarduranteanarrativa?

    d.4.Oprojetoutilizaelementosdejogos?Oprojetoenvolvevencerouperder?

    d.5. Quais so as estratgias para expandir a narrativa? Existem capacidades negativas e 14

    pistasmigratrias inclusas?15

    d.6.possvelidentificarrefernciasexternaseintertextualidadenahistria?

    2.3.e.Construodomundo

    e.1. Qual o mundo central onde a histria se passa? um mundo ficcional, real ou uma

    misturadeambos?

    e.2.Comoseapresentageograficamente?Comqueseparece?

    e.3.Quaisdesafios,perigosoualegriassoinerentesaessemundo?

    e.4.Ouniversoficcionalgrandeobastanteparasuportarexpanses?

    14 No contexto da narrativa, capacidade negativa significa a habilidade de construir lacunas estratgicas na narrativa, afimdeprovocarasensaodeincertezaemistrionaaudincia(Long2007:5359apudGambarato213)).15 Associado capacidade negativa, abertura migratria representa a habilidade para que essas lacunas funcionem comodirecionadoresparaconexesintertextuaisnouniversodahistria(Long2007:139166apudGambarato2013).

  • 34

    2.3.f.Extenses

    f.1. Quantas extenses tem o projeto? Se ele composto por muitas extenses, selecione as

    maisrelevanteseapliqueelasasquestesseguintes.

    f.2. As extenses so adaptaes (Tradues intersemiticas de um sistema ao outro) ou

    expansesdanarrativaatravsdediversasmdias ?16

    f.3.Cadaumadasextensesdoprojetocannica?Elasenriquecemahistria17

    f.4.Cadaextensomantemascaractersticasoriginaisdeseumundo?

    f.5.Cadaextensorespondeperguntasdeixadassemrespostaanteriormente?

    f.6. Cada extenso levanta novos questionamentos? Eles se abrem para novas possibilidades de

    expansesadicionais?

    f.7. As extenses tem a habilidade de espalhar o contedo, alm de explorar a possibilidade de

    seaprofundarnaexploraodanarrativa?

    2.3.g.Personagens

    g.1.Quemsoospersonagensprimriosesecundriosdahistria?

    g.2. O projeto possui algum spinoff ? Se sim, quem foram os escolhidos para se tornarem 18

    protagonistasdosspinoffs?

    g.3.Ouniversoficcionalpodeserconsideradoumpersonagemprimrioporsis?

    g.4. Existem nonplayer characters (NPCs) no projeto? se sim, quem so e em que tipo de 19

    papelelesatuam?(Aliados,adversrios,suporte,...)?

    2.3.h.Estrutura

    h.1.Quandoatransmediaocomeou?umprojetotransmiditicoproativoouretroativo?

    16Referesea:(Long2007:2225Mungioli2011:130Scolari2009:587Elliot2004:22043apudGambarato2013).p17 Jenkins define canon como o grupo de textos que a comunidade de fans aceita como legitimamente parte do mundo ficcional(2008: 281 apud Gambarato 2013). Tambm se refere a: (Long 2007: 334, 1634 Dena 2009: 56, 98123 apud Gambarato).18 Spinoffs so sadas miditicas como series televisivas, quadrinhos e video game, derivadas de histrias preexistentes. No spinoff, concentrase em um novo protagonista que, na mdia original, era um personagem secundrio.(Gambarato,2013)19 Um nonplayer character (NPC) no jogo um personagem ficcional que no pode ser controlado pelo jogador. Usualmentetambmsignificaotipodepersonagemcontroladopelocomputado(Gambarato2013)

  • 35

    h.2. possvel identificar possveis consequncias ao projeto, causadas poelo fato de ele ser

    proativoouretroativo?

    h.3. possvel considerar o projeto como uma franquia transmiditica, uma histria que contm

    transmdiaouumaexperinciatransmiditica?

    h.4.Cadaextensoatuacomoumpontoindependentedeentradaparaahistria?

    h.5.Quaissoospossveispontosfinaisparaoprojeto?

    h.6. Como se estrutura o projeto? Quais so as unidades maiores de organizao? Apresente

    umavisualizaodisto(Mapadostoryworld ,porexemplo).20

    2.3.i.Aexperinciadousurio

    i.1.Atravs de qual ponto de vista o pblico alvo experiencia o mundo? Em primeira, terceira

    pessoaouumamisturadeambos?

    i.2.Qualopapeldopbliconesseprojeto?

    i.3.Comooprojetomantmoconsumidorengajado?

    i.4.Quaissoosmecanismosdeinteraonesseprojeto?

    i.5. Existe alguma participao envolvida no projeto? Se sim, como o consumidor pode

    participarnosistemaaberto?

    i.6.Oprojetofuncionacomoumatrator/ativadorcultural ?21

    i.7.Comooconsumidorafetaosresultados?Oqueelesadicionamparaomundodahistria?

    i.8 H algum contedo gerado por fs(pardias, recaptulaes, mashups, comunidades de fs)

    Selecioneedescrevaalgunsdeles.

    i.9.Oprojetoofereceaoconsumidoralgumapossibilidadedeimersonomundodahistria?

    i.10. O projeto oferece ao usurio a possibilidade de retirar elementos da histria e

    incorporlosnodiaadia?

    i.11.Existealgumobjetivoimportantequeoousuriodevaalcanarcomoprojeto?

    i.12.Oquefarousuriodesejargastartempo,tentandoatingiresseobjetivo?

    i.13.Oqueadicionatensoexperincia?Halgumtempocronometrado?

    20Paraalgunsexemplos,ver:(Long2007:15,18,33,41,43Hayes2012apudGambarato2013).21 Os atratores cuturais so pessoas com interesses similares e, consequentemente, podem contruir conhecimento junto. Ativadores culturais so projetos que do audincia algo para fazer, uma forma significativa de participao (Jenkins2008:95,283apudGambarato2013).

  • 36

    i.14.Halgumsistemaderecompensaepenalidades?

    2.3.1h.Esttica

    h.1. Que tipo de visuais esto sendo usados no projeto?(Animao, video, grficos, uma

    mistura...?)

    h.2.Emgeral,oambientedoprojetoaparentaserrealsticooufantasioso?

    h.3.possvelidentificarestilisespecficosdedesignnoprojeto?

    h.4.Como funciona o audio nesse projeto? H algum som ambiente (Chuva, vento, barulho de

    carros),efeitosdesom,msica,etc?22

    Como se pode observar, as categorias e as perguntas propostas por Gambarato (2013), com

    base no trabalho de Strickler, (2012) leva em conta a teoria trabalhada por diversos autores, a respeito

    dos componentes essenciais de uma narrativa transmiditica. O questionrio perpassa por

    caractersticas essenciais como a participao e experincia do pblico e seus tipos especficos como

    abordado anteriormente pelo projeto de Scolari (2009), inclusive. Alm disso, inclui os diversos meios

    usados para veicular cada uma das entradas para o universo, bem como a existncia de extenses da

    narrativa corroborando com o que teria sido dito por Scolari(2009) a respeito de uma narrativa

    transmiditica aproveitar o melhor de cada meio para contar a histria, de forma autnoma e

    suplementar em relao s outras, alm de uma estruturao prpria que a define como uma narrativa

    transmiditica e no como mera adaptao de uma histria em diversos meios como discutido no

    trechoinicialdestecaptulo,comametodologiadesenvolvidaporBonaeSouza(2013).

    Quanto aplicabilidade da metodologia proposta por Gambarato no caso especfico deste

    projeto, a ideia encaixar aquilo que foi observado em The Walking Dead dentro da metodologia por

    ela proposta, fazendo as alteraes de acordo com a necessidade, como apontado pela prpria autora

    e, assim, verificar como se deu a construo transmiditica do universo da srie, levando em conta as

    caractersticasquedefinemumanarrativatransmiditica.

    Esses trabalhos apontam diversas caractersticas essenciais construo de uma narrativa

    22Traduonossa.Textooriginal:Veranexos

  • 37

    transmiditica, apontando os elementos tpicos que as compem. Com isso, tornouse possvel

    desenvolver uma prpria metodologia, com base terica fundamentada em diversos autores. No

    prximocaptulo,serapresentadaaanlisecriadaetambmsuaaplicaonoobjetoestudado.

    4ACONSTRUODOUNIVERSOTRANSMDIADETHEWALKINGDEAD

    Propese neste trabalho desenvolver uma metodologia para anlise de narrativas

    transmiditicas a partir das metodologiasde Bona e Souza (2013), Scolari (2009) e Gambarato (2013),

    bem como sua aplicao, a fim de perceber como se d a construo do universo transmidia de The

    Walking Dead. A proposta tem como base as metodologias por eles desenvolvidas, utilizando tambm

    os conceitos norteadores trabalhados no captulo 1, acrescidas de elementos que caracterizariam o

    universo especfico de The Walking Dead levando em conta o material oficial e tambm o que

    produzidopelosfs.

    4.1Verificao:TheWalkingDeadtransmdia?

    A primeira etapa de uma anlise em transmdia seria identificar se, no caso, The Walking Dead

    mesmoumanarrativatransmiditicacomosesupe,inicialmente.

    A fim de responder a esse questionamento, evocase a metodologia elaborada por Bona e

    Souza(2013). O questionamento, levantado pelos autores, que fundamenta esta etapa da metodologia

    :TheWalkingDeadseriamesmoumanarrativatransmiditica?

    Seguindo, ento, sua proposta de metodologia, reproduzse a tabela por eles elaborada, com o

    objetivo de verificar se o tipo de relao que as diversas "entradas" para esse universo estabelecem

    caracterstico da transmdia, ou seja, se apresentam contedo indito entre si, se a narrativa

  • 38

    compreensvel isoladamente, se essas entradas para o universo contribuem para o todo e a relao

    queestabelecemcomamdiaprincipal,quedeuorigemsoutras.

    O trabalho de Bona e Souza(2013) se limita ao primeiro volume da histria em quadrinhos, o

    primeiro episdio da srie televisiva, o primeiro arco de websdios e ao Telltale Game Um jogo da

    franquia, onde o jogador deve tomar decises em nome de um personagem que tenta sobreviver ao

    chamado "apocalipse zumbi". Entretanto, este trabalho pretende analisar a construo do universo

    comoumtodo,considerandotodoomaterialoficialcriadoparaasrie.

    Considerase que a ampliao do escopo de anlise tem muito a acrescentar na pesquisa, uma

    vez que com o avanar das histrias, notase cada vez mais um "afastamento" entre as narrativas, que

    se tornam cada vez mais independentes e suplementares entre si, deixando de lado o aspecto da mera

    adaptao.

    Em especial notase essa "evoluo" na relao transmiditica estabelecida entre a srie

    televisiva e os quadrinhos. Enquanto o primeiro episdio se mantm bastante fiel verso impressa, os

    rumos que a histria toma se tornam cada vez mais diversos. O autor Robert Kirkman chega a dizer

    queasrietelevisivaseriacomoumadimensoalternativadosquadrinhos.

    Assim, o quadro elaborado pelos autores foi ampliado de modo a abarcar os novos elementos

    que foram inseridos ao longo da produo e disseminao dos contedos. As mdias aqui analisadas

    so: a histria em quadrinhos em sua totalidade a srie televisiva at a quarta temporada, que a atual

    ostrsarcosdewebsdiososdoislivrososdiversosgamesrelacionadosfranquia.

    De acordo com o trabalho de Bona e Souza, devese primeiramente responder ao questionrio

    quefoiaquireproduzido,realizandoseapenasasdevidasmodificaes:

    Tabela1:ModelodeQuestionrioTransmdia.

    PlataformaMiditica

    ()HistriaemQuadrinhos()Srietelevisiva()websdios()livros()games

  • 39

    UtilizoufatosdeixadospelaHQparaseudesenvolvimento?

    Sim()No()

    Tratasedecontedoadaptadoouindito?

    Adaptado()Indito()

    possvelcompreenderocontedoisoladamente?

    Sim()No()

    Contribuiparaaformaototaldanarrativa?

    Sim()No()

    Fonte: BONA, Rafael Jos SOUZA, Marina Pacheco.2013, A NARRATIVA TRANSMDIA NA ERA DA

    CONVERGNCIA:ANLISEDASTRANSPOSIESMIDITICASDETHEWALKINGDEAD

    Aps o preenchimento da tabela pela autora, verificouse a seguinte relao estabelecida entre

    asdiversasmdiasanalisadas:

    Tabela2:Tabeladerelaesentreasmdias

    Caractersticas HQ TV Websdio Livro Game

    Utilizou fatos deixados pela HQ

    paraseudesenvolvimento?

    X X x X

    Apresentacontedoindito X X X X X

    Narrativa compreensvel

    isoladamente

    X X X X X

    Contribuiparaanarrativatotal X X X X X

    Fonte:BONA,RafaelJosSOUZA,MarinaPacheco.2013,ANARRATIVATRANSMDIANAERADA

  • 40

    CONVERGNCIA:ANLISEDASTRANSPOSIESMIDITICASDETHEWALKINGDEAD

    Observase, atravs da tabela apresentada, que todas as mdias oficiais que compem o

    universo de The Walking Dead se relacionam de um modo que corrobora com a teoria a respeito da

    relao estabelecida entre as mdias de uma narrativa transmiditica, ou seja, "Transmedia Storytelling

    uma estrutura narrativa particular que se expande atravs de diferentes linguagens e

    mdias(...)[que]participam e contribuem para a construo do mundo narrativo transmiditico"

    (SCOLARI,2009,p.587).

    Sendo a histria em quadrinhos a mdia inicial pela qual a histria contada, antes mesmo de a

    histria adquirir o carter transmiditico, e considerandoa o material de referncia para todas as

    outras, comparase o que veiculado nas outras mdias com o que seria considerado cannico em 23

    relaoaosquadrinhos.

    Deste modo, verificase que a srie televisiva, inicialmente, parece agir como uma adaptao.

    Entretanto, um olhar mais aprofundado nos leva a perceber como mesmo o primeiro episdio j nos

    fornece indcios da construo transmiditica de The Walking Dead. Embora os fatos narrados

    aconteam no mesmo lugar e ordem que a verso em quadinhos, notase um desenvolvimento mais

    aprofundado da relao entre os personagens e certas aes por eles realizada. Destacase,

    especialmente, a apario de Morgan e seu filho, Duane. Eles so os primeiros personagens vivos que

    Rick encontra, aps despertar do coma e tambm quem explica a nova situao do mundo ao

    personagem. Nos quadrinhos, o fato da esposa de Morgan estar morta meramente mencionado, mas

    na srie televisiva o fato tornase conflito constante durante o episdio, j que o zumbi dela ronda a

    casaondeafamliaserefugiamas,omaridosemostraincapazdeeliminla.

    Imagem 1: A esposa de Morgan vaga em frente a casa onde se refugiam. Apesar de ser uma

    ameaaconstantesuafamlia,elehesitaemmatla.

    23Cannico,referenteacnone.Jenkinsdefinecanoncomoogrupodetextosqueacomunidadedefsaceitacomolegitimamentepartedouniversodahistria(2006:281apudGambarato2013).

  • 41

    Fonte: AMC, Disponvel em acesso em 19 nov.

    2013.

    Dali em diante, cada vez mais a histria se distancia dos quadrinhos, chegando at mesmo a

    matar personagens que permanecem vivos na verso impressa, como o caso de Sophia, e chegando

    atmesmoaintroduzirnovospersonagens,comoocasodosirmosDaryleMerleDixon.

    Imagem 2: Sophia, na srie televisiva, morre ainda na segunda temporada. Sua contraparte

    dosquadrinhosaindaestviva.

    Fonte:TheWalkingDeadBR.Disponvelemacessoem19nov.2013

    O primeiro arco de websdios, os dois livros e trs dos cinco games desenvolvidos, tendo

    como base o universo de The Walking Dead, servem como modos de se aprofundar na histria de

    personagens marcantes na srie. Enquanto os websdios conhecidos como Torn Apart dizem

    respeito zumbi que Rick encontra, parcialmente devorada, enquanto escapava do hospital, os livros

    contam a respeito do Governador e de Lily Caul, dois dos principais personagens que aparecem

    durante os quadrinhos. Por fim, os games "Assault", "Dead Reckoning" e "Survival Instinct" se

    aprofundam nas histrias de Rick, Shane e dos irmos Dixon, respectivamente. Os quatro esto entre

    os principais personagens responsveis pela ao e luta mais intensas durante a srie. Embora o

    http:/hhttp:/h

  • 42

    ltimo jogo no tenha relao direta com os quadrinhos, e sim com a srie televisiva, ainda faz parte do

    universopoisinsereojogadornasituaovividaporumsobrevivente.

    O contedo indito tambm encontrado nas outras mdias ainda no mencionadas: os dois

    jogos restantes O social game e o Telltale Game e os dois arcos mais recentes de websdios. Todos

    eles contam a respeito de outros sobreviventes, que no aparecem diretamente na srie televisiva e nem

    na HQ, e que estariam lutando paralelamente aos fatos centrais da histria que envolve Rick e seu

    grupo.

    Ressaltase que cada uma dessas narrativas apresenta autonomia de sentido isoladamente.

    possvel que o usurio tenha apenas interesse em jogar os jogos, ou queira apenas ler os livros. H

    pontos de ligao entre as narrativas, sendo possvel notar que pertencem a um contexto muito maior.

    Entretanto, mesmo os websdios que partem do que ocorre na srie de TV podem ser entendidos

    isoladamente,jquesetratamdehistriascomcomeo,meioefim,autoexplicativas.

    Apenas caso o espectador tenha interesse, ele pode partir para as outras mdias a fim de

    compreender certas referncias, como o caso da porta que faz parte do websdio The Oath. Ela

    seria a mesma porta do hospital onde Rick estava internado durante o apocalipse zumbi. No

    necessrio que o espectador do websdio conhea a referncia, tampouco que o espectador da srie

    televisiva venha a saber as origens do objeto. Entretanto, ao ter acesso a ambas as mdias, temse um

    conhecimento mais aprofundado a respeito dos fatos que ocorreram em torno daquele lugar. Ou seja,

    como explica Jenkins (2008, p. 135), uma estria transmiditica se desenrola atravs de mltiplos

    suportesmiditicos,comcadanovotextocontribuindodemaneiradistintaevaliosaparaotodo.

    Imagem 3: A porta vista nos dois momentos: no primeiro episdio, encontrada por Rick

    GrimesenoWebsdio"TheOath".

  • 43

    Fonte: AMC, Disponvel em acesso em 19 nov. 2013.

    Portanto, notase que, mesmo com a ampliao do objeto analisado e a adio de um

    elemento o livro, podese ainda considerar que The Walking Dead sim uma narrativa

    transmiditica.

    Partindose desta constatao, avanase para uma anlise mais aprofundada, tendo como

    baseatabelapropostaporScolari(2009).

    4.2:OMapadoUniversoTransmiditicodeTheWalkingDead

    Scolari (2009) sugere uma organizao das mdias envolvidas na narrativa da srie 24 em uma

    tabela, seguindo a ordem cronolgica, de modo a oferecer um panorama visual da organizao desse

    universo. Para os fs dessa srie, importante perceber o encadeamento dos fatos, qual mdia conta o

    quevemanteseoquevemdepois,paraseaprofundardemododetalhadonosacontecimentos.

    Entretanto, The Walking Dead se desenvolve de maneira um tanto diferente. O encadeamento

    temporal nos revela uma simultaneidade dos acontecimentos. Ao mesmo tempo, podemos saber como

    cada grupo de sobreviventes lidou com os eventos do apocalipse zumbi e como continuam a sobreviver

    atopontoemquechegam,ouno,ainteragir.

    Deste modo, no se trata apenas de encadear os fatos, mas tambm de demonstrar sua

    durao, para verificar a forma como os acontecimentos interagem no espaotempo da srie. Com

    isso, adaptandose a tabela proposta por Scolari, obtmse o seguinte mapa do universo transmdia de

    TheWalkingDead:

    Quadro4:Mapadoseventosquecompemanarrativa:

    http:/h

  • 44

    Fonte:Elaboradopelaautora

    Verificase que muitos eventos ocorrem, de fato, simultneamente. E, com isso, questionouse

    que relao as histrias contadas em cada mdia estabelecem entre si, bem como a presena constante

    dematerialinditoemtodasasmdias.

    A esse respeito, elaborouse aqui o seguinte infogrfico, que busca demonstrar a configurao

    intermdiadeTheWalkingDead:

    Infogrfico1:Mapadasrelaesentreasmdias:

  • 45

    Fonte:Elaboradopelaautora

    Atravs do infogrfico, notase que a histria em quadrinhos e a srie televisiva compartilham

    histrias muito similares, elas tm muito em comum. Ambas seguem a histria de Rick Grimes, um

    exxerife que foi baleado em ao, entrado em coma. Quando o homem acorda, percebe que o mundo

    foitomadopormortosvivosqueagematravsdeseusinstintos,devorandoacarnedeseresvivos.

    Num primeiro impulso, Rick parte para encontrar sua esposa e filho pequeno, que teriam fugido

    para Atlanta. Chegando l, ele encontra no apenas sua famlia, mas todo um grupo de refugiados para

    os quais assume uma posio de liderana. A partir da, vemos a luta de Rick e seu grupo para

    sobreviverem diante da ameaa, no apenas dos mortos que podem devorlos, mas dos vivos que

    podemsertoviolentoseletaisquanto.

    J as mdias complementares parecem atuar de forma a explicar ou se aprofundarem melhor

    naquiloquecontadonasnarrativasmaiores.

    O livro detalha os eventos da vida do Governador e de Lily Caul se inserem na narrativa dos

    quadrinhos, atuando como uma prequela. Por outro lado, os websdios so prequelas para os eventos

    que ocorrem na srie televisiva, se inserindo na narrativa dela. O ponto de contato com a HQ seria o

  • 46

    primeiro websdio, entitulado Torn Apart que narra a respeito da zumbi que Rick teria encontrado

    tanto no quadrinho quanto na srie televisiva. Os outros dois arcos de websdios The Oath e Cold

    StoragefazemrefernciasaosacontecimentosdasriedeTV.

    Por fim, os jogos aparecem de forma diversificada, no que diz respeito relao que

    estabelece com as outras mdias. Enquanto Survival Instinct e o Game Social fazem referncias

    diretas a acontecimentos da srie televisiva, evidenciados pela presena dos irmos Dixon, Dead

    Reckoning faz referncias ao Shane dos quadrinhos. O Telltale Game apresenta uma pequena

    intercesso com os quadrinhos Quando encontramos um de seus personagens logo no incio do jogo,

    um dos filhos de Hershel Greene, embora siga um grupo completamente diferente de sobreviventes.

    Por isso, foi representado pela sesso que no se inclui nem no contato com os quadrinhos, nem com a

    srietelevisiva.

    Esse tipo de mapeamento importante porque oferece uma viso geral da construo do

    universo, que bem peculiar no caso de uma narrativa transmiditica. Enquanto uma mera adaptao

    se encaixaria completamente dentro da mdia original, at mesmo se diluindo no contedo desta, na

    transmdia as histrias compartilham elementos de ligao no caso de The Walking Dead, o fato de

    serem prequelas ou histrias paralelas aos acontecimentos da srie televisiva ou dos quadrinhos, mas

    tambm possuem elementos que lhes conferem um carter indito, algo que no pde ser visto nas

    outras mdias. Alm disso, so compreensveis de forma isolada, de modo a formarem partes

    suplementaresentresique,nofim,geramtodoouniversotransmiditico.

    Constatado o fato de a narrativa ser mesmo transmiditica e verificando a relao que as mdias

    estabelecem entre si, a ltima etapa consiste em analisar os elementos utilizados pela produo das

    diversas mdias para a construo do universo de The Walking Dead. Conforme apresentado no

    captulo anterior, Gambarato (2013) sugere a resoluo de um questionrio, que poderia ser

    modificadodeacordocomanarrativaanalisada,afimdelevantartaiselementos.

    4.3OselementosqueconstroemTheWalkingDead:

    Nesta etapa, foram reunidas as perguntas feitas por Gambarato (2013), que se mostram mais

    representativas daquilo que acontece em The Walking Dead, uma vez que se encaixam na construo

  • 47

    especfica dessa narrativa. Perguntas cuja respostas sejam apenas no ou que j foram desenvolvidas

    anteriormente foram desconsideradas. Alm disso, algumas perguntas foram modificadas, tendo por

    base as concluses a que Scolari (2009) chega quanto s atividades do pblico especfico de

    transmdia.

    4.3.1.PremissaePropsito

    Sobreoqueoprojeto?Qualocernedoprojeto?

    The Walking Dead conta a histria da humanidade em um cenrio psapocalptico,

    desencadeado pelo retorno dos mortos como zumbis que se alimentam de qualquer ser vivo. O foco da

    narrativa, entretanto, o drama humano, tornando os zumbis quase secundrios, aparecendo durante

    hiatos na histria dos relacionamentos travados entre os sobreviventes, a tal ponto que, no captulo 24,

    Rick declara: Ns somos os mortosvivos (No original, We are the Walking Dead, deixando claro

    aqueottuloserefere.).

    umprojetoficcional,noficcionaloumisto?

    O projeto ficcional. A nica exceo seriam as atividades desenvolvidas por e para os fans,

    como os cosplays da srie e tambm a casa mal assombrada. Nela, os visitantes podem interagir com

    as principais locaes da srie, inclusive caminhando por dentro da priso onde os personagens vivem

    atualmente, e serem assustados por atores fantasiados de zumbis, inclusive reconstituindo algumas das

    aparies mais memorveis da srie televisiva, como o zumbi que estava preso no poo da fazenda

    Greene.

    Qual o propsito fundamental? entreter, ensinar ou informar? vender um

    produto?

    O propsito o entretenimento. Em se tratando de uma srie ficcional com elementos

    fantsticos, o que se pode extrair em termos de conhecimento seria fruto da abstrao do espectador e

    noporsetratardeumobjetivoexplcitodoprojeto.

    O produto que se vende ali o prprio The Walking Dead. Scolari(2009) fala a respeito de

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    Brand Fiction, em que a fico a marca, a fico o produto. A srie se tornou um produto e at um

    modo de vida para fs mais engajados, que criam contedos prprios, se fantasiam como os

    personagens.

    4.3.2.AudinciaeMercado:

    Qualopblicoalvodoprojeto?

    possvel separar o pblicoalvo de acordo com as mdias que consomem. Embora o fato de a

    histria ter sido lanada, inicialmente, em quadrinhos no fosse parte do projeto transmiditico de The

    Walking Dead, eles se mostram como