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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO COPPEAD – Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração DEFESA DE DISSERTAÇÃO DE MESTRADO O PROCESSO DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA CONSTRUTORA MENDES JÚNIOR: a expansão, a retração e a retomada ao mercado internacional Vinícius Gabeira Cola Mestrado em Ciências (M. Sc.) em Administração Orientadora: Prof. Dr. Ariane Cristine Roder Figueira Rio de Janeiro – RJ 2016

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

COPPEAD – Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração

DEFESA DE DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

O PROCESSO DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA CONSTRUTORA MENDES

JÚNIOR: a expansão, a retração e a retomada ao mercado internacional

Vinícius Gabeira Cola

Mestrado em Ciências (M. Sc.) em Administração

Orientadora: Prof. Dr. Ariane Cristine Roder Figueira

Rio de Janeiro – RJ

2016

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VINÍCIUS GABEIRA COLA

O PROCESSO DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA CONSTRUTORA MENDES

JÚNIOR: a expansão, a retração e a retomada ao mercado internacional

Dissertação de Mestrado apresentado

ao Programa de Pós-Graduação em

Administração, Instituto COPPEAD de

Administração, Universidade Federal

do Rio de Janeiro, como requisito

necessário à obtenção do título de

Mestre em Administração.

Orientadora: Prof. Dr. Ariane Cristine Roder Figueira

Rio de Janeiro – RJ

2016

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VINÍCIUS GABEIRA COLA

O PROCESSO DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA CONSTRUTORA MENDES

JÚNIOR: a expansão, a retração e a retomada ao mercado internacional

Dissertação de Mestrado apresentado

ao Programa de Pós-Graduação em

Administração, Instituto COPPEAD de

Administração, Universidade Federal

do Rio de Janeiro, como requisito

necessário à obtenção do título de

Mestre em Administração.

Aprovada em: ________________________________________________________

Ariane Cristine Roder Figueira, D. Sc. – COPPEAD/UFRJ

Renato Cotta de Mello, D. Sc. – COPPEAD/UFRJ

Larissa Rosevics de Almeida, D. Sc. – UCP

Rio de Janeiro – RJ

2016

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AGRADECIMENTOS

Agradeço essencialmente ao COPPEAD, responsável por todo esse trajeto de

aprendizado, fundamental para minha formação profissional e pessoal. Dentro da

Instituição destaco o corpo docente, em especial a Professora Ariane Roder, minha

orientadora, que me ofereceu a oportunidade da pesquisa, e teve toda paciência do

mundo para me aconselhar sobre assuntos dentro e fora do projeto. Também

ressalto a importância dos companheiros de mestrado, imprescindíveis para a

discussão e formação de novas ideias, com destaque para Bernardo, veterano de

quem herdei o legado do tema dessa pesquisa, junto de uma incrível rede de

contatos e material relevante para conduzi-la, e Diogo, companheiro de orientação,

com quem dividi frustrações e superações, e agora compartilho esse sucesso.

Devo agradecer também à minha família, principal suporte mental e financeiro

durante essa jornada, minha principal incentivadora, que não me abandonou em

nenhum momento. Da mesma forma sou grato às confrarias Boregan e RdG,

famílias por escolha, igualmente importantes.

Por fim, agradeço à Dona Izabel e João, por me abrigarem, e aos colaboradores

da pesquisa que preferem permanecer anônimos.

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RESUMO

COLA, Vinícius Gabeira. O PROCESSO DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA

CONSTRUTORA MENDES JÚNIOR: a expansão, a retração e a retomada ao

mercado internacional. Rio de Janeiro, 2016. Dissertação de Mestrado em

Administração – Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio

de Janeiro, Rio de Janeiro, 2016.

O presente trabalho tem como objetivo explorar o movimento de

internacionalização da Construtora Mendes Júnior, abrangendo as etapas de

expansão pioneira dentro do setor, subsequente retração, e retomada das atividades

no exterior. Observou-se fatores internos, relativos às decisões estratégicas da

empresa, tanto quanto variáveis externas, referentes à influência de instituições

exógenas ao longo do processo. A análise foi embasada pelo Paradigma Eclético de

Dunning e as posteriores contribuições da Teoria Institucional, com foco na

Diplomacia Triangular, buscando compreender os interesses de todas as partes

envolvidas no processo, e os mecanismos pelos quais elas se integram para atingir

seus objetivos. Foi utilizado o método do estudo de caso com abordagem

longitudinal, sustentado por dados primários e secundários submetidos à

triangulação. Ao fim é apresentado um framework demonstrando a interação entre

os conceitos teóricos e o movimento, evidenciando as propriedades internas da

companhia que levaram à internacionalização, bem como as particularidades de

cada etapa, ratificando a grande influência dos ambientes institucionais destacada

nas teorias.

Palavras-chave: Internacionalização de Empresas, Mendes Júnior, Construção Civil,

Paradigma Eclético, Teoria Institucional, Diplomacia Triangular.

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ABSTRACT

COLA, Vinícius Gabeira. O PROCESSO DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA

CONSTRUTORA MENDES JÚNIOR: a expansão, a retração e a retomada ao

mercado internacional. Rio de Janeiro, 2016. Dissertação de Mestrado em

Administração – Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio

de Janeiro, Rio de Janeiro, 2016.

This study aims to explore the internationalization movement of the construction

company Mendes Júnior, comprising the steps of pioneering expansion in the sector,

subsequent retraction, and resumption of activities abroad, observing internal factors

relating to the strategic decisions of the company, as well as external variables,

referring to the influence of exogenous institutions throughout the process. The

analysis was based by Dunning’s Eclectic Paradigm, and following contributions of

the Institutional Theory, focusing on the Triangular Diplomacy, seeking to understand

the interests of all parties involved in the process, and the mechanisms by which they

are integrated to achieve their goals. The method utilized was the case study with

longitudinal approach, supported by primary and secondary data submitted to

triangulation. At the end, a framework is presented demonstrating the interaction

between theoretical concepts and the movement, showing the internal properties of

the company that led to the internationalization as well as the singularities of each

stage, confirming the great influence of institutional settings highlighted in the

theories.

Keywords: Internationalization, Mendes Júnior, Civil Construction, Dunning’s Eclectic

Paradigm, Institutional Theory, Triangular Diplomacy

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Lista de Figuras

Figura 1: Precursores do Paradigma Eclético ......................................................................... 22

Figura 2: Modelo da Diplomacia Triangular ............................................................................. 37

Figura 3: Risco nos negócios internacionais ........................................................................... 38

Figura 4: Framework teórico-conceitual ................................................................................... 43

Figura 5: Presença das empreiteiras brasileiras no mundo atualmente ............................. 51

Figura 6: Presença histórica internacional da Mendes Júnior .............................................. 52

Figura 7: Síntese do contrato de Sale and Lease Back ........................................................ 72

Lista de Gráficos

Gráfico 1: Evolução trimestral da construção civil no Brasil ................................................. 53

Gráfico 2: Distribuição percentual do número de empresas e empregados e valor das

obras ..................................................................................................................................................... 54

Lista de Quadros

Quadro 1: Paradigma Eclético da produção internacional .................................................... 24

Quadro 2: Relação entre vantagens e modos de entrada .................................................... 25

Quadro 3: Vantagens de Propriedade, Localização e Internalização ................................. 26

Quadro 4: Respostas estratégicas aos processos institucionais ......................................... 33

Quadro 5: Exemplos de instituições formais e informais que afetam a configuração OLI

das empresas ...................................................................................................................................... 35

Quadro 6: Porcentagem do faturamento das cinco maiores empresas de construção em

relação às cem maiores .................................................................................................................... 48

Quadro 7: Empresas de construção pesada com obras no exterior ................................... 49

Quadro 8: Dados gerais da indústria da construção - Brasil (2012-2013) .......................... 54

Quadro 9: Logística da Mendes Júnior no Iraque ................................................................... 62

Quadro 10: Resumo do movimento à Bolívia .......................................................................... 83

Quadro 11: Resumo do movimento à Argélia ......................................................................... 85

Quadro 12: Resumo do movimento à Mauritânia ................................................................... 86

Quadro 13: Resumo do movimento ao Iraque ........................................................................ 88

Quadro 14: Resumo do movimento ao Chile .......................................................................... 89

Quadro 15: Síntese dos movimentos internacionais da Mendes Junior, e as teorias

observadas .......................................................................................................................................... 90

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IX

Sumário

1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 11

1.1. OBJETIVOS DO ESTUDO ................................................................................................. 11

1.2. CONTEXTUALIZAÇÃO ..................................................................................................... 11

1.3. RELEVÂNCIA DO ESTUDO .............................................................................................. 16

1.4. ESTRUTURA DO TRABALHO ........................................................................................... 17

2. REVISÃO DE LITERATURA ..................................................................................................... 19

2.1. MUDANÇAS ESTRUTURAIS NA ECONOMIA GLOBAL ..................................................... 19

2.2. MODELOS TEORICOS DE INTERNACIONALIZAÇÃO DE EMPRESAS ................................ 20

2.2.1. Paradigma Eclético De Dunning ................................................................................... 21

2.2.2. Teoria Institucional ....................................................................................................... 27

2.2.2.1. Visão Sociológica ....................................................................................................... 28

2.2.2.2. Nova Economia Institucional ..................................................................................... 29

2.2.2.3. Novo Institucionalismo Organizacional ..................................................................... 32

2.2.3. O Paradigma Eclético Frente À Teoria Institucional .................................................... 33

2.2.4. Diplomacia Triangular .................................................................................................. 35

3. METODOLOGIA ..................................................................................................................... 40

3.1. QUESTÕES DE PESQUISA ............................................................................................... 40

3.2. MÉTODO DE PESQUISA ................................................................................................. 40

3.3. MÉTODO DE COLETA E ANÁLISE DE DADOS .................................................................. 42

3.4. LIMITAÇÕES DO ESTUDO ............................................................................................... 44

4. HISTÓRICO DO AMBIENTE SETORIAL ................................................................................... 45

4.1. A CONSTRUÇÃO CIVIL NO BRASIL...................................................................................... 45

4.2. INTERNACIONALIZAÇÃO DO SETOR .................................................................................. 48

5. EXPOSIÇÃO DO CASO............................................................................................................ 55

5.1. CONSOLIDAÇÃO INTERNA ................................................................................................. 55

5.2. MOVIMENTO DE INTERNACIONALIZAÇÃO PIONEIRO ....................................................... 59

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X

5.3. CRISE INTERNA E RECUO DA PRESENÇA INTERNACIONAL ................................................ 63

5.3.1. O Caso Iraque .................................................................................................................... 64

5.3.1.1. Papel Do Governo Na Contratação Da Mendes Júnior ................................................. 64

5.3.1.2. Desenvolvimento Das Obras ......................................................................................... 68

5.3.1.3. Disputa Judicial Entre Mendes Júnior E Banco Do Brasil .............................................. 76

5.3.2. Falhas Administrativas ..................................................................................................... 77

5.4. PRESENTE E FUTURO ......................................................................................................... 80

6. ANÁLISE DO CASO ................................................................................................................. 81

6.1. MOVIMENTO INICIAL ........................................................................................................ 81

6.2. EXPANSÃO INTERNACIONAL ............................................................................................. 84

6.3. PONTO DE INFLEXÃO ......................................................................................................... 86

6.4. PRESENÇA INTERNACIONAL ESTRATÉGICA ....................................................................... 88

7. CONCLUSÕES......................................................................................................................... 90

8. BIBLIOGRAFIA ....................................................................................................................... 93

ANEXO A – Questionário para entrevista .................................................................................... 105

ANEXO B – Cronologia do contencioso entre Banco do Brasil e Mendes Júnior ....................... 106

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1. INTRODUÇÃO

1.1. OBJETIVOS DO ESTUDO

O objetivo deste trabalho é analisar o processo de internacionalização de uma

das maiores empresas nacionais no setor de construção civil, a Mendes Junior,

englobando as diversas etapas, que envolveu seu pioneirismo na expansão para o

mercado externo, a subsequente retração na década de 1990, e a atual retomada de

suas atividades para o exterior.

A pesquisa busca iluminar características de todas as fases do processo, no que

tange motivações para internacionalização, escolha do destino, aspectos do decurso

do movimento, perspectivas sobre risco e oportunidade, e influência de instituições

exógenas sobre o caso. Também é alvo de investigação as particularidades

responsáveis pela descontinuidade da trajetória internacional percorrida pela

companhia.

1.2. CONTEXTUALIZAÇÃO

As motivações que impelem a internacionalização das empresas abrangem uma

gama extensa de justificativas. Francischini (2009) sumariza uma série de benefícios

que são buscados pelas firmas ao procurar o mercado externo, destacando que as

pesquisas são vastas e não excludentes (ALEM & MADEIRA, 2010; LASSERRE,

2003), portanto trata-se dos principais itens observados: 1) liderança global, por

meio de aquisições e fusões, no intuito de tornarem-se referência global; 2)

manutenção do crescimento, uma vez saturado o mercado doméstico; 3) acesso a

recursos estratégicos, como capital internacional, matéria-prima e tecnologia; 4)

superação de barreiras alfandegárias, contornando barreiras tarifárias e não

tarifárias que limitam a exportação; 5) acompanhamento e proximidade de clientes,

estreitando laços; 6) estabelecimento de canais de distribuição, ultrapassando o teto

alcançado pela simples exportação; 7) globalização e valorização da marca no

exterior e no mercado interno; 8) redução de custo, através de subcontratação da

produção no exterior; e, acima de tudo, 9) estar preparado para novas

oportunidades.

No conceito de autores mais clássicos, a motivação para internacionalização é

exemplificada na busca por novos mercados, otimização dos recursos, ganhos de

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eficiência, novos ativos estratégicos, ou consolidação das operações, sendo que os

processos podem ser respostas ao movimento de competidoras (DUNNING, 1988,

2000; JOHANSON & VAHLNE, 2009).

Em estudo de um conjunto de grandes empresas brasileiras, Tanure et al (2007)

concluem que a principal motivação para internacionalização foi a manutenção das

taxas de crescimento. Rocha et al (2007) escrutinam esse aspecto, acrescentando

os exemplos de grandes construtoras nacionais, como Odebrecht, Camargo Corrêa,

Andrade Gutierrez e Queiroz Galvão, que buscaram a continuidade do crescimento

internacionalmente como consequência da redução de contratos governamentais

para construção de grandes obras.

O processo de internacionalização também apresenta trade-offs, que podem

acarretar na descontinuidade do movimento. Keegan (2006) apresenta três

principais forças que restringem a internacionalização de empresas: miopia

gerencial, como gestão local ou etnocêntrica, e divergência entre os setores

doméstico e externo, que ofusca as oportunidades; controle nacional, representado

por barreiras tarifárias e não tarifárias, e custo de adequação; e oposição cultural à

globalização, devido à crença das mazelas trazidas pela internacionalização. Ainda,

segundo o autor, o ambiente político pode inibir a eficiência e lucratividade. Nesse

quesito, são observadas questões relacionadas ao risco político, perspectiva sobre

soberania dos líderes, impostos, e risco de expropriação.

A internacionalização de empresas de países emergentes é foco de estudo de

Mathews (2006). Para o autor, as características padrões que propelem a

internacionalização de organizações, como vantagens específicas de propriedade

(DUNNING, 1977), nem sempre são observadas em companhias que se

internacionalizam tardiamente. O modelo Linkage-Leverage-Learning (LLL) destaca

como característica da economia global emergente a formação de conexões entre

firmas e a adoção de novas estruturas organizacionais, visando compensar a falta

de acesso a recursos, o que explica a internacionalização acelerada desse grupo de

empresas (MATHEWS, 2006). Ramamurti (2012) propõe o aprofundamento de

pesquisas acerca das afirmações de Mathews (2006), sugerindo que as vantagens

de propriedade das empresas emergentes sejam apenas diferentes das previamente

constatadas, refletindo as condições de seu país de origem. Além disso, o autor

apresenta um contraponto sobre a afirmação de que o comportamento internacional

dessas companhias é derivado de seu ambiente de origem, sugerindo que o

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contexto global, do setor e interno da própria empresa, têm impactos relevantes

nesse comportamento.

A visão institucional de Ramamurti (2012) é de acordo com o estudo de Cuervo-

Cazurra e Genc (2008). Os autores citam desafios particulares enfrentados por

empresas de países emergentes, como seu tamanho geralmente menor, terem

recursos menos sofisticados, e estarem contidos em um mercado com ambiente de

governança problemática. Apesar disso, elas ainda podem ser bem-sucedidas no

movimento de internacionalização, já que variações institucionais são percebidas

como um fator de risco muito alto para empresas de países desenvolvidos, deixando

uma lacuna de mercado em países subdesenvolvidos. Nesse caso, as

multinacionais de países em desenvolvimento transformam sua experiência em

ambiente institucional complexo em vantagens ao serem aplicadas em condições

ainda piores (CUERVO-CAZURRA & GENC, 2008).

Tratando especificamente do setor de engenharia e construção civil, é notável a

relevância universal das exportações. Apesar de enfrentar forte recessão pós-crise

de 2008, a categoria ainda participa com 2,2% de todos os serviços exportados no

mundo, totalizando mais de 105 milhões de dólares em 2013, sendo a metade das

exportações de responsabilidade de países em desenvolvimento (UNCTAD, 2013).

Dados do IBGE (2015) apontam que o setor de construção civil representa 6% do

PIB nacional desde o início da crise, e as exportações de serviços relacionados à

engenharia atingiram o patamar de 9 bilhões de dólares em 2012.

Os efeitos da exportação do setor vão além. David Barioni, presidente da

Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil),

enaltece sua função precursora na cadeia produtiva, que envolve cerca de 2500

empresas de pequeno e médio porte para darem suporte aos serviços de

engenharia (ABECE, 2015). Essas estatísticas corroboram o princípio de influência

de instituições exógenas no processo de internacionalização, pois, além de

carregarem a imagem do país, seus benefícios extrapolam interesses particulares

das firmas.

Porém, na visão de Alem e Cavalcanti (2005), o governo brasileiro surge como

parte interessada tardiamente. Suas ações ainda são bastante restritas, e o sucesso

das empresas decorre de seu esforço próprio. Segundo Figueira (2013, p. 7):

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[...] as empresas ainda esbarram em altas cargas tributárias no país, no elevado custo de capital para operações no exterior, na volatilidade cambial, na falta de seguro para investimentos externos, dentre outros aspectos de ordem macroeconômica que acabam por dificultar o avanço empresarial para além das fronteiras nacionais.

Alem e Cavalcanti (2005) discutem os principais pontos desfavoráveis debatidos

acerca do processo: exportação de mão de obra, impacto negativo na balança

comercial acarretado pela saída de divisas e redução de investimento no cenário

doméstico, já que a investida internacional demandaria prioridade estratégica. Os

autores afirmam que essa é uma visão estática, e em todo seu dinamismo, a

internacionalização promove não só a sobrevivência das empresas, como o

fortalecimento do mercado nacional.

O primeiro aspecto é bem exposto por Sennes, Mendes e Kohlman (2009), que

ressaltam o crescimento produtivo, tecnológico e financeiro das empresas,

agregando competitividade na volta da organização ao seu país de origem,

ameaçando as multinacionais instaladas no território nacional.

As consequências dessa alavancagem são vislumbradas por Alem e Cavalcanti

(2005), ao citarem a criação de empregos numa companhia competitiva, em vez

dela fechar suas portas frente à concorrência internacional desleal. A própria missão

do BNDES, principal agente governamental no fomento à exportação, conferindo

financiamentos a juros relativamente baixos, prevê "desenvolvimento sustentável e

competitivo da economia brasileira, com geração de emprego e redução das

desigualdades sociais e regionais" (BNDES, 2016) ao executar a política nacional de

desenvolvimento econômico.

Quanto ao balanço de pagamentos, uma Nação com tendências exportadoras

tem como base "aumento, no médio e longo prazo, da entrada de divisas no país

(remessas de lucros), podendo ser vista como base para o equilíbrio das contas

externas do país" (SENNES, MENDES, KOHLMAN, 2009, p. 14), decorrentes de

investimentos em importações e débito externo. Além disso, há a geração de divisas

em moeda forte internacional, como salienta Alem e Cavalcanti (2005).

Entretanto, os benefícios alcançados vão além do simples contra-argumento aos

pontos desfavoráveis. Strange (1992) aponta que os custos com P&D estão

aumentando frente às tecnologias disruptivas e ao avanço exponencial de meios de

produção. Portanto, faz-se necessária a tomada de ações para reduzir esse gasto.

Uma solução seria diluir esses custos ao alcançar ganhos de escala, expandindo o

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mercado. Não obstante, a internacionalização pode acarretar em maior acesso a

tecnologias diferentes. Alem e Cavalcanti (2005) corroboram com a ideia afirmando

que "dispersão geográfica das atividades de P&D pode fortalecer a base tecnológica

das empresas" (ALEM & CAVALCANTI, 2005, p. 56). As novas tecnologias seriam,

portanto, dissipadas em território nacional.

Os autores salientam o efeito de transbordamento de todas as conquistas das

multinacionais como favorável ao mercado interno.

O contato com produtores e consumidores estrangeiros leva a uma troca de informações relacionadas à produção. O aprendizado induzido pelos exportadores, a fim de atingir os altos padrões de qualidade e os desafios da competição em mercados estrangeiros, pode assim “transbordar” para a economia doméstica. (ALEM & CAVALCANTI, 2005, p. 59).

Atinge-se, assim, a esfera política. Tanto o governo quanto as empresas

precisam determinar os pontos fortes e fracos de seus parceiros antes de

promoverem um acordo, conforme mencionado por Strange (1992). Portanto, a troca

de conhecimento entre os dois é imprescindível. "Uma rede de empresas nacionais

no exterior pode ser um importante ativo para o desenho de uma estratégia externa

soberana e autônoma" (SENNES; MENDES; KOHLMANN, 2009, p. 19). Um simples

estudo de viabilidade de investimento direto no exterior por parte de uma companhia

geraria informações de utilidade sem precedentes para o governo.

De posse dessas informações, o Brasil poderia exercer um cone de influência na

América do Sul e em outros países em desenvolvimento. O Conselho de

Desenvolvimento Econômico e Social, em seus enunciados estratégicos para o

Desenvolvimento, aborda o direcionamento das políticas externas:

O desenvolvimento econômico do País deve ser focado simultaneamente na expansão dos mercados interno e externo. No tocante ao mercado externo, há de se levar em conta que num mundo globalizado o país deve buscar alianças estratégicas regionais e multiregionais para melhorar a competitividade externa. A política externa deve ser ambiciosa de forma a garantir a abertura de novos mercados e perseguir a redução das assimetrias econômicas e sociais no âmbito da América do Sul. (CDES, 2010, p. 25)

Essa parceria governo-empresa tem também uma específica função diplomática.

Ao tratar da horizontalização no direcionamento da política externa brasileira, mais

especificamente da Cooperação Sul-Sul, Figueira (2013) enfatiza a aproximação de

países em desenvolvimento e o papel das empresas nesse processo. "A presença

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externa de empresas brasileiras em outros países, especialmente com IDE, tende a

levar a um estreitamento de laços diplomáticos com outros Estados possibilitando o

fechamento de acordos interessantes para o país em outras áreas" (FIGUEIRA;

2013; p. 6). Isso culminaria no aumento de todas as características já abordadas:

intensificação do comércio e investimentos, troca de conhecimento, redução da

dependência e concorrência de países desenvolvidos, e consolidação de alianças

estratégicas para condução de acordos multilaterais.

Frente aos interesses do governo ao movimento de internacionalização, foi

conduzido um estudo sobre as ferramentas dispostas por ele para auxílio à

expansão internacional de empresas brasileiras, mais particularmente sobre a

empreiteira Mendes Junior, à luz das teorias de negócios internacionais.

1.3. RELEVÂNCIA DO ESTUDO

O processo de internacionalização da empresa Mendes Junior passou por três

etapas distintas: internacionalização pioneira a partir de 1969, configurando o

primeiro relato de internacionalização de uma construtora brasileira com obra na

Bolívia, e logo expandindo sua presença para o Norte Africano e Oriente Médio;

retração de atividades no exterior em 1990, após eventos no Iraque que

desencadearam uma disputa judicial com o governo brasileiro acerca dos créditos

dos contratos, resultando em posição financeira delicada para a construtora; e

retomada do mercado externo a partir de 2004, após reestruturação interna que

permitiu novos avanços internacionais.

Em 1987, no auge da expansão internacional, que coincidiu com a diversificação

nacional, a Mendes Júnior figurou no anuário Melhores e Maiores da revista Exame

como o segundo maior conglomerado empresarial do país, com receitas de 1,2

bilhão de dólares e 40 mil empregos diretos (MENDES & ATTUCH, 2008). A Mendes

Júnior já havia marcado presença em quatro países, em três continentes diferentes,

quando as outras principais empreiteiras brasileiras tiveram sua primeira

internacionalização. Apenas entre 1982 e 1988 foram criadas mais de 50 propostas

internacionais no setor energético, e ao longo da história, mais de vinte países

ocupados, consolidando a construtora como referência mundial na execução de

obras de infraestrutura (MENDES & ATTUCH, 2008).

Portanto, o estudo aprofundado do caso Mendes Junior permite, em toda sua

singularidade, observar as principais teorias de internacionalização em diferentes

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situações buscando identificar aderência teórico-conceitual aos fatos empíricos

retratados no caso. Os modelos utilizados na análise foram os considerados mais

relevantes para o caso, sendo eles o Paradigma Eclético de Dunning e a Teoria

Institucional, já que abordam tanto fatores intrínsecos das firmas, quanto influências

exógenas no seu processo de internacionalização. Buscou-se, ainda, a correlação

entre os modelos diante de lacunas teóricas encontradas no caso.

O trabalho procura, também, servir como referência no auxílio à tomada de

decisão de gestores frente a situações como as abordadas no caso, lidando com

instabilidade gerencial, influências exógenas e perspectiva de riscos e oportunidades

associadas ao setor de construção civil e engenharia.

Por fim, tenta-se suscitar uma discussão a respeito das relações entre os atores

identificados no processo de internacionalização das empresas no âmbito escolhido,

dando oportunidade para futuras pesquisas complementarem os achados desta.

Nota-se que os trabalhos focados na Mendes Júnior se atêm ao caráter jurídico

do contencioso pós-Iraque (GOMES JÚNIOR, 2011), trabalhos com foco em outras

construtoras abordam uma linha temporal mais recente, com destaque para o

relacionamento com o Governo Brasileiro (RÊGO, 2015), e estudos sobre a relação

entre empresa, governo e negócios internacionais ressaltam a percepção dos

envolvidos acerca da nova ordem estabelecida, e a busca por formação de alianças

(CLARK, 1997). Portanto, a presente pesquisa busca englobar todos esses aspectos

em uma abordagem longitudinal, esclarecendo a interdependência entre fatores

endógenos e exógenos durante todo o percurso da empresa, realçando seus

impactos positivos e negativos, no que tange os movimentos internacionais.

1.4. ESTRUTURA DO TRABALHO

A pesquisa está dividida em sete capítulos. Após esta introdução, o segundo

capítulo traz uma revisão teórica, apresentando e discutindo os modelos de

internacionalização utilizados para embasar a pesquisa. Foram escolhidas as

contribuições da vertente econômica, representada pelo Paradigma Eclético de

Dunning (1977), e suas complementações baseadas na Teoria Institucional de North

(1990). Também foi contemplada a teoria da Diplomacia Triangular, de Stopford e

Strange (1991).

No terceiro capítulo, é apresentada a metodologia, sendo essa de natureza

qualitativa fundamentada em um estudo de caso. Na sequência, apresenta-se as

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particularidades deste método, identificando as principais vantagens e desvantagens

de sua escolha numa pesquisa científica. Além disso, são também apontados os

procedimentos metodológicos utilizados na coleta e tratamento dos dados primários

e secundários, que apoiaram a confecção deste estudo.

O quarto capítulo ambienta o leitor no contexto brasileiro de construção civil e

engenharia, incluindo os atores e movimentos presentes na área, a partir de uma

análise setorial histórica.

Os dois capítulos seguintes, quinto e sexto, constituem a descrição e análise do

caso em foco, encerrando com o sétimo capítulo: conclusões constatadas na

pesquisa e recomendações para pesquisas futuras.

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2. REVISÃO DE LITERATURA

2.1. MUDANÇAS ESTRUTURAIS NA ECONOMIA GLOBAL

Embora a globalização seja um fenômeno antigo, associado muitas vezes às

grandes navegações, ou no período de consolidação capitalista pós Segunda

Guerra Mundial, considerações contemporâneas mostram-se mais relevantes para o

caso. O fenômeno da globalização foi crescente a partir dos anos 1980, com

mudanças tecnológicas que reduziam o tempo e custo de transações internacionais

financeiras e não financeiras, promovendo integração mundial (FMI, 2000).

Para Furtado (1987), as alterações estruturais no cenário comercial mundial

impactaram nas relações políticas e econômicas através de três fatores em especial:

a desorganização das estruturas coloniais, relevância de recursos não renováveis

em países não desenvolvidos, e a evolução política nos países emergentes.

O primeiro fator se deve à pressão dos EUA para desmantelamento das colônias,

planejando exercer influência capitalista nos países subdesenvolvidos, e explorar

seus mercados com a instauração de multinacionais (FURTADO, 1987). Na visão do

autor a relação norte-sul foi intensificada com a dependência dos países

desenvolvidos da mão-de-obra e recursos não renováveis presentes nas economias

periféricas. Em terceiro lugar, o autor ressalta a inexistência de uma burguesia

integrada à exportação, portanto os interesses nacionais nesse tocante eram

guiados pelos interesses do Estado.

Já Strange (2003) considera três fatores diferentes para as mudanças estruturais:

aceleração da internacionalização da produção, aumento na mobilidade de capitais

e a velocidade das transações. A autora ainda destaca que a integração econômica

mundial favorece as relações diplomáticas entre países mais que uma simples

política externa baseada em segurança e soberania.

Do ponto de vista das firmas, a globalização as obriga a reconsiderar seu

posicionamento estratégico, visto que a dependência entre Nações intensifica-se

reconfigurando as vantagens competitivas relativas à localização, assim as

empresas acabam buscando dispersar sua presença para buscar novas vantagens

em novos mercados (DUNNING, 1997). Da mesma forma, as vantagens inerentes

às firmas tendem a se dispersar geograficamente via investimento direto externo,

associações, redes de relacionamento e transferência de tecnologia, sempre que: for

mais eficiente explorar capital, insumos ou mão-de-obra de uma fonte no exterior;

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assegurar ou melhorar o acesso ao mercado; ou alcançar novas tecnologias,

capacidades técnicas ou experiências.

Brum (2001) reflete sobre as macrotendências resultado da globalização, citando

nove aspectos da nova realidade:

1. Evolução do livre-comércio e abertura comercial entre os países;

2. Criação de blocos econômicos regionais como resultado de parcerias

buscadas para enfrentar a competitividade do novo mercado mundial;

3. Aumento do protecionismo ou maior abertura por conta da citada criação

de blocos regionais, ocasionadas respectivamente por aprofundamento

de relações geográficas ou maior participação em negociações a caráter

mundial (Organização Mundial do Comércio);

4. Mudança na participação do Estado na economia, com redução de

burocracia e reforma fiscal e tributária;

5. Intensificação das diferenças entre vantagens comparativas e

competitivas, a partir do momento que as competitivas estão sujeitas ao

Estado e à infraestrutura conferida por ele, como impostos e infraestrutura

viária;

6. Presença de grandes grupos empresariais formados por associações,

joint-ventures e fusões;

7. Valorização do acesso, coleta e tratamento de informação;

8. Perspectiva de unificação monetária em blocos econômicos para facilitar

os fluxos de capital e reduzir os custos de adequação tributários;

9. Predomínio da presença de empresas baseadas em bens intangíveis,

como prestadoras de serviços de inteligência.

Para esclarecer a trajetória da empresa foco do trabalho dentro desse contexto

de mudanças estruturais na economia mundial, serão utilizados modelos teóricos

sobre internacionalização de empresas e fatores que influenciam no processo.

2.2. MODELOS TEORICOS DE INTERNACIONALIZAÇÃO DE EMPRESAS

O principal teórico da abordagem econômica é John Dunning, que, em recentes

contribuições em 1995 e 2002, admite a influência de fatores macroambientais como

acordos regionais e políticas governamentais de agentes conscientes sobre os

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benefícios angariados pelas multinacionais (geração de empregos e disseminação

de tecnologias). Nessa mesma linha, cresce o apreço pela Teoria Institucional, que

considera central influência exercida pelas instituições na dinâmica de

internacionalização de empresas. Sendo assim, no caso investigado evidenciou-se

um papel importante exercido pelas instituições governamentais tanto no movimento

de expansão externa da empresa através de políticas específicas de financiamento,

como no processo de retração, após o contencioso empresa-governo iniciado em

decorrência da guerra no Iraque em 1990, país que hospedava a empresa neste

momento.

2.2.1. Paradigma Eclético De Dunning

O Paradigma Eclético de Dunning é uma importante perspectiva acadêmica que

pretende explicar de forma holística os fatores que implicam o envolvimento

internacional dos negócios de uma firma. Foi inicialmente proposto em Estocolmo,

em 1976, no Simpósio do Prêmio Nobel, e é embasado por vários ramos teóricos

antecessores (WEISFELDER, 2001), como a Teoria da Organização Industrial e

Teoria da Firma (COASE, 1937), teorias neoclássicas de comércio (HECKSCHER,

1919; OHLIN, 1933; SAMUELSON, 1948; MUNDELL, 1957), e seus próprios

trabalhos sobre empresas multinacionais (DUNNING, 1958, 1973).

O trabalho de Dunning tem origem ainda em meados da década de 1950, com

sua tese de PhD, quando foi apresentado à estatística de que companhias nos EUA

apresentavam produtividade maior que as do Reino Unido (DUNNING, 2001). A

questão levantada por Dunning foi se esse fato estava ligado a aspectos gerenciais

das firmas, ou se era inerente à economia de cada país. O autor utilizou, então,

multinacionais americanas em território britânico como medida comparativa. Porém,

os estudos demonstraram que a produtividade das unidades internacionais era

inferior às domésticas, mas ainda superior às nacionais britânicas. Dunning concluiu

que a produtividade é parcialmente explicada por aspectos particulares das firmas, e

por aspectos não transferíveis de cada local.

Dessa forma, Dunning consolidou em suas publicações subsequentes o

Paradigma OLI (DUNNING, 1977, 1979, 1980, 1981, 1988, 1989, 1992, 1993,

1998a, 2000, 2001, 2006a, 2006b), no qual fundamentou a motivação das empresas

ao buscarem investimento direto no exterior a partir de três características

apresentadas que influenciariam sua decisão, sendo elas necessárias, mas não

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suficientes: vantagens de propriedade (Ownership), de localização (Location), e de

internalização (Internalization).

O Paradigma é considerado eclético devido a sua abordagem diversa. Ele é

pautado nas principais teorias sobre atividade internacional de companhias

multinacionais, que ganharam visibilidade nas duas décadas antecessoras ao

estudo de Dunning, especialmente as teorias de Organização Industrial, Localização

e Falha de Mercado (fig. 1). As abordagens procuravam explicar, respectivamente,

por que (ou quando) as empresas buscavam iniciar atividades no exterior, onde e

como isso acontecia (DUNNING, 1979). Porém, por serem exploradas

separadamente, Dunning percebeu uma absência de um modelo completo e formal

sobre o tema.

Figura 1: Precursores do Paradigma Eclético

Fonte: adaptado de Weisfelder (2001, p. 23)

No que concerne os objetivos de seu trabalho, Dunning (1981) faz uso do termo

“eclético”, pois seu paradigma é relevante na elucidação de todos os tipos de

investimento direto externo, além de compreender todos os modos de envolvimento

com o exterior, sendo eles investimento direto, exportações, ou contratos, como

licenciamento, assistência técnica e acordos de gestão, indicando a direção mais

suscetível de ser tomada.

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Assim, ao convergir as teorias-base, é proposta uma nova linha cuja principal

hipótese determina que o envolvimento das firmas com o exterior se dá ao serem

satisfeitas três condições (DUNNING, 1979):

I. Possuir vantagens de propriedade em relação a outras firmas, ao

atender um mercado específico. Essas vantagens, geralmente, se

encontram na forma de ativos intangíveis que são, por hora,

exclusivos da firma que os possui;

II. Sendo a condição (I) satisfeita, é mais benéfico a empresa utilizar

essas vantagens ela mesma, em vez de vendê-las ou arrendá-las

para outras empresas, internalizando as vantagens através de

extensões de suas próprias atividades, ao invés de externalizá-las

por meio de contratos de licenciamento ou outras formas similares

de contrato;

III. Sendo as condições (I) e (II) satisfeitas, deve ser lucrativo a

utilização das vantagens em conjunto com algum fator fora do país

de origem (incluindo recursos naturais). Caso contrário os

mercados externos seriam providos apenas por exportações, e os

domésticos por produção nacional.

Então, quanto maiores as vantagens de propriedade de uma companhia, mais

incentivo elas possuem para explorá-las elas mesmas. Da mesma forma, quanto

mais atrativo uma localidade estrangeira for maior a propensão das companhias se

envolverem com produção internacional. Portanto, o envolvimento de um país com o

exterior é correlacionado com a dimensão das vantagens de suas empresas, e com

sua capacidade de oferecer recursos frente a outros países (DUNNING, 1979).

Forma-se, assim, o tripé OLI, sugerindo que todas as formas de produção

internacional, por parte de qualquer país, podem ser descritas pelas condições

citadas (DUNNING, 1979). Embora não preveja quais países, companhias ou

indústrias irão se internacionalizar, consegue caracterizar essas vantagens e indicar

que elas são assimetricamente distribuídas entre os atores (quadro 1).

As vantagens de propriedade são vantagens inerentes das firmas, englobando

tecnologia e marcas específicas, acesso privilegiado a matérias-primas, insumos,

informações e mercados, capacitação gerencial, desenvolvimento de novos produtos

e diversificação, porte e capacidade de alavancagem, e versatilidade no intercâmbio

entre países.

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Vantagens de localização envolvem benefícios regionais, tais quais: oferta

diferenciada de insumos (seja matéria-prima, ou mão-de-obra), facilidades de

adequação (burocrática ou tarifária), simbiose entre vantagens de propriedade e

mercado local, influência governamental (regulamentação ou grau de estabilidade

política), e distância. O fator distância é enxergado por Dunning (1993) como um

elemento multidimensional, abrangendo além da geográfica, diferenças culturais

(idiomas, costumes e práticas de negócios), sociais, econômicas e políticas.

Fonte: Dunning (1977, p. 410)

Para o investimento direto ocorrer, essas vantagens devem ser,

necessariamente, melhor exploradas se forem mantidas dentro da empresa. O

caminho contrário à terceirização permite às companhias gerar ganhos ao evitar

imperfeições de mercado, como custos de transação (contratuais ou logísticos), falta

Quadro 1: Paradigma Eclético da produção internacional

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de controle (qualidade ou propriedade intelectual), e desalinhamento de informação.

Os modos de entrada seguiriam, então, a seguinte forma:

Quadro 2: Relação entre vantagens e modos de entrada

Fonte: adaptado de Dunning (1988, p. 28)

O modelo de Dunning é frequentemente evoluído pelo autor, de forma que torna

impossível uma revisão minuciosa de todo seu trabalho. Mas Ietto-Gillies (2005)

disserta sobre os principais refinamentos da abordagem original, seja por mudanças

na economia mundial, ou a partir de críticas e sugestões de outros membros

pesquisadoras da academia.

O primeiro tema de debate é a respeito da dificuldade de operacionalizar-se na

prática o modelo original. Existe um risco de se cair numa “lista de compras de

variáveis” (DUNNING, 2000b), ofuscando o poder preditivo e explicativo do modelo.

Justamente por isso, o autor prefere abandonar o termo “teoria” e assumir um

caráter paradigma, sob alcunha de arcabouço sistêmico.

Dunning (2000a) sugere que o ponto chave para operacionalização é a

contextualização das variáveis de acordo com as vantagens existentes. Portanto, o

autor procura complementar o Paradigma explorando as principais motivações de

firmas ao empenhar-se no mercado externo: busca de mercado, eficiência, ativos

estratégicos e capacitações. A identificação do tipo de atividade permite filtrar as

variáveis ligadas às vantagens de propriedade. O destino das companhias seria

pautado na possibilidade de encontrar essas características presentes na nova

localidade. E a escolha das variáveis de internalização emerge das características

da indústria e das companhias. A matriz (Quadro 3) apresenta a relação entre

atividades nas quais as firmas podem estar envolvidas e as vantagens especificadas

no Paradigma.

O segundo tema diz respeito ao dinamismo do modelo. Para Vernon (1985), o

modelo falha ao não permitir interação comportamental entre os atores do processo.

Diante dos mesmos parâmetros OLI, não só a postura das multinacionais seria

particular de sua estratégia corporativa, como suas decisões acarretariam numa

Modo Propriedade Internalização LocalizaçãoIDE Sim Sim Sim

Exportações Sim Sim NãoLicenciamento Sim Não Não

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reação dos competidores, podendo até alterar os próprios parâmetros inicialmente

propostos. Dunning (1988) conta com propostas de outros modelos, como da

Organização Industrial e Empreendedorismo, na tentativa de definir quais vantagens

componentes do Paradigma são variáveis endógenas e quais são exógenas, aferir a

relação entre elas e determinar como elas mudam com o tempo.

Quadro 3: Vantagens de Propriedade, Localização e Internalização

Fonte: adaptado de Dunning (1980)

O terceiro tema, ainda relacionado ao fator dinamismo, trata do caminho de

desenvolvimento dos países graças ao investimento direto. O grau de investimento

direto externo de companhias depende do nível de desenvolvimento do país de

origem e hospedeiro, assim como o padrão e velocidade de desenvolvimento dos

países é determinado pelo nível de investimento direto que exporta e que recebe

(DUNNING, HOESEL & NARULA, 1996).

As vantagens de localização de um país, ao prover infraestrutura e tecnologia,

estimulam o desenvolvimento de vantagens de propriedade nas companhias.

Consequentemente, a internacionalização iminente dessas empresas altera

eventualmente as características particulares do país de origem (DUNNING, 1980).

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A próxima etapa é a alteração dos padrões de desenvolvimento do país, e suas

vantagens oferecidas, modificando também a configuração OLI para as companhias

domésticas e estrangeiras (DUNNING, 2001). Sendo assim, iniciativas estratégicas

governamentais de desenvolvimento, implicam não só na sua maior atratividade

para receber multinacionais, como também no maior poder competitivo de suas

empresas domésticas ao internacionalizarem-se.

Por último, e talvez a maior adaptação do modelo de Dunning diante das

reconfigurações modernas das atividades corporativas globais, é a abordagem às

alianças e parcerias como precursores e veículos de internacionalização. Enquanto

fusões e aquisições são consideradas apenas métodos de apropriação imediata de

um conjunto de vantagens, as alianças são mais destrinchadas por se tratarem de

acordos colaborativos entre partes relativamente semelhantes (DUNNING, 2001).

Dunning considera o capitalismo de alianças uma forma evolutiva do capitalismo

hierárquico, viabilizando por meio de outros modos o envolvimento externo,

reduzindo assimetrias de mercado, no momento em que investimento direto seria

impraticável.

Ao assumir ativos externos, sob os quais exerce relativa influência e controle, as

firmas expandem o conceito de vantagens de propriedade, localização e

internalização. Agora as vantagens de propriedade passam a englobar capacidade

de encontrar aliados, e gerenciar ativos que pertencem à outra instituição, inspirando

mudanças de qualidade, preço e tecnologia. Já as vantagens de localização

admitem a presença de aliados com os quais se pode fazer negócios.

Consequentemente, a internalização vai depender dos benefícios calculados a partir

desse relacionamento, em relação com o direcionamento estratégico da firma

(DUNNING, 2001).

O Paradigma é uma influente e resiliente ferramenta de análise do envolvimento

internacional de empresas, pois continua sob constantes revisões no intuito de

fortalecer e atualizar o caráter explicativo do arcabouço.

2.2.2. Teoria Institucional

As instituições encontram em Douglas North seu precursor. Principal nome da

teoria institucional, em sua publicação de 1990 intitulada Institutions, Institutional

Change and Economic Performance, o autor lança mão da análise da essência das

instituições e seus efeitos para a economia e a sociedade. Instituições são princípios

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evoluídos historicamente, sob os quais o comportamento humano é ditado,

reduzindo assim, as incertezas inerentes à nossa natureza (NORTH, 1990;

WILLIAMSON, 2000; SCOTT, 2008; PENG, 2009).

Há um esforço no corpo acadêmico da área de negócios internacionais para

complementar as lacunas pontuais abertas pelas teorias econômicas.

Recentemente, a teoria institucional vem sido apreciada na tentativa de se

compreender as decisões de investimento das multinacionais, pois engloba

características específicas do país de origem tanto quanto do país hospedeiro, em

particular quando se trata de países em desenvolvimento (PENG, WANG & JIANG,

2008).

Sua importância levou a uma ramificação, com escolas dando ênfase em

aspectos mais convenientes à sua linha (KOELBLE, 1995). A abordagem sociológica

foca em normas, convenções, e práticas que moldam a cultura organizacional

(DIMAGGIO & POWELL, 1991; MEYER & ROWAN, 1977), enquanto a econômica

refere-se à redução dos custos de transição por controle das incertezas do mercado

(NORTH, 1990; SCOTT, 1995).

2.2.2.1. Visão Sociológica

Considerando que o contexto ambiental é dividido em técnico e institucional

(MEYER & ROWAN, 1977; SCOTT, 1995, 2008), a visão sociológica provoca

relevância de questões sociais frente às incertezas institucionais, em relação aos

elementos técnicos (MEYER & SCOTT, 1983). Para os autores, os fatores técnicos

englobam disponibilidade de produtos e serviços, e são aferidos pela sua eficácia e

eficiência, enquanto os fatores institucionais levam em consideração aspectos

normativos que devem ser internalizados para atingirem a legitimidade.

Um processo histórico contínuo e consistente garante a legitimidade da

instituição (MARCH, 1988). Da mesma forma, grupos submetidos a condições

semelhantes buscarão em sua contraparte a legitimidade da instituição, num

processo de isomorfismo (DIMAGGIO & POWELL, 1983). Segundo os autores,

existem dois tipos de isomorfismo, o competitivo e o institucional, sendo o

competitivo baseado na competição por recursos e clientes entre as empresas

(HANNAN & FREEMAN, 1977). No entanto, isso não explica o relacionamento

destas com organizações políticas, portanto o isomorfismo institucional

complementa a noção de construção organizacional (DIMAGGIO & POWELL, 1983).

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Os autores identificam três mecanismos pelos quais as transformações isomórficas

institucionais acontecem, coercitivo, mimético e normativo:

a) Coercitivo: advém das pressões formais e informais exercidas sobre uma

organização por outra da qual depende. As pressões políticas e a força do

Estado, com controles normativos, moldam os rituais de conformidade sob

os quais as organizações devem se encaixar (MEYER & ROWAN, 1977);

b) Normativo: no momento em que pressões formais falham ao serem

aplicadas, entram em cena as informais, compostas de normas de

comportamento, valores e atitudes. Sendo assim, o isomorfismo

normativo, para DiMaggio & Powell (1983), estaria relacionado com a

profissionalização de uma certa ocupação, por meio de educação formal

ou redes de trabalho;

c) Mimético: incertezas e questionamentos sobre os próprios objetivos levam

as organizações a buscarem esclarecimentos em outras submetidas a

cenários semelhantes. A prática do benchmarking acaba por modelar a

empresa de acordo com sua contraparte, reduzindo incertezas instauradas

(DIMAGGIO & POWELL, 1983).

Sendo assim, as pressões sociais, exercidas na forma dos isomorfismos,

garantem a legitimidade das organizações em um contexto de ambiente institucional.

2.2.2.2. Nova Economia Institucional

A visão econômica tem seu embrião no trabalho de Ronald Coase (1937), no

qual observa a existência de custos de transação no funcionamento dos mercados,

exemplificados por custos de contratos e assimetria de informação. Para ele, a

redução desses custos de transação seria alcançada por meio das instituições.

No final do século XX, as pesquisas foram aprofundadas especialmente por

Douglass North (1990), que ratificou que informações incompletas tornam onerosas

as interações entre organizações. Para o autor, o desenvolvimento econômico das

sociedades está diretamente vinculado ao ambiente institucional, pois é ele que

facilita a interação entre indivíduos, mitigando as imperfeiçoes do mercado e

promovendo ajustes marginais ao longo do tempo, viabilizando a evolução

econômica.

Tratando-se especialmente de economias em desenvolvimento, North (1991)

considera três elementos para compreensão de que o processo de mudança

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institucional implica desenvolvimento econômico: estabilidade institucional, processo

de mudança institucional, e dependência do caminho.

O primeiro representa o conjunto de regras que definem o ambiente institucional

de uma sociedade. Porém essa estabilidade não garante eficiência, portanto

necessita-se de mudanças incrementais para propiciar adaptação rumo um

ambiente favorável. A dependência do caminho aborda a diferença evolutiva de

sociedade para sociedade após a mesma mudança incremental, procurando

entender o fenômeno (NORTH, 1991). Segundo o autor, as diferenças se devem a

um modelo social com agentes econômicos e institucionais distintos, além de um

processo evolutivo alternativo. No âmbito microeconômico, essa teoria é relevante

para a expansão externa da indústria de um determinado país, já que as mudanças

institucionais podem ocasionar incentivos levando as empresas a buscarem novos

fatores de produção, custos de informação e tecnologia (NORTH, 1991).

Em seu trabalho, North (1993) diferencia instituições de organizações. As

instituições são as regras formais e informais dentro de uma sociedade,

representadas por leis e regulamentos, códigos de conduta e convenções sociais.

As organizações são os elementos submetidos a essas regras, agrupados por um

objetivo em comum, retratados por agentes políticos, econômicos, sociais e

educacionais. Seguem, então, proposições que, para o autor, definem a natureza

das mudanças institucionais:

1. A interação contínua entre instituições e organizações movidas por

competitividade em um cenário econômico de escassez é a chave para

mudança institucional.

2. A competição impõe a evolução das organizações, alcançada por meio de

investimentos em habilidades e conhecimento para sobreviver.

3. O arcabouço institucional definirá as habilidades e conhecimentos

percebidos como os que oferecem maiores resultados.

4. Percepções são derivadas de constructos mentais dos agentes.

5. Economias de escopo, complementaridades e externalidades de rede de

uma matriz institucional tornam as mudanças institucionais incrementais e

dependentes do caminho.

North (1993) destaca que descrever mudanças econômicas é um processo

diferente de guiar uma economia ao seu desenvolvimento. No entanto, para o autor,

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é possível apontar características de modelos institucionais para sugerir possíveis

orientações visando avanço econômico:

1. Instituições são constituídas de regras formais, normas informais e a forma

como ambas são aplicadas, sendo o desempenho econômico baseado

numa combinação dos três. Ao passo que regras formais podem ser

alteradas instantaneamente, as mudanças em normas formais são

graduais e são elas que garantem a legitimidade das primeiras. Portanto,

a adoção de regras formais de economias bem-sucedidas de países do

ocidente não será condição suficiente para o sucesso de economias do

terceiro mundo.

2. A performance econômica é moldada a partir das políticas que definem e

aplicam as regras formais da economia, portanto o principal fator do

desenvolvimento das economias deve ser a elaboração de políticas que

favoreçam a eficiência dos direitos de propriedade. Embora os estudos

sobre instituições políticas aplicadas à economia tenham se concentrado

em economias de países desenvolvidos, algumas implicações são válidas:

a. Instituições políticas só encontrarão estabilidade se forem

promovidas por organizações com interesse em sua perenidade,

tornando, portanto, a criação dessas organizações ponto chave

numa reestruturação econômica.

b. A mudança do sistema de crença, tanto quanto das próprias

instituições, é essencial para o sucesso da reforma, a partir do

momento que são os modelos mentais dos agentes que

promoverão as escolhas.

c. A evolução de normas de comportamento responsáveis por apoiar

e legitimar novas regras é um longo processo. Além disso, a

ausência de tais normas tende a provocar instabilidade nas

políticas.

d. Regimes autocráticos podem promover crescimento econômico no

curto prazo, porém é o desenvolvimento do Estado de direito e

proteção da liberdade civil e política que vão garantir o crescimento

em longo prazo.

e. Normas de comportamento, convenções, códigos de conduta, e os

demais elementos que compõe restrições informais, são

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necessários, mas não suficientes, para um bom desempenho

econômico, sendo possível até sobrepujar a instabilidade de regras

políticas. O ponto chave é em que grau as regras adversas são

reforçadas.

3. Para dar sequência a um bom desempenho econômico é necessário ter-

se uma matriz institucional flexível, que se ajusta em um contexto de

evolução tecnológica e mudanças demográficas, tanto quanto choques no

sistema. A elaboração de políticas estáveis com normas complementares

é a característica essencial.

No que tange a área de negócios internacionais, a nova economia institucional

sugere que instituições estabelecem direitos individuais e intransferíveis que

acarretam em custos de transação (ANDERSON & GATIGNON, 1986). No intuito de

mitigar esses custos, as empresas podem estabelecer práticas de governança e

coordenação que influenciam na decisão de investimentos diretos no exterior

(GATIGNON & ANDERSON, 1988).

2.2.2.3. Novo Institucionalismo Organizacional

Enquanto a nova economia institucional tem foco no componente regulatório, o

novo institucionalismo organizacional permeia a sociologia e a teoria organizacional

para explorar as interações entre organizações como fator causal na mudança

estrutural (DIMAGGIO & POWELL, 1983; DIMAGGIO & POWELL, 1991; MEYER &

ROWAN, 1977).

Diferentemente do velho institucionalismo organizacional, no qual a análise recai

sobre cada organização em particular, portadora de características próprias

(SELZNICK, 1996), o novo presume que há comportamentos compartilhados entre

essas organizações (SCOTT, 1987). Portanto, a proposta da nova ordem é que se

olhe além de fatores técnicos e econômicos para definir a estrutura das

organizações, observando também fatores institucionais, provenientes de um

contexto de pressões políticas e sociais (MEYER & ROWAN, 1977).

Tratando-se desse contexto, Oliver (1991) elaborou um arcabouço de respostas

estratégicas tomadas pelas empresas para se adequar às pressões institucionais,

atingindo uma posição passiva ou ativa, de acordo com seus objetivos globais:

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Quadro 4: Respostas estratégicas aos processos institucionais

Fonte: Oliver (1991, p. 152)

É importante sempre contextualizar a teoria institucional analisada, já que ela se

apresenta sob diferentes óticas: institucionalização como um processo de adicionar

valor, institucionalização como um processo de criar realidade, sistemas

institucionais como um conjunto diferenciado de elementos, e instituições como

estruturas sociais específicas (SCOTT, 1987).

2.2.3. O Paradigma Eclético Frente À Teoria Institu cional

Child e Rodrigues (2005) ressaltam que as teorias de internacionalização tendem

a abordar a unidade empresarial como ponto central, negligenciando o contexto

ambiental, numa tentativa de favorecer a perspectiva econômica em detrimento da

social. No entanto a participação dos governos nas decisões de iniciativas privadas

é uma realidade, seja por meio do controle da propriedade ou por regulações,

especialmente no que tange países em desenvolvimento, trazendo à tona a

necessidade do reconhecimento do contexto institucional como componente das

decisões estratégicas (PENG, 2000).

Estratégia Táticas Exemplos

Hábito Seguir normas tidas como certasImitação Imitar modelos institucionaisObediência Obedecer e aceitar normas e regras

Equilíbrio Equilibrar as expectativas dos agentesPacificação Apaziguar e acomodar elementos institucionaisBarganha Negociar com stakeholders

Omissão Disfarçar não-conformidadeProteção Livrar-se de vínculos institucionaisEscape Modificar metas, atividades ou domínios

Rejeição Ignorar valores e normas explícitasEnfrentamento Contestar regras e exigênciasAtaque Atacar fontes de pressão

Cooptação Valorizar agentes influentesInfluência Formar valores e critériosControle Dominar agentes e processos institucionais

Aquiescência

Comprometimento

Fuga

Desafio

Manipulação

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Dunning (1992) associa os governos ao papel de facilitador macrossistêmico, já

que eles são responsáveis por grande parte da organização da atividade econômica

dos países, via estrutura regulatória, que impacta diretamente na forma como

recursos são explorados e desenvolvidos pelas empresas, acarretando no modo

como elas deverão interagir com ambientes externos.

Ainda, para o autor, os governos podem atuar no sentido de modificar o sistema

organizacional pelo qual são responsáveis: 1) como participantes diretos em

mercados específicos, ou grupo de mercados, por acreditarem serem mais capazes

de sustentar os princípios daquele mercado que os demais participantes, ou na

tentativa de promoverem objetivos adicionais ou distintos dos já instaurados; 2)

influenciando o resultado de transações pontuais, caso percebam que o sistema

está sendo distorcido no caso em questão, seja pelos atores ou por falhas

intrínsecas do sistema, visando eliminar essa distorção; 3) quando, embora o

sistema opere da forma mais eficiente possível, os objetivos sociais, como

sustentabilidade e distribuição, não estão sendo alcançados.

Esses papéis de modificador sistêmico influenciam diretamente em iniciativas dos

governos para restringir ou estimular o investimento direto (DUNNING, 1992).

Enquanto o Dunning (1998) cita como exemplos legislação sobre a produção,

licenciamento de tecnologia, patentes e políticas sobre impostos e câmbio, Wild,

Wild e Han (2010) destacam investimentos em infraestrutura, mecanismos

financeiros e metas de exportação.

Para Dunning e Lundan (2008), as variáveis do Paradigma OLI sofrem

adaptações ao considerar as instituições como agentes influenciadores nas decisões

de investimento. Os autores reconhecem que as vantagens de localização (L) e

internalização (I) são facilmente observáveis pelo desenvolvimento econômico a

nível nacional, conduzido pelas instituições. Já as vantagens de propriedade (O)

requerem maior aprofundamento na análise, pois podem ser divididas em vantagens

ligadas às instituições (Oi), ligadas aos ativos das empresas (Oa), e referentes às

transações (Ot). Para os autores, todos devem ser considerados num cenário

dinâmico, pois é de se esperar, por exemplo, que Oa e Oi influenciem I no tempo “t”,

por meio de exploração ou aquisição de ativos, e no tempo “t+1” acabar por exercer

influência em L ao provocarem mudança de região.

As instituições são naturalmente restritivas, ao passo que podem suprimir certa

demanda encarecendo a operação, ou desvalorizando-a (DUNNING & LUNDAN,

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2008). Dessa forma, na visão dos autores, as instituições interferem não só nas

ações das empresas, mas também na sua cultura organizacional ao longo do tempo,

quando essas tentam harmonizar com as imposições institucionais. No entanto, os

autores acreditam que o contrário é possível, e que as empresas podem alterar as

estruturas formais e informais as colocando em seu favor.

As vantagens de propriedade institucionais (Oi) envolvem a infraestrutura

institucional específica de cada empresa, englobando incentivos, regulações e

normas internas, que afetam o comportamento de todos os stakeholders (DUNNING

& LUNDAN, 2008). O quadro 5 a seguir apresenta exemplos de instituições, formais

e informais, que afetam as variáveis OLI de uma companhia:

Quadro 5: Exemplos de instituições formais e informais que afetam a configuração OLI das empresas

Fonte: Dunning & Lundan (2008, p. 583)

A complementação do modelo OLI proposta por Dunning e Lundan (2008) imbui

um caráter dinâmico às interações entre os agentes, baseado nas pressões

institucionais que podem ser moldadas por qualquer um deles. Dessa forma, a

relação governo-empresa, especialmente no que concerne o movimento de

internacionalização, ganha uma nova representatividade dentro das teorias

econômicas.

2.2.4. Diplomacia Triangular

O mercado globalizado tem estimulado cada vez mais a interação entre governos

e empresas, que buscam uma posição mais vantajosa no cenário competitivo,

através de melhores fontes de financiamento, acesso a maiores e mais lucrativos

O L IOrganizacional/Governança Capital Social Relacional

InstituiçõesLeis, Regulações, Convenções Leis, Regulações, Convenções ContratosDisciplina dos Mercados Econômicos Disciplina dos Mercados Políticos

Códigos, Normas Religião, Moral Social, Tradição Convenções, Códigos, Relações de ConfiançaCultura do País/Corporativa Sociedade Civil Clusters, NetworksMoral Ecológica dos Indivíduos

Mecanismos de ReforçoSanções, Penas Sanções, Penas Penas por Quebra de ContratoTaxas, Incentivos Qualidade das Organizações Públicas Greves, Alto Turnover , Lock-OutsAções dos Stakeholdes Educação

Persuasão Moral Culpa, Vergonha Culpa, VergonhaGanho ou Perda de Status/Reconhecimento Participação Política Não Repete as TransaçõesRetaliação Persuasão Moral Economias Externas Proveniente de NetworksConstrução ou Perda de Confiança Exlusão SocialExclusão Social

Formal

Informal

Formal

Informal

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mercados, e redução de riscos dos investimentos (STRANGE & STOPFORD, 1992;

BRASIL, 2009). Esse contexto abre uma nova gama de motivações que justificam a

internacionalização de empresas, com destaque para a função estratégica para os

governos de economias emergentes (BRASIL, 2009).

Dessa forma, a partir dos trabalhos de Strange (1994, 1996), e de Stopford e

Strange (1992), nasce o conceito de Diplomacia Triangular, que explora a Economia

Política Internacional (EPI) com ênfase no relacionamento entre empresas e

governos. Esse relacionamento acontece em diversas instâncias de arranjos

políticos, econômicos e sociais, como Estados, organizações internacionais e

nacionais, sejam governamentais ou não, empresas financeiras, industriais e

comerciais, todos com diferentes objetivos e níveis de influência sobre o sistema

(STRANGE, 1994).

Para a autora, a distinção entre esses atores se dá na sua capacidade de

influenciar o ambiente de interação (poder estrutural) ou manipular os

relacionamentos a seu favor (poder relacional). A economia política internacional

não se trata, portanto, apenas do Estado, mas de todos os atores e seus poderes.

Nesse panorama, os Estados perceberam que só alcançariam desenvolvimento ao

acumular riquezas, e para isso passaram a estimular a realização e recebimento de

investimento direto, já que as riquezas encontravam-se acumuladas nas mãos das

multinacionais (STOPFORD & STRANGE, 1992). Por outro lado, as empresas

vislumbraram oportunidade de expansão de seus mercados mediante negociação

com os próprios Estados. Neste sentido, a Diplomacia Triangular encarrega-se de

analisar interação entre as iniciativas públicas e privadas (DICKEN, 1998). Em

outros termos, o modelo proposto por Stopford e Strange (1991) é retratado no

triângulo de relacionamentos com três cenários diplomáticos: relação entre

governos, entre empresas, e finalmente entre governos e empresas:

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Figura 2: Modelo da Diplomacia Triangular

Fonte: Stopford & Strange (1991, p. 22)

Enquanto as interações entre empresas podem ser ilustradas por parcerias para

empreendimentos e transferência de tecnologia, as relações governo-governo são

exemplificadas por Cervo e Bueno (2008) como esforço diplomático de aproximação,

como nos casos do Brasil com os países do Mercosul, BRICS (Brasil, Rússia, Índia,

China e Africa do Sul), IBAS (Índia, Brasil e África do Sul) e CPLP (Comunidade dos

Países de Língua Portuguesa) Na esfera governo-empresa, Stopford e Strange

(1991) sugerem a constituição de grupos de trabalho buscando objetivos em comum

ou distintos, através de um esforço conjunto para amplificar o potencial de

resultados. São também exemplos de políticas de promoção à internacionalização,

segundo a UNCTAD (2000): assistência técnica e informação, apoio financeiro

direto, indireto, e seguros contra riscos não-comerciais.

O modelo fica bem claro no horizonte de países em desenvolvimento. Para

Cavusgil, Knight e Riesenberger (2012), o governo e empresas estatais desses

países são grandes compradores de produtos e contratadores de serviços, em

particular para suprir a demanda de obras de infraestrutura necessárias para o

crescimento da economia. Além disso, os autores destacam vantagens enxergadas

pelos Governos ao promoverem esses projetos, como criação de postos de trabalho

locais gerando emprego e alocação de recursos nacionais, reduzindo a dependência

de importações para o país.

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Embora ofereçam um mercado aquecido e vantajoso, esses países apresentam

alto grau de risco devido à infraestrutura legal e comercial, acarretando em

instabilidade política, baixa proteção à propriedade intelectual, altos níveis de

burocracia, falta de transparência e corrupção, falta de recursos disponíveis e oferta

de qualificação (CAVUSGIL, KNIGHT E RIESENBERGER, 2012). Os autores ainda

oferecem um arcabouço de riscos genéricos enfrentados pelas empresas ao

buscarem o ambiente internacional:

Figura 3: Risco nos negócios internacionais

Fonte: Cavusgil, Knight e Riesenberger (2012, p. 175), adaptado por Rêgo (2015)

No cenário brasileiro, as políticas de exportação da década de 1970 baseavam-

se em incentivos fiscais e linhas de crédito, que migrou na década seguinte para

manipulação cambial (GOULART, ARRUDA & BRASIL, 1994). Para os autores,

seguidos choques do petróleo, que culminaram na crise da dívida externa, forçaram

o governo a modificar seus mecanismos de apoio às exportações, passando para

barreiras não-tarifárias e desvalorização cambial. Para Rocha, Silva e Carneiro

(2007), foi esse cenário de recessão interna que levou as primeiras empresas

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brasileiras a buscarem o mercado externo. Segundo Iglesias e Veiga (2007), a

internacionalização das empresas nacionais teve sua origem junto à Petrobrás,

vetorizado por companhias de engenharia e construção. É esse movimento o foco

de análise do atual trabalho, que se apoiará nos modelos teóricos descritos para

melhor assimilar o processo.

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3. METODOLOGIA

3.1. QUESTÕES DE PESQUISA

O trabalho busca iluminar – explicando ou suscitando futuras discussões – a

trajetória de internacionalização de uma empresa brasileira do setor de construção

civil e engenharia. Para tal, escolheu-se estudar uma das maiores empresas

nacionais no ramo, a Mendes Junior, responsável por um movimento internacional

seminal (1969) dentre as companhias deste segmento, Além disso, a empresa

demonstrou um processo atípico de retração dos negócios internacionais, motivadas

por diversos elementos, dentro os quais a instabilidade política no Iraque (fatores

exógenos) e as consequências na sua gestão (fatores endógenos); assim também,

no período recente a empresa vem buscando retomar suas atividades no mercado

externo, apresentando, com isso, uma trajetória interessante de ser investigada,

repleta de diferentes variáveis. É possível, portanto, observar decisões à respeito do

porquê, quando e como se internacionalizar, destacando destinos escolhidos,

influência de instituições (exógenas), e percepção de riscos e oportunidades.

As perguntas que guiam a pesquisa são as seguintes:

a) Quais foram as motivações que fomentaram o processo de internacionalização

desta empresa no final da década de 1960?

b) Quando foi tomada a decisão de se internacionalizar, e quando ocorreram os

movimentos das etapas subsequentes?

c) Como o processo de internacionalização se desencadeou? Como transcorreram

os movimentos subsequentes?

d) Quais foram os destinos considerados, e quais foram escolhidos?

e) Qual foi o papel de instituições (fatores exógenos) no processo?

f) Quais motivos levaram a empresa a recuar do mercado internacional? E por que

a empresa resolveu retomar a expansão externa posteriormente?

3.2. MÉTODO DE PESQUISA

A pesquisa em profundidade foi conduzida de forma qualitativa, levando em

conta a subjetividade da análise durante a dinâmica entre pesquisador, objeto e

ambiente de estudo (GIL, 1991).

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A determinação da escolha do método do estudo de caso vem após análise de

fatores propostos por Yin (2001) que caracterizam a estratégia, sendo eles: escopo

das questões de pesquisa, abrangência do controle sobre os eventos estudados, e

recorte temporal aplicado. Para o autor, o estudo de caso foca em perguntas

explanatórias, do tipo “como” e “por que”, cuja subjetividade se esquiva de dados

quantitativos. Quanto ao controle do observador, o método admite estudo de

fenômenos nos quais não se consegue exercer interferência alguma. E quanto ao

período observado, o enfoque é em contexto contemporâneo.

Para Yin (2001), são três as situações para as quais o estudo de caso é indicado:

quando o caso em questão é crítico para testar teorias previamente estabelecidas,

quando o caso é extremo ou único, e quando o caso é inédito na literatura científica.

O caso em questão é de fato inédito, e pode ser considerado único por não haver

precedentes de internacionalização do setor, além de extremo devido aos contextos

interno e externo sob o qual foi submetido, ilustrados pela duração do processo,

valores transacionais envolvidos, e magnitude dos eventos internacionais que se

desdobraram.

Eisenhardt (1989) coloca o estudo de caso como melhor opção na análise de

novas áreas de pesquisa, ou áreas aparentemente inconsistentes. Escolha coerente

com a recência das teorias abordadas. No que concerne negócios internacionais,

Ghauri (2009) vê o método como eficiente quando os dados manuseados

transcendem fronteiras geográficas e culturais, enquanto métodos quantitativos são

questionáveis por não conseguirem traduzir essas diferenças entre países e regiões.

O autor ainda coloca entrevistas em profundidade como uma excelente forma de

compreender o comportamento dos gestores em diferentes culturas.

O autor ainda salienta vantagens da estratégia, afirmando que é útil na

investigação de fenômenos difíceis de serem compreendidos fora do seu sistema

natural. A profundidade da pesquisa também deixa margem para elaboração de

novas teorias, e não só teste das existentes. Outra vantagem é a propriedade

holística da investigação, atacando diversos pontos de vista e períodos de tempo.

Nesse tocante, Merriam (1998) afirma que o estudo de caso pode assumir

caráter histórico. A autora cita técnicas recorrentes empregadas, como uso de fontes

primárias, comuns à historiografia. O fator histórico do estudo de caso é importante

para trazer à tona a realidade contextual, ponderando sobre causalidades e

dependências históricas e conjunturais (AMENTA, 2009). O autor ressalta a

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possibilidade de retratar transformações estruturais e eventos pontuais. No entanto,

há a limitação da ausência de dados não mais disponíveis, ou distorção dos

mesmos. A movimentação internacional da Mendes Júnior já dura quase 50 anos,

portanto, é importante resgatar dados pertencentes a todas as fases do processo no

intuito de melhor compreender quais eventos provocaram mudança em sua

essência, e quais foram particulares de um determinado instante.

Para escolher o caso foco, Ghauri (2009) evidencia fatores a serem

considerados, podendo assumir caráter impeditivo ou desobstrutivo. Portanto, deve-

se levar em conta o tempo disponível para a pesquisa, os recursos financeiros

disponíveis para garantir obtenção de informação, como necessidade de viagens, e

a rede de contatos disponíveis e acessíveis.

A escolha de caso único remete à Stake (2001), que afirma ser apropriada para

circunstâncias tais quais quando se utiliza o caso para testar uma teoria, quando o

caso é raro, e não existem outros casos semelhantes para efeito comparativo, e

quando o caso propicia acesso a informações não disponíveis em banco de dados

gerais. Mattar (1996) complementa a lista destacando o intuito de reunir, em uma só

interpretação, inúmeros aspectos de um objeto pesquisado. Porém, Yin (2001)

atenta para o cuidado que deve ser tomado ao se realizar estudos de caso único, no

que diz respeito às generalizações feitas a partir deles. O autor ainda observa que o

caso pode se apresentar de forma distinta ao previsto, não favorecendo adesão às

teorias propostas inicialmente.

O estudo é conduzido com assistência de evidências provenientes de seis

diferentes fontes, sendo elas documentos, entrevistas, registros de arquivos, cada

um com seu apropriado procedimento (EISENHARDT, 1989).

Portanto, a escolha do método obedece a todos os critérios propostos de

execução e objetivos.

3.3. MÉTODO DE COLETA E ANÁLISE DE DADOS

As fontes de dados consideradas relevantes para o encaminhamento da

pesquisa, apoiados pela literatura estudada, encontram-se em dois grupos:

documentos escritos e entrevistas (YIN, 1994).

Os dados secundários foram obtidos em páginas na internet, como sites

institucionais de empresas (Mendes Júnior, Odebrecht, Petrobrás) e órgãos

relevantes (BNDES, APEX, MDIC, IBGE, CNI, IPEA, MRE, Governo Federal),

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instituições internacionais (UNCTAD, BIRD, ITC). Além disso, foi realizada uma

análise sistemática de reportagens publicadas na mídia impressa de 1960 a 1980,

disponíveis na hemeroteca digital da Biblioteca Nacional. Da mesma forma foram

obtidos documentos pertinentes ao caso, a partir de publicações oficiais do governo

federal e entidades envolvidas, como declarações presidenciais, cartas entre

representantes dos governos, acordos bilaterais, relatórios e expedientes de grupos

de trabalho, pareceres jurídicos acerca das disputas judiciais, e contratos firmados

entre as diversas partes. A pesquisa também baseou-se em publicações

acadêmicas que abordam o tema, e, especialmente, no livro lançado pelo diretor da

empresa foco da análise, Mendes e Attuch (2008).

Os dados primários foram coletados mediante entrevista semi-estruturada,

conduzidas por meio de um roteiro base, elaborado com a finalidade de responder

as perguntas de pesquisa. Foi feita apenas uma entrevista, de aproximadamente

três horas, devido à fatores suscitados abaixo. O entrevistado se trata de um ex-

funcionário da Mendes Júnior, que atuou diretamente em obras no exterior.

Todos os dados foram submetidos a triangulação, por meio de multiplicidade de

fontes, no intuito de evitar qualquer viés na análise do caso.

Já para análise de conteúdo dos dados empíricos, foi construído um framework

teórico-conceitual (Figura 4), cruzando as principais perguntas deste estudo com as

definições disponibilizadas pela literatura pertinente da área de negócios

internacionais.

Figura 4: Framework teórico-conceitual

Elaborado pelo autor

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3.4. LIMITAÇÕES DO ESTUDO

O método do estudo de caso falha em prover base necessária para

generalizações, já que propõe a análise de um caso isolado dentro de um sistema

complexo (YIN, 2001). Porém, enquanto uma má escolha de casos pode carecer de

informações conclusivas, causar generalização exagerada ou equívocos de

compreensão da relação entre as variáveis e os processos (BENNET & ELMAN,

2006a), uma escolha apropriada pode revelar uma nova pletora de informações

úteis, pois aciona mais atores e mecanismos básicos do processo estudado

(FLYVBJERG, 2006). No caso específico deste trabalho, o objetivo não é generalizar

as conclusões, e sim elucidar aspectos e suscitar discussões na tentativa de

consolidar sua compreensão.

Yin (2001) ainda reforça a essência subjetiva da pesquisa qualitativa, estando

sujeita ao viés das fontes de dados analisadas e do pesquisador. Esta crítica é

relevante pois é de suma importância delimitar a pesquisa nesse quesito. No

entanto, o viés não deve ser encarado como desvantagem do método, já que o

modo de pensar e agir dos atores, incorporando suas opiniões pessoais, é

justamente o foco da pesquisa. Da mesma forma, o senso crítico do pesquisador ao

decidir a hierarquia de importância dos dados adquiridos, tanto quanto sua

suficiência, fora sua capacidade narrativa, são fatores cruciais para a formulação de

um trabalho significativo (CRESWELL & MILLER, 2000).

No presente caso, houve limitação na coleta de dados primários, já que a

empresa foco se encontra sob investigação criminal. Portanto, tornou-se difícil o

acesso a dados na sede da empresa, e, da mesma forma, implicou na dificuldade de

realização de entrevistas com agentes estratégicos da empresa no processo de

internacionalização da mesma, visto que os principais atores, sejam de iniciativa

privada ou pública, preferiram se resguardar nesse momento, evitando

pronunciamento sobre quaisquer assuntos relacionados à empresa.

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4. HISTÓRICO DO AMBIENTE SETORIAL

4.1. A CONSTRUÇÃO CIVIL NO BRASIL

Tratando-se especificamente do cenário brasileiro, a construção pesada teve

suas operações iniciadas na metade do século XIX, por influência de empresas

estrangeiras, ao invés de um processo próprio de industrialização e evolução do

setor.

Se considerarmos a divisão da evolução da construção pesada brasileira

proposta, o primeiro movimento é compreendido aproximadamente da metade do

século XIX até a década de 1930, quando empresas estrangeiras foram as principais

responsáveis pelo desenvolvimento urbano, porém atestando o caráter de

dependência da economia nacional (CAMPOS, 2012a). Não obstante, para o autor,

por um período inicial, a função de realizador das obras também recaiu sobre o

aparelho do Estado.

O setor de saneamento evidencia essa transição, quando criada em 1933 o

primeiro organismo federal encarregado exclusivamente do assunto, a Comissão de

Saneamento da Baixada Fluminense (CAMPOS, 2012a). Após uma série de

transições de competência e escopo, o departamento foi elevado a órgão nacional,

sob alcunha de Departamento Nacional de Obras de Saneamento (DNOS). Não

mais limitado ao território carioca, o departamento ajudou a lapidar o novo setor para

empresas nacionais (LAMEGO, 2007).

Outro departamento governamental importante no setor foi a Inspetoria de Obras

contra a Seca (Iocs), criada em 1909, no governo de Nilo Peçanha. O departamento

cuidava não só de obras no intuito de combater a seca no Nordeste, como também

executava estradas, pontes, ferrovias, e inúmeras outras obras de infraestrutura,

incluindo hidrelétricas. Foi considerada nesse período a maior empreiteira nacional,

pois realizava os empreendimentos com seu próprio pessoal e equipamento, até sua

reformulação em 1945, na gestão de José Linhares. Passou a se chamar

Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (DNOCS), e limitou-se a contratar

as obras, deixando de realizá-las. Sua importância engloba o governo de Juscelino

Kubitschek, quando foi incumbido de parte do projeto rodoviário do Plano de Metas,

no trecho Fortaleza-Brasília (CAMPOS, 2012a).

A transição de Estado realizador para somente contratador de obras fica evidente

com a reformulação do DNER a partir do decreto-lei 8463 de 1947 pelo Ministro da

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Viação Maurício Joppert da Silva, conhecido como Lei Joppert (CAMPOS, 2012a).

Dessa forma, era concedida autonomia financeira e administrativa ao órgão.

Também foi criado o Fundo Rodoviário Nacional (FRN), que repassava verbas

arrecadadas via Imposto Único sobre Combustíveis Líquidos e Lubrificantes

Minerais (IUSCL), ao DNER, dando sequência ao Plano Rodoviário Nacional (PRN)

(FERRAZ FILHO, 1981). O fundo formado é considerado um marco, pois garantia

tomada de empréstimos dentro e fora do Brasil, dando início a um modelo de

acumulação da iniciativa privada, tanto quanto sua ramificação e especialização, até

então inexistentes (CAMARGOS, 1993).

Essa última adaptação do modelo é concretizada durante o governo de Juscelino

Kubitschek, no qual os setores mais importantes para a construção pesada nacional,

transportes e energia, são agraciados com políticas nacionais de incentivo, já que o

desequilíbrio entre a infraestrutura do país e o parque industrial já fortemente

impulsionado era manifestada (CAMPOS, 2012a; ROTSTEIN, 1966).

Mesmo com esse leque de oportunidades, foi do setor energético que saiu o

maior ganho das construtoras, com projetos que elevaram a produção nacional

energética em 65% (CAMPOS, 2008). Nesse período as empreiteiras continuavam

preponderantemente estrangeiras, mas é importa salientar que, sob regime de

subempreitada, a construtora Mendes Junior participou da construção da hidrelétrica

de Furnas. A construtora foi convocada para erguer o núcleo de argila da barragem

antes da cheia do rio Grande, sendo esta empreitada a origem da compreensão de

que construtoras brasileiras também poderiam executar obras de grande porte

(MENDES & ATTUCH, 2008). A partir desse momento, a empresa, que só havia

executado obras de pequeno e médio porte, junto com outras que vislumbraram a

oportunidade, investiram em capacitação administrativa e tecnológica para abraçar o

nicho (RÊGO, 2015).

A grande mudança na área veio em 1962 com a criação das Centrais Elétricas

Brasileiras S/A (Eletrobrás), holding responsável por estudos, projetos,

financiamentos, construção e operação de usinas produtoras, linhas de transmissão

e distribuição de energia elétrica, possibilitando finalmente o estabelecimento de

construtoras nacionais no setor (CAMARGOS, 1993; RÊGO, 2015).

Atinge-se, assim, o período da ditadura brasileira, fundamental para

compreendermos a posição na qual se encontram as empreiteiras atualmente. O

crescimento das empresas se deu em boa parte pela redução de encargos

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empregatícios, junto a políticas de incentivo a reinvestimentos e fusões, aumentando

o lucro das companhias (CAMPOS, 2009). Deu-se continuidade a programas

elaborados no governo de JK no setor de transportes e energia, ressaltando a

construção da hidrelétrica de Itaipu, e da rodovia Transamazônica, esta última

executada pela Mendes Junior. O projeto da rodovia visava integração nacional e foi

elaborado no governo Médici, via Plano Nacional de Desenvolvimento (PND). Vale

mencionar o período anterior, de recessão, durante o governo de Castello Branco

(1964-1967), quando houve reajuste econômico e suspensão de diversas obras,

porém a fase seguinte, conhecida como “Milagre Econômico”, foi vital para o

crescimento da economia e desenvolvimento dos setores (CAMPOS, 2012a).

O PND focava no setor rodoviário, destinando mais da metade da verba à área. É

só em 1974 que o panorama muda, e o transporte ferroviário passa a ser o eixo de

expansão. Foi o primeiro setor resguardado pelo Estado, por conta do decreto

64.345 de 10 de abril de 1969, garantindo a contratação apenas de empresas

nacionais para realização das obras, e, caso não houvesse companhia capacitada,

uma empresa estrangeira seria contratada com regime de consórcio com

participação de uma nacional, para que ocorresse transferência de tecnologia

(FERRAZ FILHO, 1981; CAMARGOS, 1993).

Neste contexto, outro fator histórico importante de ser mencionado foi a crise do

petróleo em 1973, que deu números finais ao processo de oligopolização e

ramificação das construtoras, como visível na tabela a seguir. Já que o modelo de

investimento era baseado no capital externo, os altos juros impulsionados pela crise

fizeram despencar a margem de lucro das companhias, intensificando a

concorrência. Várias empresas viram-se obrigadas a fechar as portas, enquanto

outras buscaram alternativas mergulhando nos nichos, como petroquímica,

exploração de petróleo, mineração e agroexportação (CAMPOS, 2012a).

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Quadro 6: Porcentagem do faturamento das cinco maiores empresas de construção em relação às cem maiores

Fonte: Revista O Empreiteiro, julho de 1985, nº 212

A característica final da construção nacional, pautada em obras públicas e

atividade no setor de construção civil foi proveniente do processo de entrelaçamento

político com o Estado, e não de um movimento de acumulação próprio,

exclusivamente (FERRAZ FILHO, 1981).

4.2. INTERNACIONALIZAÇÃO DO SETOR

O decorrer desse processo foi a semente para o cenário propício à

transnacionalização das construtoras brasileiras no final da década de 1960 (RÊGO,

2015). Segundo o autor, os primeiros movimentos além da simples prospecção de

licitações vieram com a Camargo Corrêa em 1967, e mais efetivamente com a

Mendes Junior em 1969. Sua subsidiária no exterior foi inaugurada em 1974. A

Mendes Junior também foi responsável pela obra considerada o marco zero das

empreitadas no exterior, a hidrelétrica de Santa Izabel, na Bolívia, concluída em

1973 (MENDES & ATTUCH, 2008). Os alvos primários foram regiões geográficas e

culturalmente próximas, como América do Sul e Central, e regiões lusófonas da

África, posteriormente, expandindo para o restante do continente africano e Oriente

Médio (RÊGO, 2015).

Foi no período do Milagre Econômico, de 1968 a 1973, que as empresas

começaram a procurar novos mercados. A tabela a seguir busca destrinchar o

número e valor dos contratos no exterior, por empresa, novamente com destaque

para a Mendes Junior, com maior quantidade e valor acumulado (FERRAZ FILHO,

1981).

Ano Porcentagem1978 31,2%1979 38,2%1980 39,3%1981 45,1%1982 48,1%1983 54,9%1984 56,9%

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Quadro 7: Empresas de construção pesada com obras no exterior

Fonte: Ferraz Filho (1981, p. 113)

Para Ferraz Filho (1981) são consideradas três possíveis motivações para o

movimento de internacionalização das empresas de construção brasileiras:

• Resposta à crise no mercado interno: a hipótese de que as empresas

buscariam novas oportunidades como contramedida à retração do

mercado nacional é infundada, pois mesmo ao ser considerada uma

redução de investimentos no setor de transportes, essa foi compensada

pelo fomento no setor energético.

• Resposta ao crescimento do mercado externo: a expansão do mercado

externo é evidenciada pela ascensão da demanda de obras de engenharia

por países produtores de petróleo, claramente grupo mais rico do cenário

mundial. Porém, por mais que seja indiscutível a atratividade do mercado

internacional, não é suficiente para determinar o movimento. Há ainda que

se discutir as condições que possibilitaram as companhias a concorrer e

serem bem-sucedidas em um mercado tão disputado.

EMPRESA Nº DE CONTRATOS VALOR (US$ MILHÕES)

AFFONSECA 3 40,5

C. CORRÊA 1 1.200,0

CETENCO 2 1.250,0

CBPO 2 31,5

CONCIC 1 10,0

BCEL 1 83,5

ECISA 4 104,0

ESUSA 2 30,0

MENDES Jr. 8 1.954,0

ODEBRECHT 2 130,0

RABELLO 4 550,0

STER 2 33,0

TOTAL 32 5.416,5

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• Tecnologia intermediária como arma brasileira para enfrentar a

concorrência internacional: a engenharia brasileira é fruto de transferência

de tecnologia de empresas internacionais, adaptadas a necessidades

específicas de ambiente, prazo, e condições de trabalho e financiamento.

Tal hipótese também não é suficiente por si só, mas ajuda a explicar como

construtoras brasileiras apresentaram excelência na execução de obras de

infraestrutura sob regime estrito no exterior, por muitas vezes

apresentando melhor proposta de tempo e custo nas licitações.

É importante ressaltar a importância do Estado no processo, cumprindo papel

vital no financiamento das obras e nas pressões diplomáticas. Essa

interdependência tanto beneficiou as maiores construtoras, que se firmaram

dominantes no cenário nacional, e o governo, que teve instrumentos para reafirmar

sua política externa (CERVO & BUENO, 2008; FERRAZ FILHO, 1981).

Atualmente, empresas brasileiras tem presença em mais de 50 países (RÊGO,

2016), evidenciado na figura 4, sendo que a maior parte das receitas é originária do

exterior (CBIC, 2012). A Odebrecht é a construtora com maior nível de atividade

estrangeira, atuando em 30 países, com 80% das receitas provenientes do exterior.

Já a Mendes Júnior, apesar de ser pioneira no processo, tem sua presença no

exterior em fase de recuperação após um período de retração. Não obstante, sua

atuação já foi extensa, como é possível verificar na figura 5, e seus relatórios anuais

recentes constam os objetivos estratégicos de voltar a ter contratos internacionais.

(MENDES JÚNIOR, 2013).

Em 2004, a exportação de serviços de engenharia por empresas brasileiras

atingiu o patamar de 2,3 bilhões de dólares. As políticas de financiamento de

exportações por meio do BNDES e do Banco do Brasil, promovidas durante o

governo Lula, foram as grandes responsáveis por essa ascensão. (CBIC, 2012)

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Figura 5: Presença das empreiteiras brasileiras no mundo atualmente

Fonte: Rêgo (2015, p. 229)

Países em que atuam hoje

África do Sul, Alemanha, Angola, Antígua, Arábia Saudita, Argélia, Argentina, Áustria, Botswana, Brasil, Bolívia, Camarões, Chile, Colômbia, Congo, Costa Rica, Cuba, El Salvador, Emirados Árabes Unidos, Equador, Estados Unidos, Gabão, Gana, Guatemala, Guiana, Guiné, Guiné Equatorial, Haiti, Honduras, Iraque, Líbano, Líbia, Mali, México, Moçambique, Namíbia, Nicarágua, Nigéria, Panamá, Paraguai, Peru, Portugal, Quênia, Reino Unido, República Dominicana, Tanzânia, Trinidad & Tobago, Uruguai e Venezuela.Países em que atuaramAzerbaijão, Bahamas, Catar, China, Cingapura, Djibuti, Espanha, Grécia, Índia, Irã, Kwait, Libéria, Malásia, Mauritânia, Rússia, Santa Lúcia, Suriname, Ucrânia, Zaire.

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Figura 6: Presença histórica internacional da Mendes Júnior

Elaborado pelo autor

O setor de construção civil brasileiro foi responsável por 4% do PIB em 2009,

tendo crescido até 2008, ano de recessão mundial no qual a redução de crédito

privado teve efeitos como queda do preço de ações das empresas. No entanto, as

medidas anticíclicas por parte do governo para mitigar a crise proporcionaram um

resiliente crescimento da construção civil no Brasil, como mostra o gráfico 1. Tanto a

área de edificações como a de construção pesada são diretamente dependentes da

restrição de crédito e capital estrangeiro, mas as providências tomadas para

minimizar os efeitos, como desoneração tributária e expansão de crédito para

habitação (e.g., Programa Minha Casa, Minha Vida), surtiram efeito imediato.

(BNDES, 2010)

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Gráfico 1: Evolução trimestral da construção civil no Brasil

Fonte: BNDES (2010, p. 315)

Em 2013 as construtoras realizaram incorporações, obras e/o serviços no valor

corrente de 357,7 bilhões de reais. Uma expansão de 3,7% em relação ao ano

anterior. Desse montante, 33,7% são originários de obras contratadas por órgãos

públicos, demonstrando uma queda em relação ao ano anterior (35%). Alguns

fatores nutriram a dinâmica do setor, como o Programa Minha Casa, Minha Vida

(PMCMV), a oferta de crédito imobiliário, os programas de investimento, como o

Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), e as obras para a Copa do Mundo

de 2014 (IBGE, 2013).

Por conta da crise de 2008, os resultados da Mendes Júnior ficaram abaixo das

expectativas, ao conviver com seguidos adiamentos na execução das obras. A

receita bruta da companhia alcançou 1,33 bilhão de reais, e lucro líquido de 41

milhões de reais. Todavia a carteira de projetos foi expandida (MENDES JÚNIOR,

2012).

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Quadro 8: Dados gerais da indústria da construção - Brasil (2012-2013)

Fonte: IBGE (2013)

Subdividindo o setor da construção em edificação e construção pesada, a

Mendes Junior coloca-se no grupo das maiores controladoras do negócio nacional.

A maior participação vem por parte das empresas de maior porte, com mais de 30

empregados, como mostra o gráfico 2.

Gráfico 2: Distribuição percentual do número de empresas e empregados e valor das obras

Fonte: BNDES (2010, p. 321)

É significativa a concentração das obras de maior valor nas mãos de empreiteiras

com presença internacional e em diversos segmentos (BNDES, 2010).

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5. EXPOSIÇÃO DO CASO

5.1. CONSOLIDAÇÃO INTERNA

A construtora Mendes Junior foi estabelecida em 31 de dezembro de 1953, em

Belo Horizonte, Minas Gerais. Murillo Mendes, em seu livro Quebra de Contrato

(2008), admite que seus ideais inovadores e até mesmo de tendência anarquista

que durante o período de formação universitária, quando cursava engenharia civil, o

levaram a desafiar a presença absoluta de empresas estrangeiras no setor em

âmbito nacional. A oportunidade veio quando a antiga empresa do patriarca da

família, seu pai José Mendes Júnior, enfrentou uma cisão devido aos conflitos

societários. Pai e filho decidiram assumir os equipamentos da antiga companhia, e

fundar a Mendes Junior, com Murillo na direção e José Mendes Júnior compondo o

conselho administrativo.

O contexto da criação da empresa coincide com o ciclo econômico conhecido

como desenvolvimentista, que perdurou no Brasil até final dos anos 1980, em que se

fomentava a ideia de industrialização baseada no modelo de substituição de

importações. Assim, esse período que também marca o final da II Guerra Mundial,

foi, no Brasil, determinado pelo combate à inflação por meio de aumento da oferta

interna de bens através de importações. Eram otimistas as previsões em relação à

balança comercial devido à proposta de política externa mais aberta, seguidos

superávits, e potenciais investimentos norte-americanos após o apoio brasileiro

oferecido durante a guerra (MALAN ET AL., 1980). Porém, as previsões não se

concretizaram, sendo que os EUA, principal parceiro brasileiro na época, priorizaram

a reconstrução da Europa como estratégia para suprimir a expansão soviética, o que

levou consequentemente a seguidos déficits no comércio exterior brasileiro

(PORTUGAL, 1994).

Logo em seguida, em outubro de 1953, a Superintendência da Moeda e do

Crédito (Sumoc), durante o segundo governo de Getúlio Vargas, criou o confisco

cambial, determinando a transferência de parte da receita com exportação do café

para o financiamento de projetos prioritários, em especial a indústria (FAUSTO,

1994). A transição do Brasil agrário para o industrial foi iniciada. Mas para que o

parque industrial se tornasse viável, deveria haver concomitantemente uma

evolução da infraestrutura.

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Diante disso, entre 1951 e 1953, a Comissão Mista Brasil – Estados Unidos para

o Desenvolvimento Econômico, criada após o Acordo de Washington, elaborou

estudos para otimizar a aplicação dos investimentos norte-americanos de auxílio ao

desenvolvimento do Brasil. As principais áreas abordadas foram a de geração de

energia e transporte, com atenção particular para a reformulação da malha

ferroviária local (LOPES, 1986).

Estava formada a atmosfera promissora que inspirou a fundação da Construtora

Mendes Júnior. A herança da experiência de José Mendes Júnior, pioneiro na

execução de obras ferroviárias no país, foi essencial para a consolidação da

empresa nos primeiros anos. Sempre almejando competir com grandes empresas

internacionais, os altos padrões de qualidade impostos pela Construtora ajudaram a

firmar seu nome entre as principais empreiteiras nacionais de 1953 a 1957. Mendes

e Attuch (2008) citam um projeto em específico responsável por alavancar a Mendes

Júnior, elevando o status da construtora a realizadora de grandes empreendimentos,

e não mais obras de pequeno e médio porte: a hidrelétrica de Furnas, em Minas

Gerais.

Foi com esta empreitada, segundo ele, que se superou o preconceito sobre

empresas brasileiras construírem barragens. A obra teve início em 1958, e a

Mendes Júnior foi convidada pela Cemig, participante do consórcio, a erguer o

núcleo de argila da barragem antes da cheia do rio. A convocação veio a partir do

trabalho que estava sendo executado na barragem de Pium-í, em Minas Gerais. A

participação de empresas privadas foi exigência do principal financiador da obra, o

Banco Mundial. Mendes e Attuch (2008) admitem haver atividades ilícitas

envolvendo a relação empresa-governo naquele tempo, mas a intervenção de

organismos internacionais como o Banco Mundial ajudava a suprimir as tentativas, e

promover a transparência de todos envolvidos, mantendo o foco no nível de

excelência na execução.

Segundo Roberto Campos (1994), Furnas foi chave para o aperfeiçoamento

nacional de técnicas para construção de grandes barragens. E foi aplicando

tecnologia inovadora, em comunhão com capital intelectual de vanguarda, que a

Mendes Junior entregou a obra 15 dias antes do prazo. Finalmente a todo vapor em

setembro de 1960, a crise energética do Sudeste foi contornada com os 900

megawatts, ou 12% da capacidade instalada, providas pela hidrelétrica.

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Foi durante o governo de Juscelino Kubitschek, via Plano de Metas, que a

engenharia brasileira vislumbrou as maiores oportunidades de amadurecimento.

Essa onda carregou também a Mendes Júnior, apesar de Mendes e Attuch (2008)

garantirem não haver proximidade política especial com o Presidente mineiro, pois

essa mentalidade não fazia parte das práticas da companhia. Isso é evidenciado na

“participação meramente decorativa” (MENDES & ATTUCH, 2008, p. 63) da

construtora nas obras de Brasília, principal empreendimento planejado por JK.

A Mendes Júnior deu, então, prioridade para o avanço tecnológico e

administrativo, contratando consultorias internacionais, como a Arthur D. Little

(MENDES & ATTUCH, 2008). Para os autores, esse passo foi determinante para

moldar as decisões da construtora, quando Murillo foi aconselhado pelo consultor

norte-americano James Libby a se empenhar na contratação de engenheiros com

experiência internacional. As justificativas foram manter o status de concorrente em

um mercado ainda controlado por empresas internacionais, e preparar a Mendes

para um processo de internacionalização como diversificação de riscos, pois uma

empresa desse porte não deveria depender exclusivamente do mercado brasileiro.

A Mendes Júnior focou em construção de barragens, integrando engenheiros

experientes como o canadense Richard Henderson, nome de grande experiência

nesta área. Logo após a conclusão de Furnas, a empresa participou de praticamente

todas as barragens construídas no Brasil nos anos 1960, construindo a usina de

Cachoeira Dourada na divisa entre Minas e Goiás, a hidrelétrica de Rio da Casca III

no Mato Grosso, Jaguara entre Minas e São Paulo, e Boa Esperança no Piauí1.

Esse período foi o alicerce da admissão da Mendes Júnior no exterior, ao

sacramentarem o uso de métodos inovadores:

A Mendes foi uma verdadeira escola e teve grande influência em outras construtoras brasileiras, pois a empresa introduziu novos métodos gerenciais e de produção. Os outros, mesmo os estrangeiros, nos copiavam em muitas das inovações, especialmente na área de barragens, pois as novas ideias eram mais eficientes e, em geral, custavam bem menos (HENDERSON apud MENDES & ATTUCH, 2008, p. 66).

Criava-se, assim, o conceito de tecnologia intermediária, abordado por Ferraz

Filho (1981) como raiz do movimento internacional de construtoras brasileiras. As

companhias brasileiras eram capazes de adaptar tecnologias estrangeiras e aplica-

1 Informações disponíveis em www.mendesjunior.com.br e acessadas em 1/08/2016

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las em condições mais escassas de recursos, tempo e expertise. A Mendes Júnior

foi precursora dessa corrente, portando a filosofia de que “a engenharia, mais do

que um compêndio de regras e procedimentos, é uma ciência em permanente

evolução” (MENDES & ATTUCH, 2008, p. 66). Para o Murillo, todo engenheiro

deveria ser um “resolvedor” de problemas.

Outra fase importante vivenciada pela empresa foi no período do Milagre

Econômico, especificamente entre 1968 e 73, quando as taxas de crescimento do

PIB saem de 9,8% e atingem médias de 14% a.a. (GIAMBIAGI et al, 2011, p. 66). O

amadurecimento da economia levou a Mendes Júnior expandir para outros setores,

como construção de ferrovias e rodovias. Secundariamente a empresa também se

aventurou em projetos de pontes e plataformas marítimas. As principais obras

executadas pela Mendes nesse intervalo foram a rodovia Transamazônica entre o

Pará e o Amazonas, a ponte Rio-Niterói, e a hidrelétrica de Itaipu2.

Impulsionado pelo I Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), do governo

Médici, responsável pelo crescimento de 34,5% ao ano do setor de veículos, a

Mendes estabeleceu domínio na área de pavimentação e estradas de rodagem. A

porta de entrada foi um trecho da BR-116 no Ceará, e em curto prazo a construtora

já assumia as obras da Belém-Brasília, Perimetral Norte, Transamazônica, e Rio-

Santos (MENDES & ATTUCH, 2008).

Com o choque do petróleo, iniciado em 1973, foi lançado o II PND, que visava

fortalecer a indústria de base. Nesse contexto a Mendes participou da construção da

Companhia Siderúrgica de Tubarão no Espírito Santo, a Ferrovia do Aço em Minas

Gerais, e até mesmo da plataforma metálica de Pampo no Rio de Janeiro,

contratada pela Petrobrás (MENDES & ATTUCH, 2008).

Nota-se como a Mendes Júnior permeou gradualmente entre diversos setores da

construção civil pesada, otimizando suas oportunidades. Especialmente, tratou-se

primeiro da especialização no setor energético, com hidrelétricas e barragens, em

seguida no rodoviário, e por fim no ferroviário. A consequência imediata foram

contratos firmados para condução de obras no exterior.

2 Informações disponíveis em www.mendesjunior.com.br e acessadas em 1/08/2016

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5.2. MOVIMENTO DE INTERNACIONALIZAÇÃO PIONEIRO

Desde seu amadurecimento gerencial, a Mendes Júnior demonstrava uma

filosofia de diversificação de riscos, pois todos países apresentam ciclos e situações

econômicas diversas com períodos de restrições de investimentos. O Brasil passava

por longa fase de desenvolvimento, e já era apresentada uma contenção econômica,

com o governo chegando a dever Cr$ 8 bilhões à Mendes Júnior ao final de 1980.

(MENDES, 1981)

A respeito das opções de investimento no exterior, Mendes e Attuch (2008)

justificam o primeiro movimento para países latinos e africanos, ao tratar da Europa:

As condições de competitividade da indústria da construção são maiores. Torna-se difícil um trabalho nos países cujo conhecimento do local pela indústria da construção seja muito grande. Mas podem surgir oportunidades, através de associações. Não é prioridade nossa, mas às vezes essas associações são ventiladas.

A primeira obra foi a da usina hidrelétrica de Santa Izabel, na região de

Cochabamba, Bolívia, iniciada em 1969. Para Mendes e Attuch (2008) a

oportunidade veio graças à boa imagem da construtora frente aos olhos do Banco

Mundial, conquistada com a excelência nas obras executadas ainda em território

nacional. A Mendes Júnior venceu a licitação concorrida por 28 empresas, sendo a

primeira brasileira financiada numa obra internacional, rompendo com a ideia de que

o BIRD dava preferência para companhias europeias. Esse episódio marcou o

embrião da expansão internacional das empresas brasileiras do setor de construção

civil pesada (AYMORÉ, 1973).

A construção da usina de Santa Izabel também foi essencial para o

aperfeiçoamento de outro aspecto da engenharia intermediária, além da falta de

recursos, houve a superação de climas extremos e culturas distintas. Os costumes

bolivianos, tanto quanto seu ambiente político e sindical, mostraram-se diversos em

princípio, forçando a Mendes a levar do Brasil cerca de 50 empregados qualificados,

entre engenheiros e corpo administrativo. A construtora tornava-se, assim, a primeira

exportadora de know-how do país (MENDES & ATTUCH, 2008).

Embora a iniciativa para internacionalização tenha partido de decisão estratégica

da Mendes Júnior, há de se admitir que o contexto de políticas públicas também

assumia um caráter expansionista. A partir da metade da década de 1960, o ônus de

conformidade foi drasticamente reduzido, tal como os impostos relativos a vendas no

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exterior. Também foram criadas entidades de suporte, como o Conselho Nacional do

Comércio Exterior, o Programa de Financiamento às Exportações (Finex), e o

Instituto de Resseguros do Brasil (IRB) (MENDES & ATTUCH, 2008). Esse último

era a ferramenta mais importante, pois tinha como finalidade resguardar os

investidores em ambientes de alto risco político e econômico, mas acabou sendo

pivô do capítulo de retração dos negócios, tanto internacionais quanto nacionais, da

Mendes Júnior, descrito posteriormente.

Como a construtora já almejava atingir 80% de receitas advindas de contratos

internacionais, somado ao cenário favorável, viu-se o mapa de atividades estender

consideravelmente. O alvo seguinte foi a África, responsável pela

internacionalização de muitos setores da indústria do Brasil, que deixava de ser

apenas exportador de commodities. Em 1975 a Mendes Júnior firmou acordos

importantes na Argélia e na Mauritânia. O primeiro foi a execução da malha

ferroviária local, por meio de uma empresa de economia mista, a Societé

d’Infrastructure Ferroviaire, formada entre a Mendes (38%), o governo argelino

(51%) e outra empresa brasileira (11%). O projeto durou dez anos, e ampliou a

experiência da Mendes em territórios de alto risco, com uma cultura não familiar.

Além disso, o currículo da empresa foi incrementado ao trabalhar com o governo

local, bagagem que mais tarde vingou contratos na China (MENDES & ATTUCH,

2008).

Já na Mauritânia foi elaborada a “Rodovia da Esperança”, 600 quilômetros de

estrada entre Nouakchott e Kiffa. Novamente foi deslocado um enorme contingente

para o local, cerca de 400 empregados entre engenheiros e técnicos, além dos mais

de mil mauritanos treinados pela Mendes num compromisso firmado com o governo

local. O orçamento da obra foi de 115 milhões de dólares, mas, apesar das obras

serem em alguns dos países mais pobres da região, eram todas financiadas pelo

Fundo Árabe de Desenvolvimento Econômico e Social, apresentando orçamento de

até 2 bilhões de dólares até 1979 (HOURANI, 1994).

Demonstrando compromisso ao entregar a obra 112 dias antes do prazo

estabelecido, por meio da proximidade com países constituintes da Liga Árabe, e

vencendo barreiras de adaptação cultural ao islamismo, novos empreendimentos

surgiram no Oriente Médio. Foi um período tão fértil que Mendes e Attuch (2008)

relatam mais de 50 propostas internacionais na década de 1980, expondo a

necessidade de um novo departamento tão logo criado: o Planejamento e Controle

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de Obra no Exterior (PCO-E), responsável por prospecção de oportunidades

internacionais.

Em 1978 a Mendes Júnior adentrou a maior empreitada de sua história, segundo

Mendes e Attuch (2008), ao buscar obras no Iraque. Para os autores, a escolha do

país deveu-se a uma série de fatores, dentre eles: 1) a proximidade alcançada com

países árabes a partir da adoção da chamada política externa pragmática e

responsável do governo Geisel, cuja premissa estava no desenvolvimento de

relações diplomáticas com parceiros estratégicos a despeito da disputa ideológica

em curso; 2) a estabilidade religiosa e aproximação política com o Ocidente provida

por um governo sunita; 3) a atratividade econômica de um país produtor de petróleo

acrescida do fator da crise do petróleo em curso promovido pelos membros da

OPEP; 4) acordos bilaterais firmados com o governo brasileiro, que quando

impedido de explorar um campo de petróleo descoberto na região, pressionou o

Iraque a abrir suas divisas para companhias brasileiras.

Neste contexto, a primeira obra no Iraque foi da ferrovia Bagdá-Akashat, ocorrida

entre 1978 e 1985, avaliada em 1,2 bilhões de dólares, o maior contrato de

exportação de serviços na história brasileira até então. Após um processo acirrado

de concorrência, sobraram três empreiteiras, sendo uma iugoslava e uma indiana,

além da Mendes. A comissão organizadora decidiu avaliar os precedentes das

empreiteiras como forma de garantia, e o portfólio da Mendes Júnior foi o único a

certificar total segurança (MENDES, 1978). Além disso, o governo iraquiano só

admitiria a Mendes caso o governo brasileiro agisse como intermediário, forçando a

construtora a associar-se com a Interbrás, subsidiária da Petrobrás (MENDES &

ATTUCH, 2008).

Posterior a essa primeira experiência no país, outros contratos foram firmados

pela empresa no Iraque. Simultaneamente à construção da ferrovia, o Iraque

contratou a Mendes Júnior, em 1981, para executar uma etapa da rodovia

Expressway, com 128 quilômetros, avaliado em 333 milhões de dólares. Já em 1984

a Mendes também foi encarregada do projeto Sifão, uma estação de bombeamento

do Rio Eufrates, que devolveria a fertilidade à região, prejudicada pela salinidade de

seus principais rios. Para Lúcio Camilo, consultor a serviço da Mendes Júnior, essa

era de expatriação foi inaugurada pela construtora, que apresentava ao redor de 10

mil funcionários brasileiros no Oriente Médio, e uma infraestrutura própria

descomunal, representada no quadro 10 (MENDES & ATTUCH, 2008):

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Quadro 9: Logística da Mendes Júnior no Iraque

Fonte: Mendes & Attuch (2008, p. 165)

Nesse intervalo, culminaram conflitos no Golfo Pérsico: a Guerra Irã-Iraque de

1980 a 1988, e a Guerra do Golfo de 1990 a 1991. Determinações da Organização

das Nações Unidas (ONU), acatadas pelo governo brasileiro, embargaram

comercialmente o Iraque, levando à retirada de todos os brasileiros do país. Os

trâmites legais à respeito do seguro de guerra pago pela Mendes Júnior geraram um

dos maiores contenciosos da história do país, sendo o principal argumento para

justificar o ponto de inflexão na trajetória internacional da empresa, discutido mais à

frente.

Enquanto isso, as investidas da Mendes não se limitaram ao Oriente Médio. Em

1989 a empresa fechou um contrato de 58 milhões de dólares para realizar obras de

expansão da mina de cobre de Los Bronces, no Chile, país que viria a tornar-se o

pilar da reestruturação da construtora. O ambiente econômico e político do Chile

cativou os diretores da Mendes. Após a escolha de um sócio local, condição

imprescindível para assumir obras no país, seguiram os projetos do mineroduto de

Collahuasi, a construção em regime de concessão do aeroporto Carrier Sul em

Concepción, a infraestrutura de saneamento em La Florida, o metrô de Santiago e

de Valparaíso, e a ponte de Llácolen (MENDES & ATTUCH, 2008).

Outra importante frente responsável por manter os negócios da empresa no

exterior foi na China. Pelo fato de que qualquer empreendimento deve ser feito em

Casas 725Hotéis 11Escritórios 309Hospitais/creches 15Clubes 13Escolas 5Veículos leves 1.184Caminhões 1.532Tratores 168Guindastes 131Carregadeiras 132Equipamentos especiais 1.194Locomotivas 8Itens em estoque 110.000

Logística do Iraque em Números

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associação com estatais, a Mendes Júnior desenvolveu um método diferente de

abordagem, vendendo e administrando a tecnologia para execução das obras. Em

1994 auxiliou na construção da maior barragem de rocha do mundo até então, na

hidrelétrica de Tianshegqiao-1, com direito a 10% do contrato de 300 milhões de

dólares (MENDES & ATTUCH, 2008)

A importância do Grupo Mendes Júnior para a cultura de internacionalização de

empresas brasileiras é notável. O ex-ministro das Minas e Energia Eliezer Batista,

salienta o papel do diretor da construtora:

O Murillo passava a imagem do brasileiro que conseguia abrir caminho no exterior – o que naquela época não era nada fácil. O Murillo foi, sem saber, um grande estrategista do país (BATISTA apud MENDES & ATTUCH, 2008, p. 135).

5.3. CRISE INTERNA E RECUO DA PRESENÇA INTERNACIONAL

Mesmo que impressionante, a história de uma das maiores construtoras do País

não é imaculada. Em junho de 1995, após 40 anos de representação de uma cultura

de excelência, tanto no cenário nacional quanto internacional, a empresa se via às

margens da falência, com dívidas estimadas em 2,9 bilhões de reais, entre

obrigações trabalhistas, e compromissos com fornecedores, além de

responsabilidade com o governo. A Mendes Júnior não possuía Certidão Negativa

de Débitos, pré-requisito para participar de concorrências públicas no mercado

nacional. Da mesma forma, se viu obrigada a recuar seu posicionamento global,

restringindo estrategicamente seus mercados ao Chile e China. Por conta disso, a

companhia viria a projetar uma reestruturação para sobreviver à sua crise mais

profunda até então.

A deflagração da crise pode ser associada a fatores endógenos, tratados por

decisões gerenciais, e exógenos, tratados pelo contencioso entre a Mendes Júnior e

o Banco do Brasil. Embora a influência negativa das questões internas seja

discutível, os eventos exógenos são pontuais e concretos, e foram os maiores

responsáveis pelo endividamento da construtora.

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5.3.1. O Caso Iraque

5.3.1.1. Papel Do Governo Na Contratação Da Mendes Júnior

A entrada da Mendes Júnior no Iraque não se deu apenas pelo potencial lucrativo

do mercado, vislumbrado por Mendes e Attuch (2008), e ratificado pela estabilidade

política e religiosa do país, em comparação a outras Nações do Oriente Médio. A

empresa serviu de instrumento diplomático para estreitamento comercial entre Brasil

e Iraque diante de um contexto de crise na balança de pagamentos, intensificada

pelos seguidos choques do petróleo, sendo evidenciado nas falas de importantes

atores envolvidos no processo:

Houve uma conciliação de interesses, claro. Mas eu fui sim solicitado a trabalhar junto [do governo]. Em todos os contenciosos, tanto o do Banco do Brasil como o da Chesf, no começo, o Governo Federal e estas empresas consideravam a Mendes Júnior como um parceiro imprescindível, algo que está documentado (MENDES apud GOMES JÚNIOR, 2011, s/p).

Naquela época, Mendes Júnior e governo eram a mesma coisa. A construtora não era mais uma entidade privada. Fazia parte de uma política do governo em relação ao Oriente Médio (SANT’ANNA apud MENDES & ATTUCH, 2008, s/p).

Faz-se mister trazer à tona o aprofundamento das relações Brasil-Iraque, no que

tange o comércio de petróleo. A partir de 1971, quando representações diplomáticas

foram oficializadas nos dois países, o Brasil deu prosseguimento à sua estratégia de

exploração de lacunas do sistema comercial internacional, aproximando-se do

mercado iraquiano abandonado pelos EUA e pela Europa Ocidental, considerados

inimigos pelos seus ideais imperialistas e sionistas (PIMENTEL, 2011). Segundo o

autor, em 1971, a nacionalização do petróleo iraquiano desencadeou um embargo

internacional, promovido pelas antigas companhias que exploravam os campos

locais. O Brasil teria sido o primeiro a furar o boicote, e esse fato acarretaria na

eterna gratidão do governo iraquiano, que passou a dar preferência aos negócios

brasileiros:

Nós havíamos descoberto o campo de Majnoon, um dos maiores do mundo. Além disso, o governo do general Emílio Médici decidiu que não iria dar bola para a pressão internacional, após a nacionalização do petróleo por Saddam Hussein. Autorizamos um navio a vir do Iraque para o Brasil e nos tornamos o primeiro país a comprar petróleo iraquiano nacionalizado. Foi um ato soberano do Brasil.

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Mesmo com a repercussão internacional, a Petrobrás continuou a receber do Iraque por ter tido a coragem de adquirir petróleo logo após a nacionalização (SANT’ANNA apud MENDES & ATTUCH, 2008, s/p).

No final de 1973 veio a primeira crise do petróleo, deflagrada por conflitos

territoriais no Oriente Médio (FARES, 2007). O autor ainda destaca ações das

Nações constituintes da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP)

no intuito de embargar os principais apoiadores de Israel durante a guerra do Yom

Kippur, limitando a quantidade produzida, e aumentando consideravelmente o preço

do barril (de 3 a 12 dólares). Para Fares (2007), a imediata consequência para o

Brasil foi o déficit em conta corrente, pois, além de ver o dispêndio com petróleo

multiplicar, teve que lidar com a redução de exportações para os países

desenvolvidos, agora em profunda recessão.

A transição do governo Médici para o Geisel foi marcada pelo dilema energético

pois, como aponta Velloso (1986), a suspensão do desenvolvimento nacional era

veementemente descartada. A saída enxergada, não só pelo Brasil, como para

grande parte dos países subdesenvolvidos, para manter o fluxo da economia, era o

financiamento promovido junto aos países produtores de petróleo (SKIDMORE,

1988). O autor destaca a grandeza dos empréstimos, quando, durante a “reciclagem

dos petrodólares”, o Brasil chegou a 11,9 bilhões de dólares em dívidas externas.

Assim, a falta de crédito internacional passou a dificultar a importação de petróleo,

provocando a aproximação natural ao Iraque:

É lógico que tinha interesse nacional. Foi na época da chamada “reciclagem de petrodólares”. Havia uma escassez mundial de petróleo e o único país que se mantinha fiel aos compromissos de fornecimento de petróleo era o Iraque (LIMA apud GOMES JÚNIOR, 2011, s/p).

Segundo o Expediente PRES 1077/88, enviado por Armando Guedes Coelho,

então presidente da Petrobras, a Antônio Aureliano Chaves de Mendonça, então

Ministro de Minas e Energia, em agosto de 1988, a estatal brasileira vinha

estreitando laços com a contraparte iraquiana State Oil Marketing Organization

(SOMO). Desde 1972 o Iraque já caminhava para se tornar o principal fornecedor de

petróleo ao Brasil, e essa posição foi ratificada após o primeiro choque, pois a

SOMO não comprometia as linhas de crédito brasileiras, já que não exigia

confirmações de cartas de crédito:

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As décadas de 70 e 80 foram de uma aproximação incrível com os países do Oriente Médio. Foi literalmente na base da amizade que conseguimos manter o país abastecido e não ter racionamento (COELHO apud MENDES & ATTUCH, 2008, s/p).

O governo brasileiro ainda aproveitou o momento de rápido enriquecimento do

Iraque para propor acordos bilaterais para equilibrar a balança comercial. De acordo

com Aburish (2001), os recursos obtidos com a venda de petróleo iraquiano

deveriam ser encaminhados para a modernização e desenvolvimento econômico do

país, descartando importação de artigos de luxo, tendência do restante dos países

do Golfo Pérsico. O autor destaca que o progresso seria alcançado ao se seguir

duas premissas: a contratação dos melhores serviços disponíveis em todo mundo, e

a diversificação dos fornecedores, mitigando risco de crises mercadológicas. O fato

da economia e a política andarem de mãos dadas no Iraque (HALLIDAY, 2005),

favoreceu enormemente o Brasil, que rapidamente buscou compensação pela

fidelidade ao governo iraquiano, propondo uma maior abertura para penetração de

empresas nacionais.

Foi por meio da Interbrás que esse espaço foi explorado. A extinta subsidiária

nasceu após acúmulo de poder e incumbências destinadas à Braspetro, companhia

que, além de encarregada de explorar petróleo, era incumbida de facilitar o comércio

de bens e serviços em geral (DIAS & QUAGLINO, 1993). O autor ressalta que o

volume de atividades coordenadas pela Braspetro tornou-se considerável,

especialmente após países árabes solicitarem que a instituição intermediasse

transações no Brasil. Sendo assim, sugeriu-se a criação de uma trading que

pudesse fazer uso do poder de compra da Petrobrás para promover as exportações

brasileiras. A ideia enfrentou resistência a princípio, porém em 1976 o presidente da

República Ernesto Geisel decretou a criação da Interbrás (SANT’ANNA apud DIAS &

QUAGLINO, 1993).

Como a proposta de modernização de Saddam Hussein passava pelo

desenvolvimento da infraestrutura local, seu plano incluía a construção de ferrovias,

rodovias, projetos de irrigação, habitação, e implantação de fábricas (MENDES &

ATTUCH, 2008, p 154). O governo viu, segundo os autores, a oportunidade de

equacionar a balança exportando serviços de engenharia, e esse empenho veio por

meio da associação Interbrás e Mendes Júnior. A construtora mineira teria sido a

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escolhida não só pelo seu acervo técnico de respeito, respaldado pelas grandes

obras nacionais e internacionais na década de 1960, mas também por ser capaz de

lidar com contratos de tamanho vulto3:

Houve a identificação de uma oportunidade e, pela nossa avaliação, a única empresa que tinha condições de assumir uma obra daquele porte era a Mendes. Assim, não fazia sentido realizar concorrência, porque não se tratava de um contrato em que nós estivéssemos adjudicando, nós apenas identificamos a Mendes como capaz de realizar o trabalho, o que eles acabaram comprovando. Foi à Mendes oferecida essa oportunidade. A palavra certa era “oportunidade” mesmo, não era uma adjudicação, mas uma indicação de oportunidade, e a resposta da Mendes foi pronta, reconhecendo que tinha capacidade de executar o trabalho (LIMA apud GOMES JÚNIOR, 2011, s/p).

O início da atuação da Mendes foi uma vitória importante, de grande significação. Até para a imagem internacional do Brasil era importante mostrar a capacidade de realizar obras daquele vulto, além de assegurar a logística (LIMA apud GOMES JÚNIOR, 2011, s/p).

O passo seguinte, descrito no Relatório Final do Grupo de Trabalho

Interministerial de 1992, foi o envio de uma carta do Ministro das Minas e Energias

Shigeaki Ueki ao Ministro do Petróleo do Iraque, em 1977, na qual apontava o

profundo interesse brasileiro na execução da obra da Ferrovia Bagdá-Al Qaim-

Akashat, no intuito de dar início ao balanceamento das contas externas já discutidos

entre os agentes. O Relatório ainda aponta comunicação direta entre o Presidente

da República, Ernesto Geisel, e o Presidente iraquiano Saddam Hussein, solicitando

a concessão da referida obra ao consórcio brasileiro.

Em 18 de julho de 1978 foi celebrado o Memorando de Entendimentos, pelo

Ministério do Planejamento do Iraque, e pelo Ministério da Indústria e Comércio do

Brasil, mediado pela Interbrás e pela construtora Mendes Junior, na forma de sua

coligada Mendes Junior International Company4. Com título original em inglês,

Memorandum of Understanding, o documento, na prática, adjudicava a obra ao

consórcio.

O Governo ainda garantiu a viabilidade do contrato fornecendo as garantias

bancárias exigidas por meio do Banco do Brasil (em nome do Tesouro Nacional),

3 Relatório do Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), datado de 23 de junho de 1992,

decorrente dos estudos promovidos na avaliação dos conflitos entre Mendes Júnior, Banco do Brasil e IRB, que se estenderam de janeiro a junho de 1992

4 Relatório do Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), datado de 23 de junho de 1992

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linhas de crédito de exportação ao Grupo Mendes Júnior via BB Grand Cayman

(subsidiária internacional do Banco do Brasil, com recursos próprios) no valor de

73,6 milhões de dólares, e linhas de crédito via contratos FINEX (recursos do

Tesouro Nacional) no valor de 133,4 milhões de dólares. As operações foram

seguradas pelo IRB, em nome do Governo Federal, cobrindo, inclusive, riscos

políticos e de guerra5.

5.3.1.2. Desenvolvimento Das Obras

Saddam Hussein contratou a empresa Arab Resources Management (ARM), sob

a ordem de prospectar as melhores companhias de infraestrutura do mundo,

dispostas a realizar as grandiosas obras no Iraque (MENDES & ATTUCH, 2008).

Segundo os autores, a Mendes Júnior ganhou a concorrência da primeira obra

(Ferrovia Bagdá-Al Qaim-Akashat), à frente de uma empresa indiana e outra

iugoslava, pois apresentava melhor capacitação técnica. Em 2 de outubro de 1978, o

contrato foi fechado no valor de 1,2 bilhões de dólares.

Para Mendes e Attuch (2008), foi desenvolvida uma verdadeira logística de

guerra para dar encaminhamento às obras no deserto, pois envolvia funcionários de

diversas nacionalidades em um cenário de escassez de matéria-prima. A

mobilização inicial da obra contemplava a aquisição de 105 mil itens em seis meses,

fazendo-se uso de 80 navios para despachar 400 mil metros cúbicos de carga

(MENDES & ATTUCH, 2008). Foram elaborados softwares para gerenciamento de

projetos de última geração para atender o empreendimento. O grupo ainda teve que

estabelecer tradings ao redor do mundo para viabilizar os suprimentos para os

acampamentos, como a Miami Trading, que agilizou a compra de estruturas pré-

fabricadas no valor de 50 milhões de dólares, responsáveis pela montagem das

casas. Além disso, ainda havia dois hospitais, dois colégios, três clubes,

restaurantes e hotéis.

Eram feitas 50 mil refeições por dia, com 750 funcionários responsáveis pela

produção, e cardápios essencialmente brasileiro, árabe, turco, chinês e filipino. Além

dos clubes, o lazer era garantido via TV a cabo, com produção da TV Tigre (apelido

de Murillo Mendes) própria da empresa, que exibia novelas, futebol, e programas

gravados no Brasil (MENDES & ATTUCH, 2008).

5 Relatório do Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), datado de 23 de junho de 1992

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Para os autores, o choque cultural demandou uma atenção especial da empresa.

Diferenças religiosas, climáticas, distância de casa e de familiares, acabaram

levando muitos funcionários a quadros de depressão, e logo a companhia passou a

oferecer acompanhamento psicológico. Também, para reduzir a alienação, a

emissora local transmitia regularmente o noticiário do Brasil. As obras chegaram a

apresentar até 43 nacionalidades diferentes de trabalhadores, e naturalmente os

funcionários expatriados encontraram um meio termo saudável de convivência,

refletido no dialeto próprio criado no canteiro de obras: o “mendês” (MENDES &

ATTUCH, 20048).

Os investimentos dos cinco primeiros anos chegaram a 230 milhões de dólares

com equipamentos, e 120 milhões de dólares com alimentação (MENDES &

ATTUCH, 2008). Para eles, foi o bom relacionamento e a dedicação demonstrada

pela construtora, ratificados pela qualidade no serviço desempenhado, que resultou

em um novo contrato: o trecho 10, com 120 km de extensão, da rodovia

Expressway, no valor de 333 milhões de dólares. Para o Governo brasileiro, as

obras concretizavam-se como um excelente gerador de divisas, na forma de

exportação de equipamentos de alta tecnologia, em valor superior a 100 milhões de

dólares, e exportação de gêneros brasileiros, em valor superior a 80 milhões de

dólares, para suprir os mais de 22 mil empregados brasileiros, acarretando na

introdução de produtos nacionais no mercado do Oriente Médio6.

No entanto, o advento do conflito Irã-Iraque acarretou em atrasos nos

pagamentos das obras (MENDES & ATTUCH, 2008). Para Coggiola (2008), a

ascensão do Aiatolá Khomeini ao poder, após a Revolução Iraniana de 1979,

amedrontou países árabes de liderança sunita, atentos a uma possível “revolução

islâmica” incitada pelo líder xiita. Da mesma forma, o Ocidente perdeu um grande

aliado, na forma do governo do Xá Reza Pahlevi. Assim, apoiado pelos EUA e por

importantes Nações do Oriente Médio como Arábia Saudita e Jordânia, tanto quanto

por potências como Grã-Bretanha, França e União Soviética, o Iraque invadiu o Irã

em setembro de 1980, sob pretexto de disputas territoriais históricas e no intuito de

restaurar autonomia de uma minoria sunita reprimida (COGGIOLA, 2008; DENAUD,

2003).

6 Parecer COJUR/CONSU nº 5.293, datado de 17 de junho de 1992

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O conflito estendeu-se até o armistício exigido pelo Conselho de Segurança da

ONU, em 1988, após cerca de um milhão e meio de vítimas, e incontáveis danos

econômicos aos dois países (COGGIOLA, 2008). Nesse ínterim, além dos atrasos

dos pagamentos às obras executadas pela Mendes Júnior, já que o Iraque estava

num processo de endividamento e priorização dos gastos com o conflito, a

construtora teve que arcar com demasiados sobrecustos7. Mendes e Attuch (2008)

destacam o impacto logístico após o bloqueio do único porto do Iraque, em Basra,

deixando como opção o Porto de Ácaba, na Jordânia, distante mais de dois mil

quilômetros. Os autores ainda citam a perda de concessões logísticas especiais

determinadas pelo governo iraquiano, que priorizavam o desembarque de cargas da

empresa, aumento do preço de fornecedores devido ao risco Iraque, e perda de

funcionários convocados ou fugitivos do front de guerra.

Aqui fica novamente evidente a participação do Governo brasileiro em todo o

processo, já que a Mendes Júnior solicitou apoio do mesmo para receber as

compensações pelos sobrecustos supracitados8. Considerando-se os investimentos

de mais de 400 milhões de dólares na ferrovia9, foi estabelecido um comitê ad hoc

composto por membros de ambos governos que buscou entendimento entre as

Partes, durante reuniões de 1983 a 198410. O resultado foi um acordo firmado em

maio de 1984, que previa parte das compensações em pagamentos pelos

excedentes nas obras da ferrovia Bagdá-Al Qaim-Akashat, e parte na adjudicação

de outras três novas obras à construtora, garantindo não só o ressarcimento da

empresa, como a continuidade de seus trabalhos no país11. A saber, as obras

referidas eram: um projeto de drenagem, apelidado de Projeto Sifão; o projeto da

ferrovia Bagdá-Kut-Um Qasr; e uma nova seção da rodovia Expressway12. O Projeto

Sifão constituía num projeto de drenagem no valor de 346 milhões de dólares13,

dedicado a desviar o curso do rio Eufrates que, originário do Cáucaso, sofria de alta

salinização, tornando infértil a região da Mesopotâmia que fazia seu uso para

7 Relatório do Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), datado de 23 de junho de 1992 8 Relatório do Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), datado de 23 de junho de 1992 9 Expediente PRES 1077/88, enviado por Armando Guedes Coelho ao então Ministro de Minas e

Energia, Antônio Aureliano Chaves de Mendonça, em 15 de agosto de 1988 10 Relatório do Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), datado de 23 de junho de 1992 11 Acordo de 15 de maio de 1984, celebrado entre as autoridades iraquianas e o Grupo Mendes

Júnior 12 Acordo de 15 de maio de 1984, celebrado entre as autoridades iraquianas e o Grupo Mendes

Júnior 13 Correspondência GTNR-DOC/DOP-1 XPRO-LOO-A10, enviada, em 23 de abril de 1990, pelo

MRE a Zélia Maria Cardoso de Mello, então Ministra da Fazenda, Economia e Planejamento

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irrigação (MENDES & ATTUCH, 2008). Segundo os autores o objetivo do projeto era

tornar novamente agricultável a região.

No entanto, o que ocorreu foi a adjudicação apenas da primeira obra, o Sifão14.

Dessa forma, considerando-se gastos de natureza variada, e indenização pelo

descumprimento do Acordo de 1984, o Grupo Mendes Júnior já reclamava um valor

de 416,9 milhões de dólares, além do restante do valor devido referente à guerra15,

ratificado pelo então Secretário-Geral das Relações Exteriores, Paulo Tarso Flecha

e Lima, em carta enviada a Jesus Murillo Valle Mendes, em maio de 1987.

Na visão de Mendes e Attuch (2008), o governo brasileiro ainda enxergava-se

refém do petróleo iraquiano, e não tinha outra opção que não continuar financiando

o governo do Iraque para manter essa relação considerada benéfica. Assim, foram

concedidos créditos ao Governo do Iraque, por meio das linhas FINEX, para

financiar o Projeto Sifão com 222,8 milhões de dólares em julho de 1984, e a Seção

10 da Rodovia Expressway n. 1 com 126 milhões de dólares em fevereiro de 1985

(Grupo de Trabalho Interministerial, 1992). Nesse momento, preocupado com o

desenvolvimento de um quadro de crises, o Governo Brasileiro, via Ministério das

Relações Exteriores (MRE), e com apoio da Petrobrás e do Banco do Brasil, cria um

grupo para intensificar as negociações no Iraque16.

De acordo com Mendes e Attuch (2008), apesar dos esforços constantes tanto da

construtora, quanto do Governo Brasileiro, a inadimplência por parte do Iraque

continuava. Visando assegurar a liquidez necessária à empresa para dar

continuidade às obras, o grupo propôs a operação de Sale and Lease Back ao

Banco do Brasil. (MENDES & ATTUCH, 2008). Celebrado em junho de 1986 entre a

Mendes Junior Internartional (MJICo) e o BB Leasing Company (BBLCo), a

operação consistia na venda dos equipamentos de propriedade da Mendes Júnior

ao Banco do Brasil, e arrendamento simultâneo à construtora17. Na prática, não

passava do refinanciamento das dívidas do grupo.

No contrato constava o valor de venda de 228,9 milhões de dólares, que seriam

destinados às quitações da Mendes Júnior perante o Banco do Brasil ao longo de

seis anos (72 parcelas mensais). A operação ainda seria segurada pelo Instituto de

14 Expediente PRES 1077/88, 15 de agosto de 1988 15 Expediente PRES 1077/88, 15 de agosto de 1988 16 Relatório do Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), datado de 23 de junho de 1992 17 Contrato de Sale and Lease Back, firmado em 6 de junho 1986

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Resseguros do Brasil, e garantia indenização integral ao Banco caso a construtora

faltasse com os compromissos em três pagamentos consecutivos.

Figura 7: Síntese do contrato de Sale and Lease Back

Fonte: Gomes Júnior (2011, p. 16)

Frente a recorrentes atrasos do Governo Iraquiano, a Mendes Júnior veio a

solicitar revisão do perfil da dívida com o Banco do Brasil, por conseguir honrar

apenas oito das setenta e duas prestações devidas, decorrido um ano de contrato18.

Em 7 de dezembro de 1987, é firmado o “Protocolo sobre Comércio e Cooperação

Econômica entre a República Federativa do Brasil e a República do Iraque”, que

previa compra adicional de até 50 mil barris de petróleo por dia, em troca da

reativação das exportações brasileiras para o Iraque.

Porém em dezembro de 1987, a construtora optou por paralisar as obras do Sifão

e da Expressway (a Ferrovia Bagdá-Al Qaim-Akashat já havia sido concluída), e

iniciar o processo de arbitragem junto à Câmara de Comércio Internacional (CCI),

contra o Iraque19. No entanto, Saddam Hussein não planejava facilitar a

desmobilização da construtora, não autorizando a paralização das obras, nem

concedendo vistos de saída para os funcionários (MENDES E ATTUCH, 2008).

18 Relatório do Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), datado de 23 de junho de 1992 19 Início da arbitragem no ICC, datado de 3 de novembro de 1987

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Em junho de 1988, visando implementar corretamente o Protocolo de Comércio,

e resolver as novas pendências, foi enviada ao Iraque uma missão governamental

liderada pelo Embaixador Paulo Tarso Flecha de Lima, e composta por funcionários

de alto escalão do Banco do Brasil, da Petrobrás, da Interbrás, do Itamaraty, e do

Ministério da Fazenda20. O resultado foi enviado via Expediente Secreto para o

Presidente da República José Sarney, assinado pelo Ministro da Fazenda Mailson

Ferreira da Nóbrega, e pelo Ministro das Relações Exteriores Roberto de Abreu

Sodré21. O Expediente garantia a firmação de um novo Memorando de

Entendimentos, envolvendo perspectivas concretas de solução dos

equacionamentos, e da viabilização do Protocolo Comercial, além de constar o

reconhecimento dos sobrecustos atribuídos à Mendes Júnior durante a Guerra Irã-

Iraque22.

O Expediente é vital para a compreensão da relação entre o Governo Brasileiro e

o Grupo Mendes Júnior, ao assinalar a importância da empresa para o comércio

bilateral com o Iraque, garantindo grandes quantidades de petróleo a baixo custo

para o Brasil, e assegurando exportações de produtos nacionais, atingindo

transações no valor global de 1,3 bilhões de dólares23. Ao mesmo passo que

salienta que a participação da construtora nos grandes projetos iraquianos se deu

graças ao esforço governamental brasileiro, que não poupou recursos políticos e

financeiros para oferecer apoio à companhia ao longo dos anos24.

Solicitado pelo Ministro de Minas e Energia Antonio Aureliano Chaves de

Mendonça, já que seu corpo técnico era extremamente familiarizado com as

operações da Mendes Júnior no Iraque, tanto quanto com detalhes da relação

bilateral entre os dois países, a Petrobrás emitiu, em agosto de 1988, um parecer

sugerindo medidas a serem adotadas pelo Governo Federal no caminho de

resolução dos impasses envolvendo o Governo do Iraque e a Mendes Júnior25.

Constava no Expediente PRES 1077/88 as seguintes proposições:

a) Absorção, pelo Governo Brasileiro, da indenização devida à Mendes Júnior no contexto de suas operações no Iraque, sub-rogando-se nos direitos e obrigações da empresa sob os

20 Relatório do Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), datado de 23 de junho de 1992 21 Relatório do Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), datado de 23 de junho de 1992 22 Parecer COJUR/CONSU nº 5.293, datado de 17 de junho de 1992 23 Relatório do Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), datado de 23 de junho de 1992 24 Relatório do Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), datado de 23 de junho de 1992 25 Expediente PRES 1077/88, 15 de agosto de 1988

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respectivos contratos celebrados naquele país, por meio de mecanismos desenvolvidos pelo próprio Governo Brasileiro. Os valores reclamados deveriam ser auditados por consultores internacionais independentes;

b) Adoção de medidas de recomposição dos compromissos a descoberto da construtora, por parte do Ministério da Fazenda e do Banco do Brasil, restaurando a liquidez adequada à empresa;

c) Desenvolvimento de estratégia para prosseguir com os entendimentos sobre a indenização devida à Mendes Júnior, que se daria exclusiva e diretamente entre os dois Governos; Implementação do Protocolo Comercial de 1987, evitando o rompimento dos vínculos com o Iraque devido aos itens supracitados, e consequente perda de mercado.

O assunto foi conduzido diretamente ao Ministério das Relações Exteriores, em

agosto de 1988, após o Presidente da República manifestar seu “de acordo”26. Por

sua vez, o Secretário-Geral das Relações Exteriores, Embaixador Paulo Tarso

Flecha de Lima, encaminhou o material ao Ministério da Fazenda para que as

medidas cabíveis dentro de sua área de competência fossem tomadas, resultando

no “Esquema para o Equacionamento das Pendências que formam o contencioso da

construtora Mendes Júnior S.A. no relacionamento comercial com o Iraque”27. O

Esquema resultou no contrato de Cessão de Créditos, firmado em julho de 1989, no

qual o Banco do Brasil assumiria os créditos da Mendes Júnior frente ao Iraque, já

que a construtora era devedora do banco28. As consultorias internacionais Arthur

Andersen S/C e Thomas Akroyd Consultants concordaram no valor devido das

indenizações de aproximadamente 421,5 milhões de dólares.

Para que efetivamente ocorresse a retomada das obras, a Mendes Júnior

suspendeu o processo junto à CCI, e ambos governos concordaram em paralisar as

discussões relativas às pendências por um ano29. A liquidez da empresa foi

retomada graças a novas operações junto ao Banco do Brasil, como o Loan

Agreement, empréstimo de 45 milhões de dólares cedido em outubro de 198930.

Porém ainda faltava a prorrogação por parte do Governo Brasileiro do prazo de

utilização das linhas de crédito na modalidade FINEX ao Governo Iraquiano, que só

26 Despacho do Presidente da República, José Sarney, de 16 de agosto de 1988 27 Ofício SGMF nº 085, datado de 14 de abril de 1989 28 Contrato de Cessão de Créditos, datado de 28 de julho de 1989 29 Correspondência GTNR-DOC/DOP-1 XPRO-LOO-A10, enviada, em 23 de abril de 1990, pelo

MRE a Zélia Maria Cardoso de Mello, então Ministra da Fazenda, Economia e Planejamento 30 Nota da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, datada de 2 de junho de 1992

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aconteceu seis dias antes da deflagração da Guerra do Golfo, inviabilizando

completamente a retomada das obras31.

Saddam Hussein, sob bandeira de proteger os países produtores de petróleo da

política pró-ocidente adotada pelo Kuwait, decidiu invadir o país vizinho em agosto

de 1990 (ABURISH, 2000). Imediatamente o Conselho de Segurança da ONU

decretou, em resposta, o completo embargo econômico-financeiro ao país, vetando

a promoção ou venda de bens e serviços ao Iraque, tanto quanto impossibilitando o

resgate dos recursos não-desembolsados das linhas de crédito cedidas a ele32. A

Resolução 661 da ONU foi prontamente acatada pelo Governo Brasileiro, através do

Decreto 99.441 de agosto de 199033, constituindo o “Fato do Príncipe”, no qual um

governo torna-se responsável pelo desequilíbrio econômico de um contrato, tendo o

dever de indenizar (DINIZ, 2005). Nesse sentido, a Mendes Júnior foi determinada a

retirar todos os funcionários em território iraquiano, reforçado por duas cartas da

Embaixada do Brasil em Bagdá em agosto de 199034, e outra pelo Ministro das

Relações Exteriores Francisco Rezek em setembro de 199035, enviadas ao

Presidente do Grupo, tendo a empresa rapidamente traçado um plano de ataque

para concluir a operação36.

Eram 277 funcionários da Mendes Júnior no Iraque em agosto de 1990, e com

ajuda da missão de libertar os brasileiros, chefiada pelo Embaixador Paulo Tarso

Flecha de Lima, em outubro já não havia quase nenhum remanescente (MENDES &

ATTUCH, 2008). Funcionários de outras empresas brasileiras no Iraque foram

auxiliados no processo, e os últimos onze funcionários da Mendes Júnior

permaneceram sob exigências do Governo Iraquiano, incumbidos da função de

transferir as obras do Sifão e da Expressway para uma construtora iraquiana que

daria sequência aos projetos. Os autores datam janeiro de 1991 a saída do último

funcionário da Mendes Júnior, pela fronteira com a Turquia, dois dias antes dos

bombardeios a Bagdá. Foram deixados para trás 230 milhões de dólares em

equipamentos (MENDES & ATTUCH, 2008). Segundo Mendes e Attuch (2008), o

Brasil exportou 4,2 bilhões de dólares ao Iraque no período de dez anos, e importou

31 Nota da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, datada de 2 de junho de 1992 32 Resolução da ONU nº 661, de 6 de agosto de 1990 33 Resolução da ONU nº 661, de 6 de agosto de 1990 34 Parecer COJUR/CONIN-CJA-90/262, datado de 12 de setembro de 1990, Consultoria Jurídica

Adjunta Internacional 35 Correspondência C/SGP/DEOP/CASQ-L00-A10, datada de 11 de setembro de 1990. 36 Relatório do Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), datado de 23 de junho de 1992

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22 bilhões, que seriam valores muito superiores caso não fossem as condições

favoráveis do comércio com o Iraque. Retirando-se enfim do cenário iraquiano, a

próxima fase do Grupo Mendes Júnior dar-se-ia nos tribunais, ao perseguir seus

direitos junto ao Banco do Brasil, numa longa disputa judicial.

5.3.1.3. Disputa Judicial Entre Mendes Júnior E Banco Do Brasil

Após a discussão entre vários representantes de ministérios e autarquias

relacionados com o caso, tanto quanto advogados, consultores, técnicos, ministros e

até do advogado-geral da União, foram produzidos relatórios, pareceres técnicos, e

documentos que concluíam que “tendo assumido os créditos da construtora no

Iraque para permitir a retomada dos trabalhos da empresa e a continuidade das

importações de petróleo, o Governo Federal, na prática, era devedor da Mendes

Júnior” (MENDES & ATTUCH, 2008, p. 235). Para os autores, seria suficiente

levantar os débitos de lado a lado e promover o acerto de contas, que era estimado

favorável ao Grupo Mendes Júnior em mais de 200 milhões de dólares.

Assim foi criado o Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), com objetivo de

identificar as pendências relacionadas a três contratos distintos de financiamento

entre a Mendes Júnior e o Banco do Brasil, contando com a participação dos

seguintes órgãos: Departamento de Assuntos Internacionais (DEAIN), Procuradoria-

Geral da Fazenda Nacional (PGFN), Departamento do Tesouro Nacional (DTN) e

Departamento de Comercio Exterior (DECEX), do Ministério da Economia, Fazenda

e Planejamento (MEFP); Departamento Econômico (DEC), Departamento de

Promoção Comercial (DPR) e Departamento do Oriente Próximo (DEOP), do

Ministério das Relações Exteriores (MRE); Banco do Brasil S.A. (BB); Instituto de

Resseguros do Brasil (IRB); e Banco Central do Brasil – Diretoria de Assuntos

Externos (BACEN/DIREX)37.

Apesar dos pareceres elaborados pelo e imediatamente após o GTI apontarem

coerência das reclamações da Mendes Júnior, o Banco do Brasil aciona o Grupo

judicialmente em agosto de 199538. O Grupo, então, interpõe ação contra o Banco

em Nova York, solicitando indenização, que ainda não foi concluída.

37 Relatório do Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), datado de 23 de junho de 1992 38 Céd. Créd. Comercial nº 89-000393-4, EXECUÇÃO PROCESSO Nº 02495.065007-7, datada

de 9 agosto de 1995

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Mendes e Attuch (2008) propõe uma cronologia do contencioso entre a Mendes

Júnior e o Banco do Brasil, desde o Decreto 99.441 do Governo Brasileiro em

agosto de 1990, até o parecer do jurista Ives Gandra Martins em março de 2004,

descrito no Anexo B.

Em agosto de 2004, o Perito Oficial do Juízo apresentou laudo com saldo de

839,7 milhões de dólares, favoráveis à Mendes Júnior39. Ambos os lados formularam

laudos próprios, com valores divergentes, favorecendo suas respectivas partes. Por

exemplo, a Mendes Júnior apresentou valor de mais de 2 bilhões de dólares40.

Em agosto de 2008, o juiz da 5ª Vara Cível da Comarca de Belo Horizonte

reconheceu o saldo calculado pelo Perito Oficial, mas o Banco do Brasil apelou e a

sentença foi anulada pelo TJ/MG, sob o pretexto de que os pontos abordados ainda

eram insuficientes para proferir a sentença41.

As ações prosseguem em Nova York, pendendo recursos da Mendes Júnior

contra a anulação da sentença (entrevista realizada com o Dr. Wilson Vilani,

advogado da Mendes Júnior). O valor estimado da causa já atinge 4 bilhões de

dólares (MENDES & ATTUCH, 2008).

5.3.2. Falhas Administrativas

Além das disputas judiciais com o Governo Brasileiro, o Grupo Mendes Júnior

passava também por momentos de decisões gerenciais internas, fomentadas pela

cultura organizacional estabelecida ao longo da história da empresa, notadas e

consideradas não saudáveis por seu corpo técnico:

O que quebrou a Mendes foi a má administração que foi minando, minando até chegar num ponto (TAL, 2015, s/p).

Para Mendes e Attuch (2008), a diversificação planejada pelo Grupo Mendes

Júnior serviu ao propósito de mitigação de riscos aos quais estavam sujeitos

dependendo de um único setor, de construção pesada, cujo principal cliente era o

governo. Os autores citam algumas variações de nicho de atuação da empresa: em

1982 a Mendes Júnior adentrou o setor de mineração, com projetos de exploração

de bauxita no Pará; em 1983 foi criada a Mendes Júnior Edificações, no ramo de

39 LAUDO PERICIAL - PERITO OFICIAL, datado de 27 de agosto de 2004 40 LAUDO PERICIAL – ASSISTENTE DA MJ, datado de 21 de setembro de 2004 41 Céd. Créd. Comercial nº 89-000393-4, SENTENÇA NOS EMBARGOS À EXECUÇÃO Nº

0024.95.107.355-0 E 0024.95.107.357-6 DA 5ª VARA CIVEL, datada de 8 de agosto de 2008

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construção civil; em 1984 a Mendes Júnior Industrial, criada a partir da incorporação

da Morrison Knudsen; e em 1985 foi inaugurada a Siderúrgica Mendes Júnior,

principal representante do impacto negativo da diversificação desenfreada.

Segundo os autores, foram investidos 652 milhões na construção da siderúrgica,

que foi concebida no contexto do II PND. Sendo assim, as metas ambiciosas

impulsionadas pela forte política de substituição de importações, forçou o Grupo a

tomar empréstimos em bancos privados, desencadeando um processo de

desequilíbrio financeiro:

Outra coisa que eles fizeram errado. Outro motivo que ajudou a quebrar mais rápido ainda, fizeram a Siderúrgica Mendes Júnior. Lá em Juiz de Fora. Quem financiou a Siderúrgica Mendes Júnior foi a obra do Iraque. Gastaram uma fábula (TAL, 2015, s/p).

Em 1987, o Grupo Mendes Júnior foi considerado pelo anuário “Melhores e

Maiores” da revista Exame como o segundo maior conglomerado do Brasil,

empregando 40 mil funcionários, e gerando 1,2 bilhões de dólares (MENDES &

ATTUCH, 2008). Porém, o porte que o Grupo assumiu acarretou em consequências

como dissidência interna entre setores:

É um dos motivos que ela foi para o buraco. Foi exatamente isso. Porque o que aconteceu: existia uma rivalidade entre obra civil, barragem.... Ela tinha três segmentos, obra civil, barragem, estrada, que incluía ferrovia e era minha parte, e depois ela começou a levantar prédio, etc. Quando um ganhava ou perdia uma obra grande, tinha festa. Alguém perdeu a barragem, os outros faziam festa porque essa pessoa perdeu. Dentro da própria empresa começou a haver essa dissidência, porque ela ficou muito grande. Quando em uma empresa, alguém lá de dentro começa a falar “ah, isso aqui não é meu não. Isso aqui é o pessoal da drenagem que fez”. Espera aí, não é o pessoal da drenagem, você trabalha na empresa, então não é “aquele pessoal”. Você faz parte daquilo, você é integrante daquilo (TAL, 2015, s/p).

Após reestruturação gerencial devido à crise da empresa nos anos 1990,

sobraram apenas quatro das doze empresas que integravam o Grupo, e todos

trabalham em volta de objetivos em comum.

Outro problema estava na verticalização gerencial da empresa, intensificada por

um forte sistema de apadrinhamento de certos funcionários notáveis. “Havia a

percepção entre seus colaboradores de que o processo de decisão era centralizado

no topo da pirâmide organizacional e de que a gestão ainda era pouco participativa”

(MENDES & ATTUCH, 2008, p. 185). Os agentes de campo da empresa tinham a

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impressão de que eram delegadas funções primordiais a equipes não capacitadas,

por questões políticas internas, e não podiam participar do processo:

Então, houve a má administração. Era muita gente, e ia só mandando gente que tinha apadrinhamento. Então tinha muita gente ganhando muito dinheiro e que não tinha nem competência para estar onde estava. Então tinha um staff muito grande de quem trabalhava aqui no Brasil, e quem estava no Iraque. Tinha gente que ia de 3 em 3 meses para o Iraque. Era muita politicagem, gastando muito dinheiro. A administração não administrou tão bem para escolher. Então você tinha gente que capacitada lá no campo. Eu era um deles. E tinha outros que não sabiam nada. Então essa administração acaba com qualquer empresa. Uma obra naquela monta, não pode ter uma administração dessa (TAL, 2015, s/p).

Isso resultou em cortes administrativos, no intuito de manter uma estrutura mais

integrada, comandada apenas por três divisões principais, ao contrário das diversas

diretorias que existiam nos estágios iniciais da companhia (MENDES & ATTUCH,

2008). Os autores asseguram que hoje a empresa trabalha sem excesso de

hierarquia.

Os problemas financeiros dos projetos nacionais do diversificado Grupo Mendes

Júnior foram, durante a década de 1980, frequentemente amortizados pelo

excelente desempenho da construtora, especialmente devido aos vultosos contratos

no exterior (MENDES & ATTUCH, 2008). O pecado capital foi prolongar esse

panorama, ao crer que as oportunidades internacionais não cessariam:

Então por quê que ela acabou? Foi na época da maior crise que houve aqui no Brasil, da engenharia. 80, 81, 82, 83, o Brasil estava um caos. Mas estava um caos mesmo, não tinha serviço, não tinha obra. O Brasil estava passando por uma crise louca, de não ter nada. Então a Mendes, pegava o dinheiro do faturamento da obra do Iraque e usava para pagar a administração de todas as obras no Brasil. Vê o erro administrativo que houve dentro de uma empresa daquele tamanho? Ela construiu uma sede em Belo Horizonte, em um bairro nobre, que era um quarteirão inteiro, dois ou três. Um negócio que nenhuma empresa precisaria fazer, com salões de festa, com tudo, para fechar grandes negócios políticos. E tudo aquilo financiado, eles achavam que nunca ia acabar, o negócio ia só melhorar. “Isso aqui não vai interromper, vai prosseguir eternamente”. O pessoal aqui continuou com salário alto. Tiravam o dinheiro da Mendes Júnior Internacional e jogava para a Nacional, com o País do jeito que estava. Achavam que a mina de ouro nunca ia esgotar (TAL, 2015, s/p).

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A obras restantes no exterior foram resguardadas na reestruturação pós-crise,

pois essa almejou a distinção clara entre a área nacional e internacional “de acordo

com a política da Mendes de buscar sempre negócios sustentáveis, que não

dependessem de outras áreas do grupo” (MENDES & ATTUCH, 2008, p. 327).

5.4. PRESENTE E FUTURO

A presença internacional do Grupo Mendes Junior não foi completamente

retirada por três razões estratégicas: manter a estabilidade organizacional interna da

empresa num cenário de reestruturação, comprovando sua capacidade de continuar

lidando com negócios importantes e se reerguer; reter corpo técnico capacitado

devido à atratividade dos contratos no exterior; e preservar a imagem do Grupo na

mídia, contrabalanceando notícias adversas do Brasil (MENDES & ATTUCH, 2008).

A decisão tática de manter obras no Chile e China renderam bons frutos. Em

2004 a Mendes Júnior foi selecionada para conduzir as obras de expansão do metrô

de Santiago, num contrato de 70 milhões de dólares, além de construir a represa no

Valle del Elqui para o Ministério de Obras Públicas do Chile, e o terminal de

passageiros do Aeropuerto Carrier Sur, de Concepción (MENDES & ATTUCH,

2008). Segundo os autores, a companhia continua com presença na China,

vendendo tecnologia num cenário adverso, em que os concorrentes desistiram de

competir, sendo também responsável pela construção de barragem para a South

China Electric Power Joint Venture.

Já em outros países, a empresa construiu a represa para rejeitos de mineração,

para a Cia. Minera Antamina, no Peru, e participou da elaboração do gasoduto

Brasil-Bolívia (MENDES & ATTUCH, 2008).

No mercado nacional, logo após a crise, a empresa participou da execução de

contratos na ordem de 450 milhões de reais (Mendes e Attuch, 2008). Contudo, alvo

da operação investigativa “Lava Jato” por crimes de lavagem de dinheiro, corrupção

e associação criminosa, a Mendes Júnior Trading e Engenharia S/A foi declarada

inidônea em abril de 2016 pela Controladoria-Geral da União, sendo proibida de

celebrar novos contratos junto à Administração Pública por pelo menos dois anos

(CGU, 2016). Hoje a empresa encontra-se em processo de recuperação judicial

(PIMENTEL, 2016).

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6. ANÁLISE DO CASO

Frente à exposição do caso, é interessante revisitar as perguntas de pesquisa

para, finalmente, submeter as respostas encontradas às teorias abordadas, no

intuito de verificar sua aderência:

a) Quais são as motivações que fomentam o processo de internacionalização

desta empresa no final da década de 1960?

b) Quando foi tomada a decisão de se internacionalizar, e quando ocorreram os

movimentos das etapas subsequentes?

c) Como o processo de internacionalização se desencadeou? Como

transcorreram os movimentos subsequentes?

d) Quais foram os destinos considerados, e quais foram escolhidos?

e) Qual o papel de instituições exógenas no processo, sejam governamentais ou

não?

f) Quais motivos levaram a empresa a recuar do mercado internacional? E por

que a empresa resolveu retomar a expansão externa recentemente?

Basicamente, procura-se entender o porquê, quando, como, e onde o processo

ocorreu, além de quais fatores influenciaram os movimentos. Para tal, analisamos

cada etapa: movimento inicial, expansão, retração e retomada.

6.1. MOVIMENTO INICIAL

A movimentação internacional da indústria brasileira, em especial no setor de

construção civil, desencadeou-se durante a década de 1980, quando empresas

como Odebrecht, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão e Camargo Corrêa buscaram

novos mercados frente a redução de investimentos internos em infraestrutura, ainda

que esse fato não seja a única justificativa (RÊGO, 2015). Para o autor, a expansão

do mercado mundial também ajuda a explicar o caráter oportunístico dos primeiros

contratos no exterior das referidas empresas, o que corrobora com a visão de Ferraz

Filho (1981) sobre as possíveis motivações do setor.

No entanto, o caso da construtora foco do presente trabalho é pontual e distinto

dos demais, justamente por ter sido o movimento embrionário, ou seja, o primeiro

registro de internacionalização do setor. Ainda assim, é possível verificar a

aderência da sua circunstância às teorias destacadas, sendo elas o Paradigma

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Eclético de Dunning (DUNNING, 1980) e a Teoria Institucional (NORTH, 1990),

salientando a Diplomacia Triangular (STOPFORD & STRANGE, 1991).

A decisão de se internacionalizar veio naturalmente com o amadurecimento da

empresa, que nasceu com a missão de ser um player do mercado mundial. Mesmo

no auge do Milagre Econômico a empresa já prospectava contratos internacionais

como estratégia de diversificação de riscos, partindo do princípio de que todas as

economias vivem ciclos, e o desenvolvimento brasileiro já durava décadas,

começando a demonstrar sinais de retenção.

O primeiro contrato firmado pela Construtora Mendes Júnior no exterior foi em

1969, para a execução da Hidrelétrica de Santa Izabel, em Cochabamba, na Bolívia.

Do ponto de vista estratégico da empresa, o projeto era tido como interessante

devido às características inerentes do mercado boliviano. O mercado europeu se

mostrava saturado e fechado, apresentando certo favoritismo para as construtoras

europeias bem estabelecidas, enquanto a América Latina apontava menor

resistência a novos entrantes. Além disso, a Bolívia manifestava uma série de

dificuldades geográficas ao desenvolvimento de obras de infraestrutura, como

altitude elevada, clima extremo, e complexidade no acesso a recursos, o que

oferecia uma posição vantajosa para a Mendes Junior frente ao seu domínio sobre

obras em condições especiais (engenharia intermediária). Dessa forma, a

construtora poderia participar da licitação com preços muito mais atrativos que a

concorrência.

É possível associar o decorrer do primeiro movimento às variáveis do Paradigma

Eclético de Dunning (2001), quando fatores endógenos levaram a companhia a

vantagens competitivas que renderam a percepção e conquista de oportunidades.

Desses fatores, pode-se destacar: capital intelectual administrativo e técnico, tanto

quanto acervo tecnológico, configurando vantagens de propriedade; acesso ao

mercado e aos recursos naturais, ilustrando variáveis de localização; e know-how e

reputação, como exemplos de incentivo à internalização (DUNNING, 1977).

O contexto exógeno sob o qual se manifestou esse processo permite analisá-lo

perante a ótica do institucionalismo (NORTH, 1990). A obra na Bolívia foi viabilizada

por financiamento do Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento

(BIRD), instituição vinculada ao Banco Mundial que promove assistência financeira

para desenvolvimento de países de média e baixa renda. Considerando que o BIRD

restringe seu apoio a países em desenvolvimento, há a tendência de direcionamento

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das multinacionais a esses ambientes, evidenciando a influência institucional nas

vantagens de localização e internalização percebidas (DUNNING & LUNDAN, 2008).

Ainda conforme os autores, nota-se que as instituições formais e informais têm

potencial para coibir o movimento internacional, quando, para ingressar no mercado

boliviano, fez-se necessário enfrentar uma política rígida em razão de um governo

caudilhesco, um ambiente sindical hostil, e uma cultura pouco familiar (MENDES &

ATTUCH, 2008).

As incertezas observadas em um mercado internacional são alvo do governo

brasileiro, que, por meio de investidas diplomáticas, busca reduzir o risco

proporcionando maior segurança institucional para as empresas nacionais (RÊGO,

2015).

A segurança oferecida pela presença diplomática do Brasil na Bolívia como

mitigador dos riscos inerentes ao país, soma-se às ferramentas de promoção

comercial elaboradas na época, como a já citada criação do Conselho Nacional do

Comércio Exterior, redução de procedimentos burocráticos, participação de

comitivas governamentais em feiras internacionais de comércio, e elaboração do

seguro de crédito controlado pelo Instituto de Resseguros do Brasil (IRB). Aplicados

em um contexto de desenvolvimento econômico nacional que propicia o crescimento

e expansão das empresas, esses fatores indicam a participação do Governo

Brasileiro na criação de oportunidades e incentivo à internacionalização das

construtoras, atestando a influência institucional na relação Governo-Empresa no

movimento inicial da Mendes Junior (STOPFORD & STRANGE, 1991). Da mesma

forma, os acordos bilaterais que originam propostas solidificam a cooperação

Governo-Governo como agente institucional influenciador relevante.

Quadro 10: Resumo do movimento à Bolívia

Elaborado pelo autor

APRESENTAÇÃO DA OPORTUNIDADE VARIÁVEL MOTIVACIONAL ME CANISMO ASSOCIADO

Mercado pouco concorrido Capital intelectual administrativo Paradigma Eclético

Financiamento internacional (BIRD) Acervo tecnológico e reputaçãoParadigma Eclético / Teoria

Institucional

Dificuldade de acesso a recursos naturais

Clima e geografia extremos

Ambiente político rígido

Ambiente cultural desconhecido

Ambiente sindical estrito

Know-how (engenharia intermediária) Paradigma Eclético

Ação diplomática do governo como mitigador de riscos e fomentador de exportações

Diplomacia Triangular / Teoria Institucional

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6.2. EXPANSÃO INTERNACIONAL

Em 1975 a Mendes Júnior, em um segundo movimento rumo a territórios

internacionais, venceu concorrências bastante disputadas no norte do continente

africano, território dominado pelas construtoras francesas.

A primeira obra foi a construção da malha ferroviária local na Argélia. Novamente

as condições políticas apresentavam alto risco devido a um governo socialista

nacionalista (HOURANI, 1994). Cabe aqui salientar a experiência internacional da

Mendes Júnior adquirida na Bolívia como fator que garante nova vantagem de

propriedade, já que quanto maior a “multinacionalidade” da empresa, melhor é sua

posição para tirar proveito de características específicas dos países e tomar risco

referente ao perfil de cada um (DUNNING, 1977). As adversidades começaram a ser

contornadas já no modo de entrada, quando a construtora compôs uma nova

empresa associada ao governo local, que detinha 51% das ações, e uma outra

empresa brasileira, com outros 11%, sobrando 38% para a Mendes Júnior

(MENDES & ATTUCH, 2008). A companhia resultante, Societé d’Infrastructure

Ferroviaire, reduziu a concorrência e ampliou a barreira a novos entrantes, e em

última instância garantindo presença no mercado local (FERRARI, 1996).

Mais uma vez fica exposta a relação Governo-Empresa citada na Diplomacia

Triangular, nesse caso na criação de um grupo de trabalho responsável por viabilizar

os interesses dos stakeholders (STOPFORD & STRANGE, 1991). Essa relação

também é notável por propiciar uma nova vantagem de propriedade para a Mendes

Júnior, agora com prática em trabalhos em conjunto com governo estrangeiro, que

seria fundamental na conquista de contratos advindos da China. Quanto às

instituições informais, um exemplo citado por Mendes e Attuch (2008) resume a

importância da adaptação cultural: colaboradores locais seguidamente sabotaram

ações dos representantes da Mendes Junior, e só entraram em entendimento após

uma ríspida discussão entre as partes. O motivo era que os argelinos não confiavam

em quem os tratava bem demais, pois acreditavam que os brasileiros estavam atrás

de informações sigilosas. A falha na compreensão desse evento poderia ter

acarretado na interrupção da empreitada internacional da construtora.

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Quadro 11: Resumo do movimento à Argélia

Elaborado pelo autor

Simultaneamente em 1975, a construtora participava da licitação para a

execução da estrada Nouakchott-Kiffa, de 600 km, em território mauritano. Soluções

criativas para indisponibilidade de recursos básicos no deserto como água e brita,

levaram a empresa a oferecer preços até 70% mais baixo que concorrentes de oito

países, vencendo a licitação. Cada vez mais a bagagem técnica da construtora era

consolidada, fortalecendo suas vantagens competitivas. A construtora perseguiu o

mercado aquecido graças ao financiamento provido pelo Fundo Árabe de

Desenvolvimento Econômico Social. Mais uma vez há o direcionamento do

movimento devido a forças exógenas.

Por conta do caráter desenvolvimentista do programa, era requisito do contrato a

capacitação de mão-de-obra local, como parte da transferência de tecnologia. Foram

diplomados mais de 300 profissionais durante os quatro anos de projeto. De acordo

com o ministro dos Transportes da Mauritânia, a obra pretendia reforçar a unidade

territorial, criar condições para desenvolvimento econômico, e permitir apoio à

população em caso de alguma calamidade pública. Assim, Vieitas e Aboim (2013)

afirmam que, por serem de porte elevado em comparação com atores locais, as

empresas multinacionais se envolvem com demandas da população e do governo

para serviços tipicamente estatais, então o cuidado com a abordagem e com a

imagem passada são redobradas, pois acabam refletindo a atuação dos estados.

Dessa forma, a cultura de expatriação para territórios distantes, envolvia o

comprometimento e treinamento do quadro de funcionários da Mendes Junior, na

tentativa de suavizar os choques culturais, que representam as instituições e

mecanismos de reforço informais destacadas na Teoria Institucional.

APRESENTAÇÃO DA OPORTUNIDADE VARIÁVEL MOTIVACIONAL ME CANISMO ASSOCIADO

Mercado dominado Associação com o Governo localParadigma Eclético / Teoria

Institucional / Diplomacia Triangular

Dificuldade de acesso a recursos naturais

Clima e geografia extremos

Ambiente político rígido

Ambiente cultural desconhecido

Know-how (engenharia intermediária) Paradigma Eclético

Multinacionalidade (experiência internacional)

Paradigma Eclético / Teoria Institucional

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86

Quadro 12: Resumo do movimento à Mauritânia

Elaborado pelo autor

6.3. PONTO DE INFLEXÃO

O fato do processo de internacionalização da Mendes Júnior ser pioneiro no

setor ocasionou sua simultaneidade com a criação das principais ferramentas

públicas de incentivo à exportação. Por exemplo, como aponta Rêgo (2015), o

BNDES foi a instituição governamental mais influente no processo de

internacionalização das construtoras brasileiras, porém suas atividades de fomento à

exportação começam apenas em 1998, com sua primeira operação de

financiamento de exportação de serviços. Essa simultaneidade pode ter limitado a

interação entre a construtora e o Governo, já que os dois processos ainda passavam

por amadurecimento e o potencial da relação ainda não podia ser plenamente

explorado.

No caso do Iraque em 1978, esse modus operandi foi diferenciado. Desde o

início, as oportunidades foram criadas e oferecidas à Mendes Júnior pelo Governo

Brasileiro. Considerando a participação do Governo nas obras internacionais da

Mendes Júnior, Murillo afirmou que a incursão no Iraque foi um caso especial

(GOMES JÚNIOR, 2011).

A influência institucional ao longo da passagem da construtora pelo país ocupa

um papel protagonista, ao passo que a maioria dos eventos se desencadeou devido

a fatores exógenos. Mediante um cenário de seguidas crises econômicas por parte

do governo brasileiro, combinado com uma perspectiva desenvolvimentista forte por

parte do governo iraquiano, a Mendes Júnior funcionou como ferramenta diplomática

para garantir o interesse dos dois países (CAVUSGIL, KNIGHT & RIESENBERGER,

2012). Não obstante, a empresa teria acesso privilegiado aos recursos e ao

mercado, políticas de incentivo e financiamentos, além de contratos lucrativos de

longa duração (RAMAMURTI & SINGH, 2009).

APRESENTAÇÃO DA OPORTUNIDADE VARIÁVEL MOTIVACIONAL ME CANISMO ASSOCIADO

Mercado aquecido Capital intelectual administrativo Paradigma Eclético

Financiamento internacional (Fundo Árabe)Capacitação de mão-de-obra local e transferência de

tecnologiaTeoria Institucional /

Diplomacia Triangular

Dificuldade de acesso a recursos naturais

Clima e geografia extremos

Ambiente político rígido

Ambiente cultural desconhecido

Know-how (engenharia intermediária) Paradigma Eclético

Representação do Governo local, construção de confiança

Diplomacia Triangular / Teoria Institucional

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87

Ao analisarmos a interação entre os atores envolvidos sob a ótica da Diplomacia

Triangular, podemos destacar três estágios:

1) Relação Governo-Governo: enquanto o Brasil buscava um destino ideal

para suas exportações, ao passo que almejava garantir suprimento de

petróleo durante os choques, o Iraque buscava um parceiro competente e

confiável para a execução de obras de infraestrutura interna que

garantiriam seu desenvolvimento econômico. O esforço diplomático de

aproximação (CERVO & BUENO, 2008) foi facilitado pela repulsa árabe a

economias desenvolvidas, expondo abertura do mercado ao Brasil. A

relação foi consolidada ao longo do tempo com a assinatura de acordos e

concessão de financiamento por parte do Governo brasileiro ao iraquiano

para execução das obras (STOPFORD & STRANGE, 1991);

2) Relação Empresa-Empresa: o cenário de aproximação e adjudicação de

contratos foi galgado por conta do bom relacionamento da Petrobrás com

a SOMO. Após a nacionalização do petróleo iraquiano, a Petrobrás ficou

limitada a prospecção de campos petrolíferos, pois a exploração seria por

conta do Iraque. A transferência de tecnologia da Petrobrás para a estatal

iraquiana viabilizou remessas de petróleo ao Brasil a baixo custo e, mais

tarde, contratos para execução de serviços de infraestrutura e exportação

de bens de consumo, em recompensa à fidelidade brasileira em tempos

de crise internacional (CERVO & BUENO, 2008);

3) Relação Governo-Empresa: foi formado um grupo de trabalho entre o

Governo brasileiro e a Mendes Júnior para potencializar os resultados

buscados em território iraquiano (STOPFORD & STRANGE, 1991).

Enquanto a construtora oferecia seu know-how na prestação de serviços

na área de construção pesada, além de disponibilidade para a execução

de operações complexas, o Governo promoveu sua internacionalização

por meio de financiamento direto e indireto, assistência técnica e acesso a

informações de mercado, e seguros contra os riscos não-comerciais do

país hospedeiro.

Ainda pode-se destacar a relevância da Teoria Institucional, por meio de

instituições informais, nas quais a Mendes Junior se apoiava para compensar riscos

encontrados naquele cenário:

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A segurança é contextual. Era inseguro, mas segundo minha

percepção, mais do que um contrato formal, o que impera são os

interesses. Enquanto eles precisassem de mim, eu estava seguro

(MENDES apud GOMES JÚNIOR, 2011, pg. 1).

Sob a ótica do Paradigma Eclético de Dunning, pode-se dizer que a empresa

dispunha de uma série de vantagens de propriedade que lhe garantiram os

contratos, como know-how, acervo técnico e acesso exclusivo a financiamento, tanto

quanto vantagens de internalização, explorando intervenção governamental de

ambos os lados.

O fim da passagem da Mendes Júnior pelo Iraque também se deu graças a

interferências diretas de instituições internacionais. Com a Guerra do Golfo, o

Conselho de Segurança da ONU, via resolução 661, embargou financeiramente o

Iraque, decisão acatada pelo Governo Brasileiro logo em seguida, via decreto

99.441. Fica claro que instituições formais e informais podem nutrir, como também

podem suprimir uma demanda de internacionalização (STOPFORD E STRANGE,

1991).

Quadro 13: Resumo do movimento ao Iraque

Elaborado pelo autor

6.4. PRESENÇA INTERNACIONAL ESTRATÉGICA

O resultado da empreitada no Iraque foi um dos maiores contenciosos da história

do Brasil, entre o Grupo Mendes Júnior e o Banco do Brasil. Após servir de

ferramenta diplomática e enfrentar sérios riscos, a construtora se via desamparada

frente à justiça ineficiente brasileira, e foi obrigada a passar por uma reestruturação

interna que, inclusive, teria consequências em parte do seu arcabouço de vantagens

competitivas.

APRESENTAÇÃO DA OPORTUNIDADE VARIÁVEL MOTIVACIONAL ME CANISMO ASSOCIADO

Mercado extremamente lucrativo e concorrido Associação com Governo de origemDiplomacia Triangular / Teoria

Institucional

Financiamento governamental (BB) Acervo tecnológico e reputaçãoParadigma Eclético / Teoria

Institucional

Dificuldade de acesso a recursos naturais

Clima e geografia extremos

Risco político

Ambiente cultural desconhecido

Know-how (engenharia intermediária) Paradigma Eclético

Subrogação ao Governo como instrumento mitigador, convicção na ação de instituições formais de seguro,

e instituições informais

Diplomacia Triangular / Teoria Institucional

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89

Justamente como parte de decisão estratégica, o corpo diretivo da Mendes

Júnior optou por manter sua presença internacional, mas essa deveria ser

concentrada em ambientes estáveis, como apoio à instabilidade interna que vinha

sofrendo. O país escolhido foi o Chile, pois a construtora já havia conhecimento local

via empreitadas anteriores, o ambiente político era estável após uma suave

transição para a democracia, a economia era igualmente estável e promissora, e

apresentava baixíssimos níveis de corrupção. Para Dumludag, Saridogan e Kurt

(2007), essas são variáveis institucionais importantes a serem consideradas, e a

falta delas causa altos custos de estabelecimento.

A Mendes Júnior se estabeleceu no Chile a partir de 1989 motivada pela

rentabilidade, e conquistada por meio de suas vantagens de propriedade relativas a

know-how de obras em condições extremas. Mais tarde, a motivação passaria a ser

quase que exclusivamente institucional: com anos de serviços prestados,

envolvendo-se com a cultura chilena, e capacitando mão-de-obra local, a construtora

conquistou a confiança dos parceiros locais, e agora desejava manter uma imagem

positiva da empresa para suportar os problemas internos no Brasil.

A percepção estratégica de ambiente institucional permitiu a empresa a

sobreviver sua pior crise até então. Hoje o braço internacional da construtora é que

mantém todas as vantagens competitivas e influências institucionais conquistadas

ao longo de sua história. Com obras recentes no Chile, China, Peru e Bolívia, o

comportamento internacional após o período de retração é de busca a estabilidade

para que se possa promover reestruturação no mercado interno.

Quadro 14: Resumo do movimento ao Chile

Elaborado pelo autor

APRESENTAÇÃO DA OPORTUNIDADE VARIÁVEL MOTIVACIONAL ME CANISMO ASSOCIADO

Mercado concorrido Consórcio com Governo localParadigma Eclético / Diplomacia Triangular

Dificuldade de acesso a recursos naturais

Clima e geografia extremos

Ambiente político-econômico estávelConstrução de confiança e reputação, manutenção

das atividades internacionais em contraponto à crise interna

Teoria Institucional

Know-how (engenharia intermediária) Paradigma Eclético

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90

7. CONCLUSÕES

Após análise é possível perceber que o processo de internacionalização da

Mendes Júnior passa por três etapas distintas: movimento inicial, retração e

retomada ao mercado externo, sintetizadas no Quadro 15. Nota-se também a

inversão de percepção de fatores influenciadores no processo. Inicialmente a

empresa se concentrava em aspectos institucionais formais para escolha de

mercados, e se apoiava em vantagens de propriedade relativas ao seu acervo

técnico nacional para adentrá-los. Mas após a crise interna, e durante a

reestruturação, passou a considerar o prisma informal tanto na prospecção de

mercados, quanto na apresentação de suas capacidades.

Quadro 15: Síntese dos movimentos internacionais da Mendes Junior, e as teorias observadas

Elaborado pelo autor

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91

Em relação aos mercados, o movimento inicial é geograficamente próximo,

devido a uma maior visibilidade de sua capacidade técnica em cenário nacional. No

entanto há logo um salto para o norte Africano e Oriente Médio, explorando as

lacunas comerciais deixadas por países desenvolvidos. Por fim, uma dispersão entre

América Latina, com Chile, Peru e Bolívia, e Ásia, com a China, quando há tentativa

de buscar cenários estáveis que possam apoiar a reestruturação pós-crise. Em

todos os casos, encontra-se um mercado saturado de empresas multinacionais de

grande porte, portanto há verificação de suas vantagens de propriedade com base

no know-how, elucidadas pelo Paradigma Eclético de Dunning.

A influência do governo brasileiro passa a ter papel acentuado a partir da

solidificação da posição internacional da construtora e evolução das ferramentas de

políticas públicas para fomento à exportação. Também é possível visualizar os

diversos casos de parceria Empresa-Governo hospedeiro (Argélia, Chile, China,

etc.).

A empreitada no Iraque acabou reprimindo a relação da empresa com o Governo

Brasileiro, pois quando tiveram oportunidade de trabalhar juntos, houve o

desencadeamento de diversos eventos exógenos, como crises e conflitos armados,

que culminaram numa disputa judicial entre as duas iniciativas, limitando parcerias

futuras possíveis. Esse fato foi potencializado pelo sistema judiciário brasileiro

ineficiente, além de seguidas alternâncias de concepções no Poder Executivo.

Portanto, pode-se notar comportamentos importantes desse relacionamento, que

se encontram em outros exemplos e merecem pesquisa mais aprofundada.

Primeiramente o potencial empreendedor da parceria Empresa-Governo, quando no

caso Mendes Júnior no Iraque, a empresa foi veículo para exportação de uma série

de serviços e bens de consumo, promovendo ainda mais as exportações nacionais.

Em segundo, a necessidade de instituições financeiras mais estruturadas a ponto de

facilitar a presença das construtoras em processos de licitação. Terceiro, a

importância de considerar a sociedade local em projetos, pois grande parte deles

ocorrem em países em desenvolvimento, e isso acaba sendo ativo importante para a

conquista de contratos e futuros parceiros. E, por fim, a necessidade da implantação

de uma instituição confiável capaz de assegurar as companhias que empreendem

frequentemente em cenários de risco não-comercial.

Sugere-se, então, estudos subsequentes sobre a influência das instituições

formais e informais no processo de internacionalização das empresas brasileiras

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prestadoras de serviço, tanto no fomento quanto no entrave, com enfoque para o

impacto de políticas mal estruturadas, e mudanças a serem adotadas visando maior

aproveitamento do mercado global contemporâneo.

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ANEXO A – Questionário para entrevista

1) Qual foi a primeira operação internacional da empresa? Em que ano isso ocorreu? O que motivou a empresa iniciar suas operações no exterior?

2) De que modo a empresa buscava se internacionalizar? 3) Qual o papel do governo nesse processo? 4) Quais variáveis eram analisadas para adentrar em um novo mercado? 5) Quais as principais barreiras encontradas? 6) Em quais países a empresa já atuou? Em que ano isso ocorreu? Quais os

modos de entrada (exportação, escritórios, licenciamento/franquia, investimento direto – de que tipo)?

7) No ano de 1983, aconteceram atrasos de pagamento em uma obra no Iraque, apesar disso a empresa optou por continuar no país, como foi tomada essa decisão?

8) Somente em 1990, durante a guerra do Kuwait, que a Mendes Júnior optou por sair do Iraque. Como isso aconteceu? Como ocorreu esse processo?

9) A empresa, ao prospectar novos negócios, possui alguma metodologia específica para fazer análise de risco político e evitar no futuro (prevenindo ou remediando) o que ocorreu no Kuwait?

10) Este foi o único episódio de crise política no país hospedeiro enfrentado pela empresa em sua atuação internacional?

11) Que papel tiveram o Itamaraty e o BNDES durante esse momento? 12) Com a saída do Iraque, a empresa foi obrigada a negociar com o Governo

brasileiro os pagamentos acertados pelas obras no Oriente Médio, o que não se concretizou e culminou em 1995, na execução judicial. Como foi esse episódio?

13) Quais os motivos que levaram a empresa a recuar na área internacional? a) Mudança de estratégia na gestão da área de internacional b) Dificuldades apresentadas nos países hospedeiros/país de origem c) Viabilidade financeira dos projetos d) Problemas com parceiros locais (redes de relacionamento) e) Concorrência internacional f) Foco no mercado doméstico

14) Este recuo foi lento e gradual ou ocorreu rapidamente? 15) Por que a empresa resolveu retomar suas atividades internacionais? Como?

Para onde? 16) A empresa passou por algum tipo de reestruturação organizacional para esta

mudança de estratégia (da retração à expansão internacional) 17) Existe algum projeto de expansão ou pretendem fazer isso gradualmente? 18) Qual o papel desempenhado pelo governo na retomada das atividades? E

do BNDES?

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ANEXO B – Cronologia do contencioso entre Banco do Brasil e Mendes Júnior

7/ago./1990 : Governo brasileiro promulga Decreto 99.441 aderindo à ONU e

proibindo relações comerciais com o Iraque.

27/ago./1990 : A empresa Mendes Júnior informa ao Banco do Brasil a ocorrência do

sinistro coberto pelo Instituto de Resseguros do Brasil das obras do Iraque.

Junho de 1991 : O Banco do Brasil notifica ao IRB a ocorrência de sinistro coberto

pelas apólices com relação às obras no Iraque.

13/jan./1992 : O Ministério da Economia, Fazenda e Planejamento cria o Grupo de

Trabalho Interministerial para atender à solicitação do Banco do Brasil. Seis meses

mais tarde, relatório final do GTI conclui que o governo brasileiro é o responsável

pelas consequências do Decreto 99.441/90.

17/jun./1992 : Parecer da assessoria jurídica do Banco do Brasil conclui, entre outros

pontos, que os débitos e os créditos da Mendes Júnior no Iraque seriam de

responsabilidade do governo brasileiro em face da sub-rogação que se teria

consubstanciado na decisão do Presidente da República, ao promulgar o Decreto

99.441/90.

10/fev./1993 : A Procuradoria Geral da Fazenda Nacional ratifica a liberação das

obrigações do Grupo Mendes Júnior e indica soluções na esfera governamental.

21/jun./1993 : O Banco do Brasil notifica o Tesouro Nacional sobre a alocação de

recursos necessários para cobrir as consequências do sinistro ocorrido com relação

às obras no Iraque.

17/ago./1993 : O advogado-geral da União, a pedido da Secretaria do Planejamento,

despacha, opinando que o Grupo Mendes Júnior está desonerado das suas

obrigações e que o governo brasileiro é o responsável pela composição dos

prejuízos do Banco do Brasil.

3/nov./1993 : Banco do Brasil emite documento em que reconhece o Grupo Mendes

Júnior como credor, mas considera os débitos de responsabilidade do Tesouro

Nacional.

22/jul./1994 : Memorial do presidente do Banco do Brasil ao ministro da Fazenda

destaca, entre outros aspectos, que medidas judiciais pelo BB implicariam

sucumbências sobre a própria União.

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9/ago./1995 : O Banco do Brasil despreza todos os pareceres anteriores e impetra

ação judicial de execução contra a Mendes Júnior em relação aos contratos no

Iraque.

15/ago./1996 : O Grupo Mendes Júnior interpõe a ação judicial contra o Banco do

Brasil em Nova York, solicitando indenização pelo não cumprimento de suas

obrigações contratuais.

20/ago./1996 : O juiz José Nepomuceno da Silva, da 5ª Vara Cível de Belo Horizonte

(MG), profere sentença favorável à Mendes Júnior e diz que a ação movida pelo

Banco do Brasil foi “temerária”.

5/set./1997 : Nova sentença, desta vez do juiz José Octávio de Brito Capanema, é

favorável à Mendes e diz que o Banco do Brasil “tangenciou a má fé processual”.

16/jun./2000 : Decisão do Superior Tribunal de Justiça, em que prevalece a posição

do ministro Carlos Alberto Direito, determina a realização de um encontro de contas

entre as partes.

30/maio/2002 : Decisão da Dra. Selma da 7ª Vara Cível de Belo Horizonte julgando

improcedente execução do Banco do Brasil.

30/dez./2002: O Banco do Brasil ajuíza ação contra o Instituto de Resseguros do

Brasil, num reconhecimento tácito de que este – e não a Mendes Júnior – é seu real

devedor.

10/set./2003 : Decisão do Dr. José Octávio de Brito Capanema julgando

improcedente a ação de cobrança da BB-Leasing.

16/jun./2003 : Uma decisão do juiz Jair José Varão Pinto Júnior, da 8ª Vara Cível de

Belo Horizonte, reforça a tese de que a ação de reparação da Mendes Júnior contra

o Banco do Brasil deve prosseguir em Nova York, apesar dos esforços do banco

para trazê-la ao Brasil.

2/mar./2004 : Parecer do jurista Ives Gandra Martins sustenta a tese de que os

argumentos do Banco do Brasil para impedir um julgamento em Nova York,

conforme preconizam os contratos entre a Mendes Júnior e a BB-Leasing, são

improcedentes.