universidade luterana do brasil – ulbra centro de ciências da saúde
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UNIVERSIDADE LUTERANA DO BRASIL – ULBRACENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
FACULDADE DE PSICOLOGIACAMPI GRAVATAÍ
A IMPORTÂNCIA DA FAMÍLIA PARA A RECUPERAÇÃO DEADOLESCENTES INFRATORES, USUÁRIOS DE DROGAS:
A EXPERIÊNCIA DA JUSTIÇA INSTANTÂNEA
JULIANA VALENTE DA SILVA
Trabalho de Conclusão de Curso
Orientadora: Profª Ms. Rejane Veiga Oliveira
Gravataí, novembro de 2003
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A IMPORTÂNCIA DA FAMÍLIA PARA A RECUPERAÇÃO DEADOLESCENTES INFRATORES, USUÁRIOS DE DROGAS:
A EXPERIÊNCIA DA JUSTIÇA INSTANTÂNEA
Juliana Valente da Silva _______________________________Nº Acadêmico982102771-7
Rejane Veiga Oliveira __________________________Profª. OrientadoraCRP 07/07080
Janaína Pacheco __________________________Coord. Trabalho de ConclusãoCRP 07/08253
Trabalho de Conclusão de Curso
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“O essencial não é aquilo que se fez dohomem, mas aquilo que ele fez daquilo que
fizeram dele.”SARTRE
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AGRADEÇO
A meus pais, por me amarem e sempre vibrarem com as minhas conquistas.
A meus filhos: Fábio, Thaís e Vanessa, pelo carinho e compreensão acima de
todas as dificuldades enfrentadas nesta etapa da minha vida.
A querida Orientadora Rejane, pela sua dedicação e disponibilidade para meu
trabalho, pois seu apoio foi de grande importância.
Ao Ministério Público e ao Centro Wallace Mandell, por autorizarem a utilização dos
documentos necessários para a realização deste estudo.
À Psicóloga Loreci Menna Barreto e à Dra. Carmen Có Freitas, pelo apoio e incentivo.
A todos aqueles que, de alguma forma, me acompanharam na caminhada, incentivando e
auxiliando também nos momentos difíceis.
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SUMÁRIO
1. JUSTIFICATIVA......................................................................................................7
2. OBJETIVOS .............................................................................................................8
2.1 Objetivo Geral.........................................................................................................82.2 Objetivo Específico .................................................................................................8
3. PROBLEMA.............................................................................................................8
4. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA .............................................................................8
4.1 A adolescência em questão ......................................................................................84.2 Breve histórico acerca da drogadicção..................................................................104.3 A família e drogadicção ........................................................................................114.4 O adolescente infrator usuário de drogas ..............................................................154.5 Justiça instantânea...................................................................................................17
5. MÉTODO ...............................................................................................................18
5.1Participantes ..........................................................................................................185.2 Instrumento ...........................................................................................................205.2 Procedimentos para coleta de dados .....................................................................21
APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS.........................................21
CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................28
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.........................................................................30
ANEXOS....................................................................................................................32
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A IMPORTÂNCIA DA FAMÍLIA PARA A RECUPERAÇÃO DEADOLESCENTES INFRATORES, USUÁRIOS DE DROGAS:
A EXPERIÊNCIA DA JUSTIÇA INSTANTÂNEA1
Juliana Valente da Silva2
Rejane Veiga Oliveira3
RESUMO
A presente pesquisa foi realizada com adolescentes que participaram do Programado Ministério Público de Atenção Especial ao Adolescente Infrator Usuário de Drogasna Clínica Wallace Mandell. Teve como objetivo específico investigar se oenvolvimento da família pode influenciar no resultado final do tratamento doadolescente infrator, com menor potencial ofensivo. Para a coleta de dados foramutilizados os registros dos prontuários de cinco adolescentes que continhaminformações acerca do paciente e de sua família. Os resultados apontam que oadolescente usuário de drogas cuja família o acompanhou e apoiou durante e posteriorao tratamento, obteve melhores resultados, não apresentando episódios de recaída apósa saída do Programa.
Palavras-chave: drogas, família, adolescente, justiça instantânea
ABSTRACT
This research was done with adolescents that have participated in a Programcarried out by de Public Ministry called Special Attention to the Offender AdolescentDrug Abuser at Clínica Wallace Mandell. The study’s main objective was to investigateif family’s involvement can influence the final result of the offender adolescenttreatment, having lesser offensive potential. For the data collection we used the registersof five adolescents who broke law that contained information on the patient and hisfamily. Results show that adolescent drug addicts whose family joined and gave supportduring and after treatment obtained better results, with no relapse into drug abuse afterleaving the Program.
Key words: drugs, family, adolescent, instantaneous justice
1 Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Psicologia da ULBRA - Gravataí2 Acadêmica em Psicologia da ULBRA - Gravataí3 Professora Mestre Orientadora de TCC – ULBRA - Gravataí
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1. JUSTIFICATIVA
O interesse surgiu através da experiência de estágio em Psicologia Clínica, onde
tive oportunidade de atender dependentes químicos e menores infratores com menor
potencial ofensivo, encaminhados pelo Ministério Público, após terem sido flagrados
pela polícia consumindo drogas. Realizei o estágio em uma clínica que pertence à rede
de tratamento, junto ao Ministério Público no Programa Justiça Instantânea.
Durante o estágio pude constatar que, em alguns casos, a família se fazia bastante
presente no tratamento de seu filho, enquanto em outros casos ela não acompanhava o
trabalho terapêutico tão de perto.
Tendo conhecimento da importância de os familiares estarem mais próximos do
paciente no acompanhamento, no manejo e no monitoramento, principalmente, durante
o tratamento, surgiu o interesse de pesquisar acerca do valor e da influência da família
no tratamento e recuperação de adolescentes infratores que fazem uso de drogas, porém
com menor potencial ofensivo.
O estágio foi baseado na linha teórica cognitivo-comportamental, a qual, durante
o tratamento do paciente com dependência química, estabelece um contato próximo
com os familiares, servindo de suporte e orientação com relação ao manejo. Enquanto
estagiária acadêmica e depois voluntária, realizei atendimento psicoterapêutico com um
dos sujeitos que fez parte desta pesquisa, o que tornou possível acompanhar sua
evolução no processo terapêutico. Participei também como coordenadora do grupo de
adolescentes; pude, assim, me inteirar do processo evolutivo dos outros indivíduos que
participaram do estudo.
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2. OBJETIVOS
2.1 Objetivo geral
Avaliar a importância da família para a recuperação do adolescente infrator
usuário de drogas.
2.2 Objetivo específico
Investigar se o envolvimento da família pode influenciar no resultado final do
tratamento do adolescente infrator com menor potencial ofensivo.
3. PROBLEMA
A participação da família influencia a recuperação do adolescente infrator usuário
de drogas? A família e a Justiça Instantânea podem ajudar na recuperação do
adolescente infrator?
4. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
4.1 A adolescência em questão
A adolescência é uma fase curiosa, que faz parte do desenvolvimento de todos
os seres humanos. É a passagem da infância para a vida adulta. A idade em que as
transformações ocorrem não é uniforme; depende da raça, hereditariedade, cultura e
alimentação. O início ocorre por volta dos doze anos, e o término ao redor dos dezoito
anos, embora também possa variar dependendo de cada pessoa (C. Lacerda & M.
Lacerda, 1998).
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Segundo os autores referidos acima, o termo adolescência vem do latim
adolescere, que significa crescer. O adolescente quer crescer, assemelhar-se aos adultos,
com violência ou revolta. Ocorrem momentos de indecisão, podendo regredir ao estágio
infantil na busca de compensar-se de suas frustrações; recorre, assim, aos rituais
mágicos, como as simpatias, cartomantes ou coisas semelhantes a essas, onde estará
declarando indiretamente que o poder está com os outros ou, então, que o adolescente é
frágil e desprotegido. Pode ser acrescentado também o recurso às drogas como tentativa
de substituir a dureza das vivências reais pela experiência química alienante, que o faz
regredir para o útero fictício, onde tenta refugiar-se por algum tempo.
A meta principal da adolescência é definir sua identidade pessoal; por isso, pode
ser vista como um novo nascimento, ou melhor, um renascimento. É momento de
encontrar sua posição no espaço e no tempo, situar-se como pessoa, com uma ideologia
de vida própria (Grynberg & Kalina, 1999).
O período da adolescência é associado como período de crise, que é necessária
para que as funções egóicas possam estar em harmonia com uma maturação psicológica
(Kalina, 1999). Outros autores defendem a idéia de que, durante a adolescência, ocorre
uma nova relação com os pais e com o mundo a seu redor e, para que isso ocorra de
forma normal, faz-se necessário que o adolescente elabore os “lutos da adolescência”
(Aberastury & Knobel, 1992).
Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, referente ao direito à vida e à
saúde: “Art. 7º. A criança e o adolescente têm o direito a proteção à vida e à saúde,
mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o
desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência” (Filho e
Milano, 1996).
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Os adolescentes constituem uma população de risco em relação ao uso de
drogas, por viverem um período de intensas transformações físicas e psíquicas, o que
ocasiona menor ou maior sofrimento (Outeiral, 1999).
Oliveira (1989) refere que o uso de drogas na adolescência é atribuído à
importância do grupo para o adolescente, ao prazer proporcionado pela droga, à
manipulação da idéia de morte e à necessidade de transgressão pelo adolescente.
4.2 Breve histórico acerca da drogadicção
Segundo Outeiral (1999), as drogas sempre existiram e sempre estiveram presentes
na vida dos seres humanos. O que interessa, na realidade, é entender e encontrar
soluções para este problema, que nos dias atuais se tornou doença grave que atinge os
indivíduos da sociedade, principalmente os jovens. Ressalta também o autor que, para
compreender mais claramente o uso das drogas, é interessante conhecer um pouco de
sua história. Em todos os tempos e lugares, as sociedades humanas têm tido contato
com drogas e fazem uso delas de diferentes maneiras, como nos exemplos a seguir:
- Na pré-história o homem já conhecia determinadas plantas e fungos tóxicos que
produziam alteração no humor e na percepção da realidade.
- Luciana Garbini conta que o homem descobriu a papoula, de onde se extrai o ópio, há
7.000 anos.
- Napoleão Bonaparte, comandante das tropas francesas que haviam invadido o Egito
em 1800, proíbe o haxixe, que é um tipo de maconha, para evitar delírios violentos entre
os soldados.
- Os rastafaris jamaicanos utilizam maconha em suas práticas religiosas como uma erva
sagrada que lhes dá conhecimento interior e os põe em contato com o divino (os
deuses).
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Na Idade Média e em nosso século, as drogas têm sido usadas de maneira
indiscriminada e não-ritualizada, muitas vezes ligadas à criminalidade e de forma
extremamente abusiva. Percebe-se que as drogas utilizadas pelos homens primitivos ou
pelas antigas sociedades eram utilizadas dentro de seus rituais, de maneira circunscrita e
como parte da atividade cultural e religiosa de suas civilizações (Outeiral, 1999).
Este autor distingue as drogas lícitas das ilícitas. As primeiras mencionadas são
as medicações, quando usadas sem prescrição médica e de maneira abusiva, o álcool e
tabaco. Estas drogas são buscadas pelas pessoas como se possuíssem um poder mágico,
com capacidade de aliviar qualquer sofrimento psíquico e/ou físico. Já as drogas ilícitas
são as seguintes: maconha, cocaína, crack, alucinógenos e derivados do ópio, como a
heroína. Todas as drogas, além de afetar o funcionamento do cérebro, também causam
graves prejuízos a outros órgãos e sistemas.
Um estudo realizado pelo CEBRID – Centro Brasileiro de Informações sobre
Drogas Psicotrópicas e, em nível local, pelo SISP – Serviço de Informação sobre
Substâncias Psicoativas durante os anos de 1987 a 1997 apresentou que alunos de
Ensino Fundamental e Ensino Médio da rede pública estadual de Porto Alegre
experimentaram, pelo menos uma vez na vida, alguma substância que tenha potencial
para causar dependência. As mais consumidas são maconha, cocaína e tabaco (Conselho
Estadual de Entorpecentes – CONENRS, 1998).
4.3 Família e drogadicção
Em todas as famílias ocorrem períodos de transição, provocados por acontecimentos
que interferem e modificam sua realidade. Muitas vezes essas mudanças são provocadas
por circunstâncias do ciclo normal do desenvolvimento, como o nascimento, a infância,
adolescência, a vida adulta, velhice e, por fim, a morte. O processo, considerado doloroso, é
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marcado por um período de insegurança e tensão, mas a tendência é que a família passe
pela tentativa de acerto e erro, buscando algum equilíbrio entre os padrões confortáveis
que lhe serviram no passado e as exigências realistas de sua nova situação (P. Minuchin,
Colapinto & S. Minuchin, l999).
Para Minuchin (1990), a família é uma unidade social que tem como função
atuar em uma série de tarefas de desenvolvimento. Assim sendo, cada cultura tem suas
variáveis, mas a família em si tem raízes universais. A estrutura familiar pode ser
considerada como um conjunto invisível de exigências funcionais que determinam a
maneira na qual seus membros vão pensar e agir. Seguindo essa dinâmica, a estrutura
familiar deve ter flexibilidade para se adaptar quando as circunstâncias mudam. O
apoio, a educação e a orientação são estratégias que unem e reestruturam a família que
está desestruturada no momento.
De acordo com Bee (1997), as pesquisas apontam, entre outros fatores, a
importância do papel da família na personalidade ou comportamento social que fluem
da criança. A mesma autora descreve as dimensões que a família deve se preocupar em
variar, tais como cuidados ou carinho, firmeza e clareza de controle, nível de exigências
de maturidade e grau de comunicação entre pais e filhos.
Minuchin (1990) vê a família como um todo, um organismo, um sistema que é
formado por subsistemas, onde os indivíduos se agrupam por sexo, interesse ou função,
desempenhando um papel específico na estrutura familiar.
A estrutura familiar corresponde a um conjunto de exigências pré-estabelecidas
que determinam a maneira em que interagem os indivíduos da família. Para que isso
seja bem claro, é necessário que existam as fronteiras, que são as regras que definem
quem e como participa da família. Ser pais significa nutrir, guiar e controlar. As
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proporções desses elementos vão depender das necessidades de desenvolvimento das
crianças ou adolescentes e da capacidade dos pais (Minuchin, 1990).
Falceto (1989) afirma que a “família é considerada tanto mais normal,
funcional, quanto mais estiver num ponto intermediário, de equilíbrio, tendo regras
estabelecidas, usadas flexivelmente, de acordo com o momento vivido e o estágio de
desenvolvimento” (p.134).
A mesma autora refere ainda que “as famílias patológicas encontram-se mais
próximas dos extremos, tendo regras muito rígidas, ou não tendo regras e tornando-se
caóticas” (p. 134).
Atualmente, as famílias configuram-se dos modos mais variados: casais em seu
segundo ou terceiro casamento, vivendo com filhos de relacionamentos anteriores; pais
e mães solteiras vivendo por si mesmos ou com suas famílias originais; filhos adotivos
dessas diferentes relações etc. Há toda essa diversidade e inúmeras outras fazendo parte
dos contextos modernos e complexos. A drogadicção, quando se instala nos contextos
atuais, cria um funcionamento mais comprometido do que nos ambientes familiares
tradicionais (Barcelos, 2000).
Quando um filho é usuário de drogas, cabe aos pais serem solidários, procurando
ajudá-lo, destaca Campos (1998). É importante que os pais procurem solucionar seus
próprios conflitos, pois muitos filhos se entregam aos vícios sob inspiração de exemplos
negativos dos pais. O ambiente sempre tem influência determinante nas atitudes que um
jovem pode tomar em relação ao convite das drogas para, através delas, encontrar o
verdadeiro sentido da vida.
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O autor referido acima ressalta que, proporcionando segurança, ocupação
constante e desejada ao adolescente, fazendo com que compreenda que possui um lugar
próprio e especial no afeto de seus pais, pode-se evitar que o jovem busque formas
alternativas, como o uso de drogas, para suprir sua carência afetiva.
A droga pretende ser substitutivo do afeto familiar. Os adolescentes vão procurar
fora o prazer que não obtiveram em casa. A voracidade própria da oralidade infantil e
não satisfeita em sua fase própria manifesta-se no desejo de ter muitas coisas materiais.
No caso de famílias que possuem melhores condições financeiras, os adolescentes
poderão suprir tal voracidade pelo acúmulo de jogos e aparelhos eletrodomésticos, entre
outras coisas materiais. Para as famílias mais pobres ocorrem os desencantos e
pequenos furtos contínuos. Os adolescentes encontram um escape para suas frustrações
ou compensação (C. Lacerda & M. Lacerda, 1998).
Barcelos (2000) afirma que a família pode influenciar na recuperação do
dependente químico. Somente através do resgate da autoridade parental se consegue
definir claramente os comportamentos adequados para o bem-estar da família e as
conseqüências que o filho sofrerá se optar por outros comportamentos. Os sentimentos
dos pais com relação ao filho é que lhes permitem estabelecer os comportamentos que
poderão ajudá-lo a escolher parar com o uso de drogas. Para o autor, desempenhar a
paternidade significa estabelecer limites, clarificando o que é certo e o que é errado, é
proteger, é prover as necessidades básicas da família. Desempenhar a maternidade
significa ter sentimentos de ternura, cuidados com a nutrição, abrigo e atenção com a
saúde e o bem-estar da família.
A prevenção do uso de drogas deve começar pelo lar, desde a tenra idade, pois o
adolescente pode vir a usufruir dessas substâncias por acidente ou por procura livre e
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espontânea. Na idade pré-escolar, a criança adquire mais facilmente hábitos e atitudes
que determinam como o indivíduo reagirá aos futuros desafios da vida. Infância bem
formada leva a adolescência sem desajustes e a vida adulta equilibrada, bem estruturada
e, sobretudo, segura (Campos, 1998).
4.4 O adolescente infrator usuário de drogas
A grande maioria dos seres humanos tem contato com algum tipo de droga
durante a vida, seja ela legal ou proibida. A grande maioria dos jovens não acredita que
podem ser vítimas do abuso de drogas, como os adultos também não acreditam nas
advertências contra as drogas, como, por exemplo, no aviso contido em maços de
cigarros (Perkins & McMurtrie-Perkins, 1986).
As primeiras experiências com drogas ocorrem entre colegas ou no grupo de
amizades. O primeiro cigarro de maconha coloca o adolescente em uma grande avenida
que se abre para o crime, e nesta avenida de mão única o motorista dificilmente retorna,
e, quanto mais avança, mais se aproxima do inusitado. Aquele que era a vítima passa a
ser causador de vítimas. A gravidade da questão da drogadicção está na imposição que o
submundo faz e que leva à degradação total da condição humana; por isso, o uso de
drogas e a marginalidade não podem estar dissociados no discurso do educador e das
autoridades (Santos, 1997).
Santos (1997) destaca que a Organização Mundial de Saúde revelou, em 1995,
que cem milhões de meninos de rua são viciados; destes, 40 milhões estão na América
Latina. Inúmeras circunstâncias agravam o uso de drogas entre meninos e meninas de
rua. A situação mais comprometedora é o descaso social, que inclui o analfabetismo,
miséria, fome, promiscuidade, marginalização e desumanização. Para esses adolescentes
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abandonados, a droga serve para superar a necessidade de aconchego, abraço, de
atenção e sobrevivência.
No entendimento de Outeiral (1999), o grupo de amigos e colegas também
poderá contribuir para o uso de drogas. A identificação com sua turma, para ter sentido
que pertencem a um grupo, muitas vezes acaba provocando experiências com as drogas.
Há o rito de iniciação e de introdução em seu grupo de iguais. É uma forma de
exibicionismo, mostrando-se o adolescente ao grupo como corajoso, sem medo de nada,
e também para realizar-se como uma pessoa mais independente, sem se importar com a
opinião dos pais.
Muitas vezes é explicado ao adolescente sobre o perigo das drogas, mas ele quer
saber até que ponto isso é verdade, quer conhecer e testar. A curiosidade pode ser uma
locomotiva que vai puxá-lo à experimentação. Afastar o jovem do caminho das drogas
pode, paradoxalmente, reforçar mais ainda a vontade de ver como é (Cavalcante, 1997).
A origem remota da drogadicção é a mesma para todos os seres humanos,
independentemente de raça, sexo, religião ou classe social. Porém, a iniciação e a
permanência no vício dependerão dos elementos desencadeadores e das desigualdades
proporcionadas pelo meio. O único objetivo de fazer uso de drogas é fugir da realidade,
ressalta Santos (1997).
O adolescente, na busca por prazeres diferentes, acaba mergulhando nos mais
variados tipos de vícios, o que, a princípio, pode dar solução à dor e alívio à angústia
para, em seguida, transformá-lo em dependente. A dependência psíquica ou o hábito é o
desejo psicológico de repetir o uso de drogas, intermitente ou continuamente, por razões
emocionais. Ela varia de indivíduo a indivíduo e de acordo com o tipo de droga usada.
A dependência física, ou vício, é caracterizada com um estado fisiológico anormal,
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produzido pela repetida administração de drogas, da qual resulta o aparecimento de uma
série característica de sintomas, chamado de síndrome de abstinência ou supressão
(Campos, 1998).
4.5 Justiça instantânea
Rocha & Cools (2002) referem que a Justiça Instantânea foi uma experiência
piloto no Projeto Justiça de Porto Alegre/RS. Um programa de intervenção preventiva à
questão da drogadicção denominado Programa Especial de Atenção ao Adolescente
Infrator Usuário de Drogas com menor potencial ofensivo, que é monitorado através da
Equipe Interdisciplinar do Sistema de Justiça do Centro Integrado de Atendimento ao
Adolescente Infrator, em articulação com demais instituições e profissionais parceiros
do Sistema de Justiça de Porto Alegre/RS, no atendimento ao adolescente a quem se
atribui a autoria de ato infracional.
Os autores referem-se ao objetivo desta experiência piloto, que é de proporcionar
atenção especial ao adolescente infrator usuário de drogas que tenham recebido
aplicação de medida sócio-educativa em meio aberto e/ou protetiva em sede de
remissão, em procedimento de apuração de ato infracional.
Esta experiência piloto foi destinada aos infratores envolvidos com drogas lícitas
e ilícitas, ou seja, destinado àqueles que cometem delito em que está presente o
componente droga. O Programa evita a prisão e oferece ao infrator a possibilidade de
receber atendimento profissional especializado (Pulcherio, Bicca & Silva, 2002).
Os autores referidos acima relatam sobre outras vantagens do Programa da
Justiça Instantânea: aumenta a probabilidade de se romper o binômio droga-crime,
diminui a reincidência da conduta infracional e o comportamento recorrente do uso de
drogas, com conseqüente redução na criminalidade, tem menor custo social-financeiro
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por ser o encarceramento mais oneroso que à atenção à saúde, e o infrator tem seus
processos arquivados, não constando mais, ao final, os antecedentes criminais.
O tempo de tratamento está vinculado ao período de suspensão do processo.
Aqueles que concluem o Programa referente ao processo em andamento tem-no
arquivado; aqueles que não cumprem a proposta, após todas as tentativas para que não
saiam do Programa, têm seus processos reabertos, percorrendo os trâmites legais da
Justiça (Pulcherio, Bicca & Silva, 2002).
5. MÉTODO
5.1 Participantes
Os participantes deste estudo são adolescentes do sexo masculino e estão
descritos na tabela abaixo.
Sujeito Idade Escolaridade Renda Familiar
A 17 anos Ensino Fundamental incompleto 1 a 3 salários mínimos
B 15 anos Ensino Fundamental incompleto 1 a 3 salários mínimos
C 18 anos Ensino Médio incompleto 10 ou mais salários mínimos
D 19 anos Ensino Médio incompleto 1 a 3 salários mínimos
E 17 anos Ensino Fundamental incompleto 10 ou mais salários mínimos
Os sujeitos desta pesquisa participaram de um projeto piloto do Ministério
Público – Programa de Atenção Especial ao Adolescente Infrator Usuário de Drogas, na
cidade de Porto Alegre. Os familiares eram obrigados a comparecer às entrevistas de
acompanhamento junto com os adolescentes no Ministério Público. Eram proporcionados
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por este órgão seminários referentes ao tema de drogadicção, e deles poderiam
participar os pais e familiares caso houvesse interesse.
Os adolescentes também foram acompanhados com tratamento psicoterápico, na
linha cognitivo-comportamental, na Clínica Wallace Mandell. Pais e/ou familiares
deveriam comparecer nas consultas quando solicitado pelo terapeuta. Era importante
que os pais participassem dos grupos oferecidos pela Clínica e que incentivassem os
filhos com relação ao tratamento.
Os adolescentes foram encaminhados para tratamento na Clínica após terem sido
flagrados pela polícia em situação de envolvimento com drogas. São adolescentes
ingressantes pela primeira vez neste Programa, sem antecedentes de atos infracionais,
considerados pelo Ministério Público como pessoas com “menor potencial ofensivo”.
Outros dados importantes com relação aos adolescentes e seu histórico familiar
encontram-se na tabela a seguir:
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Sujeito PosiçãoProle
Com quemmora
Histórico familiar importante
A 2º em 2 com a mãe e oirmão de 19anos.
Pai de A. tinha câncer, fazia tratamento quimioterápico. Entrouem depressão e suicidou-se com um tiro na cabeça em suacasa. Foi encontrado morto pela esposa e filhos. Num períodorecente, a família passou por outra perda: um acidente de motodo irmão de A., que perdeu uma perna. A. é muito apegado aeste irmão.
B único com a mãe A mãe possui problema mental (fala sozinha, está afastada dafamília). Há história de um primo por parte de mãe de B. comtranstornos mentais. Os pais são separados, pai tem outrafamília.
C 3º em 3 com a mãe,pai, irmão de29 anos eirmão de 20anos.
Pais superprotegem seu filho, muitas vezes negavam que seufilho usava drogas, atribuindo sempre a culpa a terceiros, àsmás companhias do filho.
D 1º em 3 com a mãe,pai, irmã de 12anos e irmãode 11 anos.
Segundo o pai, D. é o mais perfeito dos filhos, não incomoda,não dá trabalho, só quer dormir. Segundo a mãe, considera arelação de pais mais como de irmãos de seus filhos, pois nãobatem, não gritam e nem brigam com os filhos. Quandocriança, com 4 anos de idade, D. teve scarlatina.
E 2º em 5 desde queingressou noprojeto E.passou a morarcom seu tiopaterno, que écasado epossui umfilho de 4anos.
Segundo a mãe, desde a infância vinha falando ao filho que eleera adotado, porém o menino relata que ficou sabendo que erafilho adotivo somente na adolescência. Os pais comentam queadotaram também outro menino para que E. não fosse o únicoadotado. Segundo a mãe, a irmã de E., de 19 anos, além deusar drogas, já teve bulimia, tem transtorno bipolar etranstorno obsessivo-compulsivo. Há suspeita de abuso sexualdo pai de E. com esta filha. A mãe, após separar-se do marido,adotou mais duas meninas.
5.2 Instrumento
Foi utilizado um protocolo de pesquisa abordando os seguintes focos: dados
sóciodemográficos (nome, data de nascimento, idade, escolaridade), tipo de droga
utilizada ou que já utilizou, tratamento, participação da família no tratamento,
composição familiar e reação familiar diante da drogadicção. Este protocolo encontra-se
anexo.
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5.3 Procedimentos para a coleta dos dados
Para a coleta de dados foram utilizados os registros da clínica e do Programa de
Atenção Especial ao Adolescente Infrator Usuário de Drogas acerca do paciente e de
sua família. Para tanto, foi solicitada e obtida a autorização expressa do Ministério
Público e da Clínica Wallace Mandell, visando respeitar o sigilo e a identidade dos
participantes desta pesquisa, bem como a ética inerente à atividade profissional do
psicólogo.
6. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Realizou-se um estudo que buscou investigar características das famílias destes
adolescentes, organização familiar, se houve participação delas no tratamento, posição
do filho na prole, reação da família frente à situação e se as crises que envolvem a
adolescência ou as crises familiares podem levar os jovens a usar drogas.
Era esperado encontrar neste estudo que os familiares participassem ativamente
do tratamento do adolescente: participação da família na reunião do grupo de pais, que
se realizava de quinze em quinze dias, participação dos familiares nas consultas quando
solicitado pelo terapeuta, incentivo dos pais para a participação de seu filho no grupo de
adolescentes, que era realizado na Clínica semanalmente, além do tratamento
psicológico individual, que era realizado uma vez por semana.
Os profissionais que fizeram os registros de acompanhamento dos adolescentes
foram: psicólogo (a) da Clínica Wallace Mandell e do Ministério Público, psiquiatra,
assistente social do Ministério Público e Equipe da Promotoria de Justiça da Infância e
Juventude.
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Serão apresentados a seguir os resultados obtidos na pesquisa realizada, sendo
definidos em cinco categorias, que são: abuso de drogas, freqüência de abuso de drogas,
adesão familiar ao tratamento na Clínica e acompanhamento no Ministério Público,
forma de participação da família e curso do tratamento. Após a apresentação serão
discutidos os resultados.
Tabela 1 – Abuso de drogas
Sujeito Idade do primeiro usode drogas
Droga(s) de que abusa Tempo de uso
A 15 anos maconhatabacoálcoolcocaínaloló
1 ano9 meses3 anos1 ano4 meses
B 12 anos maconhatabacoálcoolcocaína
7 meses3 anos3 anos4 meses
C 16 anos maconha 1 ano
D 15 anos maconhatabacoálcool
4 anos4 anos4 anos
E 14 anos maconhatabacoálcool
2 anos3 anos3 anos
Tabela 2 – Freqüência de abuso de drogas
Drogas 1ª droga Abuso no ingresso aoPrograma
maconha 40% 100%álcool 60% 80%tabaco 80% 80%cocaína 0% 40%loló 0% 20%
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Os adolescentes deste estudo, (A., B., D. e E.), como pode ser observado nas
Tabelas 1 e 2, iniciaram o uso de drogas a partir do álcool e tabaco, passando também a
ser usuários de maconha. O uso de drogas mais pesadas, como cocaína e loló, foi
iniciado após o uso da maconha. Observou-se, também, que a idade média entre os
sujeitos da pesquisa ao iniciar o uso de drogas está por volta de quinze anos.
Com relação à freqüência do uso de drogas, percebe-se que todos os
participantes da pesquisa utilizaram maconha, e 80% deles fizeram uso de álcool e
tabaco. A Organização Mundial de Saúde acredita que a maconha seja a droga ilícita
mais consumida no mundo, o que ratifica os achados deste estudo, onde todos os
participantes da pesquisa usaram a maconha.
Os achados da pesquisa corroboram com a literatura. Outeiral (1999) e Oliveira,
(1989) referem que os adolescentes constituem uma população de risco em relação ao
uso de drogas por viverem um período de intensas transformações físicas e psíquicas, o
que muitas vezes pode levar à busca por drogas lícitas (álcool e tabaco) e/ou ilícitas.
Contrariando o que afirma Santos (1997), percebe-se que entre os sujeitos
pesquisados a busca pelo mundo das drogas não ocorreu com um único objetivo de
fugir da realidade. No caso dos adolescentes B. e D., a busca pelas drogas ocorreu por
curiosidade e/ou para identificar-se com seu grupo de amigos e colegas.
Corroborando com estes achados, Cavalcante (1997) refere que a curiosidade
pode ser uma maneira de levar o jovem à experimentação de drogas. Os adolescentes
necessitam identificar-se com seu grupo de amigos, não os desapontando e também
encarando qualquer desafio para não serem chamados de “careta”, o que os leva a se
tornarem usuários de drogas. Existe também a idéia de que, experimentando uma só vez
ou fazendo uso das drogas esporadicamente, não se tornarão dependentes delas. É a
24
idéia imaginária de que “isso não acontece comigo”, como no caso do adolescente C.,
que não se considera dependente das drogas.
Os achados da pesquisa relacionam-se com a literatura, Perkins & McMurtrie-
Perkins (1986), afirmam que esse tipo de pensamento também ocorre com os adultos,
pois também não acreditam nas advertências contra as drogas, como o exemplo do aviso
contido em maços de cigarros.
Tabela 3 – Adesão familiar ao tratamento na clínica e acompanhamento noMinistério Público
Sujeito Consultas na ClínicaPresença
Membro da família queparticipou do
tratamento na Clínica
Acompanhamento noMinistério Público -
Presença
A 63,64% mãe 50%
B 36,36% mãe ou tia 82,35%
C 100% pai e mãe 100%
D 91,18% mãe 66,66%
E 85,37% mãe e tio 100%
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Tabela 4 – Forma de participação da família
Sujeito Membros dafamília
Forma de participação da família
A mãe § Comparecia algumas vezes nas consultas quando erarequisitada pelo terapeuta.
§ No início do tratamento a mãe comparecia nas reuniões depais.
§ Incentivo ao filho para comparecer nas sessões depsicoterapia.
§ Participou de um seminário sobre Dependência Químicarealizado pelo Ministério Público.
§ Comparecia nas reuniões de acompanhamento do MinistérioPúblico.
B mãe ou tia § No início do tratamento a mãe e a tia compareciam nasconsultas quando eram requisitadas pelo terapeuta.
§ Comparecia nas reuniões de acompanhamento do MinistérioPúblico.
C pai e mãe § Compareciam nas consultas quando eram requisitados peloterapeuta.
§ Participaram sempre do grupo de pais.§ Incentivo para comparecer nas sessões de psicoterapia e para
ir ao grupo de adolescentes na Clínica.§ Participação assídua nos seminários sobre Dependência
Química realizados pelo Ministério Público.§ Sempre compareciam nas reuniões de acompanhamento do
Ministério Público.
D mãe § Comparecia algumas vezes nas consultas quando erarequisitada pelo terapeuta;
§ Compareceu nas reuniões de acompanhamento do MinistérioPúblico.
E mãe e/ou tio § Compareciam nas consultas quando eram requisitados peloterapeuta.
§ Participaram do grupo de pais.§ Incentivo para comparecer nas sessões de psicoterapia e para
ir ao grupo de adolescentes na clínica.§ Participação assídua nos seminários sobre Dependência
Química realizados pelo Ministério Público.§ Sempre compareciam nas reuniões de acompanhamento do
Ministério Público.
26
Tabela 5 – Curso do Tratamento
Sujeito Recaídadurante o
tratamento
Parecer final do MinistérioPúblico
Resultadodo
tratamento
Recaídaposterior aotratamento
A apenasdiminuiu ouso
Relação de passividade einfreqüência no acompanhamento,não comparecendo em diversasconsultas do tratamento. A equipeterapêutica sugeriu hospitalizaçãopara desintoxicação, mas não foiaceito pelo adolescente.Adolescente e família desligados doprojeto.
desligado Nunca aderiuao tratamento.
B apenasdiminuiu ouso
Família com pouca condição deapoio. Mãe tem comprometimentomental e pai não foi localizado. Tiano início era mais presente nosacompanhamentos, mas esquivou-sede maiores compromissos alegandoque B. tem mãe. Necessita sermantido em tratamento emonitorado por um períodoprolongado.
emtratamento
Permanece emtratamento,
apenasdiminuiu o uso.
C recaiu umavez
O adolescente e os paisapresentaram boa adesão aoacompanhamento e tratamento.Cumpriram de maneira plenamentesatisfatória o compromisso deingresso no Projeto Piloto.
alta Não houverecaída.
D não recaiu Apesar de dificuldades apresentadas,perceberam-se progressos naevolução de D. Suspendeu o uso dedrogas e melhorou a vinculaçãoescolar. O adolescente apresentoucumprimento satisfatório da medidaacordada no ingresso do ProjetoPiloto.
alta Não houverecaída.
E recaiu duasvezes
E. apresentou boa adesão aoacompanhamento e tratamento.Mostrou-se disponível para realizaros encaminhamentos sugeridos eobteve benefícios em seu processoterapêutico. Suspendeu o uso dedrogas e cumpriu satisfatoriamente amedida acordada no ingresso doProjeto Piloto. Sugere-se que E.,mesmo sendo liberado do projeto,continue em atendimentopsicoterapêutico.
alta Houve recaídagrave apóstratamento.
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A família é de extrema importância para dar suporte e auxiliar o adolescente a
parar de usar drogas. Quando a família é funcional e possui bom diálogo com seus
filhos, dá afeto, acompanha o adolescente e o incentiva em seu tratamento junto à
Clínica e ao Ministério Público, o adolescente apresenta maiores chances de adesão ao
tratamento, como é apresentado nas Tabelas 3, 4 e 5.
Os sujeito C. e E. apresentaram 100% de presença no Ministério Público. Com
relação às consultas na Clínica, C. obteve 100% de presença e E. 85,37%, como mostra
a Tabela 3. Ambos receberam alta do tratamento na Clínica e foram liberados pelo
Ministério Público, porém C. não apresentou recaída posterior ao tratamento e E.
apresentou grave recaída após término do tratamento (Tabela 5).
Observa-se nos casos de C. e E. a importância de haver um suporte familiar além
do acompanhamento terapêutico e do Ministério Público. Percebe-se que C. possui uma
família estruturada, capaz de acompanhá-lo e auxiliar no processo. No caso de E.,
apresentou uma família com condições caóticas, impossibilitada de lhe fornecer suporte
emocional, o que proporcionou a recaída no uso de drogas.
Com relação ao curso do tratamento apresentado na Tabela 5, pode-se observar
que, nos casos dos adolescentes A. e B., durante o tratamento apenas diminuíram o uso
de drogas. A. foi desligado do Projeto, pois não demonstrou adesão ao tratamento. B. ainda
permanece em tratamento; no entanto, apenas reduziu o consumo de drogas. Nos dois
casos, a família não forneceu apoio nem comprometimento, não participou ativamente
junto ao adolescente durante o período de tratamento, o que veio ocasionar seu
desligamento do Projeto.
A literatura (Cavalcante, 1997) corrobora os achados do estudo, pois é de
extrema valia que os pais se dêem conta da importância que têm para o bom crescimento de
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seus filhos. Há um questionamento: será que os pais sabem de fato quem são seus
filhos? Muitas vezes, a preocupação iminente dos pais é a luta pela sobrevivência;
deixam a família de lado, não acompanham o desenvolvimento de seus filhos e acabam
esquecendo do suporte que precisam dar em uma situação de muita importância para o
adolescente. É um momento em que ele está pedindo ajuda a sua família, porém, mesmo
assim, em alguns casos isso não acontece. Muitas vezes, como no caso de B, a mãe
apresenta problema mental e o filho não tem contato com o pai. Fica o impasse de quem
vai auxiliar, e muito depende também da estrutura emocional do adolescente em questão.
A Clínica solicitava aos pais que realizassem exames em seus filhos
periodicamente para comprovar se o adolescente ainda fazia uso de drogas ou não. O
custo dos exames era de responsabilidade da família. No caso de C., realizava exames
semanalmente, pois sua condição sócio-econômica era melhor. E. também apresentou
uma renda familiar desejável, porém os exames de acompanhamento não eram
realizados periodicamente em função de desorganização na estrutura familiar. Já os
outros indivíduos não apresentavam condições financeiras para realizar os exames com
maior freqüência, o que dificultou no acompanhamento verídico dos sujeitos de
deixarem ou não às drogas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao concluir este estudo, pode-se considerar de grande importância os achados
ligados ao tema no que se refere à importância da família para a recuperação de
adolescentes infratores usuários de drogas, com menor potencial ofensivo. Porém, é de
suma importância que se façam algumas reflexões para avaliar os dados obtidos, sendo
também fundamental relatar as limitações encontradas neste estudo.
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É importante ressaltar que a família funcional e que possui um bom diálogo com
seus filhos, que dá afeto, que acompanha o adolescente e incentiva seu tratamento
apresenta maior capacidade de fornecer suporte ao adolescente usuário de drogas,
influenciando de forma positiva sua recuperação.
O Projeto Piloto do Ministério Público – Programa de Atenção Especial ao
Adolescente Infrator Usuário de Drogas foi de extrema importância para auxiliar o
adolescente usuário de drogas e também sua família. A Justiça Instantânea e a família
do usuário de drogas podem auxiliar na recuperação do adolescente, uma vez que a
família possua condições estruturais para dar suporte no momento em que o adolescente
precisar.
Percebe-se, ao concluir a pesquisa, que a literatura abrangente corrobora quase
todos os achados. Contraria somente o pensamento de Santos (1997), que afirma como
um único objetivo dos jovens ao utilizarem drogas a fuga da realidade. O que se pôde
observar é que os sujeitos buscaram o mundo das drogas não somente para fugir da
realidade, mas por curiosidade e/ou para identificar-se com seu grupo de amigos e
colegas.
Pode-se destacar como limitação do estudo o pouco tempo para desenvolver uma
pesquisa deste nível, que requer muito estudo e envolvimento do pesquisador.
Considera-se importante o desenvolvimento de futuras pesquisas que possam dar
mais subsídios ao tratamento de drogadictos. Seria interessante pesquisar todos os
adolescentes que já passaram pelo Programa de Atenção Especial ao Adolescente
Infrator Usuário de Drogas. Deste modo, todas as clínicas que integram o Programa
participariam, possibilitando uma amostra mais significativa e/ou comparações de locais
e de linhas de tratamento.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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31
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Santos, J. L. (1997). Drogas Psicologia e Crime. Porto Alegre: Sagra Luzzatto.
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ANEXOS
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PROTOCOLO DE PESQUISA
Nome:______________________
Data de nascimento: ___/___/___ Idade: _____________
Escolaridade: ( ) Ensino Fundamental incompleto
( ) Ensino Fundamental completo
( ) Ensino Médio incompleto
( ) Ensino Médio completo
Droga(s) de que abusa: ___________________________________________________
Com que idade iniciou o abuso de drogas?____________________________________
Já utilizou outras drogas? Quais? ___________________________________________
Já fez tratamento para o abuso de drogas em outra(s) instituição/instituições? ________
______________________________________________________________________
Em caso positivo, por quanto tempo, e/ou quantas vezes? ________________________
______________________________________________________________________
Tempo de tratamento na clínica atual:________________________________________
O tratamento foi concluído? ( ) Sim ( ) Não Por que?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
A família participa/participou deste tratamento? ________________________________
Em caso positivo, de que forma? ____________________________________________
Com quem mora? ________________________________________________________
______________________________________________________________________
Quem compõe a família do adolescente infrator usuário de drogas, com menor potencial
ofensivo? ______________________________________________________________
______________________________________________________________________
Qual a posição do adolescente na prole? ____________________________________
Algum outro membro da família é ou foi usuário de drogas ou álcool?
( ) Sim ( ) Não
Em caso positivo, quem e qual o tipo de abuso/dependência? ___________________
______________________________________________________________________
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Genograma:
Renda familiar mensal: ( ) de 1 a 3 salários mínimos
( ) de 3 a 6 salários mínimos
( ) de 6 a 9 salários mínimos
( ) 10 ou mais salários mínimos
Qual foi a reação da família diante da descoberta deste adolescente usuário de drogas?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
Qual foi a reação da família ao saber que este adolescente foi detido em flagrante delito
e classificado pelo Ministério Público como um infrator com menor potencial ofensivo,
tendo sido encaminhado à Justiça Instantânea?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________