universidade nove de julho - uninove programa pÓs
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UNIVERSIDADE NOVE DE JULHO - UNINOVE
PROGRAMA PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO - PPGA
RELAÇÃO ENTRE A FAVELA E O LIXO: UMA AÇÃO TRANSFORMADORA.
LUZIA MARIA ESGOLMIN
SÃO PAULO
2010
LUZIA MARIA ESGOLMIN
RELAÇÃO ENTRE A FAVELA E O LIXO: UMA AÇÃO TRANSFORMADORA.
Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Administração da Universidade
Nove de Julho - Uninove, como requisito parcial para a
obtenção do grau de Mestre em Administração.
Orientadora: Profa. Claudia Rosa Acevedo, Dra.
SÃO PAULO
2010
FICHA CATALOGRAFICA
Esgolmin, Luzia Maria
Relação entre a favela e o lixo: uma ação transformadora / Luzia Maria Esgolmin. / São Paulo: 2010.
191 f. Dissertação (Mestrado) – Universidade Nove de Julho – Uninove, São
Paulo, 2010. Orientador(a): Profa. Dra. Claudia Rosa Acevedo 1. Vulnerabilidade 2. Resíduos Sólidos Urbanos 3. Descarte de lixo 4.
Pesquisa-ação
CDU 658
LUZIA MARIA ESGOLMIN
RELAÇÃO ENTRE A FAVELA E O LIXO: UMA AÇÃO TRANSFORMADORA
Dissertação apresentada à Universidade Nove de
Julho, Programa de Pós-Graduação em
Administração, para obtenção do grau de Mestre em
Administração, pela Banca Examinadora formada por:
____________________________________________________________
Presidente: Profa. Claudia Rosa Acevedo, Dra. - Orientadora, Uninove
____________________________________________________________
Membro: Profa. Maria Tereza Saraiva de Souza, Dra., Uninove
____________________________________________________________
Membro: Prof. Jacques Demajorovic, Dr., FEI
São Paulo, 24 de Agosto de 2010
AGRADECIMENTOS A Deus: “Você se fez presente em todos os momentos, firmes e trêmulos. E, passo a passo, pude
sentir a Sua mão na minha, transmitindo-me a segurança necessária para enfrentar meu caminho a
seguir... A Sua presença é qualquer coisa como a luz e a vida, e sinto que, em meu gesto, existe o
Seu gesto e, em minha voz, a Sua voz”.
(Vinícius de Moraes).
Aos meus pais, Walter (in memorian) e Albertina, por me ensinarem os valores essenciais de
dignidade, bondade, e, sobretudo de amor à vida e às pessoas. Com certeza, meu pai, onde quer
que esteja, comemora junto comigo mais esta vitória alcançada, um sonho realizado, fruto de
muito esforço e perseverança, assim como ele me ensinou.
Aos meus filhos Fernando e Marcella, razão da minha vida, agradeço pela compreensão e
paciência, e por entenderem todas as minhas ausências durante esses meses de pesquisas e
estudos. E, ainda, aos filhos postiços, Leandro e Jenifer, pelo incentivo e solidariedade.
De forma especial, agradeço à Professora Claudia Rosa Acevedo, que me acolheu e não mediu
esforços para a realização deste trabalho. Por sua competência intelectual e paciência, e pelos
inúmeros ensinamentos transmitidos.
Aos professores doutores Jacques Demajorovic e Maria Tereza Saraiva de Souza, agradeço pela
solicitude no trabalho de composição da banca de qualificação, e por suas valiosas sugestões para
o encaminhamento desta dissertação. A professora Maria Tereza foi, ainda, uma grande
incentivadora em outros momentos durante a execução deste trabalho.
Ao CEDECA, aos amigos da Comunidade Madalena I, ao grupo de Agentes do Meio Ambiente e
ao grupo de Catadores, com que tive a oportunidade de trabalhar e conviver, e aprender antes de
tudo, e, especialmente a Valeria Beloto da Silva, coordenadora dos projetos: Meio Ambiente:
Educação para Ação, e Coleta de Lixo Porta a Porta, pela sua grandeza de alma, seu espírito de
luta, e por todas as nossas conversas no decorrer deste trabalho que me ajudaram a entender
melhor o que é ser morador de favela.
Aos meus amigos, Elenir, Paula, Rosa, Sueli, Vera, e, em especial, ao Cláudio Queiroz, pelo
apoio e incentivo que recebi durante todos esses meses de árduo esforço.
E, por fim, a todos os amigos de luta, Amando, André, Daniel, Daniela, Ezequiel, Gilson,
Guilherme, Marcelo, Pajares, Sergio, Sibele e Wilson, pelas trocas, pela solidariedade, e pelo
compartilhamento das novas descobertas.
“A grande generosidade
está em lutar para que,
cada vez mais,
essas mãos,
sejam de homens
ou de povos,
se estendam menos,
em gestos de súplica.
Súplica de humildes
e poderosos.
E se vão fazendo,
cada vez mais,
mãos humanas,
que trabalhem e
transformem o mundo”.
Paulo Freire
RESUMO
O objetivo deste trabalho foi examinar como as ações de uma intervenção em relação ao descarte e manejo de lixo domiciliar, e as experiências compartilhadas durante essa intervenção, podem facilitar (ou dificultar) a transformação dos valores e comportamentos ambientais dos indivíduos de uma comunidade social e ambientalmente vulnerável. Em termos de procedimentos metodológicos, a pesquisa utilizou o método qualitativo de investigação optando pela técnica da pesquisa-ação. A escolha de comunidade vulnerável recaiu sobre uma favela situada na região leste da capital de São Paulo que tem como característica descartar o lixo domiciliar de forma inadequada, geralmente despejando nas vielas e becos da favela, ou jogando morro abaixo. A intervenção teve a duração de oito meses e foi realizada por uma equipe composta por aproximadamente vinte indivíduos, atuando em diferentes estágios da intervenção. Os dados foram obtidos pela pesquisa bibliográfica, mediante observação participante e entrevistas com os catadores de resíduos e os demais participantes do projeto. Os resultados obtidos revelaram que a intervenção trouxe transformações tanto nos comportamentos quanto nos valores dos moradores da comunidade. Alem disso, verificou-se que: (1) as características individuais e da comunidade que mais influenciaram na intervenção foram a participação e a valorização das contribuições individuais e coletivas; (2) durante a intervenção as experiências compartilhadas mais determinantes para a mudança de comportamento e valores foram a participação nos seminários, reuniões e treinamentos e nas rodas de reflexão, e a interação entre os moradores proporcionada pela coleta de resíduos de porta em porta. No entanto, foi possível verificar que o desafio dos problemas causados pelos resíduos é uma questão de gestão compartilhada que envolve não só cada um dos indivíduos, mas também a comunidade como um todo e o poder público que tem um papel fundamental na garantia da continuidade das ações.
Palavras-chave: Vulnerabilidade; Resíduos Sólidos Urbanos; Lixo; Pesquisa-ação; Descarte de
lixo; Favela.
ABSTRACT
The aim of this study was to examine how the actions of an intervention on disposal and
management of household waste, and the experiences shared during this intervention can
facilitate (or hinder) the transformation of values and environmental behavior of individuals in a
social community and environmentally vulnerable. In terms of methodological procedures, the
research used the qualitative method of research in choosing the technique of action research. The
choice fell on the vulnerable community located in a slum area east of the capital of São Paulo
has the characteristic of disposing of household waste improperly, usually dumping in the alleys
and lanes of the slum, or playing down the hill. The intervention lasted for eight months and was
conducted by a team of about twenty indviduals, acting at different stages of intervention. The
data were obtained by literature review, participatory observation and interviews with waste
pickers and other project participants. The results revealed that the intervention has brought about
changes both in behavior and values of community residents. Furthermore, it was found that: (1)
individual characteristics and community interventions that were most influenced the
participation and appreciation of individual and collective contributions, (2) during the
intervention over the shared experiences for a change of behavior and values were participating
in seminars, meetings and training wheels and reflection, and interaction among residents
provided by the waste collection door to door. However, we observed that the challenge of the
problems caused by waste is a management issue that involves not only shared each of the
individuas, but also the community as a whole and the government has a key role in ensuring the
continuity of actions.
Key words: Vulnerability; Municipal Solid Waste; Waste, Action Research; Disposal, Slum.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURAS Figura 1 Composição média do lixo no Brasil ................................................................... 26 Figura 2 Modelo de vulnerabilidade como uma experiência compartilhada...................... 63 Figura 3 Modelo conceitual................................................................................................ 66 Figura 4 Localização da comunidade dentro da cidade de São Paulo, SP.......................... 69 Figura 5 Área ocupada pela favela Parque Santa Madalena I............................................ 70 Figura 6 Atores envolvidos no Projeto Coleta Porta a Porta...................................... ........ 78 Figura 7 Fases da pesquisa-ação......................................................................................... 83 Figura 8 Fase Exploratória................................................................................................. 85 Figura 9 Fase de Planejamento........................................................................................... 88 Figura 10 Fase de Ação................................................................................................ ........ 89 Figura 11 Fase de Avaliação........................................................................................ ........ 91 Figura 12 Aspecto da encosta do morro que une as casas da região superior com as da parte inferior....................................................................................... 100 Figura 13 Visão da “cascata” de lixo atirada pelos moradores da área superior.......... ........ 100 Figura 14 Vista do lado de cima do morro........................................................................... 101 Figura 15 Percentual de moradias visitadas......................................................................... 104 Figura 16 Local de descarte do lixo .................................................................................... 105 Figura 17 Presença de ratos em Madalena I......................................................................... 106 Figura 18 Catadores na coleta dos resíduos......................................................................... 119 Figura 19 Tempo de residência............................................................................................ 139 Figura 20 Faixa de idade...................................................................................................... 140 Figura 21 Renda familiar..................................................................................................... 140 Figura 22 Cidade de origem................................................................................................. 141 Figura 23 Atividades de lazer............................................................................................... 142 Figura 24 Melhorias da coleta.............................................................................................. 142 Figura 25 Local de descarte do lixo..................................................................................... 144 Figura 26 Tipo de material separado.................................................................................... 144 Figura 27 Problemas causados pelo lixo.............................................................................. 145 Figura 28 Responsabilidade de cada um.............................................................................. 146 Figura 29 Responsabilidade da Prefeitura............................................................................ 147 Figura 30 Interesse pelas questões do meio ambiente.......................................................... 147 Figura 31 Reciclagem dá muito trabalho.............................................................................. 148 Figura 32 Controlar a poluição não vale a pena................................................................... 148 Figura 33 Sozinho não posso fazer nada.............................................................................. 149 Figura 34 Reciclagem diminui a poluição............................................................................ 149 Figura 35 Moradores na reunião de apresentação dos resultados........................................ 152 Figura 36 Características marcantes..................................................................................... 157 Figura 37 Características marcantes adaptadas ao modelo conceitual................................. 158
GRÁFICO Gráfico 1 Destinação do lixo produzido no Brasil....................................................... ........ 29 QUADROS Quadro 1 Características dos brasileiros mais e menos favoráveis à adoção do comportamento pró-ambiental............................................................................. 46 Quadro 2 Conceitos de vulnerabilidade social..................................................................... 56 Quadro 3 Resumo das fases, instrumentos de coleta de dados e demais ações da
pesquisa................................................................................................................ 83 Quadro 4 Relação de vielas e quantidade de moradias – Madalena I.................................. 99 Quadro 5 Abordagens do 2º Semestre 2008....................................................................... 103 Quadro 6 Ações desenvolvidas – Fase Planejamento.......................................................... 111 Quadro 7 Ações desenvolvidas – Fase Implementação....................................................... 117 Quadro 8 Avaliações das reuniões diárias........................................................................... 121 Quadro 9 Características individuais e coletivas................................................................. 127 Quadro 10 Motivos da mudança............................................................................................ 134 Quadro 11 Contribuições da intervenção............................................................................... 134 Quadro 12 Limitações da intervenção................................................................................... 135 Quadro 13 Características da comunidade que facilitam a mudança.................................... 136 Quadro 14 Características da comunidade que dificultam a mudança.................................. 136 Quadro 15 Traços da comunidade na visão da sociedade...................................................... 138
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Domicílios particulares permanentes urbanos, total e sua respectiva distribuição percentual, por destino do lixo, segundo grandes regiões 1992/1999................................................................................................ 27 Tabela 2 População total e sua distribuição segundo as grandes regiões 1992/1999............................................................................................................. 28 Tabela 3 Composição do lixo coletado em São Paulo.................................... ..................... 30 Tabela 4 Evolução da população favelada no Município de São Paulo............................... 34 Tabela 5 Indicadores das favelas do Município de São Paulo ............................................. 36 Tabela 6 Vulnerabilidade social das residências da favela Parque
Santa Madalena I................................................................................................... 70 Tabela 7 Infra-estrutura urbana da favela Parque Santa Madalena I ................................... 71 Tabela 8 Objetivos da pesquisa-ação.............................................................. ..................... 75 Tabela 9 Domicílios visitados – Fase Diagnóstico............................................................... 86 Tabela 10 Domicílios visitados............................................................................................. 102 Tabela 11 Caçambas em Madalena I.................................................................................... 105 Tabela 12 Resíduos coletados durante o projeto................................................................... 122
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................. 16
1.1 Apresentação do Panorama Geral da Pesquisa................................................................. 16
1.2 Objetivos da Pesquisa....................................................................................................... 19
1.2.1 Objetivo Prático ............................................................................................................ 19
1.2.1.1 Objetivos específicos do objetivo prático................................................................... 19
1.2.2 Objetivo do Conhecimento............................................................................................ 19
1.2.2.1 Objetivos específicos do objetivo do conhecimento.................................................. 20
1.3 Justificativa da Relevância da Pesquisa............................................................................ 20
1.4 Caracterização do Estudo................................................................................................. 22
1.5 Organização do Trabalho.................................................................................................. 22
2 REVISÃO DA LITERATURA......................................................................................... 24
2.1 Contextualização sobre a problemática do lixo ............................................................... 24
2.1.1 Características sanitárias: relação entre resíduos sólidos e saúde pública..................... 31
2.2 Dinâmicas das favelas ...................................................................................................... 33
2.2.1 Conceituação e caracterização de favela................................................. ..................... 33
2.2.2 População das favelas ................................................................................................... 35
2.2.3 Realidades sócio-culturais nas favelas........................................................................... 36
2.2.4 Participação da comunidade.......................................................................................... 39
2.3 Comportamento pró-ambiental......................................................................................... 41
2.3.1 Meio ambiente e a questão do lixo................................................................................ 41
2.3.2 Mobilizadores do comportamento pró-ambiental.......................................................... 44
2.4 Vulnerabilidade ................................................................................................................ 48
2.4.1 Riscos e Adversidades – A questão da vulnerabilidade................................................ 49
2.4.2 Vulnerabilidade Social – Origem e definição................................................................ 52
2.4.3 Fatores que influenciam vulnerabilidade social............................................................ 55
2.4.4 Vulnerabilidade aos riscos ambientais........................................................................... 60
2.4.5 Vulnerabilidade como experiência compartilhada........................................................ 62
2.5 Pressupostos da pesquisa e modelo conceitual................................................................ 65
3 MÉTODO DA PESQUISA............................................................................................... 68
3.1 Objeto de pesquisa............................................................................................................ 68
3.1.1 Processo de ocupação e situação atual........................................................................... 69
3.1.2 Delimitação e descrição da área estudada...................................................................... 71
3.2 Caracterização da pesquisa............................................................................................... 73
3.3 Participantes do projeto..................................................................................................... 77
3.4 Instrumentos de coleta de dados e fases da pesquisa-ação................................................ 79
3.4.1 Coleta de dados.............................................................................................................. 79
3.4.1.1 Pesquisa documental e bibliográfica........................................................................... 80
3.4.1.2 Observação participante.............................................................................................. 80
3.4.1.3 Entrevistas................................................................................................................... 82
3.4.1.4 Questionário................................................................................................................ 82
3.4.2 Fases da pesquisa-ação.................................................................................................. 82
3.4.3 Fase Exploratória (Diagnóstico).................................................................................... 85
3.4.4 Fase Principal (Planejamento)....................................................................................... 87
3.4.5 Fase de Ação (Implementação)...................................................................................... 89
3.4.6 Fase de Avaliação (Observação)................................................................................... 90
3.4.6.1 Fase de avaliação – Entrevistas ................................................................................. 92
3.4.6.2 Fase de avaliação – Questionário............................................................................... 93
3.5 Análise dos dados............................................................................................................. 94
3.6 Apresentação dos resultados para a comunidade.............................................................. 95
3.7 Apresentação dos resultados para o poder público........................................................... 96
4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS........................................................... 97
4.1 Aproximação..................................................................................................................... 97
4.2 Fase exploratória: Diagnóstico......................................................................................... 98
4.2.1 Mapeamento da área...................................................................................................... 98
4.2.2 Resultados do levantamento......................................................................................... 102
4.3 Fase de planejamento: Principal...................................................................................... 110
4.4 Fase de ação: Implementação.......................................................................................... 117
4.5 Fase de avaliação: Observação........................................................................................ 124
4.5.1 Entrevistas com os catadores........................................................................................ 124
4.5.2 Entrevistas com os representantes dos participantes do projeto................................... 133
4.5.3 Questionário para os moradores....................................................................................138
4.5.3.1 Características dos sujeitos........................................................................................ 139
4.5.3.2 Atividades de lazer da população.............................................................................. 141
4.5.3.3 Coleta porta a porta.....................................................................................................142
4.5.3.4 Problemas com o lixo.................................................................................................145
4.5.3.5 Responsabilidade ambiental...................................................................................... 146
4.5.4 Considerações da fase de avaliação.............................................................................. 150
4.6 Apresentação dos resultados para a comunidade............................................................. 151
4.6.1 Reunião com os moradores........................................................................................... 151
4.6.2 Desdobramentos na comunidade.................................................................................. 152
4.7 Apresentação dos resultados para o poder público.......................................................... 153
4.8 Síntese da avaliação das fases da pesquisa-ação............................................................. 154
4.9 Análise dos resultados sob o enfoque do modelo conceitual.......................................... 156
4.9.1 Condições externas....................................................................................................... 159
4.9.2 Características dos indivíduos...................................................................................... 159
4.9.3 Características da comunidade..................................................................................... 160
4.9.4 Elementos da intervenção............................................................................................. 160
4.9.5 Experiências compartilhadas........................................................................................ 161
4.9.6 Valores e comportamentos........................................................................................... 162
5 CONCLUSÃO................................................................................................................... 164
5.1 Limitações da pesquisa e propostas para futuros estudos................................................ 164
5.2 Contribuições do estudo.................................................................................................. 165
5.3 Considerações finais........................................................................................................ 166
5.3.1 Revendo os pressupostos.............................................................................................. 167
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...............................................................................169
APÊNDICES
APÊNDICE A – Roteiro da entrevista com os catadores de materiais................................. 179
APÊNDICE B – Formulário de Consentimento.................................................................... 180
ANEXOS
ANEXO A – Questionário para os moradores...................................................................... 182
ANEXO B – Brasil................................................................................................................ 186
ANEXO C – Convite aos moradores..................................................................................... 187
ANEXO D – Aviso aos moradores........................................................................................ 188
ANEXO E – Pesquisa de Opinião......................................................................................... 189
ANEXO F – Ofício nº 049/2009........................................................................................... 190
ANEXO G – Ofício nº 050/2009........................................................................................... 191
16
1 INTRODUÇÃO
Este capítulo tem o objetivo de situar o leitor sobre o estudo que será desenvolvido e
aborda os seguintes tópicos: apresentação do panorama geral da pesquisa, objetivos da pesquisa,
justificativa da relevância da pesquisa, a caracterização do estudo e a organização do trabalho.
1.1 APRESENTAÇÃO DO PANORAMA GERAL DA PESQUISA
O impacto negativo ao meio ambiente, causado pela disposição inadequada dos
resíduos sólidos urbanos tem sido uma preocupação dos estudos de meio ambiente nas últimas
décadas. O descarte dos resíduos sólidos quer seja domiciliar, industrial, hospitalar ou agrícola,
constitui um dos principais problemas enfrentados pelas sociedades atuais.
As atividades humanas sobre o meio ambiente, com o crescente aumento da
população, aliado ao acelerado processo de industrialização, vêm causando um aumento
vertiginoso na produção de resíduos sólidos, o que tem contribuído para um processo contínuo de
deterioração ambiental, com sérios prejuízos para a qualidade de vida da população.
Atualmente, o resíduo sólido doméstico é constituído por uma massa heterogênea de
materiais, dos quais fazem parte uma gama de produtos de risco, muitos deles tóxicos, além de
materiais combustíveis, orgânicos, inertes, etc. Os resíduos também são formados por produtos
com vida útil muito curta e que acarretam um grande volume de embalagens descartáveis, como
sacos plásticos rígidos, isopores, tetrapack, entre outros (GRIPPI, 2006).
Entre os resíduos domiciliares descartados também são encontradas uma grande
quantidade de materiais com características de periculosidade como pilhas, baterias de celulares,
tintas, medicamentos vencidos, etc., gerando preocupação quanto ao tratamento e/ou disposição
final compatível com a preservação do meio ambiente.
A questão do descarte de resíduos sólidos domiciliares agrava-se quando se trata de
regiões ou comunidades pobres, tanto pela carência de recursos disponíveis como pela falta de
informação quanto aos riscos produzidos. E é sobre as populações mais carentes que recai a
maior parte dos efeitos negativos da urbanização desenfreada, sem mecanismos regulatórios e de
controle, típica das áreas periféricas das grandes cidades (GOUVEIA, 1999). Tanto a pobreza,
17
como a escassez de recursos, e a expansão populacional combinam-se para criar círculos viciosos
de degradação e colapso dos ecossistemas e das comunidades locais.
Na Região Metropolitana de São Paulo, apesar da melhora dos indicadores sociais nas
últimas décadas, verifica-se a existência de um grande diferencial nas condições de vida e de
acesso a serviços públicos, com a presença de áreas extremamente pobres e carentes de
equipamentos públicos e serviços, espalhadas por toda a periferia metropolitana. Dessa forma,
existem situações com péssimas condições e exposição cumulativa a diversos tipos de risco, tanto
social como ambiental, como é o caso dos riscos de enchentes e deslizamentos de terra, em um
ambiente intensamente poluído, e de serviços sociais, que quando existem, são extremamente
ineficientes (TORRES; MARQUES, 2001; TORRES et al., 2003).
Uma das regiões que apresenta um dos mais altos índices de risco ambiental, e com
maiores concentrações de população pobre é a Zona Leste da cidade de São Paulo (TORRES,
2002). De acordo com Torres (2002), na Zona Leste de São Paulo, as áreas de risco ambiental
(definidas como os setores censitários localizados a até 100 metros dos cursos d’água)
apresentam maiores concentrações de domicílios em precárias condições sanitárias
(principalmente o acesso à rede de esgoto), bem como proporções mais elevadas de crianças e
adolescentes, e de favelas, caracterizando essa região como de grande vulnerabilidade.
Os riscos ambientais envolvem uma gama de implicações sociais, econômicas,
tecnológicas, culturais, ambientais e políticas que estão diretamente vinculadas à condição de
pobreza e de vulnerabilidade social de representativa parcela da sociedade.
O termo vulnerabilidade social vem sendo utilizado com freqüência, tanto por grupos
acadêmicos como por entidades governamentais da América Latina (ALVES, 2006). De acordo
com Alves (2006), os estudos sobre vulnerabilidade social devem-se a uma certa insatisfação
com os enfoques tradicionais sobre pobreza e com seus métodos de mensuração, baseados
exclusivamente no nível de renda monetária e em medidas fixas, como a linha da pobreza.
Estudos contemporâneos relacionados à pobreza trazem um novo olhar para essa questão que vai
além da dimensão sócio econômica.
A noção de vulnerabilidade geralmente é definida como uma situação em que estão
presentes três elementos (ou componentes): exposição ao risco; incapacidade de reação; e
dificuldade de adaptação diante da materialização do risco (MOSER, 1998).
18
Neste sentido, a noção de vulnerabilidade social, ao considerar a insegurança e a
exposição a riscos e perturbações provocadas por eventos ou mudanças econômicas, sociais e
ambientais oferece uma visão mais ampla sobre as condições de vida dos grupos sociais mais
pobres e, ao mesmo tempo, considera a disponibilidade de recursos e estratégias das próprias
famílias para enfrentarem os impactos que as afetam.
A questão do lixo urbano, em especial nos paises em desenvolvimento, como é o caso
do Brasil, está associada a vários problemas de ordem ambiental, sanitária, social e econômica.
Percebe-se que grande quantidade dos resíduos sólidos gerados no meio urbano é disposta em
condições sanitárias inadequadas, que conduzem a impactos ambientais, bem como a algum tipo
de desequilíbrio ecológico e danos à saúde pública.
A tendência das pessoas é se livrar do lixo de qualquer maneira, geralmente pelo meio
mais fácil que estiver disponível (GRIPPI, 2006). Dessa forma, cada pessoa, com seus valores,
crenças, informações e comportamentos, imprime características particulares no espaço em que
habita e aos elementos desse espaço (AJZEN, 1991). Assim, verificamos que o modo como os
moradores de comunidades carentes se relacionam com o lixo traduz, em grande parte, a falta de
informações sobre os riscos e prejuízos causados à saúde e ao meio ambiente, adotando
comportamentos que aumentam a vulnerabilidade a que estão expostos, ou seja, permitindo, de
certa forma, que o lixo predomine sobre todo o ambiente.
Apesar da preocupação das sociedades atuais com os problemas causados pelo lixo,
poucos estudos descrevem como uma comunidade se comporta quando submetida a uma
intervenção de manejo de lixo.
Este estudo buscou analisar como os indivíduos, e a comunidade como um todo,
reagem a partir da implementação de uma intervenção de manejo e coleta de lixo domiciliar.
Mais especificamente, a pergunta que direcionou este trabalho foi: Como as ações de uma
intervenção em relação ao descarte e manejo do lixo domiciliar, e as experiências
compartilhadas durante essa intervenção, facilitam (ou dificultam) a transformação dos
valores e comportamentos dos indivíduos de uma comunidade vulnerável?
Para alcançar esse objetivo utilizou-se a estratégia da pesquisa-ação junto a uma
comunidade considerada vulnerável, em razão de suas características sociais e econômicas. Foi
escolhida a Comunidade Madalena I que está situada na zona leste da cidade de São Paulo.
19
1.2 OBJETIVOS DA PESQUISA
Um estudo que utiliza a técnica da pesquisa-ação possui, normalmente, dois tipos de
objetivos. Um objetivo prático, e outro do conhecimento (THIOLLENT, 2008). Assim, a
pesquisa-ação na Comunidade Madalena I visou:
1.2.1 Objetivo Prático
Facilitar a mobilização dos moradores da Comunidade Madalena I para a implantação
da coleta de resíduos sólidos domiciliares, de porta em porta, contribuindo para intervenções mais
eficazes em comunidades vulneráveis, considerando a percepção ambiental e o manejo do lixo
como desencadeadores de mudanças nos valores e comportamentos dos indivíduos.
1.2.1.1 Objetivos específicos do objetivo prático:
• Aumentar o conhecimento e a capacitação das pessoas relacionados ao processo
de disposição dos resíduos domiciliares e da coleta seletiva;
• Oferecer oportunidade de inclusão voluntária em atividades de cunho social e
ambiental;
• Desenvolver a produção de novos conhecimentos para os participantes do projeto
e para a comunidade como um todo;
• Promover o desenvolvimento da consciência ambiental;
• Resgatar a cidadania.
1.2.2 Objetivo do conhecimento
Investigar como as ações de uma intervenção em relação ao descarte e manejo do lixo
domiciliar, e as experiências compartilhadas durante essa intervenção, facilitam (ou dificultam) a
transformação dos valores e comportamentos dos indivíduos de uma comunidade vulnerável.
20
1.2.2.1 Objetivos específicos do objetivo do conhecimento
• Compreender quais são as características da comunidade e as características dos
indivíduos a ela pertencentes, que mais influenciaram na experiência
compartilhada vivida durante essa intervenção;
• Verificar se as experiências compartilhadas na intervenção contribuíram para a
transformação dos comportamentos e valores dos indivíduos, e da comunidade,
em relação ao descarte e manejo do lixo;
• Verificar quais foram as características da intervenção que colaboraram para o
processo de mudança do comportamento e valores em relação ao manejo e
descarte do lixo.
Para efeito deste trabalho, considera-se intervenção, como o ato ou efeito de mediar a
ação de coleta e manejo de resíduos sólidos produzidos pela comunidade, buscando a
participação ativa da comunidade, de forma a modificar o significado ou as expectativas do senso
comum, quanto ao objeto da ação.
1.3 JUSTIFICATIVA DA RELEVÂNCIA DA PESQUISA
Muitos estudos sobre este tema têm mostrado que os resíduos sólidos constituem um
dos maiores problemas da atualidade. Uma das causas da destruição ambiental está relacionada à
forma como o lixo é gerado pelas pessoas e os efeitos ambientais que são provocados por sua
composição, volume e dispersão. Nesse sentido, a geração e o acúmulo de resíduos domésticos e
industriais é um grave problema que tem sido enfrentado pelos governantes e legisladores, e que
ocorrem principalmente quando são produzidos em áreas com pouco espaço para armazenagem,
exercendo um forte impacto sobre a saúde pública e o equilíbrio ambiental.
Dessa forma, é prioritário compreender como se dá a relação entre o lixo e as
comunidades carentes, e buscar estratégias para enfrentar essas questões ambientais. Apesar de
todo o esforço das políticas públicas no sentido de estimular a correta destinação dos resíduos
urbanos, pouco se tem feito para a efetiva conscientização da população quanto à necessidade de
21
se reduzir e/ou reciclar os resíduos produzidos, haja vista a falta de incentivos e de campanhas
mobilizadoras para aumentar a coleta seletiva.
A realização desta pesquisa é justificada por adentrar em uma realidade pouco
investigada, que é a exclusão da participação civil frente aos problemas ambientais. Neste
sentido, é de grande importância a aproximação do contexto teórico, ou seja, do conhecimento
científico sobre os problemas da sociedade, junto ao contexto concreto. Os moradores das favelas
que percebem a realidade como ela é, muitas vezes, não conseguem desvendar as raízes dos
problemas e mobilizarem-se para buscar uma nova solução. A relação entre conhecimento
concreto e teórico possibilita maior compreensão dos malefícios que representa a poluição
causada pelo lixo.
Para tanto, é necessário que seja investigado o que sabem, como pensam e se
comportam em relação ao fenômeno “resíduos sólidos”, que é uma rotina na vida de cada
cidadão. Essa preocupação deve-se ao fato de que cada indivíduo é responsável pela correta
destinação dos resíduos que gera diariamente. E, diante desse fato, é de extrema importância que
as pessoas sejam devidamente sensibilizadas para os pontos mais críticos do problema. Sem a
participação consciente de cada um dos indivíduos, não se conseguirá transformar seus
comportamentos.
Mandelli (1997), ao estudar o comportamento da população urbana no manejo dos
resíduos sólidos no âmbito das residências, comenta que é importante considerar as habilidades,
comportamentos, conhecimentos, interesses ou disposições que a população já tem, para começar
um programa de gerenciamento de resíduos sólidos domésticos.
O fato de muitos programas de educação ambiental que incentivam a solução dos
problemas relacionados aos resíduos sólidos urbanos serem sempre aplicados de uma forma
genérica, trazendo o nome de “manuais” ou “cartilhas” contraria a própria concepção do processo
participativo, pois ao invés de estimularem estratégias criativas, na perspectiva real da construção
da realidade, trazem receitas prontas para serem obedecidas e seguidas, com uma ênfase à coleta
seletiva dos resíduos. Assim, a participação civil na gestão dos problemas ambientais é
fundamental para a sua minimização, e o aumento dessa participação tende a influenciar, cada
vez mais, na melhoria da qualidade de vida da população.
22
Uma das contribuições deste trabalho é apresentar informações para futuras
intervenções em áreas de vulnerabilidade sócio-ambiental, segundo a percepção, o saber e os
anseios dos moradores, tendo como referência a comunidade estudada.
1.4 CARACTERIZAÇÃO DO ESTUDO
Em relação ao método, foi adotado neste estudo o método qualitativo de investigação,
utilizando-se a metodologia da pesquisa-ação, cuja principal característica é a sua concepção e
realização em estreita associação com uma ação para a resolução de um problema coletivo, e na
qual, os pesquisadores e os participantes representativos da situação, estão envolvidos de modo
cooperativo ou participativo (THIOLLENT, 2008).
Como recorte de comunidade vulnerável, optou-se por uma favela, por ser um local
onde o lixo toma conta de todos os espaços, invadindo a vida das pessoas, trazendo riscos e
doenças para a população, principalmente para as crianças.
O presente estudo foi realizado na Comunidade Madalena I, situada na zona leste da
cidade de São Paulo. Justifica-se a escolha dessa favela em função de trabalhos anteriores
desenvolvidos na área ambiental, coordenados pela organização não governamental da qual a
autora deste trabalho presta serviços como voluntária.
O pressuposto, a priori, antes de entrar em campo, era de que o lixo vinha sendo
descartado de forma inadequada, atirado a céu aberto, sem qualquer preocupação com a sua
destinação, com a redução ou com a reciclagem. Esse pressuposto está baseado na investigação
pessoal do local escolhido, e na verificação “in loco” da grande quantidade de lixo acumulada nas
ruas e no entorno das favelas.
1.5 ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO
Em conformidade com os objetivos definidos para este estudo, o trabalho foi
estruturado em cinco capítulos. O presente capítulo de introdução apresenta a temática que será
estudada e seus objetivos, abordando ainda, as justificativas para a escolha da pesquisa, o método
empregado e a delimitação do estudo.
23
No capítulo 2 é apresentado o referencial teórico utilizado para explicar o fenômeno
em análise que está subdividido em cinco partes: contextualização da questão do lixo,
conceituações e definições de favela e seus moradores, discussão de fatores que influenciam
atitudes e comportamentos em relação ao meio ambiente, pesquisas acadêmicas sobre o tema da
vulnerabilidade social e os pressupostos da pesquisa.
O capítulo 3 trata da metodologia da pesquisa de campo, a definição do público alvo
da pesquisa, o método e a técnica de coleta de dados, assim como a metodologia utilizada para a
análise dos dados coletados. Considerando que este trabalho utilizou a técnica da pesquisa-ação,
são apresentadas também a descrição de cada uma de suas fases, quais sejam: fase exploratória
(diagnóstico), principal (planejamento), ação (implementação) e de avaliação (observação).
O capítulo 4 aborda os resultados encontrados em cada uma das fases da pesquisa-
ação e a avaliação a partir do modelo conceitual adotado.
E, por último, no capítulo 5 são apresentadas as conclusões desta pesquisa e suas
implicações, assim como suas limitações e sugestões para futuros estudos.
24
2 REVISÃO DA LITERATURA
O objetivo deste capítulo é efetuar a revisão da literatura sobre vulnerabilidade sócio-
ambiental, relacionada à questão das favelas, com enfoque sobre a questão do manejo do lixo
domiciliar. Nesse sentido, o presente capítulo é composto por cinco seções.
Na primeira é apresentada uma contextualização sobre a problemática do lixo e um
panorama geral da relação entre resíduos sólidos e saúde. Na segunda seção são expostas
conceituações sociais das favelas e uma abordagem sobre as características sociais, econômicas e
culturais de seus moradores. Em seguida, a terceira seção apresenta os fatores que influenciam as
atitudes e comportamentos das pessoas em relação ao meio ambiente. A quarta seção trata dos
conceitos da vulnerabilidade social, suas articulações e complementaridades sob o enfoque da
pobreza e da exclusão social, dentro de uma perspectiva de compartilhamento da vulnerabilidade
em comunidades. Trata ainda do conceito de vulnerabilidade aplicado em outros campos da
ciência, que, assim como a pobreza, caracteriza a vida de muitos habitantes. E, por fim, a quinta
seção apresenta os pressupostos da pesquisa e modelo conceitual.
2.1 CONTEXTUALIZAÇÃO SOBRE A PROBLEMÁTICA DO LIXO
Considerando que esta pesquisa se propôs a investigar as experiências compartilhadas
por moradores de uma comunidade vulnerável, em relação ao descarte e manejo do lixo
domiciliar, é relevante contextualizar a situação do lixo no cenário brasileiro.
No que tange à definição, há uma dificuldade em se conceituar o que é entendido por
lixo e por resíduo, uma vez que pode variar conforme a época e o lugar, e dependendo de fatores
jurídicos, econômicos, ambientais, sociais e tecnológicos (SANTOS, 2008).
A Organização das Nações Unidas (ONU), por meio do documento Agenda 21, define
lixo ou resíduo(s) da seguinte forma:
Os resíduos sólidos compreendem todos os restos domésticos e resíduos não perigosos, tais como os resíduos comerciais e institucionais, o lixo da rua e os entulhos de construção. Em alguns paises, o sistema de gestão dos resíduos sólidos também se ocupa dos resíduos humanos, tais como excrementos, cinzas de incineradores,
25
sedimentos de fossas sépticas e de instalações de tratamento de esgoto. Se manifestarem características perigosas, esses resíduos devem ser tratados como resíduos perigosos (SÃO PAULO, 2008).
No Brasil, a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), por meio da Norma Brasileira Registrada (NBR) nº. 10.004, apresenta a seguinte definição para resíduos sólidos:
Resíduos nos estados sólido e semi-sólido que resultam de atividades da comunidade de origem industrial, doméstica, hospitalar, comercial, agrícola, de serviços de varrição. Ficam incluídos nesta definição os lodos provenientes de sistemas de tratamento de água, aqueles gerados em equipamentos e instalações de controle de poluição, bem como determinados líquidos cujas particularidades tornem inviável seu lançamento na rede pública de esgotos ou corpos d’água, ou exijam para isso soluções técnicas e economicamente inviáveis, em face à melhor tecnologia disponível (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, 1987, p. 2).
No estado de São Paulo, a Secretaria de Estado do Meio Ambiente (SMA) e a
Companhia de Tecnologia e Saneamento Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB), apresentam a seguinte definição:
Resíduos sólidos como o conjunto de produtos não aproveitados nas atividades humanas (domésticas, comerciais, industriais e de serviços) e aqueles gerados nas operações de varrição urbana, como folhas, galhos, terra, areia, que são retirados de ruas e logradouros públicos. Também podemos definir lixo como os restos das atividades humanas, considerados pelos geradores como inúteis, indesejáveis ou descartáveis (SÃO PAULO, 1998, p. 45).
De acordo com Demajorovic (1995), lixo é aquilo que não possui qualquer tipo de
valor, e que deve apenas ser descartado, enquanto que resíduo sólido é aquilo que possui valor
econômico agregado por possibilitar o seu reaproveitamento no próprio processo produtivo. No
entanto, para a finalidade deste trabalho, os termos lixo e resíduos sólidos serão utilizados para
designar todos os materiais descartados, uma vez que nem sempre conseguiremos fazer distinção
entre esses elementos.
No Brasil, cerca de 88% dos 5.564 municípios colocam seus resíduos em lixões ou
aterros controlados (não considerados tecnicamente sanitários), provocando situações de impacto
social e de degradação ambiental, como a contaminação dos lençóis freáticos pelo chorume e dos
solos agricultáveis. Por outro lado, o entupimento da rede de esgotos e o assoreamento de rios e
rede pluvial por Resíduos Sólidos Urbanos (RSU) somam-se aos desmatamentos e ao processo de
expansão urbana (como o asfalto) como fatores agravantes ou determinantes de inundações.
Nos últimos 30 anos, o Brasil mudou muito o tipo de lixo gerado. A aceleração do
crescimento das cidades e as mudanças de consumo das pessoas trouxeram fatores que vêm
26
gerando um lixo muito diferente daquele que as cidades brasileiras produziam há 50 anos atrás
(GRIPPI, 2006). O lixo atual é diferente em quantidade e qualidade, em volume e em
composição. O aumento do consumo atrelado ao crescimento populacional gera também cada vez
mais lixo para ser descartado.
Nos países desenvolvidos cerca de 20% do lixo doméstico é composto de matéria
orgânica, enquanto que no Brasil esse índice é bem diferente, conforme ilustra a Figura 1 (IBGE,
2003).
65%
25%
4% 3% 3%Matéria OrgânicaPapelMetalPlásticoVidro
Figura 1. Composição média do lixo no Brasil Fonte: IBGE, 2003.
Como mostra a Figura 1, o lixo brasileiro é composto por 25% de papel, 4% de metal,
3% de plástico, 3% de vidro e 65% de matéria orgânica (IBGE, 2003). Nos países desenvolvidos
essa relação é significativamente redistribuída, sendo que o lixo biodegradável ou matéria
orgânica, responsável pela produção do gás metano, um potente gás de efeito estufa que contribui
para as alterações climáticas, em geral não ultrapassa 20% da composição total do lixo
produzido.
Em todo o mundo, a falta de saneamento básico e de tratamento do lixo causa a morte
de 5,2 milhões de pessoas por ano, sendo que 4 milhões delas, são crianças (CALDERONI,
1998). No Brasil, apenas 539 municípios encaminham o lixo hospitalar para incineradores ou
aterros de segurança (IBGE, 2002). Somente 13,8% dos municípios brasileiros dispõem de
27
aterros sanitários e 68,4% do total de resíduos sólidos gerados nos municípios com população
acima de 20.000 habitantes são depositados em lixões e vazadouros a céu aberto (IBGE, 2002).
As Tabelas 1 e 2 apresentam o total de lixo coletado, por região brasileira, para os
anos de 1992 e 1999, bem como o crescimento da população para o mesmo período (IBGE,
2000). Observa-se que nesse espaço de tempo, enquanto o crescimento da população foi de
10,23%, a produção de lixo foi de 21,64%. Assim, a produção per capita aumentou
significativamente no período considerado em todas as regiões do país, com destaque para a
região Norte que teve o maior percentual de aumento de população e de lixo também, 26,10% e
33,28%, respectivamente.
No Brasil, estima-se que a produção de lixo esteja em torno de 135 mil toneladas por
dia, equivalente a cerca de 50 milhões de toneladas por ano (SNIS, 2009).
Tabela 1. Domicílios particulares permanentes urbanos, total e sua respectiva distribuição percentual, por destino do lixo, segundo as grandes regiões
1992/1999.
Regiões do Brasil
Domicílios particulares permanentes urbanos
Total Destino do lixo (%) Coletado
diretamente Coletado
Indiretamente Queimado
ou enterrado
Outro
1992 Norte 1.340.632 45,1 11,1 26,2 17,5 Nordeste 6.026.642 56,2 10,0 9,0 24,8 Sudeste 14.756.341 83,6 4,7 6,2 5,4 Sul 4.575.518 87,0 3,1 7,1 2,8 Centro-Oeste 1.965.905 75,7 2,1 13,3 8,9 Total 28.666.014 76,0 5,7 8,4 9,9
1999 Norte 1.786.841 66,6 14,8 13,2 5,4 Nordeste 7.384.254 69,1 15,4 6,1 9,3 Sudeste 17.581.561 89,6 7,6 1,8 1,0 Sul 5.620.675 94,3 3,4 1,9 0,5 Centro-Oeste 2.537.421 90,8 5,4 2,9 0,9 Total 34.870.828 85,0 8,8 3,4 2,9
Fonte: Adaptado de Pesquisa Nacional por amostra de domicílios IBGE (2000).
28
Tabela 2. População Total e sua distribuição segundo as grandes regiões 1992/1999.
Grandes Regiões População 1992 1999
Norte 6.212.288 7.828.407 Nordeste 42.985.475 46.400.796 Sudeste 63.731.248 70.067.880
Sul 22.444.361 24.514.219 Centro-Oeste 9.705.247 11.273.592
Total 145.447.491 160.336.471
Fonte: Adaptado de Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios IBGE (2000)
O crescimento da população urbana não levou em consideração a necessidade de
adequação de locais específicos para depósito e tratamento dos resíduos sólidos. Tal fato é
verdadeiro, sobretudo para as regiões ocupadas por habitações de forma desordenada, com
carências de infra-estrutura, seja em relação ao abastecimento de água e saneamento, ou em
relação à falta de coleta de resíduos (GRIPPI, 2006).
Associa-se a isso, um quadro de exclusão social e elevado nível de pobreza da
população. Muitas pessoas vivem em áreas de risco, como encostas, margens de rios e periferias
industriais. É preciso considerar também que uma significativa parcela dos brasileiros entende
que o meio ambiente diz respeito somente à natureza (rios, mares, florestas, etc.) excluindo
homens, mulheres, cidades e favelas desse conceito (TRAJBER et al., 2005).
Segundo dados do IBGE (2002), 80% da disposição final do lixo brasileiro é feita em
vazadouros a céu aberto, sendo a região nordeste a que apresenta o pior cenário. Já a região
brasileira que mais tem contribuído com a reciclagem é a sudeste, no entanto, esta representa
apenas 1,1% de todo o lixo produzido no país.
O gráfico 1, ilustra a destinação do lixo produzido no Brasil por regiões do pais.
29
Gráfico 1. Destinação do lixo produzido no Brasil. Fonte: GRIPPI, 2006, p. 6.
Observa-se que o percentual de lixo destinado a vazadouros a céu aberto é muito
superior ao destinado aos aterros sanitários e principalmente à reciclagem e que a região que mais
tem fomentado a reciclagem é a sudeste, no entanto, representa somente 1,1% de todo o lixo
produzido no país (GRIPPI, 2006).
Em São Paulo, a responsabilidade pelo gerenciamento dos serviços de limpeza urbana,
como coleta de resíduos domiciliar e seletiva, varrição de vias públicas e remoção de entulhos é
do Departamento de Limpeza Urbana – LIMPURB. De acordo com informação contida no portal
da Prefeitura Municipal de São Paulo, a cidade gera 15 mil toneladas de lixo diariamente (lixo
residencial, de saúde, restos de feiras, podas de árvores, entulho, etc.). Só de resíduos
domiciliares são coletadas mais de 9,5 mil toneladas por dia (SÃO PAULO, 2009). A coleta
regular de lixo costuma se dar três vezes por semana, no entanto, verifica-se que essa
periodicidade é insuficiente nas favelas, uma vez que o lixo e o entulho marcam a sua paisagem.
Verifica-se, na Tabela 3, a composição do lixo coletado na cidade de São Paulo em
2008 (SÃO PAULO, 2009), no entanto, não se dispõe de informação sobre a quantidade de lixo
produzida e não coletada. Do total dos resíduos coletados apenas uma pequena quantidade é
relativa à coleta seletiva, em São Paulo menos de 1% do total coletado recebe tratamento.
0
20
40
60
80
100
Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste
MédiaNacional
Vazadouro a céu aberto Reciclagem Aterros e/ou outras disposições legais
30
Tabela 3. Composição do lixo coletado em São Paulo
Tipo de Resíduo Quantidade média diária
(toneladas)
Domiciliar 9.500
Serviço de Saúde 90
Varrição 270
Inerte 3.000
Seletivo 130
Outros 1.300
Total 14.290
Fonte: SÃO PAULO, 2009.
Com relação à coleta seletiva, em virtude do pouco conhecimento da população sobre
os resíduos passíveis de reciclagem, e da falta de separação dos resíduos, muitos desses materiais
acabam se tornando impraticáveis para a reciclagem, consumindo muito esforço, tempo e
trabalho das equipes que manuseiam os materiais coletados (PEREIRA et al., 2009).
Apesar dessas dificuldades verifica-se que tem aumentado a atuação das cooperativas
de catadores, permitindo que muitas pessoas tenham uma ocupação digna, longe dos lixões onde
ficariam expostas a doenças. De acordo com um levantamento realizado em 2005 pela Prefeitura
de São Paulo, existiam na cidade, 94 grupos organizados ou cooperativas atuando com a coleta
seletiva. Destes grupos, 26 têm entre 10 e 20 participantes; 40 têm menos de 10 pessoas; 13
grupos têm mais de 20 pessoas e 15 grupos são ligados às Centrais de Triagem da Prefeitura
(SÃO PAULO, 2009).
Todo resíduo desviado de aterros sanitários contribui, em tese, para a redução dos
recursos financeiros utilizados pelo setor público com a coleta e o tratamento do lixo. Dessa
forma, as várias toneladas de materiais coletadas por esses grupos de catadores diariamente,
representam uma grande contribuição para a gestão dos resíduos. No entanto, pouca atenção tem
sido direcionada para as questões de saúde decorrentes do manuseio do lixo.
31
2.1.1 Características sanitárias: relação entre resíduos sólidos e saúde pública
Há uma dificuldade em se relacionar diretamente o manejo inadequado dos resíduos
sólidos residenciais e a saúde (ACCURIO et al., 1998). Segundo os autores as causas das
enfermidades são múltiplas, conforme apresentam, entre outras, a pobreza, a desnutrição, e a
carência de saneamento básico, como as seqüelas do manejo deficiente dos resíduos sólidos.
Apesar desse reconhecimento, são poucos os estudos e pesquisas realizados no Brasil
e na América Latina sobre o assunto. A falta de interesse por esse assunto se dá, em parte, pelo
fato de existirem poucos centros de pesquisa que tratam das questões dos resíduos sólidos
municipais e, na maioria das vezes, os trabalhos não abordam os componentes saúde e meio
ambiente. Para Ferreira e Anjos (2001) os fatores que contribuem, em maior ou menor grau, para
esta situação são:
O pouco interesse que os resíduos comuns, do cotidiano, despertam nos
profissionais e pesquisadores, especialmente entre aqueles com formação em
paises desenvolvidos, onde as questões e o nível de conhecimento sobre esses
resíduos estão relacionados a outro estágio de desenvolvimento;
A pequena pressão exercida pela população – desde que haja uma coleta
domiciliar para os problemas decorrentes da gestão dos resíduos sólidos;
A pouca atenção dada pelo poder público às questões de saúde em geral e que
também se associa ao setor dos resíduos;
A prática de incorporação de tecnologia de paises desenvolvidos sem a necessária
adaptação às condições locais, resultando, grande parte das vezes, em falhas e
fracassos. Como exemplo desta situação são citados os equipamentos
compactadores projetados para coleta de resíduos com baixo conteúdo de matéria
orgânica úmida. Nos Estados Unidos, a presença de restos de comida nos resíduos
domiciliares varia entre 6% e 18% enquanto que na América Latina varia entre
40% e 60% (ZEPEDA, 1995, apud FERREIRA; ANJOS, 2001), propiciando o
vazamento de líquidos ao longo das vias públicas, provocando mau cheiro e
atraindo moscas.
32
Algumas populações podem ser identificadas como mais suscetíveis de serem afetadas
pelas questões ambientais, com redução da qualidade de vida e ampliação dos problemas de
saúde. A primeira população a ser considerada é aquela que não dispõe de coleta domiciliar
regular e que, ao se desfazer dos resíduos produzidos, lançando-os no entorno da área em que
vive, gera um meio ambiente deteriorado com a presença de fumaça, mau cheiro e vetores
transmissores de doenças (por exemplo, moscas, mosquitos, baratas e roedores).
A questão dos resíduos, e seus problemas associados estão intimamente ligados ao
estágio cultural e ao desenvolvimento tecnológico das sociedades (ANDRADE, 2002). Desta
forma, a geração de resíduos parte de um nível básico referente à própria existência do homem,
seu ciclo biológico e as formas mais primitivas de organização social, e avança, em intensidade,
variedade e complexidade dos elementos, para outros níveis em função dos aspectos culturais das
sociedades.
O problema do lixo é um dos mais sérios nas favelas. A grande densidade
demográfica fica em torno de 400 habitantes por hectare. Além disso, o traçado irregular das
vielas, dificulta os serviços tradicionais de coleta (PASTERNAK, 2002).
Atualmente, por representar uma ameaça real ao meio ambiente, e conseqüentemente
ao próprio homem, essa questão vêm conquistando a crônica mundial, especialmente no que diz
respeito ao processamento, transporte e à disposição final dos resíduos industriais e urbanos, além
do questionamento acerca da intensidade de geração dos resíduos e das possibilidades e
limitações no seu reaproveitamento.
Diferentes estudos (VALENTE; GROSSI, 1999; D’ALMEIDA et al., 2000;
TEIXEIRA, 1999; SATO, 1999), apontam para a importância de desenvolver junto à comunidade
a conscientização quanto a sua fundamental participação, modificando seus hábitos no processo
de geração, separação, minimização, reutilização e reciclagem dos resíduos, porém não analisam
como desenvolver esse assunto complexo. A sugestão, na maioria das vezes, aponta para a prática
da educação ambiental.
De acordo com Minc (2006, p.3), “O lixo é matéria prima fora do lugar. A forma com
que uma sociedade trata do seu lixo, dos seus velhos, dos meninos de rua e doentes mentais atesta
o seu grau de civilização. O tratamento do lixo doméstico, além de ser uma questão com
implicações tecnológicas é antes de tudo uma questão cultural”.
33
Os problemas de saúde relacionados às questões do lixo afetam a todos
indistintamente, mas especialmente nas favelas é que esses problemas se tornam mais visíveis.
2.2 DINÂMICA DAS FAVELAS
Este tópico apresenta definições e caracterizações para Favela e as principais
articulações da dinâmica da população das favelas. Neste sentido, são apresentados dados
demográficos das favelas brasileiras, e, mais especificamente, da situação da cidade de São
Paulo, assim como aspectos das características sociais, econômicas e culturais da sua população.
As formas de participação da comunidade também foram consideradas, pela
importância que esse comportamento representa para uma intervenção social participativa.
2.2.1 Conceituação e caracterização de Favela
De acordo com o IBGE (2000), FAVELA é definida como um aglomerado de
moradias classificado como subnormal. É constituída por, no mínimo, 51 unidades habitacionais
(barracos, casas), sem definição de metragem. O terreno ocupado é, em geral, de propriedade
alheia (pública ou particular) e sua disposição é de forma desordenada e densa. Na maioria das
vezes é carente de serviços públicos essenciais (IBGE, 2000).
Em 2001, 1.269 prefeituras brasileiras (23%) declararam possuir favelas, mocambos,
palafitas ou assemelhados em seu município, porém, apenas 13% afirmaram possuir cadastro
desse tipo de moradia (IBGE, 2001). O total de favelas então cadastradas era de 16.433, e nelas
existiam 2.362.708 domicílios cadastrados. Desses domicílios, 1.654.736 (70%) se localizavam
nos 32 maiores municípios do país (municípios com mais de 500 mil habitantes) demonstrando,
portanto, a incidência de maior quantidade de favelas nos municípios mais populosos do território
brasileiro.
Entre as Grandes Regiões, a que mais possui domicílios cadastrados em favelas, em
números absolutos é a Sudeste, com 1.405.009 domicílios distribuídos nas 6.106 favelas
cadastradas (IBGE, 2001).
Na cidade de São Paulo encontram-se cadastradas 1.577 favelas com 386.619
domicílios cadastrados (SÃO PAULO, 2009). Somente na região de Vila Prudente e Sapopemba
34
existem 21.197 moradias em favelas, sendo que essa área está entre as regiões mais densamente
povoadas. Além das favelas, também se encontram cadastradas 1.985 moradias classificadas
como Cortiços.
Em 1973, de acordo com levantamento efetuado pela Prefeitura de São Paulo foi
diagnosticado uma população de cerca de 70 mil habitantes, ou 1% da população do município.
Uma nova pesquisa realizada em 1987 indicou que a população era em torno de 812.000
habitantes, representando 9% da população total. Em 1993, a FIPE-USP atualizou a estimativa da
população favelada, e revelou que essa população estaria na casa dos 1,9 milhões de habitantes,
resultando num crescimento de 133% em apenas 6 anos, ou 15,2% ao ano (SARAIVA;
MARQUES, 2004).
Nos anos seguintes houve uma intensa polêmica com relação ao suposto processo de
crescimento sugerido pela pesquisa da Fipe o que resultou em um trabalho que calculou
estimativas para os anos de 1991 e 2000 (TORRES; MARQUES, 2002; MARQUES; TORRES;
SARAIVA, 2003). A Tabela 4 apresenta os resultados obtidos por esse trabalho.
Tabela 4. Evolução da população favelada no Município de São Paulo, 1973-2000
Ano População Total
Populaçãosubnormal
Populaçãofavelada
% Populaçãofavelada
Período Taxa de cres. aa favelas
Taxa decres. aa
total 1973 6.560.547 - 71.840 1,10% - - 1980 8.558.841 375.023 4,40% 1973-80 20,16% 3,00%1987 9.210.668 530.822 812.764 8,80% 1980-87 8,97% 0,82%1991 9.644.122 647.400 891.673 9,20% 1987-91 1,03% 0,51%2000 10.338.196 896.005 1.160.597 11,20% 1991-00 2,97% 0,78%
Fonte: SARAIVA; MARQUES, 2004, p. 3.
Pelos dados acima se pode observar que o crescimento da população favelada foi
maior que a taxa de crescimento total da população em todos os períodos.
O impacto dessa situação para o meio ambiente é maléfico, visto que moradias
carentes de serviços básicos essenciais tendem a poluir os mananciais e os rios e a deteriorar a
cobertura vegetal. De acordo com Pasternak (2002), 71,9% dos domicílios favelados situam-se à
margem de córregos e 17,9% são sujeitos a inundações periódicas.
No entanto, as favelas não são apenas o resultado das ocupações de espaços nas
cidades, elas são também o conjunto de sentidos que lhes foram atribuídos ao longo do processo
35
de favelização (CRUZ, 2007). As favelas são a conseqüência de processos de ocupação urbana
que trazem peculiaridades arquitetônicas e urbanísticas, devido ao fato de a ocupação ter sido
projetada pelos próprios moradores, e, em alguns casos, com posteriores intervenções do poder
público. As favelas são também um constructo social, pois sua dimensão material está fortemente
relacionada com a dimensão simbólica, com as representações que foram sendo criadas nesses
espaços.
Conhecer o tamanho dessa população e suas características são tarefas indispensáveis
para que ações públicas de melhoramento dessas áreas obtenham êxito.
2.2.2 População das Favelas
Com base em dados do IBGE e do Município de São Paulo, Saraiva e Marques (2004)
efetuaram uma análise da relação entre as condições socioeconômicas dos moradores das favelas
e dos moradores do município de São Paulo como um todo. Da análise efetuada por esses
autores, destacam-se as seguintes constatações em relação à infra-estrutura, escolaridade,
rendimento e faixa etária:
a) Com relação à infra-estrutura, 96% das favelas possuem abastecimento de água,
49,2% contam com esgotamento sanitário e 82% das moradias são atendidas pela coleta de lixo,
enquanto que os números totais para o Município são: 97,6% para água, 87,2% para esgoto e
96,5% para coleta de lixo. No entanto, essas variáveis medem a cobertura do serviço e não a
qualidade de seu funcionamento, e é possível que subsistam diferenças importantes no
atendimento no que diz respeito à regularidade do abastecimento e à qualidade da água. Verifica-
se em relação à coleta de lixo que houve um aumento significativo de 1991 para 2000, passando
de 63,3% para 82%, o que demonstra um esforço de volume da Prefeitura de São Paulo para
integrar as favelas ao sistema. Mesmo assim, a diferença entre as coberturas das favelas e do
município é muito grande.
b) As favelas possuem 15,2% de pessoas analfabetas contra 7,3% para o Município,
enquanto que a escolaridade dos Chefes de Família que vai de 0 a 3 anos de estudo é de 38,4%
nas favelas, é de 17,8% no Município. O analfabetismo é um indicador emblemático dos
diferenciais de acesso entre grupos sociais. Em 1991, as pessoas analfabetas chegavam a 38,1%
da população nas favelas e a 19,3% no município. Esses indicadores caem em 2000 para 15,2% e
7,3%, respectivamente, o que indica que a presença de analfabetos se reduz consideravelmente
36
nas favelas e no município. Entretanto o seu ritmo de queda é menor nas favelas do que no
conjunto do Município.
c) Quanto ao rendimento e a faixa etária dos chefes de família temos a seguinte
configuração:
Tabela 5. Indicadores das Favelas e do Município de São Paulo
Indicadores
Números relativos Favelas
2000 %
MSP 2000
% Rendimento
Chefes de 0 a 3 SM 73,2 40,1 Chefes de 3 a 5 SM 18 17,9 Chefes de 5 a 10 SM 7,6 20,9 Chefes de 10 a 20 SM 0,9 11,6
Estrutura
Etária
Pessoas de 0 a 14 anos
35,5 24,8
Pessoas de 65 anos ou mais
1,7 6,4
Fonte: Adaptado de SARAIVA; MARQUES, 2004
Em relação aos rendimentos, observa-se que a renda dos moradores de favelas, em
geral decresce quando comparada à renda total do município. O rendimento médio da população
acima de dez salários mínimos era 11,6% para a população municipal em 2000, enquanto que o
rendimento da maioria da população favelada não alcançava três salários mínimos (73,2%). A
população favelada paulistana caracteriza-se, dessa forma, por ser a mais pobre em termos de
rendimento monetário. No que diz respeito à idade dos moradores observa-se uma acentuada
predominância de população mais jovem, com 14 anos ou menos.
2.2.3 Realidades Sócio-culturais nas Favelas
Há uma tendência dos grupos de baixa renda residirem em áreas com más condições
urbanísticas e sanitárias, e em situações de risco e degradação ambiental, por exemplo, em
terrenos próximos de cursos d’água e de lixões ou com alta declividade (ALVES, 2006). De
acordo com o autor, a explicação mais geral é que estas áreas são as únicas acessíveis à
população mais pobre, seja por se tratarem de áreas públicas e/ou de preservação (invadidas), seja
porque são muito desvalorizadas no mercado imobiliário por serem pouco propícias à ocupação,
37
devido às características de risco e à falta de infraestrutura urbana. Esse aspecto por si só já
representa uma classificação social para os moradores de favelas, ou seja, são caracterizados por
grupos populacionais muito pobres e com alta privação, morando em áreas de risco ou de
degradação ambiental.
A estrutura social é composta de indivíduos que ocupam posições distintas e cujas
relações ou interações entre eles são pautadas por regras e normas de comportamento que se
institucionalizam, conforme permanentemente praticadas. Esse é o caso de lideranças e grupos
que detêm poder sobre a população da favela.
Durante essas interações tanto as instituições como as definições de status conferidas
aos indivíduos sofrem mudanças e se reformulam. É mediante as interações que os indivíduos
definem novas formas de relação ou reformulam aquelas já estabelecidas. Nessas interações, as
relações se consolidam e se institucionalizam, e aquelas normas amplamente compartilhadas que
contam com um forte apelo social – mas que não são formalizadas, nem tampouco explicitadas
pelo padrão vigente – são denominadas instituições informais.
A cultura é responsável pela concepção de mundo que ajuda a dar conformação às
práticas sociais, num processo de produção de significados que configuram a experiência e
ajudam a modelar as relações sociais (ALVAREZ; DAGNINO; ESCOBAR, 2000).
A “vida cultural” da população é entendida como o conjunto de práticas e atitudes que
têm uma incidência sobre a capacidade do homem de se exprimir, de se situar no mundo, de criar
seu entorno e de se comunicar (BOTELHO, 2001). Os fatores que determinam a construção desse
universo podem ser definidos pelas origens regionais de cada um, em função de interesses
profissionais ou econômicos, esportivos ou culturais, de sexo, de origens étnicas, de geração,
entre outras, e a cultura pode ser entendida como a organização desses conhecimentos
socialmente compartilhados. Gould (2001) acrescenta:
Quando o desenvolvimento reconhece a cultura, ele gera uma mudança enraizada nos valores, conhecimento e estilo de vida próprios da comunidade e, portanto, tende a ser mais bem sucedido. Quando o desenvolvimento impõe valores culturais externos, prejudica o sistema de funcionamento porque desvaloriza o conhecimento nativo e a capacidade local que servem de fundamento da sociedade... o desafio é descobrir formas de liberar os recursos e bens culturais da comunidade para que se conectem com as formas de ser das próprias pessoas e possibilitem a elas o uso dessas capacidades criativas como um caminho para eliminar a pobreza, a exclusão e a dependência (GOULD, 2001, p. 69).
38
O estudo realizado por Almeida e D’Andrea (2004), numa grande favela paulistana, a
favela Paraisópolis, reforça as premissas defendidas por Gould (2001). A pesquisa revelou que a
localização da favela, bem como a sua antiguidade, são fatores que aumentam seu capital social.
Em face ao contexto de pobreza da região metropolitana de São Paulo, e dos locais de origem dos
favelados, mudar-se para Paraisópolis constitui-se numa estratégia de melhoria social.
No entanto, contrariamente ao acima exposto, o fato da maioria da população das
favelas ser composta por migrantes de vários lugares que se encontram num espaço nem sempre
desejado, explica o motivo pelo qual, em outras favelas, pode haver maior dificuldade para que
seus moradores sintam-se pertencentes ao lugar onde moram (FERRARA, 1996).
O espaço urbano de uma favela pertence ao que Magnani (1998), denomina de
“pedaço”. Pedaço é a necessidade de se estar situado numa rede de relações que combina laços de
parentesco, vizinhança e procedências. Os que freqüentam o “pedaço” são identificáveis com
algumas categorias que representam vínculos de proximidade mais ou menos amplos.
Assim, o “chegado” é conhecido de forma superficial, por não ter vínculos estreitos
com o conhecido. O “colega” é a pessoa que já tem laços mais definidos e profundos, uma
relação mais concreta: na comunidade, na escola, no time de futebol, etc. Nas relações internas do
pedaço, ser “compadre” ou “comadre” é outra forma que favorece vínculos mais fortes, tão
próximos quanto os de parentesco (MAGNANI, 1998). Magnani define assim este tipo de
relações: Quando o espaço, assim delimitado, ou um segmento dele, torna-se ponto de referência para distinguir determinado grupo de freqüentadores como pertencentes a uma rede de relações, recebe o nome de pedaço. O termo, na realidade, designa aquele espaço intermediário entre o privado (a casa) e o público, onde se desenvolve uma sociabilidade básica, mais ampla que a fundada nos laços familiares, porém mais densa, significativa e estável que as relações impostas pela sociedade (MAGNANI, 1998, p.33).
Diferentemente de outros bairros da cidade, que se apresentam com uma estrutura
econômica e social mais desenvolvida, o anonimato toma conta das relações nas favelas. Nesse
sentido, Magnani (1998) descreve como a vivência no “pedaço” permite o desenvolvimento de
processos de sociabilidade característicos que superam, de uma certa forma, as barreiras do não
conhecido. Pessoas de pedaços diferentes, ou alguém em trânsito por um pedaço que não é seu, são muito cautelosas; os conflitos, a hostilidade, estão sempre latentes, pois todo lugar fora do pedaço é aquela parte desenvolvida do mapa, e, portanto do perigo. A análise da categoria pedaço, permitiu verificar que existe um comportamento afirmativo referido
39
ao estabelecimento e reforço de laços de sociabilidade, desde o núcleo familiar até o círculo mais amplo envolve amigos, colegas, “chegados” (no âmbito do pedaço) e desconhecidos (fora do pedaço) (MAGNANI, 1998, p. 44).
Muitas das políticas e pensamentos sobre favelas oscilam entre dois extremos, ora a
favela é vista com romantismo por significar uma ordem urbana espontânea, culturalmente muito
rica e variada, e, no sentido contrário, a favela é vista como uma das aberrações que a sociedade
atual produz, amostra clara da impotência em alojar de maneira digna quase 25 a 30 % dos
moradores metropolitanos (BENETTI, 2004).
Estudos têm reconhecido as diferenças existentes entre favelas grandes e pequenas,
estruturadas e não estruturadas, consolidadas ou precárias, situadas em vales ou em morros, no
centro ou na periferia, em zonas de risco e em zonas de proteção ambiental (PASTERNAK,
2001). No entanto, essa variação geográfica e/ou temporal nao costuma ser agregada uma
variação demográfica e/ou sociológica.
Em geral, a diversidade de perfis não é considerada, tanto entre favelas como dentro
da favela. Os habitantes da favela sao sempre “os favelados”. Isso tem conduzido as intervenções
a serem projetadas de forma padronizada, num espaço homogêneo, correspondente a um único
tipo de realidade social e sem considerar a possibilidade de se aproveitar os conhecimentos e
habilidades já instados dessa população para intervenções que atendam as suas necessidades
específicas.
2.2.4 Participação da Comunidade
Numa intervenção social, planejada de acordo com a metodologia da pesquisa-ação, a
interação entre agente promotor, projetista e moradores é um ingrediente indispensável da
concepção de programas e projetos. Ao analisar a questão da participação comunitária, Silva
(1999) propõe as seguintes categorias:
a) Participação informativa – quando a comunidade somente foi informada sobre o
que iria ser feito;
b) Participação consultiva – quando a comunidade foi informada e ouvida sobre o que
iria ser feito, mas sem possibilidade de decidir sobre o que iria ser realizado. Neste caso, as
opiniões e ou sugestões da comunidade podem ter sido acatadas, mas por decisão do agente
promotor; e
40
c) Participação interativa – quando a comunidade, por iniciativa sua ou do agente
promotor, participou ou foi chamada a participar das decisões sobre o que iria ser feito.
Estas categorias se aplicam a três momentos do programa: na definição das ações e
elaboração dos projetos, na execução, e na operação e manutenção das ações e ou serviços
implantados. Embora a participação dos moradores faça parte da retórica da maioria dos
programas de intervenção, vemos que se prioriza o processo de informação à população sobre o
que vai ser feito na comunidade. Se por um lado há uma distância entre intenção e ação por parte
dos programas, por outro se reconhece que a atitude de manter a população informada, que pode
parecer óbvia, representa um avanço para as políticas públicas voltadas para as populações
faveladas (SILVA, 1999).
Dessa forma, o envolvimento e a participação da comunidade numa intervenção que
tem como propósito promover a mudança de comportamento em relação ao descarte inadequado
do lixo, se torna fundamental para que o objetivo possa ser alcançado.
De acordo com as especificações do Manual de Saneamento, concebido pelo
Ministério do Meio Ambiente para apoiar intervenções sociais:
Mobilização é convocar vontades, decisões e ações, para atuar na busca de um propósito comum, sob uma interpretação e um sentido também compartilhados, porque, além de permitir um grau de conscientização das pessoas, no caso, em relação ao problema dos resíduos sólidos, contribui para a formação de uma visão crítica e participativa a respeito do uso do patrimônio ambiental (BRASIL, 2006, p. 281).
O Manual destaca ainda que compreender os problemas de resíduos sólidos e suas
causas não é suficiente, é preciso agir. É imprescindível que os grupos e a comunidade
contribuam para a resolução dos problemas, sendo que o ideal é que as sugestões para as ações
surjam da própria comunidade.
Os projetos de intervenções-padrão em assentamentos precários geralmente não
consideram o ambiente onde estão inseridos (MOSCARELLI, 2005), nem o modo de vida e o
significado do lugar para os habitantes (CASTELLO, 2005). Segundo Castello (2005), é
importante avaliar a percepção das comunidades envolvidas e os valores extraídos do próprio
contexto a fim de garantir a efetividade da ação. Portanto, a condição essencial para a solução do
descarte inadequado do lixo, principalmente entre moradores de áreas carentes de infra-estrutura
e de saneamento, como é o caso dos moradores em favelas, é conseguir que as pessoas
41
modifiquem voluntariamente seu comportamento e as suas atitudes (BRITO Y PASQUALI,
2006).
Em resumo, torna-se evidente o impacto mútuo entre as condições de infra-estrutura e
saneamento das favelas e as condições sócio-culturais de seus moradores. Da mesma forma que o
ambiente causa impacto sobre esses indivíduos, o comportamento inadequado dessas pessoas em
relação à disposição e manejo dos resíduos, também exerce impacto sobre o ambiente e contribui
ainda mais para a sua degradação.
2.3 COMPORTAMENTO PRÓ-AMBIENTAL
O comportamento pró-ambiental é definido como aquele que leva à preservação e ao
cuidado com o ambiente físico (RIBEIRO; CARVALHO; OLIVEIRA, 2004). Nesse sentido é
relevante identificar quais são os fatores que influenciam a mudança de comportamentos das
pessoas em relação ao meio ambiente, e, mais especificamente, no que diz respeito ao manejo do
lixo domiciliar. O objetivo é identificar quais são as características pessoais, e quais as condições
associadas, que geram mudanças efetivas e duradouras nos comportamentos de indivíduos e
grupos, para uma relação mais responsável com o meio ambiente.
Para isso, esta seção está dividida em dois tópicos. O primeiro aborda questões gerais
a respeito das preocupações com o meio ambiente e da necessidade de mudanças nos
comportamentos ambientais das pessoas. O segundo traça uma breve retrospectiva dos estudos
relacionados à identificação dos mobilizadores do comportamento pró-ambiental.
2.3.1 Meio ambiente e a questão do lixo
Os pesquisadores dos problemas ambientais, na área das ciências sociais, enfatizam
que para tentar resolver os problemas causados pela degradação rápida e irreversível e/ou o
desaparecimento dos recursos naturais não é suficiente analisar e agir sobre esses fluxos físicos, e
alertam para a importância de se conhecer os processos pelos quais se desenvolvem os
comportamentos e atitudes sobre o meio ambiente (DE CASTRO, 1994). Mosler (1993, p. 111)
afirma que: “os problemas ambientais não são problemas entre as pessoas e o meio ambiente,
mas o resultado de problemas entre os membros de um sistema social”.
42
A vida das pessoas se insere em um contexto ambiental onde os aspectos físicos são a
base natural do ambiente humano. Mesmo assim, suas funções sociais, políticas, econômicas e
culturais definem a direção e a utilização dos recursos com que as pessoas constroem e
modificam o ambiente. O comportamento humano, por sua vez, que é influenciado pelas
características desse ambiente, também é modelado por ele.
As atitudes de preocupação ambiental estão enraizadas no sistema de valores das
pessoas (STERN; DIETZ, 1994). As questões ambientais estão baseadas no valor que elas
atribuem a si próprias, a outras pessoas, às plantas e aos animais.
Stern e Dietz (1994) classificaram esses valores baseados em três preocupações
ambientais: egoísta, socialmente altruísta e da biosfera. Preocupações egoístas estão baseadas nos
próprios valores, valorizando a si mesmos acima de outras pessoas e acima de outros seres vivos.
"Valores egoístas predispõe as pessoas a proteger os aspectos do ambiente que os afetam
pessoalmente, ou oporem-se à proteção do ambiente, se os custos pessoais são percebidas como
altos" (STERN; DIETZ, 1994, p. 70).
Valores socialmente altruístas levam à preocupação com as questões ambientais
baseados nos custos ou benefícios para outras pessoas, sejam eles indivíduos, um bairro, uma
rede social, um país, ou toda a humanidade, enquanto que as preocupações com a biosfera
ambiental são baseadas em um valor para todos os seres vivos, não só para os seres humanos.
Percebe-se, no entanto, que os valores egoístas emergem mais fortemente nos grandes
centros urbanos. As cidades, de um modo geral, e particularmente a cidade de São Paulo, sofrem
com o contingente migratório desordenado que provoca impactos no sistema ambiental, alterando
bruscamente a paisagem e modificando o ambiente de forma implacável com o surgimento de
lixões e esgotos correndo a céu aberto, favelas e outros problemas socioeconômicos oriundos do
crescimento não planejado.
O bem estar da humanidade e a proteção do meio ambiente dependem do
compromisso dos governos, das empresas e da sociedade. Assim, buscar a melhoria da qualidade
de vida das pessoas e a proteção ambiental são responsabilidades coletivas e devem estar entre as
prioridades de toda atividade pública.
Um ponto importante nessa relação é identificar quais as crenças e valores que
determinam os comportamentos das pessoas, tanto em relação à defesa do meio ambiente para si,
como para sua família e para a sociedade como um todo. Há necessidade de uma reflexão sobre a
43
questão do lixo, para se chegar ao entendimento de que, afinal, todos são responsáveis pelos
resíduos gerados.
Em geral a experiência direta com o lixo produzido tende a ser limitada, portanto, é
muito difícil que os pensamentos e sentimentos sobre a atitude de descarte, reutilização ou
reciclagem de lixo, sejam explorados. Vários fatores interferem na intenção de adquirir hábitos
coerentes com as necessidades de preservação da saúde das pessoas e do meio ambiente, por
exemplo: valores pessoais, estilos de vida, crenças, idade, personalidade, e, no caso de moradores
em favelas, destacam-se ainda os recursos de infra-estrutura disponíveis.
A preocupação com os problemas do meio ambiente tem provocado um aumento da
percepção das pessoas sobre vários elementos que o impactam, e a sua inter-relação, porem não
tem sido suficiente para alterar substancialmente as suas ações (HORSLEY, 1977). Segundo
Horsley (1977), os fatores que contribuem para a falta de mudança de comportamento ambiental
são identificados como:
Inconveniência pessoal em mudar um estilo de vida;
Justificativas inconsistentes por parte dos indivíduos sobre a gravidade da situação
ambiental;
Confusão sobre as responsabilidades individuais e das agências do Estado sobre
cuidar do meio ambiente;
A impressão de que uma lei possa garantir a solução do problema ambiental;
O temor do aumento dos custos financeiros pessoais;
A ignorância ou a falta de aceitação da posição de que o homem, sua cultura e o
ambiente natural vivem como uma comunidade interdependente, e que todos serão
prejudicados quando um de seus componentes for degradado.
Desta forma, a falta de mudança do comportamento individual para a conservação
ambiental pode ser explicada pela dissonância cognitiva entre o compromisso público de uma
pessoa de cuidar do meio ambiente e a falta de um comportamento ativo em fazer algo de
positivo para o ambiente (HORSLEY, 1977).
De acordo com Horsley (1977), as pressões têm forçado os indivíduos a reduzir a
dissonância, mudando uma destas três forças: a) crenças sobre as condições graves do ambiente;
44
b) conhecimento sobre o meio ambiente; ou c) as prioridades das questões sociais. Dependendo
dessas três forças, a atitude pode ser alterada.
Para a finalidade deste estudo é relevante compreender quais são as forças que
mobilizam as pessoas a alterarem seu comportamento ambiental, no entanto, a condição
socioeconômica é o que determina, na maioria das vezes, a qualidade e a quantidade de exposição
ambiental, já que grande parte da população das favelas vivencia ou experimenta o meio
ambiente através da pobreza (GOUVEIA, 1999). Assim, a combinação de riscos
socioeconômicos e ambientais elevados, experimentados pelos grupos de moradores em favelas
pressupõem uma abordagem diferenciada para a relação pessoa-meio ambiente.
2.3.2 Mobilizadores do comportamento pró-ambiental
Os primeiros estudos para se identificar os mobilizadores do comportamento pró-
ambiental eram de natureza experimental (que os tornava limitados por necessidade) ou
naturalistas, que, em geral, eram limitados por decisão dos pesquisadores (CORRAL-
VERDUGO; PINHEIRO, 1999). Essas pesquisas buscavam aumentar a probabilidade da
ocorrência de comportamentos pró-ambientais através de seu reforçamento, numa postura
Behaviorista.
Por exemplo, a pesquisa realizada por Burgess, Clark e Hendee (1971), verificou que
reforçadores positivos aos usuários de um parque público aumentava a possibilidade de que eles
depositassem seu lixo no lugar apropriado. Os resultados mostraram que a quantidade de lixo
depositada fora dos recipientes diminuía visivelmente.
O mesmo procedimento foi aplicado por Everett, Hayward e Meyers (1974) para
incrementar o uso de transporte coletivo. Eram entregues cupons para a troca por uma grande
variedade de produtos a todas as pessoas que tomassem um ônibus preliminarmente definido. A
entrega dos reforçadores produziu um aumento de 150% no uso desse tipo de transporte.
De outra forma, o reforçador também pode agir negativamente sobre as pessoas. O
trabalho realizado por Crump et al. (1977) demonstrou que o índice de lixo jogado em lugares
públicos tem uma correlação positiva com a quantidade de lixo já presente. De maneira geral, a
existência de uma alta incidência de lixo depositado irregularmente no ambiente faz com que as
pessoas passem a adotar um comportamento complacente com a sujeira.
45
A retroalimentação é uma outra técnica largamente utilizada para modelagem do
comportamento. Consiste em oferecer informação aos indivíduos sobre as conseqüências de sua
conduta pró ou antiambiental. Kohlenberg, Phillips e Proctor (1974), mostraram que, ao oferecer
aos sujeitos do estudo uma retroalimentação contínua sobre seu consumo de energia elétrica, se
promovia uma redução do consumo.
Em outros casos aplicava-se uma punição para a conduta antiecológica, como na
pesquisa realizada por Agras, Jacob e Ledebech (1980) em que as multas aplicadas ao excesso de
consumo de água produziam uma diminuição significativa no seu gasto. Esse resultado indicou,
conforme seus pesquisadores, que o castigo ao comportamento antiecológico produz uma
redução do mesmo.
Ainda que esses resultados tenham se mostrado favoráveis à conservação ambiental,
esses delineamentos de pesquisa apresentavam uma dependência extrema de controle externos ao
comportamento (reforçadores, castigos, antecedentes ou conseqüências da conduta ambiental),
fazendo com que o comportamento pró-ambiental dependesse da presença do reforçador, ou da
conseqüência comportamental. Ao remover essa conseqüência, produzia-se um retorno aos
padrões comportamentais iniciais, o que fazia com que os resultados fossem de pouca utilidade
prática (CORRAL-VERDUGO; PINHEIRO, 1999).
Outra vertente dos estudos do comportamento ambiental, de acordo com uma postura
cognitivista, as variáveis internas dos indivíduos é que recebem maior interesse pelos
pesquisadores. Nessa linha emprega-se uma estratégia observacional que se concentra na relação
entre a conduta ambientalmente responsável e algumas características psicológicas dos
indivíduos, como suas atitudes, seus conhecimentos e sua personalidade (CORRAL-VERDUGO;
PINHEIRO, 1999).
O trabalho realizado por Arbuthnot (1977), por exemplo, concluiu que as pessoas que
eram políticas, religiosas e socialmente liberais, e que demonstravam um lócus interno de
controle, eram pessoas que cuidavam bem do ambiente.
De acordo com Corral-Verdugo e Pinheiro (1999), a partir do final da década de 80,
passou-se a incluir fatores demográficos aos estudos. Isso permitiu verificar que os jovens são
ligeiramente mais responsáveis com o meio ambiente do que os mais velhos, os que têm maior
renda também relatam um compromisso maior com o comportamento pró-ambiental, e as pessoas
com maior nível de instrução tendem a ser mais pró-ecológicas.
46
No entanto, de acordo com Hines, Hungerford & Tomera (1987), (apud Corral-
Verdugo; Pinheiro, 1999), essas influências de variáveis demográficas sobre o comportamento
pró-ambiental são praticamente insignificantes.
Passou-se também a estudar algumas variáveis situacionais, como a pressão social
para cuidar do ambiente, o efeito de arranjos no planejamento de ambientes (de modo a tornar a
conservação do meio ambiente mais conveniente para os indivíduos), o efeito de “lembretes” no
cuidado dos recursos naturais, sendo que todos esses arranjos demonstraram ter influência
positiva no comportamento favorável ao meio ambiente.
No Brasil, um estudo realizado por Romeiro et al. (2009) buscou identificar quais as
características dos consumidores brasileiros que demonstram maior propensão em adotar
comportamentos ambientalmente amigáveis. Esses autores definem comportamentos
ambientalmente amigáveis como os comportamentos favoráveis à conservação do meio ambiente.
Esse trabalho realizou o exame de estudos relacionados ao comportamento de consumo ambiental
do período de 1990 a 2000 (ROMEIRO et al., 2009), como mostra o Quadro 1, e evidencia uma
grande quantidade de características desfavoráveis ao comportamento ambiental que fazem parte
da percepção do brasileiro.
Características dos brasileiros mais propensos à adoção do comportamento pró-ambiental
1) Interesse genérico pela natureza.
2) Reconhecimento da falta de produtos verdes.
3) Reconhecimento da ausência de estrutura que estimule a prática de ações favoráveis ao meio ambiente, de
forma a induzir a ações no comportamento cotidiano.
4) Crença de que o descarte do lixo impacta o meio ambiente, gerando dissonância aparentemente mais
acentuada nas classes A e B.
5) Sensibilidade (embora genérica) da necessidade da conservação ambiental.
Características dos brasileiros menos propensos à adoção do comportamento pró-ambiental 6) Interesses individuais em sobreposição aos coletivos, aparentemente mais acentuada entre os mais jovens.
7) Conceito restrito de preservação (associado à natureza).
8) O impacto sobre o meio ambiente é percebido e medido somente a partir da ocorrência de catástrofes
ambientais.
9) O conceito tangível de produto agressor ao meio ambiente é mais associado a danos causados à pele de
seu usuário.
10) Não reconhecimento de responsabilidade individual no sentido de observar a composição química do
47
produto menos agressiva ao meio ambiente.
11) Defesa da impotência do individuo, colocando-o em posição de vítima e isentando-o de assumir a
responsabilidade pela sua participação ativa no coletivo.
12) O poder de resolução dos problemas do coletivo fica sempre projetado no outro (governo, instituições,
mídia), que são os únicos considerados suficientemente fortes para mobilizar os indivíduos – via tributos,
leis, modismo e denúncias para as ações que revertam para o coletivo. Assim, evidencia-se:
• Transferência para as empresas da responsabilidade pela preservação ambiental;
• Transferência para o governo da responsabilidade pela punição aos agressores ambientais.
13) A compra de produtos “favoráveis ao meio ambiente” é percebida como hobby.
14) Decisões de compra baseadas mais em preço e qualidade do que em questões relacionadas com o meio
ambiente.
15) Aceitação da “prática de consumo verde” que não causa impacto no bolso.
16) Falta de embalagem é associada à baixa qualidade (produto a granel é percebido como “sem qualidade”).
17) Para o consumidor praticidade é mais importante do que a composição química não agressiva ao meio
ambiente.
Quadro 1. Características dos brasileiros mais e menos favoráveis à adoção do comportamento ambiental. Fonte: Adaptado de ROMEIRO et al. (2009, p. 161)
Ainda que meio ambiente não faça parte das prioridades dos brasileiros, uma vez que
os problemas de saúde, desemprego e segurança são citados como as maiores causas dos
problemas que os afligem, a população demonstra uma grande empatia com a temática do meio
ambiente (CRESPO, 2001). Conforme Crespo (2001), cada vez mais é atribuído um valor
positivo ao fato de que o Brasil possui recursos abundantes e que devem ser preservados.
No entanto, a motivação para a adoção de comportamentos pró-ambientais não é
padronizada. As condições precárias de urbanização e saneamento que predominam nas áreas
ocupadas por favelas, fazem com que a residência em locais próximos de cursos d’água implique
em exposição real a diversos riscos ambientais, pois, além das enchentes há um contato direto
com a água contaminada e exposição a vetores de diversas doenças (ALVES, 2006). Portanto,
nas favelas, a motivação para o comportamento pró-ambiental é fortemente influenciada pelas
condições sócio-ambientais a que está submetida essa população.
E, considerando que esta pesquisa se propõe a analisar como uma comunidade carente
responde a intervenções sociais, se torna relevante discorrer sobre os riscos e perigos a que esta
48
população está exposta, e que interferem na forma como esses indivíduos constroem sua visão de
mundo e definem suas crenças. Assim, a próxima seção discute as situações de vulnerabilidade
que interferem na capacidade de reação das pessoas.
2.4 VULNERABILIDADE
Este estudo parte do pressuposto de que os moradores de favelas são considerados
indivíduos vulneráveis porque são mais suscetíveis a danos econômicos, físicos e psicológicos
(em decorrência de) transações econômicas e relações interpessoais, por possuírem características
que limitam suas habilidades para maximizar seu bem estar.
Nesse sentido, longe de abarcar a literatura que tem por objeto esse tema, que é
imensa e variada, estão reunidos aqui trabalhos e investigações que, a partir de diferentes olhares
disciplinares, tem problematizado essas mudanças e seus impactos sobre os indivíduos e grupos
sociais. Assim, este tópico está dividido em seis blocos.
O primeiro e o segundo itens tratam da vulnerabilidade das pessoas e da sociedade, e
como a vida das pessoas e suas relações podem ser afetadas, o que contribui para uma
compreensão mais abrangente da situação sócio-econômica e ambiental dos indivíduos
moradores em favelas.
O terceiro tópico apresenta os fatores que influenciam a vulnerabilidade social, a
partir de trabalhos que descrevem as características demográficas, biofísicas e situacionais que
interferem na capacidade de reação das pessoas. Em seguida são apresentados os riscos
ambientais que agravam a situação de vulnerabilidade dos moradores de favelas.
Por fim, considerando que a investigação trata de uma experiência compartilhada por
uma comunidade, é apresentado o modelo proposto por Baker, Hunt e Rittenburg (2007) para
facilitar a análise sobre as facilidades e dificuldades das transformações de valores e
comportamentos das pessoas, e contribuir para a elaboração de programas de intervenção.
49
2.4.1 Riscos e adversidades – A questão da Vulnerabilidade
O termo vulnerabilidade tem sido utilizado freqüentemente na literatura científica,
especialmente após a década de 80, em diversas áreas do conhecimento, focalizando,
principalmente, a perspectiva de risco. De um modo geral, vulnerabilidade é representada por um
conjunto de fatores que pode aumentar ou diminuir o risco potencial a que estão expostas as
pessoas em todas as situações de sua vida (BAKER; GENTRY; RITTENBURG, 2005).
Watts e Bohle (1993) propuseram uma estrutura de três princípios básicos para
construir uma teoria sobre vulnerabilidade que consiste em entitlement, empowerment e política
econômica para definir o que eles denominaram de “espaço de vulnerabilidade”. Para estes
autores a vulnerabilidade é definida na intersecção dessas três forças, sendo que entitlement
refere-se ao direito das pessoas, empowerment, ao empoderamento, relacionado à sua
participação política e institucional, e a política econômica traduzida pela organização estrutural-
histórica da sociedade e suas decorrências.
Dessa forma, a vulnerabilidade aos perigos e situações adversas da vida se distribui de
maneira diferente segundo os indivíduos, regiões e grupos sociais e se relaciona, dentre outros
fatores, com a pobreza, com as crises econômicas, e com o nível educacional.
A relevância do estudo de populações vulneráveis foi também destacada pelo Dr.
Barney Cohen, coordenador da sessão 48 – The Demography of vulnerable populations, na XXIV
Conferência Geral de População da União Internacional para o Estudo Científico da População
(IUSSP), ao conceituar o tema de sua sessão:
(...) populações vulneráveis são constituídas por pessoas menos capazes do que outras para garantir suas próprias necessidades e interesses, devido à situação econômica, local de residência, condição de saúde, idade, nível educacional ou outra característica pessoal como raça, etnia ou sexo. A primeira etapa para desenvolver programas de apoio a estes grupos é aumentar a compreensão da magnitude e dimensões do problema, incluindo um reconhecimento maior das causas que determinam suas condições sociais e de saúde, e outras conseqüências de pertencer a um destes grupos, e um entendimento maior de como as políticas públicas podem afetá-los. (COHEN, 2001).
Cutter, Boruff e Shirley (2003) argumentam que existem três principais princípios na
investigação da vulnerabilidade: a) a identificação das condições que tornam as pessoas ou
lugares vulneráveis aos eventos naturais externos, como um modelo de exposição; b) a suposição
de que vulnerabilidade é uma condição social, uma medida da resistência da sociedade ou
50
resiliência a riscos; e, c) a integração das exposições potenciais e resiliência social com um foco
específico em determinados lugares ou regiões.
Nessa mesma direção, Wisner (1998) analisa o conceito sob a perspectiva da
vulnerabilidade que as pessoas ou populações podem apresentar em caso de exposição a
acidentes extensivos, como terremotos. O autor aponta que a vulnerabilidade e a capacidade de
reação são lados de um mesmo processo, pois estão intimamente relacionados à capacidade de
luta e de recuperação que o indivíduo pode apresentar. Argumenta, ainda, que o nível
socioeconômico, a ocupação e a nacionalidade também se relacionam a esse processo, pois
repercutem sobre o acesso à informação e serviços, e à disponibilidade de recursos para a sua
recuperação, os quais, por sua vez, potencializam ou diminuem a vulnerabilidade.
No Brasil, a partir da transição dos anos 90, o processo de inserção do país na nova
ordem mundial, e sua interação com processos internos de mudança, colocaram novos desafios às
análises (TORRES et al., 2003). Pobreza, desigualdades e segregação social, apesar de não serem
temas novos no interior do debate acadêmico brasileiro, têm merecido destaque frente às
transformações em curso, principalmente no que diz respeito à nova configuração sócio-espacial
que caracteriza as grandes metrópoles brasileiras.
A avaliação das tendências e abordagens que deram origem aos estudos de
vulnerabilidade, principalmente ligada aos riscos e perigos, indica que a ênfase dada ao termo
atualmente, não é apenas uma mudança ideológica ou um novo foco que a academia escolheu
para produzir sua leitura da realidade (MARANDOLA JR.; HOGAN, 2005).
Para Kelly e Adger (2000), a vulnerabilidade diz respeito às diferenças individuais e
às formas de lidar com elas, associadas às dificuldades ambientais e aos recursos disponíveis
(materiais, humanos, financeiros). Existe uma complexa interação entre a predisposição
individual à vulnerabilidade, contexto social e cultural, e a presença ou ausência de estrutura
social.
Nesse caso, o conhecimento dos benefícios da relação entre meio e fim, assume que,
em virtude da escolaridade formal, educação autodidata, ou experiência cotidiana, certas pessoas
têm maior ou menor consciência dos meios necessários para atingir seus próprios objetivos ou os
objetivos aprovados pela sociedade, e possuem diferentes graus de habilidades para executar
estes meios, de forma a atingir os resultados desejados por si mesmos ou pelos outros (BAKER,
GENTRY E RITTENBURG, 2005).
51
Assim, conforme Baker et al. (2005), as pessoas são “duplamente vulneráveis”,
quando não sabem o que é bom para elas e não têm os recursos para adquiri-los. As pessoas são
“economicamente vulneráveis” quando sabem o que é bom para elas, mas não têm as habilidades,
as competências, ativos, ou outros recursos necessários para atingi-lo. Já as pessoas têm muitos
recursos para atingir o que precisam, mas simplesmente não sabem o que é bom para elas são
denominadas “culturalmente vulneráveis”. Por fim, as pessoas não são vulneráveis quando
conhecem os meios para alcançar fins e benefícios e têm abundância de recursos para adquirir os
meios adequados.
Essa definição de tipos de (in)vulnerabilidade significa que qualquer um, ou todos os
quatro tipos, podem mudar a qualquer momento por causa de uma alteração dos recursos,
mudanças em suas habilidades, ou qualquer outra circunstância que possa afetar o conhecimento
de uma pessoa, ou a relação de beneficio entre meio e fim, e/ou o acesso aos meios para atingir o
benefício (BAKER et al., 2005).
Existe uma multiplicidade de áreas em que vários graus de vulnerabilidade podem
ocorrer, com diferenças entre as pessoas, de tal forma que qualquer pessoa é suscetível a
apresentar baixa vulnerabilidade em alguma área, mas alta vulnerabilidade em outra.
De uma forma geral, todas as pessoas, jovem ou velho, saudável ou doente, rico ou
pobre, enfrentam ou poderão enfrentar, em um momento ou outro, uma posição de
vulnerabilidade quando se deparam com situações difíceis em suas vidas, como a morte de um
ente querido, separações, perda de emprego ou outras situações adversas (GENTRY et al., 1994;
GENTRY et al., 1995). Define-se assim vulnerabilidade, com base em experiências onde lhes
falta clareza.
No entanto, definir vulnerabilidade pode criar discrepâncias. De acordo com Smith e
Cooper-Martin (1997) existe uma diferença entre vulnerabilidade real e vulnerabilidade
percebida. A vulnerabilidade real ocorre quando ela é, de fato, experimentada, e só pode ser
entendida ouvindo e observando as próprias experiências, enquanto que a vulnerabilidade
percebida ocorre quando os outros acreditam que uma pessoa é ou está vulnerável, mas ele ou ela
pode não ser. A vulnerabilidade percebida é um equívoco que ocorre quando os indivíduos
projetam nos outros, o que acham que é, deve-se levar em consideração a vulnerabilidade real e
não a percebida (BAKER et al., 2005).
52
Portanto, uma intervenção social terá maior probabilidade de obter sucesso se os
indivíduos envolvidos forem ouvidos, ou ainda mais, se forem oferecidas oportunidades para que
eles se expressem, e, a partir daí, as respostas do mercado e das políticas sociais estarão ligadas
às respostas dos indivíduos, assim como o sentido da vulnerabilidade real e da vulnerabilidade
percebida.
Segundo Baker, Hunt e Rittenburg (2007), o processo de transformação das
competências e habilidades que pode minimizar a vulnerabilidade de um indivíduo, ou de um
grupo de pessoas, acontece ao longo do tempo, em mudanças incrementais, e em várias respostas.
A obtenção dos resultados positivos provoca mudança de valores, de comportamentos e alteração
de procedimentos. Portanto, as experiências vivenciadas podem ser transformadoras, tanto
individual como coletivamente.
2.4.2 Vulnerabilidade Social – Origem e Definição
A utilização do conceito de “vulnerabilidade social” advém do termo “estado de
exclusão”, que num primeiro momento foi utilizado para caracterizar situações sociais limites, de
pobreza ou marginalidade (DEDECCA et al., 2007). O estado de exclusão é caracterizado por um
conjunto de situações marcado pela falta de acesso a meios de vida, tais como falta de emprego,
de renda, de propriedades, de moradia, de um nível mínimo de consumo, assim como a ausência
ou dificuldades no acesso ao crédito, à terra, à educação, à cidadania, a bens e serviços públicos
básicos (DEDECCA et al., 2007).
A exclusão social é um fenômeno que coloca em relevo as desigualdades econômicas,
políticas e culturais que tem uma base territorial de referência (NAHAS et al., 2009). Nesse
sentido, a exclusão é definida como uma desigualdade social com origem nos processos
econômicos, políticos ou culturais, e o resultado desses processos leva a aumentar a
vulnerabilidade social dos indivíduos, famílias e sociedade.
Tanto o conceito de exclusão social como o de vulnerabilidade social, têm a pretensão
de superar e incorporar o conceito de pobreza (NAHAS et al., 2009). Pobreza não pode ser
definida de forma única, mas ela se evidencia quando parte da população não é capaz de gerar
renda suficiente para ter acesso sustentável aos recursos básicos que garantam uma qualidade de
53
vida digna. Estes recursos são: água, saúde, educação, alimentação, moradia, renda e cidadania.
De acordo com Yasbek (2003), são pobres aqueles que, de modo temporário ou permanente, não
tem acesso a um mínimo de bens e recursos sendo, portanto, excluídos em graus diferenciados da
riqueza social.
O conceito de pobreza relaciona-se diretamente com a falta e a carência, enfatizando a
carência material. Em especial, ressalta-se a falta de recursos financeiros que indica tanto a
ausência de elementos essenciais para a subsistência e para o desenvolvimento pessoal, como um
fracasso das ferramentas necessárias para se abandonar essa posição (NAHAS et al., 2009).
Como exprimem Salama e Destrema (1999) apud Nahas et al. (2009, p. 9), “esta
noção apóia-se na percepção de sinais externos de pobreza, que fazem eco com as representações
estabelecidas: os pobres são, antes de tudo, representados pelo que não têm ou pelo que não são”.
Portanto, refere-se mais a uma característica do que a uma situação, enquanto que o
conceito de vulnerabilidade social, nos últimos anos, apresenta uma maior reflexão sobre o
fenômeno da pobreza, deixando de avaliar apenas os indicadores econômicos ou de carências não
atendidas, abordando de forma mais integral e completa as diversas modalidades de desvantagem
social (ABRAMOVAY et al., 2002; ALMEIDA, 2006).
As situações de vulnerabilidade podem ser geradas não apenas pela sociedade, mas
também pela maneira como as pessoas lidam com as perdas, os conflitos, a morte, a separação ou
com as rupturas (ALMEIDA, 2006). Fatores como a fragilização dos vínculos afetivo-relacionais
e de pertencimento social (discriminações etárias, étnicas, de gênero ou por deficiência) ou
vinculados à violência, ao território e à representação política também afetam as pessoas.
Dessa forma, conforme Abramovay et al. (2002), as configurações vulneráveis são
aquelas que não se restringem somente às situações abaixo da linha da pobreza, mas a toda
população em geral, partindo do reconhecimento do fenômeno do bem estar social de uma
maneira dinâmica, e das múltiplas causas e dimensões associadas a esse processo.
A capacidade de resposta (alta, média ou baixa) dos indivíduos e das famílias, frente
às mudanças e desafios impostos pelo ambiente natural e social, pode ser expressa através de
sentimentos de desamparo, medo e insegurança, frente à exposição aos riscos envolvidos na vida
em sociedade (BUSSO, 2001).
54
Vulnerabilidade social coloca em discussão as desvantagens sociais nas relações
entre: a) os ativos físicos, financeiros, humanos e sociais disponíveis aos indivíduos e às famílias;
b) a estrutura de oportunidades definidas pelo mercado, pelo Estado e pela sociedade civil, e c) as
estratégias de uso dos ativos (BUSSO, 2001).
O primeiro elemento diz respeito à posse ou ao controle dos recursos materiais que
permitem aos indivíduos se desenvolverem em sociedade. O segundo refere-se às estruturas de
oportunidades que provêem do mercado, do Estado e da sociedade. Elas se vinculam em níveis de
bem estar, aos quais se pode ascender em um determinado tempo e território, podendo propiciar o
uso mais eficiente dos recursos ou ainda recuperar aqueles esgotados. Por fim, o terceiro
elemento refere-se a estratégias quanto ao uso que os indivíduos fazem de seu conjunto de ativos
com vistas a fazer frente às mudanças estruturais de um dado contexto social.
No que tange à interação desses três componentes da vulnerabilidade social, Busso
(2001) coloca:
A mobilização de ativos se realiza tanto como estratégias adaptativas, defensivas ou ofensivas a mudanças no conjunto de oportunidades, e têm como finalidade fortalecer a quantidade, qualidade e diversidade de ativos disponíveis para ascender de forma distinta e mais satisfatória ao conjunto de oportunidades que são fornecidas pelo ambiente (BUSSO, 2001, p. 14).
Nesse sentido, a vulnerabilidade ou segurança de qualquer grupo é determinada pelos
recursos disponíveis e pelo direito dos indivíduos e grupos em recorrer a esses recursos (KELLY;
ADGER, 2000). A situação de carência e deterioração compromete não apenas a situação
presente, com o enfraquecimento da trama social, mas também as gerações futuras tendo em
conta a transferência intergeracional da pobreza. É quase um “círculo vicioso” que reproduz as
condições de marginalização (PERONA et al., 2000).
Quando se apela ao conceito de carência para descrever uma situação de pobreza,
também se refere à deterioração dos vínculos relacionais que se traduzem num alijamento da vida
pública, onde a presença política e sua influência social se mantêm no plano formal, ao invés da
participação real. O enfoque da vulnerabilidade social proposto por Busso (2001) afirma que esta
é uma noção multidimensional, com raízes em fatores internos e externos aos indivíduos que,
combinados, causam danos ou comprometem a capacidade de resposta das pessoas.
55
2.4.3 Fatores que influenciam Vulnerabilidade Social
Há um consenso geral no seio da comunidade das ciências sociais sobre alguns dos
principais fatores que influenciam a vulnerabilidade social. Estes incluem: falta de acesso aos
recursos (incluindo a informação, conhecimento e tecnologia); acesso limitado ao poder político e
de representação; capital social, incluindo as redes sociais e conexões; crenças e costumes;
moradia; idade; indivíduos fisicamente ou mentalmente limitados; tipo e densidade de infra-
estrutura e linhas de vida (CUTTER; BORUFF; SHIRLEY, 2003).
Apesar da atenção que tem sido dispensada aos componentes biofísicos da
vulnerabilidade e da vulnerabilidade do ambiente construído, os aspectos sociais da
vulnerabilidade socialmente criada tem sido ignorada, principalmente devido à dificuldade em
quantificá-las, o que também explica por que as perdas sociais estão normalmente ausentes dos
relatórios de custos e estimativas de perdas na seqüência de catástrofes (CUTTER; BORUFF;
SHIRLEY, 2003).
A vulnerabilidade social é mais freqüentemente descrita usando as características
individuais das pessoas (idade, raça, saúde, renda, tipo de moradia, emprego), no entanto a
vulnerabilidade social é particularmente produto das desigualdades sociais, dos fatores sociais
que influenciam ou formam a suscetibilidade de vários grupos.
Além disso, a própria condição social, mesmo em termos de classes, age de diferentes
maneiras na forma como pessoas e grupos irão enfrentar o risco. Estes elementos que promovem
a absorção do impacto do risco / perigo podem ser entendidos em termos de capacidade de
resposta, que é um dos principais elementos componentes da vulnerabilidade e que prejudicam ou
regulam a sua capacidade de responder (CUTTER, 2005; CUTTER; BORUFF; SHIRLEY, 2003;
MARANDOLA JR.; HOGAN, 2006).
O estudo de Cutter, Boruff; Shirley (2003) utilizou o modelo perigos-do-lugar, para
examinar os componentes de vulnerabilidade social em relação aos riscos ambientais (terremotos,
tornados, inundações). Nesse modelo, o risco (um objetivo mede a probabilidade de um evento de
risco) interage com a mitigação (medidas para reduzir os riscos ou reduzir o seu impacto) para
produzir o perigo potencial. O potencial de risco é moderado ou envolvido tanto por um filtro
geográfico (local e situação do local), bem como pelo tecido social do lugar.
56
O tecido social inclui a experiência da comunidade com os riscos, e a capacidade da
comunidade para responder, lidar com, recuperar, e se adaptar aos riscos, que por sua vez, são
influenciados pelas características econômicas, demográficas e de habitação. A vulnerabilidade
social e biofísica interagem para produzir a vulnerabilidade geral do lugar.
O Quadro 2 resume um conjunto de características que influenciam a vulnerabilidade
social, e que são mais freqüentemente encontradas na literatura norte-americana.
Conceito Descrição Aumenta (+)
ou diminui (-)
Vulnerabilidade
Social
Status
Socioeconômico
(renda, poder político,
prestígio)
A habilidade para absorver perdas e aumentar a resiliência aos riscos
dos impactos. A riqueza permite às comunidades absorver e
recuperar as perdas mais rapidamente devido a seguros, redes de
segurança social e direito a programas.
Alto status (+ / -)
Baixa renda ou
status (-)
Gênero As mulheres podem ter mais dificuldade durante a recuperação que
os homens, muitas vezes devido a empregos em setores específicos,
salários mais baixos e maiores responsabilidades com os cuidados
familiares.
Gênero (+)
Raça e Etnia Barreiras lingüísticas e culturais afetam o acesso a financiamento e
habitação em locais fora das áreas de perigo.
Brancos (-)
Não brancos (+)
Idade Extremos do espectro etário afetam o movimento para sair do
perigo. Pais perdem tempo e dinheiro para cuidar das crianças
quando as creches são afetadas; idosos podem ter limitações de
mobilidade ou preocupação com a crescente carga de cuidados
gerados e da falta de resiliência.
Idosos (+)
Crianças (+)
Desenvolvimento
comercial e industrial
O valor, qualidade e densidade de edifícios comerciais e industriais
fornece um indicador do estado de saúde econômica de uma
comunidade, e o potencial de perdas na comunidade empresarial e as
questões de longo prazo com a recuperação após um evento.
Alta densidade (+)
Alto valor (+)
Perda de emprego A potencial perda de emprego após um desastre agrava o numero de
trabalhadores desempregados nas comunidades, contribuindo para
uma recuperação mais lenta.
Perda de emprego
(+)
Rural / Urbana Residentes em zonas rurais podem ser mais vulneráveis devido à Rural (+)
57
baixa renda e mais dependentes da localidade baseada na extração
de recursos econômicos (por exemplo, agricultura, pesca). Alta
densidade de áreas urbanas complicam a evacuação fora da zona de
perigo.
Urbana (+)
Imóvel residencial O valor, qualidade e densidade das construções residenciais afetam
perdas potenciais de reconstrução. A mobília das casas são
facilmente destruídas, e menos resistentes aos riscos.
Mobília das casas
(+)
Infraestrutura e linha
da vida
Perda de rede de esgotos, pontes, água, comunicação e infra-
estrutura de transporte compõem potencias perdas em desastres. A
perda da infra-estrutura pode colocar encargos financeiros
insuperáveis sobre as comunidades menores onde faltam recursos
financeiros para a reconstrução.
Infraestrutura (+)
Profissões Algumas profissões, especialmente aquelas que estão envolvidas
com a extração de recursos, podem ser severamente impactadas por
um evento de risco. Pescadores sofrem quando seus meios de
produção são perdidos e se vêem obrigados a se engajar em
empregos com mais baixo rendimento.
Profissionais
independentes (+)
Estrutura familiar Famílias com grande número de dependentes ou famílias
monoparentais, com finanças limitadas, têm a capacidade de
resiliência afetada para a recuperação dos danos.
Alta taxa de
nascimento (+)
Famílias grandes
(+)
Educação Educação está ligada ao status sócio econômico. Ensino superior
resulta em maior vida útil do salário. Baixa educação restringe a
capacidade de compreender as informações e o acesso aos recursos
de recuperação.
Baixa educação (+)
Alta educação (-)
Crescimento da
população
Em municípios que experimentam um crescimento rápido podem
não ter tido tempo para se adaptarem às populações aumentadas.
Crescimento
rápido (+)
Serviços médicos Médicos, asilos e hospitais são importantes recursos de alívio pós-
evento. A falta de serviços médicos imediatos irá prolongar o
socorro e a recuperação de longo prazo dos desastres
Baixa densidade de
serviços médicos
(+)
Dependentes sociais As pessoas que são totalmente dependentes dos serviços sociais para
a sua sobrevivência já são economicamente e socialmente
marginalizados, e exigem novos apoios no período pós-desastres.
Alta dependência
(+)
Baixa dependência
(-)
Populações com
necessidades
Doentes, moradores em abrigos, sem-teto, apesar de difícil de
identificar e medir, são desproporcionalmente afetados durante
População com
necessidades
58
especiais desastres por conta de sua invisibilidade nas comunidades e são
principalmente ignorados durante a recuperação.
especiais (+)
Quadro 2. Conceitos de Vulnerabilidade Social Fonte: Adaptado de Cutter, Boruff e Shirley (2001).
Observa-se, através dos conceitos descritos no quadro acima, que a vulnerabilidade
social pode ser analisada não apenas como um fenômeno social ou biofísico, mas como uma
complexa interação entre os dois. As discussões em curso sobre a utilização do tema da
vulnerabilidade são especialmente úteis na medida em que dizem respeito a uma área que está
intimamente ligada à pobreza e marginalização social, como é o caso dos moradores em favelas.
Da mesma forma que a pobreza e a marginalização social, os desastres naturais são
também considerados como uma coincidência entre os riscos naturais (tais como inundações,
ciclones, terremotos e secas) e condições de vulnerabilidade. “Existe um grande risco de
desastres quando um ou mais riscos ocorrem numa situação vulnerável” (DELOR; HUBERT,
2000, p. 1561).
A idéia de populações em situação de risco consolida uma percepção dos
pesquisadores de que perigos e riscos ambientais atingem de forma mais intensa populações
vulneráveis (MARANDOLA JR; HOGAN, 2006). Os desastres, na maioria das vezes, trazem à
tona as carências que caracterizam os lugares e as vidas de muitas pessoas.
Tanto a pobreza, como deficiências, certos estilos de vida, determinadas formas de
produção, ou qualquer outro fator suscetível, contribuem para que determinados grupos humanos
sejam atingidos com maior intensidade pelos desastres naturais. Isso explica o fato de que todas
as pessoas que sentem as influências dos mesmos fatores, não sofrem da mesma maneira
(DELOR, HUBERT, 2000).
De acordo com Wisner (1993), o desafio no campo da pesquisa da vulnerabilidade é
criar maneiras de analisar a vulnerabilidade na vida cotidiana. Em outras palavras, a atenção deve
ser dada às condições da vida real da população, a fim de discernir as potencialidades e as
deficiências que podem torná-los vulneráveis aos eventos adversos.
Nesse sentido, Rodriguez (2001) sugere que a noção de vulnerabilidade precede a
identificação dos grupos posto que exige especificar riscos e determinar tanto a capacidade de
59
respostas das unidades de referência, como sua habilidade para adaptar-se ativamente. Nesse
sentido, a fragilidade das instituições e a falta de equidade sócio-econômica podem ser
consideradas riscos, pois obstruem o desenvolvimento sócio econômico e impedem a coesão
social.
A falta de ativos e/ou a indisponibilidade de estruturas nas favelas significam
“desvantagens sociais”, ou seja, condições sociais que afetam negativamente o desempenho de
comunidades, famílias ou pessoas. Implica em menor acesso (conhecimento e/ou disponibilidade)
e menos capacidade de gestão dos recursos e das oportunidades que a sociedade dispõe. A
pobreza é um fator de desvantagem pelas limitações que ela impõe aos indivíduos
(RODRIGUEZ, 2001).
Para Rodriguez (2001), existe um conjunto de características demográficas que estão
ligadas à capacidade das pessoas e/ou famílias de mobilizar os ativos disponíveis na sociedade.
Essas características podem ser agrupadas em três dimensões, apresentadas a seguir:
a) Estrutura Familiar – nessa dimensão são destacados dois fenômenos que tendem a
acentuar a vulnerabilidade: o aumento da uniparentalidade (a família formada por chefe e cônjuge
teria melhores condições para atender os aspectos emocionais, financeiros, de tempo e de
trabalho para a manutenção de um lar com dependentes menores), e o aumento da proporção de
mulheres chefes de família (que teriam maiores dificuldades para o seu desenvolvimento
quotidiano);
b) Ciclo de vida – famílias que se encontram nas etapas finais do ciclo (por restrições
biológicas), e nas etapas iniciais (pela falta de experiência) tenderiam a apresentar maiores
dificuldades para dispor de ativos;
c) Aspectos demográficos tradicionais – o tamanho da família (número de membros)
seria um indicativo de vulnerabilidade já que o custo de sua manutenção é maior e, portanto,
menor a capacidade de acumulação. Há também evidências empíricas de que os pobres vivem,
em média, em famílias maiores, sendo que um maior número de crianças também implica em
desvantagens para a família, no sentido de que os recursos se diluem na criação de menores.
60
2.4.4 Vulnerabilidade aos riscos ambientais
A idéia de risco implica na existência de um agente “ameaçador” e de um agente
“receptor” da ameaça. Nessa concepção, o risco pode ser entendido como a maior probabilidade
de determinados indivíduos ou grupos serem ameaçados por fenômenos específicos.
Um aspecto fundamental relacionado ao entendimento do que são riscos ambientais,
diz respeito à questão da espacialidade (TORRES, 2006). Pode-se dizer que os riscos ambientais
são espacialmente distribuídos, ou seja, terremotos ocorrem em lugares específicos, comunidades
residentes em áreas próximas a fábricas estão mais sujeitas à poluição, enchentes ocorrem com
maior freqüência em várzeas ou em áreas onde a drenagem é insuficiente.
Torres (2006) defende que os fenômenos ambientais são muitas vezes espaciais, e os
riscos ambientais também podem ser entendidos como fenômenos espaciais, e que variam ao
longo da dimensão espacial, isto é, são maiores em alguns lugares do que em outros.
Esse mapeamento do risco ambiental, quando associado a aspectos sócio econômicos,
revela dimensões importantes da questão da vulnerabilidade de indivíduos ou grupos. Riscos
sociais e ambientais tendem a ser cumulativos (TASCHNER, 1992). Torres (1997) cita como
exemplo, os residentes em áreas de inundação da Zona Leste de São Paulo que são,
cumulativamente, mais pobres e vivem em condições residenciais e sanitárias mais precárias que
o conjunto da população.
A situação topográfica das favelas paulistas revela que quase 50% dos assentamentos
estão situados à margem de córregos ou várzeas, inúmeros deles sujeitos a enchentes. De uma
forma geral, ocupam áreas municipais de uso comum e se localizam em encostas com
declividades acentuadas, com alta propensão à erosão, ou em fundos de vales, sendo que muitos
estão localizados sobre aterro sanitário/lixão, ou ainda à margem de via férrea (TORRES, 1997).
O desgaste mais vinculado a fenômeno natural na cidade de São Paulo liga-se a
chuvas e inundações (TASCHNER, 2006). De acordo com Taschner (2006), a cada inundação é
revelada parte da realidade urbana que permanecia oculta: deslizamentos e desmoronamentos em
favelas, assentamentos precários, obras de infra-estrutura mal construídas e sem manutenção, a
ocupação predatória do solo urbano e a quantidade de lixo e resíduos sólidos dispostos de forma
inadequada.
61
As inundações não poupam camadas da população com renda média e alta, no
entanto, atingem de forma dramática os grupos sociais menos favorecidos, ameaçando seus
poucos bens e suas vidas. Assim, para os moradores de favelas, a moradia é definida como um
bem de grande relevância. É um elemento que, muitas vezes, define o tipo de risco ou de
vulnerabilidade a que estão sujeitos os seus ocupantes.
Nessa linha, foram produzidos dois importantes trabalhos, o Mapa da Vulnerabilidade
Social da população da cidade de São Paulo (CEM-CEBRAP, SAS-PMSP, 2004) e o Índice
Paulista de Vulnerabilidade Social - IPRS (SEADE, 2000), que partilham do mesmo marco
conceitual. Explicitam que as situações de privação social têm um componente espacial que se
expressa em níveis de segregação residencial, traduzidos em uma diferenciação sócio-espacial
marcada também pela presença ou ausência de acesso à infra-estrutura, serviços, bens culturais,
entre outros fatores, que inclui ainda a qualidade dessa oferta, e que contribui para a produção ou
reprodução das desigualdades.
Nesse sentido, verifica-se que a concepção de casa mudou na sociedade através dos
tempos. Casa passou a ser muito menos um lugar onde viver e trabalhar estão conectados, e
muito mais um símbolo da riqueza relativa que ajuda a definir os indivíduos na sociedade (HILL,
1991). A casa, em especial, oferece um importante bloco de construção de identidade, pois,
reflete a própria história, interesses especiais, pontos fortes e fracos (SAYRE, 1994). Não é
apenas uma estrutura que contém uma coleção de objetos, é o ambiente que oferece conforto e
segurança.
De acordo com Frawley (1990) apud Hill (1991), a moradia tornou-se uma medida do
sucesso de cada pessoa e uma condição para uns diferenciarem-se dos outros. Para o homem, a
moradia é um elemento essencial na vida (Artigo XXV – Declaração Universal dos Direitos
Humanos). Assim, torna-se importante compreender que morar na favela é fator que reduz a vida
da pessoa e leva à rejeição de si próprio. Muitas vezes, os indivíduos são rejeitados pela própria
família, que coloca neles a culpa por estarem ali (GIACOMINI et al., 1987). A segregação
residencial é apontada não só como um resultado desses processos, mas é considerada também
como determinante das condições de vida.
Além disso, em uma grande região metropolitana como São Paulo, que no ano 2000
concentrava 18 milhões de pessoas, o problema da localização da pobreza não é nada simples.
Embora políticas de redução de pobreza sejam dirigidas a esses grupos sociais, quando os
62
recursos são escassos existe uma tendência de não investir nas regiões menos “visíveis”, nas
quais vivem os extremamente pobres (TORRES et al., 2003).
2.4.5 Vulnerabilidade como experiência compartilhada
Para se atingir o objetivo do conhecimento proposto nesta pesquisa, ou seja, investigar
como as ações de uma intervenção em relação ao descarte e manejo do lixo domiciliar, e se as
experiências compartilhadas durante a intervenção, facilitam (ou dificultam) a transformação dos
valores e comportamentos dos indivíduos de uma comunidade vulnerável, considerou-se
relevante a inclusão do estudo realizado por Baker, Hunt e Rittenburg (2007).
Este estudo apresenta um novo enfoque para a vulnerabilidade, examinando a questão
a partir do compartilhamento das experiências vivenciadas pelos indivíduos e grupos sociais,
trabalhando de forma ativa e construtiva. Portanto, é coerente com o presente estudo, onde a
dimensão do compartilhamento também está presente numa intervenção social.
O trabalho realizado por Baker, Hunt e Rittenburg (2007) examina a vulnerabilidade,
a partir de uma experiência compartilhada por uma comunidade que enfrentou um tornado de
grandes proporções. Parte da definição de vulnerabilidade atribuída por Baker, Gentry e
Rittenburg (2005, p. 134), “vulnerabilidade acontece quando uma pessoa se sente impotente, sem
o controle, e dependente de uma situação que tem implicações negativas para sua própria
identidade”.
O estudo analisa a forma e o conteúdo de vulnerabilidade compartilhada, ou seja,
como os indivíduos e a comunidade respondem à vulnerabilidade, e como podem ser
transformados a partir de experiências compartilhadas de vulnerabilidade e por seus esforços de
recuperação coletiva.
Os autores argumentam que fatores múltiplos e simultâneos, internos e externos aos
indivíduos, contribuem para a experiência de vulnerabilidade. Como fatores internos estão as
características individuais: biofísicas (tais como raça, etnia, idade, gênero, deficiências
cognitivas) e psicossociais (tais como auto-estima, status socioeconômico, medo de ser vitimado,
habilidades de percepção), enquanto que, como fatores externos, são elencados: a estigmatização
e a repressão, a distribuição de recursos, elementos físicos, logísticos e outras condições
63
ambientais, tais como situação econômica, social e política que muitas vezes estão fora do
controle dos indivíduos.
Um importante argumento defendido por Baker, Gentry e Rittenburg (2005) diz
respeito ao empoderamento individual que contribui para o restabelecimento da situação de
vulnerabilidade, ou seja, as pessoas devem ser tratadas como elas desejam ser tratadas, e não
como os outros acham que deve ser. Nesse sentido, tanto suas necessidades, como o estado ou a
condição de vulnerabilidade, podem não ser atendidos se os próprios indivíduos não forem
ouvidos. A condição essencial para a superação da vulnerabilidade é que as pessoas tenham
capacidade de superar as dificuldades por elas próprias.
Os resultados da pesquisa desses autores os levaram a construir um modelo, conforme
apresentado na Figura 2, sobre a experiência de vulnerabilidade que os indivíduos pesquisados
enfrentaram, e como eles transpuseram esse estado.
Figura 2. Modelo de Vulnerabilidade como uma Experiência Compartilhada. Fonte: Baker, Hunt e Rittenburg (2007)
O modelo conceitual de vulnerabilidade compartilhada, proposto por Baker, Hunt e
Rittemburg (2007), demonstra que tantos os indivíduos como as comunidades, com suas
Fatores que influenciam
experiências de Vulnerabilidade
Experiências compartilhadas de Vulnerabilidade a partir do Tornado
(individuais e coletivas)
Respostas individuais,
coletivas e de Políticas Públicas
para Vulnerabilidade
Resultados (Individuais e
coletivos)
Mudanças de comportamen-
tos
Mudanças de valores
Mudanças de políticas
Facilitam o controle
Impedem o controle
Ameaças à saúde e
segurança
Perda de vidas, bens e outros
ativos
Condições externas
Características da comunidade
Características individuais
64
características pré-existentes e as condições externas são fatores que afetam as experiências e as
respostas à vulnerabilidade.
As características pré-existentes dos indivíduos são traduzidas pelo seu status de
segurança, pelos papéis desempenhados, enquanto que da comunidade incluem a sua base
econômica, seus recursos, sua história, seus símbolos coletivos e valores. As condições externas
são representadas pelas condições estruturais e ambientais.
Os autores também defendem que as pessoas têm capacidades e habilidades pré-
existentes e que podem ser aproveitadas. Em contextos em que a vulnerabilidade é
compartilhada, os diferentes recursos das pessoas e suas habilidades podem ser empregados. No
entanto, papéis conflitantes criam diferentes percepções sobre a forma de avançar e o que a
recuperação significa e, nesse caso, quando as pessoas são informadas dos valores subjacentes
que orientam as diversas políticas, elas podem ser mais capazes de alcançar uma maior
compreensão coletiva da experiência.
O modelo proposto mostra que as respostas individuais, da comunidade e das políticas
públicas impedem ou facilitam o restabelecimento do controle. Quando uma resposta facilita o
controle, as pessoas se mobilizam em direção à recuperação da vulnerabilidade e o
restabelecimento resulta em mudança de valores, mudança de comportamentos e mudança nas
políticas e procedimentos. Portanto, as experiências de vulnerabilidade são transformadoras, tanto
em nível individual como coletivo.
Para os autores, vulnerabilidade é considerada um estado e não uma condição, já que a
vulnerabilidade geralmente é uma experiência temporária, e que as pessoas trabalham ativamente
para reduzi-la, em busca de conduzir suas vidas de volta ao estado normal. No entanto, as
respostas negativas podem causar um “ciclo vicioso” que impedem os indivíduos de se
restabelecerem, podendo permanecer relativamente vulneráveis por períodos mais prolongados,
ou ainda, perpetuar a experiência de vulnerabilidade.
65
2.5 PRESSUPOSTOS DA PESQUISA E MODELO CONCEITUAL
Os pressupostos que norteiam este trabalho são:
a) os moradores de favelas são considerados indivíduos vulneráveis porque são mais
suscetíveis a danos econômicos, físicos e psicológicos (em decorrência de) transações
econômicas e relações interpessoais, e por possuírem características que limitam suas habilidades
para maximizar seu bem estar;
b) os principais fatores presentes (e que influenciam) o descarte e manejo do lixo são
as características da comunidade, e as características dos indivíduos a ela pertencentes;
c) durante a intervenção, os indivíduos e a comunidade, como um todo, compartilham
de novas experiências em relação ao manejo e descarte do lixo;
d) as experiências compartilhadas durante a intervenção contribuem para a
transformação dos comportamentos e valores dos indivíduos e da comunidade em relação ao
descarte e manejo do lixo.
Com base na revisão da literatura referente a pesquisas anteriores apresentadas neste
capitulo, e em com consonância com a questão de pesquisa do presente estudo, foi elaborado um
modelo teórico ilustrativo do fenômeno em análise.
Muito embora um modelo seja uma simplificação da realidade e como tal está sujeito
à limitações, seu objetivo é ilustrar os constructos do fenômeno em questão, suas inter-relações e
também servir como ferramenta de suporte à reflexão, no intuito de responder ao objetivo de
conhecimento proposto neste estudo. Semelhante ao modelo construído por Baker, Hunt e
Rittenburg (2007), a Figura 3 ilustra o modelo conceitual que orienta a análise dos dados deste
estudo, que emergiu a partir do referencial teórico utilizado, e do modelo citado.
66
Figura 3. Modelo Conceitual Fonte: Adaptado de Baker, Hunt & Rittenburg (2007).
No presente estudo, da mesma forma que o modelo de Baker, Hunt e Rittenburg
(2007), foram identificados os fatores que influenciam uma intervenção social. Esses fatores são
identificados pelas características individuais e coletivas, e pelas condições externas, tais como
recursos de infra-estrutura, econômicos e ativos financeiros.
Verifica-se que as experiências compartilhadas durante a intervenção podem gerar
novas informações e aprendizados que são elementos impulsionadores das transformações.
Os elementos da intervenção (como os processos e as ações implementadas, apoio
social e políticas públicas), assim como as experiências compartilhadas (por exemplo, o aumento
de interação entre os moradores, a participação em treinamentos e seminários) são fatores que
facilitam (ou impedem) as respostas de mudanças.
Tanto os elementos utilizados durante a intervenção, como as experiências vividas
pelos indivíduos, podem resultar em transformações, tanto em nível de valores, como de
comportamentos pessoais. No entanto, dado que as capacidades e habilidades pré-existentes dos
indivíduos são diferentes, também são diferentes as formas como eles reagem à intervenção.
Fatores que influenciam a
situação de intervenção
Características
dos Indivíduos
Características
da Comunidade
Condições
Externas
Experiências compartilhadas
durante a intervenção
Elementos que facilitam ou impedem
as mudanças
Elementos da
intervenção
Experiências
compartilhadas
Mudanças de
Valores
Mudanças de
Comportamentos
Resultados da
Intervenção
Aprendizagens Aprendizagens
sobre doenças causadas pelo lixo
Aprendizagens
sobre como aumentar renda com
o lixo
Aprendizagens sobre
comportamentos interpessoais
67
Quando uma resposta facilita a transformação, as pessoas se mobilizam em direção à
mudança. No entanto, esse processo ocorre ao longo do tempo, em mudanças incrementais, e em
várias respostas, neste caso, principalmente as que são percebidas em relação às políticas
públicas.
As experiências compartilhadas são transformadoras, tanto individual como
coletivamente, porém elas não acontecem ao mesmo tempo e na mesma medida para todos os
participantes. Assim, o ciclo de realimentação ilustra o potencial de respostas que podem impedir
a transformação de valores e comportamentos.
68
3 MÉTODO DE PESQUISA
Este capítulo apresenta a metodologia utilizada na pesquisa e é composto por sete
blocos. O primeiro descreve o objeto de estudo e o segundo trata da caracterização da pesquisa. O
terceiro bloco apresenta os participantes do projeto, enquanto que no quarto são descritas as fases
da pesquisa e as técnicas de coleta de dados utilizadas. O quinto bloco trata da análise dos dados
coletados, e, em seguida, os blocos seis e sete descrevem a apresentação dos resultados para a
comunidade e para o poder público.
3.1 OBJETO DA PESQUISA
Neste item é apresentada a Comunidade Madalena I, que é o objeto de estudo desta
pesquisa. Em seguida é descrito o processo de ocupação da área e a situação atual, passando para
a delimitação da área estudada.
O estudo tomou como base geográfica uma favela situada na região Leste da cidade
de São Paulo, denominada Madalena I. Essa opção foi motivada pela situação de risco e
vulnerabilidade socioambiental a que estão submetidos seus moradores, e pela grande quantidade
de lixo acumulada entre as moradias. Essa comunidade é representativa de muitas outras que
convivem em situações semelhantes. A escolha dessa favela justifica-se por já ter sito foco de
outras ações práticas que foram implementadas nessa região, construindo, portanto, uma base de
conhecimento operacional importante para a realização de coleta de dados.
A comunidade Madalena I, localizada no bairro de Sapopemba, região leste da cidade
de São Paulo (Figura 4), possui cerca de 800 moradias e sua população é de aproximadamente
4.000 pessoas, conforme dados extraídos junto a Unidade Básica de Saúde (UBS) do Parque
Santa Madalena.
69
Figura 4. Localização da comunidade dentro da cidade de São Paulo, SP. Fonte: São Paulo, 2009.
3.1.1 Processo de ocupação e situação atual
O processo de ocupação do terreno iniciou-se em Janeiro de 1972 (SÃO PAULO,
2009), terreno esse localizado na altura do número 600 da Avenida Custódio de Sá e Faria, no
entanto, a quantidade de moradias tem sofrido aumento constante durante o decorrer dos anos. De
acordo com a Secretaria de Habitação de São Paulo (2009), a quantidade total de domicílios da
favela Parque Santa Madalena I é de 1.900, ocupando uma área de 108.269,05 m2, conforme
apresentada na Figura 5.
Comunidade Madalena I
70
Figura 5. Área ocupada pela favela Parque Santa Madalena I Fonte: SÃO PAULO, 2009.
O terreno onde se assenta a totalidade da favela é de propriedade do município e não
há previsão, até esta data, de processo de urbanização, apesar dos altos índices de vulnerabilidade
apresentados pelas residências, conforme Tabela 6.
Tabela 6. Vulnerabilidade Social das residências da favela Parque Santa Madalena I
Vulnerabilidade Social
Nenhuma 0
Muito baixa 2,56
Baixa 6,15
Média 0
Alta 18,86
Muito Alta 72,42
Índice 0,92
Fonte: SÃO PAULO, 2009
No que diz respeito à infra-estrutura urbana os dados são apresentados de acordo com
a Tabela 7.
71
Tabela 7. Infra-estrutura da favela Parque Santa Madalena I
Infra-estrutura Urbana
Total de construções 1.245
Quantidade ligações de água 614
Quantidade ligações de esgoto 96
Rede de distribuição 339,17m
Índice de abastecimento 27,13%
Índice de esgotamento 0 %
Fonte: SÃO PAULO, 2009
De acordo com os dados apresentados, no que diz respeito ao índice de
vulnerabilidade social da região e ao percentual de recursos de infra-estrutura, verifica-se que a
região está classificada no grupo de alta privação, com alto índice de vulnerabilidade sócio-
econômica. A maioria das famílias recebe até 1 salário mínimo como renda (CDHS, 2009).
3.1.2 Delimitação e descrição da área estudada
Para a finalidade deste estudo, a comunidade estudada faz parte da favela Parque
Santa Madalena I, compreendendo cerca de 859 domicílios, e foi delimitada de acordo com
levantamento efetuado no local (CEDECA, 2008). O terreno onde estão assentadas as moradias
divide-se em quatro áreas:
a) Área 1 – Amorepinima – engloba 8 vielas e possui cerca de 137 casas;
b) Área 2 – Edgar Pinto César – conta com 8 vielas com aproximadamente 199
moradias;
c) Área 3 – Paulo Rosa – 12 vielas e cerca de 183 casas, e,
d) Área 4 – Rodrigues dos Santos, que é considerada a de maior dimensão, localizada
na parte alta da favela, conta com 14 vielas e aproximadamente 340 casas.
Os nomes atribuídos a cada uma das áreas estão relacionados às ruas mais próximas
que dão acesso às moradias.
A quantidade de população, e de domicílios existentes na favela não são conhecidos
com precisão. O levantamento da quantidade de moradias da área selecionada foi efetuado pelos
adolescentes que participaram do “Projeto Meio Ambiente: Educação para Ação”, uma das ações
72
anteriormente implantadas, sob a coordenação do CEDECA – Centro de Defesa dos Direitos da
Criança e do Adolescente Mônica Paião Trevisan.
O terreno possui um forte desnível geográfico e está localizado dentro de duas
encostas (morros), sendo geologicamente marcado por um grande declive que resulta na
existência de nascentes (hoje córrego) no encontro dos morros. Esta situação faz com que a
favela seja dividida em duas zonas bem demarcadas: a parte alta e a parte baixa, e, entre elas,
existe uma rua denominada Rua Nova. A pavimentação da Rua Nova somente aconteceu há cerca
de quatro anos, em conseqüência da mobilização dos moradores em conjunto com o CEDECA.
As moradias desta comunidade possuem água canalizada e energia elétrica
individualizada, obtidas nem sempre de forma legal, porém, não contam com iluminação pública
nas ruas de acesso às vielas.
O esgotamento sanitário é altamente precário, com a canalização direcionada para um
córrego que margeia o terreno onde se localizam as moradias. No entanto, apenas uma parte do
esgoto é canalizada, sendo que em muitas áreas, os dejetos correm a céu aberto. De acordo com
dados obtidos junto à Unidade Básica de Saúde – UBS de Vila Madalena, em aproximadamente
70% das casas o esgoto corre a céu aberto. Além da situação do esgoto, existem ainda vários
pontos de minas d’água que contribuem para o agravamento da erosão do solo.
A favela não conta com serviço de coleta de lixo domiciliar. O lixo produzido pelas
famílias necessita ser transportado, pelos próprios moradores, até uma das caçambas fornecidas
pela ECOURBIS, empresa responsável pelo recolhimento do lixo das caçambas, que estão
localizadas nas ruas adjacentes.
O trabalho realizado por Alves (2006), apresentou uma análise sócio demográfica das
situações de sobreposição espacial, de problemas e riscos sociais e ambientais, e identificou que
as áreas de alta vulnerabilidade social da cidade de São Paulo estão, ao mesmo tempo,
relacionadas à alta vulnerabilidade ambiental.
Os resultados mostraram que os grupos sociais com maiores níveis de pobreza e
privação social, conseqüentemente aqueles com menor capacidade de reação às situações de
risco, residem nas áreas com maior exposição ao risco e à degradação ambiental. De acordo com
esse trabalho, a região onde está situada a Comunidade Madalena I classifica-se como de alta
vulnerabilidade social (alta privação sócio-econômica, baixa escolaridade e grande presença de
73
crianças e adolescentes) e alta vulnerabilidade ambiental (baixa cobertura de esgoto e à margem
de curso d’água).
3.2 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA
Em relação à estratégia geral de pesquisa, este estudo caracteriza-se como uma
pesquisa qualitativa, com aporte em levantamento quantitativo. A pesquisa qualitativa é um
conceito ‘guarda-chuva’, que abrange várias formas de pesquisa e nos ajuda a compreender e
explicar o fenômeno social com o menor afastamento possível do ambiente natural (GODOY,
1995). Esse pressuposto é importante para entender como valores e crenças atuam na geração dos
significados e mediam os comportamentos e atitudes das pessoas (ACEVEDO; NOHARA,
2007).
Como explicam Denzin e Lincoln (2006), os métodos qualitativos implicam numa
ênfase em processos e significados que não podem ser rigorosamente medidos em termos de
quantidade, freqüência ou intensidade. Essa abordagem foca a natureza socialmente construída da
realidade. Em geral, buscam-se respostas a perguntas que colocam em evidência como as
experiências sociais são criadas e como significados são atribuídos a elas. A pesquisa qualitativa
tem o ambiente natural como fonte direta de dados e o pesquisador como instrumento
fundamental (GODOY, 1995).
O método qualitativo tenta descrever a complexidade de determinado problema,
analisar a interação de certas variáveis, compreender e classificar processos dinâmicos vividos
por grupos sociais, contribuir no processo de mudança de determinado grupo e possibilitar, em
maior nível de profundidade, o entendimento das particularidades do comportamento dos
indivíduos. A abordagem qualitativa de um problema justifica-se, sobretudo, por ser uma forma
adequada para entender a natureza de um fenômeno social (RICHARDSON et. al., 2009).
Em relação ao tipo de pesquisa realizada, pode ser classificada em pesquisa
exploratória e descritiva. Exploratória, pois tem a finalidade de desenvolver e modificar conceitos
e idéias, com vistas à formulação de problemas mais precisos, com o objetivo de proporcionar
visão geral acerca de determinado fato. Descritiva, pois descreve as características de
determinada população ou fenômeno e o estabelecimento de relações variáveis (GIL, 2007).
74
Neste estudo, a estratégia de pesquisa utilizada foi a da pesquisa-ação. A utilização
dessa estratégia procura avançar no entendimento dos fatores determinantes que influenciam o
comportamento dos indivíduos em relação à intenção de descartar o lixo adequadamente.
Buscou-se também verificar como os indivíduos respondem, participam e vivenciam uma
experiência de coleta de lixo domiciliar, e se essa experiência pode transformar seus
comportamentos e atitudes.
O termo pesquisa-ação se originou na psicologia social, tendo sido cunhado por Kurt
Lewin na década de quarenta, nos Estados Unidos. Ele, assim, se refere à “Action Research”:
Quando falamos de pesquisa, estamos pensando em pesquisa-ação, isto é, uma ação em nível realista, sempre acompanhada de uma reflexão autocrítica objetiva e de uma avaliação dos resultados. Como o objetivo é aprender depressa, não devemos ter medo de enfrentar as próprias insuficiências. Não queremos ação sem pesquisa, nem pesquisa sem ação (BARBIER, 1985 apud HAGUETTE, 2007, p. 112).
A pesquisa-ação tem por pressuposto que os sujeitos que nela se envolvem compõem
um grupo com objetivos e metas comuns, interessados em um problema que emerge num dado
contexto no qual atuam desempenhando diversos papéis. Constatado o problema, o papel do
pesquisador consiste em ajudar o grupo a problematizá-lo, ou seja, situá-lo em um contexto
teórico mais amplo e assim possibilitar a ampliação da consciência dos envolvidos, com vistas a
planejar as formas de transformação das ações dos sujeitos e das práticas institucionais
(THIOLLENT, 2008).
De acordo com Thiollent (2008) a pesquisa-ação pode ser vista como um modo de
conceber e de organizar uma pesquisa social de finalidade prática e que esteja de acordo com as
exigências próprias da ação e da participação dos autores da situação observada. Nesse sentido,
Stringer (1999) apud Thiollent e Silva (2007), descreve a participação mais efetiva dos atores da
pesquisa quando:
a) possibilita significativo nível de envolvimento;
b) capacita as pessoas na realização de tarefas;
c) dá apoio às pessoas para aprenderem a agir com autonomia;
d) fortalece planos e atividade que as pessoas são capazes de realizar sozinhas;
e) lida mais diretamente com as pessoas do que por intermédio de representantes ou
agentes.
75
O método da pesquisa-ação ajuda a captar informações geradas pela mobilização
coletiva em torno de ações concretas que não são percebidas através da observação passiva
(THIOLLENT, 2008). Assim como o próprio nome sugere a pesquisa-ação visa produzir
mudanças (ação) e compreensão (pesquisa). Segundo os trabalhos de diversos autores (Kemmis e
McTaggart, 1982; Dick, 1997 e 1998; Arellano, (s.d.); O´Brien, 1998), apud Richardson (2004), a
pesquisa-ação procura a mudança voltada para a construção de uma melhoria. De acordo com o
mesmo autor, seus principais objetivos são melhorar e envolver os atores participantes, conforme
apresentados na Tabela 8.
Tabela 8. Objetivos da Pesquisa-Ação.
MELHORAR ENVOLVER
a prática dos participantes;
a sua compreensão dessa prática;
a situação onde se produz a prática.
assegurar a participação dos integrantes
do processo;
assegurar a organização democrática da
ação;
propiciar compromisso dos participantes
com a mudança.
Fonte: Adaptado de Richardson (2004).
No processo de pesquisa-ação destaca-se uma qualidade que não está presente nos
processos convencionais, narrada por THIOLLENTI (2008):
Outra qualidade da pesquisa-ação consiste no fato de que as populações não são consideradas como ignorantes e desinteressadas. Levando a sério o saber espontâneo e cotejando-o com as ‘explicações’ dos pesquisadores, um conhecimento descritivo e crítico é gerado acerca da situação com todas as sutilezas e nuanças que em geral escapam aos procedimentos padronizados. Com a divulgação de informação dentro da população, com o processo de aprendizagem dos pesquisadores e dos participantes, com o eventual treinamento de pessoas ’leigas’ para desempenharem a função de pesquisadores é possível esperar a geração de uma massa de informação significativa, aproveitando um amplo concurso de competências diversas (THIOLLENTI, 2008).
É importante ainda ressaltar que o projeto de pesquisa-ação não impõe uma ação
transformadora aos grupos de modo pré-definido. A transformação somente vai ocorrer caso os
grupos tenham interesse que ela aconteça, ou seja, se for do interesse dos grupos e concretamente
elaborada e praticada por eles. O papel do pesquisador é modesto: resume-se a acompanhar,
76
estimular, catalisar os aspectos da mudança decidida pelos grupos interessados (THIOLLENT,
2008).
De acordo com Haguette (2007), os pressupostos epistemológicos da pesquisa-ação
são os seguintes:
Objetividade, que é caracterizada pela separação entre o sujeito e o objeto, não é
necessária neste processo de conhecimento;
O momento do conhecimento pode coincidir com o momento da mudança;
A neutralidade não é necessária neste processo de conhecimento;
A generalização na sociedade é problemática: as sociedades atuais são muito
diferentes e o processo de mudança é muito rápido.
Uma das grandes dificuldades desta modalidade de pesquisa reside no
estabelecimento de parâmetros que delimitem as concepções teóricas e a atuação metodológica.
Isto tem dividido a opinião dos pesquisadores. De acordo com Richardson (2007), o relatório
deve incluir uma revisão dos trabalhos, teoria e pesquisas sobre o assunto para situar o projeto no
campo do conhecimento, sendo que o objetivo é de mostrar o que foi acrescentado à teoria, ao
conhecimento prático ou ao aumento da compreensão sobre o fenômeno.
Para Thiollent (2008), uma vez que a pesquisa-ação possui uma vocação prática e é
freqüentemente vista como uma concepção empirista da pesquisa social, não haveria muitas
implicações teóricas. A identificação dos problemas concretos e a busca de soluções, juntamente
com o “bom senso” dos pesquisadores seria suficiente para o desenvolvimento da pesquisa. No
entanto, o autor esclarece que de acordo com a problemática a ser estudada deverá ser articulado
um quadro de referencial teórico adaptado aos diferentes setores: educação, organização,
comunicação, saúde, vida política, lazer, etc. Neste trabalho seguir-se-á o formato de relatório
sugerido por Richardson (2007).
Haguette (2007), distingue quatro tipos de pesquisa-ação, baseadas nos trabalhos de
Lewin e seus discípulos, quais sejam:
A pesquisa-ação de diagnóstico, que procura elaborar planos de ação solicitados;
A pesquisa-ação participante, que, desde o início, envolve os membros da
comunidade no processo de pesquisa;
77
A pesquisa-ação empírica, que consiste em acumular dados de experiências de
trabalho diário em grupos sociais, e,
A pesquisa-ação experimental, que exige um estudo controlado da eficiência
relativa de técnicas diferentes, em situações sociais praticamente idênticas.
Neste trabalho foram utilizadas as características do segundo tipo de pesquisa-ação.
O conceito de intervenção na vida social teve grande influência teórica no Brasil,
sobretudo nos campos da psicologia e psicanálise, educação e religião (HAGUETTE, 2007).
Entretanto, o tipo de intervenção proposta não pretende a transformação das estruturas da
sociedade de classes, sendo este um divisor de águas entre a psicologia social americana e as
ciências humanas aplicadas. A intenção é explorar o comportamento e as representações de um
individuo ou de um grupo, diante de uma situação concreta, para compreender-lhes o sentido.
Neste caso o pesquisador deverá eleger uma problemática de investigação, com a
cautela de se evitar a imposição da problemática, mas sim propondo um caráter de reflexividade e
de questionamento, sendo que o objetivo será o de produzir um efeito de conhecimento dentro da
atividade mental dos participantes e de uma avaliação crítica sobre sua condição.
3.3 PARTICIPANTES DO PROJETO
No presente estudo foram identificados os vários papeis, desempenhados pelos
diversos atores envolvidos no projeto, como mostra a Figura 6.
78
Figura 6. Atores envolvidos no Projeto Coleta Porta a Porta Fonte: Adaptado de CEDECA – Projeto Piloto Coleta Porta a Porta (2009)
O Projeto Piloto “Coleta Porta a Porta” foi elaborado em conjunto por representantes
de cada um dos grupos participantes a seguir descritos:
a) CEDECA – Meio Ambiente, representados por sua coordenadora e pelo grupo de
oito adolescentes que atuaram como Agentes do Meio Ambiente no projeto anteriormente
implementado pela organização, denominado “Projeto Meio Ambiente: Educação para Ação”,
com ações envolvendo a capacitação desses adolescentes para atuarem junto à comunidade em
prol da defesa do meio ambiente e da melhoria da qualidade de vida de seus moradores.
CDHS
Sapopemba
Represen-tantes
Da Câmara Municipal
de SP
Coop.
Reciclando Esperança
Moradores e
Voluntários
Financia-
dores do Projeto
Catadores
De Materiais
UBS P.S.
Madalena
CEDECA
Meio Ambiente
Projeto Piloto Coleta Porta a Porta
79
b) Unidade Básica de Saúde – UBS de Vila Madalena, representada pela sua
Coordenadora e duas supervisoras, com o objetivo de fornecer dados sobre a saúde da população
e também de trazer orientações sobre os cuidados com higiene e saúde;
c) Centro de Direitos Humanos de Sapopemba – CDHS. Entidade legalmente
registrada e constituída como ONG na área dos direitos humanos, que tem como objetivo o
empoderamento jurídico e social dos moradores da região, principalmente para os jovens,
mulheres e idosos. Aqui foi representado por dois coordenadores;
d) Representantes da Câmara Municipal de São Paulo, na figura de uma vereadora e
sua assistente que trabalham por melhorias da comunidade;
e) Reciclando Esperança – Cooperativa de catadores, representada por dois de seus
sócios cooperados;
f) Financiadores do projeto – os recursos financeiros e materiais para a elaboração e
implementação do projeto foram obtidos através do repasse de um Fundo de Investimento
patrocinado pela Bolsa de Valores de São Paulo (BOVESPA, 2009).
g) Moradores e voluntários da região – todos os moradores foram convidados a
participar bem como os voluntários, onde se inclui a pesquisadora que elaborou este estudo;
h) E por fim, os catadores de material, em número de sete, que foram selecionados
entre os moradores da comunidade.
3.4 INSTRUMENTOS DE COLETA DE DADOS E FASES DA PESQUISA-AÇÃO
Este bloco está subdividido em seis itens. No primeiro são apresentados os
instrumentos utilizados para a coleta de dados deste estudo. O segundo bloco descreve como
foram estruturadas as fases da pesquisa-ação e as características de cada uma delas. E, por fim, os
itens três a seis tratam dos procedimentos adotados em de cada uma das fases (Diagnóstico,
Planejamento, Implementação e Observação).
3.4.1 Coleta de dados
A seguir são descritos os instrumentos utilizados para a coleta de dados do presente
estudo.
80
3.4.1.1 Pesquisa Documental e Bibliográfica
A pesquisa documental e bibliográfica foi desenvolvida ao longo de todas as etapas da
pesquisa, fornecendo subsídios teóricos para sua execução. Foi responsável pela coleta e análise
de todos os documentos oficiais e legislações incidentes sobre a área em estudo, além dos estudos
sobre: vulnerabilidade social, situação das favelas brasileiras e mais especificamente da Região
Leste do Município de São Paulo, situação do lixo, percepção ambiental e relações entre
percepção ambiental e vulnerabilidade.
Para a obtenção dos dados foram realizadas visitas a órgãos públicos, bibliotecas e
Internet, livros, revistas específicas, anais de congresso e outros trabalhos relacionados, bem
como a consulta a especialistas na área: poder público e cooperativas de reciclagem. A consulta
aos especialistas foi particularmente utilizada durante o treinamento realizado com os Catadores
de Material, durante a fase de implementação do projeto.
3.4.1.2 Observação Participante
A observação participante pressupõe uma integração do investigador ao grupo, à
comunidade ou à sociedade que se pretende estudar, não apenas como um simples observador
externo aos acontecimentos, mas se envolvendo e tomando parte ativa na experiência
(HAGUETTE, 2007). A observação participante foi a técnica utilizada em todas as fases do
projeto, bem como em todos os momentos de contato com a comunidade.
Da mesma forma, Gil (2007) acrescenta que a observação participante, ou observação
ativa consiste na participação real do conhecimento na vida da comunidade, do grupo ou de uma
situação determinada, e, nesse caso, o observador assume, até certo ponto, o papel de um membro
do grupo. Daí o motivo pelo qual se pode definir observação participante como a técnica pela
qual se chega ao conhecimento da vida de um grupo a partir do interior dele mesmo.
No entanto, é importante ainda salientar, assim como afirma Oliveira (2000), que a
partir do momento que se parte para uma investigação empírica, o olhar do observador já o
alterou previamente. Existe uma espécie de refração da imagem apreendida pelo esquema
conceitual formador. O ouvir é outra faculdade que deve, junto com o olhar, servir de
instrumentos no exercício da investigação. Oliveira (2000) complementa:
81
A caminhada da pesquisa é sempre difícil, sujeita a muitas quedas. É nesse ímpeto de conhecer que o ouvir, complementando o olhar, participa das mesmas precondições desse último, na medida em que está preparado para eliminar todos os ruídos que lhe pareçam insignificantes, isto é, que não façam nenhum sentido do corpus teórico de sua disciplina ou para o paradigma no interior do qual o pesquisador foi treinado (OLIVEIRA, 2000, p. 21)
Na utilização da técnica da observação participante foram observadas duas etapas
essenciais. A primeira delas consistiu da aproximação da pesquisadora ao grupo social em estudo.
Esse foi um trabalho longo e difícil, pois foi necessário trabalhar com as expectativas do grupo, e
com a preocupação de destruir alguns bloqueios, como a desconfiança e a reticência do grupo,
afim que a pesquisadora fosse aceita em seu próprio papel, isto é, como alguém externo,
interessado em realizar, juntamente com a população, um estudo. No entanto, pode-se dizer que
existe uma tensão constante para o pesquisador frente ao risco da sua total identificação com a
problemática, objeto do estudo, e o conflito de assegurar objetividade na coleta de dados.
Na segunda etapa o esforço foi de construir uma visão de conjunto da comunidade
objeto de estudo. Essa etapa pode ser operacionalizada com a utilização de documentos oficiais,
tais como jornais, documentos disponibilizados pelo CEDECA e publicações do site da prefeitura
do município, bem como através da reconstituição da história do grupo e do local, observação da
vida cotidiana, identificação das instituições e formas de atividades econômicas, levantamento de
pessoas-chave (conhecidas pelo grupo) e a realização de entrevistas não diretivas com as pessoas
que pudessem ajudar na compreensão da realidade.
Os dados foram registrados em um diário de campo para não haver a perda de
informações relevantes sobre os dados observados. Alem disso também foram realizados
registros fotográficos para a obtenção de informações adicionais de extrema relevância ao
conjunto da pesquisa. Esses registros de dados e fatos incluem: a) referências aos acordos
estabelecidos para o funcionamento de grupo; b) dados referentes a compreensões, interpretações
e reconhecimentos; c) descrição de atividades e práticas do grupo; d) sínteses das reflexões e
decisões grupais; e) descrição da participação dos elementos do grupo; e f) registro fotográfico de
cada uma das etapas do projeto.
Os dados obtidos através da observação participante foram recolhidos durante todo o
processo de pesquisa entre os meses de março a dezembro de 2009, estão registrados em atas de
reuniões, visitas e conversas com os moradores.
82
3.4.1.3 Entrevistas
Foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com os Catadores de Material, num
total de sete indivíduos, sendo quatro homens e três mulheres. Foram entrevistados ainda os
representantes dos grupos: CEDECA, CDHS e Cooperativa Reciclando Esperança, num total de
oito entrevistas.
Por se tratar de uma pesquisa qualitativa, a seleção dos entrevistados não poderia ser
aleatória, uma vez que se busca explorar o aspecto das opiniões e não o número de opiniões,
como argumentam Bauer e Gaskel (2002). As entrevistas foram gravadas e transcritas para
posterior categorização. Os protocolos das entrevistas realizadas estão detalhados a seguir, na
descrição da fase de avaliação da pesquisa-ação.
3.4.1.4 Questionário
Foi aplicado um questionário aos moradores da área definida pelo estudo, num total
de 128 respondentes, contendo questões abertas que buscaram obter impressões, sentimentos e
relações sobre a intervenção compartilhada; e questões fechadas, com categorias pré-definidas.
Os dados dos questionários foram transcritos em planilha do Excel e ofereceram informações
estatísticas sobre as questões dos roteiros de perguntas.
Da mesma forma que os protocolos das entrevistas, o detalhamento do questionário é
apresentado na fase de avaliação da pesquisa-ação.
3.4.2 Fases da Pesquisa-ação
Existem diversos modelos que apresentam as fases da pesquisa-ação, quase todos
coincidem na existência de quatro momentos que estão representados graficamente na Figura 7.
83
Figura 7. Fases da Pesquisa-ação Fonte: Adaptado de RICHARDSON (2007)
Neste trabalho, o processo da pesquisa-ação foi desenvolvido em quatro principais
etapas: fase exploratória, fase principal, fase de ação e fase de avaliação (THIOLLENT, 2008;
RICHARDSON, 2007). Esta proposição de divisão em quatro etapas foi adotada para a
realização do estudo, com o objetivo de definir e acompanhar um conjunto de ações para a
implementação do projeto de Coleta Porta a Porta, na Comunidade Madalena I.
As fases do estudo, os instrumentos utilizados para a coleta de dados e as demais
ações desenvolvidas em cada uma delas estão resumidas no Quadro 3, assim como o respectivo
planejamento de datas e prazos. Em seguida, é objeto de descrição detalhada, fase por fase.
FASE DE ESTUDO INSTRUMENTOS DE
COLETA DE DADOS
DEMAIS AÇÕES PERÍODO DE
EXECUÇÃO
Fase exploratória:
DIAGNÓSTICO da
situação atual.
- Questionário aplicado a 401
moradores da área selecionada;
- Observação Participante.
- Reuniões;
- Visitas de
Reconhecimento.
Até Junho de 2009
Fase de planejamento de
novas ações para solução
do problema: PRINCIPAL
- Entrevistas não-estruturadas
com os representantes das
entidades, num total de cinco,
- Seminários;
- Reuniões.
Julho de 2009
Fase Exploratória Diagnóstico
Fase de avaliação
Observação
Fase principal Planejamento
Fase de ação Implementação
84
. com duração média de uma hora
cada;
- Observação participante
Fase de ação:
IMPLEMENTAÇÃO do
projeto piloto.
- Observação participante - Reuniões;
- Treinamentos;
- Pontos de Controle.
De Agosto de 2009 a
Setembro de 2009.
Fase avaliação:
OBSERVAÇÃO do
funcionamento e dos
resultados atingidos.
- Entrevistas Semi-estruturadas
com todos os participantes do
grupo de Catadores de Material,
com duração média de duas
horas cada;
- Entrevistas Semi-estruturadas
com os representantes dos
grupos: CEDECA, CDHS, UBS,
Reciclando Esperança;
- Questionário de pesquisa
aplicado a 126 moradores da
comunidade;
- Observação participante.
De Outubro de 2009 a
Dezembro de 2009.
Quadro 3. Resumo das fases, instrumentos de coleta de dados e demais ações da pesquisa Fonte: Elaborado própria
É importante destacar que durante as reuniões e seminários optou-se, dentre os
diversos paradigmas existentes, pelo Método da Roda e pelo “paradigma da avaliação
emancipatória”. Nas palavras de Campos (2000), o Método da Roda nada mais é do que uma:
Aposta na democracia institucional não somente como um meio para impulsionar mudanças sociais, mas como um fim em si mesmo, processos que objetivem a construção de espaços coletivos. Entendendo-se por Espaços Coletivos arranjos concretos de tempo e lugar, em que o poder esteja em jogo; e onde, de fato, se analisem problemas e se tomem deliberações (CAMPOS, 2000, p. 42)
O “paradigma da avaliação emancipatória”, segundo Saul (2001), busca analisar de
uma forma crítica a realidade para transformá-la. É utilizado para avaliação de programas
educacionais e sociais, e tem dois objetivos principais: “iluminar o caminho da transformação e
beneficiar as audiências em termos de torná-las auto-determinantes” (SAUL, 2001, p. 105).
85
O primeiro objetivo, declara o autor, é necessário para conhecer o real e comprometer-
se com o futuro, naquilo que se quer ver transformado e modificado. O segundo visa permitir que
os sujeitos de sua própria história façam parte dela a partir de uma consciência crítica, capaz de
direcionar suas ações com seus valores eleitos. Os conceitos básicos desta proposta são:
emancipação, decisão democrática, transformação e crítica educativa.
3.4.3 Fase exploratória (Diagnóstico)
A fase exploratória diz respeito ao diagnóstico da situação, ao levantamento das
necessidades dos indivíduos, à formação de equipes envolvendo pesquisadores e participantes, e
um aspecto externo com a finalidade de divulgar as propostas e obter o comprometimento dos
participantes e dos interessados. A Figura 8 representa graficamente a construção da fase
exploratória ou do diagnóstico da pesquisa.
Fase Exploratória(Diagnóstico)
Levantamento de dados
com os moradores
Visitas deReconhecimento
Reuniões comos Agentes do Meio Ambiente
Figura 8. Fase Exploratória.
Fonte: Elaboração própria.
O objetivo desta fase foi de conhecer a área de estudo e definir as questões, os
objetivos e estratégias do projeto. Envolveu as seguintes etapas: a) levantamento de dados junto
aos moradores da área de estudo, através de respostas a um questionário; b) reuniões semanais
com os adolescentes do Projeto Meio Ambiente: Educação para Ação, também denominados
Agentes do Meio Ambiente, com duração média de duas horas cada uma das reuniões, durante o
86
período de abril a julho de 2009; e c) visitas de reconhecimento das quatro áreas da favela
delimitadas para essa pesquisa.
Para o levantamento de dados dos moradores foram utilizados os resultados obtidos
em um projeto anterior, realizado pelos adolescentes do Projeto Meio Ambiente: Educação para
Ação, durante o segundo semestre de 2008. Nessa ocasião foram aplicados questionários com
perguntas fechadas, preenchidos pelos entrevistadores (os próprios adolescentes participantes do
projeto), e respondidos pelos moradores de aproximadamente 48% dos domicílios da região. O
objetivo foi identificar aspectos da vida dos moradores e verificar suas necessidades em relação
aos problemas vivenciados pela comunidade. A Tabela 9 apresenta as áreas e quantidades de
domicílios visitados durante esse projeto.
Tabela 9. Domicílios visitados – Fase Diagnóstico.
Comunidade Madalena I
Áreas Quantidade de
domicílios
Quantidade de domicílios
visitados
1 – Amoreppinima 137 105
2 – Edgar Pinto César 199 87
3 – Paulo Rosa 183 77
4 – Rodrigues dos Santos 340 132
Total 859 401
Fonte: CEDECA - Projeto Meio Ambiente: Educação para Ação
O questionário respondido pelos moradores abrangeu as seguintes questões:
Freqüência de descarte de lixo e local onde é depositado;
Quantidade de caçambas disponibilizadas para coleta de lixo;
O morador separa o lixo reciclável, qual o tipo de material separado e o destino
para os resíduos;
Situação do esgoto da moradia;
Presença de ratos e percentual de pessoas incomodadas com isso;
Principal queixa dos moradores.
87
Foram organizadas visitas de reconhecimento por todas as vielas e becos da área de
estudo com duração de duas horas em cada visita, pelo período de cinco dias.
Durante as visitas foram realizadas diversas conversas informais com os moradores. O
objetivo destas visitas e conversas foi de complementar a análise dos dados recolhidos pelos
Agentes do Meio Ambiente no questionário respondido pelos moradores.
Elaborou-se um protocolo dos pontos a serem observados, tais como: a) acessibilidade
de equipamentos para o recolhimento de resíduos; b) situação das ruas e vielas em relação ao
esgoto a céu aberto; c) condições de iluminação das vielas; d) verificação da quantidade de lixo
atirado nas encostas; e) tempo necessário para percorrer as vielas e becos para a finalidade de
realizar a coleta dos resíduos; f) seleção do espaço para efetuar a pesagem do material recolhido;
g) dificuldades encontradas para conversar com os moradores; h) receptividade dos moradores.
Essas observações foram anotadas para posterior discussão na fase de planejamento.
Além disso, o interesse também foi de compreender melhor as atitudes e os comportamentos dos
moradores em relação à forma como procedem ao descarte dos resíduos produzidos e verificar
até que ponto as informações coletadas através dos questionários são confirmadas ou não, pela
constatações realizadas in loco.
3.4.4 Fase principal (Planejamento)
No momento em que há um claro diagnóstico sobre a realidade da situação e dos
eventos, ou pontos que se deseja transformar, os pesquisadores iniciam a prática, que ocorre
através de seminários para guiar a ação (RICHARDSON, 2007). A Figura 9 representa
graficamente o detalhamento desta fase.
88
Fase Planejamento
Reuniões e entrevistas não-estruturadascom Representantes de
Entidades
Seminários paraApresentação de propostas
Definição do Projeto eApresentação aos envolvidos
Figura 9. Fase de Planejamento. Fonte: Elaboração própria
Conforme Thiollent (2008), a Fase Principal da pesquisa-ação é composta por um
conjunto de entrevistas individuais e coletivas, ou questionários aplicados a pessoas-chave, que
irão expor suas reclamações, constatações e sugestões a respeito do assunto em pauta. Todas as
informações coletadas entre os entrevistados servirão como base para posterior discussão nos
seminários.
Coerente com as orientações de Thiollent (2008), foram realizadas entrevistas não-
estruturadas, durante o mês de julho de 2009, com os representantes de cada um dos participantes
do projeto, a saber:
Unidade Básica de Saúde de Vila Madalena;
Cooperativa Reciclando Esperança;
Centro Comunitário Viela Santa Ângela – CECOVISA;
ECOURBIS, empresa responsável pela coleta de lixo;
Administração Regional da Sub-Prefeitura de Vila Prudente e Sapopemba.
O objetivo foi recolher dados para aumentar a compreensão e o conhecimento sobre a
problemática do lixo e propor um plano de ação para a intervenção de manejo de lixo. As
entrevistas não-estruturadas, com duração média de uma hora, foram realizadas durante as
89
reuniões pré-agendadas com os representantes das entidades. As observações e informações
colhidas foram transcritas para posterior apresentação nos seminários.
Nesta fase foram realizados seminários e reuniões com os grupos envolvidos
(Moradores da comunidade, Catadores de Material, Agentes do Meio Ambiente, Coordenadores e
membros da organização de apoio) para levantamento de propostas, sob a coordenação do
CEDECA. Os itens discutidos foram:
a) Definição dos objetivos a serem alcançados por meio de ações concretas;
b) Apresentação de propostas a serem negociadas entre as partes interessadas;
c) Coordenação das atividades em sintonia com o trabalho dos demais grupos e ações
de formação;
d) Centralização das informações oriundas de diversas fontes;
e) Busca de soluções e propostas de ação; e
f) Divulgação das propostas para a comunidade.
3.4.5 Fase de ação (Implementação)
A Fase de Ação, como o próprio nome já indica, engloba medidas práticas baseadas
nas etapas anteriores: a) difusão de resultados; e b) implementação de ações-piloto que
posteriormente, após avaliação, poderão ser assumidas pelos atores sem a atuação dos
pesquisadores (THIOLLENT, 2008).
Fase de Ação
Implementação deMedidas práticas
Divulgação dosResultados
Figura 10. Fase de Ação Fonte: Elaboração própria.
90
Quando se fala em divulgação de resultados, os receptores destas informações são as
pessoas que responderam às entrevistas e questionários, ou seja, o conjunto dos membros da
organização, representantes dos atores e tomadores de decisão. Uma vez divulgadas as
informações, é iniciada a etapa de apresentação de propostas visando melhorar os aspectos
estudados. Estas propostas são analisadas e aprovadas pelos membros envolvidos e
implementadas de forma a colocar em prática as sugestões apresentadas.
No caso deste estudo, as atividades da Fase de Ação foram a implementação prática
do Projeto “Coleta Porta a Porta”, ou seja, a coleta de resíduos nas casas dos moradores, de
acordo com modelo proposto na etapa anterior, e o monitoramento e acompanhamento diário
durante esse período. Para tanto, foram necessários diversos debates e testes, para verificar a
melhor forma de implementar, bem como a capacitação para a atividade dos sete catadores de
material envolvidos. Essa capacitação aconteceu durante a última semana do mês de julho por
meio do treinamento dos catadores, realizado por especialistas da área de saúde e de reciclagem
de resíduos.
Durante todo a fase de ação, o acompanhamento sistemático, conversas informais com
os indivíduos, e a observação participante facilitou o entrosamento entre todos os atores da
intervenção permitindo a exposição de novas idéias, reclamações, constatações e sugestões sobre
o assunto.
A coleta de resíduos foi realizada de segunda a sexta-feira, no horário das 9:00 às
12:00h, e o monitoramento e o acompanhamento foram realizados através de pontos de controles
sistematizados diariamente, com duração aproximada de 30 minutos, após a pesagem do material
recolhido. Participaram do ponto de controle os Catadores de Material, a Coordenadora do
CEDECA e a pesquisadora. Foram realizados o acompanhamento das ações implementadas e o
redirecionamento das ações.
3.4.6 Fase de avaliação (Observação)
Este tópico descreve a fase de avaliação, e apresenta os procedimentos utilizados
durante esta fase: observação participante, entrevistas e questionário.
A etapa final do processo de pesquisa-ação apresenta dois objetivos principais:
verificar os resultados das ações no contexto da pesquisa e suas conseqüências a curto e médio
91
prazo, e extrair ensinamentos que serão úteis para continuar a experiência e aplicá-la em estudos
futuros. A Figura 11 representa graficamente as etapas desta fase.
Fase deAvaliação
Entrevistas semi-estruturadas
Questionário comos moradores
Figura 11. Fase de Avaliação Fonte: Elaboração própria.
Nesta fase foram processados as informações e resultados. A divulgação dos
resultados tem o objetivo de proporcionar uma “auto-reflexão” e agregar conhecimentos em torno
da questão do descarte adequado do lixo, com a conseqüente melhoria para a saúde da população
e do meio ambiente. Foram elaborados relatórios com descrição e atas dos eventos que ficaram
disponíveis para consulta ao longo e após a intervenção.
De acordo com Liu (1996), apud Thiollent e Silva (2007), os resultados da pesquisa-
ação se verificam nos modos de resolução de problemas concretos encontrados no decorrer da
realização do projeto. Os conhecimentos produzidos durante a mobilização dos indivíduos são
validados pela experiência vivenciada. A comunidade passa a ser capacitada com competências
individuais e coletivas, podendo surgir novos questionamentos para projetos posteriores,
traduzido neste estudo pelo objetivo prático da pesquisa.
Além disso, tendo em vista que o objetivo de conhecimento deste estudo foi investigar
como as ações de uma intervenção comunitária, e as experiências compartilhadas durante essa
intervenção facilitam ou não a transformação dos valores e comportamentos dos indivíduos, foi
realizada a análise do estudo à luz do modelo conceitual previamente definido.
A seguir são descritos os protocolos das entrevistas e do questionário utilizado durante
esta fase de avaliação.
92
3.4.6.1 Fase de avaliação – Entrevistas
Foram elaborados dois protocolos de entrevista, a saber:
a) para os catadores de material e, b) para os representantes dos demais atores do
projeto, conforme descrição abaixo.
a) Entrevistas com os Catadores de Material
O protocolo da entrevista com os Catadores de Material foi detalhado e flexibilizado
com o objetivo de privilegiar as idéias e as experiências individuais e coletivas das pessoas
entrevistadas O protocolo foi dividido em sete blocos:
Bloco I – Caracterização do entrevistado: estado civil, escolaridade, renda mensal e
tempo de moradia na Comunidade. Identificação dos motivos que levaram o entrevistado a morar
na área; identificação da moradia anterior e da atividade profissional que exercia; ocupação atual
e identificação do grupo familiar.
Bloco II – Nível de satisfação dos entrevistados: foram questionados se gostavam ou
não de morar na Comunidade, procurando identificar o seu vínculo com o local onde vivem e sua
vontade de contribuir para a melhoria do lugar. Aos respondentes foi solicitado também que
indicassem quais as principais características dos indivíduos e da comunidade que contribuem e
que dificultam a participação em intervenções comunitárias, do tipo que foi implementada na
favela.
Bloco III – Infraestrutura, serviços e equipamentos urbanos: os entrevistados foram
questionados sobre os serviços de abastecimento de água e de fornecimento de energia elétrica;
esgotos; descarte do lixo e sobre os serviços de saúde, e seu nível de satisfação quanto à
qualidade dos mesmos.
Bloco IV – Meio Ambiente: foi perguntado aos entrevistados qual era sua percepção
em relação à situação do lixo na comunidade e quais eram suas expectativas em relação à
implementação da coleta de lixo domiciliar na favela.
Bloco V – Comunidade: os respondentes foram questionados se participam de
associações comunitárias, e sobre como a comunidade pode contribuir para solucionar o
problema do lixo da favela.
93
Bloco VI – Experiência individual: foi solicitado aos respondentes que relatassem se a
participação no projeto de Coleta de Lixo apresentou ou não benefícios pessoais, e, em caso
positivo, que benefícios poderiam ser citados;
Bloco VII – Experiência compartilhada: foi perguntado aos entrevistados se foi
percebida mudança no comportamento e nas atitudes dos moradores da comunidade em relação
ao descarte do lixo, e se houve melhorias ou não para o ambiente da favela.
As entrevistas tiveram a duração de uma e duas horas, cada uma delas, e foram
realizadas pela autora deste estudo. O interesse foi buscar uma maior gama de visões com o
objetivo de documentar as diversas variações sobre o tema e identificar, a partir daí, padrões
comuns. As entrevistas foram gravadas e transcritas e, além das gravações, foram feitas
anotações de campo sobre pontos de destaque. Essas anotações foram especialmente úteis para se
registrar expressões, gestos e posturas e outros dados relevantes que a gravação não consegue
registrar. O roteiro utilizado para as entrevistas está descrito no Apêndice A.
b) Entrevistas com os representantes dos demais atores do projeto
As entrevistas com os representantes dos demais atores tiveram o objetivo de avaliar e
discutir as suas percepções sobre a intervenção realizada. As entrevistas, de forma não-
estruturada, aconteceram a partir da seguinte questão: Que mudanças você conseguiu observar na
vida dos moradores de Madalena I após a coleta de lixo porta-a-porta?
Como não existiam perguntas fechadas e nem uma ordem pré-fixada para as questões,
as entrevistas evoluíram como um diálogo em que a pesquisadora foi introduzindo o tema
gradativamente. O registro foi obtido através de gravação dos depoimentos dos sujeitos após o
seu consentimento.
3.4.6.2 Fase de avaliação – Questionário
Foi aplicado um questionário aos moradores da área definida pelo estudo, contendo
questões abertas que buscaram obter impressões, sentimentos e relações com outras variáveis, e
questões fechadas, com categorias pré-definidas.
94
Em face da dificuldade apresentada pelos moradores da comunidade quanto à leitura e
entendimento das questões, devido, principalmente, à baixa alfabetização dos respondentes, um
grupo de quatro jovens, moradores da comunidade, foram treinados para aplicar o questionário e
transcrever suas respostas para o formulário. A elaboração do questionário, realizada em conjunto
com os demais participantes da intervenção, foi composto por questões a respeito de:
a) Perfil familiar – tempo de residência na comunidade, representação no lar, dados
sócio-econômicos, posse de documentos pessoais, cidade de origem e opção
religiosa;
b) Lazer – o que faz para se divertir e hábitos de leitura;
c) Coleta Porta-a-Porta – se a coleta foi implantada na sua rua, se aderiu ao projeto e
se a coleta trouxe melhoria na limpeza das vielas. Onde o lixo é descartado, antes
e depois do projeto, e o que faria para melhorar a coleta;
d) Material reciclável – se a família faz a separação de materiais recicláveis;
e) Aspectos da infra-estrutura da comunidade – se existe iluminação pública, e se
recebe conta de consumo de água e de energia elétrica;
f) Meio ambiente – se tem conhecimento de problemas ambientais causados pelo
lixo, se conhece o conceito de responsabilidade ambiental, se já participou de
atividades de educação ambiental e se considera importante participar;
g) Afirmações para informar o quanto concordam ou discordam com questões
relacionadas à responsabilidade das pessoas em relação ao meio ambiente.
O questionário aplicado durante esta fase de avaliação está descrito no ANEXO A.
3.5 ANÁLISE DOS DADOS
A análise dos dados, conforme orientação de Miles e Huberman (1994), foi realizada
concomitantemente à fase de sua coleta, e não apenas no seu encerramento. Desta forma, a
análise dos dados aconteceu durante todo o período da intervenção.
Para a análise dos dados recolhidos durante as entrevistas foi utilizada a técnica da
análise de conteúdo. De acordo com Bardin (2009), a análise de conteúdo constitui-se de um
conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, através de procedimentos
sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou
95
não) que permitam inferir conhecimentos relativos às condições de produção e recepção dessas
mensagens.
Para o presente estudo foi utilizada a técnica de análise categorial temática. Os textos
transcritos das entrevistas foram lidos, cuidadosamente, várias vezes, no intuito de se identificar
questões e categorias principais de análise. A análise dos dados das entrevistas foi realizada em
duas etapas:
a) Etapa 1 – Identificação dos temas: Depois das leituras preliminares das transcrições
das entrevistas, as respostas foram resumidas para cada pergunta, em uma ou duas palavras ou
frase. Quando uma única resposta apresentou mais que uma idéia, as frases foram separadas e os
pensamentos computados de forma diferente. A identificação de temas constitui-se numa etapa
importante do estudo, uma vez que a partir dela se tornou possível a identificação de crenças,
tendências e valores contidos nas mensagens dos entrevistados (BARDIN, 2009).
Tendo em vista a utilização da abordagem qualitativa neste estudo a análise dos dados
baseou-se não somente na freqüência e aparição dos temas, mas também na sua presença ou
ausência. Tanto a presença, como a ausência de determinados elementos, constitui-se em
informações válidas e preciosas.
b) Etapa 2. Formação das categorias temáticas – Depois de identificados, os temas
foram agrupados em categorias temáticas. As respostas foram analisadas novamente com a
intenção de se verificar se essas palavras ou frases produzidas se referem a um único pensamento
ou expressam idéias separadas. Foi realizada a síntese das idéias e a formação de unidades
temáticas e, em seguida, a formação de unidades de significação. A partir daí produziu-se o
diálogo entre a literatura e as significações encontradas, e as reflexões finais.
3.6 APRESENTAÇÃO DE RESULTADOS PARA A COMUNIDADE
Todos os moradores da comunidade foram convidados para participar da reunião onde
foram apresentados os resultados do Projeto “Coleta Porta-a-Porta”. A reunião foi realizada
num sábado, às 10h da manhã, no início do mês de Outubro de 2009, de forma a permitir que a
grande maioria dos moradores pudesse comparecer. Foram elaborados cerca de quinhentos
convites, e distribuídos em todas as moradias.
96
3.7 APRESENTAÇÃO DE RESULTADOS PARA O PODER PÚBLICO
Foi elaborado um dossiê contendo todas as etapas do projeto, a quantidade de recursos
utilizados (materiais, financeiros e humanos) e os resultados alcançados. O dossiê foi entregue à
Sub-Prefeitura de Vila Prudente e Sapopemba, e foram distribuídas cópias às demais entidades
que participaram do projeto.
97
4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Este capítulo é composto por nove seções. A primeira apresenta como se deu a
aproximação da pesquisadora com o CEDECA e com a comunidade de Madalena I. As seções
seguintes descrevem os resultados encontrados em cada uma das fases da pesquisa-ação. Na sexta
e na sétima seções são descritos como os resultados da intervenção foram apresentados para a
comunidade e para o poder público. Em seguida é realizada uma síntese da avaliação das fases da
pesquisa-ação e, por fim, é apresentada a avaliação dos resultados sob o enfoque do modelo
conceitual adotado.
4.1 APROXIMAÇÃO
A aproximação ao CEDECA – Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do
Adolescente “Mônica Paião Trevisan”, iniciou-se em outubro de 2008, através do Projeto “Meio
Ambiente: Educação para Ação”, onde a autora participou como integrante do Comitê de
empregados voluntários da Caixa Econômica Federal, com atuação junto a comunidades para
implementação de ações de melhoria do meio ambiente.
O CEDECA “Mônica Paião Trevisan” foi constituído em 1987 e registrado
legalmente em 1991. A sua história está vinculada aos trabalhos das Comunidades Eclesiais de
Base, de caráter solidário e voluntário (LANNES et al., 2009).
No encontro realizado em meados de março de 2009, com a coordenadora do
CEDECA, responsável pelo acompanhamento e implementação do projeto “Meio Ambiente:
Educação para a Ação”, fui admitida como voluntária, ficando responsável pela condução das
reuniões com os adolescentes, Agentes do Meio Ambiente, moradores da favela.
As reuniões aconteciam duas vezes por semana, com duração de duas horas diárias,
com o objetivo de dar continuidade à capacitação desses adolescentes, que já haviam sido
capacitados anteriormente, e que vinham desenvolvendo ações junto à comunidade e nas escolas
da redondeza, tais como: palestras e seminários, participação em mutirões de coleta de lixo,
orientações sobre a separação de resíduos para reciclagem, entre outras.
98
Concomitantemente às reuniões que aconteciam no ambiente da favela, a interação
com os moradores, com os representantes do CEDECA, CDHS e demais atores envolvidos na
problemática do lixo foram sendo estreitadas.
Para poder perceber e tentar entender as motivações dos sujeitos participantes dessa
intervenção, bem como seus desejos e frustrações, que estão traduzidas, em parte, na forma como
manejam o próprio lixo produzido, foi necessário que durante alguns meses passasse a freqüentar
os espaços por eles ocupados, numa atitude de aproximação gradual, para que, a partir de um
relacionamento mais intenso, as informações e os seus sentimentos pudessem passar a ser
externalizados.
Como nas palavras de Giacomini et al. (1987, p. 20): “Para reconhecer a pessoa
totalmente é necessário reconhecer seus gestos, e para reconhecer os gestos das pessoas é
necessário conviver, formar uma história, para que suas atitudes totais possam ser reveladas”.
De acordo com Franco (2005), no trabalho com pesquisa-ação é importante que haja
uma fase preliminar, constituída pelo trabalho de inserção do pesquisador no grupo, e do
conhecimento do grupo em relação às suas expectativas, possibilidades e bloqueios. Essa fase
preliminar também foi fundamental para o estabelecimento de um contrato de ação coletiva, em
que se pode esclarecer questões referentes à ética da pesquisa, compromissos com a ação coletiva
e com as finalidades do trabalho que a ser desenvolvido.
4.2 FASE EXPLORATÓRIA: DIAGNÓSTICO
Nesta seção são apresentados os resultados encontrados através dos dados coletados
na fase de diagnóstico.
4.2.1 Mapeamento da área
Após o período inicial de contato com os moradores da Comunidade que durou de
março a junho de 2009, foram realizadas visitas de reconhecimento da área e a identificação das
ruas e vielas onde está situada a favela, conforme apresentado no Quadro 4. Esse quadro oferece
um resumo da situação das ruas, e a quantidade de moradias em cada uma das áreas.
99
RELAÇÃO DE VIELAS E QUANTIDADE DE MORADIAS – MADALENA I ÁREA 01
Amoreppinima Quant. Casas
ÁREA 02 Edgar
Quant.Casas
ÁREA 03 Paulo Rosa
Quant.casas
ÁREA 04 Rodrigues
Quant. Casas
Pêra 6 Imbuia 1 21 Verde 8 Imbuia III 6
Melão 35 Imbuia 2 17 Periquitos 8 Rosas 37
Uvas 22 Imbuia 3 41 Rolinhas 12 Cravos 5
Caju 10 Ipê 60 Bem-te-vi 4 Palmas 9
Maçãs 18 Peroba 1 16 Arara 14 Rosas I 21
Caqui 21 Peroba 2 8 Araponga 16 Rosas II 39
Abacaxi 5 Peroba 3 10 Tigrões 19 Begônias 28
Abacate 20 Marfim 26 Andorinhas 22 Lírios 38
Pardais 32 Girassol 16
Cicariba 22 Dálias 18
Papagaio 19 Larguinho 9
Pira 7 Violeta 34
Rodrigues dos Santos 45
TOTAL 137 199 183 340
TOTAL GERAL 859
Quadro 4. Relação de Vielas e Quantidade de Moradias – Madalena I Fonte: CEDECA, 2008 – Projeto Meio Ambiente: “Educação para Ação”.
Esse mapeamento nos auxilia a identificar as subdivisões existentes entre as condições
dos moradores da comunidade, uma vez que para cada uma das áreas há uma situação peculiar.
A situação geográfica da área da favela é composta de uma parte alta e outra que fica
no pé do morro, denominada “buracão”. Uma grande parte dos moradores da parte alta (Área 4 –
Rodrigues) descarta o lixo produzido em suas moradias diretamente no morro, atingindo os
moradores da parte baixa. Essa situação provoca uma diferenciação entre os próprios moradores.
Há os que têm “melhores condições” que vivem na parte alta, e os “menos privilegiados”, que
100
convivem com o lixo atirado de cima do morro. Isso demonstra que a discriminação e o
preconceito são tanto externos como internos no ambiente da favela.
As figuras 12 a 14, mostram o enorme risco a que está submetida essa comunidade.
Essas imagens foram extraídas anteriormente à intervenção realizada, e cedidas pelo CEDECA
para a finalidade deste estudo.
Figura 12. Aspecto da encosta do morro que une as casas da região superior com as da parte inferior.
Figura 13. Visão da “cascata” de lixo atirada pelos moradores da área superior.
101
Figura 14. Vista do lado de cima do morro.
As figuras revelam a dimensão da gravidade da situação, pela forma inadequada que é
realizado o descarte do lixo domiciliar, e pelas deficiências de infra-estrutura, especialmente
quanto ao saneamento básico.
É importante ainda destacar a atuação do CEDECA junto a essa população, já que sua
missão é expressa da seguinte forma: “garantir à população o acesso a uma participação ativa na
prática da cidadania. O eixo norteador de toda nossa atuação se baseia nos princípios do Estatuto
da Criança e do Adolescente – ECA” (CEDECA, 2009).
Essa organização atua no desenvolvimento da cultura local: na educação, no que se
refere ao desenvolvimento de habilidades e competências de inclusão social, ação comunitária
desenvolvendo lideranças que favoreçam o desenvolvimento econômico da região e a capacitação
do jovem para sua inserção no mercado de trabalho, com oficinas de panificação, cabelo e
manicure, além de música, teatro, inglês e informática.
Mas, apesar do esforço do CEDECA, principalmente com ações direcionadas às
crianças, jovens e adolescentes, existe uma população marginalizada que se encontra descolada
de sua cidadania e, principalmente, de seus direitos sociais.
102
4.2.2 Resultados do Levantamento
O levantamento de dados foi recolhido durante o segundo semestre de 2008, pelos
adolescentes do Projeto Meio Ambiente: Educação para Ação, denominados Agentes do Meio
Ambiente, que visitaram 401 domicílios, de um total de 859 moradias mapeadas na região,
conforme mostra a Tabela 10.
Tabela 10. Domicílios Visitados Domicílios Visitados 401
Área 1 – Amoreppinima 105
Área 2 – Edgar Pinto César 87
Área 3 – Paulo Rosa 77
Área 4 – Rodrigues dos Santos 132
Fonte: Adaptado de CEDECA ‘Projeto Meio Ambiente: Educação para Ação’
O Quadro 5 apresenta o diagnóstico realizado a partir de entrevistas com os
moradores dessa comunidade.
DADOS QUANTITATIVOS DAS ABORDAGENS REALIZADAS NAS VIELAS DA RUA NOVA NO 2º SEMESTRE 2008
ATIVIDADE ÁREA 1 (Amoreppinima) ÁREA 2 (Edgar) ÁREA 3 (Paulo Rosa) ÁREA 4 (Rodrigues)
Domicílios visitados 105 87 77 132
N.º de Caçambas 4 5 4 0
% de descarte na caçamba 99 93,1 78 70,3
Freqüência de descartes 2 vezes por dia Mais de 3 vezes 1 vez por dia 2 vezes por dia
Onde se descarta o lixo Morro Morro 2 pessoas no morro Morro
% que separam os resíduos 59% 37,90% 56% 37,80%
% material separado Papelão, latinha, plástico Papelão, latinha, plástico Latinha Latinha, papelão
Destino do material Venda Venda Venda Venda
Esgoto a céu aberto Sim Não Sim Sim
Presença de ratos 93 pessoas 78 pessoas 68 pessoas 124 pessoas
Principal queixa dos entrevistados Lixo no morro Mau cheiro, ratos, poluição,
crianças nas vielas Cães, falta de caçamba, ratos Esgoto a céu aberto, ratos, mau cheiro
Estado Geral das vielas Lixo doméstico, entulho Lixo doméstico Limpas Lixo doméstico
Sugestões dos entrevistados
Tirar o lixo do morro.
Encanamento no morro Tirar o lixo das vielas
Mais caçambas Tirar as caçambas da escola
Iluminação nas ruas
Conscientização para a separação do lixo.
Caçamba nas vielas Retirar o esgoto a céu aberto.
Quadro 5. Dados das abordagens do 2º semestre 2008
Fonte: Adaptado de CEDECA, 2009 – ‘Projeto Meio Ambiente Educação para Ação’
104
Esse levantamento foi essencial para entendermos as dificuldades encontradas pela
comunidade, e a Figura 15 apresenta a relação percentual entre o total de moradias existentes em
cada área e a quantidade de moradias visitadas. Foram visitadas 38% das casas da Área 1 –
Amoreppinima; 43% da Área 2 – Edgar; 42% da Área 3 – Paulo Rosa; e 38% da Área 4 –
Rodrigues, correspondendo a 46% do total de domicílios da comunidade Madalena I.
76
43
42
38
Amoreppinima Edgar Paulo Rosa Rodrigues
Figura 15. Percentual de moradias visitadas
Fonte: Adaptado de CEDECA ‘Projeto Meio Ambiente: Educação para Ação’
Em relação à questão sobre o local onde o lixo é descartado, a grande maioria dos
entrevistados informou que o lixo é depositado nas caçambas, destinadas à coleta de lixo e
situadas na região mais próxima ao local de suas moradias, conforme mostra a Figura 16.
105
99%
1%
93,10%
6,90%
78%
22%
70,30%
29,70%
0%
20%
40%
60%
80%
100%
1
Amoreppinima Caçamba Amoreppinima OutrosEdgar Caçamba Edgar OutrosPaulo Rosa Caçamba Paulo Rosa OutrosRodrigues Caçamba Rodrigues Outros
Figura 16. Local de descarte do lixo
Fonte: Adaptado de CEDECA ‘Projeto Meio Ambiente: Educação para Ação’
No entanto, apesar da quantidade expressiva de moradores que afirmaram realizar o
descarte do lixo de forma adequada, 99% na Área 1 (Amoreppinima), 93,1% na Área 2 (Edgar),
78% na Área 3 (Paulo Rosa) e 70,3% na Área 4 (Rodrigues), a realidade apresentada não
confirma essas afirmações, uma vez que a quantidade de lixo depositado nas vielas, e,
principalmente, jogado “morro abaixo” apresenta grandes dimensões.
Em relação à quantidade de caçambas, de acordo com levantamento realizado,
identificou-se a existência de treze caçambas, conforme Tabela 11.
Tabela 11. Caçambas em Madalena I Quantidade de Caçambas 13
Área 1 (Amoreppinima) 4
Área 2 (Edgar) 5
Área 3 (Paulo Rosa) 4
Área 4 (Rodrigues) 0
Fonte: Adaptado de CEDECA ‘Projeto Meio Ambiente: Educação para Ação’
106
Verifica-se que a área que abriga a maior parte dos domicílios, não possui qualquer
caçamba para a coleta de lixo em suas imediações, fazendo com que seus moradores tenham que
se deslocar por um grande percurso para encontrar esse equipamento.
A presença de esgoto a céu aberto foi diagnosticada em três das áreas mapeadas.
Somente na Área 2 (Edgar), verifica-se canalização dos dejetos. Ainda assim, esta é uma situação
precária, pois a canalização desemboca no córrego que margeia a favela.
Quanto à questão sobre a separação de material reciclável, 59% dos moradores da
Área 1; 37,90% da Área 2; 56% da Área 3; e 37,8% da Área 4 responderam afirmativamente.
Entre os materiais separados foram citados: papelão, latinhas e plástico. Os moradores foram
unânimes em informar que esse material é destinado à venda, ou seja, o interesse em se realizar a
separação dos materiais está centrado na obtenção de retorno financeiro.
As principais queixas dos entrevistados foram: quantidade de lixo atirada no morro,
poluição, grande quantidade de crianças nas vielas, grande quantidade de cães soltos nas vielas,
pouca quantidade de caçambas, esgoto a céu aberto, ratos e mau cheiro. A presença de ratos nas
vielas e nos domicílios foi uma das reclamações mais constantes entre os moradores visitados. A
Figura 17 mostra a quantidade de reclamações contra os ratos que incomodam a população.
105 93 87 78 77 68
132 124
020406080
100120140
Dom
icili
os v
isita
dos
Qtd
e.re
clam
açõe
s
Dom
icili
os v
isita
dos
Qtd
e.re
clam
açõe
s
Dom
icili
os v
isita
dos
Qtd
e.re
clam
açõe
s
Dom
icili
os v
isita
dos
Qtd
e.re
clam
açõe
s
Amoreppinima Edgar Paulo Rosa Rodrigues
Figura 17. Presença de ratos em Madalena I Fonte: Adaptado de CEDECA ‘Projeto Meio Ambiente: Educação para Ação’
107
Como sugestões de melhoria das condições das moradias, os respondentes citaram:
a) Retirar o lixo do morro;
b) Tirar o lixo das vielas;
c) Aumentar a quantidade de caçambas;
d) Realizar o encanamento do esgoto;
e) Retirar o esgoto a céu aberto;
f) Retirar as caçambas da escola;
g) Colocar iluminação nas vielas;
h) Realizar a conscientização dos moradores para a separação dos resíduos.
As preocupações salientadas dão ênfase, portanto, às carências de infra-estrutura e de
saneamento básico. Além disso, a vida na favela é marcada por inúmeras dificuldades que só se
torna possível mensurar a partir da convivência com essa realidade.
A partir da observação participante, realizada durante as reuniões e visitas efetuadas,
pode-se enumerar várias situações que ameaçam a saúde e o bem estar dos moradores,
enfatizando as dificuldades vivenciadas por essa população. São elencadas abaixo, algumas
dessas situações:
A falta de espaço para as brincadeiras e o convívio das crianças, fazendo com que
elas se exponham a maiores perigos, como quando estão sobre os telhados
“empinando pipas”, ou brincando no meio do lixo.
As brigas entre vizinhos provocadas por ações infantis, reduzindo a tolerância e a
cooperação entre os moradores.
A ausência das mães, quando estas estão entregues aos vícios (álcool, drogas)
implicando no abandono das crianças e adolescentes, que se tornam alvo fácil para a
drogadição e delinqüência.
A falta de auto-estima dos adultos que se consideram inferiorizados por fazerem
parte da população de favelados.
Os deslizamentos do morro em virtude de chuvas e infiltrações no solo que
provocam o desabamento de moradias, aumentando a insegurança dos moradores.
As doenças provocadas pela falta de saneamento e poluição do solo que contribuem
para a vulnerabilidade social em que estão inseridas.
108
As brigas e a violência entre moradores e traficantes, sendo comum a presença de
pessoas armadas, como também pessoas que são atiradas na “cascata” de lixo,
morro abaixo.
A falta de iluminação pública, impedindo que as pessoas saiam de suas moradias
depois que escurece, dificultando o retorno dos jovens para suas casas à noite, após
as aulas, correndo riscos de serem molestados.
Além disso, a população é constantemente submetida ao medo e à insegurança, fruto
da constante vigilância exercida pelos grupos de tráfico que se situam nos lugares mais altos da
favela, e com melhor poder de observação sobre todos os moradores e visitantes da favela.
Todos esses fatos foram fundamentais para delinear e compor como é a vida dessa
população, e a construção de um quadro da realidade enfrentada por seus moradores que, muitas
vezes, não conseguem reagir e melhorar sua própria condição de vida. Por outro lado, é relevante
ressaltar o testemunho de muitos moradores que, perante essa realidade, confiam em um futuro
melhor, e apostam na dinâmica da comunidade que também se encontra, se diverte, comemora, é
solidária, e acredita que é possível sonhar com uma vida melhor.
A categoria de “pedaço” (MAGNANI, 1998), aplica-se muito bem analisando os
vínculos existentes entre os moradores da comunidade Madalena I. Na favela tudo é conhecido,
tudo é imediato, tudo acontece e todos estão sabendo. Dessa forma, a vivência dentro da
comunidade na favela supera o limite da perspectiva do individualismo. Os espaços são
reduzidos, as dificuldades são conhecidas e os gestos de solidariedade e relações mais humanas
oferecem um sentido diferente. No entanto, é importante ressaltar que morar no “pedaço” exige
comportamentos e atitudes que devem ser cautelosamente respeitados. Existem códigos de
reconhecimento, laços de reciprocidade, relações que fazem com que o pedaço seja um contexto
bem definido, e bem conhecido pelos moradores, com obrigações e direitos.
Isso garante segurança de um lado, mas também uma situação incômoda do outro,
quando o espaço é “violado” por desconhecidos. Essa é uma das características típicas que
permite ao crime organizado controlar todo o espaço que lhe pertence, e todos os movimentos
que aí se dão.
Esse foi um dos grandes dificultadores enfrentados durante este estudo. Todas as
conversas, pesquisas e reuniões com os moradores, assim como os registros fotográficos
109
realizados em campo durante o período da pesquisa, foram feitos com muito cuidado evitando-se
qualquer atrito com os observadores que sempre acompanhavam de perto.
De acordo com as observações realizadas nesta fase em relação à problemática do
lixo, diagnosticada como uma das principais queixas dos moradores, pode-se constatar que a
maioria da população não demonstra qualquer preocupação em utilizar as caçambas disponíveis
para a correta disposição do lixo produzido. Havia uma enorme quantidade de resíduos, de todas
as espécies, atirada “morro abaixo”, já que a favela é composta por moradias situadas na parte
alta e na parte baixa. A rampa, onde o lixo é comumente atirado, é também conhecida entre os
moradores por “cascata” (de lixo). Dessa forma, os moradores da parte baixa são os que mais
sofrem com o lixo que é atirado na “cascata”. Além disso, as ruas e vielas servem como depósitos
para entulhos e outros resíduos, além de uma grande quantidade de fezes de animais domésticos.
A situação em que se encontra a população tem como conseqüências:
• Poluição visual do ambiente;
• Acúmulo de lixo em grandes bolsões, causando a desestabilização de terrenos e
estruturas existentes, o que contribui para a destruição das próprias moradias;
• Contaminação do solo e das águas;
• Entupimento de canais e dos encanamentos da rede de esgoto;
• Obstrução do córrego que margeia o terreno onde está assentada a favela, e, em
época de chuvas, a inundação da favela e das áreas adjacentes;
• Proliferação de insetos, roedores, escorpiões e outros organismos nocivos;
• Contribuição para o aumento das doenças infecto-contagiosas, principalmente
entre as crianças.
Enfim, verifica-se que a área ocupada, apesar de constantes esforços no sentido de se
obter melhorias para a condição de vida de seus moradores, continua carecendo de maior atenção
do poder público para resolver, mesmo que em parte, as condições precárias de infra-estrutura e
de saneamento, de mobilização e conscientização dos moradores quanto aos prejuízos causados
pelo comportamento inadequado em relação ao descarte dos resíduos.
A partir dessas observações, e dos dados coletados durante esta fase, passou-se a
discutir nas reuniões que aconteciam com os adolescentes que atuavam como Agentes do Meio
Ambiente, ações a serem planejadas pelo grupo e que pudessem ser implementadas para a
110
mitigação do problema do lixo junto à comunidade. Como resultado dessas discussões, foram
apresentadas, pelos próprios adolescentes, as seguintes ações:
a) Realização de uma gincana com os moradores para incentivar a coleta de
material reciclável;
b) Planejar um encontro entre moradores e poder público;
c) Organizar um encontro entre os moradores e os associados de uma cooperativa
de reciclagem;
d) Organizar um mutirão de limpeza com os moradores da comunidade;
e) Afixar avisos em locais estratégicos sobre a proibição de se jogar lixo a céu
aberto;
f) Buscar, junto aos órgãos competentes, a alocação de maior quantidade de
caçambas para a coleta do lixo; e,
g) Realizar coleta de resíduos de porta em porta.
Destas ações, a atividade de coleta de resíduos de porta em porta, embora fosse a de
maior complexidade, e exigisse grande esforço para sua organização e implementação, foi
considerada a de maior representatividade para a comunidade entre as ações apresentadas e,
portanto, foi priorizada de forma que também pudesse contemplar todas as outras ações pensadas
pelo grupo.
A adoção de uma ação proposta pelo grupo foi importante para “dar voz” aos
indivíduos que estavam engajados nas atividades relacionadas ao meio ambiente, e, dessa forma,
assim como proposto por Gould (2001), oferecer à comunidade formas de liberar seus próprios
recursos e capacidades criativas para eliminar ou reduzir a dependência a situações indesejáveis.
4.3 FASE DE PLANEJAMENTO: PRINCIPAL
Durante o mês de Julho de 2009 foram realizadas quatro reuniões, todas registradas
em ata, ocasiões em que foi discutida a situação do problema do lixo. A utilização do método da
roda (CAMPOS, 2000), assim como o paradigma da avaliação emancipatória (SAUL, 2001)
foram determinantes para que todos os participantes do projeto pudessem analisar o problema e
111
deliberar sobre a melhor forma de implementar as ações propostas, ou mesmo contribuindo para
que novas ações fossem adotadas para o atingimento dos objetivos propostos.
Corroborando com o proposto por Saul (2001), a partir do reconhecimento do
problema, foi possível obter o comprometimento de cada um dos participantes com o que se
desejava ver modificado, permitindo que os sujeitos fizessem parte da história. Transportando
essas idéias para o cenário do lixo, foram utilizados os conceitos básicos da emancipação, decisão
democrática e transformações, adaptados ao foco da intervenção, considerando-se ainda que a
emancipação já prevê uma consciência crítica.
Para a definição e planejamento do projeto, foram elaboradas diversas ações,
conforme apresentado no Quadro 6.
Período Ações Desenvolvidas JUL 2009
Seminário com moradores, catadores, profissionais da saúde, dos direitos humanos, agentes do meio ambiente, e voluntários para exposição do projeto e agregação de propostas;
JUL 2009
Reuniões com os representantes de entidades;
JUL 2009
Organização de uma saída a campo, em grupo, para observação dos lugares selecionados. Discussão das observações de campo realizadas pelo grupo. Comparação do que foi visto com o mapa anteriormente elaborado, correções e complementações para a síntese final do mapa da região selecionada;
JUL 2009
Seleção e cadastro dos catadores responsáveis pela coleta de lixo porta-a-porta, num total de sete pessoas, sendo quatro homens e três mulheres;
De 27 a 31 de JUL 2009
Treinamento com o grupo de catadores nas áreas de Saúde, Segurança, Direitos Humanos e Reciclagem de resíduos;
26 JUL 2009
Reunião com os moradores das ruas selecionadas para divulgação do projeto;
31 JUL 2009
Definição do percurso da saída a campo, de modo que se passe pelas ruas definidas (selecionados os pontos críticos/ problemáticos), para a compreensão socioambiental da região;
30 e 31 JUL 2009
Definição da pesagem e a destinação do material coletado (reciclável e orgânico), com a parceria do Projeto Reciclando Esperança;
02 AGO 2009
Distribuição de panfletos, de casa em casa, com instruções aos moradores da área selecionada (Anexo F).
Quadro 6. Ações desenvolvidas – Fase Planejamento Fonte: Elaboração própria
112
Nesta fase, a observação participante foi utilizada como principal ferramenta para a
coleta de dados, pois permitiu que o olhar e o ouvir, que encerram qualidades peculiares,
buscassem penetrar na cultura do outro através do diálogo, entre iguais, sem o receio de estar
contaminando os elementos do próprio discurso. No entanto, se tinha consciência de que a
presença e o olhar da pesquisadora não conseguiriam captar o real com toda a sua neutralidade,
como afirma Oliveira (2000).
O primeiro encontro, com todos os participantes do projeto, aconteceu no dia 07 de
Julho de 2009, e foi marcante para a idealização do projeto. Foram distribuídos cerca de
quinhentos convites, de casa em casa, pelos Agentes do Meio Ambiente aos moradores da
comunidade (vide Anexo C). Os representantes dos demais atores do projeto foram convidados
pela coordenadora do CEDECA.
O objetivo do encontro foi discutir a possibilidade da implantação da coleta de lixo
porta em porta nas vielas da Comunidade Madalena I para diminuir o volume de lixo nas
encostas da Rua Nova (como é conhecida a rua que delimita a parte alta da parte baixa da favela).
A reunião contou com a presença de cerca de cinqüenta pessoas. Entre elas, além dos
representantes das organizações convidadas, compareceram aproximadamente vinte moradores
da comunidade. Na abertura da reunião foi exibido um vídeo, produzido pelos adolescentes do
‘Projeto Meio Ambiente: Educação para Ação’, mostrando os contrastes entre as imagens da
natureza e de rios, de cidades limpas com as imagens de poluição de rios e mares, com a vida de
pessoas no lixo, com a falta de compromisso das pessoas com o meio ambiente. A frase final do
vídeo era um convite à reflexão de cada um: “Faça o que você pode, use o que você tem, e
comece onde você está”.
Na seqüência, cada participante foi convidado a se apresentar, e falar um pouco sobre
sua atuação e o seu compromisso com a defesa do meio ambiente.
Foram vários os temas abordados nessas falas. Falou-se de hábitos:
“Hábitos que agente não tem. É muito difícil você dizer pra fazer quando você não faz. Você não consegue convencer as pessoas” (representante da Cooperativa Reciclando Esperança).
De responsabilidade:
“Hoje, por exemplo, agente fala dos rios poluídos, agente sempre transfere a responsabilidade pra alguém. Nós todos poluímos, eu já tenho essa consciência que
113
ajudei a poluir, mas a maioria não tem” (representante da Cooperativa Reciclando Esperança).
De educação:
“Eu mesma tenho embaixo do meu tanque, tenho lata, plástico pra vendê e comprá um pão. Dá pra fazê artesanato que é o que eu tô aprendendo. O lixo, a comida que sobra serve pra fazê adubo, só que lá não tem lugar para fazê adubo. Agente ensina pras criança: vai colocá nas caçamba. Se a população ensinasse...” (moradora da comunidade).
Uma das participantes contou que foi numa “balada” que só entrava de pé descalço:
“Fiquei pensando como será isso, acho que vai ser uma sujeira. Porém, o local era super limpo, todos se preocupavam em não jogar nenhum copo ou qualquer lixo no chão, pois sabiam que todos estavam descalços, então pude ver que a limpeza atrai limpeza e a sujeira atrai mais sujeira” (representante do CDHS).
Essa afirmação vai ao encontro dos resultados do estudo elaborado por Crump et al.
(1977) que relata que o índice de lixo jogado em lugares públicos tem uma correlação positiva
com a quantidade de lixo já presente.
Uma outra participante trouxe uma reflexão importante, ela disse:
“O problema é que agente é condicionado a não pensar no processo inteiro, desde Taylor que fazia uma pecinha e não sabia o que ia acontecer com o todo. E aí tem várias coisas que agente aprende a pensar assim. Quem falou do carro (referindo-se às pessoas que jogam lixo pela janela do carro) também quer um ambiente limpo, mas não pensa que isso vai voltar pra ele. Nosso instrumento é nosso interno. A transformação de um a um é que vai fazer conseguir” (representante do CEDECA).
Nessa fala verifica-se que, em geral, as pessoas não estão acostumadas a refletir sobre
o processo inteiro. Os indivíduos estão acostumados ao imediatismo, a perceber o que acontece
somente em curto prazo, o que está refletido na prática do dia-a-dia dessa comunidade. Para que
haja uma mudança significativa no comportamento, as mudanças nos hábitos acontecem de forma
incremental, a partir da tomada de consciência do problema, e do nível de conhecimento
adquirido.
No entanto, as opiniões nem sempre são convergentes, como é o caso desse
depoimento: “Eu também trabalho faz uns oito anos tentando mudar alguma coisa. Sempre defendemos que precisa de coletores. Na viela Santa Ângela, tem, no pró-morar e no
114
Planalto também tem. Como fazer a limpeza do lixo? Fazer cartilha, entregar de casa em casa? A L. veio, tem muito catador, conversou, gostou da proposta e não aconteceu. Já teve muitas reuniões... o que pode ser feito? Tal horário põe o lixo na porta. Se passá da hora o morador é advertido, se por de novo, o morador é multado” (representante da Câmara Municipal).
E no depoimento da moradora que diz:
“Bom eu vou ser curta e grossa. Está eu e o meu marido desempregado. Pelo fato de ser uma ex-presidiária, eu vivo da feira e nós tamo vivendo assim, o que Deus manda. Recebo o bolsa-família, 122 para 5 criança, tenho um filho especial, temo gasto na farmácia, a gente vive assim pela gloria de Deus. Se realmente vocês tivé disposto a ajudá nois, e tem meu cunhado também que cata reciclagem na feira. Então é como eu to falando pra voceis...”
Esse é o retrato de muitos que apenas “esperam” pelo que os “outros” podem fazer, já
que eles se sentem totalmente incapazes de fazer qualquer coisa, mesmo que seja jogar o lixo no
lugar correto.
Em seguida, foi apresentado aos presentes os dados produzidos pelo levantamento
realizado pelos Agentes do Meio Ambiente (Quadro 5), que revela o perfil dos moradores das
vielas no que diz respeito à problemática do lixo, o local de destino dos resíduos, a quantidade de
caçambas existentes, o problema dos ratos, entre outros. A partir desses dados foi apresentada a
proposta de se elaborar um projeto piloto de coleta de resíduos, de porta em porta, por se
acreditar que a “cachoeira de lixo” da Rua Nova existe por que muitos moradores lançam o lixo
nesse local.
A proposta foi questionada e algumas sugestões foram apresentadas para melhoria do
plano, pois algumas pessoas já possuiam experiência com a coleta de materiais. Dessa forma,
corroborando com o modelo proposto por Baker et al. (2007), as capacidades e habilidades pré-
existentes da comunidade puderam ser utilizadas para a definição de melhorias no projeto. Entre
as sugestões e encaminhamentos oferecidos, constou:
Promover um encontro com pessoas interessadas em atuar como catadores de
material, nas vielas da comunidade;
Planejar um treinamento específico para o grupo de catadores selecionados, com
informações detalhadas sobre: como se apresentar e tratar os moradores da
comunidade; práticas de segurança para o manuseio de resíduos; noções de
115
higiene e saúde; práticas de separação de resíduos de forma a oferecer orientação
aos moradores quanto à coleta seletiva;
Elaborar uma cartilha informativa para a comunidade;
Promover um encontro com a Comunidade para divulgação do funcionamento do
projeto, antes do seu início;
Efetuar o levantamento dos custos para compra de equipamentos e materiais para
implementar a coleta porta a porta, inclusive para a reforma da kombi da
Cooperativa Reciclando Esperança, que será utilizada para a retirada do material
reciclável coletado;
Apresentar o projeto ao parceiro financiador para assegurar recursos financeiros
para sua implementação.
Ao final dessa reunião, todos se mostravam entusiasmados, vislumbrando a real
possibilidade de mudar a situação da favela em relação ao problema do lixo. Portanto, coerente
com os autores Baker et al. (2005), a participação dos indivíduos, quando oferecida a
oportunidade de serem ouvidos e de se expressarem, aumenta as possibilidades de sucesso de
uma intervenção social. Isto foi fundamental para que o projeto recebesse o apoio necessário de
todas as entidades participantes, e o compromisso de disponibilizar os recursos humanos
necessários para sua execução.
A reunião que se seguiu, para a escolha dos catadores de material também teve
fundamental importância para o projeto. De fato, o projeto somente se tornou viável a partir da
disposição dessas pessoas em trabalhar com a coleta do lixo. Essa reunião aconteceu no dia 24 de
Julho de 2009 e contou com a presença de doze moradores, quatro adolescentes, Agentes do
Meio Ambiente, a coordenadora do CEDECA e a pesquisadora deste estudo.
No início do encontro foi novamente exposto o projeto de coleta de lixo, agora
devidamente delineado, nas vielas da comunidade Madalena I, assim como a apresentação dos
dados e observações levantados durante as visitas de reconhecimento, que foram:
• vielas e becos de difícil acesso, com traçados tortuosos e desníveis que
impossibilitam a utilização de carrinhos com rodas para a coleta do lixo, a opção
para que a coleta fosse feita em pequenas quantidades, rua por rua. Os sacos
116
plásticos recolhidos seriam transportados até o beco mais próximo, onde seriam
depositados em um carrinho, para então serem conduzidos à área de pesagem;
• grande quantidade de vielas com esgoto a céu aberto, indicando a necessidade de
utilização de calçados e luvas especiais para o manejo dos resíduos;
• necessidade de oferecer orientação aos moradores para a correta separação dos
resíduos por tipo (seco e úmido) a fim de facilitar a retirada dos materiais;
• quantidade de vielas e de moradias a serem percorridas, bem como o tempo
necessário para a coleta dos resíduos;
• necessidade de uma abordagem adequada aos moradores para facilitar a
receptividade e a adesão ao projeto.
Como forma de compensação pelo trabalho a ser realizado foram assegurados aos
catadores os seguintes benefícios:
a) O pagamento de uma bolsa auxílio, no valor de R$ 250,00, para cada mês
trabalhado;
b) Um seguro de vida (válido por um ano);
c) Auxilio alimentação;
d) Equipamentos de proteção (botas, luvas e capa de chuva);
e) Equipamento de apoio (carrinho com rodas);
f) Treinamento (na área de segurança, saúde e reciclagem de materiais).
Além disso, a oportunidade de ser um colaborador efetivo na promoção da qualidade
de vida da comunidade. Os recursos financeiros foram obtidos pelo CEDECA após aprovação do
plano de aplicação de recursos junto à BOVESPA, financiadora do projeto. Verificou-se que o
oferecimento de benefícios financeiros aos catadores foi determinante para se obter a adesão dos
voluntários.
A partir do diagnóstico da fase exploratória, das reuniões e seminários da presente
fase, decidiu-se pela realização da coleta de lixo de porta em porta, nas casas dos moradores, que
foi denominada: Projeto Piloto “Coleta Porta a Porta”.
Foram selecionadas aproximadamente 200 casas, localizadas na Área 4 – Rodrigues
dos Santos para a aplicação do projeto. Justifica-se a escolha desse grupo de moradias uma vez
que essa é a região com maior dificuldade de acesso às caçambas, geograficamente está situada
117
acima da “cascata” e, por conseqüência, é onde se verifica a maior quantidade de moradores que
adota o comportamento de atirar o lixo pelas portas e janelas das casas morro abaixo.
Foi definido e elaborado um cronograma de implantação da coleta de lixo domiciliar
que pudesse validar, na prática da comunidade, a viabilidade de se realizar a coleta dos resíduos
nas casas das famílias para, posteriormente, chegar-se à proposição de um modelo definitivo.
Desta forma, a Fase de Ação foi iniciada com a convicção da contribuição prática que
o trabalho de pesquisa poderia trazer.
4.4 FASE DE AÇÃO: IMPLEMENTAÇÃO
Esta fase teve a duração de dois meses, entre agosto e setembro de 2009, e consistiu
da coleta domiciliar dos resíduos, envolvendo contato com os moradores de todas as casas da
área selecionada, e teve ainda o objetivo de registrar o peso dos resíduos coletados diariamente,
classificando-os como orgânicos (lixo) e não-orgânicos (materiais recicláveis). O Quadro 7
resume e descreve as atividades realizadas nesta fase.
Período Ações desenvolvidas
03 AGO Início da coleta de lixo porta em porta.
2ª semana AGO Colagem de adesivo nas casas (AQUI SE COLABORA COM O MEIO AMBIENTE) que aderiram ao projeto piloto.
Reunião diária, ao final da coleta, para discussão dos resultados e compartilhamento das informações recolhidas.
Pesagem diária do lixo coletado nas 200 moradias, bem como a pesagem do material reciclável.
13 AGO Reunião com a comunidade para avaliação das tarefas.
14 AGO Encontro com o representante da Sub-Prefeitura de Vila Prudente e Sapopemba.
18 AGO Visita do representante da sub-prefeitura à Rua Nova e entorno
21 AGO Participação no Fórum da Criança e do Adolescente.
22 AGO Treinamento sobre Educação Ambiental, no espaço da Comunidade Joilson.
28 AGO Participação no Seminário “Tecendo Rede” no Céu Sapopemba
29 AGO Mutirão de limpeza, planejado e executado pelos próprios moradores.
Colocação de eco-lixeiras em pontos estratégicos da região para incentivar a separação dos resíduos.
Afixar Faixas para motivar a participação da comunidade para a Projeto Porta a Porta.
118
Divulgação da música sobre o meio ambiente – Grupo Alta Voltagem.
23 a 28 SET Aplicação do questionário de pesquisa com os moradores.
Quadro 7. Ações desenvolvidas – Fase Implementação Fonte: Adaptado de CEDECA, Projeto Piloto: Coleta Porta a Porta
O início da coleta ocorreu na segunda-feira da primeira semana de agosto 2009. Os
moradores das vielas selecionadas para a coleta, que abrangeu o total de 200 moradias
aproximadamente, foram convidados a participar de uma reunião no sábado que antecedeu a
coleta. Nessa reunião foi apresentado todo o detalhamento do projeto, bem como foram
oferecidas instruções sobre a separação do lixo entre seco e úmido, deixando claro que essa
separação não seria obrigatória. Apesar de o convite ter sido dirigido a todas as famílias da área
selecionada, somente compareceram a essa reunião cerca de quinze moradores.
Considerando a pequena participação da comunidade na reunião, no mesmo sábado, o
grupo de Agentes do Meio Ambiente, a coordenadora e a pesquisadora percorreram todas as
vielas selecionadas para instruir os moradores quanto à coleta que se iniciaria na semana
seguinte, informando sobre os objetivos do projeto, o período que seria implantado e o horário da
coleta. Foram distribuídos avisos aos moradores, de casa em casa (Anexo D).
A coleta foi realizada de segunda a sexta-feira, entre as 9:00 e 12:00h. Foi
estabelecido um roteiro de vielas a serem percorridas por cada dupla de catadores, observando-se
a proximidade e o melhor trajeto a ser percorrido. Essa atividade foi organizada e definida pelo
próprio grupo. Todos receberam equipamentos de proteção, tais como: botas, luvas e capas de
chuva.
Os catadores foram orientados a retirar os resíduos da maneira como os moradores os
entregassem, sem exigir separação, no entanto, oferecendo orientação gradativa sobre a
importância da separação dos materiais para facilitar a coletiva seletiva. A Figura 18 retrata os
catadores na execução do trabalho de recolhimento dos resíduos.
119
Figura 18. Catadores na coleta dos resíduos Fonte: CEDECA – Projeto Piloto: Coleta Porta a Porta
Na primeira semana, apesar de todos os avisos, reuniões e visitas às moradias, a
quantidade de lixo coletada não foi considerada representativa, no entanto, a partir da segunda
semana os moradores foram se acostumando com o horário da coleta, e passaram a separar os
resíduos a serem retirados.
Durante esta fase foram desenvolvidas várias atividades, além da coleta de resíduos.
Tanto para os catadores como para os adolescentes, agentes de meio ambiente, foi proporcionado
treinamento em educação ambiental, participação no seminário “Tecendo Rede”, e no fórum da
Criança e do Adolescente. No seminário foram discutidos assuntos relacionados ao
empoderamento das pessoas a partir da construção de redes sociais, bem como noções sobre
reciclagem e coleta seletiva de resíduos. No fórum foram abordados os direitos das crianças e
jovens. Além disso, participaram de reunião realizada na Sub-Prefeitura de Vila
Prudente/Sapopemba, com a presença do chefe de gabinete do sub-prefeito e do secretário de
obras. Essa visita teve um significado especial para o grupo que se sentiu valorizado e
120
reconhecido como cidadão, com a possibilidade de ser ouvido e de poder reivindicar seus
direitos.
O grupo de catadores também foi responsável pelo planejamento e organização do
mutirão de limpeza realizado em 29 de agosto de 2009. Esse foi o terceiro mutirão realizado em
Madalena I, a exemplo dos anteriores que foram organizados pelo CEDECA. Essa atividade
demonstrou a capacidade de mobilizar os moradores a partir de orientações recebidas.
Nas moradias da favela, com o objetivo de propiciar maior envolvimento dos
moradores, foram afixados adesivos nas portas das casas que aderiam à coleta de resíduos. Além
dos adesivos nas casas, também foram colocadas faixas e lixeiras ecológicas (para separação do
lixo orgânico e do lixo seco) em pontos estratégicos da favela.
Durante todo o período da coleta, ao final de cada dia, durante aproximadamente vinte
ou trinta minutos, acontecia o balanço das atividades do dia, registrando-se em um livro-diário, a
quantidade de resíduos coletados, e, principalmente, eram discutidos os problemas e/ou
dificultadores encontrados pelo grupo.
Esta sistematização foi importante para a organização do projeto como um todo, visto
que o grupo não possuía capacidades e habilidades para o trabalho em equipe e, pela própria
característica destes indivíduos (falar muito e alto, dificuldade de ouvir e entender o outro,
capacidade limitada de articular seu pensamento), os primeiros dias foram permeados de muita
discussão, havendo a necessidade de acompanhamento muito próximo para que o grupo
conseguisse adquirir, minimamente, condições para a execução da tarefa.
As avaliações diárias foram registradas no livro-diário, conforme Quadro 8, elencadas
em ordem cronológica:
Data Aspectos positivos Aspectos negativos
03/08 Muito bem tratados – boa aceitação. Sugestão: Adesivar as moradias que aderiram ao projeto da coleta.
04/08 Os moradores incentivam a coleta, sugerindo “abaixo-assinado” para a Prefeitura.
Dificuldades entre os catadores. Utilização de “palavrões” que dificultam o relacionamento. Redefinição dos componentes nos grupos.
05/08 A participação da comunidade aumenta a cada dia. Sugestão: distribuição de sacos de lixo para os moradores.
Alguns moradores fazem exigências, exploram o trabalho dos catadores.
06/08 O grupo se entendeu. Está mais unido.
121
Sugestão: Trabalhar em equipe e não em um único grupo.
07/08 Foi bom, coleta em tempo recorde.
10/08 Incentivar a separação do material reciclável.
Muito trabalho.
13/08 Conflito no grupo. Os moradores não estão separando o material.
14/08 Sugestão: incentivar a varrição das vielas.
17/08 As famílias estão aderindo cada vez mais a coleta e estão aumentando a separação.
Segunda-feira é o dia que mais se trabalha. Há necessidade de maior quantidade de caçambas.
18/08 O assunto do dia foi a visita à sub-prefeitura. Todos interessados em receber notícias.
21/08 Planejamento do mutirão para a Rua Nova. Elaborar plano de ação.
24/08 Sugestão: colocação de faixas na Rua Nova.
25/08 Percebe-se a mudança das pessoas, não estão mais jogando lixo no morro.
01/09 Escolha dos lugares onde seriam colocadas as faixas.
09/09 Ausência de dois componentes do grupo, não foi possível percorrer todas as vielas.
10/09 Desistência de uma das componentes do grupo.
15/09 Na avaliação dos catadores aumentou a harmonia do grupo após a saída de um dos seus elementos.
29/09 Todos os moradores estão se lamentando pelo projeto acabar.
30/09 Reunião com todos os componentes do grupo para avaliação do projeto. Sugestão: criação de uma Comissão do Meio Ambiente com os mesmo participantes.
Quadro 8. Avaliações das reuniões diárias. Fonte: Adaptado de CEDECA ‘Projeto Piloto: Coleta Porta a Porta’
A pesagem dos resíduos recolhidos foi efetuada diariamente. Para transportar os
resíduos das habitações para o larguinho onde era realizada a pesagem, os catadores utilizavam
pequenos carrinhos com rodas. Após a pesagem, o lixo era transportado para as caçambas mais
122
próximas, enquanto que o material reciclável era retirado pela cooperativa Reciclando Esperança,
que utilizava uma Kombi para o transporte.
A Tabela 12 apresenta o resultado da pesagem dos resíduos retirados no período do
projeto, ou seja, durante os meses de agosto e setembro, 2009.
Tabela 12. Resíduos Coletados durante o Projeto
PROJETO PILOTO - PESAGEM DOS RESÍDUOS Nº DE VIELAS 13 - Nº DE CASAS 220 (aprox.)
AGOSTO Dia Material Reciclável
Kg Material Orgânico
Kg Total Kg
3 aprox. 1000 Litros aprox 1320 Litros 2320 Litros 4 sem pesagem aprox 1760 Litros 1760 Litros 1000 Litros 3080 Litros 4080 Litros 5 30 259 289 6 s/d 263 263 7 27 246 273
10 89 526 615 11 15 187 202 12 24 291 315 13 15 278 293 14 22 252 274 17 75 717 792 18 21 275 296 19 11 325 336 20 15 311 326 21 11 311 322 24 71 928 999 25 14 345 359 26 18 317 335 27 13 302 315 28 30 343 373 31 27 846 873
TOTAL 528 7322 7850 SETEMBRO
Dia Material Reciclável Kg
Material Orgânico KG
Total Kg
1 18 484 502 2 17 300 317 3 17 215 232 4 13 340 353
123
8 18 985 1003 9 16 375 391
10 19 414 433 11 7 270 277 14 12 290 302 15 16 272 288 16 25 300 325 17 8 371 379 18 23 372 395 21 94 738 832 22 5 313 318 23 6 402 408 24 38 248 286 25 26 296 322 28 12 302 314 29 10 289 299 30 12 261 273
TOTAL 412 7837 8249 TOTAL GERAL 940 15.159 16.099
Fonte: Adaptado de CEDECA ‘Projeto Piloto: Coleta Porta a Porta’
De acordo com a Tabela 12, foram recolhidos 940 k de material reciclável, e 15.159 k
de lixo orgânico. Os materiais recicláveis foram doados à Cooperativa de Reciclagem
participante do projeto. No total, foram 16 toneladas de lixo que deixaram, em tese, de serem
despejadas nas encostas da favela.
O fato dessa quantidade de resíduos não ter sido atirada morro abaixo pode ser
constatado por todos os moradores, uma vez que, após o primeiro mês da coleta, o morro
começou a se cobrir de verde e se podia observar até o florescimento espontâneo de girassóis,
muito provavelmente semeados por pássaros.
No entanto, alguns dificultadores também puderam ser observados, entre eles
podemos citar:
• Uma certa acomodação dos moradores, o que pode ser confirmado pelo fato de
que às segundas-feiras a quantidade de lixo era muito superior à recolhida nos
outros dias da semana, revelando que o lixo não era depositado espontaneamente
nas caçambas durante o final de semana;
124
• A quantidade de caçambas disponíveis era insuficiente para suportar todo o lixo
recolhido;
• A freqüência com que o lixo era recolhido pela empresa responsável também se
mostrou insuficiente, visto que o lixo permanecia por longos períodos aguardando
a sua retirada;
• Os moradores das ruas onde se localizam as caçambas passaram a ficar
incomodados com a quantidade de lixo depositada, dentro e fora das caçambas.
Esses resultados corroboram com os estudos de Horsley (1977) no que diz respeito
aos fatores que dificultam uma mudança do comportamento ambiental salientando a
inconveniência pessoal em mudar um estilo de vida, e os custos pessoais apontados por Stern e
Dietz (1994). De fato, o comportamento pode ser previsto quando se conhece a intenção, mas
somente quando essa conduta possui probabilidade de ocorrer de forma voluntária. Dessa forma,
as crenças conduzem à formação de atitudes e valores, e o entorno social leva à formação de
normas subjetivas, e ambos se traduzem na construção do propósito e da intenção que finalmente
determina o comportamento.
O que se percebeu nessa comunidade é que as normas subjetivas, construídas ao longo
das experiências vividas, influenciam de forma decisiva no comportamento de seus moradores.
4.5 FASE DE AVALIAÇÃO – OBSERVAÇÃO
A seguir são apresentados os resultados da fase de avaliação. Este tópico está
subdividido em três itens. O primeiro aborda o resultado obtido com as entrevistas dos catadores
que participaram do projeto de coleta de materiais, num total de sete indivíduos. O segundo relata
as entrevistas realizadas com os representantes dos demais atores que participaram do projeto
(cinco entrevistados). O último item trata do questionário aplicado a 126 moradores da área onde
foi implementada a coleta de lixo porta a porta. O objetivo foi identificar quais conhecimentos,
atitudes e comportamentos foram transformados, a partir das práticas que passaram a ser
agregadas no dia a dia da vida da população.
4.5.1 Entrevistas com os catadores
125
Este item apresenta o resultado das entrevistas semi-estruturadas realizadas com os
catadores de material, num total de sete indivíduos, onde foram abordadas as seguintes questões:
(I) Características dos entrevistados; (II) satisfação dos entrevistados; (III) infraestrutura, serviços
e equipamentos públicos; (IV) meio ambiente; (V) comunidade; (VI) experiência individual; e,
(VII) experiências compartilhadas. As entrevistas visaram identificar as concepções que os
entrevistados formulam sobre seus próprios valores, suas crenças e estilo de vida.
Bloco I – Caracterização do entrevistado
Em relação ao estado civil, uma declarou viver em regime de união estável; quatro
solteiros; e duas separadas. Em relação à renda familiar, cinco entrevistados declararam não
auferir renda mensal; e dois recebem até um salário mínimo mensal.
Como já vimos anteriormente, o baixo rendimento e a não-inserção no mercado de
trabalho leva à não-inserção social e familiar. Para que sejam satisfeitas as necessidades humanas
básicas é necessário ter renda, e quando estas necessidades não são satisfeitas, perde-se a
dignidade, busca-se alguma satisfação por meios nem sempre lícitos, como explicitado em um
dos depoimentos: “já fiz de um tudo nessa vida, já robei, já fumei, já trafiquei...”
Quanto à escolaridade, dois declararam possuir o ensino fundamental completo, sendo
que os demais não concluíram. A baixa renda familiar, aliada à baixa escolaridade, são aspectos
predominantes na população da comunidade Madalena I. No que diz respeito ao tempo de
residência, três catadores declararam morar no local desde que nasceram, sendo que todos
residem na comunidade há mais de 20 anos.
Em relação aos motivos que levaram os respondentes a residir na comunidade
Madalena I, a pobreza, a impossibilidade de adquirir moradia e os vínculos familiares
caracterizam essa situação, sendo que uma das entrevistadas declarou ter sido moradora de rua
antes de residir na favela. E, mesmo com as dificuldades enfrentadas na moradia atual sua
situação melhorou muito desde então.
Um dos catadores possui limitação psicológica e física, sendo parcialmente
dependente de sua família. Mora com uma irmã e seus sobrinhos, e sua limitação decorre do fato
126
de ter sido vítima de meningite quando tinha apenas dois anos de idade, o que ocasionou seqüelas
para a vida toda. No entanto, esse participante do grupo de catadores já executava essa atividade,
por conta própria, antes do início do projeto.
Em se tratando da atividade econômica, dois dos entrevistados trabalham com
reciclagem de resíduos, duas são donas de casa, uma faxineira e dois desempregados. Um dos
entrevistados declarou ter sido lapidador de vidro, profissão que deixou de exercer devido a
substituição dessa mão de obra pela tecnologia da indústria de vidros, e trabalha com reciclagem
por não conseguir um emprego formal.
Trabalhar com a reciclagem de materiais, em geral, é visto como uma atividade dos
não qualificados, uma atividade que não agrega valor à pessoa, como é caso do depoimento de
um dos entrevistados, quando perguntado sobre quanto tempo trabalha com reciclagem: “Varia muito, porque as vezes eu arrumo serviço, tô trabalhando, e quando fico desempregado eu volto pra isso, que nem no ano passado eu tava trabalhando, aí acabou a experiência e fui dispensado, aí eu volto pra reciclagem. É pra eu não ficá parado, não quero dependê de irmão...”
Atualmente, dois participam de um grupo de rap, denominado Alta Voltagem, e
apesar de não receberem remuneração por essa atividade, ela é responsável por proporcionar
ocupação a esses jovens, segundo as palavras de um deles:
“(...) se não fosse pelo rap eu tava descabeçado”.
Em relação ao grupo familiar, dos sete indivíduos entrevistados, seis apresentam um
número de integrantes superior a cinco pessoas. Verifica-se que a descrição do grupo é coerente
com as análises realizadas pelo IBGE e pelo próprio município de São Paulo, conforme
demonstrou o estudo realizado por Saraiva e Marques (2004), no que diz respeito à baixa
escolaridade encontrada entre os moradores das favelas, ao baixo rendimento auferido, e à grande
quantidade de pessoas pertencentes ao grupo familiar.
Bloco II – Satisfação com o lugar e características das pessoas
Em relação à satisfação dos entrevistados, três (42,8%) responderam que gostam de
morar na Comunidade Madalena I, enquanto os demais (57,2%) declararam que gostariam de
mudar do local. A maioria salientou que está “acostumado a morar aqui”.
127
Entre os problemas de se morar na comunidade foram citados: sujeira; presença de
ratos, cobras e outros animais; falta de segurança para transitar nas vielas e becos, principalmente
a partir do escurecer; e o descaso do poder público pelo abandono da comunidade.
No entanto, 50% dos entrevistados declararam participar ativamente das atividades
que envolvem a vida dos moradores da favela. Duas delas prestam serviços eventuais junto ao
CEDECA e CDHS, um já foi eleito para o conselho tutelar e dois participam de atividades
culturais. Todos declararam ter interesse em contribuir para a melhoria do lugar, o que foi
evidenciado através do engajamento voluntário dessas pessoas no projeto de coleta de lixo porta a
porta.
Os catadores foram perguntados sobre quais as características dos indivíduos e da
comunidade que mais contribuem e quais as que dificultam a participação em intervenções
comunitárias, do tipo que foi implementada na favela. As respostas estão resumidas no Quadro 9.
Características Facilitadoras Dificultadoras Individuais Participação;
Solidariedade; Disposição em ajudar; Confiança depositada nos
catadores; Respeito pelos catadores; Esforçados; Pontualidade.
Conflitos e brigas; Preguiça; Dificuldade em ouvir o outro; Falar demais; Individualismo; Atitude egoísta; Desconfiança; “Boicote” Falta de conhecimento; Falta de educação; Teimosia; “Se meter” na vida do outro; Ausência de auto-estima; Dificuldade em acreditar que pode; Vergonha de trabalhar com lixo; Falta de assiduidade no trabalho.
Coletivas Colaboração; Participação.
Acomodação da população (se “ele” não faz, também não vou fazer);
Falta de consciência sobre os danos causados aos outros;
Falta de interesse em participar da vida da comunidade;
Falta de cooperação; Falta de organização; As pessoas querem mandar, dar
ordens; Ausência de liderança; Dificuldade de trabalhar em grupo
Quadro 9. Características individuais e coletivas
128
Fonte: Elaboração própria.
Como se tratava de questão aberta, os entrevistados podiam citar mais de um motivo,
razão pela qual estão apresentados os motivos em ordem decrescente, do mais citado ao menos
citado. Verifica-se que, embora tenham sido citadas características individuais e coletivas que
facilitam a participação da comunidade, como por exemplo: solidariedade, disposição em ajudar,
reconhecimento pela confiança depositada, colaboração e participação, as características
dificultadoras foram mais evidenciadas, tanto em quantidade como em repetição.
Bloco III – Infraestrutura, serviços e equipamentos públicos
Todos os entrevistados possuem água encanada e energia elétrica em suas moradias,
porém o encanamento do esgoto é precário. Nas palavras de um dos entrevistados:
“(...) aqui tem a infiltração da água e dos esgoto. A maioria dos esgoto aqui é a céu aberto porque chegando na beira do morro os cano de todo mundo cai ali, de pia, de esgoto... agora quem mora aqui em baixo...”
Declararam que depositam o lixo de suas residências nas caçambas e fazem a
separação de resíduos para reciclagem. No entanto, não dispõem de iluminação pública e
convivem diariamente com a montanha de lixo existente nas vielas e nas encostas, sendo a
quantidade de ratos a maior preocupação.
As informações colhidas durante as entrevistas são coerentes com as reclamações dos
demais moradores da favela, registradas durante a fase de diagnóstico. As preocupações
salientadas se referem, em sua grande maioria, às carências de saneamento básico e de acesso à
infra-estrutura, além da violência.
Bloco IV – Meio Ambiente
As expectativas dos entrevistados quanto à adesão voluntária dos moradores para
correta disposição do lixo, baseou-se em sua percepção durante a fase de coleta porta a porta, e na
convivência com a população da favela. Reflete, em parte, as características citadas no Bloco II.
Nas palavras de um dos entrevistados, dois meses após o término do projeto:
“eu moro aqui e eu confio no povo daqui, se tiver uma ajuda de fora, as coisas vão pra frente e agente conscientizô os outros né? A não jogar lixo ali... e agente conseguiu
129
porque nesse mês sempre desce lixo e ate agora não desceu. E eu creio que isso é conseqüência da coleta de lixo, né?”
Nesta fala evidencia-se a crença nas pessoas do lugar, porém revela-se, também, a
necessidade de uma assistência externa para que a mudança possa acontecer.
No entanto, os respondentes demonstraram grande desconfiança sobre a contribuição
dos moradores para solucionar o problema do lixo da favela. Foram unânimes em informar que
muitas pessoas se importam e se interessam, não sendo possível determinar quantos, mas as
características nomeadas mais freqüentemente, e com maior relevância, foram as características
negativas da população, revelando, mesmo que de uma forma velada, a descrença na
transformação dos moradores.
Bloco V – Comunidade
Inicialmente foram perguntados sobre se já participavam de outras atividades
comunitárias na favela. Somente dois dos respondentes informaram participar de atividades de
maneira informal, mas que estavam sempre se “inteirando” sobre todos os acontecimentos da
favela.
Um deles informou já ter participado, voluntariamente, de um projeto com trabalhos
artesanais para crianças e jovens que possuem necessidades especiais, tais como os portadores da
síndrome de Down, e, enquanto ajudava, também recebia os resíduos produzidos para
reciclagem. Dessa forma existia um interesse e uma ajuda mútua.
Percebeu-se que na favela não há lideranças formais, tampouco associações de
moradores. São poucas as iniciativas dos moradores para se unirem em prol de um objetivo
comum, muito embora alguns deles tenham o desejo de participar. Como exemplo, descreve-se a
fala de um dos respondentes em relação à participação em um projeto anterior na comunidade:
“Foi escrito de um jeito e foi feito de outro... era o povo da comunidade que era pra participar, pra fazer o que muita gente vinha aqui e fazia, ou melhor... não era gente nossa, era gente que nunca tinha visto na vida... pra fazer uma coisa pra comunidade e a comissão que tinha que decidir quem entrava quem não entrava, então passaram por cima da palavra dos morador, entendeu?”
Diferentemente dos resultados encontrados por Almeida e D’Andrea (2004), nos
estudos realizados na favela Paraisópolis, em Madalena I não são incentivadas as redes de
relações sociais, o que contribui para o enfraquecimento do capital social do lugar.
130
Também foram evidenciados aspectos negativos em relação à atuação dos moradores
como pode ser verificado nas palavras dos entrevistados:
“o povo aqui é muito acomodado, aqui enquanto três luta pelo objetivo, dez luta conta e a maioria senta e espera...” “as pessoas vão atrás do objetivo e aí pensam assim: ah, a pessoa conseguiu aquilo eu moro do lado, vai vim pra mim tamem”. “são muito mal desinformado. O povo é tão mal desinformado, que quando nois fizemo esse projeto do meio ambiente, agente passava catando lixo e os outro pensava que agente era da prefeitura!!!” “você tem que tá ali batendo na mesma tecla umas deiz mil veis pra depois entrá na cabeça”.
As características negativas mais destacadas foram: a acomodação, a falta de
informação e o desinteresse pelas atividades da comunidade.
Bloco VI – Experiência individual
Para os catadores, trabalhar no projeto de coleta de lixo teve um significado que
transcendeu sua colaboração com a coleta de lixo e melhoria das condições de vida da
comunidade. O significado maior foi o de exercitar cidadania. Resgatou o sentido moral, que
vincula o individuo à vida, à vontade de ter um futuro e direito a ter esperança. Deu um sentido
de dignidade humana, de respeito a si mesmo, e a capacidade de valorizar mais a sua própria
participação na sociedade. Desenvolveu-se um espírito de valorização:
“Qual é o resultado do trabalho? A comunidade vai dizer. Todo mundo tá falando de vocês, todo mundo tá falando na avaliação que vai ser feita pelos moradores. Então é isso que vocês tem que acreditar, vocês colocaram a cara a tapa, colocaram vocês, vocês se expuseram pra comunidade, o retorno vocês merecem ouvir deles também, o bem que fizeram pra lá”.
Também significa aprendizagem, amadurecimento, bem como abrir uma perspectiva
de aumentar o seu rendimento, como se verifica no seguinte depoimento:
“Pra mim trabalhá no projeto foi muito especial. Creditô ni nois, confiô... e eu espero que nois não teja decepcionado algum dia... eu agradeço muito”.
131
Outros participantes acrescentam:
“eu tamem... eu agradeço memo que você confiô ni nois entendeu? Muita gente aqui mal confiô na gente entendeu? E nunca falô vô dá esse serviço pra voceis compreendeu? E vê se voceis é capaz, porque, tipo assim, eu entendi assim, isso teve falha, teve, ninguém é perfeito. Cometemo muito erro, cometemo, mas valeu pra um conhecê o otro tamem, pra um brigá com o otro tamem, a partir do tempo que acabá esse serviço pra mim a amizade lá fora vai sê normal...” “não foi só coleta de lixo, foram muitas conversa, participei de palestra, conheci novos artesanato, coisa que eu gosto muito. Pra mim, como pessoa, eu melhorei bastante porque assim, tipo assim, agente passa a ser uma pessoa melhor. Agente vê nas otra pessoa os defeito dagente entendeu? Agente vê que as pessoa não gosta dos defeito daquela pessoa e que agente não gosta e tenta se corrigir.” “a lição que tive é ser mais humano com as pessoas, procurar entender mais as pessoas, não só criticar, porque eu tenho um lado crítico pra burro. Procurar ser mais humilde, eu sô humilde, ouvir o outro, eu aprendi a ver o outro lado da pessoa, procurar compreender mais as outras pessoas não só pensar em só se aproximar...”
Um outro aspecto a ser destacado é o resgate do respeito pelo outro, e permite maior
responsabilidade e interesse pelo seu grupo social. A partir da união de pessoas com interesse
comum, como na implementação de um projeto, é possível que alguém do grupo se sinta na
obrigação de apoiar outros, que são considerados ainda mais excluídos.
Desperta um sentimento de solidariedade humana, mesmo entre pessoas igualmente
excluídas e vulneráveis, como é o caso do tratamento dispensado ao elemento do grupo com
limitações pessoais. Todos se referem a ele de uma forma carinhosa e gentil:
“ele virou o menino da turma e com ele tem sempre um cuidado”.
Muitas vezes esse sentimento de solidariedade é tomado como fonte de interesse
mútuo, na base da troca: se você me ajuda eu lhe ajudo também:
“o primeiro dia de serviço fui bem recebida pelo grupo, até hoje, não tenho queixa de nenhum deles, e pelos morador da comunidade também, por cada casinha foi chegando com café, tem bolacha, tem um bolo...”
Desenvolveu-se a necessidade de trabalhar em equipe, respeitar o outro em suas
diferenças:
132
“geralmente eu mesmo sentava lá e tinha vez até que eu falava uma coisa e o pessoal falava não beleza, vamo fazê isso, beleza”. “a hora que agente chegava no larguinho um entra num beco, um entra no outro e outro entra no outro, cada qual faz seu trabalho”. “quando agente se propõe a sentar todo dia pra avaliar, é um exercício, botá a roupa suja pra lavar naquele momento, passou o dia não adianta, fica a dor, fica mal entendido, aí pra reparar é difícil...”
Os indivíduos assumiram seu papel de protagonistas do processo. Essa afirmação
pode ser constatada por ocasião de uma visita não agendada da sub-prefeitura à área da favela,
quando o grupo foi pego de surpresa, e foi possível negociar uma solução para a remoção do lixo
que havia sido acumulado, após o mutirão dos moradores no final de semana:
“muita veiz eu erro, mas acho que nesse ponto eu achei eu certa. Cheguei lá, falei a realidade nossa é essa. Expriquei direitinho pra ele na dipromacia, nossa realidade é essa, isso, isso e isso, que que o senhor vai fazer? O que que ele falô? Te garanto que até dia tal tomo uma atitude. Não foi? Veio nessa semana”.
Bloco VII – Experiências compartilhadas
Em relação às mudanças percebidas no comportamento e nas atitudes dos moradores
da comunidade, e se houve melhorias para o ambiente da favela, observou-se uma mobilização
positiva, mesmo daqueles que não aderiram ao projeto.
“eu vejo o buracão ali meu! Eu vejo o buracão, eu olho assim e eu sinto a diferença, eu sinto a diferença e realmente nesses dois meses se o lixo fosse pra lá, sei lá, acho que o morro já tinha descido de novo, a quantidade foi grande né?” “mudou, quando foi na segunda-feira, que fomo começá a coleta de casa em casa, agente descemo lá embaixo, o pessoal ouviu o barulho dos carrinho, já tinha duas ou três senhoras saindo com a vassoura, xi xi xi, já foi varrendo, já foi juntando o lixo, de uma hora pra outra o beco ficou limpo.” “de noite ninguém dormia com os rato, roíam tudo e agora não tem mais rato.” “uma coisa que nóis conseguimo prová é que jogá lixo no morro aumenta o número de rato. Isso nóis provamo na prática. Se não jogar o lixo lá, não é só a questão do desmoronamento do barranco não, é a questão dos rato, diminui...” “percebi o aumento do verde, podem comparar com as fotos do início e de agora, como está mais verde, tem mais planta.”
133
“até a mulher do retalho não joga mais.” “pra muita gente foi importante, mesmo pra esses aí que não colaboravam, achava que não é problema meu. No meu pensamento eu acho que eles deram um passo. Eu passava: coleta, coleta, coleta. Péra aí moço! Vai deixando aí fora, tô indo, tô indo”. “limpeza interfere no modo de pensar, de agir, de falar com as pessoa, educa as pessoa”. “as pessoa mudaram muito, eles tavam trazendo o lixo, jogando dentro da caçamba, agente via, muita gente trazendo o lixo, muita, muita gente”. “Mudou. Mudou por causa de que o fato era que todos, maioria dos moradores que moravam na sociedade de baixo, não sei se era por preguiça, eu não sei, mas eu sei que sempre jogavam no lugar mais próximo, que era o buracão. Eles sempre jogavam lá já faz mais de 10 anos, e agora eles joga nas caçamba”.
Com a participação efetiva dos membros dessa comunidade, observou-se uma real
implicação na identificação e priorização dos problemas, e na busca de soluções mais adequadas
ao contexto. Como aponta Wisner (1998), a situação de vulnerabilidade das pessoas está
intimamente relacionada com a sua capacidade de reação. O empoderamento da comunidade agiu
como uma força propulsora capaz de amenizar a situação de risco vivenciada.
Através da experiência de coleta de lixo nas moradias percebeu-se muito mais do que
a limpeza proporcionada ao lugar, mas também uma ação que despertou a colaboração das
famílias e a preocupação com o meio ambiente. Cada um pode perceber que a sua participação,
ainda que pequena, representou uma significativa mudança nas condições ambientais do lugar.
4.5.2 Entrevistas com os representantes dos participantes no projeto
Foram entrevistados cinco indivíduos, dois homens (um com 49 anos de idade e outro
com 35, ambos casados) e três mulheres (uma com 35 anos de idade, solteira, e as outras duas
com 48 anos, casadas), sendo uma advogada, uma psicóloga, um industriário aposentado, um
educador, e uma com formação em pedagogia e pós-graduação em adolescentes em conflito com
a lei.
Todos atuam em atividades que envolvem questões sociais junto aos atores que
participaram do projeto.
134
Com a intenção de apresentar, resumidamente, os resultados obtidos com as
entrevistas dos representantes dos demais participantes do projeto, são apresentadas as
características marcantes reveladas em cada um dos temas abordados.
As características estão relacionadas na ordem crescente de freqüências, ou seja, as
que foram mais recorrentes são relacionadas em primeiro lugar.
O quadro 10 apresenta os motivos explicitados pelos entrevistados para justificar os
motivos da mudança.
Mudanças na vida dos moradores
Relacionados as situações dos direitos: • Reconhecer a sua própria situação de exclusão. • Sentimento de ser cidadão Relacionados as situações de empoderamento: • Se sentiram valorizados e percebidos;. • Visualizar algo mais que o lixo; • Conquistar futuras oportunidades de emprego; • Atingir além do que estava no papel; • Mudança para além do local, o estilo de cada um que foi
transformado; • Organização, a comunidade faz hoje a coleta por conta própria.
Quadro 10. Motivos da mudança. Fonte: Elaboração própria
Algumas mudanças puderam ser constatadas de imediato, através da mudança no
comportamento de um número significativo de pessoas em relação ao descarte dos resíduos, e em
relação ao cuidado dispensado à sua própria aparência. O sentimento de ser cidadão pode ser
percebido pela satisfação dos catadores em ter seus documentos regularizados, em relação à
abertura de conta em banco, e obter um cartão de movimentação e, principalmente, de ser ouvido.
O quadro 11 apresenta os motivos que os entrevistados utilizaram para justificar as
contribuições da intervenção junto à comunidade.
Contribuições da intervenção
Relacionados as situações práticas: • Ser idealizado pela própria comunidade, fazer com a comunidade
e não para. • Levar a possibilidade de se organizarem; • Buscar o reconhecimento dos direitos enquanto cidadão;
135
• Aprender juntos; • A limpeza acaba contaminando a vida das pessoas; • Fortalecer o protagonismo dos indivíduos; • Contribuir para um novo olhar do poder público; • Sistematização das ações; • Remuneração financeira para os catadores. Relacionados as situações subjetivas: • Expressar os sentimentos; • Se reconhecer enquanto ser humano; • Organização, a comunidade faz hoje a coleta por conta própria; • Conquistar futuras oportunidades de emprego; • Atingir além do que estava no papel; • Mudança para além do local, o estilo de cada um que foi
transformado.
Quadro 11. Contribuições da intervenção Fonte: Elaboração própria
Podem ser definidos dois tipos de contribuição para a intervenção: práticas e
subjetivas. As práticas demonstram um efeito imediato, e contribuem diretamente para o projeto,
enquanto que as subjetivas são aquelas que vão interferir em outros aspectos da vida, não apenas
aos relacionados à coleta e manejo do lixo.
A intervenção possibilitou um aprendizado conjunto. Ao mesmo tempo em que a
comunidade se apoderou dos conhecimentos e das habilidades transmitidos, o grupo que
acompanhou sua realização também se apropriou de novos conhecimentos, principalmente
quanto à gestão e articulação de projetos.
A dinâmica estabelecida pela pesquisa-ação foi fundamental para a participação da
população, trazendo idéias, críticas e sugestões para o aprimoramento do projeto. No entanto,
também foram observados dificultadores para a aplicação do projeto conforme relatadas no
quadro 12, que trata dos motivos explicitados pelos entrevistados para justificar as limitações da
intervenção.
Limitações da intervenção
Relacionados a estrutura: • O tempo foi muito curto para se proporcionar mudanças efetivas
nas pessoas; • Limitações de recursos financeiros; • Ter começo, meio e fim, fica faltando a continuidade; • Nem sempre o projeto é aplicado da forma como foi concebido,
quem aplica não é o mesmo que idealiza;
136
• Cada viela possui uma dinâmica própria, o que dificulta normalização de procedimentos.
Relacionados aos fatores interdependentes ao projeto: • Ausência de atuação do poder público; • A presença de organização externa é fundamental; • Se não estiver presente o tempo todo, não acontece; • Provocar mudança. Sair de uma situação de acomodação para
uma situação de se implicar. Quadro 12. Limitações da intervenção Fonte: Elaboração própria
Os entrevistados foram unânimes em relatar a dificuldade e a frustração de se
trabalhar por projeto, principalmente neste estudo, pela curta duração da ação.
Os quadros 13, 14 e 15, traçam as características observadas pelos entrevistados que
facilitam e que dificultam a mudança da população estudada.
Características que facilitam a mudança
• A vontade das crianças; • O desejo de ir além; • Curiosidade; • Interesse em fazer diferença; • Responsabilidade em assumir uma tarefa; • Sensação prazerosa de ter sua idéia aceita, aprovada; • Percepção de que “agente pode”; • Desejo de fazer parte; • Atuação das lideranças informais.
Quadro 13. Características da comunidade que facilitam a mudança Fonte: Elaboração própria
Coerente com um dos princípios básicos propostos por Watts e Bohle (1993), isto
pode ser entendido como o início de um processo de empoderamento, promovido pelo projeto
participativo, pelo qual as comunidades se acostumam à idéia de assumirem a gestão de suas
atividades produtivas, assegurando a minimização dos riscos ambientais pela viabilização de
novos comportamentos e pelas transformações do meio circundante.
Características que dificultam as mudanças
Em relação às crenças e valores:
137
• História de vida, fruto de inúmeras violações; • Sentimento de injustiça; • Sentimento de inferioridade; • Se sentem culpadas pela sua própria situação de exclusão; • São regidos pela perspectiva do assistencialismo, aguardando
pelos “outros” e assumem a posição de que “alguém” que não “eu”, tem que fazer alguma coisa;
• Acomodação; • Baixa auto-estima, adotando formas de compensação como o
vício do álcool; • Descuido com a própria aparência pessoal; • Se misturam com o lixo e parece que fazem parte daquilo. Em relação à participação da comunidade: Falta de conhecimento; Certo “boicote” às atividades; Ausência de lideranças formalmente constituídas; Dificuldade de se reunirem para discussão de assuntos de
interesse comum; Pessoas escolhidas ou indicadas, sem a participação da
comunidade; A existência de várias realidades, os que moram em cima e os que
moram embaixo. Quadro 14. Características da comunidade que dificultam a mudança Fonte: Elaboração própria
Entre as características citadas, é relevante comentar a que se refere aos “boicotes”
praticados pela comunidade. Esse comportamento se reflete, por exemplo, nas atitudes de alguns
pais que inibem a participação dos filhos em atividades, justificando que: “se eu não tive, você
também não precisa”. Ou, ainda, quando não se tem clareza sobre os motivos que “tais e tais”
pessoas participam das atividades e “eu não”. Nessas situações, o que prevalece é a necessidade
de se sentir “cuidado”, que provoca o isolamento, as críticas sem fundamentação, e um
distanciamento das pessoas, impedindo maior participação.
Para Parsons (1951), apud Mizruchi (2006), a base da ordem social está nas crenças
generalizadas e compartilhadas (valores), e em expectativas de comportamentos (normas)
interiorizados, predominantemente, por meio da socialização na infância. Na medida em que essa
socialização seja bem sucedida, a ação humana prossegue, voluntariamente, de acordo com os
valores e normas sociais.
No entanto, os relatos das histórias de vida da maioria da população dessa
comunidade contam sobre violações a que foi submetida, desde a mais tenra infância, resultando
no embrutecimento dos sentimentos e das ligações sociais.
138
Traços da comunidade na visão da sociedade
• Preconceitos; • Estigmatização.
Quadro 15. Traços da comunidade na visão da sociedade Fonte: Elaboração própria
Essa visão da sociedade em relação às favelas não é novidade. Pasternak (2002),
assim se refere à favela, vista pelos olhos das instituições e da classe média:
A favela... seria por excelência o local da desordem, território urbano dos pobres, tradução espacial da exclusão social. A nível de representação social, o favelado pertence não apenas ao mundo dos pobres, mas também ao mundo dos problemas sociais (PASTERNAK, 2002, p. 13).
O relato dos motivos, e das características explicitados nos quadros 12, 14 e 15,
mostram a dependência a que está sujeita uma comunidade vulnerável. A vulnerabilidade é
traduzida tanto no sentido sócio-econômico e de recursos disponíveis aos indivíduos, como na
estrutura de oportunidades definidas pelo mercado, pelo Estado e pela sociedade civil, da mesma
forma como identificadas por Busso (2001).
4.5.3 Questionário para os moradores
Esse questionário foi aplicado aos moradores da comunidade Madalena I, entre os dias
23 e 28 de setembro de 2009, próximo ao encerramento das atividades de coleta de lixo porta a
porta, em aproximadamente 120 moradias, selecionadas aleatoriamente, dentro e fora da área
delimitada para este estudo.
Foram treinados quatro jovens da própria comunidade para fazer a abordagem aos
moradores, em suas próprias casas. O fato dos moradores serem entrevistados por pessoas da
comunidade foi um facilitador, uma vez que o acesso e a receptividade das pessoas foi maior. No
entanto, pode-se observar que em função dessa atividade constituir-se uma novidade, uma vez
que eles não experimentam esse tipo de atividade no contexto de suas moradias, do conhecimento
prévio dos entrevistadores, e do receio de se comprometerem com as respostas formuladas,
muitos deixaram de responder a diversas questões formuladas.
139
O receio de se comprometerem com as respostas advém de dois motivos: primeiro,
por buscarem respostas coerentes com as normas e os comportamentos normalmente desejáveis,
segundo pelo receio de serem identificados como os sujeitos causadores da poluição da favela.
4.5.3.1 Características dos sujeitos
O número total de domicílios visitados foi de 126, sendo 94 moradias pertencentes à
área escolhida para a coleta de lixo (47% do total de moradias da área selecionada), e 32
moradias das demais áreas. As questões foram respondidas pelo morador disponível no momento
da entrevista e transcritas para o formulário de pesquisa (Anexo C) pelo entrevistador.
Dos respondentes, 102 eram do sexo feminino e 24 do sexo masculino. Em relação à
representação no lar, a grande maioria dos respondentes eram mães de família ou filhos. A Figura
19 apresenta o tempo de residência das famílias nesse domicilio. É importante observar que há
uma concentração muito grande de moradores que residem no local há mais de 10 anos.
1210% 4
3%108%
54%
76%
1513%
6556%
1 ano 2 anos 3 anos 4 anos 5 anos 6 a 9 anos M ais de 10 anos
Figura 19. Tempo de residência Fonte: Elaboração própria
Em relação à raça, 44% dos moradores se declararam pardos, 31% brancos e 25%
negros, e a Figura 20 mostra a distribuição das faixas de idade entre os respondentes.
140
0
5
10
15
20
25
30
35
40
11 a 15 anos 16 a 20anos
21 a 30anos
31 a 40anos
41 a 50anos
51 a 60anos
M aiores de61 anos
Figura 20. Faixa de idade Fonte: Elaboração própria
Com relação à escolaridade, a grande maioria informou não possuir o ensino
fundamental completo (47%), e apenas 3 respondentes se declararam analfabetos, no entanto,
quando perguntados sobre o hábito de leitura, 17 informaram não ler porque não sabem, 59 não
tem o hábito, 1 declarou tem limitação física, 1 informou que não pode comprar e 44 não
informaram.
A Figura 21 mostra a faixa de renda familiar dos respondentes. Verifica-se que 36%
dos entrevistados informaram possuir rendimento inferior a R$ 500,00, e 42% das famílias tem
rendimento entre R$ 500,00 e R$ 1.000,00.
13%
23%
42%
8%4% 10% até R$ 300,00
De R$ 301,00 a R$ 500,00
De R$ 501,00 a R$1000,00
De R$ 1001,00 a R$ 1.500,00
Acima de R$ 1.500,00
Não informou
Figura 21. Renda familiar Fonte: Elaboração própria.
141
Esses resultados reforçam a análise realizada por Saraiva e Marques (2004) que
aponta para o alto grau de analfabetismo e o baixo rendimento encontrado entre os moradores das
favelas quando comparados aos demais residentes do município de São Paulo.
Em relação à origem da população, Figura 22, 46% declararam ter nascido no estado
de São Paulo; 7% de outros estados da região Sudeste; 1% da região Centro-Oeste; 1% da região
Sul; e 37% são provenientes dos estados da região Nordeste.
58
8 813 17
71 2
10
Figura 22. Cidade de origem Fonte: Elaboração própria
Verificou-se que a grande maioria possui documentos pessoais: Certidão de
Nascimento, Carteira de Identidade, Título de Eleitor, e Carteira Profissional. Com a relação ao
CPF declararam possuir, embora não saibam informar se o documento está regular ou não.
Perguntados sobre a opção religiosa: 51% dos respondentes se declararam católicos, 39%
evangélicos e 10% informaram outras ou não têm religião.
Esse dado é particularmente importante considerando-se que a maioria das reuniões
para as quais os moradores foram convidados, aconteceram num salão onde funciona a igreja
católica da comunidade. Esse fato pode explicar, ainda que parcialmente, o baixo
comparecimento dos moradores.
4.5.3.2 Atividades de lazer da população
As atividades de lazer da população são apresentadas pela Figura 23.
142
Ouve rádio26%
Assiste televisão29%
Lê Jornais/revistas8%
Lê livro9%
Internet6%
Passeia na casa de parentes
18%
Outros4%
Ouve rádio Assiste televisão Lê Jornais/revistasLê livro Internet Passeia na casa de parentesOutros
Figura 23. Atividades de Lazer Fonte: Elaboração própria.
O tempo médio de horas que os entrevistados assistem televisão ficou acima de seis
horas por dia, e rádio quatro horas por dia. Com relação à categoria outros, foram informados:
igreja, shopping, bar, salão de dança e parques, porém com baixíssima incidência.
4.5.3.3 Coleta porta a porta
Perguntados se a coleta de lixo foi implantada em sua residência, 97 responderam sim,
24 responderam não, e 5 não souberam informar.
A resposta à pergunta: O quanto a coleta de lixo trouxe melhorias para sua vida e de
sua família, é apresentada pela Figura 24.
Não melhorou6% M elhorou pouco
18%
M elhorou Bastante37%
M elhorou M uito32%
Não informou7%
Não melhorou M elhorou pouco M elhorou Bastante M elhorou M uito Não informou
143
Figura 24. Melhorias da Coleta. Fonte: Elaboração própria.
A melhoria que a coleta de lixo trouxe para a vida da população foi percebida como
positiva para 69% dos entrevistados.
Quanto a contribuição da coleta para a limpeza das vielas, 78% dos respondentes
informaram que as vielas ficaram mais limpas, 11% responderam que não houve mudanças e para
10% foi indiferente ou não informaram. No entanto, quase a totalidade dos respondentes
admitiram que a coleta é importante para a população, apenas 1 morador declarou-se contrário à
manutenção da coleta.
Em relação ao que fariam para melhorar a coleta, 34% concordou com a forma como
vinha sendo feita e 38% não informou. Os demais ofereceram as seguintes sugestões:
Que a coleta fosse estendida para todos (9%);
Aumentar a quantidade de catadores (8%);
Aumentar a freqüência do recolhimento do lixo (7%);
Maior cuidado para recolher o lixo (2%), e
Maior cooperação dos moradores (2%).
As sugestões dos entrevistados sobre o que deve ser feito para melhorar a coleta dos
resíduos constituem contribuições úteis para o planejamento, implantação, execução e
monitoramento de programas de gerenciamento de resíduos sólidos, inclusive com programas de
esclarecimento à população com o objetivo de obter maior cooperação dos moradores.
As respostas sobre onde o lixo era descartado e onde é atualmente, estão representadas
pela Figura 25. Note-se que a pesquisa foi realizada nos últimos dias da coleta, motivo pelo qual
62 moradores informaram a coleta porta a porta.
144
85
55
4 0
35
0 0
62
29
0102030405060708090
Caçamba Viela Encostada RuaNova
Porta aporta
Nãoinformou
Onde era Onde é
Figura 25. Local de descarte do lixo Fonte: Elaboração própria
Entre os entrevistados houve um aumento de 31% de moradores que passaram a
descartar o lixo nas caçambas, e uma redução de 35% de moradores que deixaram de jogar o lixo
na encosta da Rua Nova.
Com relação à separação de material reciclável, 58% dos respondentes informaram
fazer a separação, 48% não fazem e 2% não informou. Os materiais que são objeto de separação
são apresentados na Figura 26. Além disso, 22% dos respondentes informaram vender o material
reciclável, enquanto que 78% informaram que doam para catadores.
Garrafa8%
Plástico46%
Não informou6%
Papel20%
Vidro2%
M etal15%
Papelão3%
Garrafa Plástico Não informou Papel Vidro M etal Papelão
Figura 26. Tipo de material separado Fonte: Elaboração própria
145
Verificou-se que muitos moradores que trabalham com reciclagem recolhem os
resíduos fora da comunidade e os trazem para separação na própria casa, atividade que é
realizada de forma extremamente precária. Entre os que trabalham em casa, a maioria citou que é
melhor desenvolver a atividade por conta própria do que se filiar a uma cooperativa, pois podem
contar com o resultado financeiro diariamente, ao invés de ter que aguardar até o final do mês
quando os lucros são distribuídos entre os cooperados.
4.5.3.4 Problemas com o lixo
Perguntados sobre se têm conhecimento dos problemas causados pelo lixo, 77%
responderam afirmativamente, 20% declararam desconhecer os problemas, e 3% não informou.
Os problemas mencionados foram: doenças, mau cheiro, poluição, baratas, desmoronamento das
casas, ratos, dengue, enchente e mosquitos, e são apresentados na Figura 27.
Doenças19%
Mal cheiro1%
Poluição14%
Barat as7%
Desmoronament o5%
Rat os41%
Dengue2%
Enchent e10%
Mosquit os1%
Doenças Mal cheiro Poluição Barat as Desmoronament o Rat os Dengue Enchent e Mosquit os
Figura 27. Problemas causados pelo lixo Fonte: Elaboração própria
Destaque para a quantidade de respondentes que mencionaram ratos (41%), ou seja
quase metade dos respondentes são incomodados, e embora a população conviva diariamente
com o lixo, o percentual de respondentes que declararam desconhecimento dos problemas
causados pelo lixo é expressivo.
A poluição foi citada apenas por 14% dos respondentes demonstrando que o impacto
sobre o meio ambiente é percebido somente a partir da ocorrência de catástrofes ambientais,
confirmando uma propensão à não adoção do comportamento pró-ambiental como descrevem
Romeiro et al. (2009).
146
4.5.3.5 Responsabilidade Ambiental
Em relação à responsabilidade ambiental, 67% declararam que já ouviram falar a
respeito, 25% desconhecem, e 8% não informaram. Entre os respondentes 27% já participaram de
alguma atividade de educação ambiental, sendo citados: mutirão de coleta de lixo, seleção de
resíduos e palestras na escola, enquanto que 72% nunca participaram, e 1% não informou. No
entanto, para 96% dos respondentes, foi considerado importante receber informações e participar
de ações de educação ambiental.
Com o objetivo de entender um pouco mais sobre a percepção dos respondentes, em
relação às questões do meio ambiente, foram apresentadas sete frases para que fosse atribuída
uma nota, numa escala de 1 a 5, onde 5 = Concorda totalmente e 1 = Discorda totalmente.
As respostas estão representadas graficamente através das figuras 28.
3013 119
0 50 100 150
É responsabilidadede cada um
contribuir com asquestões do meio
ambiente
DiscordoTotalmente
Discordo Concordo Concordomuito
ConcordoTotalmente
Figura 28. Responsabilidade de cada um Fonte: Elaboração própria
Pode-se observar que a grande maioria dos entrevistados (95% concorda totalmente,
1% concorda, e 2% concorda muito) têm consciência sobre a necessidade de todos se envolverem
com a questão do meio ambiente, no entanto, 2% responderam discordo totalmente.
147
40 2 21 2 61
0% 20% 40% 60% 80% 100%
A responsabilidadeem relação ao lixo
e ao meioambiente é da
prefeitura
DiscordoTotalmente
Discordo Concordo Concordomuito
ConcordoTotalmente
Figura 29. Responsabilidade da Prefeitura Fonte: Elaboração própria
O resultado encontrado confirma a pesquisa realizada por Crespo (2001), que
identifica uma clara tendência da população brasileira, cada vez mais, atribuir
responsabilidades ao poder local para resolver os problemas relacionados ao meio
ambiente.
Conforme exibido na Figura 30 a maioria dos moradores demonstra interesse nas
questões relacionadas ao meio ambiente, no entanto, 72% dos respondentes informaram nunca ter
participado de atividades ambientais.
11 1 13 6 95
0% 20% 40% 60% 80% 100%
Tenho interessepelas questõesrelacionadas aolixo e ao meio
ambiente
DiscordoTotalmente
Discordo Concordo Concordomuito
ConcordoTotalmente
T
Figura 30. Interesse pelas questões do meio ambiente Fonte: Elaboração própria
148
Na Figura 30 os respondentes informam sobre sua intenção de colaborar com o meio
ambiente, enquanto que a Figura 31 apresenta a disposição dos mesmos em praticar a ação. Pelas
respostas obtidas verifica-se que 61% dos respondentes discordam da afirmação, porém 39%
concordam que a separação dá muito trabalho.
74 3 14 1 34
0% 20% 40% 60% 80% 100%
Separar o lixo parareciclagem dámuito trabalho
DiscordoTotalmente
Discordo Concordo Concordomuito
ConcordoTotalmente
T
Figura 31. Reciclagem dá muito trabalho Fonte: Elaboração própria
57 1 11 2 55
0% 20% 40% 60% 80% 100%
Tentar controlar apoluição dá
trabalho que nãovale a pena
DiscordoTotalmente
Discordo Concordo Concordomuito
ConcordoTotalmente
T
Figura 32. Controlar a poluição não vale a pena Fonte: Elaboração própria
149
61 1 14 5 45
0% 20% 40% 60% 80% 100%
Eu sozinho(a) nãoposso fazer nadapara preservar omeio ambiente
DiscordoTotalmente
Discordo Concordo Concordomuito
ConcordoTotalmente
T
Figura 33. Sozinho não posso fazer nada Fonte: Elaboração própria
12 0 13 6 95
0% 20% 40% 60% 80% 100%
A reciclagemdiminui a poluição.
DiscordoTotalmente
Discordo Concordo Concordomuito
ConcordoTotalmente
T
Figura 34. Reciclagem diminui a poluição Fonte: Elaboração própria
Os respondentes informaram concordar com a afirmação de que a reciclagem diminui
a poluição, conforme mostrado na Figura 34, onde 90% expressam sua concordância. No entanto,
demonstram sua descrença em poder contribuir para a solução do problema, conforme
apresentado na Figura 32, onde 55% dos respondentes informam que controlar a poluição não
vale a pena, e na Figura 30, mostrando que 51% das pessoas acreditam que não podem fazer
nada.
Esses resultados corroboram com a pesquisa sobre as características dos brasileiros
com menor propensão à adoção do comportamento pró-ambiental (ROMEIRO et al., 2009), no
que diz respeito a:
Defesa da impotência do individuo, colocando-o na posição de vítima e isentando-
o de assumir a responsabilidade pela sua participação ativa no coletivo;
150
O poder de resolução dos problemas do coletivo fica sempre projetado no outro
(governo, instituições, mídia) que são os únicos considerados suficientemente
fortes para mobilizar os indivíduos.
Dessa forma, constata-se que a vulnerabilidade de grande parte dos moradores dessa
comunidade vai muito além da exclusão social e econômica, e podem ser considerados
indivíduos “duplamente vulneráveis”, conforme descrito por Baker, Gentry e Rittenburg (2005).
Essas pessoas além de não possuírem ativos, habilidades, competências e outros recursos
necessários para reagirem contra essa situação, também demonstram que não conhecem o que é o
melhor para elas.
4.5.4 Considerações da fase de avaliação
Para os participantes diretamente envolvidos no projeto, a avaliação das práticas
desenvolveram-se num trabalho contínuo, tanto de auto-percepção, como na observação dos
outros, refletida sobre as transformações produzidas, trocando e analisando suas compreensões.
Isto pode ser verificado através de:
• Acordos estabelecidos para o funcionamento do grupo, tais como a divisão em
sub-grupos para percorrer toda a área demarcada, no menor prazo possível,
evitando-se que a mesma viela fosse visitada por outra equipe;
• Compreensões e interpretações do papel a ser desempenhado por cada um deles
junto a comunidade, no sentido de, além de oferecer esclarecimentos sobre a
coleta de lixo, também fossem evitados conflitos com os moradores;
• Reflexões e decisões grupais. O resumo do trabalho foi discutido diariamente,
após a pesagem do material recolhido. Esse procedimento foi necessário para
explicitar as concordâncias e discordâncias com as práticas adotadas.
• Participação dos elementos do grupo.
O processo reflexivo de coletar dados, registrá-los coletivamente, discuti-los e
contextualizá-los contribuiu para a construção de saberes e para o seu compartilhamento, num
processo transformador dos participantes e das condições estruturais. No entanto, as informações
151
fornecidas pelos entrevistados apontam para uma falta de clareza, de grande parte do grupo, dos
prejuízos causados pelo lixo doméstico que vem sendo descartado nas vielas e no morro.
Considerando a vulnerabilidade social e ambiental da região, chega-se a seguinte
questão: o ambiente da comunidade Madalena I propicia condições para que o comportamento
das pessoas, em relação ao descarte do lixo domiciliar, possa ser alterado?
A identificação e análise da percepção dos moradores sobre os problemas causados
pelo lixo é fundamental para que uma intervenção produza a transformação desejada. Essa
constatação reforça os resultados encontrados em estudos anteriores, tais como D’Almeida et al.
(2000); Brito; Pasquali (2006), entre outros, sobre a necessidade de conscientização, e da
fundamental participação dos sujeitos em programas que visam o manuseio e separação de lixo.
4.6 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS PARA A COMUNIDADE
Este tópico está subdividido em dois itens. O primeiro descreve como se deu a
apresentação dos resultados do projeto para a comunidade, e o segundo apresenta os
desdobramentos para a comunidade.
4.6.1 Reunião com os moradores
A reunião com os moradores aconteceu em 03 OUT 2009, sob a coordenação do
CEDECA, quando foram apresentados os resultados atingidos pelo ‘Projeto Piloto: Coleta Porta a
porta’.
Iniciou-se com uma dinâmica, com a distribuição de pedaços de papeis coloridos aos
participantes, onde eles deveriam anotar o seu próprio endereço. Em seguida, deveriam depositar
esses papeis, simbolizando sua existência, no mapa da cidade de São Paulo, colocado
previamente no salão (Figura 35).
152
Figura 35. Moradores na reunião de apresentação dos resultados Fonte: CEDECA, Projeto Coleta Porta a Porta
Chamou-se a atenção para o fato de que, nesse mapa, a Comunidade Madalena I não
figurava entre os bairros existentes na cidade.
Quando agente coloca, na reunião, vocês perceberam que o local que vocês residem não está no mapa? Vocês não são conhecidos? Isso mexe, mexe, talvez pra além do que agente gostaria de pontuar (Coordenadora do CEDECA).
4.6.2 Desdobramentos na comunidade
Segundo Thiollent (2008), a pesquisa-ação não pode correr o risco de se transformar
em ativismo, no entanto, sua pretensão é possibilitar o desenvolvimento do “nível de
consciência” e do conhecimento dos envolvidos. Portanto, os princípios teórico-metodológicos da
pesquisa-ação-participativa se aproximam dos princípios teórico-metodológicos da educação
ambiental. Nesse sentido, através da análise das etapas de pesquisa, na escolha e articulação de
um grupo de trabalho, pode-se observar uma construção coletiva dos indicadores de qualidade de
vida mais significativos para os moradores dessa comunidade como norteadores de ações
educativas ambientais, pela metodologia da pesquisa-ação-participativa.
Com todas as dificuldades, inerentes a uma metodologia participativa, que não
estabelece a priori e com rigidez as etapas dos estudos e, em particular, os resultados imediatos,
153
investiu-se no processo grupal para se atingir o objetivo prático da pesquisa, ou seja, facilitar a
mobilização dos moradores da Comunidade Madalena I para a implantação da coleta de resíduos
sólidos domiciliares, de porta em porta.
Coerente com a perspectiva da “revolução interna” (HAGUETE, 2007, p. 149), que é
peculiar a um trabalho participativo, este trabalho considerou que os objetivos práticos
específicos puderam ser alcançados, uma vez que proporcionou:
a) um processo concomitante de geração de conhecimento, tanto por parte dos
organizadores como dos participantes da ação;
b) o compartilhamento dos conhecimentos já existentes em cada um dos atores que
participaram do projeto;
c) um processo de mudança, seja aquela que ocorre durante a pesquisa, que pode ser
chamada de mudança imediata, seja aquela projetiva, que extrapola o âmbito e a
temporalidade da pesquisa, na busca de transformações estruturais e práticas que
favoreçam as populações ou grupos vulneráveis.
Neste sentido e coerente com Haguette (2007), a quebra da objetividade, considerada
como o aspecto mais saliente da pesquisa-ação, se justifica. O que interessa na pesquisa-ação não
é a captação do real em determinado momento, mas o processo de conhecimento que se
estabelece.
Entre os desdobramentos para a comunidade foram observados dois fatos de real
contribuição para o engajamento da população. Primeiro a execução da música “Brasil...”, escrita
pelo grupo de rap Alta Voltagem, durante a realização deste projeto de intervenção (Anexo B),
que foi posteriormente gravada.
Em segundo lugar, a constituição da Comissão de Meio Ambiente, composta pelo
grupo de catadores de materiais, com o objetivo de realizar o acompanhamento das ações
implementadas pelo projeto.
4.7 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS PARA O PODER PÚBLICO
A partir da reunião de apresentação do projeto à comunidade deliberou-se sobre a
forma de apresentação dos resultados atingidos para a Sub-Prefeitura de Vila Prudente e
154
Sapopemba. Duas solicitações foram encaminhadas, de imediato, através de ofícios do CEDECA,
aprovados pela Comissão de Meio Ambiente.
O primeiro solicitando implantação de iluminação na Rua Nova (Rua dos Córregos) e
a construção de serviço de saneamento básico nas vielas (Anexo G), e o segundo (Anexo F),
reivindicando a implantação da coleta de lixo porta a porta nas vielas, e a reorganização das
caçambas, com aumento da quantidade, e com sugestão de caçambas ecológicas para a separação
do lixo orgânico e material reciclável.
Todas as ações, recursos e resultados das pesquisas com os moradores, utilizados
durante o projeto, foram descritos em um volume que foi entregue à Sub-prefeitura e para os
demais participantes do projeto.
4.8 SÍNTESE DA AVALIAÇÃO DAS FASES DA PESQUISA-AÇÃO
De acordo com Richardson (2009), os objetivos da pesquisa-ação são: melhorar a
participação e produzir mudanças. Neste estudo, o propósito foi o de facilitar a mobilização dos
moradores da Comunidade Madalena I para a implantação da coleta de resíduos sólidos
domiciliares, de porta em porta, e contribuir para intervenções mais eficazes em comunidades
vulneráveis, considerando a percepção ambiental e o manejo do lixo como desencadeadores de
mudanças nos valores e comportamentos dos indivíduos.
Apesar da variação nas abordagens de pesquisa-ação, todas assumem que a
experiência vivida no cotidiano, quando re-significada através de processos reflexivos críticos é
passível de transformação, da mesma forma como a inseparabilidade entre conhecimento, ação,
teoria e práxis. Assim, da mesma forma que Barbosa e Giffin (2005), se acredita que através da
problematização da vida cotidiana é possível construir o alargamento da consciência crítica, no
sentido de compreender melhor o problema, e buscar alternativas para solução.
Neste estudo procurou-se não somente problematizar e refletir sobre os aspectos
relativos ao manejo e a disposição dos resíduos em Madalena I, mas, a partir desta experiência,
formar novos facilitadores e multiplicadores para trabalharem junto à comunidade, reforçando a
construção coletiva e a prática de cidadania. Para isso buscou-se atuar com voluntários
envolvidos am atividades direcionadas para as questões coletivas ou, no mínimo, interessados em
desempenhar o papel de agentes sociais. Investiu-se no sentido de que, ao final do projeto, esses
indivíduos tivessem adquirido uma maior desenvoltura para facilitar a discussão dos mais
155
diferentes temas relacionados ao seu cotidiano, particularmente em relação ao problema do lixo,
reivindicando e acompanhando junto ao poder público o cumprimento dos seus direitos.
Tanto na elaboração como na apropriação dos conhecimentos gerados, buscou-se
sempre incluir os participantes como sujeitos, e não meros objetos, no processo de produção do
saber. Coerente com a metodologia proposta, além dos temas contidos no planejamento inicial,
esteve sempre presente o princípio da flexibilidade e do acolhimento, reservando espaço para o
surgimento de novas idéias e sugestões, que emergiram durante o processo de interação.
Os depoimentos relatados pelos catadores, item 4.5.1, sobre as mudanças em suas
vidas, ilustram alguns resultados deste processo, desde a repercussão e conquistas no plano
individual como também no coletivo. O texto a seguir foi retirado do livro-diário que
acompanhou a implementação do projeto, produzido após uma roda de reflexão, e escrito pelo
grupo de catadores durante a fase inicial da coleta de resíduos, assim que começaram a enfrentar
as primeiras dificuldades de relacionamento, tanto no grupo, como na interação com os demais
moradores: Nós do grupo sentimos a colaboração dos moradores, e com a união vamos conquistar os nossos objetivos. Discutindo as relações com encontros e desencontros, encontramos a solução. Temos que tratar os moradores bem, mesmo com o desrespeito de alguns, e o grupo não recuou. E todos ganham com isso. Até mesmo as pessoas resistentes confiam no plano e bastaram só 5 dias. Todos ganham com isso.
Foi possível verificar que para além do problema do lixo, objetivo inicial deste
trabalho, os indivíduos envolvidos no projeto debateram e refletiram sobre vários outros temas,
tais como: organização, mobilização, saúde e segurança, participação e cidadania, entre outros,
sendo que, com maior intensidade, foram discutidos os problemas relacionados à convivência
entre eles. Entre as conseqüências ou desdobramento do projeto na comunidade, observa-se que
houve um efeito mobilizador com ganho de auto-estima e de capacitação coletiva.
No início da intervenção, a maioria dos membros da comunidade não se sentia capaz
de mudar a situação em vários aspectos das condições de vida social. O entusiasmo e a crença de
que seria possível atingir os objetivos do projeto foram num crescente, a medida que cada vez
mais os moradores aderiam à coleta.
Apesar de suas limitações, o projeto de Madalena I mostrou que é possível
desenvolver uma pesquisa participativa, com aspectos próprios à pesquisa-ação, revelando-se
156
capaz de desencadear uma série de conseqüências positivas em matéria de organização das
comunidades vulneráveis.
Com a participação efetiva de membros de cada um dos atores do projeto, observou-se
uma real implicação na identificação e priorização dos problemas e na busca de soluções mais
adequadas ao contexto. Dessa forma, foi possível contribuir para o aumento do conhecimento e a
capacitação dos indivíduos no que diz respeito aos processos de disposição correta dos resíduos, e
de coleta seletiva, bem como influir diretamente na produção de novos conhecimentos, alterando
o comportamento e os valores da comunidade.
Através da participação voluntária dos integrantes junto à comunidade foi possível,
também, promover e desenvolver uma maior consciência ambiental, com a multiplicação dos
conhecimentos adquiridos nas reuniões, seminários, treinamentos e visitas realizadas durante a
fase de implementação do projeto.
Além do objetivo prático proposto neste trabalho, a pesquisa também se dedicou a
analisar em que medida a intervenção e as experiências compartilhadas entre os indivíduos
facilitaram as transformações de valores e comportamentos. É esse aspecto que será abordado no
próximo item.
4.9 ANÁLISE DOS RESULTADOS SOB O ENFOQUE DO MODELO CONCEITUAL
Este item faz uma avaliação dos resultados utilizando o modelo conceitual adotado.
Conforme descrito no modelo são tecidas considerações sobre os seguintes aspectos: condições
externas, características dos indivíduos, características da comunidade, elementos da intervenção,
experiências compartilhadas, e valores e comportamentos.
Para responder ao objetivo do conhecimento do presente estudo, utilizou-se a análise
de conteúdo das entrevistas realizadas. As categorias iniciais, intermediárias e finais foram
formuladas levando-se em consideração três condições básicas: a exclusão mútua, a
homogeneidade e a pertinência.
Pelo critério de exclusão mútua, construíram-se categorias de forma que um elemento
não pudesse ter dois ou vários aspectos suscetíveis de serem classificados em duas ou mais
categorias. O princípio de exclusão mútua depende da homogeneidade das categorias, ou seja, um
único princípio de classificação deve reger a organização das categorias. Finalmente, a
157
interpretação, consistiu em captar as semelhanças entre os conjuntos de dados em função do
modelo de vulnerabilidade proposto por Baker, Hunt e Rittenburg (2007), que reconhece que a
vulnerabilidade vem de fontes múltiplas e é respondida em várias maneiras.
A inserção da pesquisadora na comunidade, e a análise de conteúdo das entrevistas
permitiram observar que, de uma maneira geral, as características marcantes dessa comunidade
podem ser verificadas pela leitura da figura 36.
Figura 36. Características marcantes Fonte: Elaboração própria
Essas características marcantes, transportadas para o modelo conceitual adotado, são
apresentadas pela Figura 37.
Valores e Comportamentos
Condições Externas Falta de saneamento; Ratos; Esgoto a céu aberto; Doenças; Ausência de projeto de urbanização;
Violência.
Características dos Indivíduos
Interesse e valorização Perseverantes. História de vida; Individualismo; Acomodação; Falta de conhecimento Baixa auto-estima;
Características da Ausência de lideranças
formais; Tendência ao assistencialismo exacerbado;
Valores egoístas.
Elementos da Intervenção Participação da comunidade; Tempo de duração; Remuneração financeira; Equipamentos e ferramentas
Experiências Compartilhadas Participação em seminários, treinamentos e reuniões;
Convivência com os catadores
158
Figura 37. Características marcantes adaptadas ao modelo conceitual Fonte: Adaptado de Baker, Hunt e Rittenburg (2007)
Fatores que influenciam experiências
de vulnerabilidade
Experiências compartilhadas durante a
intervenção
Respostas individuais, coletivas e de Políticas Públicas
que facilitam ou impedem as transformações
Resultados da
Intervenção
Características dos Indivíduos: - Interesse e valorização; - Perseverantes; - História de vida; - Individualismo; - Acomodação; - Falta de conhecimento; - Baixa auto-estima.
Características da Comunidade: - Ausência de lideranças formais: - Tendência ao assistencialismo; - Valores egoístas.
Condições externas: - Falta de saneamento; - Ratos; - Esgoto a céu aberto: - Doenças; - Ausência de projeto de urbanização; - Violência.
Elementos da Intervenção: - Participação em seminários; - Participação em treinamentos; - Participação em rodas de reflexão; - Convivência com os catadores; - Interação entre os participantes do projeto; - Convivência e interação com os moradores da área selecionada para o projeto; - Interação com o poder público.
Aprendizagens: - Sobre as doenças causadas pelo lixo; - Sobre como aumentar a própria renda com os resíduos; - Sobre comportamentos interpessoais
Elementos da intervenção: - Valorização da participação da comunidade; - Tempo de duração do projeto; - Remuneração financeira oferecida aos catadores; - Fornecimento de equipamentos e ferramentas; - Comunicação ao poder público.
Valores
transformados
Comportamentos
alterados
Políticas públicas
implementadas
159
4.9.1 Condições Externas
A precariedade das moradias, a falta de higiene e saneamento, como esgoto a céu
aberto, telhados quebrados, ausência de pisos ou assoalhos, torna as famílias mais vulneráveis às
doenças. Além dessas condições, há uma situação que interfere diretamente na vida dos
moradores que é o clima de violência dominante na favela. A violência, neste caso, pode ser
considerada como uma condição externa, uma vez que não está sob o controle dos moradores da
comunidade.
O tráfico de drogas, a criminalidade e a agressividade nas relações são influenciadores
diretos nas relações da comunidade.
O empobrecimento dessas famílias faz com elas busquem recursos que nem sempre
são os mais adequados. A submissão de algumas famílias desta comunidade ao controle dos
traficantes, muitas vezes, passa a ser uma questão de sobrevivência, já que a ausência deles pode
resultar na ausência de provisão de recursos, proteção e segurança.
Esse fato pode ser constatado pela declaração de um dos entrevistados, quando fala
sobre a segurança na comunidade:
“...segurança, a própria comunidade que é a segurança daqui”
4.9.2 Características dos Indivíduos
Em relação às características biofísicas dos indivíduos, há uma predominância de
pessoas muito jovem e de idosos. O nível de escolaridade é muito baixo, a grande maioria não
completou o ensino fundamental. Quanto à renda, a grande maioria tem renda familiar menor que
R$ 1.000,00, para sustentar famílias numerosas, pois a maioria é composta por cinco ou mais
membros.
Se por um lado os indivíduos são, em geral, retratados pelo próprio grupo como
pessoas: acomodadas, individualistas, indolentes, com pouco conhecimento e informação, por
outro, demonstram um grande interesse em contribuir quando suas habilidades são valorizadas. A
partir do momento que têm o reconhecimento de suas competências e habilidades passam a
160
demonstrar um espírito de solidariedade e de ajuda mútua para que o objetivo do grupo possa ser
alcançado.
4.9.3 Características da comunidade
Como característica marcante dessa comunidade evidenciou-se uma grande
dependência de assistência externa. É necessário que os participantes da comunidade enxerguem
assistência social como o conjunto de práticas que visam à emancipação dos indivíduos. No
entanto, para a maioria dos entrevistados verificou-se que a necessidade de contar com a ajuda
externa, principalmente no que diz respeito à defesa dos seus direitos é bastante presente.
Muito provavelmente esse comportamento traduz a forma como a maioria das ações
de governo, e de investimentos de empresas e de indivíduos têm sido utilizadas junto à
populações carentes e/ou vulneráveis. Estamos longe de entender a real importância do
investimento social, basta verificar que a maioria do investimento realizado pelos governos
federal, estadual e municipal tiveram como destino medidas assistencialistas e não condições para
que o cidadão fragilizado possa alcançar os seus direitos.
Os valores egoístas também aparecem como características marcantes dessa
comunidade. Considerando que o egoísmo é um traço da personalidade de um individuo que se
caracteriza por hábito ou atitude de privilegiar seus interesses desconsiderando as demais pessoas
envolvidas, há uma forte relação entre o hábito de resolver o seu problema de descarte do lixo
sem se preocupar com o que acontece com as outras pessoas ou com o meio ambiente. Há uma
forte relação entre os valores apreendidos por cada individuo dentro da própria família, e, as
atitudes e hábitos egoístas são desenvolvidos, em principio, nessa relação, onde cada morador de
favela busca desesperadamente o melhor pra si, já que há tão pouco disponível.
E, por último, a ausência de lideranças, associações ou grêmios que facilitem a
organização da comunidade são fatores que não promovem apoio, orientação, respeito e
responsabilidade. São as lideranças que podem definir um novo rumo ou a visão de um grupo,
mostrando o caminho a ser seguido.
4.9.4 Elementos da Intervenção
161
A característica que se destaca na implementação deste projeto foi a busca da
participação da comunidade. O projeto de coleta de lixo porta a porta foi idealizado pelos
integrantes da própria comunidade, o que lhe conferiu uma distinção especial. Todas as reuniões,
seminários e rodas de reflexão foram abertas para possibilitar a participação dos moradores e dos
grupos de apoio ao projeto.
Buscou-se a valorização dos participantes, não só em relação às idéias apresentadas,
mas também oferecendo recursos financeiros e materiais para a execução das tarefas. A
valorização das pessoas pressupõe dar autonomia para o atingimento de objetivos, tanto
individuais como coletivos, criar oportunidades de aprendizado, de desempenho das
potencialidades e de reconhecimento pelo bom desempenho.
Além disso, uma característica preponderante para a implantação do projeto foi a
contra-partida financeira oferecida aos catadores de materiais pelos serviços prestados. Esses
recursos foram citados por vários participantes como determinantes para o engajamento das
pessoas ao projeto.
Outra característica importante foi o tempo de duração do projeto, citado pela maioria
dos entrevistados como insuficiente para provocar uma efetiva mudança de comportamento dos
moradores da comunidade Madalena I. No entanto, acredita-se que o objetivo prático proposto foi
atingido, na medida em que foi demonstrado que a coleta de resíduos domiciliares pode ser
implementada, cabendo ao poder público fazer com que o serviço de coleta porta-a-porta seja
oferecido a todos os moradores.
4.9.5 Experiências compartilhadas
A participação em seminários, treinamentos e rodas de reflexão contribuíram para o
desenvolvimento do conhecimentos, das habilidades e das atitudes dos participantes do projeto,
em especial, aqueles que tiveram o papel de interagir constantemente com toda a população da
favela, ou seja, os catadores de resíduos.
No que diz respeito aos conhecimentos foi possível proporcionar treinamentos em
áreas técnicas (separação e reciclagem de resíduos, aterros sanitários), na área de saúde e higiene
e na área de relacionamento entre grupos, permitindo que as habilidades e as atitudes pudessem
ser desenvolvidas.
162
A interação entre os grupos foi fundamental para que fossem estabelecidas as
condições para um compartilhamento das experiências vivenciadas.
4.9.6 Valores e Comportamentos
Assim como no modelo proposto pelos autores Baker, Hunt & Rittenburg (2007),
verificou-se que as características externas, as características dos indivíduos e da comunidade,
bem como as aprendizagens e conhecimentos adquiridos durante o processo da intervenção são
condições determinantes para que os moradores possam superar as condições de vulnerabilidade
a que estão expostos.
No entanto os elementos da intervenção (tais como os processos e as ações
implementadas, apoio social e políticas públicas percebidas), assim como as experiências
compartilhadas (por exemplo, o aumento de interação entre os moradores, a participação em
treinamentos e seminários) são fatores que facilitam (ou impedem) as respostas de mudanças.
Quando as respostas facilitam a transformação, as pessoas se mobilizam em direção à
mudança. No entanto, esse processo ocorre ao longo do tempo, em mudanças incrementais, e em
várias respostas, principalmente as que são percebidas em relação às políticas públicas.
As experiências compartilhadas são transformadoras, tanto individual como
coletivamente, porém elas não acontecem ao mesmo tempo e na mesma medida para todos os
participantes. Isso significa dizer que o impedimento atual pode ser ressignificado permitindo que
a mudança, ou a transformação aconteça no futuro.
Além disso, verificou-se que (1) as características individuais e da comunidade que
mais influenciaram na experiência compartilhada vivida durante essa intervenção foram: a
percepção de que “agente pode”, desejo de fazer parte e a responsabilidade por assumir uma
tarefa; (2) as experiências compartilhadas na intervenção contribuíram para a transformação dos
comportamentos e valores, em relação ao descarte e manejo do lixo; (3) as características da
intervenção que colaboraram para o processo de mudança foram: a participação e a valorização
das contribuições, a sistematização e organização das ações.
No entanto, a identificação de que é possível viver em um ambiente mais limpo, com
maior responsabilidade compartilhada produziu um paradoxo: por um lado a alegria de perceber
que é possível realizar a coleta de lixo de porta em porta, apesar das dificuldades existentes na
163
favela, e, de outro, a angústia e a frustração de ter que aguardar a solução definitiva via poder
público.
Em outras palavras, se por um lado as pessoas experimentaram uma melhor condição
de convivência, com um ambiente mais limpo e organizado, a frustração parte da constatação que
a intervenção aconteceu apenas por um tempo determinado e a garantia da sua continuidade
depende de investimentos da área pública.
164
5 CONCLUSÕES
Este capítulo final do trabalho foi estruturado em três partes. A primeira trata das
limitações da pesquisa e propostas para estudos futuros; a segunda apresenta as contribuições
teóricas e metodológicas; e, por último, as considerações finais.
5.1 LIMITAÇÕES DA PESQUISA E PROPOSTAS PARA FUTUROS ESTUDOS
Foram observadas algumas limitações ao presente estudo, mais precisamente em
relação ao desenvolvimento do processo. Observou-se que a transformação de valores e
comportamentos puderam ser mais efetivos entre os participantes diretamente envolvidos nas
ações propostas. Esse fato demonstra a necessidade da formulação de estratégias que possam
envolver a comunidade como um todo, com atividades e oficinas que promovam reflexões mais
abrangentes.
Outra limitação observada foi quanto ao tempo de duração da intervenção. A interação
da comunidade poderá ser maior caso aconteça em uma base relativamente regular, através de
períodos estendidos de um período estável de tempo.
Apesar dos recursos de divulgação utilizados no projeto, tais como faixas, adesivos
para as casas, panfletos e convites, verificou-se que foram insuficientes para que produzissem um
clima de mobilização mais efetivo. Os objetos e símbolos presentes no ambiente imediato devem
estimular a atenção, exploração, manipulação e imaginação das pessoas, fazendo com que se
lembrem o tempo inteiro dos objetivos do projeto. Nesse aspecto, os recursos financeiros
disponíveis para a implantação de uma pesquisa-ação se constituem em um dos limitadores à
execução do projeto.
Com relação aos procedimentos da pesquisa, verificou-se que o tipo de entrevista
adotado dificultou a análise dos resultados. Por um lado, o fato de se manter a entrevista em
clima de diálogo foi responsável por propiciar maior abertura para que os respondentes pudessem
se expressar livremente, e reduzir a inibição pelo fato de estarem sendo submetidos a uma
entrevista. Em muitos momentos, o próprio gravador utilizado nas audiências atuava como
inibidor dos depoimentos. Por outro lado, a ausência de questões fechadas, ou pelo menos mais
165
direcionadas, implicou em grande quantidade de material a ser analisado com multiplicidade de
categorias.
Cabe ainda salientar que essa foi a primeira experiência da pesquisadora em uma
comunidade carente e, apesar de todo esforço e tempo despendidos para conhecer melhor e
estabelecer um clima de confiança com os indivíduos pertencentes a essa comunidade, somente a
partir dos meses finais deste estudo essa reciprocidade pode ser mais fortemente percebida. Esse
fato, no entanto, não trouxe prejuízo aos trabalhos desenvolvidos durante a pesquisa, visto que o
grupo de apoio foi composto por muitos outros atores participantes do projeto, e que já
mantinham relacionamento com os moradores e desfrutavam da sua confiança.
Dadas as dificuldades enfrentadas na realização da pesquisa-ação, recomenda-se que
em futuros estudos as questões a serem apresentadas aos respondentes tenham maior objetividade
e direcionamento.
5.2 CONTRIBUIÇÕES DO ESTUDO
A experiência do projeto com a comunidade Madalena I confirmou a viabilidade da
aplicação da metodologia participativa, e dos princípios da pesquisa-ação, dentro de um trabalho
interdisciplinar, com técnicas de separação de resíduos e coleta seletiva, elementos de orientação
para a saúde e de cidadania, junto à população objeto do estudo.
Com a participação efetiva dos membros dessa comunidade, observou-se uma real
implicação na identificação e priorização dos problemas referentes à questão do manejo e
disposição do lixo produzido pelas famílias, e a busca de soluções mais adequadas ao contexto.
Dessa forma o projeto de coleta de resíduos pretende trazer contribuições tanto para a
área acadêmica, quanto para o aprimoramento das políticas públicas. Em primeiro lugar,
buscando compreender melhor as transformações de comportamentos e valores das pessoas
quando expostas a uma intervenção para melhoria das condições de vida da comunidade.
Analisando se os indivíduos e a comunidade podem ser transformados por suas experiências
compartilhadas e por seus esforços para promover a mudança. E, em segundo lugar, oferecendo
apoio e subsídios para a implantação da coleta do lixo domiciliar na comunidade Madalena I, e
em outras comunidades semelhantes, por parte do poder público.
166
5.3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A proposta central deste trabalho foi verificar se a participação da comunidade numa
experiência compartilhada de manejo de resíduos provoca transformações nos comportamentos e
nas atitudes de uma comunidade considerada vulnerável, e aos indivíduos a ela pertencentes.
Foram descritos as ações e os procedimentos adotados para conduzir a experiência da
coleta de resíduos domiciliares na comunidade Madalena I, bairro Sapopemba, zona leste da
cidade de São Paulo, durante os meses de Março a Outubro de 2009.
A maior contribuição deste estudo está em constatar a riqueza da troca de experiências
entre os membros do grupo de catadores de resíduos, dos moradores da comunidade, e entre estes
e a equipe de apoio, ou, entre pesquisador e pesquisados, durante cada uma das fases deste
projeto.
Questões referentes à cidadania, ética, direitos, poder público, foram levantadas,
questionadas, debatidas, não importando ser o elemento do grupo analfabeto ou não. Verificou-se
que existe um ambiente bastante fértil para se debater valores, tais como: equidade, solidariedade
e responsabilidade, bases do movimento para o empoderamento das pessoas. Foram debatidos
também os princípios cooperativos, dentre eles o da formação cooperativa, como é o caso do
grupo que participa da Cooperativa Reciclando Esperança.
A busca de avaliar e gerir o risco, conhecendo as dinâmicas que produzem o perigo e
os elementos que promovem a vulnerabilidade, é um esforço de “tentar domar o indomável, de
conhecer o intangível e de assegurar o incerto” (MARANDOLA JR; HOGAN, 2006, p. 38).
Em nossas reflexões nos perguntamos até que ponto estamos agindo no sentido de
proporcionar ao grupo o entendimento de seus problemas para que ele possa atuar em defesa de
seus próprios interesses. Esse é o desafio inerente à proposta da pesquisa participante, despertar,
trazer à tona o potencial de conhecimento e ação do grupo com o qual se trabalha. O intuito é de
aproximá-lo, cada vez mais, da condição de sujeito do processo de geração e produção do
conhecimento.
O reconhecimento dos perigos reforça a necessidade de aprofundar os conhecimentos,
tanto dos mecanismos da sua geração quanto das possibilidades de reagir e se proteger. A cultura
167
e o imaginário são as características que mais contribuem para a percepção do risco e dos
fenômenos envolvidos, tanto em nível individual como coletivo.
Da mesma forma que a cultura e o imaginário das pessoas influenciam na percepção
dos riscos e perigos, os lugares e as regiões também sofrem com este processo de amplificação
social do risco. Muitas vezes, essas imagens e estigmas são criados por diferentes agentes e atores
e podem rotular de tal forma uma comunidade que, no imaginário coletivo, esse estigma passa a
ser explicação do lugar ou seu principal qualitativo.
Sob esse aspecto, verificou-se que a comunidade Madalena I era reconhecida,
individual e coletivamente, pelo lugar onde se habita e se convive com o lixo, justificando, em
parte, a situação de acomodação que foi percebida na população.
O estímulo ao autoconhecimento, à auto-estima, à valorização do saber prático, à
criatividade, e à construção de projetos coletivos contribuem para a construção do capital social
do lugar, potencializando o desenvolvimento de capacidades individuais e coletivas.
5.3.1 Revendo os pressupostos
No início deste trabalho, foram colocados quatro pressupostos: os moradores de
favelas são indivíduos vulneráveis; os fatores que influenciam o manejo do lixo são as
características dos indivíduos e da comunidade; os indivíduos compartilham novas experiências
durante uma intervenção; e, as experiências compartilhadas durante a intervenção contribuem
para a transformação dos comportamentos e valores dos indivíduos e da comunidade.
Com relação ao primeiro pressuposto, verifica-se que ele pode ser confirmado pela
análise efetuada. Considerando as características dos indivíduos, a sua escolaridade, recursos
financeiros e materiais disponíveis, além das condições de riscos ambientais a que estão
permanentemente expostos, torna esses indivíduos vulneráveis às condições sociais, econômicas
e ambientais.
O segundo pressuposto parte do princípio de que as características dos indivíduos e da
comunidade são determinantes para influenciar a questão do manejo do lixo. Verificou-se,
através dos relatos das entrevistas, que a maior fonte de influência estão relacionadas a duas
características principais: a) a história de vida das pessoas; b) a falta de conhecimento sobre os
perigos e riscos provocados pela disposição inadequada do lixo.
168
Além disso, as percepções sobre o meio ambiente confirmam os estudos realizados
por Romeiro et al. (2009), principalmente no que diz respeito à impotência do indivíduo que se
coloca em posição de vítima, se isentando de assumir a responsabilidade pela sua participação
ativa no coletivo. Por outro lado, percebeu-se que as pessoas empoderadas reagem positivamente
aos estímulos externos, principalmente quando tomam a consciência de que suas ações podem
trazer benefícios para si, para sua família e para a comunidade como um todo.
A estratégia adotada favoreceu o terceiro pressuposto, no sentido de que o
compartilhamento das experiências é condição para que a pesquisa-ação aconteça. Essa reflexão
crítica, e a busca da empatia contribuíram para que as experiências fossem transformadoras,
mesmo que essa transformação não possa ser percebida de imediato.
Por fim, verificou-se que mesmo numa comunidade carente e vulnerável, com uma
série de problemas, há motivação também para as questões ambientais, há o desejo de colaborar e
inclusive com a adoção de mudanças de comportamento. O problema é oferecer uma
infraestrutura que garanta continuidade.
169
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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179
APÊNDICE A ROTEIRO DE ENTREVISTA COM OS CATADORES DE MATERIAIS
IDENTIFICAÇÃO
1- Nome
2- Endereço
3- Data de nascimento do entrevistado
4- Educação (formação técnica, profissional e acadêmica)
Bloco 1: Experiências anteriores
1) Experiências vividas no contexto social que podem impedir ou facilitar oportunidades de
mudança de comportamentos em relação ao descarte e manejo do lixo domiciliar;
2) Crenças;
3) Segurança;
4) Características individuais;
5) Características da comunidade;
6) Condições externas.
Bloco 2: Esforços de respostas que facilitam ou impedem a mudança de comportamentos
1) Respostas às experiências vividas;
2) Respostas às experiências compartilhadas;
3) Respostas às forças para ajuda e segurança;
4) O que facilita?
5) O que impede?
Bloco 3: Percepção dos resultados e esforços de transformação
1) Resultados pessoais obtidos;
2) Resultados obtidos para a comunidade;
3) Mudança de Comportamentos;
4) Mudança de Valores.
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APÊNDICE B
FORMULÁRIO DE CONSENTIMENTO
Prezado(a) Senhor(a), agradeço desde já, sua disposição em nos encontrarmos. Gostaria de
convidá-lo a colaborar na realização da pesquisa descrita neste formulário. Caso o(a) senhor(a)
aceitar participar da pesquisa, manterei o original deste formulário assinado.
Tema da pesquisa: Investigar o comportamento dos moradores da comunidade, em relação ao
descarte e a separação do lixo gerado pelas famílias, identificando os fatores que determinam esse
comportamento, bem como verificar se a participação dos indivíduos numa ação coletiva e
compartilhada de coleta de lixo domiciliar, transforma o seu comportamento e suas atitudes a
partir dessa experiência.
Responsável pela pesquisa: Luzia Maria Esgolmin, mestranda do Programa de Pós-Graduação
em Administração do Centro Universitário Nove de Julho – UNINOVE. Telefone: (11) 4976-
5150. Correio eletrônico: [email protected].
Descrição da Pesquisa: Esta pesquisa tem por tema analisar, as motivações das pessoas que
resistem ao descarte adequado do lixo produzido pelas famílias, moradoras da Comunidade
Madalena I através da implementação de um projeto piloto para a coleta de lixo domiciliar.
O levantamento de dados permitirá a eventual publicação de artigos em congressos e
em revistas de administração, além de poder auxiliar na realização da pesquisa e da dissertação
da mestranda Luzia Maria Esgolmin.
Para a realização desta pesquisa, sua participação será de grande valor, visto a falta de
compreensão e de estudos sobre as transformações ocorridas junto a população participante da
coleta de lixo domiciliar. Conhecimentos sobre o tema podem ajudar a desenvolver campanhas
públicas de mobilização e contribuir com a melhoria da qualidade de vida das pessoas.
Muito obrigado!
Luzia Maria Esgolmin
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CONSENTIMENTO A ASSINAR:
Participação na entrevista (para assinar antes da entrevista)
Após ter lido e entendido o texto precedente e ter tido a oportunidade de receber
informações complementares sobre o estudo, eu aceito, de livre e espontânea vontade, participar
da(s) entrevista(s) de coleta de dados para esta pesquisa sobre a participação da comunidade na
coleta de lixo domiciliar implementada nos meses de Agosto e Setembro na Comunidade
Madalena I.
Eu sei que posso me recusar a responder a uma ou outra das questões se eu assim
decidir. Entendo também que posso pedir o cancelamento da entrevista, o que anulará meu aceite
de participação e proibirá o pesquisador de utilizar as informações obtidas comigo até então.
Pessoa entrevistada
Local: ______________________
Nome: _______________________________________
Assinatura: ____________________________________
Data: _______________________
Entrevistador
Nome: _______________________________________
Assinatura: ___________________________________
Este texto tem por finalidade assegurar os direitos dos colaboradores na pesquisa quanto a questões éticas. Qualquer sugestão, reclamação ou solicitação pode ser encaminhada à responsável pela pesquisa e/ou à coordenação do Programa de Pós-Graduação em Administração da UNINOVE. Para contato com o programa telefone (11) 3665-9300/9342 FAX (11) 3665-9369, correio eletrônico: [email protected].
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ANEXO A – QUESTIONÁRIO PARA OS MORADORES
PROJETO MEIO AMBIENTE - EDUCAÇÃO PARA AÇÃO
PESQUISA DE IMPACTO Objetivo desta pesquisa é medir o impacto na comunidade da execução da fase da coleta do lixo porta a porta.
1º Bloco: PERFIL FAMILIAR Nome: 1- Endereço da residência: 2- Tempo que a família reside neste domicilio:
COMPOSIÇÃO FAMILIAR
3- Representação no lar: ( ) Pai ( ) Mãe ( ) Filho(a) ( ) Avô(a) ( ) Tio(a)
Outro: _______________
4- Sexo ( ) F ( ) M 5- Raça ( ) Negra ( ) Parda ( ) Branca 6) ____idade
7- Escolaridade: _________ Completo ( ) Incompleto ( ) 8- Ocupação profissional:
8- Documentação Pessoal:
Certidão Nascimento: ( ) Sim ( ) Não
RG: ( ) Sim ( ) Não
CPF Regularizado: ( ) Sim ( ) Não
Carteira de Vacinação: ( ) Sim ( ) Não
Carteira de Trabalho: ( ) Sim ( ) Não
Título de Eleitor: ( ) Sim ( ) Não
Nasceu em: Cidade onde vota:
9- Renda Familiar ( ) Até R$ 300,00
( ) De R$ 301,00 a R$ 500,00
( ) De R$ 501,00 a R$ 1.000,00
( ) De R$ 1.001,00 a R$ 1.500,00
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( ) Acima de R$ 1.500,00
10- Opção Religiosa ( ) Católico ( ) Evangélico ( ) Espírita ( ) Outros:______________
2º Bloco – LAZER
11- O que você faz para divertir e ou passar o tempo. ( ) Ouve rádio Quantas horas por dia em média?__________
( ) Assiste Televisão. Quantas horas por dia em média?__________
( ) Lê Jornal/Revista Qual? Freqüência
( ) Lê Livro Qual? Freqüência
( ) Internet ( ) Sempre ( ) Às vezes ( ) Nunca
( ) Passeia na casa de parentes Quantidade no mês.
( ) Outros Qual?
12- Se você não lê jornal, revista e livros, indique qual o motivo: ( ) Não sabe ler ( ) Impossibilidade física
( ) Não têm o hábito ( ) Não têm condições de comprar o material.
3º Bloco: COLETA PORTA A PORTA
13- Foi implantada a coleta de lixo na rua da sua casa?
( ) Sim ( ) Não
14- Você aderiu ao projeto piloto de coleta de lixo em casa?
( ) Sim ( ) Não
15- Se não aderiu por quê?
( ) Não foi convidado ( ) Não achou interessante ( ) Outro ___________________
16- Esta coleta melhorou sua vida e de sua família?
( ) Não melhorou ( ) Melhorou pouco ( ) Melhorou bastante ( ) Melhorou Muito
17- A coleta porta a porta melhorou a limpeza na viela?
( ) Não ( ) Sim ( ) Viela não ficava suja ( ) Indiferente
18- É importante a coleta porta a porta?
( ) Sim ( ) Não Por quê?
184
19- O que você melhoraria na coleta?
20- Onde era descartado o lixo produzido pela família?
( ) Caçamba ( ) Viela ( ) Cascata da rua nova ( ) Outros: _____________________
E atualmente?
21- Sua família separa material reciclável do lixo orgânico?
( ) Não ( ) Sim
Quais?
22- Sua família vende algum material reciclável?
( ) Não ( ) Sim Qual: ____________________________
23- A coleta de lixo porta a porta deve continuar?
( ) Não ( ) Sim
4º Bloco: MEIO AMBIENTE
24- Existe iluminação pública na sua rua?
( ) Não ( ) Sim
25- Você recebe conta da SABESP?
( ) Não ( ) Sim
26- Você recebe conta da Eletropaulo?
( ) Não ( ) Sim
27- Você se sente parte integrante do Meio Ambiente?
( ) Não ( ) Sim
28- Você conhece algum problema ambiental causado pelo lixo?
( ) Não ( ) Sim Qual: ____________________________
185
29- Você já ouviu falar sobre responsabilidade ambienta?
( ) Não ( ) Sim
30- Você já participou de alguma atividade de educação ambiental?
( ) Não ( ) Sim Qual: ____________________________
31- Você acha importante receber informações e participar de ações de educação ambiental, a fim
de melhorar a qualidade de vida de sua comunidade e, conseqüentemente, a sua?
( ) Não ( ) Sim
Informe qual quanto você concorda com as frases abaixo, marque um X no valor correspondente, onde 5 = Concorda totalmente e 1 = Discorda totalmente.
1 2 3 4 5 32- É responsabilidade de cada um contribuir com as questões do meio ambiente.
33- A responsabilidade em relação ao lixo e ao meio ambiente é da Prefeitura.
34- Tenho interesse pelas questões relacionadas ao lixo e ao meio ambiente.
35- Separar o lixo para reciclagem dá muito trabalho.
36- Tentar controlar a poluição dá tanto trabalho que não vale a pena.
37- Eu sozinho(a) não posso fazer nada para preservar o meio ambiente.
38- A reciclagem diminui a poluição.
Quem e quando realizou esta pesquisa?
Nome:
Data:
186
ANEXO B
Brasil...
Pro povo da favela não existe diversão, o moleque que empina pipa caminhando no lixão. A situação é difícil, não tem como negar, o cheiro do esgoto é que exala pelo ar.
O governo não ajuda, eles não querem saber, se o lixo do morro cai em cima de você. O que é isso Brasil me diz o que acontece, só se lembram de boyzinho
e da favela se esquece. Sentado na cadeira vendo a televisão, o assessor político dá risada da nação.
Só vão interferir falam que vão ajudar quando na televisão uma família implorar. Secretaria da saúde e do meio ambiente, vem bater um papo é com a população de frente.
Aí você vai ver, e vai poder comprovar, não precisa de estatísticas pra você acreditar. Vai se arrepiar quando então comprovar e ver um gato morto no esgoto a boiar.
É rato que invade a casa da população, e ninguém não dá a mínima para a situação. No gabinete do assessor o problema é discutido, mas não tem solução
para o problema do lixo. Dinheiro e mais dinheiro dizem que vão investir, mas vai pro bolso do político
que vai se divertir. Dinheiro nunca visto, dinheiro da nação, só vão utilizar quando chegar a eleição.
Aí a gente ouve os porcos vão dizer, essa situação nos temos que resolver.
Sou função, sou favela, aconteça o que for você ta ligado no lixão nasce flor, Sou função, sou favela, aconteça o que for você ta ligado no lixão nasce flor.
O homem está acabando com a natureza, parece que eles fazem até por brincadeira.
Não, pode crer que é ganância, devastam nossas matas como se não fosse nada. Vários contrabando, neguinho exportando, estão tirando o ar que respiramos.
Eles não notam, eles não percebem, que o clima está mudando vira e mexe acontece. Chove sem parar o vento leva tudo, esse é o resultado da poluição do mundo. A terra está chorando, tá pedindo ajuda, floresta pega fogo poluição constante.
Fumaça de carro e de caminhão, quando passa por perto chega estourar até pulmão. Temos que fazer algo bem feito, quem dera se as pessoas pensassem desse jeito.
Nossos filhos eles não são culpados, isso está acontecendo desde os nossos antepassados. A nossa ganância e nossa ambição vai trazer problema para a nova geração. Tantas tragédias que estão acontecendo, é muita gente que está adoecendo. Por causa da mudança clima e estação, tem inundação no tempo de verão. Tá tudo louco, tá tudo mudado, o aquecimento global causando estrago.
Vamos contribuir pra ver se algum dia a gente não se mate com a nossa ideologia. De querer mais, e mais poder e se a natureza um dia desaparecer.
Pois aquele nosso lindo paraíso se transformou em depósito de lixo.
Sou função, sou favela, aconteça o que for você ta ligado no lixão nasce flor, Sou função, sou favela, aconteça o que for você ta ligado no lixão nasce flor.
Rony Vieira dos Santos
Gilson Alberto de Oliveira Junior
187
ANEXO C CONVITE AOS MORADORES
188
ANEXO D – AVISO AOS MORADORES
189
ANEXO E – PESQUISA DE OPINIÃO
190
ANEXO F
OFICIO ADM nº. 049/2009
191
ANEXO G
OFICIO ADM nº. 050/2009