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UNIVERSIDADE POTIGUAR - UnP PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO CURSO DE SERVIÇO SOCIAL
CLEIDIANA TELLES DE OLIVEIRA JANE SILVA DE FREITAS BARBOSA
ADOLESCÊNCIA SEM DROGAS: UMA REALIDADE POSSÍVEL NO ESPAÇO VIVÊNCIA - SÃO GONÇALO DO AMARANTE/RN
NATAL 2008
CLEIDIANA TELLES DE OLIVEIRA JANE SILVA DE FREITAS BARBOSA
ADOLESCÊNCIA SEM DROGAS: UMA REALIDADE POSSÍVEL NO ESPAÇO VIVÊNCIA - SÃO GONÇALO DO AMARANTE/RN
Monografia apresentada à Universidade Potiguar – UnP, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Serviço Social.
Orientadora: Profª. MSc. Adna Rejane de Freitas Rego
NATAL 2008
CLEIDIANA TELLES DE OLIVEIRA JANE SILVA DE FREITAS BARBOSA
ADOLESCÊNCIA SEM DROGAS: UMA REALIDADE POSSÍVEL NO ESPAÇO VIVÊNCIA – SÃO GONÇALO DO AMARANTE/RN
Monografia apresentada à Universidade Potiguar – UnP, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Serviço Social.
Aprovado em: ___/___/___
BANCA EXAMINADORA
___________________________________
Profª MSc. Adna Rejane de Freitas Rego
Orientadora
Universidade Potiguar – UnP
_____________________________________
Profª Dra Maria Célia Correia Nicolau
Examinador interno
Universidade Potiguar – UnP
______________________________________
Profª MSc. Ângela Cristina Oliveira Pinto
Examinador interno
Universidade Potiguar – UnP
Dedico a realização desse grande sonho, especialmente a Deus por ter me
iluminado com sabedoria, dando-me forças nos momentos mais difíceis desta longa
jornada, a minha família, e também a minha grande amiga de Faculdade Jane, que
comigo se esforçou para juntas concluirmos esta grande vitória. Enfim, a todos que
de certa maneira contribuíram para a realização deste grande sonho.
Cleidiana Telles de Oliveira
Dedico, primeiramente ao meu DEUS, o Todo-Poderoso, pois sem Ele nada poderia
ter sido feito, sendo o mesmo a minha bússola, o meu porto seguro, pois só Ele é
capaz de nos orientar e guiar. Agradeço pela sua presença constante em minha
vida, por ter me dado esta grande e rica oportunidade de estar realizando um dos
meus grandes sonhos, ao meu esposo e aos meus filhos, que tanto o amo e admiro.
E a todos, que de maneira direta e indiretamente contribuíram pela conquista desta
vitória.
Jane Silva de Freitas Barbosa
AGRADECIMENTOS
Agradeço em primeiro lugar a Deus, que me deu esta grande oportunidade
em minha vida de ter sido iluminada com sabedoria, para que eu pudesse conquistar
esta importante etapa da minha vida.
Agradeço, em especial, a minha mãe por ter compreendido minha luta e me
ajudado, disponibilizando-se a cuidar do meu filho, para que eu conseguisse concluir
este curso. Obrigada mãe.
Ao meu pai, que sempre acreditou em mim e no meu potencial, me
incentivando sempre na busca do meu sonho. Obrigada Pai.
Agradeço ao meu irmão, por uma das principais ajudas dada na realização
deste grande mérito. Obrigada Telles.
A minha irmã, que apesar das reclamações, ainda tentava ajudar nas fases
mais complicadas dos meus estudos. Obrigada Claudiana.
Agradeço, também, ao meu pequeno filho, que apesar de não entender nada
ainda, mas foi de grande importância para que eu pudesse ter forças para a
conclusão deste curso.
A minha amiga de Faculdade e companheira de estágio Jane, que comigo
lutou para este sonho ser concluído, sendo sempre amiga, companheira,
incentivadora, criando entre nós, uma forte amizade. Obrigada minha amiga pela
força.
Agradeço a minha orientadora Profª MSc Adna Rejane pela paciência e
incentivo dado durante todo o período de orientação, o qual foi de fundamental
importância. Obrigada Profª Adna por tudo.
Ao Espaço Vivência e aos adolescentes dessa instituição, por ter nos acolhido
durante todo o tempo de estágio, passando o ensinamento e mostrando a realidade
vivida pelos adolescentes da mesma. Obrigada Espaço Vivência pelo acolhimento.
A direção do curso de Serviço Social, em especial, a diretora Dra Maria Célia
e a todos os professores que foram de fundamental importância, para que a 1ª turma
de Serviço Social fosse concluinte.
Agradeço, por fim a todos que torceram por mim e me incentivaram, dando
apoio e força para que este sonho fosse realizado com sucesso. Obrigada a todos.
Cleidiana Telles de Oliveira
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo, ao DEUS DOS DEUSES, por
ter me dado a capacidade de realizar este grande sonho.
Agradeço ao meu esposo, José Emiliano Barbosa, pela força, oportunidade,
confiança, incentivo e compreensão dos momentos de ausência na busca desta
vitória: “Meu esposo, te admiro muito e te amo a cada dia. Não tenho palavras para
expressar minha enorme gratidão. Com amor, agradeço a Deus por você existir”.
Agradeço aos meus filhos, Mayana, Mayara, Álvaro e a minha filha de
coração Arlene, por entenderem a minha ausência em alguns momentos. Agradeço
pelo incentivo e ajuda em meu cotidiano, em especial a Mayana e a Mayara por
muitas vezes terem feito papel de mãe e de dona de casa, me ajudando com o meu
filho Álvaro. O meu amor por vocês é incondicional.
Agradeço a minha querida, amada e inesquecível mãe (in memoriam), a qual
tanto me estimulou a crescer e vencer na vida, aconselhando-me em todo tempo e
fazendo-me enxergar o caminho a seguir. Servindo-me de exemplo, mostrando-me a
importância da fidelidade, honestidade, do respeito, da responsabilidade e do amor
que devemos ter para com o próximo.
Agradeço ao meu pai, aos meus irmãos, em especial a minha querida irmã e
amiga Jackeline, e ao seu esposo Almir, que em muitos momentos difíceis da minha
vida me acolheram em sua casa, me tratando como uma filha, incentivando-me a
estudar, acreditando em meu potencial sempre.
Agradeço a minha querida e amada sobrinha Aldeise, pela grande ajuda em
momentos de grandes dúvidas, sobretudo, no processo de elaboração desse projeto
monográfico. Muito Obrigada! Que Deus continue te abençoando.
Agradeço a minha amiga e companheira de estagio, Cleidiana por tudo que
compartilhamos nos anos de faculdade, pelo companheirismo, e respeito mútuo.
Agradeço a minha professora e orientadora, Profª MSc. Adna Rejane, pela
paciência e dedicação que nos foi dada.
Agradeço a minha amiga e orientadora de campo Alexsandra, que eu não
diria somente orientadora, mas professora também, a qual me ajudou, e me ensinou
o fazer profissional.
Agradeço a nossa querida professora e coordenadora Dra Maria Célia Correia
Nicolau, por ter acreditado em nossa turma.
Agradeço a minha querida amiga Mathu que muito me ajudou.
Agradeço a minha amiga Josedalva, pela força e confiança dentro do Fórum
de São Gonçalo do Amarante/RN, em relação ao meu estágio.
Agradeço aos adolescentes e a Equipe do Espaço Vivência, os quais de uma
forma carinhosa nos acolheram e ajudaram a realizar nosso projeto.
Jane Silva de Freitas Barbosa
RESUMO
O estudo desenvolvido, no presente trabalho monográfico, objetiva realizar algumas reflexões da experiência teórico-prática que envolve crianças e adolescentes, usuários de drogas. O estudo desenvolvido é resultado da experiência do estágio curricular do curso de Serviço Social da Universidade Potiguar - UnP, realizada na instituição Espaço Vivência, cujo estudo se deu em torno de uma ação sócio-educativa com os adolescentes da referida instituição, numa perspectiva de prevenção quanto ao uso das drogas. Na materialização desse trabalho, foi utilizado procedimentos metodológicos como: palestras, dinâmicas, vídeos, rodas de conversas e atividades de campo, com o intuito de promover uma maior reflexão junto aos adolescentes quanto aos malefícios do uso das drogas. Palavras-chave: Drogas. Adolescentes. Ação Sócio-Educativa. Experiência Teórico-Prática.
ABSTRACT
The study developed in this monographic work, purposes to do some reflections of theoretical- practice experience that involves children and teenagers drug users. The study developed is the result of the experience of the stage of the Social Service course curriculum in the Universidade Potiguar – UnP, made at the Espaço Vivência institution, whose study does it around a socio-educational action with teenagers of that institution, with a view to preventing against the use of drugs. In the materialization of this work was used as methodological procedures: lectures, dynamic, videos, groups of conversations and classes of visits in order to promote a great reflection among teenagers about the harmful effects of the use of drugs. Keywords: Drugs. Teenagers. Socio-Educational Action. Theoretical-Practice Experience.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Foto 1 Antigo Fórum Municipal de São Gonçalo do Amarante/RN.............. 23
Foto 2 Novo prédio do Fórum....................................................................... 24
Gráfico 1 Drogas consumidas pela sociedade brasileira.................................. 27
Foto 3 O Espaço Vivência............................................................................ 30
Foto 4 Arte em mosaico................................................................................ 35
Foto 5 Arte em madeira (Pirogravura).......................................................... 35
Foto 6 Equipe multiprofissional do Espaço Vivência.................................... 39
LISTA DE SIGLAS
CEAD Centro Integrado de Adolescente
CEDUC Centro Educacional
CONANDA Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
DEA Delegacia Especializada no Atendimento de Adolescentes
ECA
FEBEM
Estatuto da Criança e do Adolescente
Fundação do Bem Estar do Menor
LCA Liberdade Assistida Comunitária
SEDH Secretaria Especial de Direitos Humanos da Previdência da
República
SEMTHAS Secretária Municipal do Trabalho, Habitação e Assistência Social
SENAD Secretaria Nacional Antidrogas
SINASE
SPDCA
PIA
PSC
Sistema Nacional de Atendimento Sócio-educativo
Subsecretaria de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente
Plano de Atendimento Individual
Prestação de Serviço à Comunidade
.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO............................................................................................... 13
2 AS MEDIDAS DE PROTEÇÃO SOCIAL DIRECIONADA AOS
ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI............................................
15
2.1 ESPECIFICIDADES....................................................................................... 15
2.2 MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS: ALGUMAS REFLEXÕES........................ 19
2.3 O FÓRUM MUNICIPAL DE SÃO GONÇALO DO AMARANTE/RN E SUA
CONTRIBUIÇÃO NA POLÍTICA DE ATENDIMENTO A CRIANÇA E AO
ADOLESCENTE EM CONFLITO COM A LEI...............................................
23
2.4 UMA BREVE ANÁLISE SOBRE AS DROGAS, SEUS MALEFÍCIOS E SUA
RELAÇÃO COM OS ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI DO
ESPAÇO VIVÊNCIA................................................................................
26
3 O TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL NO ESPAÇO VIVÊNCIA E O
ESTÁGIO NA FORMAÇÃO PROFISSIONAL..............................................
30
3.1 O ESPAÇO VIVÊNCIA NO CONTEXTO DAS MEDIDAS SÓCIO-
EDUCATIVAS................................................................................................
30
3.2 O TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL NO ESPAÇO VIVÊNCIA............ 39
3.3 A IMPORTÂNCIA DO ESTÁGIO NA FORMAÇÃO PROFISSIONAL E A
EXPERIÊNCIA DA PRÁTICA DE INTERVENÇÃO JUNTO AOS
ADOLESCENTES DO ESPAÇO VIVÊNCIA..................................................
42
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................... 49
REFERÊNCIAS............................................................................................. 50
APÊNDICES................................................................................................... 53
13
1 INTRODUÇÃO
Em face das necessidades sociais das crianças e adolescentes em conflito
com a lei, foi criada a instituição Espaço Vivência, campo da nossa prática
interventiva, tendo como missão prestar serviços de assistência social1 e psicológica
aos adolescentes e jovens em situação de risco2.
Entre os serviços ofertados pelo Espaço Vivência, direcionados ao público
citado, podemos elencar: acompanhamento com assistente social, psicológico e
pedagogo, reforço alimentar, e curso profissionalizante de pirogravura e mosaico.
Com relação aos usuários atendidos pela respectiva instituição, esses
pertencem a uma faixa etária que compreende 12 a 18 anos de idade e,
excepcionalmente, entre 18 e 21 anos, cuja situação financeira é extremamente
limitada, ou seja, pertencem as famílias que sobrevivem com renda per capita
muitas vezes inferior a um salário mínimo. Por outro lado, muitos desses
adolescentes possuem uma relação direta com o mundo das drogas, ou seja, são
usuários de substâncias entorpecentes.
Segundo o levantamento nacional sobre o uso de drogas entre adolescentes
em situação de risco, nas 27 capitais brasileiras, no ano de 2003, observou-se que
as principais causas, as quais os levam ao primeiro uso das substâncias
entorpecentes são: influência de amigos que já consomem drogas, uma vez que
foram forçados ao consumo ou procurava “coisa mais forte”. E os motivos atribuídos
para o uso delas são: “acha legal”, “gostoso”, “esquecer a tristeza”, “sentir mais
solto” (desinibido), “sentir mais forte”, “poderoso”, “corajoso”, “esquecer a fome e o
frio”.
1 De acordo com a Lei Orgânica de Assistência Social, Lei nº 8742, de 7 de dezembro de 1993, a assistência social, conforme expressa no artigo 1º da citada lei, é um direito do cidadão e dever do Estado. É política de seguridade social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada por meio de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade para garantir atendimento as necessidades básicas. De acordo com o art. 2º, entre os objetivos da assistência encontra-se: à proteção a família, à maternidade, à infância, à adolescência e a velhice e o amparo a crianças e adolescentes carentes. (Disponível em: http://www.rebidia.org.br/noticias/social/loas.html. Acesso em: 22 set. 2008).
2 Adolescentes e jovens em situação de risco são categorias sociais, que desassistida pelos familiares necessita de intervenção por parte do Estado na proteção dos seus direitos fundamentais. Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, os direitos fundamentais estão relacionados a: todas as facilidades e oportunidades a lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social em condição de liberdade e dignidade. (Disponível em: http://www.rebidia.org.br/noticias/social/loas.html. Acesso em: 22 set. 2008).
14
Partindo desse contexto, elaboramos e executamos uma proposta de trabalho
de âmbito sócio-educativo que contemplou os usuários do Espaço Vivência, numa
tentativa de contribuição ao trabalho de prevenção quanto aos malefícios do uso das
drogas.
Sendo assim, o estudo em questão consolida os resultados alcançados
durante a experiência do estágio curricular no Espaço Vivência, no período de
fevereiro a junho de 2008.
Fazem parte desse estudo os seguintes tópicos: no primeiro, fizemos uma
discussão a respeito das medidas de proteção social direcionada aos adolescentes
em conflito com a lei, com um enfoque nas medidas sócio-educativas previstas no
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Em seguida, damos prioridade ao
Fórum Municipal de São Gonçalo do Amarante/RN no contexto da política de
atendimento à criança e ao adolescente em conflito com a lei. Ainda nesse tópico,
tercemos algumas reflexões sobre as drogas, seus malefícios e sua relação com os
adolescentes em conflito com a lei, do Espaço Vivência, locus de nossa intervenção.
No segundo tópico, priorizamos o trabalho do assistente social e a importância do
estágio na formação profissional. Por fim, fazemos o detalhamento das ações
realizadas no período de intervenção direcionada aos usuários da respectiva
instituição.
Como metodologia que serviu de suporte a materialização desse estudo,
contemplamos: a observação do cotidiano institucional, a pesquisa bibliográfica e
documental e a sistematização da prática de intervenção.
15
2 AS MEDIDAS DE PROTEÇÃO SOCIAL DIRECIONADA AOS ADOLESCENTES
EM CONFLITO COM A LEI
2.1 ESPECIFICIDADES
Vivemos em uma sociedade liderada por um sistema excludente e perverso,
em que predomina uma má distribuição de renda3. Como resultado desse processo,
presenciamos camadas populacionais inteiras excluídas de direitos sociais básicos,
os quais são indispensáveis à sua sobrevivência enquanto cidadãos. E nesse
contexto, é exatamente a criança e o adolescente os que mais sofrem. Primeiro, por
não ter condições de auto defesa, tornando-se vitima fácil da desnutrição, doenças,
drogas, exploração sexual, entre tantos outros aspectos, que indigna a todo aquele
que se sensibiliza com a problemática.
Partindo dessa realidade problemática em que se encontram submetidas
muitas das nossas crianças e adolescentes, as quais vão sendo criadas e
3 O Brasil possui grande parcela da população incapaz de atender às suas necessidades básicas, e a distribuição de renda é uma das mais desiguais do mundo; o Coeficiente de Gini do Brasil, em 2001, era de 0,594, melhor apenas que a Guatemala, Suazilândia, República Centro-Africana, Serra Leoa, Botsuana, Lesoto e Namíbia. A concentração de renda permaneceu praticamente inalterada durante as últimas quatro décadas, com seus índices oscilando dentre as 10 últimas posições do mundo, dando os primeiros sinais de melhora somente a partir de 2001. (Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Distribui%C3%A7%C3%A3o_de_renda. Acesso em: 3 nov. 2008).
Estatísticas mostram que a partir do último trimestre de 2002 a distribuição de renda no Brasil começou melhorar lentamente. Em 2004, ocorreu o primeiro avanço significativo para a diminuição da desigualdade econômica no país: a taxa de crescimento da renda per capita para os mais pobres foi de 14,1%, enquanto a renda per capita média cresceu 3,6% no mesmo período. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Distribui%C3%A7%C3%A3o_de_renda. Acesso em: 3 nov. 2008).
Um estudo do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) demonstrou que a desigualdade entre os rendimentos dos trabalhadores brasileiros (população economicamente ativa) caiu quase 7% entre o quarto trimestre de 2002 e o primeiro de 2008. Nesse período, o Coeficiente de Gini na renda do trabalho, ou o intervalo entre a média dos 10% mais pobres da população e a média dos 10% mais ricos, caiu de 0,543 para 0,505. "Para um país não ser primitivo, esse índice precisa estar abaixo de 0,45", afirmou o presidente do IPEA, Márcio Pochmann, em entrevista à BBC Brasil. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Distribui%C3%A7%C3%A3o_de_renda. Acesso em: 3 nov. 2008).
No Brasil, a alta concentração de renda no topo da pirâmide dificulta a sua medição, por meio dos índices mais comuns como o P90/P10. Isso por causa da anormalidade da distribuição: a metade pobre da população brasileira ganha em soma quase o mesmo valor (12,5% da renda nacional) que os 1% mais ricos (13.3%).(Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Distribui%C3%A7%C3%A3o_de_renda. Acesso em : 3 de Nov. de 2008).
16
aperfeiçoadas ao longo do processo histórico, um conjunto de medidas que procura
garantir os direitos da categoria infanto-juvenil.
O Código de Menores, por exemplo, elaborado sob a Lei 6.697, de 10
de outubro de 1927, representa o primeiro documento legal para a população
menor de 18 anos, ficando popularmente conhecido como o Código de Mello
Matos. Como bem enfatiza Pontes (2002), o código tinha como alvo preferencial os
menores que se encontrassem em situação irregular, ou seja, aqueles
abandonados, vítimas de maus-tratos, miseráveis e, em especial, os infratores.
Como bem ressalta Costa (1993), o Código de Menores visava estabelecer
diretrizes claras para o trato da infância e juventude excluídas, regulamentando
questões como trabalho infantil, tutela e pátrio poder, delinqüência e liberdade
vigiada. O Código revestia a figura do juiz de grande poder, sendo que o destino de
muitas crianças e adolescentes ficava a mercê do julgamento e da ética do Juiz.
Em 1979, entra em vigência o segundo Código de Menores, constituindo-se
enquanto revisão do Código de 1923. Contudo, essa nova legislação não
conseguiu romper com as características de arbitrariedade, assistencialismo e
repressão junto à população infanto-juvenil, que caracterizava do Código anterior.
Analisando esse período Veronese (1997, p.12) vem acrescentar que:
O Código de Menores de 1979, apesar de ter sido constituído em relação ao anterior de 1927, um avanço em algumas direções, continha, no entanto, aspectos controversos que permitiam questionamentos e críticas, como é o caso das características inquisitórias do processo envolvendo crianças e adolescentes, quando a própria constituição garantia ao menor de 18 anos defesa ampla; o referido Código não previa o princípio do contraditório. Outro fato que pode ser colocado como exemplo dessa distorção era a existência para os menores de 18 anos da ‘prisão cautelar’, uma vez que o menor, ao qual se atribuía a autoria de infração penal, podia ser apreendido para fins de verificação, o que significava uma verdadeira afronta aos direitos da criança, na medida em que para o adulto a prisão preventiva só poderia ser aplicada em dois casos: Flagrante delito ou ordem escrita e fundamentado de autoridade judiciária competente.
Ainda conforme o citado autor, o Código de Menores era somente aplicado
aos “menores em situação irregular”. Quando algum “menor” se encontrava em
situação irregular, qualquer pessoa podia tirar sua liberdade e levá-lo à presença do
famoso “Juiz de Menores”. O juiz, então decidia se o “menor” estava ou não em
situação irregular. Se estivesse, o juiz passava então a ter todos os poderes sobre
ele, e poderia até mesmo interná-lo, ou seja, prendê-lo, se achasse que ele
apresentava “desvio de conduta”.
17
O julgamento de um “menor” por algum crime que houvesse cometido não
possibilitava direito à defesa. O “menor” era processado e julgado sem ter a garantia
de um advogado para defendê-lo. Não eram preciso provas de sua culpa, bastava o
juiz achar que ele era perigoso, para poder prendê-lo. A sua prisão não tinha prazo
definido, pois o “menor” continuaria internado até que o juiz entendesse de soltá-lo.
Vale salientar, que o Código de 1967, foi elaborado em um contexto de pleno
regime ditatorial. Um regime arbitrário que, na medida em que caía no isolamento e
afundava num ritual de contradições, degenerou e resvalou para a prática de
violências e atrocidades contra adversários, perseguindo, banindo, encarcerando,
torturando e assassinando a sangue-frio os que se batiam pela democracia. No
âmbito das políticas criadas em torno da categoria infanto-juvenil, instituição como a
Fundação do Bem Estar do Menor (FEBEM), criada nas regiões brasileiras,
funcionavam por meio de práticas repressivas, e com tratamentos desumanos
dispensados aos considerados infratores.
Com o término do Regime Militar e o ressurgimento dos movimentos
populares, o Movimento dos Direitos do “Menor” ganha força e expressividade.
Diferentes categorias sociais, entre os quais se encontravam presentes grupos de
técnicos, educadores, agentes sociais, os quais se mostravam contra o modelo que
vinha sendo estabelecido no trato do menor, passam a reivindicar novas posturas.
Nesse contexto, surge o Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua
em 1985. Este tinha como bandeira de luta a efetivação dos direitos do segmento
em questão, diferenciando-se dos outros movimentos a partir dos seguintes
aspectos: era necessário que houvesse também a participação dos próprios
meninos e meninas no movimento, reivindicando melhores condições de vida.
Sendo assim, com a volta da democracia, o Código de Menores e o Juizado
de Menores desapareceram do cenário jurídico. Inaugurou-se, por meio dos arts.
227 e 228 da Constituição Federal, uma nova concepção da criança e do
adolescente, apoiado na doutrina da proteção integral. Assim, preceitua os citados
artigos:
Art. 227 – É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de coloca-lós a salvo de toda forma de negligência, descriminação, exploração, violência, crueldade e opressão;
18
Art. 228 – São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL DO BRASIL DE 1988).
Sendo assim, a Lei Federal nº. 8.069, de julho de 1990, denominada de
Estatuto da Criança e do Adolescente, substituiu o antigo Código de Menores (Lei
nº. 6.697, de 10 de outubro de 1979), dando novo tratamento aos pequenos, os
quais passaram a ser divididos em “crianças”, assim entendidos as pessoas com
idade até 12 anos incompletos, e “adolescentes” aquelas que, tendo mais de 12
anos, ainda não completaram 18 anos.
Segundo Carvalho (1992, p.27):
O ECA é uma proposta consagrada em lei que altera radicalmente o modo do Estado-Sociedade-Família relacionarem-se com a criança e o adolescente; passando a ser percebido como valor na caminhada de uma humanidade, deixando de ser peso, sobrecarga, dever do Estado ou da família. Recuperar a criança é fonte de prazer e de continuidade do humano para toda sociedade.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8.069/90 regulamenta os
preceitos da Constituição Brasileira, de 1988, no que se refere à atenção a esse
segmento importante da nossa população. Segundo Costa (2004a, p.23), O ECA
introduz três orientações que alteram radicalmente o modo de atenção à criança e
ao adolescente. São elas:
• A primeira orientação diz respeito ao modo de conceber crianças e adolescentes; • A segunda orientação altera o modo de gestão publica das políticas de atenção à criança e ao adolescente; • A terceira grande orientação diz respeito à participação comunitária local na formulação acompanhamento, controle e avaliação dos serviços públicos locais destinados a criança e ao adolescente.
No entanto, a implementação integral do ECA, ainda se constitui num grande
desafio para todos aqueles envolvidos e comprometidos com a garantia dos direitos
da população infanto-juvenil. Analista do assunto como Costa (1993, p.32),
denomina de salto triplo os três pulos necessários à efetiva implementação do ECA.
São eles:
• Mudanças no panorama legal: os municípios e estados precisam se adaptar à nova realidade legal. Muitos deles ainda não contam, em suas leis municipais, com os conselhos e fundos para a infância;
19
• Ordenamento e reordenamento institucional: colocar em prática as novas institucional idades trazidas pelo ECA: conselhos de direitos, conselho, conselhos tutelares, fundos, instituições que auxiliam as medidas sócio-educativas e articulação das redes locais de proteção integral; • Melhoria nas formas de atenção direta: é preciso mudar a maneira de ver, entender e agir dos profissionais que trabalham diretamente com as crianças e adolescentes. As ações desses profissionais são historicamente marcadas pelas práticas assistencialistas, corretivas e muitas vezes repressoras, presentes por longo tempo na história das práticas sociais no Brasil. Com isso, há ainda um longo caminho a ser percorrido antes que se atinja um estado de garantia plena de direitos com instituições sólidas e mecanismos operantes.
No âmbito da prática do ato infracional, o ECA institui algumas diretrizes que são
imprescindíveis na aplicação dos direitos direcionados as crianças e adolescentes,
que agem violando ou ameaçando direitos. O próximo item será dado uma atenção
maior sobre as medidas sócio-educativas, que por sua vez particularizam as
crianças e adolescentes que praticam atos infracionais.
2.2 MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS: ALGUMAS REFLEXÕES
Segundo Costa (2004) a sócio-educação é uma modalidade de ação
educativa destinada a preparar os adolescentes em conflito com a lei, a fim de
reintegrá-lo ao convívio social de forma plena e efetiva.
Dessa forma, argumenta o autor que a sócio-educação abrange as políticas, as
quais são constituídas pelo conjunto de mecanismos jurídicos e institucionais,
funcionando a partir de um conjunto de ações legalizadas pelo estado democrático
em favor das pessoas e grupos ameaçados ou violados em seu direito, e também as
políticas de proteção social, as quais se destinam as pessoas ou grupos que
estejam em situação de risco pessoal e social, ou seja, que estão ameaçadas em
sua integridade física, psicológica ou moral em razão de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade ou opressão.
Assim sendo, os programas que implementam as medidas sócio-educativas são
considerados programas de proteção especial, que por sua vez assegura a todos as
crianças e adolescentes a sobrevivência e seu desenvolvimento pessoal e social.
Nessa perspectiva, as medidas sócio-educativas têm natureza sancionatório e
conteúdo pedagógico. Sendo assim, torna-se necessário que os educadores
20
envolvidos na ação sócio-educativa tenham preparo no âmbito dessas duas
dimensões. Conforme Costa (1994), o primeiro passo para o sucesso dessas ações
é que os atores envolvidos nesse processo, e nesse caso estamos nos referindo aos
educadores, que tenham uma formação legalista básica, ou seja, é necessário, de
acordo com o autor, que os educadores possam:
Conhecer os dispositivos legais e sua aplicação. Mas é preciso ir além: o educador precisa ser formado para, diante do trabalho de controle sócio de delito, atuar para garantir os direitos fundamentais do adolescente, autor de ato infracional e a segurança do cidadão. (COSTA, 2004b, p. 34)
Por outro lado, Rodrigues (2006, p.08) acrescenta que as medidas sócio-
educativas devem estar fundamentadas não só no ato atribuído ao jovem infrator,
mas levar em considerarão as necessidades peculiares do jovem, de forma que se
alcance o objetivo, na medida em que seja oportunizada ao jovem sua inclusão
social do modo celebre possível. E ainda acrescenta:
A medida sócio-educativa deve estar fundamentada não só no ato atribuído, mas também no respeito à equidade (no sentido de dar o tratamento adequado e individualizado a cada adolescente a quem se atribua um ato infracional), bem como considerar as necessidades sociais, psicológicas e pedagógicas do adolescente. (RODRIGUES, 2006, p. 08).
Entretanto, Maior (1996) afirmar que a eficácia das medidas sócio-educativas,
se fará presente a parti do momento em que os adolescentes tenham oportunidade
de se constituírem agentes transformadores de sua atual realidade como vitimas da
sociedade injusta no qual estão inseridas.
A aplicação das medidas sócio-educativas se dá, a partir do processo de
sindicância movido pela representação do Ministério Público mediante o ato
infracional consumado. Conforme afirma Frasseto (2006, p. 124):
Após a prática do ato infracional é respeitado os princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, devidamente comprovado a autoria e a materialidade do fato tipificado como crime no moldes da legislação brasileira poderá ser aplicada ao adolescente em conflito com a lei, quaisquer das medidas vincadas no art. 112, do Estatuto da Criança e do Adolescente [...].
21
Por outro lado, as medidas sócio-educativas são aplicadas e operadas de
acordo com a natureza da infração, condição sócio-familiar e, também, a
disponibilidade de programas de serviços em nível municipal, regional e estadual.
Vale salientar que, a política de aplicação das medidas sócio-educativas não
pode estar desvinculada das demais políticas públicas. O trabalho sócio-educativo
começa pela inscrição do adolescente infrator em alguns dos programas de
execução das medidas sócio-educativas, devendo ter prosseguimento além deles.
Hamoy (2006, p.12) argumenta que a criança ou adolescente tem um
tratamento pela norma estatutária que define, primeiramente, a garantia de proteção
integral, considerando-as como sujeitos de direitos, necessitando de atendimento
especializado, tendo em vista estarem em pleno desenvolvimento, no qual estão
absorvendo normas, valores e atitudes das pessoas adultas.
De acordo com (Volpi, 2006b p.21), as medidas sócio-educativas têm natureza
coercitiva, por ter caráter punitivo e educativo, por promover a oportunidade à
formação de valores positivos, de forma que o adolescente seja reincluso na
sociedade e possa superar sua condição de exclusão. E ainda acrescenta:
Os regimes sócio-educativos devem constituir-se em condição que garanta o acesso do adolescente as oportunidades de superação de sua condição de exclusão, bem como de acesso à formação de valores positivos de participação na vida social.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu art. 112, preceitua que
“verificada a prática de ato infracional”, a autoridade competente poderá aplicar ao
adolescente as seguintes medidas:
• I- Advertência - constitui em uma medida admoestatória, informativa e imediata, sendo executadas pelo juiz da infância e da juventude. A coerção manifesta-se no seu caráter intimidatório, devendo envolver os responsáveis num procedimento ritualístico. A advertência deverá ser reduzida a termo e assinada pelas partes; • II- Obrigação de reparar o dano – A reparação do dano se faz a partir da restituição do bem, do ressarcimento e/ou compensação da vítima. Caracteriza-se como uma medida coercitiva e educativa, levando o adolescente a reconhecer, sendo intransferível e personalíssima. Para os casos em que houver necessidade, recomenda-se a aplicação conjunta de medidas de proteção; • III- Prestação de Serviço à Comunidade - Prestar serviços à comunidade constitui uma medida com forte apelo comunitário e educativo, tanto para o jovem infrator quanto para a comunidade, que por sua vez poderá responsabilizar-se pelo desenvolvimento integral desse adolescente. Para o jovem é oportunizada a experiência da vida comunitária, de valores sociais e compromisso social;
22
• IV- Liberdade Assistida - Constitui-se numa medida coercitiva, quando se verifica a necessidade de acompanhamento da vida social do adolescente (escola, trabalha e família). Os programas de liberdade assistida devem ser estruturados no nível municipal, preferencialmente localizados nas comunidades de origem do adolescente. Devem ainda ser gerenciados e desenvolvidos pelo órgão executor no nível municipal em parceria com o judiciário, que supervisiona e acompanha as ações do programa; • V - inserção em regime de semiliberdade - contempla os aspectos coercitivos, desde que afasta o adolescente do convívio familiar e da comunidade de origem, contudo, ao restringir sua liberdade, não o priva totalmente do seu direito de ir e vir. Assim, como na internação, os aspectos educativos baseiam-se na oportunidade de acesso a serviços organização da vida cotidiana. Desse modo, os programas de semiliberdade devem, obrigatoriamente, manter uma ampla relação com os serviços e programas sociais e/ou formato, no âmbito externo a unidade de moradia; • VI- Internação em estabelecimento educacional – A internação, como a última das medidas na hierarquia, que vai da menos grave para a mais grave, somente deve ser destinadas aos adolescentes que cometem atos infracionais graves. Embora, o Estatuto tenha enfatizado os aspectos pedagógicos e não os punitivos ou repressivos, a medida de internação guarda em si conotações coercitivas e educativas. (VOLPI, 2008, p. 23-28).
O que se procura alcançar com essas medidas, é fazer voltar ao adolescente
infrator à condição de ser assistido, criado e educado por seus pais ou por um
responsável, que os substitua de forma a resguardarem os requisitos da cidadania.
Contudo, conforme menciona Volpi (2001, p.15):
Transformar a vontade ficta da lei (ECA) em realidade palpável chega a beirar ‘utopia’, se observamos a nossa volta o estado de penúria e calamidade das instituições brasileiras, eivadas de agentes corruptos e sem suficientes para mudar a vida de milhares de crianças e adolescentes que, a pôr-se à margem do aparelho estatal.
Ainda conforme o citado autor, quanto a aplicabilidade do ECA, não resta
dúvidas, torna-se difícil, sobretudo, no que permeia à política de atendimento às
crianças e adolescentes, como podemos observar no artigo 864 do ECA, pois falta
compromisso dos órgãos públicos da administração, seja a nível municipal, estadual
ou federal, uma vez que é importante ressaltar a relevância dos três níveis de
poderes na execução da política.
O ECA, que substituiu o Código de Menores, traz um grande avanço em
relação ao tratamento e procedimentos direcionados às crianças e adolescentes do
nosso país. A respectiva lei resgata a qualidade de sujeito de direito inerente a todo
4 Art. 86 – A política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente far-se-á por meio de um conjunto articulado de ações governamentais, da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. (Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/LEIS/L8069.htm>. Acesso em: 22 set. 2008).
23
ser humano. E no caso específico das crianças e adolescentes, o ECA ocupa um
lugar especial, uma vez que a categoria infanto-juvenil por muito tempo fora tratado
como simples objeto de intervenção, com apenas um direito, qual seja o de
resignação diante das medidas aplicadas, tida como educativas e ressocializadoras.
Nesse contexto, como bem enfatiza Volpi (2006c, p.20):
Há que se acreditar na possibilidade dos adolescentes infratores de hoje, mesmo a míngua das medidas inócuas do Estado e da falta de estrutura dos órgãos judiciários especializados, virem a se tornar sujeitos de sua própria história, constituindo seus projetos de vida e deixando para trás o triste papel de vítimas das organizações elitistas e marginalizadoras.
Em verdade, o que podemos constatar é que existe uma distância entre os
direitos garantidos do ponto de vista legal e a sua aplicabilidade. Crianças e
adolescentes do nosso país continuam com seus diretos violados, necessitando
assim que seja materializado uma rede de atendimento, que deve partir não
somente do Estado, por intermédio do incremento de políticas públicas voltadas as
necessidades da categoria infanto-juvenil, como também uma maior participação
dos conselhos de direitos, conselhos tutelares, agindo em prol da cidadania desse
público-alvo, o qual por muito tempo viveu sem ser considerados cidadãos no
sentido pleno do termo.
2.3 O FÓRUM MUNICIPAL DE SÃO GONÇALO DO AMARANTE/RN E SUA
CONTRIBUIÇÃO NA POLÍTICA DE ATENDIMENTO A CRIANÇA E O
ADOLESCENTE EM CONFLITO COM A LEI
Foto 1 - Antigo Fórum Municipal de São Gonçalo do Amarante/RN
Fonte: Coleta direta de dados (2008).
24
O Fórum Municipal de São Gonçalo do Amarante/RN encontra-se localizado
na Rua Coronel Estevam Moura s/nº, funcionando também como anexo do Tribunal
de Justiça do município de Natal/RN.
O Fórum tem como missão prestar a jurisdição com qualidade, eficiência,
seriedade e presteza nos casos relativos à criança e ao adolescente. Essa
instituição tem o objetivo de cumprir as determinações estabelecidas na constituição
Federal, bem como no Estatuto da criança e do adolescente (ECA), efetivando os
direitos e garantias fundamentais.
O público-alvo direcionado para o atendimento no fórum são pessoas que, em
geral residem no próprio município. Essas pessoas procuram a instituição de forma
espontânea, motivados por necessidades particulares, que em sua maioria são
casos de regularização de guarda, adoção, menores que cometem atos infracionais
e problemas familiares como regularização judicial de separação, violência
doméstica, dentre outros serviços.
Ainda sobre o perfil característico atendido, é constituído de pessoas
carentes, crianças em situação de abandono e de risco, familiares em conflito com a
guarda de seus filhos menores, pessoas interessadas em adoção de crianças,
adolescentes em conflito com a lei, e ainda familiares desses adolescentes.
A respectiva instituição, com projeções ainda para esse ano, vai passar a
funcionar a em uma nova dependência, que até o presente momento ainda está em
fase de construção. O novo espaço contará com uma área totalmente ampliada, com
instalações adequadas ao atendimento dos usuários, localizado na Rua Aildo
Mendes s/nº. Como vemos na foto a seguir:
Foto 2 – Novo prédio do Fórum
Novo Fórum Municipal de São Gonçalo do Amarante
Fonte: Coleta direta de dados (2008).
25
O quadro de funcionários é composto por Juiz, Promotor de Justiça,
Assistente Social e Auxiliar de Justiça, tornando-se, contudo, insuficientes para
atender a demanda da instituição, requerendo assim um número maior de
profissionais.
Os atendimentos incluem encaminhamentos de crianças e adolescentes a
casa abrigo do município à instituição Espaço Vivência (locus de nossa intervenção,
caracterizado posteriormente) para a Secretaria da Assistência Social (SEMTHAS),
a fim do cumprimento de medidas sócio-educativas. No cumprimento dessas
medidas, os adolescentes são encaminhados para instituições que trabalham com
internação provisória como o Centro Integrado de Adolescente (CEAD) - com 45
dias de internação -, ou por tempo determinado no Centro Educacional (CEDUC) -
com 6 a 3 anos de internação.
O Fórum atende por dia uma demanda de 20 a 25 usuários. Os atendimentos
são realizados de segunda a sexta, sendo que dois dias da semana são para a
realização de visitas domiciliares, no horário das 8h às 12hs.
Para efetivação desse trabalho, o fórum desenvolve parcerias com o
Conselho Tutelar do município, entre prefeitura municipal, e ONGs.
A infra-estrutura disponível do fórum é de: uma recepção; dois gabinetes para
juízes com banheiros; uma secretaria da 2ª Vara de Família e do Juizado da Infância
e da Juventude; uma secretaria da 1ª Vara Cível e de Excursão; duas salas para
arquivos; uma copa; dois banheiros públicos; uma sala para depósito de materiais;
uma sala da assistente social e salas de audiência. Toda essa estrutura está sendo
disponibilizada provisoriamente, pois o prédio é alugado e, conforme já mencionado,
já está sendo concluída uma sede fixa.
As propostas de trabalho realizadas pelos profissionais envolvidos nas
diferentes Varas não se confrontam, visto que cada instância realiza seu trabalho de
forma individual de acordo com sua especificidade, pois cada processo é
encaminhado a Vara competente em atendimento específico.
Em contraponto a essa política de trabalho, o Fórum enfrenta uma demanda
insuficiente de profissionais qualificados na área e falta de infra-estrutura como um
todo, o que acaba refletindo em termos locais.
26
2.4 UMA BREVE ANÁLISE SOBRE AS DROGAS, SEUS MALEFÍCIOS E SUA
RELAÇÃO COM OS ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI DO ESPAÇO
VIVÊNCIA
As drogas são substâncias utilizadas para produzir alterações, mudanças
nas sensações, no grau de consciência e no estado emocional. As alterações
causadas variam de acordo com as características da pessoa que as consome, do
tipo de droga que é utilizada, como também da quantidade.
Siqueira (2004, p. 07), estudioso da temática, argumenta que:
Geralmente achamos que existem apenas algumas poucas sustâncias extremamente perigosas: são essas que chamamos de drogas. Achamos também, que drogas são apenas os produtos ilegais como a maconha, a cocaína e o crack. Porém, do ponto de vista da saúde, muitas substâncias legalizadas podem ser igualmente perigosas como, por exemplo, o álcool que também é considerado uma droga como as demais.
Por outro lado, estamos vivendo uma realidade em que a prática do
consumo de drogas, consideradas lícitas ou ilícitas, vem se intensificando cada vez
mais cedo, o que tem acarretado graves problemas de saúde física e mental nos
seus usuários, tornando-se assim uma questão de saúde pública.
No contexto dos usuários de drogas estão os adolescentes. Bocher (1998,
p. 37) estudioso do assunto, argumenta que atualmente há uma tendência cada
vez mais de considerar o uso de drogas na adolescência como fazendo parte do
seu desenvolvimento. A esse respeito o autor enfatiza:
A adolescência é um período da vida onde as contradições assumem um papel dinâmico essencial. O adolescente vê-se então, dividido entre o desejo de conservar o mundo confortável da sua infância e a necessidade imperiosa de adquirir sua autonomia. É a época em que se põe o problema de identidade do sujeito da relação com seu corpo, com seu lugar na família e na sociedade. Assim, a utilização de drogas é uma das maneiras, através da qual se exprime o mal-estar de muitas adolescentes.
Segundo Uchoa (2002), foi registrado entre crianças e adolescentes, de 1º e
2º grau, o aumento significativo na tendência de uso de maconha e cocaína, quando
comparado a estudos anteriores na mesma população.
27
Além disso, dados fornecidos pelo estudo epidemiológico nacional, realizado
em 2002, identificaram, conforme evidencia o gráfico a seguir, que as drogas mais
consumidas pela população brasileira são álcool, atingindo um percentual de 68,7%,
o tabaco com 41,1%, a maconha com 6,9%, os solventes com 5,8%, os orexígenos
com 4,3% e a cocaína com 2,3%.
Gráfico 1 – Drogas consumidas pela sociedade brasileira
Alcool
Tabaco
Maconha
Solventes
Orexigênios
Cocaína
Fonte: Estudo epidemiológico nacional (2002).
Assim, diante da gravidade do aumento do consumo de drogas, esse tema
vem recebendo tratamento de alta prioridade pelo Governo Federal, dentro do
princípio do compartilhamento das responsabilidades com os governos estaduais e
municipais, setor produtivo e sociedade civil.
A orientação adotada é que o combate ao uso indevido de drogas exige que,
não só o setor público, mas todos os cidadãos brasileiros se conscientizem da
magnitude do problema, se mobilizem e atuem de forma efetiva integrando esforços
e maximizando resultados.
Nesse contexto, a Política Nacional Antidrogas, ocorrido em 11 de dezembro
de 2001, representou um importante marco no esforço nacional do combate às
drogas. O documento estabeleceu os objetivos, as diretrizes e as estratégias para a
ação antidrogas, e definições indispensáveis para que os esforços de redução da
demanda e da oferta de drogas pudessem ser conduzidos de forma planejada e
articulada, viabilizando assim a sinergia entre os diversos agentes nacionais.
É importante ressaltar que, a elaboração da Política Nacional Antidrogas
resultou de um processo participativo de debates levantados durante o I Fórum
28
Nacional Antidrogas, realizado em 2000, nos quais foram incorporadas contribuições
da sociedade brasileira e de sua comunidade científica. Dessa forma, ao ser
sancionado pelo Presidente, a política já havia sido legitimada pela sociedade
brasileira, na qual contribuiu na qualidade de parceria para a definição do seu
conteúdo.
O lançamento da Política Nacional Antidrogas oficializou, portanto, a
determinação governamental de conduzir o país para uma realidade livre das
ameaças das drogas, e estabeleceu a “linha mestra” para ações antidrogas,
sinalizando os rumos e os caminhos para que as forças nacionais públicas e
privadas pudessem atuar de forma coordenada e sintonizada.
Conforme Uchôa (2002, p. 85):
A política estabeleceu importantes orientações para a ação nacional de combate às drogas, como a necessidade de buscar fundamentação técnicas e cientificas para os programas, projetos e atividades antidrogas, por meio de aplicação regular de pesquisas/levantamentos nacionais e realização de estudos. Além disso, contemplou a preocupação com o desenvolvimento de um modelo de gestão empreendedor para a condução das ações nacionais, estaduais e municipais, dotado de sistema de informação, de planejamento, eficácia e efetividade ao Sistema Nacional Antidrogas.
Para tanto, a Política Nacional Antidrogas reconhece a diferença entre o
usuário ou dependente e o traficante de drogas, admitindo que a dependência antes
de se configurar crime, deve ser considerada uma doença, precisando receber
tratamento adequado. Por outro lado, a política afirma ainda, que a opção brasileira
pela municipalização das ações como estratégia adequada para conceder a
necessidade capilaridade, mensagem antidrogas e potencializar a participação do
setor privado e da sociedade civil no esforço de combater às drogas.
Diante do exposto, tivemos uma clara noção a respeito do conjunto de ações
que vêm sendo empreendidas pela Política Nacional de Combate às Drogas.
Contudo, apesar dos avanços que se têm registrado, o número de usuários de faixas
etárias diferenciadas que utilizam substâncias entorpecentes no nosso país é
bastante considerável. E entre esses usuários estão os adolescentes, que por
alguma razão desenvolvem ou não uma relação direta com o mundo das drogas.
Geralmente, o início da prática do uso de drogas por parte de jovens
adolescentes, se dá a partir do consumo de drogas lícitas como álcool e tabaco,
aprofundando-se até as drogas ilícitas, mencionadas anteriormente.
29
Partindo dessa premissa, é que consideramos de grau relevância a
elaboração do nosso projeto de intervenção, que abordou um tema tão complexo
como é o caso das drogas. Em verdade, procuramos contribuir para a promoção do
processo de conscientização e reflexão a cerca dos malefícios trazidos pelo uso de
drogas aos adolescentes em conflito com a lei, inseridos no âmbito institucional do
Espaço Vivência que, infelizmente, já convivem com essa realidade problemática.
30
3 O TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL NO ESPAÇO VIVÊNCIA E O
ESTÁGIO NA FORMAÇÃO PROFISSIONAL
3.1 O ESPAÇO VIVÊNCIA NO CONTEXTO DAS MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS
Foto 3 – O Espaço Vivência
Fazenda Cajueiro (Espaço Vivência)
Fonte: Coleta direta de dados (2008).
O Espaço Vivência foi fundado em 14 de novembro de 2006, pela Prefeitura
Municipal de São Gonçalo do Amarante/RN, nas pessoas do: Prefeito Jarbas
Cavalcante, pela Juíza do Fórum desse Município Dra. Luciana Lima Teixeira e pelo
Promotor de Justiça Dr. Luiz Eduardo. Sendo localizado na Fazenda Cajueiro, no
município de São Gonçalo do Amarante/RN.
A instituição é financiada pela Prefeitura Municipal de São Gonçalo do
Amarante/RN, Secretaria Municipal do Trabalho, Habitação e Assistência Social
(SEMTHAS) de São Gonçalo do Amarante/RN, Conselho Nacional dos Direitos da
Criança e do Adolescente (CONANDA), em parceria com o Tribunal de Justiça do
Rio Grande do Norte.
Em conformidade com o público-alvo que presta assistência, a política que
perpassa a instituição é a de assistência a criança e ao adolescente, tomando por
base legal as diretrizes e princípios do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA),
Lei nº 8.069, de 13 de junho de 1990, a qual, segundo o seu art. 6º, considera “a
condição peculiar da criança e do adolescente, como pessoa em desenvolvimento”.
31
Encaminhados pelo Fórum, as faixas etárias predominante no Espaço
Vivência são de adolescentes entre 12 e 18 anos de idade e, excepcionalmente,
entre 18 e 21 anos. Na maioria dos casos, esses adolescentes já tiveram passagem
pela Delegacia Especializada no Atendimento ao Adolescente (DEA) e o Centro
Educacional (CEDUC). São, portanto, usuários reincidentes na prática de atos
infracionais, em que muitos deles já cumpriram medidas sócio-educativas como:
semiliberdade e internação.
Por outro lado, pelo que observamos nas fichas de registro da instituição, a
grande maioria dos adolescentes são filhos de pais separados, 68%. Num universo
de 25 usuários, 26% vivem com os pais, 42% com tios ou avós e 31% só com a
mãe. Podemos observar a existência de uma desestruturação familiar que,
certamente, trouxe e traz danos à formação desses adolescentes, os quais, em sua
maioria, estão em fase de desenvolvimento, precisando de orientação e apoio
familiar.
Também observamos, no que se refere à educação, que dos 25 usuários,
68% freqüentam a escola e desse percentual apenas 10% possui o ensino médio
concluído, estando o restante em andamento. Os que não freqüentam a escola
atingem um percentual de 26%, uma quantia considerável, a qual se encontra à
margem do processo educacional formal. Um dos direitos garantidos legalmente,
pois conforme preceitua o ECA, entre os direitos sociais inerentes a condição
humana está à garantia do acesso à educação.
Por meio das fichas de registro analisadas, também podemos observar que a
maioria dos adolescentes são usuários de drogas, os quais iniciaram o consumo
muito cedo.
O Espaço Vivência trabalha, especificamente, com o regime de medidas
sócio-educativas em meio aberto à comunidade e liberdade assistida. Faz parte de
seu trabalho a aplicação de uma proposta pedagógica que objetiva o fortalecimento
dos vínculos familiares e comunitários. Para tanto, essa instituição em consonância
com os preceitos determinados pelo ECA, trabalha em parceria com o Poder
Executivo Municipal, o Poder Judiciário, o Ministério Público e o Conselho de Direito
Municipal, contando também com a possibilidade da participação de outros autores
sociais, numa relação horizontal e participativa e de forma co-responsável.
O sistema de prestação de serviço da instituição encontra-se pautado na
busca da garantia integral dos direitos dos adolescentes, em conflito com a lei do
32
município. Para tanto, vem procurando ampliar e proporcionar a humanização no
atendimento desses jovens, auxiliando-os na redução da reincidência e oferecendo-
lhes oportunidades para assumirem novo papel social, menos estigmatizados de
acordo com as propostas da Secretaria Especial de Direitos Humanos da
Previdência da Republica (SEDH), por intermédio da Subsecretaria de Promoção
dos Direitos da Criança e do Adolescente (SPDCA) e do Sistema Nacional de
Atendimento sócio-educativo (SINASE).
Na prestação desses serviços são respeitados e praticados os princípios
constitucionais, e os estabelecidos no ECA e o parâmetro da gestão pedagógica no
atendimento sócio-educativo, inclusive as diretrizes pedagógicas do SINASE, com
vistas à prevalência sócio-educativa sobre os “aspectos pedagógicos, priorizando-se
no projeto pedagógico a singularidade do adolescente, a diversidade étnico-racial, a
participação da família e da comunidade e a formação continuada dos atores
sociais”.
O município coordena o Sistema Municipal de Atendimento Sócio-educativo,
com a edição de normas complementares para a organização e funcionamento dos
programas de atendimento.
Baseado nisso, Volpi (2006, p.23) argumenta que:
Os programas sócio-educativos deverão utilizar-se do princípio da incompletude institucional, caracterizado pela utilização do máximo possível de serviços (saúde, educação, defesa jurídica, trabalho, profissionalização etc.) na comunidade, responsabilizando as políticas setoriais no atendimento aos adolescentes.
A ação precursora da desjudicialização do atendimento sócio-educativo em
meio aberto desse município, está representada pelo convênio que foi celebrado
com o Centro Educacional Dom Bosco, entidade governamental credenciada para
executar medida sócio-educativa em meio aberto – Prestação de Serviço à
Comunidade (PSC) – e liberdade assistida, localizado na capital desse Estado,
município limítrofe, numa atuação conjunta com o Poder Judiciário, o Ministério
Público e o Conselho de Direito Municipal, proporcionando aos jovens infratores
33
residentes nesse município um atendimento especializado por uma equipe
multidisciplinar5.
Vale salientar, que o Espaço Vivência enquanto espaço de medidas sócio-
educativas representa o resultado do processo de municipalização e de
desjudicialização do atendimento em meio aberto, por uma unidade descentralizada.
Apresenta-se como um desafio pioneiro no Estado do Rio Grande do Norte-RN, que
objetivou proporcionar qualidade ao atendimento dos jovens em conflito com a lei,
procurando contribuir para a inclusão social desses seres em desenvolvimento, pela
educação, apoio familiar e comunitário, sustentado no paradigma da proteção
integral que norteia o Estatuto da Criança e do Adolescente.
Ressalta-se, ainda, que o cumprimento das medidas no município, onde
residem os adolescentes, proporciona aos mesmos, facilidades de deslocamentos
para a instituição de cumprimento da medida, bem como para as oficinas que são
oferecidas.
Para o bom funcionamento da Central de Medidas sócio-educativas, em que
se encontra inserido o Espaço Vivência, são seguidos os seguintes objetivos, entre
os quais podemos citar:
• Garantir o amplo acesso da criança e do adolescente a Defensoria
Pública;
• Realizar estudos e pesquisas voltadas para o conhecimento da realidade
da criança e do adolescente, autor do ato infracional;
• Articular uma rede de proteção que garanta a promoção e a proteção da
criança e do adolescente em conflito com a lei;
• Articular as diversas políticas públicas desenvolvidas no Município para
assegurar um melhor atendimento das necessidades da criança e do
adolescente;
• Desenvolver atividades sócio-educativas, visando a ressocialização e o
resgate da cidadania, tendo como respaldo o Estatuto da Criança e do
Adolescente;
5 Equipe Multidisciplinar - Grupo de especialistas com profissionais de diversas áreas, ou seja, com formações acadêmica diferentes, que podem interagir para o trabalho de reabilitação ou educação de pessoas com deficiências, e que trabalham em prol de um único objetivo.
34
• Identificar os interesses e as habilidades dos adolescentes em
cumprimento de medidas de prestação de serviço à comunidade, nas
entidades acolhedoras;
• Oferecer atendimento social e psicológico individual e grupal aos
adolescentes em conflito com a lei;
• Realizar estudo social e psicológico individual, reavaliando o caso
periodicamente, comunicando os resultados as autoridades competentes;
• Capacitar periodicamente as entidades acolhedoras dos adolescentes em
cumprimento de medidas sócio-educativas;
• Contribuir para resgatar a cidadania e identidade, em conformidade com
a proposta do ECA;
• Desenvolver atividades que buscam o restabelecimento dos vínculos
familiares e comunitários dos adolescentes;
• Realizar parcerias efetivas com os atores envolvidos no processo como
órgãos públicos, iniciativa privada e terceiro setor;
• Assegurar a inserção e/ou reinserção do adolescente no sistema regular
de ensino;
• Promover a aquisição dos documentos pessoais (RG, CPF, CTPS) de
100% da população atendida.
A instituição tem capacidade para atender e acompanhar 25 adolescentes de
ambos os sexos, em cumprimento de medida sócio-educativa em meio aberto de
liberdade assistida e prestação de serviço à comunidade.
Apresenta um caráter sócio-educativo e ressocializador, visando à promoção
de elementos que possibilitem a melhoria da qualidade de vida desses
adolescentes, com atividades fundamentadas em uma abordagem junto ao
adolescente, família, escola e comunidade.
É procedido de todo um acompanhamento social, jurídico e psicológico capaz
de levar o adolescente a perceber a responsabilidade do cumprimento da medida
aplicada, assegurando meios apropriados para que ocorra uma ressocialização
satisfatória.
Na fase da ressocialização, busca-se promover assessoramento e orientação
individual, grupal aos adolescentes e aos seus familiares, e trabalho comunitário,
35
tendo em vista o melhor relacionamento com membros familiares e sociedade, bem
como a preparação para o trabalho, que se desenvolverá, inicialmente com a
promoção de cursos, efetivados em convênio com os órgãos públicos e
organizações não governamentais.
O Espaço Vivência tem suas fases voltadas para a melhoria da qualidade de
vida dos adolescentes, com atendimento individual e grupal aos adolescentes e
familiares, visitas domiciliares, encaminhamento para oficinas e cursos
profissionalizantes, atividades artísticas, dentre essas, algumas em madeira e
mosaico. Como nas fotos a seguir:
Foto 4 - Arte em mosaico
Foto 5 - Arte em madeira (Pirogravura)
Fonte: Trabalho realizado pelos adolescentes do Espaço Vivência
36
As ações desenvolvidas no Espaço Vivência se materializam de forma
individual, grupal, profissionalizante e com sistema de controle e avaliação.
Nos atendimentos individualizados são colocadas em prática as seguintes
ações: acolhimento, entrevista social, orientação social, encaminhamentos de várias
naturezas e visitas domiciliares.
A equipe funcional da instituição, sobretudo o assistente social desenvolve um
trabalho de acolhimento, que se inicia com o repasse de um conjunto de
informações aos adolescentes e seus familiares sobre as normas, regras e rotinas
institucionais, bem como esclarecimentos mais precisos sobre a medida sócio-
educativa que o mesmo irá cumpri-la no período determinado.
A entrevista social, instrumental utilizada pelo assistente social, se realiza
com o suporte de um questionário previamente elaborado contendo questões,
especialmente, relacionada a dados pessoais dos usuários e sua situação sócio-
econômica.
A orientação social é realizada a partir do momento em que o adolescente e
sua família chegam à instituição. A assistente social responsável por essa ação
viabiliza algumas orientações, em relação a todo o período de cumprimento de
medidas dentro da instituição, a fim de que a família tome conhecimento da situação
de seu familiar e compreenda a dimensão das medidas determinadas judicialmente.
No decorrer do cumprimento das medidas, os adolescentes do Espaço
Vivência vão sendo encaminhados pelo serviço social para programas sociais do
governo, tais como: Pro Jovem6; Consocio da juventude7; Agente Jovem8; também
6 O Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Pro Jovem) foi criado pelo Governo Federal e é executado em parceria com os governos estaduais e o Distrito Federal. Por meio dele, jovens entre 18 e 24 anos, que não concluíram o ensino fundamental, têm oportunidade de elevar seu grau de escolaridade. Além disso, o programa oferece qualificação profissional voltada à inclusão social e estimula a prática de ações comunitárias e o exercício da cidadania. O jovem matriculado no Pro Jovem recebe um benefício de R$ 100,00 mensais durante o período do curso (12 meses), desde que cumpra as metas estipuladas e tenha freqüência mínima de 75% nas aulas. Disponível em:< http://www.caixa.gov.br/Voce/social/beneficios/projovem/index.asp#a>. Acesso em: 30 de Outubro de 2008.
7 O objetivo das ações no eixo do Consórcio da Juventude é preparar os jovens pertencentes a grupos de maior exclusão social, com ações de qualificação, destacando-se o apoio à elevação da escolaridade, à inclusão digital, aos valores humanos, à ética e à cidadania, à saúde, à qualidade de vida e à educação ambiental, além da capacitação técnica profissional. As ações do Consórcio vêm resultar na inserção dos jovens no mundo do trabalho. Disponível em:< http://www.caixa.gov.br/Voce/social/beneficios/projovem/index.asp#a>. Acesso em: 30 de Outubro de 2008.
8 O Projeto Agente Jovem de Desenvolvimento Social e Humano é uma ação da assistência social que, pautada na Emenda Constitucional nº 20, buscou definir uma proposta de ocupação destinada à jovens em situação de risco e vulnerabilidade social, que não configure trabalho, mas que possibilite, de fato, experiências práticas que os preparem para futura inserção no mundo do
37
são encaminhados para tratamentos odontológicos e aquisição de documentos,
conforme a necessidade.
Durante o período de cumprimento das medidas, a assistente social realiza
visitas domiciliar, com o intuito de acompanhar o desenvolvimento desses
adolescentes dentro e fora da instituição.
Com relação ao atendimento grupal, este se realiza por intermédio de
atividades lúdicas, especiais, visitas institucionais, orientações e apoio sócio familiar.
As atividades lúdicas são desenvolvidas sob a supervisão de um professor
com especialização em Arte. Com o respaldo desse profissional, são realizadas
atividades como mosaico e pirogravuras (arte na madeira).
Já as atividades especiais se materializam pelas reuniões em grupo com
todos os adolescentes da instituição, com o intuito que tomem conhecimento das
normas institucionais e ao mesmo tempo seve de espaço de interação entre esses
usuários.
Outra ação importante que o Espaço Vivência realiza, são as visitas
institucionais a instituições filantrópicas, que trabalham com crianças, adolescentes,
idosos e dependentes químicos. São atividades extras realizadas pelo Espaço
Vivência, visando mostrar a realidade vivida dentro de outras instituições, e com isso
trabalhar temas transversais como cidadania, solidariedade, entre outras, sendo
dessa forma selecionadas instituições que trabalhem com esse propósito,
despertando nos adolescentes consciência e conhecimento da realidade. Essas
visitas são acompanhadas por toda equipe interdisciplinar do Espaço Vivência,
sendo o responsável por toda ação o assistente social da referida instituição.
A orientação e apoio sócio-familiar são viabilizados mensalmente com os
familiares dos usuários. A intenção é promover um espaço de discussão, reflexão e
debate sobre as problemáticas existentes que giram em torno da situação específica
de cada adolescente.
Uma outra especificidade do Espaço Vivência, são as ações
profissionalizantes, as quais são realizadas com os adolescentes com oficinas que
desenvolvem trabalhos com mosaico e pirogravura (escultura na madeira). A
trabalho e permanência no sistema educacional. O jovem passa por uma capacitação teórico-prática em temas de saúde, cidadania e meio-ambiente, e exerce atividades práticas em sua comunidade como parte de sua formação humana e social. (Disponível em:< http://www.caixa.gov.br/Voce/social/beneficios/projovem/index.asp#a>. Acesso em: 30 de out. 2008).
38
intenção é despertar nos usuários a criatividade e contribuir na sua formação
profissional.
No Espaço Vivência, também existe um sistema de controle e avaliação, que
se efetiva com o objetivo de contribuir no processo de integração dos adolescentes
no âmbito institucional. Esse processo é importante, porque facilita a assimilação
dos usuários no que diz respeito às normas, regras e rotina institucional. Para tanto,
é verificado sistematicamente aspectos relacionados a:
• Adaptação as normas e rotinas do Espaço Vivência / compromisso com a
instituição;
• Freqüência as ações programadas, em cumprimento da medida aplicada;
• Freqüência escolar;
• Assiduidade e pontualidade;
• Interesse pelas tarefas;
• Relacionamento com os demais colegas e equipe interdisciplinar;
• Aptidão pelas tarefas (habilidade e capacidade);
• Desempenho no grupo, na família e na comunidade.
O modelo operacional da central de execução das medidas sócio-educativas
(Espaço Vivência) é pautado na política de atendimento da criança e do
adolescente, por intermédio de uma grande e permanente articulação entre o
Executivo, o Judiciário, o Conselho de Direito, instituições governamentais e não
governamentais atentas ao problema, dando-se ênfase a mobilização social.
Em relação a esse fato, Volpi (2006, p. 23) acrescenta:
[...] As medidas sócio-educativas são aplicadas e operadas de acordo com as características da infração, circunstâncias sócio familiar e disponibilidade de programas, e serviços em nível municipal, regional e estadual.
A instituição enquanto órgão coordenador e executor das políticas
destinadas as medidas sócio-educativas, é composto por uma equipe
multiprofissional, incluindo: coordenador técnico, assistente social,
psicopedagogo, arte-educadora e coordenador administrativo.
39
Foto 6 - Equipe multiprofissional do Espaço Vivência
Fonte: Trabalho realizado pelos adolescentes do Espaço Vivência.
3.2 O TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL NO ESPAÇO VIVÊNCIA
O Serviço Social no Brasil foi implantado na década de 30, como um
departamento especializado da ação social, a fim de intervir na questão social que,
segundo Iamamoto (2001), se define como as expressões do processo de formação
e desenvolvimento da classe operária e de seu ingresso no cenário político da
sociedade, exigindo seu reconhecimento como classe por parte do empresariado e
do Estado.
O atual contexto sócio-histórico influencia na atuação cotidiana do serviço
social de forma que implica nas condições e relações de trabalho, como também nas
condições de vida dos usuários do serviço social. Dessa forma, se torna necessário
que o assistente social tenha um olhar amplo, o qual viabilize uma atuação
condizente com as demandas emergentes do cotidiano.
De acordo com Iamamoto (2005), o assistente social tem uma função
histórica de implementação de políticas sociais e públicas, contudo, deve responder
as demandas atuais rompendo com a rotina e a burocracia. Assim afirma:
40
Responder a tais requerimentos exige uma ruptura com a atividade burocrática e rotineira, que reduz o trabalho do assistente social a mero emprego, como se limitasse ao cumprimento burocrático de horário, a realização de um leque de tarefas as mais diversas ao cumprimento de atividades preestabelecidas. (IAMAMOTO, 2005a, p. 21).
Para Iamamoto (2005b) o exercício da profissão é mais que isso, requer uma
ação profissional que saiba estabelecer propostas inovadoras, defender seus
projetos e negociar junto à instituição, na qual atua, de forma que supere as rotinas
institucionais, apreendendo as constantes mudanças do mundo global.
Para uma atuação no âmbito judicial, o assistente social utiliza de um
conjunto de instrumentais técnicos que são imprescindíveis no seu fazer profissional.
Esses instrumentais, alguns já elucidados anteriormente, se concentram em estudos
do caso pelo diálogo, observação, análise, registro e elaboração de pareceres.
Estabelecendo assim, um estudo social dos indivíduos usuários dos serviços
judiciais.
No campo jurídico, apesar de ser subordinado administrativamente a um juíz
de direito, e isso nos podemos verificar no nosso estágio, o assistente social tem sua
autonomia profissional, que por sua vez é garantida legalmente de acordo com o
código de ética profissional.
Como bem sabemos, a entrevista é o instrumento mais utilizado pelo
assistente social nos primeiros contatos com o público. Esse instrumento assume
papéis diversos no decorrer dos processos, pois por meio dele o assistente social do
Espaço Vivência faz todo o levantamento de perfil, do público assistido pela
instituição, e assim tem condições de analisar a realidade socioeconômica, em que o
usuário está inserido.
Posteriormente, com o desenvolvimento dos casos surge outro instrumento
de grande destaque nos trabalhos desempenhados pela assistência social, os quais
são as visitas domiciliares. Essas visitas representam a verificação dos dados
levantados nas entrevistas, o que se torna essencial em determinados casos, como
por exemplo, nas adoções. Vale salientar que, a prefeitura disponibiliza um meio de
transporte para a realização dessas visitas.
Durante as visitas tudo é registrado, minuciosamente, pois é a partir dessa
realidade que o profissional em questão elabora o parecer social que é anexado aos
processos e posteriormente avaliado pelo promotor.
41
O espaço oferecido pela instituição para a atuação do profissional é composto
de uma sala própria com os equipamentos necessários a sua prática como:
computador disponível, armário e cadeiras, ou seja, um ambiente com boas
condições para prestar o atendimento aos usuários da instituição.
O Serviço Social no Espaço Vivência é um setor de grande relevância no
desenvolvimento de todos os trabalhos direcionados operacionalizados na
instituição. Tendo sua atuação embolsada em todo um conhecimento teórico, o
assistente social no Espaço Vivência desempenha os seguintes trabalhos:
• Responde pela área de atendimento direto ao adolescente e sua família;
• Acompanha o adolescente nas atividades inseridas, mantendo contato
constante com instrutor ou pessoa responsável para a condução da
atividade;
• Elabora relatórios a serem encaminhados a Vara da Infância e da
Juventude;
• Responde pela elaboração e excursão do Plano de Atendimento
Individual (PIA), e pelos encaminhamentos destinados aos adolescentes
sobre sua orientação;
• Realiza atividades definidas pelo projeto em acompanhamento ao
adolescente, de acordo com suas atribuições como orientadora social:
faz interpretação da medida sócio-educativa com adolescentes e
familiares e/ou qualquer outra atividade, em situação necessária ou
excepcional;
• Realiza visitas na instituição em que o adolescente cumpre medidas em
Prestação de Serviço a Comunidade (PSC);
• Assume as responsabilidades técnicas junto ao poder judiciário
(Relatório), e quando necessário assegura encaminhamentos e
providencias para o adolescente e sua família;
• Realiza contatos com instituições e rede de serviços com o intuito de
agilizar os encaminhamentos necessários e acompanhar com presteza
os adolescentes.
Contudo, para que o assistente social materialize suas ações, torna-se
necessário, que esse tenha domínio, não somente do ponto de vista das técnicas no
manuseio dos instrumentais, mas que também estejam capacitados teoricamente,
42
eticamente e politicamente. Em outras palavras, isso quer dizer, conforme Guerra
(2000), que estejam instrumentalizados para dar sentido ao fazer profissional. Só
assim, terão condições de romper com práticas rotineiras, mecanicistas e destituídas
de qualquer visão crítica. Assim, durante o período de estágio podemos observar
que o assistente social do Espaço Vivência possui de fato esse suporte instrumental
(ANEXO A), o qual é necessário ao exercício de suas funções.
3.3 A IMPORTÂNCIA DO ESTÁGIO NA FORMAÇÃO PROFISSIONAL E A
EXPERIÊNCIA DA PRÁTICA DE INTERVENÇÃO JUNTO AOS ADOLESCENTES
DO ESPAÇO VIVÊNCIA
De acordo com estudiosos do assunto, Bianchi (2002) e Buriolla (2001), o
estágio é o momento de aprendizado prático, em meio a gama de conhecimentos
teóricos vivenciado nas universidades. Mas, compreender exatamente o que é o
estágio, perpassa esse conceito empírico e culmina em observações mais profundas
na realização dessa etapa de aprendizado.
Dessa forma, Bianchi (2002, p.33) diz que "o estágio é um período de estudos
práticos para aprendizagem, experiência e envolve, ainda, supervisão, revisão,
correção e exame cuidadoso".
Observa-se então, que estão imbuídos no estágio, algo além da vivência
prática, mas ainda, um estudo dessa vivência que engloba em seu desfeche
supervisão, revisão, correção e exame. Kulcsar (apud FAZENDA [et al.], 1994a,
p.10), referindo-se ao estágio em magistério, diz que o estágio deverá proporcionar
o engajamento do estagiário na realidade, para que este possa perceber os desafios
que a carreira profissional lhe oferecerá, e este possa assim, refletir maduramente
sobre a profissão que vai assumir.
A autora complementa, ainda dizendo que "esse envolvimento, em situações
reais, vividas, visará primordialmente à integração do saber com o fazer”.
(KULCSAR apud FAZENDA [et al.], 1994b, p.11) Essa visão atribui ao estágio um
caráter reflexivo, o qual coloca o acadêmico frente as constantes do dia-a-dia
43
profissional, a fim de que esse possa, a partir do conhecimento adquirido,
compreender bem o contexto da profissão que irá exercer.
Apesar dessas idéias serem atribuídas ao estágio do magistério, elas
compreendem perfeitamente as necessidades da formação em Serviço Social ou a
qualquer outra formação.
Segundo Nicolau (2005, p. 120):
o processo formativo, tendo como base os pressupostos que definem determinada visão de homem e de sociedade, pretende preparar pessoas para atuarem no concreto. Tenta, portanto, construir um discurso do dever-ser, pelo qual o concreto é negado. O exercício profissional, por seu turno, articula um discurso do dever-ser, pelo qual, o dever-ser da formação é negado. O processo formativo nesse sentido, tem uma dimensão de abstração que só supera o nível abstrato na medida em que se dar o dialogo continuo com o fazer no exercício profissional. O exercício profissional, em contrapartida concretiza uma mobilização do real a partir da pratica definida pelos pressupostos hegemônicos ao grupo que a concretiza, na totalidade social.
Dessa forma, evidencia-se o estágio como uma estratégia reflexiva da
formação profissional que complementa o processo de ensino/aprendizagem, dando
ênfase à prática.
Como observado nesses dois autores, o estágio proporciona além do
aprendizado prático da profissão, reflexão e revisão teórica, e também avaliação,
oferecidas ao acadêmico, por meio da participação em situações reais de trabalho.
Em serviço social não é muito diferente.
Buriolla (2001) diz que o estágio é campo de treinamento, espaço de
aprendizagem do fazer concreto do serviço social. Em outras palavras:
O estágio é no locus onde a identidade profissional do aluno é gerada, e referida; volta-se para o desenvolvimento de uma ação vivenciada, reflexiva e crítica e, por isso, deve ser planejado gradativamente e sistematicamente. (BURIOLLA, 2001a, p. 13).
O estágio pode ser desenvolvido em órgãos públicos e/ou privados,
instituições de ensino – dependendo do curso de formação – dentre outros, sob
coordenação e responsabilidade da universidade, por intermédio do supervisor
acadêmico, e em cursos como o Serviço Social conta ainda com o apoio do
supervisor de campo.
44
Para Buriolla (2001), essa fase de aprendizado consiste na preparação do
acadêmico para a inserção no mercado de trabalho, inter-relacionando e integrando
a formação acadêmica – mais especificamente a teoria aprendida em sala - com a
prática profissional. E ainda acrescenta: “assim, o acadêmico insere-se no campo
com o propósito de apreender sua profissão, a realidade prática e sua ligação com a
teoria, bem como o emprego das técnicas e instrumentos comuns ao cotidiano da
profissão”. (BURIOLLA, 2001b, p 25).
No período do estágio curricular, vivenciado no Espaço Vivencia, tivemos a
oportunidade de relacionar conhecimentos teóricos adquiridos na academia com a
realidade prática. Tal situação, nos possibilitou uma maior aproximação com
cotidiano do exercício da profissão, com o emprego das técnicas e instrumentos que
se vinculam à realização da prática enquanto base fundamental para o processo de
aprendizagem, imprescindível para a formação profissional, momento que será
detalhado seqüencialmente.
No mês de fevereiro foi realizado, o primeiro encontro com os adolescentes
do Espaço Vivência. O objetivo desse primeiro encontro foi para fazer a divulgação
do nosso projeto de intervenção. Lá se encontravam oito adolescentes, a assistente
social, a coordenadora da instituição e o professor de artes. Podemos nessa ocasião
apresentar nossa proposta de trabalho, com os horários estabelecidos para as
posteriores reuniões e a apresentação do cronograma (APÊNDICE A). Durante essa
apresentação, também contamos com a ajuda da coordenadora da instituição e da
assistente social, que nos ajudaram a mostrar como iria ser realizado nosso projeto
dentro da referida instituição.
Nesse primeiro momento, observamos que apesar da ajuda dada pelos
profissionais da instituição em nossa apresentação, houve uma resistência por parte
dos adolescentes, em ouvir o que seria nosso objetivo.
Decidimos durante alguns dias do mês de fevereiro, já que havia tido uma
resistências por parte dos adolescentes, observar um pouco mais esses usuários, no
intuito de tentar nos aproximar mais deles. Então, no início de cada encontro
aplicamos atividades de dinâmicas de grupo e reflexões, na tentativa de elevar a
auto-estima dos usuários e torná-los participativos das ações realizadas, buscando
também uma maior aproximação dos mesmos, já que a realização de atividades
desse tipo desperta mais o interesse das pessoas.
45
Quando nos sentimos mais próximos desses adolescentes, resolvemos nos
voltar para as atividades seguidas pelo cronograma e dar início ao segundo encontro
do projeto. Sendo realizado no mês de março, organizamos uma palestra com a
colaboração de um psicólogo do município de São Gonçalo do Amarante/RN, o qual
trabalha em seu cotidiano a problemática das drogas. O mesmo tentou, de forma
clara e explicativa, passar em sua discussão as conseqüências que as drogas
trazem na vida do individuo, para tanto enfatizou alguns tipos de drogas juntamente
com seus efeitos como, por exemplo:
• Maconha - Tagarelice, excitabilidade, risadas ou depressão e sonolência.
Aumento do apetite (doces), olhos vermelhos congestos, alucinações,
distúrbios na percepção do tempo e do espaço;
• Cola de sapateiro - Aparência de ébrio, excitação, linguagem enrolada,
perda de equilíbrio, olhos vermelhos, nariz escorrendo (constipado),
sonolência, inconsciência;
• Cocaína - Excitação, aumento da atividade, agressividade, idéias
delirantes, com suspeita de tudo e de todos, palidez acentuada e
dilatação da pupila;
• Crack - Os primeiros efeitos do crack são uma euforia plena que
desaparece repentinamente depois de um curto espaço de tempo, sendo
seguida por uma grande e profunda depressão. Por causa da rapidez do
efeito, o usuário consome novas doses para voltar a sentir uma nova
euforia e sair do estado depressivo. O crack também provoca
hiperatividade, insônia, perda da sensação de cansaço, perda de apetite,
e conseqüente perda de peso e desnutrição. Com o tempo e uso
constante da droga, aparecem um cansaço intenso, uma forte depressão
e desinteresse sexual;
• Álcool - O consumo do álcool causa, em um primeiro momento, euforia,
desinibição e sociabilidade. Conforme aumenta a dose, os efeitos
passam ser mais depressivos, causando falta de coordenação motora,
diminuição sensitiva, descontrole sono e até uma espécie de coma,
denominado coma alcoólico. O álcool pode deixar também o consumidor
com o rosto vermelho, causar dor de cabeça, dificuldade de falar e mal-
estar seguido de vômito.
46
Nesse encontro participaram oito adolescentes, e foi possível observar uma
grande atenção durante toda a palestra, apesar da desconfiança que existiam em
alguns dos adolescentes, talvez pela vergonha ou até mesmo pela culpa em fazer
parte desse quadro de usuários, pois a discussão estava bastante interessante e
dentro da realidade atual.
Ao final da palestra, podemos perceber que os adolescentes sentiam vontade
de fazer perguntas ao psicólogo, mas, talvez, por motivos de timidez ou por está
perante a alguém, que até então não conheciam, não conseguiam expor suas
dúvidas, com medo talvez que julgássemos por ser um usuário no presente ou ter
sido no passado. Percebendo essa frustração nos adolescentes, nós, como
estagiárias, resolvemos fazer algumas perguntas ao psicólogo, ali presente, que
achamos que poderiam servir de dúvidas dos adolescentes, como vemos a seguir:
• O que o consumo excessivo do álcool pode causar?
Psicólogo: O consumo contínuo de álcool traz conseqüências graves,
como doenças em todos os órgãos do corpo humano, em especial o
estômago, o fígado, o coração e o cérebro.
• Qual a conseqüência que a maconha causa quando usada por um longo
tempo?
Psicólogo: Em um longo prazo, o consumo de maconha pode reduzir a
capacidade de aprendizado e memorização, além de passar a apresentar
uma falta de motivação para desempenhar as tarefas mais simples do
cotidiano.
• Quais os sintomas que podemos perceber, em um indivíduo usuário de
drogas?
Psicólogo: Mudanças bruscas no comportamento, queda do rendimento
escolar ou abandono dos estudos, queda na qualidade do trabalho,
inquietação, irritabilidade, insônia ou, ao contrário, depressão e
sonolência, uso de óculos escuros mesmo sem excesso de luz, camisas
de manga longa mesmo no calor, uso de sons em alto volume, troca do
dia pela noite, síndrome emotivacional.
Essas foram algumas das perguntas feitas ao psicólogo palestrante, na
tentativa de ajuda aos adolescentes do Espaço Vivência, a ter uma idéia mais
precisa quantos aos malefícios do uso das drogas. Observamos que os
adolescentes ficaram bem atentos a todas as perguntas e respostas.
47
No terceiro encontro do cronograma, mês de maio, conseguimos expor um
vídeo com o filme: Eu, Cristiane F. Drogada e Prostituída. O filme mostrava que
Christiane era uma jovem alemã, a qual descobriu o tenebroso mundo das drogas
com 13 anos em “baladinhas” inocentes aos olhos dos pais. O grupo com quem ela
andava eram usuários de drogas, e ela para ser aceita por esse grupo passou a
consumir heroína, e posteriormente passou também a se prostituir. Christiane era
procurada por homens casados, o que demonstrava o nível da situação em que a
adolescente encontrava-se inserida. O seu namorado, também se prostituía, a fim
de conseguir dinheiro para poder se “picar”. Esse fato demonstra que a prostituição
infantil, continua não sendo exclusividade do Brasil, já existia na década 70, na
Alemanha. Enfim, essa era a vida de uma criança de 13 anos, se drogando e se
prostituindo em decorrência de um vício.
Nesse encontro, participaram sete adolescentes, e durante toda a exposição
do filme percebemos que, por se tratar de fatos reais inerentes a vidas deles, houve
toda uma empolgação. Não se ouvia conversas e nem descontrações, pois as
atenções estavam todas voltadas para o filme. No final da exposição, foi possível
fazer uma roda de conversas e discussões sobre o tema abordado. Passamos a
informação sobre a real situação de Christiane (personagem do filme), ainda hoje
viva, com seus 43 anos e diz não se “picar” mais. Na realidade, a nossa intenção ao
passar esse tipo de filme, foi para fazê-los refletir sobre a nocividade do uso das
drogas em suas vidas e ao mesmo tempo mostrar que é possível sim, ultrapassar
esse grande obstáculo que é o mundo das drogas, basta determinação e força de
vontade.
No quarto encontro, ainda no mês de maio, foi realizada uma festinha em
comemoração ao dia das mães. Foi um momento muito harmonioso e bastante
participativo, pois foi o momento de aproveitar o encontro desses adolescentes com
suas respectivas mães, no intuito de mostrar a eles a verdadeira força, em que os
mesmos devem se inspirar, para conseguirem seus verdadeiros objetivos na vida. E
um deles é estimular seus filhos a se afastar do uso das drogas. Tentamos discutir
um pouco sobre o comportamento de cada um desses adolescentes, e as possíveis
formas de enfrentar os problemas recorrentes em suas vidas. Com isso,
aproveitamos o momento para realizar uma reflexão acerca do problema enfrentado
por eles, e tentamos passar um pouco de como é possível a família tentar ajuda-los
a se livrarem das drogas; incentivando os mesmos a estudarem; praticarem
48
esportes, fazer cursos profissionalizantes entre outras atividades, e especialmente
mostrar a importância do afeto para com esses adolescentes em seus lares, pois a
grande maioria necessita de apenas uma palavra de carinho.
No sexto momento, mês de junho, foi um dos mais interessantes, pois
conseguimos com a ajuda do psicólogo Francisco, que já havia apresentado uma
palestra no Espaço Vivência, levar esses adolescentes a ver de perto a dura
realidade de outros adolescentes do Centro de Recuperação ao usuário de drogas,
Desafio Jovem de Natal, no qual estão tentando se livrar dessas substâncias
entorpecentes. Essa foi a nossa última atividade realizada.
Nessa instituição, os adolescentes buscam esse objetivo realizando
atividades de estímulos, em que os mesmo ocupam seu tempo ocioso com o cultivo
de horta, atividades de mosaico, artesanato, leitura de livros, prática religiosa, cursos
profissionalizantes dentro da instituição, entre outras atividades. Dessa forma,
buscamos mostrar a eles como é doloroso o tratamento para livra-se das drogas, é
preciso muita força, coragem, estímulo, e acima de tudo fé em Deus.
Durante todo o passeio de campo, percebemos que alguns dos adolescentes
ficaram bastante chocados diante da situação vivida pelos outros jovens dentro
daquela instituição, e também muito impressionados com a realidade e com a
grande dificuldade de livrar-se das drogas, “mas que não é algo impossível”, relatou
um deles. Essa percepção, já representa um ponto bastante positivo desse
encontro.
Ao final do nosso estágio no Espaço Vivência, realizamos uma comemoração
de agradecimento, não somente aos adolescentes, mas também a todos os
profissionais que fazem essa instituição.
49
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
No primeiro momento do estágio dentro da instituição Espaço Vivência, foi
possível ter uma visão da realidade, na qual se encontra inserida a unidade, a
composição da sua estrutura organizacional, e ainda, os limites e dificuldades que
se expressam como obstáculos na consecução dos objetivos institucionais.
A experiência vivenciada com os adolescentes do Espaço Vivência, nos
oportunizou a conhecer e refletir sobre a problemática dos adolescentes em conflito
com a lei e a relação que, infelizmente, muitos deles possuem com o mundo das
drogas.
O nosso principal objetivo da intervenção foi contribuir com a instituição no
desenvolvimento do trabalho de prevenção direcionada ao público especificado,
fazendo continuamente com os adolescentes uma reflexão sobre os malefícios do
uso das drogas, via atividades sócio-educativas que, conforme já detalhamos, se
deu a partir de dinâmicas, oficinas, mostra de vídeos, passeio de campo e palestras.
Tais atividades puderam proporcionar aos adolescentes uma reflexão acerca do seu
problema vivenciado, pois a sua participação nas discussões sobre drogas em muito
contribuiu para a tomada de decisão, ou seja, para o exercício da iniciativa entre os
adolescentes sobre o desenvolvimento da cultura dos “malefícios do uso das
drogas”.
Consideramos então, a realização desse trabalho interventivo, muito
gratificante, pois passamos a entender que podemos fazer algo de importante para
contribuir na mudança de uma realidade, apesar dos obstáculos passados durante o
percurso. Contudo, foi muito prazeroso trabalhar com esses adolescentes
cumpridores de medidas de liberdade assistida e os funcionários da instituição
Espaço Vivência.
Em suma, a maior contribuição durante todo o processo de estágio dentro da
instituição, foi a troca de experiências, ao passar para os adolescentes o
conhecimento aprendido na teoria dentro da academia, e receber deles a força na
busca da auto-ajuda, na tentativa do retorno ao convívio social.
50
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51
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54
APÊNDICE A – Cronograma
Atividades Fevereiro Março Abril Maio Junho
Reunião para apresentação do
projeto.
X
Palestras educativas com um
profissional especializado na área de
drogas.
X
Reflexões sobre auto-estima.
X
X
X
Dinâmica de grupo com o intuito de
promover reflexão e interação entre
os membros do projeto.
X
X
Apresentação de filmes que
interpretem a realidade vivenciada e
aborde o tema proposto.
X
Visita de campo.
X
Monitoramento e avaliação.
X
X
X
X
X
Elaboração e entrega do relatório final
de estágio as instituições envolvidas
UnP e Espaço Vivência.
X