universidade tuiuti do paranÁ alex sandro jose de...

40
UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ ALEX SANDRO JOSE DE SOUZA A MÚSICA NO DIREITO AUTORAL CURITIBA 2014

Upload: dangliem

Post on 07-Nov-2018

212 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

ALEX SANDRO JOSE DE SOUZA

A MÚSICA NO DIREITO AUTORAL

CURITIBA

2014

A MÚSICA NO DIREITO AUTORAL

CURITIBA

2014

ALEX SANDRO JOSÉ DE SOUZA

A MÚSICA NO DIREITO AUTORAL

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná, com o intuito da obtenção do Título de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. Dr. Sérgio Said Staut Junior.

CURITIBA

2014

TERMO DE APROVAÇÃO

ALEX SANDRO JOSÉ DE SOUZA

A MÚSICA NO DIREITO AUTORAL

Esta monografia foi julgada e aprovada parta a obtenção do grau de Bacharel em Direito no curso da Faculdade de Ciências Jurídicas do Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba ________ de _________________de 2014.

_________________________

Curso de Direito

Universidade Tuiuti do Paraná.

_________________________

Orientador: Prof. Dr. Sérgio Said Staut Júnior

_________________________ Prof.

_________________________ Prof.

AGRADECIMENTOS

A Deus em primeiro lugar, que nos da força, esperança, saúde e

sabedoria para trilharmos o melhor caminho em nossas vidas.

A minha mãe Dona Lucia pessoa que tenho como referência de vida,

que mesmo nas adversidades esteve ao meu lado e de meu irmão, mostrando

lealdade à família, e acima de tudo um exemplo de batalha e honestidade.

A minha namorada Dra. Giovanna Sartório, minha sempre incentivadora,

comigo todas as horas, e que acompanhou de perto todo meu desenvolvimento

enquanto acadêmico de direito, e eu podia notar nos seus olhos, nos seus

carinhos e no seu sorriso o orgulho que sentia dessa minha trajetória.

Aos amigos e colegas que ganhei nesse período de faculdade.

E por fim aos professores, que passaram seus conhecimentos, seu

apoio, e que com certeza contribuem e muito para formar não apenas

Bacharéis, mais sim melhores cidadãos.

RESUMO

Este trabalho trata do Direito Autoral na música num aspecto histórico, conceitual, como também numa perspectiva Constitucional, de modo a observar sua evolução, como a criação da lei 9610/98, e como o Direito do Autor pode ser violado. Também abordara de que forma se deu a criação da gestão coletiva, como é feita a arrecadação e a distribuição unificada feita pelo ECAD (Escritório Central de arrecadação e Distribuição). E por fim o que muda em relação a gestão coletiva com o advento da Lei 12.853/13. Palavras-chave: Direito Autoral. Música. Plágio. Gestão Coletiva.

Sumário

INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 8

I ASPECTOS GERAIS DOS DIREITOS AUTORAIS ................................................ 10

1.1 CONCEITO ......................................................................................................... 10

1.2 BREVE HISTÓRICO ........................................................................................... 11

1.3 . DIREITO AUTORAL NO BRASIL ...................................................................... 14

1.4 A EVOLUÇÃO DO DIREITO DO AUTOR NUM VIÉS CONSTITUCIONAL ........ 16

1.5 DO DOMÍNÍO PÚBLICO ..................................................................................... 20

1.6 DOMÍNIO PÚBLICO REMUNERADO ................................................................ 22

1.7 DA DUALIDADE DOS DIREITOS AUTORAIS ................................................... 23

II DO DIREITO MUSICAL ........................................................................................ 26

2.1 DAS OBRAS MUSICAIS ..................................................................................... 27

2.2 VIOLAÇÃO DO DIREITO AUTORAL NAS OBRAS MUSICAIS ......................... 30

2.2.1 Contrafação ...................................................................................................... 30

2.2.2 Plágio ............................................................................................................... 31

2.3 DA GESTÃO COLETIVA DE DIREITOS AUTORAIS ......................................... 33

2.3.1 ECAD - Escritório Central de Arrecadação e Distribuição ................................ 33

2.3.2 Gestão Coletiva - Lei 12.853/13 ....................................................................... 35

3. CONCLUSÃO ....................................................................................................... 38

REFERÊNCIAS......................................................................................................... 39

8

INTRODUÇÃO

O presente trabalho pretende discutir a delicada questão dos direitos autorais,

no campo da musica, na esteira das transformações nas práticas de circulação e

consumo, bem como a necessidade de uma legislação mais abrangente que

acompanhe essa mudança principalmente no que tange ao titular originário, o autor.

O primeiro capítulo abordará o conceito de direito autoral, na forma legal e

doutrinária, no tocante à sua evolução, e também como foi protegido ao decorrer da

história por nossas constituições.

Para a legislação brasileira, o criador de toda obra intelectual deve ser

recompensado pelo uso dessa produção.

Ainda no primeiro capitulo, uma breve analise direito do autor, nesse ínterim

entra a figura do domínio publico, e ainda a característica presente da dualidade dos

direitos autorais sendo eles morais e patrimoniais.

As obras estão protegidas desde o momento da criação e, por isso, seu

criador não é obrigado a registra-la, embora isso seja possível. Os direitos autorais

são importantes para todas as etapas da cultura, justamente por significarem uma

economia gigantesca em circulação: criação, produção, distribuição, consumo e

aproveitamento dos bens culturais.

O segundo capitulo trata do direito autoral na musica, de como este direito

pode ser violado, passando, ainda que sucintamente, mencionar alguns tipos de

violação deste direito, como por exemplo o plágio e a contrafação.

Na tratativa da parte musical em direito autoral, ganha destaque a figura do

compositor, o titular originário da matéria, que por sua vez, não havendo a

possibilidade de gerir economicamente seus direitos por uma questão da dimensão

que pode atingir, fez necessária a criação de órgãos como o ECAD – Escritório

Central de Arrecadação de Direitos, com atuação direta em casas noturnas, eventos

populares, meios de comunicação (rádio e televisão) e demais locais de exibição

musical, desta forma unificando a gestão coletiva dos Direitos Autorais.

Os arquivos do ECAD - Escritório Central de Arrecadação, são alimentados

pelos compositores, ligados a diversas instituições de cadastros de letra e música,

como exemplo a ABRAMUS – Associação Brasileira de Música.

9

Atualmente, o cenário musical aponta dificuldades de adaptação às novas

regras. Paralelamente a isso, a evolução tecnológica e o acesso a musica tornou-se

muito mais prático e democrático, ao passo que, a Internet é a ferramenta mais

usada para adquirir, ou ouvir qualquer tipo de música. Neste sentido, tal

democratização de acesso às obras de propriedade intelectual é vista de forma

negativa para arrecadação e distribuição dos direitos autorais aos compositores.

Recentemente entra em vigor a nova lei n° 12.853/13, que trata da gestão

coletiva, e com isso uma gama de discussões a respeito da sua Constitucionalidade,

d um lado as associações do outro o Ministério da Cultura e os interessados na

sociedade.

A visível crise da indústria fonográfica traduz de certa forma o cenário atual

que vive a arrecadação dos direitos autorais, observada a emergência de se criar

novas regras para tutelar esses direitos, a nova lei veio com um intuito de buscar a

transparência dos atos da gestão coletiva para equilibrar a relação com os autores.

10

I ASPECTOS GERAIS DOS DIREITOS AUTORAIS

1.1 CONCEITO

O direito autoral faz parte dos Direitos da Propriedade Intelectual e está

regulamentado, no Brasil, pela Lei 9.610/98, recentemente editada pela Lei

12853/13.

Não há definição expressa em lei no tocante ao conceito de Direito Autoral ao

passo que Otávio Afonso conceitua como:

O direito que o criador de obra intelectual tem de gozar dos produtos resultantes da reprodução, ou da representação de suas criações e outros como o conjunto de normas que estabelecem os direitos e deveres sobre as obras do espírito correspondentes a quem tenham criado ou sejam seus titulares, independentemente dos direitos e deveres de outras pessoas ou entidades (2009, p. 10).

Direito Autoral, é, por assim dizer, um conjunto de prerrogativas que visa a

proteção dos direitos do autor, daqueles ligados a ele, de forma a resguardar seus

direitos patrimoniais e morais.

Neste mesmo sentido entende Antônio Chaves, conforme abaixo transcrito:

As diretrizes doutrinárias podem ser desdobradas nos seguintes tópicos: o direito de autor é um direito de coletividade; é um direito real de propriedade; é uma emanação do direito de personalidade; é um direito especial de propriedade, tendo por objeto um valor imaterial; é um direito sui generis, que sob essa perspectiva, abarca diversos elementos do direito público e privado; é um direito de clientela; é um direito dúplice de caráter real pessoal-patrimonial, essa teoria está atrelada ao fato do direito do autor ser composto por direito moral e direito patrimonial. (1987, p.13)

Ainda, o doutrinador Carlos Alberto Bittar cita que o Direito Autoral "é o ramo

do Direito Privado que regula as relações jurídicas advindas da criação e utilização

econômica de obras intelectuais estéticas e compreendidas na literatura, nas artes e

na ciência". (BITTAR, 2003, p.08)

11

1.2 BREVE HISTÓRICO

O conhecimento sobre a origem do Direito Autoral é indispensável para

entendermos sua evolução, que remota aos homens da caverna.

Em estudo publicado nos Anais do VI Congresso de Direito Autoral e

Interesse Público, constam comentários sobre o surgimento do tema:

A origem remota do direito autoral pode ser atribuída à época em que os seres humanos desenhavam nas paredes das cavernas situações do seu cotidiano, em que a ideia advinda do seu intelecto era materializada e reproduzida em uma base concreta. (BRAUN e PELLEGRINI, 2013, p.114)

De acordo com Eduardo Pimenta, os jurisconsultos romanos, “pais da ciência

jurídica”, não reconheciam a possibilidade de um autor reclamar a propriedade dos

produtos de sua inteligência. (PIMENTA, 1994, p. 18 e 19)

A primeira contraprestação pecuniária conhecida como pagamento de uma

criação intelectual foi para o poeta Gringoire que por encomenda escreveu uma obra

sobre a vida de Monseigneur Sait-loys de France para a Confraria dos Carpinteiros

de Paris. (SANTIAGO in PIMENTA, 1994, p.13)

Já a primeira legislação sobre o tema que se tem notícia é do século XVIII no

ano de 1710 na Inglaterra, em que a Rainha Ana, promulgou o Act Anne 8 c 19 que

se transformou no Copyright Act, no qual tratou o direito de cópia como mecanismo

efetivo de proteção à criação intelectual e mais tarde, juntamente ao Parlamento

Inglês complementou o Estatuto, encorajando os autores a criação de novas obras,

diante do incentivo a cultura e da possibilidade de colherem os frutos advindos de

suas criações por um período de 14 anos.

O doutrinador Guilherme Carboni discorre sobre o tema, citando a lei foi

sancionada para "encorajar a ciência e garantir a propriedade dos livros àqueles que

são seus legítimos proprietários” e “para encorajar os homens instruídos a compor e

12

escrever obras úteis”, através do reconhecimento de um direito exclusivo de

reprodução de obras por eles criadas”. (CARBONI, 2003, p.39)

Anteriormente a criação desta medida, os lucros das obras publicadas eram

fundamentalmente dos editores e a regulamentação reconheceu os direitos dos

autores.

No mesmo Século, nos Estados Unidos, com influências no Estatuto da

Rainha Ana da Inglaterra, criou-se o Copyright Act americano, mas como uma ideia

diversa aquela original pois nasceu como os princípios da Revolução Francesa -

Liberdade, Igualdade e Fraternidade - sendo agora, o autor titular pleno dos direitos

autorais.

Com a visível propagação das obras intelectuais, inclusive no âmbito

internacional, tornava-se mister estabelecer tratados que norteassem as

regulamentações dos direitos autorais nas nações signatárias, a fim de, forma

isonômica, proporcionar ao autor estrangeiro as mesmas garantias de proteção

concedidas pelas legislações nacionais aos autores dos próprios países,

estabelecendo a reciprocidade no tratamento jurídico da autoria. Surge então, como

grande marco internacional do direito autoral, a Convenção de Berna, descrita por

Menezes, da seguinte forma:

Em 1886, a realização da Convenção de Berrna, na Suiça, seria o grande marco internacional do Direito de Autor. Diversas nações estabeleciam ali diretrizes de aplicação das normas autorais em seus ordenamentos jurídicos, comprometendo-se a refletir, em suas legislações nacionais, as garantias de proteção aos autores naquele momento pactuadas. (MENEZES, 2007,p.24).

Enquanto o velho continente, assim como a América do Norte tratava do tema

Direito Autoral com grande veemência, gerando inúmeras legislações, e

posteriormente Convenções, no Brasil, mesmo após a declaração da independência,

manteve-se o mesmo sistema de privilégios a editoras, que só seria extinto com a

Proclamação da República.

13

Desmistificando o método tradicional de se contar a História do Direito e

especialmente o Direito Autoral, Sérgio Said Staut Júnior, aborda que o discurso

tradicional dos direitos autorais faz com que o Direito seja algo apartado da

realidade:

Por essa vertente da História do direito, o discurso tradicional dos direitos autorais reforça a ideai de que toda a regulação social das ideias em sociedade é realizada apenas pelo discurso jurídico estatal.

(...) Por exemplo, não se reconhece nenhum pluralismo de direitos autorais. O historicismo em matéria de uma lei num determinado período histórico, a sua eficácia social, a contextualização das lições dos grandes doutores num dado ambiente, a existência de outras ordens não jurídicas de regulação numa determinada sociedade etc. (STAUT JÚNIOR. 2006. p. 111 e 112)

Anteriormente a primeira legislação sobre o tema, no século XVIII, o regime

Francês decidia quais livros poderiam ser impressos em um controle da !burocracia

real". O controle também era exercido sobre os autores, editores, livreiros e leitores.

Com afinco, o controle e a punição realmente existira, mesmo entre 1659 até

a Revolução Francesa, quando aproximadamente mil infratores foram enviados À

Bastilha em virtude de crimes relativos ao ramo editoria. (ROCHE in STAUT. 2006.

p. 117)

A regulamentação, portanto, dos direitos autorais, foi fruto da luta dos autores

por seus direitos e para Chartier, "é este caminho tortuoso que leva a invenção do

direito do autor" (CHARTIER in STAUT. 2006, p. 112)

Neste sentido, preciosas são as palavras de Staut que destaca que "apesar

do discurso tradicional dos direitos autorais sustentar a legitimidade do novo sistema

na luta dos autores por seus direitos, parece que a modificarão no sistema jurídico

de regulação da atividade autoral se deu muito mais pela adequação ao novo modo

de produção, em que os detentores do capital (os editores) e não os detentores da

criatividade (os autores) ocuparam o centro da vida política, jurídica e econômica da

França pós-revolucionária". (STAUT. 2006, 122 e 123)

14

1.3 . DIREITO AUTORAL NO BRASIL

A história brasileira registra que durante todo o período colonial, Portugal

enquanto colonizadora proibia qualquer manifestação cultural trazida da colônia,

justificando o desinteresse pelo assunto nesse período.

Mesmo após a independência do Brasil, o regime imperial de D. Pedro II

baseava-se na exclusividade de exploração econômica das obras autorais no antigo

sistema de privilégios. Assevera a doutrinadora Elisângela Dia Menezes que:

Só tinham, portanto, direito sobre as obras, os editores e impressores, mesmo assim mediante outorga política de prerrogativas. Assim sendo, a Constituição do Império de 1824, enquanto a primeira Constituição brasileira, só protegia os direitos do inventor sobre a Propriedade Industrial, não trazendo qualquer referência ao Direito do Autor". (MENEZES, 2007, p.25)

Foi com a criação dos primeiros cursos jurídicos em São Paulo-SP e Olinda-

PE, é que houve a primeira manifestação de proteção aos direitos autorais no Brasil

11 de agosto de 1827 - onde eram assegurados aos professores, os direitos sobre

suas obras.

No compêndio formado pelos legisladores, restou definido aos professores

das faculdades de Direito, o privilégio de gozar dos direitos de suas obras pelo prazo

de 10 (dez) anos

Porém, somente os professores das faculdades de direito de Olinda e de São

Paulo usar do direito sobre a reprodução da obra por dez anos. Os demais autores

brasileiros não tinham este direito, configurando um verdadeiro privilégio, este

concedido por outorga política.

Constam ainda registros, que em 1830, no Código Criminal do Império,

normas estabelecendo penas para aqueles que utilizassem obra de autor ainda vivo,

ou antes de dez anos após sua morte, se o autor tivesse deixado herdeiro. Ainda na

esfera Criminal, em 1890, o Código Penal da República tratou especificamente dos

Direitos Autorais e das punições dos crimes de contrafação e plágio.

15

Somente na Constituição de 1891 é que o direito autoral foi tratado de forma

mais específica, e com a redação conferida pela Emenda Constitucional de 03 de

setembro de 1926, restou definido que direito exclusivo aos autores sobre a

reprodução de suas obras literárias e artísticas.

A lei 496/1898, denominada Medeiros de Albuquerque em homenagem ao

seu autor, nos seus 28 artigos, define a obra literária, sobre a caracterização e

garantia dos direitos autorais. Mais tarde esta lei seria revogada pelo Código Civil de

1916, subdividindo de forma especifica o seu texto, sob o título “Da propriedade

literária, cientifica e artística” para abordar as questões relacionadas aos direitos

autorais, conforme expõe a multicitada autora Elisângela Menezes:

Alguns anos mais tarde, a Lei n.496 seria revogada pelo nascente Código Civil. Datada de 1916, a nova lei civilista regulava o instituto autoral nos artigos 649 a 673. Assim permaneceria dali por adiante o Direito do Autor, dentro do campo do próprio Direito Civil, sendo modificado constantemente por leis extravagantes, até que fosse chegada a época de renovação dos códigos, quando se decidiu editar uma lei especifica para regular a matéria. (MENEZES, 2007, p.26).

No Código Civil de 1916 a criação intelectual foi trazida nos artigos 649 a 673,

sob a inscrição "Da propriedade literária, cientifica e artística". (VENOSA. 2005.

p.631)

Em 1973, o General Emilio Garrastazu Médici, então Presidente da

República, sanciona a Lei n° 5.988, criando uma nova legislação ordinária que

tratava especificamente sobre os direitos autorais, que posteriormente foi substituída

pela Lei 9.610/1998.

Houve um lapso de quase cem anos para o tratamento autônomo da matéria

desde a Lei Medeiros, o que acabou por atrasar o desenvolvimento jurisprudencial

da matéria (MANSO, 1980, p.18).

A Constituição de 1988 foi um marco importante para o direito, e que trouxe

grandes benefícios elevando a matéria de Direitos Autorais a um nível

Constitucional, com normas que o asseguram, no artigo 5°, incisos XVII e XVIII.

16

1.4 A EVOLUÇÃO DO DIREITO DO AUTOR NUM VIÉS CONSTITUCIONAL

Em 1824, a Carta Imperial reconhecia direito exclusivo do autor da obra,

porém de forma temporária sobre suas produções, conforme legislava o artigo 179,

XXVI em que os inventores terão a propriedade das suas descobertas, ou das suas

produções. A Lei lhes assegurava um privilégio exclusivo temporário, ou lhes

remunerará em ressarcimento da perda, que hajam de sofrer pela vulgarização.

A época era propícia para a matéria - proteção da obra intelectual -, pois em

1886 foi assinada a Convenção de Berna, da qual o Brasil é signatário e então, logo

após a Constituição de 1891, teceu breves normas sobre o tema na Seção II -

Declaração de Direitos, reconhecendo como direito real os direitos autorais,

classificando-os como Direito de Propriedade.

Em cristalina influência do liberalismo norte-americano do Copyright Act, o

texto constitucional brasileiro ampliou a proteção a propriedade intelectual no artigo

72 e especificamente pelo §26, veja-se:

Artigo 72. A Constituição assegura a brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes: §26. Aos autores de obras literárias e artísticas é garantido o direito de reproduzi-las, pela imprensa ou por qualquer outro meio mecânico. Os herdeiros dos autores gozarão desse direito pelo tempo que a lei determinar.

A Constituição de 1926 entendia que os direitos autorais eram uma

propriedade, poderiam ser transmitidos e utilizados por terceiros, deixando, portanto,

de ser uso exclusivo dos autores, e continuava a garantir tal direito aos herdeiros.

Já a Constituição de 1934 foi pioneira em reconhecer direitos autorais em

obras científicas, conforme se depreende do artigo 113, XX:

Artigo 113, XX - Aos autores de obras literárias, artísticas e científicas é assegurado o direito exclusivo de produzi-Ias. Esse direito transmitir-se-á aos seus herdeiros pelo tempo que a lei determinar.

17

A Constituição de 1937 despiu os direitos autorais seu cunho de Direito de

Propriedade, por se tratar de uma Constituição em que o Estado intitulava-se bem

comum de todos os cidadãos, pelo próprio período político em que vivia o Brasil.

O Estado paternalista dava subsídios para a criação e o desenvolvimento

intelectual, deixando a competência de lei ordinária para fixação dos limites, do

conteúdo e a própria essência da propriedade literária, artística e cientifica,

estabelecendo inovações no setor educacional da arte e da ciência:

Artigo 128 - A arte, a ciência e o ensino são livres à iniciativa individual e a de associações ou pessoas coletivas públicas e particulares.

É dever do Estado contribuir, direta e indiretamente, para o estímulo e

desenvolvimento de umas e de outro, favorecendo ou fundando instituições

artísticas, científicas e de ensino.

A Constituição de 1946 retoma os preceitos firmados nas constituições

anteriores a 1937 e afirmou, no entanto que nenhum imposto oneraria os direitos do

autor:

Artigo 203 - Nenhum imposto gravará diretamente os direitos de autor, nem a remuneração de professores e jornalistas.

A Constituição de 1967 expandiu as prerrogativas do autor ao usar o termo

“utilizá-las” e não apenas reproduzi-las:

Artigo 150 - A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pais a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: § 25 - Aos autores de obras literárias, artísticas e científicas pertence o direito exclusivo de utilizá-las. Esse direito é transmissível por herança, pelo tempo que a lei fixar.

A Constituição de 1969 manteve o mesmo texto da anterior e em 1973, a Lei

nº 5.988 em seu artigo 17, facultou ao autor o registro de sua obra intelectual como

meio identificador da sua autoria, conforme transcrição do texto abaixo:

18

Artigo 17. Para segurança de seus direitos, o autor da obra intelectual poderá registra-Ia, conforme sua natureza, na Biblioteca Nacional, na Escola de Música, na Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro, no Instituto Nacional do Cinema, ou no Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia.

A Constituição de 1988 muda a terminologia, ao invés de “assegurado”,

passou a ser garantido, talvez por ter sido elaborado de uma forma livre e

democrática, ficando evidente a liberdade de expressão criativa, sem censura, não

atingidas plenamente nas Constituições anteriores. Estando também incluso o direito

de utilização econômica, que permite o autor o recebimento dos proventos pela

utilização de obra intelectual.

Quanto à tutela do direito autoral, a Carta Magna em seu artigo 5° incisos IV

e IX, consagra a liberdade de manifestação do pensamento, vedando-se o

anonimato, bem como liberdade de expressão da atividade intelectual, artística,

cientifica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.

No tocante à propriedade intelectual, o citado artigo confere tutela nos seguintes

termos:

XXVII - aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar; XXVIII - são assegurados, nos termos da lei: a) a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução da imagem e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas; b) o direito de fiscalização do aproveitamento econômico das obras que criarem ou de que participarem aos criadores, aos intérpretes e às respectivas representações sindicais e associativas; XXIX - a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País;

Em conformidade com os incisos IX e XXVII do artigo 5°, observa-se que ao

autor é conferido o direito exclusivo de utilizar, publicar e reproduzir suas obras

literárias, artísticas, cientificas e de comunicação, sendo que o direito exclusivo

também é transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar. As normas

19

constitucionais reconhecem o direito de propriedade intelectual em caráter vitalício,

compreendendo direitos morais e patrimoniais.

Para Allan Rocha de Souza, o inciso IX do artigo 5º busca proteger o

indivíduo e sua obra, como manifestação de seu íntimo, a criação intelectual,

artística e científica. (SOUZA, 2006, p. 134)

O citado estudioso assevera ainda que a "Carta Magna não possui o sentido

individual e exclusivo outrora, após ser considerada como um direito subjetivo do

proprietário no último século, passou a ter uma função eminentemente social, tanto é

que a própria Constituição, após a disposição de proteção da propriedade privada no

inciso XXIII, do mesmo artigo 5º, estabelece que a propriedade atenderá a sua

função social". (SOUZA, 2006, p. 138)

Isto porque o Direito Autoral está afeto não apenas ao autor e editoras, mas

também atinge àqueles a quem a obra é distribuída e veiculada e a partir desta

ideia, "o proprietário já não desfruta de uma quase antropomórfica posição jurídica

de absoluta soberania, situação concebida no passado como relação entre sujeito e

objeto". (TEPEDINO in SOUZA, 2006, p. 139)

Movimento atual no Brasil é a constitucionalização do Direito, surgido após a

promulgação da Constituição de 1988, num movimento em que inúmeros institutos

do Direito foram ajustando-se aos fundamentos constitucionais.

Para BRAUN e PELEGRINI a constitucionalização do direito do autor "é um

fenômeno reflexo da adoção de um sistema civilista fechado, desencadeado pelo

fenômeno de Codificação, pós Revolução Francesa". (BRAUN e PELEGRINI, 2013.

p. 122)

Vê-se, portanto, que é fundamental a proteção constitucional do Direito do

Autor, porquanto sua ligação pessoal com a obra, "a atividade intelectual é algo

interno ou intransitivo do homem, analogamente ao sentimento, à paixão, à

consciência, à crença, à fé. Todas essas atividades pertencem ao forun internum".

(CRETELLA JÚNIOR in SOUZA, 2006, p. 134)

20

1.5 DO DOMÍNÍO PÚBLICO

O domínio público é uma expressão tradicional usada para elencar obras que

sofreram esgotamento do prazo de proteção ou outros efeitos estabelecidos em lei.

De acordo com o artigo 41 da Lei 9610/1998 " Os direitos patrimoniais do

autor perduram por setenta anos contados de 1° de janeiro do ano subseqüente ao

de seu falecimento, obedecida a ordem sucessória da lei civil."

Importante ainda citar, que quando houver co-autoria, o prazo do artigo passa

a contar apenas quando do falecimento do ultimo dos co-autores. Decorrido este

prazo, as obras pertencerão ao domínio público.

Importante citar que o termo "Domínio Público" sobre as obras, não

representa nenhum domínio ou direito de propriedade, mas simplesmente uma

liberdade do público.

Com relação a norma anterior, José de Oliveira Ascensão aduz que "a noção

primitiva de domínio público era a situação das obras que se tornavam res

communes omnium, de tal modo poderiam ser utilizadas livremente por qualquer um,

com finalidade de lucro ou sem ela" (ASCENSÃO, 1997. P. 353)

As obras em domínio público não carecem de prévia autorização para sua

adaptação, tradução, arranjo ou orquestração por quem quer que tenha interesse

em fazê-la. Contudo, esta obra uma vez adaptada, por exemplo, o resultado final

dessa adaptação – assim considerado agora um obra nova – sua adaptação não

poderá ser utilizada sem sua autorização expressa do autor da adaptação, porém, o

autor da adaptação da obra original, não poderá se opor a novas adaptações.

Para tutelar o domínio público, com compete ao Estado a defesa da

integridade e autoria da obra caída em domínio público, conforme ensina o artigo 24

§2º da multicitada Lei 9610/1998.

Nota-se que aqui o interessado em anotar ou comentar uma obra original, não

depende de prévia autorização para fazê-lo, contudo não poderá reproduzir o texto

original sem a devida autorização.

21

Cumpre também citar que além das obras em relação às quais decorreu o

prazo de proteção aos direitos patrimoniais, pertencem ao domínio público as obras

elencadas no artigo 45:

I – as de autores falecidos que não tenham deixado sucessores; II – as de autor desconhecido, ressalvada a proteção legal aos conhecimentos étnicos e tradicionais.

Se o criador de uma obra intelectual que tenha proteção legal falecer, e por

ventura não deixar sucessores, esta obra automaticamente cai em domínio publico,

da mesma forma a obra anônima, respeitando suas ressalvas.

Para Antonio Chaves, o domínio publico consiste no possível aproveitamento

econômico de uma obra artística ou literária, por qualquer pessoa, desde que

vencido o período de proteção, concedidos ao autor, sucessores ou cessionários.

Chaves menciona que o objetivo do legislador foi possibilitar, de forma mais ampla

possível, a reprodução ou execução das mesmas obras, a preço inferior, com o

escopo de facilitar a divulgação, e difundir, a arte e a cultura. Não obstante, Antonio

Chaves ressalta ainda, que ”raramente encontra-se qualquer diferença de preço

entre obras que pagam e as que não pagam, demonstrando que o domínio publico

esta nas mãos de editores, tornando-se um inconveniente, em muitos casos, no que

diz respeito a alterações das obras, que nem sempre mantém características

originais". (CHAVES, 1977. p.49)

Para José de Oliveira Ascensão, a obra cai no domínio publico em

consequência do esgotamento da proteção, ou por efeitos de outras circunstancias

estabelecidas na lei. Aduz também Ascensão, que essa expressão não é a mais

apropriada, pois cria confusão com o regime particular de coisas do interesse

público, tradicionalmente qualificadas como domínio público. Finalmente observa

que a expressão representa apenas uma liberdade publica e não uma propriedade

ou domínio. (ASCENSÃO,1997. p. 352-353.).

Hely Lopes Meirelles, possui uma visão clássica de direito público, no tocante

ao domínio publico, e assim o define:

22

“A expressão domínio publico ora significa o poder que o Estado exerce sobre os bens próprios e alheios, ora designa a condição desses bens.”

Por fim, como regra, se, por exemplo, uma obra antes protegida cai em

domínio público pelo término do prazo de proteção, jamais voltará a integrar o

elenco das criações intelectuais protegidas. Contudo é muito importante

compreender o art. 122, da Lei 9610/98, para evitar um conflito da lei no tempo.

Como mencionado anteriormente o domínio publico em relação à obra,

representa apenas uma liberdade de uso do publico, e não um domínio. Todavia

essa liberdade fora tolhida, assim aduz José de Oliveira Ascensão:

Mas essa liberdade vem de novo a ser restringida se implantar o domínio público remunerado. A obra caída no domínio publico deixaria de ser de utilização livre e gratuita. Por isso temos de distinguir hoje, da obra não protegida, a obra caída no domínio publico. (Ascensão, 1997, p. 355)

1.6 DOMÍNIO PÚBLICO REMUNERADO

Segundo José de Oliveira Ascensão a lei dos Direitos Autorais, na sua

primeira versão da Lei dos Direitos Autorais, no artigo 93, deu abertura ao instituto

do domínio publico remunerado, conforme abaixo transcrito:

Artigo 93 - A utilização, por qualquer forma ou processo que não seja livre, das obras intelectuais pertencentes ao domínio público, depende de autorização do Conselho Nacional de Direito Autoral. Parágrafo único – Se a utilização visar o lucro deverá ser recolhida ao Conselho Nacional de Direito Autoral importância correspondente a cinquenta por cento da que caberia ao autor da obra, salvo se destinar a fins didáticos, caso em que essa percentagem se reduzira a dez por cento.

Ascensão esclarece que o domínio público remunerado é uma reinvidicação

das sociedades de autores que pretendem que a obra desprotegida não faça

concorrência com a obra protegida, que os utentes não se sintam tentados a

recorrer a obras do domínio publico para fugir ao pagamento dos direitos que

gravam as obras protegidas.

23

A natureza do domínio público remunerado, para o autor, teria característica

de imposto. Isto porque, após o termino do prazo de proteção, a lei brasileira,

aparentemente seguia uma posição de que era precisa uma autorização para a

utilização de obras que possuíam este contexto, ou seja, passaria o direito do autor

para um conselho, passando o pagamento pela utilização destas obras com intuito

meramente pecuniário.

Assim aduz Ascensão:

Esta percepção de caráter tributário, a “autorização” do Conselho Nacional de Direito Autoral tinha de ser entendida apenas como acordo do Conselho relativamente à quantia a ser paga, não tendo o Estado qualquer espécie de poder discricionário de autorizar ou negar utilização.( ASCENSÃO, 1997, p. 358)

Desta forma depreende-se dos estudos sobre o tema que numerosos autores

compreendiam que o uso gratuito das obras em domínio público, importa em

concorrência desleal a respeito das obras de domínio privado que devem ser

remuneradas.

A gratuidade do uso não beneficia o público, mas o usuário (editor,

empresário, etc.), uma vez que o preço dos livros ou espetáculos não diminuem

quando neles se utilizam gratuitamente as obras em domínio público. ( CHAVES in

Revistas USP, 1985, p. 48-61).

1.7 DA DUALIDADE DOS DIREITOS AUTORAIS

As legislações contemporâneas vem tutelando os direitos do sujeito criador da

obra e estas normas apresentam-se em caráter dúplice, contendo natureza moral e

patrimonial.

Na legislação brasileira verifica-se claramente no artigo 22 da Lei 9.610/1998

que ao autor pertence os direitos patrimoniais e morais sobre a obra que criou. A

citada lei, disponibiliza em seu teor capítulos específicos para cada matéria, sendo o

Capítulo II do Título 03 sobre Direitos Morais do Autor, enquanto o Capítulo III do

mesmo título trata dos Direitos Patrimoniais e sua duração.

24

Esta proteção surge pelo caráter pessoal que o autor estabelece com sua

obra ou criação, são direitos inalienáveis e irrenunciáveis, o que impede qualquer

negociação pecuniária ou cessão de seus direitos para terceiros sem a devia

contraprestação.

Por sua vez, como já citado, a exploração advém do direito patrimonial da

obra intelectual protegida, que possibilita a recompensa do autor pelo seu esforço

criativo.

Cumpre esclarecer ainda, que não se pode confundir o direito do autor com

os direitos da personalidade, ao passo que o primeiro surge com a criação da obra,

e o segundo é intrínseco ao ser humano.

Sobre o tema, Menezes discorre que "devidamente entrelaçados, os direito

morais e patrimoniais de autor - ambos utilizados no plural, dada a sua multiplicidade

garantem ao criador as necessárias prerrogativas para a tutela, defesa e difusão de

sua obra, criando um conjunto coordenado e lógico de princípios intrinsecamente

relacionados e harmônicos, que constitui a própria essência do Direito Autoral".

(MENEZES. 2007 p. 66)

Além da proteção de sua criatividade, o caráter patrimonial dos Direitos

Autorais no discurso tradicional permite ao autor obter proveitos econômicos

advindos da divulgação e exploração de sua obra intelectual.

Importante diferenciar que a faculdade de utilizar uma obra, não constitui

especificamente um Direito Patrimonial já que Lei menciona a utilização com intuito

de lucro, albergado pelo artigo 5º, XXVII da Constituição Federal.

Para a circulação da obra diversos mecanismos podem ser utilizados e para

tanto "os direitos patrimoniais do autor podem ser transferidos, total ou parcialmente

pelo autor ou por seus sucessores, a título universal ou singular, pessoalmente ou

por seus representantes e podem ser transferidos mediante licenciamentos,

concessões, cessões e outros meios admitidos pelo direito."(COSTA NETTO in

STAUT. 2006, p. 86)

25

O artigo 6-bis da Convenção de Berna estabelece que "independentemente

dos direitos patrimoniais do autor, e mesmo após a cessão desses direitos, o autor

conserva o direito de reivindicar a paternidade da obra e de se opor a qualquer

deformação, mutilação ou outra modificação dessa obra ou a qualquer atentado a

mesma obra, que possa prejudicar a sua honra ou a sua reputação".

Sendo direitos pessoalíssimos ou pessoais, como destaca Sérgio Said Staut

Júnior, o direito moral do autor caracteriza-se por um "vínculo indissolúvel que existe

entre o autor e sua obra". (STAUT. 2006, p. 88)

O citado doutrinador destaca ainda que a proteção moral do autor está na

seara dos direitos extrapatrimoniais, porque não são suscetíveis de avaliação

econômica, ainda que a violação deste direito possa resultar em uma reparação

pecuniária.

Neste viés, a discussão sobre o duplo aspecto dos direitos autorais permeia

todo o processo de transformação e mudança que encontra-se positivada na Lei

9610/1998, e que ainda não está superada. (STAUT. 2006, p. 61).

26

II DO DIREITO MUSICAL

A música tem um papel de suma importância na vida do ser humano, por

tratar-se do patrimônio do nosso espírito. Ela esta nos meios de comunicação, na

internet, rádios, celulares, em quase todos os lugares esta presente.

Vale destacar um papel de grande relevância assumido pela música na

sociedade, com funções primordiais, como podemos observar no texto da

doutrinadora Julia Maria Hummes (2004) , que em seu artigo para o programa de

Pós Graduação em música pela UFRGS cita o antropólogo e ethnomusicólogo Alan

Merriam, elencando estas funções :

Função de expressão emocional: refere-se à função da música como uma expressão da liberação dos sentimentos, liberação das ideias reveladas ou não reveladas na fala das pessoas. É como se fosse uma forma de desabafo de emoções através da música Função do prazer estético: inclui a estética tanto do ponto de vista do criador quanto do contemplador. Função de divertimento, entretenimento: essa função de entretenimento está em todas as sociedades. Função de comunicação: aqui se refere ao fato de a música comunicar algo, não é certo para quem essa comunicação é dirigida, ou como, ou o quê. Função de representação simbólica: há pouca dúvida de que a música funciona em todas as sociedades como símbolo de representação de outras coisas, ideias e comportamentos sempre presentes na música. Função de validação das instituições sociais e dos rituais religiosos: enquanto a música é usada em situações sociais e religiosas, há pouca informação para indicar a extensão que tende a validar essas instituições e rituais. Os sistemas religiosos são validados, como no folclore, pela citação de mitos e lendas em canções, e também por música que exprime preceitos religiosos.(MERRIAM, 1964, p. 219-226 in HUMMES, 2004).

Contudo, percebe-se pelo numero de funções listadas por MERRIAM, que á

musica é essencial para nossas vidas, seja em qualquer segmento, ela esta

presente no cotidiano das sociedades, cantada, ouvida, sentida, ou até descrita

como o poema “Ofício”, do compositor Paulo Cesar Pinheiro:

“A música me ama, ela me deixa fazê-la A música é uma estrela, deitada na minha cama

27

Ela me chega sem jeito, quase sem eu perceber Quando dou conta e vou ver, ela já entrou no meu peito No que ela entra a alma sai, fica o meu corpo sem vida Volta depois comovida, e eu nunca soube onde vai Meu olho dana a brilhar, meu dedo corre o papel E a voz repete o cordel, que se derrama do olhar Fico algum tempo perdido, até me recuperar Quase sem acreditar, se tudo teve sentido A música parte e eu desperto, pro mundo cruel que aí está Com medo de ela não voltar Mas ela está sempre por perto Nada que existe é mais forte, e eu quero aprender-lhe a medida De como compõe minha vida Que é para compor minha morte” (PINHEIRO P C, 1984)

2.1 DAS OBRAS MUSICAIS

Às obras musicais se aplica o artigo 07º da Lei 9610/1998, conforme norma

abaixo transcrita:

São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível oi intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como: V - as composições musicais tenham ou não letra.

São protegidos pela norma os autores, co-autores e intérpretes. Já a

execução pública implica em pagamento de direito autoral que é regulada pelo

ECAD - Escritório Central de Arrecadação e Distribuição.

Não há como falar de Direito Autoral, no tocante a musica, sem mencionar a

figura do compositor, criador da matéria prima, da cadeia de produção em torno da

musica.

O compositor é titular de direitos sobre sua criação intelectual, e esta por sua

vez é protegida por nosso ordenamento.

A Lei 9610/98 ilustra de forma genérica quem é o autor, mas esse conceito na

referida lei se mostra muito sucinto. Talvez o texto que mais se aproxima do conceito

compositor esteja contido no artigo 22°, que assim diz:

28

Art. 22. Pertencem ao autor os direitos morais e patrimoniais sobre a obra que criou. Os Direitos Morais sobre a obra, definidos no art. 24, garantem ao Autor, entre outras coisas: I - o de reivindicar, a qualquer tempo, a autoria da obra; II - o de ter seu nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou anunciado, como sendo o do autor, na utilização de sua obra; III - o de conservar a obra inédita; IV - o de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer modificações ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la ou atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra; V - o de modificar a obra, antes ou depois de utilizada; VI - o de retirar de circulação a obra ou de suspender qualquer forma de utilização já autorizada, quando a circulação ou utilização implicarem afronta à sua reputação e imagem;

A generalidade como a lei trata o autor, mostra que o verdadeiro titular da

obra, assume um papel secundário no texto da lei.

Para que uma obra seja protegida pela lei autoral, faz-se necessário que a

mesma tenha originalidade e que não esteja sob o domínio público.

Quando falamos em obras musicais, há uma certa dificuldade no que diz

respeito ao enquadramento das mesmas, por serem peculiares, por isso não

poderão sofrer similitudes com outras obras artísticas.

Alguns critérios devem ser observados para distinguir uma obra musical, e se

a mesma se coloca sob a proteção do direito do autor, fazendo necessária a analise

de três elementos, como menciona Antonio Chaves: a melodia, a harmonia e o

ritmo:

“A melodia,lembra o tratadista, é a emissão de um numero indeterminado de sons sucessivos, que o homem da rua qualifica de “ar”, o tema sobre o qual se edifica a composição musical, sons que se encaixam uns após os outros. “dois sons simultâneos provêm, não de uma só mesma melodia, mas de melodias sobreposta, e pertencem a segunda categoria, a harmonia.” Por isso diz Alain Le Tarnec que a melodia é a norma a partir da qual é composta a obra musical, é o seu tema. Pode ser definida como a emissão de sons sucessivos. A harmonia decorre da emissão simultânea de varias melodias em concurso. Veste a melodia, guarnece e enriquece-a, para usar da imagem de Henri Desbois. Finalmente o ritmo, na definição de P. Dunant, Du droit dês compositeurs de musique, Genève, 1892, pág. 47, nota 2, que ambos reproduzem, é a

29

“sensação determinada pelas relações de duração relativa, seja de diferentes sons consecutivos, seja das diversas repercussões ou repetições de um mesmo som ou de um mesmo ruído.” (CHAVES. 1987, p. 438).

As composições musicais, com ou sem letra, consideram-se obras originárias.

No que tange a obra musical com letra deve-se observar que a musica

contendo letra se comporta como um todo, não podendo ser fragmentada.

Porém podem ocorrer casos de co-autoria que ambos participam da criação

de letra e musica. Vale ressaltar que existem situações que a letra é confeccionada

em momento diverso da melodia, como ocorre em poemas musicados, ou vice

versa, considerando-se letra e musica obras separadas.

Vale ressaltar que os conceitos de obras musicais se encontram no artigo 5°,

VII, da lei 9610/98:

Art. 5.º Para efeitos desta Lei, considera-se: VII – obra: a)em co-autoria – quando é criada em comum, por 2 (dois) ou mais autores; (na Lei anterior co-autoria era chamada de colaboração). b)anônima – quando não se indica o nome do autor, por sua vontade ou por ser desconhecido; ( a Lei nova trocou a palavra determinação pela palavra vontade). c)pseudônima – quando o autor se oculta sob nome suposto; d)inédita – a que não haja sido objeto de publicação; e)póstuma – a que se publique após a morte do autor; f)originária – a criação primígena; g) derivada – a que, constituindo criação intelectual nova, resulta da transformação de obra originária; h)coletiva – a criada por iniciativa, organização e responsabilidade de uma pessoa física ou jurídica, que a publica sob seu nome ou marca e que é constituída pela participação de diferentes autores, cujas contribuições se fundem numa criação autônoma;

Podemos citar como exemplo a bela obra de Pixinguinha “Lamentos”, criada

na década de 20, originalmente instrumental, e que posteriormente, em 1962, foi

letrada por outro gênio do nosso cancioneiro popular, o “poetinha” Vinicius de

Moraes.

Morena, tem pena Mas ouve o meu lamento Tento em vão te esquecer Mas, ai, o meu tormento é tanto Que eu vivo em prantos, sou tão infeliz

30

Não há coisa mais triste meu benzinho Que esse chorinho que eu te fiz Sozinho, morena Você nem tem mais pena Ai, meu bem, fiquei tão só Tem dó, tem dó de mim Porque eu estou triste assim por amor de você Não há coisa mais linda neste mundo Que o meu carinho por você

Considerando o consumo musical como um comportamento emblemático na

cultura atual, é importante lembrar que quase toda a música é distribuída hoje em

formato digital.

A tecnologia dos CD - Compact Discs, que se tornou dominante nos anos

1980 e 1990, quase tornando extintos o disco de vinil e as fitas cassete, coexiste

hoje com arquivos de áudio transmitidos diretamente pela internet. Esses arquivos

digitalizados são estocados e reproduzidos nos computadores pessoais ou nos

diversos tipos de tocadores portáteis de música que já se tornaram extremamente

populares no mercado mundial, além de serem executados nas novas gerações de

telefones celulares. Entretanto, nem todos esses arquivos de música são feitos com

o consentimento dos detentores de direitos autorais, tornando a batalha em torno da

propriedade intelectual na internet uma das mais renhidas hoje.

2.2 VIOLAÇÃO DO DIREITO AUTORAL NAS OBRAS MUSICAIS

2.2.1 Contrafação

O artigo 19° da Lei 496 de 1898 estabelecia que:

[...] Todo o attentado doloso ou fraudulento contra os direitos de autor constitue o crime de contrafacção. Os que scientemente vendem, expoem á venda, teem em seus estabelecimentos para serem vendidos ou introduzem no territorio da Republica com fim commercial objectos contrafeitos, são culpados do mesmo crime.

31

Nota-se que a referida lei tinha uma conotação bem ampla no que se diz

respeito ao crime de contrafação.

Atualmente a Lei 9.610/98 no seu artigo 5°, VII, também se mostra bem

genérica ao tratar do assunto, este tratado de uma forma mais ampla na doutrina.

[...] Para os efeitos desta Lei, considera-se: VII - contrafação - a reprodução não autorizada

Alguns autores conceituam contrafação como a reprodução não autorizada,

para a distribuição com intuito de lucro, casos clássicos da pirataria, seja no modo

físico (CD, DVD) ou no eletrônico como copia de musica etc.

Não obstante conclui o doutrinador Antonio Chaves (1987, p. 458) que

“contrafação pode ser encarada de forma objetiva ou subjetiva, onde objetivamente

é a usurpação dolosa, e subjetivamente é o ato fraudulento que visa imitar ou

falsificar alguma coisa, e como, ato criminoso é passível de sanção penal.”

2.2.2 Plágio

A música é a manifestação intelectual mais abrangente em nossa sociedade,

talvez por isso seja delicado identificar a figura do plágio, no tocante a violação da

obra musical.

O termo “plágio” deriva do latim plaga, que consistia em açoitar aqueles que

vendiam homens livres como escravos. Segundo (Abreu, 1968, p.97), plágio

correspondia também a uma expressão do latim plagium, usada inicialmente por

Marçal, com o escopo de identificar o ilícito em comento.

O plágio se destaca pela ma-fé na forma como é usada, consiste na

apropriação do cerne criativo da obra anterior, assim denota (Ascensão 1997, p. 34)

“ Plágio não é cópia servil, é mais insidioso, porque se apodera da essência criadora

da obra, sob veste ou forma diferente.”

32

A caracterização do plágio se da pela melodia no caso da música, podendo

até repetir a harmonia, ou seja, a estrutura de acordes, mas não poderá ocorrer

repetição melódica.

Existe uma suposta regra que com 8 compassos idênticos, a música pode ser

considerada plagiada. Esta é uma regra que o Direito não reconhece, pois o

tamanho dos compassos varia de acordo com o estilo musical, ou seja, há

necessidade de um perito para obter um diagnóstico mais preciso sobre essa

matéria tão subjetiva. Ademais no Brasil não há qualquer registro de legislação que

demonstre este calculo matemático.

Segundo o (BITTAR, 2004. p. 132) a doutrina reuniu em dois grupos as

Violações ao Direito do Autor.

O primeiro grupo envolve casos de avenças contratuais, estas podem utilizar

o compromisso arbitral para a solução do conflito. O segundo é o que diz respeito às

questões extracontratuais, ou seja, o uso indevido da obra.

Na esfera penal o plágio encontra-se previsto no artigo 184 do Código Penal,

e que ainda, em regra é crime de ação penal publica, salvo se praticado contra

entidade publica, ou praticado com intuito de lucro, como reza os parágrafos § §1° e

2° do mesmo artigo.

Em suma, a tutela exigida pelo autor lesado, é a indenização por danos

morais e patrimoniais baseados nos artigos 186, 187 e 927 do código civil.

E como ressalta (BITTAR, 2004. P. 203), “no dano moral é que se deve

concentrar a suficiente reparação do plágio. Uma vez identificado o plágio é

desnecessária a prova do prejuízo correspondente.”

Por fim, dispõe os autores de instrumentos para defesa de suas obras contra

o crime de plágio, para que sua criação fique resguardada, e somente utilizada sob a

égide da lei, para que sejam respeitados os direitos sob sua propriedade intelectual.

33

2.3 DA GESTÃO COLETIVA DE DIREITOS AUTORAIS

As entidades de representação dos artistas existem desde a primeira metade

do século, segundo Ascensão (1997, p. 619), “estas entidades terão uma função que

genericamente podemos qualificar como sindical”, estas com a proposta de

assegurar a percepção dos créditos inerentes ao titular em relação à utilização de

sua obra.

Com o advento da lei n° 5.988/73, a situação se modifica, pela necessidade

de uma entidade com competência especifica, sendo assim, o artigo IV da referida

lei trouxe uma organização dividindo-se em pública e privada.

Na esfera pública criam-se o CNDA (conselho Nacional de Direito Autoral)

desativado posteriormente, Fundo de Direito Autoral, Centro Brasileiro de

Informações sobre Direitos Autorais e o Museu do CNDA.

Enquanto no campo privado surge as Associações de Titulares, e o ECAD

(Escritório Central de Arrecadação e Distribuição), este ultimo com maior ênfase no

decorrer do presente trabalho.

Pode os titulares, assim querendo, confiar à gestão de seus direitos

patrimoniais a um mandatário. Ocorre grande dificuldade, no tocante ao compositor,

em gerir seus direitos, restando assim, ao autor, uma obrigatoriedade de utilizar a

gestão coletiva para administrar, trocando em miúdos Ascensão (1997, p. 621)

ilustra bem o fato, “o autor é a pessoa de quem se fala; mas não é a pessoa que

fala.”

2.3.1 ECAD - Escritório Central de Arrecadação e Distribuição

No Brasil, no que diz respeito à música, as nove associações unificam o

Escritório Central de Arrecadação e Distribuição – ECAD – motivados pelo princípio

da unicidade associativa de gestão coletiva extraído do artigo 99, da Lei de Direitos

Autorais (9.610/98).

34

O ECAD é uma sociedade civil de natureza privada, sem finalidade

econômica, instituída por determinação da lei federal nº 5.988/73 e mantida pela

atual lei de direitos autorais.

Sua existência é prevista na referida lei, que no teor do seu artigo 99°, diz

que as associações manterão um único escritório central para a arrecadação e

distribuição, em comum, dos direitos relativos à execução pública das obras

musicais e demais.

A função centralização é de cunho estritamente operacional, e exclusiva

gestão coletiva desses direitos.

Destarte percebe-se que o ECAD é o único órgão com legitimidade para

realizar cobranças da exploração de obras musicais protegidas pela lei. Esta

cobrança segue um padrão tabelado, estabelecido por meio de regulamento onde

considera-se a importância da musica para o estabelecimento, a atividade que

exerce o usuário, por qual período e também a maneira que se realiza a

apresentação.

Pontua Bittar a respeito do assunto da seguinte forma:

“quanto à adequação da cobrança em termos valorativos com a realidade,

também permanece lacuna legislativa a respeito; não há no texto da lei

alusões a cotas ou valores máximos ou mínimos para cobrança de direitos

autorais, o que deverá ser versado em legislação infra-ordinária e por meio

da pactuação privada.” (BITTAR, 1999, p.117).

Caberá aos tribunais a interpretação deste vazio, por não haver no

ordenamento jurídico matéria que verse sobre o assunto.

O fato é que a Lei 9610/98 da grande autonomia ao ECAD no tocante a

arrecadação e distribuição dos valores referente aos direitos autorais das obras

musicais, resultando em muitas criticas sobre essa não interferência estatal, talvez

este seja o principal ponto resultante da reforma da lei 9610/98 com promulgação da

Lei 12.853/13.

35

2.3.2 Gestão Coletiva - Lei 12.853/13

A gestão coletiva sempre foi um tema bastante discutido no que tange os

direitos autorais, atualmente essa discussão tornou-se mais acirrada, pois foi

promulgada a Lei 12.853/13, e nesse ínterim as associações alegam interferência

estatal em campo privado.

Todavia a sociedade interessada e também o Ministério da Cultura, exigiram

um acompanhamento mais detalhado a respeito das cobranças dos Direitos

Autorais, haja vista, que esta sempre foi de difícil compreensão, talvez pela

precariedade de informações advindas do gestor.

Cumpre salientar que esta discussão sobre o tema, não configura que a

gestão coletiva seja algo desagregador para o Direito Autoral, mas sim com o

escopo de alcançar uma legislação que seja adequada a contemporaneidade das

relações.

Dentre vários temas, um é de bastante relevância aos envolvidos no

processo. Trata-se da transparência, que foi o principal motivo para a criação da

nova lei, pois a sua ausência ensejou houve conflito de interesses no meio autoral.

O decorrer do processo histórico mostra a fragilidade do titular originário no

tocante aos seus interesses, ocupando uma posição antagonista quando deveria ser

ao contrário.

Neste sentido, aduz Ascensão:

“o autor é mais uma vítima que um beneficiário do sistema. Este é necessário, o autor tem de recorrer a ele, o autor é a própria justificação da existência deste – mas o autor perdeu o protagonismo. Os gestores do sistema, sejam eles próprios autores ou não, estão em primeiro plano.” (ASCENSÃO, 2011, p. 155)

O fato é que o criador da obra foi afastado do comando das mesmas devido

aos desdobramentos históricos desfavoráveis a sua classe. E isto se consolida na

atualidade, visto que quase não participa dos tramites de arrecadação e distribuição

o autor, esta prerrogativa sendo exclusiva das editoras com o pretexto de estar

36

atendendo aos interesses da coletividade dos mesmos, com isso tornando-se nada

democrática sua forma de gestão.

A transparência tem como objetivo diminuir essa disparidade, e inserindo o

autor no contexto de conhecimento sobre gestão coletiva, e por sua vez também

adentrar no campo das decisões a respeito de seus interesses.

Outra discussão respeito da nova lei, se da por alegações quanto a sua

inconstitucionalidade.

Pois bem, vejamos o artigo 5° da Constituição Federal:

XXVII - aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar; XXVIII - são assegurados, nos termos da lei: a) a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução da imagem e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas; b) o direito de fiscalização do aproveitamento econômico das obras que criarem ou de que participarem aos criadores, aos intérpretes e às respectivas representações sindicais e associativas;

Mostra-se claramente que o autor é protegido no texto Constitucional, e que

pode gozar e fruir plenamente os frutos da criação do seu intelecto.

Todavia a Lei 9610/98 era omissa quanto a essa questão, e com o advento da

nova Lei de Gestão Coletiva, passa a vigorar a transparência da gestão,

possibilitando ao titular originário, o acesso às prerrogativas que se refere o texto

Constitucional. Não obstante, a ausência de um dispositivo tratando do assunto, é

que ensejaria uma inconstitucionalidade por omissão.

Não há como se falar em gestão coletiva, se não houver transparência, pois

ela é o elemento fundamental para diminuir a déficit de legitimidade que paira nas

associações gestoras dos direitos autorais.

Nesse sentido, observamos o artigo 98. § 2°:

[...] As associações deverão adotar os princípios da isonomia, eficiência e transparência na cobrança pela utilização de qualquer obra ou fonograma.

37

Cumpre salientar a presença da palavra transparência no teor do artigo 98,

assim como no art 98 A, I, II:

[...] As associações de gestão coletiva de direitos autorais, no desempenho de suas funções, deverão: I - dar publicidade e transparência, por meio de sítios eletrônicos próprios, às formas de cálculo e critérios de cobrança, discriminando, dentre outras informações, o tipo de usuário, tempo e lugar de utilização, bem como os critérios de distribuição dos valores dos direitos autorais arrecadados, incluídas as planilhas e demais registros de utilização das obras e fonogramas fornecidas pelos usuários, excetuando os valores distribuídos aos titulares individualmente; II - dar publicidade e transparência, por meio de sítios eletrônicos próprios, aos estatutos, aos regulamentos de arrecadação e distribuição, às atas de suas reuniões deliberativas e aos cadastros das obras e titulares que representam, bem como ao montante arrecadado e distribuído e aos créditos eventualmente arrecadados e não distribuídos, sua origem e o motivo da sua retenção;

O texto legal impõe que as associações deverão prestar contas dos valores

que são devidos aos associados, com regularidade e de modo direto, com critérios

objetivos.

Isto posto, pode se notar a importância da transparência nas atividades

inerentes à gestão coletiva de direito de autor e direitos conexos. É o principal

elemento na perspectiva econômica do direito do autor, ficando a impressão do

primeiro passo dado rumo a uma gestão justa e eficaz.

38

3. CONCLUSÃO

A sociedade se desenvolve num mundo globalizado, onde a cada dia

aumenta e num ritmo acelerado as relações sociais, e juntamente com isso as

evoluções tecnológicas.

Todavia a sociedade necessita que o direito acompanhe essas modificações

e transformações para atender e tutelar seus interesses. Portanto o direito autoral

como qualquer outro deve atentar para essa realidade.

A música está presente em todas as camadas sociais, desde dos primórdios

até na atualidade, ele exerce múltiplas funções, seja no cunho histórico,

educacional, cultural, ou seja, é de estrema relevância a função social da musica.

Não há como falar em musica sem mencionar a figura do compositor, seu

titular originário e que possui seus direitos sejam morais ou patrimoniais, garantidos

na Constituição Federal.

Esses direitos sobre sua criação intelectual, que são regulados na forma de

gestão coletiva, mais precisamente pelo ECAD, que apesar dos mecanismos de

regulamentação, a fiscalização é carente, com isso abrindo um flanco para mal

intencionados se valerem desta falha e auferir ganhos.

Por fim, o advento da nova Lei de Gestão Coletiva, traz um norte para trilhar

uma distribuição e arrecadação mais justa, organizada e transparente, sendo assim,

a interferência do Estado mesmo que indiretamente, exigindo transparência na

forma da lei, ajuda o autor a estar a par da gestão de seus direitos, e com isso

deixando um pouco o antagonismo histórico que sempre permeou a relação

compositor/gestor.

39

REFERÊNCIAS

ABREU, Edman Ayres de. São Paulo: RT, 1968. AFONSO, Otávio. Direito Autoral: Conceitos Essenciais. Barueri: Manole. 2009. ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito Autoral. 2.ed, ref. e ampl, Rio de Janeiro, Renovar, 1997. ASCENSÃO, José de Oliveira. A supervisão da gestão coletiva na reforma da LDA, capítulo 11 do livro: Por que mudar a lei de direito autoral – estudos e pareceres, Fundação Boiteaux/Editora Funjab, Florianópolis. BITTAR, Carlos Alberto. Contornos atuais do Direito do Autor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. BITTAR, Carlos Alberto. Direito de Autor. 4.ed. Rio de janeiro: Forense Universitária, 2004. BRASIL. Constituição (1988). In: Vade Mecum Saraiva. 18.ed. atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2014. BRASIL. Lei n° 9.610 de 19 de fevereiro de 1988. Altera, atualiza e consolida a legislação sobre direitos autorais e da outras providências. In: Vade Mecum Saraiva. 18.ed. atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2014. BRAUN. Michele e PELLEGRINI, Grace Kellen de Freitas. A Função Social do Direito Autoral a partir da constitucionalização do direito privado: uma necessidade imperiosa ara a concretude do texto constitucional: in :Anais do VI Congresso de Direito do Autor e Interesse Público (2013: Florianópolis, SC), Coordenadores: Marcos Wachowicz, José Augusto Fontoura Costa, Márcia Carla Pereira Ribeiro e Carol Proner. GEDAI/UFSC: Florianópolis, 2013. CARBONI, Guilherme. O Direito do Autor na Multimídia, São Paulo: Quartier Latin. 2003 CHAVES, Antonio. Domínio Publico em matéria de Direito de Autor. In: Rev. Forense. Vol.273. ano 1977 CHAVES, Antonio. Direito do Autor. Rio de Janeiro: Forense, 1987. GANDELMAN, Henrique. De Gutenberg à Internet: Direitos autorais na era digital. 1ª ed. São Paulo: Record. 1997. MANSO, Eduardo J. Vieira. O que é Direito Autoral. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1992.

40

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo Brasileiro. São Paulo: 1981, p.478 PIMENTA, Eduardo S. Dos Crimes contra a propriedade intelectual – violação de direito autoral – usurpação de nome ou pseudônimo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994. p, 18 e 19 SANTIAGO, Oswaldo. Aquarela do Direito Autoral in PIMENTA, Eduardo S. Dos Crimes contra a propriedade intelectual – violação de direito autoral – usurpação de nome ou pseudônimo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994.p.20 STAUT JÚNIOR, Sérgio Said. Direitos Autorais: Entre as Relações Sociais e as Relações Jurídicas. Curitiba: Moinho do Verbo, 2006. VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direitos reais. 5 ed., São Paulo, atlas, 2005, BOBBIO, Pedro Vicente. O direito de autor na criação musical. São Paulo: Editora Lex. 1951: in : HUMMES, J. As funções do ensino de música, sob a ótica da direção escolar: um estudo nas escolas de Montenegro/RS. Dissertação (Mestrado em Educação Musical)–Programa de Pós-Graduação em Música, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2004. Sites: CHAVES, Antonio. In: www.revistas.usp.br/rfdusp/article/download/67041/69651 - Acessado em 25 set. 2014 DRUMMOND, Victor. In : http://www.academia.edu/8339211/Aspectos_sobre_a_constitucionalidade_da_Lei_12853_13 - Acesso em 01 Out. 2014 ECAD – Escritório Central de Arrecadação e Distribuição - http://www.ecad.org.br/en/Pages/default.aspx. Acesso em 20 set. 2014 RODRIGUES, Leonardo Mota Costa. Lei de Direitos Autorais nas obras musicais. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 67, 1 set. 2003. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/4328>. Acesso em: 28 set. 2014.

http://www.drzem.com.br/2011/08/como-foi-criado-o-choro-lamentos-de.html - Acesso em 30 set. 2014

http://www.direitocom.com/lei-9-6101998-lei-de-direitos-autorais-comentada/titulo-v-dos-direitos-conexos-do-artigo-89-ao-96/capitulo-ii-dos-direitos-dos-artistas-interpretes-ou-executantes-do-artigo-90-ao-92/artigo-91-4 acesso em 4/09/2014 - Acesso em 28 set. 2014 http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1824-1899/lei-496-1-agosto-1898-540039-publicacaooriginal-39820-pl.html - Acesso em 01 out. 2014