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USINABILIDADE DE LIGAS METÁLICAS COM APLICAÇÃO
ODONTOLÓGICA A
PARTIR DA EVOLUÇÃO DAS FORÇAS DE AVANÇO NA FURAÇÃO
João Pedro Martins Morand
Projeto de Graduação apresentado ao
Curso de Engenharia Mecânica da Escola
Politécnica, Universidade Federal do Rio
de Janeiro como parte dos requisitos
necessários para a obtenção do grau de
Engenheiro.
Orientadora: Anna Carla Monteiro de
Araujo
Rio de Janeiro
Setembro de 2016
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO Departamento de Engenharia Mecânica
DEM/POLI/UFRJ
USINABILIDADE DE LIGAS METÁLICAS COM APLICAÇÃO
ODONTOLÓGICA A
PARTIR DA EVOLUÇÃO DAS FORÇAS DE AVANÇO NA FURAÇÃO
João Pedro Martins Morand
PROJETO FINAL SUBMETIDO AO CORPO DOCENTE DO DEPARTAMENTO
DE ENGENHARIA MECÂNICA DA ESCOLA POLITÉCNICA DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO COMO PARTE DOS
REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA A OBTENÇÃO DO GRAU DE
ENGENHEIRO MECÂNICO.
Aprovado por:
________________________________________________
Prof.ª Anna Carla Monteiro de Araujo; D.Sc. (Orientadora)
________________________________________________
Prof. Daniel Alves Castello; D.Sc.
________________________________________________
Prof. Juan Carlos Garcia de Blas; Dr. Ing.
RIO DE JANEIRO, RJ - BRASIL.
SETEMBRO DE 2016
i
Martins Morand, João Pedro.
Usinabilidade de Ligas Metálicas com Aplicação
Odontológica a Partir da Evolução das Forças de Avanço na
Furação / João Pedro Martins Morand. – Rio de Janeiro:
UFRJ/ Escola Politécnica, 2016.
VII, 45 p.: il.; 29,7 cm.
Orientadora: Anna Carla Monteiro de Arajujo
Projeto de Graduação – UFRJ/ Escola Politécnica/
Curso de Engenharia Mecânica, 2016.
Referencias Bibliográficas: p. 43-45.
1. Usinagem 2. Furação 3. Usinabilidade I. Monteiro de
Arajujo, Anna Carla. II. Universidade Federal do Rio de
Janeiro, Escola Politécnica, Curso de Engenharia Mecânica.
III. Usinabilidade de Ligas com Aplicação Odontológica a
Partir da Evolução das Forças de Avanço na Furação.
iii
AGRADECIMENTOS
Um agradecimento especial ao Professor Guillaume Fromentin do Laboratoire
Bourguignon des Matériaux et Procédés da École Nationale Supérieure d'Arts et
Métiers que tornou possível essa monografia.
À Professora Anna Carla por sua orientação atenciosa, pelos ensinamentos, e
por sua enorme dedicação e respeito pelos alunos. Sua energia e ética de trabalho
elevam ainda mais a engenharia da UFRJ.
A meus pais Sergio e Tereza e toda minha família pelo carinho e apoio
incondicionais e pelo exemplo de vida e de caráter, o meu maior obrigado. Tudo que
sou agradeço a vocês.
À minha esposa e amiga Camila que trilhou essa jornada comigo, partilhando
de todas as dificuldades e sucessos. Sem você tudo seria imensamente mais difícil e
as conquistas não teriam o mesmo sabor. Teremos ainda muitas outras jornadas pela
frente.
Aos meus amigos do Colégio Santo Inácio, André, Carlos, Fernando,
Guilherme, Marcos, Matos, Pedro, Rafael, Raphael, Ronny, Thiago e Vinicius
companheiros leais de uma vida inteira, um grupo sem igual, não poderia desejar
amigos melhores.
Aos meus colegas e da turma de 2010.2, onde fiz vários amigos, pessoas
extraordinárias e talentosas. Um agradecimento especial a Tiago, amigo de todas as
horas com quem se pode contar, sempre generoso e disposto a ajudar, parabenizo-o
por sua capacidade impar e desejo merecido sucesso.
Ao amigo Ivanovich pela paciência e dedicação em transmitir seu
conhecimento durante minha iniciação científica no LabRob, e também ao professor
Max Dutra por me acolher em seu laboratório.
Ao corpo docente e aos funcionários da Escola Politécnica por seu trabalho
que mantém essa centenária escola de engenharia funcionando.
iv
Resumo do Projeto de Graduação apresentado à Escola Politécnica/ UFRJ como parte dos
requisitos necessários para a obtenção do grau de Engenheiro Mecânico
Usinabilidade de Ligas Metálicas com Aplicação Odontológica a Partir da
Evolução das Forças de Avanço na Furação.
João Pedro Martins Morand
Setembro/2016
Orientadora: Anna Carla Monteiro de Araujo
Curso: Engenharia Mecânica
O presente trabalho visa comparar a usinabilidade entre dois materiais utilizados em
próteses dentárias, a liga de Titânio Ti6Al4V e a liga de Cromo-Cobalto Romur 400,
através das forças de avanço. Para avaliar a evolução da força de avanço na furação
desses materiais com o comprimento usinado e compará-la em ambas as ligas, foi feita
uma sequência vinte de furos em cada material variando as velocidades de avanço entre
30 e 45 mm/min e com velocidade de corte de 10,05 m/min. Nos experimentos, os
patamares de força no Romur 400 foram mais estáveis que os do Ti6Al4V. As forças de
avanço no Romur 400 foram superiores as encontradas na furação do Ti6Al4V e a taxa
de crescimento dessas forças com o comprimento usinado também foi superior no
Romur 400, tendo um valor de 0,17N/mm em comparação com a liga de titânio que
apresentou taxa de 0,12 N/mm. O índice de usinabilidade relativa, encontrado pela
razão média de forças de avanço entre o Ti6Al4V e o Romur 400 foi de 0,69. Esses
resultados indicam que o Ti6Al4V possui melhor usinabilidade que o Romur 400.
Palavras-chave: Furação, Usinabilidade, Força de Avanço, Ti6Al4V, Romur 400.
v
Abstract of Undergraduate Project presented to POLI/UFRJ as a partial fulfillment for the
degree of Mechanical Engineer
Machinability of Alloys used in Dentistry from the Feed Forces Evolution in
Drilling
João Pedro Martins Morand
September/2016
Advisor: Anna Carla Monteiro de Araujo
Course: Mechanical Engineering
This work aims to compare the machinability of two materials used in dental prosthesis,
the titanium alloy Ti6Al4V and the Chrome-Cobalt alloy Romur 400, using the feed
forces. To evaluate the evolution of the feed forces in the drilling of those materials and
compare them in both alloys, a sequence of twenty holes was made, varying the feed
speeds between 30 and 45 mm/min correspondingly in both materials and using a fixed
cutting speed of 10.05 m/min. In the experiments, the force levels in Romur 400 were
more stable than in Ti6Al4V. The feed forces were greater in Romur 400 than in
Ti6Al4V and the rate of growth of this force with the machined length was also greater
in Romur 400, with a value of 0,17 N/mm than in Ti6Al4V which presented a rate of
0,12 N/mm. The relative machinability index, found by dividing the average feed force
of Ti6Al4V by the same average force on Romur 400 was of 0.69. Those results point
that Ti6Al4V has a better machinability than Romur 400.
Keywords: Drilling, Machinability, Feed Force, Ti6Al4V, Romur 400.
vi
Sumário
1 Introdução ................................................................................................... 1
2 Processo de Furação em Ligas com Aplicações Odontológicas .................. 3
2.1 Características dos Materiais Analisados ............................................. 3
2.2 O Processo de Furação ....................................................................... 5
2.2.1 Características geométricas das brocas helicoidais ........................ 6
2.2.2 Materiais empregados em brocas helicoidais .................................. 7
2.3 Parâmetros de usinagem ..................................................................... 7
2.3.1 Velocidade de corte (Vc).................................................................. 7
2.3.2 Avanço (Vf) ..................................................................................... 8
2.3.3 Profundidade de usinagem (ap) ....................................................... 9
2.3.4 Grandezas relativas ao cavaco ....................................................... 9
2.4 Desgaste em Brocas ............................................................................ 9
2.5 Usinabilidade ..................................................................................... 11
2.6 Furação dos Materiais Estuados ........................................................ 11
2.6.1 Furação do Ti6Al4V ...................................................................... 11
2.6.2 Furação do Cromo-Cobalto ........................................................... 13
3 Forças de Usinagem no Processo de Furação .......................................... 15
3.1 Pressão Específica de Corte .............................................................. 16
3.2 Pressão Específica segundo Kienzle ................................................. 17
3.3 Forças na Furação de Ligas de Titânio .............................................. 17
3.4 Calculo das Constantes de Kienzle para o Ti6Al4V ............................ 20
3.5 Furação de Ligas de Cromo-Cobalto.................................................. 23
4 Materiais e Métodos .................................................................................. 25
4.1 Experimento ....................................................................................... 25
4.2 Corpos de Prova ................................................................................ 25
4.3 Ferramenta de Corte .......................................................................... 26
4.4 Parâmetros de Corte .......................................................................... 27
4.5 Centro de Usinagem .......................................................................... 27
vii
4.6 Medição da Força de Avanço ............................................................. 28
5 Resultados Experimentais ......................................................................... 29
5.1 Forças de Avanço Experimentais ....................................................... 29
5.1.1 Identificação das Etapas da Furação ............................................ 31
5.1.2 Forças Médias e Pressões Médias de Avanço .............................. 33
5.1.3 Ajuste Linear da Força de Avanço ................................................ 38
5.1.4 Razão Entre Forças Médias de Avanço ........................................ 39
6 Conclusão ................................................................................................. 41
7 Referências ............................................................................................... 43
1
1 Introdução
As próteses dentárias são importantes para corrigir problemas de saúde bucal,
restaurando funções estéticas, fonéticas e mastigatórias. Cada paciente configura um
caso com necessidades únicas em termos de próteses. Portanto, uma tecnologia que
possa produzi-las de maneira personalizadas, com rapidez, produtividade e precisão
adequada traz grandes benefícios para essa forma de tratamento.
Uma das principais soluções existentes é a manufatura por usinagem através
da tecnologia CNC associada a um sistema de CAD/CAM desenvolvida de maneira
que o uso seja acessível aos profissionais da área odontológica. Em conjunto utiliza-se
também um equipamento de escaneamento 3D, capaz de digitalizar a geometria da
arcada dentária do paciente. A máquina CNC idealmente deve ser compacta de
maneira a caber em consultórios ou laboratórios médicos, e a interface com o usuário
deve ser elaborada tendo por objetivo que um profissional da área médica possa
produzir as próteses mesmo sem um profundo conhecimento do processo de
fabricação ou da programação e operação de máquinas CNC.
As ligas de Cromo-Cobalto ou de Titânio são próprias para a composição de
próteses dentárias, e têm sido amplamente utilizadas de várias décadas não apenas
em próteses dentárias como em outros tipos de próteses como implantes médicos de
joelho e bacia, válvulas de coração, dentre outros. As principais características que
tornam essas ligas desejáveis para aplicações médicas são resistência a corrosão e
ao desgaste, alta biocompatibilidade, grande resistência a esforços e altas
temperaturas. Além disso, apresentam um módulo de elasticidade e uma resistência a
fadiga cíclica maiores, o que é altamente desejável em próteses dentárias [1–3].
O processo de furação é de especial interesse nesse caso por dois motivos,
primeiro porque para a fixação das próteses, é necessário fazer um furo para a
posterior criação da rosca, de maneira que a prótese receba um pino fixador, além
disso, pode servir para desbaste inicial na fabricação da prótese. As ligas de Cr-Co e
Ti6AlV4 mesmo utilizando ferramentas de corte adequadas e empregadas dentro de
uma faixa de especificações recomendadas, provocam acelerado desgaste e
consequentemente aumento das forças de usinagem na ferramenta e redução do
tempo de vida [4, 5]. O desgaste aumenta os esforços realizados na broca e pode até
criar um desbalanceamento na componente das forças perpendiculares a força de
avanço, promovendo a flexão e a possível quebra prematura da ferramenta.
2
Esse projeto tem como objetivo o estudo da evolução das forças de avanço na
furação de ligas odontológicas. É utilizada uma ferramenta para cada corpo de prova,
analisando a evolução das forças com o desgaste da ferramenta e os resultados para
os dois materiais são comparados.
3
2 Processo de Furação em Ligas com
Aplicações Odontológicas
Esse capítulo apresenta os conceitos fundamentais para o estudo da
usinabilidade na furação das ligas de titânio e de cromo-cobalto. São abordadas as
características dos materiais, os principais processos de furação, as características
geométricas da broca helicoidal, os parâmetros de corte envolvidos e a usinabilidade e
as condições de furação.
2.1 Características dos Materiais Analisados
As ligas de titânio têm excelentes propriedades mecânicas, de resistência a
ataques químicos e ao calor. A liga que é foco desse estudo, Ti-6Al-4V, além do
próprio titânio possui pequenas quantidades de vanádio e alumínio, respectivamente 6
e 4%, e representa 50% de toda a utilização de Titânio.
A liga de titânio Ti6Al4V se caracteriza pelo alto ponto de fusão, baixa
condutividade térmica e baixa densidade se comparado com materiais mais comuns
como o aço. As ligas de titânio possuem propriedades mecânicas excepcionais se
comparadas com outros metais de engenharia, com alta resistência mecânica e
dureza.
Da Tabela 1 à Tabela 3 estão expostas a composição química e as
propriedades físicas e mecânicas típicas da liga de titânio Ti-6Al-4V [6].
Tabela 1: Composição química típica da liga Ti-6Al-4V.
Al V C Fe O N H Ti
6% 4% <0,08% <0,25% <0,2% <0,05% <0,015% Restante
A liga apresenta como elementos principais o titânio, alumínio e vanádio. A
presença desses dois metais além do titânio melhora as propriedades mecânicas da
liga com relação ao titânio puro comercialmente disponível e permitem que sejam
feitos tratamentos térmicos. Outros elementos servem ainda de estabilizador alfa ou
beta, modificando a temperatura de transição da liga.
4
Tabela 2: Propriedades físicas típicas da liga Ti-6Al-4V.
Densidade (g/cm³)
Ponto de fusão (ºC)
Calor específico (J/kgºC)
Condutividade térmica (W/m.K)
4,42 1649 560 7,2
Tabela 3: Propriedades mecânicas típicas da liga Ti-6Al-4V a temperatura ambiente.
Resistência à Tração (MPa)
Resistência ao Escoamento (Mpa)
Módulo de Elasticidade (Gpa)
Dureza Rockwell
C
1000 910 114 36
Assim como as ligas de titânio, as ligas de cromo-cobalto são extensivamente
utilizadas na indústria médica, especialmente em próteses que apresentam contato
com tecidos ósseos, como implantes ortopédicos e dentais. Além disso, essas ligas já
encontraram aplicação em vários campos nos quais a resistência ao desgaste é fator
fundamental, como indústria aeroespacial, cutelaria, rolamentos, componentes de
turbinas a gás, e outros.
As ligas de cromo-cobalto foram descobertas no início do século XX, fundindo
os metais cromo e cobalto, além disso, não raramente possuem molibdênio ou níquel
em menores proporções em sua composição. Algumas das características que as
tornam desejáveis para o uso médico em comparação com outras ligas metálicas são,
de maneira semelhante as ligas de titânio, as resistências à corrosão, oxidação,
desgaste, a alta biocompatibilidade, alto módulo de elasticidade e força específica. O
primeiro uso dessas ligas em implantes ocorreu na década de 60, sob a forma de uma
válvula cardíaca que durou 30 anos. Atualmente as ligas de Cr-Co são amplamente
utilizadas em juntas artificiais de substituição de joelho e quadril e em implantes
dentais.
As ligas de Cromo-Cobalto, tipicamente possuem, se comparadas com, por
exemplo, o aço, baixa ductilidade, alto módulo de elasticidade, alta resistência à
fadiga, alta resistência ao cisalhamento, tendência ao encruamento, e baixa
condutividade térmica. [5, 7].
A liga empregada nos experimentos recebe a nomenclatura de Romur 400. As
características do Romur 400 podem ser observadas da Tabela 4 à Tabela 5 [8].
5
Tabela 4: Composição química típica da liga Romur 400.
Co Cr W Si Mn Fe Outros
61,65% 27,75% 8,45% 1,61% 0,25% 0,2% <0,1%
Os principais componentes que formam a liga são cobalto e cromo, havendo
também adição de molibdênio.
O Romur 400 apresenta uma densidade muito superior a do titânio Ti6Al4V, de
8,55 g/cm³. Não é informado pelo fabricante o ponto de fusão nem a condutividade
térmica do material, porém o ASTM F75, outra liga a base de cobalto com composição
similar, apresenta valores de 1454ºC e 14,7 W/m.K respectivamente, sendo a
condutividade bastante inferior à do aço.
Tabela 5: Propriedades mecânicas típicas da liga Romur 400.
Resistência à Tração (Mpa)
Resistência ao Escoamento (Mpa)
Módulo de Elasticidade (Gpa)
Dureza Vickers
525 375 240 285 HV 10/30
Essa liga apresenta um módulo de elasticidade maior que a liga de titânio, mas
uma dureza inferior e um limite de escoamento mais baixo.
2.2 O Processo de Furação
Furação se define como processo de usinagem que visa retirar cavaco de
forma a gerar uma superfície cilíndrica circular interna, coaxial ao eixo de rotação da
ferramenta associado ao movimento de avanço na direção do eixo em uma peça de
trabalho. Normalmente é feita com uma broca com duas arestas de corte, e o furo feito
na peça tem o diâmetro externo do envelope gerado pela rotação da ferramenta [9].
Existem diversas brocas que podem ser utilizadas dependendo da geometria
final da peça e do material usinado, mais comum é a helicoidal, que é utilizada nos
experimentos apresentados nesse trabalho. [10]
A furação, dependendo dos parâmetros utilizados, pode alterar as propriedades
mecânicas superficiais do material, gerando uma camada com altas tensões residuais
na superfície recém-formada, o que causa maior suscetibilidade a corrosão e a
propagação de trincas e à falha. Essa alteração das propriedades mecânicas do
material usinado é um fator importante nos furos para a posterior fixação de próteses
dentárias, uma vez que pode vir a causar falha. [10]
6
2.2.1 Características geométricas das brocas helicoidais
A Figura 1 mostra as partes das brocas helicoidais e sua nomenclatura como
definidas pela norma ABNT NBR ISO 5419:2009. São elas:
Haste: É a parte superior da ferramenta e tem por objetivo fixar a broca na
máquina. Em brocas de menor diâmetro (até 15 mm), a fixação é feita por
mandris.
Guias: Superfície mais externa da broca, presente em duas regiões, uma para
cada aresta de corte. A superfície tem diâmetro maior que as paredes da
broca. As funções da guia é guiar a broca dentro do furo, e minimizar o atrito
contra as paredes.
Diâmetro: É a dimensão do envelope gerado pela rotação das guias da broca.
Núcleo: É a parte interior da broca confere e sua rigidez e seu diâmetro é
aproximadamente 0,16 do diâmetro total da broca.
Canais Helicoidais: É a superfície de saída da ferramenta, se destinam a
permitir a passagem dos cavacos removidos.
Arestas de corte principais: São as arestas principais de corte, por definição,
localizadas na parte da ferramenta que aponta no sentido de corte. O ângulo
entre elas no plano de referência da ferramenta é denominado ângulo de
ponta, geralmente igual a 118º.
Aresta transversal: É a aresta que liga as arestas de corte. Seu comprimento
está relacionado ao diâmetro do núcleo da broca.
Figura 1: Arestas, superfícies e outros elementos de uma broca helicoidal [11].
7
2.2.2 Materiais empregados em brocas helicoidais
As brocas helicoidais usualmente são de aço rápido ou de metal-duro. O aço
rápido foi desenvolvido para utilização em ferramentas de usinagem, possui boa
tenacidade se comparado com os aços comuns, elevada dureza e resistência ao
desgaste. O metal duro é feito a partir de carboneto de Tungstênio e ligantes metálicos
(Cobalto, Níquel, Titânio, Cromo ou uma combinação destes), possui maior dureza,
resistência ao desgaste e ao calor que o aço rápido, características desejáveis na
usinagem de superligas como o Romur 400 e o Ti6Al4V [11, 12].
As ferramentas podem ainda receber um revestimento. A utilização de
revestimentos permite atingir melhores resultados com relação ao desgaste da
ferramenta e a produtividade dos processos. Revestimentos com maior dureza
reduzem o desgaste abrasivo e também o atrito entre o cavaco e a ferramenta
moderando dessa forma o calor gerado e diminuindo solicitações térmicas da
ferramenta [13].
2.3 Parâmetros de usinagem
Os parâmetros de corte são definidos pelo operador e determinam a maneira
como o processo de corte será realizado. Na furação, os três parâmetros definidos
pelo operador são a velocidade de corte, velocidade de avanço e a profundidade de
usinagem. A partir desses parâmetros obtêm-se as grandezas relativas ao cavaco.
2.3.1 Velocidade de corte (Vc)
A velocidade de corte, mostrada na Figura 2, é a velocidade, instantânea do
ponto de referência da aresta cortante da ferramenta, de acordo com a direção e
sentido do corte. No caso da furação a velocidade varia de acordo com a distância
para o centro da broca. A velocidade é zero no ponto coincidente com o centro, e é
máxima na periferia. [13] Para um ponto qualquer ao longo da aresta de corte, sua
velocidade de corte é dada por:
(2-1)
n = rotação da ferramenta [rpm];
r é o raio entre o ponto e o centro da ferramenta [mm].
Considera-se a velocidade nominal aquela que ocorre no diâmetro externo da
broca [14]. Tem-se, portanto a equação da velocidade de corte neste ponto:
8
(2-2)
onde:
D = diâmetro da ferramenta [mm].
A especificação da velocidade de corte está relacionada com a vida da
ferramenta, material a ser usinado, acabamento superficial desejado e potência e
rotação disponíveis na máquina-ferramenta [14, 15]. Velocidades demasiado elevadas
podem gerar calor em excesso e, portanto desgaste acelerado. Velocidades baixas
demais levam a instabilidade, e possível quebra da broca.[10]
2.3.2 Avanço (Vf)
O avanço é o deslocamento por rotação da broca no sentido axial por
revolução. Obtém-se a velocidade de avanço (Vf), também mostrada na Figura 2, a
partir do avanço por rotação (f) pela equação a seguir:
(2-3)
Com maiores avanços, ocorre um aumento dos esforços que a máquina-
ferramenta precisa suportar, sendo esses esforços limitados pela sua resistência
estrutural. Do ponto de vista da ferramenta, grandes avanços podem também levar a
ruptura da aresta e do corpo da broca enquanto avanços demasiado pequenos podem
levar a vibração e geração de calor. [10]
Figura 2: Velocidades no processo de furação [16].
9
2.3.3 Profundidade de usinagem (ap)
É a profundidade de penetração da aresta principal. Mede-se ela
perpendicularmente ao plano de trabalho. Corresponde na furação em cheio, ao raio
da broca [15].
A profundidade de corte (ap), o avanço (f) bem como a espessura de usinagem
(h) e a largura de usinagem (b) que serão discutidas a seguir nessa sessão, estão
ilustrados na Figura 3.
Figura 3: Grandezas de corte de uma broca helicoidal.
2.3.4 Grandezas relativas ao cavaco
A espessura de usinagem (h) é dependente do avanço e do ângulo de ponta da
broca (σ), que podem ser vistos, na Figura 3. Calcula-se por:
(2-4)
Largura de usinagem (b) é a largura do cavaco indeformado, medido na
superfície de corte, segundo a direção perpendicular a direção de corte e também está
ilustrado na Figura 3. [15]
(2-5)
2.4 Desgaste em Brocas
O desgaste em ferramentas é definido pela norma ISO 3685 como "mudança
de sua forma original durante o corte, resultante da perda gradual de material".
Diferencia-se de avaria pelo fato de que a perda é relativamente constante e gradual
10
ao longo do uso. Mesmo em ferramentas que sejam suficientemente tenazes e por
isso estejam imunes à avarias o desgaste estará presente. O desgaste é progressivo e
surge tanto na superfície de folga quanto na superfície de saída. Uma ferramenta de
corte passa por três estágios em sua evolução de desgaste, que estão também
ilustrados na Figura 4 [9]:
Estágio I: É o início do corte, o desgaste é acelerado. Nesse estágio a
ferramenta está sofrendo uma adequação ao sistema tribológico envolvido no
processo de usinagem.
Estágio II: Região mais estável onde a taxa de desgaste é constante ao longo
do tempo, isto é, a curva possui uma inclinação constante. A ferramenta já se
encontra adaptada ao processo e os mecanismos de usinagem operam em
taxa constante
Estágio III: O nível de desgaste atinge estágio crítico, de maneira que as
temperaturas e tensões envolvidas no processo podem vir a promover eventual
quebra da ferramenta. Nesse estágio ocorre uma aceleração no desgaste,
aumentando acentuadamente sua taxa e, em um curto espaço de tempo,
levando a ferramenta a quebrar.
Figura 4: Desgaste ao longo do tempo de uso de uma ferramenta [17].
Define-se como "vida da ferramenta de corte" como o tempo que uma aresta
de corte pode trabalhar antes de ser reafiada ou substituída. Diversos critérios são
adotados simultaneamente para determinar o fim do tempo de vida da ferramenta,
dentre eles o desgaste de flanco médio, desgaste de flanco máximo, profundidade de
cratera, desgaste de entalhe ou a falha catastrófica. [9].
Os desgastes na broca se correlacionam com aumento do momento de torção
e da força de avanço. Em trabalhos desenvolvidos com aço ABNT 8640, por exemplo,
11
observa-se um aumento da força de torção de 30% e de avanço de 20% com o
avanço do desgaste, considerando uma perda de material de 600µm na aresta
principal como o critério de fim de vida [18].
Na furação, em condições adequadas de corte, é usual que o desgaste da
aresta secundária seja mínimo, e predomine o desgaste na aresta principal de corte.
Se o desgaste predominante for o da aresta transversal de corte, isso é sinal de que o
avanço utilizado está acima do adequado [12].
2.5 Usinabilidade
Usinabilidade é a facilidade com que um material é usinado [16]. Para
determinar a usinabilidade, leva-se em conta condições e parâmetros relativos à
máquina-ferramenta, à peça, aplicação de fluido de corte, parâmetros do processo e à
ferramenta. Esses fatores se alterados, podem produzir variação nos resultados dos
métodos de avaliação da usinabilidade, e por isso devem ser considerados ao comprar
a usinabilidade obtidas em diferentes testes. Mantendo esses fatores constantes, a
usinabilidade passa a depender apenas do material [14].
Os principais critérios de usinabilidade são [16]:
Desgaste da ferramenta. A usinabilidade pode ser determinada pelo
comprimento usinado antes que a ferramenta atinja os critérios de fim de vida
relativos ao desgaste. Na furação são monitorados os desgastes em diversas
regiões da broca, como flancos, guias, face e arestas de corte.
Forças de usinagem e potência consumida. Essa avaliação é feita analisando a
as forças e potências requeridas para usinar um determinado material, e a sua
evolução de acordo com o comprimento usinado;
Acabamento superficial. Esse critério se baseia no decaimento da qualidade do
acabamento superficial com o comprimento usinado.
2.6 Furação dos Materiais Estudados
2.6.1 Furação do Ti6Al4V
A principal dificuldade em empregar liga de titânio é o custo da matéria prima e
de processamento, tornando muito difícil o uso em indústrias com menor valor
agregado e menores requisitos de desempenho, restringindo o uso a indústrias como
12
a aeroespacial, biomédica, automobilística, etc. Do ponto de vista da usinagem, essa
dificuldade de processamento advém de um desgaste acelerado nas ferramentas.
O trabalho de BALAŽIC e KOPAČ [19] menciona como fatores que colaboram
para a baixa usinabilidade das ligas de titânio a sua ata resistência a tração, baixo
limite de escoamento e um módulo de elasticidade 50% mais baixo que o do aço,
assim como uma condutividade térmica 80% mais baixa.
O trabalho de SHARIF, RAHIM e SASAHARA [4] aponta as altas temperaturas
e sua distribuição desfavorável na ferramenta como o principal limitador da furação em
liga de titânio. Devido a baixa condutividade térmica das ligas de titânio, é possível
observar temperaturas acima de 900ºC na superfície de saída mesmo em velocidades
de corte não muito altas, o que torna o titânio altamente reativo quimicamente,
fragilizando a ferramenta, e também promovendo a adesão de material da peça a ela.
[20]
Além dos danos a ferramenta, as altas temperaturas de usinagem podem gerar
danos a própria peça. J.L. Cantero et al. [20] em sua publicação mostra um
experimento em liga de titânio Ti-6Al-4V no qual a peça apresenta danos superficiais
na forma de zonas afetadas por calor e tensões residuais. No experimento houve
mudança na liga de titânio de fase alfa para beta próximo a superfície usinada,
aumentando em 30% a sua microdureza.
SHARIF, RAHIM e SASAHARA [4] em sua publicação colocam o desgaste de
flanco não uniforme, lascamento e micro-fraturas como os principais mecanismos de
falha de uma broca na furação da liga Ti-6Al-4V. Nesse caso, o desgaste ocorre de
maneira predominante nas arestas de corte e nos flancos. O desgaste de flanco pode
levar também a aderência de material à ferramenta, especialmente porque o titânio é
altamente reativo em altas temperaturas e tem uma tendência de se soldar à
ferramenta. Essa aderência ocorre nas arestas principais e na aresta transversal de
corte, inicialmente protegendo-as, mas à medida que o material que se aderiu é
arrancado, ele leva junto lascas da ferramenta.
Para evitar uma perda prematura da ferramenta, e obter dados condizentes
com o uso em condições reais de usinagem, é necessária a definição correta dos
parâmetros de corte. O fabricante da broca sugere algumas configurações para o corte
de diferentes materiais, como é possível observar na Tabela 7. A liga de titânio se
encaixa na categoria de materiais resustentes a calor, portanto se encontra na última
linha, designada pela letra S. Os valores sugeridos para a velocidade de corte são
13
entre 15 e 50 pés/min, e o avanço entre 0,0004 e 0,002 pol./rot. No sistema métrico
isso dá uma velocidade de corte entre 4,6 e 15 m/mim e um avanço entre 0,01 e 0,05
mm/rot.
Tabela 6: Recomendações do fabricante para velocidade de corte e avanço na
furação de diversos materiais para a ferramenta utilizada [21].
Material Dureza:
Diâmetro da Broca: 1,0 a 2,95mm
Velocidade de Corte (pés/min)
Avanço (pol./rot.)
P
Aço Doce <180HB 200 (165-230)
0,0031 (0.0016-0.0047)
Aço Carbono Aço Liga
180-280HB 200 (165-230)
0,0031 (0.0016-0.0047)
280-350HB 165 (130-200)
0,0031 (0.0016-0.0047)
M Aço Inoxidável <200HB 100 (65-130)
0,0020 (0.0008-0.0039)
K
Ferro Fundido Resistência a tração < 350 Mpa
165 (130-200)
0,0032 (0.0016-0.0047)
Ferro Fundido Nodular
Resistência a tração < 450 Mpa
100 (65-130)
0,0024 (0.0008-0.0039)
N Liga de Alumínio
- 200 (165-230)
0,0032 (0.0020-0.0059)
S Liga Resistente a Calor
- 35 (15-50)
0,0012 (0.0004-0.0020)
2.6.2 Furação do Cromo-Cobalto
O trabalho de SHOKRANI, DHOKIA, e NEWMAN [5] classifica as ligas de Cr-
Co como de baixa usinabilidade e associa a usinagem delas às curtas vidas de
ferramenta. Ainda segundo o trabalho, isso se atribui especialmente à baixa
condutividade térmica, alta resistência do material, alta dureza.
Do ponto de vista da furação, as ligas de Cr-Co seguem os mesmos
parâmetros que para as ligas de titânio segundo as recomendações do fabricante da
broca mostradas na tabela 3, ou seja, uma velocidade de corte entre 4,6 e 15 m/mim e
um avanço entre 0,01 e 0,05 mm/rev.
14
O guia de propriedades de biomateriais editado por BLACK e HASTINGS [7]
sugere os seguintes parâmetros descritos na Tabela 7 para a furação sem maiores
considerações com relação ao diâmetro da broca.
Tabela 7: Recomendações para a furação de liga de Cr-Co [7].
Liga Condição Velocidade de corte (m/min)
Velocidade de Avanço (mm/rev)
Cr-Co Fundido Forjado ou Forjado e Recozido 2 - 4,5 0,025 - 0,15
Cr-Co Forjado
Solubilizado Solubilizado e Envelhecido artificialmente
6 4,5
0,05 - 0,1 0,05 - 0,1
15
3 Forças de Usinagem no Processo de
Furação
As forças de usinagem no processo de furação se correlacionam com o
desgaste da ferramenta, temperatura de corte, acabamento superficial e com falhas
catastróficas de broca. A compreensão dessas forças e dos parâmetros que as
influenciam é fundamental para o melhor aproveitamento da ferramenta, para os
resultados adequados nas peças produzidas e para a eficiência da produção.
Força de usinagem é a força total que atua na cunha cortante de uma
ferramenta. Por simplificação do estudo das brocas helicoidais, considera-se duas
cunhas de corte cada uma contendo aresta principal e transversal de corte. Cada
cunha possui uma força de usinagem resultante (F), designadas, respectivamente, e
.
As forças e presentes na furação podem ser decompostas nos seguintes
componentes (Figura 5): Força de corte (Fc) é a projeção da força de usinagem na
direção de corte; força de avanço (Ff), que é a projeção da força de usinagem sobre a
direção de avanço, ou seja, é coaxial a broca; e a força passiva (Fp), que é a projeção
das forças na direção radial a broca.
As forças passivas Fp1, e Fp2 possuem mesma direção e sentidos opostos,
portanto em uma broca ideal se contrabalanceiam dando em uma resultante nula. Ff1,
e Ff2 somadas equivalem à força de avanço total. E Fc1, e Fc2, que não são medidas
diretamente em experimentos de usinagem, são calculadas a partir do momento torsor
a partir da seguinte relação para a furação em cheio:
(3-1)
Figura 5: Forças atuando na furação [11].
16
A força de usinagem no processo de furação pode ser decomposta em [15]:
Força originária do corte do material nas duas arestas principais de corte (Ffa);
Força devido ao corte e extrusão de material na aresta transversal de corte
(Ffb);
Força presente nas guias e superfície de saída da broca (Ffc).
A força de usinagem é a soma desses componentes.
(3-2)
Para brocas helicoidais com afiação normal, a contribuição típica de cada
componente para a força de avanço está apresentada na Tabela 8 [15].
Tabela 8: Participações na força de avanço e momento de torção na furação [15].
Arestas Principais Arestas transversais Atritos
Força de Avanço (Ff) 39-59% 40-58% 2-5%
.
3.1 Pressão Específica de Corte
A pressão específica de corte relaciona as forças de usinagem com a área do
cavaco indeformado (Ac). Divide-se então a aresta em seguimentos de raio. As forças
decompostas na direção tangencial, radial e axial são:
(3-3)
onde a área de cada elemento de aresta é:
(3-4)
A área do cavaco total (Ac) para cada aresta após a penetração total do cone
na peça é:
(3-5)
17
A força de avanço para ambas as arestas somadas à aresta transversal se dá
por:
(3-6)
3.2 Pressão Específica segundo Kienzle
Para calcular a pressão específica de corte KC o modelo de Kienzle, que
apesar de ainda ser menos preciso que o modelo de Kronenberg, tem a vantagem de
poder ser comparado com outros processos de usinagem [7].
Kienzle propôs a seguinte formulação para a força de corte:
(3-7)
onde e são constantes características do material furado.
Para calcular a pressão específica de avanço Kz, uma adaptação do modelo de
Kienzle proposta por Spur calcula a força de avanço em cada aresta [7]:
(3-8)
Fazendo as devidas substituições é possível obter a força de avanço total para
duas arestas:
(3-9)
3.3 Forças na Furação de Ligas de Titânio
POUTORD [22] em seu estudo da furação a seco de fibra de carbono e liga de
titânio sobrepostos testou também a furação de apenas liga de titânio, e mediu como
as forças de avanço crescem ao longo do uso e consequente desgaste da ferramenta,
e encontrou um aumento de forças com os danos sofridos pela broca. Foi utilizada
uma broca de 12 mm de metal duro sem revestimento, velocidade de corte de 10
m/min e avanço de 0,20 mm/rev, o comprimento do furo é de 25,5 mm. Ao longo de 18
furos, a força de avanço aumentou em 100 N. Os resultados podem ser observados na
Figura 6 a seguir, a partir do lascamento da ferramenta no furo 14 há um aumento
substancial da força.
18
Figura 6: Evolução da força de avanço e do torque ao longo de uma série
furações [26]
Outro estudo de forças conduzido por ISBILIR e GHASSEMIEH [23] aponta um
crescimento 7,5% na força de avanço, de 750 N para 806 N em 15 furos. Após 36
furos a broca atinge o fim da sua vida, e a força de avanço é de 867 N, um aumento
de 16%. Os parâmetros utilizados foram 0,2 mm/rotação no avanço e 113 m/min como
velocidade de corte. A broca é de metal duro revestido com 8 mm de diâmetro e o
fluido de corte foi aplicado sob pressão por canais internos na broca.
Os parâmetros de usinagem como velocidade de corte e velocidade de avanço
também afetam diretamente as forças de usinagem. O artigo escrito por SHARIF,
RAHIM e SASAHARA [4] conclui que as forças de torque e avanço diminuem
levemente com o aumento da velocidade de corte, e que, em contraste, essas forças
aumentam significativamente quando o avanço aumenta. P. ZEILMANN [24] obtém
resultados parecidos, com a diferença que após uma redução inicial das forças com o
aumento da velocidade de corte há um sutil aumento. Foi utilizada uma broca de
metal-duro classe K10 de 8,5mm de diâmetro e aplicação de fluido do tipo MQF. Os
resultados obtidos que evidenciam os comportamentos das forças de acordo com os
parâmetros podem ser observados na Figura 7 e na Figura 8 a seguir.
19
Figura 7: Efeito da velocidade de corte sobre a força de avanço e o torque [24].
Figura 8: Efeito da velocidade de avanço sobre a força de avanço e o torque
[24].
Um fator altamente relevante na furação de liga de titânio e que influencia nas
forças de usinagem é a forma de aplicação do fluido de corte. O trabalho de PERÇIN
et al. [25] estuda a influência das diferentes formas de aplicação sobre a micro-furação
de liga Ti-6Al4V. No experimento foi utilizada uma broca de 0,7 mm. Foi testada a
usinagem a seco; com mínima quantidade de fluido; por inundação e criogênica,
empregando diversos avanços, entre 10 e 70 mm/min, e velocidades de corte, entre 2
e 22 m/min. As aplicações com menor capacidade de resfriamento geraram forças de
avanço menores, uma vez que há um amolecimento pelo calor, sendo a menor força
de avanço atribuída ao corte a seco, como pode ser visto na Figura 9. Por outro lado,
os melhores acabamentos superficiais foram provenientes da condição de MQFC e
menores desgastes e formação de rebarba advêm da aplicação criogênica de fluido de
corte. Este estudo obteve forças de avanço crescentes de forma proporcional ao
avanço, e que variaram entre 12 e 23 N.
20
Figura 9: Forças de avanço para cada taxa de avanço e modo de aplicação de
fluido de corte [22]
3.4 Calculo das Constantes de Kienzle para o Ti6Al4V
Para comparação com os resultados experimentais apresentados nesse
trabalho, uma estimativa de forças de avanço para a liga de titânio obtida pelo método
de Kienzle. Para obter as constantes da equação foi conduzida uma análise a partir
dos resultados experimentais de PERÇIN et al. [25], que realizaram experimentos com
micro-usinagem de liga titânio Ti-6Al-4V.
Linearizando a equação adaptada de Kienzle (Eq.(3-8)) pode-se obter as
constantes kz1.1 e 1-mz:
(3-10)
Na Tabela 9 encontram-se calculados os valores de h, b e dos logaritmos
necessários para encontrar as constantes da equação de Kienzle. A força tabelada é
para ambas as arestas de corte.
21
Tabela 9: Dados para a determinação das constantes da equação de Kienzle para a liga de titânio. [25]
Vf [mm/min]
f [mm/rot]
fz [mm/dente]
Fz
[N]
h [mm]
log(h) b
[mm] log(Fz/b)
10 0,001 0,0005 14,5 0,0005 -3,32 0,36 1,30
30 0,003 0,0015 16,9 0,0014 -2,84 0,36 1,37
50 0,005 0,0025 18,1 0,0024 -2,62 0,36 1,40
70 0,007 0,0035 19,8 0,0034 -2,47 0,36 1,44
A partir desses valores é possível chegar a um ajuste linear a partir do método
dos mínimos dos quadrados, e a partir da equação da reta do ajuste linear encontrar
por inspeção as constantes desejadas. A reta obtida a partir do ajuste linear pode ser
vista na Figura 10.
Figura 10: Ajuste linear por método dos mínimos dos quadrados para obtenção de constantes de Kienzle.
Equação de ajuste linear indica que:
(3-11)
Por inspeção conclui-se que:
1-mz = 0,16, e, portanto: mz = 0,84;
E que:
22
log(kz1.1) = 1,8, então: kz1.1 = 63 N/mm²
Para a micro-usinagem, isso é para a furação são os casos em que h < 0,1
mm, KLOCKE, GERSCHWILER e ABOURIDOUANE [26] propõe em seu trabalho
adaptações ao modelo e sugerem a seguinte equação:
(3-12)
onde:
kz é a força de avanço dividida pela área b.h, medida em mN/µm²;
kz1,1 é a força requerida para cortar o cavaco indeformado de 1 µm x 1 µm;
mz é uma constante adimensional do material.
Linearizando torna-se:
(3-13)
De maneira análoga ao caso anterior:
(3-14)
Linearizando por método dos mínimo dos quadrados, obtém-se a reta que pode ser
vista na Figura 11.
Figura 11: Ajuste linear por método dos mínimos dos quadrados para obtenção de constantes de Kienzle modificado.
23
Portanto:
mf = 0,84;
log(kf1.1) = 1,3, então kf1.1=19,95;
3.5 Furação de Ligas de Cromo-Cobalto
A quantidade de estudos disponíveis sobre furação em ligas de Cr-Co ainda é
significativamente menor que a das ligas de titânio e estudos de furação, se
existentes, são escassos. Para obter-se uma compreensão melhor das características
da usinagem do material, é necessário então recorrer aos dados e conclusões geradas
a partir de outros processos além da furação.
O trabalho apresentado por SHOKRANI, DHOKIA, e NEWMAN [5] estudou o
fresamento de ligar de cromo-cobalto em diversas condições de aplicação de fluido de
corte. Os parâmetros utilizados foram velocidade de corte de 200 m/min, rotação de
5305 rpm, avanço de 636,6 mm/min, profundidade de corte axial de 1 mm e radial de
4mm. A conclusão atingida é que o resfriamento criogênico obteve resultados
significativamente melhores em relação à mínima quantidade de fluido tanto em
acabamento superficial quanto desgaste da ferramenta. Difusão e abrasão foram os
mecanismos de desgaste dominantes.
AYKUT et al. [27] conduziram experimentos em faceamento em uma liga de
Cromo-Cobalto denominata Stellite 6 utilizando ferramentas com recobrimento PVD e
sem recobrimento. Foram utilizadas profundidades de corte variando entre 0,25 e
0,75mm, avanços entre 60 e 100 mm/min e velocidades de corte entre 30 e 40 m/min.
Como se pode apreciar na Figura 10, as forçar de corte apresentaram uma tendência
crescente acentuada de acordo com o uso e consequente desgaste da ferramenta,
sofrendo reduções abruptas apenas quando os parâmetros de corte foram mudados.
O trabalho conclui que as forças aumentam com a profundidade de corte e com o
avanço, já as velocidades de corte tiveram pouca influência nos esforços. Além disso,
o desempenho de ferramentas com recobrimento é sensivelmente melhor que sem.
24
Figura 12: Forças de corte no processo de faceamento de uma liga de Cr-Co
ao longo de uma série de experimento [27].
O trabalho de SHAO, et al. [28] investigou o processo de torneamento
utilizando ferramentas de metal duro com recobrimento. Foi empregada uma
velocidade de corte variando entre 16 e 43 m/min, avanços de 0,20 e 0,25 mm/rev e
profundidade de corte de 0,3 mm, sem o uso de fluido de corte. A partir de seus
experimentos, é possível notar que a vida da ferramenta decresce com o aumento do
avanço. A principal causa de falha das ferramentas foi desgaste excessivo de flanco.
Fraturas na superfície de saída também foram observadas. Dependendo do
recobrimento da ferramenta, lascamento e deformação plástica também puderam ser
observadas.
25
4 Materiais e Métodos
Esse capítulo apresenta os experimentos e as condições em que foram
realizados. São apresentados os corpos de prova, ferramenta de corte, centro de
usinagem, parâmetros de corte e instrumentação para medição e aquisição de dados.
4.1 Experimento
Com o objetivo de avaliar a evolução da força de avanço de usinagem na
furação com o desgaste e compará-la em liga de Cromo-Cobalto Romur 400 e em liga
de Titânio Ti6Al4V, foi feita uma sequência de furos variando as velocidades de
avanço de forma correspondente em ambos os materiais. Dessa forma há uma
paridade entre os comprimentos usinados e condições de usinagem ao longo do
processo experimental. Essa sequência de diferentes avanços é similar à condição de
operação real de uma broca.
A velocidade de avanço começa configurada em 40 mm/min para os cinco
primeiros furos. Ao longo do experimento essa velocidade é variada, mas entre
mudanças, a velocidade de 40 mm/min é retomada com o objetivo de fornecer uma
comparação direta com os primeiros furos usinados. A força de avanço de cada furo
então foi captada pelo sistema de aquisição com uma frequência de 24 kHz.
4.2 Corpos de Prova
Foram utilizados dois corpos de prova, um de liga de titânio Ti-6Al-4V e outro
de Romur 400, uma liga comercial de cromo-cobalto voltada para próteses
odontológicas. Os corpos de prova com os furos já realizados podem ser observados
afixados ao dinamômetro na Figura 13.
26
Figura 13: À esquerda, corpo de prova de liga de titânio, à direita corpo de prova de cromo-cobalto.
4.3 Ferramenta de Corte
Foi utilizada a broca MWS0160SB produzida pela Mitsubishi. Essa broca é de
metal-duro com revestimento de (Al,Ti)N, denominado VP15TF, e com canais internos
para passagem de fluido de corte.
O diâmetro dessa broca, de 1,6mm, é adequado para fazer furos padrão M2,
conforme recomendação da norma NBR10625. O ângulo de ponta (σ) é de 145º. Essa
broca apresenta afiação do tipo X-thinning, de forma a se auto-centrar, e apresentar
forças de corte mais baixas ao reduzir a aresta transversal. As dimensões da broca
são mostradas na Tabela 10, em conjunto com a Figura 14.
Tabela 10: Características da broca utilizada. [21]
Código Diâmetro da Broca D1 (mm)
Profundidade de furação (l/d)
Fluido de Corte (Interno/externo)
Dimensões (mm) Tipo
L1 L2 L3 D4
MWS0160SB 1,6 1 Interno 68 10,6 8,0 3 A
Figura 14: Características da broca utilizada [21].
27
4.4 Parâmetros de Corte
A velocidade de corte para todos os furos foi de 10,05 m/min. A velocidade de
avanço foi variada. O comprimento de cada furo é de 4 mm. Os parâmetros
específicos de cada furo estão listados na Tabela 11.
Tabela 11: Parâmetros de usinagem dos testes.
Testes Velocidade de
Avanço [mm/min]
Velocidade de Avanço por
volta [mm/volta]
Velocidade de
corte [m/min]
Profundidade do furo [mm]
1- 5, 11, 16, 21
40 0,020
10,05 4 6 - 10 30 0,015
12 - 15 35 0,0175
17 - 20 45 0,0225
4.5 Centro de Usinagem
O centro de usinagem utilizado foi uma máquina DECKEL MAHO DMC 65 V
com comando da Siemens do LABOMAP no ENSAM-Cluny na França (Figura 15).
Este é um centro de usinagem CNC de três eixos, com um espaço de trabalho de
650x500x500mm, e tem rotação máxima de 18000 revoluções por minuto, e uma
potência máxima disponível de 15 kW. A fixação da ferramenta à máquina se deu por
fretamento.
Figura 15: Centro de usinagem DM65V.
28
4.6 Medição da Força de Avanço
Foi utilizado um dinamômetro piezelétrico designado pelo código comercial
9256C2, produzido pela Kistler para até três componentes ortogonais de força.
Construtivamente esse dinamômetro consiste em quatro sensores de força com uma
alta pré-carga montados entre placas metálicas. Dentro de cada um desses quatro
sensores há três anéis de cristal, cada um dos anéis medindo forças em um eixo, X, Y
e Z.
A fixação da peça foi realizada por meio de parafusos utilizando os furos na
superfície do dinamômetro. O dinamômetro foi fixado à mesa de trabalho por meio de
um mordente. A Figura 13 mostra a o dinamômetro fixado a mesa de trabalho e a peça
fixada ao dinamômetro.
Esse modelo de dinamômetro tem um alcance de medida que vai de -250 a
250N para força e -11 a 11 N.m para torque. Sua sensibilidade é relativamente alta, -
26pC/N, e possui baixo erro devido a temperatura e alta frequência natural, na ordem
de grandeza dos 5kHz. Seu limiar mínimo é de 0,002N. A área de montagem é de
39x80 mm.
O dinamômetro é ligado a um amplificador de sinais e o amplificador a um
sistema de aquisição (Figura 16). Foi utilizado um módulo NI 9215 acoplado em um
chassi NI cDAQ-9188 e um computador com o software DAISY Lab.
Figura 16: Sistema de aquisição de dados da National Instruments.
29
5 Resultados Experimentais
Nesse capítulo são apresentados os resultados obtidos nos experimentos de
furação em ambas as ligas metálicas. Primeiro é apresentada uma estimativa pelo
modelo de Kienzle para os esforços, em seguida os resultados de força ao longo de
cada furo obtidos em cada configuração de avanço; A análise das etapas da furação;
A evolução das forças médias de avanço; Uma comparação entre as duas ligas; O
desgaste das ferramentas ao final dos furos e por fim uma análise do resultado da
furação.
5.1 Forças de Avanço Experimentais
As medições de força foram com uma frequência de 24 kHz. O calculo do
comprimento usinado do furo (Lf) pode ser feito relacionando o tempo decorrido a
partir do início do corte e a velocidade de avanço:
(5-1)
As forças aquisitadas nas furações no Romur 400 e no Ti6Al4V são
apresentadas da Figura 17 à Figura 20, na ordem em que os furos forma feitos. Foi
acrescentado um filtro que elimina os ruídos de mais alta frequência para tornar a
visualização das diversas forças em sobreposição possível, essa filtragem foi feita a
partir da função smooth do Matlab com grupos de 1000 pontos.
É possível perceber a partir da análise dessas figuras que a furação na liga de
Cr-Co apresenta patamares de força mais altos mais estáveis, enquanto a liga de
titânio apresenta muito mais variações de força ao longo do processo.
30
Figura 17: Forças de avanço dos testes 1 a 5 com avanço de 40 mm/min no
Romur 400(a) e no Ti6Al4V (b).
Figura 18: Forças de avanço dos testes 7 a 10, com avanço de 30 mm/min, no
Romur 400 (a) e no Ti6Al4V (b).
Figura 19: Forças de avanço dos testes 12 a 15, com avanço de 35 mm/min,
no Romur 400 (a) e no Ti6Al4V (b).
31
Figura 20: Forças de avanço dos testes 17 a 20, com avanço de 45 mm/min,
no Romur 400 (a) e no Ti6Al4V (b).
O Ti6Al4V apresenta uma maior resistência a tração, e, no entanto as forças de
avanço são menores que no Romur 400. Uma possível explicação é sua baixa
resistência ao cisalhamento, tipicamente em torno de 55% de sua resistência a tração,
no entanto não há dados disponíveis para o Romur 400 que permitam essa
comparação. Além disso, outras propriedades podem ser fatores determinantes para a
força de avanço, como por exemplo, a adesão do material a superfície,
5.1.1 Identificação das Etapas da Furação
Para fins de compreensão das etapa de crescimento da força, o comprimento
do cone da broca (e) pode ser calculado pela Equação (5-2) a partir de seu diâmetro e
seu ângulo de ponta e de seu raio (Figura 21). O valor obtido é de 0,25 mm.
(5-2)
Figura 21: (a) Contato inicial da broca com a peça; (b) cone da broca penetrou
totalmente a peça.
32
Para analisar as diferentes etapas da usinagem em ambos os materiais foram
escolhidos e sobrepostos sem distinção especial um furo em cada configuração de
avanço, gerando assim duas figuras, uma para cada material (Figura 22 e Figura 23).
Figura 22: Sobreposição das forças em furações no Romur 400, uma com
cada avanço utilizado.
Figura 23: Sobreposição das forças em furações na liga de Ti6Al4V, uma com
cada avanço utilizado.
Observa-se na Figura 22 e na Figura 23 um comportamento típico para a
furação.
33
Na etapa I há um crescimento acelerado das forças devido ao primeiro contato
da ferramenta com a superfície da peça. A força observada na transição entre
a etapa I e a etapa II é aproximadamente equivalente à parcela de contribuição
da aresta transversal à força total;
Na etapa II há m aumento gradual da força a medida que o cone da ferramenta
penetra a peça usinada. A transição da fase II para a fase III ocorre com a
penetração completa do cone da ferramenta. O comprimento calculado do
cone equivale ao ponto de transição encontrado;
A etapa III apresenta um patamar relativamente estável de força, tendo o cone
já penetrado totalmente o material;
A etapa IV corresponde ao fim do processo de furação, com uma queda rápida
da força.
A região de maior interesse para o presente estudo é a III, que, passado o
transiente de penetração do cone, representa o regime permanente de corte. Nos
experimentos, essa região se encontra aproximadamente entre 0,25 e 3,7mm. Para
fins de aproveitamento de dados para o cálculo das forças médias de avanço, foi
considerado um intervalo de medição entre 0,5 e 3,7 mm na liga de cromo-cobalto
para evitar o uso de uma região que apresenta uma pequena queda repentina após a
penetração do cone; e um intervalo de medição entre 1,5 e 3,7mm na liga de titânio,
para evitar alguns ruídos excessivos que apareceram no início da furação
especialmente no furo 2.
5.1.2 Forças Médias e Pressões Médias de Avanço
Para fins de comparação com os resultados experimentais, foram obtidas
estimativas para a força de avanço utilizando as constantes da equação de Kienzle
anteriormente calculadas (Tabela 12) e também a versão modificada para micro-
usinagem da equação de Kienzle (Tabela 13).
Tabela 12: Estimativas de forças para a furação de liga de titânio a partir da equação de Kienzle.
Vf [mm/min]
Fz [N]
40 50,3
30 48,1
35 49,3
45 51,3
34
Tabela 13: Estimativas de força para a furação de liga de titânio a partir da equação de Kienzle modificada.
Vf [mm/min]
Fz [N]
40 54,0
30 51,5
35 52,8
45 55,0
Os resultados experimentais estão representados na Tabela 14 e Tabela 15. A
força de avanço média foi obtida através da média aritmética dos pontos de força
aquisitados no intervalo de medição de cada material apresentado na seção anterior.
Como exemplo, a Figura 24 mostra o teste 2 no Cromo-Cobalto, com o intervalo de
medição utilizado para obtenção da força de avanço média, entre 0,5 e 3,7 mm, e
exibe a força de avanço média encontrada para este ensaio.
Figura 24: Forças no teste 2 em Cromo-Cobalto com força de avanço média
O intervalo de confiança de 95% para as forças médias de avanço foi calculado
por meio de uma aproximação pela distribuição de Student bicaudal com infinitos
graus de liberdade, que fornece um valor t = 1,92.
Obtém-se então o intervalo de confiança por meio da seguinte equação:
(5-3)
35
A média no teste 2, por exemplo, foi calculada a partir de um n = 115232
pontos de tomada de força e obteve uma média de 44,0 N. Utilizando estes valores do
exemplo, o intervalo de confiança de 95% para a média é de 0,02 N.
O cálculo da pressão específica de avanço média se deu dividindo a força de
avanço média pela área do cavaco indeformado. No caso do ensaio 2 a área é de
0,016mm, portanto a pressão é de 2753,1 Mpa. O intervalo de confiança é calculado
de forma análoga, dividindo o intervalo de confiança da força de avanço média pela
área.
Tabela 14: Resultados experimentais de força e pressão médias para furação em liga de cromo-cobalto
Teste Comprimento usinado
(mm)
Avanço (Vf)
(mm/min)
Força Média de Avanço
(N)
Intervalo de
Confiança da Força
(95%) (N)
Pressão Específica de
Avanço Média (MPa)
Intervalo de Confiança da
Pressão (95%) (Mpa)
1 2 40 41,07 0,02 2567,1 1,1
2 6 40 44,05 0,02 2753,1 1,3
3 10 40 48,01 0,03 3000,6 1,7
4 14 40 47,42 0,02 2963,9 1,1
5 18 40 48,35 0,02 3021,6 1,2
6 22 30 46,31 0,03 3859,3 2,5
7 26 30 46,87 0,02 3906,3 1,7
8 30 30 49,97 0,03 4164,6 2,7
9 34 30 49,70 0,03 4141,8 2,7
10 38 30 50,54 0,03 4211,6 2,7
11 42 40 51,91 0,02 3244,4 1,3
12 46 35 53,40 0,02 3814,4 1,3
13 50 35 54,80 0,03 3914,4 2,2
14 54 35 51,20 0,02 3657,4 1,4
15 58 35 52,72 0,03 3765,9 2,1
16 62 40 54,41 0,03 3400,5 2,0
17 66 45 55,34 0,02 3074,4 1,2
18 70 45 57,17 0,03 3176,2 1,6
19 74 45 54,27 0,03 3014,8 1,6
20 78 45 54,30 0,03 3016,8 1,6
21 82 40 58,63 0,02 3664,6 0,9
36
Tabela 15: Resultados experimentais de força e pressão para furação em liga de titânio
Teste Comprimento usinado
(mm)
Avanço (Vf)
(mm/min)
Força Média de
avanço (N)
Intervalo de Confiança da Força (95%)
(N)
Pressão Específica de
Avanço Média (MPa)
Intervalo de Confiança da
Pressão (95%) (Mpa)
1 2 40 32,07 0,02 2004,8 1,3
2 6 40 30,61 0,02 1913,2 1,3
3 10 40 28,63 0,02 1790,0 1,1
4 14 40 31,60 0,03 1975,3 1,7
5 18 40 32,85 0,03 2053,3 2,0
6 22 30 35,91 0,03 2993,3 2,3
7 26 30 33,82 0,02 2818,5 1,6
8 30 30 32,01 0,01 2668,1 1,2
9 34 30 32,16 0,02 2680,7 1,3
10 38 30 30,74 0,01 2562,3 1,1
11 42 40 37,11 0,02 2319,5 1,4
12 46 35 36,36 0,02 2597,2 1,4
13 50 35 33,39 0,02 2385,0 1,5
14 54 35 35,35 0,02 2525,5 1,6
15 58 35 35,00 0,03 2500,2 1,8
16 62 40 37,88 0,03 2367,8 1,8
17 66 45 44,00 0,03 2445,0 1,5
18 70 45 39,62 0,03 2201,3 1,6
19 74 45 38,43 0,03 2135,1 1,5
20 78 45 35,99 0,033 1999,5 1,8
Uma comparação entre as forças revela que as forças médias de usinagem
para a liga de cromo cobalto são significativamente maiores, começando na ordem de
40 Newtons no ponto mais baixo e atingindo quase 60 Newtons no ponto mais alto, já
para a liga de titânio a força média de avanço mais baixa é da ordem de 27 newtons e
a mais alta de 40 newtons.
Além disso, no Cr-Co ao comparar as forças de avanço médias do 1º furo com
as do 16º furo, escolhidos pois ambos usando uma velocidade de avanço de 40
mm/min, obtêm-se um aumento de 41,07 N para 54,41 N, um aumento de 32%. Na
mesma comparação agora entre o 1º furo e o 21º furo cuja força é 58,63 N, é possível
constatar um aumento da força média de avanço de 43%. E no Ti6Al4V é possível, ao
comparar o 1º furo cuja força de avanço é de 32,07 N com o 16º furo, com 37,88N,
nota-se um crescimento de 18%.
37
A representação gráfica das pressões médias se encontra na Figura 25 e
Figura 26 a seguir. A variação entre as pressões para os diferentes avanços é menor
na liga de titânio que na de Cr-Co. As pressões de avanço médias servem para fazer
comparações com outros experimentos que utilizem diferentes parâmetros de corte.
Figura 25: Evolução das forças médias de avanço em furações consecutivas na liga de Cromo-Cobalto.
Figura 26: Evolução das forças médias de avanço em furações consecutivas na liga Ti6Al4V.
38
5.1.3 Ajuste Linear da Força de Avanço
A representação gráfica dos resultados de força e os ajustes linear pelo método
dos mínimos dos quadrados com suas retas correspondentes se encontram na Figura
27, o intervalo de confiança desses resultados se encontra na Tabela 14 e na Tabela
15. Esses ajustes que evidenciam uma tendência geral de crescimento das forças por
seus coeficientes lineares positivos de 0,17 N/mm para o Romur 400 e de 0,12 N/mm
para o Ti6Al4V. Isso significa que as forças na liga de titânio apresentam uma taxa de
crescimento equivalente a 70% da constatada na liga de cromo cobalto. Além disso,
evidencia-se também uma variação maior em torno da reta de tendência das forças
médias para a liga de titânio que para a de cromo cobalto.
Figura 27: Comparação das forças médias de avanço de acordo com o
comprimento usinado
39
5.1.4 Razão Entre Forças de Avanço e Usinabilidade Relativa
Foi calculada a razão entre as forças médias de avanço, e, por conseguinte
entre as pressões médias de avanço. Dividiu-se a força de avanço média na liga de
titânio pela na liga de cromo cobalto e obteve-se uma razão para cada par de furos, os
valores encontrados estão tabelados na Tabela 16. Agregando todos esses pontos por
meio de uma média aritmética obtém-se um índice relativo de usinabilidade de 0,69,
isto é, a usinabilidade relativa da liga de Cromo-Cobalto é 0,69 da usinabilidade da liga
de Titânio. Ou seja, a força de avanço média na furação da liga de titânio foi então, em
média apenas 69% da força requerida para a liga de cromo cobalto.
Tabela 16: Razão entre forças e pressões na furação de ambas as ligas
Comprimento Usinado
(mm)
Razão entre Forças e Pressões (Ti6Al4V/Romur 400)
2 0,78
6 0,69
10 0,60
14 0,67
18 0,68
22 0,78
26 0,72
30 0,64
34 0,65
38 0,61
42 0,71
46 0,68
50 0,61
54 0,69
58 0,66
62 0,70
66 0,80
70 0,69
74 0,71
78 0,66
Média 0,69
40
Figura 28: Razão entre as forças médias ao longo do comprimento usinado
Ao representar graficamente os dados na Figura 28, e fazer uma regressão
linear, é possível perceber que apesar de haver uma variação da razão entre 0,6 e 0,8,
a tendência é pela estabilidade, havendo um coeficiente linear da ordem de 1,3x10-5
.
Isso se explica uma vez que as forças na liga de titânio são equivalentes a 69%
das forças no cromo-cobalto, e a taxa de evolução das forças é 70% da taxa no
cromo-cobalto. O crescimento relativo das forças é equivalente, preservando a razão
de forças ao longo do processo.
41
6 Conclusão
Esse estudou analisou a usinabilidade através de forças de avanço em
superligas metálicas tipicamente utilizadas em próteses dentárias por meio do estudo
das forças de avanço envolvidas na furação. Foram feitos vinte furos na liga de titânio
Ti6Al4V e vinte e um na liga de cromo-cobalto Romur 400 variando a velocidade de
avanço.
Os seguintes resultados podem ser destacados:
Os níveis de força obtidos em cada na liga de cromo-cobalto foram
consideravelmente mais estáveis que os obtidos com a liga de titânio. O
Ti6Al4V apresentou também uma variabilidade maior das forças médias
ao longo das furações.
Foi utilizado o modelo de Kienzle modificado por Spur e o modelo
proposto para microfuração para obter resultados teóricos para as
forças de avanço com a finalidade de comparação com os resultados
experimentais. Esses modelos não levam em conta a velocidade de
corte e o desgaste, o que levou a diferenças com relação ao resultado
experimental.
É possível constatar que a liga de titânio requer forças de avanço
médias mais baixas, apesar do material ter uma resistência mecânica a
tração maior, representando em média 69% da força de avanço
requerida pela liga de cromo cobalto. Além disso, a taxa de crescimento
das forças por comprimento usinado é menor para a liga Ti6Al4V, 0,12
N/mm, representando 70% da taxa no Romur 400, que foi de 0,17
N/mm. Comparando o 1º e o 16º testes em cada material, feitos com a
mesma configuração de avanço, 40 mm/min, é possível perceber na
liga de titânio um aumento percentual menor da força de avanço, de
18%, enquanto no Romur 400 esse aumento é de 32%. O liga de titânio
Ti6Al4V apresenta, portanto uma usinabilidade superior a da liga de
Cromo-Cobalto Romur 400.
Para estudos futuros seria interessante uma bateria de ensaios para determinar
a velocidade ideal de usinagem para ambos os materiais de forma a minimizar o
desgaste; Realizar um estudo das temperaturas da peça ao longo do processo de
usinagem e buscar compreender como elas afetam a microestrutura e as
características mecânicas dos materiais; Comparar os diferentes regimes de aplicação
42
de fluido de corte, a seco, mínima quantidade, criogênica, etc. do ponto de vista dos
desgastes, esforços e temperaturas geradas;
Para a liga de Cr-Co que especificamente possui poucos ensaios de furação,
propõem-se novos experimentos utilizando uma gama mais ampla de avanços e
velocidades de corte para a compreensão de como as forças de corte variam com os
parâmetros utilizados.
43
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