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PORTUGUÊS- 11º ANO – PROF. FERNANDA MONTEIRO SERMÃO DE SANTO ANTÓNIO AOS PEIXES Padre António Vieira LINHAS DE LEITURA No Exórdio, Padre António Vieira apresenta o conceito predicável, “Vós sois o sal da Terra”, e explica as razões pelas quais a terra está tão corrupta. Ou a culpa está no sal (pregadores), ou na terra (ouvintes). Se a culpa está no sal, é porque os pregadores não pregam a verdadeira doutrina, ou porque dizem uma coisa e fazem outra ou porque se pregam a si e não a Cristo. Se a culpa está na terra, é porque os ouvintes não querem receber a doutrina, ou antes imitam os pregadores e não o que eles dizem, ou porque servem os seus apetites e não os de Cristo. Ao apresentar o conceito predicável, Padre António Vieira, introduz o tema do sermão, mas apesar de tudo desvia-se do tema e preocupa-se apenas com a razão pela qual a terra está corrupta, partindo do princípio de que a culpa é dos ouvintes. Consegue isto, uma vez que o sermão é proferido no dia de santo António, aproveitando assim o exemplo deste. Santo António não obtinha resultados da sua pregação e os homens até o quiseram matar, em vez de desistir resolveu pregar aos peixes. Assim se viu Padre António Viera, sem obter resultados, a terra continuava corrupta, resolvendo igualmente pregar aos peixes, seguido o exemplo de S. to António. Na primeira parte, o orador vai louvar as virtudes dos peixes e em seguida repreende- los. O capítulo II (Exposição) contempla os louvores aos peixes de caráter geral, recorrendo-se ao exemplo de Jonas para mostrar que os homens são muito piores que os peixes. Como suas qualidades temos: - Bons ouvintes / obedientes; - Primeira criação de Deus; - Melhores do que os homens; - Livres, puros, longe dos homens; Estas qualidades são, por antítese, os defeitos dos homens.

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PORTUGUÊS- 11º ANO – PROF. FERNANDA MONTEIRO

SERMÃO DE SANTO ANTÓNIO AOS PEIXES

Padre António Vieira

LINHAS DE LEITURA

No Exórdio, Padre António Vieira

apresenta o conceito predicável, “Vós sois o

sal da Terra”, e explica as razões pelas quais a

terra está tão corrupta. Ou a culpa está no sal

(pregadores), ou na terra (ouvintes). Se a culpa

está no sal, é porque os pregadores não pregam

a verdadeira doutrina, ou porque dizem uma

coisa e fazem outra ou porque se pregam a si e

não a Cristo. Se a culpa está na terra, é porque

os ouvintes não querem receber a doutrina, ou

antes imitam os pregadores e não o que eles

dizem, ou porque servem os seus apetites e não

os de Cristo.

Ao apresentar o conceito predicável,

Padre António Vieira, introduz o tema do sermão, mas apesar de tudo desvia-se do tema e

preocupa-se apenas com a razão pela qual a terra está corrupta, partindo do princípio de que a

culpa é dos ouvintes. Consegue isto, uma vez que o sermão é proferido no dia de santo António,

aproveitando assim o exemplo deste. Santo António não obtinha resultados da sua pregação e os

homens até o quiseram matar, em vez de desistir resolveu pregar aos peixes. Assim se viu Padre

António Viera, sem obter resultados, a terra continuava corrupta, resolvendo igualmente pregar aos

peixes, seguido o exemplo de S.to António.

Na primeira parte, o orador vai louvar as virtudes dos peixes e em seguida repreende-

los. O capítulo II (Exposição) contempla os louvores aos peixes de caráter geral, recorrendo-se ao

exemplo de Jonas para mostrar que os homens são muito piores que os peixes. Como suas

qualidades temos:

- Bons ouvintes / obedientes;

- Primeira criação de Deus;

- Melhores do que os homens;

- Livres, puros, longe dos homens;

Estas qualidades são, por antítese, os defeitos dos homens.

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PORTUGUÊS- 11º ANO – PROF. FERNANDA MONTEIRO

Neste, como em todos os

capítulos, há um exemplo prático de

S.to António, para o louvar no seu dia.

O capítulo III (Confirmação) é

igualmente de louvor aos peixes, mas

agora de carácter particular. Padre

António Vieira utiliza quatro peixes

para mostras a relação entre o

homem e o divino, como os peixes se

dão a estes cuidados e os homens não pensam em tais coisas:

- Peixe de Tobias: Tem umas entranhas e um coração que expulsam os demónios e simboliza o

poder purificador da palavra de Deus.

- Rémora: peixe que quando se agarra e um navio tem força suficiente para o conduzir sozinha.

Simboliza o poder da palavra do pregador – guia das almas.

- Torpedo: produz descargas elétricas que faz tremer o braço do pecador. Simboliza o poder da

palavra de Deus, de fazer tremer os pecadores que pescam na terra tudo quanto encontram.

- Quatro-olhos: tem dois pares de olhos, uns para cima e outros para baixo. Simboliza o dever dos

cristãos em tirar os olhos da vaidade terrena, olhando para o céu sem esquecer o inferno.

Todos estes louvores que Padre António Vieira faz aos peixes são antíteses aos defeitos

dos homens, assim simbolizando os seus vícios.

Seguidamente parte-se para as

repreensões aos peixes, primeiramente de

carácter geral (Cap. IV) e depois de carácter

particular (Cap. V).

No caráter geral, Padre António Vieira

acusa os peixes de se comerem uns aos

outros, recorrendo a um exemplo dos homens

para explicar o que eles faziam. Assim, os

homens praticam antropofagia social, ou seja exploração uns dos outros. O orador faz uma

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comparação entre a antropofagia ritual dos Tapuias (índios brasileiros) e a antropofagia social dos

homens, considerando esta última mais grave que a anterior, porque, muitas vezes, procuram tanto

a exploração, que nem os mortos escapam. O mais grave de tudo, é que são os grandes que

comem os pequenos, ou seja, são precisos muitos pequenos para alimentar um grande. Acusa-os

igualmente de cegueira, vaidade e de terem a maldade.

Estas repreensões são feitas com o objetivo de mudarem os homens, ou pelo menos fazê-

los pensar, mesmo que não haja uma mudança rápida.

Aqui, há também um exemplo prático de Sto António que nunca praticou antropofagia social

e que trocou a riqueza pela simplicidade e humildade.

De carácter particular, Padre António Vieira usa quatro exemplos de peixes que se referem

a tipos comportamentais. O roncador que simboliza os arrogantes, o pegador, que simboliza os

oportunistas, o voador, que simboliza os ambiciosos e o pior de todos, o polvo, que simboliza o

traidor e o hipócrita. Este último, tem uma aparência de santo e manso e um ar inofensivo, mas na

essência é traiçoeiro e maldoso, é hipócrita e faz-se de amigo dos outros e no fim “abraça-os”.

Neste capítulo são usados os exemplos de São Pedro, Sto Ambrósio, São Basílio e o Gigante

Golias.

Por fim, a despedida, no capítulo VI (Peroração), onde o orador retoma os pregadores de que

falava no conceito predicável, servindo-se dele próprio como exemplo alegando que não estava a

cumprir a sua função. Alega também que ele (homens) e os peixes, nunca vão chegar ao sacrifício

final, uma vez que os peixes já vão mortos e os homens vão mortos de espírito.

Padre António Vieira diz que a irracionalidade, a inconsciência e o instinto dos peixes, são

melhores do que a racionalidade, o livre arbítrio, a consciência, o entendimento e a vontade do

homem.

CONTEXTUALIZAÇÃO

Barroco – arte de deslumbrar e impressionar; culto da forma, como reação ao século XVI

(classicismo).

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Cultismo

- Culto da forma e sobreposição de ornamentos;

Características do Barroco na Literatura:

- Continuidade da temática do séc. XVI: bucolismo, petrarquismo, amor platónico;

- Permanência das características da estrutura externa das composições classicistas;

- Reação ao séc. XVI: reflexão moral, evasão, busca dos prazeres espirituais, futilidade de muitos temas;

- Preocupação em provocar o espanto, surpreender e aturdir o espírito à força dos ornamentos e

burilamentos; arquitetura rebuscada;

- Estilo rítmico e movimentado, cheio de cores poéticas: o vermelho dos rubis, da púrpura e das rosas; o

verde das esmeraldas ou o azul do mar, do céu e das safiras; o branco dos lírios, das açucenas, do marfim,

da prata e do cristal;

- Alusão e subentendidos através das metáforas e das antíteses;

- Cultismo e conceptismo.

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- Complexidade formal e rebuscamento literário, com sacrifício da clareza do conteúdo;

- Riqueza vocabular;

- Uso exagerado das metáforas, das hipérboles, dos paradoxos, mas também das perífrases, das

hipálages, das sinédoques, das anáforas, dos trocadilhos, dos hipérbatos, etc.

- Abuso de jogos de palavras, de imagens e de construções.

Conceptismo

- Jogo dos conceitos;

- Enigmas e malabarismos intelectuais;

- Construção mental e alegoria analógica (que correlaciona realidade e pensamento);

- Elegância da subtileza.

Porquê o nome deste sermão dado por Padre António Vieira?

- Homenagem ao Sto. António (pregado no dia de Santo António);

- Segue o exemplo do sermão de Santo António (aos peixes);

- Tal como Sto. António tenta converter os hereges (expulsem os demónios dentro de si), também

Padre António Vieira tenta fazer isso com os colonos portugueses no Brasil.

Objetivos:

- Pretende agitar as consciências (abrir os olhos), conduzir à reflexão;

- Pretende evitar o mal e preservar o bem (sal que tenta salgar).

Todo o sermão é uma alegoria!

Porque os peixes são metáfora dos Homens, as suas virtudes são metáforas dos defeitos dos

Homens e os seus vícios são metáfora dos vícios dos Homens.

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CAPÍTULOS ASSUNTO

EX

ÓR

DIO

Capítulo I

Conceito Predicável: “Vós sois o sal da terra”

• Há muitos pregadores (sal):

E no entanto a terra está corrupta… Porque o sal não salga ou a terra não se deixa salgar

• Santo António exemplo de pregador:

Os homens não o ouviam, pregou aos peixes O P.

e António Vieira, seguindo o exemplo de

Sto António vai pregar aos peixes

EX

PO

SIÇ

ÃO

E C

ON

FIR

MA

ÇÃ

O

Capítulo II

Capítulo III

Capítulo IV

Capítulo V

Louvores aos peixes, em geral: Bons ouvintes; obedientes; primeiros animais da criação; melhores do que os homens; livres e puros.

Louvores aos peixes, em particular: Peixe de Tobias (curativo); Rémora (guia); torpedo (faz tremer);

Quatro-olhos.

Repreensões aos peixes, em geral: Comem-se uns aos outros; os grandes comem os pequenos; Cegueira; vaidade.

Repreensões aos peixes, em particular:

Roncadores (arrogância); pegadores (oportunismo); voadores (ambição); polvo (hipocrisia, traição).

PE

RO

RA

ÇÃ

O

Capítulo VI

Conclusão

• Apelo aos ouvintes

• Louvor a Deus

1) Estrutura do texto oratório (o sermão)

Segundo a retórica clássica, a estrutura do texto argumentativo organiza-se em quatro partes

Exórdio

Apresentação do tema e captação da atenção do auditório.

Exposição

Narração/explanação dos factos.

Confirmação

Defesa da tese com argumentos.

Peroração

Resumo do que foi dito e apelo à adesão dos ouvintes.

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2) Progressão temática – conceito predicável, tema e desenvolvimento do tema

Quando lemos o "Sermão de Santo António aos Peixes" temos a sensação de que

o texto é uma peça de arquitetura, um edifício muito bem projetado que vai sendo

construído progressivamente, com uma organização lógica, na qual todas as peças se

articulam de forma coesa.

Por outro lado, de acordo com as regras do sermão barroco, o conceito predicável, apresentado no

exórdio, tem como objetivo apresentar o tema. Assim, o tema deste Sermão seria a Palavra dos

Pregadores que evita a corrupção da terra.

Tal não acontece, no entanto, pois o tema é deslocado para a própria corrupção que vai

ser a base de toda a argumentação.

COMO SE FAZ UM SERMÃO

"Há-de tomar o pregador uma só matéria, há-de defini-la para que

se conheça, há- de dividi-la para que se distinga, há-de prová-la com a

Escritura, há-de declará-la com a razão, há-de confirmá-la com o exemplo,

há-de amplificá-la com as causas, com os efeitos, com as circunstâncias,

com as conveniências que se hão-de seguir, com os inconvenientes que

se devem evitar; há-de responder às dúvidas, há-de satisfazer as

dificuldades, há-de impugnar e refutar com toda a força da eloquência os

argumentos contrários, e depois disto há-de colher, há-de apertar, há-de

concluir, há-de persuadir, há-de acabar. Isto é sermão, isto é pregar…"

Padre António Vieira, Sermão da Sexagésima

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