waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

78
WAIMIRI ATROARI a histOria que ainda não foi contada. Jos6 Porfirio F. de Carvalho. C331w Carvalho, Jose Porfirio Fontenele de Waimiri Atroari a histOria que ainda n g o foi contada. Brasilia, 1982. 180p. ilust. 1. Waimiri Atroari — HistOria. I. Titulo. CDU: 39(-081:811) (091) 0 Copyright Jose Porfirio Fontenele de Carvalho Todos os direitos de publicagOes deste Livro s5o de Jose Porfirio Fontenele de Carvalho 14 1 4/14/RI ATROM1 a histOria que ainda ndo foi contada. 78162

Upload: caetano

Post on 23-Jun-2015

605 views

Category:

Documents


4 download

DESCRIPTION

A história escrita por quem participou dos fatos.

TRANSCRIPT

Page 1: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

WAIMIRI ATROARI

a histOria que aindanão foi contada.

Jos6 Porfirio F. de Carvalho.

C331w Carvalho, Jose Porfirio Fontenele deWaimiri Atroari a histOria que ainda n go foi

contada. Brasilia, 1982.180p. ilust.

1. Waimiri Atroari — HistOria. I. Titulo.

CDU: 39(-081:811) (091)0 Copyright

Jose Porfirio Fontenele de Carvalho

Todos os direitos de publicagOes deste Livros5o de Jose Porfirio Fontenele de Carvalho

1414/14/RI ATROM1

a histOria que aindando foi contada.

78162

Page 2: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

1--tp dAQA-L cot,,c,)

WAIMIRI ATROARI

A histOria que ainda n5o foi contada.

Josè Porfirio Fontenele de Carvalho.

3

I N D I C E

OS WAIMIRI ATROARI 4BARBOSA RODRIGUES E OS CR ICHANAS 11A DEFESA DOS INDIOS WAIMIRI ATROARI PELOSERVICO DE PROTECAO AOS INDIOS — SPI 17OS WAIMIRI ATROARI "VERSUS"4TH PHOTO CHARTING SQUADRON 23OS WAIMIRI ATROARI 30POSTO INDIGENA I RAOS BRIGLIA 33A MISSAO GALLERI 38ATAQUE NO RIO ALALAU 49A ESTRADA BR-174 MAN US-CARACARAI-BOA VISTA 61GILBERTO PINTO FIGUEIREDO COSTA 85OS WAIMIRI ATROARI Depois da morte de GILBERTOPINTO FIGUEIREDO 106A RESERVA INDIGENA WAIMIRI ATROARI 110DIMINUICAO DA RESERVA WAIMIRI ATROARI 115NOVA ESTRA DENTRO DA TERRA DOS INDIOSWAIMIRI ATROARI 118FOTOS 121MAPAS 131

Dedico este trabalho, aos que, mesmo sem saber porque estavam fazen-do, sacrificaram suas vidas, em defesa dos indios.

Presto aqui minha homenagem pessoal a Gilberto Pinto Figueiredo e aJo5o Dionisio do Norte, o "Jo5o Maracajr, que sacrificaram suas vidas nadefesa dos indios Waimiri-Atroari.

Quando iniciei este trabalho, nos idos de 1974, n5o imaginei que levariatanto tempo para conclu (do.

Mc) se trata de nenhum trabalho com pretens5o cientifica ou acaderni-ca, trata-se de depoimentos pessoais sobre fatos que testemunhei e de resumosobre o resultado de exaustiva pesquisa bibliogrâfica e documental.

Por isto, ao escrever este trabalho, rigo sigo nenhum chav5o estótico co-mumente usado, escrevo e narro os epis6dios de forma como o pesquiseie da maneira que costumo contar est6rias.

"Eu nunca quis saber porque os indios mataram ou deixaram de matarTenho-os como meus filhos, considero-os o prolongamento de minha familia.Ando armado na floresta, mas näo atiro nos indios em caso de ataque.Se me matarem um dia, paciència ...""Gilberto Pinto Figueiredo", Indigenista morto em servico, na floresta,noPosto Indigene de Atrac5o Abonari em 29 de dezembro de 1974.

Page 3: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

OS WAIMIRI ATROARI

Todas as noticias que encontrei nos documentos pesquisados sobre osindios denominados Waimiri Atroari e os contatos mantidos corn aquele gru-po tribal, n5o garantem que eles se auto-denominem como sac) conhecidos.

Sabe-se que os indios que habitam a area de influencia do rio Camanau,Jauaperi o Santo Antonio do Abonari,quando se referem aos indios que habi-tarn a area de influéncia dos rios Alalau e Uaturn5, chamam-lhes de "Atroari".E aqueles quando fazem referencia aos indios do Camanau e Jauaperi, SantoAntonio do Abonari, denominam-lhes de Waimiri. Entretanto são poucos oshistoriadores que fazem referencias aos indios habitantes na regi5o corn-preendida pelos rios Jauaperi, Camanau, Uatum5, Santo Antonio do Abona-ri, Alalau e seus afluentes, corn a denominac5o Waimiri Atroari.

As primeiras noticias que se tern dos indios habitantes na margem es-querda do Rio Negro, compreendendo a area que se estende do rio Jatapu aoRio Branco (vide mapa n901), datam do seculo XVII.

Barbosa Rodrigues, famoso etnálogo brasileiro, foi um dos primeirosque manteve contatos amistosos corn os indios Waimiri Atroari, que ele naocasi5o, denominou-os de Crichanas.

Sobre os contatos corn, indios, Barbosa Rodrigues, publicou urn traba-lho em forma de livro intitulado "Jauaperi, Pacificac5o dos Crichanas"(1885).

Sabe-se tambarn que o missionario Frei Teodoro das Mercés, urn dosprimeiros exploradores do Rio Negro, manteve contato corn os WaimiriAtroari, denominando-os entretanto de "Aroaquis".

Os Waimiri Atroari, eram tambern conhecidos corn a denominac go deTarumas, Caripunas, Cericunas, Crichanas, Alalaus, Jauaperi e Wautemiri.

O relacionamento entre os indios Waimiri Atroari corn os segmentos dasociedade colonizadora manteve-se sem maiores problemas ate o inicio dosaculo XIX, quando o comércio e a exploracao dos castanhais atingiram eco-nomicamente grande importancia. As terras ocupadas pelos Waimiri Atroaris5o ricas ern produtos vegetais, destacando-se a Castanha do Brasil, Balata,Pau Rosa (3) e outros artigos de grande procura comercial naquela apoca.

Foram criadas nas margens do Rio Negro, pequenas vilas como Moura,Carvoeiro e Airdo sem que fosse registrado nenhuma resistencia por parte dosindios a fixac5o daqueles povoados dentro do territ6rio ocupados por eles.4

ApOs a ida para a regi5o (area de influência dos rios Jauaperi e RioBranco) do Major Manoel Ribeiro de Vasconcelos, nomeado pelo Presidenteda Provincia do Amazonas, Dr. Jo5o Pedro Dias Vieira, ern 1856, iniciou-seuma verdadeira guerra, aberta e desigual, contra os indios Waimiri Atroari.

Para "pacificar" os indios Waimiri Atroari, o Major Vasconcelos, seguiuno dia 29 de abril de 1856, levando consigo, ao Rio Jauaperi, 50 guardasbem armados prontos para entrarem ern acào contra os indios. A pacificackentendida pelo Major Vasconcelos, era de forcar a bala o rendimento dos in-dios, para que os comerciantes exploradores de Castanha pudessem realizarsuas coletas sem que fossem molestados.

Major Vasconcelos, subindo o rio Jauaperi, entrou corn seus guardasno Igarapa Uatupura, onde foi encontrado uma grande aldeia de indiosWaimiri e all foi travado urn combate entre os pracas e os indios, que colhi-dos de surpresa e pela desigualdade de armas fugiram apavorados, deixandonas proximidades da maloca urn grande nOmero de mortos.

Os comandados do Major Vasconcelos, saquearary as casas dos indios,lancaram fogo ern toda a maloca, chegando a morrerem dentro, \ferias crian-cas e velhos que n5o conseguiram fugir.

Segundo relatórios da expedic5o, devem ter morrido mais de 300 indiosentre adultos, criancas e velhos.

Depois do ataque, o Major Vasconcelos retornou a Manaus para relataro fato, e a seu pedido foi instalado na foz do pequeno Igarapa chamadoMacucuaua, urn destacamento militar para garantir aos coletores de castanha,seguranca nécessaria aos seus trabalhos.

Muitos dos castanheiros atmtrios pela presenca do destacamento militar,foram estabelecendo-se nas margens dos rios Jauaperi e Alalau, dando conti-nuidade a explorac5o das matas, dentro do territhrio dos indios WaimiriAtroari.

N5o custou muito, os indios passaram a tentar afastar os invasores deseus dominios. Fu go Jord5o, urn dos moradores que se estabelecera na mar-gem esquerda do rio Jauaperi, no local mais tarde conhecido como Mahaua,foi atacado pelos indios a flechadas, juntamente corn as pessoas que residiamcorn ele e estavam participando da coleta de castanha.

Na foz do igarapé Tunuau, afluente do rio Jauaperi, os indios saquea-ram a casa de D. Catarina que se encontrava ausente, fazendo corn que de-pois disto todos os que se aventuraram a subir o rio Jauaperi abandonassemde vez suas residéncias.

5

Page 4: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Toda vez que urn dos invasores das terras dos Waimiri Atroari avistavaurn rndio, fazia-Ihe fogo. 0 Indio por sua vez e quando era possivel, revidava.0 "crime" dos indios aparecia, mas as vitimas inchgenas nunca tornavam-seconhecidas. Nessa guerra desigual o Indio, sempre levava o pior e isto fatal-manta provocava nos indios maior ira contra os colonizadores.

Ern 1867, Frei Samuel Luciani, vigario da parequia de Moura, vila amargem direita do Rio Negro, estabelecida nas proximidades da foz do RioJauaperi, elaborou urn projeto para "Pacificar os Indios Waimiri Atroari".Foi então Presidente da Provincia do Amazonas, Epaminondas de Melo econseguiu os meios para levar adiante o seu projeto.

Entretanto, Frei Samuel n5o saiu de Moura. Enviou ao rio Jauaperi emmissão de "Pacificacgo", guardas armados para manter contatos corn indios.0 grupo de guardas ao encontrar-se corn os indios, por falta de conhecimen-to e mains de lidar corn ales, foi hostilizado e retornaram a Moura, tologo foi possivel.

Frei Lucianni, escreveu ao Presidente da Provincia comunicando o ocor-rico e pediu reforcos de mais guardas armados para levar adiante sua desas-trosa miss5o.

O Presidente da Provincia do Amazonas, Epaminondas de Melo, negouo pedido do Frei L rescindindo ern seguida o contrato firmado corn o padrepara "Pacificar os Indios".

Os atritos entre indios e castanheiros continuaram toda vez, que dentrodo territorio dos Waimiri Atroari, encontravam-se.

No dia 12 de Janeiro de 1879, a vila de Moura, foi atacada pelos indiosWaimiri. Os moradores ao notarem a presenca dos indios nas proximidades,tiveram tempo de refugiar-se numa ilha existente na frente da vila (a ilha eraconhecida corn a denominacao de ilha Curupiari ou Sabia). Os moradores deMoura, depois do ataque dos indios, passaram a denominar a ilha onde esca-param dos indios, de ilha da Salvack, nome pela qual ainda e conhecida.

0 ataque dos indios a vila de Moura, I i mitou-se quase a danos materiais,apenas dois dos moradores morreram,isto porque reagiram, a bala, a pre-senca dos indios.

Quando a noticia da presenca dos indios em Moura, chegou a capital daProvincia do Amazonas (dias depois), o Presidente fez seguir para Moura

6

Quando as forcas atingi ram Moura, os indios j6 tinham se afastado.

0 Brigadeiro Comandante, dividiu a forca ern duas frentes de combatee sairam a procura dos Indios.

Subindo o rio Jauaperi, uma das lanchas encontrou-se corn urn grupo deindios que seguiam ern 11 Ubas de retorno as suas malocas.

As Ubes foram alvejadas corn tiros de artilharia e todas metidas a pique.Os Indios que viajavam nas embarcacOes morreram quase todos e segun-do o relat6rio da expedic5o, foram mais de uma centena.

A segunda lancha, tendo no seu comando o Tenente Pastana, encostouna margem esquerda do Rio Jauaperi, acima do local onde as Lib& forampostal a pique, tendo seguido corn seus comandados por terra. Ao encontrar-se corn urn grupo de indios foi feito uma intensa fuzilaria que durou "ate anoite chegar".

Seguindo pelo rio Curiau, partindo de Tauapessassu, saiu outra expedi-c5o armada contra os indios.

Pr6ximo a foz do Curiau, a expedick encontrou-se corn um grupo decerca de 80 indios, que apOs a fuzilaria dos expedicionarios, poucos escapa-ram, fugindo mata a dentro.

Nesse revide a presenca dos indios na vila de Moura, mais de 400 indiosmorreram alvo das balas dos colonizadores.

Depois do retorno das expedicOes, em Moura ficou sediada uma Lanchade Guerra, destinada ao combate sistemetico aos indios Waimiri Atroari.

No més de outubro de 1874, o Tenente Antonio de Oliveira Horta, co-mandante do destacamento militar da vila de Moura,flagrou nas proximida-des do povoado, urn grupo de cerca de 200 (tidies Waimiri Atroari, que fo-ram mortos a bala pelos pracas sob seu comando. Apenas o prapa de nomeQuitiliano Jose Ferreira ficou ferido entre os guardas da guarnick militarde Moura.

No dia 9 de novembro do mesmo ano, o Tenente Horta, comandando20 pracas armados, a bordo da lancha de guerra que se achava estacionadaem Moura, seguiu ao rio Jauaperi a caca dos indios Waimiri Atroari.

7

Iniciou-se ent5o, uma guerra sem treguas, entre os exploradores de pro-dutos naturals e os Indios Waimiri Atroari.

uma forca do 39 Regimento de Artilharia e outra do Corpo ProvisOrio, sob ocomando do Brigadeiro Joao de Barros Falc5o, a bordo de duas lanchas deartilharia.

Page 5: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

No dia 12 do mesmo mes s, por volta das 10 horas, a expedic5o, aindano rio Jauaperi, encontrou aparentemente abandonadas 5 Ubes, que porordem do Comandante Horta foram destrufdas. Os indios,possiveis passagei-ros daquelas embarcacOes n go apareceram.

Em seguida, urn pouco mais acima, encontraram mais 2 Ubas,tambemaparentemente abandonadas. Estas, o Comandante Horta resolveu levy-laspara Moura, como se fossem trofaus de guerra.

No dia 21 de novembro, o sentinela do destacamento militar, ao avis-tar um Indio nas proximidades do povoamento, deu urn tiro matando-o,alertando a populacgo e o prOprio destacamento.

Iniciou-se entgo mais urn sangrento combate, tendo o Tenente Horta,usado sua forca militar ajudado pelos moradores da vila.

0 Comandante Horta era sempre auxiliado em suas missees contra osindios pelos "civis" de nome Manoel Gonsalves, vulgo Bicudinho, HermO-genes Rodrigues Pastana, Hermenegildo Rodrigues Pastana e alguns outroscorn menos freq6ancia.

Em 1875, o Presidente da Provincia do Amazonas, Dr. Domingos JaciMonteiro, em seu relatOrio anual, comentando os atos do Tenente Horta cornrelacgo aos indios Waimiri Atroari frizava: "fez-se neles(nos indios) umagrande mortandade, ja quando o perigo ja estava passado e eles retiravam-se.Deste modo dificulta-se a conciliac5o com aqueles selvagens, em que cresceo espfrito de vinganca com repetic go das ofensas".

Apesar de tudo, os indios continuaram aparecendo nas cercanias davila de Moura, ora no Parana da Desgraca, ora no Parana do Lim go, nas ilhasUrupunan e na ilha do Cureru, sendo sempre recebidos a tiros de fuzil.

Morreram muitos indios "Incontaveis" segundo noticias dos jornais daépoca.

Muitos indios entretanto conseguiram fugir, levando consigo algunsmortos e feridos.

ApOs o ataque, o Tenente Horta organizou uma patrulha e saw em per-seguicao aos indios que conseguiram escapar.

Novo encontro deu-se entre indios e os comandados pelo Tenente Hor-ta e mais uma vez a mortandade ocorreu. Ainda assim alguns feridos conse-guiram refugiarem-se nas matas pr6x imas as margens do rio Jauaperi.

No dia seguinte continuou a perseguic g o aos indios feridos.

Escondidos entre a folhagem das arvores "onde estavam trepados e si-lenciosos" encontravam-se cerca de 23 indios feridos.

Os guardas armados ao encontrarem os indios escondidos e trepadosnos galhos das érvores ficaram euf6ricos "como cacadores entusiasmadosante um grupo de guaribas". Cada um dos expedicionerios procurava desta-car-se em sua pontaria "Apontavam a arma e, ao disparar, o pobre Indioca fade onde se encontrava abrigado, no meio de gargalhadas gerais e gritos desatisfacgo. "Assim cairam todos, a excess go de um que ficou preso a umgalho".

No outro dia, os prapas voltaram ao local da chacina e apOs empilharemos corpos, lancaram fogo.

8

0 Tenente Horta foi afastado do Comando Militar incubido de protegerMoura e em seu lugar assumiu o Comando o Tenente Malaquias Neto.

No dia' 16 de dezembro de 1876, o Tenente Malaquias em"viagem deinspecgo" dirigiu-se ao rio Jauaperi, a bordo da lancha de guerra que faziaparte de seu destacamento.

Ja no rio Jauaperi, ao encontrar uma Uba aparentemente abandonadanuma praia, prOximo ao Tanau, mandou encostar a lancha para averigua-cOes.

Ao aproximar-se da margem onde se encontrava encostada a Lib& alancha encalhou nos bancos de areia formados no leito do rio. De repentesurgiram vários indios atacando a lancha a flechadas.

Houve fogo cerrado de artilharia "querendo os indios tomar a lancha,cobriram-na de flechas, pelo que a tripulac go fugiu para os porOes depoisde dar urn tiro de metralha com rod fzio de proa que, n5o estando preso pelovergueiro, saltou ao conves. Ficaram alguns marinheiros e indios feridos,morrendo muitos desses" (Jornal "Amazonas" — 28 de abril de 1878).

Em 1878, o entgo Presidente da Provincia do Amazonas, Barg° de Ma-racaju, convidou o padre Jose Maria Vila, para assumir a miss go de catequisaros indios Waimiri Atroari, chamados na Opoca de Crichanas.

Ao tentar aproximar-se dos indios, o Padre Josè Maria Vila, foi hostili-zado e seus acompanhantes reagiram a bala, entretanto ri g° se registrounenhuma morte.

Page 6: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Corn o insucesso do primeiro contato, o Padre Jose Maria desistiu desua miss5o.

0 destacamento policial sediado em Moura, continuou corn regularida-de e insistencia a cacada aos indios habitantes no rio Jauaperi e seus afluen-tes.

Em 08 de junho de 1886, o Presidente da Provincia do Amazonas, desi-gnou o Frade Jesualdo Machetti para, corn os Padres que vieram da Europaem sua companhia, organizar e dirigir o servico de catequese aos indios Cri-chanas (Waimiri Atroari).

Frade Jesualdo, achando-se sem condicees para desempenhar a cateque-se dos indios, n5o chegou a iniciar o trabalho para o qual fora designadopelo Presidente da Provincia.

Diante da recusa do Frei Jesualdo, o Presidente da Provincia nomeouo Frei Venancio Zelochi, que chegou a it as cabeceiras do Rio Branco (hojeTerritOrio Federal de Roraima) a procura de interpretes entre os indiosMacuxi, que pertencem ao mesmo grupo liguistico dos Waimiri Atroari.

Como n5o conseguiu trazer para o rio Jauaperi, os interpretes que ne-cessitava pars o seu trabalho, Frei Venancio tambern desistiu de catequisaros Waimiri Atroari.

Corn mais esta desistencia de religiosos para a catequese dos indiosWaimiri Atroari, o Presidente da Provincia do Amazonas, Coronel Conrado,difterminou a instalac5o na foz do Rio Branco e rio acima de Postos Milita-res, visando a protec5o dos segmentos da sociedade colonizadora que jainvadiam o territOrio indigena a procura das riquezas naturais.

Em 1889, retorna o Tenente Horta ao comando do Destacamento Po-licial encarregado de proteger a vila de Moura. E tambêm volta a persegui-c5o implacavel e sisternatica aos indios Waimiri Atroari.

A bordo da lancha de guerra, sediada em Moura, e acompanhado dosub-delegado daquela vila, o elemento conhecido pela alcunha de Rato, oTenente Horta volta ao rio Jauaperi e no lugar conhecido como Maracaceencontrou-se corn os indios Waimiri Atroari, ocorrendo intensa fuzilaria,onde mais de uma centena de indios tombou sem vida.

Moura foi o local, de onde, no seculo passado, partiram a maioria dasexpedicOes de caca ao indios Waimiri Atroari.

BARBOSA RODRIGUES E OS CRICHANAS

Em 29 de marco de 1884, o Diretor do Jardim Botanic° do Amazonas,etn6logo e botanic°, Barbosa Rodrigues a bordo de urns lancha da Marinhade Guerra, comandada pelo Tenente Jose de Almeida Bessa, acompanhadoainda do alferes Manoel Ferreira da Silva e do Conde Ermano Stradeli, par-tiu de Manaus com destino ao Rio Jauaperi pars tentar urn contato amistosocorn indios habitantes daquela regi5o.

Na vila de Moura, incorporou-sea expedic5o os Srs. Manoel Gonsalves,Zeferino Jararaca e o Indio Macuxi, Petro Ferreira Marques Brasil,que parti-cipava na condicgo de interprete, pois tudo indicava que o idioma dos indiosCrichanes (Waimiri Atroari) como denominava o etnOlogo Barbosa Rodri-gues, pertencia ao mesmo grupo linguistico dos indios Macuxi, habitantes noalto Rio Branco (hoje regi5o do Territ6rio Federal de Roraima).

A expedick partiu da vila de Moura, no dia 01 de Abril de 1884, a bor-do da lancha da Marinha, que foi cedida a Barbosa Rodrigues pelo Presidenteda Provincia do Amazonas, exclusivamente pars a miss5o.

Na boca do Parana Calango, que une o Rio Negro ao Rio Jauaperi, alancha ficou fundeada e os expedicionerios, seguiram a viagem daquele pontoem diante em urns canoa, levando a reboque mais duas que transportavambrindes e artigos para alimentacão.

Numa das ilhas do lago denominado Mahaua foram avistadas 4 Ubas,tripuladas por cerca de 40 indios.

Foi o primeiro contato dos expedicionerios chefiados por Barbosa Ro-drigues corn os indios. "Um alarido bort-Niel e gritos ameacadores retumba-ram pela floresta. Era de fazer estremecer o ruido produzido pelos galhos dasarvores que se quebravam e a vozeria dos selvagens" assim expressou-se Bar-bosa Rodrigues ao narrar em seu relatOrio o primeiro encontro corn os in-dios.

Barbosa Rodrigues, muito receioso,procurou se aproximar do grupo deindios que gesticulava e acenava aos gritos.

Atraves do interprete, o Indio Macuxi que acompanhava a expedic5o,convidou-os a irem ate a canoa, pois ali tinha brindes e presentee para eles.

Os outros expedicionarios ficaram dentro da canoa, pois temiam aqualquer momento o ataque dos indios.

10 11

Page 7: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Os indios cercaram Barbosa Rodrigues e depois de muito insistir, aceita-ram a acompanha-lo ate onde encontravam-se as canoas corn os objetos des-tinados a presentes.

Mas, os companheiros de Barbosa Rodrigues, ao verem o grupo de in-dios se aproximando das canoas, remaram corn pressa, se afastando da praia,o deixando sozinho corn os indios. "De repente, escreveu Barbosa Rodrigues,os selvagens, me envolveram, me agarraram e me levaram a forca para urncOrrego que dividia a ilha na parte coberta de vegetac5o. 0 cOrrego era bemprof undo. N5o me atrevi a atravessa-lo porque tornava-se necessario nadar eeu não podia por estar doente e vestido".

Procurando conter os Indios, fazendo gestos corn as mãos, demonstran-do que não sabia nadar, conseguiu Barbosa Rodrigues, acalme-los. Depois demandar distribuir aos indios os presentes que tinha levado na expedic5o, isrecebendo dales, em troca, as suas prOprias flechas e arcos, deixando-ospor conseguinte desarmados.

Procurando sempre demonstrar o use dos presentes entregues aos in-dios, Barbosa Rodrigues, aparentemente conquistara naquele primeiro con-tato, a confianca dos Crichanas (Waimiri Atroari). Os brindes "trocados" fo-ram principalmente — Machados, Tercados, Facas, Tesouras, Agulhas, Calcas,Camisas e Chapeus.

Os indios, por sua vez gostaram dos Oculos e do bigode de Barbosa Ro-drigues. Queriam que Ihes dessem o bigode. E como logicamente não era pos-sivel, demonstravam certa tristeza par n5o o possu Crem, porque Segundo opr6prio Barbosa Rodrigues, os indios passavam os dedos pelo lado superiordo labia e fazendo gestos, comparando com o seu bigode.

Enfim, terminaram fazendo Barbosa Rodrigeus clang& corn eles, cola-cando-o no meio de uma grande roda de dangarinos

Mais de uma semana, conviveu Barbosa Rodrigues corn os indios. Quan-do os viveres acabaram, a expedicão retornou a Moura para reabastecimento.

No dia 12 de abril do mesmo ano, a expedic5o novamente entrou no rioJauaperi. Nas proximidades do lugar conhecido como Sapa, encontraram2 Lib& corn varios indios a bordo. Barbosa Rodrigues, fazendo sinais,con-seguiu que as embarcacOes dos indios aproximassem das que viajava,e elepassou dal em diante a viajar numa das canoas dos Indios, que seguiam corndestino ao lugar conhecido como Mahaua.

Depois de troca de presentes, a expedic5o seguiu viagem rumo as cabe-ceiras do rio Jauaperi.

12

Na foz do igarape Chichinau, a expedic5o encontrou urn novo grupo deIndios, tendo Barbosa Rodrigues, mantido contatos amistosos com eles, rea-lizando tambem troca de presentes.

Todos os contatos mantidos por Barbosa Rodrigues e os indios foram a-mistosos e coroados de exitos. Os indios pareciam confiar no cientista. A ex-pedick chefiada por Barbosa Rodrigues, contou corn a ajuda do alferes Ma-noel Ferreira da Silva, Tenente Bessa e o Conde Stradeli, destacando-se aindaa participacao do Indio Macuxi, Pedro Ferreira Marques Brasil, que serviu de in-ter-prate nos primeiros contatos corn os indios Crichanas (Waimiri Atroari).

Acompanhado de sua esposa e filha, Barbosa Rodrigues, em 3 de junhodo mesmo ano, pita de Manaus em nova expedick ao Rio Jauaperi.

A populac5o de vila de Moura, criou varias dificuldades para a secla daexpedic5o de Barbosa Rodrigues, que passara naquele povoado, para reabas-tecer-se de viveres, pois sabedores de sua miss5o pacifista, a populac5o desa-provava a ack do etnalogo, preferindo a ac5o do "Tenente Horta" e suasexpedicOes punitivas.

Enfrentando toda sone de dificuldades, Barbosa Rodrigues retornou aorio Jauaperi, chegando a 26 de julho ao lugar denominado como Tauaquera,que ao chegar rebatizou-o corn a denominacao de TeoduretOpolis, em home-nagem ao ent5o Presidente da Provincia do Amazonas, patrono de suas expe-dicOes.

Depois de dois dias de espera pelos indios, eles n5o apareceram. BarbosaRodrigues, resolveu seguir viagem rio acima. No lugar denominado por Bar-bosa Rodrigues, de Triunfo, local onde na expedic5o anterior teve contatoamistosos com os indios, as embarcacOes foram encostadas para pernoite. Aoamanhecer, Barbosa Rodrigues, acompanhado pelo alferes Ferreira, e doIndio Pedro Ferreira Marques Brasil, e ainda de mais cinco indios da nac5oTucano, seguiu por terra a procura da maloca dos indios Crichinas (WaimiriAtroari).

Encontrava a poucas horas da margem do rio, uma maloca vazia, cornsinal de que ainda estava habitada. Deixaram no local os brindes que traziame retornaram ao lugar onde se encontravam acampados seus companheiros deexpedick.

Urn dia depois da visita a maloca, surgiu nas proximidades do acampa-mento da expedic5o, urn numeroso grupo de indios que fizeram um "enormealarido" ao aproximar-se.Uns vieram por terra e outros em suas canoas,vin-dos de pontos diferentes.

13

Page 8: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Barbosa Rodrigues, cita que, aquele grupo de indios era chefiado peloTuxaua "Apanaraca" que manteve contatos amistosos corn eles, realizandoali, troca de presentes

Depois da troca de presentes, a expedich retornou a Tauaquera ouTeoduret6polis, como rebatizara o lugar Barbosa Rodrigues.

La havia ficado um grupo de expedicionerios, encarregados de construi-rem uma pequena casa, onde mais tarde poderia servir de abrigo aos expedi-cionérios. Foi erguido naquele lugar, tambern, urn "Cruzeiro", "para simbo-lizar a paz, a uni5o, entre civilizados e selvagens".

Barbosa Rodrigues, no ano seguinte, retornou ao rio Jauaperi e sempremantendo contatos amistosos corn os indios. Ele passou a levar nas expedi-cOes, sempre a sua esposa e filha, as quais eram objetos de admirac5o paraos indios, devido a tez Branca e a cabeleira loira.

No period() em que Barbosa Rodrigues, esteve no rio Jauaperi, cessaramas hostilidades entre "civilizados" e indios.

No dia 28 de outubro de 1884, quando Barbosa Rodrigues encontrava-se na vila de Moura, la apareceram uns indios, que vindos das matas, aproxi-maram-se das casas dos moradores, que assustados tentaram reagir. Entretan-to Barbosa Rodrigues foi de encontro aos indios e depois da troca de presen-tes realizada naquela hora, sem nenhum incidente, os indios retornaram deonde vieram rumo as suas malocas.

"Este acontecimento foi o mais notavel dos fatos da vila de Moura".Barbosa Rodrigues, entretanto n5o pode continuar seus trabalhos pacifistasjunto aos indios. Por motivos de ordem particular foi obrigado a deixar a ta-refa a que se prop6s "de conduzir ao convivio da civilizac5o os abor(genes doJauaperi".

Ja em 1900, depois da sa Ida de Barbosa Rodrigues, do rio Jauaperi, e dadesistencia da continuidade da missao, o Coronel Conrado J. Niemeir, Presi-dente da Prov(ncia do Amazonas, determinou a instalac5o nas margens doRio Branco, de Postos Mil itares, visando a "protec5o dos segmentos da socie-dade invasora dentro do territ6rio incligena, abrangendo toda a area do rioJauaperi e de seus afluentes.

Em 1901, o etn6logo Ricardo Payer conseguiu visitar por alguns dias osindios Waimiri Atroari, habitantes das proximidades do lugar denominadoMahaua. Por ter acabado os brindes e ainda por notar qualquer atitude hostila sua presenca, o etnologo n5o se demorou muito na visita, entretanto levouconsigo,farto material etnografico e que pelo que se sabe foi recolhido aoMuseu de Hist6ria Natural de Viena.14

Desse trabalho de pesquisa foi elaborado um resumido vocabulario doidioma dos indios habitantes no rio Jauaperi. (Von Kock — Gurenerg DieJauapery, G. Huber — Einteitung).

Em 1905, por causa de urn incêndio num barracgo de urn dos morado-res de nome Antunes, que se estabelecera no rio Jauaperi e relacionado corno assassinato de urn Indio, o Governo do Amazonas, enviou mais uma forcapolicial ao rio Jauaperi.

A forca Policial era chefiada pelo Capita° Catingueira, que seguiu mataa dentro ate as malocas dos indios, realizando ali, a mais tregica hecatombeque se pode imaginar acontecer a urn povo.

0 grupo policial destruiu todas as malocas que encontrou, incendiando-as e matando os indios a bala. Naquela horrivel carnificina pereceram cercade 283 indios, alguns mortos dentro das prOprias malocas incendiadas.

Os pracas forcavam,a bala, os indios permanecerem dentro das malocase depois ateavam fogo. Os que tentavam mesmo assim fugir do fogo eram rece-bidos fora da maloca por intensa fuzilaria. Morreram na ocasião muitas crian-cas junto corn suas m ges, no interior das malocas incendiadas.

0 capit5o Catingueira,para comprovar o seu feito diante de seus supe-riores, levou para Manaus, 18 indios como prisioneiros.

Em Manaus os indios foram alvo da curiosidade pnblica, que via no fei-to do Capitão Catingueira urn ato de bravura e coragem.

Os 18 indios Waimiri Atroari ficaram presos no ent5o Quartel de I Man-taria da Pol icia do Amazonas. Foram obrigados a vestirem as roupas dos sol-dados enquanto permaneciam presos. Desses 18 indios, seis morreram de tris-teza e mal tratos dentro da pris5o. Doze deles, gracas a intervench do Coro-nel Euclides Nazar& que condo(do deles, os levou consigo, ate a vila de Mou-ra e de la mandou-os levar ao Jauaperi.

Em 23 de novembro de 1911, o Capit5o de Infantaria, Al ipio Bandeira,subiu o rio Jauaperi, partindo da vila de Moura, corn uma comitiva corn-posta de 12 pessoas, entre as quais encontrava-se o Coronel Euclides Nazar&para tentar novamente urn contato amistoso corn os indios Waimiri Atroari.

Em 29 de novembro, a expedick desembarcou no lugar conhecido co-mo Mahaua, e na ocasi5o foram avistados quatro indios Waimiri Atroari. 0Capith Al ipio Bandeira fez sinais aos indios convidando-os a se aproximarem.

' Os indios corn certo receio e gesticulando muito se aproximaram das em-barcacOes que compunham a frota da expedic5o. Depois de muitos hesita-

15

Page 9: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

rem, os indios saltaram em terra, pr6ximo onde ja se encontrava os expedi-cionarios.

Al ipio Bandeira, fez entrega aos indios dos presentes que trazia, man-tendo rapido contato com aquele grupo tribal. Destacou-se nesse contato oIndio identificado como Mepri, que segundo relatou Al ipio Bandeira, ele imi-tava passards e "alguns quadrOpedes e corn isto chegou a divertir os expedi-cionarios durante algum tempo".

Depois deste contato corn os indios, a expedic go ainda tentou it maisalem daquele local, entretanto, por Mao encontrarem indios rio acima,retor-naram.

Alipio Bandeira, foi nomeado o primeiro lnspetor do Servico de Prote-cgo aos Indios SPI.

Em 1912, o prOprio Alipio Bandeira, fundou na ilha conhecida comoMahaua, no rio Jauaperi,o Primeiro Posto de Atrac go aos Indios,hoje conhe-cidos como Waimiri e Atroari.

Entretanto, ngo obstante a presenca no rio Jauaperi de funcionarios doServico de Protecgo aos indios, novos fatos, colocavam-se contra osdando continuidade a escalada de exterminio daquele povo.

16

A DEFESA DOS 1 10105 WAIMIRI ATROARIPELO SERVICO DE PROTECÂO AOS INDIOS = SPI

A Castanha do Brasil, na primeira década do seculo, era procurada porprecos fantesticos, motivando que novos segmentos da sociedade nacional,tentassem penetrar nos dominios territoriais dos Waimiri Atroari. As areasdos rios Jauaperi e Alalau, sgo riquissimas em Castanha do Brasil, e segundoa visgo dos civilizados, "n go tinham donos", foram as mais visadas na regigopelos coletores de castanha, que viam naquelas terras a oportunidade parariqueza facil.

Os governos do Estado do Amazonas, sempre visando a "economia doestado e de grupos politicos dominantes, permitiam e ate mesmo determina-yam a invasgo das terras dos indios Waimiri Atroari", provocando assim se-rios atritos entre os coletores de castanha e indios.

primeiro encarregado do Posto lndigena de Atrac go do Servico deProtecgo aos Indios — SPI, foi o Sr. Greg6rio Horta, cuja unidade administra-tiva, foi instalada no rio Jauaperi, no lugar denominado Mahaua.

Sr. Greg6rio tgo logo assumiu suas funcOes, procurbu impedir por to-dos os meios possiveis, a invasdo do territOrio indigena Waimiri Atroari. En-tretanto pouco pode fazer, pois os comerciantes apoiados pelos politicos deManaus, burlavam as ordens de n go invadirem a terra dos indios.

Por iniciativa da 1a Inspetoria do Servico de Protec go aos Indios — SPI,Governo do Estado do Amazonas, atrav6s da Lei n9941 de 16 de outubro

de 1917, concedeu aos indios Wautemiris (Waimiri Atroari) as terras situadasa 50 quilOmetros a jusante das cachoeiras dos rios Jauaperi e Camanau.

Mesmo corn o amparo legal, a 1a Inspetoria do SPI ndo conseguia impe-dir a invasgo do territOrio dos indios Waimiri Atroari, face a falta de pessoal

meios para melhor vigilência. Com isto, a situacgo de conflito entre indiosinvasores continuava. Toda vez que o coletor de castanha encontrava o In-

dio, este era abatido a tiros.

Em Manaus, existia uma empresa sob a razgo social de Penha & Bessa,sob a direcgo de seu principal s6cio, o individuo de nome Edgar Penha, cujaatividade comercial era de financiar e promover a coleta de Castanha do Bra-sil e extracgo de borracha.

Por ordem de Edgar Penha, os seus funcionarios toda vez que iam aoJauaperi e Camanau, realizar seus trabalhos de coleta, ao encontrarem malo-

17

Page 10: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

cas e rocados dos indios, ateavam fogo e roubavam os gêneros de suas rocas.Tudo isto burlando a vigilancia do Posto Indigena Mahaua, que passou a serchef iado pelo indigenista Luis Jose da Silva, onde vinha prestando bons ser-vicos a causa indigena.

Edgar Penha, por diversas vezes tentou tirar da chefia do Posto Ind ige-na Mahaua,o Sr. Luis Jose da Silva,pois acusava-o de arbitrario e de que esta-va entravando o desenvolvimento da economia do Estado, quando proibiaa entrada de coletores de castanha no territOrio dos indios.

A V Inspetoria do SPI sempre defendia o servidor das acusacOes deEdgar Penha, dando conhecimento as autoridades de ent5o, da seriedade dotrabalho desenvolvido pelo Sr. Luis Jose da Silva. Em marco de 1926, osindios Waimiri Atroari, surgiram em varies partes do rio Jauaperi e numadessas saidas mantiveram dialogo com duas mu lheres que se encontravam emum acampamento de castanheiros, de nome Maria e Antonieta, que haviamsubido ao rio Jauaperi com seus maridos para trabalharem na coleta de cas-tanha. Na ocasiao os indios deixaram transparecer o descontentamento e odesejo de viganca contra os invasores de seu territOrio.

Os corpos estavam molhados, parecendo que tinham sido retirados dedentro d'agua. 0 de Jose Candido Bessa, tinha ao lado direito um profundogolpe, por onde se via o figado e o corack. 0 de Francisco Eliseu apresenta-va ferimento de flecha em cima do peito esquerdo, os punhos cortados e umforte cip6 amarrado no pescoco.

18

Dois molhos de cabelos de mulher apareciam pendurados em uma arvo-re. Os cabelos eram de Maria Eugenia, que para ali fora em companhia deFrancisco Mariano, um dos funcionerios e expedicionerios coletores de cas-tanha da firma Penha & Bessa". (Rola-tad° da la Inspetoria do Servico deProtec5o aos Indios no Amazonas, ano de 1926).

0 servidor do SPI de nome Sebasti5o Gomes de Lima, lotado no PostoIndigena Mahaua, chegou ao local, minutos depois do ataque dos indios aosinvasores de suas terras, pois se encontrava exatamente a procura dos invaso-res de suas terras, para afaste-los do territOrio indigene.

Edgar Penha, principal s6cio da firma Penha & Bessa, depois do ocorri-do, aumentou sua perseguic5o aos funcionérios do Servico de Protec5o aoslndios, acusando-os de insufladores dos ataques dos indios. Usando de seuprestigio politico, Edgar Penha, procurou por todos os modos, afastar dachefia do Posto Indigena Mahaua, o Sr. Luis José da Silva.

As autoridades do Estado do Amazonas, acatavam as denOncias do Sr.Edgar Penha e por mais que a 1a Inspetoria do SPI em Manaus, desmentisseas acusacOes infundadas contra os seus denodados funcionarios, a palavra fi-nal sempre era do invasor das terras dos indios.

Na tentativa de evitar maiores problemas, a 1a Inspetoria do SPI, man-dou vir a Manaus, o chefe do Posto Indigena Mahaua, alvo das acusacOes doSr. Edgar Penha, para pessoalmente explicar as autoridades o que realmenteocorria la no rio Jauaperi.

Luis Jose da Silva, tudo explicou e como nada das acusaceles do Sr.Edgar Penha ficou provado, retornou ao Posto, dando continuidade ao seutrabalho. Entretanto quando tudo parecia ter ficado explicado, Edgar Penha,tramava uma grande invas5o a area dos Indios Waimiri Atroari.

Ao retornar ao Posto Ind igena Mahaua, a bordo de lancha de sua pro-priedade particular, o Sr. Luis Jose da Silva, acompanhado de seus familia-res, mulher e quatro indios menores Waimiri, foram assaltados por Edgar Pe-nha e cerca de 30 bandoleiros sob seu comando.

Luis Jose da Silva, foi preso e seviciado dentro de sua prOpria lancha,as vistas de sua esposa e filhos adotivos.

edgar Penha, ap6s o assalto, levando a reboque a lancha Rio Andira,onde se encontrava preso o servidor do SPI Luis Jose da Silva, sua esposa D.Candida Pastana e 4 indios menores, de nomes Abrah5o, Bere, Muxupi eMaria, seguiu ate o Posto Indigena Mahaua para que fosse retirado daquele

19

A maioria dos coletores de castanha que se encontrava trabalhando naarea do rio Jauaperi, ao tomar conhecimento do posicionamento dos indios,abandonaram aquele rio. Os funcionerios da firma Penha & Bessa, ao contra-rio, passaram a realizar,quando de suas penetracOes na mata a procura de cas-tanha, cerrados tiroteios, tentando "espantar" os indios.

Um dia quando o pessoal da firma Penha & Bessa, encontrava-se no'lo-cal conhecido como Mijac5o, foram surpreendidos pelos indios, travando alluma batalha que terminou com a morte de todos os coletores de castanhacornponentes da expedic5o.

"Os indios cairam sobre o pessoal, matando e trucidando. As canoasdos expedicionarios ficaram encharcadas de sangue e a terra ficou toda emdesordem, as bagagens espalhadas, volumes de mercadorias esparsas, riflese espingardas encostados a um pau, sem que nenhuma dessas armas fosse uti-lizadas. Todo o pessoal foi vitimado pelos indios r que arrastaram alguns cadà-veres para o centro da mata, entre eles um dos sOcios da firma Penha & Bes-sa, o Sr. Candido Bessa.

Page 11: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

local, todos os pertences do Sr. Luis. Jose da Silva. Queria Edgar Penha, quecorn a retirada dos pertences de Luis, e as sevicias que estava sendo subme-tido, ele n go retornasse mais para a. chefia do Posto Indigena, como a '0 Ins-petoria do Servico de Protecgo aos Indios, insistia ern conservado.

A familia de Luis Jose da Silva, assistia tudo aquilo corn pavor, desta-cando-se os indios menores,que tudo viam corn muito medo e estranheza.De-pois de retirado os principais pertences do Sr. Luis de dentro da sede doPosto Ind igena, Edgar Penha, corn seus homens armados, destruiram tudono Posto. Ate a pr6pria casa que servia de sede administrativa ao 19 Postode Atracgo do Servico de Protecgo aos Indios, foi demolida naquela ocasigo.Nada restou inteiro do material e das instalacOes daquele Posto.

Depois de tudo quebrado e demolido, Edgar Penha, que conservava pre-so ern sua prOpria embarcacgo, o Chefe do Posto Ind igena Mahaua, Sr. LuisJosè da Silva, e sua familia, retornou ao lugar denominado Nova VitOria, asmargens do Rio Negro; sede de seus negOcios. E ali, desatracou a embarcackRio Andirá de propriedade do Sr. Luis Jose da Silva, que estava servindo depresidio a ele prOprio, pois estava confinado no carnarote sem poder sair,sendo vigiado constantemente por dois homens armados de rifles.

Edgar Penha ao desatracar a lancha, fez ameacas a Luis Jose da Silva,dizendo que quern mandava naquelas paragens era ele e n go is admitir queLuis retornasse ao Posto Indigena.

Luis Josè da Silva, bastante doente em consequencia das agressOes f i-sicas que sofrera, continuou a sua viagem corn destino a Manaus.

Chegando a Manaus, tudo relatou a Chefia da 1a Inspetoria do Servicode Protecgo aos Indios, que por sua vez levou ao conhecimento das autorida-des estaduais, sem conseguir que :fosse tornado qualquer providencia parapunir Edgar Penha e seu bando,ou mesmo coibir que fatos semelhantesvol-tassem a acontecer.

Luis Jose da Silva, poucos dias depois de sua chegada a Manaus, faleceu•

ern consequencia dos maus tratos e agressOes de Edgar Penha. A 1a Inspetoriado Servico de Protecgo aos Indios — SRI, em seu relat6rio anual de 1940, fazas seguintes referéncias sobre os fatos:

- "Ate a presente data n5o teve esta Inspetoria nenhuma noticia de qual-quer providencia tomada,em relac go ao assunto, pelas autoridades policiaisque, forca é confessar, em todos os denials assuntos, sempre foi solicitada emprestar todo 6 apoio a acgo desta Inspetoria, dificuldades de alta monta cer-tamente impedira ate agora as prov sobre os fatos verificados em epo-

20

ca anormal, embora praticados por quern, logo em seguida ao ataque do Pos-to Indigena Mahaua deveria assumir as funcáos de Prefeito Municipal (EdgarPenha), onde havia saqueado urn estabelecimento p6blico a -m5o armada,conduzindo preso ate esta capital, o encarregado do Posto Ind igena, que veioa falecer em consequência dos maus tratos recebidos".

Corn a morte de Luis Jose da Silva, chefe do Posto Indigena Mahaua, ea depredacgo das I nstalaceies do Posto, os trabalhos da primeira Inspetoria doServico de Protecgo ao Indio, foram praticamente suspensos na regi5o.

Corn a destruicgo do Posto Mahaua, os invasores tomaram conta do rioJauaperi. Tudo sob comando do Sr. Edgar Penha, que voltou a organizarpedicaes de caca aos indios Waimiri Atroari.

Centenas de indios eram mortos toda vez que os encontravam. Sabia-seapenas em Manaus, que os indios "nao mais aborreciam". E que os coletoresde castanha e balateiros, estavam trazendo suas producees para Manaus, vin-das do rio Jauaperi e Camanau.

A Inspetoria do Servico de Protec5o ao Indio, n go mais retornou aorio Jauaperi. Procurou mudar o local da instalac5o dos Postos de Atrac go aos

Assim, procurando evitar o relacionamento entre os invasores do rioJauaperi corn os servidores do SPI, foi instalado no rio Camanau, urn PostoIndigena corn a denominacgo de Posto Indigena "Manoel Miranda", paravoltar a tentar atrair os indios e defendó-los da ac go predadora e criminosados invasores.

Na epoca, pelo rio Jauaperi, três foragidos da Policia de Manaus, conhe-cidos como Pedro Guerreiro, Casemiro e Lauriano, penetraram na area dosindios e tudo indica que passaram a viver corn eles e ate ajudando-os na dote-sa de seu territOrio.

Inclusive,se sabe que numa dessas expedicOes de caca aos fndios, orga-nizada pelos invasores,quando os indios foram impiedosamente massacra-dos, urn dos feridos, podia clemencia em portugues, se dizendo ser PedroGuerreiro e ri go indio.Entretanto,nunca mais teve-se noticias dos outros. Po-de ser que tenham vivido ate os 6Itimos dias corn os indios, pacificamente,ou tenham morrido em conflito, confundidos ou corn os invasores ou corn osindios Waimiri Atroari.

Somente, ja nos anos 40,a IP Inspetoria do Servico de Protec go ao In-dio,voltou a tentar contato corn os indios Waimiri Atroari. Abandonando orio Jauaperi, se instalou no rio Camanau.

21

Page 12: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Sob a orientacgo dos irmgos, Humberto e Luiz Briglia, foi tundado noalto do rio Camanau, o Posto Indigene de Atrac5o denominado Manoel Mi-randa.

Entretanto, apos periodo do contatos amistosos, em dezembro de 1942,os indios Waimiri Atroari, certamente por confudir os denodados funciona-rios do Servico de Protecgo aos Indios, corn aqueles criminosos que os vinhaperseguindo por dezenas de anos, atacaram o Posto Manoel Miranda, ma-tando todos os que ali se encontravam.

0 Servico de Proteck aos Indios — SPI, atraves da 1 f? Inspetoria de Ma-naus, n5o desistiu do contato corn os indios Waimiri Atroari. Tao logo foipassive' o Posto Manoel Miranda, foi reaberto, em outro local e com deno-minack diferente — Posto Irma"os Briglia, em homenagem aos I rm5os indige-nistas Humberto e Luiz Briblia que tombaram sem vide, na miss go de con-tater pacificamente os indios Waimiri Atroari.

Os irm5os, quando em servico no Posto Indigene Manoel Miranda, en-tre outros trabalhos relevantes, escreveram urn vocabulario da lingua dosindios Waimiri Atroari.

A morte do irm5os Briglia, provocou entre as idealistas do Servico deProtecdo aos Indios, mais amor a causa que abracaram por opc5o, servindocomo exempla de trabalho a ser seguido por todos.

OS WAIMIRI ATROARI "VERSUS"4TH PHOTO CHARTING SQUADRON

Nos primeiros dias do mes de setembro de 1944, a Primeira Inspetoriado Servico de Protecão aos Indios em Manaus,recebeu a visita do Tenen-te Walter Willianson, do 4 TH Photo Charting Squadron, do Exercito NorteAmericano, que pretendia realizar uma expedicao pelos rios Jauaperi e Ala-lau, ate nas proximidades da cachoeira conhecida como Cachoeira Criminosa(no Rio Alalau), corn a finalidade de realizar naquela regi5o observagoesas-tronbmicas, atendendo acordos celebrados entre o governo brasileiro e o go-verno dos Estados Unidos da America.

Os funcionarios da 1 a Inspetoria do Servico de Protec5o aos Indios, emManaus, procuraram explicar ao Tenente Walter, que a regi5o onde pretendiafazer as observacOes astronOrnicas, nos rios Jauaperi e Alalau, eram habitadaspor indios ainda arredios, que face ao comportamento dos invasores de seusterrit6rios, estes poderiam reagir corn atitudes belicosas a presence de suaequipe de trabalho. Advertiram ainda os funcionerios da 1P Inspetoria doServico de Protecgo aos Indios, para as dificuldades que a expedic5o iria en-contrar quanta a navegac5o, atraves do rio Alalau, pois este rio na época,encontrava-se corn suas cachoeiras e corredeiras, corn pouca ague, dificultan-do seriamente a navegacgo de canoas.

Por mais que os funciondrios do SPI procurassem cientificar das dificul-dades que a expedic5o iria encontrar, o Tenente Walter, demonstrava indite-renca aos problemas que iria fatalmente enfrentar. Decidido seguir viagem aoRio Jauaperi e Rio Alalau, o Tenente Walter, solicitou a Inspetoria do Ser-vico de Protecdo aos Indios, em Manaus, que Ihe fosse cedido para a expedi-c5o, funcionärios experimentados e urn dos batel gies pertencente ao SPI, paratransporte de seu pessoal e material.

A Inspetoria do Servico de Protec5o aos indios — SPI, emprestou aoTenente Walter o batel5o, denominado de Tenente Lira, e seguiram acompa-nhado a expedic5o alguns funcionarios experimentados e conhecedores daregi5o.

Antes da partida da expedic5o, a chef ia da 1a Inspetoria do SPI reco-mendou veementemente ao Tenente Walter, que tivesse muito cuidado norelacionamento corn os indios Waimiri Atroari, poisesteseram tidos como pe-rigosos, em virtude de sua indole muito desconfiada diante da presence de es-tranhos em seu territOrio, isto em conseqiiencia do sofrimento secular que Ihesfinharn infrigido os civilizados. Entre as recomendecOes estava a de que oTenente Walter, levasse na expedicao brindes para serem trocados quando do

22 23

Page 13: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

encontro que fatalmente teriam corn os indios Waimiri Atroari, o que pode-ria ajudar no relacionamento pacific° entre os expedicionerios e aquele povohabitante na regi5o dos rios Jauaperi e Alalau.

Em seguida a visita do Tenente Walter a 19 Inspetoria do Servico de Pro-tecão aos Indios, a expedic5o partiu corn destino a area dos indios WaimiriAtroari.

Em menos de uma semana apes a partida, a expedicão retornou a Ma-naus, face a uma pane no motor da embarcack.

Os funcionarios da 19 Inspetoria do Servico de Protecão aos Indios, queseguiram fazendo parte da expedip5o do Tenente Walter, depois de conserta-do o motor da embarcac5o, recusaram-se a seguir acompanhando o TenenteWalter para dar continuidade a viagem interrompida pela pane do motor.

Alegaram que o Tenente Walter, n5o teria seguido os conselhos ofereci-dos pelo pessoal do SPI que eram conhecedores n5o s6 da regi5o como da for-ma de lidar pacificamente corn os silvicolas, e que a forma de agir do oficialnorte americano, fatalmente provocaria nos indios, uma atitude hosti I.

A chefia da 19 Inspetoria do Service de Proteck aos Indios, acatouplenamente a opinião do seu pessoal especializado, principalmente por-que aquela chefia tomou conhecimento de que o Tenente Walter, n5o acolhe-ra as sugestOes daquela direc5o, para levar consigo brindes como machados,facOes, etc. e ern seu lugar levou aperlas carteiras de cigarros, que os indiospouco caso fariam para aquele tipo de brinde.

Mesmo sem mandar os funcionerios do SPI seguir acompanhando o Te-nente Walter, a chefia da 19 Inspetoria do Servico de Protec5o aos Indios, su-geriu aquele oficial que procurasse na vila de Moura, pessoal que poderiaservir-Ihe de guia na espedic5o que iria empreender aos rios Jauaperi e Alalau.

0 comerciante da Vila de Moura, de nome Raul Vilhena,cedeu ao Te-nente Walter, quatro homens conhecedores da regi go e ate com certa präticano relacionamento corn indios habitantes na regi5o dos riosJauaperi e Alalau.

A expedicao partiu da vila de Moura, em 28 de setembro de 1944, che-fiada polo Tenente Walter Williamson, corn destino ao rio Alalau, tendo co-mo principal objetivo atingirem a Cachoeira conhecida pela denominackde Criminosa.

No dia 17 de Outubro, Raul Vilhena, que tinha cedido ao Tenente Wal-ter Williamson, 04 homens para servirem de guia a expedick, apreensivopela demora do seu retorno, enviou correspondência a chefia da 19 Inspe-24

toria do Service de Protecao aos Indies, ern Manaus, informando que ateaquela data n5o tinham retornado, comunicando a sua apreens5o pela sortedos expedicionarios e sugerindo que fossem tomadas medidas no sentido deenviar corn major urgéncia possivel, uma equipe de socorro ao rio Alalau, depreferência por via aérea. Comunicou ainda Raul Vilhena, que naquela oca-si5o estava enviando ao rio Alalau, por via fluvial uma equipe de funciona-rios seus, para subir o rio Alalau a procura dos expedicionerios.

A Primeira Inspetoria do Servico de Proteck aos Indies ern Manaus, aotomar conhecimento dos dizeres da carta enviada por Raul Vilhena, atravesde seu chefe,entrou ern contato corn o consulado norte americano, comu-nicando o ocorrido.

Na nOite do mesmo dia o interventor do Estado do Amazonas convi-dou a chefia da 19 Inspetoria do Servico de Protecgo aos Indios, para corn-parecer em Palacio no dia seguinte as 8:00 horas, para tratar do assunto.

No outro dia, no horärio estipulado, o prOprio Interventor do Estadodo Amazonas, Alvaro Maia, acertou corn a chefia da 19 Inspetoria de Ser-vice de Protecgo aos Indios, que seria formada uma nova expedic& queseguiria corn destino ao Rio Alalau, em busca dos expedicionarios chefiadospelo Tenente Walter Williamson.

A chef ia da 1? Inspetoria do Servico de Protec5o aos Indios,aindana reuni5o realizada no Palacio do Governo do Amazonas, quando soube quea expedic5o seria composta tambern corn tropas do Exercito Brasileiro, fir-mou posicäo,e que ficasse bem claro,que o verdadeiro carater da expedicaosolicitada pales norte americanos,seria apenas de buscas e resgates e,em ne-nhuma hipetese seria de carater punitive, sob pena de n5o acompanhar a ex-pedick.

0 prOprio interventor do Estado do Amazonas, interpelou o Consulnorte americano, quanto as intencbes da expedicão, e na presenca do Capi-tao Dubois, do Exercito norte americano, tendo recebido coma respostaque a expedic3o tinha apenas o objetivo de recolher os corpos dos norteamericanos e o material por ventura ainda existente da malograda expedi-cao, salvando, se possIvel, tambern alguma parte dos trabalhos ja realizaddspelo Tenente Walter.

Tendo em vista as intenceies pacifistas demonstrada por todos os patro-nos e membros da expedicao, a chefia da 19 Inspetoria do Servico de Prote-cäo aos Indios, aceitou em acompanhar e fazer parte da expedicdo.

Antecipando-se aos trabalhos da expedic5o, as 7,30 horas do dia 23 deoutubro de 1944, um avian "Gruma", partiu de Manaus corn destino a vila

25

Page 14: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

de Moura, levando a bordo a Chef ia da 1? Inspetoria do Servico de Pro-tecão aos Indios, o Consul Norte Americano em Manaus, seu secretario,Capita() Dubois, chegando a Moura por volta das 8,30 horas.

Em Moura,os expedicionarios encontraram-se corn o comerciante RaulVilhena e que na ocasi5o ja havia chegado em Moura, o (mica sobreviventeda expedicgo do Tenente Walter, de nome Raimundo Felipe, urn dos homensconhecedores da raga:), gentilmente cedido pelo Sr. Raul Vilhena ao Tenen-te Walter. ApOs ouvirem o relato do sobrevivente sobre os acontecimentos norio Alalau, ficou decidido de que continuariam sua viagem por via aarea, pro-curando observar, baseado no relato do sobrevivente,o local onde teria ocor-rido o ataque dos indios aos expedicionarios.

Passaram a fazer parte da expedick adrea o comerciante Raul Vilhenae o sobrevivente da expedick do Tenente Walter, que a bordo do avi5o,orientava o piloto para o local onde teria ocorrido o ataque dos Indios.Quando o avi5o sobrevoou o local so foi possivel notar algumas caixas sobreos pedrais da cachoeira Criminosa, no rio Alalau. ApOs mais veos rasantes eprocura de avistar algum outro vest igio sem sucesso, o avik retornou a Mou-ra.

Ern Moura, foi tornado por termo o depoimento de Ralmundo Felipe,Onico sobrevivente da expedicao chefiada pelo Tenente Walter Williamson.

"No dia 2 de setembro de 1944, as 13,00 horas ern du gs embarcacOeschefiadas pelo Tenente Walter Williamson, a expedick era composta de 3oficiais norte americanos e mais quatro guias,incluindo o pr6prio Raimun-do Felipe". As 17,00 horas do mesmo dia encostaram as embarcacOes parapernoite ainda no rio Jauaperi, pernoitando no lugar conhecido como Barrei-ra Branca. As 6,00 horas do dia seguinte reiniciaram a viagem com destinoao rio Alalau acampando as 18,00 horas, para pernoite na ilha do Binanau. Aviagem prosseguia sem nenhuma anormalidade.Novamente as 6:00 horas dodia 28 seguiram pelo rio Alalau ate acima da cachoeira denominada Cachoei-ra dos I ndios". Ai dormiram, passaram os dias 29 e 30, tendo o tenente Wal-ter Williamson feito a sua primeira observac5o astronOmica. Sairam dia 30 as3,00 horas da tarde e foram dormir no pedral das Palmeiras. Naquele localo Tenente Walter fez a segunda observac5o astronOmica. No dia 19 de no-vembro prosseguiram viagem, atingindo a cachoeira conhecida como cachoei-ra Criminosa, por volta das 11 horas. Naquele local, urn dos batelOes, o dename Tenente Lira, foi atracado onde deveria ficar ate o retorno da expedi-c5o, que seguiria o rio Alalau rumo as suss cabeceiras a bordo de uma peque-na canoa. No Batel5o Tenente Lira, ficaram os mantimentos previsto para oretorno da expedic5o.

"No dia 02 de novembro, a expedic5o continuou sua viagem a bordo deuma canoa, deixando para tras o batelk tenente Lira, sem que ficasse nin-26

guem para tomar conta, subindo os pedrais da cachoeira Criminosa cuja ex-tensa"o é de cerca de trés quilbmetros. Chegando entretanto ao topo da ca-choeira Criminosa, por volta das 14:00 horas, foram vista 10 mulheres (ndiasque fazim sinais aos expedicionarios. A conselho de Raimundo Felipe, os ex-pedicionarios nao atederam os chamados. Um pouco mais acima da cachoeiraCriminosa foi armado o acampamento para pernoite. No dia 04 pela manh5,seguiram viagem ate o lugar conhecido coma "Repartimento dos Indios"onde penetraram por aquele igarapé, viajando cerca de hors e meia su-bindo, contra alias a determinacao da chef ia da 1? Inspetoria do Servico deProtecão aos Indios em Manaus, que recomendara ao tenente Walter William-son respeitar e não entrar no referido igarapó.

No retorno dormiram na ilha conhecida como ilha do Rio Preto ondeo Tenente Walter fez sua terceira observack astrondmica. Dia 05 desceram epor volta das 13,00 horas aiingiram o comeco da cachoeira Criminosa. Laencontraram alarn das indios que avistaram quando subiram o rio, mais 4 in-dios adultos do sexo masculino e,alguns curumins. Os Indios novamente ace-naram chamando os expedicionarios. Os guias brasileiros, aconselharam nova-mente ao Tenente Walter para que evitasse o contato corn os Indios, e seguis-sem viagem. 0 Tenente Walter, nano obstante os conselhos, ordenou que en-costasse a embarcacao no local onde encontravam-se Indios. Como Raimun-do Felipe, que pilotava a lancha (e o Unico sobrevivente da expedic5o) deso-bedecesse, por nao querer encostar, o Tenente Walter obrigou-o a largar omotor e ao mesmo tempo pilotando a embarcacao aproou para a margem di-reita do rio Alalau, afirmando "brasileiro medroso, tern medo de Indio, euyou agora tirar fotografia para mandar para.Amarica.

Quando a canoa encostou onde encontravam-se os indios, os guias bra-si lei ros,permaneceram a bordo e o sargento Baitz, auxi liar do Tenente Walter,urn tanto receioso, colocou urn pa em terra e outro dentro da embarcacao. 0Tenente Walter Williamson, aproximando-se do grupo de indios ofereceu-lhescigarros, tendo aceitado e passaram a fumar. Em seguida o Tenente Walter,preparando sua maquina, procurava tirar algumas fotos. Os guias brasileiros,voltaram a advertir o Tenente para desistir das fotografias, pois estavam no-tando que os indios estavam muito desconfiados corn a mäquina fotografica.

Tenente nàb atendendo as observacOes feitas tomava melhor posic5o paraas fotografias, quando recebeu no peito du gs flechas disparadas pelos indios.

Tenente Walter, que se sentindo ferido, jogou a máquina no ch5o e atirou-se dentro do rio, arrancando as flechas de seu peito.

Ao perceberem o desastre que tinha ocorrido todos os expedicionariosatiraram-se n'agua, tentando fugir a nado. 0 sargento Baitz-tendo atirado-sen'agua nao mais voltou a tona, presumindo-se que se tenha afogado, por nãosaber nadar, ou talvez as piranhas o tivessem exterminado. Os brasileiros,

27

Page 15: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Eonio Lemos e Isaias Ovidio, ocultaram-se seguros no motor embaixo dacanoa, mas ao serem percebidos pelos Indios foram flechados mortalmente.0 brasileiro Renato de Araujo foi flechado afundando para nao mais voltar.

Os indios apoderaram-se da canoa e desceram em perseguicao a Rai-mundo Felipe e do Tenente Walter Williamson que nadavam ja distantes dolocal da tragedia. Disse Raimundo Felipe, o Onico sobrevivente do ataque dosindios, qde o Tenente Williamson era bom nadador e que mesmo ferido, se-guia na frente e que a muito custo Raimundo conseguia acompanha-lo. Nolocal em plena cachoeira Criminosa, apresenta forte correnteza e isto ajuda-va-os mais ainda na fuga. A certa altura, segundo afirmou Raimundo Felipe,uma flecha acertou o seu pr6prio chapeu, que era de "massa" e que por pou-co tambem nao tombara sem vida. Corn a flechada em seu chapeu, Raimun-do Felipe, passou a nadar por debaixo d'agua, tentando salvar-se das flecha-das. Ao subir a tona, depois de varios mergulhos, teve a felicidade de surgirpor detras de uma pedra da cachoeira, ficando assim protegido das flechadasdos indios.

Viu entdo o Tenente Walter Williamson, que seguia mais a frente nadan-do a largas bracadas ajudado pela correnteza do rio, quando foi acertado poruma flecha na nuca e seu corpo inanimado desapareceu num remanso da ca-choeira Criminosa".

Com urn mergulho, Raimundo Felipe, conseguiu passar sem ser visto pe-los indios, por um dos tombos da Cachoeira Criminosa e ganhou a outra mar-gem do rio,descendo a pa sem alimentac5o durante 13 dias pela mata ate aboca do rio Alalau (foz do rio Alalau no rio Jauaperi).

No dia 18 de outubro Raimundo Felipe,ouviu, um barulho de motor norio e gritou por socorro. Era a canoa do Sr. Raul Vilhena que tinha saido deMoura dia 17 a procura dos expedicionerios.

Raimundo Felipe, magro, quase sem forcas, foi recolhido pelos tripulan-tes da canoa e levado a Moura, onde relatou primeiro todo o ocorrido a RaulVilhena e a Comiss5b chef iada pelo Consul americano e o Chefe da 1a Inspe-toria do Servico de Protecao aos Indios, ern Manaus.

(Este relato foi copiado do relatOrio do Dr. Alberto Pizarro Jacobina,sobre a ocorrência datado de novembro de 1944).

Em seguida a Comiss5o, constituida pelo Dr. Alberto Pizarro Jacobina,Chefe da 1a Inspetoria do SPI em Manaus, Carlos Pinto Corréa, Inspetor doSPI, Capitdo Johan E. Du Bois, Tenente Conrad Lundgren, Sargento WilliamThompsom, Tenente I tamer Al lent, Cabo Palheta e mais seis soldados, segui-ram viagem ao rio Alalau, na tentativa de resgatar alguns pertences, ou o querestou da expedicao do tenente Walter Williamson.28

Pouca coisa conseguiram recolher. Foi encontrado intacto, o bate&Tenente Lira, que pertencia ao Servico de Proteck aos I ndios e que fora em-prestado para compor as embarcaciies da expedic5o. Entretanto toda a cargafoi destruida.

Pelos sinais encontrados na cachoeira Criminosa,a versa.° apresentadapor Raimundo Felipe foi confirmada, n5o deixando dOvida quanto a ocor-r8ncia.

Ja na volta, a expedicao encontrou urn grupo de Indios Waimiri Atroari,que ao avistarem os expedicionerios fizeram grande algazarra e acenavam co-mo se tivesse chamando.

0 Dr. Alberto Pizarro Jacobina, acompanhado de seu auxiliar CarlosPinto Corr8a, numa das canoas da expedicao, afastou-se de seu grupo, e le-vando consigo alguns brindes, tentou urn contato amistoso com os indios.

Ao aproximar-se do grupo de indios, foi notado que eles tambern esta-vam receiosos da aproximacao da canoa da expedie5o.

Entretanto Jacobina, procurando expressar-se na lingua dos indios, emmonossilabos, fazia gestos de amizade, conseguiu encostar sua canoa nas dosindios.

Quando into ocorreu, alguns indios, chegaram a passar para a canoa deJacobina e ele, passou a distribuir os brindes que levava consigo. Tudo cor-reu de forma amigavel e Jacobina, em retribuic5o aos presentes, recebeu tarn-barn alguns, co,mo arcos, flechas, bananas e pedacos de carne de anta.

As trocas de presentes, demoraram cerca de meia hora, e t5o logo, aca-baram, os indios que haviam passado para a canoa de Jacobina retornaramas suas prOprias embarcacOes, e afastaram-se lentamente.

Jacobina e seu companheiro Carlos Pinto Correia, remaram sua ember-cacao para junto as outras da expedick.

Depois deste contato amistoso, que foi uma vitOria do born senso e doprOprio Servico de Protecao aos lndios, pois n5o permitiu qualquer atitudehostil contra os indios, a expedicäo retornou a Manaus, ciente de que cum-prira a missão.

29

Page 16: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

OS VVAIMI RI ATROARI

Os indios conhecidos como Waimiri Atroari, ou Crichan6s, Juaperi, Ala-laus, Waitemiris, habitavam a regiao compreendida desde o rio Urubu, tribu-'Oho da margem esquerda do rio Negro, ate a foz do Rio Jauaperi, subindopor esse rio, ate a bacia do seu principal afluente, o rio Alalau, onde hoje lo-caliza-se a major concentracäo populacional desses indios.

0 seu idioma e classificado como do Grupo Karib, face a semelhancacom outras I Inguas do mesmo grupo linguistico, como os Macuxi, habitantesdo TerritOrio Federal de Roraima.

Medem aproximadamente 1,80 metros de altura, s5o fortes e sua pele 6de urn moreno claro. Cabelos pretos e lisos.

Raspam os cabelos da cabeca ate um pouco acima da orelha, tanto oshomens como as mulheres.

Andam normalmente nus.Os homens usam uma especiedecinta confec-cionado corn cip6 titica que ao mesmo tempo serve de suspensOrio peniano.As mulheres usam uma esp6cie de tanga, confeccionada com carocos de baca-ba, presos e tecidos de tucum que s5o fixados na cintura por cord5o de fibratambern de tucum.

A tanga e usada apenas na parte da frente, deixando totalmente desco-berto a regi5o glCitea.

Confeccionam seus utensil ios domesticos corn palha de tucum, cip6 titi-ca, produzindo balaios, cestas, jamax is, maqueras, tipitis e peneiras.

Utilizam-se tamb6m do barro para confeccionar panelas e uma esp6ciede frigideira para use no preparo da al imentacao.

As suas armas, como o arca, sac) confeccionadas corn o árnago do paud'arco e medem cerca de 2,10 metros de comprimento, servindo tamb6mcomo Badurna.

As flechas s5o confeccionadas corn taboca e flecheira para o corpo pro-priamente dito e a ponta ou bico, pode ser de pau d'arco bem afiado, osso deanimais silvestres, ou pedacos de facOes, devidamente amolados.

Os Waimiri Atroari, ao contrerio da maioria dos indios habitantes naAmazOnia Brasileira, não s5o vistos com enfeites corporais, nem mesmo apresenca de plumagens foi notada.

30

Pouco se sabe sobre os rituais dos Waimiri Atroari, apenas algumas ocor-rancias foram anotadas como procurarei descrever.

Os mortos dos Waimiri Atroari sac) cremados, utilizando-se urn girau -de cerca de 1,00 metro de altura e o fogo é ateado no espaco ex istente entreo girau e o solo. As cinzas dos mortos são jogados nos rios. Sobre este fato,sabe-se que ales alegam que se deixarem os mortos enterrados, toda vez quepassarem no local, ter5o lembrancas tristes dos mortos, por into optam emcrania-los e jogar as cinzas no rio. Entretanto, esta informack a muito super-ficial, carecendo maiores estudos sobre o assunto, para poder fazer urn co-mentOrio seguro.

Os doentes graves s5o isolados no canto da maloca pertencente ao seugrupo familiar, colocando-se uma pena de gaviao nos punhos da rede e em-baixo, uma vasilha no ch5o corn ague para o doente beber quando estO cornsede, procurando evitar de qualquer modo, o contato f (sic° corn o doente.

Sabe-se tambOm que no mês de setembro, que coincide corn o period()da baixa das âguas dos rios, costumam promover festas em suas malocas cen-trais.Possivelmente dedicada em oferenda as plantacOes que ir5o realizar,cujo trabalho ocorre tao logo terminem as festas.

Os Waimiri Atroari vivem principalmente da agricultura.

Produzem mandioca, macaxeira, cana-de-acticar, banana, batata docee industrializam, de forma artesanal a farinha.

Fazem o plantio e a colheita por etapas. Nunca armazenando o resulta-do da colheita.

Plantain suas rocas em Opocas e locais diferentes.Ora,prOxima a pr6priamaloca, ora entre uma aldeia e outra,nos caminhos que ligam suas povoacOes.

S5o tambOm hObeis cacadores e pescadores, fazendo parte de seu card6-pio, antas, macacos, porcos, jacarOs, tartarugas, tracajOs, paca. PescamtucunarO, pirarucu, pirarara.

Colhem como alimentos auxiliares, frutas do buriti, castanha do Brasil,mel de abelha.

As suas casas constituem em uma construck de troncos fincados nochão em forma oval ou redonda, corn duas portas.

As paredes da construc5o, s5o formadas por paus rolicos fincados noch5o, trancadas corn palhas de Ubim ou Buca-, n5o chegando a atingir a altura

31

Page 17: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

do teto, deixando uma abertura para entrada do are para a saida de fumacade suas fogueiras.

Internamente a maloca contem divisOes, formadas por esteios fincadosno chao, os quais servem como divisor entre acomodacOes das farnilias e co-mo apoio de suas "maqueras", que ficam atadas nesses esteios e nos esteiosde sustentacdo do teto.

Em cada divisgo interna, vive uma familia com todos os seus pertences,como arco, flecha, cestos, jamaxis e maqueiras.

No meio da divisgo encontra-se sempre uma pequena fogueira, sempreacesa, na qual sdo preparados os alimentos e serve para esquentar o frio e afumaca para espantar os mosquitos.

Usam como meio de transporte, as Ulads, que sac) canoas construidas deurn tronco de madeira cavado no seu arnago e s go muito pesadas e de dificilnavegacgo.

Estes dados sobre os indios Waimiri Atroari, foram levantados atravesde contatos que mantive corn aquele grupo tribal e com base tambêm ern in-formacaes prestadas a mim, pelo Gilberto Pinto Figueiredo e outros colegasde trabalho, que tiveram a oportunidade de conhecerem de perto aquelesindios.

32

POSTO INDIGENA IRMAOS BRIGLIA

A 1 Inspetoria do Servico de Protegao aos indios — SPI, depois doocorrido no Posto Manoel Miranda, no rio Camanau em dezembro de 1942,quando tombaram sem vida OS irmaos Humberto e Luiz Briglia e seus corn-panheiros insistindo na tentativa de contatar amistosamente corn os indiosWaimiri Atroari, organizou uma nova equipe de dedicados indigenistas dis-postos ao sacrif icio de sua prapria vida, para instalarem no mesmo rio Ca-manau, urn novo Posto I nd igena de Atrac5o.

Este Posto, seria instalado, como foi, muito mais acima de onde haviasido instalado o Posto Manoel Miranda, e muito mais prOximo das malocasdos indios Waimiri Atroari.

A direcdo do Posto lndigena I rm gos Briglia, denominacdo esta ern justahomenagem aos indigenistas mortos em defesa da causa, foi entregue ao Sr.Luis de Carvalho, que ja tinha bastante experiência em contato com indiose demonstrado ser possuidor de conhecimentos necessarios a missdo que Ihefoi confiada.

Corn ele seguiram 12 auxiliares, pessoas tambern ja com experiência nocontato com indios em outras areas e dispostos a realizarem a tarefa de con-tatar corn os Waimiri Atroari corn amor e dedicacgo.

Entre os expedicionerios que chegaram ao Posto Indigena I rrn5os Bri-glia, destacava-se a figura de D. Candida, viCrva do Sr. Luis Jose da Silva, pri-meiro Chefe do Posto Ind igena de Atracgo Mahava, instalado no rio Jaua-peri, que morreu em consequência das agressOes de Edgar Penha, em defesado territ6rio indigena.

D. Cendida, mais tarde casou-se corn o indigenista Luis de Carvalho ecorn ele seguiu rumo ao rio Camanau para a instalac go do Posto lndigena

Irrndos Briglia.

D. Cêndida conhecia bern os indios Waimiri Atroari, chegando, quandomorava no Posto lndigena Mahaua em companhia de seu finado marido LuisJose da Silva, a ter como h6spede de sua casa no Jauaperi, quatro indios me-nores do grupo Waimiri que os tratava como fossem seus filhos. Ela falavafluentemente o idioma dos indios Waimiri Atroari, talvez uma das 6nicas pes-soas que vieram a dominar a lingua daqueles

0 Posto foi instalado como previra a 1P Inspetoria do Servico de Pro-tack aos Indios — SPI, e Luiz de Carvalho,seguindo as diretrizes fixadas,

33

Page 18: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

nab) procurou forcar o contato corn os indios. Preferiu esperar que os indiosviessem ate o Posto.

Esperou cerca de dois anos e nenhum dos Waimiri Atroari aparecera nasede do Posto, n go obstante a aproximacgo em que se encontrava corn rela-cdo as suas malocas.

ocorrera no Posto Manoel Miranda, foi considerado pela 1P Inspetoria doServiqo de Proteb go aos Indios — SPI, como urn importante marco no rela-cionamento entre os indigenista e a comunidade inch igena Waimiri Atroari,no relat6rio da 1a Inspetoria do SPI, sobre o fato, D. Candida foi assimconsiderada:

Entretanto, no dia 19de novembro de 1946,por volta do meio dia, sur-giram na sede do Posto Irm gos Briglia, cerca de 25 indios Waimiri Atroari,chefiados pelo Indio Muxupi, que tinha sido, quando crianba, h6spede deD. C5ndida no Posto Mahaua no rio Jauaperi.

Muxupi ja era urn rapaz, pois JO se passara varios anos desde o dia emque ele deixara o convivio corn D. Candida e voltara para a sua aldeia. Istoocorreu t5o logo foi destruido o Posto Mahaua, pelos castanheiros e balatei-ros, chefiados por Edgar Penha.

D. Candida estava sozinha ern casa na hora em que os indios chegaramao Posto. Luis de Carvalho e seus auxiliares estavam para a roca, onde encon-trava-se trabalhando. A roca ficava urn pouco afastada da area da sede doPosto, onde estavam construidas as casas residenciais e sede do Posto.

D. C5ndida ao avistar o seu filho adotivo Muxupi, n go o reconheceu,chegando a pensar que aqueles indios Waimiri Atroari que acabavam de che-gar de surpresa, iriam ataca-la. Entretanto, reagindo ao susto inicial, procu-rou conversar com eles, expressando-se no idioma falado pelo grupo.

S6 assim conseguiu identificar Muxupi, como aquele menino que elahospedaria e tivera como filho adotivo no Posto Mahava. Muxupi tambem re-conheceu D. Candida como a sua "Mange" e aceitou o convite pars entrarem casa e almocar corn ela.

D. Candida aproveitou a oportunidade para conversar corn todos, per-guntando pelos parentes de Muxupi, que conhecera quando ainda morava noPosto Mahua e sobre o conhecido, JO naquele tempo Tuxaua Maruaga.

Muxupi, respondeu que Maruaga ja estava muito velho e ri ga aguentavamais fazer grandes viagens e ele agora era o chefe daquele grupo.

Depois de almobarem e receberem presentes ofertados por D. Candida,os indios embarcaram em suas canoas e subiram o rio, rumo as suas malocas,prometendo retornar na pr6x ima lua.

Este contato amistoso mantido corn os indios Waimiri Atroari, por D.Cgndida no Posto Irm5os Briglia em 19 de novembro de 1946, ap6s o que

34

"D. C8ndida merece, indiscutivelmente as glorias dessa pacificac go, a eladevemos o êxito de nossa missgo, como embaixatriz que foi da paz e da con-c6rdia entre os civilizados e Waimiris, de he muito desavinhos "Relatário de

Inspetoria do Servico de Protecao aos Indios em Manaus referente as ativi-dades do mOs de novembro de 1946".

Os indios voltaram ao Posto Indigena Irm gos Briglia, como haviam pro-metido. E desta vez encontram. Luis de Carvalho e seus companheiros na sededo Posto.

Entretanto, segundo D. C5ndida,eles estavam desconfiados,bem diferen-te quando le estiveram em 19 de novembro.

Muxupi, que na primeira visita procurava demonstrar afeibao a D. C5n-dida, durante a nova visita procurava evitar qualquer contato direto corn ela.

D. Cándida, mesmo notando a diferenca de comportamento de Muxupi,procurou desfazer qualquer mal entendido por acaso existente. Fez vestidospara as mulheres Indias que vieram acompanhando os seus maridos presen-teando-as e elan ficaram muito satisfeita.

Outros brindes, como machado, faclies, arames, foram distribu (dos a to-dos os visitantes, entretanto Muxupi, demonstrava sempre uma certa intran-quilidade, e bem diferente de seu comportamento da Ultima visita.

Os indios demoraram na sede do Posto nessa visita 3 dias e apOs as des-pedidas prometeram voltar na prOxima lua.

Luiz de Carvalho, D. Cándida e seus companheiros, ficaram urn poucoapreensivos,pois apesar do contato corn os indios ter sido amistoso e alegre,notou-se certa intranquilidade entre eles, principalmente em Muxupi.

D. Candida estava gravida e esperando o nascimento do belod para aque-les dias. Luiz de Carvalho JO providenciara a vinda de uma parteira que seencontrava hospedada em sua casa no Posto aguardando o dia do nascimen-to do seu filho. Ela, a parteira, ficou em p5nico corn a chegada dos indiospois ela pessoalmente, n ig ° conhecia os Waimiri Atroari, so tendo not icias da-les atraves de narrativas de massacres e mortes violentas contadas pelos ribei-rinhos da regi go. Mas os indios n go chegaram nem mesmo a ve-la, cols en-

35

Page 19: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

quanta os indios permaneceram no Posto, ela trancou-se em um dos quartosda casa da sede do Posto, de la s6 saindo quando os visitantes foram embora.

Dois dias depois da sa Ida do grupo de indios Waimiri Atroari, chef iadospar Muxupi, surgiu novamente no Posto Incligena Irmao Briglia, um outrogrupo de indios, nao os mesmos que participaram da visita anterior emboraestivessem chefiados tamb6m por Muxupi. Vieram desacompanhados de mu-Iheres e criancas. Eram sO adultos e jovens.

Chegaram desconfiados e arredios.D.Candida procurou conversar camMuxupi, tentando saber quais as motivos do retorno, pais ales tinham par-tido dizendo que sO retornariam na pi-6x ima lua, e em poucos dias ja tinhamretornado. Muxupi desconversava e nao respondia as perguntas de D. Candi-da. Falava sobre outros assuntos, mas nao explicava a razao do retornorapido.

Luiz de Carvalho, procurou agrada-los, voltando a distribuir mais pre-sentes e conseguiu convecd-los a pernoitar no Posto naquele dia, Entretantopela madrugada partiram do Posto sem se despedirem, como é costume da-les.

0 fato causou apreensao em todos.

Na vaspera do Natal, dia 24 de dezembro de 1946, o mesmo grupo re-tornou ao Posto, e sem nenhuma explicacao atacou a todos que se encontra-yam na sede do Posto de Atracao lrmaos Briglia, a flechadas.

D. Cándida que se encontrava dentro da casa, quando iniciou o ataquedos indios, ao ouvir os gitos, procurou verificar o que estava acontecendono patio, tendo tambam sido flechada no ombro esquerdo quando sala decasa.

A parteira que se encontrava dentro de casa, trancou-se em um dos CO-modos da residência e entrou em panico gritando e pedindo cleméncia.

Flechada, mas cam vida e likida D. Candida ao avistar Muxupi, pediu-lhe que poupasse sua vida e da parteira, explicando-lhe que estava com me-nino para nascer.

Conta D. Candida que nada levou de sua casa, saiu de la do jeito que seencontrava, corn a flecha ainda encravada em seu peito e sangrando muito,pois a flecha estava enganchada dentro e nao era possivel arranca-la s6 pu-xando.

Ao passar rumo ao rio D. Cêndida avistou o corpo do seu marido Luizde Carvalho e dos seus companheiros, todos mortos a flechadas.

Os tras, D. Candida, o Indio Raimundo e a parteira, embarcaram nacanoa e comecaram a viagem rio abaixo. Na hora da partida, o motor de po-pa da embarcacao nao quis pegar, talvez pelo nervosismo em que se encon-trava Raimundo, que teve muita dificuldade para faze-lo funcionar. Mas de-pois de varias tentativas, Raimundo fez o motor funcionar e o barco seguiurio abaixo.

Minutos depois da partida, dentro da canoa, nasce o beloa de D. Candi-da que continuava corn a flecha encravada no seu peito.

Somente dois dias depois, apOs o incidents a canoa chegou a Manaus eD. Candida recebeu cuidados medicos e a flecha foi retirada do seu corpo.

0 menino que nasceu dentro da canoa, nas aquas do riq Camanau, foibatizado corn o nome de Luiz Pastana de Carvalho e chegou mais tarde, jarapazola a trabalhar no Posto de Atracao Camanau, na 6poca Indiosque o Ser-tanista Gilberto Pinto Figueiredo chefiava a Atracao dos ndios WaimiriAtroari.

Hoje Luiz Pastana de Carvalho, é funcionario da Fundacao Nacionaldo Indio — .FUNAI e trabalha como vigia noturno do pradio onde funcionaa "Casa do Indio" em Manaus.

D. Candida Pastana de Carvalho, mora em palafita no Igarapa de Ma-naus, em Manaus, e em condicaes de vida sub-humanas, recebendo a ajuda deseu filho Luiz Pastana de Carvalho e viva ainda traumatizada pelo que ocor-reu naquele natal de 1946.

Muxupi, concordou em deixa-la it embora. Ela e a parteira e urn Indiodo grupo lanomani, aculturado de nome Raimundo que trabalhava no Posto,foram autorizados a irem embora em uma canoa corn motor de popa perten-cente ao Posto.

36 37

Page 20: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Padre Calleri, pouca experiencia tinha de como lidar com osprincipalmente corn os indios que se candidatara a "amansar" no caso os in-dios Waimiri Atroari.

Apenas por duas vezes, Padre Calleri, visitara aldeias indigenas no Brasil.Os contatos que manteve foram corn os indios lanomami. Uma vez, quandose fazia acompanhar do cinegrafista Guilherme Lombardi, da empresa Am-plavisk, de Primo Carbonari, visitou a aldeia dos indios Waice, da grande na-

cgo dos indios lanomami.

Ele e o cinegrafista, partindo de Boa Vista, capital de Roraima, segui-ram a bordo de canoas ate o Rio Negro, subindo por este ate a vila de Tapu-ruquara. E pouco tempo demoraram na aldeia Maturace, dos indios lanoma-mi. Por falta de habilidade do Padre Calleri, os indios obrigaram tanto o pa-dre como o cinegrafista a fugirem correndo do local.

A viagem do cinegrafista as aldeias dos indios lanomami acompanhandoo Padre Calleri era para o seu pedido, realizar um documenterio que seria exi-bido na Italia, corn rendas em benef icio das obras missionarias da Prelazia deConsolata de Roraima.

0 Padre Calleri, portanto n go tinha ern seu curriculum, experiencia sufi-ciente para substituir na dif fell tarefa de contatar com os indios WaimiriAtroari, o Sertanista Gilberto Pinto Figueiredo, que desde sua juventude vi-nha mantendo contatos amistosos corn aquela comunidade indigena.

Ap6s o acerto corn a Fundaggo Nacional do Indio — FUNAI, e DNER— DER-AM, foi organizado as pressas a expedic go que tinha como objetivoprincipal, a pacificack rapida do indios Waimiri Atroari, para que quandoos trabalhos de desmatamento da estrada Manaus-Caracaraf-Boa Vista, atin-gissem a area habitada pelos indios, là n go fossem impecilhos a implantacgo

da rodovia. E que, por falta de mgo-de-obra na regi5o, eles, Waimiri Atroari,viessem tambern participar dos trabalhos de construdo da rodovia.

A Equipe do Padre Calleri, formada por mais 8 homens e 3 mulheres,que seguiram para o local, em canoas e no heliceptero pertencente ao DER-AM, partindo do acampamento denominado S go Gabriel corn destino aoIgarape Santo Antonio do Abonari, onde os mantimentos je esperavam a ex-pedick.

Duas canoas, corn o material mais pesado,ja se encontravam no IgarapeSanto Antonio do Abonari, que teriam seguido via helicOptero.

ApOs o translado do material e dos expedicionerios chefiados pelo Pa-dre Calleri, seguiram viagem a bordo de duas canoas, subindo o igarape Santo

39

A MISSAO CALLERI

No in icio dos trabalhos da construck da BR-174, estrada Manaus-Cara-cara (-Boa Vista, a cargo do Departamento Nacional de Estrada e Rodagens —DNER e do Departamento Estadual de Rodagens do Estado do Amazonas —DER-AM, no ano 1968, contava corn urn grande obstâculo. 0 de ter que cru-zar a regi5o habitada pelos indios Waimiri Atroari. Indios temidos ern todaa regi5o pelas noticias de sua ferocidade e de sua posick contraria a presencade estranhos ern seus domfnios territorials.

lnicialmente, era meta dos dirigentes do DER-AM, que antes do infciodos trabalhos de desmatamento da estrada nas proximidades da area habitadapelos indios Waimiri Atroari, eles ja estivessem "mansos" e prontos inclusivepara participarem, como m50-de-obra, nos servicos de desmatamento da ro-dovia BR-174.

A Fundacäo Nacional do Indio — FUNAI, mantinha na cidade de Ma-naus, uma unidade administrativa — Delegacia Regional, que atrav6s de seuprincipal funcionario — Sertanista Gilberto Pinto Figueiredo, vinha manten-do esporadicos contatos corn alguns indios Waimiri Atroari, habitantes naregião ern que a construcao da rodovia Manaus-Caracaraf-Boa Vista iria pas-sa r.

No rio Camanau, nas proximidades de sua foz, a FUNAI, mantinha urnPosto de Atrac5o, que periodicamente recebia visita dos indios Waimiri, habi-tantes nas malocas construirdas nas cabeceiras daquele rio.

Ja naquela Opoca Gilberto Pinto Figueiredo, grande conhecedor da re-giào e indigenista assumido, era contrario a construc5o da rodovia BR-174,que atravessaria todo o territhrio dos indios Waimiri Atroari.

Gilberto, tambem era contrario a forma em que os dirigentes do DER-AM, queriam utilizar-se dos trabalhos do pessoal da FUNAI para "amansa-rem" os indios Waimiri Atroari. Achava aquilo urn absurdo, e nao estava dis-posto a aceitar de nenhuma forma as propostas formuladas a pr6pria FUNAI,pelo Departamento de Estrada Rodagens do Estado do Amazonas.

Talvez por isto, e que a pr6pria FUNAI, atravês do seu Presidente naapoca — Queiroz Campos, afastou da area dos indios Waimiri Atroari, o Ser-tanista Gilberto e aceitou que em seu lugar fosse nomeado para a missäo de"amansar" os indios Waimiri Atroari o Padre Italiano Giovanni Calleri, mem-bro atuante da Prelazia da Consolata em Roraima.38

Page 21: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Antonio do Abonari, rumo as suas cabeceiras e as malocas dos indios WaimiriAtroari.

Por volta das 17:00 horas do dia 22 de outubro de 1968 na foz de pe-queno igarape, afluente da margem esquerda do rio Santo Antonio do Abo-nari, a expedick fez o seu primeiro acampamento dentro do territOrio habi-tado pelos indios Waimiri Atroari. Por volta das 18:00 horas, depois de insta-lado o eq uipamento de rédiofonia, foi transmitida a primeira mensagem doPadre Calleri ao pessoal do acampamento do DER-AM, que acompanhava ostrabalhos da expedicao atraves do radio.

Eis na fntegra e em fac simile a Mensagem Oficial no 01 do PadreCalleri, ao DER-AM.

"Fac Simile da Mensagem"

MO. PR IND — MANAUS

MENSAGEM OFICIAL No 1

Santo Antonio 28/10/68 — Hs. 18,00 — Estamos acamados no Ul-

timo braco do Rio Santo Antonio. Foram terminadas satisfatoriamente

todas as operacties de transporte de carga e homens com avian e heli-

copter°. Deixamos hole de manila' com motor de popa acampamento

do DER/Am, do F.N.T. e a tarde o posto da transcon. Corn a nossa

chegada todas as equipes da BR/174 deixaram a regrifo. Estamos so.

Amanhe deixaremos o Rio e, por meio de caminho contamos encon-

trar-nos, Dew queira sem imprevistos corn a primeira maloca de Indios.SOS Pa Calleri

DATA: 22-10-68

NORA: 20,30

RECEBIDO POR RADIOFONIA DER/Am

NOME OP. M/NE/RO

Na sua mensagem, o Padre Calleri, informava que jâ se encontrava nasp roximidades da primeira maloca dos indios Waimiri Atroari e pedia a Deusque n5o ocorresse imprevistos.

40

No outro dia, as expedicionãrios seguiram viagem rumo a primeira ma-loca, continuando navegando por urn igarapé ate por volta das 11:00 horas,quando encontraram atracadas na margem do igarape, 8 Uldàs, num barrancode onde se via um varadouro longo e limpo, fazendo crer que se tratava deurn local utilizado pelos indios como porto de embarque e desembarque eque aquele caminho ligava corn as malocas dos indios.

0 Padre Calleri, que desde o inicio vinha demonstrando total desconhe-cimento, ate mesmo de viajar pela selva e a de navegar em canoas, na ocasi5oda chegada da expedic5o no local onde se encontravam as canoas dos indios,mandou que urn dos expedicionarios disparasse para o alto 8 tiros de rifle,que segundo ele, serviria de aviso aos indios de que a expedic5o estava che-gando al i. 0 Padre Calleri, corn sua lOgica absurda nada mais fez, certamente,do que criar apreensk entre os indios. Pois ern qualquer pats do mundo ouhabitat de qualquer povo, os visitantes amigos nao chegam disparando suasarmas de guerra, e se assim se comportam sac considerados como agressorese prontos a qualquer animosidade. Näo se sabe de onde ou de quern PadreCalleri aprendeu aquela forma insOlita de avisar os indios de sua turbulentae indesejada chegada.

A noite, o Padre Calleri, depois de instalado o sistema de radiofonia,transmitiu ao DER-AM, a Mensagem Oficial n9 02, narrando ern detalhes asua chegada no "porto dos indios" e da, forma como chegou.

"Fac Simile da Mensagem Oficial n902"

MO. PR /ND — MANAUSMENSAGEM OFICIAL N9 2

Rio Atroaris 23/10/68 — Hs. 19,30 — Uma janta de farofa no bar-ranco defronte do primeiro posto dos indios Atroaris. As aparanciasindicam que o posto 6 de grande movimento B/PT oito compridas massilenciosas e bem alinhadas, e atraz urn varadouro majestoso e severoque deveria levar para as malocas. Nossa primeira canoe penetrou nestaarea as 11,30 hs. da manta. Decidimos acampar aqui pois achamos im-prudente invadir o solo dos silvicolas sem estarmos todos unidos. De-mos oito tiros ao alto para sinalar aos indios nossa presence, logo emseguida voltamos. Buscamos restante de homens e cargas deixadas emnosso Ultimo acampamento. Amanhif a noite no nosso rediofonia agi-ram do meio dos primeiros Indios, se Deus quiser. STS Pe. Calleri.

RECEBIDO POR RADIOFONIA DO DER/AmDATA: 23-10-68RECEBIDO: 20,45NOME OP. MINEIRO

41

Page 22: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

38 km. Num igarape que bem cedo andou se acabando num chavascal

tremendamente fechado. Quase todo o tempo passamos arrastando etorando paus. No fim tambem o nosso bom Jonhson deu pane. Corn os

meios imagineveis num labirinto com p este, conseguimos remediar. Mais

um esforco e logo acampamos na beira, ou melhor, num partano. Ama-

nh5 nio sere melhor B/PT mas corn tudo 6 bem preferir a dureza no

certo que nab facilidade no risco. Ate mais. Pe. Called.

RECEB/DO POR RADIOFON/A DO DER/Am

DATA: 24/10/68HORAS: 20,50NOME OP. MINEIRO

A noite passou calma, sem nenhum incidente. Ao amanhecer do dia 25de outubro, foi desfeito o acampamento e os expedicionarios prosseguiramviagem. A viagem estava cada vez mais dificil,pois o igarapa cada vez maisestreito e de dif icil navegac5o,princi pa lmente porque as embarcac5es esta-

yarn carregadas corn o mantimento da expedic5o.

0 Padre Calleri, fazia calculos de que estariam bem prOximos das malo-cas dos indios Waimiri Atroari, e que possivelmente no outro dia estaria man-tendo contato corn os (ndios Waimiri Atroari. Ainda no igarapa, fizeram opernoite. Depois de armarem o acampamento e instalado o sistema de radio,o Padre Calleri, voltou a transmitir suas mensagens dierias ao DER-AM.

"Fac Simile da Mensagem Oficial n904"

MO. PR IND — MANAUSMENSAGEM OFICIAL N9 4

Rio Abonari 25/10/68 — 17,25 Hs. — Con forme nossa facil previ-s5o, hoje a marcha no labirinto nib foi nada melhor. S6 o transporte detodo o complexo radiofOnico (sere a primeira vez que este aparelho sepermite tal turismol no meio de pantanos 6 chavascais, embaixo de chu-vas ininterruptas criou nab pouco caso sério. Mas uma forte vontade devencer, igual em todos os componentes da equipe, permitiu-nos de con-tinuar 6 cobrir uma distincia excepcional. BIPT conseguimosacampar a

uns mil metros da primeira maloca dos Atroaris. Poderiamos bem alcan-43

Os expedicionarios passaram a noite acampados no in icios do varadouroe local que servia de Porto aos indios, sem que aparecesse nenhum sinal dosindios.

Ao amanhecer do dia 23 de outubro, o Padre Calleri, ainda pela madru-gada, mandou que novamente fossem disparados mais 4 tiros de rifle para oalto, repetindo o aviso aos (ndios que a expedicgo Calleri, encontrava-se ali.Os indios n5o apareceram, como previra o Padre Calleri. Claro que os indiosao ouvirem os tiros, nao iriam aventurar-se a it de encontro a urn inimigo toocorajoso, capaz de, chegar ao territario dos indios Waimiri Atroari,ir logodisparando suas armas de fogo.

Como os indios n5o apareceram, o Padre Calleri, resolveu prosseguir asua viagem pelo igarapa, pois deduziu que seria muito perigoso, principal-manta depois dos tiros disparados, seguir viagem para as malocas dos indiosWaimiri Atroari, atravas do varadouro.

A expedic5o percorreu cerca de 38 quilbmetros por dentro do pequenoigarapa, acampando no final do dia nas proximidades de urn Ontario quetudo indicava estaria bem próximo a uma das malocas dos indios WaimiriAtroari.

A noite, depois de instalado o acampamento, o Padre Calleri voltou atransmitir suas mensagens através de recliofonia para o DER-AM, relatandoo ocorrido durante aquele dia.

"Fac Simile da Mensagem Oficial n903"

MO. PR IND — MANA US

MENSAGEM OFICIAL NP 3

Rio Atroaris 24/70/68 — Aqui esta mania is 9,00 hs. o grandePorto é o majestoso varadouro dos Atroaris Permaneceram em absolutosileincio. De madrugada repetimos nosso aviso aos indios corn outros4 tiros ao alvo, mas ninguim compareceu ou nib quis comparecer.Nab teria sidq contactar corn um primeiro grupo no posto e comesse continuarmos ate as malocas. Mas, nib tendo-se esta ocorrencia,achamos perigoso entrar sozinhos no varadouro, pois trataria-se de

violacab de posse. Decidimos portanto tentar atingir as residencies indf-genas passando pela via considerada neutra, isto 6 o Rio. Saimos11,15 hs. com 5 homens e uma mulher. Percorremos aproximadamente

42

Page 23: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

pa-/a, mas a hora em que estamos, do descer do sol, rao 6 oportuna paraesta operaplo. Hoje a noite daremos as Olt/mas instrupdes de encontroe amanhS, se nab hoover imprevistos desagradaveis, ataremos nossasredes corn as dos indios. Para a prOxima noite nab end certa nossa pos-sibilidade de comunicapao. SDS Pe. Calleri.

RECEBIDO POR RADIOFONIA DER/AmDATA: 25/10/68HORA: 17,25NOME OP. MINEIRO

A expedicao prosseguiu viagem no dia 25 de outubro ao amanhecer dodia, ainda a bordo de canoa, que tinha muitas dificuldades na navegacao ten-do em vista que o igarape ja estava muito estreito.

Por volta das 9:00 horas encontraram encostado numa das margens doigarape duas canoas certamente pertencentes aos Waimiri Atroari. E ao apro-ximarem-se das canoas, surgiu repentinamente de dentro do mato um grupode indios Waimiri, muito desconfiados e arredios, certamente estranhandomuito o comportamento daqueles expedicionerios, pois normalmente quandoos funcionerios da FUNA I ou SPI aventuravam-se a irem ate aquela area, iamcorn muita cautela, evitando ate a se aproximarem das malocas dos indiosWaimiri .Atroari, e isto s&acontecia, quando eram convidados pelos prepriosindios e muito raramente.

Tao logo os expedicionérios desembarcaram, os indios passaram a verif i-car os objetos que a expedicao conduzia. Por curiosidade e talvez por quere-rein realizar trocas ou receber de presentes aqueles objetos, os indios verifica-ram tudo que vinha dentro das canoas.

O Padre Calleri, de forma descortes, impediu que qualquer Indio seapossasse de objetos que levava na expedicao.

De forma autoritaria, o Padre Calleri, fez corn que os indios participas-sem da descarga dos objetos que se encontravam a bordo das canoas. Os pro-prios indios ainda sob comando do Padre Calleri, constru (ram nas proximida-des de suas malocas, urn local para o acampamento da expedicao, onde foiinstalado todo o equipamento de sistema de rediofonia, e todo o materialque compunha a expedicao.

Os indios Waimiri Atroari, por volta das 15:00 horas, como sinal de cor-tezia aos truculentos visitantes chefiados pelo Padre Calleri nfereceram-Ihepanerees de bebidas feitas com milho e mandioca.

44

0 Padre Calleri, na calmaria dos indios e de sua boa vontade, arriscou-seentrar no interior da maloca e quando ja estava dentro, contou as redes quese encontravam amarradas nos esteios daquela moradia indigena. Tendo oPadre Calleri, registrado a existéncia de mais de cem redes amarradas nos es-teios da maloca.

Baseado em depoimento do Unico sobrevivente da expedic5o Calleri, omateiro Alvaro Paulo, o Padre ao realizar a contagem das redes, fizera apon-tando com o dedo, fato este, que voltou a causar irritack entre os indios.

Por volta das 19:00 horas o Padre Calleri, voltou a transmitir suas costu-meiras mensagens ao DER-AM, quando enviou a Mensagem Oficial n905.

"Fac Simile da Mensagem Oficial n905"

MO. PR IND — MANAUS

RELATORIO OFICIAL N9 5

Atroaris 1 — 26/10/68 — 19,00 Hs. — Estamos acampados corn os

Atroaris na primeira maloca. Foi luta dura, embora usando todo's os

recursos psicotOcnicos de estrattia indigenista, conseguir o que conse-

guimos, sem abandonar uma I6gica honesta a primeira operaplo. Che-

gamos as (malocas) 0,00 hs. Os indios comparecera de repente no rio;

inicialmente se apresentaram medrosos e desconfiados, depois nos ofe-

receram laranjas e be//Os, mas rido nos permitiram entrar na maloca.

Em seguida, vendo nossa mercadoria, comeparam se agitar usando ges-

tos violentos para tirar tudo. Corn calma e serenidade e o maxim° acar-

do entre n6s, nada foi permitido (o Indio bem sabe que isso esti no

nosso direito de gente superior. S6 tenta perturbar para conseguir) e o

jeito foi resfriar o fogo corn o trabalho. Mediante artiffcios oportunos

provocamos entusiasmo na turma: improvisamente criou-se um movi-

mento: os indios mesmos descarregaram a canoa, transportaram e ajei-

taram tOda a mercadoria, limparam uma area de mato (de/xamos a ales

escolher), bem ao lado da maloca, dales, construfram para nos um born

barrack) e instalaram a antena radio e fisemos a ales mesmos par em45

Page 24: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

movimento o gerador, aparelho de Rediofonia e sistema iluminante.Todo mundo dos Atroaris estava suando.

0 resulted° foi chiplice: Seacalmaram e se entusiasmaram em fazer 6/es mesmos as coisas que nostinhamos medo de fazer. As 75,00 hs. nos trouxeram, em sinal deamizade, para tomarmos todos juntos, quatro panelOes de bebidas.Quase uns noventa indios

nos fizeram a grande festa. Pelas 18,00 hs. es6 naque/e momento, fomo-nos oferecer presentes pela primeThe vez.Porem a distribuicao foi organizada em maneira de extinguir qualquerpedido ales, vein deixar so o nosso criteria. Aproveitamos a alegriapara pOr os pes na maloca: contamos cento e mais redes. Amanhe"iremos ver. Certo que tudo procederd no mesmo sistema: carregar oIndio para resfra-lo. Que Dew nos elude.

Trans: Padre Calleri

Nesta mensagem o Padre Calleri demonstrou a sua inexperiOncia de lidarcorn os indios. Qualificou-se inclusive na condicao de pertencente a urn "po-vo superior" que seria os civilizados l og icamente incluindo-se e isto, p rojetouperfeitamente a sua filosofia no trato corn povos de costume diferentes do

seu e que por isto mesmo nào possuia as mit-limas condicOes indispensaveispara conviver corn povos de culturas diferentes da dele, p rincipalmente urnpovo habitante da selva, corn caracteristicas dos indios Waimiri Atroari.

No amanhecer do dia 27 de outrubro, no acam pamento da expedicãoCalleri, que se encontrava instalado ao lado da maloca dos indios WaimiriAtroari, tudo estava calmo e sem maiores novidades.

0 Padre Calleri determinou aos expediciongrios que retornassem ao lo-cal onde haviam deixado alguns viveres, para transporth-los ate ao

acampa-mento onde encontravam-se.

Foi muito dif icil para o Padre Calleri, convencer alguns indios de acorn-panhar os expedicionérios na tarefa de transportar o material das canoas parao acampamento.

Mudando o hebito de transmitir suas mensagens no final do dia, o PadreCalleri, ligou o sistema de râcliofonia e conseguiu contatos corn o acampa-

' cial n9 06.memo do DER-AM, por volta das 8:50 horas transmitindo Mensagem Of i-

46

"Fac Simile da Mensagem Oficial n906"

MO. PR IND — MANAUSM/SSAO ALALAU RELATORIO N9 6

Atroaris 1 — 26 de outubro as 05,10 Hs. — Nossa pequena equipe

da frente vai se dividindo ainda. Doffs homens e uma mulher ficar

defendendo novo acampamento Atroaris, e tr6s homens tentargo a nao

facil empreza de convener os Atroaris 19 para it juntos, ver varadouroa 45 ou 50 km. do acampamento Abonari 39 , pare fazer de costa o

transporte de toda a mercadoria. A viagem servira tambein para locali-zar, corn os indios, as malocas abandonadas. At6 mais. Padre Caller'.

TRANS — J0,40RECEBIDO POR RADIOFONIA DO DER/Am

DATA: 27/10/68HORAS: 08,50NOME OP. JOSE RAIMUNDO

Esta foi a 6Itima mensagem transmitida pela Expedick Calleri.

0 mateiro Alvaro Paulo, conhecido tambern coma Paulo Mineiro, urndos expedicionerios da missao Calleri, desde o primeiro contato corn os in-dios Waimiri Atroart que vinha alertando o Padre Calleri para a forma quetratava os indios. Dizia Paulo Mineiro, que o Padre Calleri ao inves de tratarcorn' respeito e corn dignidade os indios,ao contrerio, procurava sempre,aosgritos, humilhe-los,inclusive ameacando-os corn uma espingarda, quando elesqueriam forcosamente apossar-se de algum objeto que a expedick levava.

Quando o Padre Calleri apontara a espingarda a urn Indio que insistia fi-car deitado na rede do Padre, Paulo Mineiro, que ja conhecia aqueles indios,quando participara de outras expedicees da FUNAI naquela região, sentiuque fatalmente os indios iriam reagir. E tentando evitar o pior advertia insis-tentemente ao Padre Calleri para ter cuidado e mudar os seus metodos de re-lacionamento corn os

Como o Padre rieo Ihe dava ouvidos, Paulo Mineiro resolveu desligar-seda expediceo retornando corn seus prOprios meios a Manaus. Comecou aconstruir uma balsa de paus rolico num local onde poderia iniciar sua viagemde retorno. Entretanto je corn a balsa pronta, naquele mesmo dia 27 de outu-

47

Page 25: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

bro, antes de in iciar a sua viagem, resolveu voltar ao acampamento para des-pedir-se de seus companheiros de expedicao e apanhar alguns v i'veres para asua alimentack na viagem que empreenderia.

Ao ap roximar-se da maloca dos Indios, notou urn silêncio incomum ep recavendo-se, passou a caminhar por dentro da mata corn muito cuidado,ate chegar nas proximidades da area da maloca, quando avistou dois corpos,um de homem e outro de uma das mulheres que compunham a expedicao,corn sinais de violencia e em estado inanimado, deduzindo sem &wide queos indios haviam atacado a equipe do Padre Calleri.

Sem ter coragem de fazer maiores averiguacaes, saiu dali, ern desemba-lada carreira pela selva, abandonando o piano in icial de retorno.

Paulo Mineiro, ficou escondido na mata ate ao anoitecer, quando vol-tou a empreender sua fuga. Dirigiu-se primeiro a urn dos antigos acampa-mentos, onde teria ficado algum mantimento e apanhando o indispensevelpara sua viagem de retorno a Manaus, ainda a noite, embarcou na balsa quehavia construido para o seu retorno. Descendo o igarape Santo Antonio doAbonari, quando o dia clareou JO se encontrava longe do local onde os indiosatacaram a expedicdo.

Dois dias depois, encontrou alguns cacadores que o ajudaram a Jr ate acidade de Itacoatiara, onde pode comunicar-se corn as autoridades e corn opessoal do DNER-DER-AM, denunciando o ocorrido.

JO neste period() a direc5o do D NER-DER-AM, estava preocupada corna sorte da expedic5o, pois tinham perdido o contato corn o Padre, atravesde rediofonia.

As buscas dos corpos dos ex pedicionerios foram realizadas pela FAB,através do PARASAR, que depois de mais de uma semana de p rocura, con-seguiu encontrar os restos mortais dos inditosos ex pedicionarios, confirman-do assim as afirmacOes e narrativos do mateiro que sobreviveu ao ataque,o conhecido Alvaro Paulo — Paulo Mineiro.

48

ATAQUE NO RIO ALALAU

No dia 01 de outubro de 1974, o Sertanista Gilberto Pinto FigueiredoCosta, encarregado da Frente de Atrac5o aos Indios Waimiri Atroari, entrouna minha sala de trabalho na sede da FUNAI ern Manaus, e demonstrando-muita apreensao deu-me ciéncia de que uma canoa que saira do Posto deAtracão Alalau I, instalado na foz do rio Alalau, transportando os funcioné-rios da FUNAI, Jo5o Dionisio do Norte, Paulo Ramos e Luiz Braga, no dia30 de setembro, corn destino ao Posto de Atrac5o Alalau II, instalado a mar-gem esquerda do rio Alalau, distante cerca de trés quilOmetros do desmata-mento da rodovia BR-174 — Manaus-Caracaral-Boa Vista, ainda n5o tinha

chegado ao seu destino.

Gilberto,na oportunidade, confessou-se apreensivo pelo fato de demora,pois era sabedor de que o funcionario da FUNAI, Mario Alves de Moura, aodescer o rio Alalau no sentido inverso ao da embarcapão ora esperada, no diaanterior da partida da canoa, avistara urn grupo de Indios Atroari, acampadosna margem direita do rio, chegando mesmo a manter conversa corn o grupode Indios e prometer que o "Papal Jo5o" (como era conhecido Jo5o Dionisiodo Norte pelos Indios) no outro dia 30 de setembro de 1974, estaria naquelelocal. Tendo os Indios, segundo Mario, demonstrado alegria em saber que oJo5o Maracaja — Joao Dionisio do Norte — viria encontre-los.

Sobre as rafees da demora da canoa em chegar ao Posto Alalau II, trans-portando os funcionérios da FUNAI, sob a lideranca de Jo5o Dionisio doNorte, levantamos vérias hip6teses. Poderia ter sido uma pane no motor depopa da embarcac5o. Poderia ser tambern que Jo5o Dionisio, como era mui-to amigo dos Indios, tivesse sido convidado por eles para visitar as suas malo-cas. E por Ultimo, os indios poderiam ter atacado a canoa. Embora esta hi-patese fosse a mais remota, pois os contatos corn os indios Waimiri Atroarivinham sendo realizados corn muita frequéncia e os indios demonstravamque JO tinham confianca e amizade corn os funcionarios da FUNAI que tra-balhavam nos Postos de Atracao Alalau I e Alalau II.

A nossa apreensäo aumentou, corn relac5o ao desaparecimento dos fun-cionarios da FUNAI que viajavam na canoa corn destino ao Posto de Atrac5oAlalau II, quando o Chafe do Posta Alalau II, comunicou-nos atraves de re-diofonia, a chegada na sede daquele Posto, de 11 Indios Atroaris todos dosexo masculino e a maioria adultos.

No Posto de Atrac5o Alalau II, onde esperavam ansiosos pela chegadada canoa conduzindo mais trés funcionarios da FUNAI, encontravam-se cin-co outros funcionarios da FUNAI, que all prestavam servicos, Ad5o Vascon-celos — Indio aculturado do grupo Baniwa, corn instruc5o primaria e que amais de 2 anon trabalhava para a FUNAI naquela Frente de Atrac5o. Esme-

49

Page 26: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

raldo Miguel Neto, tambern Indio aculturado do grupo Baniwa e que presta-va servicos naquela Frente de Atrac go tambern cerca de 2 anos. Evaristo Mi-quiles, Indio do grupo Satere-Maue, que trabalhava na Frente de Atracgo dorio Santo Antonio do Abonari e que temporariamente estava prestando ser-vicos naquele Posto, substituindo a funcionario que tinha afastado-se doservico para tratamento de sa6de em Manaus. Odoncil Santos, Indio do gru-po Bare, corn 19 anos de idade, corn instrucgo primäria completa e mais de1 ano que prestava servicos naquela Frente de Atrac go. Faustino Lima, Indiodo grupo Baniwa, corn seis meses de trabalho na Frente de Atracgo WaimiriAtroari. Todos eles,com excec go de Evaristo Miquiles, Indio Satere-Maue,conheciam os indios que acabavam de chegar a sede do Posto e de quern jase consideravam amigos.

Gilberto, devido a demora da canoa transportando os três funcionariosda FUNAI, chefiados por Jogo Dion isio do None e o surgimento de urn gru-po de Mdios no Posto de Atracgo Alalau II, alertou aos funciondrios que seencontravam no Posto Alalau II, atraves de radiofonia, para que tomassembastante cuidado e ficasse bem atentos corn o comportamento do grupo deindios Waimiri Atroari ora ern visita . ao Posto. E que sob nenhuma hipOtese,afastassem-se da sede do Posto, nem viessem a permitir que fosse criado es-paco e ambiente para propiciar condicOes de ac go belicosa por parte dos in-dios. Gilberto temia que se os funcionarios saissem de dentro de casa e se osindios estivessem corn o prop6sito de ataca-los,iriam faze-lo do )ado de forada casa, corn major espaco para o lancamento de suas flechas.

Add° Vasconcelos, que liderava o grupo de funcionarios da FUNAI na-quele Posto, respondeu a Gilberto, pelo radio, que n go ficasse preocupado,pois aqueles indios eram conhecidos deles e amigos, principalmente o chefedeles, o Indio conhecido coma Comprido.

Mesmo assim, Gilberto respondeu a Ad5o, para que mesmo sendo in-dios conhecidos e amigos, como era o caso daquele grupo, ficassem semprealerta e seguissem os seus conselhos, pois a demora da chegada da canoa con-tinuava inspirar-lhe cuidados e que no outro dia ele, Gilberto,estaria seguindopara o Posto em uma aeronave e sair a procura da canoa desaparecida.

Mativemos naquele dia contato corn o Posto de Atracgo Alalau II, atra-ves do radiofonia ate por volta das 20:00 horas. Como tudo se encontravanormal,ficou estabelecido que no outro dia, 02 de outubro; Gilberto voltariaa entrar em contato corn o Posto de Atracgo Alalau II, no horario das 8:00horas para acompanhar o desenrolar dos contatos corn os indios ora ern visi-ta ao Posto, isto, mesmo estando ja preparado para a viagem que iria fazernaquele dia rumo ao Alalau.

Desde a hora marcada que tentavamos entrar em contcto corn o PostoAlalau II, atraves do radiofonia e n go conseguia-mos.

Gilberto que ja encontrava-se preparado para a viagem ao Alalau, come-cou a ficar mais preocupado, por falta de respostas aos chamados através deradiofonia, apressando-se mais ainda para it logo ao local.

Como ate as 10:00 horas n go conseguimos contato corn o Posto, resol-vemos seguir logo diretamente ao Posto e verificar pessoalmente o que pode-

ria ter ocorrido.

Por volta do meio dia,a bordo de urn avi go anf fbio,pertencente a igreja

Adventista, pilotado pelo Pastor Daniel, seguimos eu e Gilberto corn destino

ao Posto de Atracgo Alalau II, localizado as margens esquerda do rio Alalau.

Depois de pousar na pista nas proximidades do igarape Santo Antoniodo Abonari, onde montamos uma base de apoio aos nossos trabalhos no Ala-lau, instalando inclusive no acampamento que improvisamos, urn radiofoniassb, a cargo de funcionarios da FUNAI, do Posto de Atrac go Santo Antonio

do Abonari, rumamos ao Posto de Atracgo Alalau II, continauva sem respon-

der aos nossos chamados por radio.

As 15:00 horas aproximadamente avistamos o Posto. 0 Posto de Atra-

cgo Alalau II, consistia numa area desmatada de cerca de 500 x 200 metros enessa area existia plantacOes de mandioca e cana-de-ackar.Uma casa cons-truida corn paus rolicos, coberta de aluminio,servia de sede naquela uni-

dade de atracgo. Uma pequena casa construida corn madeira rolica e cobertade palha destinada a abrigo de indios ern visita e urn pequeno depOsito paracombustive! completavam as construcOes existentes naquela area.

0 Posto estava aparentemente deserto. Avistamos a porta principal, en-treaberta e as janelas da casa totalmente aberta. Tudo indicava que os indiosteriam atacado os funcionarios da FUNAI que all se encontravam.

0 avigo continuava sobrevoando, e nos procuravamos avistar ern alqumlugar os tuncionârios que la se encontravam. N go vimos nenhum sinal de vi-

da. Apenas algumas canoas dos indios encostadas no porto do Posto, Je-monstrava, que os indios Waimiri Atroari, ainda se encontravam ali.

A situacgo parecia muito perigosa para nos, caso o avi go pousasse. Tudo

indicava que os funcionarios do Posto, n go mais ali se encontravam ou se estavam no Posto, estariam sem vida ou gravemente feridos. E a nossa presencana area tambem poderia ser alvo do ataque dos indios, pois tinhamos o mes-mo conhecimento e amizade a eles, como os funcionérios e companheiros

que all se encontravam.

Tinhamos tres opc5es. A primeira de retornarmos a Manaus, corn a ale

gacgo de que por falta de seguranca, n go descemos no Posto Alalau, e comu-51 50

Page 27: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

nicar as autoridades de que o Posto teria sido atacado, e que por falta de si-nais de vida dos funcionarios que ali se encontravam, eles fatalmente esta-riam mortos.

A segunda era a de descermos no Posto, e conseguir salvar algum passi-ve' ferido, que estivesse precisando de cuidados medicos.

A terceira, era de que ao descermos no Posto, fossemos também ataca-dos pelos indios e n go mais poderiamos retornar a Manaus.

Sabiamos de nossa responsabilidade, tanto para os companheiros doPosto de Atracdo Alalau II, como para o prOprio piloto da aeronave que nosconduzia e que se insistissemos a descer, ale tambem correria o mesmo riscoque nos.

Depois de algumas voltas sabre a area do Posto, e nossa reun id°, ali den-tro do avi go, decidimos que deveriamos descer, mesmo que aquele ato, fosseo ultimo de nossas vidas. Tentariamos nos precaver do passive' ataque. 0 Pi-loto Daniel, ri go estacionaria completamente a aeronave, ficaria corn o motorligado e taxiando pelo meio do rio, enquanto eu e Gilberto iriamos ate o Pos-to. Combinamos que ao pisarmos em terra firme, sairiamos correndo em zi-gue-zague para evitar possieveis flechadas. E que se urn de nos fosse ferido en go houvesse mais condioeies de se locomover, o outro nao deveria tentar sal-va-lo, pois seria muito perigoso. Deixamos corn o Pastor Daniel, as recomen-dacOes, para que caso viessemos a morrer, avisasse nossos amigos e familia-res.

Desta forma, o aviao aquatisou no meio do rio Alalau e eu e Gilberto,ainda vestidos, nos lancamos nas aquas e nadando corn muita pressa nos di-rigimos a sede do Posto. Tao logo tomamos pa, saimos correndo em zigue-zague, como haviamos combinado, eu pela direita e Gilberto pela esquerda.A porta principal da casa sede estava entreaberta, parecendo esconder algu-ma pessoa atras da parede, esperando qualquer movimento. Nada, tido tinhaninguem. Eu, ao passar pela porta da cozinha, deparei-me corn urn dos nossoscompanheiros ca (do no chgo, corn a cabeca decapitada, totalmente separadado corpo. Era o Faustino Lima.

Fiz sinal para Gilberto, que se encontrava encostado corn as costa naparede da frente da casa e mostrei-lhe o que acabara de ver. Gilberto procu-rava averiguar se dentro da casa ainda tinha alguern, como n go foi notadonenhum movimento, ele entrou de uma vez dentro da casa. Segui-lhe e en-contramos a casa toda revirada. Brindes, medicamentos, utensilios jogadosno chgo. 0 aparelho de radiofonia SSB, partido a machadadas. Nenhum ou-tro sinal dos nossos companheiros foi encontrado. Apenas o corpo de Fausti-no Lima, foi encontrado e ainda encontrava-se corn sangue escorrendo dosferimentos que sofrera.52

Fizemos sinal ao Pastor Daniel, piloto da aeronave que nos conduzira,ele encostou no barranco, o avi go. Ele emprestou-nos uma sacola grande denylon, e colocamos o corpo de Fautisno Lima e embarcamos no aviao.

Em seguida saimos a procura de outros sinais que pudessem identificaro que 'realmente ocorrera no Posto; andamos por toda a area desmatada e

n go encontramos nenhum sinal. Parecia que os nossos companheiros tinhamsimplesmente desaparecido.

No Posto, existia uma cachorra que encontramos vindo da mata e aonos ver latia e corria rumo ao local que viera, dando a entender que queriaque a acompanhassemos. Resolvemos segu e ela, na frente sempre latin-do. Na medida em que lamas penetrando na mata a cachorra quando perdia-nos de vista, ficava esperando, prosseguindo taco logo voltava a nos avistar.A cadela que is sempre latindo na frente, de repente deixou de latir e quandoandamos mais uns metros, encontramos a cachorra morta corn uma flechaque ainda se encontrava encravada no seu pescoco.

Aquele sinal era que os indios ainda estavam ali e tudo indicava que ndoqueriam que continuassemos seguindo por onde estavamos. Pensamos tarn-barn que seriamos atacados naquela hora, foi uma hora barn dif icil para nas,pois teriamos que retornar dali, mas ngo pretend lamas dar as costas para olocal onde possivelmente os indios se encontravam. Comecamos a retornartanto eu como o Gilberto, sem virar-nos, urn pouco andando de lado, poistemiamos que ao darmos as costas, poderiamos ser surpreendidos por flecha-das. Mesmo de frente sabiamos também que estariamos sujeltos a receber oataque dos indios. Conseguimos sair daquela parte da mata sem qualquerproblemas. Apenas notamos movimentos entre as folhagens, e que tudo indi-cava, na medida que lamas nos afastando os indios que se encontravam es-condido na mata, iam trocando de posicgo.

Ao retornarmos ao Posto, onde o Pastor Daniel tinha ficado sozinho,decidimos, tentar mais uma vez encontrar nossos companheiros que aindaencontravam-se desaparecidos, entrando outra vez na mata, s6 que por ou-tro lado. Novamente penetramos na mata fechada e percorremos uma pe-.quena trilha que existia e que servia ao pessoal do Posto, para realizar algumacacada. Andamos ate o final da tarde sem encontrarmos nenhum sinal. Re-

gornamos ao Posto e como a noite ja se aproximava, resolvemos regressarbase de nossos trabalhos de buscas, que tinhamos instalados nas margens doigarape Santo Antonio do Abonari, nas proximidades da Ponta da estradaManaus-Caracarai, local onde existe uma pista de pouso, construida peloSexto Batalh go de Engenharia e Construcgo. Chegamos no campo de pouso,por volta das 18:30 horas, quase noite. Retiramos o corpo de Faustino Lima,que traz lamas no avi go e tomamos as providências para transladado para Ma-naus, atraves de uma ambulancia da prOpria FUNAI, que solicitamos viesseimediatamente para o local.

53

Page 28: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Pouco depois de nossa chegada ao Campo de Pouso e ao acampamentoque havfamos instalado para dar apoio as buscas no Alalau, uma equipe decompanheiros nossos do Posto de Atracão Santo Antonio do Abonari, quedesde o meio dia quando, passamos e instalamos a base de apoio, tinha segui-do por terra no eixo da rodovia Manaus-Caracarai a procura de sinais ou deprovaveis sobreviventes do ataque dos indios ao Posto de Atrack Alalau I I,retornou de sua caminhada e trazia consigo o companheiro Esmeraldo Mi-guel Neto, que tinha sido flechado no ombro esquerdo, quando se encon-trava ainda na sede do Posto de Atracdo Alalau II, e que tinha conseguidofugir corn vida do local.

Conversamos repidamente corn ele, para sabermos exatamente o queacontecera naquela manh5, no Posto de Atracdo Alalau II eo encaminhamospara Manaus, para receber cuidados medicos.

A noite, depois de uma leve refeic5o em nosso acampamento pr6ximoao campo de pouso e estrada BR-174 — Manaus-Caracarai-Boa Vista, as mar-gens do lgarape Santo Antonio de Abonari, reunimo-nos Gilberto, MarinelioMachado, Chefe do Posto de Atracdo Santo Antonio do Abonari e eu, e co-mecamos a procurar uma explicacdo para as atitudes dos indios Atroari, con-tra os nossos companheiros do Posto de Atracão Alalau II. Conversamos ateAlta noite. Gilberto, rnuito abatido como todos nos, repetia sempre "os in-dios ndo podem ter matado Jo5o Maracaja, n5o acredito... Os indios devemter levado-o para suas malocas. Os indios adoravam o Joao". Gilberto referia-se ao companheiro Joao Dion isio do Norte, que junto corn 3 outros compa-nheiros, encontravam-se desaparecido desde o dia 30 de setembro, quandosubiam o rio Alalau numa canoa a motor corn destino ao Posto de Atrae5oAlalau II. Discutimos muito sobre o problema. Gilberto sempre voltava a le-vantar a hipOtese de que algo rnuito grave deveria ter acontecido corn os in-dios para motivar uma reacdo tdo drastica. Unica explicap5o que achavamose o tenico fato novo na area que trnhamos conhecimento era a acelerac5o daconstrued° da estrada BR-174, corn baterias de maquinas pesadas removendoärvores e terra, num trabalho que virava dia e noite. 1st°, ao nosso ver, pode-ria fazer os indios pensarem que aquelas maquinas poderiam tambem it deencontro as suas malocas e suas rocas. E assim passamos toda a noite procu-rando explicacdo para o que ocorrera. Gilberto muitas vezes dizia-me "Car-valho, estes indios sofreram rnuito. Foram vitimas de varios massacres porparte dos brancos e essas estradas podem ser vistas pelos indios como urncaminho para que os "Civilizados" atinjam corn maior rapidez as malocasdeles e voltem a praticar os massacres do passado". N5o conseguimos dormirnaquela noite. Estavamos nervosos demais e o pensamento fixo, torcendopara que os nossos companheiros que se encontravam da:cp: rocidos aindaestivessem vivos.

54

E foi corn esta esperanca, que na manh g do dia seguinte retornamos aArea do Posto de Atrac5o Alalau II, desta vez corn mais dois companheiros:Marinelio Machado e o mateiro conhecido pelo apelido de Sacrificio.

No Posto de Atrac5o Alalau II, fizemos nova batida em toda a Area eseguindo relato do sobrevivente Esmeraldo Miguel Neto, dirigimo-nos aolocal onde, segundo Esmeraldo, havia sido perpretado o ataque dos indioscontra ele e seu cornpanheiro de infortOnio, Evaristo Miquiles, que tinhamsaido do Posto juntos corn dois indios Atroari a guiza de cacarem pelas re-dondezas.

Encontramos o local descrito por Esmeraldo e tambern as flechas dispa-radas pelos indios e que ainda permaneciam naquele local, mas enfiadas nosolo, outras simplesmente jogadas sobre as folhas secas do ch go. Encontra-mos tambern as botas de Esmeraldo que ali havia deixado na ocasi go do ata-

que dos indios.

Quando recolh lamas as flechas, Marinello Machado, ao recolher uma fiecha que se encontrava encravada no solo a poucos metros onde nos encontra-vamos (Gilberto, Sacrificio e Eu), ao invês de trazer a flecha ate onde estava-mos, talvez por nervosismo ou impruclência Marindlio dirigindo-se ao mateiroSacrificio, jogou a lanca, dizendo "segura". E a flecha, que tinha a pontaconfeccionada em [ lamina de facgo, lancada por Marinelio para que Sacrif i-

cio, a apanhasse, caiu em cima do pe de Sacrificio, de ponta, enfiando-se ernseu pA, atravessando inclusive a sua bota e atingindo o solo. Aquele acidente,criou urn ambiente rnuito mais nervoso. Sacrificio sentindo-se ferido, gritoude dor. Gilberto apressou-se em arrancar a flecha que se encontrava encrava-da no IAA de Sacrificio, e ao mesmo tempo rasgando sua pr6pria camisa, im-provisou urn curativo para estancar a hemorragia que ja comecara.

Marinello, preocupado corn o que cometera, correu para o local, pedin-do desculpas a Sacrificio, que ainda gemia de dores.

Carregando Sacrificio, que momentaneamente n go conseguia caminhar,

retornamos ao Posto de Atracgo Alalau II, onde haviamos deixado somenteo piloto da aeronave que nos conduzia, o Pastor Daniel, o que nos aguardavarnuito apreesivo por causa da demora de nosso retorno.

La no Posto, corn ajuda do Pastor Daniel, foi feito novo curativo no fe-rimento de Sacrificio, que em pouco tempo ja se achava em condic go de ca-minhar. Marinelio e Sacrificio, seguiram a IA pela mata na direc go do desma-tamento da estrada Manaus-Caracarai, seguindo o mesmo caminho tornadopelos companheiros Esmeraldo Miguel Neto e Evaristo Miquiles apOs sofre-rem ataque a flechas dos indios Atroari. Esmeraldo que ja encontrava-se emManaus, hospitalizado, havia nos confessado de que Evaristo, tambern tinha

55

Page 29: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

sido flechado e tentando atingir o desmatamento da estrada. Entretantodevido aosferiinentos ri g° foi possivel prosseguir a fuga em companhia de Esmeraldo,que notando a falta de condicao de seu companheiro, deixou-o abrigado em-baixo de uma arvore e foi em busca de socorro na estrada, quando foi encon-trado pela equipe de socorro que seguira por terra, partindo de nosso acam-pamento nas margens do Igarape de Santo Antonio do Abonari. Os nossoscompanheiros da equipe de socorro que estava percorrendo o desmatamentoda rodovia, seguindo as informaceies de Esmeraldo, estiveram no local ondeteria ficado Evaristo e nao haviam encontrado-o. Agora Marinello e Sacrif icioiriam tentar fazer o mesmo trajeto percorrido por aqueles inditosos compa-nheiros, na tentativa de encontrar Evaristo, que ainda encontrava-se desapa-recido.

Gilberto e eu, voltamos ao aviao e seguimos voando acompanhado o lei-to do rio Alalau, procuranto notar algum sinal de nosso companheiros desa-parecidos. !nicialmente seguimos rio acima e ao atingirmos as proximidadesdas malocas dos indios Atroari, que ficam acima da cachoeira conhecida corn"Grim iosa", pedimos ao Piloto Daniel que sobrevoasse as malocas para obser-varmos se existia indicios que nos ajudasse em nossas buscas. Quando sobre-voamos pela segunda vez uma das malocas que tinha dado sinal de que teriampessoas nas proximidades, os indios atearam fogo nela, num sinal de que pos-sivelmente teria sido aquele o grupo responsével pelo ataque ao Porto deAtracao Alalau I I e estavam temendo alguma represalia das pessoas que esta-vam no aviao.

Alem da maloca incendiada, nao constatamos nenhum sinal que nos pu-desse ajudar a local izar nossos companheiros desaparecidos.

Retornamos rio abaixo, corn o aviao voando a baixa altura sobre o leitodo rio Alalau.

Desta felta, seguimos ate o local onde possivelmente teria aportado a ca-noa que conduzia Joao Dion isio do Norte e seus companheiros.

Ao ap roximar-nos do local pedimos ao piloto que aquatizasse o aviaoe seguisse taxiando ate uma pequena enseada do, rio, conhecida como "Portodos Indios". Enquanto o aviao permanecia taxiando pelo leito do rio Alalau,Gilberto e eu nos colocamos em cima da aeronave para melhor observar orio e suas margens, sempre na esperanca de encontrar sinal dos desaparecidos.

Ao chegar na enseada "Porto dos indios", para onde dirigiamo-nos, opiloto Daniel nao conseguiu estacionar a aeronave em condiceies favoréveisao desembarque, isto devido a forte correnteza que existia c a in.......meras ârvo-res caidas nas p roximidades da margem direita do rio.

56

Gilberto e o Piloto Daniel, permaneceram na aeronave e em face domeu peso ser menor, entre eu e o Gilberto, tive a preferencia de ser a pessoaque deveria desembarcar e verificar se all existia algum sinal dos nossos com-pan hei ros.

Caminhando por cima de uma das asas do aviao, consegui pular em ter-ra. 0 local realmente era ideal para acampamentos. Existiam érvores frondo-sas e um pequeno igarapê desembocava no local. 0 solo estava batido e bemlimpo. Caminhando rumo a floresta, distante cerca de 40 metros da margemencontrei um pequeno "Tapiri", onde encontravam-se pedacos de came deAnta espetados e em posic5o de ester assando As achas de madeira que seencontravam embaixo da carne, tinham sinais de ter o fogo sido apagadocorn égua e as pressas. Tanto a came, como as brasas, ainda estavam quentes.Andei um pouco mata a dentro, seguindo por um caminho que se dirigia paraa floresta, nao encontrando, em princi'pio nenhum sinal, mas sintia urn odor,de carne em putrefacao. Pretendia seguir mais adiante, quando fui advertidopor Gilberto, que ainda permanecia na aeronave em pe, de que eu retornassedali, pois tudo indicava que os indios ainda permaneciam naquele local e es-condidos, Realmente, nao sei se por cause do nervosismo e da ansiedade quesentia, tudo indicava e eu chegava a sentir que ao meu redor existiam outraspessoas.

JA quando retornava a margem do rio, vi ao lado do caminho, algunssinais de mata abaixada e de que naquele local fora colocado algum objetogrande e dali sale o odor que eu sentira tao logo descera do,avi5o. Gilbertocontinuava chamando-me na aeronave, pedindo que eu me apressasse, poisos indios que all estavam escondidos poderiam tomar qualquer atitude bell-cosa, pois se estivessem com intenc5es a mistosas n5o estariam escondendo-se.

0 avi5o que je se encontrava com seu motor funcionando, encostou umpouco mais na margem do rio, possibilitando-me que saltasse na asa e entras-se na cabine. Em seguida o avi5o levantou veio.

Narrei a Gilberto, o que vira e que sentira e decidimos formar uma equi-pe de maior ntimero de pessoas para fazer uma incurs5o naquele local e queao nosso ver, estavam os corpos dos nossos companheiros Jo5o Dionisio doNorte "Joao Maracajr, Paulo Ramos e Luiz Braga. Tres dias depois, a equi-pe formada por oito companheiros nossos chefiada pelo Gilberto, encontra-ram os corpos dos nossos companheiros, no local onde vi sinal da mata abai-xada e corn odor de putrefac5o, mortos a flechadas.

Seguimos rumo ao desmatamento da estrada a fim de apanhar Marine-llo e Sacrif Icio, que tinham seguido por terra acompanhando itinererio per-corrido por Esmeraldo Miguel Neto e Evaristo Miquiles.

57

Page 30: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

No local combinado, encontramos Marinello e Sacrificio que tinham se-guido o intinerario e n5o encontraram nenhum sinal de Evaristo, que aindacontinuava desaparecido.

Retornamos ao nosso acampamento instalado nas margens do IgarapeSanto Antonio do Abonari, onde centralizamos as buscas aos companheirosdesaparecidos. Ao chegarmos no acampamento, encontramos mais urn dossobreviventes do ataque dos indios ao Posto Alalau II. 0 companheiro AdoVasconcelos, que sofrera ataque dos indios a golpes de -lack, tendo conse-guido fugir, inicialmente correndo e atravessando o rio Alalau. Ada.° teveseu brag° fraturado por urrCgolpe de -lack. Foi encontrado pela nossa equipede socorro que havia seguido pelo desmatamento da estrada.

Ada° relatou-nos o epis6dio em que culminou corn o golpe recebidopor ele no seu braco esquerdo e a morte de Faustino Lima, cujo corpo ja ti-nhamos encontrado quando da primeira visita ao Posto de Atrac5o Alalau I Ie de Odoncil que segundo informou Ad5o, sofrera tambern golpes de fac5oe tentara tambern fugir atravessando o rio Alalau, acompanhando Ad5o. Masinfelizmente näo tivera a mesma sorte que Ad5o, pois ao atingir a margem di-reita do rio Alalau, foi flechado mortalmente no peito.

Ap6s ouvirmos o relato de Ad5o Vasconcelos, calculamos onde possivel-mente estaria o corpo de Odoncil Santos.

Ad5o seguiu imediatamente para Manaus, onde receberia cuidados me-dicos.

No outro dia pela manh5, o avi5o novamente levou a turma de socorropara prosseguir nas buscas dos desaparecidos. Em seguida, Gilberto e eu ru-mamos ao ponto onde imaginevamos encontrar o corpo de Odoncil, pois anarrativa de Ad5o, fora esclarecedora de onde poderia estar.

0 avi5o seguiu ate o rio Alalau, e aquatizou na altura onde a estradacruza o rio, e dali em diante o avi go seguiu taxiando na direcao do Posto Ala-lau II, eu e Gilberto, subimos para as asas e ficamos observando as margensdo rio, local onde segundo nossas previseies e informacOes de Ad5o, encontra-riamos o corpo de Odoncil.

Depois de cerca de 10 minutos de taxiamento, distante cerca de 200metros da sede do Posto de Atrac5o Alalau II, avistamos entre os galhos dearvores caidos no rio, na margem direita do rio Alalau, um pedaco de panocor vermelha, que seria a camisa de Odoncil e quando nos aproximamos dolocal, constatamos que era o corpo de Odoncil que ja se encontrava emadiantado estado de putrefack.

58

Como a aeronave n5o oferecia condic5o para resgatarmos o corpo deOdoncil, seguimos ate a sede do Posto de Atrac5o Alalau II e le, ap6s atracar-mos o avi5o, amarrando-o em um dos mour5es do porto, apanhamos umaube dos indios Atroari, que ainda se encontrava all, desde o ataque ao Postono dia 02 de outubro, e com cordas na m5o e remos improvisados corn peda-cos de tabuas, dirigimo-nos, Gilberto, Piloto Daniel e eu, remando ao localonde encontrava-se o corpode Odoncil.

Quando chegamos ao local, em face da forte correnteza do rio, Gilbertoque se encontrava remand() na popa do Ube, ficou segurando nos galhos dasarvores da margem, para evitar que a Ube, distanciasse do local onde se en-contrava o corpo. 0 Piloto Daniel e eu, tentevamos amarrar uma corda entreos bracos do corpo de Odoncil, para poder reboce-lo ate a sede do Posto,onde encontrava-se a aeronave, pois a Ube, n5o tinha espaco para tal. Che-guei a mergulhar por debaixo do corpo de Odoncil, para conseguir amarrara corda corn seguranca e em condicOes de reboce-lo. Como no corpo deOdoncil ainda encontrava-se enfiada a flecha que o vitimou, e o corpo estavaflutuando corn o rosto voltado para baixo, a flecha, na medida em que pas-savamos por cima de galhos caidos dentro do rio ai enganchando-se, tornan-do mais dif icil a remoc5o do corpo.

N6s, devido a falta de costume de utilizar aquele meio de transporte,aquele tipo de canoa (urn tronco de ervore cavado no meio) e corn os remosimprovisados e inadequados, encontramos muita dificuldade para conse-guirmos chegar ate uma barcaca pertencente ao 69 Batalhao de Engenhariae Construck, que se encontrava provisoriamente ancorada na frente doPosto de Atrack Alalau II.

Depois de uma hora de remadas, conseguimos chegar a barca, rebocan-do o corpo de Odoncil. Imediatamente, Gilberto foi ate o aviào que se en-contrava atracado na frente da casa sede do Posto, buscar lona e plasticopara acondicionar o corpo de Odoncil.

Eu e o piloto Daniel, comegamos a retirar o corpo de Odoncil de den-tro d'egua, para coloce-lo em cima da barcaca, onde seria melhor, para mo-vimentarmos na ocasido de enrolarmos no plastico e na lona e o embarqueno avid°.

Quando Gilberto chegou trazendo a lona, conseguimos retirar da eguao corpo de Odoncil. Gilberto, arrancou a flecha que ainda se encontravaencravada no peito de Odoncil. 0 seu revolver ainda continuava em sua cin-tura na bainha.

Enrolamos o corpo em pléstico e lona e embarcamos no aviao. 0 corpoestava muito inchado e em decomposic5o e para ser possivel coloce-lo dentrodo pequeno avião, foi necesserio retirar urn dos assentos.

59

Page 31: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Depois de embarcado o corpo subimos a bordo e devido o mau cheiroque exalava do corpo, fizemos toda a viagem entre o Posto de Atracão Ala-lau II ea pista de pouso existents nas proximidades do acampamento do 69Batalhäo de Engenharia e Construed°, corn as janelas abertas, dificultandoate mesmo a navegae5o do aparelho.

ApOs embarcamos o corpo de Odoncil na viatura que o transportou ateManaus, retornamos as buscas do Ultimo possivel sobrevivente, Evaristo Mi-guiles, ja ferido por flechadas, mas que havia empreendido fuga rumo ao des-matamento da estrada. Neste resto de dia, n5o conseguimos nenhum exito.

No outro dia, voltamos as busca. Uma turma por terra e outra por avi5oprocurando dentro da selva e por todo o desmatamento da estrada algum si-nal que pudesse dar pistas para encontrarmos Evaristo.

No final do dia, ao sobrevoarmos o desmatamento da estrada BR-174,vimos urn sinal convencionado pelo pessoal de terra que haviam encontradoEvaristo.

Continuando sobrevoar o local onde teriamos visto o sinal, jogamos ali-mentos e medicamentos, seguindo para o acampamento instalado na margemdo Igarapé Santo Antonio do Abonari, onde seguiu imediatamente umaoutra equips de companheiros num jipe de encontro a outra que ja tinha en-contrado Evaristo, mas estava sem conducao, corn o fim de resgatar o ultimosobrevivente do ataque ao Posto de Atracdo Alalau II no dia 02 de outubrode 1974.

Evaristo no mesmo dia que foi encontrado deu entrada no Hospital Ge-tOlio Vargas em Manaus ainda corn vida, mas infelizmente, dias depois veioa falecer.

Dos dez funcionarios da FUNAI que se encontravam no dia 30 de se-tembro de 1974, nos Postos de Atrack Alalau I e II, no rio Alalau, seis torn-baram sem vida, em sacrificio a uma causa e em defesa dos seus prOprios al-gazes, os indios Waimiri Atroari.

60

A ESTRADA BR-174MANAUS-CARACARAI-BOA VISTA

Ate o ano de 1974, s6 era possivel it de Manaus ao TerritOrio Federalde Roraima, ao norte do Amazonas,ou por via aérea ou por via fluvial s atra-yes de precario sistema de navegacão pelos rios Negro e Rio Branco.

Seguia-se pelo Rio Negro ate a foz do Rio Branco e por esse rio ate asgrandes cachoeiras, nas proximidades da vila Caracarai ja no territ6rio deRoraima, e para se seguir ate Boa Vista,capital daquele territOrio, teria quese prosseguir a viagem via terrestre.

Varias tentativas foram feitas para que fosse construido uma estradaque ligasse as terras de Roraima ao Estado do Amazonas.

A primeira tentativa de construck de uma estrada, ocorreu no ano de1847 e teria o seu percurso seguindo inicialmente o rio Urubu ate atingir oscampos do entao Territhrio Federal do Rio Branco.

Entretanto o piano ndo saiu do papel.

Ern 21 de outubro de 1893, foi firmado pelo Presidents da Provincia doAmazonas, urn contrato corn o Sr. Sebastido Jose Domingos, para construed()de uma estrada ligando Manaus a vila de Boa Vista, hoje capital do TerrithrioFederal de Roraima.

Os trabalhos de construc5o da estrada foram iniciados em 31 de novem-bro de 1893 e concluidos em 13 de janeiro de 1895.

A construc5o da estrada foi feita em 14 meses, medindo 815 quilOrne-tros e 419 metros. Foram cravados em toda sua extens5o 816 marcos de urnmetro de altura. A estrada tinha uma largura que variava de 05 a 08 metros.Atravessava 9 rios e 734 igarapds.

Ndo se tern nenhum registro de incidentes graves, envolvendo trabalha-dores da estrada e os indios habitantes na regi5o onde a estrada passou.

Entretanto ern pouco tempo a vegetacao cresceu e a estrada ficou nova-mente intransitavel.

Em 1928, L. 0. Collins, abriu uma "picada" ligando Manaus a Boa Vis-ta corn 868 quilOrnetros e 835 metros que a exemplo da primeira estrada empouco tempo depois de construida ficou completamente intransitavel.

61

Page 32: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Somente na dêcada de sessenta, voltou-se a falar na construcao de umarodovia que ligasse Manaus ao TerritOrio Federal de Roraima. Entretanto na-da de concreto foi realizado.

No final da decada de sessenta, o Brasil firmou varios acordos interna-cionais, corn os paises vizinhos e entre eles o de construir uma estrada quetornasse possivel a ligacao atraves de rodovia, da rag& do Prata corn os An-des, sem que fosse necessario enfrentar toda a cordilheira.

Daf surgiu a ideia da estrada,tambem conhecida como BV8 ou Trans-continental, que I igaria Buenos Aires, capital da Argentina, Montevideu,Brasilia, Caracas e Bogota por sistema rodovierio.

E a estrada vinha de encontro a antigo desejo tanto de roraimenses,como dos amazonenses, pois seria a oportunidade de conseguir a ligacäoatravés de estrada entre aquelas regiOes, atraves de rodovia, acabando assimcorn o isolamento daquela regi5o.

A construc5o da estrada que no trecho Manaus-Boa Vista seria denomi-nada BR-174, atenderia em principio o acordo firmado com os paises visi-nhos e atenderia diversos aspectos de interesses nacionais, como politico,econOm ico e militar.

Entretanto a rodovia teria que ser construida atravessando a selva ama-zOnica, numa regi5o das mais in6spita, de dif fcil condicOes da implantaedode uma estrada.

0 tracado da estrada, cortava ao meio o territOrio cultural dos IndiosWaimiri Atroari, conhecidos na regi5o pela sua agressividade aos não indiose tidos como arredios a toda tentativa de contato.

Entretanto, este fato n5o foi considerado. A estrada teria que ser cons-truida e era um fato "irreversivel", alias como ultimamente tem sido veriasoutran obras faraOnicas que o governo brasileiro, comeca e n5o chega a con-cluir.

0 Ministerio do Transporte, atraves do Departamento Nacional de Es-trada de Rodagens, DNER, antes do . infcio da construed() da estrada propria-rnente dita, preocupado apenas ern evitar que os trabalhos da estrada viessema ser interrompidos pelos indios Waimiri Atroari, procurou a Fundack Na-cional do Indio — FUNAI, e praticamente exigiu que aquele Org5o fizesse omais rapid° possivel a "pacificacao" daqueles indios, no menor espaco detempo para que quando os trabalhadores da construed() da rodovia atingis-sem a regi5o ocupada pelos indios, esse ja estivessem "man gos" e ate viessema colaborar como moo-de-obra da construed() da estrada.

62

Para tanto foi organizado uma expedig5o, formada pelos prOprios enge-nheiros do DNER e alguns mil itares do Exercito Brasileiro, sediados em Ma-naus, para tentarem eles mesmos o contato direto com os indios WaimiriAtroari, pois achavam a tarefa tack, imaginando que bastava explicar aos in-dios a "grande vantagem que seria a estrada para eles, que serveria de meio decomunicacdo entre a região em que moravam com as cidades de Manaus eBoa Vista, alem de ser urn mercado de trabalho para os Indios".

A expedicao seguiu ao territOrio dos indios Waimiri Atroari, por via flu-vial, atraves do rio Camanau e foram ate as proximidades do antigo Posto In-d fgena Irraos Briglia, do Servico de Protecdo aos Indios (SPI) que se encon-trava desativado. Como nao chegaram a avistarem-se com os indios, retorna-ram a Manaus.

A Fundac5o Nacional do Indio — FUNAI, atendendo solicitac5o doDNER colocou a disposicao daquele organismo Federal, o seu funcionerio —Sertanista Gilberto Pinto Figueiredo, com a finalidade de "pacificar os in-dios" Waimiri Atroari, face as necessidades apresentadas tendo em vista aconstruc5o da rodovia.

Inicialmente, o trecho da rodovia de Manaus ate o rio Alalau, ficou acargo do Departamento de Estrada de Rodagens do Estado do Amazonas —DER-AM, permanecendo sob supervis5o do Departamento Nacional de Es-trada de Rodagens — DNER.

Embora a Fundac5o Nacional do Indio — FUNAI, houvesse nomeadoGilberto Pinto, para pacificar os indios Waimiri Atroari, ele tinha sua posi-c5o formada corn relack ao assunto Era um sertanista experiente e parti-dério de que a estrada deveria ter seu tracado alterado e contrario a "pacifi-cacdo dos Indios" de forma apressada e de outros metodos preconizados pe-los dirigentes do DNER — DER-AM.

Gilberto Figueiredo, no dia 23 de agosto de 1968, subindo o rio Uatu-m5 e depois o seu afluente Rio Abonari, conseguiu encontrar-se corn os in-dios Waimiri Atroari, quando manteve contatos amistosos e realizou corneles, trocas de presentee. E pretendia Gilberto, je que o tracado da estrada,n5o era mais possivel mudar, segundo as autoridades do DNER, procuraratrair os indios para fora do eixo da estrada, tentando assim evitar maioresproblemas para aquela comunidade de silvicolas.

Por notarem o posicionamento de Gilberto com relack a estrada e aosIndios, o DNER — DER-AM, que tinham pressa em que fosse feito a "pacifi-cac5o" dos Waimiri Atroari pediram a substituic5o de Gilberto Pinto, dostrabalho de contatar os indios.

63

Page 33: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

No seu lugar foi nomeado o Padre Giovanni Calleri, que era conhecidona raga° pela sua ousadia e forma apressada de "pacificar" indios (Na verda-de o Padre Calleri neo tinha nenhuma experiência em contato com os in-dios).

A misseo do Padre Calleri era de "pacificar" os Waimiri Atroari com omenor espaco de tempo possivel, de acordo corn as necessidades do DNER —DER-AM, pois queriam que quando os trabalhos da construceo atingissemo territOrio habitado pelos indios, estes ja estivessem "pacificos" e mansos,pois pretendiam utilize-los como meo-de-obra auxiliar na construcSo.

Infelizmente o apressado Padre Calleri, e seus inditosos companheirosde trabalho, foram mortos pelos indios dias depois de penetrarem nosterrit6-rio dos indios Waimiri Atroari.

Corn a morte do Padre Calleri e de seus companheiros, e ainda por faltade recursos financeiros, a construceo da rodovia, foi suspensa temporaria-mente.

Em fins de 1969 e in icio de 1970, os trabalhos da construceo da Rodo-via Manaus-Boa Vista, BR-174, foram reiniciados, e o DNER transferiu a res-ponsabilidade da construck do Departamento de Estrada de Rodagens doEstado do Amazonas — DER-AM, para o 29 Grupamento de Engenharia eConstruceo — 69 Batalhao de Construcao, do Exercito Brasileiro.

A Fundaceo Nacional do Indio — FUNAI, novamente foi chamada aparticipar dos trabalhos, atraves da pacificaceo dos indios Waimiri Atroari.S6 que desta vez, nào houve uma participageo tn.° direta do DNER. Os con-tatos corn os indios ficaram exclusivamente a cargo da FUNAI sem nenhumainterferéncia direta.

Novamente os trabalhos de contato com os Waimiri Atroari, foram en-tregues ao indigenista Gilberto Pinto Figueiredo, que no periodo em que aconstrucão da estrada estava parada, continuou seu trabalho junto aos in-dios, realizando perrodicas visitas aquela comunidade indigena.

Usando mOtodos de não ingerencia na vida dos indios e extremo respei-to ao territ6rio indigena, Gilberto conseguiu manter contatos amistosos comos Waimiri Atroari, por muito tempo.

Desvinculado dos trabalhos da estrada, Gilberto usava sempre os rios,como caminhos para atingir o territOrio dos indios e para visitas as suas malo-cas, quando realizava troca de brindes.

64

Paralelamente a atividade de Gilberto, os trabalhos da construcäo daestrada prosseguia, o desmatamento corn frentes de centenas de homens tra-balhando sem descanco, dirigiam-se para dentro de territ6rio Waimiri Atroa-ri.

Corn a aproximack do desmatamento da estrada ao territ6rio dos in-dios Waimiri Atroari, Gilberto apreensivo quanto ao possivel contato dosindios com os trabalhadores, procurou por diversas vezes o Comandante do29 Grupamento de Engenharia e Construck — Sexto BEC., para pedir-Ihesque fosse instruido a todos que trabalhassem na estrada para que n5o reali-zassem nenhuma visita as malocas dos indios.

Gilberto, confessou-me Arias vezes que sentia .que quando fazia essasvisitas ao BEC, e fazia aqueles pedidos de protecio aos notava en-tre o Comandante do Sexto BEC e seus auxiliares nenhuma receptividade eisto o deixava temeroso de que seus pedidos n5o fossem cornpreendidos eatendidos.

As advertências e pedidos de Gilberto, resumiam-se sempre em que ostrabalhadores da estrada evitassem entrar em contato corn os indios e emhip6tese nenhuma procurassem it ate as malocas dos Waimiri Atroari.

Em Janeiro de 1973, urn dos mateiros, empregado no servico de desma-tamento da estrada, desobedecendo as recomendacOes de Gilberto, junta-mente com alguns companheiros, esteve visitando uma das aldeias dos indiosWaimiri Atroari. E le comportou-se de forma abusiva. Teria levado consigo,entre outros objetos, algumas revistas pornograficas, corn fotografias obcenase mostrado as indias e indios. E na ocasi5o teria tentado acariciar uma dasindias que se aproximara. Esse fato irritara profundamente os Waimiri Atroa-ri.

Poucos dias depois dessa desastrosa visita, os indios atacaram o Posto deAtrack Alalau, instalado no rio Alalau por Gilberto Figueiredo, matandotrês funcionerios que ali encontravam-se no trabalho de manter contatos cornos Waimiri Atroari.

Gilberto ficou magoado com o fato. Pois vinha advertindo o SextoBEC, para que nao permitissem a ida de pessoas as aldeias dos indios. E ofato ocorreu, provocando a revolta dos indios e a morte de tres abnegadoscompanheiros de trabalho.

Os contatos corn.os Waimiri Atroari, vinham sendo realizados wnstan-temente de forma pacifica, e a presenca de forma injuriosa de pessoas nasaldeias dos indios, prejudicou todo urn trabalho que vinha sendo realizadoe a morte de três pessoas que era o mais grave.

65

II

Page 34: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Entretanto o Comandante do 29 Grupamento de Engenharia e Constru-p5o, n5o aceitou o fato, como de responsabilidade do Sexto BEC, que de-sobedecera as recomendacCies de Gilberto.

0 comandante do 29 Grupamento de Engenharia e Construp5o — doExercito Brasileiro, em Nota Oficial, publicada em todos os jornais da capi-tal isentou o mateiro que visitara as aldeias dos indios de qualquer responsa-bilidade das mortes dos funcionerios da Fundap5o Nacional do Indio, e ten-tou denegrir a pessoa e o trabalho de Gilberto Pinto Figueiredo e seus corn-panheiros de trabalho, colocando ate em davida sua competência profissio-nal.

Gilberto foi intimado na epoca, a responder inquérito Policia! (Inquê-rito aberto pela Policia Federal em Manaus) que apurava a responsabilidadedas mortes que resultaram do ataque dos indios Waimiri Atroari ao Postode Atrap5o Alalau, no rio Alalau, unidade administrativa da Fundap5o Na-cional do Indio — FUNAI.

Outras pessoas foram intimadas tambern a prestar depoimentos, inclu-sive do Exercito, atraves do 29 Grupamento de Engenharia e Construp5o —Sexto BEC, que apresentou subs(dios atraves de depoimentos de oficiais quetrabalhavam na estrada e fez juntar ao processo a sua nota oficial que publi-cou na imprensa, onde isentava o mateiro Celso Maia, pessoa que teria visita-do os indios antes do ataque, e ao mesmo tempo colocava em clövida os co-nhecimentos indigenistas de Gilberto Pinto Figueiredo.

Gilberto confessava-me que antes ja n5o era bem visto iielo pessoal doSexto BEC e corn o ataque dos indios ao Posto de Atrapão Alalau e posi-cionamento piliblico do Comando do 29 Grupamento de Engenharia e Cons-trup5o, através de nota assinada pelo prOprio General Octavio Ferreira Quei-roz, ficou muito mais dif foil o relacionamento entre Gilberto e o pessoal doExercito encarregado da construp5o da BR-174 — Rodovia Manaus-Caraca-ra (-Boa Vista.

Na regi5o do rio Alalau e Branquinho, antes da passagem do desmata-mento da estrada, foi realizado trabalhos de sondagem do solo atraves daempresa Lasa Engenharia S/A, que em comum acordo corn a FUNAI e asdiretrizes preconizadas por Gilberto Figueiredo, o pessoal encarregado doservipo, circulou em todo o percurso de onde passaria a estrada, realizandoas pesquisas, sem que tivessem o menor incidente corn os indios. 0 pessoalseguia os seguintes principios para circular dentro da area dos WaimiriAtroari.

N5o visitar as aldeias.

Não oferecer presentes aos indios.

66

N5o cacar no territOrio dos indios

Nao pescar nas aguas dentro do territOrio dos indios.

Estar vacinado contra molestias previniveis.

N5o ser portador de doencas contagiosas.

N5o portar objetos que poderiam atrair a curiosidade dos indios.

Näo portar armas de fogo.

0 trabalho realizado pela equipe da Lasa Engenharia S/A, cumprindo asnormas fixadas por Gilberto, corn certeza foi a principal causa da n5o hostildade dos indios.

Os Waimiri Atroari, quando da realizac5o dos trabalhos a cargo do pes-soal da Lasa Engenharia S/A, visitaram verias vezes os acampamentos de tra-balho, mas n5o ocorreu nenhum incidente.

Tao logo os trabalhos da Lasa Engenharia S/A, foram ooncluidos, os ser-vipos a cargo do Sexto BEC de desmatamento foram aproximando-se do rioSanto Antonio do Abonari, ja dentro do território Waimiri Atroari.

A pedido de Gilberto, a FUNAI, atraves da 1a Delegacia Regional emManaus, passou a cobrar do Sexto BEC as normas exigidas e fixadas ao pes-soal da Lasa Engenharia S/A, quanto as exigéncias para a circulap5o de pes-soas dentro do territOrio dos indios Waimiri Atroari.

Houve imediata resistência do pessoal do Exercito que trabalhava naestrada, pois eles n5o abdicavam da condip5o de permanecerem armados cornarma de fogo.

As normas encaminhadas ao 29 Grupamento de Construp5o — SextoBEC fixava que nenhuma pessoa viesse a circular alern da Rome construidasobre o rio Abonari, portanto arma rumo ao territOrio Waimiri Atroari, e queobedecesse as exigências anteriormente fixadas para o pessoal da firma LasaEngenharia S/A, como rik capar, n5o pescar, estar vacinado, n5o visitar asaldeias dos indios, etc...

Estas normas fizeram com que gerasse entre o pessoal do Sexto BEC in-satisfap5o, e desrespeitando totalmente as condipbes fixadas para permanece-rem dentro do territOrio Waimiri Atroari, procuravam sempre impor suasvontades, desconhecendo por completa a presenpa da FUNAI, atraves deGilberto Figueiredo e sua equipe na area dos Waimiri Atroari.

67

Page 35: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Algumas vezes quando encontrava-me nos Postos de Atracão Abonari eAlalau, durante a noite, eu cheguei a presenciar, ouvindo tiros de espingardadentro da mata. Como os Waimiri Atroari, na época desconheciam o use dearmas de fogo, Gilberto levantava-se de sua rede e junto corn os seus compa-nheiros de trabalho, fazia buscas na mata tentando localizar o cacador. Umadestas vezes, eu o acompanhei e flagramos urn dos trabalhadores da estradae funcionério do Sexto BEC cacando, oportunidade que Gilberto apreendeua sua arma. E isto ocorria frequentemente, ern total desrespeito as normasfixadas por Gilberto e oficializadas pela pr6pria FUNAI.

A Fundacao Nacional do Indio — FUNAI, através da Sub-Coordenackda Amazonia — SUB-COAMA, ern Manaus, por diversas vezes advertiu aoComando do 29 Grupamento de Engenharia de Construcao — Sexto BEC,sobre estes incidentes, alertando sobre o perigo que o nosso pessoal corriatoda vez que uma pessoa aventurava-se a cacar dentro do territOrio WaimiriAtroari. Lembrando sempre que o nosso pessoal era quern ficava mais pro-ximo as aldeias dos indios e por isto seriam os primeiros a serem responsa-bilizados pelo fato e os primeiros a serem sacrificados, no caso de qualquerac5o belicosa por parte dos indios.

Pessoalmente fui %/arias vezes acompanhando o sertanista Gilberto Pin-to Figueiredo apresentar reclamacOes ao Comando do 29 Grupamento deEngenharia de Construc5o sobre o comportamento do pessoal do SextoBEC dentro da area indfgena.

E todas as vezes que estivemos no Comando do 29 Grupamento de En-genharia e Construc5o, ern Manaus, a indiferenca da chefia era notada, cornrelac5o as nossas denUncias.

Certa vez, urn dos oficiais do Exercito, tambarn certamente do 29 Gru-pamento de Engenharia e Construc5o, presente aquelas reunifies perguntou-nos se n5o estóvamos sendo exigentes e muito rigorosos, principalmente pe-lo tato de querer que o pessoal que trabalhava na estrada andasse desarmado,deixando transparecer sem nenhuma reserva que não obedeceriam e nemiriam obedecer as normas fixadas por Gilberto e a prOpria FUNAI, de queninguem andasse armado dentro da reserva Waimiri Atroari.

Mesmo assim, as trabalhos da Rodovia Manaus-Boa Vista — BR-174,andavam em ritmo acelerado. Baterias de maquinas pesadas invadiam e movi-mentavam-se dentro do territOrio dos Waimiri Atroari.

Sentiu-se nos Postos de Atracão Alalau I, Alalau II, Abonari e Camanau,urn movimento incomum dos indios, que desde a entrada na reserva, das ma-quinas e a grande movimentack na estrada, chegavam em visita aos Postose pouco demoravam, como normalmente faziam.

Alguns grupos de Waimiri Atroari, surgiram na estrada onde as maqui-nas movimentavam-se corn maior frequência.

Gilberto, apreensivo com a situac0o,circulava entre os Postos Indigenas,e as vezes surgia na estrada, onde estavam os trabalhadores verificando a si-tuacao quanto a presenea de Indios.

Gilberto pessoalmente, pediu ao encarregado do servico de desmata-mento, que seguia sempre a frente, do trabalho de terraplanagem e aterro,que quando atingissem o rio Alalau, n5o construissem acampamento pr6xi-mo a margem do rio, para evitar que os indios fossem atraidos ao local,quando passassem em seas canoas no rio, e que viessem a ter, por falta de ex-periencia dos trabalhadores, algum incidents corn os

Nesse periodo, urn dos principais I ideres dos Indios Atroari, conhecidocomo "Comprido", em visita ao Posto de Atrae5o Alalau I I, procurou Gilber-to e pediu-lhe com certa insistência que o levasse a Manaus, juntamente cornseu filho que o acompanhava na ocasiao.

Gilberto temeroso em levar Comprido a Manaus, pois temia que se le-vasse Comprido e seu filho a Manaus e la por mero acaso viessem a contrairalguma doenea, por ma is simples que fosse, ou mesmo n5o viesse a gostar daviagem, pudesse provocar uma reae5o dos indios contra si e seus companhei-ros de trabalho no Posto de Atrae5o Alalau II, procurou dissuadi-lo do pro-p6sito.

Entretanto Gilberto não conseguiu demove-lo da idaia. Gilberto entdo,atraves de radiofonia,pediu-me que enviasse ao Posto Alalau I I,um avi5o paraconduzir-lhe juntamente comComprido e seu filho a Manaus,explicando in-clusive a situack.

0 avião seguiu imediatamente e Gilberto, muito preocupado chegou aManaus acompanhado de "Comprido" e seu filho.

Hospedou-se na pr6pria Ade_onde funcionava a Primeira Delegacia Re-geional da Fundac5o Nacional do Indio — FUNAI.

Ele pr6prio, Gilberto, alojou-se tambern ali, para poder dar maior assis-téncia aos visitantes.

Comprido e seu filho, não demonstraram em nenhuma hora, qualquerinsatisfack. Muito pelo contrario. Estavam alegres e sorridentes.

Gilberto acompanhou-os a passeios por toda a cidade procurando sem-pre explicar-Ihes o funcionamento de cada instituic5o visitada.

68 69

Page 36: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Gilberto apresentou a Comprido sua prOpria familia tentando assim,estreitar mais ainda os lacos de amizade que ja vinha existindo entre eles.Os indios estiveram visitando tambern as famosas lojas de Manaus onde Gil-berto comprou alguns presentes para Comprido, seu filho e seus parentes.

No retorno, apOs tit dias de visita a Manaus, a bordo da pequena aero-nave que os conduzia, Gilberto procurou mostrar a Comprido a localizac5oda estrada e das malocas dos indios Waimiri Atroari.

No sobrev6o, Gilberto is explicando a Comprido o que seria a estradapara que serviria, mostrando a parte prOxima a Manaus, onde os caminheesautornOveis circulavam pela rodovia.

Comprido, ouvia muito atento as explicacOes de Gilberto.

0 avi5o a pedido de Gilberto, sobrevoou uma das malocas dos indiosAtroari e Comprido chegou a reconhecer alguns indios que se encontravamno patio da aldeia acenando. Ele talvez pensando que seria ouvido pelosseus companheiros que se encontravam nas aldeias, gritava e acenava, tentan-do fazer-se reconhecer por eles.

Gilberto, como era costume, ao chegar no Posto de Atrac5o Alalau II,no rio Alalau, conduziu Comprido e seu filho numa canoa motor ate o Portoda aldeia onde residia Comprido.

Ao chegar no porto da aldeia (local de embarque e desembarque nas ca-nods — é sempre um pequeno igarape raso, onde as canoas dos indios ficamatracados protegidas da correnteza e de periOdicas enchentes) existia urngrande nOmero de indios, que saudavam alegremente a chegada da canoaconduzida por Gilberto e onde tambern viajava Comprido e seu filho.

Os indios ofereceram a Gilberto alguns presentes como bananas e beijuseste após as despedidas retornou ao Posto, certo de que com o passeio de

Comprido a Manaus, teria dado um grande passo para a conquista da amizadedaquele grupo de indios.

Gilberto, quando retornou ao Posto de Atrac go Alalau II, apOs o per-noite, seguiu viagem via fluvial corn destino ao Posto de Atracgo Alalau I,que se encontrava instalada na foz do rio Alalau, corn o rio Jauaperi.

Ao passar no local onde a estrada Manaus-Boa Vista, BR-174, cruza orio Alalau, viu na margem esquerda urn acampamento possivelmente perten-cente aos trabalhadores da estrada, encarregados do desmatamento. A pre-senca daqueles trabalhadores naquele local, contrariava o acordo e o pedido70

feito ao 29 Grupamento de Engenharia e Construcgo — Sexto BEC, para quenão instalassem acampamentos na margem dos rios, procurando assim evitarque os indios ao navegarem pelos rios, n5o fossem atraidos pelos acampa-mehtos e os seus ocupantes.

Gilberto, encostou a canoa e foi ate ao acampamento. Pediu aos traba-lhadores que no momento encontravam-se no local, que afastassem as ins-talacOes das proximidades do rio.

Ap6s fazer algumas advertências aos trabalhadores da estrada sobre apossibilidade de receberem visitas de indios e de evitarem a todo custo decacarem naquela area, Gilberto continuou sua viagem ao Posto de AtracgoAlalau I, muito apreensivo.

Poucos dias depois, recebemos radiograma tanto do Posto de AtracgoAlalau II, como do Alalau I, informando-nos que durante a noite, estavamouvindo corn bastante intensidade o barulho das maquinas na estrada. Eratambern o sinal de que os indios tambern ja estavam ouvindo o ruido provo-cado pela movimentac5o das maquinas pesadas em servico de terraplanagemna estrada, pois suas malocas, estavam na mesma distáncia que separava osPostos de Atrac go, ao tracado da estrada.

Nesta mesma epoca, estranhamente a imprensa de Manaus, noticiavadiariamente assuntos corn relac go a construcgo da estrada Manaus-Boa Vista.Ora informava que os indios VVaimiri Atroari tinham atacado os trabalhado-res, ora diziam que os trabalhos da estrada estavam prosseguindo sem anor-malidades, gerando intranquilidade entre as familias dos trabalhadores daestrada e que procuravam a FUNAI para ter noticias do que realmente esta-va ocorrendo.

0 pessoal da FUNAI, ern Manaus, procurava explicar aqueles que procu-ravam a sede do Orgdo, que tudo is correndo barn, e que n5o tinham conhe-cimento ate entdo de nenhum incidents entre trabalhadores e

Entretanto as noticias falsas de ataque dos indios aos trabalhadores,deixavam-nos apreensivos, pois poderia estar tentando justificar alguma ati-tude ja tomada ou a tomar.

Ames de 15 dias decorridos da visita que o Capitdo Comprido e seu fi-lho fizeram a Manaus, surgiu nas proximidades do Posto de Atrac go Alalau I,urn grupo de indios Atroari, que ficaram acampados na margem direita dorio Alalau.

Mais tarde quando os funcionarios do Posto de Atrac go Alalau I, che-fiados por Jo5o Dionisio do Norte (mais conhecido pela alcunha de Jo5o

71

Page 37: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Maracaja) foram encontra-los, foram surpreendidos par eles, em um ataquea flechadas, tendo sido todos mortos.

Simultaneamente outro grupo de indios Atroari, surgiu no Posto de'Atragdo Alalau I I, e depois de urn dia de visita, atacou os funcionarios daFUNAI que se encontravam naquela unidade administrativa.

Os funcionarios Ad5o e Esmeralda, sobreviveram, entretanto, foramgravemente feridos a flechadas e a corte de fac5o. Morreram, vitimas doataque dos indios, os funcionarios Faustino Lira, Odoncil Santos e EvaristoMiquiles que conseguiu fugir ao ataque dos indios gravemente feridos, masja no hospital em Manaus, faleceu em consequência de uma flechada nofigado.

Quando em Manaus, fomos avisados atraves de radiofonia do Posto deAtracao Alalau II, que a canoa conduzindo Jodo Dion Isla do Norte estavadesaparecida, pais saira a dois dias do Posto de Atrac5o Alalau I para o Ala-lau II e ainda n5o havia chegado ao destino, apressamo-nos a deslocarmospara o local, numa tentativa n5o s6 de socorrer aqueles nossos companheirosque se encontravam desaparecidos, como tambem, pessoalmente, procuraravaliar a situack e, se possivel evacuar todo o nosso pessoal que se encontra-vam trabalhando nas frentes de Atrack na regi5o dos indios Waimiri Atroa-ri.

Pais de certa forma, ja esperavamos a reac5o dos indios quando as ma-quinas pesadas passassem a operar nas proximidades das suas malocas. Le-vantavamos a hipOtese de que os indios poderiam pensar que assim como asmaquinas, ate ent5o desconhecidas dales, derrubavam arvores removiam ter-ras, poderiam ir de encontro as suas pr6prias malocas.

Gilberto Figueiredo e eu, fretamos um aviao ant ibio, pertencente a Igre-ja Adventista de Manaus, sob comando do Pastor Daniel e seguimos com des-tino ao território dos indios Waimiri Atroari.

Ao sobrevoarmos a area do Posto de Atracão Alalau II, no rio Alalau,pelo seu estado de abandono, portas abertas, ninguern no patio, deduziu-seque os indios ja haviam atacado o Posto e tambem que os nossos companhei-ros ja n5o mais estivessem vivos.

Sabendo do risco que corriamos, o de ser possivelmente atacados pelosdecidimos descer e ir ate o Posto, numa tentativa de salvar possiveis

feridos ou ate mesmo com nossa presenca evitar que os indios continuassemo ataque.

0 avid() pousou no rio e fomos ate o Posto. Na casa sede do Posto soencontramos o companheiro Faustino Lira, que se encontrava n orto na co-72

zinha. Palos sinais ainda de morte recente, deduzimos que o ataque dos in-dios teria ocorrido minutos antes de nossa chegada, pois o sangue do indito-so Faustino Lira, ainda continuava pingando de seu corpo.

A casa do Posto,estava toda revirada. 0 aparelho de radiofonia des-tru (do. Mas nenhum sinal dos outros companheiros nem dos indios.

Apenas na frente da casa sede do Posto, ainda encontravam-se atracadas5 Ubas pertencentes aos indios, mas nem mesmo as canoas pertencentes aoPosto encontramos.

Na tentativa de encontrarmos os outros companheiros, que estavam de-saparecidos, eu e o Gilberto entramos na mata a procura de sinais que pudes-sem levarnos ate eles.

Infelizmente nenhum sinal encontramos dos nossos companheiros. Ape-nas tivemos certeza de que nas proximidades do Posto os indios ainda se en-contravam. Urn fato que nos deixou muito apreensivo quanta a nossa sobre-vivencia, foi a de que quando seguiamos ruma a mata, partindo da casa sededo Posto, uma pequena cadela, pertencente aos nossos companheiros que seencontravam desaparecidos, seguiu-nos, passando a ir, como é costume erncaminhadas pela mata, sempre a nossa frente.Sempre latindo,a cachorra pa-recia querer levarnos a algum lugar, que imaginavamos era o local onde esta-riam nossos companheiros. Entretanto quando ja encontravamos a cerca de500 metros dentro da mata a cachorra que sempre is latindo a nossa frente,calou-se repentinamente. E quando caminhamos mais alguns metros a nossafrente, encontramos a cadela agonizante corn uma flecha espetada em seupescoco. Aquele sinal era evidente que os indios estavam ali e que n5o que-riam que prosseguissemos ern nossa caminhada mata a dentro. Retornamosdal i, corn muita apreens5o, pois sabiamos que estavamos correndo sério riscode vida. Entretanto para surpresa nossa conseguimos retornar ao Posto semnenhum incidente. Por outro caminho, continuamos as buscas, a procura denossos companheiros.

Ficamos, eu e Gilberto, na area dos Waimiri Atroari, ate quando ali janäo mais estava nenhum dos nossos companheiros.

Conseguimos ainda resgatar corn vida, companheiros Ado Vasconcelos,Esmeralda e Evaristo Miquiles que veio a falecer no Hospital Getelio Vargasem Manaus.

Foram dias de angUstia e sofrimento para nos, pois cada corpo de corn-panheiro que encontravamos, reavivava a dor e a tristeza. Conseguimos en-contrar todos os corpos e transladamos todos para Manaus, onde foramsepultados.

73

Page 38: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Quando retornamos a Manaus, oficiamos ao 29 Grupamento de Enge-nharia e Construc5o urn pedido veemente para que mandasse suspender ostrabalhos de construcgo da estrada ate que tivessemos condicaes de retort-nuaos Postos de Atracgo e recompor o nosso pessoal.

Pessoalmente fomos entregar o officio ao Comandante do 29 Grupamen-to de Engenharia e Construggo, General Gentil.

Na ocasi go da entrega do documento, o General Comandante, nos fezciente de que JO mandara para as frentes de trabalho da estrada, brigadas desoldados do Exercito armados, prontos para "defenderem a qualquer custo,a continuidade dos servicos de desmatamento e terraplanagem da estrada Ma-naus-Boa Vista".

Aquela noticia, dada pelo General, deixou-nos perplexos e procuramosargumentar junto ao Comandante que naquele momento n5o era oportunoa continuidade do trabaho da estrada e muito menos prudente o envio aolocal de tropas do Exercito "prontos para defenderem, a qualquer custo, acontinuidade dos trabalhos'; como afirmara,

0 General comandante, diante de outros oficiais presentee naquela reu-nig°, respondendo as nossas ponderacOes afirmou "A Estrada (BR-174) ternque ficar pronta, mesmo que para isto tenhamos que abrir fogo contra essesIndios assassinos. Eles ja nos desafiaram muito e est go atrapalhando nossostrabalhos.Temos urn compromisso de entregar esta estrada pronta. E nab vaiser urn grupo de (ndios assassinos que vai impedir o prosseguimento da obra".

As afirmacOes do General Comandante,deixaram bem claras as intencbesque a missão do grupo de soldados que teria sido deslocada corn destino aoterritOrio dos Indios Waimiri Atroari.

Diante de afirmacOes tgo claras e jä decididas n go tinhamos mais nadaa argumentar.

Antes de sairmos da sala, o General Comandante, dirigindo-se ao Gilber-to, perguntou — "Que a que voce acha disso?". Gilberto corn os olhos chejosde legrimas, mal respondeu. Disse apenas:"General, na tentativa de fazer ami-zade corn os (ndios Waimiri Atroari, JO morreram entre FUNAI e Servico deProteggo aos Indios, mais de 60 funcionerios, procurando nunca tomar medi-das repressivas contra aquele povo. Agora o que o Senhor este me dizendoque fez e vai fazer, torna o sacrif (cio dos .que perderam suas prOprias vidasern defesa daqueles indios ern Va'o".

74

0 General Comandante, apenas respondeu: "Tenho tambern uma mis-s5o, a de construir a estrada Manaus-Caracaraf-Boa Vista e terei que cumpri-Ia. Mesmo que para isto tenha que enfrentar a bala os indios".

Diante dessas afirmacees e sabedores que os soldados armados ja se en-contravam dentro da reserva Waimiri Atroari, podia-se imaginar sem proba-bilidade de erro, sobre o que estaria acontecendo naquela regi5o.

Saimos da reuni5o, tristes olhando urn para o outro,perguntando-nos: eagora?. Tudo que foi feito na defesa dos indios teria sido Estávamosdesolados.

Aquela reuni5o e a posicgo doGeneral Comandante tinham esclarecidomuitas coisas.E nos deixou pensando ern que JO poderia ter ocorrido dentroda reserva dos indios Waimiri Atroari sem que soubessemos e que possivel-mente teira sido a causa da ira dos indios co*ra o nosso pessoal.

Retornamos ao escritOrio da Coordenac go da AmazOnia ern Manaus, ele mais uma vez eu e o Gilberto, continuamos a discutir o assunto e comen-tando o posicionamento do comandante do 29 Grupamento de Engenhariae Construcgo.

E sempre nos perguntavamos o que fazer? Diante da posicgo do GeneralComandante do 29 Grupamento de Engenharia e Construc go, as possibilida-des para continuarmos corn as frentes de atraggo n5o existia. Seria como tra-balhar entre dois fogos inimigos. De urn lado, os soldados do Exercito prontospara o combate tgo logo os indios procurassem impedir o andamento dos tra-balhos da estrada. Do outro, os pr6prios (ndios que vendo nossos companhei-ros a frente dos soldados, procurariam ataca-los antes do confronto corn asforcas armadas.

A direcgo da FUNAI, comunicada dos fatos e da intencgo das medidasja tomadas pelo Comandante do 29 Grupamento de Engenharia e Constru-c5o, ainda nano se pronunciara a respeito.

Apenas confirmara nossa decisào de suspendermos os trabalhos de atra-c5o ate que pudesse ser tornado novas medidas corn relaogo ao assunto.

Na regi5o dos indios Waimiri Atroari, apenas urn Posto de Atrac go per-manecia ern atividade. 0 Posto de Atraggo do Rio Santo Antonio do Abona-ri, regigo de influencia dos indios Waimiri, que eram liderados pelo conheci-do Maroaga, que desde muitos anos vinha demonstrando cultivar grande ami-zade aos nossos companheiros daquele Posto, destacando-se a amizade cornGilberto e corn o chefe do Posto Marinello Machado.

75

Page 39: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Junto corn Marinelio ainda permaneciam 6 outros abnegados colegas detrabalho, que talvez por uma quest go de honra e fidelidade a Gilberto e ami-zade dos indios, la permaneciam independente dos acontecimentos.

Mas apesar de se encontrarem dentro da reserva Waimiri Atroari e deterem conhecimento do que ocorrera corn os outros seus companheiros dorio Alalau, permaneciam la no Posto Abonari, sem nenhum terror de queviessem a sofrer urn ataque dos indios.

Depois disto, Gilberto que recebera ordens da alta direc go da FUNAIde ngo se afastar de Manaus, atraves de radiofonia, continuava mantendodiariamente contato corn o Posto de Atracgo Santo Antonio do Abonari.

Ern novembro de 1974, a FUNAI resolveu modificar os matodos detrabalho na area dos indios WaWiri Atroari.

Gilberto Pinto Figueiredo, que ha mais de 10 anos trabalhava junto aosIndios Waimiri Atroari, seria afastado da frente de atracgo e no seu lugarseria nomeado o jovem sertanista Sebasti go Amäncio da Costa, que naquelaalpaca chefiava as frentes de atrac go dos rios Itui, Itacoai e Javari, no alto rioSoftiies, na area de jurisdicgo administrativa da Base Avancada de Atalaiado Norte.

Quando a noticia foi dada a Gilberto, de que seria afastado da frente deatraggo Waimiri Atroari, Gilberto ficou muito magoado e triste e chegou adizer-me: "e agora o que you fazer? e os Indios, qual vai ser a situacga da-les?".

Entretanto Sebasti go Amancid que continuava a frente de seus traba-lhos na area do alto rio SolimOes, ainda ri go sabia que seria o substituto deGilberto, pessoa que respeitava muito e era para ele e grande maioria dos in-digenistas que o conhecia, uma especie de orientador e guia daqueles querealmenfe abracaram a cause indigenista.

A direcgo da FUNAI, ri go definira entretanto para onde seria deslocadoGilberto. Apenas decidira que aguardasse o seu substituto, que no caso seriao Sebasti go Amanda da Costa.

Gilberto, tambem estava aguardando o deferimento de seu pedido deaposentadoria que ja fazia jus, pelo tempo de servico prestado ao Servico P6-blico. Entretanto ilk era desejo de Gilberto, alien aposentar-se, afastar-se dotrabalho. Pois o valor que iria receber mensalmente pela aposentadoria doservico p6blico, era insignificante e para manter-se era necessario continuartrabalhando.

76

Sebastigo Amanda, quando soube que teria sido nomedo para chefiara frente de atrack Waimiri Atroari, em substituicgo a Gilberto, n go aceitoua designacgo e procurando o novo Delegado da FUNAI em Manaus, explicouas seus motivos. Ngo conhecia os indios, n5o tinha nenhuma experiénciacorn o grupo Waimiri Atroari e por isto seria muito dificil e traumatizanteo trabalho. E ainda, ele Sebasti go Amanda, estava desenvolvendo urn traba-lho no alto rio Softiies e gostaria de continuar là, pois alegava que os can-tatas corn grupos de indios arredios habitanteinaquela regi go, ja haviam co-mecado e a interrupcgo jogava por terra tudo que tinha sido feito ate entgo.

0 Delegado Regional da FUNAI em Manaus, n go tinha poderes paramodificar uma decisgo da alta direcgo da FUNAI, apenas cumpria ordens pa-ra transferir a responsabilidade da frente de atracdo Waimiri Atroari de Gil-berto Pinto Figueiredo para Sebasti go Amáncio Costa.

Sebasti go Amanda, ainda numa tentativa de demover a FUNAI da ideiade nomeä-lo chefe da frente de atracgo Waimiri Atroari, tirou ferias e viajoupara Brasilia, coma de tentar junto a direcgo da FUNAI, mudar adecisgo.

A nova direcao da Delegacia Regional da FUNAI em Manaus, que subs-tituia o General Coutinho e a minha pessoa a frente da Sub-Coordenacgo daAmazOnia, modificara todo os sistema de trabalho que ate ent go vinha sen-do utilizado.

A independéncia em que agiamos corn relaciies as nossas decisOes, fo-ram substituidas pela pol itica de que tudo deveria ser levado ao conhecimen-to do 29 Grupamento de Engenharia e Construcdo, para estudo e aprovacgo.A modificacdo foi tal e a dependència junto ao exercito chegou a tal nivel,que foi firmado urn acordo que os funcionarios da FUNAI, que prestassemservicos na frente de atracgo Waimiri Atroari, receberiam uma complemen-tack salarial do praprio 29 Grupamento de Engenharia e Construcgo, istovisando que fosse aumentado o efetivo de trabalhadores na reserva WaimiriAtroari, cujos trabalhos ate a mudanca da direcao da FUNAI, continuavamdesativados.

As normas anteriormente fixadas por Gilberto e a Sub-Coama em Ma-naus, para ingresso de pessoas em area indigena, como necessidade de estarvacinado, exames medicos para constatac go de ngo ser portador de doengasinfecto-contagiosas, foram abandonadas, passando a ri ga exigir absolutamen-te nada a ngo ser a ordem do 29 Grupamento de Engenharia e Construcgo.

Enfim houve praticamente uma intervencgo do 29 Grupamento de En-genharia e Construcgo, na direcgo da Fundacgo Nacional do Indio, em Ma-naus, principalmente nos trabalhos realizados pela frente de atrac go WaimiriAtroari.

77

Page 40: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

No dia 20 de novembro de 1974, no acampamento do exdrcito — 29Grupamento de Engenharia e Construedo — 69 BEC, na altura do Km 220 daBR-174 — Estrada Manaus-Caracara (-Boa Vista, foi realizada uma reuni go en-tre o Comando do 29 Grupamento de Engenharia e Construe:do e a direcdoda FUNAI no Estado do Amazonas, Sr. Francisco Mont'alverne Pires, Dele-gado Regional da FUNAI, e o chefe da Divisdo da Amaz6nia da FUNAI, Ma-jor Saul Carvalho Lopes, quando a sorte dos indios Waimiri Atroari foi tra-cada.

Na reuni go do Km 220, os representantes da FUNAI, que ao assumiremos cargos em Manaus, passaram a submeter-se as ordens do Exercito, atravésdo 29 Grupamento de Engenharia e Construc go, apenas ouviram e anotaramo que o alto Comando daquela corporacdo ja decidira. Ou seja, o de dar con-tinuidade a qualquer preco os trabalhos da estrada,que tinham sido rapida-mente interrompidos,apas o ataque dos indios ao Posto Indigena Alalau norio do mesmo nome, naquelas proximidades.

Entre outras medidas administrativas, que ficaram decididas naquelemomento, ficou acertado que alarn de medidas de defesa que o pessoal doExército que trabalhavam na estrada ja tomara, seria realizado dentro da re-serva dos Waimiri Atroari, demonstracdo pelo Exarcito de forca bdlica atra-yes de rajadas de metralhadoras, explosOes de dinamites, de granadas, numatentativa de "amendrontar" os indios e evitar que voltassem a interrompero andamento dos trabalhos da estrada.

Os dirigentes da Fundacgo Nacional do Indio, que participaram daquelareunido, n go possuiam a minima formacgo indigenista e estavam ocupandoos cargos de Delegado Regional e Diretor da Djvisao AmazOnica, por meroacaso e por motivos de ordem particular, ou seja apenas em funcao do altosalad° que percebiam e por isto mesmo ndo tinham nenhum compromissocorn a causa indigena.

Nem mesmo aquela regi3o onde encontravam-se no momento da reu-nido conheciam, mas apesar de estarem nos cargos a menos de urn mds arvo-ravam-se de conhecedores do problema e diante das afirmacties do Sr. Co-mandante do 29 Grupamento de Engenharia e Construed°, diziam apenas o"Sim Senhor", as ordens do alto Comando.

Tanto o Sr. Mont'alverne e o Major Saul, eram conhecidos por suas po-sicdes anti-indio e pelas suas posic5es acomodados de simples obedecedoresde ordens.

E assim,naquela manh3 de novembro, foi oficializado a guerra, que des-de muito tempo existia contra os indios Waimiri Atroari, isto corn os funcio-78

narios da FUNAI, concordando em tudo que 'he foi dito e determinado peloalto Comando do 29 Grupamento de Engenharia e Construcgo.

E assim os trabalhos de construcgo da rodovia Manaus-Caracarai-BoaVista, continuaram em r Itmo acelerado, sem interrupcOes.

No outro dia, 21 de novembro de 1974,atraves do Of ficio n9042/E-2Confidencial, o Sr. Comandante do 29 Grupamento de Engenharia e Constru-ca"o — General Gentil Nogueira Paes, determinava ao Comandante do SextoBatalh go de Engenharia e Construc go que fossem tomadas as medidas repres-sivas aos indios Waimiri Atroari para que os trabalhos da rodovia Manaus-Ca-racara (-Boa Vista tivessem continuidade.

Entre as recomendacOes do officio n9 042/E, destacaram-se os seguintesitens:

"Que considerem as visitas amigaveis dos indios como aviso de futuroataque e que tomem medidas necess.irias para retrair ou receber reforcos".

"Sejam distribuidos as turmas e grupos, foguetes e bombas do tipo "ju-nino" — para afugentarem os indios; devendo esses artif Icios pirotêcnicosserem utilizados corn parcimonia, para que produzam resultados".

"Esse comando, caso haja visitas dos indios realize demonstracOes defor-ea, mostrando aos mesmos as efeitos de uma rajada de metralhadora, degranadas defensivas e da destruicao de dinamite".

Este document° cuja "Fac-smile"encontra-se publicado nas pdginas se-guintes, foi certamente a "cobertura" que o Comando do 29 Grupamento deEngenharia e Construed°, forneceu aos seus comandados pelos atos ja pra-ticados e em pratica naquele momento dentro da reserva Waimiri Atroari.

Pois muito antes da realizaedo da reunido entre o 29 Grupamento deEngenharia e Construgd° e a FUNAI, no Km 220 da rodovia Manaus-Caraca-rai-Boa Vista, ja o Sr. Comandante, nos avisara que tomaria as providénciasdeterminadas no of icio n9 042/E-2 Confidencial datado de 21 de novembrode 1974, quando enviou grupos de soldados armados para a reserva WaimiriAtroari, corn a finalidade de garantir o prosseguimento dos trabalhos daconstrued° da BR-174 (fato ja narrado neste livro em paginas anteriores —visita ao alto Comando do 29 Grupamento de Engenharia e Construed() feitapor mim e o Gilberto Pinto Figueiredol.

A reuni go do Km 220 da estrada Manaus-Caracarai-Boa Vista — BR-174,ngo contou corn a presenca do sertanista Gilberto Pinto Figueiredo, que ern-bora oficialmente estivesse afastado de suas func5es, na realidade contintiava

79

Page 41: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

de fato comandando as frentes de atraedo, esperando que o seu substituto,ja nomeado, mas em ferias, assumisse a chefia da frente de atrae5o WaimiriAtroari.

Aproximava-se o final do ano, e as chuvas naquela regi5o intensificava-se, diminuindo o ritmo dos trabalhos da estrada.

Na area da reserva dos indios Waimiri Atroari, apenas o Posto de Atra-cdo Santo Antonio do Abonari, permanecia ativado. Entretanto desde outu-bro que os indios ndo apareciam no Posto.

0 Chefe do Posto, Marinelio Machado, desde junho de 1974, que adiavao periodo em que deveria afastar-se do trabalho em gozo de ferias regulamen-tares. E, apenas por necessidade do servico e em solidariedade a Gilberto eseus companheiros de trabalho, permaneceu no trabalho ate o mds de dezem-bro. Com a proximidade das festas de fim de ano, Marinelio Machado, afas-tou-se da chefia do Posto de Atrac'ao Waimiri Atroari Santo Antonio do Abo-nari e entrou em gozo de ferias, que por diversas datas fora adiada.

Embora a chefia do Posto Santo Antonio do Abonari, ficasse a cargo deoutro colega tambern muito experiente, Gilberto, corn a saida de MarinelioMachado da chefia do Posto, ficara muito preocupado corn sua ausência naarea.

Entretanto a turma que permanecia no Posto de AUKS° Santo Antoniodo Abonari, ja desde muito trabalhava sob orientac5o de Gilberto e tinha ex-periência no trato corn os indios.

No Posto, existia urn estoque de brindes relativamente suficiente paraatender a visita de qualquer grupo de indios e todo o equipamento do Postofuncionava bem. Inclusive o rediofonia SSB que a qualquer hora entrava emcontato corn a sede da FUNAI em Manaus e corn outros Postos Indigenes daregido.

Alern disto a sede do Posto Santo Antonio do Abonari II, ficava a cercade 1 (um& hora distante de viagem de canoa a motor da estrada BR-174, játransitavel por veiculos, partindo-se de Manaus em direcao a Caracard.

Nas proximidades da Ponte constru Ida sobre o rio Santo Antonio doAbonari, a cerca de dois quilbmetros do rio, encontrava-se instalado umacampamento do Sexto Batalh5o de Engenharia e Construck, no Km 220,que servia de base aos trabalhos de construed° da estrada dentro da reservaWaimiri Atroari.

No acampamento do Km 220, do Sexto Batalhdo de Engenharia e Cons-trued°, desde o ataque dos indios ao Posto da FUNAI no rio Alalau, em ou-80

tubro/74, permanecia de prontid5o grupos de soldados do exercito, forte-mente armados que periodicamente e sistematicarnente faziam excursOesdentro da Reserva Waimiri Atroari, sempre utilizando-se de caminhOes, jipes,nos locais transitaveis, seguindo ainda em longas caminhadas, realizando o"Patrulhamento a pa"

Mas, quando se aproximava o final da semana, os trabalhos da constru-e5o da rodovia eram suspensos e tanto os oficiais chefes de turmas, peOes,soldados, retiravam-se da area e seguiam para Manaus,para passarem o fim desemana, s6 retornando as vezes na terca-feira.

E naquela época, fim de ano de 1974, os trabalhos da estrada estavapraticamente paralisados, pois as chuvas ja castigaram bastante naquela re-gido tornando-se quase que impossivel a continuidade dos trabalhos de cons-trued° da rodovia. Alern disto, a maioria dos oficiais do exêrcito que traba-lhava na construc3o da estrada, estava entrando de ferias ou viajando para ascidades onde residia seus familiares para passar as festas de fim de ano.

Poucos dias antes do natal, a imprensa de Manaus publicou noticiasque teria surgido nas frentes de trabalho de construed() da rodovia Manaus-Caracarai-Boa Vista, urn grupo de indios Waimiri Atroari e que os trabalha-dores estavam temerosos de que eles repetissem o ataque que fizeram aosfuncionerios da FUNAI, no Posto de Atrack do rio Alalau em outubro da-quele ano.

Gilberto, que se encontrava em Manaus, aguardando a chegada de seusubstituto, foi convocado pela FUNAI, para seguir urgente a area dos indiosWaimiri Atroari, para verificar se a noticia publicada nos jornais em Manausteria fundamento e tomar, se fosse o caso, as providéncias no sentido de ten-tar evitar u ma ac5o belicosa por parte dos indios.

Gilberto deslocou-se ate a area em avid° fretado, e percorreu toda a ex-tensdo da rodovia construida dentro da reserva Waimiri Atroari e nao chegoua constatar a existencia de nenhum sinal que pudesse identificar que os in-dios tivessem estado em algum trecho da estrada em construc5o.

Gilberto, ao retornar a Manaus, afirmou que os trabalhos da estrada es-tavam paralizados e que aquelas noticias de surgimento de indios na faixaem construed° da rodovia, talvez tivesse lido divulgada simplesmente parajustificar temporariamente a paralisacdo dos trabalhos de construed° da es-trada e permitir assim que os trabalhadores do Sexto Batalh5o de Engenha-ria e Construed°, passassem as festas de fim de ano em Manaus, corn os seusfamiliares.

81

Page 42: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Informou ainda Gilberto, que ate o acampamento do Sexto Batalhaode Engenharia e Construck, no Km 220 da Estrada Manaus-Caracarai,situado nas proximidades do igarapé Santo Antonio do Abonari, encontra-va-se praticamente desativado, pois apenas alguns soldados eram vistos mon-tando guarda.

Gilberto passou o natal em Manaus e sempre mantendo contato atravesde radiofonia corn os companheiros que permaneciam no Posto de AtracaoSanto Antonio do Abonari.

Tudo naquele posto corria normalmente, ate que no dia 26 de dezem-bro surgiu na sede daquela unidade de atracao, um grupo de indios Waimiri,chef iados pelo conhecido Maruaga, amigo pessoal de Gilberto, e dos funcio-narios que se encontravam no Posto.

Os indios, como era normal ern visitas amistosas, faziam-se acompanhardos velhos, mu lheres e criancas.

E tudo indicava que aquela visita era mais uma que periodicamenteaquele grupo de indios, fazia ao Posto Santo Antonio do Abonari, para reali-zarem troca de presentes.

Entretanto os funcionarios que ali encontravam-se tao logo surgiram osindios no Posto, comunicaram a sede da FUNAI em Manaus, e entraram erncontato corn Gilberto atraves do sistema de radiofonia.

Presenciei o contato que Gilberto manteve atraves de radiofonia corno Posto de Atracao Santo Antonio do Abonari. Notei entretanto que Gilber-to ficara apreensivo corn a noticia da chegada dos indios no Posto.

0 encarregado do Posto que se encontrava substituindo Marinelio Ma-chado, transmitiu a informacao de que os indios estavam perguntando porGilberto, entretanto afirmou que tudo estava bem e nao era necessario o des-locamento de Gilberto ao Posto de Atracao Santo Antonio do Abonari.

Mesmo assim, Gilberto, preocupado corn seus companheiros que seencontravam no Posto de Atracdo Santo Antonio do Abonari, decidiu itate ao Posto e foi naquele mesmo dia, fretando uma aeronave, que o deixouno local.

Tao logo Gilberto chegou na sede do Posto Santo Antonio do Abona-ri, comunicou-se atraves de radiofonia corn a sede da FUNAI ern Manaus,informando que tudo no Posto estava sob controle e que os indios estavamapenas passeando, como normalmente faziam naquela epoca do ano, quandoas aquas dos rios comecam a subir de nivel.82

Tanto o Delegado da FUNAI ern Manaus, como o Diretor da DivisgoAmazOnica da FUNAI, "responsaveis" pela area n g o se encontravam ern Ma-naus. Estavam passando as festas de fim de ano corn seus parentes nas cida-des que residiam, no sul do pals.

Entretanto tudo corria bem na sede do Posto de Atracdo Santo Antoniodo Abonari, pois os ältimos contatos atraves do radiofonia do Posto, corn asede da FUNAI em Manaus, informavam que tudo corria sem incidentes eque os indios Waimiri em visita ao Posto, ja se preparavam para partir corndestino as suas ma locas.

No dia 28 de dezembro, num fim de semana, sabado, na sede da FUNAIern Manaus, tudo estava calmo. Apenas o sistema de radio comunicac go fun-cionava. Foi mantido o Ultimo contato corn o Posto de Atracao Santo Anto-nio do Abonari naquele sabado por volta das 11:00 horas, 0 pr6prio Gilbertodispensava o radio-telegrafista de voltar a manter contato corn ele domingo.

Tudo estava calmo e no tinha motivos para que o sistema de radiofo-nia ficasse de plant go no domingo, dia 29 de dezembro de 1974.

Aquele entretanto, foi o Ultimo contato corn a FUNAI.

No domingo, dia 29 de dezembro de 1974, por volta do meio dia, Gil-berto Pinto Figueiredo Costa, sertanista, indigenista, estava mono no necro-thrio do Hospital GetOlio Vargas em Manaus.

A noticia oficial fornecida pelo Exarcito — 29 Grupamento de Enge-nharia e Construcgo — Sexto Batalhao de Engenharia e Construcão, informa-va que os indios Waimiri Atroari, tinham atacado o Posto de Atracao SantoAntonio do Abonari I I e trucidado todos os funcionarios da FUNAI que alise encontravam, corn excessäo de urn, o indio aculturado de nome Ivan,que ndo sabia explicar corn detalhes o que realmente acontecera.

0 pr6prio pessoal que se encontrava no acampamento do Sexto BEC,no Km 220, nas proximidades do Igarap4 Santo Antonio do Abonari, teriaido em socorro dos funcionarios da FUNAI, que se encontravam no Postode Atracão Santo Antonio do Abonari, mas n go encontraram ninguêm cornvida.

A Nota Oficial distribuida a imprensa, dava conta. de que Gilberto eseus companheiros de trabalho, teriam sido mortos a flechadas pelos indiosWaimiri Atroari, em inesperado ataque, que surpreenderam a todos ao ama-nhecer do dia 29 de dezembro de 1974.

83

Page 43: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

0 enterro de Gilberto, inexplicavelmente, foi antecipado das 16:00, pa-ra 15:00 horas, e em nenhum momento foi permitido que o caixao funera-rio aberto pelos seus familiares.

Existiam ordens superiores para que o enterro fosse feito o mais rapid°poss Nei .

E assim foi encerrado mais urn capitulo na hist6ria dos contatos entrea sociedade nacional e os indios Waimiri Atroari.

Depois do dia 29 de dezembro de 1974, os trabalhos da construck darodovia Manaus-Caracarai-Boa Vista, seguiram em ritmo acelerado e a estra-da hoje encontra-se conclu Ida.

Centenas de caminhOes e automOveis circulam diariamente entre ascidades de Manaus e Boa Vista com bastante regularidade na koca da estia-gem amazOnica.

Hojó e comum ver indios Waimiri Atroari, atrepados nas carrocerias doscaminhOes, viajando de urn lado ao outro da reserva.

Os Waimiri Atroari, no mds de jundo de 1981, foram vitimas de urnsurto de sarampo, que por falta de assistencia da FUNAI, vieram a falecer21, entre homens e mulheres. 0 surto espalhou-se entre toda a comunidadeWaimiri Atroari, mesmo entre aqueles que ainda nk se deram por vencidose ainda se encontram residindo no centro da floresta, resistindo de todas asformas ao contato indiscriminado corn os transeuntes da BR-174.

Na parte leste da reserva, na area de influencia das nascentes dos riosAlalau e Uaturna, encontra-se instaladas,em pleno territOrio indigena,empre-sas de minerack,que desde finais de 79 exploram as riquezas existentes na-quela area.

Uma hidrelètrica esta sendo constru Ida no rio Uatum5, na altura da ca-choeira conhecida como Balbina, que corn o represamento das aguas, inun-dare cerca de 1/3 de todo o territOrio Waimiri Atroari.

Uma nova estrada esta sendo planejada para ser construida dentro dareserva dos Indios Waimiri Atroari, pois a rodovia existente, parte dela, On-cipalmente a que se encontra dentro da reserva, sera inundada pelas aquas darepresa Balbina necessitanto que seja construida em urn novo tracado, umaoutra rodovia, para dar continuidade ao transito ja existente entre as cidadesde Boa Vista e Manaus.

Corn a construck da BR-174, os acordos internacionais firmados peloBrasil, foram cumpridos.

A missk do 29 Grupamento de Engenharia e Construck — Sexto Bata-Ihk de Engenharia e Construck, foi coroada de éxitos.84

GILBERTO PINTO FIGUEIREDO COSTA

Conheci Gilberto Pinto Figueiredo Costa ern 1972, quando fui transferi-do de Brasilia para Manaus, na condicão de funcionario da Fundack Nacio-nal do Indio — FUNAI.

Gilberto era urn homem simples e fisicamente nk aparentava ser urnhomem ligado a trabalhos na selva. Parecia mais urn prOspero comerciante doque urn homem ligado ao indigenismo. Entretanto, n5o obstante a sua apa-rencia, foi urn dos maiores indigenistas que conheci e como ser humano, um dosmelhores.

Liderava no Amazonas os indigenistas e era respeitado por todos que oconheciam.

Conhecia todo o Estado do Amazonas e parte de Roraima e era dotadoda chamada mernOria de arquivo. Era capaz de lembrar-se de fatos ocorridosmuitos anos atras. Tinha uma facilidade de localizar processos sobre assun-tos indigenas, quando ex istia necessidade de consultas, sem mesmo consultarqualquer protocolo ou indice,no arquivo "morto" da sede da 1P DelegaciaRegional da FUNAI.

Gilberto praticamente conhecia pelos nomes todos os principais I ideresindigenas do Amazonas e os principais problemas enfrentados por cada co-munidade.

Tinha uma forma muito particular de lidar corn os indios. Chamava-ossempre de "paren tes"e gesticulando,mesmo que nao conseguisse expressar-sesuficientemente para se fazer entender, conseguia conversar corn eles.

Gilberto, que comecara a trabalhar no "Servico de Indios", como elecostumeiramente denominava o indigenismo, aos 15 anos de idade,como ser-vente da Primeira Inspetoria do Servico de Proteck aos Indios, testemunharae participara durante 25 anos in i terruptos de todas as atividades daquela uni-dade regional do SPI.

Chegou ate a assumir por diversas vezes, frentes de atrack, Postos Ind I-genas e a prOpria chefia da Primeira Inspetoria Regional do Servico de Prate-c5o aos Indios.

Todos que chegavam no Amazonas e iniciavam-se no "servico" procura-vam Gilberto para orientar-se e aprender como lidar corn os indios e sobrevi-ver na selva.

85

Page 44: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Ele parecia inicialmente tentar tester o iniciante no indigenismo. Fazia-Ihe ver primeiro as dificuldades que fatalmente encontraria na selva, quandoestivesse sozinho ou comandando uma equipe ou chefiando urn Posto Indi-gene.

Tratava-os corn rigor quase mil itar, fazendo-Ihe empreender viagens dfree's, racionando-Ihe ao maxima a alimentac go, para que aprendesse a pou-par, para que n go viesse a falter durante o periodo da viagem.

Submetia o novato a servicos pesados, como carga e descarga de barcos,caminhadas longas carregando peso, derrubando a machado ervores de gran-de porte no preparo de terrenos para rocados. Fazia participar de constru-ceies de acampamentos e ensinava-Ihes a controlar os estoques e material sobsua responsabilidade.

Gilberto, tinha um zelo incomum pelos bens pUblices. Se faltava umapeca, por mais insignificante que fosse, obrigava o funcionario que tinha oobjeto sob sua responsabilidade a repor imediatamente o objeto que sumira.

Qualquer objeto ou produto colhido pelo funcionario do SPI ou FU-NAI dentro da area indigene, Gilberto 0 obrigava a pagar, n go admitindo emhipOtese nenhuma, que funcionario do Orggo se beneficiasse de algum pro-duto ou bens pertencentes as comunidades indigenes.

Por isto, as vezes n5o era compreendido. Alguns funcionarios e subordi-nados, o achavam exigente demais e que ele procurava desestimular a presen-ce de outras pessoas no trabalho junto as comunidades indigenes.

Mas muitas vezes, Gilberto, confessava-me a preocupac go de que era ne-cessario formar turmas novas de indigenistas, para irem assumindo os traba-Ihos dos mais velhos, e que ele incluia-se entre eles.

Mas tambarn era patente o "ciUme" que sentia dos indios. Sentimentoeste, que existia na maioria dos indigenistas, pois cria-se tanta amizade aosindios que se outra pessoa comeca tambdm a conviver corn eles, a genie sen-te-se como se fosse colocado urn pouco de lado e isto naturalmente pode serchamado de uma espécie de "chime".

Em razgo disto, talvez tenha surgido algum mal entendido entre os no-vatos e o Gilberto.

Quando o conheci, Gilberto, 'la era o encarregado da Frente de Atrac5oWaimiri Atroari.

86

Apas o ataque dos indios ao Posto de Atraq go Alalau II, quando mor-reram 3 funcionarios da FUNAI, que la se encontravam, Gilberto desativouos trabalhos do Posto, permanecendo apenas em atividades os Postos Cama-nau, localizado na foz do rio Camanau e o Posto Santo Antonio do Abonari,na foz do Igarapó Santo Antonio do Abonari, corn o rio Uatumg.

Gilberto, na ocasi go do ataque dos indios ao Posto de Atraq go Alalau I I,responsabilizara o mateiro Celso Maia, funcionario do Sexto Batalhäo de En-genharia e Construcgo, como principal "pivot" de ter provocado a ira dos in-dios contra os funcionarios do Posto de Atracgo Alalau II.

Explicava Gilberto, que urn sem mimero de vezes teria advertido ao em-preiteiro do desmatamento dos servicos de construc5o da Estrada Manaus-Ca-racarar, que proibisse os seus empregados a irem visitar as aldeias dos indiosWaimiri Atroari, n5o s6 por temer que eles fossem portadores de doencastransmissive's, como tambem viessem a praticar atos que os indios pudesseminterpretar como ofensas ou desfeitas.

Gilberto, por diversas vezes, tambarn advertira o ent5o comandante doSexto Batalhão de Engenharia e Construc5o, Cel Oliveira para o fato e este,que gratuitamente demonstrava näo gostar de Gilberto, nä() levava em consi-deracgo as suss advertências e pedidos.

0 Cel Oliveira dizia-se conhecedor da regi go e da histOria e habitos indi-genes. Tinha mètodos e opini5es pr6prias de como lidar corn os indios. Poristo talvez a sua indiferenca aos pedidos e apelos de Gilberto, que por suavez, ngo era urn homem ligado aos estudos convencionais. Mas por sua vez,era possuidor de grande conhecimento da comunidade indigene WaimiriAtroari.

Corn muita humildade, Gilberto sempre procurava convencer n go so oCel Oliveira, Comandante do Sexto Batalh5o de Engenharia e Construcgo,como tambOm o pr6prio Comandanw do 29 Grupamento de Engenharia eConstruc5o, de que era necesserio evitar contatos dos trabalhadores e osindios, principalmente porque a rnaioria dos que trabalhavam na rodoviaBR-174, eram pessoas despreparadas para tal e que esses contatos eram pe-rigosos. E que, caso nesse contato entre trabalhadores da estrada e indiosgerasse qualquer incidente, os funcionarios da FUNAI nos Postos Indigenesde Atracgo seriam os primeiros a serem sacrificados.

Mas esses argumentos, por serem de Gilberto, rigo eram aceitos nemconsiderados.

Quando Gilberto teve conhecimento de que o individuo Celso Maia ealguns companheiros, empregados do servico de desmatamento da Rodovia

87

Page 45: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Manaus-Boa Vista, estiveram em visita a uma das aldeias dos indios WaimiriAtroari, procurou o Cel Oliveira, Comandante do Sexto Bata'ha° de Enge-nharia e Construed° e fez a reclamac5o, pois soubera tambem que ditos in-dividuos haviam levado consigo algumas revistas pornograficas, onde exis-tiam figuras de pessoas praticando atos sexuais que teriam mostrado aos in-dios e que na ocasiao tentaram persuadir a algumas indias a manterem rela-eaes sexuais com ales. Ndo tendo conseguido o intento, Celso Maia, teria fi-cado despido e dancado pateticamente para os indios verem, isto ao som deum toca disco portatil, que levara consigo, na visita a aldeia.

A reclamacdo de Gilberto, näo foi considerada.

Poucos dias depois os indios, procurando por Maia, atacaram o Postode Atracdo Alalau II, onde tombaram sem vida fit's funcionarios da FUNAI.

A imprensa de Manaus, divulgou a opini5o de Gilberto com relac5o aoataque dos indios Waimiri Atroari ao Posto de Atrac5o Alalau, destacando-seo fato de que muito antes de ocorrer o incidente, Gilberto procurara o Co-mando do Sexto Batalhao de Engenharia e Construe5o, cientificando dasocorrências na area, chegando a pedir que fosse afastado dos trabalhos deconstrued.° da estrada, o mateiro Celso Maia, e que infelizmente rido foi aten-dido. Na imprensa, tambem foi divulgado o pensamento de Gilberto, respon-sabilizando Celso Maia e o Sexto BEC pelo ataque dos indios ao Posto deAtrac5o Alalau II, quando morreram 3 funcionarios da FUNAI.

Em seguida a divulac5o da opini5o de Gilberto, o Comandante do 29Grupamento de Engenharia e Construed°, General Octavio Ferreira Quei-roz, atraves de Nota Oficial que entregou a imprensa, procurava desmentiras acusacOes de Gilberto (fac smile nas paginas seguintes) procurando ao mes-mo tempo denegrir o seu trabalho, isentando o mateiro Celso Maia de quais-quer responsabilidade quanto ao ataque dos indios Waimiri Atroari, ao Postode Atrac5o Alalau II, da Fundac5o Nacional do Indio.

Na nota oficial do Sr. Comandante do 29 Grupamento de Engenharia eConstrued°, de forma maldosa, foi procurando justificar as advertências queGilberto fizera antes do ataque dos indios ao Posta de Atrack Alalau II comrelacdo ao mateiro Celso Maia, como que Gilberto estivesse procurando afas-tar de seu caminho uma pessoa que gozasse de excessiva popularidade e ami-zade entre os indios e que por isto mesmo estaria atrapalhando o seu traba-lho ou empanando a sua lideranca.

A Nota Oficial do Comando do 29 Grupamento de Engenharia e Cons-true5o, traduziu sem nenhum sofisma, o clima de animosidade existente en-tre aquele Comando e a visào que tinham corn relacdo ao trabalho de Gilber-to, a frente dos trabalhos junto a comunidade Waimiri Atroari.

Gilberto ficou muito magoado com os dizeres da nota oficial do 29 Gru-pamento de Engenharia e Construc5o. Mas, mesmo assim, quando foi chama-do a depor em inquerito instaurado pela Policia Federal em Manaus, voltoua responsabilizar em primeiro piano o mateiro Celso Maia e o 29 Grupamentode Engenharia e Construed°, por n5o dar guarida as suas adverténcias quantoao contato corn a comunidade indigena Waimiri Atroari.

ApOs o incidente, Gilberto continuou o seu trabalho a frente da Atra-c5o dos indios Waimiri Atroari, entretanto urn pouco mais cauteloso e sabe-dor que nao era bem visto pelo o Alto Comando do 29 Grupamento de En-genharia e Construed°, muito ate pelo contrario, como uma pessoa n5o grataaquela corporacdo.

Chef iava na epoca a "ODelegacia Regional da Fundac5o Nacional doIndio — FUNAI, em Manaus,o General da Reserva Antonio Esteves Coutinho.

0 General Coutinho, entre outras atividades, era afeito e ate brincava de"agente de informacOes", considerava-se urn informante de primeira linha ehoje, por coinciancia ou nao, ocupa cargo de destaque no Governo Federal,como chefe de "servico de informacbes" de Org5os veiculados ao Ministerioda Previdéncia Social.

Os Delegados da FUNAI, como o General Coutinho, tocios eram mem-bros e participantes da chamada "comunidade de informacOes", que tinhamligacOes diretas corn a Assessoria de Seguranca e InformaeOes — ASI, daFUNAI e corn o próprio Servico Nacional de InformapOes — SNI em cadaregi5o.

0 General Coutinho, na condic5o de General, mesmo da reserva e sabe-dor da animosidade existente entre o alto Comando do 29 Grupamento deEngenharia e Construcäo corn o Gilberto, nunca procurou desfazer a falsaopini5o, mesmo que admirasse pessoalmente Gilberto e seu dificil trabalho.

Uma das manias do General, alem da de brincar de "agente de informa-cOes" era de publicar atraves de jornais, histOrias que inventava corn relac5oaos indios, dando-Ihes urn "roteiro" como se fosse urn seriado aos moldesdos filmes de faroeste norte-americanos, justificando sua atitude quando eraconsultado, como que estaria informando a opini5o pUblica sobre o que es-tava ocorrendo nas areas indigenas.

Ao dar noticias aos jornais de Manaus, inventava estOrias como "Gilber-to vai fumar o cachimbo da paz corn o Indio Maruaga", "Gilberto marcounovo encontro corn os Atroari na prOxima lua cheia", "Nasceu a nova filhado Capitho e seu nome e Pena Verde".

8988

Page 46: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Dava essas not(cias em doses homeopeticas como se fosse novela em ca-pitu los, deixando sempre o leitor na expectativa das próximas not(cias.

Gilberto, que n5o era muito de prestar declaragOes a jornais, primeiropor causa de seu comportamento introvertido e segundo em obediência asnormas da FUNAI que proibia qualquer servidor— menos os Generais —prestar qualquer declaraq5o a imprensa, ficava muito irritado com as not(-cias sobre o seu trabalho, divulgadas de forma incorreta pelo General Cou-ti n ho.

Ades o ataque dos (ndios ao Posto de Atraccio Alalau II, no rio Alalau,em Janeiro de 1973, os trabalhos de construcao da Rodovia BR-174 — Ma-naus-Caracarai-Boa Vista, foram suspensos em parte, pois a epOca invernosarid° permitia o desenvolvimento normal do servico de terraplanagem.

Gilberto nesse periodo s reativou os Postos de Atracão que estavam comseus servicos paralizados e deu continuidade ao seu trabalho de contatar os(ndios Waimiri Atroari, como se nada tivesse acontecido.

0 Posto de Atracao Alalau II, no rio Alalau, que fora destruido pelosfoi reinstalado em outro local, mas no mesmo rio, para que os indios

näo viessem a relacionar com o anteriormente destruido e n5o viessem a pen-sar que a reconstruc5o do Posto tivesse care-ter de vinganca.

Depois de instalado os Postos, os Indios novamente voltaram a visitar asfuncionérios da frente de atracão que le se encontravam trabalhando na areasob coordenacgo e orientacao de Gilberto.

Gilberto enfrentava serias dificuldades para realizar o seu trabalho, orafaltavam recursos para apoio logistic° e compra de brindes para o trabalhode atrac5o, ora faltava pessoal. Pois eram poucas as pessoas que se arriscavama irem trabalhar na frente de atrac5o dentro da selva, ganhando o salario quea Fundac5o Nacional do Indio — FUNAI pagava (era um pouco mais do queo salario-m (nimo). outros n5o aceitavam ir, assustados com as histarias queouviam sobre a indole e comportamento dos Indios Waimiri Atroari.

Par outro lado, Gilberto, n5o aceitava na sua equipe qualquer funcione-rio, pelo simples fato dale querer ir para a frente de atrac5o. Gilberto faziauma especie de selec5o e um estagio, que se n5o fosse aprovado dentro doque ale via como requisitos indispenséveis ao trabalho, afastava o funcionerioimediatamente.

Exigia uma obediencia rigorosa aos seus métodos de trabalho, pois sabiaque qualquer erro no relacionamento com os (ndios Waimiri Atroari, poderia

•90

ser fatal. Exigia dos funcionerios que trabalhavam em sua equipe, que respei-tassem o Indio e que em nenhuma hora procurassem ter intimidades comas indias.

Gilberto sempre dizia "prefiro ter poucos funcionerios que confio, doque muitosque n5o confio e que n5o seguir5o os meus matodos de trabalho"

Nu mericamente, realmente eram poucos os funcionerios em cada Posto,cerca de 5 ou 6 no maxima. Mas Gilberto que circulava constantemente en-tre os Postos tinha muita confianca neles. Principalmente num deles conheci-do como "Jo5o Maracaje". Um velho de 65 anos, que desde os quinze anos,antes mesmo de vir a trabalhar no Servico de Protec5o aos Indios, je manti-nha contatos amistosos com os indios Waimiri Atroari.

João Dion Csio do Norte, o verdadeiro name de "Jog° Maracaja", erauma espécie de orientador dos indigenistas mais jovens, e por sua grande ami-zade aos indios Waimiri Atroari, era uma peca fundamental no trabalho de-senvolvido por Gilberto.

Aqui e acole surgiam funcionerios que temerosos de proveveis ataquesdos Indios,pediam para sair ou simplesmentes abandonavam o trabalho evoltavam a Manaus,desistindo do emprego na Frente de Atracao WaimiriAtroari.

A maioria dos desistentes, eram trabalhadores bracais, que eram recruta-dos por Gilberto, para trabalho nos rocados, que a mercê dos indios ficavamapavorados e desistiam do emprego.

Gilberto ironizava o medo dos que desistiam apavorados, denominandode "medorreia" a "doenca" simulada pela maioria dos funcionerios queabandonavam os Postos e voltavam a Manaus.

Não obstante a tudo isto, Gilberto dispensava aos seus companheirosde trabalho em geral, muito respeito, n5o deixando faltar-Ihes nada no Postopara a manutenc5o e se surgissem (ndios em qualquer dos Postos, ale desloca-va-se para o local e le permanecia ate os (ndios retornarem.

Enquanto Gilberto encontrava-se desenvolvendo o seu seri° trabalho,em Manaus, o Coronel Coutinho, Delegado da 1Delegacia Regional da FU-NAI,comunicava a imprensa amazonense com suas hist6rias novelescas sobre osindios Waimiri Atroari, criando na opinião publics uma imagem falsa tantodos indias Waimiri Atroari como do trabalho de Gilberto e de seus compa-nheiros de trabalho.

91

Page 47: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Nas minhas m5os, por acaso, e por erro da secreteria do General Couti-nho, Delegado Regional da FUNAI no amazonas, passou urn documento,chamado "Pedido de Buscas" originerio do pr6prio Servico Nacional de In-formacbes — SNI agenda em Manaus, onde fazia referenda ao "noticiário es-candaloso publicado pela imprensa de Manaus, sobre o problema indigena econstruck da estrada Manaus-Caracarai-Boa Vista", citando também o Gil-berto como responsevel pela divulgac5o daquelas noticias, que ao ver do au-tor do Pedido de Buscas (SNI) estaria colocando a opini5o p6blica contra ogoverno e o exercito, responsavel pela construck da rodovia Manaus-Caraca-raj-Boa Vista — BR-174.

Quando li aquele documento, procurei imediatamente falar corn o Ge-neral Coutinho, dizendo a ele que aquelas afirmacOes no Pedido de Buscasdo Servico Nacional de informacOes — SNI eram mentirosas e injustas cornrelac5o a Gilberto, pois quem estava dando aquelas informacOes absurdasimprensa era ele pr6prio, General Coutinho, que teria que it pessoalmente aoServico Nacional de InformacOes — SNI agenda de Manaus, e procurar des-fazer aquela imagem falsa, arquitetada contra Gilberto. 0 General obvia-mente näo gostou do que Ihe disse e n5o foi a agenda do Servico Nacionalde Informaceies, desfazer os documentos e as acusaciies formuladas contraGilberto.

Na primeira vez depois deste dia que me encontrei corn Gilberto, falei-Ihe sobre o assunto e ele pessoalmente tambem esteve corn o General Cou-tinho, reclamando sobre o que estava escrito no Pedido de Buscas do SNIe exigiu que ele fosse apresentar o desmentido sobre o assunto na agenciado SNI.

0 General Coutinho tornou nenhuma iniciativa pois se procuras-se isentar Gilberto da autoria da divulgack das noticias absurdas que esta-vam sendo publicadas pela imprensa de Manaus, teria que assumi-las e istocertamente faria corn que perdesse o seu prest(gio como informante dos Or-g5os de seguranca e ate mesmo perder o emprego que comodamente ocupa-va.

Gilberto mesmo sabendo que estava no alvo do temido Servico Nacio-nal de InformacOes e do pi-6136o Exercito, atraves do Segundo Grupamentode Engenharia e Construc5o, continuou o seu trabalho como se nada tives-se acontecendo.

A preocupack de Gilberto era somente corn os indios. Preocupava-semuito corn os possiveis contatos que os indios teriam corn os trabalhadoresda estrada.

92

Em setembro de 1974, Gilberto pediu-me atraves de radiofonia . do Pos-to de Atracäo Alalau II, que enviasse uma aeronave fretada aquele Postopara conduzir a Manaus o principal Irder dos indios Atroari, o conhecidoIndio Comprido e seu filho em uma viagem de passeio.

Quando Gilberto chegou a Manaus, acompanhado de Comprido e seufilho, estava visivelmente alegre. Conseguira vencer uma importante etapanos contatos amistosos que mantinha corn os indios Atroari.

Gilberto alojou Comprido e seu filho na prOpria sede da Primeira Dele-gacia Regional da Fundack Nacional do Indio — FUNAI e para melhor darassistancia equeles visitantes ilustres, ele pr6prio trouxe a sua rede para dor-mir na sede da FUNAI, junto corn seus convidados, visando melhor assisti-los enquanto permanecessem ern Manaus.

Gilberto levou os indios, Comprido e seu filho, para conhecerem todaa cidade de Manaus. Visitaram lojas, pracas, escolas, o porto, enfim cumpri-ram urn programa bem movimentado. Os indios demonstraram terem gos-tado muito do passeio que fizeram.

Quando Gilberto e os indios retornavam ao Posto de Atm* Alalau II,Gilberto pediu ao Piloto da aeronave em que viajavam, que conduzisse oavigo de maneira que fosse possivel avistar o desmatamento da estrada Ma-naus-Caracarai-Boa Vista e as malocas dos indios Waimiri Atroari.

Gilberto na aeronave, mostrava ao Indio Comprido e seu filho, a proxi-midade da estrada corn relacao as suas malocas.

E fazia urn apelo a Comprido, que ele procurasse explicar aos seus lide-rados que evitassen . visitar a estrada, pois Gilberto previa que os contatosindiscriminados dos indios corn os trabalhadores e mais tarde corn os viajan-tes da BR-174 — Rodovia Manaus — Boa Vista, seriam desastrosas para osindios, como tern sido para todas as comunidades indigenas cujos territO-dos cruzados por uma rodovia.

Segundo Gilberto, Comprido parecia entender bem o que ele procura-va explicar.

Quando chegaram ao Posto de Atrack Alalau II, no rio Alalau, Cornprido e seu filho, pediram a Gilberto que os levasse a sua aldeia, que ficavilocalizada acima do Posta, cerca de seis horas de viagem em canoa corn mofor de popa.

Gilberto, seguiu viagem imediatamente corn destino a maloca dos Mdios Atroari, onde morava Comprido e seu filho.

9;

Page 48: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Ao chegarem no "Porto" da maloca, encontravam-se esperando Corn-prido e seu filho, muitos indios, que saudaram corn muita alegria a chegadada canoa que os transportava.

Comprido que levava muitos presentes aos seus parentes, apressou erndespedir-se de Gilberto e de seus companheiros que tinham seguido na canoae acompanhado de varios indios, seguiu imediatamente para a sua maloca.

Gilberto, retornou ao Posto, confiante de que conseguira consolidar aamizade corn aquele grupo de indios Atroari chefiados pelo Indio Comprido.

Em seguida, descendo o rio Alalau, ao passar na altura do trecho ondea estrada BR-174, corta o rio, constatou que na margem esquerda encontra-va-se instalado urn acampamento de trabalhadores do desmatamento da Ro-dovia BR-174.

Gilberto, foi ate ao local, e pediu aos trabalhadores que ali encontra-varn-se que retirassem o acampamento das proximidades da margem do rio,pois os indios ao passarem pelo rio, iriam fatalmente notar a presenca doacampamento e viriam saber e conhecer quern estava ali. E isto poderia pro-vocar algum problema entre indios e trabalhadores da estrada. Alias, Gilber-to, atraves da Sub-Coama ern Manaus, ja advertira o 29 Grupamento de En-genharia e Construed° que ndo fosse instalado acampamentos nas proximi-dades dos rios, para evitar que fosse ponto de atrack aos indios que viajas-sem pelos rios.

Gilberto ao retornar a Manaus, fez-me a comunicaedo do fato.

Logo apOs sua chegada a Manaus, recebemos urn radiograma da area deAtraggo Waimiri Atroari, informando que o empreiteiro de nome André,responsevel pelo servico de desmatamento dos servicos de construed° da es-trada Manaus-Boa Vista, estaria desobedecendo as normas de comportamen-to dentro da area indigena, fixada por Gilberto, para que todos que traba-lhassem na construed° da rodovia obedecessem.

Segundo o radiograma, urn trabalhador do desmatamento da estrada,empregado do Sr. Andre, e do Sexto Batalhdo de Engenharia e Construed°,teria sido flagrado nas proximidades da aldeia dos indios Atroari armadoe caeando, chegando inclusive a disparar varios tiros.

0 chefe do Posto que flagrou o cacador dentro da area dos indios nasproximidades das aldeias, apreendeu a espingarda e conduziu-o sob ordensate o acampamento do Sexto Bata'he- 0 de Engenharia e Construed°, entre-gando-o ao oficial que respondia pela chefia do acampamento naquele diaexplicando-lhe o que ocorreria.

94

No dia 19 de outubro de 1974, enviamos ao Comandante do Sexto Ba-talhao de Engenharia e Construck, corn sede em Boa Vista — Territ6rio Fe-deral de Roraima, o officio n987/74, comunicando a irregularidade cometidapelos trabalhadores da estrada, levantando inclusive a possibilidade de vir aocorrer, em razão da desobediencia das normas por nas fixadas e dos tirosdisparados pelo cacador nas proximidades da aldeia dos indios Atroari, al-guma reacdo por parte dos indios, contra o pessoal da FUNAI, que se encon-trava nos Postos de Atracao, como tambêm ate mesmo aos prOprios trabalha-dores da estrada.

No dia 02 de outubro de 1974, os indios Atroari, atacaram o Posta deAtrack Alalau I I, na margem do rio Alalau.

Gilberto e eu, antes mesmo de ocorrer o ataque dos indios, ja hay famosdecidido que por motivos de precaug go iriamos mandar recuar todo o pes-soal que se encontravam prestando servicos no Posto de Atracdo Alalau II,pois aquele Posto, era o que ficava mais próximo das aldeias dos indiosAtroari e com o fato dos tiros disparados pelo trabalhador da estrada, pode-riam os indios revoltarem-se e tentar alguma represélia.

Entretanto, antes que consegufssemos retirar todo o pessoal do Postode Atracao Alalau II, os indios atacaram o Posto no dia 02 de outubro de1974, por volta das 8:00 da manha.

Antes do ataque, recebemos a notfcia através de radiofonia, em queum grupo de indios Atroari, teria surgido no Posto de Atrack Alalau II, pro-curamos imediatamente fretar uma aeronave e seguimos imediatamente parao local.

Seguimos pela manha do dia 02 de outubro de 1974, a bordo de umaaeronave de propriedade da Igreja Adventista de Manaus, pilotada pelo Pas-tor Daniel.

Ao sobrevoar o Posta, notamos que os indios ja haviam atacado, poiso local parecia deserto e na'o se \ is nenhum sinal de vida. Apenas na beirado rio, no local que servia de Porto as canoas, encontravam-se cinco Ubas,amarradas e sem ninguern.

0 avigo continuou sobrevoando a area e vasculhamos corn nossosolhos, toda a area desmatada a procura de um sinal de nossos companheiros.Mas nada. Tudo parecia deserto e sem vida.

Estava bem claro,que os indios tinham atacado os nossos companheirosque se encontravam naquele Posto.

95

Page 49: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Sabiamos que era muito perigoso, pousar a aeronave e descermos a pro-cure dos nossos companheiros. Entretanto tinhamos apenas três opcOes. Aprimeira, de n go descermos e voltarmos a Manaus, para comunicar a nossossuperiores que o Posto de Atrac go Alalau II, teria sido atacado pelos indios,e que tudo indicava, todos os que ali se encontravam estavam mortos. A se-gunda era de descermos e verificarmos pessoalrnente o que ocorrera, poden-do inclusive, salvar algum dos nossos companheiros que por ventura aindaestivessem vivo ou ferido. A terceira °Kg° era descer e a exemplo de nossoscompanheiros, sermos vitimas de ataque dos indios, que tudo indicava aindaencontravam-se nas proximidades, pois as suas canoas, ainda estavam amarra-das no Porto do Posto.

Eu e Gilberto, sabiamos do grande risco que cornamos quando decidi-mos pela opcgo de descer e procurar os nossos companheiros. Fizemos antes

do avi go aquatizar, urn pacto, que consistia no seguinte: se urn de nos viesse aser flechado, na ocasi go em que descessemos na area do Posto, não era paraser socorrido, pois ceria muito perigoso, a pessoa que tentasse socorrer, serv Itima tambarn de mais uma flechada.A pessoa que n go fosse ferida, teria queabandonar o outro e voltar imediatamente para o avi gd, que ficaria corn o mo-tor funcionando e navegando pelo meio do rio, a salvo das possiveis flechadas.

Demos as Ultimas instrucOes ao Pastor Daniel, caso viessemos a morrer,de transmitir aos nossos familiares as nossas 6Itimas vontades, e nos jogamosdentro do rio Alalau e nadando fomos nos aproximando da margem.

Combinamos tambêm que t go logo "tomassemos pa" sairiamos corren-do no rumo da casa sede do Posto e ern zigue-zague, procurando assim evitarpossiveis flechadas, pois tudo indicava que os indios estariam escondidosdentro da casa.

Foram as bracadas mais longa de minha vida, pod famos estar nadandopara a morte. Mas algo muito forte e dificil de se explicar nos dava coragempara prosseguir ao nosso intento. Simultaneamente saimos d'agua correndoem zigue-zague, eu pela direita e Gilberto pela esquerda.

Ao passar pela porta da cozinha da casa sede do Posto deparei-me comurns cena horrivel, urns cabeca humane estava equilibrada no batente da Aor-ta e por ela escorria sangue e uma substancia amarela. Era a cabeca do nossocompanheiro, Fautisno Lima, que tivera o seu corpo seccionado por uma fa-

cgozada de urn Indio.

Em pouvos minutos, entramos na casa e encontramos tudo em desor-dem. Todos os pertences estavam fora do lugar e tudo revirado. 0 râcliofoniado Posto, estava destruido a machadadas. Encontramos apenas o corpo denosso companheiro Faustino Lima. Nao encontramos nenhum sinal dos ou-

tros.96

Pegamos urn saco de plastic° que o Pastor Daniel trazia consigo na aero-nave, colocamos o corpo do nosso companheiro Faustino Lima e embarca-mos no avigo.

Ter iamos que sair procurando os outros companheiros. 0 pastor Daniel,ficou no Posto e eu e Gilberto saimos a procure dos outros. Nao encontra-mos ninguern, e por vote das 17:00 horas daquele dia corn o corpo de Fausti-no a bordo da aeronave, seguimos rumo ao Posto de Atrac go Alalau I ondenas proximidades, tinha desaparecido urn grupo de 04 companheiros nossos,chef iados pelo chefe do Posto Jo go Dion (sic) do None, conhecido como Jog°Maracaja.

Passarnos mais de urns semana nas buscas dos nossos companheiros de-saparecidos, conseguimos ainda salvar os de nome Ad go e Esmeraldo, quemesmo feridos, conseguiram fugir e grata as nossas buscas conseguiram sal-var-se corn vida.

ApOs o ataque dos indios, fizemos urn expediente ao 29 Grupamento deEngenharia e Construcgo, pedindo que fossem suspensos os trabalhos deconstrucgo da rodovia BR-174, ate que nos fosse possivel reorganizer asfrentes de trabalho, desativadas em raz go do que ocorrera.

Pessoalmente, fomos entregar o expediente ao Sr. Comandante do 29Grupamento de Engenharia e Construcgo ern Manaus.

Na ocasigo da entrega, eu e Gilberto, em conversa corn o Sr. Comandan-te na presenca de outros oficiais pertencentes aquela corporacgo, ouvimosaquela autoridade informer que ja havia mandado se deslocar para a area dosindios VVaimiri Atroari, um grupo de soldados do exarcito armados corn oobjetivo de garantir, de qualquer modo a continuac go dos trabalhos de cons-trucgo da rodovia Manaus-Boa Vista.

Aquela noticia assustou-nos, pois estavamos ali, exatamente numa ten-tative, de pedir a suspensgo dos trabalhos de construcgo da estrada, para rea-valiarmos tudo que ja tinha sido feito e tenter reorganizar os trabalhos deatracgo. E aquela informacgo ngo nos dava nenhuma esperanca corn relacgoa sorte dos indios.

Dizendo, que a "Estrada tern que ficar pronta, mesmo que para isso te-nhamos que abrir fogo contra esses indios assassinos", o General Comandan-te, assumia séria responsabilidade quanto a sorte dos indios Waimiri Atroari.Complementando o seu discurso, o General disse: "Temos urn compromissode entregar a estrada pronta. E n go vai ser urn grupo de indios assassinos quevai impedir o prosseguimento da obra". As palavras do General feriam osnossos ouvidos, pois tanto eu como Gilberto, haviamos acabado de retornar

97

Page 50: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

da area Waimiri Atroari, apOs exaustiva busca de nossos companheiros quetinham sido vitimas do ataque dos indios, que acreditavamos teria sido pro-vocado pela presence nas proximidades de suas malocas de cacadores desobe-dientes as normas fixadas por nos, e estävamos convencidos de que os indiosteriam agido de forma defensiva, e que era necessario muito cuidado para

que ales n go vissem em nets o desejo ou comportamento corn finalidades vin-gativas. A presenca de soldados do Exercito, armados dentro da area, mesmoque nab viesse a disparar nenhum tiro, possivelmente seria considerada pelosindios como intengdo de vinganca.

Entretanto, por mais que ndo quisessemos acreditar no que estavamosouvindo, o General era incisivo quanto a possibilidade dos soldados que se-guiram para a area Waimiri Atroari, terem que realizar demonstracOes de for-ca, através de disparos de suas potentes e mortiferas armas de guerra.

Antes de sairmos da sala do Comando, o General Comandante dirigin-do-se diretamente a Gilberto perguntou "Que é que voce acha disso?" Gilber-to com os olhos cheios de lagrimas, mal respondeu. Disse apenas: "General,na tentativa de fazer amizade com os indios Waimiri Atroari, mais de 60 fun-cionerios entre FUNAI e Servico de Protecao aos lndios, ja morreram procu-rando nunca tomar medidas repressivas contra aquele povo. Agora o que oSenhor este me dizendo que fez e vai fazer, torna o sacrificio dos que perde-ram suas pr6prias vidas em defesa daqueles indios em vdo".

Saimos calados e tristes. Perguntevamos um ao outro: e agora? Tudoque foi feito, teria sido inUtil? E que fazer de agora em diante?

Voltamos a conversar sobre o assunto, na sede da FUNAI em Manaus.Quando imaginâvamos o que poderia ja ter ocorrido dentro da area WaimiriAtroari, sem que soubassemos pois a posicdo do General Comandante rig°deixava dtividas quanto a possibilidade de que antes de termos conhecimen-to, ja teria ocorrido manobras "defensivas" por tropas do exercito dentroda area Waimiri Atroari. Talvez, tenha sido ate mesmo a causa do ataquedos indios aos Postos de Atracgo, e ngo aquela razdo que antes de termosconhecimento das intencOes do Comandante, imaginavamos.

Comunicamos o fato a sede da FUNAI em Brasilia e ficamos no aguar-do de providências no sentido de voltarmos a reativar nossos trabalhos nafrente de atracdo Waimiri Atroari.

Na regigo dos indios Waimiri Atroari, apenas um Posto de Atrac go, con-tinuava ativado: o Posto de Atracdo do Santo Antonio do Abonari, regigoque predominava a presenca do grupo Waimiri.

98

Gilberto permaneceu em Manaus, cumprindo determinacdo da alta dire-cdo da FUNAI, ate que foi comunicado que seria afastado dos trabalhos dafrente de atracgo Waimiri Atroari.

Foi um grande choque para Gilberto, pois ale ainda tinha esperancasde que alguma providencia poderia ser tomada no sentido de suspender ostrabalhos da estrada e através de contatos amistosos com os indios conse-guir reatar a amizade que havia sido quebrada com o ataque ao Posto deAtracgo Alalau, no rio Alalau.

Em seu lugar seria nomeado o Sertanista Sebastido Amend°, que na-quela dpoca chefiava a frente de atrac go do alto rio SolimOes, nos rios Ja-vari, Itui e Itacoai.

Quando a noticia foi dada a Gilberto, de que seria afastado da frentede atracgo Waimiri Atroari, ale ficou muito magoado, pois parecia ate umapunicdo, como ocorrera antes da vinda do "Padre Calleri" para a regiao,quando ale tambem fora afastado dos trabalhos para que o Padre assumissea sua funcgo.

Surgiu entretanto um problema, Sebasti go Amend° ndo quis assumira incubencia que a FUNAI determinara. Primeiro, porque Sebasti go Amgn-cio era uma pessoa que gostava muito de Gilberto, o tinha como uma asp&de de professor. Segundo, era consciente que ri g() era possuidor do conhe-cimentos a altura para substituir o tao experimentado Gilberto que, pormais de 10 anus trabalhava junto aos Waimiri Atroari. Preferia permanecerno seu trabalho que vinha desenvolvendo no alto do rio Solimaes, do queiniciar um trabalho, que ja era de conhecimento de todos, cheios de pro-blemas e de alto risco. Sebastido Amancio, que acompanhava mesmo delunge as ocorrências, sabia da posicdo dos "patronos" da construc go daestrada com relacdo aos indios e aos funcionarios da FUNAI, que insistiamem tomar a defesa dales.

Sebastido AmAncio, tentou por diversos modos convencer a alta dire-cgo da FUNAI, para revogarem a medida de nomee-lo encarregado da Fren-te de Atracgo Atroari. Entretanto como nao conseguiu, pediu para entrarem gozo de ferias regulamentares e, nesse mein tempo, is tentar it ate Bra-silia e procurar convenser os dirigentes da FUNAI a mudar o que ja foradeterminado.

Necse mein tempo Gilberto, mesmo oficialmente afastado da frente deAtracdo Waimiri Atroari, permanecia em Manaus, aguardando seu substitu-to, sem que deixasse de manter contato diariamente com a frente de atracgo,atraves do Calico Posto que ainda permanecia ativado na area que era o Postode Atracdo Waimiri Atroari.

99

Page 51: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Na chefia daquele Posto permanecia o Indigenista Marinelio Machado,que vinha adiando as suas ferias, desde julho de 1974, quando fez jus. Entre-tanto, em solidariedade a Gilberto, permanecia no trabalho, aguardando horamais oportuna.

Coma no final do ano, m'es de dezembro, epoca das chuvas, quando ostrabalhos nos Postos ficam quase paralisados, Marinelio saiu de ferias deixan-do em seu lugar um companheiro, conhecido pelo apelido de"Acaba Rancho':Pessoa que tinha mais de trés anos de experiencia no trabalho de frente deatrack e tinha o name de Raimundo Pereira.

Os trabalhos da rodovia Manaus-Caracarai-Boa Vista estavam pratica-mente paralisados. Era fim de ano, e a maioria dos oficiais que trabalhavamna construc5o estavam licenciados em viagem para as suas cidades natal, ondepassariam as festas de fim de ano.

Poucos dias antes do natal, os jornais de Manaus noticiaram que indiosWaimiri Atroari, estariam surgindo na estrada BR-174, nas frentes de traba-lho de desmatamento e terraplanagem. E que os trabalhadores da constru-ck estavam temerosos que os indios promovessem algum ataque, a exem-plo do que ocorrera com o Posto de Atrack Alalau II da Fundack Nacio-nal do India — FUNAI.

A direck da FUNAI, determinou que Gilberto deslocasse ate a area everificasse pessoalmente o que estava ocorrendo.

Gilberto esteve no local, percorreu todo o tracado da estrada, dentroda reserva Waimiri Atroari e n5o encontrou nenhum sinal de que os indiostivessem estado nas proximidades dos acampamentos de servico dos trabalha-dores na construck da estrada.

Ao retornar, informou-me que tudo indicava que a noticia publicadanos jornais, tinha sido com a intenck de que o Sexto BEC permitisse tam-barn que os trabalhadores, no militares, pudessem suspender os trabalhose viessem passar os dias de festas de fim de ano, em Manaus, com seus fa-miliares.

Gilberto, informou ainda que estivera no acampamento do Exercito noKm 220, nas proximidades do Igarape Santo Antonio do Abonari, local ondeexistia uma pista de pouso para pequenas aeronaves e la quase nk encontrouninguern. Apenas alguns soldados chefiado par um cabo, que tinha ficadocomo vigia daquelas instalacOes.

Logo apOs o natal, na sede da Delegacia Regional da FUNAI, encontrei-me com Gilberto que me comunicou ter sido aposentado, mostrando inclusi-

100

ve o Decreto de Aposentadoria publicado no Diario Oficial da Uni5o. Per-guntei-lhe se pretendia realmente parar. Ele respondeu-me que nao, pois o so-laria que recebia como aposentado era muito inferior ao que vinha rece-bendo como funcionerio da FUNAI e que alOm disto ele nk saberia fazeroutra coisa a nk ser trabalhar "no servico de indios". E que is ver se aFUNAI iria aceita-lo na condick de aposentado e ser recontratado.

Gilberto que passara o dia de Natal pela primeira vez em case, juntocom seus familiares, nk deixou de diariamente, entrar em contato com oPosto de Atrack Santo Antonio do Abonari, atraves do sistema de radiofo-nia.

Tudo naquele Posto corria bem, ate que no dia 20 de dezembro, Rai-mundo, o"Acaba Rancho': informou ao Gilberto o surgimento de urn grupode indios Waimiri Atroari na sede do Posto e atraves de radiofonia, identifi-cou inclusive por nomes os indios que la se encontravam. A presenca dos in-dios no Posto era considerada normal, pois naquela alpaca do ano, quandoas aguas dos rios comecam a subir, eles costumavam vir ate ao Posto para rea-lizarem trocas de presentes.

0 grupo era composto de homens, mulheres e criancas e estavarri chefia-dos pelo ja conhecido e amigo de todos do Posto, Indio sexagenario Maruaga.A presenca de mulheres e criancas e velhos, deixou Gilberto tranqUilo, poisem nenhum dos ataques dos indios Waimiri Atroari a Postos da FUNAI eSPI ocorrera quando os indios estavam acompanhado de suas esposas e fi-lhos. Os ataques sempre ocorreram quando os visitantes indios sk apenashomens adultos e adolescentes. Nunca quando estk acompanhado de suastam (I ias.

Raimundo, comunicou a Gilberto de que os indios estavam perguntan-do por ele, mas ao saberem que ele n5o estava n5o fizeram muito caso. E quenum dado momenta da transmiss5o da mensagem de radiofonia o prOprioMaruaga, escutara a voz do Gilberto no radio e identificou como se fosse.dele ficando aparentemente satisfeito de ouvir a sua voz. Entretanto Gilber-to, que ja não era mais o Chafe da Frente de Atrac5o Waimiri Atroari, tal-vez, com o desejo de rever as indios antes de sua saida de fato da area, re-solveu it ate ao Posto de Atrac5o Alalau.

Seguiu para o local em um avian fretado que pousou na pista existentenas proximidades do igarape Santo Antonio do Abonari, exatamente no localonde a rodovia BR-174, cruza aquele igarapd. Fica prOximo tambOrn aoacampamento do ExOrcito no Km 220 da BR-174.

Tao logo Gilberto chegou ao Posto de Atrack Santo Antonio do Abo-nari, comunicou-se com a sede da FUNAI em Manaus, atraves de radiofonia,

101

Page 52: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

informando que a situac5o no Posto estava tranquila e que n5o existia moti-vo para preocupac5o.

0 substituto do Delegado da FUNAI em Manaus, cujo titular encontra-va-se viajando para Brasilia, manteve contato tambam corn Gilberto atravésde radiofonia, perguntando sobre a situack. Gilberto repetiu tudo que jatinha dito, reafirmando que a situac5o era calma e que tudo estava correndobem. Na ocasiao o substituto do Delegado Regional da FUNAI ern Manaus,transmitiu a Gilberto, uma pergunta que um determinado Major do 29 Gru-pamento de Engenharia e Construc5o teria mandado fazer e que na horaparecia um pouco absurda. Pois o referido Major mandara perguntar a Gilber-to e queria a resposta, que fosse informado o que é que os indios estavamquerendo no Posto. Gilberto ao ouvir a pergunta formulada e transmitidapelo radiofonia, ficou irritado, pois nao cabia a pergunta. Os indios, segundoo pr6prio Gilberto afirmara na ocasi5o, andam por onde querem e n5o de-vem explicar as suas visitas.

Sabia-se,entretanto, q ue desde o ataque dos indios ao Posto Alalau II em02 de outubro de 1974, que o sistema de radiofonia, da FUNAI, estava sobcensura. Isto foi comprovado, quando um certo dia, um dos Postos Ind ige-nas, estava chamando o radio da FUNAI em Manaus e n5o conseguiu respos-ta. Na ocasi5o recebemos um telefonema do servico de radio do exarcito, avi-sando do chamado do Posto,que n5oestava-mos ouvindo.Este fato comprovouque o sistema de radiofonia da FUNAI em Manaus,estava sob escuta perma-nente e sob censura.

E, I6gicamente,todas as transmisseies de mensagens entre os Postos I ndf-genas e a sede da FUNAI eram captados pelo sistema de escuta.

No &aback) a tarde, dia 28 de dezembro de 1974, Gilberto informouatravas de radiofonia, que tudo estava bem no Posto e que os indios que lase encontravam em visita, estavam preparando-se para irem embora na manh5do dia seguinte. Os brindes ja tinham sido trocados e estavam satisfeitos cornos negOcios. Tudo estava correndo na mais perfeita ordem.

Gilberto era uma pessoa que possuia muita experiancia no trato corn osindios e por isto mesmo em nenhuma hora ficava desatento ao comporta-mento deles. Principalmente porque esses mesmos indios ja haviam atacadosvärios Postos da FUNAI. Gilberto usava inclusive urn sistema de segurancaquando no Posto em que ele se encontrava era visitado por grupos indigo-nas, mesmo naquele caso, que os indios estavam acompanhados de suas mu-lheres e criancas. Gilberto sempre no final da tarde quando a noite se apro-ximava, determinava que um dos companheiros de trabalho, atravessase orio, ou procurasse amarrar sua rede em local pouco distante da area do Pos-to, para que de la pudesse ver toda a area do Posto e detectar, em melhores

102

condicEres, quaisquer anormalidades que por acaso viesse a ocorrer nas pro-ximidades da casa-sede. Isto era justificado por Gilberto que dizia que aspessoas que estao dentro da casa sempre tern a vis5o restrita e uma pessoaque esta de longe e fora de casa, tern condicdo de observar qualquer movi-mento anormal por acaso praticado pelos indios visitantes.

Pelo depoimento que me prestou o indio Ivan ele, naquela tarde, te-ria sido o escolhido para ser o "observador", tendo ele amarrado a sua redeem uma arvore no outro lado do rio Santo Antonio do Abonari, na frenteda sede do Posto.

No Ultimo contato via radiofonia corn a sede da FUNAI em Manaus,naquela tarde de skado, dia 28 de dezembro de 1974, por estar tudo nor-mal no Posto, Gilberto dispensou o plant5o que normalmente o servico deradio da FUNAI em Manaus fazia aos domingos, quando os Postos deAtracão estavam recebendo visitas, como era o caso do Posto de AtracaoSanto Antonio do Abonari.

No domingo dia 29 de dezembro de 1974, por volta do meio dia, ocorpo de Gilberto Pinto Figueiredo Costa encontrava-se no necrot4rio doHospital Gethio Vargas, em Manaus, que teria sido trazido por oficiais doexdrcito, que se encontravam no acampamento do Sexto Batalh5o de En-genharia e Construc5o, localizado no Km 220 nas proximidades do Igara-pa Santo Antonio do Abonari.

A versäo oficial, informava que Gilberto e seus companheiros que seencontravam no Posto de Atrac5o Santo Antonio do Abonari, tinham sidovftimas de ataque dos indios Waimiri Atroari, os mesmo que se encontravamem visita ao Posto, desde o dia 26 de dezembro eque,segundo Gilberto, na-quele dia 29 de dezembro estariam retornando as suas malocas.

A noticia do ataque dos indios Waimiri Atroari ao Posto de Atrac5oSanto Antonio do Abonari teria sido dado ao pessoal do acampamento doKm 220 da BR-174, do Sexto Batalh5o de En genharia e Construp5o pelofndio aculturado Saterá-Mauë, de nome Ivan, que trabalhava na frentede atrack e que na ocasi5o teria conseguido fugir correndo pela selva.

Segundo informaceSes oficiais, ap6s a noticia dada por Ivan sobreo que ocorrera no Posto de Atrack Santo Antonio do Abonari, algunsoficiais e soldados do exórcito que se encontravam naquele domingo noacampamento do Sexto Batalhao de Engenharia e Construc5o, no Km 220da BR-174, seguiram imediatamente para o local a bordo de duas canoasmovidas a motor de popes

103

Page 53: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

105

Polo depoimento de Ivan, ficou uma clOvida quanto, quem estaria ati-rando, pois os indios Waimiri Atroari n5o sabiam utilizar-se de armas de fo-go, nem as possu Cam. Gilberto e seus companheiros por formac5o indigenis-tas, dificilmente teriam atirado nos indios. E o que fazia Gilberto, em pa,na varanda do Posto, gritando e gesticulando enquanto os indios corriampara a math?. 0 que ocorrera naquela manh5 para mudar as intencOes dosindios ao ponto de voltarem-se contra os funciorthrios da FUNAI no PostoSanto Antonio do Abonari?. A hipOtese dos indios atacarem o Posto eraremota, pois eles nunca tomam nenhuma medida belicosa quando est5o a-companhados de suas mulheres e filhos. E a maioria dos visitantes eramcriancas, mulheres e velhos.

Mesmo que a hip6tese de ataque dos indios VVaimiri Atroari fosse amais provável, eles em toda a hist6ria de ataques que realizaram, nunca dei-xaram os atacados reagirem. Usavam sempre estrategias de surpreender quemeles iriam atacar,nunca ocorrendo um confronto direto.A n5o ser quando osatacados tomassem a iniciativa e isto nunca iria acontecer por parte de Gil-berto.

S6 o tempo, um dia talvez, possa desvendar o mistério que envolveu amorte de Gilberto e seus companheiros de trabalho naquele dia 29 de dezem-bro de 1974.

Page 54: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

OS WAIMIRI ATROARIdepois da morte de Gilberto Pinto Figueiredo

Ap6s a morte de Gilberto Pinto Figueiredo Costa, funcionario daFUNAI — Fundacao Nacional do Indio, encarregado de chefiar a atracaodos indios Waimiri Atroari, no dia 29 de dezembro de 1974, no Posto deAtrack Santo Antonio do Abonari, o Org5o oficial de assistencia aos indiosno Brasil — FUNAI, mudou os seus matodos de atracäo aqueles silvicolas.

Para substituir Gilberto, apOs a sua morte, foi nomeado inicialmente oSertanista Apoena Meireles, que procurou, ao inves de contatar corn indios,atraindo-os aos Postos de Atrack, construir uma infra-estrutura administra-tiva, aumentando substancialmente o efetivo material e pessoal, instalandoinclusive Postos de Vigilência na estrada Manaus-Caracarai, dentro da reser-va Waimiri Atroari.

Apoena passou pouco tempo chefiando a Frente de Atrac5o WaimiriAtroari. N5o chegou a manter contato corn os indios. Retirou-se da chefiada Frente de Atrack, transferindo a responsabilidade para o tambern Ser-tanista Sebasti5o Firmo, ex-funcionario da frente de atracão Waimiri Atroa-ri, na epoca em que Gilberto comandava.

Sebasti5o Firmo, em novembro de 1975, nas margens do rio Alalau, on-de a rodovia Manaus-Caracarai-Boa Vista, cruza aquele rio, manteve contatosamistosos com um grupo de indios Atroari, que surgiu na estrada, ap6s cercade um ano sem contatos.

Desde ent5o, os contatos corn os indios Waimiri Atroari foram aumen-tando. Os indios passaram a visitar quase que diariamente a estrada e os a-campamentos dos funcionarios da FUNAI na estrada, que atingia cerca de200 pessoas, instalados nos Postos de Vigil5ncia da FUNAI, dentro da reservaWaimiri Atroari, na margem da rodovia BR-174.

Corn a intensidade da circulacao de veiculos na BR-174 — Manaus-Cara-carai-Boa Vista, a Fundack Nacional do Indio — FUNAI, no sentido de pro-teger os transeuntes e possiveis ataques dos indios, criou os chamados Postosde Vigil5ncia e Equipes Volantes de Batedores que seguiam acompanhandoos comboios de veiculos que se formavam para cruzarem a area da reservados indios Waimiri Atroari.

Nenhum incidente grave foi reg strado nesses 1.1 ltimos seis anos. Nenhumdos transeuntes foi molestado pelos indios. E a FUNAI foi relaxando a vigi-15ncia e hoje é comum urn carnioneiro parar seu veiculo e oferecer caronaaos antes temidos indios Waimiri Atroari.106

A politica da Fundacao Nacional do Indio — FUNAI antes da morte deGilberto Pinto Figueiredo, em dezembro de 1974, de atrair os indios WaimiriAtroari, tinha como uma das diretrizes, a de evitar por todos os meios queos indios viessem a circular pela estrada Manaus-Caracara I, quando ela viessea ficar transithvel.

Os postos de atrac5o aos indios Waimiri Atroari eram instalados emlocais onde a atracão fosse dirigida para longe do tracado da estrada Manaus-Caracara i-Boa Vista. Temia-se que os indios, quando a estrada estivesse pron-ta e com tránsito regular e passassem a ter contatos indiscriminados com ostranseuntes, Io que infelizmente esta ocorrendo agora), viessem a contrairdoencas e receber influèricias negativas no seu sistema de vida.

Exemplos ja existiam na alpaca, em locals onde estradas atravessavamreservas indigenes, corn resultados negativos e destruidor da comunidades in-d igenas habitantes naquelas areas.

Na nova politica de atracao da FUNAI, em que a frente de atrac5o pas-sou a ter como base o eixo da rodovia Manaus-Caracarai, exatamente ao con-trario da politica anterior, fez com que alguns grupos de Waimiri Atroari,viessem a construir suas novas malocas nas margens da rodoviapas proximi-midades dos Postos da FUNAI.

Hoje existem nas margens da estrada Manaus-Caracaraf-Boa Vista- BR-174, mais de 3 aldeiamentos dos indios Waimiri Atroari, que vem mantendoindiscriminadamente e de forma desordenada contatos com os transeuntesda rodovia.

A FUNAI que continua incentivando os indios a permanecerem eli re-sidindo nas proximidades da estrada, consciente do mal que estä fazendo,assume urn risco e a responsabilidade de todos os males que por ventura jaadquiriram e irk adquirir por estarem residindo nas margens da rodovia.

Nos meses de maio e de junho de 1981, surgiu entre os indios habitan-tes nos aldeiamentos instalados na margem da rodovia Manaus-Caracarai —BR-174, onde a Fundacao Nacional do Indio — FUNAI, ostenta uma infra-estrutura composta de casas, galpOes, veiculos e pessoal, capaz de atender,se quiser, mais de duas centenas de indios enfermos, u m surto de sarampoque contaminou toda a populac5o daqueles aldeiamentos.

A origem da contaminacäo do sarampo, sem sombra de dirvida, foi docontato indiscriminado que os indios Waimiri Atroari, vem mantendo cornos transeuntes da estrada e que por lapso da prOpria FUNAI, a tudo permi-te sem a necesseria intervenc5o.

107

Page 55: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Os indios habitantes nas proximidades da rodovia e ali instalados porinduc5o da pr6pria FUNAI, bem que poderiam ter sido vacinados contra osarampo, medida esta elementar quando se leva a seri° um contato com in-dios ainda nao acostumados ao convivio com a sociedade dita civilizada. En-tretanto os encarregados da frente de atrac5o não tiveram esta iniciativa,preferiram esperar que acontecesse, para depois lamentar.

Dos cento e setenta e quatro indios que residiam nas aldeias a margemda Estrada BR-174, 21 deles morreram a mingua, sem os cuidados medicosnecessarios. Funcionarios da FUNAI, que lidam diretamente corn os indios,os atendentes de enfermagem, quando descobriram o surto de sarampo, ape-laram a administrac5o do &Or) pedindo socorro, tentando assim evitar emtempo que o sarampo viesse a provocar mortes e maiores sofrimentos entreos indios acometidos do mal. Os apelos n5o foram atendidos. A administra-c'do da FUNAI em Manaus omitiu-se quanto ao tratamento intensivo e aoscuidados solicitados pelos funcionarios ligados a area de sa6cle. E, 17 mulhe-res e 04 homens, as vistas dos funcionerios, morreram sem que eles pudes-sem fazer alguma coisa.

A morte de 21 indios Atroari, vitimas de sarampo e por total descasodo 6rg5o encarregado de assistencia aos indios, demonstra claramente as in-tencOes da atual politica indigenista brasileira, hoje sob tutela de urn grupode militares, que oriundos da chamada "Comunidade de InformacOes" vemcolocando em pratica uma politica Genocida, visando simplesmente a exter-minac5o das comunidades indigenas no Brasil.

0 sarampo que contaminou o grupo indigena Waimiri Atroari, que seencontra residindo nas proximidades da rodovia BR-174 Manaus-Caracarai-Boa Vista, espalhou entre os indios do mesmo grupo que ainda n5o mantemcontatos corn o pessoal da FUNAI, resistindo ao contato nas malocas no cen-tro da selva, eles contaminados, sem nenhum cuidados medicos tambem vie-ram a falecer. E o que se deduz.

0 nOrnero portanto de mortos em raz5o do surto de sarampo surgidoentre os indios Waimiri Atroari em maio e junho de 1981, ainda esta porser precisado, pois fatalmente nunca se sabers o nUrnero de vitimas provoca-das pelo surto.

Mesmo depois deste tragic() fato, a FUNAI nose preocupou em vaci-nar os indios contra doencas evitaveis e nem mesmo intensificou a vigilanciana estrada para que os transeuntes evitem de manter contato corn os indiosWaimiri Atroari.

Nas proximidades da area tradicionalmente ocupada pelos indios Wai-miri Atroari este sendo constru Ida uma usina Hidreletrica, que utilizara o

108

represarnento das aquas do rio Uatuma, na altura da cachoeira Balbina, quevira provocar a inundack de cerca de 1/3 da area ja reservada para os indiosWaimiri Atroari.

Ao leste da reserva, ja encontra-se em pleno funcionamento a Empresalimbo Minerac50 Ltda, pertencente ao grupo Parapanema que este explo-rando os recursos minerais da area dos indios Waimiri Atroari.

A FUNAI ja comecou a enviar a area, seus antrop6logos e tecnicos, su-pervisionados por Coroneis, propondo urn estudo visando a diminuic5o daarea e aconsequente liberac5o das terras as empresas de Minerack que pre-tendem nos pr6ximos anos instalarem seus equipamentos no territOrio dosindios Waimiri Atroari.

No INCRA em Manaus s5o encontrados documentos de mais de 30p roprieterios corn titulos registrados em cartOrio, da area compreendida pelareserva Waimiri Atroari, territOrio tradicionalmente habitado por aquelesindios.

Em pouco, tempo, se a politica n5o mudar, so ouviremos falar dos in-dios Waimiri Atroari, atraves de bibliografia em citees nas bibliotecas

109

Page 56: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

A RESERVA INDIGENA WAIMIRI ATROARI

Desde o in icio dos trabalhos do Servico de Proteck aos Indios —SPI,no Estado do Amazonas e da Primeira Inspetoria corn sede em Manaus, queforam feitas Arias tentativas de fixar limites ao avanco da sociedade n go in-

digena sobre o territ6rio dos (ndios Waimiri Atroari.

A instalacgo pelo SPI do Posto Incligena Mahaua, nas margens do rioJauaperi, visando principalmente defender a integridade do territhrio dosindios Waimiri Atroari foi o primeiro passo para a criac go de uma reserva

para aqueles Indios.

0 primeiro document° sobre a reserva Waimiri Atroari, foi a Lei n9941de 16 de outubro de 1917, que no artigo 59, destinava as terras da margemdireita no rio Jauperi, para os indios "Waimiris".

Entretanto,em 1921, o ent5o Governador do Estado do Amazonas, oDesembargador Rego Monteiro, visando afastar qualquer impecilho as inten-cOes de seu sobrinho Simpl Icio Coelho Rezende Rubin, de tomar conta dasterras dos indios Waimiri Atroari, revogou a Lei n9 941 e promoveu assima oficializack da invask ao territOrio indigena.

Mesmo assim, sem a protec5o das leis, ou de reservas legalmente consti-tuidas, os indios Waimiri Atroari, ap6s recuarem suas moradias da foz dorio Jauperi para as cabeceiras do rio Alalau, da foz do rio Camanau para a

regi go nascentes daquele rio corn as nascentes do Igarape Santo Antonio doAbonari, da Foz do rio Uatum5, para a area de sua cabeceiras, nao permitiamo avanco da presenca do homem civilizado para dentro daquele territario.

E toda a vez, que algum corajoso, aventurava-se a penetrar no Ultimo re-duto dos Waimiri Atroari, fatalmente pagava corn a prOpria vida.

Entretanto com o in(cio da construcio da rodovia BR-174 — Manaus-Caracara(-Boa Vista, e aptis o insucesso da miss5o Calleri e por proposta deindigenistas da Fundacgo Nacional do Indio — FUNAI, destacando-se a parti-cipac5o pessoal do indigenista Gilberto Pinto Figueiredo, foi criada a reservadenominada Waimiri Atroari, atravês do Decreto n9 68.907 de 13 de junhode 1971.

Os limites fixados n go foram exatamente os propostos por Gilberto. Aarea proposta era muito maior da que foi considerada reserve indigene peloDecreto a seguir:

"Ao norte: partindo da cabeceira do rio Camanau por uma linha reta eseca ate a foz de urn riacho sem nome, afluente da margem esquerda do rio

Jauaperi nas coordenadas aproximadas de 61°13'W e 0 035'5, dal subindoeste rio a foz do seu afluente rio Alalau, subindo este ate a foz do riachosem nome, seu afluente da margem esquerda, nas coordenadas aproximadasde 60°28'W e 0049'5, subindo este riacho ate sua cabeceira, por umalinha reta e seca ate a cabeceira do riacho sem nome, afluente da margemdireita do rio Uaturn g , nas coordenadas aproximadas de 59°59'W e 0037'S,dal descendo este riacho ate sua foz no rio Uaturng.

Leste: Deste ponto descendo o rio Uatum g ate a foz do seu afluenteIgarapé Santo Antonio do Abonari ate sua cabeceira do riacho sem nome,primeiro afluente da margem direita do rio Curianau partindo de sua foz, nascoordenadas aproximadas de 61°01'W e 1 042'S, descendo esse riacho atea foz do rio Curiau e por este rio abaixo ate a sua foz no rio Camanau.

Oeste: Subindo o rio Camanau ate sua cabeceira principal.

A area da reserva ficou com extens go aproximada de 1.611.900 ha, en-cravada no municipio de Airgo, no Estado do Amazonas.

A reserva entretanto n5o englobou toda a area habitada pelos indiosWaimiri Atroari. Muitas malocas dos (ndios e areas de caca ficaram de fora.As malocas instaladas na margem direita do rio Alalau e muitas outras naregigo central, alem do Alalau n5o foram consideradas e os limites fixadopelo Decreto 68.907, deixaram-nas de fora da reserva.

Na época os indigenista da FUNAI, principalmente Gilberto Pinto Fi-gueiredo, protestaram contra o fato da reserva n5o atingir toda area realmen-te ocupada pelos indios Waimiri Atroari. Entretanto nada de positivo con-seguiu-se. A alegac5o era sempre de que por se tratar de uma regi5o inospita,não havia necessidade de retificar o Decreto que criara a reserve e que comoainda ngo se tinha conseguido contatar com a maioria do grupo indigena,seria melhor esperar o contato para definir ao maior precis go os limites daarea.

Entretanto em agosto de 1974, conseguiu-se que nova area fosse inter-ditada para fins de atracgo dos indios Waimiri Atroari. Mais uma vez, ri5oobstante ficaram de fora do Decreto que fixou os limites:

Decreto 74.463 de 26 de agosto de 1974, fixava os seguintes limitespara esta nova area a ser acrescida a reserva decretada inicialmente para osindios Waimiri Atroari.

Norte: Partindo do rio Jauaperi, na altura da ilha Graziela, num pontode coordenadas 61°05'W 0 020'S por linha seca ao rumo geral leste, numaextensgo aproximada de 4 quilometros ate a cabeceira do riacho denomina-

110 111

Page 57: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

de 1978, incluindo, consequentemente,na area de reserva, a area de 03 malo-cas que se encontravam fora dos limites da reserva Waimiri Atroari e dasareas anteriormente interditadas.

A Portaria n9 511 N, juntamente corn os Decretos 68.907/71, 74.463/74 e 75.310/75, delimitaram a area minima do territOrio dos indios WaimiriAtroari, que na apoca ja era uma ilha entre urn sem nirmero de novos vizi-nhos que se instalaram na regik corn projetos de explorack de madeira,agropecuaria e minerac5o.

A Portaria n9 511 N, foi o Ultimo documento oficial que visava a prote-c5o do territ6rio dos indios Waimiri Atroari.

Estes diplomas, mesmo de forma fragil, mas que reconheciam oficial-mente a area dos indios Waimiri Atroari, foram a principal defesa do territO-rio daqueles indios a frente de varias tentativas de invas5o.

Entretanto no decorrer dos anos e corn a instalack de projetos de ex-ploracao agricola e madereiro nas proximidades da reserva, aventureiros eespeculadores, corn a parcimonia de 6rg5o oficial, chegaram a registrar comopropriedades particulares, vastas areas dentro da reserva dos indios WaimiriAtroari.

Mesmo corn registro, ou declarack de posse junto ao INCRA e "pagan-do impostos", estes falsos proprietarios nunca se arriscaram a tomar de suadeclarada propriedade, talvez pelo grande terror que os regionais ainda culti-yarn corn relack a agressividade dos indios Waimiri Atroari.

Corn autorizacao da Fundack Nacional do Indio — FUNAI, encontra-se instalada dentro da reserva Waimiri Atroari a empresa de mineracdo Tim-bb Mineradora Ltda, pertencente ao grupo Parapanema, que se encontra ernplena atividade exploratOria na regi5o leste da reserva.

Nas proximidades da reserva Waimiri Atroari, no rio Uatum5, abaixourn pouco do limite Noroeste esta sendo construido a usina hidreletrica de-nominada Balbina, que usara o represamento das aquas do rio Uatum5, comoforca hidraulica, formando um grande lago a jusante da barragem, que pro-vocara a inundaq5o de cerca de 1/3 da area da reserva Waimiri Atroari.

Ern janeiro de 1979, a ELETRONORTE comunicou a FUNAI que iriainiciar os trabalhos da construck da Barragem que represara o rio Uatum5,informando o nivel que a 15mina d'agua atingira e a sua influancia na areada reserva Waimiri Atroari.

A inundac5o de parte da reserva Waimiri Atroari, atingirth tambern par-te da rodovia BR-174, que liga Manaus-Boa Vista, exatamente no trechoda estrada que fica dentro da area dos indios.

113

Page 58: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Entretanto,sabe-se que existem duas alternativas para solucionar a pro-blema da inundacao de trecho da rodovia. 1) Alteamento dos trechos atingi-dos. 2) Construcao de uma nova estrada, contornando o lago que se formaradentro da reserva Waimiri Atroari, quando da construcao da barragem na ca-

choeira Balbina.

Sabe-se tambarn que a construcao de uma nova estrada ja foi determina-do. Os trabalhos de levantamento topogréfico ja foram realizados. Mais umavez o territOrio Waimiri Atroari sofrera depredaceies.

DIMINUICAO DA RESERVA WAIMIRI ATROARI

Quando este livro ja se encontrava composto, surgiram fatos novos, quevieram confirmar minhas previsOes e infelizmente, foram tomadas novasmedidas pelo poder publico, visando destruir o que resta dos indios conheci-dos como WAIMIRI ATROARI.

No ano de 1980, a FUNAI, tendo a frente da sua administracao obisonho Coronel da reserva Joao Carlos Nobre da Veiga, pessoa declaradainimiga dos Mdios, vinha tomando uma sarie de medidas visando diminuiralgumas das poucas reservas indigenas ja existentes no territOrio nacional.

Sabe-se que o referido Coronel Joao Carlos Nobre da Veiga, tinha eainda mantem estreitas I igacOes com grupos economicos do ramo de explora-cao e extracao de minarios.

Talvez por isto, tenha facilitado que a empresa Paranapanema S/A,conseguisse obter junto ao D.N.P.M, do Ministório de Minas e Energia, alvarade pesquisa na area nordeste da reserva indigena Waimiri Atroari.

Depois de um ano de pesquisa a empresa Paranapanema, constatou aexistancia de uma grande jazida de estanho na area em que pesquisava dentroda reserva indigena WAIMIRI AT ROAR I.

Para exploracao da jazida, foi elaborado o Projeto Pitinga, corn previsaode investimento na area de US$ 5.000.000 (vinte e cinco milhOes de &flares)para aplicapao nos anos de 1982 e 1983

0 potencial da jazida foi estimada em 28.000 toneladas de estanho,perfazendo um montante de US$ 420.000.000 (qutrocentos e vinte milheesde d6lares).

Entretanto o projeto enfrentava dificuldade para sua aplicacao, face ajazida encontrar-se encravada dentro da reserva indigena WAIMIRIATROARI.

A dificuldade foi afastada, pois a pr6pria FUNAI, tutora dos indios eresponsavel pelo zelo e conservacao da posse e usufruto pelos indios dastiaras por eles habitadas, atraves de seus dirigentes, inclusive seu Presidente,Cel. Nobre da Veiga, vinha praticando uma politica de traicao aos seustutelados e declaradamente de posicao favor-a y& a grupos economicosinvasores dos territorios ind igenas.

115114

Page 59: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

ATRACAO e PACIFICACAO DOS INDIOS WAIMIRI ATROARI", inver-tendo totalmente o processo de forrnalizacao de uma Reserva Indigena,pois a medida tomada nao caberia, pois a reserva indigena ja estava legalmen-te criada e corn os limites ja bem definidos pelos Decretos n9 s : 69/907/71 e74.463/ 74 e 75.310/75.

Tao logo a firma PARANAPANEMA procurou a FUNAI para tentarconseguir a necessaria autorizacao para explorar a jazida existente na areanordeste da reserva indigena WAIMIRI ATROARI, foi desencadeado urnprocesso de elaboracao de proposta para diminuicao da area da reserva.

Atraves do Departamento Geral de Patrim6nio Indigena da FUNAI,foram nomeadas varies comissOes de antrop6logos — (Recem contratadospela FUNAI em substituicao a urn grupo de indigenistas, que por nao con-cordarem corn a politica posta ern pre-Lica pela administracao do Cel. Nobreda Veiga) para reestruturarem em carater de urgência a diminuicao da reservaindigena WAIMIR ATROARI de tal sorte que deixasse de fora a jazida de es-tanho descoberta pela empresa PARANAPANEMA.

Entretanto, mesmo usando os antropOlogos recem contratados, oD.G.P. I., sob o comando do Cel. Pagano, nao conseguiu que fosse elaboradoa proposta de diminuicao da reserva indigena WAIMIRI AT ROAR I.

Resolveu entao o Diretor do D.G.P.I, Cel. Pagano a nomear urn seucolega, o Coronel da reserva de nome NEY FONSECA e sua principal as-sistente, a antrop6loga de nome Hildegart Rick, para dar uma solucaourgente no "caso" Paranapanema.

0 Cel. Ney Fonse e a antroploga'Hildegart estiveram na area dos indiosWAIMIRI ATROARI, num periodo de 2 (dois) dias e fizeram rapidos sobre-v6os sobre a mata, verificando, segundo alegaram ern seu relat6rio, a existan-cia ou nao de malocas de indios Waimiri Atroari, nas proximidades do acam-pamento d'a empresa pesquisadora de minerios, PARANAPANEMA.

Como nao "viram" nenhuma maloca nos rapidos e "arriscados" sobre-v6os que fizeram sabre a mata amazOnica, no processo, ja ern andamentoproporam a DIMINUICAO DA AREA DA RESERVA INDIGENA WAIMIRIATROARI.

A proposta de diminuicao da reserva indigena, foi remetida ao Ministe-rio do Interior (Processo FUNAI BSB/2625/81), ern carater de urgancia e emseguida encaminhado a Presidencia da Rep6blica para formalizacao do Decre-to.

Em 23 de novembro de 1981, o Presidente Figueiredo, atraves doDecreto n9 86.630/81, revogando todos os decretos anteriores (Decretos68.907/71 de 13.07.71, 74.463 de 26.04.74 e 75.310 de 27.01.75 que criavae aumentava a Reserva indigena Waimiri Atroari), tornou EXTINA a ReservaIndigena WAIMIRI ATROARI, transformando a area habitada por aquelesindios, como "AREA INTERDITADA TEMPORIAMENTE PARA FINS DE

116

Alem do ato de acabar corn anuma "Area interditada" o Decretoem 526.800 hectares, exatamente acgo PARANAPANEMA S/A

Reserva Indigena, tornando-a em apenas86.630/81 de 23.11.81, diminuiu a AreaArea pretendida pela emprdsa de minera-

Urn verdadeiro absurdo, um verdadeiro crime contra a populac go indi-gena WAIMIRI ATROARI, pois devido a sua condic go de indios aindaarredios, riao tern condicOes de protestarem publicamente contra o abuso etraicào praticado pelos seus tutores.

117

Page 60: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

NOVA ESTRADA DENTRO DA TERRA DOS INDIOSWAIMIRI ATROARI

Corn a extincgo da reserva indfgena Waimiri Atroari, que passou a serapenas uma "area interditada temporariamente" e a diminuic go da area, dei-xando I ivre e desembaracada 526.800 hectares para a empresa ParanapanemaS/A, foi dado o prosseguimento ao processo de instalac go do Projeto Pitinga,daquela empresa, que visa a exploracgo de jazida estanifera.

Entretanto Paranapanema S/A, n go satisfeita corn os 526.800 hectaresdas terras indfgenas que lhe foram, n go se sabe a que preco, cedidas pela dire-

cgo da FUNAI, passou a exigir daquele Orgao, que lhe autorizasse a construirdentro da nova "area interditada" uma estrada para utilizacgo em cargterprivado e exclusivo, com o fim de escoar por rodovia, o minerio a ser retira-da da jazida de estanho que se encontra na area incligena, hoje em poderdaquela empresa.

No period() em que a Paranapanema formalizou a FUNAI o pedidode autorizacgo para construir a estrada, antes mesmo de qualquer respos-ta, iniciou os trabalhos de construc go abrindo picadas e levantamentos to-

pograf icos.

Nesta epoca, dezembro de 1981, o Cel. Nobre da Veiga, foi afastadoda Fundacão Nacional do Indio, levando consigo a fama de pior Presiden-te que a FUNAI jä teve, inclusive corn a marca de Arias denuncias pOblicasde seu envolvimento corn casos de corrupc go administrativa.

Em seu lugar assumiu o Cel. Paulo Moreira Leal,que oriundo da Secre-taria do Conselho de Seguranca Nacional, era uma esperanca para que pelomenos a seriedade e o respeito as leis fosse restabelecido na FUNAI.

Com a mudanca da administracão, os desejos da Paranapanema ngotiveram a mesma acolhida que vinha recebendo na epoca da administracgodo Cel. Nobre da Veiga.

Consultado as antropalogos do arg go (Processo n9 003929/81-FUNAI)e sem a ameaca do Cel. Nobre da Veiga, estes foram de parecer contrerio apretensào da Paranapanema S/A de mais uma vez invadir as terras dos indiosWaimiri Atroari, atraves da construc go de uma estrada c/38 quilOmetros deextensaa para seu use exclusivo.

Diante do impasse tecn ico, devido a negativa dos antropOlogos, urn dosremanescentes da administrac5o Nobre da Veiga, o truculento Diretor e Che-

fe da Assessora de Estudos e Pesquisas da FUNAI, Cel. Ivan Zanoni Heusen,assumiu a questäo "PARANAPANEMA" e procurou novas formulas paraatender o desejo daquela empresa de mineracao.

Sugeriu, que tendo em vista a necessidade premente e inevitävel de serconstruido a estrada, fosse criado na area, uma infra-estrutura por parte daFUNAI, visando evitar possiveis reacOes dos fndios contra os construtores daestrada e futuros transeuntes da rodovia, quando a PARANAPANEMA S/Ainiciasse o transporte do minerio.

Sugeriu tambam que fosse cobicado urn elemento que conhecesse os fn-dios WAIMIRI ATROARI, para exercer suaseatividades de sertanista e indi-genistas junto as equipes de funcionarios da PARANAPANEMA S/A, visandoa protecgo dos trabalhos a serem realizados quando da construcgo da estra-da.

A pessoa escolhida foi eu. E pessoalmente fui convidado pelo Cel. Zano-ni. Como sent( que por tit do convite existia interesses ngo confessados, eque a firma PARANAPANEMA estava invadindo terras indigenas, recuseiem principio o convite, propondo que antes de qualquer resposta, eu visi-tasse a area e depois do meu retorno daria a minha resposta final.

Estive na Area indigena Waimiri Atroari, assim como no acampamen-to da PARANAPANEMA, onde os trabalhos de infra-estrutura ja se en-contra mediante estagio de implantaggo.

Constatei na ocasi go, que o Projeto PITINGA, da Paranapanema, riga,se restringe somente a area de 526.800 hectares, cedidas da area indfgena pe-la FUNAI, mas inclue tambarn toda a area compreendida a direita da rodoviaBR 174 no sentido Manaus—Caracaraf entre os rios Santo Antonio do Abo-nari e Alalau e que a estrada a ser construfda pela Paranapanema, visa prin-cipalmente a posse dessa area e n go necessariamente um meio e via de escoa-mento do minerio ja descoberto na area cedida pela FUNAI.

Quando retornei a Brasilia, apresentei urn relatario ao Presidente daFUNAI, Cel. Paulo Moreira Leal, informando-o dos males que a estradase constru Ida causara aos Indios e que havia constatado corn relac go as pre-tensaes expansionistas do Projeto Pitinga da Paranapanema, com relacOo asterras dos Indios Waimiri Atroari.

Em principio a minha denuncia foi bem acolhida, principalmente quan-to a denuncia do processo em que resultou na diminuic go da reserva.

Providencias na FUNAI foram tomadas no sentido de apurar responsa-bilidades quanta a possivel envolvimento de funcionarios do Org go, favore-

119118

Page 61: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

cendo a empresa PARANAPANEMA S/A em prejuizo das terras dos fndiosWAIMIRI ATROARI.

Sabe-se que o Cel. Paulo Leal, ap6s ter sido contrário a pretens go da Pa-ranapanema S/A em construir mais uma estrada dentrdo da "area interditadados indios WAIMIRI ATROAR I", teria voltado atras, cedendo a fortes pres-sees que recebera dos altos escalbes da administrabao federal.

ApOs a entrega do meu relathrio ao Presidente da FUNAI, contr6rio aspretensbes da PARANAPANEMA S/A, fui procurado por um dos seus fun-cionerios, Sr. Vilas Boas, que ao saber do meu parecer contrario a pretensãoda empresa em que trabalha, de construir uma estrada dentro dos domfniosterritoriais dos fridios WAIMIRI ATROARI, fez-me pessoalmente ameacas,dizendo "que o poder econOmico 6 muito forte e que passaria por cima demim e do Presidente da FUNAI e ate mesmo de quem quer que fosse quetentasse impedir o sucesso do Projeto Pitinga.

Da forma como estao acontecendo os fatos, certamente quando estelivro comecar a chegar as Mac's do public), novos crimes contra os IndiosWAIMIRI ATROARI jä foram perpetradas e sua reserve mais uma vezdiminufda.

Gilberto Figueiredo, conversando corn o seu amigo Indio MAR UAGAem 1974.

Page 62: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Meninos WAIMIRI, em vistia ao Posto deAtracgo CAMANAU 1974.

indios WAIMRI em visita ao POSTO DEATRACAO CAMANAU — em 1974.

Indios WAIMIRI — Tuxaua (o de camisa) — e sua esposaacompanhados de urn outro 'icier WAIMIRI — ATROARI. A estrata BR-174 — Manaus-Boa Vista, depo is de pronta. Trecho dentro da

reserva inclfgena WAIM IR I-ATROAR I.

Page 63: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

So'dodos do B.E.C. na BR-174 — Manaus-Boa Vista,no trecho que cruza a reserva inclfgena WA IM IR I-ATROAR I.

Indios WA IM IR1 em visita ao Pcsto de A trace° da F UNA I em 1974.

Page 64: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Maloca de Indios WA IM IR I-AIR OAR I, na hora em que estava sendoincendiada, quando o aviâo de buscas as vitimas do ataque ao Posto deAtrac go ALALAU II, sobrevoava o local. Em 02 de outubro de 1974.

Gilberto Figueiredo corn os Indios WALMIRI quando visitam oPOSTO DE ATRAQAO CAMANAU em, 1974.

indios ATR OAR I, na margem do rio Alalau, logo ap6s ao ataque aoPosto de Atrac5o ALALAU II ern 02 de outubro de 1974.

Page 65: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

A estrata BR-174 — Manaus-Boa Vista ainda em construflo (19741, na areada reserva indfgena WA IM I-ATR OAR I.

Canoas dos indios WA !MIR I-ATR OAR I — "UBAS" — 1974.

Maloca dos Indios WA IM IR I-ATR OAR I, na margem direita do rio A lalau— 1974.

Canoas dos indios ATR OAR I — UBAS — no "porto" do POSTO DEATRACAO ALALAU II. Em 1974.

Page 66: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

0)

-- --------

Pia Alalau•

tr -A

A(Pi •

z.-

9Cc

%

itit•

Igarape S. Ant.Posto

0 FrgiointoBrigna

o•

/

A to/•

07"Or

O is Camanau

0 legenderio Indio WAIMI RI — Tuxaua Maruaga.Foto em 1974

RESERVA WAIMIRI ATROARILimite da ReservaAldeia de IndioPosto da Funai

Page 67: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

REDE ROOOVIÄRIA PRINCIPAL, EX ISTE NT EE PROJETADA NA PAN-AMAZONIA

CARACAS

GEORGE TOWNRAMARIBO

CA IE NA

/AT

/L M

•in balls..I

;## I Hunan:1 Crowo as sal

*rase a

Pucal Z")

MA

•••••••

ONreVIDEU +

C)

O

AREA OE /JAZIDA OE ESTANNO

ICASSITEALTAI

MAPA DA RESERVA WAIM IRI ATROAR IDestacando a distincia cons relecio a Manaus, Capital doEstado do Amazonas.Regi5o None do Brasil — America do SW.Escala: 1: 250.000

tuullsn

Page 68: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

G LOSSARIO

ANTA — Tapir. Mamffero perissoclactilo da fart ilia dos tapirideos, que habi-ta a regiao compreendida desde a AmazOnia Colombiana ao charco Ma-togrossense. Mede cerca de 2 metros de comprimento e 1 metro de altu-ra. Vive nas matas, nas proximidades dos rios e lagoas. E tido pelos ca-cadores como urn caca nobre e sua came é saborosissima.

BACABA — Palmeira de espique anelado, folhas lanceoladas, I ineares, de flo-res brancas, comestiveis, com as quais se fabrica bebida vinhosa. 0 pal-mito é alimenticio. 0 fruto, oleaginoso e comes-Live,. Palmeira do Oile-r° Oenocarpus.

BALAIO — Cesta de palha, de talas de palmeiras ou de cip6, de forma arre-dondada, que serve para guardar farinha de mandioca e frutas.

BALATA — Nome gendrico as espkies de sapotâceas produtoras de gomarigo eléstica, de importancia comercial. As principals espacies de "BA-LATAS" — Sdo: Balata Verdadeira, Balata Rosada, Balata Rosadinha eBalata Inferior — extra ida da massaranduba. (Manikara Bidentata, Side-rowylon Resineferom, Sideroxylon Cyrtobotrym, Minikara Huberi).

BALATE I RO — Coletor de Balata.

BANDOLEIROS — Expressk designativa a pessoas que se prestam em gru-pos, a atividades fora da lei corn use da violéncia. Bandido. Cangaceiro.

BATELAO — Embarcack robusta, constru Ida com ferro ou madeira, usadapara embarque e desembarque de cargas, sem propulsk prOpria.

BEIJU — Bolo de massa de mandioca ou de tapioca.

BORDUNA — Arma constru Ida em madeira na forma de um grande lack.

BORRACHA — Substancia elastica feita do latex coagulado de \ferias plantasprincipalmente a seringueira (Haves Brazilienses).

BRINDES — Presentes ofertados e trocados com os indios, consistindo emfaceies, anz6is, facas, calcaes de pano, roupas em geral, arame, machado,enxadas, foices, etc.

CACHOR RA — Cadela ainda nova. Fôrnea do cgo.

Page 69: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

CANOA — Embarcacão constru Ida em madeira, de pequeno porte. Mede de01 a 05 metros.

CASTANHA DO BRASIL — Castanha do Para — Amèndoa rica em prate inasgordmras, sail minerais e vitaminas. Sabor muito apreciado. (Bertholletiaexcelsa H.B.K. Leciticlacea).

CRUZEIRO — Grande cruz erguida em cemiterio, pracas, largos. Simbolo docristianismo. Era erguido sempre quando se fundava uma povoac5o. Ser-via de marco initial de urn povoado.

CUR UM IM — Rapaz. Rapazinho de sete a doze anos, moleque. De Kyrymi-Curumi (Tupi).

DER-AM — Departamento de Estrada e Rodagens do Estado do Amazonas.Vinculado ao Governo do Estado do Amazonas.

DNER — Departamento Nacional de Estrada e Rodagens. Vinculado ao Mi-nister-la dos Transportes.

FUNAI — Fundac5o Nacional do Indio — Instituic5o do Governo Brasileiro,corn a finalidade de defender e proteger os indios no Brasil. Substituiuo Servico de Protec5o aos indios — SPI, extinto em 1967. Foi criada pe-la Lei 5.371, de 05 de dezembro de 1967.

GAVIAO — Designacao comum as värias especies de a yes falconiformes, dafamilia dos acipitrideos e falcon ideos.

GEN EROS — Produtos agr (colas, viveres, mercadorias

IGARAPE — Ribeir5o. Riacho. Caminho de canoa. De Ygara — Canoa-Pe Ca-minho.

JAMAXIS — Uma especie de cesto de forma comprida, onde os indios Wai-miri Atroari, carregam os seus pertences quando em viagem. Feito detala de arum5 e cipa de timbOacu, com alcas para o peito e para a cabe-ca.

MACAXEI RA — Tuberculo comestivel. Conhecida também como aipim. Eas vezes, como mandioca.

MALOCA — Casa residential comunal. A maloca dos indios Waimiri Atroari,consiste em uma construcão de troncos fincados no ch5o, de espaco aespaco, que sustentam uma cobertura de palha de ubim trancado. Temforma oval ou redonda, com duas portas e paredes tambern de hastes

fincadas no chao, forradas corn palha de ubim ou bugu as quais, quasesempre nao chegam a atingir a altura do teto, deixando uma aberturapara a entrada de ar e para saida da furnace de suas fogueiras. Interna-mente a maloca contarn divithes que são esteios fincados ao ch5o osquais servem n5o so para dividir entre as acomodaceies de duas familias,pois a maloca é um sistema de moradia comunal, como tambern servempara dar apoio as suas "Maqueras" que ficam atacadas nestes esteios enos esteios de sustentac5o do teto. Em cada uma destas divisties viveuma familia com seus pertences: Arcos, Flechas, Cu ias, Jamaxis, Maque-ras, etc.

MANDIOCA — Planta leitosa, da familia dos euforbikes, cujos grossos tu-bèrculos radiculares, ricos em amidos, sk de largo empenho na alimen-tacão e que servem para o fabrico da farinha para alimentack.

MAQUERAS — Rede de dormir, construida corn fibras de tucum, em forma-to de malhas, corn rombos de 8 a 10 cm quadrados e bastante resisten-tes.

MATE I RO — Pessoa conhecedora da selva e que oferece seus servicos comoguia em expedicees na mata.

PACA — Mamifero roedor dos cuniculideos (Cuniculus Pacal. Vive sempreperto d'água, onde busca refOrgio quando perseguido. Adulto pesa cer-ca de 10 quilos e é apreciado para a caca esportiva.

PARANA — Brag° de rio caudaloso, separado deste por uma pequena ilha.Canal que I iga dois rios.

PARTEI RA — Mulher encarregada de ajudar no parto.

PENEI RA — Objeto circular, com caixilho de madeira ou cli p& corn o fundoformado por telas de palhas de palmeiras.

PICADA — Caminho feito na mata, atraves de desmatamento das pequenasärvores ou arbustos, conservando-se as kvores maiores. Inicio da cons-truc5o de uma estrada maior.

PIRANHA — Designacgo comum a Arias espácies de peixes teleosteos, cari-ciformes, da familia dos caracideos. Conhecidos como carnivoros, ex-tremanente ferozes e vorazes, corn dentes numerosos e cortantes. De-monstram predileck especial por animals sangrantes, tornando perigo-sos os rios e lagos onde vivem.

PIRARARA — Peixe teleoteos, siluriforme da familia dos pimelodideos.Tern dorso escuro e uma faixa amarela ao longo da linha lateral, corn

Page 70: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

duas series de pigmentos de amarelo ouro. Tido dos rios amazOnicos,como peixe perigoso e devorador de animals.

PI RARUCU — Peixe telksteos da ordem dos clOpeos, da familia dos osteo-glossideos da bacia amazOnica. E o major peixe de escamas do Brasil.A pesca e feita com anz6is ou arpk. A lingua é usada para ralar guara-ni A escama é utilizada para lixar unhas.

PORTO — A expressgo "porto" e utilizado para designar o local onde ascanoas ficam atracadas e onde os passageiros embarcam e desembarcam.E um barranco na margem dos rios e as vezes uma pequena enseada,pr6pria para o atracamento das pequenas embarcacOes.

POSTO DE ATRACAO — Consiste num local onde sk instalados atrativospara que os indios arredios aproximem-se das pessoas que I g se encon-tram. Local de doacgo e trocas de presentes, visando conseguir fazeramizade com os indios arredios.

POSTO DE ATRACAO ALALAU I Local de atrack instalado na margemesquerda do rio Alalau nas proximidades de sua foz corn o rio Jauaperi.

POSTO DE ATRACAO ALALAU II — Posto de Atracgo instalado na mar-gem esquerda do rio Ala lau, distante cerca de 3 quilOrnetros do tracadoda BR-174.

POSTO DE ATRACAO CAMANAU — Posto de Atrac go instalado na mar-gem direita do rio Camanau, nas proximidades da foz do rio Curiau.

Brasil. Foi depois extinto e substituido pela Fundacao Nacional do In-dio — FUNAI. Dividia-se o SPI em Inspetorias Regionais. A Inspeto-ria foi instalada em Manaus, capital do Estado do Amazonas.

SUB-COAMA — Sub-Coordenac5o da AmazOnia — Organismo criado dentroda pr6pria FUNAI, para tratar dos assuntos da AmazOnia Legal. Em ca-da regiao da amazOnia foi criada uma SUB-COAMA, subordinada aCOAMA — Coordenack da AmazOnia, com sede em Brasilia — DistritoFederal.

TABOCA — Bambu. Taquara.

TAP I RI — Cabana. Do Tupi — Tapi'ri.

TRAIRA — Peixe teleosteo da familia das carcacideos. Muito comum nosrios brasileiros.

TUCUM — Palmeira de cujas grandes folhas se extrai uma fibra forte é Otile cujas sementes fornecem 30 a 50% de um Oleo alimenticio. Atingeuns dez a doze metros de altura.

TUCUNAR — Peixe teleosteo, percomofo, da familia dos ciclideos da ama-zenia, de coloracão prateada.

UBAS — Canoas feitas de um tronco de Orvore inteirica, cavado no meio, quecom use de remos, servem como embarcack e meio de transporte.

VARADOURO — Caminho estreito dentro da floresta.POSTO DE ATRACA- 0 SANTO ANTONIO DO ABONAR I — Posto de Atra-

cgo instalado na margem direita do Igarap6 Santo Antonio do Abonari,distante do tracado da rodovia, cerca de 1:30 horas de viagem em motorde popa.

SE RTAN ISTA — Pessoa que trabalha na selva. Acostumado ao trabalho jun-to as comunidades indigenas.

SEXTO BATALHAO DE ENGENHARIA E CONSTRUCAO — Divisk doEx6rcito Brasileiro, subordinado ao 29 Grupamento de Engenharia eConstruck — encarregado de construcOes de estradas na regi go amazO-nica. Responsável pela construck na BR-174, Estrada Manaus-Caraca-rai-Boa Vista.

SERVICO DE PROTECAO AOS INDIOS — SPI — Instituick do GovernoBrasileiro, criada em 20 de julho de 1910, pelo Decreto 8.072 de 20 dejulho de 1910, tendo como finalidade prestar assisténcia aos indios do

Page 71: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

ntirts'W

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA E CITADA NESTE TRABALHO

RelatOrio que a Assembléia Legislativa Provincial apresentou na abertu-ra da sessao ordindria do dia 03.05.1850, ao Presidente da Provincia doAmazonas — Francisco Josè Furtado.

Relatario que a Assemblaia Legislativa Provincial apresentou na abertura dasessio ordindria do dia 07.09.1858, ao Presidente da Provincia do Amazo-nas — Francisco Josè Furtado.

Jornal do Amazonas — 28 de abril de 1878.

JAUAPERI, PACIFICACÂO DOS CR ICHANAS — 1885.Barbosa Rodrigues.

"DIE JAUAPERI" — Georg Hueber e Koch-Gruemberg Teodor.Zeitschrift fuer Ethnologic, ano 39 — 1907, Berlin.

OFICIO N9 144 — 23.021931 da Chefatura de Policia do Estado do Ama-zonas pare a Inspetoria do S.P.I. no Amazonas.RelatOrio da Inspetoria do S.P.I. — 19 — dos anos 1930/1931.

JOAQUIM GODIMEtnografia Indigena — Estudos realizados em várias regiOes da AmazOnianos anos de 1921 a 1926. Volume I — Editora Fortaleza, Cearè, 1938.

RelatOrio da 19 Inspetoria do Servico de ProtecSo aos lndlos — SPI, noEstado do Amazonas, em 1940.

OFICIO N9 22 do Sr. Inspetor do S.P.I. Carlos Eugenio Chauvin, em 20 defevereiro de 1941 ao Sr. Dorval de MagaIhSes, Prefeito de Moura.

Colectänea Indigena — Tenente A lipio BandeiraTipografia Jornal do Comercio — Rodrigues & C. — 1929

JAUAPERI — Alipio Bandeira — 1926.

Major LIMA FIGUEIREDO/adios do BrasilBrasiliana, thrie 59 Vol. 163.Biblioteca Pedagogia BrasileiraCia. Editora Nacional, Sao Paulo — 1939.

Page 72: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Related° do Dr. Alberto Pizzarro Jacobin sobre a expedient) chefiada pelotenente WALTER W ILLIAMSON do 4TH PHOTO CHARTING SQUA-DRON — 1944.

RelatOrio da 19 Inspetoria do S.P. I. do ano de 1946.

Related° que Dr. Domingos Monteiro Peixoto entregou a administracäo daProvincia do Estado do Amazonas em 16 de marco de 1875.

Related° do S.P.I. — assinado pelo Inspetor Manoel Moreira de Ara*, em03 de maio de 1961.

Jornal do Comárcio — 30.05.68 — Manaus — AM.

Jornal do Comer-do — 30.05.68 — Manaus — AM.

Jornal do Comercio — 07.07.68 — Manaus — AM.

Jornal da Tarde — SP — 09.11.68

Estado de Sao Paulo — SP — 09.11.68

A Critica — Manaus — AM — 21.11.68

Folha de Sgo Paulo — SP — 24.11.68

Estado de Sao Paulo — SP — 24.11.68

Estado de Sao Paulo — SP — 26.11.68

Folha de Sao Paulo — 2711.68 — SP

Jornal do Brasil — RJ — 04.12.68

Jornal do Brasil — RJ — 10.12.68

O Estado de Sao Paulo — SP — 13.1268

A Noticia — 08.02.73 — Manaus — AM

A Noticia — 170273 — Manaus — AM

A Noticia — 020273 — Manaus — AM

OFICIO N9 46 do Chefe da 19 Inspetoria do S.P.I.Viana ao Sr Diretor do S.P. I. — Em 2203.49

em Manaus, M. Rocha

RelatOrio de viagem de Gilberto Pinto F4ueiredo Costa — 30.09.73

Jornal do Brasil — 17.01.74

Note Oficial do 29 Grupamento de Engenharia e Construct — COMANDODA AMAZON/A — assinada pelo General Bda. OCTAVIO FERREIRAQUE/ROZ.

Offcio datado de 03 de dezembro de 1968, da C.N.B.B. assinado pelo PadreMateus George — Sub-Secretdrio Regional Norte 1, ao Sr Dr. QueirozCampos — Presidente da FUNAI.

RelatOrio da Frente de Atract WAIMIR I ATROA RI — Gilberto PintoFigueiredo — 27.10.73.

Oficio n9 19/74 — 19 D.R. do Sub-Coordenador da Coama — FUNAI,Jose Porfirio F. de Carvalho ao Sr. Comandante do 69 BEC datado de0207.74.

A Noticia — 05.01.74 — Manaus — AM

Oficio n9 119/74 do Chefe da Sub-Coama — Manaus — AM. Jos6 PorfirioF. de Carvalho pars o Sr. Comandante do 29 Grupamento de Engenhariae Construct — em 22.10.74.

Offcio n9 87/74 do Chefe da Sub-Coama — FUNAI em Manaus — AM — Jo-sè Porfirio F. de Carvalho ao Sr. Comandante do 69 B.E.C. datado de01.10.74.

OfIcio no 120/74 do chefe da Sub-Coama — Manaus — José Porfirio F. deCarve/ho, pare o Sr. Comandante do 29 Grupamento de Engenharia e Cons-trued° em 22. m74.

Ate da 819 Sessdo do Conselho Indigenista da FUNAI — 24.01.75.

OFICIO NO 69/75 — CART. 05.0275 do Chefe do D.O.P.S./Departamentoda Policia Federal — Bet Hello Vieira Junior ao Delegado da FUNAI emManaus.

OFICIO N9 042/E-2-CONF. de 21 de novembro de 1974, do Comandantedo 29 Grupamento de Engenharia e Construct ao Comandante do 69 Ba-talhdo de Engenharia e Construed°. Assinado pelo General de Brigade GentilNogueira Pees.

A guerra do Exterminio contra os Waimiri AtroariEgydio Schwade — 1980.

Page 73: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

HTNISTAUTO DO 'OM/ TO

COINANDO MILITAR DA AMAZONIA

20 GRUPAMENTO DE ENGENHARTA DE CONSTRU0A0

NOTA OEICIAI

0 Comando do 2 0 Grupnmente de Errohnrim de E onstrucr/o, • quem

est; delegnda P implantacAo ]74 ''PA.NAI1S-UOA VISTA-FRONTED/A /

DA VENEZUEI A em face d ist”ntem noticin g que Vein anndo pnbli

cads. em jorrnte (lento Tata]. e, MCSMO, do. grandee centros do

Pals, em que o Sr Cr' -LP NMREIRA MIA A apresenindo Como responsA -

veil on cOltindo polo trAgico trucidemonto de tres funcionArios da

'UNA' por silvtrolas, no posto drid/Ala Fo o d:lc:10 nitundo A margem do

rio AlalnA, sente-se no dever de prentar an pAblico os indispensA-

veis esclarecimentos a dim do que concluses preripilados e souse -

cees sem fundnmento un verdade dos fates nEto venhani a en ti gma tizer

I humilde pntrfelo pie, e sue manrira a coin o son trabalb a , colabo

rau eficnweenle na importante obra quo estamos rcalizando.

Do gdo quo dos Intensiticaram os trabalhoa de de gmatamentm na

BR-174, con previ g reo 'Jr t raves g ln da Reserve Indigene Walmiri-Atro-

rf, .st- Comando monteve-se parmanenttemonte informed(' do quo es

have nconTerendo nnquein fronie de service, mein nirnvedi do Coronado

do Go DEC, que dirlre diretnmente es trchnlhos, mojn ntrnves de De-

Inset', Regional do Fld s/AI, cnJa mince° ern exercer, corn o set/ pes-

'al onpeciali2ado, o cuntrole dos values ililvenn. Wnimtrts-Atruad

Fla quo habitnm as proximidadem do traced° da rodovia.

Durndte dodo e perfodo em role as turmas dr dr , matnmento perMa-

nec eram no Arca indigene, que ne este/1(10u de Jul 72 n 4 Jan 7T,quan

foi e ingtdo o rio Jauaperi e iniciada a retirada do pessonl per

aquele rio, nenhum cheque au desentenddmento foi registrado entre /

trnbalhadoros e fndio g Atronris, nitrite embers estes acorressem fre-

lnentemonte nos scamp/mentos dam turmns, via de regra em buses de

,ge s entrn, pardicularmente artigos do alimentnc:n n. A deguranca das

,pernc .rieg rot montlda, na trovessia do territArio habitado polo A-

d-earls, pela observancin de proCedimentos previnmente estudados ''e

Atobelecidos, ditndos pe10 . exper1;ncta e erOcie de homene eetudIo

Os da hintori0 n dn. Pithitos Indigenes a conheredoree de regao,co

o 0 Ten rel J04; de Almoida Oliveira, Cmt 60 DEC; o eertnnIst n Gil

orto Pinto Figuniredo Costa, do FUNAT e o empreitelro Andre Morel-

Nunes. Dues rogron bAnicne forme. nadmrldw g , • raess0Cm 1"m"*""

/valuta.. oretivee (cerca de 20(1 horned. foram mantIdem em service),

It denencorajonse qualquer aiditude agrearava poi parte dos indigo

Page 74: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

nes e • nhnudAncla dr snprImentas, quo neutron o n sun nn Prir

e rnparidean. Essen medtdan revelarom-en plonnmente ..

roe a ns,er, nrnrom n paz entre trabalhndorrs e milvicolos darentriL:-

t Od 0 0 lenq , 01 0111 qne Pill n . Train (011 cuntnto. .4' 10

Una vez nfinyjdo 0 rin Aln lair pnlae tunas de donmatnmento,em

Jul 72. entreifelre Andt4 Nureira /g lows enntratnn Colso floreira

Hai n pnra eft-tin/1r n transports de suprtmenton, par y in fluviolot;

acompnelentn e , Inhelerido na mnrgem aorta d iignele rio o quo servi

I n de 'polo para n pronneguimento don trabolhos.Denincnmbindo-se

A• nma tnrefn Cat epee Colso Main montove, em duns oportnnidndes ape

contntos cornnis com grupos de Atroarls, em componhin do eau

' il or Pedro Lenndro, Ambom os contatoa, porqne se verificarnm

no ' p i. “xrnto do turma de desmatamento, A margem do AloltiM, on em

-nos pros i mid-ides, foram testemunhados por um aviinro consideroivel

de pesnoas, qua Ra t/ nnAnimen ern afirmar quanta As manifestogties de

nlegrin e conmidoracAo dos Indigent' s porn corn Celro Main, chamon-,

do-0, mesmo, repetldnionnte, de "Papal Main". Ile, pnlnonbundante e

lubitAvol comprovngAo testemunhal do boo acolluido dodo pe/es in-

digenns • Celno JA a verso quo tem sido difundida, db qua

minelo cidndilo torte prnticado atos ofensivon nos costumes indigo-

nns e poriemo atrnidn sou Odic., carece totolmente d• te.temnnh,s /

oculnren e prow peln lnacettnbilldnde de hlstorin fantAntica de

um homem qnn, gunme mozinho, teve • inacredi tavol cprngom e and; -

Pie de orender nm AtrOarlA em sums pi4mirinel platoons, rotirando -.e,

ap6s, impune e liemp.

Datum de 14/15 Ago a 17/20 Set os contatos de Colso Maia com

es Atrnnris, comprovadnmente nmist0,30s. Apta s •stn Altimn data, riAo

main na enc”mtrou, por matins quo odinnte so verAn.

Em Out 72, o sertanista Gilberto Pinto FIgneiredo Costa, en-

C -egado polo N INA] do chefinr os trabalhos de controle dosiAtron

im durnnte a troll/03sta do Reacrva Indigena pelne tureins de domain-

tamento da nu-17 11, aoltcitoo ao Cmdo Gpt o afamtamento do Cahn

Main dnei nel area, soh a alegac7 1 do quo silos relacOca com on in-

digenes entnrirm perturb:1nd° o trohnlho da equine do FUNAI. JA sa-

bedor do verdeirm uninv e zn dos relay:lea de Caine Thin Com os A-

troarin, ntrriv7,, dos informacrien procedentem da (route de servigo,

m ete CC/Mande C0091. er00 a solicitagile do sertnni eta a atribuiu-a

razors exclorivamonte do nrdom tecnicn, parfoitomente eompreensi

lima populnridade do tr.m.-;portndor entre on

ria, fromionmente ca.- “ ctvrlzada a Cv:apruvada, poderia enfentinecerOU

tomprometer a NcAo de ltdernric a Rohr, o p ifilit$0011• qua,por impost-

tla mar numitich• por Gilberto Pinte.Fieli ..... A

/1.0.4.4411.

g A I r lut dode Or CAM'Ino, • - VI nab:eSbilidde .,sempre

everini I ;o0n do/ r - met1105 da FUNAl n no ncet-aid,, r fl r aminto Art-o0, 0 Crate Gpt recemee, .•-••

oreira ::ours eiOr Main Pilo mots tnt

tr./arts. 0 e compreendido

SO ras vingen, qne renlizou,. nitraprolando n confluencis

jeunperliAl

No foi, pnis, convAm frizar, Celno Main proibido de ponetrnrta•'Deserve Indio, eno per mon compor tamen to anirelaciio nos indigenns,mn.,

mimplesmonte afastado, de comum °cord., a fim de mentor-se o princI.

pin de fixogAn de responsabilidaden prevlamente ertnbelecidoin cons-,trugAo do ePtrndn e minsAo do Exlircito; o cons role dos indlgenns A

pia sno da prNAI.

Realmente, no period() .p ie tromiscorren npAs 2 0 Set 72, 'l,tn do

. ultimo omit:Ito do Celso Main com os nllvIcolon, eaten o procurnram /

vA •ias vezes, n710 com o propOsito vindidatArio que onto lend° utri -

bold° a essan bnscnn, menAu Com a esperanca do abler novamenin Com

ale as utilldades com r ine rostuninve brindA-los. Se houve qualquer im

paeiAncia on inquietn;An entre os indlgenas provocada pelts nesson de

Cpino Maio, 1-to devem-se A sun prolongnda ausAncia: p ois nguardnvom

son voltn, vende no to um homem capncitado a proporcianer-1 hes coi-

gne por p lea opreCiodas, jrimais nun element° nocivo n mar eliMinaJ0.

condo, Com base em Caton comprovadon o nn ham Rona n , este

riamon matte maim pr<C rintom da terdade at formulniinemon n hleAtese d.'

on indigenaa troo p] trucidodo os de,venturados funcionArlos da FUN2I

per jillgArlon relpans :nets polo de sapnr eeimen tm de Calsa Mnia on par

'WA inr,pocidade de rn7;1-70 nparecer. E, neste rano, it "culpa" rerni

win sobre a dedicndo mertnnistn Gilberto Pinto, gee proper o sou n-

faminmento In Area c o Cmdo 2 0 Opt E Cnst,que concordou cam a medida.

E mutton outran "outpacin g," ender-me-le encontrnr, nognindo enxn It-

nho in rociocinin a fazendo varier as hipStenesi

Mond., se cancln1 o esseneinl da quest:80 nilo A eneontrle,h/1.0frirlomenfr, to• 11710 restttnivia a vii., 1.1111•1..!. he

14/C04 10.0 lonorI 00 Tin i nnduu 0111 no :;100 1)00(0 e nu cumpr i n100, 0 do MOW

dnvor, nem traria mats matinfogilo a omparo As suns familia,. Criminal

*ante Iolanda, as culpados sZo cis Atrontis, qua on nssasetnaram, •

ants ninguem. E estes siio 'irresponsAvels pernnte nom, leis, dada a

amts condig.% ue nelvagens. on/pndon on renponnAveis indiretos

Jela trts I r ocorr,",nova scri p uma tnirefe quase irroalizAvet a nom gnat.

pier 'I.jett y, :wAtian, porinn el ,pre n tOdoa Os p ion, arras on Anil Orntip•dma mornrolormonle no per wise neer.qu• Fenno, • quo

w.01)

21 'iniciin do rnMpJn I

acne proftenidhl;1 ./

4 O. "70d, -rirlitm,a0 A.

10 emnreitriro Andrii

em et-mint/1 com os A-

nmhos, ono tendo Cel-

/

Page 75: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

f )('

plid e 1211-1 )7) I i r • I. •n I]) .1410, ?Mit c Ir Orengan "/

el p. l', 11 f r r r riI 11 , ..1.11 Id 110 .111111 ) prop

it.,00.

,,,do Of alloy',

muw, ti• (nLnrnhm d::,‘ (r.moldan d i llculdm4 r s onfron/adan prIns'

, lendon hon” . on , no comrimento da tuna suits

‘ d, " tem no t icia dent e Pais. Onoeficiamo-n on per

a Lieutnr rte ! . .,n tr Jalhu r c n nsidordran-lo frier Oncis irn d os exi-

a17' ,.ern of, n :± ales 'Id nuns., miss;o, pclo quo lhen momon infini

grAton, An m-uao tempo fl ue nna irmnnomns item rl o n, nu sea

nr pule pnrda islu n tee tre y conponheiros, confiaMom em que a-intel!

rIn, men4atoz e di:;nidode de .ens dirigentes nnibnm condozir ire

od i fl pe nn:" ( eis iHVr t im 4 c ;rs no mentido de npurar-se gnatr as erron

c .WIa9 In ! o • n rlimuMo o u de nerliranca Cometidos nn montosem p

am n;no do onife do alaloU,vfnando, eXCIMEIvaMentes evt“-los no fit-

m), p nur,n L , •m, VI Ill telo preCionos porn n consecurZo He sell,

nt,ren e v•mdd

sae on r r iwccimenton que o Conic/ G•t E Cnst

co de vor n n n cdo 1gnc;/o de prestnr 003 nossom pdtr/ciom, -m nome do

pow Sense, de .h 1 9ticn P dal lirriado.

Hannon-AM, em_LLde feverri ro de 1973

, a r'A Wit,/Gen 'Ida OCTAVIO FER n ZE1 PA 101Kly11L

Cunt do 20 Gpt E Cost

Confer. corn o original

Quarto! em Dennum-AM, em 19 de junho de 19

, (

NEP DE OLIVEIRA AQUINO - PEN CEL ENG DENA

CIIEFE DA 2 11 SECED DO 2‘ GPT E CNST

-1-6)C I SEATO PINT0 r7& STA

MANAUS, 4 DE MOV[MORO DE 1974

Ln .A. CILAERTO 'INTO F. COSTA

AO SO, SUOCOORDENADOR COAMA

Stan Suatoo ***** dem

Ao SUCEPIRMOs A ANPLIAC20 DA RETERVA IND;OEN4 SOLICITAI

NO REL A T6R10 S/N DATADO OE 27/10/73 f ENCAMINNADO A COATI* ATRAVES DO

ri:10 Ier of 07 OE ROVER/IRO DE 1973, VIMOS DAIS URA VC[ SOl/CI

TA

SEJA Am p LIAO0 COM A Pos n IvEL OnEvIDADE A REPERIDA AREA ENIIMENADAS

Nr, m PA •o t T O CON OS NUMEROS I, 2 E 3, SENDO QUE A DE Ng 3 mni D A SD °

ZATA PEELNTEmERTE EM SOAAEVOS NO AMINO OA FUNA1, QUATRO (4) i.e..' cAt

All EXISTrOrEr., TORNANDO-SE NEEESS:n10 A INTrA p ic - n nESSA 2Rml, ISTO

uE, COAST A cur aoonOS CArrIADOS POR DEPUTADOS FEDLR A IS C OUTGO. sEN

ER#11 CM $;0 1AULO ;PEAS DUE A novAVELNENTE ATINOINAM A AREA ONDE ES

TAO SITUADAS AS Q uA TRO (4) M A LOC A S NEA ENTEMENTE DESCOSERTAV.

CO A D IA L N ENTE A ,

Page 76: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

\ •

• ••••11

ITACÂO 5.00W • 00 INDIO-FUNA.olio As A nATAni• I <1AM A

KM do - :!B -CC OS M

WI - AM

rv. ) \‘4, I-

N" NI . (4..,‘,"n .rdt;• - ..-- -

-.0-- „Lay .......... -,:.- 4

I J.)l t

S t 1; • , 4#7

1 t...4- - --ec2 IA' Cy.

)4100,Lvermwm—q""-.,'

It-A4eirpt „ \

Po . ' CA SPVIII.VIM•

MAININI4u.r

, \- ". Xt.A •

tp*er"144,.4

1 ).

./ I "ria . -.••••

I t ""I . 10", 1

.r., 1),CA• h../ t

\ .•• ,,,•••••• ?4/' 4P•••• ',..

tath OtTu. • P I i I , t _g.,•,. t N+ L. -. _1— el.' • 1, (....5..4.... n A 1

f" •^`''' ,

'

t1^4 1 ! ,....,

't ws. ).n --po1Wtri.. ....... - it )

.5•.,rd

,,% • s•As.-...‘ n -... -...•

,t16.4(3.1.;..)

ergn...11\ V

1 f

OF. N u 155/74 Manaus, 06 de novembro de 19

bonhor Cooroenedor

anceminnamos em anexo memprando Al 20/74, onde o sertani

to HMO, encerregado de fronts de atraq.Zo

licit. I terdicio de areas habitados por indica WAIKIKI/3 e ATROLlatt.

Aa Irene solicited/is, sett.° sendo alvo de invesio, por p

mar- ca terran a madereiros•les proximidadee do ig. ETO. ANTONIO DO

BOKAA., ,C flegramos trebalhadores em desmatamento, pertencentes so a

preandinehto do ..el. Cialvoso, que se lie poeseiro daquela Iran. Alessi

ezi. s am construg go ume serraria, cajos pro p ...let:trios &Ando nio con

gu ,nn mine by, indica quo Si tram de prajeto aprovado

1. ., Oka.

Tent° o empreendimentc do Gel. Galvoso • da merrarla, es

1 otm de .1a 10 as de reserve c proximo portent° dam Taloa

Au. o Int represents grave prooleme e exits medides de u:geac

Jam aviter ideelvele desestr03

Alertamos sites Tara d fat° de qua, tomamos con'i.cimenuo

1,ravea do p-ApTIA, Cel. Gaivoso, qua o Deputed° Federal ABRUO ,Jazau,

teou tOc.0 a area incluindo se meioses doe Indi°11 • este promovendo

vend. ae.Aeles lotes a grtpos Ananceirom paulietee. Ohegamos a ver a

r are., totalmente koteaus.

For isec, urge quo aejaa tomadas semlidas de urgiincie ao•

den_ ... minister os invesor,9 e interditar • arca baited. pis' a

..114111116-aTBOAPIS, independents de reserve Jill existent*.

Page 77: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

no I NTE010,FUNDACAO NACIONAL DO INDIO •FUNAICremlimmllo Is Ammenfie — COAMACA-Coordaiglo • Muss- SUII-COAMA s

Rs oportunidads, apresentamos noes°n protestos

setts, • conaid•ragio.

r

Atinp1osement•

JOBA PORI DS CART

SUD-C DA COMA

u^n t PIO DO o nan o

COM ANDO MILITAR DA AMAZONIA

2° C2Urdil010 OE INThi:1111 UE C01;SildiC 0

Naanua-Ail, on 21 4-Ij zaveaLr_ Co Ir.:-

c: no 0 42-E2-CONP Do Gorandanto do 2a Gpt E C. ,t

Ao Co=aadonto to 62 B2'Cno2

Aoszntot Trabafl‘a

( doLLralna )

/

1. Em conaequeuzia da re=1 g0 reallzaCo no E2:1112 .20 Ca BR 174,

eutre este o ozao Cozanda, juntcconto can Ca Er)FRANCISE0 MONTI

ALVERNE 2/UES, Celegado Regional da Puna', no Eu- tado Co A=azonas

c SAUL CARVALRO LOPES, Diretor da DiviaLa A=azonla da

coAcadaranCo:

Azoatocicantoo booLCaa no roBiaa 20 Rio AL',

AO :frplantacao da La 174 ;0‘1:= aar

BR. COO IEDENADOR DA COMAco:c= cer realizadue obaaoccaCo 4L-

BRaLILIA - ,,„ocurar;a6

Bos=ato=nto Eanuzl, a 7,art_2

aCaa L :1Laa Cn COajlaTit0 CC= a

c

o quo 0.7;503 as Tarraa poorr_a_ .

to.

e, Data nanual. realize sand trahall

o q..3 26:20.; gropes potato, no cinimol15

a do Dearata“anto ;:antral raja aompro acocpanhaa:.)

or alcmorseao onpecializados da FUNAI;

doe dispouibilidados do ao,lam as darif-a /

tu-.:. ,,o rcompanhnOnn por winos ol,. _,J ocoociaLS_a:14_

42:44:,\S inatrzlcaos intensive-la pare quo todae as

s ca exa4paa quo rocebam visitno omielvoin doecc:no un do futuro (*toques es quo t •

a au nocozatiria3 codidac pars retrain on rotes=

- continua •

Page 78: Waimiri atroari-josé-porfírio a história que não foi contada

Os meus agradecimentos a

D. Candida Pastana de Carvalho,Claudio dos Santos Romero,Elisabeth Gameiro,Cello Horst,Carlos Moreira Neto,Paulo Campos Martins,Egydio Schwade,Ezequias Heringer, o Xara,Ana de Carvalho Lange,Estevao Rodrigues,Sebastião Amancio,

Que me ajudaram muito na realizacgo deste trabalho.

Coordenacão, Diagramack e ArteMILTON FURLAN

. - -ea Pt r,-.v 7'1)

Fl CC -

au t'arxon a ervpon - focuott a homhaa do

tapo - parch oruzentar clip indica, dovonn °noon artsfiCiO3 211:OtGOrliCOC carom utilimados cop pareic:_:_agpara qua

pcoduk:4-7:a ranultcdool

aoja octabolocida no Dostocamonto But Gesso Datalhao u=

po do 50;uranco, comande“:4 por ofIcioi, o p= aZotivo a crtj,..dooao ecdo o quo tonha entre /sutras, as eccaintoo

planojar o dar aocurango to turmaa de trabalho, cora prior&

dada para as turmna main doatacadon a frontal

planojar o dor socuronea nob doolocacanto0 cotorimadoc quo

on oftciaio a pargoatoa Chores do Car= gao obrigadoe a fazorom, por Corea do avian atribuictca;

e coca Crupo do ScEaramgc coja dcvlducento inatruids para, no

case do indlcioa do az:one:log utiliser todo0 on coioa do per

cuLI QSo passive-so, c& to yalceda do uco da forqc Loa canoe Ce

IcEitica dofcca praprla oa do outrer;

case Ecdo coloquo, do Juicing. hocoae a dispocieZo da .7CMIpara ancillor o trabalho Coo scrtanietna a quo, no futcreg

forncea ura totpicmcntag5o do ea/arlo ao pocsoat • Cant" 40rola c2NAItonac cc_lo tarmac° todo o Opole Coll.:Stade peace elm:a:leen ca',aslant:ado° da FCJAI, opolo ease 00 brincles, 2aanroc c2:1/2rr.ti t dal o tr 5 do P t 10 M tO- denc co, M3 or para c no . _Ca 0 0 OS 00 10 a :In olocamcntoo ncnoccarion;

. coca Crza'n, caco hnja vicltno dos inclloa, mattes poonozoo ezmnantracaoa do ("arca, coctrc=do con common oa efoitor; do t=n

rajnda do motralhodora, do granadoe dolma/man o da doserd.1g;:o polo uco do dint...zit°,cojea oo occmpamontoo protecIdon Com corona do Ctos do cco torpedo, o quo, entre a corms e a mats, haja uma arca

:;orrono limpo (door:unit:leo), oom no mtnimo Gm do laraura 'vonl'Io toe° o acampamonto,

;, outronnia quo, lien estabotecido ..oionamta--oco'.71 vista a pocificacno doe indica o a carte do FUNAI, a ca-q iota .cnc acilicitando codidoo qua precede's e acompanhom oe-trA)othosla2lcntatila da rodovia.

son Inda GENTIL NCGUZIRA PACEGet do 20 Gpt E Gnat