0 pontifÍcia universidade catÓlica do rio grande...
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PONTIFCIA UNIVERSIDADE CATLICA DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE FILOSOFIA E CINCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM HISTRIA
MESTRADO
JOS CARLOS VITACHI
A (IN)AO DO ESTADO:
DA GLEBA JORGE TEIXEIRA DE OLIVEIRA
AO NCLEO URBANO UNIO BANDEIRANTE
PORTO VELHO/RO - 1999/2014
Prof. Dr. Maria Cristina dos Santos
Orientadora
Porto Alegre
2015
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JOS CARLOS VITACHI
A (IN)AO DO ESTADO: DA GLEBA JORGE TEIXEIRA DE OLIVEIRA AO
NCLEO URBANO UNIO BANDEIRANTE PORTO VELHO/RO - 1999/2014
Dissertao apresentada como requisito para a
obteno do grau de Mestre pelo Programa de
Ps-graduao em Histria da FFCH da
Pontifcia Universidade Catlica do Rio
Grande do Sul.
Orientadora: Profa. Dra. Maria Cristina dos Santos
Porto Alegre
2015
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CATALOGAO NA FONTE
V835 Vitachi, Jos Carlos
A (In)ao do estado: da gleba Jorge Teixeira de
Oliveira ao ncleo urbano unio bandeirante Porto
Velho/RO - 1999/2014 / Jos Carlos Vitachi. Porto Alegre,
2015.
159 f. Diss. (Mestrado) Faculdade de Filosofia e Cincias Humanas,
Ps-Graduao em Histria. PUCRS.
Orientadora: Profa. Dra. Maria Cristina dos Santos.
1. Porto Velho (RO). 2. Movimento Dos Sem Terra Rondnia
(RO). 3. Conflitos - 1999-2014. 4. Unio Bandeirante. 5. Reforma
Agrria. 6. Assentamento (RO).
I. Santos, Maria Cristina dos. II. Ttulo.
CDD 333.1309816
Bibliotecria Responsvel
Ginamara de Oliveira Lima
CRB 10/1204
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JOS CARLOS VITACHI
A (IN)AO DO ESTADO: DA GLEBA JORGE TEIXEIRA DE OLIVEIRA AO
NCLEO URBANO UNIO BANDEIRANTE PORTO VELHO/RO - 1999/2014
Dissertao apresentada como requisito para a
obteno do grau de Mestre pelo Programa de
Ps-graduao em Histria da FFCH da
Pontifcia Universidade Catlica do Rio
Grande do Sul.
APROVADA em 13 de maro de 2015
BANCA EXAMINADORA
______________________________________________
Orientadora: Profa. Dra. Maria Cristina dos Santos (PUCRS)
______________________________________________
Prof. Dr. Luciano Aronne de Abreu (PUCRS)
__________________________________________
Prof. Dr. Ricardo Jacobsen Gloeckner (FADIR/PUCRS)
Porto Alegre
2015
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Dedico a minha esposa Milva, e a meus pais,
exemplos vida.
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AGRADECIMENTOS
A Deus;
E a todos que, de forma direta ou indireta, contriburam para a produo e
viabilizao desta dissertao.
Profa. Dra. Maria Cristina dos Santos, nossa Orientadora, por sua diligente ateno,
disposio, inestimvel ajuda e incondicional participao na pesquisa, a minha gratido e
respeito;
Ao Prof. Dr. Fbio Rycheki Hectheuer, Diretor Geral da Faculdade Catlica de
Rondnia por ter viabilizado a parceria MINTER/Pontifcia Universidade Catlica do Rio
Grande do Sul, possibilitando a realizao do Programa de Ps-Graduao em Histria, em
Rondnia;
Aos Professores da PUC/RS que se dignaram atravessar o Pas para ministrarem, na
Amaznia, seus ensinamentos e experincias de vida aos mestrandos; a nossa gratido;
Aos membros do Ministrio Pblico do Estado de Rondnia: Hverton Alves de
Aguiar, Rodney Pereira de Paula, Aidee Maria Moser Torquato, Luiz Marcos Valrio Tessila
de Melo e Miguel Mnico Neto, que contriburam com farto material de pesquisa e
informaes sobre a questo ambiental afeta ao Distrito Unio Bandeirante;
Aos amigos, Carlos Neves de Arajo, Aldino Brasil de Souza, Eliseu Shockness,
Luiz Cludio Fernandes, Saulo Roberto Faria do Nascimento, Maria do Socorro Belarmino da
Silva e Helena Zoraide Pelacani Almada, pela ajuda de sempre;
s fontes consultadas e as lideranas do Distrito Unio Bandeirante pela gentileza de
nos concederem entrevistas;
minha famlia, pelo apoio especialmente minha esposa e maior motivao;
sem ela e sem meus filhos, enteadas, netos e netas, no teria conseguido alcanar os meus
objetivos, por isso, perdoem-me pelas ausncias e convvio enquanto eu estava estudando e
trabalhando os materiais para a elaborao da dissertao;
A todos, meu muito obrigado.
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Onde o homem passou e deixou marca de sua
vida e inteligncia, a est a Histria (Fustel
de Coulanges)
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RESUMO
O objetivo desta pesquisa a reconstruo histrica do processo de ocupao e
colonizao da Gleba Jorge Teixeira de Oliveira e do surgimento do Ncleo Urbano Unio
Bandeirante, ocorrido no perodo de 1999-2014. Localizado na subzona 2.1 do Zoneamento
Socioeconmico e ecolgico, de ocupao restrita, no entorno da Resex Jaci-Paran, Flona
Bom Futuro e Terra Indgena Karipuna, no Municpio de Porto Velho/RO, a ocupao foi
realizada por migrantes dissidentes do Movimento MST/RO. A ocupao e a explorao da
terra deram causa a expressivo passivo ambiental em razo do desflorestamento e outros
ilcitos, interferindo o Ministrio Pblico, visando a desocupao da Gleba, com proibio de
assentamento e/ou regularizao fundiria e execuo de servios de infraestrutura pblica, na
regio. A impactante medida causou inmeros conflitos socioambientais, intervindo
movimentos sociais rurais, comunidades, igrejas, polticos, Estado e, tambm, o Ministrio
Pblico da Infncia e Juventude, em favor da populao atingida pela medida judicial. O
estudo vincula-se histria do tempo presente e metodologia da histria oral, levantamento
bibliogrfico e documental, (analgico, digital, cartogrfico) e pesquisa de dados primrios
em campo e rgos pblicos e privados, os quais permitiram concluir que a ocupao, e no
invaso da Gleba ocorreu de forma espontnea e incentivada pelo INCRA, com apoio
material e logstico. O dano ambiental, com ofensas ao ZSEE do Estado, deve-se
morosidade da reforma agrria, ineficiente fiscalizao do processo de ordenamento da
estrutura fundiria e de proteo s Unidades de Conservao, aliado aos resultados
econmicos da explorao extrativista e agropastoril de terra produtiva e dos madeireiros e
latifundirios com interesse na regio. A ocupao irreversvel. Est consolidada. Ela foi
inicialmente impulsionada pelo Estado, porm no promoveu a reforma agrria que
prometera.
Palavras-Chaves: Rondnia. Unio Bandeirante. Conflitos. 1999-2014
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ABSTRACT
The goal is the historical reconstruction of the occupation and colonization process
of the Jorge Teixeira de Oliveira Glebe and the emergence of the Unio Bandeirante Urban
core occurred in the 1999-2014 period. Located in the subzone 2.1 of socioeconomic and
ecological zoning of restricted occupation, surrounding the Jaci-Paran Resex, Flona Bom
Futuro and Karipuna Indigenous Land in the city of Porto Velho / RO, the occupation was
carried out by MST Movement / RO dissident migrants. The occupation and exploitation of
the land have brought significant environmental liabilities due to deforestation and other
illegal initiatives, interfering the State Public Prosecution Service seeking the vacating of the
Glebe, with prohibition of settlement and / or land regulation and execution of public
infrastructure services in the region. The shocking decisions caused numerous environmental
conflicts, intervening rural social movements, communities, churches, politicians, State and
also the Children and Youth Public Prosecution Service in order to support the population
affected by Judges decisions. The study is linked to the history of the present time and the
methodology of oral history, literature and documentary (analog, digital, cartographic) and
primary data collection in the field and in public and private agencies, which showed that the
occupation, not invasion of the Glebe, occurred spontaneously and encouraged by INCRA,
with material and logistical support. Environmental damage, with offenses to the state ZSEE,
due to the slow pace of land reform, ineffective oversight of the land structure planning
process and protection of conservation Unit lands, together with the economic results of
extraction and agropastoral exploitation of productive land and loggers and landowners with
interests in the region. The occupation is irreversible. It is consolidated. It was initially driven
by the State which did not promote the land reform which had had been promised.
Key Words: Rondnia. Bandeirante Union. Conflicts. 1999-2014
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LISTA DE ILUSTRAES
Figura 1 - Mapa de Localizao da Regio de Estudo ............................................... p.138
Figura 2 - Fundao da UTS Brasil (1988) ............................................................... p.139
Figura 3 - Primeiro Acampamento (Fazenda Dispar 1999) .................................... p.139
Figura 4 - 1 Acampamento Rio Periquito: o comeo de tudo ................................... p.140
Figura 5 - Croqui Gleba Jorge Teixeira de Oliveira ................................................... p.140
Figura 6 - Medidas Iniciais da Topografia (25/06/2000) ........................................... p.141
Figura 7 - Cadernetas de Campo ................................................................................ p.141
Figura 8 - Casa de Apoio - Porto Velho ..................................................................... p.141
Figura 9 - Fundao ASCOAGRO (2000) .............................................................. p.142
Figura 10 - Acampamento dos colonos (2000) ......................................................... p.142
Figura 11 - Traado Original do Ncleo Urbano Unio Bandeirante ........................ p.143
Figura 11A - Mapa atual do Ncleo Urbano Unio Bandeirante ............................... p.143
Figura 12 - Vila Unio Bandeirante (2001) ................................................................ p.144
Figura 13 - 1 Posto de Gasolina (2001) .................................................................... p. 144
Figura 14 - Construo Rodoviria (2001) ................................................................. p.144
Figura 14A Audincia Pblica: Situao Fundiria do Distrito Unio Bandeirante
(14/10/2004) ............................................................................................................... p.144
Figura 15 - rea de Abrangncia da Medida Liminar................................................ p.145
Figura 16 - Carta Imagem do Permetro Urbano de Unio Bandeirante .................... p.146
Figura 17 - Usina Termeltrica Unio Bandeirante.................................................... p.147
Figura 18 - Carta Imagem da Gleba Jorge Teixeira de Oliveira: Linhas 4 e F .......... p.147
Figura 19 - Primeiras Construes de Unio Bandeirante ......................................... p.148
Figura 20 - rea Urbana do Distrito Unio Bandeirante (Dez.2014) ....................... p.148
Figura 21 - rea Urbana do Distrito Unio Bandeirante (Dez.2014) ....................... p.149
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LISTA DE SIGLAS
APRO Associao dos Proprietrios Rurais de Rondnia.
ASCOAGRO Associao Comunitria dos Pequenos e Micros Produtores Rurais Unio
Bandeirante.
CIDH Comisso Interamericana de Direitos Humanos.
CPT Comisso Pastoral da Terra.
CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente.
ECA Estatuto da Criana e Adolescente.
EFMM Estrada de Ferro Madeira-Mamor.
FAO Organizao das Naes Unidas para Alimentao e Agricultura.
FIERO Federao das Indstrias do Estado de Rondnia.
FRUM de ONGS Frum das Organizaes No Governamentais que atuam no Estado de
Rondnia.
FUNAI Fundao Nacional do ndio.
FUNASA Fundao Nacional da Sade.
GJTO Gleba Jorge Teixeira de Oliveira.
IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis.
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica.
IBRA Instituto Brasileiro de Reforma Agrria.
INCRA Instituto Nacional de Colonizao e Reforma Agrria.
INDA Instituto Nacional de Desenvolvimento Agrrio.
MDA Ministrio de Desenvolvimento Agrrio.
MST Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra.
MAST/RO Movimento dos Agricultores Sem Terra de Rondnia.
MTST Movimento dos Trabalhadores Sem Terra.
OSR Organizao dos Seringueiros de Rondnia.
PCR Partido Comunista Revolucionrio.
PICS Projetos Integrados de Colonizao.
PLANAFLORO Plano Agropecurio Florestal de Rondnia.
RO Rondnia.
SEDAM Secretaria de Estado do Desenvolvimento Ambiental de Rondnia.
SEMTA Servio Especial de Mobilizao de Trabalhadores para a Amaznia.
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SIPAM Sistema de Proteo da Amaznia.
TAC Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta.
UCs Unidades de Conservao.
UTS Brasil Unio dos Trabalhadores Sem Terra do Brasil.
ZSEE Zoneamento Socioeconmico Ecolgico do Estado de Rondnia.
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SUMRIO
INTRODUO ............................................................................................................. 15
CAPTULO 1. A FORMAO DA GLEBA JORGE TEIXEIRA DE OLIVEIRA E A
AO DOS MIGRANTES NA COLONIZAO DO NCLEO UNIO
BANDEIRANTE ........................................................................................................... 27
1.1 FAZENDA URUP ............................................................................................ 33
1.2 INSPEO DA GLEBA: MOVIMENTO MST .................................................. 37
1.3 OCUPAO DA GLEBA PELO GRUPO DISSIDENTE DO MOVIMENTO
MST 40
1.4 O PRIMEIRO ACAMPAMENTO: RIO PERIQUITO ......................................... 43
1.5 PROJETO DO LOTEAMENTO RURAL E SERVIOS TOPOGRFICOS ........ 46
1.6 ASCOAGRO E CASA DE APOIO ...................................................................... 49
1.7 NCLEO URBANO: FORMAO INICIAL ..................................................... 51
CAPTULO 2. AO DO ESTADO PARA A FORMAO E OCUPAO DA
GLEBA: CONFLITOS SCIOAMBIENTAIS ........................................................... 60
2.1 OS CONFLITOS ................................................................................................. 61
2.2 CPI DOS CONFLITOS FUNDIRIOS: BURITIS, NOVA MAMOR E PORTO
VELHO (RO) ................................................................................................................. 63
2.3 AUDINCIA PBLICA: SITUAO FUNDIRIA DO DISTRITO ................. 73
2.4 A PRIMEIRA AO INTERVENTIVA DO ESTADO: JUSTIA FEDERAL,
SEO JUDICIRIA DE RONDNIA. 5 VARA FEDERAL AMBIENTAL E
AGRARIA ...................................................................................................................... 76
CAPTULO 3. O ESTADO VERSUS OCUPANTES DA GLEBA .............................. 85
3.1 ZONEAMENTO SOCIOECONMICO E ECOLGICO .................................... 85
3.2 RESULTADOS DA APROXIMAO DO ESTADO GLEBA ....................... 88
3.3 A DIMINUTA AO DO ESTADO EM OBRAS DE INFRAESTRUTURA E
DE SERVIOS PBLICOS ........................................................................................... 91
3.3.1 Educao ........................................................................................................... 91
3.3.2 Sade ................................................................................................................. 92
3.3.3 Infraestrutura. Economia. Segurana ................................................................. 93
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3.4 A AUSNCIA DO ESTADO: REGISTROS DE VIOLNCIA ............................ 94
3.5 O ESTADO VAI AO DISTRITO ......................................................................... 97
3.6 A SEGUNDA AO INTERVENTIVA DO ESTADO: JUSTIA ESTADUAL.
2 JUIZADO DA INFNCIA E DA JUVENTUDE ...................................................... 100
3.7 A AO DOS MOVIMENTOS SOCIAIS ........................................................ 103
3.8 A EXECUO DO TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA ................ 107
3.9 PIE - PRODUTOR INDEPENDENTE DE ENERGIA ELTRICA ................... 108
3.10 O INCRA EFETUA LEVANTAMENTO FUNDIRIO DA GLEBA ................ 109
3.10.1 Ao Antrpica: desflorestamento ...................................................................... 111
3.10.2 Explorao Agropecuria e Extrativa ................................................................. 112
3.10.3 Investimentos ..................................................................................................... 113
3.11 SEDE DO DISTRITO UNIO BANDEIRANTE .............................................. 113
CONSIDERAES FINAIS. ..................................................................................... 118
REFERNCIAS .......................................................................................................... 122
ANEXOS ..................................................................................................................... 129
ANEXO I - MATRCULA GLEBA JORGE TEIXEIRA DE OLIVEIRA ..................... 129
ANEXO II - OFCIO INCRA T/N 139/2000 ............................................................... 130
ANEXO III - CARTA/SR/17/RO/R-1/N 60/2000 ........................................................ 133
ANEXO IV - RECIBO PAGAMENTO PREPROJETO ................................................ 134
ANEXO V - CARTA DE INTENO E COMPROMISSO ......................................... 135
ANEXO VI - DECLARAO DO SR. CONTI NETO. 15.08.2012 ............................. 136
APNDICES ............................................................................................................... 150
APNDICE I - LEVANTAMENTO FUNDIRIO DA GLEBA JORGE TEIXEIRA DE
OLIVEIRA ................................................................................................................... 150
APNDICE II - DIMENSO DAS PARCELAS RURAIS ........................................... 151
APNDICE III - ORIGEM DOS POSSEIROS: ESTADO DE RONDNIA ................ 151
APNDICE IV - IDADE DOS RESIDENTES NA OCUPAO ................................. 152
APNDICE V - AO ANTRPICA: DESFLORESTAMENTO ............................... 152
APNDICE VI - EXPLORAO AGROPECURIA E EXTRATIVA ....................... 152
APNDICE VII - INVESTIMENTOS LINHAS 4 E F ............................................... 153
APNDICE VIII - TELA DE CADASTRAMENTO .................................................... 155
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APNDICE IX - FICHA DE CADASTRAMENTO ..................................................... 156
APNDICE X - IDENTIFICAO DO OCUPANTE E DO IMVEL ........................ 158
APNDICE XI - TERMO DE CESSO DE USO DE DIREITOS DE DEPOIMENTO
ORAL E DE CONTEDO IMAGTICO ..................................................................... 159
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INTRODUO
O tema escolhido fruto da nossa atuao como membro do Ministrio Pblico do
Estado de Rondnia e a de docncia na Faculdade Catlica de Rondnia. O estudo atende
igualmente aos objetivos iniciais formulados no projeto de pesquisa, que so a reconstruo
histrica do processo de ocupao e colonizao da Gleba Jorge Teixeira de Oliveira GJTO,
do surgimento do Ncleo Unio Bandeirante e descrever as aes dos migrantes que foram
desbravar a rea visando garantir a posse de lote de terra e explor-lo junto com a sua famlia.
O modelo de colonizao adotado pelos migrante-posseiros para cultivar a Gleba e
abrir o pequeno Ncleo Urbano de apoio no foi diferente do idealizado pelo INCRA, nas
dcadas de 70, 80, e 90, nos projetos oficiais de assentamentos e/ou de regularizao de terras
na Amaznia, exceto no que se refere a investimentos e em infraestrutura governamental que,
ali, foi nenhum.
A GJTO em estudo foi arrecadada pelo INCRA de terras devolutas da Unio em
1999, visando atender a projetos de reforma agrria. Ela se situa em regio
predominantemente coberta de mata primria, protegida pela legislao ambiental, com
proibio do corte raso de madeira.
A Gleba foi ocupada em quase toda a sua extenso territorial a partir de dezembro de
1999, por migrantes oriundos dos Municpios de Jaru, Ouro Preto do Oeste, Mirante da Serra,
Urup, Corumbiara, Rio Crespo, Ariquemes (RO), e outros das diversas unidades da
federao.
Em Unio Bandeirante, a reforma agrria foi feita, de fato, no pelo INCRA, mas
pelos prprios migrantes, agricultores, com recursos prprios. Foi assim que eles
conquistaram e demarcaram suas posses sem nenhuma ajuda ou orientao oficial do rgo
encarregado da reforma agrria. Tudo foi feito por eles mesmos, em busca da terra prometida.
Com o estudo examinam-se os diferentes interesses em conflitos entre os
protagonistas: o Estado e os ocupantes da Gleba, em sua maioria, colonos, posseiros1 e
camponeses sem-terra. Buscam-se as razes da divergncia e desinteligncia entre os atores
1 Aquele agricultor que trabalha com sua famlia numa determinada rea, como se fosse sua, mas no possui
ttulo de propriedade da terra. Na maioria das vezes a terra do Estado ou, tambm, sem que ele saiba, de um
proprietrio qualquer. A maior parte dessa categoria encontra-se na regio Norte do Pas, nas reas de fronteira
agrcola. (MORISSAWA, 2001, p. 250).
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sociais e o seu enfrentamento, com apoio e intensa movimentao e articulao dos
movimentos sociais, MST, Liga Operria, igrejas, partidos polticos, sindicatos e associaes
de produtores rurais, dentre outros.
Descreve-se, igualmente, a relao conflituosa entre os ocupantes da rea
conflagrada e o Estado, impedido judicialmente de atender a populao residente na rea em
conflito, com obras de infraestrutura e de acesso aos servios pblicos e privados,
indispensveis e necessrios vida em comunidade.
Analisam-se de forma focada a legislao agrria, fundiria e ambiental e o seu
enfrentamento, pelo Estado, proibindo ao INCRA a formulao de projetos de assentamento
e/ou regularizao fundiria, reconhecimento de posses e entrega de ttulos definitivos de
lotes aos seus ocupantes; o litgio fundirio ainda no teve soluo.
So atores protagonistas dos conflitos; de um lado, o homem, a populao indgena,
o campons, o posseiro, o trabalhador rural sem terra e tambm o empresrio do setor
madeireiro, comerciantes e outros profissionais estabelecidos no Ncleo Unio Bandeirante e
adjacncias, enfim, o capital e a economia privada. Do outro, tm-se a Unio, com seus
rgos e agentes: INCRA, IBAMA, FUNAI; o Estado de Rondnia e os Municpios de Porto
Velho, Buritis e Nova Mamor. Tambm so protagonistas do processo o Ministrio Pblico,
propositor de duas aes judiciais, com objetivos diametralmente opostos, como que em
conflito de interesses; uma em defesa do meio ambiente e seus fins, como definido no art. 3
da Lei n 6.938/81, dispondo sobre a Poltica Nacional do Meio Ambiente, (BRASIL, 1981)2,
inclusive propondo o despejo da rea, pela sua tica, invadida; na outra ao temos o mesmo
Ministrio Pblico estadual, batendo-se pela permanncia da populao em Unio
Bandeirante e pelos interesses coletivos afetos infncia e juventude, fundamentado no
2 Art. 3 - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
I - meio ambiente, o conjunto de condies, leis, influncias e interaes de ordem fsica, qumica e biolgica,
que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas;
II - degradao da qualidade ambiental, a alterao adversa das caractersticas do meio ambiente;
III - poluio, a degradao da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente:
a) prejudiquem a sade, a segurana e o bem-estar da populao;
b) criem condies adversas s atividades sociais e econmicas;
c) afetem desfavoravelmente a biota;
d) afetem as condies estticas ou sanitrias do meio ambiente;
e) lancem matrias ou energia em desacordo com os padres ambientais estabelecidos;
IV - poluidor, a pessoa fsica ou jurdica, de direito pblico ou privado, responsvel, direta ou indiretamente, por
atividade causadora de degradao ambiental;
V - recursos ambientais: a atmosfera, as guas interiores, superficiais e subterrneas, os esturios, o mar
territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora. (Redao dada pela Lei n 7.804, de
1989)
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7804.htm#art1iihttp://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7804.htm#art1ii
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Estatuto da Criana e do Adolescente (ECA)3 e no art. 227 da Magna Carta, visando assegurar
criana e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito vida, sade, alimentao,
educao, como que desafiando a equao do art. 225 da Magna Carta direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras geraes.
A regio do estudo (Cf. Figura 1) abrange o Estado de Rondnia, e, em particular, o
Municpio de Porto Velho, a GJTO e o Distrito Unio Bandeirante criado pela Lei municipal
n 1535/2003, faltando apenas a sua instalao.
O Estado de Rondnia foi criado pela Lei Complementar n 41, de 22 de dezembro
de 1981 e instalado em 4 de janeiro de 1982, com a transformao do Territrio Federal de
Rondnia, em Estado4.
Porto Velho foi criado por volta de 1907, durante a construo da Estrada de Ferro
Madeira Mamor. Ele foi elevado categoria de vila e municpio pela Lei Estadual n 757, de
02 de Outubro de 1914 e desmembrado da Vila de Humait (AM) constitudo do distrito sede.
Foi instalado em 24 de janeiro de 1915. A extenso territorial do municpio de 34.096,388
km, com populao estimada em 2013 de 484.992 habitantes. A densidade demogrfica do
municpio de 12,57 hab./km. (IBGE, 2014)5.
O Municpio constitui-se de 13 Distritos, a saber: (sede) Porto Velho, Abun,
Calama, Demarcao, Extrema, Fortaleza do Abun, Jaci-Paran, Mutum Paran, Nazar,
Nova Califrnia, So Carlos, Vista Alegre do Abun e o ltimo, Unio Bandeirante, ainda no
instalado, objeto do nosso estudo.
O Distrito de Unio Bandeirante, distante cerca de 160 km da capital do Estado, est
encravado na Gleba Jorge Teixeira de Oliveira, com uma rea de 104.653,2258, na Zona 2.
Subzona 2.1 do Zoneamento Socioeconmico Ecolgico de Rondnia ZSEE, instrumento
tcnico e poltico de planejamento e de orientao do espao e polticas pblicas, aprovado
pela Lei Complementar n 233, de 6 de junho de 2000, (RONDONIA, 2000).
O Ncleo Urbano Unio Bandeirante surgiu por volta de 2001, para abrigar
3 Lei n 8069/1990.
4 Com uma rea de 237.590,547 km, pertence Regio Norte do Brasil, (Noroeste da Amaznia Ocidental) e
tem como limites o Estado do Amazonas (Norte e Nordeste), Mato Grosso (Leste e Sudeste), Acre (Noroeste) e a
Repblica da Bolvia no (Sudeste e Oeste), entre os paralelos 758 e 1343 de Latitude Sul e os meridianos
5950 e 6648 de Longitude Oeste de Greenwich. Sua populao estimada em 2013 de 1.728.214 milhes e a
densidade demogrfica de 6,58 hab./km, contando com 52 municpios. A sua economia baseada,
fundamentalmente na agricultura e pecuria, com destaque para a borracha, caf, cacau, arroz, feijo, mandioca,
milho e no extrativismo vegetal (madeira, seringa, castanha) e de minrios, (estanho e ouro). (IBGE, 2014).
5http://cidades.ibge.gov.br/painel/historico.php?lang=&codmun=110020&search=rondonia|porto-
velho|infograficos:-historico, acesso em 27/04/2014.
http://cidades.ibge.gov.br/painel/historico.php?lang=&codmun=110020&search=rondonia|porto-velho|infograficos:-historicohttp://cidades.ibge.gov.br/painel/historico.php?lang=&codmun=110020&search=rondonia|porto-velho|infograficos:-historico
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posseiros, familiares e moradores da GJTO, comrcio, servios, serrarias, escola, sade, etc.
no lado Leste da GJTO, logo depois da transposio do Rio So Francisco, em regio
circunvizinha da rea de entorno6 das Unidades de Conservao Reserva Extrativista Jaci-
Paran7, Floresta Nacional Bom Futuro8 e Terra Indgena Karipuna9, protegidas e reguladas
pelo referido ZSEE.
O recorte temporal compreende o segundo semestre de 1999 at dezembro de 2014.
Inicia-se com o oferecimento da GJTO aos camponeses sem-terra ligados ao MST, invasores
da Fazenda Urup, em Mirante da Serra (RO), como alternativa administrativa negociada,
visando impedir o despejo judicial em vias de acontecer. Findo o recorte histrico em 2014
com a prolao das sentenas de mrito do 1 grau de jurisdio da Justia Federal e Estadual
de Rondnia, ainda pendentes de recurso (BRASIL, Justia Federal, 2004; RONDNIA,
Tribunal de Justia, 2004).
Designada uma Comisso de Vistoria indicada pelos acampados na fazenda, ela foi
levada pelo INCRA a conhecer e avaliar as potencialidades da GJTO, terra prometida como
um Projeto de Assentamento Agroambiental, em princpio, para 1000 famlias. O MST no
aceitou a rea.
Com a recusa, lideranas de outros acampamentos do interior do Estado, dissidentes
do MST regional de Rondnia, igualmente apoiadas pelo INCRA visitaram, aps, a mesma
gleba, levando na caravana outros pretendentes interessados e arranchados embaixo de
lonas, esperando ser assentados pela autarquia federal encarregada da reforma agrria.
O estudo perpassa pela contratao dos servios e feitura de projetos e de mapas
destinados topografia e a imposio de limites geogrficos e de demarcao das parcelas
rurais e das datas10 urbana, tudo organizado, gerido e contratado pelos sem-terra, com
recursos financeiros arrecadados entre os prprios pretendentes interessados na ocupao da
Gleba.
A pesquisa abrange o perodo de apossamento e de abertura dos lotes rurais, com
6 rea de entorno ou rea de abrangncia, consistente num raio de 10 quilmetros a partir dos limites da Floresta
Nacional do Bom Futuro, Parque Guajar-Mirim, Reserva Extrativista Jaci-Paran e rea indgena Karipuna. 7 Resex Jaci-Paran instituda pelo Decreto n 7335, de 17 de janeiro de 1996, do Estado de Rondnia. 8 Flona Bom Futuro, Unidade de Conservao de uso sustentvel, criada pelo Decreto Federal n 96.188/1988,
com rea total estimada em 280 mil hectares, reduzida para 97.357 hectares pela Lei n 12.249/2010. 9 Terra Indgena Karipuna com rea demarcada de 152.930 hectares, homologada pelo Decreto sem nmero de 9
de setembro de 1988. 10Terreno retangular de 20 m a 22 m por 40 m a 44 m. Regionalismo: Minas Gerais, So Paulo, Paran.
(HOUAISS, 2009, p. 596).
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desmatamento, extrao e explorao da mata primria, agresses ambientais, etc. na GJTO e
regio, culminando com a propositura em 2004 de aes judiciais pelo Ministrio Pblico
Federal e Estadual, (BRASIL, Justia Federal, 2004, p. 12; RONDONIA, Tribunal de Justia,
2004).
Compreende o perodo das aes civis pblicas e das liminares judiciais (2004)
que transformou por completo a vida da populao de Unio Bandeirante estimada, em 2004,
em 8 mil habitantes. Pontua a celebrao do Termo de Ajustamento de Conduta TAC, na
Justia Federal, em 2006, entre os atores envolvidos no conflito, com a imposio de
obrigaes de fazer e de no fazer ao Estado e ao municpio de Porto Velho, dentre elas a de,
agora, levarem melhoramentos pblicos ao povoado.
Sob o ponto de vista terico, metodolgico e epistemolgico da historiografia, esse
estudo vincula-se histria do tempo presente e metodologia da histria oral. A histria do
presente no somente o estudo do passado, ela tambm pode ser, com um menor recuo e
mtodos particulares, o estudo do presente (CHAUVEAU e TTART, 1999, p. 15).
Assim situado, v-se que o interesse pelo estudo do tempo presente vem de longa
data, pelo menos do sculo passado, at que se reunissem obras, mtodos, seminrios e
pesquisadores dessa possvel histria no sentido de estrutur-la, academicamente
(MEDEIROS, 2002).
A histria do tempo presente liga-se diretamente ao ofcio do historiador que trabalha
com a memria viva dos seus contemporneos, com a oralidade, documentos, etc., em um
recorte temporal muito prximo de si mesmo, podendo ser o pesquisador, na maioria das
vezes, tambm ator e testemunha do prprio acontecimento. a presena fsica do historiador
no prprio objeto, no seu tema e no seu tempo. H, nesse caso, uma relao estreita, direta,
entre o tempo do historiador com o objeto do seu estudo (FERREIRA, 2000).
O domnio do fazer da histria do tempo presente foi instrumentalizado e
institucionalizado com a criao, nos idos de 1978, do IHTP - Instituto d!Histoire du Temps
Prsent, sendo seu fundador e diretor, at 1990, Franois Bedarida, substitudo, na sequncia,
pelo Historiador Robert Frank, que permaneceu na direo da instituio at 1994, vindo,
aps, Henry Rousso, tendo a partir da granjeado respeitabilidade, aceitabilidade e
considerao entre muitos dos acadmicos da historiografia, principalmente na Frana
(MEDEIROS, 2002).
At a dcada de 1930, histria e tempo presente eram antinmicos, opostos. Depois
disso, delimitou-se o seu campo, acima, pela histria muito imediata e, abaixo, pela
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sobrevivncia de testemunhas, qualificando-a, ento, como histria das testemunhas, como
leciona Philippe (BRAUNSTEIN, 1993, p. 736).
J no h mais hoje para a historiografia maior restrio aos testemunhos, nem
oralidade, abrindo-se a possibilidade de o historiador trabalhar os acontecimentos
contemporneos, ou seja, aquilo que puderam viver e presenciar no seu tempo e na
investigao do tema, ou seja, na pesquisa metodolgica da histria, porm voltada para o
presente. A histria do tempo presente trabalha em profuso com pessoas vivas, com a
oralidade, com a memria e com as questes do tempo que se vivencia, sua
contemporaneidade mesmo, no ficando preso unicamente ao passado.
O tempo presente no se pensa como tempo marcado, fixo, delimitado, como
comumente se refere a historiografia, ou seja: histria antiga, moderna, contempornea,
histria nova, etc.
Tempo presente no o imediato. No. Muito menos se refere a um tempo fixo,
estanque. O tempo presente pressupe, sempre, um recuo, mas no recuo de longa, mdia ou
curta durao. O recuo pode ser o de hoje para o ontem; de hoje para antes de ontem, ou de
trinta, quarenta, cinquenta anos atrs, ou de uma gerao, por exemplo.
Falar de tempo presente falar de algo recente, de fonte viva, pelo emprego da
metodologia do uso da oralidade, dos relatos, da entrevista, da memria, das fontes
documentais oficiais ou no ainda disponveis de serem consultadas, checadas, fidedignas,
tendo por finalidade recompor um passado ainda recente, um acontecimento histrico,
contemporneo ao historiador, bem prximo de si e/ou de sua gerao.
A histria do tempo presente convive perfeitamente com as fontes produzidas pelos
jornais, imprensa falada, televisada, filmes, fotografia, mdia eletrnica, as mais variadas,
como complementares ou principais s fontes orais, at para confront-las. regra da
historiografia que o pesquisador no pode descurar-se do dever de examinar o seu objeto,
tanto quanto possvel com iseno suficiente para no comprometer ou contaminar as suas
fontes com interesses pessoais e no comprometer a pesquisa.
Quanto ao objeto da pesquisa - reconstruo histrica do processo de ocupao e
colonizao da GJTO e do surgimento do Distrito Unio Bandeirante - por ser um
acontecimento recente, v-se como pertinente a utilizao e emprego das fontes orais,
consorciadas com a documental, extradas dos processos judiciais e de suas falas, tudo
confrontado com as fontes provenientes dos rgos e atores envolvidos no objeto, como
Ministrio Pblico, Judicirio, rgos pblicos e privados, campons, trabalhador rural,
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invasores, posseiros, numa relao direta com o pesquisador, no seu tempo e no objeto
estudado, vale dizer, no tempo presente.
Tempo presente, repita-se, o que se refere s fontes orais, aos testemunhos vivos na
histria presente. Sintetizando: o tempo que ainda estamos vivendo, o momento mesmo, o
acontecimento, o fato, suas consequncias, enfim, o objeto de estudo que se quer narrar,
compreender, estudar.
A questo dos testemunhos diretos dos fatos recentes est presente na Histria desde
a antiguidade clssica. Segundo Ferreira (2000, p.1) o trabalho do historiador era expor os
fatos recentes atestados por testemunhos diretos [...] e as testemunhas oculares eram fontes
privilegiadas para a pesquisa. O uso das fontes orais, da memria, era o mais utilizado, at
pela exiguidade de registros escritos e de acervo bibliogrfico e de documentos destinados
pesquisa.
A histria no estanque, muito ao contrrio, ela dinmica, est em constante
mudana, como a metodologia e os seus cnones. Assim que, em meados do sculo XIX, o
testemunho direto, to valorizado na antiguidade, passou a ser desqualificado pelos
profissionais da historiografia contempornea por entenderem que competia histria [...] a
interpretao do passado e que s os indivduos possuidores de uma formao especializada
poderiam executar corretamente essa tarefa, para voltar a ser valorizado neste sculo pelos
historiadores que defendem a validade do estudo do tempo presente (FERREIRA, 2000).
Sobre isso, e de forma anloga, antigamente, quando reinavam os mestres da escola
positivista, a nica histria era a do passado, um passado cortado epistemologicamente do
presente, que, ele prprio, pertencia ao rumor pblico, ao jornalismo, a qualquer coisa
(BRAUSTEIN, 1993, p. 736).
O historiador do tempo presente, na lio da historiadora Marieta de Moraes Ferreira
(2000) lida com a memria viva dos seus contemporneos, razo pela qual ele est exposto a
uma presso social e poltica inegvel.
Est aqui o cuidado que o historiador/pesquisador deve ter para manter o rigor
cientfico de seu trabalho, fundado no testemunho direto, espanando para os lados toda e
qualquer influncia malfica que possa comprometer a sua independncia funcional de
pesquisador e historiador e iseno na interpretao dos fatos acontecidos.
Tarefa extremamente difcil, a do historiador do tempo presente, em se manter na
imparcialidade, isento de paixes e de desapego com seus posicionamentos polticos a
respeito do tema trabalhado que, por vezes, prtica de sua prpria vivncia e do seu
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cotidiano, como no nosso caso, referindo-me ao surgimento do Distrito Unio Bandeirante.
Justifica-se o emprego como fonte a Histria Oral que permite o registro de relatos,
de entrevistas, de testemunhos, possibilitando acesso a histrias dentro da histria,
ampliando, dessa forma, as possibilidades de interpretao do passado pelo que se beneficia
de ferramentas tericas de diferentes disciplinas das Cincias Humanas, como a Antropologia,
a Histria, a Literatura, a Sociologia e a Psicologia, dentre outras, de forma interdisciplinar.
Faz um trabalho transdiciplinar (ALBERTI, 2011, p. 155).
No se pretende apresentar, aqui, apenas, a transcrio nua e crua da entrevista, do
relato, para no cairmos no equvoco de que a entrevista publicada j Histria, e no
apenas uma fonte que, como todas as fontes, necessitam de interpretao e anlise, como diz
Alberti (p. 158).
Pensou-se registrar, pelas entrevistas, histrias de vidas, contribuies e
conhecimentos daqueles que foram colonizar a GJTO e o Ncleo Unio Bandeirante. A
anlise e interpretao da entrevista fundamentam-se nos textos de Nncia Santoro de
Constantino, e de Pollak (1992), com nfase em memrias e identidades em uma sociedade.
E, como ensina Nncia Constantino, aludindo Aris, na distino entre memrias e
testemunho:
So registros de observaes diretas sobre a vida privada e sobre a vida
pblica, mas nunca sobre a relao entre a vida privada e a pblica. O
testemunho no apenas o relato de um espectador ou a informao de um
ator, relato que se prope a ser exato, completo, objetivo, ainda que o
testemunho possa ser tudo isso. S um testemunho quando se apresenta
como um caso particular, exemplar na sua extrema particularidade. Digamos
que o testemunho , simultaneamente, uma existncia pessoal intimamente
ligada histria e um momento da Histria apreendido em sua relao com
uma existncia particular (CONSTANTINO, 2001 p. 12).
Com esse desiderato, o projeto de pesquisa considerou a possibilidade de valer-se das
fontes histricas, escritas e tambm recolher relatos e/ou excertos de entrevistas, da oralidade,
que dizem respeito ao surgimento do povoado, como, no caso, as entrevistas de tcnicos
responsveis pelos processos de colonizao oficial e de reforma agrria em Rondnia.
Tambm foram entrevistados proprietrios, posseiros e ocupantes da GJTO sobre questes
relacionadas com a migrao, colonizao, movimentos sociais, memrias e testemunhos,
sobretudo a memria individual.
Sobre a utilizao das falas e da memria, calha ao estudo os ditos de Constantino
(2013, p. 24) Decididamente so as pessoas que constroem sua prpria histria e podem
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muito bem construir uma narrativa desta histria.
Bem explica a importncia, as vantagens e o emprego da Histria Oral, na
reconstruo do conhecimento histrico sobre uma instituio, comunidade, enfim, sobre a
sociedade, a citao abaixo extrada do Manual de Procedimentos do Programa de Histria
Oral da Justia Federal, pertinente nossa pesquisa:
[...] Histria Oral diminuir a distncia entre o indivduo, o agente da
Histria, e o pesquisador; resgatar as razes histricas da instituio e
promover a sua maior participao na construo dessa histria.
Possibilitar, ainda, compreender o processo de construo da identidade dos
magistrados federais. Melhor desvenda o futuro quem conhece o passado
(De SORDI, AXT e FONSECA, 2007, p. 6).11
Melhor desvenda o surgimento do Ncleo Unio Bandeirante os seus prprios
pioneiros e construtores do progressista Distrito de Porto Velho.
So exploradas as fontes escrita e oral ao esclarecimento do surgimento do
Ncleo Unio Bandeirante, que, por recente, do tempo presente, para no dizer imediato,
exguas mesmo. Ademais, no h hierarquia ou precedncia entre elas,
[...] Mas fontes escritas e orais tm semelhana porque nenhuma das duas
expresso transparente de uma realidade exterior, no representa quela
desejada janela escancarada para o passado, [...] alm do mais, h uma
imensa quantidade de fontes documentais produzidas a partir da oralidade
(CONSTANTINO, 2013, p. 17).
O registro do testemunho daqueles pioneiros desbravadores da GJTO instrumento
indispensvel compreenso entre o presente e o passado. Suas lies de vida, reminiscncias
do que ainda conservam em memrias, servem historiografia e ao conhecimento da nossa
sociedade, em particular, do Estado de Rondnia.
As fontes orais foram indispensveis realizao da pesquisa. que, apesar da
grande quantidade de documentos produzidos pelos atores envolvidos, nas duas aes
judiciais, somado a outro tanto pesquisado nos rgos pblicos (Unio, Estado de Rondnia e
Municpio de Porto Velho), e privados, as vozes dos envolvidos no processo de ocupao no
apareciam. Da a opo pelas entrevistas, relatos, testemunhos. Os depoimentos gravados,
filmados, editados e transcritos, esto arquivados em mdia e impressos, disponveis no
Centro de Pesquisa da Imagem e Som da PUCRS, todos eles acompanhados dos respectivos
11 DE SORDI. Manual de Procedimentos do Programa Histria Oral da Justia Federal. Braslia: Conselho da
Justia Federal, 2007.
http://www2.cjf.jus.br/jspui/bitstream/handle/1234/19/manual%20historia%20oral.pdf?sequence=1, acesso em
11/05/2014.
http://www2.cjf.jus.br/jspui/bitstream/handle/1234/19/manual%20historia%20oral.pdf?sequence=1
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termos de cesso gratuita de direitos de depoimento oral e de contedo imagtico12.
Foram analisados nos dois ltimos anos, como preparo dissertao, cerca de dez
mil documentos, juntos nos processos judiciais, alm de outros colhidos em rgos pblicos e
privados, INCRA, SEDAM, Assembleia Legislativa de Rondnia, Judicirios Federal e
Estadual, Ministrio Pblico, Polcia Militar, Eletrobrs, Municpio de Porto Velho, Registro
de Imveis, Pastoral da Terra, alm de gravaes, imagens, figuras, fotografias, anotaes de
campo, mapas e croqui da regio estudada, tudo para entender o surgimento e colonizao de
Unio Bandeirante/RO.
Utilizamos a fotografia/reproduo como fonte histrica e de expresso de
comunicao no verbal, muitas delas cedidas de acervos de pioneiros e/ou familiares, aqui
retratados, como materializao da experincia vivida, doce lembrana do passado,
memrias de uma trajetria de vida, flagrantes sensacionais, ou ainda, mensagens codificadas
em signos. Tudo isso, ou nada disso, a fotografia pode ser, como dizem Cardoso e Mauad
(1997, p. 405).
Valemo-nos ainda de diversas entrevistas no estruturadas agendadas com agentes
polticos, funcionrios pblicos dos rgos, envolvidos e moradores do Distrito Unio
Bandeirante, com questionamentos sobre a emigrao, as origens do povoamento e do
processo de diviso, demarcao e de ocupao das parcelas rurais e datas de terras da GJTO.
Com a pesquisa de campo e anlise documental em 232 Laudos de Vistoria, feitos
pela equipe tcnica do INCRA, para fins de regularizao fundiria, determinado pelo juzo,
busca-se resgatar nas posses das Linhas 4 e F, da GJTO, por onde teve incio a demarcao da
Gleba pelos primitivos posseiros, dados socioeconmicos sobre a origem dos seus ocupantes,
famlias, tradio agrcola, escolaridade, investimentos, tipos de cultura, plantel etc. e
identificao do imvel, inclusive quanto aos percentuais de desmatamentos, pastagens,
culturas permanentes e temporrias.
Todas essas informaes esto organizadas e disponveis em um Banco de Dados
Relacional construdo especificamente para este fim, com informaes relevantes
apresentao dos resultados, como ferramenta de apoio elaborao da dissertao. No
desenvolvimento da aplicao do sistema foi utilizado como ferramenta o aplicativo
PowerBuilder, da empresa Sybase, licenciado.
12 A transcrio das falas, com edio de texto, foi feita pelo prprio pesquisador-entrevistador, com o auxlio do
Software F4, alemo, indicado pelo Laboratrio de Pesquisa em Histria Oral da PUCRS, com licena e chave
de uso regularmente adquirida pelo pesquisador.
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O tamanho da amostra utilizada no estudo significativo, em torno de 18% dos
1256 lotes ocupados e vistoriados pelo INCRA.
Todo esse material foi digitalizado, digitado e inserido no Banco de Dados para
anlise pormenorizada dos interessados.
O sistema de diviso e demarcao dos lotes procedidos pelos colonos/posseiros da
GJTO e de Unio Bandeirante, seguiu o modelo adotado pelo INCRA nos projetos de
assentamento e de regularizao fundiria. Os lotes demarcados, na maioria, com 50 hectares,
deram-se inicialmente para a formao de uma agricultura de subsistncia, familiar, ampliada,
depois, pela formao de excedentes de produo, cada vez mais diversificados, destinados
comercializao, sobressaindo, no caso, as culturas de caf, cacau, banana, cupuau, milho,
arroz, feijo, mandioca, hortalias, etc., findando o ciclo agrcola com a criao de animais
sunos, caprinos, ovinos, pecuria leiteira e de corte.
O trabalho est estruturado em trs captulos. O primeiro aborda sucintamente o
modelo de colonizao de Rondnia de 1950 a 1990 e o processo histrico de formao e
ocupao territorial da Gleba Jorge Teixeira de Oliveira, GJTO, destacada dos Seringais So
Francisco, Bom Futuro e Janaiaco, no municpio de Porto Velho, para atender aos programas
de reforma agrria. Outro objetivo deste captulo analisar as aes e articulaes dos
posseiros, migrantes sem-terra, suas lideranas e movimentos sociais, nos processos de
ocupao, demarcao, distribuio das parcelas rural e urbana, colonizao e construo, por
mos prprias, do Ncleo Urbano em rea com restries do ZSEE. Com este captulo se
deixa claro que a ocupao da Gleba Jorge Teixeira de Oliveira ocorreu por dissidentes do
movimento MST da regio de Jaru (RO), com a conivncia do INCRA.
Por inao do rgo fundirio, exiguidade de recursos materiais e financeiros a
autarquia deixou de implantar na GJTO um Projeto de Assentamento de caractersticas
agroambientais, concebido para cerca de 1000 famlias, sedimentando a ocupao. Esse
modelo de projeto atendia aos interesses do IBAMA.
No segundo captulo, discute-se o cenrio e a problemtica ambiental existente na
GJTO em razo do descumprimento do Zoneamento Socioeconmico e Ecolgico do Estado,
instrumento tcnico e poltico de planejamento ambiental e de ordenamento territorial em
Rondnia. Outro objetivo apresentar os vrios conflitos socioambientais decorrentes da
ocupao territorial, antrpico; a apropriao ilegal dos recursos naturais e tenses entre os
atores sociais de diversas categorias e diferentes identidades, como as populaes tradicionais
extrativistas das Unidades de Conservao e Povos Indgenas; entre estes e o Estado, e os
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posseiros, agricultores e moradores do Distrito Unio Bandeirante, com suas lideranas e
movimentos sociais, comerciantes, madeireiros e proprietrios de terras com ttulos
definitivos na regio contestada. Neste capitulo, por fim, identificam-se as razes de
divergncia e desinteligncia entre os ocupantes da rea conflagrada e o Estado, impedido
judicialmente de atender a populao residente com obras e infraestrutura e de acesso aos
servios pblicos e privados.
No terceiro captulo, so examinados aspectos relativos legislao fundiria e Lei
do ZSEE, aos conflitos socioambientais, polticos e econmicos; o alcance das medidas
liminares requeridas e a reao da populao de Unio Bandeirante ao do Estado e ao seu
enfrentamento, pelos envolvidos. So examinados cerca de duas centenas de Laudos de
Vistoria feitos pelo INCRA para fins de regularizao fundiria, referentes s Linhas 4 e F da
GJTO, demarcadas pelos primitivos posseiros, com extrao de dados sobre a origem dos
seus ocupantes, tradio agrcola, investimentos e identificao do imvel, para demonstrar os
percentuais de desmatamentos, tipos de cultura, pastagens, plantel, a fora produtiva e a
pujana econmica do Distrito, considerado celeiro agrcola da capital do Estado.
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CAPTULO 1. A FORMAO DA GLEBA JORGE TEIXEIRA DE OLIVEIRA E
A AO DOS MIGRANTES NA COLONIZAO DO NCLEO UNIO
BANDEIRANTE
Um dos propsitos deste captulo descrever o modelo de colonizao de Rondnia
e o processo histrico de formao e ocupao territorial da Gleba Jorge Teixeira de Oliveira -
GJTO, por iniciativa de dissidentes sem-terra do Movimento MST, oriundos de vrios
acampamentos da regio central do Estado, interessados na ocupao da rea arrecadada de
terras devolutas da Unio, para atender aos programas de assentamentos e de reforma agrria,
inclusive projetos agroambientais. A Gleba situa-se no Municpio de Porto Velho, distante
160 km da capital, em regio limtrofe s Unidades de Conservao Resex Jaci-Paran, Flona
Bom Futuro e Terra Indgena Karipuna, protegidas e reguladas pelo Zoneamento
Socioeconmico Ecolgico do Estado de Rondnia - ZSEE.
Outro objetivo analisar as aes e articulaes dos posseiros, migrantes sem-terra,
suas lideranas e movimentos sociais, nos processos de ocupao, demarcao, distribuio
das parcelas rural e urbana, colonizao e construo, por mos prprias, do Ncleo Urbano
Unio Bandeirante, em rea com restrio do ZSEE. Para a elaborao desse captulo foram
utilizadas fontes histricas, escritas, documentais, da oralidade, das falas e da memria, de
relatos e/ou excertos de entrevistas no estruturadas, sobretudo das que dizem respeito
ocupao da GJTO. No campo terico nos valemos das teorias do tempo presente
propugnadas por Chaveau e Ttard, (1999), Ferreira (2000), Braustein (1993), Alberti (2011),
Nncia Constantino e outros. A opo plas fontes orais foi necessria porque no encontrei
na anlise documental dos processos as falas dos migrantes, sequer ouvidos em juzo.
A ocupao e colonizao das terras de Rondnia tm incio com a edificao do
Forte Prncipe da Beira, iniciado em 1776 e concludo em 1783, pela Coroa Portuguesa, nas
barrancas do Rio Mamor, em defesa de sua soberania, do territrio, proteo e
navegabilidade dos rios Guapor, Mamor e Madeira, (BRUNO, 1967, p. 49, 146;
BASSEGIO, 1992).
Tambm no foi diferente por ocasio da construo da centenria Estrada de Ferro
Madeira-Mamor - EFMM, pelas mos dos ingleses, coadjuvados por tcnicos e trabalhadores
braais indianos e outros, vindos de todos os rinces, muitos deles aqui se radicando
definitivamente, como no caso dos barbadianos os afro-caribenhos da EFMM, como
referidos pelos historiadores da UNIR/RO:
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O segundo segmento populacional negro de Rondnia formado por um
conjunto de populaes caribenhas, comumente chamadas de barbadianos.
Esse grupo tnico remonta aos primrdios da construo da Estrada de Ferro
Madeira Mamor (1873/1912). Possuem uma cultura de razes colonialistas
inglesas e so protestantes ou evanglicos (Batistas, Anglicanos e outros).
Ainda falam o ingls e no se consideram afrodescendentes nem vinculados
escravido, mas descendentes dos sditos de Sua Majestade Britnica. As
populaes barbadianas formaram o mais importante segmento tnico
responsvel pelas origens e fundao de Porto Velho, ponto inicial da
Madeira Mamor. Mesmo depois do trmino das obras, diversas famlias
permaneceram na regio, definindo especificidades culturais regionais e
atuando de forma decisiva nos setores educacionais e de sade do Territrio
e, mais tarde, Estado de Rondnia (TEIXEIRA, FONSECA, MORATO, s/d,
p. 6/7).
Quanto importncia da ferrovia como elo de integrao de toda regio Amaznica e
de escoamento da produo extrativista do ltex, o chamado ciclo da borracha, colhe-se
como ilustrao e fonte de pesquisa que:
No incio do sculo XX, desenhava-se uma nova geografia para a regio,
com a consolidao da incorporao do norte do Mato Grosso, do
Amazonas, incluindo o atual Estado de Rondnia, e a anexao do Acre
(1903). A expanso da produo de borracha nessa regio determinou a
construo da Ferrovia Madeira-Mamor, concluda em 1912, cujo objetivo
era facilitar o escoamento da produo para os portos de Manaus e Belm,
atravs da integrao da estrada de ferro com a bacia do Amazonas
(SOUZA, 2001, p. 43, apud Oliveira, 1995, p. 42).
A partir desses dois grandes empreendimentos experimenta-se um intenso
movimento migratrio no territrio sobre o qual Rondnia veio a se constituir, estimulado,
por certo, pela economia resultante dos ciclos econmicos extrativista de minerais (ouro e
diamante) e, depois, o ltex, extrado pelas mos dos seringueiros, em sua maioria,
nordestinos, durante a explorao econmica dos seringais na Amaznia que se deu ao longo
dos rios Negro, Japur, Solimes, Juru, Rio Branco, Purus, Amazonas, Xingu e, em
Rondnia, nos rios Guapor, Mamor, Madeira e outros, como descritos no romance-denncia
a Selva, do literato portugus Ferreira Castro, descrevendo a tenaz luta dos cearenses,
maranhenses e nordestinos, os infortnios dos seringueiros, quase escravos nas florestas da
Amaznia (CASTRO, 1967, p. 2).
Na mesma toada, o cortador de caucho13 e seringa, homem que trabalha para
escravizar-se, como referido por Euclides da Cunha, (2006), pois ele s pode aviar no
13 rvore que atinge mais de 35 m (Castilloaulei), da fam. das morceas, nativa do Brasil (AMAZ, C.-O.), com
madeira prpria para pasta de papel, ltex de que se faz borracha, folhas oblongas, frutos com polpa mole,
comestvel, e sementes oleaginosas; cauchu. (HOUAISS, 2009, p. 426).
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barraco14 do patro. Exemplo disso a descrio pormenorizada da conta do aviamento
de um seringueiro recrutado no Cear para ser levado gleba das estradas15, nas colocaes16,
no paraso diablico dos seringais:
No prprio dia em que parte do Cear, o seringueiro principia a dever: deve
a passagem de prova at o Par (35$000), e o dinheiro que recebeu para
preparar-se (150$000). Depois vem a importncia do transporte, numa gaiola
qualquer de Belm, ao barraco longnquo a que se destina, e que , na
mdia, de 150$000. Aditem-se cerca de 800$000 para os seguintes utenslios
invariveis; um boio de furo, uma bacia, mil tigelinhas, uma machadinha de
ferro, um machado, um terado, um rifle (carabina Winchester) e duzentas
balas, dois pratos, duas colheres, duas xcaras, duas panelas, uma cafeteira,
dois carretis de linha e um agulheiro. Nada mais. A temos o nosso homem
no barraco senhoril, antes de seguir para as barracas, no centro, que o
patro designar. Ainda um brabo, isto , ainda no aprendeu o corte e j
deve 1:135$000, (CUNHA, [189?] 2006, p. 28/29).
Essa era a via crucis dos Soldados da Borracha arregimentados em todo o nordeste
para servir ao Exrcito da Amaznia, pelo Servio Especial de Mobilizao de
Trabalhadores para a Amaznia (SEMTA), rgo da estrutura federal criado pela Portaria 30
de novembro de 1942, do Ministro Joo Alberto Lins de Barros, no Governo Getlio Vargas.
Esses seringueiros ficavam dispensados da convocao militar, enquanto permanecessem nos
seringais, dada a importncia da borracha no teatro da guerra (FERREIRA, 1999, p. 29).
A imigrao tambm foi intensamente estimulada na era Vargas, com Getlio no
governo da Nova Repblica. De vis nacionalista, o Presidente buscou estimular a ocupao
territorial da hileia17, as atividades econmicas e a integrao regional e poltica da vastssima
regio Amaznica. Com esse desiderato, foram criados, em 1943, os territrios federais do
Amap, do Rio Branco e do Guapor, este ltimo elevado categoria de Estado pela Lei
14 Os seringais ficam longe de tudo e de todos. Essa condio natural, mais a ambio dos seringalistas, gerou
um sistema de trabalho cruel: o dono do seringal destina uma rea (colocao) para, dali, o seringueiro extrair o
ltex, ou seringa, e lhe compra as plas (grandes bolas feitas com a seringa defumada). No paga com dinheiro,
abre um saldo no barraco (armazm que pertence ao prprio seringalista). Proibido pelo seringalista de
fazer at mesmo uma pequena horta, o seringueiro no tem outra alternativa seno comprar tudo no barraco,
desde alimentos e ferramentais at utenslios, roupas, remdios e tudo o mais que precisar a preos
escorchantes. O seringueiro est sempre devendo. In Claro, Milton. A Amaznia que no conhecemos. So
Paulo: Ordem dos Servos de Maria, 2007, p. 97.
15 Estrada: caminho que avana pela floresta contornando uma faca (lote) de cem cento e cinquenta seringueiras.
(CLARO, 2007, p. 97).
16 Colocao: uma rea do seringal onde a seringa coletada. Nesta rea, ficam a casa do seringueiro e as
estradas de seringa. Um seringal possui vrias colocaes. (CLARO, 2007, p. 97).
17 Essa a denominao dada imensa floresta equatorial amaznica por Alexander Von Humboldt (1769-
1859), naturalista alemo, e Aim Bonpland (1773-1858), naturalista francs. Derivao: por extenso de
sentido, a Amaznia brasileira. (HOUAISS, 2009, p. 1022).
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30
Complementar n. 41, de 22/12/1981, conservando o municpio de Porto Velho como capital.
Alm da ocupao territorial orientada o outro objetivo estratgico do governo era o
fomento explorao da borracha para atender a conjuntura da Segunda Grande Guerra,
redundando num crescimento expressivo da sua populao:
o censo demogrfico de 1940, quantificava a populao residente na regio
Norte em 1.467.940 indivduos; o censo de 1950 registrou um crescimento
absoluto de aproximadamente 25%, passando a regio a contar com
1.834.185 habitantes (IBGE, 1996, p. 12). Entre 1942 e 1945 chegaram
Amaznia algo em torno de 100 mil migrantes, na sua maioria trabalhadores
nordestinos, os chamados soldados da borracha (SOUZA, 2001, p. 45).
Vemos, na sequncia, no segundo governo Vargas, (1950-1954) agora eleito pelo
voto democrtico direto, um novo surto migratrio no perodo pr-64: a Marcha para o
Oeste, com sua poltica de integrao regional e de desenvolvimento nacional e tambm de
expanso das relaes capitalistas (SOUZA, 2001, p. 41).
Noutra quadra e na esteira da construo da BR 364, ligando Cuiab/Rondnia/Acre,
vieram, para Rondnia nas dcadas de 70 e 80, levas de migrantes oriundos em grande parte
do Nordeste, Paran, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, So Paulo, Esprito Santo, em busca
de terras da Unio, estimulados pela poltica governamental do novo Eldorado.
Esse modelo de ocupao seguia a diretriz poltico-ideolgica do Governo Militar,
engendrada na Escola Superior de Guerra ESG, de cunho nacionalista e integracionista,
centradas na segurana de fronteiras, que precisava ser protegida contra a penetrao
estrangeira e, ainda, esvaziar o conflito por terra em ebulio no pas.
Sobre isso confira o registro de Mitsue:
[...] pela propaganda oficial, havia terras em abundncia espera de
colonizadores s margens das grandes rodovias: a Transamaznica, a
Cuiab-Santarm e a Cuiab-Porto Velho. Essa poltica espelhava o interesse
do governo em esvaziar os conflitos por terra aos quatros cantos do Brasil. O
General Mdici a justificava como uma forma de levar homens sem terra
para terra sem homens. A ideia de que a Amaznia, aquela imensido
coberta por florestas e cortada por inmeros rios, precisava ser protegida
contra a penetrao estrangeira era antiga. Os governos militares elaboraram
vrios planos de ocupao da Amaznia. Enviando para l os camponeses
das vrias regies do pas que pediam terra e entravam em conflitos contra
os latifundirios, o governo matava dois coelhos: ocupava os espaos
vazios resolvia os conflitos (MORISSAWA, 2008, p. 100).
Em resposta ao incomensurvel e desordenado movimento migratrio para as terras
do Eldorado, visando atender a demanda dos sem-terra, o INCRA, encarregado da reforma
agrria, implantou ao longo do eixo da BR-364, grandes Projetos Integrados de Colonizao
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ou de assentamento de trabalhadores rurais, os quais, em sua maioria, deram origem criao
de quase todos os municpios do Estado de Rondnia.
Sobre isso diz o senador da Repblica Assis Gurgacz:
[...] Rondnia fruto de um grande projeto de reforma agrria, pois sua
ocupao inicial ocorreu com a transferncia para o local das famlias dos
agricultores que ocupavam as terras que hoje abrigam o lago da Hidreltrica
de Itaipu, em Foz do Iguau (PR). Cidades como Ji-Paran, Presidente
Mdici, Rolim de Moura, Cacoal e Ariquemes so frutos de uma grande
reforma agrria que hoje alavancam a economia do estado, com a produo
agrcola vindo da agricultura familiar. (DIRIO DA AMAZNIA, edio e
1 de dezembro de 2012, caderno A4).
Com essa poltica pretendia-se atender, tanto quanto possvel, aos reclamos dos
colonos, parceleiros18 e trabalhadores rurais sem-terra, em sua maioria, da regio Nordeste
em permanente tenso social, e tambm os das regies Sul e Sudeste, vidos por uma reforma
agrria clere, estimulados pelos gritos das ruas e dos articulados movimentos sociais,
sindicatos, igrejas, Comisso Pastoral da Terra (CPT), notadamente pela Liga Operria e
Camponesa, pelo Partido Comunista Revolucionrio19, e classe poltica.
A ocupao e colonizao da Amaznia visava tambm, como no governo de
Getlio, minimizar a presso social interna dos trabalhadores rurais e urbanos, por terras e
rendas.
No se descuida de que havia igualmente outros interesses a atender, o externo,
movido pela cobia econmica, sobretudo dos americanos pelas terras e riquezas minerais e
florestais da Amaznia, ainda pouco exploradas, virgens mesmo.
ento assinado pelo primeiro governo militar, Marechal Castelo Branco, (1964-
1966), o Estatuto da Terra, Lei n 4.504, de 30/11/64. Como decorrncia e na sequncia do
18 Todo aquele que venha a adquirir lotes ou parcelas em reas destinadas reforma agrria ou colonizao
pblica ou privada (art. 7 do Decreto n 55.891/65), in Glossrio de Termos Tcnicos do INCRA, Braslia,
1981.
19 O 'Partido Comunista Revolucionrio (PCR) um partido poltico brasileiro de esquerda, baseado
ideologicamente nos princpios do marxismo-leninismo com expresso nacional e forte penetrao nos meios
sindicais e estudantis. Fundado em maio de 1966, em Recife - PE, foi reorganizado em 1995. Seu smbolo uma
foice e um martelo cruzados com uma estrela Vermelha na parte superior do martelo (smbolo sovitico),
simbolizando a aliana operrio-camponesa, sobre um retngulo vermelho onde est escrito a sigla PCR. Edita o
jornal "A Verdade", e internacionalmente, membro da Conferncia Internacional de Partidos e Organizaes
Marxista-Leninistas (CIPOML). O PCR nos dias de hoje atua em entidades estudantis (atua por intermdio
da Unio da Juventude Rebelio - UJR), na Unio Nacional dos Estudantes - UNE e na Unio Brasileira dos
Estudantes Secundaristas - UBES); sindicais (Movimento Luta de Classe - MLC), e no movimento
popular (Movimento de Lutas nos Bairros, Vilas e Favelas - MLB), tendo como rgo central do partido o
Jornal A Verdade. A partir de 2004, passou a representar o Brasil na Conferncia Internacional de Partidos e
Organizaes Marxista-Leninistas (Unidade e Luta) (CIPOML). In.
:www//pt.wikipedia.org/wiki/Partido_Comunista_Revolucion%C3%A1rio. Acesso em 29/10/2014.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Marxismo-leninismohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Recife_(Pernambuco)http://pt.wikipedia.org/wiki/Pernambucohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Confer%C3%AAncia_Internacional_de_Partidos_e_Organiza%C3%A7%C3%B5es_Marxistas-Leninistashttp://pt.wikipedia.org/wiki/Confer%C3%AAncia_Internacional_de_Partidos_e_Organiza%C3%A7%C3%B5es_Marxistas-Leninistashttp://pt.wikipedia.org/wiki/Uni%C3%A3o_da_Juventude_Rebeli%C3%A3ohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Uni%C3%A3o_Nacional_dos_Estudanteshttp://pt.wikipedia.org/wiki/Uni%C3%A3o_Brasileira_dos_Estudantes_Secundaristashttp://pt.wikipedia.org/wiki/Uni%C3%A3o_Brasileira_dos_Estudantes_Secundaristashttp://pt.wikipedia.org/wiki/Sindicatohttp://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Movimento_Luta_de_Classe&action=edit&redlink=1http://pt.wikipedia.org/wiki/Movimento_popularhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Movimento_popularhttp://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Movimento_de_Lutas_nos_Bairros,_Vilas_e_Favelas&action=edit&redlink=1http://pt.wikipedia.org/wiki/A_Verdadehttp://pt.wikipedia.org/wiki/Confer%C3%AAncia_Internacional_de_Partidos_e_Organiza%C3%A7%C3%B5es_Marxistas-Leninistashttp://pt.wikipedia.org/wiki/Confer%C3%AAncia_Internacional_de_Partidos_e_Organiza%C3%A7%C3%B5es_Marxistas-Leninistas
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Estatuto, criam-se o Instituto Brasileiro de Reforma Agrria - IBRA e o Instituto Nacional de
Desenvolvimento Agrrio - INDA, estruturas do Poder Executivo central, voltadas ao
atendimento dos interesses do trabalhador brasileiro e tambm fundirios, de colonizao,
assentamento, regularizao e titulao de terras pblicas e devolutas.
O IBRA foi instalado no Territrio Federal de Rondnia em 1968. Dois anos depois,
sucede-lhe o Instituto Brasileiro de Colonizao e Reforma Agrria INCRA, criado pelo
Decreto-Lei n 1.110, de 09 de julho de 1970, absorvendo as atribuies do IBRA e INDA,
(BRASIL, 1970).
Coube nova autarquia federal promover a implantao da colonizao oficial e
ordenar a ocupao da Amaznia Ocidental sob o lema integrar para no entregar e ocupar
as terras sem homens com os homens sem terras (OLIVEIRA, 2010, p. 30).
Pensamento diverso sobre a questo o do Socilogo Jos de Souza Martins:
A problemtica da Amaznia no uma problemtica estritamente
econmica. Os militares desenvolveram uma doutrina de ocupao dessas
regies que chamada doutrina de ocupao dos espaos vazios que eu
pessoalmente chamo de doutrina de esvaziamento dos espaos ocupados,
porque uma doutrina de expulso do homem para colocao do boi, ou
seja, preciso ocupar dessa forma, e no de outra, para defender. Eu diria
que essa imensa boiada poder alimentar imensos exrcitos de inimigos
(MARTINS, 1986, p. 137).
A partir da dcada de 1960 experimenta-se um crescimento populacional bastante
acentuado em razo da atividade dos garimpos (diamante, ouro, cristais de rocha) e de um
novo ciclo econmico, o agrcola, fruto dos projetos de assentamentos do INCRA, em sua
maioria localizados s margens da BR-29, (atual BR-364), ligando Vilhena/Porto
Velho/Abun (RO), para onde se deslocou incalculvel contingente populacional, se fixando
principalmente na zona rural.
O crescimento populacional foi intensificado em funo de uma nova onda de
migrantes extrativistas, aliado construo da BR-364, na dcada de 1960, incentivados
oficialmente pela propaganda do Governo, todos em busca de terras produtivas, fartas e
baratas.
Foi esse modelo oficial de emigrao fundado na atividade econmica
predominantemente extrativista e agrcola, em terras pblicas federais, algumas arrecadadas
de terras devolutas20, que estimulou o movimento migratrio para Rondnia, com proliferao
20 Terras sem ttulo de propriedades pertencentes ao governo municipal, estadual ou federal. Art. 20, II, CF So
Bens da Unio, II: as terras devolutas indispensveis defesa das fronteiras, das fortificaes e construes
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de significativo contingente de trabalhadores rurais e pequenos agricultores21, assim entendido
tambm os sem-terra.
Quanto dinmica demogrfica no Estado de Rondnia colhe-se que
[...] a ocupao e colonizao [...] so resultado da estratgia do governo
brasileiro no sentido da ampliao das condies de expanso do capital na
economia brasileira, fundamentada na economia de mercado, que
preconizava a ocupao por meio de uma poltica de integrao nacional
(SEDAM 2002, p. 26).
O crescimento populacional de Rondnia foi exponencial, fruto natural do Plano de
Valorizao Econmica implantado pelo Governo Federal, de estmulo ao desenvolvimento
da regio. Significativo e esclarecedor quanto a isso o registro de Claro (2007, p. 89), em
50 anos, entre 1950 e 2000, a populao do Brasil cresceu 220%. No mesmo perodo, a
populao da Amaznia cresceu acima de 400%. e a populao urbana dentro da Amaznia
cresceu 1.250%.
1.1 FAZENDA URUP
Em 1999 existiu um conflito fundirio de grande proporo em Mirante da Serra, em
Rondnia, envolvendo camponeses ligados ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-
Terra - MST e empregados da Fazenda Urup, contratados pela famlia Ricardo Borges de
Castro Cunha, que a administrava. Em duas anteriores tentativas de ocupao desse imvel
houve troca de tiros, sem feridos. Numa terceira tentativa, ocorrida no dia 3 de outubro desse
mesmo ano, aps frustradas negociaes entre os contendores, o Governo do Estado de
Rondnia e o INCRA, cerca de 250 famlias ocuparam um canto da rea que havia sido
desocupada em abril deste ano (DIRIO do GRANDE ABC, 15/10/1999).
De acordo com a declarao escrita de Sebastio Conti Neto22 (2013) a Fazenda
Urup, de seis mil hectares de rea, invadida vrias vezes, estava agora na iminncia de sofrer
outra desocupao judicial. Antevia-se com a possvel execuo do despejo um conflito
fundirio armado, de gravssima proporo, qui como aquele ocorrido em Corumbiara, RO,
militares, das vias federais de comunicao e preservao ambiental, definidas em lei; Art. 26, IV Incluem-se
entre os bens dos Estados: IV as terras devolutas no compreendidas entre as da Unio; quanto destinao,
compatibilizao com a poltica agrcola e com a reforma agrria. Consultar o art. 188, da CF.
21 Agricultor que trabalha com a famlia em sua prpria terra. Porm a rea que possui muito pequena, tem
geralmente 5 hectares, e com ela no consegue sobreviver e sustentar a sua famlia, por isso precisa de mais terra
e considerado tambm um sem-terra. In, glossrio, (MORISSAWA 2008, p. 250).
22 Sebastio Conti Neto. Informao escrita datada de 15/08/2012, sobre a criao do Ncleo Unio Bandeirante.
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em agosto de 1995, por ocasio da desintruso da Fazenda Santa Elina.
O episdio, de triste memria, ficou conhecido como Massacre de Corumbiara,
com deletria repercusso nacional e internacional pelo que foi submetido o caso
considerao da Comisso Interamericana de Direitos Humanos - CIDH e tambm na
Comisso de Direitos Humanos do Congresso Nacional.
Contabiliza-se daquele despejo o registro de onze trabalhadores rurais e dois policiais
militares mortos, inclusive a pequena Vanessa, de apenas 6 anos que morreu com um tiro
pelas costas, alm de cinquenta e trs feridos e centenas de pessoas detidas pela autoridade
policial encarregada do malfado despejo (MESQUITA, 2002).
O caso, pela sua gravidade e repercusso meditica, foi apresentado CIDH, por
representao conjunta formulada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra,
Centro de Defesa dos Direitos Humanos da Arquidiocese de Porto Velho, da Comisso
Teotnio Vilela e pela Human Rigths Watch/Amricas, visando responsabilizar a Repblica
Federativa do Brasil. O CIDH julgou o caso em maro de 2004 e imps responsabilidade ao
Estado Brasileiro por violao aos artigos 4 (direito vida), 5 (integridade pessoal), 8
(garantias judiciais) e 25 (proteo judicial), consagrados na Conveno Americana da qual o
Brasil signatrio (SILVA, 2006)23.
No que se refere ao conflito fundirio da Fazenda Urup e considerando o fato que,
mesmo despejados vrias vezes do imvel em litgio, os invasores para l sempre
regressavam, era imperioso e urgente uma soluo negociada e definitiva para o conflito.
Ocorre que a propriedade, considerada produtiva, em razo das benfeitorias, equipamentos,
construes, e pastagem, conforme Dirio do Grande ABC, edio de 15 de outubro de 1999,
dedicada criao de gado nelore de elite, com investimentos de grande monta, tornou-se
insuscetvel de desapropriao para fins de reforma agrria consoante a regra do art. 185, da
Constituio Federal24.
Articulou-se, ento, na sequncia dos acontecimentos, como possvel soluo para o
impasse entre os contendores, a compra do imvel mediante pagamento de preo justo e
convencionado que, igualmente, no foi possvel consoante se v do expediente n 139, de 01
23 SILVA, Andressa de Souza e. A Corte Interamericana de direitos humanos. Rev. Jur., Braslia, v. 8, n. 79,
p.47-61, jun./jul., 2006. Disponvel em
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/rev_79/artigos/PDF/Andressa_Rev79.pdf>. Acesso em 05.05.2014. 24 Art. 185. So insuscetveis de desapropriao para fins de reforma agrria:
I - a pequena e mdia propriedade rural, assim definida em lei, desde que seu proprietrio no possua outra;
II - a propriedade produtiva.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/rev_79/artigos/PDF/Andressa_Rev79.pdf
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de maro de 2000, (Cf. Anexo II) assinado pelo Presidente do INCRA, Francisco Orlando
Costa Muniz, e endereado Coordenao Estadual do MST, em Rondnia (BRASIL, Justia
Federal, 2004, p. 101/103)25.
Da anlise do documento, certo que a compra tambm no se concretizou em razo
da significativa diferena de valores entre as duas avaliaes procedidas no imvel, no espao
de 17 meses, a saber: R$ 1.849.925,00, na primeira avaliao e R$ 4.290.000,00, na ltima,
mesmo assim considerando as diferenas de metodologias utilizadas em ambas as avaliaes
(BRASIL, Justia Federal, 2004, p. 101/103).
A falta de acordo quanto ao justo preo do imvel em disputa entre o INCRA,
expropriante, e o fazendeiro, expropriado, a aquisio da Fazenda ficou prejudicada como
bem registrou o Dirio do Grande ABC, edio de 15 de outubro de 1999:
Trata-se da terceira ocupao da Fazenda Urup em dois anos. Desanimado
com os prejuzos, Cunha [Ricardo Borges de Castro] anunciou que pretende
vender a propriedade ao Incra. Segundo o superintendente do Incra, as
vistorias para avaliao comeam na segunda-feira. A notcia da venda da
rea reduziu um pouco a tenso, disse Rodrigues26.
Ainda sobre a avaliao da Fazenda Urup,
Cunha ressalta, entretanto, que somente vender a rea por um preo justo.
Na outra invaso, o Incra avaliou a propriedade em um valor abaixo do
mercado [grifos do original], disse o fazendeiro. Na poca, o preo das
terras estava em queda e j houve uma alta, diz Rodrigues (DIRIO DO
GRANDE ABC, edio de 15 de outubro de 1999).
Uma vez inviabilizada a aquisio da Fazenda Urup o Conselho Diretor do INCRA
ofereceu ao MST, como alternativa desocupao da Fazenda Urup, em proposta escrita,
assentar aquelas famlias nos 104 mil hectares da Gleba Jorge Teixeira de Oliveira, no
municpio de Porto Velho.
O INCRA concebeu para a referida gleba um Projeto de Assentamento com
caractersticas agroambientais, visando atender cerca de 1000 famlias, alm de destinar
explorao agrcola convencional um total de 20 mil hectares, distribudos nas terras de maior
potencial agrcola. O restante da rea, de acordo com o documento, seria destinado a projetos
25 Ver expediente /INCRA/T/N. 139/2000, de 01 de maro de 2000, juntado por cpia nos Autos da Ao Civil
Pblica 2004.41.00.001887-3, fls. 101 (Cf. documento anexo)
26 Antonio Renato Rodrigues, ento Superintendente do INCRA em Rondnia.
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de manejo florestal com vistas manuteno da vegetao nativa27. Com a proposta o INCRA
assegurava infraestrutura e crditos necessrios as 300 famlias acampadas na rea em litgio,
ou seja, na fazenda Urup. (GODINHO. Depoimento 26/12/2013)28.
Ainda como alternativas tendentes desocupao e assentamento desses posseiros
acampados em Mirante da Serra, o INCRA ofereceu ao MST terras em duas outras glebas, no
caso, Projeto Burareiro, na regio de Ariquemes (RO) e tambm na Gleba Corumbiara,
no sul do Estado, regio de grande conflito fundirio, assegurando-lhes os recursos destinados
infraestrutura bsica, alm de lonas e cestas bsicas, at que fosse viabilizada a transferncia
das famlias para o novo assentamento definitivo (BRASIL, Justia Federal 2004, p. 102).
Mas no s: colhe-se, ainda, daquele documento, [ofcio n 139, de 01 de maro de
2000], como complementares quelas propostas, mais estas:
Contratao de transporte para deslocamento das famlias at a rea escolhida.
Fornecimento de cestas bsicas no valor de R$ 40,00 at o assentamento definitivo.
Aquisio de lonas para as 300 famlias.
Contratao de uma equipe do Projeto LUMIAR para assistncia tcnica s famlias
assentadas.
Disponibilizao de 2 engenheiros para elaborar o Projeto Bsico de Obras.
Liberao de R$ 30.000,00 para o Plano de Desenvolvimento do Assentamento
(PDA).
Liberao de R$ 120.000,00 para a demarcao dos lotes.
Liberao de R$ 420.000,00 para a construo de estradas e abastecimento de gua.
Liberao de R$ 600.000,00 para o crdito custeio/PRONAF.
Liberao de R$ 700.000,00 para a construo de casas.
Eletrificao no Projeto de Assentamento a ser negociado com o Governo do Estado.
Levadas essas propostas mesa de negociao e enquanto no se efetivava a compra
da Fazenda Urup, com recursos financeiros do Governo do Estado e da Unio, a
Coordenao do MST, regional de Rondnia, designou uma Comisso de Vistoria formada
de lderes dos posseiro-invasores da rea, para, in loco, irem efetivamente conhecer e avaliar
as potencialidades das terras incrustadas na GJTO, prometidas aos acampados como projeto
de assentamento agroambiental. (GODINHO. Depoimento, 26/12/2013).
27 Ofcio/INCRA/T/N. 139/2000, de 01 de maro de 2000, fls. 101/103, Autos da Ao Civil Pblica
2004.41.00.001887-3, p. 102.
28 Entrevista concedida por GODINHO, Eustquio Chaves. Eustquio Chaves Godinho gravada em 26/12/2013. Entrevistador: Jos Carlos Vitachi. Porto Velho/RO.
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Constituda a comisso de posseiros, o INCRA designou do seu quadro de
colaboradores o tcnico Mrio Lcio Gomes Nascimento29, profundo conhecedor da Gleba,
que l j havia trabalhado por ocasio do georreferenciamento e demarcao. Ele, juntamente
com outro tcnico do INCRA, Joo de Paula Batista e do motorista Zacarias, designados pela
Secretaria de Estado do Desenvolvimento Ambiental de Rondnia SEDAM, encarregaram-
se de levarem os vistoriadores, providenciando transporte, alimentos, enfim, o necessrio
ordem de misso, as expensas do INCRA.
1.2 INSPEO DA GLEBA: MOVIMENTO MST
Ento, como planejado, em dia no precisado do segundo semestre de 1999, inicia-se
a viagem que iriam lev-los, inicialmente, s terras de domnio do Sr. Sebastio Conti Neto e
outros, j que ele havia franqueado ao INCRA e aos visitantes as instalaes da sua fazenda,
propiciando o necessrio para atender aos objetivos da misso, que, como visto, era o de
conhecer e inspecionar a rea oferecida como futuro assentamento dos acampados de Urup.
O deslocamento da Comisso foi feito pela BR-364, sentido Porto Velho/Acre, indo
em direo ao distrito de Mutum Paran, a l65 Km da capital, passando pelo distrito de Jaci-
Paran, ramal 31 de Maro e Jirau. Do distrito de Mutum-Paran seguiu viagem pelo ramal
rodovirio de cho, at a sede da fazenda do Conti Neto, adiante 30 km. L pernoitaram
todos. Mrio Lcio e Zacarias, servidores do INCRA, regressaram na manh seguinte para a
sede da Autarquia, em Porto Velho, ficando de voltar para recambi-los dias depois.
(NASCIMENTO. Depoimento, 26/12/ 2013).
Durante esse tempo, a Comisso inspecionou parte da GJTO andando pelas divisas,
caminhos e ligaes entre ela e a propriedade particular do Sr. Conti Neto, que lhe servia de
apoio. Embrenharam-se mata dentro por caminhos, picadas, divisas, rios, igaps e igaraps.
Da gleba inspecionada colheram, em locais diversos e de diferentes topografias, vrias
amostras de solo, sementes e frutos de rvores encontrados pelo caminho, alm de produtos
agrcolas recebidos de alguns poucos posseiros encontrados nos locais visitados.
A primeira viagem de inspeo foi comandada pelo Tcnico Agrcola do INCRA,
Mrio Lcio Gomes Nascimento, mineiro, transferido de Braslia para trabalhar e residir, em
1977, na regio de Mutum Paran e Nova Mamor, inicialmente no Projeto Sidney Giro. O
seu trabalho era fazer vistorias nos seringais e terras devolutas da Unio, visando estabelecer
29 Entrevista concedida por NASCIMENTO, Mrio Lcio Gomes. Mrio Lcio Gomes Nascimento: entrevista
gravada em 26/12/2013. Entrevistador: Jos Carlos Vitachi. Porto Velho/RO.
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limites e arrecadao de terras devolutas para fins de reforma agrria. Profundo conhecedor
dos seringais de onde foi desmembrada a rea para constituir a GJTO, foi o escolhido para
acompanhar e orientar os visitantes do MST na inspeo da Gleba.
Sobre essa visita consignou o nosso entrevistado, Mrio Lcio Gomes Nascimento:
Declinar nomes eu acho que eu peco, pois eu sou muito ruim de memria e
j faz muitos anos. Mas eu me lembro de que a primeira visita ns fizemos,
que ela foi determinada pelo Presidente, Dr. Antonio Renato, com o
Eustquio, que era o meu chefe da Diviso. Foi determinado para eu levar o
primeiro grupo que era do MST. [...] ns chegamos, colocamos eles l,
fizemos o acampamento e retornamos. Viemos embora para c. Eles ficaram
acampados fazendo reconhecimento, e marcaram o dia de a gente ir busc-
los. No sei dizer quanto tempo, mas foi coisa de pelos menos cindo dias,
estiveram l dentro na regio. A demos pra eles o mapa da regio, com os
pontos de referncias dos rios, n, eram os rios porque tinha mata densa
(NASCIMENTO. Depoimento, 26/12/2013).
Encerrada a vistoria, na data aprazada, a Comisso de Vistoria retornou ao
acampamento de Urup, e, na sequncia, reuniu-se com a Coordenao do MST, relatando o
que viram. Como de regra, foi realizada uma assembleia para a avaliao dos relatos da visita.
Submetidos apreciao dos acampados, principais interessados na proposta escrita do
INCRA, consignada no expediente n 139/2000, ela foi de pronto rechaada. De
consequncia, optaram, definitivamente, permanecerem acampados ali mesmo, num canto da
rea, re