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A SANTA BÍBLIA O PENTATEUCO OS CINCO PRIMEIROS LIVROS DA BÍBLIA (O TESTAMENTO DA ETERNA ALIANÇA) José Haical Haddad CAPÍTULO II O LIVRO DO ÊXODO A ALIANÇA E O POVO DE DEUS 2.1. - OS FILHOS DE ISRAEL TORNAM- SE “POVO” O Livro do Êxodo tem esse nome em virtude de narrar a saída do Egito, ou seja, o êxodo, do então aí formado Povo dos Filhos de Israel, em busca da Terra Prometida. Não só. Integram-no também institui- ções que serviram de fundamento para estruturar tanto a nação israeli- ta como a fé cristã. Quando foi composta a Escritura os cinco primei- ros livros que a compõem (a Torah, ou - os Cinco Quintos da Lei, ou - os Livros de Moisés), eles não tinham a forma atual, nem títulos que os distinguissem e formavam uma unidade. O conjunto tinha a forma de rolo, pois eram enrolados os papiros ou peles de animais em que se escrevia. Dele se extraíam partes para o uso litúrgico e formou-se o cânon, palavra hebraica que significa lei. Com a divisão dele para o uso, eram dispostos em vasos distintos, ou foram se dividindo em cin- co rolos que receberam cada um, os nomes da primeira palavra hebrai- ca com que se iniciavam. Atualmente, os nomes dos livros, que não os dessa Bíblia Hebraica, derivam dos que lhes atribuiu a Versão dos Se- tenta ou Septuaginta, a versão grega. Não há neles uma narração específica, que corresponda somente ao título que trazem, mas se harmonizam no conjunto, e o que se narra num livro quase sempre se iniciou em outro, tem referências com ou- tros adiante ou anteriormente dispostos, obedecendo a uma ordem nem sempre cronológica e nem mesmo lógica. A esse conjunto inicial dos Cinco Quintos da Lei ou a Torah, como são conhecidos na Bíblia He- braica, e que se tornaram cinco livros, deu-se o nome de Pentateuco na versão grega denominada Septuaginta. Já foi visto como José se revelou verdadeiro sábio, tanto como administrador, como no trato político. Também com sua parentela, com as pessoas e no modo como se conduzia em todas as dificuldades que lhe surgiam. Conhecendo a religião de seus familiares e também a do Egito procurou situá-los em região fronteiriça e afastada onde não sofressem a influência idólatra e também evitando desencontros, cho-

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A S A N T A B Í B L I A O P E N T A T E U C O

OS CINCO PRIMEIROS LIVROS DA BÍBLIA (O TESTAMENTO DA ETERNA ALIANÇA)

José Haical Haddad

CAPÍTULO II

O LIVRO DO ÊXODO

A ALIANÇA E O POVO DE DEUS

2.1. - OS FILHOS DE ISRAEL TORNAM-SE “POVO”

O Livro do Êxodo tem esse nome em vi r tude de narrar a saída do

Egi to, ou seja, o êxodo, do então aí formado Povo dos Fi lhos de Israel ,

em busca da Terra Prometida. Não só. Integram -no também inst i tu i -

ções que serviram de fundamento para es t ruturar tanto a nação israel i -

ta como a fé cr is tã . Quando foi composta a Escri tura os cinco prime i-

ros l ivros que a compõem (a Torah, ou - os Cinco Quintos da Lei , ou -

os Livros de Moisés ) , eles não t inham a forma atual , nem t í tulos que

os dis t inguissem e formavam uma unidade. O c onjunto t inha a forma

de rolo , pois eram enrolados os papiros ou peles de an imais em que se

escrevia . Dele se ex traíam par tes para o uso l i túrgico e formou-se o

cânon, palavra hebraica que s ignif ica lei . Com a divisão dele para o

uso, eram dispostos em vasos dis t intos , ou foram se div idindo em cin-

co rolos que receberam cada um, os nomes da primeira palavra hebra i-

ca com que se iniciavam. Atualmente , os nomes dos l ivros, que não os

dessa Bíbl ia Hebraica, derivam dos que lhes at r ibuiu a Versão dos S e-

tenta ou Septuaginta , a versão grega.

Não há neles uma narração específ ica, que corresponda somente

ao t í tulo que t razem, mas se harmonizam no conjunto , e o que se narra

num l ivro quase sempre se iniciou em outro, tem referências com o u-

tros adiante ou anteriormente dispostos , obedecendo a uma ordem nem

sempre cronológica e nem mesmo lógica. A esse conjunto inicial dos

Cinco Quintos da Lei ou a Torah, como são conhecidos na Bíbl ia H e-

braica, e que se tornaram cinco l ivros , deu-se o nome de Pentateuco na

versão grega denominada Septuaginta.

Já fo i vis to como José se revelou verdadeiro sábio, tanto como

adminis t rador, como no t rato pol í t ico . Também com sua parentela,

com as pessoas e no modo como se conduzia em todas as dif iculdades

que lhe surgiam. Conhecendo a rel igião de seus famil iares e ta mbém a

do Egi to procurou s i tuá -los em região f ronteir iça e afastada onde não

sofressem a influência idólatra e também evi tando desencontros , ch o-

2

ques entre seus antagonis tas , buscando sempre a possibi l idade de paz ,

harmonia e conc i l iação:

" D e p o i s d i s s e J o s é a s e u s i r m ã o s , e à c a s a d e s e u p a i : E u s u b i r e i e i n f o r m a r e i a F a r a ó , e l h e d i r e i : M e u s i r m ã o s e a c a s a d e m e u p a i , q u e e s t a v a m n a t e r r a d e

C a n a ã , v i e r a m p a r a m i m . O s h o m e n s s ã o p a s t o r e s , q u e s e o c u p a m e m a p a s c e n t a r

g a d o ; e t r o u x e r a m o s s e u s r e b a n h o s , o s e u g a d o e t u d o o q u e t ê m . Q u a n d o , p o i s , F a r a ó v o s c h a m a r e v o s p e r g u n t a r : Q u e o c u p a ç ã o é a v o s s a ? R e s p o n d e r e i s : N ó s ,

t e u s s e r v o s , t e m o s s i d o p a s t o r e s d e g a d o d e s d e a n o s s a m o c i d a d e a t é a g o r a , t a n -

t o n ó s c o m o n o s s o s p a i s . I s s o d i r e i s p a r a q u e h a b i t e i s n a t e r r a d e G e s s e n ; p o r -q u e t o d o p a s t o r d e o v e l h a s é a b o m i n a ç ã o p a r a o s e g í p c i o s " ( G n 4 6 , 3 1 - 3 4 ) .

Com essa astuta argumentação soube se impor ao Faraó e conse-

guir neutral izar qualquer reação negat iva à acei tação deles , pois tendo

s ido pastores e nômades em Canaã, er am até certo ponto , indesejáveis .

Porém, indo habi tar em lugar afastado e fronteir iço, viu-se que não

pretendiam fixar morada nem perturbar a vida pastori l dos egípcios .

Convencido, o Faraó até recomendou que se entregasse o seu r ebanho

à adminis t ração de um deles que fosse capaz (Gn 47,5 -6) . A Tribo de

Is rael se deslocava para o Egi to em si tua ção perigosa e opressora e t i -

nha pleno conhecimento do regime econômico e pol í t ico escravocra ta ,

e f icaria cercada de antagon ismos principalmente no r el igioso:

" . . . R e s p o n d e u M o i s é s : N ã o c o n v é m q u e a s s i m s e f a ç a , p o r q u e é a b o m i n a ç ã o a o s

e g í p c i o s o q u e h a v e m o s d e o f e r e c e r a I a h w e h n o s s o D e u s . S a c r i f i c a n d o a a b o m i -n a ç ã o d o s e g í p c i o s p e r a n t e o s s e u s o l h o s , n ã o n o s a p e d r e j a r ã o e l e s ? . . . " ( E x

8 , 2 1 - 2 3 ) .

O antagonismo entre o s cul tos seria capaz de impedir a conv i-

vência pacíf ica e, pior que tudo, comprometer a sat isfação das ex igê n-

cias monolátr icas da Aliança. Os Hebreus , desde os Patr iarcas , e t radi-

cionalmente se dis t inguiam da cul tura idólatra da época , tanto no cul to

como na conduta e comportamento de cada um. Não a doravam ídolos

ou imagens, mas o Deus Vivo, uma Pessoa.

O problema social que se originara da organização econômica do

Egi to foi ideal izado e ut i l izado pelo próprio José para superar a cr ise

de al imentos de carát er universal . A fome foi tamanha que os egípcios

acabaram por t rocar pelo al imento o próprio rebanho e até mesmo as

propriedades, t ransferindo tudo ao Faraó e chegando o povo a ser re-

duzido à servidão (cfr . Gn 47,13 -27). José cr iou então um sis tema e-

conômico a que todos se sujei taram com uma única exceção : os sacer-

dotes . Por tal s is tema todo o solo egípcio passou à propriedade sob e-

rana do Faraó, num sis tema que não impedia a p ropriedade part icular

(Gn 47,27) , e de toda a produção entregava um quinto ( vinte por cen-

to ) ao Faraó. Era uma espécie de servidão muito próxima da co rvéia da

Idade Média. Regime este que passou a vigorar até mesmo após a cr ise

quando foi composta a narrat iva, muito tempo depois (cfr . " . . . a té o

dia de hoje . . . " – Gn 47,26). Mas, os Fi lhos de Is rael f ica ram isentos

desse regime enquanto foi possível manter a tutela de J osé:

" J o s é , p o i s , e s t a b e l e c e u i s t o p o r e s t a t u t o q u a n t o a o s o l o d o E g i t o , a t é o d i a d e

h o j e , q u e a o F a r a ó c o u b e s s e o q u i n t o d a p r o d u ç ã o ; s o m e n t e a t e r r a d o s s a c e r d o -

t e s n ã o f i c o u s e n d o d e F a r a ó . A s s i m h a b i t o u I s r a e l n a t e r r a d o E g i t o , n a t e r r a d e G e s s e n ; e n e l a a d q u i r i r a m p r o p r i e d a d e s , e f o r a m f e c u n d o s e m u l t i p l i c a r a m - s e

m u i t o " ( G n 4 7 , 2 6 - 2 7 ) .

3

Já se viu que naquele tempo cada povo t inha um deus ou cada

deus t inha o seu povo e seu terr i tório. Dist inguia -se um povo pelo

deus que adorava e servia. Enquanto vivo , José cuidou dos i rmãos e

suas famíl ias (Gn 47,11 -12):

" M o r r e u , p o i s , J o s é , e t o d o s o s s e u s i r m ã o s , e t o d a a q u e l a g e r a ç ã o . O s f i l h o s d e I s r a e l f r u t i f i c a r a m e a u m en t a r a m m u i t o , m u l t i p l i c a r a m - s e e t o r n a r a m - s e s o b r e -

m a n e i r a f o r t e s , d e m o d o q u e a t e r r a s e e n c h e u d e l e s . L e v a n t o u - s e s o b r e o E g i t o

u m n o v o r e i , q u e n ã o c o n h e c e r a a J o s é . D i s s e e l e a o s e u p o v o : E i s q u e o P o v o d o s F i l h o s d e I s r a e l é m a i s n u m e r o s o e m a i s f o r t e d o q u e n ó s " ( E x 1 , 6 - 9 ) .

Vale a pena repet i r : "Eis o Povo dos Fi lhos de Israel . . . " - apesar

do regime econômico servi l em que todos viviam no Egi to, os Fi lhos

de Israel foram reconhecidos pelo Faraó como povo , pois fecundos que

eram tornaram-se numerosos, permaneceram fiéis ao seu Deus e não se

submeteram aos deuses do Egi to. Formaram então o Povo dos Fi lhos

de Israel que se es t ruturou de manei ra ind ependente, tendo até mesmo

o seu próprio Conselho de Anciãos (Ex 3,16/ Ex 4,29) e já se inaug u-

rando o "cumprimento" da Promessa a Abrão:

" E u f a r e i d e t i g r a n d e p o v o . . . " ( G n 1 2 , 2 ) / “ T o r n a r - t e - e i s o b r e m a n e i r a f e c u n d o e

d e t i f a r e i n a ç õ e s , e r e i s s a i r ã o d e t i " ( G n 1 7 , 6 ) .

" . . . mais numeroso e mais forte do que nós ", pela fecundidade já

anunciada a Abrão e impressa por Deus com vis tas à Aliança é agora

concentrada na formação do Povo dos Fi lhos de Israel . Não se tem r e-

gis t ro oficial da população , nem foi prat icado nenhum recenseame nto.

Então, o "mais numeroso do que nós " poderia ter s ido uma força de

expressão usada pelo Faraó para seduzir os egípcios à perseguição que

se anunciava. Mesmo assim , ter ia de se apoiar e se apoiou no fato i n-

contestável de que realmente foi " mais forte que nós" e não aband onou

a sua fé para servir aos deuses egípcios , nem se deixou submeter . Ape-

sar da servidão imposta pelo regime criado por José até mesmo adqu i-

rem propriedades, o que evidencia o seu progresso e desenvolv imento

(Gn 47,27b). Além disso, aumenta a opressão deles (Ex 1,11-14) e in i -

cia uma s is temát ica perseguição para tentar inut i lme nte impedir sua

prol i feração e d esenvolvimento econômico:

" E i a , u s e m o s d e a s t ú c i a p a r a c o m e l e , p a r a q u e n ã o s e m u l t i p l i q u e , e a c o n t e ç a

q u e , v i n d o g u e r r a , e l e t a m b é m s e a j u n t e c o m o s n o s s o s i n i m i g o s , e p e l e j e c o n t r a n ó s e s e r e t i r e d a t e r r a . P o r t a n t o , p u s e r a m s o b r e e l e s f e i t o r e s , p a r a o s a f l i g i r e m

c o m s u a s c a r g a s . A s s i m , o s i s r a e l i t a s e d i f i c a r a m p a r a F a r a ó c i d a d e s a r m a z é n s ,

P i t o m e R a m s é s . M a s q u a n t o m a i s o s e g í p c i o s a f l i g i a m o p o v o d e I s r a e l , t a n t o m a i s e s t e s e m u l t i p l i c a v a e s e e s p a l h a v a ; d e m a n e i r a q u e o s e g í p c i o s s e p r e o c u -

p a v a m p o r c a u s a d o s f i l h o s d e I s r a e l . P o r i s s o , o s e g í p c i o s f a z i a m o s f i l h o s d e

I s r a e l s e r v i r c o m d u r e z a ; a s s i m l h e s a m a r g u r a v a m a v i d a c o m p e s a d o s s e r v i ç o s e m b a r r o e e m t i j o l o s , e c o m t o d a s o r t e d e t r a b a l h o n o c a m p o , e n f i m c o m t o d o o

s e u s e r v i ç o , e m q u e o s f a z i a m s e r v i r c o m d u r e z a " ( E x 1 , 1 0 - 1 4 ) .

" . . . os egípcios faz iam os f i lhos de Israel servir com dureza; a s-

s im lhes amarguravam a vida com pesados serviços em barro e em t i j o-

los , e com toda sorte de t rabalho no campo, enfim com todo o seu ser-

viço, em que os faz iam servir com dureza ", repet indo proposi tadame n-

te o f inal da t ranscr ição, para se veri f icar que o regime de servidão a

que foram submetidos at ingia toda a ex tensa gama profiss ional de t r a-

balho, não só nos t i jolos do exemplo es colhido pelo narrador (Ex 5,6 -

4

14). Mas, mesmo assim, temia o Faraó que o povo se al iasse a alguma

nação est rangeira e, em vir tude da local ização fronteir iça, i sso faci l i -

tasse a saída do país (Ex 1,10). Provocar -se-ia, então, a evasão de mão

de obra barata e servi l , e daquele imposto de um quinto da prod ução e

do t rabalho, com grande perda econômica. Não pode ser outro o mot i -

vo de tanta preocupação e de tanta providência es t remada , pois a eva-

são deles do país causaria sério t ranstorno ao Egi to, po is a despei to da

opressão , os israel i tas eram bastante produt ivos:

" P o r t a n t o , p u s e r a m s o b r e e l e s f e i t o r e s , p a r a o s a f l i g i r e m c o m s u a s c a r g a s . A s -s i m o s i s r a e l i t a s ed i f i c a r a m p a r a F a r a ó c i d a d e s a r m a z é n s , P i t o m e R a m s é s " ( E x

1 , 1 1 ) .

Mas, como soe acontecer com um povo geralmente perseguido,

quanto mais era opr imido mais se desenvolvia e crescia , tanto em nú-

mero como se integrava nele o sent imento de unidade, for talecendo -

lhe a res is tência. Não sat isfei to e para impedir maior prol i feração , o

Faraó determinou o ex termíni o dos meninos nasci turos . Porém não o

consegue, em vir tude de uma qual idade das "mulheres hebréias que

davam à luz antes que cheguem as parte i ras" (Ex 1,19). Mesmo assim,

aumentava e se tornava mais res is tente , obrigando o Faraó a medidas

ex tremas (Ex 1,20-22). Contorcendo -se no mundo de pecado , o Povo

dos Fi lhos de Israel amadurecia no sofr imento e cada vez mais tomava

consciência de sua unidade na fé, e mais se fortal ecia. Essa opressão

durou, o que se comprova pelo tempo decorrido em se modificarem

providências diversas , em constatar - lhes a ineficácia (Ex 1,11s / 1 ,15 /

1 ,22) e até mesmo suficiente s para se puder reconhecer a Bênção de

Deus às partei ras que protegeram a mulher hebréia, "dando -lhes uma

posteridade" (Ex 1,15 -21).

2.2. - O POVO DOS FILHOS DE ISRAEL E MOISÉS

Nesse cl ima nasce um menino da Tribo de Levi mant ido ocul to

enquanto pôde, até que foi colocado num cesto calafetado e deixado

quase à deriva no Nilo , no local “onde a f i lha do Faraó se banhava ” .

Encontrando-o, ela adotou-o e o entregou , sem saber , à própria mãe,

chamada pela i rmã dele que a tudo presenciava , para amamentá-lo e o

devolver quando desmamasse (Ex 2,1 -10). Recebe o nome de Moisés

(= saído das águas) e foi cr iado na cor te faraônica depois de desm a-

mado, fato comprovado pela t r adição israel i ta (Ex 11,3 / At 7 ,21). P o-

rém, junto com o le i te materno a mãe o "amamentou" com a sua or i -

gem, his tória, raça, nacional idade e, p rincipalmente, com a fé em Ia h-

weh, o Deus de Abraão, Isaac e Jacó, o Deus da Promessa e da Al iança

que os dis t inguia como Povo de Iahweh:

" P e l a f é M o i s é s , l o g o a o n a s c e r , f o i e s c o n d i d o p o r s e u s p a i s d u r a n t e t r ê s m e s e s ,

p o r q u e v i r a m q u e o m e n i n o e r a f o r m o s o ; e n ã o t e m e r a m o d e c r e t o d o r e i " ( H b

1 1 , 2 3 ) .

Moisés , da Tribo de Levi embora mal vis ta pelo pai Jacó com a

dest i tezerro uição da primogeni tura (Gn 49,5 -7) , é quem vai comandar

a l ibertação de Is rael das garras dos egípcios , conduzi - los até a Terra

5

Prometida e cumprir ass im a Promessa fei ta a Abraão (Gn 12,7; 13,15;

15,18; 17,8) . Outra t radição israel i ta viu esse tempo de Moisés com

mais profundidade que a narrat iva em tela, e oferecendo mais detalhes:

" E n q u a n t o s e a p r o x i m a v a o t e m p o d a p r o m e s s a q u e D e u s t i n h a f e i t o a A b r a ã o , o p o v o c r e s c i a e s e m u l t i p l i c a v a n o E g i t o ; a t é q u e s e l e v a n t o u a l i o u t r o r e i , q u e

n ã o t i n h a c o n h e c i d o J o s é . U s a n d o e s s e d e a s t ú c i a c o n t r a a n o s s a r a ç a , m a l t r a t o u

a n o s s o s p a i s , a p o n t o d e f a z ê - l o s e n j e i t a r s e u s f i l h o s , p a r a q u e n ã o v i v e s s e m . N e s s e t e m p o n a s c e u M o i s é s , e e r a m u i f o r m o s o , e f o i c r i a d o t r ê s m e s e s e m c a s a

d e s e u p a i . S e n d o e l e e n j e i t a d o , a f i l h a d e F a r a ó o r e c o l h e u e o c r i o u c o m o s e u

p r ó p r i o f i l h o . A s s i m M o i s é s f o i i n s t r u í d o e m t o d a a s a b e d o r i a d o s e g í p c i o s , e e r a p o d e r o s o e m p a l a v r a s e o b r a s " ( A t 7 , 1 7 - 2 2 ) .

Deus não se sujei ta às convenções dos homens e mesmo que às

vezes se integrem em Seus Desígnios fará sempre o que for preciso p a-

ra at ingi - los . É o que dirá a Moisés: " . . . terei misericórdia de quem eu

t iver misericórdia, e me compadecerei de quem me compadecer" (Ex

33,19), e o escolhe apesar de todas as oposições cul turais . Moi sés sa-

cri f ica todo o seu conforto na corte faraônica e se esforça para se i m-

por como l íder israe l i ta:

" P e l a f é M o i s é s , s e n d o j á h o m e m , r e c u s o u s e r c h a m a d o f i l h o d a f i l h a d e F a r a ó ,

e s c o l h e n d o a n t e s s e r m a l t r a t a d o c o m o p o v o d e D e u s d o q u e t e r p o r a l g u m t e m p o o g o z o d o p e c a d o , t e n d o p o r m a i o r e s r i q u e z a s o o p r ó b r i o d e C r i s t o d o q u e o s t e -

s o u r o s d o E g i t o ; p o r q u e t i n h a e m v i s t a a r e c o m p e n s a . P e l a f é d e i x o u o E g i t o ,

n ã o t e m e n d o a i r a d o r e i ; p o r q u e f i c o u f i r m e , c o m o q u e m v ê a q u e l e q u e é i n v i -s í v e l ( H b 1 1 , 2 4 - 2 7 ) .

A formação na corte faraônica facul tou -lhe um conhecimento à

al tura de sua missão , bem como a famil iar idade com os inimigos de

seu povo, propiciando-lhe a visão necessária para a sua l ibertação, e

para a sat isfação e cumprimento da Aliança de Abraão. Assi m como os

homens sempre se opõem aos Desígnios de Deus por causa do dese n-

contro causado pelo pecado, seus i rmãos Is rael i tas se opuseram à l id e-

rança de Moisés . Isso porque, cul tura lmente, não se encaixava nas

normas da primogeni tura outorgada por Jacó a out ra t r ibo que a de Le-

vi . Não foi acei to como l íder pelos israel i tas apesar de sua demonstr a-

ção de lealdade, arr iscando a sua sorte por causa de um irmão de raça

que sofr ia nas mãos do capataz opressor. Essa mesma prova foi - lhes

dada também por ter abandonad o a sua posição de príncipe, adotado

que foi pela f i lha do Faraó, possível candidato à sucessão do t rono.

Envolve-se tanto que, tendo matado o capataz egípcio que mal t ratava

um hebreu, acaba por fugir para a Terra de Madiã (Ex 2,11 -15 ) , j unto

de sua parente la (Gn 25,2) , perseguido pe lo Faraó que r esolveu matá-lo:

" A s s i m M o i s é s f o i i n s t r u í d o e m t o d a a s a b e d o r i a d o s e g í p c i o s , e e r a p o d e r o s o e m p a l a v r a s e o b r a s . O r a , q u a n d o e l e c o m p l e t o u q u a r e n t a a n o s , v e i o - l h e a o c o -

r a ç ã o v i s i t a r s e u s i r m ã o s , o s f i l h o s d e I s r a e l . E v e n d o u m d e l e s s o f r e r i n j u s t a -

m e n t e , d e f e n d e u - o , e v i n g o u o o p r i m i d o , m a t a n d o o e g í p c i o . C u i d a v a q u e s e u s i r m ã o s e n t e n d e r i a m q u e , p o r m ã o d e l e , D e u s l h e s h a v i a d e d a r a l i b e r d a d e ; m a s

e l e s n ã o e n t e n d e r a m . N o d i a s e g u i n t e , a p a r e c e u - l h e s q u a n d o b r i g a v a m , e q u i s

l e v á - l o s à p a z , d i z e n d o : ' H o m e n s , s o i s i r m ã o s ; p o r q u e v o s m a l t r a t a i s u m a o o u -t r o ? ' M a s o q u e f a z i a i n j u s t i ç a a o s e u p r ó x i m o o r e p e l i u , d i z e n d o : ' Q u e m t e

c o n s t i t u i u s e n h o r e j u i z s o b r e n ó s ? A c a s o q u e r e s t u m a t a r - m e , c o m o o n t e m m a -

t a s t e o e g í p c i o ? ' A e s t a p a l a v r a f u g i u M o i s é s , e t o r n o u - s e p e r e g r i n o n a t e r r a d e M a d i ã , o n d e g e r o u d o i s f i l h o s " ( A t 7 , 2 2 - 2 9 ) .

Aí , junto a um poço encontra, tal como aconteceu com Isaac e

Jacó, as f i lhas de um sacerdote, defende -as de um bando que as imp e-

6

dia, e deu de beb er ao rebanho. Por causa desse gesto, é acolhido pelo

pai , e futuramente se casa com uma delas que lhe deu o f i lho Gerson

(Ex 16,22) e outro El iezer (Ex 18,4) . Moisés , em vir tude da sua opção,

também passa pelas mesmas viciss i tudes por que passaram os Patr iar-

cas para aquele amadurecer que lhes viera pelo sofr i mento, até que

Deus se lembre de sua Promessa e da Al iança:

" D e c o r r i d o m u i t o t e m p o , m o r r e u o r e i d o E g i t o ; e o s f i l h o s d e I s r a e l g e m i a m d e b a i x o d a s e r v i d ã o , c l a m a r a m , e s u b i u a D e u s o s e u c l a m o r p o r c a u s a d a s e r v i -

d ã o . E n t ã o D e u s , o u v i n d o - l h e s o s g e m i d o s , l e m b r o u - s e d a s u a A l i a n ç a c o m A -

b r a ã o , c o m Is a a c e c o m J a c ó . E v i u D e u s o s f i l h o s d e I s r a e l , e D e u s o s c o n h e -c e u " ( E x 2 , 2 3 - 2 5 ) .

Ce r to d i a , Moisés apascentava o rebanho de seu sogro, e at ingindo

o Monte Sinai ( também conhecido por Monte Horeb) percebe “a moita

de sarça que ardia em chamas, mas não se consumia”, mantendo -se

com o seu verdor apesar da voracidade do fogo. Aproxima -se para ob-

servar melhor o fenômeno (Ex 3,2 -3) , quando então ouve o chamado

de Deus para l iber ta r “ . . . o meu povo, os f i lhos de Is rael ”:

" E v e n d o Ia h w e h q u e e l e s e v i r a r a p a r a v e r , c h a m o u - o d o m e i o d a s a r ç a , e d i s s e :

M o i s é s , M o i s é s ! R e s p o n d e u e l e : E i s - m e a q u i . P r o s s e g u i u D e u s : N ã o t e c h e g u e s p a r a c á ; t i r a o s s a p a t o s d o s p é s ; p o r q u e o l u g a r e m q u e t u e s t á s é t e r r a s a n t a .

D i s s e m a i s : E u s o u o D e u s d e t e u p a i , o D e u s d e A b r a ã o , o D e u s d e I s a a c , e o

D e u s d e J a c ó . E M o i s é s e s c o n d e u o r o s t o , p o r q u e t e m e u o l h a r p a r a D e u s . E n t ã o d i s s e Ia h w e h : C o m e f e i t o , t e n h o v i s t o a a f l i ç ã o d o m eu p o v o , q u e e s t á n o E g i t o ,

e t e n h o o u v i d o o s e u c l a m o r p o r c a u s a d o s s e u s o p r e s s o r e s , p o r q u e c o n h e ç o o s

s e u s s o f r i m e n t o s ; e d e s c i p a r a o l i v r a r d a m ã o d o s e g í p c i o s , e p a r a o f a z e r s u b i r d a q u e l a t e r r a p a r a u m a t e r r a b o a e e s p a ç o s a , p a r a u m a t e r r a q u e m a n a l e i t e e

m e l . . . E a g o r a , e i s q u e o c l a m o r d o s f i l h o s d e I s r a e l é v i n d o a m i m ; e t a m b é m

t e n h o v i s t o a o p r e s s ã o c o m q u e o s e g í p c i o s o s o p r i m e m . A g o r a , p o i s , v e m e e u t e e n v i a r e i a F a r a ó , p a r a q u e t i r e s d o E g i t o o m e u p o v o , o s f i l h o s d e I s r a e l " ( E x

3 , 4 - 1 0 ) .

Mas, tal como acontece geralmente com o elei to , a primeira rea-

ção de Moisés foi de temor ante a missão à qual Deus o dest inava. A s-

sim é. Já era perseguido pela idéia de l ibertar o seu povo e agora o

próprio Deus a determina. Assusta -se mais que pelo compromisso i n-

compreensível que, em face da missão específ ica e sagrada oriunda d i-

retamente de Iahweh, e comprometido pelo sent imento de impotência

pert inente à dimensão então emergente da origem e necessária ao seu

cumprimento. Ao perceber a envergadura da Obra Divina a que é con-

vocado, o elei to t reme e teme. Há uma enorme provação numa dif íci l e

dura fase da vida, num período de dif iculdades em que sente tudo

desmoronar dentro e em torno de s i , res tando -lhe apenas Deus pela fé.

Sent ia-se t raído, rejei tado que fora pelos seus i rmãos de raça e em f u-

ga por ter , também ele, t raído a corte do Faraó. É como um náufrago,

sozinho em al to mar e em plena t reva noturna, tão negra que nada se

percebe a não ser uma tênue luz de esperança a lhe apon tar a única d i-

reção do chamado de Deus.

É o ponto culminante e crucial da fé. Só lhe resta es sa fé num

lance de consciência a lhe manter viva a esperança em um ideal há

muito al imentado e até então recusado. Começa sua caminhada no se n-

t ido de Deus e então se equi l ibra e se l iberta de tudo. S ó quem é l ivre

pode desempenhar uma missão que nasce na int imidade de Deus. Só

quem é l ivre pode v iver em comunhão e unidade com Deus. Só quem é

7

l ivre l iberta. E, ass im, l ivre de qualquer peia torna -se presa fáci l para

Deus que só entra num coração l i vre e vazio de tudo e es tabelece com

o seu elei to um diálogo ínt imo em que se dá a conhecer por intei ro, e

até informa o próprio nome, como se dis t i ngue:

" E n t ã o M o i s é s d i s s e a D e u s : Q u e m s o u e u , p a r a q u e v á a F a r a ó e t i r e d o E g i t o o s f i l h o s d e I s r a e l ? R e s p o n d e u - l h e D e u s : C e r t a m e n t e e u e s t a r e i c o n t i g o ; e i s t o

t e s e r á p o r s i n a l d e q u e e u t e e n v i e i : Q u a n d o h o u v e r e s t i r a d o d o E g i t o o m e u

p o v o , s e r v i r e i s a D e u s n e s t e m o n t e . E n t ã o d i s s e M o i s é s a D e u s : E i s q u e q u a n d o e u f o r a o s f i l h o s d e I s r a e l , e l h e s d i s s e r : O D e u s d e v o s s o s p a i s m e e n v i o u a

v ó s ; e e l e s m e p e r g u n t a r e m : Q u a l é o s e u n o m e ? Q u e d i r e i ? R e s p o n d e u D e u s a

M o i s é s : E u - I a ( S o u - o m i t i d o ) E l e - h w e h ( E l e = “ o D e u s d e v o s s o s p a i s , o D e u s d e A b r a ã o , o D e u s d e I s a a c , e o D e u s d e J a c ó ” , e m h e b r a i c o Ia h w e h , s a -

b e n d o - s e n ã o s e u s a a p r i m e i r a p e s s o a d o v e r b o s e r ) . D i s s e m a i s : A s s i m d i r á s

a o s f i l h o s d e I s r a e l : I a h w e h m e e n v i o u a v ó s . E D e u s d i s s e m a i s a M o i s é s : A s -s i m d i r á s a o s f i l h o s d e I s r a e l : I a h w e h , o D e u s d e v o s s o s p a i s , o D e u s d e A b r a ã o ,

o D e u s d e I s a a c , e o D e u s d e J a c ó , m e e n v i o u a v ó s ; e s t e é o m e u n o m e e t e r n a -

m e n t e , e e s t e é o m e u m e m o r i a l d e g e r a ç ã o e m g e r a ç ã o " ( E x 3 , 1 1 - 1 5 ) .

" Is to te será por s inal de que eu te enviei : Quando houveres t i r a-

do do Egi to o meu povo, servireis a Deus neste monte", foi o s inal d a-

do por Deus a se real izar no futuro e acei to absurdamente por Mo isés ,

a não ser que se expl ique por um ato de profunda fé, cuja s imples a-

f i rmação de Deus, "certamente eu estarei cont igo", lhe foi suf iciente.

Com a mesma fé de Abraão, Isaac e Jacó, Moisés pro ssegue seu cami-

nho na real ização da Aliança. Por outro lado, e da mesma forma, o ". . .

mais numeroso e mais forte do que nós" (Ex 1,9) torna-se temido pelo

Faraó, não apenas em vir tude do número de pessoas, mas sobretudo pe-

lo modo part icular , especial e pec ul iar da fé, da vida em comum e da

unidade de seus membros em que muito se dis t inguia.

Realmente. É um povo já organizado, consciente de sua un idade,

tendo até mesmo chefes dis t intos daqueles do Egi to a quem obedecia.

Só lhe fal tava a independência oficia l para se l ibertar , se desmembrar

e se desenvolver . Dessa maneira tornou -se impossível mantê -lo cat ivo,

e oprimido:

" V a i , a j u n t a o s a n c i ã o s d e I s r a e l e d i z e - l h e s : I a h w e h , o D e u s d e v o s s o s p a i s , o

D e u s d e A b r a ã o , d e I s a a c e d e J a c ó , a p a r e c e u - m e , d i z e n d o : c e r t a m e n t e v o s t e n h o

v i s i t a d o e v i s t o o q u e v o s t e m s i d o f e i t o n o E g i t o ; e t e n h o d i t o : F a r - v o s - e i s u b i r d a a f l i ç ã o ( . . . ) p a r a u m a t e r r a q u e m a n a l e i t e e m e l . E o u v i r ã o a t u a v o z . . . " ( E x

3 , 1 6 - 1 8 a ) .

Os Fi lhos de Jacó t inham uma fé comum, um a única fé, a fé dos

pais , cr ia e esperava num único e mesmo Iahweh, "o Deus („v ivo‟) de

Abraão, de Isaac e de Jacó", a quem cul tuavam e eram fié is , f ruto de

uma t ransmissão oral de quatrocentos anos, mant ida viva e f iel (Gn

15,13). Os hebreus mant iveram oralmente a fé dos antepassados, v i -

vendo em ter ra es t ranha e alheia como peregrinos. Não sendo assim

não ter ia sent ido dizer - lhes , nem seria compreendido que se t ratava de

"o Deus de vossos pais , o Deus de Abraão, o Deus de Isaac, o Deus de

Jacó":

" E o u v i r ã o a t u a v o z e i r á s , t u e o s a n c i ã o s d e I s r a e l , a o r e i d o E g i t o , e d i r - l h e -

e i s : I a h w e h , o D e u s d o s h e b r e u s , e n c o n t r o u - n o s . A g o r a , p o i s , d e i x a - n o s i r a c a -

m i n h o d e t r ê s d i a s p a r a o d e s e r t o , p a r a q u e o f e r e ç a m o s s a c r i f í c i o s a Ia h w e h n o s s o D e u s " ( E x 3 , 1 8 ) .

8

Conheciam a própria his tória e com confiança em seu futuro a-

guardavam a própria independência, o único fator latente para, l ibe r -

tos , tornarem-se um povo, o Povo da Aliança de Abraão e herdeiros da

Terra Prometida:

" E n t ã o d i s s e Ia h w e h a A b r ã o : S a b e s c o m c e r t e z a q u e a t u a d e s c e n d ê n c i a s e r á p e -r e g r i n a e m t e r r a a l h e i a , e s e r á r e d u z i d a à e s c r a v i d ã o , e s e r á a f l i g i d a p o r q u a t r o -

c e n t o s a n o s ; s a b e t a m b é m q u e e u j u l g a r e i a n a ç ã o a q u a l e l a t e m d e s e r v i r ; e d e -

p o i s s a i r á s c o m m u i t o s b e n s " ( G n 1 5 , 1 3 - 1 4 ) .

Juntamente com a Promessa e a Ali ança , esse aviso estava enra i-

zado em sua própria índole e consciência, e integrou -se à sua cul tura

pela esperança que deposi tavam em Iahweh Deus, causa de sua doci l i -

dade e paciência em toda a servidão. Acredi tavam que os l ibertar ia

("i r ia fazê-los subir da af l ição do Egi to [ . . . ] para uma terra que mana

lei te e mel " - Ex 3,17). Era esse o mot ivo pelo qual apesar de perse-

guidos e oprimidos , sent iam-se totalmente l ivres , vivendo já em figura

a "gloriosa l iberdade dos Fi lhos de Deus " (Rm 8,21). Liberdade que se

t raduz mais no sent ido da vinculação do H omem ao seu Criador do que

uma expressão do direi to de prat icar soberanamente atos l íci tos .

Quando o Homem se vincula a Deus torna -se l ivre, só se submetendo a

algo enquanto essa submissão não perturbar aquela comu nhão. Quando

essa l iberdade se apresenta em grupo humano homogêneo e organizado

torna-se vir tual desassossego a ameaçar a t ranq ui l idade gera l de outros

agrupamentos. Os hebreus no Egi to chegaram a ameaçar até a pr ópria

segurança nacional pela unidade que d eles emanava, unidade de fé e

unidade de esperança, já que se temia a sua união com os inimigos (Ex

1,10). Não era a força deles , mas a coesão que emana da fé coerente

que se i rradiava em t emor. .

Os Hebreus const i tuí ram -se em povo que se tornou numeroso,

poderoso e l ivre a ponto de não se submeter aos cul tos dos egípcios

nem aos seus costumes pagãos. Naquele tempo , o povo dominado sub-

metia-se ao deus do povo dominante. Não acei tando o cu l to idólat ra

deles se tornaram incômodos, os const rangiam e cada vez mais se se-

paravam, se dis t inguindo em dois povos dis t intos . Quando a fé ou o

cul to não é comum não pode haver unidade his tórica, nem nacional , e

a consequência é o antagonismo mútuo, donde a perseguição ensej ada.

Mais do que a opressão f ís ica e psicológica a que os submetiam sofr i -

am outra os Israel i tas , bem caracterizada no pedido ao far aó :

" A g o r a , p o i s , d e i x a - n o s i r c a m i n h o d e t r ê s d i a s p a r a o d e s e r t o , p a r a q u e o f e r e -

ç a m o s s a c r i f í c i o s a Ia h w e h n o s s o D e u s " ( E x 3 , 1 8 ) .

Não podiam oferecer seus sacri f ícios , pois os animais , as ví t imas

que ofereciam a Deus , eram deuses para os egípcios , o que lhes era

abominável , ofensivo e ul t rajante , pois adoravam o boi , o carneiro e

outros animais , imoláveis pelos israel i tas :

" E n t ã o c h a m o u F a r a ó a M o i s é s e a A a r ã o , e d i s s e : I d e , e o f e r e c e i s a c r i f í c i o s a o

v o s s o D e u s n e s t a t e r r a . R e s p o n d e u M o i s é s : N ã o c o n v é m q u e a s s i m s e f a ç a , p o r -

q u e é a b o m i n a ç ã o a o s e g í p c i o s o q u e h a v e m o s d e o f e r e c e r a o S e n h o r n o s s o D e u s . S a c r i f i c a n d o n ó s a a b o m i n a ç ã o d o s e g í p c i o s p e r a n t e o s s e u s o l h o s , n ã o

n o s a p e d r e j a r ã o e l e s ? H a v e m o s d e i r a c a m i n h o d e t r ê s d i a s a o d e s e r t o , p a r a q u e

o f e r e ç a m o s s a c r i f í c i o s a o S e n h o r n o s s o D e u s , c o m o e l e n o s o r d e n a r " ( E x 8 , 2 1 -2 3 ) .

9

"Sacri f icando nós a abominação dos egípcios perante os seus o-

lhos não nos apedrejarão eles?" Aí es tá o fundamento do antagonismo

entre ambos, da perseguição encetada pelos egípcios e da opressão s o-

fr ida pelos israel i tas : a fal ta de l iberdade de cul to t raduzida na impo s-

sibi l idade de oferecimento de sacri f íc ios . O centro gravi tacional do

cul to desde os Patr iarcas torna -se uma "a abominação aos olhos dos

egípcios". Essa foi a opressão real sofr ida pelos Israel i tas , e não a

servidão f ís ica. Ocorria ainda aqui um natural ciúme do Faraó, t ido e

havido entre eles como um deus ou o f i lho de um deus, bem co mo a

necessidade cul tural de se demonstrar qual dos deuses era mais pod e-

roso. Porém isso era desnecessário para o israel i ta , pois a sua fé já f o-

ra comprovadamente demonstrada por uma esperança al icerçada na paz

e na concórdia, e pela própria submissão há ta nto tempo provada. S a-

bia que Iahweh, o seu Deus, avisa de antemão a dureza da missão in i -

ciada e da vi tória f inal , deixando claro ser Ele o principal protagonis ta

da luta a ser t ravada. Não seria fáci l a l ibertação “. . . a não ser por uma

forte mão”, a mão de Deus, pela qual ela vir ia inexoravelmente. Ia h-

weh Deus anuncia e avisa que “ estenderei a minha mão , e fer i rei o E-

gi to com todos os meus prodígios”, e “depois vos deixará i r” . E, ve n-

ceria:

" E u s e i , p o r é m , q u e o r e i d o E g i t o n ã o v o s d e i x a r á i r , a n ão s e r p o r u ma fo r t e mão. P or t an to es t en d er e i a m in h a mão , e f e r i r e i o E g i t o c o m t o d o s o s m e u s p r o d í -

g i o s q u e f a r e i n o m e i o d e l e . D e p o i s v o s d e i x a r á i r . E e u d a r e i g r a ç a a e s t e p o v o

a o s o l h o s d o s e g í p c i o s ; e a c o n t e c e r á q u e , q u a n d o s a i r d e s , n ã o s a i r e i s d e m ã o s v a z i a s . P o r q u e c a d a m u l h e r p e d i r á à s u a v i z i n h a e à s u a h ó s p e d e j ó i a s d e p r a t a e

j ó i a s d e o u r o , b e m c o m o v e s t i d o s , o s q u a i s p o r e i s s o b r e v o s s o s f i l h o s e s o b r e

v o s s a s f i l h a s ; a s s i m d e s p o j a r e i s o s e g í p c i o s " ( E x 3 , 1 9 - 2 2 ) .

Esse f inal " . . . despojarão os egípcios" , a referência ao "exérc i to"

de Israel mais adiante (Ex 6,26; 7 ,4; 12,36.51), bem como, as ". . . jóias

de prata e jóias de ouro. . ." que servirão para a confecção do "B ezerro

de Ouro" (Ex 32,2 -4) , insinuam que se t ratava de uma "guerra santa",

pois não fora ass im não seriam despojos . Moisés res is te e apesar dos

s inais que Deus lhe oferece para lhes mostrar e da vara que lhe dá (Ex

4,17) não adquire coragem (Ex 4,1 -10) . É nessa ocasião que aparece

pela primeira vez na Bíbl ia a função de um profeta cujo s ignif icado é

por demais deturpados pela errônea versão de ser aquele que é capaz

de fazer vat icínios ou previsões dos acontecimentos futuros . Não é as-

s im, porém. A língua portuguesa tem uma palavra que pode auxi l iar a

compreender et imologicamente o s ignif icado d e "pro-feta". É a palavra

"pro-nome" que s ignif ica "no lugar do nome", is to é, a palavra que se

usa em lugar do nome de uma coisa, de uma pessoa: eu, ele, nós etc. .

Dentro dessa mesma estrutura "pro-feta" s ignif ica "o que fala ( ' feta '

em hebraico ) no lugar de outro".

Moisés t inha razão de f icar temeroso sent indo-se “pesado de bo-

ca e pesado de l íngua” por ter de convencer tanto os seus conterrâneos

que o haviam " traído" (Ex 11-15 / At 7,23-25), como a corte faraônica

donde saíra e que havia “ t raído". É natural que assim se s inta e prote s-

te , veementemente , e insis ta com Deus, res is t indo, e dessa at i tude

t ransparece o s ignif icado de "profeta" ao lhe ser af i rmado que seria

10

Deus para Aarão, em cuja boca Moisés poria as palavras para ele d i -

zer :

" E n t ã o d i s s e M o i s é s a o S e n h o r : A h , Ia h w e h ! E u n ã o s o u e l o q u e n t e , n u n c a o f u i , n e m d e p o i s q u e f a l a s t e a o t e u s e r v o ; p o r q u e s o u p e s a d o d e b o c a e p e s a d o d e l í n -

g u a . ( . . . ) E n t ã o s e a c e n d e u c o n t r a M o i s é s a i r a d o S e n h o r , e d i s s e e l e : N ã o é

A a r ã o , o l e v i t a , t eu i r m ã o ? E u s e i q u e e l e p o d e f a l a r b e m . ( . . . ) T u , p o i s , l h e f a -l a r á s , e p o r á s a s p a l a v r a s n a s u a b o c a ; e e u s e r e i c o m a t u a b o c a e c o m a d e l e , e

v o s e n s i n a r e i o q u e h a v e i s d e f a z e r . E e l e f a l a r á p o r t i a o p o v o ; a s s i m e s e r á a

t u a b o c a , e t u s e r á s p a r a e l e D e u s " ( E x 4 , 1 0 - 1 6 ) .

Fica mais claro ainda em outra narrat iva do mesmo fato:

E n t ã o d i s s e o S e n h o r a M o i s é s : E i s q u e t e t e n h o p o s t o c o m o D e u s a F a r a ó , e A a -

r ã o , t e u i r m ã o , s e r á o t e u p r o f e t a . T u f a l a r á s t u d o o q u e e u t e m a n d a r ; e A a r ã o ,

t e u i r m ã o , f a " l a r á a F a r a ó , q u e d e i x e i r o s f i l h o s d e I s r a e l d a s u a t e r r a " ( E x 7 , 1 -2 ) .

"E ele falará por t i ao povo; ass im ele será a tua boca, e tu serás

para ele Deus" (Ex 4,16) e "Aarão, teu i rmão, será o teu profeta. Tu

falarás tudo o que eu te mandar; e Aarão, teu i rmão, fal ará a Faraó (Ex

7,1-2) . Basta a lei tura dos t rechos acima t ranscri tos para se perceber

que "profeta é a boca de Deus" ou "aquele que f ala o que Deus coloca

na sua boca" e não aquele que faz vat icínios ou previsões de futuro .

Porém, como para Deus não há tempo , as palavras que coloca na boca

do profeta são sempre atuais e sempre se real izam, parecendo que foi

fei to um vat icínio. Mas, antes de t udo, é profeta porque fa la aqui lo, e

só aqui lo que Deus manda falar , só por isso. Daí porque Aarão era o

profeta de Moisés , faland o só o que lhe determinava e Moisés funci o-

nara como deus para ele colocando na sua boca o que deveria dizer .

Assim convencido e municiado com a "Vara de Deus" (Ex 4,17.20)

Moisés , parte de Madiã:

" T o m a r á s , p o i s , n a t u a m ã o e s t a v a r a , c o m q u e h á s d e f a z e r o s s i n a i s . ( . . . ) D i s s e

t a m b é m Ia h w e h a M o i s é s e m M a d i ã : V a i , v o l t a p a r a o E g i t o ; p o r q u e m o r r e r a m t o d o s o s q u e p r o c u r a v a m t i r a r - t e a v i d a . T o m o u , p o i s , M o i s é s s u a m u l h e r e s e u s

f i l h o s , e o s f e z m o n t a r n u m j u m e n t o e t o r n o u à t e r r a d o E g i t o ; e M o i s é s l e v o u a

v a r a d e D e u s n a s u a m ã o " ( E x 4 , 1 7 - 2 0 ) .

" . . . vol ta ( . . . ) porque morreram todos os que procuravam t i rar- te

a vida" - essa f rase servirá de modelo a outra que será di ta milênios

depois , cumprindo o que aqui se configurava – São José no Egi to com

o Menino Jesus, fugindo de Herodes ouvirá a mesma exortação (cfr .

Mt 2,20). Mateus a usará para mostrar com seu Evangelho, Jesus como

o Moisés prometido (Dt 18,15), já que São José, parafraseando, "t o-

mou, pois , . . . sua mulher e seu f i lho, e os fez montar num jumento e re-

tornou a terra. . . " (cf r . Mt 2,21).

Moisés parte. No caminho acontece algo misterioso, daqueles

mistérios da Escri tura que dependem de um conhecimento da cul tura

do tempo, e que se perdeu. É o episódio da ci rcuncisão do f i lho de

Moisés por sua mulher Séfora cujo desate é incompreensível (Ex 4,24 -

26), parecendo que , por não ter s ido ainda ci rcuncidado Gérson, seu

f i lho, Deus ameaçou t i rar - lhe a vida. Tudo indica, porém que o casal

se separa por causa da missão de Moisés e o r i tual prat icado é suger i -

do como um compromisso de f idel idade entre ambos , selado com o

sangue do prepúcio do próprio f i lho. Só assim se just i f icam as pal a-

11

vras então di tas de que " tu és para mim um esposo de sangue ", uma

vez que seria "devolvida pelo sogro com seus dois f i lhos " , Gérson e

El iezer , tempos depois (Ex 18,2 -5) . A sua importância r i tual para a

missão de Moisés f icou destacada por sua inclusão nesse ponto da na r-

rat iva, "no caminho" (Ex 4,24) e antes de iniciá - la . É t recho de inte r-

pretação dif íci l , prevalecendo o cri tér io da ci rcuncisão do f i lho como

indispensável perante Deus e da garant ia pelo sangue de f idel idade

mútua e do reencontro, em vir tude da separação temporária de Moisés

da sua famíl ia .

2.3. - MOISÉS E A LIBERTAÇÃO DO POVO DE ISRAEL

O marco inicial da missão l iber tadora de Moisés é o de seu en-

contro com Aarão, que o procurava também a mando de Deus . Recebe-

ram a missão e então, juntos , procuraram e falaram aos anciãos e ao

povo manifestando-lhes os s inais :

" D i s s e o S e n h o r a A a r ã o : V a i a o d e s e r t o , a o e n c o n t r o d e M o i s é s . E e l e f o i e , e n -c o n t r a n d o - o n o m o n t e d e D e u s , o b e i j o u . E r e l a t o u M o i s é s a A a r ã o t o d a s a s p a -

l a v r a s c o m q u e Ia h w e h o e n v i a r a e t o d o s o s s i n a i s q u e l h e m a n d a r a . E n t ã o f o r a m

M o i s é s e A a r ã o e a j u n t a r a m t o d o s o s a n c i ã o s d o s f i l h o s d e I s r a e l ; e A a r ã o f a l o u t o d a s a s p a l a v r a s q u e Ia h w e h h a v i a d i t o a M o i s é s e f e z o s s i n a i s p e r a n t e o s o -

l h o s d o p o v o . E o p o v o c r e u ; e q u a n d o o u v i r a m q u e Ia h w e h h a v i a v i s i t a d o o s f i -

l h o s d e I s r a e l e q u e t i n h a v i s t o a s u a a f l i ç ã o , i n c l i n a r a m - s e e a d o r a r a m " ( E x 4 , 2 7 - 3 1 ) .

Em seguida , deveriam ambos i r ao Faraó em nome de Iahweh,

Deus desconhecido e não acei to por ele que era considerado um deus

no Egi to e por isso estava enciumado. Também, e por es se mesmo mo-

t ivo não deixou sair o Povo para "oferecer -Lhe sacri f ícios" ou "cel e-

brar-Lhe uma festa no deserto" pois “não conheço Iahweh, nem ta m-

pouco deixarei i r Isr ael” (Ex 5,1.3):

" D e p o i s f o r a m M o i s é s e A a r ã o e d i s s e r a m a o F a r a ó : A s s i m d i z Ia h w e h , o D e u s

d e I s r a e l : D e i x a i r o m e u p o v o , p a r a q u e m e c e l e b r e u m a f e s t a n o d e s e r t o . M a s F a r a ó r e s p o n d e u : Q u e m é I a h w e h , p a r a q u e e u o u ç a a s u a v o z p a r a d e i x a r i r I s -

r a e l ? N ã o c o n h e ç o Ia h w e h , n e m t a m p o u c o d e i x a r e i i r I s r a e l " ( E x 5 , 1 - 2 ) .

"Não conheço Iahweh, nem tampouco deixarei i r Israe l" (Ex

5,2) . O Faraó, desconhecendo o Deus denominado Iahweh , não se cur-

vou. Ao contrário, vendo Seu Nome a r ra igado no coração daquele povo

e também a predi leção general izada por Ele, enciumado, "endureceu -

se-lhe" orgulhosamente o seu "coração" (Ex 3,19; 4 ,21; 7 ,3.13.22;

8 ,11.15; 9 ,7 .12.34s; 10,1.20.27; 11,10; 14,4.8.17) . Deus não "endurece

o coração" de ninguém a não ser como efei to do próprio orgulho d a-

quele de quem é endurecido, opondo -se ou virando-se cont ra Ele (Ex

3,19), ou não O acei tando nos s inais de Sua manifestação. Por isso , a

expressão "endurecer o coração" te m por autor , ora o próprio Deus (Ex

4,21; 7 ,3; 9 ,12; 10,1.20.27; 11,10; 14,4.8.17), ora o próprio coração

(Ex 7,13.22; 8 ,15; 9,7.35), ora o Faraó (Ex 8,11.28; 9 ,34), como Mo i-

sés fora aler tado pelo próprio Iahweh (Ex 3,19). Considerado um deus

e para combater e sabotar a f inal idade do pedido, “ para sacri f icar a I-

ahweh”, o Faraó dá ordens a seus capatazes para mais ainda oprim i rem

12

os israel i tas (Ex 5,6 -19). Causou isso revol ta dos Is rael i tas contra

Moisés e Aarão , fazendo com que Iahweh fosse invocado (Ex 5,2 0-23)

e novamente se referisse ao modo como seria vencida aquela obst in a-

ção:

" E n t ã o d i s s e Ia h w e h a M o i s é s : A g o r a v e r á s o q u e h e i d e f a z e r a F a r a ó ; p o i s p o r u m a p o d e r o s a m ã o o s d e i x a r á i r , e p o r u m a p o d e r o s a m ã o o s e x p u l s a r á d e s u a

t e r r a " ( E x 6 , 1 ) .

Neste ponto , há uma segunda narrat iva da vocação de Moisés e

da sua genealogia, bem como uma expl icação do nome de Deus, que

será objeto de anál i se posterior . Anteriormente conhecido pelos Patr i -

arcas como El -Shaddai , agora recebe por intermédio de Moisés o nome

de Iahweh (Ex 6,2 -3) , e com esse nome rat i f ica a Aliança, toda a obra

decorrente e a confi rma:

" A d e m a i s , t e n h o o u v i d o o g e m e r d o s f i l h o s d e I s r a e l , q u e o s e g í p c i o s e s c r a v i -z a m ; e l e m b r e i - m e d a m i n h a A l i a n ç a . P o r t a n t o d i z e a o s f i l h o s d e I s r a e l : E u s o u

I a h w e h ; e u v o s t i r a r e i d e d e b a i x o d a s c a r g a s d o s e g í p c i o s , l i v r a r - v o s - e i d a s u a

s e r v i d ã o , e v o s r e s g a t a r e i c o m b r a ç o e s t e n d i d o e c o m g r a n d e s j u í z o s . T o m a r -v o s - e i p o r m e u p o v o e s e r e i v o s s o D e u s ; e v ó s s a b e r e i s q u e e u s o u Ia h w e h v o s s o

D e u s , q u e v o s t i r o d e d e b a i x o d a s c a r g a s d o s e g í p c i o s . In t r o d u z i r - v o s - e i n a t e r -

r a q u e j u r e i d a r a A b r a ã o , a I s a a c e a J a c ó ; e v o - l a d a r e i p o r h e r a n ç a . E u s o u I a h w e h " ( E x 6 , 5 - 8 ) .

"Tomar-vos-ei por meu povo e serei vosso Deus; e vós sabereis

que eu sou Iahweh vosso Deus" - Deus rat i f ica a formação de Seu P o-

vo e confi rma toda a esperança que al imentaram de serem "introduz i-

dos na terra que jurei dar a Abraão, a Isaac e a Jacó; e vo -la darei por

herança. Eu sou Iahweh", condição que i rá impregnar a Obra da R e-

denção:

" M a s F a r a ó n ã o v o s o u v i r á ; e e u p o r e i m i n h a m ã o ( “ p o d e r o s a ” ) s o b r e o E g i t o , e

t i r a r e i o s m e u s e x é r c i t o s , o m e u p o v o , o s f i l h o s d e I s r a e l d a t e r r a d o E g i t o , c o m g r a n d e s j u í z o s . E o s e g í p c i o s s a b e r ã o q u e e u s o u Ia h w e h , q u a n d o e s t e n d e r a m i -

n h a m ã o s o b r e o E g i t o , e t i r a r o s f i l h o s d e I s r a e l d o m e i o d e l e s " ( E x 7 , 4 - 5 ) .

"E os egípcios saberão que eu sou Iahweh. . ." , essa a f inal idade

de todos os ". . . grandes juízos" ou prodígios que faria: convencê -los

de que Iahweh é o verdadei ro Deus. Iahweh quer não só l ibertar e co n-

vencer os i srael i tas (Ex 4,30 -31 / Ex 10,2) , mas, também, levar os e-

gípcios a se converterem (Sb 11,15s.23) , em vir tude do poder que d e-

monstrava com os seus prodígios ". . . para que saibais que não há ni n-

guém como Iahweh . . ." (Ex 8,6; 9 ,14). Então, os Israel i tas (Ex 10 ,2) e

os Egípcios foram alvos da mesma demonstração, uma vez que ". . .

Deus não faz acepção de pessoas . . . " (Dt 10,17; At . 10,34; Rm 2,11).

Assim como adoravam vários répteis , c rocodi los , serpentes , lagartos ,

rãs , até o escaravelho, Deus lhes demonstra o seu grande poder “. . .

enviando- lhes uma mult idão de animais i rracionais . . .” com isso mo s-

t rando o domínio sobre eles , para “. . . levá - los a ver claro e reconh ecê-

LO como verdadeiro Deus . . .” (Sb 11,15; 12,23 -27). Os primeiros pro-

dígios foram repet idos pelos mago s do Egi to (Ex 7,11.22; 8 ,3) mas de

certo ponto em diante não mais o conseguem (Ex 8,14; 10,11) e até

mesmo admitem:

" . . . E n t ã o d i s s e r a m o s m a g o s a F a r a ó : I s t o é o d e d o d e ( u m ) D e u s . . . ” ( E x 8 , 1 5 ) .

13

Reconheceram assim a presença de Iahweh enquanto o Faraó

mais se obst inava. Porém , a part i r desse reconhecimento dos magos ,

ele vai se enfraquecendo principalmente quando Iahweh lhe mostra ". . .

que dis t ingue entre o meu povo e o teu povo " (Ex 8,19), excluindo dos

efei tos dos prodígios o Povo dos Fi lhos de Israe l (Ex 8,18-20). Se an-

tes até mais oprimia os israel i tas agora muda de at i tude e passa a qu e-

rer permit i r os sacri f ícios , porém mantendo -os sob controle e observa-

ção. Temia que fugissem, "deixassem de servi - los" (Ex 14,5) e , log i-

camente, não lhe agradava ver animais que adorava se tornarem ví t i -

mas em oferenda a Iahweh . Moisés insis te em se afastar por um e spaço

de t rês dias , lembrando -lhe do antagonismo entre as duas formas de

cul to sacri f ical , pelo que corr iam o r isco de serem punidos pelos egíp-

cios . Prosseguem os prodígios cada vez mais sérios e gr aves, fazendo

com que o Faraó fosse se enfraquecen do; mas, ao s inal de que os israe-

l i tas deixariam o país novamente endurec e o coração e vo l ta at rás , até

que os seus próprios servos o advert i ram, levando -o a tentar audaciosa

al ternat iva, porém sem nada conseguir :

" E n t ã o c h a m o u F a r a ó a M o i s é s e a A a r ã o , e d i s s e : I d e , e o f e r e c e i s a c r i f í c i o s a o v o s s o D e u s n e s t a t e r r a . R e s p o n d e u M o i s é s : N ã o c o n v é m q u e a s s i m s e f a ç a , p o r -

q u e é a b o m i n a ç ã o a o s e g í p c i o s o q u e h a v e m o s d e o f e r e c e r a Ia h w e h n o s s o D e u s .

S a c r i f i c a n d o n ó s a a b o m i n a ç ã o d o s e g í p c i o s p e r a n t e o s s e u s o l h o s , n ã o n o s a p e -d r e j a r ã o e l e s ? H a v e m o s d e i r a c a m i n h o d e t r ê s d i a s a o d e s e r t o , p a r a q u e o f e r e -

ç a m o s s a c r i f í c i o s a Ia h w e h n o s s o D e u s , c o m o e l e n o s o r d e n o u . E n t ã o d i s s e F a -

r a ó : E u v o s d e i x a r e i i r , p a r a q u e o f e r e ç a i s s a c r i f í c i o s a Ia h w e h v o s s o D e u s n o d e s e r t o ; s o m e n t e n ã o i r e i s m u i t o l o n g e ; e o r a i p o r m i m " ( E x 8 , 2 1 - 2 4 ) .

" . . . e orai por mim" - essa frase do Faraó, em conjunto com as

várias manei ras de se referi r ao "endurec imento de seu coração", ch a-

ma a atenção e requer um exame p ela incoerência ass im tão clara. A-

inda mais quando se percebe que não exis te uma só referência a um só

dos deuses do Egi to , tão combat idos, mesmo quando da praga das rãs ,

tendo no seu panteão uma "deusa - rã". Nesta luta de Iahweh co ntra os

deuses , o nome deles não é mencionado sabendo -se do zelo israel i ta a

esse respei to , não os mencionando nem mesmo pronunciando -lhes o

nome (Ex 23,13). Mas a presença dos magos mostra que estavam se m-

pre influenciando o Faraó mesmo quando ele começava a ceder. Trans-

parece séria dif iculdade por que passavam o Faraó, os magos, os ofic i -

ais ou servos (Ex 8,4.14.15.24; 9 ,11.20.30; 10,7.11.16.20.24.27 etc. )

debatendo-se entre a crença em seus deuses e em Iahweh, o Deus do

Povo dos Fi lhos de Israel , comprovadamente mais poderoso pelas o-

bras que real izava. E as concessões que f izeram não passaram de te n-

tat ivas para impedi r a saída do Egi to , já convencidos da sua superior i -

dade na fé. Em uma das úl t imas oportunidades, após uma manifestação

de medo e desespero (Ex 10,7) , buscaram até mesmo que oferecessem

o sacri f ício sem a imolação de animais , alguns sagrados para eles ,

quando o Faraó ten ta ainda uma forma de conseguir que não saíssem

do país , pretendendo que somente os homens f ossem ao sacri f ício (Ex

10,7-11). Finalmente, Iahweh, de uma vez por todas, põe f im à luta:

" D i s s e I a h w e h a M o i s é s : A i n d a m a i s u m a p r a g a t r a r e i s o b r e F a r a ó , e s o b r e o E -g i t o ; d e p o i s e l e v o s d e i x a r á i r d a q u i ; e , d e i x a n d o v o s i r a t o d o s , c o m e f e i t o v o s

e x p u l s a r á d a q u i . ( . . . ) À m e i a - n o i t e e u s a i r e i p e l o m e i o d o E g i t o ; e t o d o s o s

14

p r i m o g ê n i t o s n a t e r r a d o E g i t o m o r r e r ã o , d e s d e o p r i m o g ê n i t o d o F a r a ó , q u e s e a s s e n t a s o b r e o s e u t r o n o , a t é o p r i m o g ê n i t o d a s e r v a q u e e s t á d e t r á s d a m ó , e

t o d o s o s p r i m o g ê n i t o s d o s a n i m a i s . P e l o q u e h a v e r á g r a n d e c l a m o r e m t o d a a

t e r r a d o E g i t o , c o m o n u n c a h o u v e n e m h a v e r á j a m a i s . M a s c o n t r a o s f i l h o s d e I s r a e l d e s d e o s h o m e n s a t é o s a n i m a i s n e m m e s m o u m c ã o g a n i r á , p a r a q u e s a i -

b a i s q u e o S e n h o r f a z d i s t i n ç ã o e n t r e o s e g í p c i o s e o s f i l h o s d e I s r a e l " ( E x

1 1 , 1 - 7 ) .

" . . . todos os primogêni tos na terra do Egi to morrerão, desde o

primogêni to de Faraó, que se assenta sobre o seu t rono, até o primog ê-

ni to da serva que es tá detrás da mó, e todos os primogêni tos dos an i-

mais" . . . - "todos os primogêni tos dos egípcios morrerão" - Por que os

primogêni tos? O resul tado seria menos assustador se fossem mortos

outros f i lhos que não os primogêni tos? Se Deus houvera anunciado a

morte da total idade de uma determinada criatura ou de outra espécie

só e em todo o Egi to seria também ater rador o acontecimento , não im-

portando qual . E o resul tado seria o mesmo tal como previs to, até

mesmo com a mesma obst inação seguida ao reconhec imento, condição

já se tornando por demais presente , mas agora com uma esperança de

solução derradeira e defini t iva:

" D i s s e o S e n h o r a M o i s é s : A i n d a m a i s u m a p r a g a t r a r e i s o b r e F a r a ó , e s o b r e o E g i t o ; d e p o i s e l e v o s d e i x a r á i r d a q u i ; e , d e i x a n d o v o s i r a t o d o s , c o m e f e i t o

v o s e x p u l s a r á d a q u i ( . . . ) E n t ã o t o d o s e s t e s t e u s s e r v o s d e s c e r ã o a m i m , e s e i n -

c l i n a r ã o d i a n t e d e m i m , d i z e n d o : S a i t u , e t o d o o p o v o q u e t e s e g u e a s p i s a d a s . D e p o i s d i s s o e u s a i r e i . E M o i s é s s a i u d a p r e s e n ç a d e F a r a ó a r d e n d o e m i r a . P o i s

I a h w e h d i s s e r a a M o i s é s : F a r a ó n ã o v o s o u v i r á , p a r a q u e o s m e u s p r o d í g i o s s e

m u l t i p l i q u e m n a t e r r a d o E g i t o . E M o i s é s e A a r ã o f i z e r a m t o d o s e s t e s p r o d í g i o s d i a n t e d e F a r a ó ; m a s Ia h w e h e n d u r e c e u o c o r a ç ã o d e F a r a ó , q u e n ã o d e i x o u i r d a

s u a t e r r a o s f i l h o s d e I s r a e l " ( E x 1 1 , 1 . 8 - 1 0 ) .

Não se submeteu o Faraó apesar da ameaça da el iminação dos

primogêni tos , já anunciada e previs ta por Iahweh, bem antes de inici a-

da a missão de Moisés . As palavras seguintes ter iam sido d i tas no in í -

cio do ministér io de Moisés , quando ainda estava no exí l io em Madiã,

e já lhe resumira tudo o que aconteceria e at é mesmo prat icamente já

lhe anunciara a úl t ima praga: a morte dos primogêni tos :

" D i s s e a i n d a Ia h w e h a M o i s é s : Q u a n d o v o l t a r e s a o E g i t o , v ê q u e f a ç a s d i a n t e d e F a r a ó t o d o s o s p r o d í g i o s q u e t e n h o p o s t o n a t u a m ã o ; m a s e u e n d u r e c e r e i o s e u

c o r a ç ã o , e e l e n ã o d e i x a r á i r o p o v o . E n t ã o d i r á s a o F a r a ó : A s s i m d i z Ia h w e h : I s r a e l é m e u f i l h o , m e u p r i m o g ê n i t o ; e e u t e t en h o d i t o : D e i x a p a r t i r m eu f i l h o

p a r a q u e m e s i r v a ; m a s t u r e c u s a s t e a d e i x á - l o i r ; e i s q u e e u m a t a r e i o t e u f i l h o ,

o t e u p r i m o g ê n i t o " ( E x 4 , 2 1 - 2 3 ) .

Ora, Deus não comunica nada à toa nem sem sent ido ou que não

seja compreendido pelo seu elei to , que sempre pede esclarecimentos

quando não O entende. Então Moisés compreendeu o que Deus quisera

dizer com a el iminação dos primogêni tos . O que já se viu a r espei to

dessa inst i tuição é que o primogêni to se dest inava à chefia da t r ibo ou

clã. Mas, não é só a isso que se dest ina, pois entre os egípcios i sso se

apl icaria exclusivamente ao f i lho do Faraó, sucessor do t rono. Mas f o-

ram incluídos "todos os primogêni t os na terra do Egi to. . . , desde o pr i -

mogêni to de Faraó, que se assenta sobre o seu t rono, até o primogêni to

da serva que está detrás da mó, e todos os primog êni tos dos animais",

numa ampla genera l ização. Alguma outra qual idade exis te que tanto

valorizava essa inst i tuição principalmente fazendo coincidir com a

15

Inst i tuição da Páscoa uma el iminação em massa dos primogêni tos de

todo o Egi to, tanto de homens como de animais , e ainda com essa

mesma denominação qual i f icar Is rael :

" . . . A s s i m d i z o S e n h o r : I s r a e l é m e u f i l h o , m e u p r i m o g ê n i t o . . . " ( E x 4 , 2 2 )

Mesmo que alguns se insurjam contra as pragas do Egi to julga n-

do-as mais fruto da lenda popular ou do nacional ismo extremado isra e-

l i ta , bem como, de fatos naturais que ocorrem normalmente na região,

muitos elementos comprovam a ocorrência de algo extraordinário, l e-

vando os israel i tas à l ibertação. De imediato destacam -se dois fatos

sobremaneira es t ranhos: a acei tação do nome Iahweh como o nome de

Deus pelos Is rael i tas e a acei tação de Moisés como l íder , apesar da t á-

ci ta recusa inicial de sua l iderança pela exclusão da t r ibo de Levi , da

Primogeni tura:

" A e s t e M o i s é s q u e e l e s h a v i a m r e p e l i d o , d i z e n d o : Q u e m t e c o n s t i t u i u s en h o r e

j u i z ? a e s t e e n v i o u D e u s c o m o s e n h o r e l i b e r t a d o r , p e l a m ã o d o a n j o q u e l h e a -

p a r e c e r a n a s a r ç a . F o i e s t e q u e o s c o n d u z i u p a r a f o r a , f a z e n d o p r o d í g i o s e s i -n a i s n a t e r r a d o E g i t o , e n o M a r V e r m e l h o , e n o d e s e r t o p o r q u a r e n t a a n o s " ( A t

7 , 3 5 - 3 6 ) .

"Foi es te que os conduziu para fora, fazendo prodígios e s inais

na terra do Egi to. . ." - mesmo que fossem fenômenos naturais a oco r-

rência súbi ta e o seu término , em momentos determinados por Moisés

mostram uma causa mais s ignif icat iva que a s imples coinc idência com

acontecimentos da natureza. Era Iahweh que comand ava os fenômenos ,

tornando-os seus inst rumen tos pelo que se impôs como Deus ao Faraó,

que pouco a pouco, não O reconhecendo de início (Ex 5,2) e respo n-

dendo com um agravamento da opressão (Ex 5,6 -19), vai reconhecê-lo ,

ao f inal , com um pedido de oração e de bênção (Ex 8,24 / 12,32).

Também aos própr ios israel i tas que inicialmente não acei taram Moisés

e terminaram por se lhe submeter , acatando todas as suas inst ruçõe s e

l iderança desde o cat iveiro até a l ibertação. Por isso é dis pensável

discut i r quanto à ocorrência ou não dos fenômenos, pois um só é o fato

his tórico ocorrido "milagrosamente" - a Libertação Incondicional do

Povo dos Fi lhos de Isr ael .

2.4. - A INSTITUIÇÃO DA PÁSCOA

Exis te um grande mal entendido que é preciso desde já esc lar e-

cer para se compreender bem a Páscoa em seus fundamentos, s i gnif i -

cado e objet ivo. Principalmente, para nós catól icos , por causa da E u-

caris t ia a Ela indestacavelmente unida. Pelo fato de se supor, e São J e-

rônimo t raduzir (Ex 12,11), que o s igni f icado original da p alavra seria

passagem, passou -se a se entender e definir a Páscoa exclusivamente

como "passagem". Mas, uma pequena frase de São Paulo deixa claro

que se denomina de "Páscoa" ao cordeiro que é imolado na cerim ônia:

" . . . C r i s t o , n o s s a p á s c o a , j á f o i i m o l a d o " ( 1 C o r 5 , 7 ) .

16

Também, os Apóstolos e Jesus, quando se referem à preparação

da Páscoa, usam a expressão "comer a páscoa" (Mt 26,17; Mc 14,12;

Lc 22,8) e , como ninguém come "passagem", a Páscoa é o Cordeiro.

Tudo indica que a confusão começa quando se t raduz da Vulgata de S.

Jerônimo:

" A s s i m , p o i s o c o m e r e i s : O s v o s s o s l o m b o s c i n g i d o s , o s v o s s o s s a p a t o s n o s p é s , e o v o s s o c a j a d o n a m ã o ; e o c o m e r e i s a p r e s s a d a m e n t e ; E s t a é a P á s c o a ( I s t o é

' P a s s a g e m ' ) d e Ia h w e h " ( E x 1 2 , 1 1 ) .

A inclusão do parêntesis "( is to é 'passagem')", na t radução fei ta

por S. Jerônimo, após a palavra "páscoa" e no vers ículo t ranscri to , l e-

vou a se confundir a solenidade com o s ignif icado da palavra que i n-

forma. Não fosse suficiente o que informam os Evangel is tas e a frase

de São Paulo, que acima se t ranscreveu , o próprio texto esclarece em

vários lugares:

" M a s s e a f a m í l i a f o r p e q u e n a d e m a i s p a r a u m c o r d e i r o , ( . . . ) n a p r o p o r ç ã o d o q u e c a d a u m p o s s a c o m e r . . . " ( E x 1 2 , 4 ) .

" T o m a r ã o d o s a n g u e ( . . . ) n a s c a s a s e m q u e o c o m e r e m . E n a q u e l a n o i t e c o m e -r ã o . . . N ã o c o m e r e i s d e l e c r u . . . ( . . . ) A s s i m , p o i s o c o m e r e i s : O s v o s s o s l o m b o s

c i n g i d o s , a s v o s s a s s a n d á l i a s n o s p é s , e o v o s s o c a j a d o n a m ã o ; e o c o m e r e i s a -

p r e s s a d a m e n t e ; e s t a é a p á s c o a ( . . . ) d e Ia h w e h " ( E x 1 2 , 7 - 1 1 ) .

" D i s s e m a i s Ia h w e h a M o i s é s e a A a r ã o : e s t a é a o r d e n a n ç a d a p á s c o a ; n e n h u m ,

e s t r a n g e i r o c o m e r á d e l a ; m a s t o d o e s c r a v o c o m p r a d o p o r d i n h e i r o , d e p o i s q u e o h o u v e r e s c i r c u n c i d a d o , c o m e r á d e l a . o f o r a s t e i r o e o a s s a l a r i a d o n ã o c o m e r ã o

d e l a . N u m a s ó c a s a s e c o m e r á o c o r d e i r o ( . . . ) n e n h u m i n c i r c u n c i s o c o m e r á d e l a "

( E x 1 2 , 4 3 - 4 8 ) .

Por outro lado, já se tornou clássica a expressão Cordeiro Pas-

cal , por ser "ele, a Páscoa, o cordeiro que se imola e se come", e não

se pode confundir a ví t ima com a cerimônia comemorat iva. Ela, em si

mesmo considerada, é o sacri f ício especial da comunidade de todo o

Povo de Israel , celebrado num mesmo momento, em comemoração ao

fato de que Deus o protege enquanto fere de morte os primogêni tos do

Egi to. Causa com isso, além de profundo sent imento de un idade, o de

nacional idade iniciando -se, e a l ibertação deles , em cum primento à A-

l iança de Abraão, Isaac e Jacó (Ex 6,7 -8) . Há, entre a Páscoa e a Al i -

ança es t rei ta e indissolúvel vinculação:

" E n t ã o D e u s , o u v i n d o - l h e s o s g e m i d o s , l e m b r o u - s e d e s u a A l i a n ç a c o m A b r a ã o ,

c o m Is a a c e c o m J a c ó " ( E x 2 , 2 4 ) .

" E q u a n d o v o s s o s f i l h o s v o s p e r g u n t a r e m : Q u e q u e r e i s d i z e r c o m e s t e c u l t o ?

R e s p o n d e r e i s : E s t e é o S a c r i f í c i o d a P á s c o a d e Ia h w e h , q u e p a s s o u a s c a s a s d o s f i l h o s d e I s r a e l n o E g i t o , q u a n d o f e r i u o s e g í p c i o s , e l i v r o u a s n o s s a s c a s a s "

( E x 1 2 , 2 6 - 2 7 ) .

"Este é o Sacri f ício . . ." Primeiramente, quando se fala em Sacri -

f ício se fala em ví t ima imolada . A idéia de sacri f ício escapa ao h omem

atual , cul turalmente desl igado de seu uso e de sua f inal idade. Pa ra o

Is rael i ta , porém, t inha um sent ido rel igioso muito profundo e e ssencial

à sua fé, como informa S. Paulo:

" V e d e I s r a e l s e g u n d o a c a r n e : o s q u e c o m e m d o s s a c r i f í c i o s n ã o e s t ã o e m c o m u -n h ã o c o m o a l t a r ? " ( 1 C o r 1 0 , 1 8 ) .

17

É a indispensável "Comunhão com Deus", con sumada na sant i f i -

cação da oferenda do sacri f ício ("sacri + f icar" = "f icar sa grado") . O

próprio Jesus vai se referi r a ele em várias oportunidades, rat i f icando

o seu valor e não o excluindo, nem condenando seu uso, mas reforça n-

do sua ef icácia como meio de sant i f icação:

" C e g o s ! P o i s q u a l é m a i o r : a o f e r e n d a , o u o a l t a r q u e s a n t i f i c a a o f e r e n d a ? " ( M t 2 3 , 1 9 ) / " P o r t a n t o , s e e s t i v e r e s a p r e s e n t a n d o a t u a o f e r e n d a n o a l t a r , e a í t e

l e m b r a r e s d e q u e t e u i r m ã o t e m a l g u m a c o i s a c o n t r a t i , d e i x a a l i d i a n t e d o a l t a r

a t u a o f e r e n d a , e v a i r e c o n c i l i a - t e p r i m e i r o c o m t e u i r m ã o , e d e p o i s v e m a p r e -s e n t a r a t u a o f e r e n d a " ( M t 5 , 2 3 - 2 4 ) .

A Páscoa, portanto é um sacri f ício e como tal dest inada à com u-

nhão e sant i f icação, não apenas individual , mas de toda a com unidade

nacional israel i ta , pela imolação conjunta e concomitante, em t odas as

famíl ias de todo o Povo de Israel :

" O r a , Ia h w e h f a l o u a M o i s é s e a A a r ã o n a t e r r a d o E g i t o : E s t e m ê s s e r á p a r a v ó s

o p r i n c í p i o d o s m e s e s ; s e r á o p r i m e i r o d o s m e s e s d o a n o . F a l e a t o d a c o n g r e g a -ç ã o d e I s r a e l , d i z e n d o : A o d é c i m o d i a d e s t e m ê s t o m a r á c a d a u m p a r a s i u m c o r -

d e i r o p o r f a m í l i a , u m c o r d e i r o p a r a c a d a c a s a . M a s s e a f a m í l i a f o r p e q u e n a d e -

m a i s p a r a u m c o r d e i r o , t o m a - l o - á j u n t a m e n t e c o m o v i z i n h o m a i s p r ó x i m o d e s u a c a s a , c o n f o r m e o n ú m e r o d e p e s s o a s ; n a p r o p o r ç ã o d o q u e c a d a u m p u d e r c o m e r .

O c o r d e i r o s e r á s e m d e f e i t o , m a c h o e d e u m a n o , o q u a l e s c o l h e r e i s e n t r e a s o -

v e l h a s o u e n t r e o s c a b r i t o s , e o g u a r d a r e i s a t é o d é c i m o q u a r t o d i a d e s t e m ê s ; e t o d a a a s s e m b l é i a d a c o n g r e g a ç ã o d e I s r a e l o m a t a r á à t a r d i n h a . T o m a r ã o d o

s a n g u e , e p ô - l o - ã o e m a m b o s o s u m b r a i s e n a v e r g a d a p o r t a , n a s c a s a s e m q u e o

c o m e r e m . E n a q u e l a n o i t e c o m e r ã o a c a r n e a s s a d a a o f o g o , c o m p ã e s á z i m o s ; c o m e r v a s a m a r g a s a c o m e r ã o . N ã o c o m e r e i s d e l e n a d a c r u , n e m c o z i d o e m á g u a ,

m a s a s s a d o a o f o g o ; a s u a c a b e ç a c o m a s s u a s p e r n a s e c o m a s u a f r e s s u r a . N a d a

d e l e d e i x a r e i s a t é p e l a m a n h ã ; m a s o q u e d e l e f i c a r a t é p e l a m a n h ã , q u e i m a - l o -e i s n o f o g o . A s s i m , p o i s o c o m e r e i s : O s l o m b o s c i n g i d o s , a s s a n d á l i a s n o s p é s ,

e o c a j a d o n a m ã o ; e o c o m e r e i s à s p r e s s a s : e s t a é a p á s c o a p a r a Ia h w e h . P o r q u e

n a q u e l a n o i t e p a s s a r e i p e l a t e r r a d o E g i t o , e f e r i r e i t o d o s o s p r i m o g ê n i t o s n a t e r r a d o E g i t o , t a n t o d o s h o m e n s c o m o d o s a n i m a i s ; e f a r e i j u s t i ç a s o b r e t o d o s

o s d e u s e s d o E g i t o ; e u Ia h w e h . M a s o s a n g u e v o s s e r á p o r s i n a l n a s c a s a s e m

q u e e s t i v e r d e s ; v e n d o e u o s a n g u e , p a s s a r e i a d i a n t e , e n ã o h a v e r á e n t r e v ó s p r a -g a p a r a v o s d e s t r u i r , q u a n d o e u f e r i r a t e r r a d o E g i t o . E e s t e d i a v o s s e r á u m

m e m o r i a l , e c e l e b r a - l o - e i s c o m o u m a f e s t a p a r a Ia h w e h ; a t r a v é s d a s v o s s a s g e -

r a ç õ e s o c e l e b r a r e i s p o r e s t a t u t o p e r p é t u o " ( E x 1 2 , 1 - 1 4 ) .

Com a sua inst i tuição introduziu -se uma modificação no cale n-

dário, começando-se o ano no dia daquela comemoração in icial , s is t e-

ma ainda em uso entre os Is rael i tas . Devia ser imolado um cordeiro

por famíl ia , r i tual que será modificado posteriormente (Dt 16,1-8 / 2

Cro 30,1-13; 35,10-14). Se pequena, a famíl ia unia -se à viz inha, sem-

pre se computando o que iam comer, evi tando -se a sobra, já que era

uma ví t ima sagrada, e se houvesse dever ia ser queimada tota lmente p a-

ra não ser profanada. O cordeiro devia ser macho, sem defei to e de um

ano, podendo ser um cordeiro ou um cabri to , não se podendo quebrar -

lhe osso algum (Ex 12,46 / Jo 19,33-36 / Sl 34 (33),21 ). Toda a comu-

nidade israel i ta o imola ao crepúsculo e com o sangue que fora rec o-

lhido em uma bacia (Ex 12, 22) ungir -se- iam os marcos e a t ravessa da

porta onde o comiam. Desde Noé o sangue tem um sent ido vinculado à

vida e não é comido, mas derramado na terra, em torno do a l tar :

" A c a r n e , p o r é m , c o m s u a v i d a , i s t o é , c o m s e u s a n g u e , n ã o c o m e r e i s " ( G n 9 , 4 ) .

Comeriam-no numa mesma noi te com pães áz imos por causa da

saída às pressas , não dispondo de tempo para levedar a massa, com e r-

18

vas amargas para se lembrar do amargor da vida no Egi to e assado ao

fogo evi tando-se com isso a ingestão de carne crua e de sangue. Seria

comido ". . . às pressas . . . c ingidos os r ins , sandál ia nos pés e bo rdão na

mão. . ." , paramentos que sempre lhes lembrarão da l ibertação do Egi to,

preparados assim para caminhar em terreno de dif íci l locomoção . Ne-

cessi tavam para isso de se levantar a tú nica e amarrá -la à al tura dos

r ins , a f im de não se prender no chão i r regular , de calçar sandál ias p a-

ra a proteção dos pés e do cajado, para auxi l iar os passos que dariam a

caminho da l iberdade e pelo longo t rajeto bem acidentado que os esp e-

rava.

Jesus , quando enviar seus discípulos em missão (Mt 10), dar -

lhes-á inst ruções baseadas nesse episódio mostrando a repet ição da

conquis ta e ident i f icando -as com as suas diferenças, dispensando os

discípulos dos objetos do despojo que se fez dos egípcios de objetos

de ouro, prata tais como os adornos, brincos etc. , das provisões para a

viagem, túnica e al forje, cajado, sandál ias nos pés . . . Por sua vez , ta m-

bém, insinua uma ident idade com a Páscoa dos Israel i tas , pelas me s-

mas palavras que usa, ref let indo uma s i tuação a Ela vinculada, ao na r-

rar e comparando-as :

“ N ã o l e v e i s o u r o , n e m p r a t a , n e m c o b r e n o s v o s s o s c i n t o s , n e m a l f o r j e p a r a o c a m i n h o , n e m d u a s t ú n i c a s , n e m s a n d á l i a s , n e m c a j a d o . . . ” ( M t 1 0 , 9 - 1 0 ) . / “ É a s -

s i m q u e d e v e r e i s c o m ê - l o ( „ o C o r d e i r o P a s c a l ‟ ) : c o m o s l o m b o s c i n g i d o s , s a n d á -

l i a s n o s p é s e c a j a d o n a s m ã o s . . . ” ( . . . ) / “ O s f i l h o s d e I s r a e l f i z e r a m c o m o M o i -s é s h a v i a d i t o , e p e d i r a m a o s e g í p c i o s o b j e t o s d e p r a t a , o b j e t o s d e o u r o e r o u p a s

( . . . ) o s e g í p c i o s l h e s d a v a m o q u e p e d i a m ; . . . ” ( E x 1 2 , 1 1 . 3 5 - 3 6 ) .

Dispondo-as em duas colunas e remanejando -as para melhor v i-

são, vê-se a semelhança de palavras e a diferença de s i tuações, tal c o-

mo desejou Jesus:

M t 1 0 , 9 - 1 0 E x 1 2 , 1 1 . 3 5 - 3 6

N ã o l e v e i s

c o b r e n o s v o s s o s c i n t o s ,

n e m s a n d á l i a s , n e m c a j a d o .

É a s s i m q u e d e v e r e i s c o m ê - l o :

o s l o m b o s c i n g i d o s

s a n d á l i a s n o s p é s c a j a d o n a s m ã o s .

N ã o l e v e i s O s f i l h o s d e I s r a e l f i z e r a m c o m o M o i s é s h a v i a d i -

t o , e p e d i r a m a o s e g í p c i o s

o u r o , n e m p r a t a

n e m c o b r e n o s v o s s o s c i n t o s , n e m p a r a o c a m i n h o ,

n e m d u a s t ú n i c a s .

o b j e t o s d e o u r o , o b j e t o s d e p r a t a

e r o u p a s .

É que, na Páscoa Is rael i ta , o Cordeiro seria “comido às pre ssas”

pelos israel i tas em fuga, já preparados para uma longa viagem (Ex

12,11) e para a conquis ta da Terra Prometida (Ex 6,26; 7 ,4; 12,36.51 /

Nm 13-14) enquanto que, agora, n a Páscoa Cris tã, i r iam em Missão de

Paz , armados para uma conquis ta difere nte:

“ . . . p r o c l a m a i q u e o R e i n o d o s C é u s e s t á p r ó x i m o . C u r a i o s d o e n t e s , r e s s u s c i t a i o s m o r t o s , p u r i f i c a i o s l e p r o s o s , e x p u l s a i o s d e m ô n i o s . D e g r a ç a r e c e b e s t e , d e

g r a ç a d a i ” ( M t 1 0 , 7 - 8 ) .

Com a diferença do dia de início, no dia seguinte, quase conc o-

mitantemente sem se confundirem, celebrava -se a Festa dos Ázimos

em que durante sete dias só se comia pão sem fermento em comemor a-

ção à saída do Egi to (Ex 12,15 -20). A Páscoa deverá se r uma Festa

19

Nacional dos israel i tas , comemorada todos os anos e por todas as g e-

rações, sempre reco rdando aos f i lhos o seu s ignif icado:

" P o r q u e Ia h w e h p a s s a r á p a r a f e r i r a o s e g í p c i o s ; e , a o v e r o s a n g u e n a v e r g a d a p o r t a e e m a m b o s o s u m b r a i s , I a h w e h p a s s a r á a q u e l a p o r t a , e n ã o d e i x a r á o d e s -

t r u i d o r e n t r a r e m v o s s a s c a s a s p a r a v o s f e r i r . P o r t a n t o , g u a r d a r e i s i s t o p o r e s t a -

t u t o p a r a v ó s e p a r a v o s s o s f i l h o s , p a r a s e m p r e . Q u a n d o , p o i s , t i v e r d e s e n t r a d o n a t e r r a q u e Ia h w e h v o s d a r á , c o m o t e m p r o m e t i d o , g u a r d a r e i s e s t e c u l t o . E

q u a n d o v o s s o s f i l h o s v o s p e r g u n t a r e m : Q u e q u e r e i s d i z e r c o m e s t e c u l t o ? R e s -

p o n d e r e i s : E s t e é o s a c r i f í c i o d a p á s c o a d e Ia h w e h , q u e p a s s o u a s c a s a s d o s f i -l h o s d e I s r a e l n o E g i t o , q u a n d o f e r i u o s e g í p c i o s , e l i v r o u a s n o s s a s c a s a s . E n -

t ã o o p o v o i n c l i n o u - s e e a d o r o u . E f o r a m o s f i l h o s d e I s r a e l , e f i z e r a m i s s o ;

c o m o Ia h w e h o r d e n a r a a M o i s é s e a A a r ã o , a s s i m f i z e r a m " ( E x 1 2 , 2 3 - 2 8 ) . / " E s -t a é u m a n o i t e q u e s e d e v e g u a r d a r a Ia h w e h , p o r q u e o s t i r o u d a t e r r a d o E g i t o ;

e s t a é a n o i t e d e Ia h w e h , q u e d e v e s e r g u a r d a d a p o r t o d o s o s f i l h o s d e I s r a e l a -

t r a v é s d a s s u a s g e r a ç õ e s " ( E x 1 2 , 4 2 ) .

A expl icação do r i to , que o pai dá ao f i lho, parece acrescentar ao

nome da festa como é conhecida, também a l ibertação, o fa to de que

"l ivrou nossas casas", mas a Pásc oa propriamente di ta é a ví t ima im o-

lada. De acordo com a segunda t ranscrição acima vê -se que o comemo-

rado na solenidade é "esta é a noi te de Iahweh, porque t i rou os Fi lhos

de Israel da terra do Egi to, que deve ser guardada por todas as ger a-

ções" (Ex 12,42) . Comemora-se a l ibertação do Povo de Israel do Eg i-

to onde foi escravo durante quatrocentos e t r inta anos, cumprindo -se o

que anunciara quando da Aliança com Abraão:

" E n t ã o d i s s e Ia h w e h a A b r ã o : S a b e c o m c e r t e z a q u e a t u a d e s c e n d ên c i a s e r á p e -

r e g r i n a e m t e r r a a l h e i a , e s e r á r e d u z i d a à e s c r a v i d ã o , e s e r á a f l i g i d a p o r q u a t r o -

c e n t o s a n o s ; s a b e t a m b é m q u e e u j u l g a r e i a n a ç ã o a q u a l e l a t e m d e s e r v i r ; e d e -p o i s s a i r á c o m m u i t o s b e n s " ( G n 1 5 , 1 3 - 1 4 ) . / " O r a , o t e m p o q u e o s f i l h o s d e I s -

r a e l m o r a r a m n o E g i t o f o i d e q u a t r o c e n t o s e t r i n t a a n o s . E a c o n t e c e u q u e , a o

f i m d e q u a t r o c e n t o s e t r i n t a a n o s , n a q u e l e m e s m o d i a , t o d o s o s e x é r c i t o s d e I -a h w e h s a í r a m d a t e r r a d o E g i t o " ( E x 1 2 , 4 0 - 4 1 ) .

E os israel i tas celebraram então a primeira Páscoa da Histór ia da

Salvação, e aqui lo que Deus dissera aconteceu: recusaram os egípcios

l ibertar os israel i tas e Deus cumpre o que prometeu:

" E f o r a m o s f i l h o s d e I s r a e l , e f i z e r a m i s s o ; c o m o Ia h w e h o r d e n a r a a M o i s é s e a

A a r ã o , a s s i m f i z e r a m . E a c o n t e c e u q u e à m e i a - n o i t e I a h w e h f e r i u t o d o s o s p r i -m o g ê n i t o s n a t e r r a d o E g i t o , d e s d e o p r i m o g ê n i t o d e F a r a ó , q u e s e a s s e n t a v a e m

s e u t r o n o , a t é o p r i m o g ê n i t o d o c a t i v o q u e e s t a v a n o c á r c e r e , e t o d o s o s p r i m o -g ê n i t o s d o s a n i m a i s . E F a r a ó l e v a n t o u - s e d e n o i t e , e l e e t o d o s o s s e u s s e r v o s , e

t o d o s o s e g í p c i o s ; e f e z - s e g r a n d e c l a m o r n o E g i t o , p o r q u e n ã o h a v i a c a s a e m

q u e n ã o h o u v e s s e u m m o r t o " ( E x 1 2 , 2 8 - 2 9 ) .

Imediatamente o Faraó e os egípcios conheceram a qual Deus

deveriam respei tar (Ex 12,32 - " . . . abençoai a mim também") e reso l-

ve-se defini t ivamente e sem mais delongas ou condições a saída dos

israel i tas em fuga do Egi to:

" E n t ã o F a r a ó c h a m o u M o i s é s e A a r ã o d e n o i t e , e d i s s e : L e v a n t a i - v o s , s a í d o

m e i o d o m e u p o v o , t a n t o v ó s c o m o o s f i l h o s d e I s r a e l ; e i d e s e r v i r a Ia h w e h ,

c o m o t e n d e s d i t o . Le v a i t a m b é m c o n v o s c o o s v o s s o s r e b a n h o s e o v o s s o g a d o , c o m o t e n d e s d i t o ; e i d e , e a b e n ç o a i - m e t a m b é m a m i m . ( . . . ) E Ia h w e h d e u a o p o -

v o g r a ç a a o s o l h o s d o s e g í p c i o s , d e m o d o q u e e s t e s l h e d a v a m o q u e p e d i a , e

d e s p o j a r a m o s e g í p c i o s . A s s i m v i a j a r a m o s f i l h o s d e I s r a e l d e R a m s é s a S u c o t , c e r c a d e s e i s c e n t o s m i l h o m e n s a p é , s e m c o n t a r a s c r i a n ç a s . T a m b é m s u b i u c o m

e l e s u m a g r a n d e m i s t u r a d e g e n t e ; e , e m r e b a n h o s e m a n a d a s , u m a g r a n d e q u a n -

t i d a d e d e g a d o . E c o z e r a m p ã e s á z i m o s d a m a s s a q u e l e v a r a m d o E g i t o , p o r q u e e l a n ã o s e t i n h a l e v e d a d o , p o r q u a n t o f o r a m e x p u l s o s d o E g i t o ; e n ã o p u d e r a m

d e t e r - s e , n e m h a v i a m p r e p a r a d o p r o v i s õ e s p a r a o c a m i n h o " ( E x 1 2 , 3 0 - 3 9 ) .

20

A Inst i tuição da Páscoa foi fundamental para a Nação Is rael i ta , e

sem ela é possível que a História da Salvação não t ivesse o mesmo

traçado sat isfazendo os desígnios de Deus, nem o Povo de Deus ter ia

consciência plena de sua condição de elei to , e da dimensão de Fi lho

Primogêni to. Para se entender um pouco mais o s ignif icado dessa e x-

pressão Fi lho Primogêni to pode -se recorrer ao que ensina São Paulo

quando usa o mesmo qual i f icat ivo para Jesus Cris to, guardadas as d e-

vidas proporções, comparando -se com a Bênção de Jacó:

" P o r q u e o s q u e d a n t e s c o n h e c e u , t a m b é m o s p r e d e s t i n o u p a r a s e r e m c o n f o r m e s à i m a g e m d e s e u F i l h o , a f i m d e q u e e l e s e j a o p r i m o g ê n i t o e n t r e m u i t o s i r m ã o s "

( R m 8 , 2 9 ) .

" . . . t r a n s p o r t o u - n o s p a r a o r e i n o d o s e u F i l h o A m a d o , e m q u e m t e m o s a r e d e n -

ç ã o , a s a b e r , a r e m i s s ã o d o s p e c a d o s . E l e é a Im a g e m d o D e u s i n v i s í v e l , o p r i -

m o g ê n i t o d e t o d a a c r i a ç ã o , p o r q u e n e l e f o r a m c r i a d a s t o d a s a s c o i s a s n o s c é u s e

n a t e r r a , a s v i s í v e i s e a s i n v i s í v e i s , s e j a m t r o n o s , s e j a m d o m i n a ç õ e s , s e j a m

p r i n c i p a d o s , s e j a m p o t e s t a d e s , t u d o f o i c r i a d o p o r e l e e p a r a e l e . E l e é a n t e s d e

t o d a s a s c o i s a s , e n e l e s u b s i s t e m t o d a s a s c o i s a s . E l e é a C a b e ç a d a I g r e j a , q u e é o S e u C o r p o . e l e é o p r i n c í p i o , o p r i m o g ê n i t o d e n t r e o s m o r t o s , p a r a q u e e m

t u d o t e n h a a p r i m a z i a , p o r q u e a p r o u v e a D e u s q u e n e l e h a b i t a s s e t o d a a p l e n i -

t u d e . . . " ( C l 1 , 1 3 - 1 9 ) .

" R ú b e n , t u é s m e u p r i m o g ê n i t o , m i n h a f o r ç a e a s p r i m í c i a s d o m e u v i g o r , p r e e -

m i n e n t e e m d i g n i d a d e e p r e e m i n e n t e e m p o d e r " ( G n 4 9 , 3 ) .

Uma comparação em colunas vai mostrar melhor as semelhanças

e as diferenças notáveis e que vão nos auxi l iar a compreender melhor a

História da Salvação, pelas inst i tuições l igadas cul turalmente ao seu

povo, respei tadas e usadas por Deus, e t al como a Bíbl ia e xpõe:

( G n 4 9 , 3 ) ( C l 1 , 1 3 - 1 9 )

R ú b e n , t u é s m e u p r i m o g ê n i t o n o s t r a n s p o r t o u p a r a o r e i n o d o s e u F i l h o A m a d o , e m q u e m t e m o s a

r e d e n ç ã o , a s a b e r , a r e m i s s ã o d o s p e c a d o s . E l e é a I m a g e m d o D e u s i n v i s í v e l , o p r i m o g ê n i t o d e t o d a a c r i a ç ã o

M i n h a f o r ç a

p o r q u e n e l e f o r a m c r i a d a s t o d a s a s c o i s a s n o s c é u s e n a t e r r a , a s v i -

s í v e i s e a s i n v i s í v e i s , s e j a m t r o n o s , s e j a m d o m i n a ç õ e s , s e j a m p r i n c i -

p a d o s , s e j a m p o t e s t a d e s , t u d o f o i c r i a d o p o r e l e e p a r a e l e .

E a s p r i m í c i a s d o m e u v i g o r E l e é a n t e s d e t o d a s a s c o i s a s , e n e l e s u b s i s t e m t o d a s a s c o i s a s .

P r e e m i n e n t e e m d i g n i d a d e

E P r e e m i n e n t e e m p o d e r

E l e é a C a b e ç a d a Ig r e j a , q u e é o S e u C o r p o . e l e é o p r i n c í p i o , o

p r i m o g ê n i t o d e n t r e o s m o r t o s , p a r a q u e e m t u d o t e n h a a p r i m a z i a , p o r q u e a p r o u v e a D e u s q u e n e l e h a b i t a s s e t o d a a p l e n i t u d e

P r e e m i n e n t e e m p o d e r t u d o f o i c r i a d o p o r e l e e p a r a e l e .

Assim a idéia de Fi lho Primogêni to num primeiro lance é o de

primícia, fonte e mantenedor de tu do, "anúncio de far ta colhe i ta" como

já se definiu e o começo daqui lo que já vive e que será viv ido por o u-

t ros em seguida e em pleni tude. Pode -se melhor entender a ex pressão

apl icada a Jesus de Primogêni to Dos Mortos , como aquele que abriu

aos outros que o seguirem, primícia que é, as portas da eternidade .

Imediatamente após a saída do povo do Egi to, Deus a s i mesmo cons a-

gra os primogêni tos . Com a el imin ação daqueles dos egípcios impõe -se

a sua subst i tuição pelos vi toriosos, o que se faz com essa separação ,

sant i f icando-os, e aparece mais um dado s ignif icat ivo que oferece uma

definição cul tural deles ao tempo, is to é, qual o seu s ignif icado cul t u-

ral :

" E n a q u e l e m e s m o d i a Ia h w e h t i r o u o s f i l h o s d e I s r a e l d a t e r r a d o E g i t o , s e g u n -d o o s s e u s e x é r c i t o s " ( E x 1 2 , 5 1 ) / " E n t ã o f a l o u Ia h w e h a M o i s é s , d i z e n d o : S a n -

21

t i f i c a - m e t o d o p r i m o g ê n i t o , t o d o o q u e a b r i r a m a d r e d e s u a m ã e e n t r e o s f i l h o s d e I s r a e l , a s s i m d e h o m e n s c o m o d e a n i m a i s ; p o r q u e m e u é " / " T a m b é m q u a n d o

I a h w e h t e h o u v e r i n t r o d u z i d o n a t e r r a d o s c a n a n e u s , c o m o j u r o u a t i e a t e u s

p a i s , q u a n d o t a h o u v e r d a d o , s e p a r a r á s p a r a Ia h w e h t u d o o q u e a b r i r a m a d r e , a t é m e s m o t o d o p r i m o g ê n i t o d o s t e u s a n i m a i s ; o s m a c h o s s e r ã o d e Ia h w e h . ( . . . )

E q u a n d o t e u f i l h o t e p e r g u n t a r n o f u t u r o , d i z e n d o : Q u e é i s t o ? r e s p o n d e r - l h e -

á s : I a h w e h , c o m m ã o f o r t e , n o s t i r o u d o E g i t o , d a c a s a d a s e r v i d ã o . P o r q u e s u -c e d e u q u e , e n d u r e c e n d o - s e F a r a ó , p a r a n ã o n o s d e i x a r i r , I a h w e h m a t o u t o d o s o s

p r i m o g ê n i t o s n a t e r r a d o E g i t o , t a n t o o s p r i m o g ê n i t o s d o s h o m e n s c o m o o s p r i -

m o g ê n i t o s d o s a n i m a i s ; p o r i s s o e u s a c r i f i c o a o S e n h o r t o d o s o s p r i m o g ê n i t o s , s e n d o m a c h o s ; m a s a t o d o p r i m o g ê n i t o d e m e u s f i l h o s eu r e s g a t o . ( E x 1 3 , 1 - 2 , 1 1 -

1 5 ) .

"Sant i f ica -me todo primogêni to, todo o que abri r a madre de sua

mãe entre os f i lhos de Israel , ass im de homens como d e an imais; por-

que meu é" ( . . . ) " . . . separarás para Iahweh tudo o que abri r a madre,

até mesmo todo primogêni to dos teus animais; os machos serão de I-

ahweh" (v. Ex 13) - vê-se daí que primogêni to é "todo o que abri r a

madre de sua mãe" e "tudo o que abri r a madre, até mesmo dos teus a-

nimais". Trazia então uma conotação profundamente vinculada à idéia

de mediação, vida e fecundidade, "o que abre ou inaugura a fecundid a-

de da madre", tal como Jacó disse a Rúben: "minha força e as prim í-

cias do meu vigor" e São P aulo a respei to de Jesus Cris to: "Ele é antes

de todas as coisas , e nele subsis tem todas as coisas". Por isso também

é o Primogêni to dos Mortos , fecundando de vida a morte, e abrindo as

portas da vida eterna. Essas referências aos israel i tas , a quem foi ra t i -

f icada a Promessa de Abraão, embutida na Aliança e que tomaria no

futuro o nome de Libertação Messiânica, es tá t raduzida na "ter ra que

mana lei te e mel" , p resente aqui na Inst i tuição da Pá scoa:

" Q u a n d o Ia h w e h t e h o u v e r i n t r o d u z i d o n a t e r r a ( . . . ) q u e e l e j u r o u a t e u s p a i s q u e t e d a r i a , t e r r a q u e m a n a l e i t e e m e l , g u a r d a r á s e s t e c u l t o n e s t e m ê s " ( E x

1 3 , 5 ) .

Vai o primogêni to desempenhar a função sacerdotal em vir tude

de sua mediação e pela consagração ensejada. Tanto é ass im que qua n-

do for inst i tuído o sacerdócio auxi l iar , es te subst i tui rá os primogên i-

tos no exercício dessa função junto à Casa de Aarão, também da Tr ibo

de Levi , que det inha o sacerdócio pleno (Ex 29): Além da chefia da

t r ibo ou do clã, det inha o primogêni to o exercício do sacerdócio, tal

como mostram as ci tações seguintes:

" E d i s s e Ia h w e h a M o i s é s : F a z e c h e g a r a t r i b o d e Le v i , e p õ e - n o s d i a n t e d e A a -

r ã o , o s a c e r d o t e , p a r a q u e o s i r v a m ; e l e s c u m p r i r ã o o q u e é d e v i d o a e l e e a t o d a

a c o n g r e g a ç ã o , d i a n t e d a t e n d a d a r e u n i ã o , f a z e n d o o s e r v i ç o d o t a b e r n á c u l o ; c u i d a r ã o d e t o d o s o s m ó v e i s d a t e n d a d a r e u n i ã o , e z e l a r ã o p e l o c u m p r i m e n t o

d o s d e v e r e s d o s f i l h o s d e I s r a e l , f a z e n d o o s e r v i ç o d o t a b e r n á c u l o . D a r á s , p o i s ,

o s l e v i t a s a A a r ã o e a s e u s f i l h o s ; d e t o d o l h e s s ã o d a d o s d a p a r t e d o s f i l h o s d e I s r a e l . D i s s e m a i s o S e n h o r a M o i s é s : E u , e u m e s m o t en h o t o m a d o o s l e v i t a s d o

m e i o d o s f i l h o s d e I s r a e l , e m l u g a r d e t o d o p r i m o g ê n i t o , q u e a b r e a m a d r e , e n t r e

o s f i l h o s d e I s r a e l ; e o s l e v i t a s s e r ã o m e u s , p o r q u e t o d o s o s p r i m o g ê n i t o s s ã o m e u s . N o d i a e m q u e f e r i a t o d o s o s p r i m o g ê n i t o s n a t e r r a d o E g i t o , s a n t i f i q u e i

p a r a m i m t o d o s o s p r i m o g ê n i t o s e m Is r a e l , t a n t o d o s h o m e n s c o m o d o s a n i m a i s ;

m e u s s e r ã o . E u s o u o S e n h o r " ( N m 3 , 1 1 - 1 3 ) .

" A s s i m s e p a r a r á s o s l e v i t a s d o m e i o d o s f i l h o s d e I s r a e l ; e o s l e v i t a s s e r ã o

m e u s . D e p o i s d i s s o o s l e v i t a s e n t r a r ã o p a r a f a z e r e m o s e r v i ç o d a t e n d a d a r e u n i -

ã o , d e p o i s d e o s t e r e s p u r i f i c a d o e o f e r e c i d o c o m o o f e r t a d e m o v i m e n t o . P o r -q u a n t o e l e s m e s ã o d a d o s i n t e i r a m e n t e d e n t r e o s f i l h o s d e I s r a e l ; e m l u g a r d e

t o d o a q u e l e q u e a b r e a m a d r e , i s t o é , d o p r i m o g ê n i t o d e t o d o s o s f i l h o s d e I s r a -

e l , p a r a m i m o s t e n h o t o m a d o . P o r q u e m e u é t o d o p r i m o g ê n i t o e n t r e o s f i l h o s d e I s r a e l , t a n t o e n t r e o s h o m e n s c o m o e n t r e o s a n i m a i s ; n o d i a e m q u e , n a t e r r a

22

d o E g i t o , f e r i a t o d o p r i m o g ê n i t o , o s s a n t i f i q u e i p a r a m i m . M a s t o m e i o s l e v i t a s e m l u g a r d e t o d o s o s p r i m o g ê n i t o s e n t r e o s f i l h o s d e I s r a e l . D e n t r e o s f i l h o s d e

I s r a e l t e n h o d a d o o s l e v i t a s a A a r ã o e a s e u s f i l h o s , p a r a f a z e r e m o s e r v i ç o d o s

f i l h o s d e I s r a e l n a t e n d a r e u n i ã o , e p a r a f a z e r e m e x p i a ç ã o p o r e l e s , a f i m d e q u e n ã o h a j a p r a g a e n t r e e l e s , q u a n d o s e a p r o x i m a r e m d o s a n t u á r i o " ( N m 8 , 1 4 - 1 9 ) .

Daí se vê que Iahweh Deus fulminou os deuses do Egi to , quando

fulminou de morte todos os primogêni tos , acabando com o sacerdócio

deles e com as suas v í t imas sacri f icais const i tuídas pelos primogêni tos

dos animais , conforme a visão r i tual daquele tempo. Para subst i tuí - los ,

não mais ex is t indo o sacerdócio pagão e começarem a funcionar ofic i -

almente , Iahweh então agi l iza o Seu Sacerdócio com os primogêni tos

poupados dos israel i tas , do Povo que é o seu Fi lho Primogêni to , que

tem a missão de primícia sacerdotal , medianeira.

2.5. - A PÁSCOA E A EUCARISTIA

Será necessário neste i tem repet i r muita coisa já vis ta e abordar

juntamente aspectos e inst i tuições ain da não estudados, mesmo co r-

rendo o r isco da prol ixidade. Assim, mesmo àqueles que não têm o h á-

bi to da lei tura da Bíbl ia será facul tado o acesso ao conteúdo usado no

desenvolvimento do tema abordado, faci l i tando -lhes a compreensão. E,

aos que já es tão famil iar izados, não faz mal e é até bom repet i r . Fun-

damental é a unidade dos dois Testamentos como fonte das inst i tuições

cr is tãs e , também, para anal isar alguns elementos essencia is da Euc a-

ris t ia e sua raiz no passado. Alguma referência a alguma inst i tuição

melhor examinada adiante sempre será acompanhada de uma breve e x-

pl icação, e não causará nenhuma inconveniência. Por sua vez uma an á-

l ise ass im irá famil iar izar o es tudioso com a unidade da Escri turas S a-

grada.

A Inst i tuição da Páscoa Israel i ta é f igura da Cri s tã por causa do

Cordeiro Imolado no âmago de uma refeição sagrada nacional , pois de-

la toda a comunidade Is rael i ta part icipa. Entrando então em com unhão

uns com os outros e com Deus sant i f icam -se em comunhão com a ví t i -

ma do sacri f ício que se imola e se com e. Na mesma perspect iva é a

Páscoa atual , a Eucaris t ia , onde Cris to é a Páscoa Imolada (cfr . 1Cor

5,7) e , por causa do s ignif icado rel igioso do sacri f ício, é den ominada

genericamente de comunhão (1Cor 10,18). A ví t ima do sacri f ício, a

hóst ia , é “ . . . coisa sant íss ima. . .” (cfr . Lv 7,6) . A Páscoa foi inst i tuída

quando, e em comemoração da saída do Povo de Deus do Egi to e dev e-

ria ser comemorada em cada famíl ia como uma espécie de refeição s a-

grada nacional , uma festa e um sacri f ício ( Ex 12,25-28 / Nm 9,13)

presidida pelo pai , que atuava como sacerdote. Posteriormente , com a

central ização do cul to na reforma de Josias , passou a ser imolada no

Templo pelo sacerdote que derramava o sangue no al tar , prosseguindo-

se o cerimonial em famíl ia ou com amigos ou parentes em outros luga-

res (Dt 16,5-7 / 2Cro 30,15-17; 35,10-14), ass im vigorando ao tempo

de Cris to. Algumas s ignif icações se incorporaram ao cerimonial como,

dentre elas , além da de um banquete, a de l ibertação e a de Al iança, e

até mesmo a Messiânica. A l ibertação que impregna a ce lebração da

Páscoa não se resume ao aspecto pol í t ico de um povo em busca de sua

23

real ização nacional , mas tem o sent ido especi f icamente re l igioso que

inicia a formação do “Povo de Iahweh - Deus”, em cumprimento da A-

l iança com Abraão e rat i f icada em várias oportunid ades:

“ E u f a r e i d e t i u m g r a n d e p o v o . . . ” ( G n 1 2 , 2 ) . “ . . . t e u s d e s c e n d e n t e s s e r ã o e s -t r a n g e i r o s n u m p a í s q u e n ã o s e r á o d e l e s . . . ( . . . ) . . . s a i r ã o c o m g r a n d e s b e n s ” ( G n

1 5 , 1 3 - 1 4 ) . “ ( „ J a c ó ‟ ) N ã o t e m a s d e s c e r a o E g i t o , p o r q u e l á e u f a r e i d e t i u m a

g r a n d e n a ç ã o ” ( G n 4 6 , 3 ) . ( ' E g i t o ' ) “ D e u s l e m b r o u - s e d a s u a A l i a n ç a c o m A b r a -ã o , I s a a c e J a c ó ” ( E x 2 , 2 4 ) . “ E u v i , e u v i a m i s é r i a d o m e u p o v o q u e e s t á n o E g i -

t o . . . ( . . . ) P o r i s s o d e s c i a f i m d e l i b e r t á - l o . . . , e p a r a f a z ê - l o s u b i r d a q u e l a t e r r a

p a r a u m a t e r r a b o a e e s p a ç o s a . . . ” ( E x 3 , 7 - 8 ) .

Por esse motivo, com Moisés , Iahweh anuncia a úl t ima praga pa-

ra a saída do Egi to:

“ Ia h w e h d i s s e a M o i s é s : „ F a r e i v i r m a i s u m a p r a g a a i n d a c o n t r a o F a r a ó e c o n t r a

o E g i t o . E n t ã o e l e v o s d e i x a r á p a r t i r ( . . . ) e e l e a t é m e s m o v o s e x p u l s a r á d a q u i .

( . . . ) A s s i m d i z Ia h w e h : à m e i a - n o i t e p a s s a r e i p e l o m e i o d o E g i t o . E t o d o o p r i -

m o g ê n i t o m o r r e r á n a t e r r a d o E g i t o . . . M a s , e n t r e t o d o s o s f i l h o s d e I s r a e l , d e s -

d e o s h o m e n s a t é o s a n i m a i s , n ã o s e o u v i r á o g a n i r d e u m c ã o , p a r a q u e s a i b a i s

q u e Ia h w e h f e z u m a d i s t i n ç ã o e n t r e o E g i t o e I s r a e l ” ( E x 1 1 , 1 - 7 ) .

E imediatamente inst i tui a Páscoa, vinculando os dois acontec i-

mentos em um só fato:

“ E s t e m ê s s e r á p a r a v ó s . . . o p r i n c í p i o d o s m e s e s . . . : A o s d e z d e s t e m ê s , c a d a u m

t o m a r á p a r a s i u m c o r d e i r o p o r f a m í l i a , u m c o r d e i r o p a r a c a d a c a s a . . . O c o r d e i r o

s e r á m a c h o , s e m d e f e i t o e d e u m a n o . . . ( . . . ) . . . . ; e t o d a a a s s e m b l é i a d a c o m u n i -d a d e d e I s r a e l o i m o l a r á a o c r e p ú s c u l o . T o m a r ã o d o s e u s a n g u e e p ô - l o - ã o s o b r e

o s d o i s m a r c o s e a t r a v e s s a d a p o r t a . . . ( . . . ) . . . . ; o q u e , p o r é m , f i c a r a t é p e l a m a -

n h ã , q u e i m á - l o - e i s a o f o g o . n ã o ( “ s e l h e ” ) q u e b r a r á o s s o a l g u m ( „ c f r . t e x t o g r e -g o e E x 1 2 , 4 6 ‟ ) . É a s s i m q u e d e v e r e i s c o m ê - l o : c o m o s l o m b o s c i n g i d o s , s a n d á -

l i a s n o s p é s e c a j a d o n a m ã o ; c o m ê - l o - e i s à s p r e s s a s : é u m a p á s c o a p a r a Ia h w e h .

E n a q u e l a n o i t e e u p a s s a r e i p e l a t e r r a d o E g i t o e f e r i r e i n a t e r r a d o E g i t o t o d o s o s p r i m o g ê n i t o s , d e s d e o s h o m e n s a t é o s a n i m a i s ; e e u , I a h w e h , f a r e i j u s t i ç a s o -

b r e t o d o s o s d e u s e s d o E g i t o . o s a n g u e , p o r é m , s e r á p a r a v ó s u m s i n a l n a s c a s a s

e m q u e e s t i v e r d e s : q u a n d o e u v i r o s a n g u e , p a s s a r e i a d i a n t e e n ã o h a v e r á e n t r e v ó s o f l a g e l o d e s t r u i d o r . . . E s t e s e r á p a r a v ó s u m m e m o r i a l e o c e l e b r a r e i s c o m o

u m a f e s t a p a r a Ia h w e h ; . . . é u m d e c r e t o p e r p é t u o . ( . . . ) . Q u a n d o v o s s o s f i l h o s v o s

p e r g u n t a r e m : „ Q u e r i t o é e s t e ? ‟ , r e s p o n d e r e i s : „ É o s a c r i f í c i o d a p á s c o a p a r a i a h w e h q u e p a s s o u a d i a n t e d a s c a s a s d o s f i l h o s d e I s r a e l n o E g i t o , q u a n d o f e r i u

o s e g í p c i o s , m a s l i v r o u n o s s a s c a s a s . . . ” ( E x 1 2 , 2 - 2 8 ) .

Mesmo que o tex to nada diga , a inst i tuição t raz todos os int e-

grantes de um sacri f ício (a ví t ima imolada em oferenda a Iahweh, o

sangue “espalhado nas portas das casas” como “vida” e proteção do

Povo de Deus, a refeição sagrada compart i lhada por famil iares , a

queima do que sobeja por ser “sa nto”) . E, possui duas caracterís t icas

fundamentais : foi di retamente determinada pelo próprio Deus , e para

ser celebrada como memorial (Gn 9,14-15). Nesse memoria l , como diz

tex tualmente, " . . . eu me lembrarei . . . " (Gn 9,14-15), – quando Iahweh

se lembra, atual iza, e es tava vinculada indestacavelmente à Aliança

pela l ibertação do Povo por Iahweh “que se lembrou da sua Aliança

com Abraão, Isaac e Jacó” (Ex 2,24) e a atual iza, l ibertando o Seu P o-

vo.

Além disso, as expressões: “ Farei just iça sobre todos os deuse s

do Egi to” e “a morte dos primogêni tos do Egi to ” têm um signif icado

profundamente rel igioso, a part i r da inst i tuição muito cara aos ant i -

gos: a primogeni tura , evidentemente es t ruturada no concei to que t i -

nham dos primogêni tos “como aqueles que abrem o útero materno”

24

(Ex 13,2) . Dest inavam-se ao sacerdócio (Nm 3,45) pela pos ição med i-

aneira no ato da geração do nasci turo, “abrindo o útero materno”, i -

naugurando e facul tando o nascimento, donde vis tos como medianeiros

de Iahweh na fecundidade h umana.

Era tão sér ia es ta inst i tuição que, por não a respei tar , Caim teve

sua oferenda rejei tada por Iahweh que acolheu o sacri f ício de Abel que

ofereceu “dos primogêni tos [ou primícias] de seu rebanho” (Gn 4,4); o

redator , na relação das genealogias só menciona o nome deles (Gn 5) ,

e quando se mencionavam os outros nomes o deles era o primeiro (Gn

10); por sua vez , realça que o desprezo de Esaú por ela (Gn 25,29 -34)

fê- lo perdê-la, ocas ionando inimizade mortal entre ele e Jacó, que u-

surpou “sua bênção” (Gn 27), muito cobiça da, por s inal . A ameaça de

Deus ao Faraó de el iminar todos eles do Egi to (Ex 11,4 -10) e o cum-

primento dela ocas ionou a expulsão dos israel i tas pelo Faraó (Ex

12,31-33), terminando este por dizer: “ . . . part i e abençoai a mim tam-

bém” (12,32), por se submeter e se render ao poder de Iahweh que

quando el iminou os dos egípcios poupou os dos israel i tas , vencendo e

assim “ fazendo just iça sobre os deuses do Egi to”. Em conseq uência,

foram os dos israel i tas oficialmente “consagrados a Iahweh, homens e

animais mesmo; aqueles para seu serviço e es tes para o sacr i f ício” (Ex

13).

No deserto, quando da unif icação do sacerdócio, todos os dos

homens foram “subst i tuídos” no sacerdócio que já exerciam, pelos L e-

vi tas (Nm 3,45 e 8,14 -18). São eles ( „ inexis t ia outra possibi l idad e‟) ,

os Primogêni tos , os que são mencionados como “sacerdotes”, a ntes da

sua oficial ização e da sua concentração nos levi tas (Ex 19,22.24), os

“jovens que ofereceram holocaustos e sacri f ícios de comunhão” no S i -

nai (Ex 24,5) , quando da rat i f icação da A liança:

“ M o i s é s e s c r e v e u t o d a s a s p a l a v r a s d e Ia h w e h ; e , l e v a n t a n d o - s e d e m a n h ã , c o n s -t r u i u u m a l t a r . . . D e p o i s e n v i o u a l g u n s j o v e n s d o s f i l h o s d e I s r a e l , e o f e r e c e r a m

o s s e u s h o l o c a u s t o s e i m o l a r a m a I a h w e h n o v i l h o s c o m o s a c r i f í c i o d e c o m u n h ã o .

M o i s é s t o m o u a m e t a d e d o s a n g u e e c o l o c o u - a e m b a c i a s , e e s p a r g i u a o u t r a m e -t a d e d o s a n g u e s o b r e o a l t a r . T o m o u o L i v r o d a A l i a n ç a e l e u p a r a o P o v o ; e e l e s

d i s s e r a m : „ T u d o o q u e Ia h w e h f a l o u , n ó s o f a r e m o s e o b e d e c e r e m o s . ‟ M o i s é s

t o m o u d o s a n g u e e o a s p e r g i u s o b r e o p o v o , e d i s s e : „ e s t e é o s a n g u e d a A l i a n ç a q u e Ia h w e h f e z c o n v o s c o , a t r a v é s d e t o d a s e s s a s c l á u s u l a s ” ( E x 2 4 , 1 - 8 )

Viu-se como entre os ant igos os primogêni tos eram dest inados,

além da chefia do c lã, ao exercício do sacerdócio, motivo da “just iça

de Iahweh sobre os deuses do Egi to”. Com a morte deles es tava destr u-

ída a rel igião egípcia, deixando de ex is t i r o sacerdócio que era exerc i-

do por eles . A Páscoa então comemora também este fato que caracter i -

za a perenidade do sacerdócio israel i ta (Ex 19,6) , "Meu Fi lho Primo-

gêni to" (Ex 4,22s) , e em co nsequência, a da Aliança:

“ . . . I a h w e h . . . d i s s e - l h e : „ A s s i m d i r á s à C a s a d e J a c ó . . . V ó s m e s m o s v i s t e s o q u e e u f i z a o s e g í p c i o s . . . A g o r a , s e o u v i r d e s a m i n h a v o z e g u a r d a r d e s a m i n h a A l i -

a n ç a , s e r e i s p a r a m i m u m a p r o p r i e d a d e p e c u l i a r e n t r e t o d o s o s p o v o s , p o r q u e t o -

d a a t e r r a é m i n h a . V ó s s e r e i s p a r a m i m u m r e i n o d e s a c e r d o t e s e u m a n a ç ã o s a n t a . ( . . . ) V e i o M o i s é s . . . e x p ô s d i a n t e d e l e s t o d a s e s t a s p a l a v r a s q u e Ia h w e h

l h e h a v i a o r d e n a d o . E n t ã o t o d o o p o v o r e s p o n d e u : „ T u d o o q u e I a h w e h d i s s e , n ó s

o f a r e m o s ” ( E x 1 9 , 3 - 8 ) . / “ T o m o u o L i v r o d a A l i a n ç a e o l e u p a r a o p o v o ; e e l e s d i s s e r a m : „ T u d o o q u e Ia h w e h f a l o u , n ó s o f a r e m o s e o b e d e c e r e m o s . ‟ M o i s é s

t o m o u d o s a n g u e e o a s p e r g i u s o b r e o p o v o , e d i s s e : „ E s t e é o S a n g u e d a A l i a n ç a

q u e I a h w e h f e z c o n v o s c o , a t r a v é s d e t o d a s e s s a s c l á u s u l a s ” ( E x 2 4 , 7 - 8 ) .

25

Iahweh havia di to ao Faraó , por meio de Moisés:

“ A s s i m f a l o u Ia h w e h : „ o m e u p r i m o g ê n i t o é I s r a e l ‟ . E e u t e d i s s e : „ f a ç a p a r t i r m e u f i l h o , p a r a q u e m e s i r v a ! ‟ m a s , u m a v e z q u e r e c u s a s d e i x á - l o p a r t i r , e i s q u e

f a r e i p e r e c e r o t e u f i l h o p r i m o g ê n i t o ” ( e x 4 , 2 2 - 2 3 ) .

E é o próprio J esus , que ao inst i tui r a eucaris t ia e após o r i tual

da páscoa dos judeus vincula tudo is to ao que se denominou nova al i -

ança, inst i tui o sacerdócio dela e inclui o m emorial . É ele que as rel a-

ciona, mostrando assim o “pleno cumprimento” (M t 5 ,17) que ele

mesmo lhes imprimiu:

“ B e b e i d e l e t o d o s , p o i s i s t o é o m e u s a n g u e , o s a n g u e d a a l i a n ç a , q u e é d e r r a -m a d o p o r m u i t o s p a r a a r e m i s s ã o d o s p e c a d o s ” ( M t 2 6 , 2 7 - 2 8 ; M c 1 4 , 2 4 ; Lc

2 2 , 2 0 ; 1 C o r 1 1 , 2 5 ) . “ E s t e c á l i c e é a N o v a A l i a n ç a e m m e u s a n g u e ; t o d a s a s v e -

z e s q u e d e l e b e b e r d e s , f a z e i - o e m m e m ó r i a d e m i m ” ( 1 C o r 1 1 , 2 5 ) .

É por isso tudo que São Paulo, São João e São Pedro têm condi-

ções para dar a J esus o t í tulo de Cordeiro ident i f icando-o ao Pascal :

“ P o i s N o s s a P á s c o a , C r i s t o , f o i i m o l a d a ” ( 1 c o r 5 , 7 ) .

Em São João é preciso combinar o brado de João Bat is ta com a

conclusão quando J esus morre na cruz; para is to , a part i r da f igura do

cordeiro anunciado pelo Servo de Deus ( Is 53,7.12 / Jo 1,29) e vai -se

num crescendo até a t ingir , no f inal , a do Cordeiro Pascal na cruz , pela

expressão: “nenhum dos seus ossos lhe será quebrado” (ex 12,46 / jo

19,33-37):

“ N o d i a s e g u i n t e , e l e ( „ J o ã o B a t i s t a ‟ ) v ê J e s u s a p r o x i m a r - s e e d i z : „ e i s o C o r -

d e i r o d e D e u s , q u e t i r a o p e c a d o d o m u n d o ‟ ( J o 1 , 2 9 / Is 5 3 , 7 . 1 2 ) ” . “ a o v e r J e -s u s q u e p a s s a v a , d i s s e : „ e i s o c o r d e i r o d e d e u s ‟ ” ( J o 1 , 3 6 / Is 5 3 , 7 ) . / “ C h e g a n -

d o a J e s u s e v e n d o - o j á m o r t o , n ã o l h e q u e b r a r a m a s p e r n a s ( . . . ) , p o i s i s t o s u c e -

d e u p a r a q u e s e c u m p r i s s e a e s c r i t u r a : „ n e n h u m d o s s e u s o s s o s l h e s e r á q u e b r a -d o ‟ ” ( J o 1 9 , 3 3 - 3 7 / E x 1 2 , 4 6 ) .

"Porque is to sucedeu para que se cumprisse a escri tura: nenhum

dos seus ossos será quebrado" - São João Evangel is ta ident i f ica jesus

com o cordei ro pascal . Este fato nos leva à inst i tuição da eucaris t ia

fei ta após a ceia pascal isr ael i ta:

" E , c h e g a d a a h o r a , p ô s - s e J e s u s à m e s a , e c o m e l e o s a p ó s t o l o s . E d i s s e - l h e s : T e n h o d e s e j a d o a r d e n t e m e n t e c o m e r c o n v o s c o e s t a P á s c o a , a n t e s d a m i n h a p a i -

x ã o ; p o i s v o s d i g o q u e n ã o a c o m e r e i m a i s a t é q u e e l a s e c u m p r a n o r e i n o d e

D e u s " ( Lc 2 2 , 1 4 - 1 6 ) .

Vê-se que, após a Ceia Pascal dos judeus, com as palavras "t e-

nho desejado , ardentemente , comer convosco esta páscoa, antes da m i-

nha paixão; pois vos digo que não a comerei mais até que ela se cum-

pra no reino de Deus", Jesus encerra a Páscoa t radicional e logo a s e-

guir inst i tui a Cris tã , a Eucaris t ia:

" E n t ã o h a v e n d o r e c e b i d o u m c á l i c e , e t e n d o d a d o g r a ç a s , d i s s e : T o m a i - o , e r e -

p a r t i - o e n t r e v ó s ; p o r q u e v o s d i g o q u e d e s d e a g o r a n ã o m a i s b e b e r e i d o f r u t o d a

v i d e i r a , a t é q u e v e n h a o r e i n o d e D e u s . ( “ a q u i t e r m i n a a P á s c o a d o s j u d e u s ” ) E t o m a n d o u m p ã o , e h a v e n d o d a d o g r a ç a s , p a r t i u - o e d e u - o a e l e s d i z e n d o : I s t o é

o m e u c o r p o , q u e é d a d o p o r v ó s ; f a z e i i s t o e m m e m ó r i a d e m i m . S e m e l h a n t e -

26

m e n t e , d e p o i s d a c e i a , t o m o u o c á l i c e , d i z e n d o : E s t e c á l i c e é a n o v a a l i a n ç a e m m e u s a n g u e , q u e é d e r r a m a d o p o r v ó s " ( Lc 2 2 , 1 7 - 2 0 ) .

Para realçar o fato da identidade de Jesus como o Cordeiro Pascal

é que os Evangelistas, que narram a Instituição da Eucaristia , mostram-

na acontecendo no mesmo dia da Sua Morte, levando -se em conta que o

dia para o judeu começava à tarde e terminava na tarde seguinte. É o

próprio Jesus que vinculou todas, - Páscoa e Aliança, Eucaristia e Morte

na Cruz, - tornando-as inseparáveis:

M t 2 6 , 2 6 - 2 8 M c 1 4 , 2 2 - 2 4 Lc 2 2 , 1 9 - 2 0 1 C o r 1 1 , 2 3 - 2 5

“ E n q u a n t o c o m i a m , J e -s u s t o m o u u m p ã o e ,

t e n d o - o a b e n ç o a d o ,

“ E n q u a n t o c o m i a m , e l e t o m o u u m p ã o ,

a b e n ç o o u ,

“ E

t o m o u u m p ã o ,

“ . . . : n a n o i t e e m

q u e f o i e n t r e g u e , o S e n h o r J e s u s

t o m o u o p ã o e ,

D e u g r a ç a s , d e p o i s d e d a r g r a -

ç a s ,

P a r t i u - o

e , d i s t r i b u i n d o - o a o s

d i s c í p u l o s ,

P a r t i u - o

e d i s t r i b u i u - l h e s ,

P a r t i u

e d i s t r i b u i u - o

a e l e s ,

p a r t i u - o

D i s s e :

T o m a i e c o m e i ,

I s t o é o m e u c o r p o . ‟

D i z e n d o :

T o m a i ,

I s t o é o m e u c o r p o . ‟

D i z e n d o :

„ I s t o é o m e u c o r p o

e d i s s e :

„ I s t o é o m e u c o r p o ,

Q u e é d a d o p o r v ó s .

F a z e i i s t o e m m i n h a

m e m ó r i a . ‟

Q u e é p a r a v ó s ;

f a z e i i s t o e m m e m ó -

r i a d e m i m . ‟

D e p o i s , D a n d o g r a ç a s ,

t o m o u u m c á l i c e ,

e d e u - l h o d i z e n d o : „ B e b e i d e l e

t o d o s , p o i s

D e p o i s , d a n d o g r a ç a s ,

e , t o m o u u m c á l i c e

d e u - l h e s e t o d o s d e l e b e b e r a m .

E d i s s e - l h e s :

E , d e p o i s d e c o m e r , F e z o m e s m o

C o m o c á l i c e ,

d i z e n d o :

a p ó s a c e i a , D o m e s m o m o d o ,

t a m b é m t o m o u o c á -

l i c e ,

d i z e n d o :

I s t o é o m e u s a n g u e ,

o s a n g u e d a A l i a n ç a ,

I s t o é o m e u s a n g u e ,

o s a n g u e d a A l i a n ç a ,

„ E s t e c á l i c e é a

N o v a A l i a n ç a E m m e u s a n g u e ,

„ E s t e c á l i c e é a

N o v a A l i a n ç a e m m e u s a n g u e ;

Q u e é d e r r a m a d o p o r

m u i t o s p a r a r e m i s s ã o d o s p e c a d o s . ”

q u e é d e r r a m a d o e m f a v o r d e m u i t o s . ”

Q u e é d e r r a m a d o E m f a v o r d e v ó s . ”

t o d a s a s v e z e s q u e

d e l e b e b e r d e s , f a z e i - o e m m e m ó r i a

d e m i m . ”

Apesar de cada narrador pretender abordar um ângulo diferente

ex is tem detalhes que lhes são comuns. Destaca -se, para es te exame, o

Sangue da Aliança em Mateus e Marcos, e a Nova Aliança em Meu

Sangue em Lucas e Paulo. Em si dizem a mesma coisa, eis que, em

Mateus e Marcos Jesus é apresentado como aquele que “não veio rev o-

gar a Lei e os Profetas , mas dar- lhes pleno cumprimento” (Mt 5,17),

enquanto Lucas e Paulo ao se referi r em à Nova Aliança dizem o mes-

mo, naturalmente já se reportan do às profecias messiânicas , dentre as

quais se destaca:

“ E i s q u e v i r ã o d i a s - o r á c u l o d e I a h w e h - e m q u e s e l a r e i c o m a c a s a d e I s r a e l ( e a c a s a d e J u d á ) u m a N o v a A l i a n ç a . N ã o c o m o a A l i a n ç a q u e s e l e i c o m s e u s p a i s ,

n o d i a e m q u e o s t o m e i p e l a m ã o p a r a f a z ê - l o s s a i r d o E g i t o - m i n h a A l i a n ç a

q u e e l e s m e s m o s r o m p e r a m , e m b o r a e u f o s s e o s e u S e n h o r . . . P o r q u e e s t a á a A -l i a n ç a q u e s e l a r e i c o m a c a s a d e I s r a e l d e p o i s d e s s e s d i a s , . . . E u p o r e i a m i n h a

l e i n o s e u s e i o e a e s c r e v e r e i e m s e u c o r a ç ã o . E n t ã o e u s e r e i o s e u D e u s e e l e s

s e r ã o o m e u p o v o . ( . . . ) . P o r q u e t o d o s m e c o n h e c e r ã o , ( . . . ) , p e r d o a r e i a s u a c u l p a e n ã o m e l e m b r a r e i d e m a i s d e s e u p e c a d o ” ( J r 3 1 , 3 1 - 3 4 ) . “ S e l a r e i c o m e l e s u m a

A l i a n ç a E t e r n a . . . ” ( J r 3 1 , 3 9 ) .

Ao que se percebe a Nova Aliança já era um ter mo presente na

Sagrada Escri tura, com o que Cris to era famil iar izado e pretendeu i -

naugurá-la naquela cerimônia, e determinando a sua repet ição como

um memorial . Várias outras Profecias referi ram -se ao advento do Mes-

27

sianismo (Ez 16,62; 34,23s; 36,26s; 37,24 .26-28 etc. ) com tal anúncio,

t raduzindo a consol idação da Aliança com a expiação dos p ecados . E,

dentre outros fatos como que coroando Sua Obra a vinda do Espír i to

Santo, tão bem revelado por São Pedro no dia de Pentecostes (At 2,16 -

21 / J l , 3 ,1-5) . Da mesma forma, confi rmando o seu cumprimento em

Cris to, São Paulo a ela se refere categor icamente:

“ E i s p o r q u e E l e é m e d i a d o r d e u m a N o v a A l i a n ç a . A s u a m o r t e a c o n t e c e u p a r a o r e s g a t e d a s t r a n s g r e s s õ e s c o m e t i d a s n o r e g i m e d a P r i m e i r a A l i a n ç a ; e , p o r i s s o ,

a q u e l e s q u e s ã o c h a m a d o s r e c e b e m a h e r a n ç a e t e r n a q u e f o i p r o m e t i d a . ( . . . ) O r a ,

n e m m e s m o a P r i m e i r a A l i a n ç a f o i i n a u g u r a d a s e m e f u s ã o d e s a n g u e . D e f a t o , d e p o i s q u e M o i s é s p r o c l a m o u a t o d o o p o v o c a d a m a n d a m e n t o d a l e i , e l e t o m o u

o s a n g u e d e n o v i l h o s e d e b o d e s ( . . . ) e a s p e r g i u o p r ó p r i o l i v r o e t o d o o p o v o ,

a n u n c i a n d o : E s t e é o S a n g u e d a A l i a n ç a q u e D e u s v o s o r d e n o u . S e g u n d o a Le i , q u a s e t o d a s a s c o i s a s s e p u r i f i c a m c o m s a n g u e ; e s e m e f u s ã o d e s a n g u e n ã o h á

r e m i s s ã o ” ( H b 9 , 1 5 - 2 2 ) .

Cris to na Ceia Eucarís t i ca, confi rmando o que anunciara na Mu l-

t ipl icação dos Pães, es tabelece indissolúvel união d‟Ela com o sangue

derramado na Cruz e o sangue aspergido por Moisés no Sinai :

“ M o i s é s t o m o u d o s a n g u e e o a s p e r g i u s o b r e o p o v o , e d i s s e : - „ E s t e é o S a n g u e d a A l i a n ç a q u e Ia h w e h f e z c o n v o s c o . . . ‟ ” ( E x 2 4 , 8 ) .

É a esse Sangue da Aliança que Cris to se ident i f ica como Co r-

deiro Pascal , na Inst i tuição da Eucaris t ia , tornando -o “o Cál ice da No-

va Aliança em meu Sangue”, tal como apresentam uniformemente M a-

teus e Marcos de um lado, Lucas e São Paulo de outro:

M A T E U S E M A R C O S L U C A S E P A U L O

D e p o i s , t o m o u u m c á l i c e e d a n d o g r a -

ç a s d e u - l h o

D i z e n d o : „ B e b e i d e l e t o d o s , p o i s

D e p o i s , t o m o u u m c á l i c e e , d a n d o g r a ç a s , d e u -

l h e s e t o d o s d e l e b e b e -

r a m . E d i s s e - l h e s :

e , d e p o i s d e c o m e r , f e z

o m e s m o c o m o c á l i c e ,

d i z e n d o : „ e s t e C á l i c e

d o m e s m o m o d o , a p ó s a c e i a , t a m -

b é m t o m o u o c á -

l i c e , d i z e n d o :

e s t e C á l i c e é a

i s t o é o M eu S a n g u e , o S a n g u e

d a A l i a n ç a ,

i s t o é o M eu S a n g u e , o S a n g u e

d a A l i a n ç a ,

é a

N o v a A l i a n ç a e m m e u s a n g u e ,

N o v a A l i a n ç a e m m e u s a n g u e ;

Q u e é d e r r a m a d o p o r

m u i t o s p a r a r e m i s s ã o d o s p e c a d o s . ”

q u e é d e r r a m a d o

e m f a v o r d e m u i t o s . ”

Q u e é d e r r a m a d o

E m f a v o r d e v ó s . ”

T o d a s a s v e z e s

q u e d e l e b e b e r -d e s , f a z e i - o e m

m e m ó r i a d e m i m

Para Mateus, Jesus deveria se ident i f icar com Moisés , e ass im,

com “a Lei e os Pro fetas” (Mt 5,17), motivo por que o sangue deveria

ser “derramado por muitos para a remissão dos pecados” ou "bebido

em sua memória" [ „o bom odor que aplaca‟ (v. Gn 8,21)] , lembrando

os sacri f ícios leví t icos , be m como, o da própria Páscoa após Josias ,

em que “sem efusão de sangue não há remi ssão” (Hb 9,22):

“ P o r q u e a v i d a d a c a r n e e s t á n o s a n g u e . E e s t e s a n g u e e u v o - l o t e n h o d a d o p a r a

f a z e r o r i t o d a e x p i a ç ã o s o b r e o a l t a r , p e l a s v o s s a s v i d a s ; p o i s é o s a n g u e q u e f a z e x p i a ç ã o p e l a v i d a ” ( Lv 1 7 , 1 1 / H b 9 , 2 2 ) . / “ O s a c e r d o t e f a r á p o r e l e o r i t o

d a e x p i a ç ã o d i a n t e d e Ia h w e h , e e l e s e r á p e r d o a d o , q u a l q u e r q u e s e j a a a ç ã o q u e

o c a s i o n o u a s u a c u l p a ” ( L v 5 , 2 6 ) .

28

Esse derramar o sangue a que Cris to , em Mateus , se refere é o

r i to de expiação:

“ S e a s u a o f e r e n d a c o n s i s t i r e m h o l o c a u s t o d e a n i m a l g r a n d e , o f e r e c e r á u m m a -c h o s e m d e f e i t o . . . P o r á a m ã o s o b r e a c a b e ç a d a v í t i m a e e s t a s e r á a c e i t a p a r a

q u e s e f a ç a p o r e l e o r i t o d e e x p i a ç ã o . E m s e g u i d a i m o l a r á o n o v i l h o d i a n t e d e

I a h w e h , e o s f i l h o s d e A a r ã o , o s s a c e r d o t e s , o f e r e c e r ã o o s a n g u e . E l e s o d e r r a -m a r ã o a o r e d o r s o b r e o a l t a r . . . ” ( L v 1 , 3 - 5 . 1 1 - 1 2 ) .

Mas, es ta expiação se dá na Cruz:

“ . . . , s e a l g u é m p e c a r , t e m o s c o m o a d v o g a d o , j u n t o d o P a i , J e s u s C r i s t o , o j u s t o .

E l e é a v í t i m a d e e x p i a ç ã o p e l o s n o s s o s p e c a d o s . . . ” ( 1 J o 2 , 1 - 2 ) . ” N i s t o c o n s i s t e o a m o r : n ã o f o m o s n ó s q u e a m a m o s a D e u s , m a s f o i e l e q u e m n o s a m o u e e n v i -

o u - n o s o s e u f i l h o c o m o v í t i m a d e e x p i a ç ã o p e l o s n o s s o s p e c a d o s ” ( 1 J o 4 , 1 0 )

Jesus ao dizer -se Sangue e Sangue da Aliança durante a cer imô-

nia da Ceia Eucarís t ica , antecipa a expiação do sacri f ício da Cruz. E s-

se é o motivo por que nos Sinót icos a Inst i tuição da Eucari s t ia e o S a-

cri f ício da Cruz são s i tuados no mesmo dia, fazendo de ambos um só

fato; e São João ao adi tar no seu Evangelho a menção de que ao pr e-

tenderem quebrar os ossos dos crucif icados não o f izeram com Jesus,

que já es tava morto. Ao mesmo tempo revela o Evangel is ta que se

cumpria a prescrição referente ao cordeiro pascal de que “nenhum o sso

lhe será quebrado” (ex 12 ,46) , e ass im o ident i f ica com J esus. também,

tão clara como a re lação sacri f ical , é a “memória” dessa vinculação

indestacável ao calv ário:

“ . . . d e p o i s , t o m o u u m c á l i c e e d a n d o g r a ç a s d e u - l h o d i z e n d o : „ b e b e i d e l e t o d o s , p o i s i s t o é o M e u S a n g u e , o S a n g u e d a A l i a n ç a , q u e é d e r r a m a d o p o r m u i t o s p a r a

r e m i s s ã o d o s p e c a d o s . ” “ . . . f a z e i - o e m m e m ó r i a d e m i m ” ( M t 2 6 , 2 6 - 2 8 / M c

1 4 , 2 2 - 2 4 / Lc 2 2 , 1 9 - 2 0 / 1 C o r 1 1 , 2 3 - 2 5 ) .

Além da relação sacri f ical e de comunhão de uma refeição s a-

grada, e como bebendo o seu sangue recebe-se sua vida (Dt 12,23; Lv

17,11a), a Eucaris t ia é o Sacri f ício perfei to da Nova Aliança e Fonte

de Vida, Sacramento, Fonte de Sant i f icação , ta l como dissera, “Eu vim

para que tenham vida e a tenham em pleni tude” (Jo 10,10). A Eucari s-

t ia atual iza e real iza todos aqueles valores que em figura , eram pert i -

nentes à Páscoa dos Judeus, que pela Aliança l ibertou o Povo de Deus

do Egi to e o conduziu à Ter ra Prometida; e , agora, se cumprindo na

Páscoa Cris tã, pela Nova Aliança, l iberta o Homem do peca do e o con-

duz à Vida Eterna.

“. . . fazei -o em memória de mim”, já foi vis to quando se anal isou

o Dilúvio (Gn 8,21) o s ignif icado et imológico da palavra memória ,

que se t ranscreve: “. . . perfume que aplaca. . .” – mui tas Bíbl ias t razem

esta t radução que é a qu e melhor se ident i f ica ao resul tado almejado

com um Sacri f ício, no caso do Dilúvio e na opinião do narrador, seria

a Ira de Iahweh pelos atos contrários ao Seu Desígnio. A palavra m e-

mória em hebraico tem uma conotação com perfume ou odor. É que ,

quando alguém usa perfume, mesmo após sua saída do local , a prese n-

ça do odor marca a sua estadia pela lembra nça. Quando se celebra um

Sacri f ício, imola -se a ví t ima em lugar do ofertante e Deus ao sent i r o

odor da fumaça, lembra-se dele, do ofertante. Então, Deus ao sent i r o

“odor de Cris to, a v í t ima imolada no sacri f ício, lembra -se do ofertante

29

e o Sant i f ica pela Comunhão” (cfr Cap. I , nº 1 .8 .2, no f inal) . Quando

Deus se lembra, atual iza (Gn 9,14s / Ex 2,24, anal isados em 2.5 – A

Páscoa e a Eucaris t ia , acima).

2.6. - A PÁSCOA E A PASSAGEM DO MAR VERMELHO

O Povo Israel i ta que já nascia para a vida em comunhão com

Deus inaugura a sua nação teocrát ica no Sinai (Ex 19 a 24) es tabel e-

cendo-a após a inst i tuição do Sacerdócio dos Primogêni tos (Ex 13,1-

16). Além da Páscoa, outros Sacri f ícios const i tui r iam a base do seu

cul to e ident i f icando-se com a Aliança estabelece o seu Sacerdócio,

"primícias da sant i f icação e do poder de Deus". Is to tem esta caract e-

r ís t ica de “primícia” em decorrência de ser Israel “Fi lho Primogêni to

de Iahweh” qual idade exalada dos próprios dizeres de Jacó a R úben, o

seu primogêni to (Gn 49,3) . Sem sacerdócio não há sacri f ícios (Hb 5,1 -

3; 8 ,3) . Assim organizados, ou expulsos , ou fugindo, saem do Egi to

após a celebração da Páscoa, sabendo que "naquele mes mo dia Iahweh

t i rou os f i lhos de Is rael da terra do Egi to, segundo os seus exérci tos"

(Ex 12,51). "Leva-os não pelo caminho habi t ual da terra dos f i l is teus"

(Ex 13,17), pois que, despreparados para uma guerra contra os que os

queriam capturar poderiam se a pavorar e entregar -se ao Egi to. Por isso

os desviava por out ro caminho, fugindo. Apesar de " subirem armados

da terra do Egi to" (Ex 13,18b) do seu manejo não t inham prát ica, nem

consciência es t ratégica, nem estavam preparados para defender a n a-

cional idade nascente. Além disso, como "Moisés levou consigo os o s-

sos de José" (Ex 13,19), evidenciando a tônica rel igiosa de tudo o que

acontecia, tendo por fulcro a Aliança, só se entregariam à guerra em

defesa de sua fé conforme estavam conscient izados (Ex 13,17 -19). A-

provei taram-se da permissão que o Faraó dera para "servi r a Iahweh

como tendes di to" (Ex 12,31), escaparam. Na verdade, f ugi ram:

" Q u a n d o , p o i s , f o i a n u n c i a d o a o r e i d o E g i t o q u e o p o v o h a v i a f u g i d o , m u d o u - s e o c o r a ç ã o d e F a r a ó , e d o s s e u s s e r v o s , c o n t r a o p o v o , e d i s s e r a m : Q u e é i s s o q u e

f i z e m o s , p e r m i t i n d o q u e I s r a e l s a í s s e e d e i x a s s e d e n o s s e r v i r ? E F a r a ó a p r o n t o u

o s e u c a r r o , e t o m o u c o n s i g o o s e u p o v o ; t o m o u t a m b é m s e i s c e n t o s c a r r o s e s c o -l h i d o s e t o d o s o s c a r r o s d o E g i t o , e c a p i t ã e s s o b r e t o d o s e l e s . P o r q u e Ia h w e h

e n d u r e c e u o c o r a ç ã o d e F a r a ó , r e i d o E g i t o , e e s t e p e r s e g u i u o s f i l h o s d e I s r a e l ; p o i s o s f i l h o s d e I s r a e l s a í a m a f o i t a m e n t e . O s e g í p c i o s , c o m t o d o s o s c a v a l o s e

c a r r o s d e F a r a ó , e o s s e u s c a v a l e i r o s e o s e u e x é r c i t o , o s p e r s e g u i r a m e o s a l -

c a n ç a r a m a c a m p a d o s j u n t o a o m a r , p e r t o d e P i a i r o t , d i a n t e d e B a a l - S e f o m " ( E x 1 4 , 5 - 9 ) .

"Que é isso que f izemos, permit indo que Israel saísse e deixa sse

de nos servir?" - ret rata uma s i tuação que não se pode deixar de lado

quando se anal isa esse fato. O Po vo do Egi to, apesar de já mencionado

como integrante da opressão aos israel i tas , não poderia es tar part ic i -

pando dela, eis que, da inst rução dada por Deus constata -se a ex is tên-

cia de uma s i tuação pecul iar :

" F a l a a g o r a a o p o v o , q u e c a d a h o m e m p e ç a a o s e u v i z i n h o , e c a d a m u l h e r à s u a

v i z i n h a , j ó i a s d e p r a t a e j ó i a s d e o u r o . E Ia h w e h d e u a o p o v o g r a ç a a o s o l h o s d o s e g í p c i o s . A l é m d i s s o , o v a r ã o M o i s é s e r a m u i t o i m p o r t a n t e n a t e r r a d o E g i -

t o , a o s o l h o s d o s s e r v o s d e F a r a ó e a o s o l h o s d o p o v o " ( E x 1 1 , 2 - 3 ) / " F i z e r a m ,

p o i s , o s f i l h o s d e I s r a e l c o n f o r m e a p a l a v r a d e M o i s é s , e p e d i r a m a o s e g í p c i o s j ó i a s d e p r a t a , e j ó i a s d e o u r o , e r o u p a s . E Ia h w e h d e u a o p o v o g r a ç a a o s o l h o s

30

d o s e g í p c i o s , d e m o d o q u e e s t e s l h e d a v a m o q u e p e d i a ; e d e s p o j a r a m a o s e g í p -c i o s " ( E x 1 2 , 3 5 - 3 6 ) .

Este comentário do narrador é suficiente para se entender bem a

s i tuação dos israel i tas , pois não é de se es t ranhar essa demonstração

de amizade dos egípcios que se encont rou. Principalmente quando se

lembra que o s is tema econômico insta lado por José no início de seu

governo ainda vigorava (Gn 47,13 -27). Pelo menos não há regis t ro b í-

bl ico de nenhuma revogação e o regime de servidão a que os israel i tas

es tavam sujei tos era compart i lhado pelos cidad ãos egípcios , também

ví t imas. Então os que perseguiam o s i srael i tas eram os soldados ou

serviçais do Faraó e sua co rte, não o povo egípcio em si .

Outros se originavam de vários outros povos que, aprovei tando a

oportunidade fugiram também, pois "subiu com eles uma mult idão com

ovelhas , gado e muit íss imos anima is" (Ex 12,38). E os perseguiam a

todos exclusivamente por causa da crise econômica que seria causada

com a perda do "quinto de produção" estabelecidos (Gn 47,26) e da

mão de obra barata e competente que "construiu para Faraó as c idades

armazéns de Pi tom e Ramsés" (Ex 1,11). Não é de hoje que a economia

just i f ica a t i rania e o imperial ismo dos poderes do mundo profano com

tais arbi t rar iedades contra a dignidade humana. Ainda, atualmente, em

vez de a economia ex is t i r para o engrandecimento do homem é o h o-

mem que exis te para o engrandecimento da economia. Ass im, não se

há de est ranhar as condições desumanas em vigor naquela época.

Também, outro fato digno de nota é que "Deus ia adiante deles ,

de dia numa coluna de nuvem para guiá-los pelo caminho, e de noi te

numa coluna de fogo para alumiá-los", ass im protegendo e cond uzindo

o Seu Povo. E , es t ra tegicamente , o conduz fazendo até mesmo o Faraó

pensar que est ivessem perdidos e desorientados no deserto e se an i -

masse a perseguí- los com a intenção de encurralá- los em frente ao Mar

Vermelho, onde mais uma vez manifestar -se-ia o Poder de Ia hweh:

" A s s i m p a r t i r a m d e S u c o t , e a c a m p a r a m - s e e m E t a m , à e n t r a d a d o d e s e r t o . E I -

a h w e h i a a d i a n t e d e l e s , d e d i a n u m a c o l u n a d e n u v e m p a r a o s g u i a r p e l o c a m i -n h o , e d e n o i t e n u m a c o l u n a d e f o g o p a r a o s a l u m i a r , a f i m d e q u e c a m i n h a s s e m

d e d i a e d e n o i t e . N ã o d e s a p a r e c i a d e d i a n t e d o p o v o a c o l u n a d e n u v e m d e d i a ,

n e m a c o l u n a d e f o g o d e n o i t e . D i s s e Ia h w e h a M o i s é s : ' F a l a a o s f i l h o s d e I s r a e l q u e s e v o l t e m e ( . . . ) a s s e n t a r e i s o a c a m p a m e n t o j u n t o a o m a r . E n t ã o F a r a ó d i r á

d o s f i l h o s d e I s r a e l : “ E l e s e s t ã o d e s o r i e n t a d o s n a r e g i ã o , o d e s e r t o o s e n c e r -r o u . ” E u e n d u r e c e r e i o c o r a ç ã o d e F a r a ó , e e l e o s p e r s e g u i r á ; g l o r i f i c a r - m e - e i

e m F a r a ó , e e m t o d o o s e u e x é r c i t o ; e s a b e r ã o o s e g í p c i o s q u e e u s o u Ia h w e h ‟ . E

e l e s f i z e r a m a s s i m " ( E x 1 3 , 2 0 - 1 4 , 4 ) .

Foi um momento por demais dramático em que o Povo dos Fi lhos

de Is rael , despreparado, percebeu que, apesar da " coluna de nuvem e

fogo" estava entr incheirado ent re o mar e o exérci to do Faraó pelo que

é muito natural que temesse e se amedrontasse. Anuncia -se uma séria

dif iculdade a enfrentar , o Povo clamou a Deus, e se bem que prote s -

tando energicamente procurou o próprio Moisés para uma solução e a

resposta que lhes deu mostra a fé que se deposi tava em I ahweh Deus.

Não se tem not ícia de alguma deserção nem de que alguns se entrega s-

sem ao Faraó, que os ter ia recebido de braços abertos . Moisés não pe r-

de a calma e o cont role da s i tuação, o Povo a recupera e também crê,

percebendo-se que, proposi tadamente, "se tomou outro caminho que o

dos f i l is teus" (Ex 13,17):

31

" Q u a n d o F a r a ó s e a p r o x i m a v a , o s f i l h o s d e I s r a e l l e v a n t a r a m o s o l h o s , e e i s q u e

o s e g í p c i o s m a r c h a v a m a t r á s d e l e s ; p e l o q u e t i v e r a m m u i t o m e d o o s f i l h o s d e I s -

r a e l e c l a m a r a m a Ia h w e h ! E d i s s e r a m a M o i s é s : ' F o i p o r q u e n ã o h a v i a s e p u l c r o s

n o E g i t o q u e d e l á n o s t i r a s t e p a r a m o r r e r m o s n e s t e d e s e r t o ? P o r q u e n o s f i z e s t e i s t o , t i r a n d o - n o s d o E g i t o ? N ã o é i s t o o q u e t e d i s s e m o s n o E g i t o : D e i x a - n o s ,

q u e s i r v a m o s a o s e g í p c i o s ? P o i s m e l h o r n o s f o r a s e r v i r a o s e g í p c i o s , d o q u e

m o r r e r m o s n o d e s e r t o ' . M o i s é s , p o r é m , d i s s e a o p o v o : ' N ã o t e m a i s ; p e r m a n e c e i f i r m e s e v e r e i s o q u e Ia h w e h h o j e f a r á p a r a v o s l i v r a r ; p o r q u e o s e g í p c i o s q u e

h o j e v e d e s , n u n c a m a i s t o r n a r e i s a v e r ; I a h w e h p e l e j a r á p o r v ó s ; e v ó s v o s t r a n -

q u i l i z a r e i s " ( E x 1 4 , 1 0 - 1 4 ) .

Al i , onde o Faraó pensara que os israel i tas es tavam perd idos,

acontece um fato ou fenômeno que permanece humanamente inexpl ic á-

vel conhecido como a "passagem milagrosa do Mar Vermelho ", que se

abriu para os israel i tas e se fechou af ogando os egípcios:

" E n t ã o d i s s e Ia h w e h a M o i s é s : P o r q u e c l a m a s a m i m ? D i z e a o s f i l h o s d e I s r a e l

q u e m a r c h e m . E t u , l e v a n t a a t u a v a r a , e e s t e n d e a m ã o s o b r e o m a r e f e n d e - o ,

p a r a q u e o s f i l h o s d e I s r a e l p a s s e m p e l o m e i o d o m a r e m s e c o . E i s q u e e u e n d u -r e c e r e i o c o r a ç ã o d o s e g í p c i o s , e s t e s e n t r a r ã o a t r á s d e l e s ; e g l o r i f i c a r - m e - e i e m

F a r a ó e e m t o d o o s e u e x é r c i t o , n o s s e u s c a r r o s e n o s s e u s c a v a l e i r o s . E o s e -

g í p c i o s s a b e r ã o q u e e u s o u Ia h w e h , q u a n d o m e t i v e r g l o r i f i c a d o n o F a r a ó , n o s s e u s c a r r o s e n o s s e u s c a v a l e i r o s . E n t ã o o a n j o d e D e u s , q u e i a a d i a n t e d o e x é r -

c i t o d e I s r a e l , s e r e t i r o u e s e p ô s a t r á s d e l e s ; t a m b é m a c o l u n a d e n u v e m s e r e t i -

r o u d e d i a n t e d e l e s e s e p ô s a t r á s , c o l o c a n d o - s e e n t r e o c a m p o d o s e g í p c i o s e o c a m p o d o s i s r a e l i t a s ; a s s i m h a v i a n u v e m e t r e v a s ; c o n t u d o a q u e l a c l a r e a v a a

n o i t e p a r a I s r a e l ; d e m a n e i r a q u e e m t o d a a n o i t e n ã o s e a p r o x i m o u u m d o o u t r o .

E n t ã o M o i s é s e s t e n d e u a m ã o s o b r e o m a r ; e I a h w e h f e z r e t i r a r o m a r p o r u m f o r t e v e n t o o r i e n t a l t o d a a q u e l a n o i t e , e f e z d o m a r t e r r a s e c a , e a s á g u a s f o r a m

d i v i d i d a s . E o s f i l h o s d e I s r a e l e n t r a r a m p e l o m e i o d o m a r e m s e c o ; e a s á g u a s

f o r a m - l h e s q u a l m u r o à s u a d i r e i t a e à s u a e s q u e r d a . E o s e g í p c i o s o s p e r s e g u i -r a m , e e n t r a r a m a t r á s d e l e s a t é o m e i o d o m a r , c o m t o d o s o s c a v a l o s d e F a r a ó ,

o s s e u s c a r r o s e o s s e u s c a v a l e i r o s . N a v i g í l i a d a m a n h ã , Ia h w e h , n a c o l u n a d o

f o g o e d a n u v e m , o l h o u p a r a o c a m p o d o s e g í p c i o s , e a l v o r o ç o u o c a m p o d o s e -g í p c i o s ; e m b a r a ç o u - l h e s a s r o d a s d o s c a r r o s , e f ê - l o s a n d a r d i f i c u l t o s a m e n t e ; d e

m o d o q u e o s e g í p c i o s d i s s e r a m : F u j a m o s d e d i a n t e d e I s r a e l , p o r q u e Ia h w e h p e -

l e j a p o r e l e s c o n t r a o s e g í p c i o s " ( E x 1 4 , 1 5 - 2 5 ) .

Pela narrat iva , percebe-se que Moisés não t i tubeou um instante

sequer, chegando a dizer que "os egípcios que hoje vedes, nunca mais

tornareis a ver" (Ex 14,13), e "estendeu a mão sobre o mar; e Iahweh

fez ret i rar o mar por um forte vento or iental toda aquela noi te, e fez

do mar terra seca, e as águas foram div ididas ". Não foi um acontec i-

mento instantâneo como pode parecer , eis que o mar foi açoi ta do por

um forte vento oriental toda aquela noi te e não se t ratava de um p e-

queno grupo de pessoas que passou a pé enxuto. Mas, o retorno das

águas ao seu nível normal foi sem demora , a ponto de at ingi r o exérc i-

to faraônico de su rpresa:

" N i s s o Ia h w e h d i s s e a M o i s é s : E s t e n d e a m ã o s o b r e o m a r , p a r a q u e a s á g u a s s e

t o r n e m s o b r e o s e g í p c i o s , s o b r e o s s e u s c a r r o s e s o b r e o s s e u s c a v a l e i r o s . E n t ã o M o i s é s e s t e n d e u a m ã o s o b r e o m a r , e o m a r r e t o m o u a s u a f o r ç a a o a m a n h e c e r ,

e o s e g í p c i o s f u g i r a m d e e n c o n t r o a e l e ; a s s i m o S e n h o r d e r r i b o u o s e g í p c i o s n o

m e i o d o m a r . A s á g u a s , t o r n a n d o , c o b r i r a m o s c a r r o s e o s c a v a l e i r o s , t o d o o e -x é r c i t o d e F a r a ó , q u e a t r á s d e l e s h a v i a e n t r a d o n o m a r ; n ã o f i c o u n e m s e q u e r u m

d e l e s . M a s o s f i l h o s d e I s r a e l c a m i n h a r a m a p é e n x u t o s p e l o m e i o d o m a r ; a s

á g u a s f o r a m - l h e s q u a l m u r o à s u a d i r e i t a e à s u a e s q u e r d a . A s s i m Ia h w e h , n a -q u e l e d i a , s a l v o u I s r a e l d a m ã o d o s e g í p c i o s ; e I s r a e l v i u o s e g í p c i o s m o r t o s n a

p r a i a d o m a r . E v i u I s r a e l a g r a n d e o b r a q u e Ia h w e h o p e r a r a c o n t r a o s e g í p c i o s ;

p e l o q u e o p o v o t e m e u a Ia h w e h , e c r e u e m Ia h w e h e e m M o i s é s , s e u s e r v o " ( E x 1 4 , 2 6 - 3 1 ) .

Para o fenômeno ocorrido não se encontrou até hoje uma expl i -

cação natural que fosse sat isfatória ou exata ou defini t iva, e tudo ind i-

32

ca que nunca se conseguirá , principalmente , porque os israel i tas es t a-

vam encurralados e conseguiram passar o Mar Vermelho sem uma ba i-

xa sequer. Algo de miraculoso aconteceu e sua descrição minuciosa se

mesclou com o nacional ismo nascente e poét ico não permit indo outra

visão que a descri ta . A t í tulo i lust rat ivo conta-se:

“ A m ã e p e r g u n t a a s e u f i l h o o q u e e s t á e s t u d a n d o n o C a t e c i s m o P a r o q u i a l . O m e n i n o r e s p o n d e q u e " o P a d r e e n s i n o u q u e q u a n d o M o i s é s t i r o u o P o v o d e D e u s

d o E g i t o f e z c o n s t r u i r u m a e n o r m e p o n t e d e c o n c r e t o a r m a d o p a r a o p o v o p a s -

s a r . Q u a n d o o s e g í p c i o s v i e r a m a t r á s d o s I s r a e l i t a s , M o i s é s d i n a m i t o u a p o n t e . O s e g í p c i o s c a í r a m n o m a r e m o r r e r a m t o d o s ” . A s s u s t a d a a m ã e r e t o r n a : " M eu

D e u s ! É i s s o m e s m o q u e o P a d r e e s t á e n s i n a n d o , m e u f i l h o ? ! " R e s p o n d e o m e n i -

n o , a s s u s t a d o c o m a r e a ç ã o d a m ã e : " N ã o m a m ã e , n ã o f o i i s s o o q u e o P a d r e e n -s i n o u . M a s s e e u c o n t a r c o m o o P a d r e e n s i n o u a s e n h o r a n ã o v a i a c r e d i t a r " ! ! !

Há pouco tempo num fi lme de Jesus Cris to, desses que a única

coisa que se faz é fals i f icar tudo, em determinado momento f ict ício

apresenta-se Pi latos dizendo a Caifás: "Vocês chegam a pensar que

Deus abriu o mar para vocês passarem". Ao que Caifás respondeu: ". . .

nós passamos". Nessa resposta do rotei ro está uma expl icação sucinta

do fenômeno: alguma coisa aco nteceu para que f icasse tão impr egnada

na História de Is rael :

" E v i u I s r a e l a g r a n d e o b r a q u e Ia h w e h o p e r a r a c o n t r a o s e g í p c i o s ; p e l o q u e o

p o v o t e m e u a Ia h w e h , e c r e u n ‟ E l e e e m M o i s é s , s e u s e r v o " ( E x 1 4 , 3 1 ) .

". . . o povo temeu a Iahweh, e creu n‟Ele e em Moisés , seu servo "

- da mesma forma que com as pragas repete -se o reconhecimento do

Povo de Deus pelo acontecimento ou fenômeno que não pode ter s ido

algo assim normal ou costumeiro, pois foi suficiente para incut i r um

temor reverencial e ao mesmo tempo fé em Deus como confiança em

Moisés . Isso é o que importa e não a procura de expl icação para o f e-

nômeno, nunca se conseguindo a contento e, além disso, por demais

desnecessários a não ser aqui lo que prefigurava a se cumpri r em Cri s to

(Mt 5,17) . É São Paulo quem mostra esse cumprimento:

" P o i s n ã o q u e r o , i r m ã o s , q u e i g n o r e i s q u e n o s s o s p a i s e s t i v e r a m t o d o s d e b a i x o

d a n u v e m , e t o d o s p a s s a r a m p e l o m a r ; e , n a n u v e m e n o m a r , t o d o s f o r a m b a t i -

z a d o s e m M o i s é s , e t o d o s c o m e r a m d o m e s m o a l i m e n t o e s p i r i t u a l ; e b e b e r a m t o -d o s d a m e s m a b e b i d a e s p i r i t u a l , p o r q u e b e b i a m d a p e d r a e s p i r i t u a l q u e o s a c o m -

p a n h a v a ; e a p e d r a e r a C r i s t o " ( 1 C o r 1 0 , 1 - 4 ) .

Outra confusão que é muito freq uente é a da Páscoa com “esta

passagem" do Mar Vermelho. Apesar de próximos os acontec imentos , a

referência entre eles é apenas cronológica ou, f igura pela semelha nça

fát ica entre a l ibertação do Egi to (pela água) e a l ibertação do pec ado

pelo bat ismo na água. Fenômeno semelhante i rá acontecer e se rep et i r

nas águas do Jordão , quando o Povo de Is rael passar pelo seco e e ntrar

com os Sacerdotes carregando a Arca da Aliança na Terra Prometida

(Js 3 ,14-17). Finalmente, é ensino da Sagrada Escri tura que “ a Deus

tudo é possível” (Gn 18,14 / Lc 1,37).

2.7. - DEUS CONDUZ O SEU POVO

33

Após tal façanha , os Israel i tas se inflamam e junto co m Moisés

acompanhado de sua i rmã Maria e todas as mulheres , em homenagem,

entoaram e dançaram um poema tal como é muito comum no Oriente

Médio (Ex 15,1 -21) . Entoam um canto a Iahweh, reconhecendo Seu

Poder e Soberania, bem como a força do Seu Espír i to [" sopro de suas

narinas" (Ex 15,8)] "entre todos os deuses" (Ex 15,11) como se fora

um Hino da Independência. Mencionam a Sant idade de Iahweh , forma

de caracterizar bibl icamente a t ranscendência de Deus separado e di s-

t into dos seres que criou e tendo sobre ele s ainda pleno domínio. Et i -

mologicamente , em hebraico , há semelhança nas raízes das palavras

santo e separado :

" A o s o p r o d a s t u a s n a r i n a s a m o n t o a r a m - s e a s á g u a s , a s c o r r e n t e s p a r a r a m c o m o m o n t ã o ; o s a b i s m o s c o a l h a r a m - s e n o c o r a ç ã o d o m a r . O i n i m i g o d i z i a : P e r s e g u i -

r e i , a l c a n ç a r e i , r e p a r t i r e i o s d e s p o j o s ; d e l e s s e s a t i s f a r á a m i n h a a l m a ; a r r a n c a -

r e i a m i n h a e s p a d a , a m i n h a m ã o o s d e s t r u i r á . S o p r a s t e c o m o t e u v e n t o , e o m a r

o s c o b r i u ; a f u n d a r a m - s e c o m o c h u m b o e m á g u a s p r o f u n d a s . Q u e m e n t r e o s d e u -

s e s é c o m o t u , ó Ia h w e h ? Q u e m é c o m o t u p o d e r o s o e m s a n t i d a d e , a d m i r á v e l e m

l o u v o r e s , o p e r a n d o p r o d í g i o s ? E s t e n d e s t e a m ã o d i r e i t a , e a t e r r a o s t r a g o u " ( E x 1 5 , 8 - 1 2 ) .

"Na tua bondade guiaste o povo que remiste; na tua força o

c \ \duzis te à tua santa habi tação” (Ex 15,1 3) – Realça-se a misericórdia

de Deus l ibertando-os para conduzi - los à Terra Prometida, aqui refe-

renciada com ess a frase, int roduzida no poema para esclarecimento ,

muito tempo depois como afi rmam os exegetas . Isso aconteceu quando

se assumiu a posse da Terra Prometida , nela res idindo e es tabelecidos ,

após terem derrotado e dominado os pagãos ou gent ios e com uma in-

cipiente organização r i tual do Templo ou Santuário (Ex 25,8-9):

" N a t u a b o n d a d e g u i a s t e o p o v o q u e r e m i s t e ; n a t u a f o r ç a o c o n d u z i s t e à t u a

s a n t a h a b i t a ç ã o . O s p o v o s o u v i r a m e e s t r e m e c e r a m ; d o r e s a p o d e r a r a m - s e d o s h a b i t a n t e s d a F i l i s t é i a . E n t ã o o s p r í n c i p e s d e E d o m s e p a s m a r a m ; d o s p o d e r o s o s

d e M o a b a p o d e r o u - s e u m t r e m o r ; d e r r e t e r a m - s e t o d o s o s h a b i t a n t e s d e C a n a ã .

S o b r e e l e s c a i u m e d o , e p a v o r ; p e l a g r a n d e z a d o t e u b r a ç o e m u d e c e r a m c o m o u m a p e d r a , a t é q u e o t e u p o v o p a s s a s s e , ó Ia h w e h , a t é q u e p a s s a s s e e s t e p o v o

q u e a d q u i r i s t e . T u o s i n t r o d u z i r á s , e o s p l a n t a r á s n o m o n t e d a t u a h e r a n ç a , n o

l u g a r q u e t u , ó Ia h w e h , a p a r e l h a s t e p a r a a t u a h a b i t a ç ã o , n o s a n t u á r i o , ó Ia h -w e h , q u e a s t u a s m ã o s e s t a b e l e c e r a m . Ia h w e h S e n h o r r e i n a r á e t e r n a e p e r p e t u a -

m e n t e " ( E x 1 5 , 1 3 - 1 8 ) .

Não se pode deixar de regis t rar essa inclusão de esclarecime n-

tos , fei to com fatos ocorridos no futu ro, muito comum na confecção da

Escri tura Sagrada e que muitas vezes confunde o estudioso. Um exe m-

plo claro disso foi a frase usada na narrat iva da saída do Egi to em que

se diz que Deus " levou-os não pelo caminho habi tual da ter ra dos f i l i s -

teus" (Ex 13,17), sabendo-se que a esse tempo os f i l is teus ainda não

habi tavam, nem eram conhecidos na Palest ina. Narra -se o acontec i-

mento com a cul tura e os conhecimentos que se tem na ocasião da na r-

rat iva e não conforme a ocasião em que aconteceram realmente.

Também costuma o narrador mesclar algum versícu lo est ranho ao

contexto e fora do assunto, tal como nesse poema, acrescentado muito

tempo depois por t rechos fora de lugar, entrecortado por uma espécie

de parêntesis e dest inado à sat isfação de algum esclarecimento ex igido

por t radição oral di s t inta da na rrada. Nesse ponto parece que se ex tr a-

34

via do assunto para outro aspecto da viagem, abrindo -se uma espécie

de parêntesis :

" D e p o i s M o i s é s f e z p a r t i r a I s r a e l d o M a r V e r m e l h o , e s a í r a m p a r a o d e s e r t o d e S u r ; c a m i n h a r a m t r ê s d i a s n o d e s e r t o , e n ã o a c h a r a m á g u a . E c h e g a r a m a M a r a ,

m a s n ã o p o d i a m b e b e r d a s s u a s á g u a s , p o r q u e e r a m a m a r g a s ; p o r i s s o c h a m o u - s e

o l u g a r M a r a . E o p o v o m u r m u r o u c o n t r a M o i s é s , d i z e n d o : Q u e h a v e m o s d e b e -b e r ? E n t ã o c l a m o u M o i s é s a Ia h w e h , e Ia h w e h m o s t r o u - l h e u m a á r v o r e , e M o i s é s

l a n ç o u - a n a s á g u a s , a s q u a i s s e t o r n a r a m d o c e s . A l i D e u s l h e s d e u u m e s t a t u t o e

u m a o r d e n a n ç a , e a l i o s p r o v o u , d i z e n d o : S e o u v i r e s a t e n t a m e n t e a v o z d e Ia h -w e h t e u D e u s , e f i z e r e s o q u e é r e t o d i a n t e d e s e u s o l h o s , e i n c l i n a r e s o s o u v i -

d o s a o s s e u s m a n d a m e n t o s , e g u a r d a r e s t o d o s o s s e u s e s t a t u t o s , s o b r e t i n ã o e n -

v i a r e i n e n h u m a d a s e n f e r m i d a d e s q u e e n v i e i s o b r e o s e g í p c i o s ; p o r q u e e u s o u I a h w e h q u e t e s a r a . E n t ã o v i e r a m a E l i m , o n d e h a v i a d o z e f o n t e s d e á g u a e s e -

t e n t a p a l m e i r a s ; e a l i , j u n t o d a s á g u a s , a c a m p a r a m " ( E x 1 5 , 2 2 - 2 7 ) .

Não se pode deixar de lado e se esquecer da presença na vida

humana das consequências do pecado a se manifestar sempre até me s-

mo com os elei tos , os escolhidos por Deus para uma missão. Deus usa

delas para amadurecê-los , prová-los (Ex 15,25), em outras palavras

mais adequadas à real idade, temperá-los ou mesmo prepará-los , para

aqui lo que deles espera; pois já os conhece bem e não necessi ta su b-

meter ninguém à prova para saber com quem l ida (1Sm 16,7; 11,20; Jó

10,4; J r 17,10; Is 55 ,8 -9; Jo 2,25). Também não se pode deixar de lado

que a Bíbl ia não é um l ivro especial izado em História ou em Psicol o-

gia ou em qualquer ciência, e que o centro gravi tacional dela é a fé em

Iahweh.

Além de tudo isso não se pode anal isar fato do passado apress a-

damente sem se considerar a s i tuação real do acontecimento, nem e-

xaminá-lo com base na cul tura atual e nas conquis tas his tóricas . Pri n-

cipalmente ainda pelo fato de que a Bíb l ia ter ia s ido escri ta , não para

o homem atual , mas para os israel i tas daquele tempo e a dis posição

lógica dos fatos do que se narra se adequava a eles , com a sua cul tura

e modo de raciocinar . As narrat ivas daquele tempo nem sempre se i -

dent i f icam ao s is tema atual de relatar fatos ou acontecimentos nem s e-

guem a mesma ordem lógica ou cron ológica. E , ainda, poucas pessoas

sabiam ler , além do fato de que se escrevia para quem já conhecia o

assunto e, também, havia muita dif iculdade em s e conseguir o material

para escrever, motivos causadores dos resumos e s ínteses fei tos , me n-

cionando-se muitas vezes somente o indispensável ou o est r i tamente

necessário.

Tudo indica que a reclamação ter ia s ido séria e até mesmo pr ó-

x ima ao desespero. Mas, é isso mesmo que soe aco ntecer a um povo

sedentário , que, de uma hora para outra , passa às pressas para uma v i-

da nômade estando para ela , completamente despreparado. Na real id a-

de, esse povo vivia no Egi to na amargura de uma servidão, mas t inha

água para beber e comida com a fartura necessária para manter -se e à

própria famíl ia . Não era um regime de escravidão plena como se pensa

e muitas vezes se propaga, mas um sis tema econômico que reduziu t o-

do o povo a um regime de servidão semelhante ao que se poderia d e-

nominar de um esboço da corvéia, onde não lhes fal tava o al imento

necessário à subsis tência para manter o r i tmo do t rabalho e da produ-

ção (Ex 14,12; 16,3) . Agora, porém, sem esse conforto, caminhando

errante num deserto com todos os familiares expostos a toda a sorte de

35

intempéries , tendo que encontrar uma fonte de água para se dessede n-

tar , com o pão ainda sem o ferment o, mal preparado agora esgotando ,

sem mais al imentos e , não conhecendo a inda a vida no deser to , é mui-

to natural que se desesp erem.

De novo se observa que não desertaram , mas procuraram Moisés

e Aarão e reclamaram. É essa dif iculdade de vida que o narrador quer

mostrar e a s i tuação em que se encontravam, demonstrando, pelo r e-

sul tado alcançado, que não houve uma sedição propriamente di ta , mas

uma s i tuação de emergência contornada. E o povo saiu amadurecido e

preparado para o prosseguim ento da peregrinação em busca da consu-

mação da Promessa da Terra Prometida. Deus os prepara desde já e , tal

como com os Patr iarcas , pelo sofr imento, e então recebem de Deus a

aprovação:

" . . . A l i D e u s l h e s d e u u m e s t a t u t o e u m a o r d e n a n ç a , e a l i o s p r o v o u , d i z e n d o : S e

o u v i r e s a t e n t a m e n t e a v o z d e Ia h w e h t e u D e u s , e f i z e r e s o q u e é r e t o d i a n t e d e

s e u s o l h o s , e i n c l i n a r e s o s o u v i d o s a o s s e u s m a n d a m e n t o s , e g u a r d a r e s t o d o s o s

s e u s e s t a t u t o s , s o b r e t i n ã o e n v i a r e i n e n h u m a d a s e n f e r m i d a d e s q u e e n v i e i s o b r e o s e g í p c i o s ; p o r q u e e u s o u I a h w e h q u e t e c u r a " ( E x 1 5 , 2 5 - 2 6 ) .

Essas palavras não se apl icariam a um povo rebelde que t ivesse

realmente se revol tado contra Iahweh Deus. Recorreram a quem dev e-

riam, e pelo fato da prát ica adquir ida por Moisés da vida no deserto,

onde aprendeu os seus s egredos e as condições necessárias para a s o-

brevivência nas mais adversas s i tuações , superou -se a s i tuação. O Po-

vo de Israel seguia o mesmo trajeto muito famil iar a Moisés até o

Monte Sinai , onde Deus lhe aparecera e onde apascentava o rebanho de

seu sogro (Ex 3,1) . No local onde Deus disse -lhe que seria adorado

quando fosse l ibert ado o Seu Povo (Ex 3,12) , comprovando -se assim o

cumprimento da promessa de l ibertá - lo . Por causa de sua experiê ncia,

Moisés conhece a madeira a ser colocada na água para a adoçar . Aqui

é que não se pode anal isar como se fora uma narração comum, mas d e-

ve-se levar em conta o s ignif icado s imbólico aí subjacente e em fi gu-

ra, já que tanto a água amarga como seu adoçante t raduzem as muitas

dif iculdades encontradas, t razendo o amadurecim ento dos i srael i tas no

contato com a vida se lvagem e rude:

" E n t ã o v i e r a m a E l i m , o n d e h a v i a d o z e f o n t e s d e á g u a e s e t e n t a p a l m e i r a s ; e a l i , j u n t o d a s á g u a s , a c a m p a r a m " ( E x 1 5 , 2 7 ) .

Quando muitas vezes não se entende o que se lê na Bíbl ia é que

foi deixado de lado o sent ido rel igioso que, por excelência, foi expre s-

so com primazia. Também, o Povo Is rael i ta não era apenas um amo n-

toado de pessoas com costumes, sent imentos , ambições, his tória e

normas comuns, mas um povo organizado em torno de uma rel igião

comum, o centro i r radiador de todos os demais elementos const i tut ivos

de sua real idade. Então o s ignif icado imediato do vers ículo acima

t ranscri to não se l imita a um relato apenas cronológico ou seq uencial

da peregrinação. É que as doze fontes são como que re presentações

das doze t r ibos dos f i lhos de Israel , f rutos das setenta pessoas que

desceram ao Egi to (Ex 1,5 / Gn 46,27), s ignif icadas pelas setenta pa l-

meiras , onde fert i lmente se prol i feraram e " acamparam junto das á-

guas" (Rio Nilo) , qual seja de seu Senho r e recebem a Sua Bênção nas

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fontes da fecundidade, motivo da grande prol i feração dos Fi lhos de I s-

rael (Ex 1,7.12).

2.7.1. – O MANÁ, AS CODORNIZES E A ÁGUA DA ROCHA

Inegavelmente , a l ibertação do Povo de Israel do Egi to é um

mistério por causa dos prodígios conhecidos por pragas , às vezes i -

nexpl icáveis . Por isso, supõe -se não passarem de lendas ou fenômenos

naturais exal tados ao grau máximo pelo ardor t r ibal , j á na origem do

Povo dos Fi lhos de Israel . Porém, da mesma forma que ocorre com a

Passagem do Mar Vermelho não se pode deixar de reconhecer a pr e-

sença at iva de Deus que o l iberta. Diz -se o mesmo das águas amargas

que Moisés adoçou com um pedaço de madeira (Ex 15,23 -24); do fe-

nômeno das codornizes at ravessando o mar em busca de terra f i rme

(Ex 16,13) com que o Povo se far tou de carne . Também, da água do

rochedo (Ex 17,1 -7) com que ele saciou a sede; e , quando se esbarra

com o Maná impõe-se o reconhecimento da mesma presença at iva d e

Deus (Ex 16,9-35) al imentando os Fi lhos de Is rael com “o pão do

céu” .

Essa presença de Iahweh junto a Seu Povo é dinâmica , `` sempre

percept ível ao menor s inal de alguma necessidade ameaçando o Desí g-

nio de Deus. É o que aparece principalmente com o exame da narr at iva

do Maná e das Codornizes . O relato j á se referiu ao choque que deve

ter ocorrido com a mudança de s i tuação do Povo dos Fi lhos de Is rael

saindo em fuga de uma opressão para um deserto inóspi to, passando a

sofrer fome e sede. Apesar de parecer sedição quando os Is rael i tas r e-

clamavam dessas condições adversas , a s i t uação foi sempre resolvida e

a paz mant ida (Ex 32,1.25 / Nm 16 e 25), mesmo com soluções mu itas

vezes dramáticas , e nunca comprometendo a unidade. Os Profetas

sempre denominaram o período de peregrinação no deserto como um

fel iz tempo de noivado de Iahweh com o Seu Povo (J r 2 ,2 / Os 2,16;

11,1) .

As privações que encontraram no deserto foram de tal sorte que

os f izeram se esquecer (vrs . 11 e 12) o que sofreram no Egi to. Exig i-

ram a solução energicamen te junto a Moisés e Aarão os l íderes da fuga

empreendida , responsabi l izando-os pela drást ica s i tuação em que se

encontravam. São relatos do que a vida dura no deserto esculpiu na

personal idade e no caráter do Povo dos Fi lhos de Israel , amadurece n-

do-o para a envergadura da missão que o aguardava assumindo a Al i -

ança de Abraão, Isaac e Jacó. Deus conduziu -o com uma pedagogia a-

propriada à tomada de consciência de sua tarefa de Povo Primogêni to,

"as primícias da fecundidade de Iahweh " (Gn 49,3) . Foi ass im suste n-

tado e al imentado pelo próprio Deus com a carne das C odornizes e

com o pão do Maná, f iguras da Eucaris t ia , do mesmo modo que i rá a-

l imentar o Povo da Nova Aliança com o Corpo („ Carne e Pão ‟) e San-

gue de Seu Fi lho. Algumas dif iculdades não conseguem obscurecer os

fatos das codornizes e do maná, ret i rando -lhes o bri lho. É que, para

alguns, a migração das codornizes se dá em setembro e o f enômeno do

maná em maio-junho no centro desért ico do Sinai onde escasseia a v e-

getação, não passando de f enômenos naturais .

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Mas, como foi di to na Introdução, não há observância crono lógi-

ca dos fatos narrados na Escri tura Sagrada. Expunha -se s implesmente,

dest inando-se a narrat iva quase sempre a quem conhecia o que se e s-

crevia, dispensando -se muitos detalhes . Ora, na primavera os bandos

de codornizes emigram da África para o Norte, hav endo poucas que a-

t ravessavam a Península do Sinai , onde a vegetação era muito pobre.

Porém, a dimensão do prodígio de Iahweh aval ia -se pela abundância de

codornizes e da época em que aparecem, conforme o que se informa

em Ex 16,1 e Nm 11,31, conjugados. Os dois fatos podem ter oco rrido

em épocas dis t intas , porém com o mesmo objet ivo de evidenciar a pr e-

sença at iva de Iahweh, motivo que poderia levar o h agiógrafo a uni - los

em uma mesma narração , de acordo com a cul tura da época.

Conforme anunciara Iahweh, re spondendo aos reclamantes , ma n-

dou primeiro a carne: “à tarde subiram as codornizes e cobri ram o a r-

raial . . .” l i teralmente “. . . o lharam para o deserto, e eis que, a gl ória de

Iahweh apareceu na nuvem”. Viram uma nuvem onde se manifestou a

“Glória de Deus”, nuvem que outra coisa não era que aquela que se m-

pre lhes dera guarida (Ex 13,21 -22; 19,16; 24,15-18), e num primeiro

lance a visão das codornizes , voando em bando. “Chegai -vos à presen-

ça de Iahweh . . .” é outra f rase digna de anál ise, contrariando a opinião

geral de se t ratar de antecipação cronológica da presença da Arca, para

melhor entendimento dos ouvintes . Adiante, quando se comenta o ve r-

s ículo t r inta e quatro, vai -se admit i r a mesma antecipação cronológica ,

com a ressalva de que lá usou -se o termo especí f ico Testemunho, onde

se colocou o vaso com maná. Mas, ex istem vários locais onde se fez a

mesma observação, que fogem a essa ci rcunstância. É o caso de Adão

se esconder da “presença de Iahweh Deus” (Gn 3,8) e de Abraão ao s e-

lar a Aliança com a inst i tuição da ci rcuncisão ao ouvir “ . . . anda na

minha presença e sê perfei to” (Gn 17,1) . Conclui -se então que “andar

na presença de Iahweh, é viver honestamente”. Então, foi isso que se

exigiu do povo em peregr inação, uma ret idão de costumes dentro da-

quela moral natural que todo ser humano t raz ao nascer :

“ P a r t i r a m d e E l i m , e t o d a a c o n g r e g a ç ã o d o s f i l h o s d e I s r a e l v e i o p a r a o d e s e r t o d e S i m , q u e e s t á e n t r e E l i m e S i n a i , a o s q u i n z e d i a s d o s e g u n d o m ê s , d e p o i s q u e s a í r a m

d a t e r r a d o E g i t o . T o d a a c o n g r e g a ç ã o d o s f i l h o s d e I s r a e l m u r m u r o u c o n t r a M o i s é s e A a r ã o n o d e s e r t o ; d i s s e r a m - l h e s o s f i l h o s d e I s r a e l : Q u e m n o s d e r a t i v é s s e m o s

m o r r i d o p e l a m ã o d e Ia h w e h , n a t e r r a d o E g i t o , q u a n d o e s t á v a m o s s e n t a d o s j u n t o à s

p a n e l a s d e c a r n e e c o m í a m o s p ã o a f a r t a r ! P o i s n o s t r o u x e s t e s a e s t e d e s e r t o , p a r a m a t a r d e s d e f o m e t o d a e s t a m u l t i d ã o . E n t ã o , d i s s e Ia h w e h a M o i s é s : E i s q u e v o s f a -

r e i c h o v e r p ã o d o c é u , e o p o v o s a i r á e c o l h e r á d i a r i a m e n t e a p o r ç ã o p a r a c a d a d i a ,

p a r a q u e e u p o n h a à p r o v a s e a n d a n a m i n h a l e i o u n ã o . D a r - s e - á q u e , a o s e x t o d i a , p r e p a r a r ã o o q u e c o l h e r e m ; e s e r á o d o b r o d o q u e c o l h e m c a d a d i a . E n t ã o , d i s s e

M o i s é s e A r ã o a t o d o s o s f i l h o s d e I s r a e l : à t a r d e , s a b e r e i s q u e f o i Ia h w e h q u e m v o s

t i r o u d a t e r r a d o E g i t o , e , p e l a m a n h ã , v e r e i s a g l ó r i a d e Ia h w e h , p o r q u a n t o o u v i u a s v o s s a s m u r m u r a ç õ e s ; p o i s q u e m s o m o s n ó s , p a r a q u e m u r m u r e i s c o n t r a n ó s ? P r o s s e -

g u i u M o i s é s : S e r á i s s o q u a n d o Ia h w e h , à t a r d e , v o s d e r c a r n e p a r a c o m e r e , p e l a

m a n h ã , p ã o q u e v o s f a r t e , p o r q u a n t o Ia h w e h o u v i u a s v o s s a s m u r m u r a ç õ e s , c o m q u e v o s q u e i x a i s c o n t r a e l e ; p o i s q u e m s o m o s n ó s ? A s v o s s a s m u r m u r a ç õ e s n ã o s ã o c o n -

t r a n ó s , e s i m c o n t r a Ia h w e h . D i s s e M o i s é s a A r ã o : D i z e a t o d a a c o n g r e g a ç ã o d o s

f i l h o s d e I s r a e l : C h e g a i - v o s à p r e s e n ç a d e Ia h w e h , p o i s o u v i u a s v o s s a s m u r m u r a -ç õ e s . Q u a n d o A r ã o f a l a v a a t o d a a c o n g r e g a ç ã o d o s f i l h o s d e I s r a e l , o l h a r a m p a r a o

d e s e r t o , e e i s q u e a g l ó r i a d e Ia h w e h a p a r e c e u n a n u v e m . E I a h w e h d i s s e a M o i s é s :

T e n h o o u v i d o a s m u r m u r a ç õ e s d o s f i l h o s d e I s r a e l ; d i z e - l h e s : A o c r e p ú s c u l o d a t a r -d e , c o m e r e i s c a r n e , e , p e l a m a n h ã , v o s f a r t a r e i s d e p ã o , e s a b e r e i s q u e e u s o u Ia h -

w e h , v o s s o D e u s . À t a r d e , s u b i r a m c o d o r n i z e s e c o b r i r a m o a r r a i a l ; p e l a m a n h ã , j a -

z i a o o r v a l h o a o r e d o r d o a r r a i a l ” ( E x 1 6 , 1 - 1 3 ) .

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“Então. . . sabereis que foi Iahweh quem vos t i rou da terra do

Egi to” (v . 4 ) , já se impondo o nome de Iahweh como o nome do Deus a

ser adorado pelo Povo dos Fi lhos de Israel . Quanto ao maná em si há

maior variedade de descrições (Ex 16,31 / Nm 11, 6 -9 / Dt 8 ,3.16 / Ne

9,20 / Sl 78,24). E, a resposta de Iahweh de que “ lhes dar ia carne e

pão dos céus para que reconhecessem o seu poder”, se concret iza sem

mais tardar , e “chove o maná”, “ l i t ter is”: “ . . . pela manhã, jaz ia o o r-

valho ao redor do arraial . E, quando se evaporou o orvalho que caíra,

na superfície do deserto res tava uma coisa f ina e semelhante a esca-

mas, f ina como a geada sobre a terra.” Iahweh estabelece en tão um r e-

gulamento para a co lhei ta , repart indo -o. Limitou-a em um gômer („ t rês

l i t ros e meio‟ ) por pessoa em cada dia, de acordo com os dias da s e-

mana; modificando -se, apenas nas sextas -fei ras , quando a ração de c a-

da um era dobrada por causa do sába do quando não lhes cair ia o “m a-

ná”, “o pão dos céus que Deus lhes dar ia” e lhes far ia “chover pão do

céu” (cf r v . 4) . De várias maneiras poderia ser servido e preparado

desde a véspera (Nm 11,8) , rat i f icando -se tanto na sua a l imentação,

como na colhei ta o respei to ao “repouso do s ábado”.

Aquela tendência em anal isar o s prodígios real izados no Egi to

julgando-os o resul tado de algum fenômeno natural esbarra aqui com

um sério obstácu lo: a surpresa do povo desconhecendo-o e perguntan-

do “manhu?”, que se t raduz por “o que é is to?”, donde o termo “maná”

adveio , al iado ao próprio tex to que informa em seguida que “não sab i -

am o que era”. Confunde -se o referido maná com a secreção de um i n-

seto de algumas tamareiras , contrariando a surpresa e o desconhec i -

mento gera is . O grande prodígio é que , após a colhei ta , veri f icava-se

que “medindo -o com o gômer, não sobejava ao que colhera mu ito, nem

fal tava ao que colhera pouco, pois colheram cada um quan to podia

comer”, fato que se contrapõe a um fenômeno natural . Também, nada

dele poderia ser deixado para o dia se guinte a não ser no sábado. Dele

foi ret i rado um vaso que deveria ser guardado “na presença de Ia h-

weh” , i s to é, a primeira vis ta , no Tabernácul o:

“ T o m a u m v a s o , m e t e n e l e u m g ô m e r c h e i o d e m a n á e c o l o c a - o d i a n t e d e Ia h w e h , p a r a g u a r d a r - s e à s v o s s a s g e r a ç õ e s . C o m o Ia h w e h o r d e n a r a a M o i s é s , a s s i m A r ã o

o c o l o c o u d i a n t e d o T e s t e m u n h o p a r a o g u a r d a r ” ( E x 1 6 , 3 3 - 3 4 ) .

Outra af i rmação fora da ordem cr onológica, eis que se referindo

ao Testemunho, as Tabuas de Pedra com o Decálogo, falam do Tabe r-

náculo, da Arca da Aliança ainda inexis tente. A dimensão do prodígio

é t raduzida por Moisés reconhecendo ser dom de Deus, “ i s to é o pão

que Iahweh vos dá para v osso al imento”, e sela a questão.

Em vários locais a Sagrada Escri tura t rata -o como o Alimento do

Povo Messiânico (Sl 78,23 -24; 105,40 / Sb 16,20 -22) Ainda, esse mi-

lagre de Iahweh é ass im reconhecido por Jesus na controvérsia com os

judeus, quando da Mul t ipl icação dos Pães (Jo 6,35 -50), vinculando-o

ao Anúncio da Eucaris t ia que faz ia como se anal isará no i tem a seguir

“O Maná e a Eucar is t ia”. Por sua vez , São Paulo vê nele uma f igura

(1Cor 10,3) e recomenda a mesma norma de dis t r ibuição al imentar i -

gual entre os cr is tãos da comunidade (2 Cor 8,14 -15). Também é o a-

l imento da imortal idade, segundo S. João (Ap 2,17):

39

“ . . . p e l a m a n h ã , j a z i a o o r v a l h o a o r e d o r d o a r r a i a l . E , q u a n d o s e e v a p o r o u o o r -

v a l h o q u e c a í r a , n a s u p e r f í c i e d o d e s e r t o r e s t a v a u m a c o i s a f i n a e s e m e l h a n t e a

e s c a m a s , f i n a c o m o a g e a d a s o b r e a t e r r a . V e n d o - a o s f i l h o s d e I s r a e l , d i s s e r a m

u n s a o s o u t r o s : Q u e é i s t o ? p o i s n ã o s a b i a m o q u e e r a . D i s s e - l h e s M o i s é s : I s t o é o p ã o q u e I a h w e h v o s d á p a r a v o s s o a l i m e n t o . E i s o q u e Ia h w e h v o s o r d e n o u :

C o l h e i d i s s o c a d a u m s e g u n d o o q u e p o d e c o m e r , u m g ô m e r p o r c a b e ç a , s e g u n d o

o n ú m e r o d e v o s s a s p e s s o a s ; c a d a u m t o m a r á p a r a o s q u e s e a c h a r e m n a s u a t e n -d a . A s s i m o f i z e r a m o s f i l h o s d e I s r a e l ; e c o l h e r a m , u n s , m a i s , o u t r o s , m e n o s .

P o r é m , m e d i n d o - o c o m o g ô m e r , n ã o s o b e j a v a a o q u e c o l h e r a m u i t o , n e m f a l t a v a

a o q u e c o l h e r a p o u c o , p o i s c o l h e r a m c a d a u m q u a n t o p o d i a c o m e r ” ( E x 1 6 , 1 3 b -1 8 ) .

Apesar de toda a recomendação de que se colhesse cada dia a sua

provisão, nada deixando para o dia seguinte, tal como preconiz ado no

versículo quat ro, “ o povo sairá e colherá diariamente a porção para

cada dia, para que eu ponha à prova se anda na minha lei ou não ”. O

que Iahweh exigia era a confiança na entrega diária da ração de cada

qual , não havendo necessidade de nenhuma pro visão ou qualquer preo-

cupação com o dia seguinte. Essa era a “prova se anda na minha lei ou

não”. Alguns, porém t iveram dif iculdade em permanecer em inertes e

deposi tando confiança, sem nenhuma providência pessoal e temendo

que o al imento viesse a fal tar gu ardaram-no para o dia seguinte , e para

surpresa geral , ele se corrompeu “deu b ichos e cheirava mal”. Moisés

indignou-se por causa disso e eles passaram a obedecer, mesmo sem

compreender o que se passava, colhendo o que podiam comer antes do

sol , que derret ia o Maná. E, no sexto dia , colheram o dobro tal como

recomendado, e os chefes das famíl ias vieram infor mar a causa dessa

diferença uma vez que ainda não fora oficial izado o repouso sabát ico ,

não passando essa prel iminar de preparação para isso. E guardaram o

al imento até o dia seguinte e ele não cheirou mal , nem deu bichos. E ,

neste dia , de sábado não se encont rou mais o Maná, e Moisés esclare-

ceu: “Comei -o hoje, porquanto o sábado é de Iahweh; hoje, não o a-

chareis no campo; seis dias o colhereis , mas o sét imo dia é o sábado;

nele, não haverá o que colher”, e o Povo guardou o sábado, respei ta n-

do o repouso pela primeira vez . Aparece nova descrição do maná e a

sua nomeação pela casa de Is rael e a nova ordem de Iahweh para a s e-

paração de uma urna com um gômer d o maná para ser colocada na A r-

ca do Testemunho, o que será fei to , quando for construída (Ex 25,10 -

22):

“ D i s s e - l h e s M o i s é s : N i n g u é m d e i x e d e l e p a r a a m a n h ã s e g u i n t e . E l e s , p o r é m , n ã o d e r a m o u v i d o s a M o i s é s , e a l g u n s d e i x a r a m d o m a n á p a r a a m a n h ã s e g u i n t e ;

p o r é m d e u b i c h o s e c h e i r a v a m a l . E M o i s é s s e i n d i g n o u c o n t r a e l e s . C o l h i a m - n o ,

p o i s , m a n h ã a p ó s m a n h ã , c a d a u m q u a n t o p o d i a c o m e r ; p o r q u e , e m v i n d o o c a -l o r , s e d e r r e t i a . A o s e x t o d i a , c o l h e r a m p ã o e m d o b r o , d o i s g ô m e r e s p a r a c a d a

u m ; e o s p r i n c i p a i s d a c o n g r e g a ç ã o v i e r a m e c o n t a r a m - n o a M o i s é s . R e s p o n d e u -

l h e s e l e : I s t o é o q u e d i s s e Ia h w e h : A m a n h ã é r e p o u s o , o s a n t o s á b a d o d e Ia h -w e h ; o q u e q u i s e r d e s c o z e r n o f o r n o , c o z e i - o , e o q u e q u i s e r d e s c o z e r e m á g u a ,

c o z e i - o e m á g u a ; e t u d o o q u e s o b r a r s e p a r a i , g u a r d a n d o p a r a a m a n h ã s e g u i n t e .

E g u a r d a r a m - n o a t é p e l a m a n h ã s e g u i n t e , c o m o M o i s é s o r d e n a r a ; e n ã o c h e i r o u m a l , n e m d e u b i c h o s . E n t ã o , d i s s e M o i s é s : C o m e i - o h o j e , p o r q u a n t o o s á b a d o é

d e Ia h w e h ; h o j e , n ã o o a c h a r e i s n o c a m p o . S e i s d i a s o c o l h e r e i s , m a s o s é t i m o

d i a é o s á b a d o ; n e l e , n ã o h a v e r á . A o s é t i m o d i a , s a í r a m a l g u n s d o p o v o p a r a o c o l h e r , p o r é m n ã o o a c h a r a m . E n t ã o , d i s s e Ia h w e h a M o i s é s : A t é q u a n d o r e c u s a -

r e i s g u a r d a r o s m e u s m a n d a m e n t o s e a s m i n h a s l e i s ? C o n s i d e r a i q u e Ia h w e h v o s

d e u o s á b a d o ; p o r i s s o , e l e , n o s e x t o d i a , v o s d á p ã o p a r a d o i s d i a s ; c a d a u m f i -q u e o n d e e s t á , n i n g u é m s a i a d o s e u l u g a r n o s é t i m o d i a . A s s i m , d e s c a n s o u o p o -

v o n o s é t i m o d i a . D e u - l h e a c a s a d e I s r a e l o n o m e d e m a n á ; e r a c o m o s e m e n t e d e

c o e n t r o , b r a n c o e d e s a b o r c o m o b o l o s d e m e l . D i s s e M o i s é s : E s t a é a p a l a v r a q u e Ia h w e h o r d e n o u : D e l e e n c h e r á s u m g ô m e r e o g u a r d a r á s p a r a a s v o s s a s g e r a -

40

ç õ e s , p a r a q u e v e j a m o p ã o c o m q u e v o s s u s t e n t e i n o d e s e r t o , q u a n d o v o s t i r e i d o E g i t o . D i s s e t a m b é m M o i s é s a A a r ã o : T o m a u m v a s o , m e t e n e l e u m g ô m e r

c h e i o d e m a n á e c o l o c a - o d i a n t e d e Ia h w e h , p a r a g u a r d a r - s e à s v o s s a s g e r a ç õ e s .

C o m o Ia h w e h o r d e n a r a a M o i s é s , a s s i m A r ã o o c o l o c o u d i a n t e d o T e s t e m u n h o p a r a o g u a r d a r . E c o m e r a m o s f i l h o s d e I s r a e l m a n á q u a r e n t a a n o s , a t é q u e e n -

t r a r a m e m t e r r a h a b i t a d a ; c o m e r a m m a n á a t é q u e c h e g a r a m a o s l i m i t e s d a t e r r a

d e C a n a ã . G ô m e r é a d é c i m a p a r t e d o e f a ” ( E x 1 6 , 2 2 - 3 6 ) .

Outro episódio , em seguida , repete a mesma cena dos protes tos e

o socorro de Iahweh ao Povo dos Fi lhos de Isr ael :

“ T e n d o p a r t i d o t o d a a c o n g r e g a ç ã o d o s f i l h o s d e I s r a e l d o d e s e r t o d e S i m , f a -

z e n d o s u a s p a r a d a s , s e g u n d o o m a n d a m e n t o d e Ia h w e h , a c a m p a r a m - s e e m R a f i -

d i m ; e n ã o h a v i a a l i á g u a p a r a o p o v o b e b e r . C o n t e n d e u , p o i s , o p o v o c o m M o i -s é s e d i s s e : D á - n o s á g u a p a r a b e b e r . R e s p o n d e u - l h e s M o i s é s : P o r q u e c o n t e n d e i s

c o m i g o ? P o r q u e t e n t a i s Ia h w e h ? T e n d o a í o p o v o s e d e d e á g u a , m u r m u r o u c o n -

t r a M o i s é s e d i s s e : P o r q u e n o s f i z e s t e s u b i r d o E g i t o , p a r a n o s m a t a r e s d e s e d e , a n ó s , a n o s s o s f i l h o s e a o s n o s s o s r e b a n h o s ? E n t ã o , c l a m o u M o i s é s a Ia h w e h :

Q u e f a r e i a e s t e p o v o ? S ó l h e r e s t a a p e d r e j a r - m e . R e s p o n d e u Ia h w e h a M o i s é s :

P a s s a a d i a n t e d o p o v o e t o m a c o n t i g o a l g u n s d o s a n c i ã o s d e I s r a e l , l e v a c o n t i g o

e m m ã o o b o r d ã o c o m q u e f e r i s t e o r i o e v a i . E i s q u e e s t a r e i a l i d i a n t e d e t i s o -

b r e a r o c h a e m H o r e b ; f e r i r á s a r o c h a , e d e l a s a i r á á g u a , e o p o v o b e b e r á . M o i -

s é s a s s i m o f e z n a p r e s e n ç a d o s a n c i ã o s d e I s r a e l . E c h a m o u o n o m e d a q u e l e l u -g a r M a s s a e M e r i b a , p o r c a u s a d a c o n t e n d a d o s f i l h o s d e I s r a e l e p o r q u e t e n t a -

r a m Ia h w e h , d i z e n d o : E s t á I a h w e h n o m e i o d e n ó s o u n ã o ? ” ( E x 1 7 , 1 - 7 ) .

Moisés deu ao local o nome de “ Massa e Meriba”, termos que

s ignif icam respect ivamente “ Provação e Contestação ”, t raduzindo o

acontecimento em palavras s ignif icat ivas do incidente. Este fato vem

também narrado em Nm 20,2-13, causando algum debate tendo por s o-

lução mais provável a ocorrência de dois acontecimentos idênt icos .

Entre ambos há um inte rvalo de t r inta anos.

São Paulo, por sua vez , combatendo o hábi to de alguns que fr e-

quentavam a Eucaris t ia e também os sacri f ícios pagãos, p arte desse

Milagre da Água da Rocha:

“ T o d o s e l e s c o m e r a m d e u m s ó m a n j a r e s p i r i t u a l 4 e b e b e r a m d a m e s m a f o n t e e s p i r i t u a l ; p o r q u e b e b i a m d e u m a p e d r a e s p i r i t u a l q u e o s s e g u i a . E a p e d r a e r a

C r i s t o . E n t r e t a n t o , D e u s n ã o s e a g r a d o u d a m a i o r i a d e l e s , r a z ã o p o r q u e f i c a r a m

p r o s t r a d o s n o d e s e r t o . ” ( . . . ) “ e u n ã o q u e r o q u e v o s t o r n e i s a s s o c i a d o s a o s d e -m ô n i o s . N ã o p o d e i s b e b e r o c á l i c e d o S e n h o r e o c á l i c e d o s d e m ô n i o s ; n ã o p o -

d e i s s e r p a r t i c i p a n t e s d a m e s a d o S e n h o r e d a m e s a d o s d e m ô n i o s ” ( 1 C o r 1 0 , 3 -

5 . 2 1 ) .

2.8. - O MANÁ E A EUCARISTIA

São Paulo ensina que ". . . todos comeram do mesmo al imento e s-

pir i tual . . ." (1 Cor 10,3) e , São João Evangel is ta dispõe s ignif icat iv a-

mente o Anúncio da Eucaris t ia logo em seguida à Mult ipl icação dos

Pães em que ocorreu sério desenco ntro e drást ico desenlace (Jo

6,60.66-71). Ora, os Evangel is tas não escreveram nada à toa, nem a

disposição dos assuntos foi aleatória, sem motivo. Assim, quando João

regis t ra que os oposi tores de Jesus o desafi aram com o Maná indica o

motivo, o teor e a evocação do debate e qual o s ignif icado que a Mu l-

t ipl icação dos Pães adquir iu para os Apóstolos tal como lhes foi ens i-

nado pelo próprio Jesus. É que, após o milagre, al imentando a mult i -

dão a part i r de "cinco pães de cevada e dois peixes" (Jo 6,9.22 -58.59-

71), protestaram os diss identes com evidente de sprezo:

41

“ . . . : Q u e s i n a l r e a l i z a s , p a r a q u e v e j a m o s e c r e i a m o s e m t i ? Q u e o b r a f a z e s ? N o s s o s p a i s c o m e r a m o m a n á n o d e s e r t o , c o m o e s t á e s c r i t o : „ D e u - l h e s P ã o d o

C é u a c o m e r ‟ ” ( J o 6 , 3 0 - 3 1 ) .

Queriam dizer com is so que Moisés f izera muito maior milagre ,

al imentando o Povo de Deus no deserto durante quarenta anos do que

“uma simples dis t r ibuição de pães e peixes para cinco mi l pessoas”,

tal como acontecera al i . Jesus lhes dá a resposta e, como de costume,

os contes ta doutr inando:

“ E m v e r d a d e , e m v e r d a d e , v o s d i g o : n ã o f o i M o i s é s q u e m v o s d e u o P ã o d o C é u , m a s é m e u P a i q u e m v o s d á o v e r d a d e i r o P ã o d o C é u ; p o r q u e o p ã o d e D e u s é o

P ã o q u e d e s c e d o C é u e d á v i d a a o m u n d o ” ( J o 6 , 3 2 - 3 3 ) .

Assim Jesus ident i fica o verd adeiro pão do céu como sendo o

pão de Deus, que desce do céu e dá vida ao mundo, o que não deixa de

ter referência clara com o Maná, agora se aperfeiçoando pelo “pleno

cumprimento” que Ele próprio lhe imprime (Mt 5,17), e por cujo meio

dá vida ao mundo (Jo 3,17; 10,10). O Maná, por s i só, não possuía e s-

sa vir tude vivif icante, tendo s ido dad o para al imentá -los somente ain-

da que apenas e esp ir i tualmente e como resposta de Iahweh às murm u-

rações do Povo de I srael :

“ A n t e s f ô s s e m o s m o r t o s p e l a m ã o d e I a h w e h n a t e r r a d o E g i t o , q u a n d o ( . . . ) c o -m í a m o s p ã o c o m f a r t u r a ! ( . . . ) I a h w e h d i s s e a M o i s é s : „ E i s q u e v o s f a r e i c h o v e r

p ã o d o c é u ; s a i r á o p o v o e c o l h e r á a p o r ç ã o d e c a d a d i a . . . ” ( . . . ) “ I s t o é o P ã o

q u e Ia h w e h v o s d a r á p a r a v o s s o a l i m e n t o ” ( E x 1 6 , 3 - 4 . 1 5 ) . / “ T o d o s c o m e r a m o m e s m o a l i m e n t o e s p i r i t u a l ” ( 1 C o r 1 0 , 3 ) .

Assim como o Maná é o pão do céu e al imento, a ví t ima do s a-

cri f ício recebe a mesma denominação, como está na recomendação de

Iahweh, com respei to aos sace rdotes:

“ S e r ã o c o n s a g r a d o s a s e u D e u s e n ã o p r o f a n a r ã o o n o m e d o s e u D e u s , p o r q u e s ã o

e l e s q u e a p r e s e n t a m a s o f e r e n d a s q u e i m a d a s a Ia h w e h , o p ã o d o s e u d e u s , e d e -v e m e s t a r e m e s t a d o d e s a n t i d a d e . ( . . . ) . T u o t r a t a r á s c o m o s a n t o , p o i s o f e r e c e o

p ã o d o t e u d e u s ” ( Lv 2 1 , 6 - 8 ) .

Ora, quando neste t recho fala -se em “al imento e pão” é em “sa-

cri f ício ou refeição sagrada” , pois menciona “oferendas queimadas a

Iahweh”. Daí se deduz a que Jesus também se refere ao mencionar o

“pão do céu ou pão de Deus” e “pão de Deus é o Pão que desce do Céu

e dá vida ao mundo”, manifestando quem Deus daria para ser ví t ima

para a vida do mundo , recordando-se da missão dos sacerdotes desde

sua inst i tuição ainda no deserto, agora os subst i tuindo (Hb 9,11 -14).

Pois , a ví t ima imolada num sacri f ício (ou a “oferenda queimada a Ia h-

weh”) era considerada “Pão ou Alimento de Deus” aqui e em outros

lugares (destacando -se: Lv 1,9; 3 ,3.11.16; 21,17.21; Nm 9,13;28,1) .

Também o Maná, da mesma forma que a Vít ima dos Sacri f ícios , era

conhecido s implesmente por “pão do céu” ou “al imento” („espir i tual‟ ,

d iz São Paulo) , como nos tex tos acima transcri tos . Não foi sem motivo

que Jesus faz referências ao Pão de Deus e ao Pão do Céu (Jo 6,33.58)

na discussão que t ravou ident i f icando -se com ambos e mostrando as

diferenças “cumpridas” por Ele (Mt 5,17):

42

“ E s t e é o p ã o q u e d e s c e u d o c é u , e l e n ã o é c o m o o q u e o s p a i s c o m e r a m e p e r e -c e r a m ; q u e m c o m e e s t e p ã o v i v e r á p a r a s e m p r e ” ( J o 6 , 5 8 ) .

" . . . quem come este pão viverá para sempre" - Exis tem aspectos

na narrat iva da Mult ipl icação dos Pães em São João (6,1 -15) que a

tornam bem dis t inta da dos demais Evangelhos seja s i tuando -a “próx i -

ma à Páscoa, a fes ta dos judeus” (6,4); seja t ratando os que se al ime n-

tavam como convivas de uma refeição; seja pelo debate ocorrido a re s-

pei to do Maná; seja pelo gesto de Jesus que, “to mando os pães , dá

graças” (6,11), tal como na Inst i tu ição da Eucaris t ia (Lc 22,19 / 1Cor

11,24). Também, no que se evidencia t ratar -se de banquete ou de r e-

feição sagrada, os “convidados” que t ransparecem quando Jesus diz

“onde compraremos pão para al imentá - los” (6,5) e “fazei que se ac o-

modem pelo chão” (6,10), numa acomodação para os “amesendados”

[6,10.11 (1) ] , - „fala como um anf i tr ião‟ . E, na ação de graças pecul i -

ar a uma refeição comum ou sagrada ou ao sacri f ício de comunhão;

bem como, “no recolhimento dos doze cestos do que restou ” , fá - lo por

se t ratar de “coisa sant i f icada” (Ex 29,37 / Jo 6,12 -13): - Não há outro

motivo para se recolher a sobra de uma refeição! Por outro lado, João

também relata que:

“ O s j u d e u s m u r m u r a v a m , e n t ã o , c o n t r a e l e , p o r q u e d i s s e r a : „ E u s o u o p ã o d e s c i -

d o d o c é u ” ( J o 6 , 4 1 ) .

Fosse alguma f igura de l inguagem não haveria motivo para isso.

“Murmuravam” porque a af i rmação foi muito séria. Jesus referia -se a

s i mesmo tal como entenderam, nada corrige e ainda prossegue mais

incis ivo, e acrescenta “. . . o pão vivo descido do céu” :

“ E u s o u o p ã o v i v o d e s c i d o d o c é u . Q u e m c o m e r d e s t e p ã o v i v e r á e t e r n a m e n t e . o

p ã o q u e e u d a r e i é a m i n h a c a r n e p a r a a v i d a d o m u n d o ” ( J o 6 , 5 1 ) .

Jesus usa o futuro “ darei a minha carne para a vida do mundo” ,

anunciando a futura doação seja na Ins t i tuição da Eucaris t ia seja na

Cruz, pelo que, falando sempre numa concret ização a se real izar e a-

pós a al tercação novamente advinda (Jo 6,52), ainda é mais incis ivo:

“ E m v e r d a d e , e m v e r d a d e , v o s d i g o : s e n ã o c o m e r d e s a c a r n e d o F i l h o d o H o m e m

e n ã o b e b e r d e s o s e u s a n g u e , n ã o t e r e i s a v i d a e m v ó s . Q u e m c o m e a m i n h a c a r -

n e e b e b e o m e u s a n g u e t e m a v i d a e t e r n a e e u o r e s s u s c i t a r e i n o ú l t i m o d i a . P o i s a m i n h a c a r n e é v e r d a d e i r a c o m i d a e o m e u s a n g u e , v e r d a d e i r a b e b i d a .

Q u e m c o m e a m i n h a c a r n e e b e b e o m e u s a n g u e p e r m a n e c e e m m i m e e u n e l e .

A s s i m c o m o o P a i , q u e v i v e m e e n v i o u e e u v i v o p e l o P a i , t a m b é m a q u e l e q u e c o m e r d e m i m v i v e r á p o r m i m ” ( J o 6 , 5 3 - 5 7 ) .

Quando João narra tal acontecimento com tantos detalhes e diz

que “estava próxima a Páscoa , a fes ta dos judeus” (6,4) , relaciona -o

diretamente com Ela . É que Jesus estava anunciando e começando en-

tão o que i r ia se “cumprir” nela. Só se pode concluir então que a Mu l -

t ipl icação dos Pães é o “Anúncio da Eucaris t ia”, um s acri f ício em que

Nota: (1) Seria uma tradução “literal” mais conforme à palavra do “grego – o `koiné” (“anapesein”) ou

latina (“discumbere”) usada, pelo Evangelista ou pela Vulgata, referindo-se aos “assentados” ou “presen-

tes”, como se usa traduzir. Já, a Bíblia de Jerusalém e a TOB, de edições francesas, melhor traduzem por

“convives”, que em português significa “convivas ou convidados”.

43

a ví t ima “será” o próprio Jesus, de que o Maná foi f igura . E, neste

ponto e ao f inal izar o debate diz especif icamente, se ident i f ica ndo e se

anunciando maior que o Maná, o “Pão vivo que desceu do Céu ” (Jo

6,51):

“ E s t e é o p ã o q u e d e s c e u d o c é u . E l e n ã o é c o m o o q u e o s p a i s c o m e r a m e p e r e -c e r a m ; q u e m c o m e e s t e p ã o v i v e r á p a r a s e m p r e ” ( J o 6 , 5 8 ) .

2.9. - A LEI DA ALIANÇA

Porém o Maná não l ivrara os Is rael i tas de problemas outros , tais

como o ataque de surpresa dos amaleci tas em Rafidim. Repete -se outro

milagre com a "Vara de Deus", aquela que foi entregue a Moisés e A a-

rão para a execução dos prodígios (Ex 4,17 / 14,16 / 17,6): " enquanto

Moisés mant inha as mãos que a empunhava suspensas , Israel prevale-

cia". Então, vi ram-se obrigados, Aarão e Hur , a forçar a sustentação

delas nessa posição até que Josué os vence em defini t ivo (Ex 17,8 -16).

Por esse incidente se tornam inimigos i rreconci l iáveis e t radicionais ,

“porquanto Iahweh jurou, haverá guerra de Iahweh cont ra Amalec de

geração em geração” (Ex 17,14 / 1Sm 15):

“ E n t ã o , v e i o A m a l e c e p e l e j o u c o n t r a I s r a e l e m R a f i d i m . C o m i s s o , o r d e n o u M o i s é s a J o s u é : E s c o l h e - n o s h o m e n s , e s a i , e p e l e j a c o n t r a A m a l e c ; a m a n h ã , e s -

t a r e i e u n o c i m o d o o u t e i r o , e o b o r d ã o d e D e u s e s t a r á n a m i n h a m ã o . F e z J o s u é

c o m o M o i s é s l h e d i s s e r a e p e l e j o u c o n t r a A m a l e c ; M o i s é s , p o r é m , A r ã o e H u r s u b i r a m a o c i m o d o o u t e i r o . Q u a n d o M o i s é s l e v a n t a v a a m ã o , I s r a e l p r e v a l e c i a ;

q u a n d o , p o r é m , e l e a b a i x a v a a m ã o , p r e v a l e c i a A m a l e c . O r a , a s m ã o s d e M o i s é s

e r a m p e s a d a s ; p o r i s s o , t o m a r a m u m a p e d r a e a p u s e r a m p o r b a i x o d e l e , e e l e n e -l a s e a s s e n t o u ; A a r ã o e H u r s u s t e n t a v a m - l h e a s m ã o s , u m , d e u m l a d o , e o o u t r o ,

d o o u t r o ; a s s i m l h e f i c a r a m a s m ã o s f i r m e s a t é a o p ô r - d o - s o l . E J o s u é d e s b a r a -

t o u a A m a l e c e a s e u p o v o a f i o d e e s p a d a . E n t ã o , d i s s e Ia h w e h a M o i s é s : E s c r e -v e i s t o p a r a m e m ó r i a n u m l i v r o e r e p e t e - o a J o s u é ; p o r q u e e u h e i d e r i s c a r t o -

t a l m e n t e a m e m ó r i a d e A m a l e c d e d e b a i x o d o c é u . E M o i s é s e d i f i c o u u m a l t a r e

l h e c h a m o u : „ Ia h w e h é M i n h a B a n d e i r a ‟ . E d i s s e : P o r q u a n t o Ia h w e h j u r o u , h a v e -r á g u e r r a d e Ia h w e h c o n t r a A m a l e c d e g e r a ç ã o e m g e r a ç ã o ” ( E x 1 7 , 8 - 1 6 ) .

Como ação de graças pela vi tória , Moisés oferece um sacri f ício,

”pelo que. . . edif icou um al tar . . .” , prosseguindo a t radição dos Patr ia r-

cas que o têm como centro do cul to e de comunhão c om Iahweh. Cum-

prida a sua missão l ibertadora , Moisés recebe a vis i ta de Jetro seu s o-

gro t razendo-lhe de vol ta a esposa e os f i lhos (Ex 4,24 -26). Tomando

conhecimento de tudo o que acontecera (Ex 18,8) , reconhece " Iahweh

como o maior de todos os deuses " (Ex 18,9-11) e aconselha Moisés a

dis t r ibuir funções para adminis t rar a just iça entre os israel i tas e a m a-

nutenção da ordem (Ex 18,17 -26):

" E a l e g r o u - s e J e t r o p o r t o d o o b e m q u e Ia h w e h t i n h a f e i t o a I s r a e l , l i v r a n d o - o

d a m ã o d o s e g í p c i o s , e d i s s e : B e n d i t o s e j a Ia h w e h , q u e v o s l i v r o u d a m ã o d o s e g í p c i o s e d a m ã o d e F a r a ó ; q u e l i v r o u o p o v o d e d e b a i x o d a m ã o d o s e g í p c i o s .

A g o r a s e i q u e Ia h w e h é m a i o r q u e t o d o s o s d e u s e s ; a t é n a q u i l o e m q u e s e h o u v e -

r a m a r r o g a n t e m e n t e c o n t r a o p o v o . E n t ã o J e t r o , o s o g r o d e M o i s é s , t o m o u h o l o -c a u s t o e s a c r i f í c i o s p a r a D e u s ; e v e i o A a r ã o , e t o d o s o s a n c i ã o s d e I s r a e l , p a r a

c o m e r e m p ã o c o m o s o g r o d e M o i s é s d i a n t e d e D e u s " ( E x 1 8 , 9 - 1 2 ) .

”. . . Jet ro, o sogro de Moisés , tomou holocausto e sacri f ícios p a-

ra Deus; e veio Aarão, e todos os anciãos de Israel para comerem pão

com o sogro de Moisés diante de Deus” - novamente o sacr i f ício co m-

pondo o cul to is rael i ta em que todos par t icipam "comendo o pão diante

44

de Deus", sant i f icando-se pela comunhão estabelecida. Aqui se t rava

contato com a expressão "comendo o pão" , que é o modo como se d e-

nominava a ví t ima imolada e consumida no sacr i f ício e se es tabelecia

a comunhão com Deus (". . . o pão de seu Deus. . . " - Lv 21 ,6.8 / 1Cor

10,18). Além disso , ofereceu-se "holocausto e sacri f ícios". O hol o-

causto como oferenda toda queimada (Lv 1) e os sacri f ícios como r e-

feições sagradas (Lv 3 -5) . O cl ima rel igioso e míst ico at ingia o seu

ápice e caminhava-se para o "servir a Deus no monte Sinai" tal como

anunciado por Deus (Ex 3,12). A presença a í do sacri f ício , antes de

sua regulamentação r i tual , demonstra o uso anterior a tudo o que se

ordenará.

Aquele desígnio de Deus de estabelecer com o Homem uma vida

em comunhão, int imidade e famil iar idade, retardado pelo Pecado Or i-

ginal , que se renovou na Aliança com Abraão , deverá se real izar "nu-

ma grande nação" (Gn 12,2) que agora se torna o Povo de Iahweh. E é

nesse Monte Sinai que o Povo dos Fi lhos de Israel torna oficia lmente

Povo de Iahweh, cujos compromissos com os Patr iarcas deverão ser r a-

t i f icados e assumidos por ele . Para isso, por primeiro, Iahweh Deus se

propõe:

" E n t ã o s u b i u M o i s é s a D e u s , e d o m o n t e Ia h w e h o c h a m o u , d i z e n d o : ' A s s i m f a -l a r á s à c a s a d e J a c ó , e a n u n c i a r á s a o s f i l h o s d e I s r a e l : V ó s t e n d e s v i s t o o q u e

f i z a o s e g í p c i o s , c o m o v o s l e v e i s o b r e a s a s d e á g u i a , e v o s t r o u x e a m i m . A g o r a ,

p o i s , s e o u v i r d e s a m i n h a v o z e g u a r d a r d e s a m i n h a A l i a n ç a , s e r e i s a m i n h a p r o -p r i e d a d e p e c u l i a r e n t r e t o d o s o s p o v o s , p o r q u e m i n h a é t o d a a t e r r a ; e v ó s s e r e i s

p a r a m i m u m r e i n o d e s a c e r d o t e s e u m a n a ç ã o s a n t a . S ã o e s t a s a s p a l a v r a s q u e

f a l a r á s a o s f i l h o s d e I s r a e l " ( E x 1 9 , 3 - 6 ) .

" . . . se ouvirdes a minha voz e guardardes a minha Aliança. . ." - A

Aliança contraída com Abraão, Isaac e Jacó deveria ser rat i f icada com

o Povo dos Fi lhos de Is rael . Então, na condição de profeta e med ianei-

ro, "veio Moisés e, tendo convocado os anciãos do p ovo, expôs diante

deles todas estas palavras que Iahweh lhe t inha ordenado" (Ex 19,7) , e

o Povo de Deus assume sua missão:

" E n t ã o t o d o o p o v o r e s p o n d e u a u m a v o z : T u d o o q u e I a h w e h d i s s e , n ó s o f a r e -

m o s " ( E x 1 9 , 8 a ) .

"E relatou Moisés a Iahweh as palavras do pov o" (Ex 19,8b).

Pode-se imaginar o suspense que se es tabeleceu no momento e a em o-

ção que deve ter tomado conta de todos num cl ima de profunda com u-

nhão, do Povo que al i se formava no seio de Iahw eh, o "Povo Primo-

gêni to de Iahweh" (Ex 4,22), "as primícias da fecundidade salvíf ica de

Deus" („pa rodiando‟ Gn 49,3):

" E n t ã o d i s s e Ia h w e h a M o i s é s : ' E i s q u e e u v i r e i a t i em u m a n u v e m e s p e s s a , p a -

r a q u e o p o v o o u ç a q u a n d o e u f a l a r c o n t i g o e t a m b ém s e m p r e c r e i a e m t i . ' E

M o i s é s r e l a t o u a Ia h w e h a s p a l a v r a s d o s e u p o v o " ( E x 1 9 , 9 ) .

De algum modo ess a cena lembra a "Transfiguração de Jesus",

principalmente pela presença da nuvem , caracterís t ica de toda teofan i-

a:

" S e i s d i a s d e p o i s , t o m o u J e s u s c o n s i g o a P e d r o , a T i a g o e a J o ã o , i r m ã o d e s t e , e

o s c o n d u z i u à p a r t e a u m a l t o m o n t e ; e f o i t r a n s f i g u r a d o d i a n t e d e l e s ; o s e u r o s -

45

t o r e s p l a n d e c e u c o m o o s o l , e a s s u a s v e s t e s t o r n a r a m - s e b r a n c a s c o m o a l u z . E e i s q u e l h e s a p a r e c e r a m M o i s é s e E l i a s , f a l a n d o c o m e l e . P e d r o , t o m a n d o a p a -

l a v r a , d i s s e a J e s u s : ' S e n h o r , b o m é e s t a r m o s a q u i ; s e q u e r e s , f a r e i a q u i t r ê s c a -

b a n a s , u m a p a r a t i , o u t r a p a r a M o i s é s , e o u t r a p a r a E l i a s . ' E s t a n d o e l e a i n d a a f a l a r , e i s q u e u m a n u v e m l u m i n o s a o s c o b r i u ; e d e l a s a i u u m a v o z q u e d i z i a :

' E s t e é o m e u F i l h o a m a d o , e m q u e m m e c o m p r a z o ; a e l e o u v i . ' O s d i s c í p u l o s ,

o u v i n d o i s s o , c a í r a m c o m o r o s t o e m t e r r a , e f i c a r a m g r a n d e m e n t e a t e m o r i z a -d o s " ( M t 1 7 , 1 - 6 ) .

Momento dramático da vida de Jesus logo após haver anunciado

a sua Paixão, necessi tando os apóstolos então muito mais fortalec i-

mento da fé , ocasião em que Deus se manifesta "na nuvem" e lhes af i -

ança: - "Este é o meu Fi lho amado, em quem me comprazo; a ele o u-

vi", pelo mesmo motivo com Moisés , a quem, "eu virei a t i em uma

nuvem espessa, para que o povo ouça quando eu falar cont igo e ta m-

bém sempre creia em t i” .

Aqui também foi um momento dramático em que Deus e o Povo

de Israel selar iam uma Aliança para todo o sempre e passa Moisés a

preparar os Fi lhos de Israel para a teofania que i r ia selar a Al iança a-

cei ta:

" D i s s e m a i s Ia h w e h a M o i s é s : " V a i a o p o v o , e s a n t i f i c a - o s h o j e e a m a n h ã ; l a v e m

e l e s a s s u a s v e s t e s , e e s t e j a m p r o n t o s p a r a o t e r c e i r o d i a ; p o r q u a n t o n o t e r c e i r o d i a d e s c e r á Ia h w e h d i a n t e d o s o l h o s d e t o d o o p o v o s o b r e o m o n t e S i n a i . T a m -

b é m m a r c a r á s l i m i t e s a o p o v o e m r e d o r , d i z e n d o : G u a r d a i - v o s , n ã o s u b a i s a o

m o n t e , n e m t o q u e i s o s e u t e r m o ; t o d o a q u e l e q u e t o c a r o m o n t e s e r á m o r t o . M ã o a l g u m a t o c a r á n a q u e l e q u e o f i z e r , m a s e l e s e r á a p e d r e j a d o o u f l e c h a d o ; q u e r

s e j a a n i m a l , q u e r s e j a h o m e m , n ã o v i v e r á . Q u a n d o s o a r a b u z i n a l o n g a m e n t e ,

s u b i r ã o e l e s a t é o p é d o m o n t e . ” E n t ã o M o i s é s d e s c e u d o m o n t e a o p o v o , e s a n -t i f i c o u o p o v o ; e l a v a r a m o s s e u s v e s t i d o s . E d i s s e e l e a o p o v o : " E s t a i p r o n t o s

p a r a o t e r c e i r o d i a ; e n ã o v o s u n a i s a m u l h e r " ( E x 1 9 , 1 0 - 1 5 ) .

" . . . sant i f ica -os hoje e amanhã. . . " , " . . . lavem eles as suas ve s-

tes . . ." e ". . . não vos unais a mulher" - são t rês expressões muito vinc u-

ladas entre s i , formando um todo. No termo "sant i f icar" es tá clara a

"separação do profano", o sent ido da consag ração a Deus, depois a p u-

ri f icação s imbolizada no "lavar suas vestes". Já na determinação de

". . . não vos unais a mulher" não se há de entender que a união com a

mulher em si t er ia s ido t ida como impura: a famíl ia , que incluía a m u-

lher , era parte do povo a l i em congregação. Então, o sent ido real da

expressão era de que no ato de separação do profano, ou sant i f icação,

inclui -se a relação sexual pelo respei to à vida que gerava, tal como o

respei to ao sangue (Lv 15,18; 1Sm 21,5) , num gesto de consagração

total e nunca de repulsa. Assim preparados, man ifesta-se Deus:

" A o t e r c e i r o d i a , a o a m a n h e c e r , h o u v e t r o v õ e s , r e l â m p a g o s , e u m a n u v e m e s p e s -

s a s o b r e o m o n t e ; e o u v i u - s e u m s o m d e t r o m b e t a m u i f o r t e , d e m a n e i r a q u e t o d o

o p o v o q u e e s t a v a n o a c a m p a m e n t o e s t r e m e c e u . E M o i s é s l e v o u o p o v o f o r a d o a c a m p a m e n t o a o e n c o n t r o d e E l o h i m ; e p u s e r a m - s e a o p é d o m o n t e . N i s s o t o d o o

m o n t e S i n a i f u m e g a v a , p o r q u e Ia h w e h d e s c e r a s o b r e e l e e m f o g o ; e a f u m a ç a s u -

b i u c o m o a f u m a ç a d e u m a f o r n a l h a , e t o d o o m o n t e t r e m i a f o r t e m e n t e . E , o s o m d a t r o m b e t a c a d a v e z m a i s f o r t e , M o i s é s f a l a v a , e D e u s l h e r e s p o n d i a . E , t e n d o

I a h w e h d e s c i d o s o b r e o m o n t e S i n a i , s o b r e o c u m e d o m o n t e , c h a m o u M o i s é s ; e

M o i s é s s u b i u . E n t ã o d i s s e I a h w e h a M o i s é s : " D e s c e , a d v e r t e a o p o v o , p a r a n ã o s u c e d e r q u e t r a s p a s s e o s l i m i t e s a t é Ia h w e h , a f i m d e v e r , e m u i t o s d e l e s p e r e -

ç a m . O r a , s a n t i f i q u e m - s e t a m b é m o s s a c e r d o t e s , q u e s e c h e g a m a Ia h w e h , p a r a

q u e Ia h w e h n ã o s e l a n c e s o b r e e l e s " . R e s p o n d e u M o i s é s a Ia h w e h : " O p o v o n ã o p o d e r á s u b i r a o m o n t e S i n a i , p o r q u e t u n o s t e n s a d v e r t i d o , d i z e n d o : ' M a r c a l i -

m i t e s a o r e d o r d o m o n t e , e s a n t i f i c a - o " . A o q u e l h e d i s s e Ia h w e h : " V a i , d e s c e ;

d e p o i s s u b i r á s t u , e A a r ã o c o n t i g o ; o s s a c e r d o t e s , p o r é m , e o p o v o n ã o t r a s p a s -s e m o s l i m i t e s p a r a s u b i r a I a h w e h , p a r a q u e e l e n ã o s e l a n c e s o b r e e l e s " . E n t ã o

M o i s é s d e s c e u a o p o v o , e d i s s e - l h e s i s s o " ( E x 1 9 , 1 6 - 2 5 ) .

46

A presença de Deus foi de tal majestade que , apesar do povo es-

t remecer , não fugiu e foi até necessário impor -lhe l imites de acesso ao

lugar sob pena de lapidação. Então a descrição do fenômeno não se l i -

mita ao que ocorre, por exemplo, com um vulcão em erupção que a t u-

do destrói e a todos amedronta. Não houve tal reação ; ao contrário, a

teofania at raiu. Deus prepara a solenidade à al tura do que al i se co n-

sumava: a Aliança de Deus com o Homem em que as condições são t o-

das pronunciadas e claramente ouvidas , uma a uma:

" E n t ã o f a l o u D e u s t o d a s e s t a s p a l a v r a s , d i z e n d o : E u s o u Ia h w e h t e u D e u s , q u e t e t i r e i d a t e r r a d o E g i t o , d a c a s a d a s e r v i d ã o . N ã o t e r á s o u t r o s d e u s e s d i a n t e d e

m i m . N ã o f a r á s p a r a t i i m a g e m e s c u l p i d a , n e m f i g u r a a l g u m a d o q u e h á e m c i m a

n o c é u , n e m e m b a i x o n a t e r r a , n e m n a s á g u a s d eb a i x o d a t e r r a . N ã o a s a d o r a r á s n e m a s s e r v i r á s ; p o r q u e e u , Ia h w e h o t e u D e u s , s o u D e u s z e l o s o , q u e v i n g o a i -

n i q ü i d a d e d o s p a i s n o s f i l h o s a t é a t e r c e i r a e q u a r t a g e r a ç ã o d a q u e l e s q u e m e

o d e i a m e u s o d e m i s e r i c ó r d i a a t é m i l g e r a ç õ e s c o m o s q u e m e a m a m e g u a r d a m o s m e u s m a n d a m e n t o s . N ã o t o m a r á s o n o m e d e I a h w e h t e u D e u s e m v ã o ; p o r q u e

I a h w e h n ã o t e r á p o r i n o c e n t e a q u e l e q u e t o m a r o s e u n o m e e m v ã o . L e m b r a - t e

d o d i a d o s á b a d o , p a r a o s a n t i f i c a r . S e i s d i a s t r a b a l h a r á s , e f a r á s t o d o o t e u t r a -b a l h o ; m a s o s é t i m o d i a é o s á b a d o d e Ia h w e h t e u D e u s . N e s s e d i a n ã o f a r á s t r a -

b a l h o a l g u m , n e m t u , n e m t e u f i l h o , n e m t u a f i l h a , n e m o t e u s e r v o , n e m a t u a

s e r v a , n e m o t e u a n i m a l , n e m o e s t r a n g e i r o q u e e s t á d e n t r o d a s t u a s p o r t a s . P o r -q u e e m s e i s d i a s f e z Ia h w e h o c é u e a t e r r a , o m a r e t u d o o q u e n e l e s h á , e a o

s é t i m o d i a d e s c a n s o u ; p o r i s s o Ia h w e h a b e n ç o o u o d i a d o s á b a d o , e o s a n t i f i c o u .

H o n r a a t e u p a i e a t u a m ã e , p a r a q u e s e p r o l o n g u e m o s t e u s d i a s n a t e r r a q u e I a h w e h t e u D e u s t e d á . N ã o m a t a r á s . N ã o a d u l t e r a r á s . N ã o f u r t a r á s . N ã o d i r á s

f a l s o t e s t e m u n h o c o n t r a o t e u p r ó x i m o . N ã o c o b i ç a r á s a c a s a d o t e u p r ó x i m o ,

n ã o c o b i ç a r á s a m u l h e r d o t e u p r ó x i m o , n e m o s e u s e r v o , n e m a s u a s e r v a , n e m o s e u b o i , n e m o s e u j u m e n t o , n e m c o i s a a l g u m a d o t e u p r ó x i m o . O r a , t o d o o p o v o

p r e s e n c i a v a o s t r o v õ e s , e o s r e l â m p a g o s , e o s o m d a t r o m b e t a , e o m o n t e a f u -

m e g a r ; e o p o v o , v e n d o i s s o , e s t r e m e c e u e p ô s - s e d e l o n g e " ( E x 2 0 , 1 - 1 8 ) .

É a Lei da Aliança: Assim denominar -se-á aqui "o decálogo", ou

as "dez palavras", ou os "dez mandamentos" , pois a sua referência com

a Aliança de Abraão é mais que clara. Tudo o que o Povo Is rael i ta faz

es tá resumido nela e se projeta em casos part icu lares já amontoados

conforme o uso costumeiro e enraizado cul turalmente a que se deu o

nome de Código da Aliança (Ex 21-24). Apesar de toda a cerimônia e

majestade presente al i e de toda a dramaticidade , a voz de Deus ecoou

f i rme principalmente no coração de todos. Quando se diz que Deus f a-

lou e pronunciou todas as palavras se diz que se revelou e que aqui lo

que disse é de s i mesmo , com todos os Seus at r ibutos a té mesmo a

Sant idade. Part indo de seu ínt imo revela principalmente o amor que

devota ao Povo de I srael . Só a Palavra revela o ínt imo daquele que f a-

la e Iahweh falando Se Revela Deus no mais ínt imo de Seu Ser. Não se

pode concluir di ferentemente, tendo -se em vis ta a presença de todo o

povo até o f inal de todas as palavras que Deus pronunciou, sem que

fugissem , face “. . . aos t rovões, e os relâmpagos, e o som da t romb eta,

e o monte a fumegar; e o povo, vendo isso, es t remeceu e pôs -se de

longe” .

Por mais que se esforce , não se pode dizer que se t rate de uma

espécie de Const i tuição das cartas que compõem a est rutura "pol í t ica"

de uma nação moderna. Não se t rata da luta do povo contra um poder

arbi t rár io cuja vi tór ia culminou numa carta de direi tos do cidadão , a

serem respei tados pela autoridade e que os del imitassem. Nada desvi r-

tua mais o Decálogo que essa comparação absurda. Não fo i uma co n-

quis ta, foi uma dádiva, foi o dom de Deus que Se "abriu" e ofereceu

uma orientação e um chamamento dir igido a cada um e a todo o Seu

47

Povo. Estabelece normas de conduta e co mportamento com o que cada

um se ident i f ica ao Cr iador de quem é "imagem e semelhança" (Gn

1,26s) , e a f im de se es tabelecer uma comunhão de vidas , só assim se

sant i f icando, pois “só Deus é Sa n to”:

" 2 0 8 5 - O D e u s ú n i c o e v e r d a d e i r o r e v e l a , p r i m e i r o , a s u a g l ó r i a a I s r a e l ( c f . E x 1 9 , 1 6 - 2 5 ; 2 4 , 1 5 - 1 8 ) . A r e v e l a ç ã o d a v o c a ç ã o e d a v e r d a d e d o h o m e m e s t á l i g a d a

à r e v e l a ç ã o d e D e u s . O h o m e m t e m a v o c a ç ã o d e m a n i f e s t a r D e u s p e l o s e u a g i r ,

e m c o n f o r m i d a d e c o m a s u a C r i a ç ã o , " à i m a g e m e s e m e l h a n ç a d e D e u s " ( C a t e -c i s m o d a Ig r e j a C a t ó l i c a ) .

Ademais e por outro lado , as "palavras" então pronunciadas dir e-

tamente por Deus não se confinavam apenas ao grupo de isra el i tas al i

presentes ass is t indo a uma teofania. Traçavam normas dest inadas à u-

nif icação e comunhão de vidas em torno de uma fé c omum, mantendo-

os em todas as suas gerações e para sempre coeso em vis ta de um obj e-

t ivo bem maior do que se poderia ao menos imaginar . Tudo o que al i

se plantava se dest inava à Obra da Redenção e era a semente da cri s-

tandade que se esboçava em l inhas ainda t ímidas que seriam provadas

no cadinho do deserto e em toda a História do Povo Primogêni to de

Deus, "primícias da glória de Iahweh" anunciando a far ta colhei ta "de

uma mult idão de outros povos de que ser ia pai Abraão" (Gn 17,3):

" A g o r a , p o i s , s e o u v i r d e s a m i n h a v o z e g u a r d a r d e s a m i n h a A l i a n ç a , s e r e i s a

m i n h a p r o p r i e d a d e p e c u l i a r e n t r e t o d o s o s p o v o s , p o r q u e m i n h a é t o d a a t e r r a ; e v ó s s e r e i s p a r a m i m u m r e i n o d e s a c e r d o t e s e u m a n a ç ã o s a n t a . S ã o e s t a s a s p a -

l a v r a s q u e f a l a r á s a o s f i l h o s d e I s r a e l " ( E x 1 9 , 5 - 6 ) .

Por causa da missão i r radiadora de seu "sacerdócio e nação sa n-

ta" impõe-se a seriedade e clareza pedagógicas das determinações e

muitas vezes de punições, dada a cul tura do tempo, em caso de viol a-

ção dos precei tos (Ex 21,14.17.23 -25. . . ) . A Lei ou O Código da Alia n-

ça inicia-se com as normas conhecidas como Os Dez Mandamentos e

prosseguem em casuís t ica var iada e comum à época em vários tópicos.

Era necessário em vis ta das viciss i tudes por que passaria e que o am a-

dureceria, povo ainda em gestação, levando -o à tomada de consciência

de sua própria ident idade e missão. Isso era necessário também tendo

em vis ta a paz e a segurança de todos e de cada um, bem como a da

própria nacional idade nascente. Melhor dimensionando , é necessário

esclarecer o pensamento da época:

(1º) - " . . . falou Deus todas estas palavras. . . " - Moisés f icará

preocupado com o comportamento do Povo de Israel depois de sua

morte e pronuncia uma série de discursos que lhe servir ia de orient a-

ção. Em um deles vai lembrá -lo de que:

" C h a m o u , p o i s , M o i s é s a t o d o o I s r a e l , e d i s s e - l h e s : O u v e , ó I s r a e l , o s e s t a t u t o s

e p r e c e i t o s q u e h o j e v o s f a l o a o s o u v i d o s , p a r a q u e o s a p r e n d a i s e c u i d e i s e m o s

c u m p r i r . I a h w e h n o s s o D e u s f e z u m a A l i a n ç a c o n o s c o e m H o r e b . N ã o c o m n o s -s o s p a i s f e z Ia h w e h e s s a A l i a n ç a , m a s c o n o s c o , c o m t o d o s n ó s q u e h o j e e s t a m o s

a q u i v i v o s . F a c e a f a c e f a l o u Ia h w e h c o n o s c o n o m o n t e , d o m e i o d o f o g o . E s t a v a

e u n e s s e t e m p o e n t r e Ia h w e h e v ó s , p a r a v o s a n u n c i a r a p a l a v r a d e Ia h w e h ; p o r -q u e t i v e s t e s m e d o p o r c a u s a d o f o g o , e n ã o s u b i s t e s a o m o n t e , d i z e n d o e l e : E u

s o u Ia h w e h t e u D e u s , q u e t e t i r e i d a t e r r a d o E g i t o , d a c a s a d a s e r v i d ã o . N ã o t e -

r á s o u t r o s d e u s e s d i a n t e d e m i m " ( D t 5 , 1 - 7 ) .

48

"Não com nossos pais fez Iahweh essa Aliança, mas conosco,

com todos nós que hoje es tamos aqui vivos. Face a face fa lou Ia hweh

conosco no monte, do meio do fogo. . . " - Moisés lembra-lhes a teofania

por todos presenciada, vis ta e ouvida. Indicava pela demon stração de

majestade e poder a origem do que se convencionou denominar de D e-

cálogo (= Dez Palavras) , ou de Dez Mandamentos. Passou a s er vincu-

lado e também todo o episódio à Aliança donde a denomin ação que lhe

seria mais apropriada de Lei da Aliança. É um desses f atos espantosos

que compõem a His tória do Povo de Is rael e se tornou um legado do

cris t ianismo. Evidenciam por s i só a presenç a de um Deus Pessoal e

Dinâmico a conduzir inexoravelmente a his tória humana para o Seu

Desígnio, para aquela int imidade, famil iar idade e comunhão de vidas

do Jardim do Éden. O mesmo Deus que "passeava pelo Jardim à brisa

do dia" (Gn 3,8) se manifesta no M onte Sinai (ou Horeb) , num encon-

tro inesquecível com o mesmo Homem e lhe diz :

" E u s o u Ia h w e h t e u D e u s , q u e t e t i r e i d a t e r r a d o E g i t o , d a c a s a d a s e r v i d ã o . N ã o t e r á s o u t r o s d e u s e s d i a n t e d e m i m " ( E x 2 0 , 2 - 3 ) .

É necessário um exame dessa f rase para dimens ionar o que fora

t ransmit ido e receb ido pelos Israel i tas ao ouvi - la . Em primeiro lugar é

um Deus Vivo que demonstrou amar os "Fi lhos de Abraão" al i rem a-

nescentes , l ibertando-os de uma servidão e que por isso merece uma

demonstração de amor como resposta . E m seguida , começam-se as

formas de se dar a resposta como reconhecimento e que só pode ser

outra demonstração de amor e de f idel idade em retr ibuição. Por isso ,

ela vem expressa em uma forma negat iva do imperat ivo após uma e x-

pressão tangencial deixando de s er ass im uma ordem posi t iva e direta,

como aquelas da Cr iação ou como aquelas após o pecado, t al como se

pode observar:

" . . . F r u t i f i c a i e m u l t i p l i c a i - v o s ; e n c h e i a t e r r a e s u j e i t a i - a ; d o m i n a i . . . " ( G n

1 , 1 8 ) / “ . . . e m d o r d a r á s à l u z f i l h o s ( . . . ) e e l e t e d o m i n a r á . E a o h o m e m d i s s e : ( . . . ) m a l d i t a é a t e r r a p o r t u a c a u s a ; e m f a d i g a c o m e r á s d e l a ( . . . ) c o m e r á s d a s

e r v a s d o c a m p o . ( . . . ) c o m e r á s o t e u p ã o , a t é q u e t o r n e s à t e r r a , p o r q u e d e l a f o s -

t e t o m a d o ; p o r q u a n t o é s p ó , e a o p ó t o r n a r á s " ( G n 3 , 1 6 - 1 9 ) .

"Frut i f icai . . . , mul t ipl icai . . . , enchei . . . sujei tai . . . ; dominai" "d a-

rás . . . , . . . dominará. . . , . . .maldi ta é . . . , comerás . . . , . . . ao pó torn arás" são

expressões imperat ivas posi t ivas , enquanto que no Decálogo há uma

maneira diferente de ordenar com a forma ". . . não terás . . . " , após uma

ampla e carinhosa exposição de motivos tal como, por exe mplo, um pai

dizendo ao seu f i lho:

" E u s o u o t e u p a i q u e t e s u s t e n t o e p a g u e i a t u a e s c o l a c o m m u i t a d i f i c u l d a d e e

t r a b a l h o ; n ã o m e t r a i r á s , n ã o d a r á s o u v i d o a e s t r a n h o s e n ã o t e d e s v i a r á s d e m i m , n ã o p e r d e r á s o a n o e s c o l a r , n ã o . . . "

Seria isso ordem, mandamento? Parece mais pedido, apelo de

amor, e prat icado após a prát ica de ato que o tenha demonstrado, como

se dissesse:

" F u i E u q u e m l i v r e m e n t e t e l i b e r t o u d a e s c r a v i d ã o : n ã o m e t r o q u e s p o r o u t r o

D e u s , q u e n a d a f e z p o r t i : N ã o t e r á s o u t r o s d e u s e s d i a n t e d e m i m . N ã o f a r á s p a -r a t i i m a g e m e s c u lp i d a , n e m f i g u r a a l g u m a d o q u e h á e m c i m a n o c é u , n e m e m

49

b a i x o n a t e r r a , n e m n a s á g u a s d e b a i x o d a t e r r a p a r a a s a d o r a r e s e r v i r . E u s o u u m D e u s V i v o e P e s s o a l , n ã o u m í d o l o . N ã o t e e n c u r v a r á s d i a n t e d e l a s , n e m a s

s e r v i r á s . . . ” .

Eis ai o motivo do pedido: o perigo de desvio do Israel i ta para a

prát ica de então de se adorar vários ídolos e de servir a vários deuses ,

entre os quais Iahweh não dev eria ser incluído "porque eu, Iahweh teu

Deus, sou Deus ciumento, que vingo a iniq uidade dos pais nos f i lhos

até a terceira e quar ta geração daqueles que me odeiam e uso de mis e-

r icórdia até mil gerações com os que me amam e guardam os meus

mandamentos". Es ta frase causa certa repulsa por t ransparecer que

Deus vinga nos f i lhos o er ro dos pais , mas não é ass im. Lançando a

semente da monolat r ia e de futuro monoteísmo , Deus está d izendo que

enquanto os deuses dos pagãos não se incomodam em se enfi lei rar ju n-

to com outros num panteão, Iahweh não acei ta outro ao seu lado c omo

igual ou ser considerado outro dentre os deuses . É “Deus ciumento”,

“o Deus Vivo, Pessoal e tem ciúmes”. Soava então , para o Israel i ta , a

obrigação de adorar somente a Ele lembrando -se de que , enquanto as

consequências de um ato "dos que me odeiam (= me agridem, me ofen-

dem = o pecado )" a t ingem "três ou quatro gera ções" a "sua misericór-

dia com aqueles que o amam at inge mil gerações ", isso é, vai até o in-

f ini to , naquele tempo representado pelo nú mero mil . É uma demons-

t ração da dimensão da misericórdia de Deus que não é at ingido e não

se al tera, em si , em face do desvio por causa do pecado; e , cujo efei to

somente ao próprio Homem at inge. É ele mesmo quem o provoca r e-

percut indo a sua conduta nos seu s descendentes por causa da sol idar i -

edade mais sensível naquele tempo por e s tar o meio social al icerçado

numa dinâmica t r ibal e patr iarcal .

O israel i ta vivia numa comunidade onde sempre se correlaciona

e os efei tos danosos de qualquer ato contra Iahweh nã o se l imitam a

quem o prat icou apenas , mas at inge os seus contemporâneos pela vio-

lação das Leis da Aliança e seus efei tos sociais . Mesmo assim, porém,

a relação proporcional entre a "vingança" e a "misericórdia" de Deus é

infini ta , que , em números , seria de mil para t rês ou quatro unidades. É

a impossibi l idade de se aderi r a outro deus juntamente com Iahweh,

que é "ciumento". As conseq uências desse ato de infidel idade ou f id e-

l idade respect ivamente não f icará impune ou sem recompensa , mas se

ref let i rá para sempre, seja pelo cul t ivo e colhei ta dos efei tos do pec a-

do, seja pela l ibertação dele , facul tando à própria vida a t ingir a sua

vocação natural . Para um grupo humano permanecer unido e coeso é

indispensável uma fé comum e ex terior izada em uma codif icação c o-

mum de procedimento moral , l igada a um só Deus e um só "Mand a-

mento" principalmente pela missão de "povo de sacerdotes e nação

santa" que era. Nenhuma infidel idade poderia ocorrer , seja ela indiv i-

dual seja comunitária , para não comprometer a comunhão e a uni dade.

É necessário destacar aqui que es se "Primeiro Mandamento" ou

"Primeira Palavra" vai crescer , t ransformar -se e tornar -se bem mais

aprofundado após a peregrinação dos isra el i tas pelo deserto. É por isto

que regis t ra o l ivro de Deuteronômio amplo desen volvimento, enrique-

cendo-se o sent ido de se "amar a Deus" (Dt 5 -11), que com Jesus foi

rat i f icada nesses te rmos:

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" O s f a r i s e u s , q u a n d o s o u b e r a m , q u e e l e f i z e r a e m u d e c e r o s s a d u c e u s , r e u n i r a m -

s e t o d o s ; e u m d e l e s , d o u t o r d a l e i , p a r a o e x p e r i m e n t a r , i n t e r r o g o u - o , d i z e n d o :

M e s t r e , q u a l é o g r a n d e m a n d a m e n t o n a l e i ? R e s p o n d e u - l h e J e s u s : A m a r á s a o

S e n h o r t e u D e u s d e t o d o o t e u c o r a ç ã o , d e t o d a a t u a a l m a , e d e t o d o o t e u e n -t e n d i m e n t o . E s t e é o g r a n d e e p r i m e i r o m a n d a m e n t o . E o s e g u n d o , s e m e l h a n t e a

e s t e , é : A m a r á s a o t e u p r ó x i m o c o m o a t i m e s m o . D e s t e s d o i s m a n d a m e n t o s d e -

p e n d e m t o d a a l e i e o s p r o f e t a s " ( M t 2 2 , 3 4 - 4 0 ) .

Esse fato comprova a qual idade de Mandamentos de Amor da n-

do-lhe val idade perene para a salvação , tal como confirmada pelo

mesmo Jesus:

" E e i s q u e s e a p r o x i m o u d e l e u m j o v e m , e l h e d i s s e : M e s t r e , q u e f a r e i p a r a c o n -

s e g u i r a v i d a e t e r n a ? R e s p o n d e u - l h e e l e : ( . . . ) s e q u e r e s e n t r a r n a v i d a , g u a r d a

o s m a n d a m e n t o s . . . " ( M t 1 9 , 1 6 - 1 9 ) .

Não é diferente o que ensina a Igreja ainda atualmente:

" 2 0 8 3 - J e s u s r e s u m i u o s d e v e r e s d o h o m e m p a r a c o m D e u s n e s t a p a l a v r a : " A m a -

r á s o S e n h o r t e u D e u s c o m t o d o o t e u c o r a ç ã o , c o m t o d a a t u a a l m a , c o m t o d a a

t u a m e n t e ( M t 2 2 , 3 7 ; c f . Lc 1 0 , 2 7 : " e c o m t o d a s a s t u a s f o r ç a s " ) . E s t a p a l a v r a é o e c o i m e d i a t o a o a p e l o s o l e n e : " E s c u t a , I s r a e l : o S e n h o r n o s s o D e u s é o ú n i c o "

( D t 6 , 4 - 5 ) .

D e u s f o i o p r i m e i r o a a m a r . O a m o r d o D e u s ú n i c o é l e m b r a d o n a p r i m e i r a d a s " D e z P a l a v r a s " . E m s e g u i d a , o s m a n d a m e n t o s e x p l i c i t a m a r e s p o s t a d e a m o r q u e

o h o m e m é c h a m a d o a d a r a o s e u D e u s " ( v . o P a r á g r a f o d o C a t e c i s m o d a I g r e j a

C a t ó l i c a ) .

(2 . º )- O Culto Das Imagens - Muitos cr is tãos , até mesmo entre

os catól icos , têm séria dif iculdade com o que se entende ser uma pro i -

bição de veneração de imagens principalmente em uso na Igreja Cat ó-

l ica, pelo que se impõe uma anál ise mais det ida a part i r do contexto:

" N ã o f a r á s p a r a t i i m a g e m e s c u l p i d a , n e m f i g u r a a l g u m a d o q u e h á e m c i m a n o

c é u , n e m e m b a i x o n a t e r r a , n e m n a s á g u a s d e b a i x o d a t e r r a " ( E x 2 0 , 4 ) .

Anal isando-se só es te vers ículo, isoladamente, só s e pode dedu-

zir que não se pode reproduzir numa imagem qualquer objeto, seja ele

o que for . Nessas condições vai se chegar ao absurdo de que nem

mesmo uma fotografia com a imagem dos pais ou a tela de pintura de

paisagem ou um ser qualquer, poder -se-ia confeccionar ou pintar . E,

atualmente seria de se precaver até mesmo contra as imagens da tela

de um televisor , ass im como os heróis ou as f iguras da his tória de um

povo não poderiam ter nem mesmo o seu busto em praça públ ica. P o-

rém, quando se anal isa o referi do vers ículo em conjunto com todo o

contexto em que foi escri to , e considera ndo-se o que lhe antecede e o

que lhe segue, a conclusão muda de perspe ct iva, ou seja:

" N ã o t e r á s o u t r o s d e u s e s d i a n t e d e m i m " ( E x 2 0 , 3 ) ;

" N ã o f a r á s p a r a t i i m a g e m e s c u l p i d a , n e m f i g u r a a l g u m a d o q u e h á e m c i m a n o c é u , n e m e m b a i x o n a t e r r a , n e m n a s á g u a s d e b a i x o d a t e r r a ” ( E x 2 0 , 4 ) ; e ,

" N ã o a s a d o r a r á s n e m a s s e r v i r á s . . . " ( E x 2 0 , 5 ) .

Assim dispostos vê -se que a preocupação de Iahweh é a confe c-

ção de ídolos que fossem objeto de ad oração juntamente com Ele ou

em Seu lugar ("Não terás outros deuses diante de mim ") . Não se pode

deixar de lado que já fora f ixada a acei tação do Povo de Israel pela

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Aliança em resposta ao que Deus lhe di ssera: "Tudo o que Iahweh di s-

se, nós o faremos" (Ex 19,5-8) . Assim, a principal norma da Aliança

era essa de f idel idade impar e exclusiva ao Deus que os l ibertou do

Egi to, "não adorando nem servindo " a outro deus que, além de est r a-

nho, nada por eles f izera e nem poderia fazer ("Não farás para t i im a-

gem esculpida, nem figura alguma do que há em cima no céu, nem em

baixo na terra, nem nas águas debaixo da ter ra. Não as adorarás nem

as servirás . . . " . O Deus de Israel não é um deus esculpido ou inventado

ou criado, Iahweh é um Deus Vivo e Pessoal , com quem se ent ra em

comunhão de vidas , sant i f icando -se. A única Imagem de Deus é o H o-

mem).

É de se notar que , nem mesmo em Is rael , essa disposição era a s-

s im tão radical ou pacíf ica, ex is t indo exemplos de confecção de im a-

gens por determinação do próprio Iahweh tanto na representação dos

querubins na Arca da Aliança (Ex 25,18 -21), como na da serpente de

bronze no deserto (Nm 21,8s) . Exis tem também de outras imagens no

Templo construído por Salomão em Jerusalém tais como as de quer u-

bins (1Rs 6,23-29), as dos doze touros d o Mar de Bronze (1Rs 7,25);

e , várias imagens de querubins , bois , romãs, botões e f lor de amêndoa

esculpidos e dispostos em muitos outros locais (Ex 25,31; 1Rs

6,29.32.35; 7 ,18s.29.36.42; 1Cro 28,18; 2Cro 3,10) e as dos leões do

t rono do próprio Salomão (1 Rs 10,19s) . Também, a confecção por G e-

deão de um éfode que t inha quase sempre a forma de uma imagem cu l-

tual , usado para adivinhação (Jz 8,24 -27), ex is t indo também outro ,

junto da espada tomada de Golias (1Sm 21,10a), e até mesmo um t ipo

para se t i rar a sor te (1Sm 14,3.18s.37.41; 23,6.9s; 30,7s) . Destaca -se

até mesmo o caso de uma imagem (éfode e terafim) colocada em um

nicho e servida por um sacerdote levi ta e apesar de alguns comentários

do narrador, indicam o seu uso e ntre os israel i tas :

" Q u a n d o e l e r e s t i t u i u o d i n h e i r o a s u a m ã e , e l a t o m o u d u z e n t a s m o e d a s d e p r a t a , e a s d e u a o o u r i v e s , o q u a l f e z d e l a s u m a i m a g e m e s c u l p i d a e u m a d e f u n d i ç ã o ,

a s q u a i s f i c a r a m e m c a s a d e M i c a . O r a , t i n h a e s t e h o m e m , M i c a , u m s a n t u á r i o e

f e z u m é f o d e e t e r a f i n s , e c o n s a g r o u u m d e s e u s f i l h o s , q u e l h e s e r v i u d e s a c e r -d o t e . N a q u e l a s d i a s n ã o h a v i a r e i e m Is r a e l e c a d a q u a l f a z i a o q u e p a r e c i a b e m

a o s s e u s o l h o s . E h a v i a u m j o v e m d e B e l é m d e J u d á , d a f a m í l i a d e J u d á , q u e e r a

l e v i t a , e p e r e g r i n a v a a l i . E s t e h o m e m p a r t i u d a c i d a d e d e B e l é m d e J u d á p a r a i r e s t a b e l e c e r - s e o n d e p u d e s s e . S e g u i n d o e l e o s e u c a m i n h o , c h e g o u à r e g i ã o m o n -

t a n h o s a d e E f r a i m , à c a s a d e M i c a , o q u a l l h e p e r g u n t o u : D o n d e v e n s ? E e l e l h e r e s p o n d e u : S o u l e v i t a d e B e l é m d e J u d á , e v o u p e r e g r i n a r a t é m e e s t a b e l e c e r

o n d e a c h a r c o n v e n i e n t e . E n t ã o l h e d i s s e M i c a : F i c a c o m i g o , e s ê - m e p o r p a i e

s a c e r d o t e ; e c a d a a n o t e d a r e i d e z m o e d a s d e p r a t a , o v e s t u á r i o e o s u s t e n t o . E o l e v i t a e n t r o u . C o n s e n t i u , p o i s , o l e v i t a e m f i c a r c o m a q u e l e h o m e m , e l h e f o i

c o m o u m d e s e u s f i l h o s . E M i c a c o n s a g r o u o l e v i t a , q u e l h e s e r v i u d e s a c e r d o t e ,

e f i c o u e m s u a c a s a . E n t ã o d i s s e M i c a : A g o r a s e i q u e o S e n h o r m e f a r á b e m , p o r q u e t e n h o u m l e v i t a p o r s a c e r d o t e " ( J z 1 7 , 4 - 1 3 ) .

Apesar de dizer que "naqueles dias não havia rei em Israel e c a-

da qual faz ia o que parecia bem aos seus olhos", em vir tude de não ter

s ido ainda definido o local do "único santuário" (Dt 12,4 -9 / Ex 20,24;

25,8s) , as imagens aqui er igidas eram anteriormente servidas pelo s a-

cerdócio segundo o costume, pelo "primogêni to", é claro ("e consagrou

um dos seus f i lhos") , e depois por um sacerdote levi ta (domici l iado em

Judá), tal como então oficial izado para o cul to (Nm 8,15 -18). Esses

ídolos e imagens foram apropriados pelos Dani tas e l evados a Si lo (Jz

18,15-31). Por a í se vê que, mesmo em Is rael , a questão não t inha uma

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conotação tão l i te ra l e não se pode deixar de lado a dos Bezerros de

Ouro (Ex 32) que serão futuramente er igidos por Jeroboão , um em Be-

tel e outro em Dã (1Rs 12,26 -33). Apesar da crí t ica ferrenha de vários

profetas quanto aos úl t imos, causada quase sempre por uma indignação

pol í t ica provocada pela separação havida do Reino do Nor te, desme m-

brando-se a Nação Is rael i ta (cfr . Am 4,4; 5 ,5s; 7 ,9; Os 8,5; 13,2) , a

proibição de imagem não t inha essa conotação tão radica l como se pre-

tende.

Diz o Mandamento: “Não farás para t i imagem esculpida, nem

f igura alguma do que há em cima no céu, nem em baixo na terra, nem

nas águas debaixo da terra. Não as adorarás nem as servi rás”. Assim a

proibição do Decálogo só pode ser a de se confeccionar imagens para

as "adorar", i sso é, "prestar - lhes cul to no lugar de Deus", reconhece n-

do-a como outro criador e senhor diferente (Ex 20,23; 22,19;

23,24s.32s) , na condição "servo", em f ranca e ostensiva v iolação da

Aliança. Já a "veneração pecul iar aos ca tól icos , ortodoxos, angl ic anos

etc." t em o sent ido de se honrar a sant idade alcançada por um fiel , o-

bra de Deus pela Redenção em Seu Fi lho . Isso vem melhor esclarec ido

pelo Catecismo da Igreja Catól ica, ns . º . 2129 - 2132:

" I V . " N ã o f a r á s p a r a t i q u a l q u e r i m a g e m e s c u l p i d a " " 2 1 2 9 - E s t a d i s p o s i ç ã o d i v i n a c o m p o r t a v a a i n t e r d i ç ã o d e q u a l q u e r r e p r e s e n t a -

ç ã o d e D e u s p o r m ã o d o h o m e m . O D e u t e r o n ô m i o e x p l i c a : " T o m a i s c u i d a d o c o n -

v o s c o ; n ã o v i s t e s f i g u r a a l g u m a , n o d i a e m q u e o S e n h o r v o s f a l o u d o m e i o d o f o g o , n o H o r e b . E v i t a i , p o i s , p e r v e r t e r - v o s , f a b r i c a n d o q u a l q u e r í d o l o c o m o r e -

p r e s e n t a ç ã o o u s í m b o l o d o q u e q u e r q u e s e j a " ( D t 4 , 1 5 - 1 6 ) . D e u s q u e S e r e v e l o u

a I s r a e l é a b s o l u t a m e n t e t r a n s c e n d e n t e . " E l e é t u d o " , m a s , a o m e s m o t e m p o , " e s -t á a c i m a d e t o d a s a s s u a s o b r a s " ( E c l o 4 3 , 2 7 - 2 8 ) . E l e é " a p r ó p r i a f o n t e d e t o d a

a b e l e z a c r i a d a " ( S b 1 3 , 3 ) .

2 1 3 0 - N o e n t a n t o , j á d e s d e o A n t i g o T e s t a m e n t o D e u s o r d e n o u o u p e r m i t i u a i n s t i t u i ç ã o d e i m a g e n s , q u e c o n d u z i r i a m s i m b o l i c a m en t e à s a l v a ç ã o p e l o V e r b o

E n c a r n a d o : p o r e x e m p l o , a s e r p e n t e d e b r o n z e ( c f r . N m 2 1 , 4 - 9 ; S b 1 6 , 5 - 1 4 ; J o

3 , 1 4 - 1 5 ) , a a r c a d a a l i a n ç a e o s q u e r u b i n s ( c f r . E x 2 5 , 1 0 - 2 2 ; 1 R s 6 , 2 3 - 2 8 ; 7 , 2 3 -2 6 ) .

2 1 3 1 - C o m b a s e n o m i s t é r i o d o V e r b o E n c a r n a d o , o s é t i m o C o n c í l i o E c u m ê n i -

c o , d e N i c é i a ( a n o d e 7 8 7 ) j u s t i f i c o u , c o n t r a o s i c o n o c l a s t a s , o c u l t o d o s í c o n e s : d o s d e C r i s t o , e t a m b é m d o s d a M ã e d e D e u s , d o s a n j o s e d e t o d o s o s s a n t o s .

E n c a r n a n d o , o F i l h o d e D e u s i n a u g u r o u u m a n o v a " e c o n o m i a " d a s i m a g e n s .

2 1 3 2 - O c u l t o c r i s t ã o d a s i m a g e n s n ã o é c o n t r á r i o a o p r i m e i r o m a n d a m e n t o , q u e p r o í b e o s í d o l o s . C o m e f e i t o , " a h o n r a p r e s t a d a a u m a i m a g e m r e m o n t a a o

m o d e l o o r i g i n a l " ( S . B a s í l i o , S p i r . 1 8 , 4 5 ) e " q u e m v e n e r a u m a i m a g e m v e n e r a

n e l a a p e s s o a r e p r e s e n t a d a " ( C o n c . I I d e N i c é i a : D S 6 0 1 ; c f . C o n c í l i o d e T r e n t o : D S 1 8 2 1 - 1 8 2 5 ; C o n c í l i o d o V a t i c a n o I I : S C 1 2 6 ; L G 6 7 ) . A h o n r a p r e s t a d a à s

s a n t a s i m a g e n s é u m a " v e n e r a ç ã o r e s p e i t o s a " , e n ã o u m a a d o r a ç ã o , q u e s ó a D e u s s e d e v e :

O c u l t o d a r e l i g i ã o n ã o s e d i r i g e à s i m a g e n s e m s i m e s m a s c o m o r e a l i -

d a d e s , m a s o l h a - a s s o b o s e u a s p e c t o p r ó p r i o d e i m a g e n s , q u e n o s c o n -d u z e m a o V e r b o E n c a r n a d o . O r a , o m o v i m e n t o q u e s e d i r i g e à i m a g e m

e n q u a n t o t a l n ã o s e q u e d a n e l a , m a s p a s s a à r e a l i d a d e d e q u e é i m a g e m

( S . T o m á s d e A q u i n o , S u m m a T h e o l o g i c a , 2 - 2 , 8 1 , 3 , a d 3 ) . "

A imagem se torna então um meio material e até mesmo didát ico

ou pedagógico, principalmente durante a oração, usando -se o sensível

para se at ingir mentalmente a Sant idade do Verbo Encarnado t raz ida

ao Homem. Seria como que um meio sensível de se vis lumbrar imagi-

nariamente o sobrenatural e santo, obra exclusiva de Deus, pois "Deus

é que sant i f ica" (Lv 19,2 / 20,8) . O cul to ass im não se f ixa nela, mas

se dir ige desde o in ício da invocação, a Deus, ao único Autor da Sa n-

t idade al i representada. E, até mesmo o próprio Jesus se ident i f ica com

53

a imagem da serpente de bronze confeccionada no deserto, ao d izer a

Nicodemos:

" E c o m o M o i s é s l e v a n t o u a s e r p e n t e n o d e s e r t o , a s s i m i m p o r t a q u e o F i l h o d o h o m e m s e j a l e v a n t a d o ; p a r a q u e t o d o a q u e l e q u e n e l e c r ê t e n h a a v i d a e t e r n a "

( J o 3 , 1 4 - 1 5 ) .

Ao dizer isso quis signif icar mentalmente a Imagem de Sua Mor-

te Redentora Na Cruz para que Nicodemos A unisse, didat ic amente, à

imagem da serpente que Moisés levantou no deserto para curar os isr a-

el i tas , Ele que curar ia o Homem das chagas do pecado:

" P o r q u e o s q u e d a n t e s c o n h e c e u , t a m b é m o s p r e d e s t i n o u p a r a s e r e m c o n f o r m e s à i m a g e m d e s e u F i l h o , a f i m d e q u e e l e s e j a o p r i m o g ê n i t o e n t r e m u i t o s i r -

m ã o s . . . " ( R m 8 , 2 9 ) / " E l e n o s t i r o u d o p o d e r d a s t r e v a s , e n o s t r a n s p o r t o u p a r a

o r e i n o d o s e u F i l h o a m a d o ; e m q u e m t e m o s a r e d e n ç ã o , a s a b e r , a r e m i s s ã o d o s p e c a d o s ; o q u a l é i m a g e m d o D e u s i n v i s í v e l , o p r i m o g ê n i t o d e t o d a a c r i a ç ã o . . . "

( C o l 1 , 1 3 - 1 5 ) .

Além disso, “ . . . não os servirás . . .” diz respei to à Oferenda em

Sacri f ício do Pão de Deus, pelo qual também Deus “se al imentava”, tal

como foi ordenado a respei to dos Sacerdotes: “Tu o t ratarás como sa n-

to, pois oferece o pão do teu deus” (Lv 21,8)”. “Servir” en tão é part i -

cipar de um sacri f íc io pagão ao seu deus, esculpido em imagem. Daí a

proibição mandamental .

(3.º) - "Não tomarás o nome de Iahweh teu Deus em vão; por-

que Iahweh não terá por inocente aquele que tomar o seu nome em

vão" - Emprega-se o nome de Deus em vão quando for à toa, sem mo-

t ivo, ou por razões fúteis e sem nenhuma necessidade. Mas, para o I s-

rael i ta , além disso, como são indestacáveis e inseparáveis da pessoa o

nome e a palavra, no que se refere a Iahweh Deus o Seu Nome detém

Sua Sant idade, Sua Palavra o Seu Poder e ambos a Sua Majestade. A s-

sim, "tomar-lhe o nome em vão" é um indesculpável desrespei to que

Deus "não terá como sendo fruto de inocência, sem culpa". A causa

principal disso é o mau uso que se pode fazer em juramentos falsos em

que Deus é colocado como testemunha para af iançar aqui lo que fals a-

mente se af i rma (Lv 19,12), além do uso superst ic ioso do Seu Nome

para a prát ica da magia, ou pelos necromantes , em busca de efei tos

fantasiosos , até mesmo nos r i tos pagãos pelo poder de que se apodera

e adquire quem O pronuncia (Lv 19,31; 20,6.27; Nm 23,23; Dt 18,10 -

12). Tais costumes seriam intolerávei s para o Povo dos Fi lhos de Isr a-

el pela corrupção que produzir iam no meio comunitário em formação ,

fer indo com uma insuperável desunião ou confl i tos de sérias cons e-

quências , a fé e a Al iança.

É esse sent ido que está embutido no pedido fei to por Moisés ao

Faraó do Egi to para que deixasse o povo avançar t rês dias no deserto

para “servir o Pão de Deus” a Iahweh. O Povo dos Fi lhos de Israel

queria oferecer seus Sacri f ícios a Iahweh , sem ser importunado pelos

egípcios .

(4.º) "Lembra-te do dia do sábado, para o santif icar : - . Seis

dias t rabalharás , e farás todo o teu t rabalho; mas o sét imo dia é o s á-

54

bado de Iahweh teu Deus. Nesse dia não farás t rabalho algum, nem tu,

nem teu f i lho, nem tua f i lha, nem o teu servo, nem a tua serva, nem o

teu animal , nem o est rangeiro que está dentro das tuas portas . Porque

em seis dias fez Iahweh o céu e a terra, o mar e tudo o que neles há, e

ao sét imo dia descansou; por isso Iahweh abençoou o dia do sábado, e

o sant i f icou" - O respei to pelo dia de sábado já ex is t ia antes da pr o-

mulgação das Leis da Aliança, como se vê por ocasião do Maná (Ex

16,22-30). No entanto, aqui , vai se vincular à Aliança, base de toda a

es t rutura do Decálogo:

" D i s s e m a i s Ia h w e h a M o i s é s : F a l a r á s t a m b é m a o s f i l h o s d e I s r a e l , d i z e n d o : C e r t a m e n t e g u a r d a r e i s o s m e u s s á b a d o s ; p o r q u e i s s o é u m s i n a l e n t r e m i m e v ó s

p e l a s v o s s a s g e r a ç õ e s ; p a r a q u e s a i b a i s q u e e u s o u o S e n h o r , q u e v o s s a n t i f i c a .

P o r t a n t o g u a r d a r e i s o s á b a d o , p o r q u e s a n t o é p a r a v ó s ; a q u e l e q u e o p r o f a n a r c e r t a m e n t e s e r á m o r t o ; p o r q u e q u a l q u e r q u e n e l e f i z e r a l g u m t r a b a l h o , s e r á e x -

t e r m i n a d o d o m e i o d o s e u p o v o . S e i s d i a s s e t r a b a l h a r á , m a s o s é t i m o d i a s e r á o

s á b a d o d e d e s c a n s o s o l e n e , s a n t o a Ia h w e h ; q u a l q u e r q u e n o d i a d o s á b a d o f i z e r

a l g u m t r a b a l h o , c e r t a m e n t e s e r á m o r t o . G u a r d a r ã o , p o i s , o s á b a d o o s f i l h o s d e

I s r a e l , c e l e b r a n d o - o n a s s u a s g e r a ç õ e s c o m o a l i a n ç a p e r p é t u a . E n t r e m i m e o s

f i l h o s d e I s r a e l s e r á e l e u m s i n a l p a r a s e m p r e ; p o r q u e e m s e i s d i a s f e z Ia h w e h o c é u e a t e r r a , e a o s é t i m o d i a d e s c a n s o u , e r e t o m o u a l e n t o " ( E x 3 1 , 1 2 - 1 7 ) .

Pela consagração do sábado é tes temunhada por Is rael a sua fé

em Iahweh, separando-o dos outros dias e ass im o sant i f icando e , prin-

cipalmente , demonstrando a sua f idel idade à Aliança por um ato ex te r-

no que at ingia a vida material eles deixavam de t rabalhar jun to com os

seus serviçais e até mesmo escravos. O sábado vai ass im se juntar à

ci rcuncisão , como sinal vis ível de adesão ao Povo dos Fi lhos de Is r ael .

Por a í se vê a seriedade da inst i tuição e a sua violação ser ia s inal de

quebra de unidade nacional , t razendo sério perigo à ordem social , pelo

que a reação do povo deveria ser ass im extremada.

Para melhor compreensão da origem e s ignif icado da "inst i tuição

da consagração do sábado" é oportun a, aqui , a t ranscrição do que

consta no Capí tulo I, n . 1 .6.1 deste Es tudo, quando da narrat iva da

Criação:

" O e s c r i t o r b í b l i c o a o i d e a l i z a r o s a c o n t e c i m e n t o s d o p a s s a d o m e s c l o u - o s c o m a

c u l t u r a d e e n t ã o , l e v a n d o p a r a a o r i g e m o u p a r a a C r i a ç ã o a s i n s t i t u i ç õ e s v i g e n t e s n o s e u t e m p o , a i l o c a l i z a n d o - a s t a l c o m o q u e a s j u s t i f i c a n d o . É o c a s o d o s á b a d o c o m o é

c o n h e c i d o o s é t i m o d i a d a s e m a n a . C o m b a s e n o q u e j á v i m o s p o d e m o s c o m p r e e n d e r o s i g n i f i c a d o d a d o o r i g i n a r i a m e n t e a e l e , e q u a l o s e u s e n t i d o r e l i g i o s o :

“ A s s i m f o r a m t e r m i n a d o s o c é u e a t e r r a e t o d o o s e u e x é r c i t o . E n o s é -t i m o d i a D e u s d e u p o r t e r m i n a d a a o b r a p o r e l e f e i t a ; e n o s é t i m o d i a

c e s s o u d e t o d a a o b r a q u e h a v i a f e i t o ; e , p o r i s s o , d eu s a b e n ç o o u o s é -

t i m o d i a e o s a n t i f i c o u , p o r q u e n e l e c e s s o u d e t o d a a o b r a q u e , e l e , c r i -a n d o , t i n h a f e i t o . E s t a é a g e r a ç ã o d o c é u e d a t e r r a n a s u a c r i a ç ã o ” ( G n

2 , 1 - 4 ) .

A p a l a v r a “ c e s s a r ” e m h e b r a i c o p r o n u n c i a - s e m a i s o u m e n o s “ s h a b b á t ” d e o n d e

v e i o o n o m e e a p r o n ú n c i a d o s é t i m o d i a d a s e m a n a , “ s á b a d o ” , t a l c o m o é c o n h e c i d o .

N e s s e t r e c h o n ã o s e t r a t a d a i n s t i t u i ç ã o d o r e s p e i t o a o s á b a d o , m a s d e e x p l i c a r a s u a d i s t i n ç ã o e n t r e o s o u t r o s d i a s , a p o n t o d e s e l h e v e d a r n e l e t o d o e q u a l q u e r t r a b a l h o .

N ã o s e t r a t a d e u m r e p o u s o d e D e u s , p r o p r i a m e n t e f a l a n d o , D e u s n ã o p r e c i s a d e r e p o u s o

a l g u m ( J o 5 , 1 7 ) , m a s d o d i a e m q u e t e r m i n a a C r i a ç ã o e l h e d á o a c a b a m e n t o f i n a l , a -b e n ç o a n d o - a . E , q u a n d o D e u s a b e n ç o a , f e c u n d a e “ e n e r g i z a ” p a r a q u e s e c u m p r a a s u a

f i n a l i d a d e , c o n f o r m e o S e u D e s í g n i o , t a l c o m o a b e n ç o a r a o s a n i m a i s e o h o m e m a o c r i á -

l o s . N ã o s e t r a t a d e f e c u n d a r e “ e n e r g i z a r ” u m d i a , t o r n a n d o - o f é r t i l p a r a a “ r e p r o d u ç ã o d e o u t r o s d i a s i g u a i s ” , m a s d e i m p r i m i r n a O b r a d a C r i a ç ã o a s l e i s q u e l h e s ã o p ec u l i a -

r e s , “ f e c u n d a n d o - a ” e “ e n e r g i z a n d o - a ” p a r a q u e e l a p r o s s i g a d e c o n f o r m i d a d e c o m s e u

d e s í g n i o , a b e n ç o a n d o - a t o d a . D e u s c e s s a d e c r i a r , t a l c o m o o p r ó p r i o J e s u s n o s r e v e l a , m a s n ã o c e s s a d e g o v e r n a r :

55

“ . . . : m e u p a i t r a b a lh a s e m p r e e e u t a m b é m t r a b a l h o ” ( J o 5 , 1 7 ) .

D e u s n a d a c r i o u s e m m o t i v o e s e m m e t a a a t i n g i r , m u i t o m e n o s p a r a d e s t r u i r .

D a í p o r q u e D e u s " s a n t i f i c o u " o s é t i m o d i a , i s s o é , n u m s e n t i d o b í b l i c o , “ s e p a r o u ” , d i s -t i n g u i u . A p a r e c e e n t ã o c o m t o d a a c l a r e z a a i r r e v e r s i b i l i d a d e e i n e x o r a b i l i d a d e d a c r i a -

ç ã o :

“ E n q u a n t o d u r a r a t e r r a , s em e a d u r a e c o l h e i t a , f r i o e c a l o r , v e r ã o e i n -

v e r n o , d i a e n o i t e n ã o h á d e f a l t a r ” ( G n 8 , 2 2 ) . "

Pelo exposto se pode deduzir que Deus "cessou" de criar no "sé-

t imo dia", no início dos tempos quando ainda não se dera nome aos d i-

as da semana e nem se denominava " sábado", tendo por origem et im o-

lógica o verbo hebraico " shabbát". O seu s ignif icado é "cessar de f a-

zer o que se es tá fazendo e retornar ao anterior es tado", motivo que

levou a se dizer que Deus "repousou". Iahweh Deus cessou de criar no

sét imo dia , mas não cessou de governar . Por isso, o Homem, "imagem

e semelhança de Deus" também "repousa", "cessa o que faz e vol ta ao

estado anterior", "descansa e guarda o sét imo dia", passando para a fé

prat icada essa terminologia e f icando assim conhec ido.

4.º .1 . - Domingo ou Sábado? - "Seis dias trabalharás, e farás

todo o teu trabalho; mas o sétimo dia é o sábado de Iahweh, teu

Deus" - Pelo fato de muitos adotarem a guarda do domingo em vez do

sábado, alguns cris tãos f icam com escrúpulo, entendendo que não se

observa o mandamento. Mudando -se para o "Dia do Senhor" (que é o

s ignif icado da palavra "domingo") não se desr espei ta o precei to eis

que se t rabalha "sei s dias e se cessa no sét imo", cumprindo -o na ínte-

gra. De maneira mais clara veri f ica -se que se t rabalha segunda (1.° d i -

a) , terça (2.° dia) , quarta (3.° dia) , quinta (4.° dia) , sex ta (5.° dia) e

sábado (6.° dia) , i s to é, "seis dias" como manda o estatuto e "cessa" o

t rabalho no domingo (7 .° dia) - i sso é, "t rabalha -se seis d ias e "des-

cansa -se" no sét imo".

É que, em vir tude de ocorrer no "Primeiro Dia da Semana" a

Ressurreição de Cris to (Mt 28,1; Mc 16,1 -2; Lc 24,1; Jo 20,1) , a As-

censão de Jesus (Mc 16,1.19; At 1) e o Dia de Pentecostes (At 2,1 -40 /

Lv 23,15-16) os primeiros cr is tãos passaram a guardá -lo como "o Dia

do Senhor" , em lugar do sábado dos israel i tas , não sem luta e relutâ n-

cia de alguns que a isso se opunham. Não é outro o motivo por que e-

x istem tantos episódios nos Evangelhos em que se narram várias at i t u-

des de Jesus ocasionando vários desencontros com os chefes rel igiosos

dos judeus, acusando-o de violá - lo (Mt 12,1-8.9-21; Mc 1,21-28; 2 ,23-

28; 3 ,1-6; Lc 4 ,31-37.38-39; 6 ,1-5.6-11; 13,10-17; 14,1-6 ; Jo 5,7-15;

9 ,13-25). São apenas just i f icações da permissibi l idade da mudança,

pois "o Fi lho do Homem é Senhor do sábado" (Mt 12,8) .

Por outro lado, há uma narrat iva que nos mostra um acontec i-

mento muito út i l para se entender o que ocorria naqueles dias dos pr i -

mórdios , quando do choque das duas cul t uras:

" N o p r i m e i r o d i a d a s e m a n a , t e n d o - n o s r e u n i d o a f i m d e p a r t i r o p ã o , P a u l o , q u e

h a v i a d e s a i r n o d i a s e g u i n t e , f a l a v a c o m e l e s , e p r o l o n g o u o s e u d i s c u r s o a t é a

m e i a - n o i t e " ( A t 2 0 , 7 ) .

56

"No primeiro dia da semana, tendo -nos reunido a f im de pa rt i r o

pão. . ." - , i sso é, "reuniram-se no domingo (=primeiro dia da semana)

para a Eucaris t ia (= a f im de part i r o pão)", tendo Paulo "prolongado o

seu discurso até a meia -noi te" - Ora, o horário israel i ta di fere do oc i -

dental , eis que para aquele se conta o dia a part i r das dezoi to horas até

as dezoi to horas do dia seguinte. Então, part iam o pão à noite do sáb a-

do ocidental , que já era domingo para eles , única possibi l idade de

Paulo haver "prolongado o seu discurso até a meia noi te". Outras ref e-

rências ex is tem que confirmam a ex is tência da reunião fest iva no d o-

mingo (1Cor 16,2 e Ap 1,9 -11).

Evidencia-se out ro aspecto da visão cr is tã do sábado, pelo que

dissera Cris to: "o sábad o exis te para o homem e não o homem para o

sábado" (Mc 2,27), manifestado por São Paulo:

" P o r t a n t o , n i n g u é m v o s j u l g u e p o r q u e s t õ e s d e c o m i d a e d e b e b i d a , o u a r e s p e i t o

d e f e s t a s a n u a i s o u d e l u a n o v a o u d e s á b a d o s , q u e s ã o a p e n a s s o m b r a d e c o i s a s

q u e h a v i a m d e v i r , m a s a r e a l i d a d e é o c o r p o d e C r i s t o " ( C o l 2 , 1 6 - 1 7 ) .

Também não é out ro o ensino do Catecismo da Igreja Catól ica ,

que doutr ina e expl ica suficientemente:

" 2 1 7 4 - J e s u s r e s s u s c i t o u d e e n t r e o s m o r t o s " n o p r i m e i r o d i a d a s e m a n a ( M t 2 8 , 1 ; M c 1 6 , 2 ; Lc 2 4 , 1 ; J o 2 0 , 1 ) . E n q u a n t o " p r i m e i r o d i a " , o d i a d a R e s s u r r e i -

ç ã o d e C r i s t o l e m b r a a p r i m e i r a C r i a ç ã o . E n q u a n t o " o i t a v o d i a " , a s e g u i r a o

s h a b b á t ( M c 1 6 , 1 ; M t 2 8 , 1 ) , s i g n i f i c a a n o v a C r i a ç ã o , i n a u g u r a d a c o m a R e s s u r -r e i ç ã o d e C r i s t o . E s t e d i a t o r n o u - s e p a r a o s c r i s t ã o s o p r i m e i r o d e t o d o s o s d i a s ,

a p r i m e i r a d e t o d a s a s f e s t a s , o d i a d o S e n h o r ( " H é k u r i a k é h é m e r a " , " d i e s d o -

m i n i c a " ) , o " D o m i n g o " : R e u n i m o - n o s t o d o s p r e c i s a m e n t e n o d i a d o S o l , n ã o s ó p o r q u e f o i o

p r i m e i r o d i a e m q u e D e u s , t r a n s f o r m a n d o a s t r e v a s e a m a t é r i a , c r i o u o

m u n d o , m a s t a m b é m p o r q u e J e s u s C r i s t o , N o s s o S a l v a d o r , n e s s e d i a r e s -s u s c i t o u d o s m o r t o s ( S ã o J u s t i n o , A p o l . 1 , 6 7 ) "

" 2 1 7 5 - O D o m i n g o d i s t i n g u e - s e e x p r e s s a m e n t e d o s h a b b á t , a o q u a l s u c e d e c r o -

n o l o g i c a m e n t e , e m c a d a s e m a n a , e c u j a p r e s c r i ç ã o d e c a r á t e r c e r i m o n i a l s u b s t i -t u i p a r a o s c r i s t ã o s . O D o m i n g o c o m p l e t a , n a P á s c o a d e C r i s t o , a v e r d a d e e s p i -

r i t u a l d o s h a b b á t j u d a i c o e a n u n c i a o d e s c a n s o e t e r n o d o h o m e m e m D e u s . P o r -

q u e o c u l t o d a Le i p r e p a r a v a p a r a o m i s t é r i o d e C r i s t o e o q u e n e l a s e p r a t i c a v a e r a f i g u r a d e a l g u m p o r m e n o r r e l a t i v o a C r i s t o ( 1 C o r 1 0 , 1 1 ) :

O s q u e v i v e r a m s e g u n d o a A n t i g a A l i a n ç a a l c a n ç a r a m u m a n o v a e s p e -

r a n ç a , n ã o g u a r d a n d o j á o s á b a d o , m a s c e l e b r a n d o o d i a d o S e n h o r , p o r -q u e n e s s e d i a s u r g i u a n o s s a v i d a , f r u t o d a s u a m o r t e ( S a n t o In á c i o d e

A n t i o q u i a , M g n 9 , 1 1 ) .

2 1 7 6 - A c e l e b r a ç ã o d o D o m i n g o é o c u m p r i m e n t o d a p r e s c r i ç ã o m o r a l , n a t u -r a l m e n t e i n s c r i t a n o c o r a ç ã o d o h o m e m , d e " p r e s t a r a D e u s u m c u l t o e x t e r i o r ,

v i s í v e l , p ú b l i c o e r e g u l a r , s o b o s i g n o d o s e u b e n e f í c i o u n i v e r s a l p a r a c o m o s h o m e n s " ( S . T o m á s d e A q u i n o , S u m m a T h e o l o g i c a 2 - 2 , 1 2 2 , 4 ) . O C u l t o D o m i n i -

c a l c u m p r e o p r e c e i t o m o r a l d a A n t i g a A l i a n ç a , c u j o r i t m o e e s p í r i t o r e t o m a , a o

c e l e b r a r e m c a d a s e m a n a o C r i a d o r e o R e d e n t o r d o S e u P o v o . "

Faci lmente se constata que o Cul to do Domingo é o mesmo Culto

do Sábado não havendo motivo para o receio de descumprimento do

conhecido mandamento da Lei de Deus.

5.º) " Honra a teu pai e a tua mãe, para que se prolonguem os

teus dias na terra que Iahweh teu Deus te dá" - Até aqui o Decálogo

gira em torno da adoração a Deus com a exclusão de qualquer outro

cujo nome nem ao menos pronunciar era l íci to ao Israel i ta (Ex 23,13).

O seu cul to só poderia se di r igir a Iahweh a quem invocaria conforme

as especif icações dos quatro manda mentos já examinadas, cuja f inal i -

dade e missão era mais ampla ainda:

57

" P o r q u e o m e u a n j o i r á a d i a n t e d e t i , e t e i n t r o d u z i r á n a t e r r a d o s ( . . . " o u t r o s p o v o s " . . . ) e e u o s a n i q u i l a r e i . N ã o a d o r a r á s o s s e u s d e u s e s , n e m o s s e r v i r á s ,

n e m i m i t a r á s a s s u a s o b r a s ; a n t e s o s d e s t r u i r á s t o t a l m e n t e , e q u e b r a r á s d e t o d o

a s s u a s c o l u n a s . S e r v i r e i s , p o i s , a Ia h w e h v o s s o D e u s , . . . ( . . . ) N ã o f a r á s a l i a n ç a a l g u m a c o m e l e s , n e m c o m o s s e u s d e u s e s . . . . p o i s s e s e r v i r e s o s s e u s d e u s e s ,

c e r t a m e n t e i s s o t e s e r á u m a a r m a d i l h a " ( E x 2 3 , 2 3 - 2 5 . 3 1 - 3 3 ) .

Após aquelas disposições de f idel idade a Iahweh , o Decálogo vai

começar a ordenar o relacionamento das pessoas umas com as outras

com vis tas à paz social e comunitária , a começar com os pais , i sso é ,

em famíl ia apesar de nômades e no peregrinar a que se sujei taram.

Também fator indispensável para a paz num regime t r ibal e patr iarcal

em que tudo se cent ral iza no pai , chefe da famíl ia ou da t r ibo. Com r e-

ferência a esse mandamento , São Paulo:

" V ó s , f i l h o s , s e d e o b e d i e n t e s a v o s s o s p a i s n o S e n h o r , p o r q u e i s t o é j u s t o . H o n -

r a a t e u p a i e a t u a m ã e , q u e é o p r i m e i r o m a n d a m e n t o c o m p r o m e s s a , p a r a s e r e s

f e l i z e t e r e s u m a l o n g a v i d a s o b r e a t e r r a " ( E f 6 , 1 - 3 ) .

O mesmo regime patr iarcal impõe as normas que são capazes de

manter a paz interna e de qu e depende para a própria sobrevivência e

elas passam a reger coerci t ivamente a co nduta do grupo. Porém, nesse

caso, a coerção é mais interior , vem de dentro da pessoa, de sua pr ó-

pria consciência rel igiosa e se impõe , mas com uma promessa de r e-

compensa. Bas ta para se comprovar isso o fato de que não se diz " amar

pai e mãe", mas, se diz "honrar pai e mãe". Ora, o "amar" é uma ação

normal e natural no ser humano mas o "honrar" vai mais longe e ind e-

pendentemente do "amar" ex ige uma in teriorização, concentração ra-

cional e um esforço pessoal algo mais que a própria natureza sent i -

mental a agir . Mas i sso não acontece somente na vida nôm ade e mesmo

quando do assentamento do Povo de Israel na Terra Prometida só have-

rá modificação sens ível nesse , e no conjunto dos demais disposi t ivos

sofrerá apenas e tão somente aperfeiçoamentos. Esse sofrerá modifica-

ção bem como o que será anal isado a seguir quando Is rael at ingir as

Estepes de Moab, à entrada da Terra Prometida. Na ocasião far -se-ão

os comentários a propósi to .

Muitos destes mandamentos que se manifestam no grupo social

não passaram a ser observados somente após a sua promulgação , mas

já eram costumeiramente usados com base na própria experiência do

grupo, fenômeno que ocorre com toda a legis lação escr i ta . Assim,

quanto aos disposi t ivos "não matarás", "não cometerás adul tér io", "não

furtarás" e "não di rás falso tes temunho contra o teu próximo" (Ex

20,13-16) dizem respei to aos atos ex teriores do homem que ferem em

cheio o próximo, prejudicando -o e com isso sabotando a Paz Social

cujos efei tos danosos são sobejamente conhecidos. O que é necessário

notar é a necessidade de uma base comum centrada na consciência o b-

jet iva para a harmonia do grupo humano sem o que ela é impossível . É

de se regis t rar , porém, que o adul tér io vai sofrer modificação com

Cris to que vai acabar com a pol igamia mascul ina dos judeus e inst i tui r

a monogamia cris tã .

Resta o Décimo Mandamento que diz "não cobiçarás a casa de

teu próximo. . . nem coisa alguma que lhe pertença", em que há a origi-

58

nal idade que fere o preconcei to que se tem da cul tura ant iga, de ser

ass im superficial e sem profundidade. Preste -se a devida atenção e

ver-se-á que esse mandamento procura at ingir o ínt imo do Homem, seu

recanto mais privado, onde al imenta às vezes os seus mais querido s

sonhos e ideais e lhe diz : "não cobiçarás . . . ! Vai falar - lhe no mais ín-

t imo de seu ser e ev i tar -se-á muitos males oriundos de uma cobiça d e-

senfreada e inescrupulosa. Diferença notável é aqui o concei to de

"próximo" apl icado a outro Israel i ta , que Jesus i r á es tender a qua lquer

ser humano.

2.10. - A ALIANÇA CONSUMA-SE COM O POVO DE ISRAEL

Terminada a exposição e promulgação públ ica dos dez manda-

mentos , o Povo de Israel se manifesta e pede:

" O r a , t o d o o p o v o p r e s e n c i a v a o s t r o v õ e s , e o s r e l â m p a g o s , e o s o m d a t r o m b e t a , e o m o n t e a f u m e g a r ; e o p o v o , v e n d o i s s o , e s t r e m e c e u e p ô s - s e d e l o n g e . E d i s -

s e r a m a M o i s é s : F a l a - n o s t u m e s m o , e o u v i r e m o s ; m a s n ã o f a l e D e u s c o n o s c o ,

p a r a q u e n ã o m o r r a m o s . R e s p o n d e u M o i s é s a o p o v o : N ã o t e m a i s , p o r q u e D e u s v e i o p a r a v o s p r o v a r , e p a r a q u e o s e u t e m o r e s t e j a d i a n t e d e v ó s , a f i m d e q u e

n ã o p e q u e i s . A s s i m o p o v o e s t a v a e m p é d e l o n g e ; M o i s é s , p o r é m , s e c h e g o u à s

t r e v a s e s p e s s a s o n d e D e u s e s t a v a . E n t ã o d i s s e Ia h w e h a M o i s é s : A s s i m d i r á s a o s f i l h o s d e I s r a e l : V ó s t e n d e s v i s t o q u e d o c é u e u v o s f a l e i . N ã o f a r e i s o u t r o s

d e u s e s d e p r a t a j u n t o a m i m , n e m d e u s e s d e o u r o f a r e i s p a r a v ó s " ( E x 2 0 , 1 8 - 2 3 ) .

Constata-se inicialmente o “. . . não t emais . . .” , expressão que

surge sempre que um elei to se vê face a face com a missão para a qual

Deus o convoca. Assim aconteceu com Abraão, com Isaac e com Jacó,

aqui com os Fi lhos de Israel e em várias oportunidades no Novo Te s-

tamento (Gn 15,1; 26,24; 46,3; 50,19 -21; Ex 20,20; . . . ; Mt 1,20;

10,26.28.31; Lc 1,13.30; . . . ) . Acontece também quando da opos ição que

às vezes surge do desencontro da fé com as ex igências e com as coisas

do mundo. Aconteceu isso com Abraão ao recusar os despojos a que

t inha direi to (cfr . Gn 15,1) e desde a sua conversão teve que enfre ntar

inúmeras dif iculdades, tendo que se afas tar de seu clã, garant ia de s e-

gurança e sobrevivência naquele tempo. Numa época em que se acredi-

tava em vários deuses , cada clã ou t r ibo formava -se em torno de um

deles . Já foi vis to anteriormente , mas é bom repet i r que quando Abr a-

ão deixa de adorar o deus do clã (Jos 24,2) e passa a adorar Ia hweh ou

El Shaddai (Ex 6,3) não poderia mais nele permanecer. São coisas da

cul tura do tempo em que se deram tais fatos . Atualmente, e para qua l-

quer pessoa, não é um problema insuperável se afastar da famíl ia , do

convívio dos conterrâneos ou da ter ra natal , e até mesmo da rel igião.

Pode-se viver prat icamente em segurança em qualquer lugar . Mas, nos

dias de Abraão, era - lhe por demais comprometedora a sobrevivência.

Basta se lembrar que foi esse o cast igo imposto por Deus a Caim (Gn

4,11-14) e, o mesmo Abraão sent iu-se obrigado a pedi r que sua mulher

Sara dissesse ser sua i rmã por causa do perigo de ser morto para dela

se apropriarem (Gn 12,10 -13; 20,1-7) . Da mesma forma, não reteve os

despojos advindos da sua vi tó ria l ibertando Lot e os Reis r eduzidos à

escravidão (Gn 14,21 -24). Se bem que, além da prudência, havia ta m-

bém a sua consagração a Deus (Gn 14,22-23 / 2Rs 5,16) e não perten-

cendo a um clã que lhe servisse de suporte, adorando um deus desc o-

59

nhecido e impotente em face do mundo de então, temeu. O própri o

Deus vem em seu socorro , ocasião em que Abraão exala a sua ansied a-

de mais ínt ima: fal tava -lhe um fi lho, um herdeiro (Gn 15,1-6) a quem

pudesse deixar os despojos como herança. Sua consagração a Deus o

s i tuava em confl i to com o mundo de então.

Quando o narrador s i tua essa manifes tação de Iahweh “ depois

desses acontecimen tos . . .” a es tá s i tuando após todos os fatos narrados

desde a conversão de Abraão, que modi ficara e dif icul tara por demais

a sua v ida. Não tendo f i lho te r ia que se contentar com um herdeiro que

não era de sua descendência como exigia a cul tura do tempo. De t udo

isso e da entrega incondicional adveio-lhe o temor seguido do co nsolo,

que o próprio Deus lhe t raz com o “não temas”. Essa expressão apar e-

ce também tanto na Anunciação de João Bat is ta (a Zacarias) c omo na

Anunciação de Jesus Cris to (a Maria):

“ N ã o t e m a s , A b r ã o ! E u s o u o

t e u e s c u d o , t u a r e c o m p e n s a s e -r á m u i t o g r a n d e ” ( G n 1 5 , 1 ) .

“ N ã o t e m a s , Z a c a r i a s , p o r q u e a t u a

s ú p l i c a f o i o u v i d a . . . ” ( Lc 1 , 1 3 ) .

“ N ã o t e m a s , M a r i a ! E n c o n -

t r a s t e G r a ç a j u n t o d e D e u s . . . ” ( Lc 1 , 3 0 ) .

Agora também ao Povo de Is rael , al i no Monte Sinai , Moisés lhe

dir ige o "não temas" vocacional (Ex 20,20) , esclarecendo-se assim o

motivo do temor então reinante em face da real e impressionan te teo-

fania (Ex 19,16-21) , sem que ocorresse uma debandada geral . É que

não foi um temor ocasionado pelos mesmos motivos de um medo i rr a-

cional que tudo submete ao inst into de conservação e provoca o dese s-

pero, o pânico e a fuga. Era s im, aquele temor rever encial em face do

sagrado acontecimento e da seriedade do compromisso para o que f o-

ram todos os Fi lhos de Is rael conscient izados, preparados e conduz i-

dos, tal como nos casos dos demais ele i tos . Era o remate f inal de uma

longa e di f íci l t rajetória marcada a inda pela responsabi l idade de outra

tão espinhosa como a primeira missão que se iniciava. Moisés é elei to

o interlocutor oficial dos israel i tas junto de Deus, iniciando -se como

profeta (Dt 18,16-17):

" E d i s s e r a m a M o i s é s : F a l a - n o s t u m e s m o , e o u v i r e m o s ; m a s n ã o f a l e D e u s c o -n o s c o , p a r a q u e n ã o m o r r a m o s " ( E x 2 0 , 1 9 ) .

Deus os atende e passa a se dir igir a Moisés: - "Assim dirás aos

Fi lhos de Israel (Ex 20,22) ( . . . ) Eis as leis que lhes proporás . . ." (Ex

21,1) - Moisés em nome de Deus, de acordo com o pedido d eles , passa

a descrever alguns procedimentos costumeiros f i rmando -os, como

normas de comportamento. Com elas regulamenta oficialmente o rel a-

cionamento geral , enriquecendo-as a part i r de sua experiência como

"juiz" (Ex 18,13-16) . A principal f inal idade é a de manter a paz comu-

ni tár ia , fruto da comunhão com Deus que se es tabeleceria pelos sacr i -

f ícios oferecidos e pela obediência aos precei tos del ineados. É de se

destacar a inst i tuição oficial de uma pena, mencionada desde Caim

(Gn 4,14) e Lamec (Gn 4,14), esp écie de vingança legal que se resume

em " tal dano tal punição", donde o nome de tal - ião :

" M a s s e r e s u l t a r d a n o g r a v e , e n t ã o d a r á s v i d a p o r v i d a , o l h o p o r o l h o , d e n t e p o r

d e n t e , m ã o p o r m ã o , p é p o r p é , q u e i m a d u r a p o r q u e i m a d u r a , f e r i d a p o r f e r i d a , g o l p e p o r g o l p e " ( E x 2 1 , 2 3 - 2 5 ) .

60

Jesus vai revogar isso ao estabelecer:

" O u v i s t e s q u e f o i d i t o : O l h o p o r o l h o , e d e n t e p o r d e n t e . E u , p o r é m , v o s d i g o q u e n ã o r e s i s t a i s a o h o m e m m a u ; m a s , a q u a l q u e r q u e t e b a t e r n a f a c e d i r e i t a ,

o f e r e c e - l h e t a m b é m a o u t r a ; e a o q u e q u i s e r p l e i t e a r c o n t i g o , e t i r a r - t e a t ú n i c a ,

l a r g a - l h e t a m b é m a c a p a ; e , s e q u a l q u e r t e o b r i g a r a c a m i n h a r m i l p a s s o s , v a i c o m e l e d o i s m i l " ( M t 5 , 3 8 - 4 1 ) .

Os demais precei tos se agrupam em ordenações acerca dos e s-

cravos (Ex 21,1 -11) , leis contra os homicídios e lesões corporais (Ex

21,12-32), contra os danos à propriedade privada (Ex 21,33 -22,5) , re-

gulando o crédi to e o emprést imo (Ex 22,6 -14), quanto à violação de

uma virgem (Ex 22,15 -16), deveres para com os inimigos e es t range i-

ros (Ex 23,1-9) e as leis morais e rel igiosas (Ex 22,17 -30 / 23,10-33).

Uma simples lei tura será suficiente para se dimensionar a forma rud i-

mentar dos costumes de então , principalmente no campo que atualme n-

te se diz dos direi tos civi l e penal . O que não se deve fazer é anal i sar

tais disposi t ivos confrontando -os com as conquis tas modernas e def i -

nições ideológicas ou até mesmo rel igiosas atuais , mas s i tuá -los no

seu devido tempo e procurar compreender a cul tura de então para me-

lhor penetrar nos meandros do desígnio de Deus al i se debatendo para

se deixar conhecer enquanto conduz a História.

Assim vão se destacar as leis morais e rel igiosas como arremate

f inal iniciando com a condenação da fei t iceira, a morte do que prat icar

ato sexual com um animal , o anátema para quem sacri f ic ar a outros

deuses , o modo de se comportar com os est rangeiros , a viúva ou órfão

e principalmente com o próximo, que naquele tempo era outro Israel i ta

(Ex 22,17-27). Quase ao f inal dessa minuciosa exposição legal ap arece

uma frase aqui colocada como demons tração da f inal idade de t udo:

" S e r e i s p a r a m i m h o m e n s s a n t o s " ( E x 2 2 , 3 0 ) .

Há uma relação legal entre o comportamento e a sant idade que é

modo do Homem se posicionar tal como " no princípio", - "imagem e

semelhança de Deus ". Vai prosseguir ass im na casuís t ica moral até de-

saguar após os sábados (passa a se mencionar o Ano Sabát ico junto

com o dia do Sábado) nas fes tas rel igiosas de ordem públ ica , obrigan-

do os homens ao comparecimento diante de Iahweh Deus. Mas não se

menciona a Páscoa que era uma festa mais ínt ima e famil iar (Ex 23,13 -

19), não tendo s ido comemorada durante a peregrinação em busca da

Terra Prometida. Tudo se encaminha para um desfecho em que t ran s-

parece a missão de Israel junto aos povos que seriam derrotados na

conquis ta a que se dest inam:

" P o r q u e o m e u a n j o i r á a d i a n t e d e t i , e t e i n t r o d u z i r á n a t e r r a d o s . . . ( “ n o m e i -

a m - s e s e t e p o v o s " ) . . . e e u o s a n i q u i l a r e i . N ã o t e i n c l i n a r á s d i a n t e d o s s e u s d e u -

s e s , n e m o s s e r v i r á s , n e m f a r á s c o n f o r m e a s s u a s o b r a s ; a n t e s o s d e r r u b a r á s t o -t a l m e n t e , e q u e b r a r á s d e t o d o a s s u a s c o l u n a s . S e r v i r e i s , p o i s , a Ia h w e h v o s s o

D e u s , e e l e a b e n ç o a r á o v o s s o p ã o e a v o s s a á g u a ; e e u t i r a r e i d o m e i o d e v ó s a s

e n f e r m i d a d e s . ( . . . ) N ã o h a b i t a r ã o n a t u a t e r r a , p a r a q u e n ã o t e f a ç a m p e c a r c o n -t r a m i m ; p o i s s e s e r v i r e s o s s e u s d e u s e s , c e r t a m e n t e i s s o t e s e r á u m a a r m a d i l h a "

( E x 2 3 , 2 0 - 3 3 ) .

61

"Não te incl inarás d iante dos seus deuses , nem os servirás , nem

farás conforme as suas obras; antes os derrubarás totalmente, e qu e-

brarás de todo as suas colunas. . . ": Eis aqui a principal missão de Isra-

el , que é a er radicação do cul to a outros deuses destruindo -os comple-

tamente bem como testemunhando a f idel idade a Iahweh a quem "se r-

vireis , pois a Iahweh vosso Deus e ele abençoará o vosso pão e a vossa

água; e eu t i rarei do meio de vós as enfermi dades". Tudo isso bem d e-

finido, Moisés se encaminha para a rat i f icação da Aliança com o Povo

dos Fi lhos de Israel a quem apresenta as condições di tadas por Deus:

“ V e i o , p o i s , M o i s é s e r e l a t o u a o p o v o t o d a s a s p a l a v r a s d e Ia h w e h e t o d o s o s e s t a t u t o s ; e n t ã o t o d o o p o v o r e s p o n d e u a u m a v o z : F a r e m o s t u d o o q u e I a h w e h

d i s s e ” ( E x 2 4 , 3 ) ” .

Após a apresentação de todo o Código da Aliança , em adendo ao

Decálogo e à adesão incondicional do Povo dos Fi lhos de Israel , o

compromisso mútuo é selado com o sangue de um s acri f ício :

" E n t ã o M o i s é s e s c r e v e u t o d a s a s p a l a v r a s d e Ia h w e h e , t e n d o - s e l e v a n t a d o d e m a n h ã c e d o , e d i f i c o u u m a l t a r a o p é d o m o n t e , e d o z e c o l u n a s , s e g u n d o a s d o z e

t r i b o s d e I s r a e l , e e n v i o u c e r t o s j o v e n s d o s f i l h o s d e I s r a e l , o s q u a i s o f e r e c e r a m

h o l o c a u s t o s , e i m o l a r a m b o i s a Ia h w e h e m s a c r i f í c i o s p a c í f i c o s . E M o i s é s t o m o u a m e t a d e d o s a n g u e , e a p ô s e m b a c i a s ; e a o u t r a m e t a d e d o s a n g u e e s p a r g i u s o -

b r e o a l t a r . T a m b é m t o m o u o L i v r o d a A l i a n ç a e o l e u p e r a n t e o p o v o ; e o p o v o

d i s s e : T u d o o q u e I a h w e h d i s s e n ó s f a r e m o s , e o b e d e c e r e m o s . E n t ã o t o m o u M o i -s é s a q u e l e s a n g u e , e e s p a r g i u - o s o b r e o p o v o e d i s s e : E i s a q u i o S a n g u e d a A l i -

a n ç a q u e Ia h w e h f e z c o n v o s c o a t r a v é s d e t o d a s e s t a s c l á u s u l a s ( . . . ) . . . d e p o i s

c o m e r a m e b e b e r a m " ( E x 2 4 , 4 - 8 . 1 1 c ) .

Aquela Aliança inic iada com Abraão é agora rat i f icada com os

seus descendentes com aspersão de sangue num sacri f ício com os F i-

lhos de Israel (ou Jacó), cumprindo -se a Promessa, e cont inuando a

busca do mesmo des ígnio de Deus em es tabelecer com o Homem a c o-

munhão de vidas do Jardim do Éden:

" E u f a r e i d e t i u m g r a n d e p o v o , a b e n ç o a r - t e - e i , e e n g r a n d e c e r e i o t e u n o m e ; e

t u , s ê u m a b ê n ç ã o " ( G n 1 2 , 2 ) / " . . . n ã o m a i s s e r á s c h a m a d o A b r ã o , m a s A b r a ã o

s e r á o t e u n o m e ; p o i s t e f a ç o p a i d e m u i t a s n a ç õ e s ; f a r - t e - e i f r u t i f i c a r e x t r a o r -d i n a r i a m e n t e , e d e t i f a r e i n a ç õ e s , e r e i s s a i r ã o d e t i ; e s t a b e l e c e r e i a m i n h a A l i -

a n ç a c o n t i g o e c o m a t u a d e s c e n d ê n c i a d e p o i s d e t i e m s u a s g e r a ç õ e s , c o m o A l i -

a n ç a p e r p é t u a , p a r a s e r o t e u D e u s e d e t u a d e s c e n d ê n c i a d e p o i s d e t i . D a r - t e - e i a t i e à t u a d e s c e n d ê n c i a d e p o i s d e t i a t e r r a d e t u a s p e r e g r i n a ç õ e s , t o d a a t e r r a

d e C a n a ã , e m p e r p é t u a p o s s e s s ã o ; e s e r e i o s e u D e u s " ( G n 1 7 , 5 - 8 ) .

É essa Aliança que se consumará defini t ivamente com Jesus

Cris to (1 Cor 11,25).

O CULTO A IAHWEH

2.11. - FUNDAMENTOS GERAIS

O Povo dos Fi lhos de Is rael foi qual i f icado pelo próprio Deus de

"meu f i lho primogêni to" (Ex 4,22). As caracterís t icas e implicações

pertencentes ao Ins t i tuto da Primogeni tura de "primícia" e "sacerdó-

62

cio" já se t raduzia e lhe conferia a responsabi l ida de por uma missão

específ ica que , pouco a pouco se amplia e se esclarece:

" A s s i m f a l a o I a h w e h : I s r a e l é m e u f i l h o , m e u p r i m o g ê n i t o " ( E x 4 , 2 2 ) / " A g o r a , p o i s , s e o u v i r d e s a m i n h a v o z e g u a r d a r d e s a m i n h a A l i a n ç a , s e -

r e i s a m i n h a p r o p r i e d a d e p e c u l i a r e n t r e t o d o s o s p o v o s , p o r q u e m i n h a é

t o d a a t e r r a ; e v ó s s e r e i s p a r a m i m u m r e i n o d e s a c e r d o t e s e u m a n a ç ã o s a n t a . . . " ( E x 1 9 , 5 - 6 ) / " Q u a n d o o a n j o m a r c h a r n a t u a f r e n t e e t e i n t r o -

d u z i r n a t e r r a d o s ( . . . “ v á r i o s ” p o v o s . . . ) , e e u o s e x t e r m i n a r , n ã o a d o r a -

r á s o s s e u s d e u s e s , n e m l h es p r e s t a r á s c u l t o , i m i t a n d o s e u s c o s t u m e s . A o c o n t r á r i o d e r r u b a r á s e q u eb r a r á s a s s u a s c o l u n a s . S e r v i r e i s a Ia h w e h

v o s s o D e u s , e e l e a b e n ç o a r á t e u p ã o e t u a á g u a , e a f a s t a r á d o t e u m e i o

a s e n f e r m i d a d e s . ( . . . ) N ã o f a r á s a l i a n ç a c o m e l e s n e m c o m s e u s d e u s e s . . . . t e f a r i a m p e c a r c o n t r a m i m : S e r v i r i a s a o s s e u s d e u s e s , e i s s o s e r i a

u m a a r m a d i lh a p a r a t i ” ( E x 2 3 , 2 3 - 3 3 ) .

" . . . vós sereis para mim um reino de sacerdotes e uma nação sa n-

ta" conjuga-se com ". . . não adorarás os seus deuses , nem lhes p restarás

cul to , imitando seus costumes; ao contrário derrubarás e quebrarás as

suas colunas; servireis a Iahweh vosso Deus. . ." - com tais fundamentos

lhes é f ixada a Missão da Difusão do Nome de Iahweh com a excl usão

e el iminação de quaisquer outros . Assim , tal como desde Abraão, para

a adoração de Iahweh é indispensável o Altar de Sacri f ício para a pr ó-

pria Sant i f icação pela Comunhão com Iahweh, pelo “Pão de Deus” e n-

tão oferecido e dele part icipando. Ass im, fazendo do Culto o Centro

Gravi tacional da Al iança contraída que se consumou no Monte Sinai e

se corpori f ica no Povo de Iahweh, rat i f ica -se e recorda-se tanto a Mis-

são como a f idel idade absoluta e exclus iva:

" D o n o m e d e o u t r o s d e u s e s n e m f a r e i s m e n ç ã o , n e m s e o u ç a d a v o s s a b o c a " ( E x 2 3 , 1 3 ) / " . . . s e o u v i r d e s a m i n h a v o z e g u a r d a r d e s a m i n h a A l i a n ç a , s e r e i s a m i -

n h a p r o p r i e d a d e p e c u l i a r en t r e t o d o s o s p o v o s , p o r q u e m i n h a é t o d a a t e r r a ; e

v ó s s e r e i s p a r a m i m u m r e i n o d e s a c e r d o t e s e u m a n a ç ã o s a n t a . . . " ( E x 1 9 , 5 - 6 ) .

Já não se t rata de um relacionamento ind ividual ou de uma t r ibo

num regime patr iarcal , mas de est rutura mais ampla como a de um p o-

vo, o Povo de Israe l , "separado" dentre outros povos que também são

de Iahweh ("porque minha é toda a terra") . Por isso, dadas as novas

dimensões e ex igências colet ivas es tabelecem-se normas para o cul to

principal da Aliança de Iahweh com o Seu Povo. Descrevem -se inic i -

almente as ex igências básicas para a construção de um Altar de Sacr i -

f ícios prosseguindo-se a mesma t radição de Centro Gravi tacional do

Cul to, agora de um Povo, o Povo dos Fi lhos de Israel , o Povo de Ia h-

weh:

" . . . n ã o m e c o l o q u e i s e n t r e o s d e u s e s d e o u r o o u d e p r a t a , d e u s e s q u e n ã o d e v e -

r e i s f a b r i c a r p a r a v ó s . D e v e r á s f a z e r p a r a m i m u m a l t a r d e t e r r a , s o b r e o q u a l m e o f e r e c e r á s o s h o l o c a u s t o s , o s s a c r i f í c i o s p a c í f i c o s , a s o v e l h a s e o s b o i s . E m

q u a l q u e r l u g a r e m q u e f i z e r r e c o r d a r o m e u n o m e , v i r e i a t i e t e a b e n ç o a r e i . S e

m e c o n s t r u í r e s u m a l t a r d e p e d r a , n ã o o f a ç a s d e p e d r a s l a v r a d a s , p o r q u e a o m a n e j a r o c i n z e l c o n t r a a p e d r a , t u a p r o f a n a r i a s . . . " ( E x 2 0 , 2 1 - 2 6 ) .

" . . . não me coloqueis entre os deuses de ouro ou de prata, deuses

que não devereis fabricar para vós " - é como se Deus dissesse: “não

me incluam entre outros deuses como num panteão, eu sou “o Único

Deus para vocês”; e também para o Cu l to “Deverás fazer para mim um

al tar de terra. . .” ( . . . ) “E se me f izeres um al tar de pedras , não o con s -

t ruirás de pedras lavradas. . .” . Tendo s ido descri to quando ainda no d e-

63

serto e logo após o Decálogo e não sendo um Altar Fixo pode-se até

denomina-lo de "al tar de campanha" ou de "al tar peregrino" tal a fo r-

ma rudimentar de sua construção para uso durante a peregrinação que

faz iam até a Terra Prometida. Só poderia ser erguido havendo pr évia

manifestação de Iahweh em forma de "bênção" - algo de "fecundo ou

fért i l" que , acontecendo, deixasse clara a Sua presença no local agindo

em benefício de todo o povo. Moisés , então, em nome de Iahweh (" Es-

tes são os es tatutos que lhes proporás . . . " - Ex 21,1) , apresenta ao P o-

vo al i reunido normas de comportamento em forma de leis de apl icação

quot idiana, oficial izando o que já se prat icava. Como todas elas es tão

desordenadas e às vezes mescladas com outros disposi t ivos é preciso

separá-las para melhor entendimento. Um exemplo expl ica m elhor:

" N ã o d e i x a r á s c o m v i d a u m a f e i t i c e i r a . Q u e m t i v e r r e l a ç õ e s c o m u m a n i m a l , s e -r á p u n i d o d e m o r t e . Q u e m o f e r e c e r s a c r i f í c i o s a o s d e u s e s , e n ã o u n i c a m e n t e a

I a h w e h , s e r á c o n d e n a d o a o e x t e r m í n i o . N ã o m a l t r a t e s o e s t r a n g e i r o n e m o o p r i -

m a s , p o i s v ó s f o s t e s e s t r a n g e i r o s n o E g i t o . J a m a i s o p r i m a s u m a v i ú v a o u u m ó r -f ã o . S e o s o p r i m i r e s , c l a m a r ã o a m i m e e u l h e s o u v i r e i o s c l a m o r e s . M i n h a c ó l e -

r a s e i n f l a m a r á e e u v o s m a t a r e i à e s p a d a . V o s s a s m u l h e r e s s e t o r n a r ã o v i ú v a s ,

e ó r f ã o s o s v o s s o s f i l h o s . S e e m p r e s t a r e s d i n h e i r o a a l g u é m d e m e u p o v o , a u m p o b r e q u e v i v e a o t e u l a d o , n ã o s e j a s u m u s u r á r i o . N ã o l h e d e v e i s c o b r a r j u r o s .

S e t o m a r e s c o m o p e n h o r o m a n t o d o p r ó x i m o , d e v e r á s d e v o l v ê - l o a n t e s d o p ô r -

d o - s o l . P o i s é a ú n i c a v e s t e p a r a o c o r p o , e c o b e r t a q u e e l e t e m p a r a d o r m i r . S e e l e r e c o r r e r a m i m , e u o o u v i r e i , p o r q u e s o u m i s e r i c o r d i o s o . N ã o b l a s f e m a r á s

c o n t r a D e u s , n e m i n j u r i a r á s o p r í n c i p e d o p o v o . N ã o a t r a s a r á s a o f e r t a d e t u a

c o l h e i t a e d o t e u l a g a r . D e v e r á s d a r - m e o p r i m o g ê n i t o d e t e u s f i l h o s " ( E x 2 2 , 1 9 - 2 8 ) .

Neste pequeno t recho que se escolheu para o exemplo, faci lmen-

te destacam-se os seguintes vers ículos que se referem estr i tamente ao

relacionamento com Deus e ao cul to, sendo os demais de cunho m oral ,

referindo-se ao comportamento individual , inseparáveis para o Israel i -

ta:

" N ã o d e i x a r á s c o m v i d a u m a f e i t i c e i r a . ( . . . ) Q u e m o f e r e c e r s a c r i f í c i o s a o s

d e u s e s , e n ã o u n i c a m e n t e a Ia h w e h , s e r á c o n d e n a d o a o e x t e r m í n i o . ( . . . ) N ã o b l a s f e m a r á s c o n t r a D e u s , n e m i n j u r i a r á s o p r í n c i p e d o p o v o . N ã o a t r a s a r á s a

o f e r t a d e t u a c o l h e i t a e d o t e u l a g a r . D e v e r á s d a r - m e o p r i m o g ê n i t o d e t e u s

f i l h o s " ( E x 2 2 , 1 9 - 2 8 ) .

Da mesma forma são inseridas aqui t ambém normas para o

cul to , tais como a consagração dos "primogêni tos dos f i lhos" para o

sacerdócio, a oferenda dos "das vacas e das ovelhas" (v . tb . Ex

13,12) e "as primícias dos prim eiros frutos da tua terra t rarás à casa

de Iahweh teu Deus" (Ex 23,19), costume e s is tema que será ofici a-

l izado futuramente para o sacerdócio, destacando -se também as "o-

ferendas" e, dentre elas , o "díz imo":

" N ã o a t r a s a r á s a o f e r t a d e t u a c o l h e i t a e d o t eu l a g a r . D e v e r á s d a r - m e o p r i -

m o g ê n i t o d e t e u s f i l h o s . O m e s m o f a r á s c o m o p r i m o g ê n i t o d a s v a c a s e d a s o v e l h a s : f i c a r á s e t e d i a s c o m a m ã e , e n o o i t a v o t u o e n t r e g a r á s a m i m . S e d e

h o m e n s s a n t o s p a r a m i m . N ã o c o m a i s c a r n e d e a n i m a l d i l a c e r a d o n o c a m p o ,

m a s l a n ç a i a o s c ã e s " ( E x 2 2 , 2 8 - 3 0 ) .

“Sede homens santos para mim” – há uma est rei ta relação entre a

sant idade e o modo de se proceder ou de se comportar . Porém, a base

dessa sant idade não é o procedimento em si correto demais e conforme

as normas mandamentais . É muito mais! Supõe, quando se cumpre os

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mandamentos a vida em profunda int imidade com Deus, numa com u-

nhão de vidas a tal ponto que “em vir tude de se andar na presença de

Iahweh‟, to rna-se di s t into de outros seres humanos e da mesma forma

que Deus é santo por não se confundir com a Criação; da mesma fo r-

ma, os que andam na presen ça de Deus e não se confundem com as

demais cr iaturas são igualmente santos . Assim sendo, todas as normas

foram integradas indestacavelmente na rat i f icação da Aliança (Ex

24,3-8) , destacando-se ainda as fes tas rel igiosas já e ntão constando

como inst i tuídas eis que já do uso costumeiro, porém insis t indo-se na

exclusividade de Iahweh:

" D o n o m e d e o u t r o s d e u s e s n e m f a r e i s m e n ç ã o ; n u n c a s e o u ç a d a v o s s a b o c a . T r ê s v e z e s n o a n o m e c e l e b r a r á s f e s t a : A F e s t a d o s Á z i m o s g u a r d a r á s : d u r a n t e

s e t e d i a s c o m e r á s p ã e s á z i m o s c o m o t e o r d e n e i , a o t e m p o a p o n t a d o n o m ê s d e

A b i b , p o r q u e n e l e s a í s t e d o E g i t o . N i n g u é m a p a r e ç a p e r a n t e m i m d e m ã o s v a z i -a s . G u a r d a r á s a F e s t a d a M e s s e , a d a s P r i m í c i a s d o t e u t r a b a l h o d e s e m e a d u r a n o

c a m p o ; e , i g u a l m e n t e g u a r d a r á s a F e s t a d a C o l h e i t a n o f i m d o a n o , q u a n d o t i v e -

r e s r e c o l h i d o d o c a m p o o s f r u t o s d o t e u t r a b a l h o . T r ê s v e z e s n o a n o t o d o s o s t e u s h o m e n s a p a r e c e r ã o d i a n t e d e Ia h w e h D e u s . N ã o o f e r e c e r á s o s a n g u e d o m e u

s a c r i f í c i o c o m p ã o l e v e d a d o , n e m f i c a r á d a n o i t e p a r a a m a n h ã a g o r d u r a d a m i -

n h a f e s t a . A s p r i m í c i a s d o s p r i m e i r o s f r u t o s d a t u a t e r r a t r a r á s à c a s a d e Ia h w e h t e u D e u s . N ã o c o z e r á s o c a b r i t o n o l e i t e d e s u a m ã e " ( E x 2 3 , 1 3 - 1 9 ) .

Aparecem aqui t rês das fes ta s rel igiosas dos Is rael i tas menci o-

nadas em outras partes (Ex 23,18.22 -23 / Dt 16,16 / Lv 23 / Nm 28 -

29):

(1.º) "A Festa dos Pães Ázimos" (Ex 23,15), cr iada à saída do

Egi to juntamente com a Inst i tuição da Páscoa ( 'Páscoa ': - Ex 12,1-13 =

/ 'Ázimos ': = 's em fermento ' - Ex 12,14-20; 13,3-10) e durava uma se-

mana, celebrando-se a part i r do dia da Páscoa e durante a qual só se

comia “Pães Ázimos ou Sem Fermento ”:

" . . . Q u a n d o Ia h w e h t e h o u v e r i n t r o d u z i d o n a t e r r a ( . . . ) q u e e l e j u r o u a t e u s p a i s

q u e t e d a r i a , t e r r a q u e m a n a l e i t e e m e l , g u a r d a r á s e s t e c u l t o n e s t e m ê s . S e t e d i -a s c o m e r á s p ã e s á z i m o s , e a o s é t i m o d i a h a v e r á u m a f e s t a a Ia h w e h . S e t e d i a s s e

c o m e r ã o p ã e s á z i m o s . . . " ( E x 1 3 , 3 - 1 2 ) .

(2.º) "Guardarás a Festa da Messe ou De Pentecostes ou da

Colheita, e a das Primícias do teu trabalho de semeadura no ca m-

po . . .” (Ex 23,16) - Essa festa agora oficial izada (cfr . tb . Ex 34,22) s e-

rá regulamentada mais tarde quando já na Terra Prometida (Lv 23,15 -

22). O seu nome advém do espaço de "sete semanas" ou " cinquenta di-

as" ("Pentecostes ", em grego) , contados do início da colhei ta até o dia

da festa. Para os cr is tãos es ta fes ta marcará o início das at ividades

missionárias da Igreja com o " Batismo dos Apóstolos" (At 1 ,5) na

"Vinda do Espíri to Santo" :

" C h e g a n d o o D i a d e P e n t e c o s t e s , e s t a v a m t o d o s r e u n i d o s n o m e s m o l u g a r . D e

r e p e n t e v e i o d o c é u u m r u í d o , c o m o d e u m v e n t o i m p e t u o s o , q u e e n c h e u t o d a a

c a s a e m q u e e s t a v a m s e n t a d o s . E v i r a m , e n t ã o , u m a e s p é c i e d e l í n g u a s d e f o g o , q u e s e r e p a r t i r a m e f o r a m p o u s a r s o b r e c a d a u m d e l e s . F i c a r a m t o d o s c h e i o s d o

E s p í r i t o S a n t o e c o m e ç a r a m a f a l a r e m o u t r a s l í n g u a s , c o n f o r m e o E s p í r i t o S a n -

t o l h e s c o n c e d i a " ( A t 2 , 1 - 4 ) .

(3.º) "Guardarás a Festa da Colheita (Festa dos Tabernáculos

Ex 23,16) no f im do ano, quando t iveres recolhido do campo os frutos

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do teu t rabalho" (Lv 23,33 -44). Essa festa também ficará para sempre

l igada à História Cr is tã , durante a qual ocorreu aqui lo que se comem o-

ra como a Entrada Triunfal de Jesus em Jerusalém no Domingo de R a-

mos, desenvolvido e esclarecido por São Joã o:

" D e p o i s d i s s o , J e s u s a n d a v a p e l a G a l i l é i a . N ã o q u e r i a a n d a r p e l a J u d é i a p o r q u e o s j u d e u s d a l i o q u e r i a m m a t a r . E s t a v a p e r t o a f e s t a d o s j u d e u s , c h a m a d a d a s

T e n d a s ( . . . ) . N o ú l t i m o d i a , o m a i s i m p o r t a n t e d a f e s t a , J e s u s f a l o u d e p é e e m

v o z a l t a : ” S e a l g u é m t i v e r s e d e v e n h a a m i m e b e b a . Q u e m c r ê e m m i m , c o m o d i z a E s c r i t u r a , d o s e u i n t e r i o r c o r r e r ã o r i o s d e á g u a v i v a ” . R e f e r i a - s e a o E s p í -

r i t o q u e h a v i a m d e r e c e b e r a q u e l e s q u e c r e s s e m n e l e . D e f a t o , a i n d a n ã o t i n h a

s i d o d a d o o E s p í r i t o , p o i s J e s u s a i n d a n ã o t i n h a s i d o g l o r i f i c a d o " ( J o 7 , 1 - 3 9 ) / " . . . E u s o u a l u z d o m u n d o . Q u e m m e s e g u e n ã o a n d a r á n a s t r e v a s , m a s t e r á a l u z

d a v i d a " ( J o 8 , 1 2 ) .

Nessa festa os israe l i tas habi tavam durante sete dias em tendas

ou cabanas, daí seu nome (Festa das Tendas ou Festa das Cabanas) pa-

ra comemorar o tempo de peregrin ação no deserto:

" N o p r i m e i r o d i a ( “ d o m i n g o ” ) t o m a r e i s f o l h a g e m d e á r v o r e s o r n a m e n t a i s , r a m o s d e p a l m e i r a s , g a l h o s d e á r v o r e s f r o n d o s a s , d e s a l g u e i r o s d a t o r r e n t e , e v o s a l e -

g r a r e i s d u r a n t e s e t e d i a s d i a n t e d o S e n h o r v o s s o D e u s . C e l e b r a r e i s e s t a f e s t a e m

h o n r a d o S e n h o r c a d a a n o d u r a n t e s e t e d i a s . É u m a l e i p e r p é t u a , v á l i d a p a r a v o s s o s d e s c e n d e n t e s . C e l e b r a r e i s a f e s t a n o s é t i m o m ê s . S e t e d i a s m o r a r e i s e m

c a b a n a s . T o d o s q u e f o r e m n a t u r a i s d e I s r a e l m o r a r ã o e m c a b a n a s , p a r a q u e v o s -

s o s d e s c e n d e n t e s s a i b a m q u e e u f i z m o r a r o s i s r a e l i t a s e m c a b a n a s q u a n d o o s t i -r e i d o E g i t o . E u s o u o S e n h o r v o s s o D e u s ” ( Lv 2 3 , 4 0 - 4 3 ) .

Com o tempo e por causa da s imbologia da água e da luz usadas

no cerimonial essa fes ta vai tomar o sent ido messiânico (Ex 17,1 -7 /

Nm 20,2-13; 1Cor 10,4; Zc 14,8; Ez 47,1 -2; Is 9 ,1 -6; 60,19-21) que

Jesus reivindicará ao se comparar com a " água viva que dará e com a

luz do mundo que é " (Jo 7,39 e 8,12). As festas duravam uma semana,

celebradas com o seu memorial e objet ivo e tudo girava em torno de

verdadei ro cul to e sacri f ício (". . . a legrareis -vos durante sete d ias . . ." ) :

" E s t a s s ã o a s s o l e n i d a d e s d e Ia h w e h n a s q u a i s c o n v o c a r e i s a s s e m b l é i a s l i t ú r g i -

c a s p a r a o f e r e c e r a Ia h w e h s a c r i f í c i o s p e l o f o g o , h o l o c a u s t o s e o b l a ç õ e s , v í t i -m a s e l i b a ç õ e s , p r e s c r i t o s p a r a c a d a d i a , a l é m d o s s a c r i f í c i o s a Ia h w e h a o s s á -

b a d o s , d o s d o n s , v o t o s e t o d a s a s o f e r t a s v o l u n t á r i a s q u e a p r e s e n t a r e i s a Ia h w e h

" ( Lv 2 3 , 3 7 - 3 8 ) / " T r ê s v e z e s a o a n o , t o d o s o s t e u s h o m e n s d e v e r ã o a p r e s e n t a r -s e p e r a n t e Ia h w e h t e u D e u s , n o l u g a r q u e e l e t i v e r e s c o l h i d o : n a f e s t a d o s Á z i -

m o s , n a f e s t a d a s S e m a n a s e n a f e s t a d o s T a b e r n á c u l o s . N i n g u é m a p a r e c e r á p e -

r a n t e Ia h w e h d e m ã o s v a z i a s m a s c a d a q u a l f a r á s u a s o f e r t a s c o n f o r m e a s b ê n -ç ã o s q u e Ia h w e h t e u D e u s l h e h o u v e r c o n c e d i d o " ( D t 1 6 , 1 6 - 1 7 ) .

Para todas elas a regra básica era a ex igência de que "ninguém

compareça perante mim de mãos vazias , mas cada qual fará suas ofe r-

tas conforme as bênçãos que Iahweh teu Deus lhe houver concedido"

(Ex 23,15; Dt 16,16 -17) cujas oferendas seriam elevadas à sant i f icação

sacri f ical . Assim, consoante esse disposi t ivo, pode -se compreender a

consagração dos primogêni tos dos animais e das primícias que já se

viu que se dest inavam ao cul to l i túrgico de então. Além disso, apar e-

cem os sábados de anos, novidade legal para o "repouso" da terra, não

mandamental , mas t razendo disposi t ivo de amparo humanitár io “para

que se al imentem os pobres de teu povo”. O Sábado do Decálogo será

para sempre como um Sinal da Aliança, e vai aparecer com essa tônica

principalmente no judaí smo (Ne 13,15-22; 1Mc 2,32-41):

66

" D u r a n t e s e i s a n o s s e m e a r á s a t e r r a e r e c o l h e r á s o s p r o d u t o s . N o s é t i m o a n o , p o r é m , d e i x a r á s d e c o l h e r e d e c u l t i v a r a t e r r a , p a r a q u e s e a l i m e n t e m o s p o b r e s

d e t e u p o v o , e o r e s t o c o m a m o s a n i m a i s d o c a m p o . O m e s m o f a r á s c o m a v i n h a

e o o l i v a l . S e i s d i a s t r a b a l h a r á s , e n o s é t i m o d e s c a n s a r á s , p a r a q u e d e s c a n s e m t a m b é m o b o i e o j u m e n t o , o f i l h o d e t u a e s c r a v a e o e s t r a n g e i r o p o s s a m t o m a r

f ô l e g o . G u a r d a i t u d o o q u e v o s d i s s e : N ã o i n v o c a r e i s o n o m e d e o u t r o s d e u s e s ;

q u e o s e u n o m e n ã o s e o u ç a e m t u a b o c a " ( E x 2 3 , 1 0 - 1 3 ) .

Após a rat i f icação da Aliança e de todas essas admoestações de

ordem rel igiosa mescladas com outras , es t rutura-se especi f icamente o

cul to , com os seus ornamentos e aparatos indispensáveis . Era preciso

al i mesmo e ainda no deserto buscar regulamentar todo o cerimonial

com a mesma pompa com que eram ornados os r i tuais dos deuses egí p-

cios de cuja lembrança o povo ainda re t inha na memória. Não que se

copiasse ou plagiasse o cul to pagão, mas aqui lo que lá se usava nos

cul tos era cul turalmente necessário e comum a todos os povos. Apesar

das variações natura is e pecul iares de cada povo havia muita coisa em

comum, fruto de uma mesma cul tura his t órica.

2.12. - O SANTUÁRIO - PLANEJAMENTO GERAL

Moisés vai para o Monte Sinai em ret i ro e contemplação onde f i -

ca "quarenta dias e quarenta noi tes ", duração de ordem bíbl ica para

s ignif icar tempo necessário e completo para o preparo de uma missão:

M o i s é s s u b i u a o m o n t e e a n u v e m c o b r i u o m o n t e . A g l ó " r i a d e Ia h w e h p o u s o u

s o b r e o m o n t e S i n a i , e a n u v e m o c o b r i u d u r a n t e s e i s d i a s . N o s é t i m o d i a c h a -

m o u M o i s é s d o m e i o d a n u v e m . A g l ó r i a d e Ia h w e h a p a r e c i a a o s i s r a e l i t a s c o m o u m f o g o d e v o r a d o r s o b r e o c u m e d o m o n t e . M o i s é s , p o r é m , p e n e t r o u d e n t r o d a

n u v e m , e n q u a n t o s u b i a a m o n t a n h a , e p e r m a n e c e u a l i q u a r e n t a d i a s e q u a r e n t a

n o i t e s " ( E x 2 4 , 1 5 - 1 8 ) .

Findo esse tempo passará Moisés a reivindicar oferendas volu n-

tárias (Ex 37,5 -29) e independentes daquelas já pert inentes e advindas

das consagrações menc ionadas anteriormente, agora dest inadas à o r-

namentação e adorno do cul to oficial a Iahweh, apresentando o narr a-

dor primeiro uma descrição do projeto objet ivamente del ineado:

" Ia h w e h f a l o u a M o i s é s : “ D i z e a o s i s r a e l i t a s q u e a j u n t e m o f e r t a s p a r a m i m . R e -

c e b e r e i s a o f e r t a d e t o d o s o s q u e d e r e m e s p o n t a n e a m e n t e . E s t a s s ã o a s o f e r t a s q u e r e c e b e r e i s : o u r o , p r a t a , b r o n z e , t e c i d o s d e p ú r p u r a v i o l á c e a , v e r m e l h a e

c a r m e s i m , l i n h o f i n o e c r i n a s d e c a b r a , p e l e s d e c a r n e i r o t i n t a s d e v e r m e l h o e

p e l e s d e g o l f i n h o , m a d e i r a d e a c á c i a , a z e i t e d e l â m p a d a , b á l s a m o p a r a o ó l e o d e u n ç ã o e p a r a o i n c e n s o a r o m á t i c o , p e d r a s d e ô n i x e o u t r a s p e d r a s d e e n g a s t e p a -

r a o e f o d e o p e i t o r a l . E l e s m e f a r ã o u m s a n t u á r i o , e e u h a b i t a r e i n o m e i o d e l e s .

F a r e i s t u d o c o n f o r m e o m o d e l o d a h a b i t a ç ã o e s e u s u t e n s í l i o s q u e v o u t e m o s -t r a r " ( E x 2 5 , 1 - 9 ) .

"Eles me farão um Santuário. . ." - com a real ização desse objet i -

vo rat i f ica-se toda a Aliança nos mesmos fundamentos dos Patr iarcas

para a comunhão de vidas pelo fato de Iahweh "habi tar no meio d eles".

Então o ato de Abraão, Isaac e Jacó , edif icando sempre um al tar para o

cul to (Gn 12,6 -9; 13,3; 26,25; 28,10 -22; 35,1-15) há de ser também o

objet ivo principal da at ividade israel i ta que se inicia. Enquanto em p e-

regrinação haverá o "al tar peregrino" (Ex 20,2 4-25) ou até mesmo o

"al tar portát i l " (Ex 25 -26; 27,1-8) , em torno do qual s erão reunidos em

67

comunhão de vidas pelo sacri f ício, Deus e os Fi lh os de Israel ou tam-

bém comparecendo em sua prese nça para consul tas pessoais (Ex 29,42s

/ 33,7) . Em verdadeira co ntemplação ["Fareis tudo conforme o modelo

de habi tação e todos os seus utensí l ios que te mostrarei" (Ex 25,9)] ,

Moisés , em Nome de Deus e por Ele ass is t ido planejou toda a comp o-

sição material do cul to com base nos costumes já em prát ica até me s-

mo no Egi to (Ex 5,3-9; 8 ,21-24; 10,24 -26), regulamentando-o objet i -

vamente nos mínimos detalhes , para apresentar todo o planejamento

aos Fi lhos de Israe l e para cuja real ização concorreriam voluntari a-

mente. Já se prefigurava e se anunciava a cont inuidade daquele desí g-

nio de Deus de reconduzir o Homem para a vida part i lhada e ínt ima do

Jardim do Éden.

É preciso aqui notar que Moisés es tá a inda no seu ret i ro e co n-

templação no Monte Sinai e regis t ra a descrição do que viu (Ex 25 -

31), para a construção futura (Ex 35 -40). Em geral , os móveis e uten-

sí l ios seriam ou fei tos ou recobertos ou forrados ou tecidos ou bord a-

dos com ouro puro e ornados com pedras preciosas (Ex 25,1 -9) . Isso

por causa da sant i f icação que a presença de Deus lhes impr ime princ i-

palmente na Arca, no Propici atório (Ex 25,10-22) e no Altar de Incen-

so (Ex 37,25-28). Na Arca é s ignif icada a presença de Iahweh pela c o-

locação nela das " tábuas de pedra contendo o Decálogo " (Ex

25,16.21), dos "dois querubins", onde Deus pousava (Ex 25,18 -20 / Ex

25,17-21), dos Pães da Proposição e do Incenso para o Dia da Expi a-

ção. Is to porque para o oriental e , até mesmo, para o israe l i ta a pal a-

vra é inseparável da pessoa que a pronuncia com todos os seus at r ib u-

tos donde o Decálogo (Dez Palavras "de Deus" ) , escri to pelo próprio

Deus em " tábuas de pedra ", ser o s inal da presença da Sant idade de

Deus no Santuário ou Habi tação a ser construído. Daí , pela Sant idade

presente, compreende-se também o motivo da "f ixação dos varais às

argolas nos pés (ou cantos)" para o t ransporte (Ex 25,15), evi tando-se

que tocassem o solo assim como o contato manual . Mesmo nos varais

não tocava pessoa profana, alheia ao sacerdócio, função reservada aos

levi tas (Nm 8,5 -25). Moisés regis t ra todas as medidas , a disposição e a

forma da confecção dos utensí l ios e apetrechos : a Arca que receberá o

nome de Arca da Aliança (Ex 25,10 -16), o Propiciatório (Ex 25,11 -

22), a Mesa dos Pães da Propiciação ou Apresentação (Ex 25,23 -30 /

Lv 24,5-9; 1Sm 21,5) e o Candelabro com seu óleo ou azei te (Ex

25,31-39 / 27,20-21). Foi com respei to a esses Pães da Propiciação

que Jesus ret rucou a acusação dos far i seus de que os disc ípulos de s-

respei tavam o sábado comendo as espigas (Mt 12,1 -4) , lembrando-lhes

que Davi as comera quando teve fome, mesmo " sendo reservado aos

sacerdotes" (1Sm 21,5) .

A seguir vem a menção do "tabernáculo" , que será também co-

nhecido por "tenda da reunião" (Ex 29,42 -43 / 33,7) ou ainda "habi t a-

ção". Era um volume retangular todo coberto com tábuas e séries de

cort inas l igadas e t rançadas umas às outras e dividido interiormente

em duas partes por uma cort ina ou véu. Denominou -se de Sant íss imo

ou Santo dos Santos à parte antes do véu onde f icaria a Arca e o Pr o-

piciatório com os Querubins e de Santo o local , após o véu, onde ser i -

am colocados os demais utensí l ios menc ionados e o "al tar de incenso

68

ou de perfumes" (Ex 30,1 -10 / 37,25-28). Foi defronte a um al tar de

incenso que o Anjo apareceu a Zacarias , quando anunciou o nascimen-

to de João Bat is ta (Lc 1,11). E, o véu é aquele que se "rasgou no m o-

mento da Morte de Cris to " (Mt 27,51; Mc 15,38; Lc 23,45) constr uído

no Templo de Jerusalém tal como o que fora planejado no "Tabernác u-

lo da Peregrinação":

" F a r á s t a m b é m u m v é u d e p ú r p u r a v i o l á c e a , v e r m e l h a e c a r m e s i m e d e l i n h o f i -n o t o r c i d o , b o r d a d o d e q u e r u b i n s . S u s p e n d e r á s o v é u e m q u a t r o c o l u n a s d e m a -

d e i r a d e a c á c i a r e c o b e r t a s d e o u r o , p r o v i d a s d e g a n c h o s d e o u r o , e a p o i a d a s em

q u a t r o b a s e s d e p r a t a . P e n d u r a r á s o v é u d e b a i x o d o s c o l c h e t e s , e a l i , p o r t r á s d o v é u , i n t r o d u z i r á s a a r c a d a a l i a n ç a . O v é u s e r v i r á p a r a s e p a r a r o l u g a r S a n t o d o

S a n t í s s i m o . S o b r e a a r c a d a a l i a n ç a p o r á s o p r o p i c i a t ó r i o , n o l u g a r S a n t í s s i m o .

D o l a d o d e f o r a d o v é u c o l o c a r á s a m e s a e d i a n t e d e l a o c a n d e l a b r o . E s t e f i c a r á d o l a d o s u l d a m o r a d a , e a m e s a p o r á s a o n o r t e . P a r a a e n t r a d a d a t en d a f a r á s

u m a c o r t i n a d e p ú r p u r a v i o l á c e a , v e r m e l h a e c a r m e s i m e d e l i n h o f i n o t o r c i d o ,

a r t i s t i c a m e n t e b o r d a d a . P a r a a c o r t i n a f a r á s c i n c o c o l u n a s d e m a d e i r a d e a c á c i a , r e v e s t i d a s d e o u r o e c o m g a n c h o s d e o u r o , e f u n d i r á s p a r a e l a s c i n c o b a s e s d e

b r o n z e " ( E x 2 6 , 3 1 - 3 7 ) / " N o m e s m o i n s t a n t e a c o r t i n a d o S a n t u á r i o r a s g o u - s e d e

a l t o a b a i x o , e m d u a s p a r t e s , a t e r r a t r e m e u e f e n d e r a m - s e a s r o c h a s " ( M t 2 7 , 5 1 ) .

Em redor da "habi tação" ou do "tabernáculo" (Ex 26,1 -37 / 33,7-

11 / 36,8-19) será construído o "átr io" (Ex 27,9 -19 / 38.9-20), ampla

área em cujo interior , na frente e fora do "tabernáculo", se disporá a

"bacia de bronze" (Ex 30,17 -21 / 38,8 / 1Rs 7,23 -28) e o "al tar dos ho-

locaustos" (Ex 27,1-8 / 38,1-7 / 1Rs 8,64). Tomando -se por base o

"côvado", unidade de medida então usada, de cinquenta cent ímetros

em média, os vários móveis ter iam a descrição resumida e a medida

aproximada:

1 . A Arca (Ex 25,1-22), um baú de madeira de acácia, forrada de

ouro, onde colocar -se-iam as Duas Tábuas da lei escri tas pelo

dedo de Deus, as Tábuas do Testemunho (Ex 25,16.21 / Dt

10,2-5) , com 1,25 m. de comprimento , 0 ,75 m. de largura e

0 ,75 m. de a l tura; em cima da qual colocar -se-ia uma tampa de

ouro puro, o Propic iatório, com as mesmas medidas de co m-

primento e largura da arca, onde se ergueriam Dois Querubins

(Ex 25,17-18). Diante delas seria colocada uma urna com o

Maná (Ex 16,32-34) ;

2 . A Mesa dos Pães da Proposição ou da Apresentação (Ex

25,23-30) de madeira de acácia, medindo 1 m. de comprime n-

to, 0 ,5 m. de largura e 0 ,75 m. de al tura, toda reves t ida e a-

dornada em ouro puro, os vários utensí l ios necessários , e com

argolas nos cantos onde se f ixaram os varais , tudo revest ido

em ouro puro, para o t ran sporte;

3 . O Candelabro (Ex 25,31-40) de ouro puro, em forma de árv o-

re com sete ramos, t rês de cada lad o e um no centro, com o

pedestal em forma de caule, e os ramos terminando em form a-

to de amêndoas, f lores e botões , dispondo nele sete lâmp adas.

Será disposto de forma a projetar luz para a frente (Ex 25,27);

s inal da presença de Deus na Arca da Tenda da Re união, ofe-

recendo aos Israel i tas a luz para se orientarem nas t revas , br i -

lhando toda a noi te , donde nas Igrejas catól icas manter -se a-

69

cesa a luz do Sacrár io que se d enomina também, por causa da

presença de Cris to Eucarís t ico, de Tabernáculo (Ex 27,20 -21).

4 . O Tabernáculo (Ex 26,1-30) const i tuído de séries paralelas

de cort inas l igadas por colchetes de ouro e prata e coberturas

de pelos de cabra, formando uma Tenda, e por fora todo ce r-

cado por tábuas de acácia (Ex 26,16.18), tendo o véu (Ex

26,31-37) separando a área denominada de Sant íss imo ou Sa n-

to dos Santos , da parte denominada Santo, medindo respect i -

vamente o Sant íss imo 5 m. e o Santo 10 m. de comprimento o

que dará para todo o tabernáculo o comprimento de 15 m. e

4 ,5 m. ou 6 m. de largura (Ex 26,22 -25 - t recho de dif íci l

compreensão), que será disposto no sent ido norte - sul , dent ro

do át r io que será descr i to em seguida;

5 . O Altar dos Holocaustos (Ex 27,1-8) , de tábuas de madeira

de acácia, formando um quadrado medindo 2,50 m. de co m-

primento e largura, revest ido de bronze, oco no centro, ornado

com recipientes para cinzas , pás , t r inchantes e braseiros de

cobre, colocando -se nos seus quatro cantos chifres s imbol i -

zando força e poder (Dt 33,17; Sl 22,22), que serão puri f ic a-

dos com sangue na inst i tuição do sacerdó cio de Aarão (Ex

29,12; 30,10); e ,

6 . O Átrio (Ex 27,9-19), f inal izando a descrição "do que viu"

(Ex 25,9.40; 26,30; 27,8) , uma área medindo 50 m. de co m-

primento (Ex 27,9.18) por 25 m. de largura (Ex 27,13), e rgu i-

do na direção norte - sul (Ex 27,9-10) e com entrada a es te

(Ex 27,13-14).

2.13. - O PREPARO DO SACERDÓCIO

Ainda na fase descri t iva do que lhe "foi mostrado e Moisés viu" ,

nos dias de seu ret i ro e contemplação no Monte Sinai , cuida-se da or-

ganização do Sacri f ício Israel i ta , herança dos Patr iarcas , cuja f idel i -

dade havia já s ido posta à prova em séculos de perseguição rel igiosa

no Egi to e o principal motivo da evasão geral havida. Agora que se e s-

t ruturava em cul to defini t ivo de povo organizado torna va-se em conse-

quência necessári a e até mesmo essencia l a inst i tuição de um Sacerd ó-

cio Oficial não mais aquele cul tural , famil iar e mais de acordo com os

costumes, exercido até então pelos Primogêni tos , devendo a gora ser

outorgado a Aarão e seus f i lhos (Ex 28,1) , completando-se com o se-

guinte:

1 . Óleo para as lâmpadas do Candelabro: de "azei te de ol ivei ra puro

que os israel i tas deveriam trazer para arder cont inuamente na Te nda

da Reunião, onde os f i lhos de Aarão o dev eriam preparar a part i r de

toda a tarde até a manhã" (Ex 27,20 -21) ;

2 . Os Paramentos Sacerdotais (Ex 28,1-43): "mandarás fazer vestes

l i túrgicas para teu i rmão Aarão , em sinal de honra e dis t inção. In-

cumbirás por isso art is tas bem preparados, que dotei do esp ír i to de

sabedoria, de confeccionar as vestes de Aarão para consagrá -lo co-

70

mo sacerdote a meu serviço. Estas são as vestes que deverão fazer:

um pei toral , um é fode, um manto, uma túnica bordada, uma mitra e

um cinto. Assim farão vestes l i túrg icas para teu i rmão Aarão e seus

f i lhos para que sejam meus sacerdotes . Ut i l izarão ouro, púrpura v i-

olácea, vermelha e carmesim e l inho f ino" (Ex 28,2 -5) . Não é ne-

cessária uma descrição detalhada além de uma lei tura pessoal , le m-

brando-se de que a Igreja Catól ica e outras confissões cr is tãs aqui

se inspiram para o uso dos seus paramentos l i túrgicos, principa l-

mente nas Cerimônias Eucarís t icas;

3 . A Consagração de Aarão e seus Fi lhos para o Sacerdócio Perene

(Ex 29,1-37 / Ex 30,30): - com a responsabi l idade do oferecimento

do Sacri f ício Cot idiano, ao amanhecer e ao entardecer , "será um

holocausto perpétuo para vossas geraç ões a ser oferecido à entrada

da Tenda de Reunião, diante de Iahweh, lá onde me encontrarei

cont igo para te falar . É lá que me encontrarei com os israe l i tas , l u-

gar que será consagrado por m inha glór ia. Consagrarei a Tenda de

Reunião e o Altar , bem como Aar ão e f i lhos para que me s i rvam

como Sacerdotes . Habi tarei no meio dos israel i tas e serei o seu

Deus. Eles reconhecerão que eu, Iahweh, sou o seu Deus, que os l i -

bertei do Egi to para habi tar no meio deles . Eu, Iahweh, seu Deus "

(Ex 29,42-46);

4 . O Altar dos Perfumes (Ex 30,1-10): todo de ouro puro, motivo que

leva a ser também conhecido como o Altar de Ouro (Ex 39,38;

40,5.26): um quadrado de 0,50 m. de lado, com chifres no quatro

cantos , revest idos de ouro puro e objeto da expiação sang uínea (Ex

30,10), com as varas de madeira, também revest idas de ouro, presas

às argolas para o t ransporte, onde "Aarão queimará incenso arom á-

t ico cada manhã e cada entardecer", vedado outro perfume que o

descri to juntamente com o Óleo da Unção (Ex 30,34 -38);

5 . Far-se-á um recenseamento de homens aptos para a guerra (Nm

1): ocasião em que os de vinte anos para cima que forem al is tados

deverão pagar , em resgate , o valor de meio s iclo, conforme o s iclo

do santuário elei to como padrão, "como contr ibuição ao Senhor a

ser apl icado no servi ço da Tenda da Reunião" (Ex 30,11 -16). Um

único valor para "r icos e pobres" esboçando-se aqui a igualdade de

todos perante Deus e as futuras oferendas que lhe serão acrescidas ,

para a manutenção do cul to e do sacerdócio; foi cobrado até mesmo

de Jesus Cris to e São Pedro (Mt 17,24);

6 . A Bacia de Bronze: colocada entre a Tenda da Reunião e o Altar

dos Holocaustos para as abluções das mãos e dos pés de Aarão e

seus f i lhos "quando entrarem no Tabernáculo ou se aproximarem do

Altar , para oficiar" (Ex 30,17-21); e ,

7 . O Óleo para a Unção : Tudo o que fosse dest inado a Iahweh era -

Lhe consagrado, tornava -se santo . A idéia subjacente de “sant id a-

de” é “ser separado”, tal como Deus que é Santo por não se co n-

fundir com a Criação. Transcende -a.

" Ia h w e h f a l o u a M o i s é s , d i z e n d o : R e c o l h e a r o m a s d e p r i m e i r a q u a l i d a d e : ( . . . )

F a r á s d i s t o u m ó l e o p a r a a u n ç ã o s a g r a d a , u m a m i s t u r a d e e s p e c i a r i a s p r e p a r a d a

s e g u n d o a a r t e d a p e r f u m a r i a . S e r á e s t e o ó l e o p a r a a u n ç ã o s a g r a d a . U n g i r á s a t e n d a d e r e u n i ã o , a a r c a d a a l i a n ç a , a m e s a c o m t o d o s o s a p e t r e c h o s , o c a n d e l a -

b r o c o m o s u t e n s í l i o s , o a l t a r d o i n c e n s o , o a l t a r d o s h o l o c a u s t o s c o m o s u t e n s í -

71

l i o s , b e m c o m o a b a c i a c o m o s u p o r t e . A s s i m o s c o n s a g r a r á s e s e r ã o s a n t í s s i -m o s ; t u d o o q u e o s t o c a r s e r á s a n t o . U n g i r á s t a m b é m A a r ã o e o s f i l h o s , c o n s a -

g r a n d o - o s p a r a m e s e r v i r e m c o m o s a c e r d o t e s . A s s i m f a l a r á s a o s i s r a e l i t a s : e s s e

s e r á p a r a m i m o ó l e o d a u n ç ã o s a g r a d a p o r t o d a s a s g e r a ç õ e s . E l e n ã o s e r á d e r -r a m a d o s o b r e o c o r p o d e n en h u m a p e s s o a , n e m f a r e i s o u t r o p a r e c i d o , d a m e s m a

c o m p o s i ç ã o . É c o i s a s a g r a d a , e d e v e r e i s c o n s i d e r á - l o c o m o t a l . Q u e m f i z e r o u t r a

m i s t u r a s e m e l h a n t e , o u u s á - l o s o b r e u m e s t r a n h o , s e r á e l i m i n a d o d o m e i o d e s e u p o v o ” ( E x 3 0 , 2 2 - 3 3 ) .

A Unção Sagrada foi inst i tuída a f im de se consagrar a Iahweh

as pessoas, os lugares e objetos de st inados ao uso sagrado e l i túrgico.

As pessoas eram d a Tribo de Levi , os Sacerdotes “separados”, is to é,

“sant i f icados”, dest inados exclusivamente ao Santuário. Era derram a-

do neles o Óleo Sagrado da Unção e então assim “untados” ou “ung i -

dos”, eram “separa dos” exclusivamente para Iahweh, “sant i f icados”.

Em primeiro lugar seria sant i f icado o Tabernáculo com todos os ute n-

sí l ios e objetos usados nos cul tos e r i tuais l i túrgicos de então e, em

seguida, Aarão e os Fi lhos, sant i f icando -os para o exercício do Sace r-

dócio. Além dos Sacerdotes futuramente serão ainda ungidos alguns

Profetas , os Reis de Israel (1 Sm 24,7; 26,9.11.23; 2 Sm 1,14.16;

19,22) que por causa disso serão conhecidos por “Messias” ou em gr e-

go "Cris tos" ambos s ignif icando “U ngido”. Por tudo isso esse Óleo da

Unção vai desempenhar o mais importante pape l da vida rel igiosa de

Is rael e até mesmo at ingir o Cris t ianismo, onde será usado como “so-

brenome” de Jesus, Jesus Cris to, que s igni f ica Jesus, o Ungido . Assim

sendo, Cris to não é o sobrenome de Jesus , o nome de sua famíl ia , mas

um predicado, ou melhor, o seu at r ibuto de “o Ungido do Senhor" . Aí

es tá o verdadeiro sent ido da frase usada por Pedro quando da revel a-

ção de que fora alvo (Mt 16,16): " Tu és o 'Ungido' , o Fi lho de Deus

Vivo".

E, como o remate de toda a obra são apresentadas as essências

aromáticas e incenso para "perfumar" o ambiente onde seria r i tua l-

mente aspergido ou derramado f req uentemente o sangue, puri f icando -

o:

" Ia h w e h d i s s e a M o i s é s : “ A r r a n j a e s s ê n c i a s a r o m á t i c a s : r e s i n a , â m b a r , g a l b a n o ,

s u b s t â n c i a s a r o m á t i c a s e i n c e n s o p u r o e m p a r t e s i g u a i s . P r e p a r a r á s u m i n c e n s o p e r f u m a d o , c o m p o s t o s e g u n d o a a r t e d a p e r f u m a r i a , b e m d o s a d o , p u r o e s a n t o .

P a r t e d e l e r e d u z i r á s a p ó a f i m d e p ô r d i a n t e d a a r c a d a a l i a n ç a n a t e n d a d e r e u -n i ã o , o n d e m e e n c o n t r a r e i c o n t i g o . H a v e i s d e c o n s i d e r á - l o c o m o a l g o d e s a n t o e

c o n s a g r a d o . N ã o d e v e i s f a z e r p a r a v ó s o u t r o i n c e n s o d a m e s m a c o m p o s i ç ã o . D e -

v e r á s c o n s i d e r á - l o c o m o c o n s a g r a d o a Ia h w e h . Q u e m p r e p a r a r o u t r o s e m e l h a n t e p a r a s e n t i r - l h e o a r o m a , s e r á e l i m i n a d o d o m e i o d e s e u p o v o ” ( E x 3 0 , 3 4 - 3 8 ) .

Terminando os preparat ivos e para a execução de toda a Obra

mostrada a Moisés , Deus " infunde de Seu Espír i to alguns art í f ice s",

como se faz referências em out ros lugares (Gn 41,38; Nm 11,17) , ver -

dadeira antecipação da pres ença do Espír i to Santo, caracterizando já

"em figura" a f inal idade cris tológica das escri turas (1Cor 10,3 -4.11;

Gl 3,24; Rm 15,4):

" Ia h w e h f a l o u a M o i s é s , d i z e n d o : “ O l h a , e u c h a m e i e s p e c i a l m e n t e B e s e l e e l f i -

l h o d e U r i , f i l h o d e H u r , d a t r i b o d e J u d á . E n c h i - o d o e s p í r i t o d e D e u s : s a b e d o -r i a , h a b i l i d a d e e a r t e p a r a q u a l q u e r t i p o d e t r a b a l h o ( . . . ) P u s t a m b é m n o c o r a -

ç ã o d e t o d o s o s a r t e s ã o s h a b i l i d o s o s a s a b e d o r i a p a r a q u e e x e c u t e m t u d o o q u e

t e m a n d e i : a t e n d a d e r e u n i ã o , a a r c a d a a l i a n ç a , o p r o p i c i a t ó r i o q u e a e n c o b r e e t o d o s o s a c e s s ó r i o s d a t e n d a ; a m e s a c o m o s u t e n s í l i o s , o c a n d e l a b r o d e o u r o

p u r o c o m o s u t en s í l i o s e o a l t a r d o i n c e n s o ; o a l t a r d o h o l o c a u s t o c o m o s u t e n -

72

s í l i o s e a b a c i a c o m o s u p o r t e ; a s a l f a i a s c o m a s v e s t e s l i t ú r g i c a s d o s a c e r d o t e A a r ã o e d e s e u s f i l h o s , p a r a e x e r c e r e m o m i n i s t é r i o s a c e r d o t a l ; o ó l e o d a u n ç ã o

e o i n c e n s o a r o m á t i c o p a r a o s a n t u á r i o . E l e s f a r ã o t u d o c o n f o r m e t e m a n d e i ”

( E x 3 1 , 1 - 1 1 ) .

Mesmo nos t rabalhos dest inados ao Santuário cont inuava em v i-

gor a discipl ina r ígida e severa do Sábado, punindo com a morte qua l-

quer infrator , considerando -se a sua violação como sendo à Aliança

Perpétua de que é s inal (Ex 31,12 -17). Por f im, Iahweh entrega a Moi-

sés as "tábuas de pedra escri tas pelo dedo de Deus (de 'Elohim' )" (Ex

31,16-18):

“P e lo q u e os f i lh os d e Is ra e l gu a rd a rã o o sáb ad o , c e l eb ra n d o -o p or a l i an ça p erp étu a

n as su as g eraç õ es . En t r e mim e os f i lh o s d e Is ra e l é s i n a l p a ra semp r e; p orq u e , em

se i s d i a s , f ez Iah weh o s céu s e a t e r ra , e , a o sé t im o d ia , de sca nso u , e to mo u a l ento .

E , t en d o acab ad o d e fa la r c o m e l e n o m on t e S in a i , d eu a Moi sé s a s d u as t áb u as d o

Tes t emu n h o, t áb u as d e p ed ra , esc r i t a s p e lo d ed o d e D eu s ” (E x 3 1 ,1 6 -1 8 ) .

2.14. - "O BEZERRO DE OURO"

Moisés cont inuava no Monte Sinai e o Povo de Is rael , sem o seu

comando e controle, sent iu como se fora abandonado e como tal reage:

“ V e n d o q u e M o i s é s d e m o r a v a a d e s c e r d o m o n t e , o p o v o r e u n i u - s e e m t o r n o d e

A a r ã o e l h e d i s s e : „ V a m o s ! F a z e - n o s d e u s e s ( [ = " E l o h i m " , n o t e x t o h e b r a i c o ] )

q u e c a m i n h e à n o s s a f r e n t e . P o i s q u a n t o a M o i s é s , o h o m e m q u e n o s t i r o u d o E g i t o , n ã o s a b e m o s o q u e l h e a c o n t e c e u ‟ ” ( E x 3 2 , 1 - 2 ) .

Esta frase “vamos! faze -nos „deuses‟" ("Elohim" ) que „caminhe‟

à nossa frente. . .” E a reação de Moisés quanto ao fato (Ex 32,19 -28),

insinuam a ex is tência de uma "idolatr ia". Também o fato de Aarão, de

posse de objetos de ouro, ter fundido um Bezerro de Ouro:

" A a r ã o l h e s d i s s e : „ T i r a i o s b r i n c o s d e v o s s a s m u l h e r e s , v o s s o s f i l h o s e v o s s a s

f i l h a s , e t r a z e i - o s a m i m ‟ . T o d o o p o v o a r r a n c o u o s b r i n c o s d e o u r o q u e u s a v a , e o s t r o u x e p a r a A a r ã o . R ec e b e n d o o o u r o , e l e o m o l d o u c o m o c i n z e l e f e z u m

b e z e r r o f u n d i d o . E n t ã o e l e s d i s s e r a m : „ A í t e n s , I s r a e l , " E l o h i m " ( = " d e u s e s " )

q u e t e f e z s a i r d o E g i t o ! ‟ . A o v e r i s t o , A a r ã o c o n s t r u i u u m a l t a r d i a n t e d e l e e p r o c l a m o u : „ A m a n h ã h a v e r á f e s t a e m h o n r a d e Ia h w e h ‟ . Le v a n t a n d o - s e n a m a -

n h ã s e g u i n t e , o f e r e c e r a m h o l o c a u s t o s e a p r e s e n t a r a m s a c r i f í c i o s p a c í f i c o s . O

p o v o s e n t o u - s e p a r a c o m e r e b e b e r , e d e p o i s s e l e v a n t o u p a r a s e d i v e r t i r " ( E x 3 2 , 2 - 6 ) .

"Elohim" é um dos nomes com que era conhecido o Deus dos he-

breus e é dele que se fez a imagem. Não se t ratou de s imples represe n-

tação, pois "levantando-se na manhã seguinte ofereceram hol ocaustos

e apresentaram sacr i f ícios pacíf icos , e o povo sentou -se para comer e

beber, e depois se levantou para se d ivert i r" (Ex 32,6) . Is to é, af i r-

mando que “o povo sentou -se para comer e beber” refere -se ao cer i -

monial do Sacri f ício oferecido e ao dizer “e depois se levantou para se

divert i r” parece estar dizendo que caiu na orgia, profanando -o com

fornicação pagã. O S acri f ício do t ipo denominado "pacíf ico" é uma

"refeição sagrada" que degeneram , ao que parece, motivando a incr i -

minação por Iahweh (Ex 32,7 -8), “o Deus ciumento”. Ao que tudo i n-

dica foi essa a causa, muito séria por s inal , que culminou com a morte

de "cerca de t rês mil homens" (Ex 32,28). Moisés ao "ver o B ezerro de

73

Ouro e as danças”, isso é, a orgia pagã do povo se divert indo, num a-

cesso de cólera, “ar rojou das mãos e quebrou as tábuas de Pedra” “ o-

bra de „Elohim‟" (Ex 32,16.19), "queimou o Bezerro, t r i turo u-o, redu-

ziu-o a pó e, misturando-o na água obrigou o povo a bebê-la".

Em vir tude do confl i to aqui manifestado entre o nome Ia hweh e

Elohim impõe-se uma anál ise cul tural dos nomes de Deus , que aparece

nesse t recho como "Elohim" de quem se fez a imagem (Ex 32,4.8) , e

contra quem se insurge " Iahweh" (Ex 32,7-8) . Como já se viu, quando

da anál ise fei ta por ocasião da Bênção de Jacó (cfr : Capí tulo II, nº

1 .20, Gn 49), à t r ibo de Efraim, primogêni to de José, caber ia a chefia

do clã na forma da t radição cul tural correspondente ao equi l íbrio entre

as t r ibos em vigor na época. Nesse episódio do Bezerro de Ouro man i-

festam-se aspectos daquela host i l idade latente no seio do povo, a que

lá se referiu, desde quando ainda se resumia na Tribo de Jacó some n-

te. Como se viu, e não faz mal repet i r , José era o f i lho predi leto de

Jacó e os seus i rmãos o odiavam seja por causa di sso seja por causa de

sonhos dele, que previam sua supremacia futura (Gn 37,3 -4 .5-11). Jo-

sé (por di rei to) e Judá (por sucessão) são os dois f i lhos pr imogêni tos

das mulheres de Jacó, Raquel e Lia. De Lia, Judá seria o primogên i to

em lugar de Rúben, Simeão e Levi , que perderam o direi to (Gn 49,4 -

6); e , de Raquel , José, a quem Jacó amava com predi leção e a quem

deu a primogeni tura (Gn 49,22 -26). Por sua vez , foi a t r ibo de Judá

abençoada por Jacó com um colorido messiânico (Gn 49,8 -12), caben-

do-lhe o direi to da primogeni tura pela ordem cronológica de nasc i-

mento (Gn 29,31 -35) e pela dest i tuição de Rúben e Simeão (Gn 49,5 -

7) . Com o reencontro de José as coisas m udam e em Jacó reacende sua

predi leção. Assim como Esaú odiou Jacó por causa da primoge ni tura

pelo mesmo motivo é de se esperar o ressent imento de Judá quando foi

ela dest inada a José, tanto com a correspondente bênção, como com

Efraim igualado a Rúben (Gn 48,5) e na dupla po rção dada a José (Gn

48,22). Não se deve perder de mira que foi Judá quem chefiou a venda

de José para os Ismael i tas (Gn 37,26-27), contra a vontade de Rúben

que o queria res t i tui r i leso ao pai (Gn 37,22), e isso se deu antes da

bênção de Jacó (Gn 49). Também Rúben, que det inha o direi to não d e-

ve ter acei tado a de st i tuição sem em contrapart ida devotar alguma oj e-

r iza por perdê -lo. Assim, os antagonismos famil iares fervi lhavam,

fermentando-se uma divisão futura. Esses fatos são confirmados bibl i -

camente:

" A d e s c e n d ê n c i a d e R ú b e n , o p r i m o g ê n i t o d e I s r a e l : E l e e r a n a r e a l i d a d e o p r i -

m o g ê n i t o , m a s p o r q u e p r o f a n o u o l e i t o d o p a i , o d i r e i t o d a p r i m o g e n i t u r a f o i

c o n f e r i d o a o s f i l h o s d e J o s é f i l h o d e I s r a e l , e a s s i m o s r u b e n i t a s n ã o f o r a m r e -

g i s t r a d o s c o m o p r i m o g ê n i t o s . N a v e r d a d e , J u d á v e i o a p r e d o m i n a r e n t r e o s i r -

m ã o s e d e l e s a i u u m p r í n c i p e ; m a s a p r i m o g e n i t u r a f i c o u c o m J o s é " ( 1 C r o 5 , 1 -

2 ) .

" H o s a , d a d e s c e n d ê n c i a d e M e r a r i , t i n h a f i l h o s : S e m r i e r a o c h e f e ; o p a i o n o -

m e a r a c h e f e , e m b o r a n ã o f o s s e o p r i m o g ê n i t o " ( 1 C r o 2 6 , 1 0 ) .

Uma anál ise , mesmo superficial como essa, mostra que nesse e-

pisódio , concentram-se, entre outros , esses confl i tos e t radições t r i -

bais . Em primeiro lugar , algumas t raduções mencionam "deuses"

quando t raduzem Ex 32,1.4.8 e 23 segundo a Septuaginta e a Vulgata,

74

que é a t radução l i t eral de "Elohim" , no hebraico. Sabe-se que "Elo-

him" era um dos nomes hebraicos do Deus Is rael i ta , parale lo com Ia h-

weh, porque, em Gn 1,1 , a t radução l i teral seria "no princípio 'deuses

(= 'Elohim') ' ' cr iou (= 'bara ') 'os céus e a terra". Pelo fato de se col o-

car o verbo („bara‟= criou) no s ingular conclui -se que "Elohim" aqui é

o nome do Deus - Criador e não a palavra hebraica "El (=deus)", no

plural “Elohim” com o s ignif icado de “deuses”.

Hoje se reconhece na contextura das Escri turas Sagradas a ex i s-

tência de narrat ivas oriundas de várias t radições documentárias . Entre

elas as denominadas de "Eloís ta" e "Javis ta", conforme o tex to se ref i -

ra à t radição de Elohim ou à t radição de Iahweh , o nome dado a Deus.

É muito fáci l saber qual o nome se encontra no tex to original pela t r a-

dução: - se o nome no tex to t raduzido for "Senhor" no original es tá " I-

ahweh"; se o nome t raduzido foi “Senhor Deus” no original es tará “ I-

ahweh El”; e , se o nome t raduzido for "Deus" , no original se encontra

"Elohim". No t recho em exame (Ex 32) , nota-se uma espécie de s imb i-

ose de ambos, fazendo com que alguns especial is tas o at r ibuam às d u-

as t radições documentárias . Apesar de não se pretender part icipar de s-

ses debates dest ina -se o comentário apenas a confi rmar o exposto e pa-

ra deixar claro que , mesmo havendo divergência entre os dois ou mais

contextos de fontes diversas , não se deve esquecer que o na rrador ou o

compilador original conhecia esses detalhes e se os juntou no texto é

porque não há contradição havendo hoje apenas divergência cul tural

de t raduções . Devem-se somar informações, nunca r eduzi- las .

Só se pode concluir que Moisés seja o patrocinador do nome " I-

ahweh" (Ex 3,13-15; 6 ,2-3) cabendo-lhe a sua apresentação ao Povo

de Is rael , que o designava com outros nomes: Elohim e Iahweh (Gn

1,1; 4 ,6.26; 12,1; Ex 6,2 -4) , El -Shaddai (Gn 17,1; 28,3 ; 43,14; Ex

6,3) , El Elyon (Gn 14,18 -24), El 'Olam (Gn 21,33), El Ro 'i (Gn 16,13),

Iahweh Yir 'el (Gn 22,14), El Bete (Gn 31,13; 35,7) , Adonai ( Gn

15,2.8) etc. . Pelos prodígios do Egi to , o nome Iahweh se impôs aos F i-

lhos de Is rael , bem como Moisés , o seu Profeta, superando -se a reje i -

ção ocorrida no início da luta (Ex 2,14). Moisés não pertencia a n e-

nhuma das t r ibos que det inham o direi to advindo d a primogeni tura e a

de Levi , que era a dele (Ex 2,1 -2.10), fora dele excluída por Jacó (Gn

49,5-7) , não lhe cabendo o encargo de chefia pelo direi to de famíl ia

patr iarcal . Grande vantagem lhe adveio em vir tude de pertencer à corte

faraônica (Ex 2,10), fazendo com que o fato fosse subest imado. Aliam-

se a isso os prodígios de Iahweh real izados por seu intermédio e A a-

rão, bem como a função desempenhada por Josué, uma espécie de

"primeiro minis t ro de Moisés" (Ex 24,13) e por ele nomeado , por ser

membro da Tribo de Efraim, que det inha o direi to de primogeni tura .

Essa condição confirma a escolha fei ta por habi l idade pol í t ica de Mo i-

sés , contornando a possível ex igência do direi to da t r ibo na chefia que

assim teria s ido pacif icada. Também, o fato de ser dest inado a subst i -

tui r Moisés confi rma-lhe o direi to e a sua preeminência (Nm 28,18 -23

/ Dt 31,3-8 / J s 1 ,1-9) .

Quando Moisés subiu ao monte e lá permaneceu "quarenta dias e

quarenta noi tes" (Ex 24,18), levando consigo Josué (Ex 24,13), o povo

75

sent iu-se desguarnecido e abandonado por Iahweh e seu profeta e bus-

cou apoio em Elohim, tal como regis t ra a Bíbl ia Hebraica:

" M o i s é s , p o r é m , e n t r o u n o m e i o d a n u v e m , d e p o i s q u e s u b i u a o m o n t e ; e M o i s é s e s t e v e n o m o n t e q u a r e n t a d i a s e q u a r e n t a n o i t e s " ( E x 2 4 , 1 8 ) . / " M a s o p o v o ,

v e n d o q u e M o i s é s t a r d a v a em d e s c e r d o m o n t e , a c e r c o u - s e d e A a r ã o , e l h e d i s s e :

L e v a n t a - t e , f a z - n o s " E l o h i m " ( = d e u s e s , - c f r . : c o n s t a " E l o h i m " n a B í b l i a H e -b r a i c a ) q u e v á a d i a n t e d e n ó s ; p o r q u e , q u a n t o a e s s e M o i s é s , o h o m e m q u e n o s

t i r o u d a t e r r a d o E g i t o , n ã o s a b e m o s o q u e l h e a c o n t e c e u . . . " ( E x 3 2 , 1 . 2 3 ) .

Sabe-se que, quando se usa a quant idade bíbl ica de "quarenta d i-

as e quarenta noi tes" não se t rata de uma sequela exata, mas s imból i -

ca, caracterizando-se o tempo necessár io para algum ato ou missão .

Tal ausência de Moisés se dá após a promulgação do Decálogo e a rat i -

f icação da Aliança antes da inst i tuição do Tabernáculo ou Santuário e

do Sacerdócio. Tanto é ass im que a alegação "não sabemos o que lhe

aconteceu" caracteriza bem que não se t ratava de uma aus ência peque-

na, mas de muito tempo a ponto do povo , sent indo-se desguarnecido e

abandonado, vol tar a buscar apoio no ant igo nome do Deus t r ibal : Elo-

him . Com isso manifestou -se o que se deu a entender ser uma espécie

de sedição, aparecendo então aquela divisão, já latente no seio do p o-

vo desde a sua condição t r ibal , tendo agora , por es topim e agravante , a

violação do direi to de primogeni tura. A sedição t eve por fu lcro a vol ta

a Elohim para que assumisse a posição de comando a que t inha direi to

naturalmente sob a chefia de Efraim, o detentor do direi to a dvindo da

primogeni tura e da adoção que recebera pelas mãos de Jacó. Tanto está

certa essa conclusão que, descoberta a sedição, coloca -se Moisés "à

entrada do acampamento exclamando: „Quem for de Iahweh venha a

mim” (Ex 32,26).

Essa frase só tem sent ido no contexto se a sedição se deu co ntra

a Aliança cont raída com Iahweh e concluída no Sinai por meio de

Moisés . É por isso que Moisés quebra as Tábuas de Pedra (Ex 32,19),

escri tas "pelo dedo de Elohim" (Ex 31,18, tex to hebraico). Também a

frase: "Moisés viu que o povo estava abandonado, pois que Aarão o

abandonara, expondo-o à zombaria dos adversários" (Ex 32,25) só tem

sent ido em referência pi lhérica aos que perman eceram fiéis a Iahweh e

Moisés . Tudo isso confirm a que o episódio do Bezerro de Ouro nã o se

refere a uma idolat r ia , i ss o é, à adoração de um ídolo. Vem em favor

dessa conclusão o fa to de Aarão não ter s ido punido, tendo e le fundido

a imagem (Ex 32,4) , apesar da sedição não ter s ido da Tribo de Levi à

qual pertencia. Foram os levi tas que apoiaram Moisés (Ex 32,26) co r-

respondendo bem à fama que desfrutavam de sanguinários , motivo da

recusa deles na escala descendente da subst i tuição de Rúben pelo pr ó-

prio Jacó (Gn 34,25 -31 / 49,5-7) , matando, naquele dia , "t rês mil ho-

mens" (Ex 32,28). A frase de Moisés: "c inge, cada um de vós, a espada

sobre o lado, passai e tornai a passar pelo acampamento, de porta em

porta, e mate, cada qual , a seu i rmão, a seu amigo, a seu parente" (Ex

32,27), só ter ia sent ido e melhor se ident i f ica se dir igida também a J o-

sué, o "braço direi to de Moisés" e responsável pela paci f icação. E,

sendo membro do mesmo clã , por força do cargo, a ele cabia também a

reação até mesmo por uma questão de ordem e discipl ina, contra a s e-

dição da Tribo de Efraim. Mas o exercício do sace rdócio, como já foi

76

amplamente disposto, vinculava -se indestacavelmente à primogen i tura

pelo que pertenceria exclusivamente à t r ibo de Efraim. O próprio Mo i-

sés reconhece:

" D e J o s é d i s s e ( M o i s é s ) : A b e n ç o a d a p o r Ia h w e h s e j a a s u a t e r r a , ( . . . ) . . . v e n h a t u d o i s s o s o b r e a c a b e ç a d e J o s é , s o b r e o a l t o d a c a b e ç a d a q u e l e q u e é c o n s a -

g r a d o e n t r e s e u s i r m ã o s . E l e é o s e u t o u r o p r i m o g ê n i t o ; e l e t e m m a j e s t a d e ; e o s

s e u s c h i f r e s s ã o c h i f r e s d e b ú f a l o ; c o m e l e s e l e f e r e t o d o s o s p o v o s , t o d a s a s e x -t r e m i d a d e s d a t e r r a d e v e z . T a i s s ã o a s m i r í a d e s d e E f r a i m , e t a i s s ã o o s m i l h a -

r e s d e M a n a s s é s " ( D t 3 3 , 1 3 - 1 7 ) .

Vincula-se esse t recho ao Gn 49,22, cuja t radução não é pac í f ica

e é cheia de conjecturas . Atualmente a "Edi t ion Intégrale TOB, 1978 ,

Edição Francesa" rompe com a vertente "t radicional" de inte rpretação

e t raduz com mais f idel idade:

" J o s e p h e s t u n j e u n e t a u r e a u , u n j e u n e t a u r e a u p r è s d ' u n e s o u r c e . . . " q u e s e p o d e

t r a d u z i r p a r a o p o r t u g u ê s p o r - " J o s é é u m b e z e r r o ( j o v e m t o u r o ) , u m b e z e r r o

j u n t o d e u m a f o n t e . . . " ( G n 4 9 , 2 2 ) .

A divergência que se observa nas t raduções des se t recho vem

exatamente do fato de se desconhecer ou se desprezar a Ins t i tuição da

Primogeni tura, não se levando em conta a sua influência no meio soc i-

al de então. Pela "Traduct ion Oecuménique de la Bible" ident i f ica -se

por isso mesmo e , com faci l idade , José com a "consagração" e com o

"touro primogêni to" , ou com o "touro consagrado", advindo da est rei ta

relação entre a t r ibo de José com o sacerd ócio. Assim, é de se deduzir

que o "bezerro" é uma representação da força e potência de "Elohim"

em cujo dorso pousava quando descia esse Deus da t r ibo de Efraim.

Ora, pelo fato de Moisés ser da t r ibo de Levi os levi tas vieram

em socorro de Iahweh, que se pretendeu impor com exclusiv idade ao

povo israel i ta e dominou a pretensa sedição formada. Apesar de ter ela

s ido excluída da primogeni tura pelo próprio Jacó (Gn 49,5 -7) , ter ia s i -

do premiada, em reconhecimento disso , com o Sacerdócio Pleno por

meio da consagração da Casa de Aarão (Ex 29,1-46) e com o Sacerdó-

cio Auxi l iar pela subst i tuição dos primogêni tos pelos demais membros

da t r ibo, os levi tas (Nm 3,5 -51 e 8,5-26) :

“ V e n d o M o i s é s q u e o p o v o e s t a v a d e s e n f r e a d o , p o i s A a r ã o o d e i x a r a à s o l t a p a r a

v e r g o n h a n o m e i o d o s s e u s i n i m i g o s , p ô s - s e e m p é à e n t r a d a d o a r r a i a l e d i s s e :

Q u e m é d e I a h w e h v e n h a a t é m i m . E n t ã o , s e a j u n t a r a m a e l e t o d o s o s f i l h o s d e L e v i , a o s q u a i s d i s s e : A s s i m d i z Ia h w e h , o D e u s d e I s r a e l : C a d a u m c i n j a a e s -

p a d a s o b r e o l a d o , p a s s a i e t o r n a i a p a s s a r p e l o a r r a i a l d e p o r t a e m p o r t a , e m a t e

c a d a u m a s e u i r m ã o , c a d a u m , a s e u a m i g o , e c a d a u m , a s eu v i z i n h o . E f i z e r a m o s f i l h o s d e L e v i s e g u n d o a p a l a v r a d e M o i s é s ; e c a í r a m d o p o v o , n a q u e l e d i a ,

u n s t r ê s m i l h o m e n s . P o i s M o i s é s d i s s e r a : C o n f e r i - v o s , h o j e , a i n v e s t i d u r a p a r a

I a h w e h ; c a d a u m c o n t r a o s e u f i l h o e c o n t r a o s e u i r m ã o , p a r a q u e e l e v o s c o n -c e d a , h o j e , b ê n ç ã o ” ( E x 3 2 , 2 5 - 2 9 ) .

Após a prova de Levi , tendo agido, “cada um contra o seu f i lho e

contra o seu i rmão para que ele vos conceda, hoje, bênção ” Iahweh

lhes concede a bênção e os admite de novo de vol ta ao meio Israel i ta e

vai outorgar - lhes , num futuro bem próximo , o sacerdócio da Casa de

Is rael t al como afi rma Moisés: “Confer i -vos, hoje, a inves t idura para

Iahweh”, conforme a Bíbl ia Hebraica [ l i t . : “ vós vos enches tes as

mãos” (com as oferendas dos sacri f í cios)] na terminologia bíbl ica s i g-

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nif icando inst i tui r alguém nas funções sacerdotais (Ex 28,41; 29,9;

33,8-9 / Lv 21,10).

Por outro lado, as r ival idades já ex is tentes favorecem a união de

Levi com Judá contra Efra im em vir tude da preferência de Jacó por J o-

sé, desde os tempos passados. Assim , o Profeta Isaías regis t ra "cessará

o ciúme" e "não será mais adversário" que caracterizam a ex is tência de

sent imentos host is muito enraizados e não t ransi tórios:

" T a m b é m c e s s a r á o c i ú m e d e E f r a i m , e o s a d v e r s á r i o s d e J u d á s e r ã o e l i m i n a d o s ; E f r a i m n ã o t e r á m a i s c i ú m e d e J u d á e J u d á n ã o s e r á m a i s o a d v e r s á r i o d e E f r a -

i m " ( I s 1 1 , 1 3 ) .

Estudando-se a origem do Reino do Norte, desl igando -se do de

Judá (1Rs 12), ver-se-á ainda fervi lhante , tais antagonismos t r ibais

confi rmando o que se expõe aqui . Algo que foi fruto de dor cul tura l -

mente sent ida e mergulhada no âmago do sent imento t r ibal e no seu

orgulho, não pode ter outra origem que a luta pelo direi to da primog e-

ni tura. Tal como ocor rera entre Jacó e Esaú, vai se prosseguir na Hi s-

tória de Israel até mesmo na revol ta de Absalão, que vai se aprovei tar

da divergência levantando essas t r ibos t radicionalmente descontentes

contra seu pai Davi , da t r ibo de Judá (2 Sm 15 -19)

Não é possível concordar com o episódio do Bezerro de O uro, tal

es tá narrado em Ex 32, após a Teofania ou manifestação sensível de

Deus ocorrida no Sinai (Ex 19,16 -25) de tão vigorosas expressões d i-

nâmicas do poder divino ao então recém -formado Povo de Deus. É

s implesmente inacredi tável . Após tão violenta presença “do meio do

fogo” não é cr ível que se seguisse uma idolatr ia tão colorida de aspe c-

tos gent í l icos mais apropriad os aos outros povos cuja cu l tura rel igiosa

o povo israel i ta reje i tara até mesmo no Egi to. Nem mesmo é cr ível que

após rat i f icar a Aliança de Iahweh com Abraão (Ex 24,1 -8) o Povo de

Deus viesse a violá- la , contradi toriamente, com uma imagem esculpida

não de "outro deus" (Ex 20,4 -5) , mas do mesmo que "pronunciou o

Decálogo" (Ex 20,1) e o mesmo da Criação (G n 1,1) .

Há os episódios que convenceram os Israel i tas a deixarem uma

vida já acomodada "comendo as cebolas e carnes no Egi to" para se a-

venturarem em uma vida nômade num deserto desconhecido para eles .

E também os prodígios presenciados da morte dos primogêni tos do E-

gi to com a poupança dos de Israel , d o Maná, das Codornizes e da Pas-

sagem do Mar Vermelho. Esses motivos concorreram para não fugirem

e vol tarem ao Faraó que os ter ia recebido com a sat isfação de co lorido

bem econômico , recuperando a "mão de obra " servi l e bara ta que pe r-

dera (Ex 14,5) .

2.15 - A RATIFICAÇÃO DA ALIANÇA COM IAHWEH - OPÇÃO DEFINITIVA

Mortos os insurretos outro caminho não se poderia t r i lhar que a

rat i f icação dos termos da Aliança com Iahweh. Porém, os acontec i-

mentos t rouxeram para Moisés di f iculdades quase insuperáveis não f o-

ra a sua confiança em Iahweh. É essa fé que o leva a interceder nova-

mente pelo povo não sem antes conscient izá -lo de sua fal ta grave ad-

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moestando-o severamente pela t raição prat icada ao compromisso com

Iahweh (cf r Ex 20,1-19):

“ N o d i a s e g u i n t e , d i s s e M o i s é s a o p o v o : V ó s c o m e t e s t e s g r a n d e p e c a d o ; a g o r a , p o r é m , s u b i r e i a Ia h w e h e , p o r v e n t u r a , f a r e i p r o p i c i a ç ã o p e l o v o s s o p e c a d o .

T o r n o u M o i s é s a Ia h w e h e d i s s e : O r a , o p o v o c o m e t e u g r a n d e p e c a d o , f a z e n d o

p a r a s i d e u s e s d e o u r o . A g o r a , p o i s , p e r d o a - l h e o p e c a d o ; o u , s e n ã o , r i s c a - m e , p e ç o - t e , d o l i v r o q u e e s c r e v e s t e . E n t ã o , d i s s e Ia h w e h a M o i s é s : R i s c a r e i d o m e u

l i v r o t o d o a q u e l e q u e p e c a r c o n t r a m i m . V a i , p o i s , a g o r a , e c o n d u z e o p o v o p a r a

o n d e t e d i s s e ; e i s q u e o m e u A n j o i r á a d i a n t e d e t i ; p o r é m , n o d i a d a m i n h a v i s i -t a ç ã o , v i n g a r e i , n e l e s , o s e u p e c a d o . F e r i u , p o i s , I a h w e h a o p o v o , p o r q u e f i z e -

r a m o b e z e r r o q u e A a r ã o f a b r i c a r a ” ( G n 3 2 , 3 0 - 3 5 ) .

Moisés sofre em vir tude de ver o seu ideal da unidade de todos

os Israel i t as em torno de Iahweh comprometido pelas dramáticas co n-

sequências f icando por demais frust rado e luta ainda para perm anecer -

lhe f iel . Chega a se oferecer para sofrer a punição em lugar deles di -

zendo “perdoa - lhe o pecado; ou, se não, r isca -me, peço- te, do l ivro

que escreveste” Porém, “disse Iahweh a Moisés: Riscarei do meu l ivro

todo aquele que pecar contra mim” Iahweh n ão cast iga inocentes e não

se curva ao desejo de subst i tuição de Moisés , acei ta o pedido de pe r-

dão pelo povo e determina que “vai . . . conduze o povo para onde te

disse. . . no dia da minha vis i tação, vingarei , neles , o seu pecado”. Mo i -

sés ret i ra de tudo algumas conclusões e amadurece mais a inda para o

encargo e missão de levar todo o Povo de Is rael à Terra Prometida. F i-

ca assim rat i f icada a Nova Aliança de Moisés que cont inua sem m u-

danças est ruturais , sofrendo apenas influências acidentais que não m u-

dam o Desígnio de Iahweh.

É estarrecedora a mudança de at i tude d e Iahweh, antes cheio de

cólera espumando punições: “Riscarei do meu l ivro todo aquel e que

pecar contra mim.. .” , “ . . . no dia da minha vis i tação, ving arei , neles , o

seu pecado. Feriu, pois , Iahweh ao povo, po rque f izeram o bezerro que

Aarão fabricara. . .” E, prosseguindo " Iahweh falou a Moisés e lhe di s-

se: „Vamos! Sai daqui , com o povo que f izeste sai r do Egi to, para a

terra que prometi a Abraão, a Isaac e a Jacó, dizendo: „Eu a darei à tua

descendência‟ . Enviarei na tua f rente um anjo. . .” - is to é, Deus perm a-

necerá sempre f iel à Promessa e à Aliança com os Patr iarcas , mesmo

com a infidel idade do “povo de cabeça dura”:

" Ia h w e h f a l o u a M o i s é s e l h e d i s s e : “ V a m o s ! S a i d a q u i , c o m o p o v o q u e f i z e s t e

s a i r d o E g i t o , p a r a a t e r r a q u e p r o m e t i a A b r a ã o , a I s a a c e a J a c ó , d i z e n d o : „ E u

a d a r e i à t u a d e s c e n d ê n c i a ‟ . E n v i a r e i n a t u a f r e n t e u m a n j o , p a r a e x p u l s a r o s c a n a n e u s , o s a m o r r e u s , o s h i t i t a s , o s f e r e z e u s , o s h e v e u s e o s j e b u s e u s . S o b e

p a r a a t e r r a o n d e c o r r e l e i t e e m e l . M a s e u n ã o s u b i r e i c o n t i g o , p o r q u e é s u m

p o v o d e c a b e ç a d u r a ; d o c o n t r á r i o a c a b a r i a c o n t i g o n o c a m i n h o “ . A o o u v i r e s t a a m e a ç a , o p o v o p ô s - s e d e l u t o e n i n g u é m m a i s u s o u en f e i t e s . É q u e Ia h w e h t i -

n h a d i t o a M o i s é s : “ D i z e a o s i s r a e l i t a s : S o i s u m p o v o d e c a b e ç a d u r a ; s e p o r u m

i n s t a n t e s u b i s s e c o n v o s c o , e u v o s a n i q u i l a r i a . D e s p o j a i - v o s , p o i s , d o s e n f e i t e s , e e u s a b e r e i o q u e f a z e r c o n v o s c o ” . O s i s r a e l i t a s d e s p o j a r a m - s e d o s e n f e i t e s a o

p a r t i r d o m o n t e H o r e b " ( E x 3 3 , 1 - 6 ) .

“Despojai -vos, pois , dos enfei tes , e eu saberei o que fazer co n-

vosco” – foi a consequência do ato impensado, e “ . . . despojaram -se

dos enfei tes ao part i r do monte Horeb”. Essa disposição imposta foi

cumprida, numa real e séria demonstração de arrependimento aband o-

nando-se os ornamentos, que desde o Egi to ainda usavam , dest inando-

os à edi f icação de uma Tenda de Reunião onde comparecerá Moisés e

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os que desejarem consul tar Iahweh. Essa edif icação da Tenda da Re u-

nião torna ainda mais dif íci l o entendimento após tudo o que se disse

da cólera de Iahweh contra o seu Povo , por causa do Bezerro de Ouro.

Porém, não é outra coisa que o “lançamento da pedra fundamental” da

edif icação do Santuário de Iahweh (Ex 25 e 26), que se inicia. Tudo

indica, porém que a disposição da Tenda fora do acampamento seja

fundada na reação de Iahweh ao Bezerro de Ouro. É que a local ização

ideal dela seria no centro , para f icar protegida de qualquer ataque de

possíveis inimigos:

" M o i s é s p e g o u a t e n d a e m o n t o u - a f o r a , a c e r t a d i s t â n c i a d o a c a m p a m e n t o , e d e u - l h e o n o m e d e T e n d a d e R e u n i ã o . A s s i m t o d o a q u e l e q u e i a c o n s u l t a r Ia h -

w e h , s a í a p a r a a T e n d a d e R e u n i ã o q u e e s t a v a f o r a d o a c a m p a m e n t o . Q u a n d o

M o i s é s s e d i r i g i a à t e n d a , o p o v o t o d o s e l e v a n t a v a e d e p é à p o r t a d a p r ó p r i a t e n d a , s e g u i n d o M o i s é s f i c a v a c o m o s o l h o s a t é e s t e e n t r a r n a t e n d a . D e p o i s q u e

M o i s é s e n t r a v a n a t e n d a , a c o l u n a d e n u v e n s b a i x a v a , f i c a n d o p a r a d a à e n t r a d a

d a t e n d a , e n q u a n t o Ia h w e h f a l a v a c o m M o i s é s . A o v e r a c o l u n a d e n u v e n s p a r a -

d a à e n t r a d a d a t e n d a , t o d o o p o v o s e l e v a n t a v a e c a d a u m s e p r o s t r a v a à e n t r a -

d a d a p r ó p r i a t e n d a . Ia h w e h f a l a v a f r e n t e a f r e n t e c o m M o i s é s , c o m o a l g u é m

q u e f a l a c o m s e u a m i g o . D e p o i s M o i s é s v o l t a v a p a r a o a c a m p a m e n t o . M a s s e u a j u d a n t e , o j o v e m J o s u é f i l h o d e N u n , n ã o s e a f a s t a v a d o i n t e r i o r d a t e n d a " ( E x

3 3 , 7 - 1 1 ) .

Claro está que foi uma instalação provisória onde o povo pod eria

"consul tar Iahweh de fora" e onde principalmente Moisés o faz ia "e n-

t rando nela , enquanto uma nuvem baixava até a entrada . Al i Iahweh

falava com ele, fren te a frente", mantendo -se Josué no interior , numa

espécie de pront idão e como um “primogêni to”, o Sacerdote , “de gua r-

da”. Numa dessas consul tas , quis Moisés no estado de ânimo em que

se encontrava e ainda atordoado pela sedição ocorrida conhecer se o

“Desígnio de Deus" sofrera alguma solução de cont inuidade ou ainda

se mant inha. Houve um instante de desorientação de Moisés , que f icou

temeroso de alguma reação de Ia hweh:

" M o i s é s d i s s e a Ia h w e h : “ O r a , t u m e d i z e s : „ F a z e s u b i r e s t e p o v o ‟ ; m a s n ã o m e i n d i c a s t e n i n g u é m p a r a m e a j u d a r n a m i s s ã o . N o e n t a n t o m e d i s s e s t e : „ E u t e c o -

n h e ç o p e l o n o m e e t u m e s m o g o z a s d o m e u f a v o r ‟ . S e f o r , p o i s , v e r d a d e q u e g o -

z o d e t e u f a v o r , f a z e - m e c o n h e c e r t e u s c a m i n h o s , p a r a q u e t e c o n h e ç a e a s s i m g o z e d e t e u f a v o r . C o n s i d e r a q u e e s t a n a ç ã o é o t e u p o v o ” . Ia h w e h r e s p o n d e u -

l h e : “ E u i r e i p e s s o a l m e n t e e t e d a r e i d e s c a n s o ” . M o i s é s r e s p o n d e u - l h e : “ S e n ã o

v e n s p e s s o a l m e n t e , n ã o n o s f a ç a s s u b i r d e s t e l u g a r . D o c o n t r á r i o , c o m o s e s a b e -r i a q u e e u e t e u p o v o g o z a m o s d e t e u f a v o r , s e n ã o p e l o f a t o d e c a m i n h a r e s c o -

n o s c o ? A s s i m , e u e t e u p o v o , s e r e m o s d i s t i n g u i d o s d e t o d o s o s p o v o s q u e v i v e m s o b r e a t e r r a ” . I a h w e h d i s s e a M o i s é s : “ F a r e i t a m b é m i s t o q u e p e d i s t e , p o i s g o -

z a s d e m e u f a v o r , e e u t e c o n h e ç o p e l o n o m e ” ( E x 3 3 , 1 2 - 1 7 ) .

"Moisés disse a Iahweh: „Ora, tu me dizes: „Faze subir es te p o-

vo‟; mas não me indicaste ninguém para me ajudar na missão" - isso

não poderia ser af i rmado em estado de t ranqüi l idade menta l após Ia h-

weh lhe haver di to que "enviaria na tua frente um anjo. . . " (Ex 33,2) . E

é até natural que Moisés es t eja ass im atordoado e confuso, po is es tava

no Monte Sinai em êxtase ou em contemplação recebendo os detalhes

do Santuário a ser erguido para Iahweh , quando explode o a to de sed i-

ção ou idólatra ("faze subir es te povo, mas não me indicas te ni nguém

para me ajudar na missão ” . . . se é verdade que gozo de teu favor f aça-

me conhecer teus caminhos ) . Nada mais i rreal e contrariando todos os

fatos havidos desde que foi vocaciona do no episódio da Sarça a rdente

em que Iahweh claramente lhe mostrara o seu Desígnio e em que Mo i-

80

sés deposi tara tanta fé. O diálogo parece ser somente mental de Moisés

que o cont inua até que se recompõe, reconhecendo o Desí gnio de Deus

real izando-se, inexoravelmente. E, desejoso de penetrar mais ainda no

mistério da natureza e divindade, pede para "conhecer teus caminhos"

e "a tua glória" mas recebe só o que Deus lhe quer dar:

" M o i s é s d i s s e : “ M o s t r a - m e a t u a g l ó r i a !” E I a h w e h r e s p o n d e u : “ F a r e i p a s s a r d i -a n t e d e t i t o d a a m i n h a b o n d a d e e p r o c l a m a r e i m e u n o m e , ' I a h w e h ' , n a t u a p r e -

s e n ç a , p o i s f a v o r e ç o a q u e m q u e r o f a v o r e c e r , e u s o d e m i s e r i c ó r d i a c o m q u e m

q u e r o u s a r d e m i s e r i c ó r d i a ” . E a c r e s c e n t o u : “ N ã o p o d e r á s v e r m i n h a f a c e , p o r -q u e n i n g u é m m e p o d e v e r e p e r m a n e c e r v i v o ” . Ia h w e h d i s s e : “ A í e s t á o l u g a r

p e r t o d e m i m ! T u e s t a r á s s o b r e a r o c h a . Q u a n d o a m i n h a g l ó r i a p a s s a r , e u t e p o -

r e i n a f e n d a d a r o c h a e t e c o b r i r e i c o m a m ã o e n q u a n t o p a s s o . Q u a n d o e u r e t i r a r a m ã o , v e r á s a s m i n h a s c o s t a s . M i n h a f a c e , p o r é m , n ã o s e p o d e v e r ” ( E x 3 3 , 1 9 -

2 3 ) .

Moisés não quer mais "falar com Deus face a face", es tando

Deus na forma da nuvem (Ex 33,9 -11), nem na forma de um fogo dev o-

rador (Ex 16,7.10; 24,16.17), mas sem mistérios e intermediários . No

entanto , nisso não pode ser atend ido pois o Homem não pode "ver

Deus e permanecer vivo" (Jo 1,18) , mas o que se pode d‟Ele ver ser -

lhe-á mostrado em toda a sua just iça e imparcial id ade:

“ F a r e i p a s s a r d i a n t e d e t i t o d a a m i n h a b o n d a d e e p r o c l a m a r e i m e u n o m e , ' I a h -w e h ' , n a t u a p r e s e n ç a , p o i s f a v o r e ç o a q u e m q u e r o f a v o r e c e r , e u s o d e m i s e r i -

c ó r d i a c o m q u e m q u e r o u s a r d e m i s e r i c ó r d i a ” ( E x 3 3 , 1 9 ) .

O que um homem pode ver da glória de Deus, até mesmo Moisés

que "lhe falava face a face" (Ex 33,9 -11) , é só o efei to de Sua Pass a-

gem ("verás as minhas costas; minha face, porém, não se pode ver")

s ignif icado em "toda a minha bondade com o que proclamarei meu n o-

me ' Iahweh ' na tua presença". Confirma -o como o Seu Enviado sempre

e l ivremente sem que ninguém O manipule, "pois favoreço a quem qu e-

ro favorecer , e uso de misericórdia com quem quer o usar de misericó r-

dia”, tal como a misericórdia que usou com os Israel i tas n esse episó-

dio não os punindo como se pensava que deveria ter fei to . Pelo menos

é ass im que São Paulo vai apl icar ess e t recho:

" Q u e d i r e m o s , p o i s ? H a v e r á i n j u s t i ç a e m D e u s ? D e m o d o a l g u m . P o r q u e d i s s e a M o i s é s : T e r e i m i s e r i c ó r d i a d e q u e m m e a p r o u v e r t e r m i s e r i c ó r d i a . T e r e i c o m -

p a i x ã o d e q u e m e u q u i s e r t e r c o m p a i x ã o . D e s t a f o r m a a e s c o l h a n ã o d e p e n d e d e q u e m a q u e r n e m d e q u e m c o r r e , m a s d a m i s e r i c ó r d i a d e D e u s . P o r i s s o d i z a

E s c r i t u r a a o F a r a ó : P r e c i s a m e n t e p a r a i s s o t e s u s c i t e i , p a r a m o s t r a r e m t i o m e u

p o d e r e p a r a d a r a c o n h e c e r m e u n o m e a t o d a a t e r r a . A s s i m D e u s t e m m i s e r i -c ó r d i a d e q u e m q u e r e é d u r o p a r a q u e m q u e r " ( R m 9 , 1 4 - 1 8 ) .

Assim é que, nesse sofr imento , Moisés teve o seu quinhão de

peni tência e recebe também a incumbência de "cortar duas tábuas de

pedra iguais à primeiras" , para que Iahweh escrevesse nelas o mesmo

Decálogo das anteriores (Dt 10,3 -4) , e subiu sozinho o Monte leva ndo-

as . Novamente em ret i ro e contemplação no Monte Sinai , Moisés vai

conhecer at r ibutos de Deus , num crescendo cada vez maior:

“ Ia h w e h d e s c e u n a n u v e m , p a r o u j u n t o d e l e e e l e p r o c l a m o u o n o m e d e Ia h w e h . .

E n q u a n t o Ia h w e h p a s s a v a d i a n t e d e l e , e x c l a m o u : “ Ia h w e h , Ia h w e h ! D e u s c o m -p a s s i v o e c l e m e n t e , p a c i e n t e , r i c o e m m i s e r i c ó r d i a e f i e l . E l e c o n s e r v a a b o n d a -

d e p o r m i l g e r a ç õ e s , e p e r d o a c u l p a s , r e b e l d i a s e p e c a d o s , m a s n ã o d e i x a i m p u -

81

n e s , c a s t i g a n d o a c u l p a d o s p a i s n o s f i l h o s e n e t o s a t é a t e r c e i r a e q u a r t a g e r a -ç ã o ” ( E x 3 4 , 5 - 7 ) .

"Deus compassivo e clemente, paciente, r ico em misericórdia e

f iel" - são os at r ibutos de Deus que Moisés passa a "conhecer", fruto

de sua vivência nos úl t imos acontecimentos a que se al ia aquela mes-

ma proporção entre a misericórdia e os possíveis cast igos de sua infl e-

x ível just iça quando a quiser apl icar , ou seja, na quela “relação de mil

para t rês ou quatro” . Ao que se percebe Moisés lutava também com o

receio de que a at i tude do Bezerro de Ouro, que lhe soava como um

ato por demais peca minoso, t rouxesse um rompimento da Aliança com

Iahweh:

" Im e d i a t a m e n t e M o i s é s c u r v o u - s e a t é o c h ã o e p r o s t r o u - s e e m a d o r a ç ã o . D e p o i s

d i s s e : “ Ia h w e h , s e é v e r d a d e q u e g o z o d e t e u f a v o r , q u e Ia h w e h c a m i n h e n o m e i o d e n ó s , p o r q u e e s s e é u m p o v o d e c a b e ç a d u r a . P e r d o a - n o s a s c u l p a s e o s

p e c a d o s , e r e c e b e - n o s c o m o p r o p r i e d a d e t u a ” ( E x 3 4 , 8 - 9 ) .

E Iahweh rat i f ica a Aliança apesar de tudo o que acontecera . A s-

sim é a misericórdia , inflex ível e justa , do Deus que dir ige a História

e não se sujei ta às cont ingências humanas pois confi rma a Missão de

Is rael com a difusão de Seu Nome e tanto corresponde como atende à

esperança de Moisés , que temia o abandono:

" Ia h w e h r e s p o n d e u : “ O l h a , e u v o u f a z e r u m a a l i a n ç a ! D i a n t e d e t o d o o t e u p o v o f a r e i p r o d í g i o s c o m o n u n c a s e f i z e r a m e m n e n h u m p a í s o u n a ç ã o , p a r a q u e t o d o s

o s p o v o s q u e t e c e r c a m v e j a m c o m o s ã o t e r r í v e i s a s o b r a s d e Ia h w e h , q u e e s t o u

p a r a f a z e r c o n t i g o . ( . . . ) I a h w e h d i s s e a M o i s é s : “ E s c r e v e e s t a s p a l a v r a s , p o i s b a s e a d o n e l a s f a ç o a l i a n ç a c o n t i g o e c o m Is r a e l ” . M o i s é s f i c o u a l i c o m Ia h w e h

q u a r e n t a d i a s e q u a r e n t a n o i t e s , s e m c o m e r p ã o n e m b e b e r á g u a , e e s c r e v e u n a s

t á b u a s a s p a l a v r a s d a a l i a n ç a , o s d e z m a n d a m e n t o s d a Le i " ( E x 3 4 , 1 0 - 2 8 ) .

Deus não muda, é sempre o mesmo (Hb 13,8) . Apesar de tudo , as

determinações a que se sujei tarão os Israel i tas se equiparam às anter i -

ores . São como uma repet ição resumida delas , a mesma exigência de

f idel idade a Iahweh , mantendo-se a mesma Missão de Is rael de errad i-

car o cul to pagão:

" G u a r d a b e m o q u e h o j e t e o r d e n o . E u e x p u l s a r e i d a t u a f r e n t e o s a m o r r e u s , o s

c a n a n e u s , o s h i t i t a s , o s f e r e z e u s , o s h e v e u s e o s j e b u s e u s . G u a r d a - t e d e f a z e r a -l i a n ç a c o m o s h a b i t a n t e s d o p a í s q u e i n v a d i r á s , p a r a q u e n ã o s e t o r n e m u m a a r -

m a d i l h a . A o c o n t r á r i o d e r r u b a r e i s o s a l t a r e s , q u e b r a r e i s a s e s t e l a s e c o r t a r e i s o s

t r o n c o s s a g r a d o s . P o r q u e n ã o d e v e r á s a d o r a r n e n h u m o u t r o D e u s , p o i s Ia h w e h s e d i z c i u m e n t o e d e f a t o é . N ã o f a ç a s a l i a n ç a c o m o s h a b i t a n t e s d o p a í s ! S e n ã o ,

q u a n d o s e p r o s t i t u í r e m c o m o s d e u s e s e l h e s o f e r e c e r e m s a c r i f í c i o s , e l e s t e c o n -

v i d a r i a m e t u c o m e r i a s d o s s e u s s a c r i f í c i o s ; t o m a r i a s s u a s f i l h a s p a r a c a s a r e m c o m t e u s f i l h o s , e q u a n d o e l a s s e p r o s t i t u í s s e m c o m s e u s d e u s e s , l e v a r i a m t a m -

b é m t e u s f i l h o s a s e p r o s t i t u í r e m c o m e l e s . N ã o f a r á s p a r a t i d e u s e s d e m e t a l

f u n d i d o " ( E x 3 4 , 1 1 - 1 7 ) .

“. . . quando se prost i tuí rem com os deuses e lhes oferecerem s a-

cri f ícios , eles te convidariam e tu comerias dos seus sacri f ícios; tom a-

rias suas f i lhas para casarem com teus f i lhos, e quando elas se prost i -

tuíssem com seus deuses , levariam também teus f i lhos a se prost i tu í -

rem com eles”, aqui se ret rata uma das principais causas dessa at i tude

de destruir o cul to pagão: a tão usada prost i tuição sagrada em que se

ofereciam o coi to feminino ou mascul ino em oferta ao deus pagão.

Também a f idel idade aos princípios concer nentes à celebração e man u-

82

tenção do cul to, à entrega das oferendas, "não se apresentando nunca

no santuário de mãos vazias", e às datas das comemor ações rel igiosas ,

aos sábados, dos primogêni tos etc. , prescrições essas que são rat i f ic a-

ções das anteriores (Ex 23,12.15.16.17.18.19.23 -33; 20,4.5.23; 22,28 -

29):

" G u a r d a r á s a f e s t a d o s á z i m o s . D u r a n t e s e t e d i a s c o m e r á s p ã o s e m f e r m e n t o , c o m o t e m a n d e i , n o t e m p o m a r c a d o d o m ê s d a s E s p i g a s . P o i s f o i n o m ê s d a s E s -

p i g a s q u e s a í s t e d o E g i t o . T o d o p r i m o g ê n i t o é m e u : t o d o s o s p r i m o g ê n i t o s m a -

c h o s d e t e u r e b a n h o , d a s v a c a s e o v e l h a s . R e s g a t a r á s o p r i m o g ê n i t o d o j u m e n t o , c o m u m a o v e l h a ; s e n ã o o r e s g a t a r e s , d e v e r á s q u e b r a r - l h e a n u c a . R e s g a t a r á s o

p r i m o g ê n i t o d e t e u s f i l h o s . N ã o t e a p r e s e n t a r á s d i a n t e d e m i m d e m ã o s v a z i a s .

D u r a n t e s e i s d i a s t r a b a lh a r á s e n o s é t i m o d e s c a n s a r á s , t a n t o n a é p o c a d o p l a n t i o c o m o n a d a c o l h e i t a . C e l e b r a r á s a f e s t a d a s S e m a n a s n o i n í c i o d a c o l h e i t a d o

t r i g o , e a f e s t a d a C o l h e i t a n o f i m d o a n o . T r ê s v e z e s p o r a n o t o d o s o s h o m e n s

d e v e r ã o c o m p a r e c e r d i a n t e d e I a h w e h , Ia h w e h o D e u s d e I s r a e l . E u e x p u l s a r e i d i a n t e d e t i a s n a ç õ e s e d i l a t a r e i t u a s f r o n t e i r a s ; a s s i m n i n g u é m c o b i ç a r á a t u a

t e r r a e n q u a n t o e s t i v e r e s s u b i n d o , t r ê s v e z e s p o r a n o , p a r a t e a p r e s e n t a r e s d i a n t e

d e Ia h w e h t e u D e u s . N ã o o f e r e c e r á s o s a n g u e d e m i n h a s v í t i m a s c o m p ã o f e r -

m e n t a d o . O s a c r i f í c i o d a f e s t a d a P á s c o a n ã o d e v e s o b r a r p a r a o d i a s e g u i n t e . 2 6

L e v a r á s à c a s a d e Ia h w e h t e u D e u s , o m e l h o r d o s p r i m e i r o s f r u t o s d o t e u s o l o .

N ã o c o z i n h a r á s u m c a b r i t o n o l e i t e d e s u a m ã e ” ( E x 3 4 , 1 8 - 2 6 ) .

Iahweh - Deus é quem agora vai escrever os Dez Mandamentos

nas tábuas de pedra lavradas por Moisés (Ex 34,1 / Dt 10,3 -5, não co-

mo sugere 34,27-28). O que Moisés escreve são as demais prescr ições .

Essas tábuas i rão para a Arca da Aliança. Moisés ao de scer do Monte

com as Tábuas da Lei nas mãos i rá "bri lhar - lançar raios de seu rosto"

a ponto de amedrontar os Israel i tas , motivo que o leva a "cobrir o ro s-

to que apresentava a semelhança de t razer chifres resplandecentes na

cabeça", tal como constava da V ulgata de São Jerônimo (Ex 34,29-35).

Tanto o "bri lho" como os "chifres" t raduzem a união com Iahweh tal

como a s ignif icação de estar representado no rosto de Moisés o P oder

e a Glória de Deus, fortalecendo a posição de seu elei to apesar da i n-

surreição hav ida:

" Q u a n d o M o i s é s d e s c e u d a m o n t a n h a d o S i n a i , t r a z e n d o n a m ã o a s d u a s t á b u a s

d a a l i a n ç a , n ã o s a b i a q u e a p e l e d e s u a f a c e r e s p l a n d e c i a ( l a n ç a v a d e s i u n s r a i -

o s ) p o r t e r f a l a d o c o m Ia h w e h . A a r ã o e o s i s r a e l i t a s t o d o s , a o v e r e m c o m o r e s -p l a n d e c i a ( o u " l a n ç a v a d e s i o s r a i o s " ) a f a c e d e M o i s é s , t i v e r a m m e d o d e a p r o -

x i m a r - s e . E n t ã o M o i s é s o s c h a m o u , e A a r ã o c o m o s c h e f e s d a c o m u n i d a d e v o l t a -

r a m - s e , e e l e l h e s f a l o u . D e p o i s s e a p r o x i m a r a m o s d em a i s i s r a e l i t a s , e M o i s é s l h e s t r a n s m i t i u t o d a s a s o r d e n s q u e Ia h w e h l h e t i n h a d a d o n o m o n t e S i n a i .

Q u a n d o M o i s é s a c a b o u d e f a l a r , p ô s u m v é u s o b r e o r o s t o . Q u a n d o M o i s é s s e a p r e s e n t a v a a Ia h w e h p a r a f a l a r , r e t i r a v a o v é u , a t é s a i r ; d e p o i s s a í a e d i z i a a o s

i s r a e l i t a s o q u e l h e t i n h a s i d o m a n d a d o . O s i s r a e l i t a s v i a m a f a c e r a d i a n t e ( o u

" q u e l a n ç a v a d e s i u n s r a i o s " ) d e M o i s é s , e M o i s é s t o r n a v a d ep o i s a c o b r i r o r o s t o c o m o v é u , a t é i r f a l a r d e n o v o c o m Ia h w e h " ( E x 3 4 , 2 9 - 3 5 ) .

São Paulo i rá se referi r a esse fato quando anal isar a causa da

incredul idade dos judeus quanto à m essianidade de Jesus Cris to, vi n-

culando-a como condição para se compree nder as Escri turas :

" T a l é a c o n f i a n ç a q u e t e m o s e m D e u s p o r C r i s t o . N ã o q u e p o r p r ó p r i a f o r ç a s e -

j a m o s c a p a z e s d e p e n s a r a l g u m a c o i s a c o m o d e n ó s m e s m o s . N o s s a c a p a c i d a d e v e m d e D e u s . E l e é q u e n o s c a p a c i t o u c o m o m i n i s t r o s d a n o v a a l i a n ç a , n ã o d a

l e t r a , m a s d o E s p í r i t o . P o i s a l e t r a m a t a e o e s p í r i t o d á v i d a . P o i s , s e o m i n i s t é -

r i o d a m o r t e , g r a v a d o e m l e t r a s d e p e d r a , s e r e v e s t i u d e t a l g l ó r i a q u e o s i s r a e -l i t a s n ã o p o d i a m f i x a r o s o l h o s n o r o s t o d e M o i s é s , p o r c a u s a d o e s p l e n d o r d e

s u a f a c e , q u e e r a t r a n s i t ó r i o , c o m o n ã o s e r á d e m a i o r g l ó r i a o m i n i s t é r i o d o E s -

p í r i t o ? S e o m i n i s t é r i o d a c o n d e n a ç ã o j á f o i g l o r i o s o , m u i t o m a i s o u l t r a p a s s a r á e m g l ó r i a o m i n i s t é r i o d a j u s t i ç a . E , e m v e r d a d e , o q u e f o i g l o r i o s o d e m o d o

p a r c i a l , d e i x a d e o s e r , c o m p a r a d o c o m e s t a o u t r a g l ó r i a e m i n e n t e . P o r q u e , s e o

83

t r a n s i t ó r i o f o i g l o r i o s o , m u i t o m a i s o s e r á o q u e p e r m a n e c e . D e p o s s e d e t a l e s -p e r a n ç a , p r o c e d e m o s c o m p l e n a f r a n q u e z a . N ã o f a z e m o s c o m o M o i s é s , q u e c o -

b r i a o r o s t o c o m u m v é u p a r a q u e o s i s r a e l i t a s n ã o v i s s e m o f i m d a g l ó r i a q u e

s e d e s v a n e c i a . E m c o n s e q ü ê n c i a , a i n t e l i g ê n c i a d e l e s p e r m a n e c e u o b s c u r e c i d a . A i n d a a g o r a , q u a n d o l ê e m o A n t i g o T e s t a m e n t o , e s s e m e s m o v é u p e r m a n e c e c e r -

r a d o , p o r q u e s ó e m C r i s t o é q u e d e v e s e r a b e r t o . P o r i s s o a t é o d i a d e h o j e ,

q u a n d o l ê e m M o i s é s u m v é u l h e s c o b r e o c o r a ç ã o . T a l v é u s ó l h e s s e r á t i r a d o q u a n d o s e c o n v e r t e r e m a o S e n h o r . O S e n h o r é o E s p í r i t o e o n d e e s t á o E s p í r i t o

d o S e n h o r , h á l i b e r d a d e . T o d o s n ó s , d e f a c e d e s c o b e r t a , r e f l e t i m o s a g l ó r i a d o

S e n h o r , c o m o u m e s p e l h o , e n o s v e m o s t r a n s f o r m a d o s n e s t a m e s m a i m a g e m , s e m p r e m a i s g l o r i o s a , p e l a a ç ã o d o S e n h o r , q u e é E s p í r i t o " ( 2 C o r 3 - 1 8 ) .

2.16. - A EREÇÃO E CONSAGRAÇÃO DO SANTUÁRIO E DO SACERDÓCIO

A envergadura dos homens que compõem a História da Salvação

é respei tável por demais . As personal idades até agora vis tas , Abraão

passando por Isaac e pelo vigor de um manso Jacó , todos e com a in-

f lex ível obst inação comum pelo mesmo Deus , vão ecoar em José do

Egi to e culminam em Moisés . A luta que t ravaram contra tudo e co ntra

todos , sozinhos e perseguidos tant as vezes , suas vi tórias à sombra da

proteção de Deus que lhes abonou o v igor e a tenacidade , deu-lhes

como resposta à fé que n‟Ele deposi taram , a capacidade de suportar

tudo sem esmorecer . Fibra invejável , sant idade indiscut ível e fé inab a-

lável . Creram, e tal como creram, viveram. Eram já a expressão prévia

do próprio Povo a que dariam origem , dos seus descendentes que co m-

part i lhariam a mesma obst inação e até mesmo quando aqui e acolá fos-

sem julgados eram "um povo de dura cerviz" (Ex 32,9.22; 33,3; 34,9) .

Mas essa "dureza" t inha duas al ternat ivas ou dois lados, já que se ma-

nifestava também pela unicidade de fé e f idel idade a Iahweh , mesmo

quando postas à prova em simples l ances de desprendimento mat erial :

" M o i s é s f a l o u a t o d a a c o m u n i d a d e d o s i s r a e l i t a s e l h e s d i s s e : “ F o i i s t o o q u e I a h w e h m a n d o u : F a z e i e n t r e v ó s u m a c o l e t a p a r a Ia h w e h . Q u e m f o r g e n e r o s o

l e v a r á u m a o f e r e n d a a Ia h w e h : o u r o , p r a t a , b r o n z e , p ú r p u r a v i o l á c e a , v e r m e l h a

e c a r m e s i m , l i n h o f i n o , c r i n a s d e c a b r a , p e l e s . . . T o d o s o s a r t e s ã o s h a b i l i d o s o s v e n h a m p a r a e x e c u t a r t u d o o q u e o Ia h w e h m a n d o u : a m o r a d a c o m a t e n d a e a

c o b e r t u r a , a s a r g o l a s , ( . . . ) ; o a l t a r d o s h o l o c a u s t o s , c o m a g r e l h a d e b r o n z e , o s

v a r a i s e t o d o s o s u t e n s í l i o s ; a b a c i a e ( . . . ) , a s v e s t e s l i t ú r g i c a s p a r a o s a c e r d o t e A a r ã o , e a s v e s t e s d o s f i l h o s p a r a a s f u n ç õ e s s a c e r d o t a i s ” . E n t ã o t o d a a c o m u -

n i d a d e d o s i s r a e l i t a s s e r e t i r o u d a p r e s e n ç a d e M o i s é s . E m s e g u i d a v i e r a m t o d o s

c u j o c o r a ç ã o o s m o v i a , e c u j o â n i m o o s i m p e l i a , t r a z e n d o o f e r t a s a Ia h w e h p a r a a s o b r a s d a t e n d a d e r e u n i ã o , p a r a o c u l t o e m g e r a l , e p a r a a s v e s t e s l i t ú r g i c a s .

V i e r a m h o m e n s e m u l h e r e s , e t o d o s g e n e r o s a m e n t e t r a z i a m b r o c h e s , b r i n c o s ,

a n é i s , c o l a r e s e t o d a s o r t e d e o b j e t o s d e o u r o , q u e c a d a u m a p r e s e n t a v a c o m o o f e r t a a Ia h w e h . T o d o s q u a n t o s t i n h a m c o n s i g o p ú r p u r a ( . . . ) . O s q u e d e s e j a v a m

f a z e r o f e r t a s d e p r a t a o u d e b r o n z e t r o u x e r a m - n a s a I a h w e h . O m e s m o f i z e r a m

o s q u e t i n h a m m a d e i r a d e a c á c i a p a r a a s v á r i a s o b r a s d a c o n s t r u ç ã o . T o d a s a s m u l h e r e s q u e t i n h a m h a b i l i d a d e p a r a a t e c e l a g e m t e c e r a m e t r o u x e r a m o s t e c i -

d o s : a p ú r p u r a v i o l á c e a , v e r m e l h a e c a r m e s i m , e o l i n h o f i n o . T o d a s a s m u l h e -

r e s b e m d i s p o s t a s e d o t a d a s p a r a t a n t o t e c e r a m c r i n a s d e c a b r a . O s c h e f e s d o p o v o t r o u x e r a m p e d r a s d e ô n i x e p e d r a s d e e n g a s t e p a r a o e f o d e o p e i t o r a l , o s

p e r f u m e s e o a z e i t e p a r a o c a n d e l a b r o , p a r a o ó l e o d e u n ç ã o e p a r a o i n c e n s o

a r o m á t i c o . T o d o s o s i s r a e l i t a s , h o m e n s e m u l h e r e s , d i s p o s t o s a c o n t r i b u i r p a r a a s o b r a s q u e Ia h w e h t i n h a m a n d a d o e x e c u t a r p o r m e i o d e M o i s é s , t r o u x e r a m a

I a h w e h c o n t r i b u i ç õ e s e s p o n t â n e a s . . . " ( E x 3 5 , 4 - 3 5 ) .

A generosidade com que se apresentaram os Israel i tas das várias

especial idades evidencia a sua f idel idade "obst inada" a Iahweh, mo s-

t rando também que a at i tude tomada com o Bezerro de Ouro não pode

ter s ido um ato de absoluta rebeldia e rejeição, mas uma sedição de

84

colorido cul tural de projeção apenas "pol í t ica". Essa generosidade foi

tamanha que exigiu um pedido de interrupção das oferendas para o

Santuário:

" M a s c a d a m a n h ã o p o v o c o n t i n u a v a t r a z e n d o a M o i s é s o f e r t a s e s p o n t â n e a s , d e m o d o q u e o s a r t í f i c e s q u e f a z i a m a s o b r a s d o s a n t u á r i o d e i x a r a m o t r a b a l h o e

v i e r a m d i z e r a M o i s é s : “ O p o v o t r a z m u i t o m a i s q u e o n e c e s s á r i o p a r a e x e c u t a r

a c o n s t r u ç ã o q u e Ia h w e h m a n d o u f a z e r ” . E n t ã o M o i s é s m a n d o u q u e s e p u b l i c a s -s e n o a c a m p a m e n t o a s e g u i n t e o r d e m : “ N i n g u é m m a i s , n e m h o m e m n e m m u l h e r ,

p r o m o v a c a m p a n h a s p a r a a c o l e t a d o s a n t u á r i o ” . E o p o v o d e i x o u d e t r a z e r o f e r -

t a s . O m a t e r i a l j á e r a s u f i c i e n t e p a r a t o d o s o s t r a b a l h o s q u e s e d e v i a m e x e c u t a r , e a t é s o b r a v a " ( E x 3 6 , 3 - 7 ) .

Assim é que se começam a real iza r os trabalhos conforme proj e-

tados e apresentados por Moisés , f indo o seu retorno do ret i ro conte m-

plat ivo e descrevendo-os na ordem cronológica de sua apresentação

vindo as ci tações en tre parêntesis fei tas na ordem: primeiro a constru-

ção e depois a descrição separados pela barra ( / ) . . A começar com as

cort inas do Tabernáculo (Ex 36,8-19 / Ex 26,1-13), a coberta de peles

e as tábuas (Ex 36,20 -34 / Ex 26,14-30), o Véu e as colunas (Ex 36,35-

38 / Ex 26,31-37), a Arca da Aliança (Ex 37,1 -5 / Ex 25,10-16), o

Propiciatório e os Dois Querubins (Ex 37,6 -9 / Ex 25,17-22) , a Mesa e

seus utensí l ios (Ex 37,10 -16 / Ex 25,23-30), o Candelabro de ouro p u-

ro (Ex 37,17-24 / 25,31-40), o Altar do Incens o (Ex 37,25-28 / Ex

30,1-10), o Óleo Sagrado da Unção e o Incenso Santo (Ex 37,29 / Ex

30,22-38), o Altar dos Holocaustos (Ex 38,1 -7 / Ex 27,1-8) , a Bacia de

Bronze (Ex 38,8 / Ex 30,17 -21), o Átrio (Ex 38,9 -20 / Ex 27,9-19) ,

completando a Obra do Santuário com um Inventário f inal do material

gasto e f inalmente as Vestes e os Par amentos dos Sacerdotes (Ex 39,1 -

31 / Ex 28,1-43). Apresentou-se toda a Obra a Moisés que a determ i-

nara (Ex 39,32-43 / Ex 35,10-19):

" O s i s r a e l i t a s e x e c u t a r a m t o d o s o s t r a b a l h o s e x a t a m e n t e c o m o Ia h w e h t i n h a o r -

d e n a d o a M o i s é s . M o i s é s e x a m i n o u t o d a a c o n s t r u ç ã o e v i u q u e a f i z e r a m e x a -t a m e n t e c o m o Ia h w e h t i n h a m a n d a d o a M o i s é s , e o s a b e n ç o o u " ( E x 3 9 , 4 2 - 4 3 ) .

Esse úl t imo t recho nos faz lembrar outr o que tem a mesma cono-

tação de se at ingir determinada f inal idade a que toda a obra se dest i -

nava:

" E D e u s v i u t u d o q u a n t o h a v i a f e i t o e a c h o u q u e e s t a v a m u i t o b o m " ( G n 1 , 3 1 ) / " M o i s é s e x a m i n o u t o d a a c o n s t r u ç ã o e v i u q u e a f i z e r a m e x a t a m e n t e c o m o Ia h -

w e h t i n h a m a n d a d o " ( E x 3 9 , 4 2 ) .

Tudo o que de material era necessário para a construção do Sa n-

tuário, Tabernáculo ou "Habi tação de Iahweh" estava pronto e foi por

Moisés entregue a Iahweh que determina a sua e dif icação consumando-

se a Obra:

" Ia h w e h f a l o u a M o i s é s , d i z e n d o : “ N o p r i m e i r o d i a d o p r i m e i r o m ê s l e v a n t a r á s a m o r a d a , a t en d a d e r e u n i ã o . P o r á s a l i a A r c a d a A l i a n ç a , e a c o b r i r á s c o m o

V é u . In t r o d u z i r á s a M e s a , e a d e i x a r á s p o s t a ; l e v a r á s o C a n d e l a b r o , e c o l o c a r á s

a s Lâ m p a d a s ; p o r á s o A l t a r d e O u r o p a r a o I n c e n s o d i a n t e d a A r c a d a A l i a n ç a , e p e n d u r a r á s a C o r t i n a n a E n t r a d a d o S a n t u á r i o . P o r á s o A l t a r d o s H o l o c a u s t o s

d i a n t e d a E n t r a d a d o S a n t u á r i o ( d a M o r a d a ) , d a T e n d a d e R e u n i ã o . C o l o c a r á s a

B a c i a e n t r e a T e n d a d e R e u n i ã o e o A l t a r , e p o r á s á g u a ; d i s p o r á s o Á t r i o e m t o r n o , e p o r á s a C o r t i n a n a e n t r a d a d o Á t r i o " ( E x 4 0 , 1 - 7 ) .

85

Porém, a parte material apenas não basta, fal ta a parte principal ,

o objet ivo de toda a Obra: - prepará-la para at ingir a Sant i f icação, p e-

la comunhão com Iahweh, organizando -se o Sacri f ício . É o que vem a

seguir :

" P e g a r á s o ó l e o d e u n ç ã o , u n g i r á s a m o r a d a ( o u S a n t u á r i o ) e t u d o o q u e n e l a e s -t i v e r , c o n s a g r a n d o - a a s s i m c o m t o d o s o s p e r t e n c e s , e e l a s e r á s a n t a . U n g i r á s o

a l t a r d o s h o l o c a u s t o s e t o d o s o s u t e n s í l i o s , c o n s a g r a n d o a s s i m p a r a q u e s e j a

s a n t í s s i m o . U n g i r á s a b a c i a c o m a b a s e , p a r a c o n s a g r á - l a " ( E x 4 0 , 9 - 1 1 ) .

Deve-se reafi rmar o s ignif icado dessa Unção com o Óleo Sagr a-

do: a "consagração do que for tocado por ele para que seja sant íss i -

mo", incluindo-se então o Sacerdócio para o qual foi " separado" "Aa-

rão e seus f i lhos":

" F a r á s d i s t o u m ó l e o p a r a a u n ç ã o s a g r a d a , u m a m i s t u r a d e e s p e c i a r i a s p r e p a r a -

d a s e g u n d o a a r t e d a p e r f u m a r i a . S e r á e s t e o ó l e o p a r a a u n ç ã o s a g r a d a . U n g i r á s

a t e n d a d e r e u n i ã o , a a r c a d a a l i a n ç a , a m e s a c o m t o d o s o s a p e t r e c h o s , o c a n d e -l a b r o c o m o s u t e n s í l i o s , o a l t a r d o i n c e n s o , o a l t a r d o s h o l o c a u s t o s c o m o s u t e n -

s í l i o s , b e m c o m o a b a c i a c o m o s u p o r t e . A s s i m o s c o n s a g r a r á s e s e r ã o s a n t í s s i -

m o s ; t u d o o q u e o s t o c a r s e r á s a n t o . U n g i r á s t a m b é m A a r ã o e o s f i l h o s , c o n s a -g r a n d o - o s p a r a m e s e r v i r e m c o m o s a c e r d o t e s " ( E x 3 0 , 2 5 - 3 0 ) .

At inge-se o ponto central de toda a Obra, a invest idura dos s a-

cerdotes , sem os quais não há sacri f ício (Hb 8,3) e nada do que se fez

poderia levar à comunhão com Deus , pe la Sant idade ensejada:

" M a n d a r á s A a r ã o e s e u s f i l h o s a p r o x i m a r - s e d a e n t r a d a d a t e n d a d e r e u n i ã o e o s

l a v a r á s c o m á g u a . D e p o i s r e v e s t i r á s A a r ã o c o m a s v e s t e s l i t ú r g i c a s , e o u n g i r á s c o n s a g r a n d o - o p a r a q u e m e s i r v a c o m o s a c e r d o t e . F a r á s o s f i l h o s a p r o x i m a r - s e

e , d e p o i s d e r e v e s t i - l o s c o m a s t ú n i c a s , o s u n g i r á s c o m o u n g i s t e o p a i , p a r a q u e

m e s i r v a m c o m o s a c e r d o t e s . E s t a u n ç ã o c o n f e r i r - l h e s - á o s a c e r d ó c i o p e r p é t u o

p o r t o d a s a s g e r a ç õ e s ” ( E x 4 0 , 1 2 - 1 5 ) .

" . . . revest irás Aarão com as vestes l i túrgicas, e o ungirás co n-

sagrando-o para que me s irva como sacerdote; e , farás os f i lhos apro-

ximar-se e, depois de revest i - los com as túnicas, os ungirás para que

me s irvam como sacerdotes . Esta unção conferir - lhes-á o sacerdócio

perpétuo por todas as gerações ” - após isso, o narrador considera f i -

nal izada da Obra da Habi tação. Em seguida vem a "montagem" de t odo

o Tabernáculo , coordenada por Moisés , juntando-se uma a uma as p e-

ças e dispondo os móveis e utensí l ios nos respect ivos locais planej a-

dos:

" N o d i a p r i m e i r o d o p r i m e i r o m ê s d o s e g u n d o a n o , f o i e r i g i d a a m o r a d a . M o i s é s l e v a n t o u a m o r a d a , c o l o c o u a s b a s e s e a s t á b u a s , a s s e n t o u a s t r a v e s -

s a s e e r g u e u a s c o l u n a s . E s t e n d e u a t e n d a s o b r e a m o r a d a e p ô s p o r c i m a a

c o b e r t u r a d a t en d a , c o m o I a h w e h l h e h a v i a m a n d a d o . P e g o u o d o c u m e n t o d a a l i a n ç a e o c o l o c o u d e n t r o d a a r c a , m e t e u o s v a r a i s n a a r c a e p ô s p o r c i m a

d e l a o p r o p i c i a t ó r i o . In t r o d u z i u a a r c a n a m o r a d a e p en d u r o u o v é u d e p r o t e -

ç ã o , o c u l t a n d o a a r c a d a a l i a n ç a , c o m o Ia h w e h t i n h a m a n d a d o a M o i s é s . D e -p o i s i n s t a l o u n a t e n d a d e r e u n i ã o a m e s a , n o f l a n c o n o r t e d a m o r a d a , d o l a d o

d e f o r a d o v é u ; e a r r u m o u s o b r e e l a o s p ã e s c o n s a g r a d o s a Ia h w e h , a s s i m

c o m o Ia h w e h t i n h a m a n d a d o a M o i s é s . P ô s o c a n d e l a b r o n a t e n d a d e r e u n i ã o , d e f r o n t e d a m e s a , n o f l a n c o s u l d a m o r a d a . E m c i m a a c e n d e u a s l â m p a d a s d i -

a n t e d e Ia h w e h , a s s i m c o m o Ia h w e h h a v i a m a n d a d o a M o i s é s . C o l o c o u o a l t a r

d e o u r o n a t e n d a d e r e u n i ã o , d i a n t e d o v é u , e q u e i m o u o i n c e n s o a r o m á t i c o , a s s i m c o m o Ia h w e h h a v i a m a n d a d o a M o i s é s . P e n d u r o u a c o r t i n a n a e n t r a d a

d a m o r a d a " ( E x 4 0 , 1 7 - 2 8 ) .

86

"Pegarás o óleo de unção, ungirás a morada (ou o Santuário ) e

tudo o que nela est iver , consagrando -a assim com todos os pertences,

e ela será santa. Ungirás o al tar dos holocaustos e todos os utens í-

l ios , consagrando assim para que seja sant íss imo. Ungirás a bacia

com a base, para consagrá -la" (Ex 40,9-11) - "Moisés executou tudo

exatamente como Iahweh lhe havia ordenado" (Ex 40,16) - Isso fei to ,

tendo "ungido" toda "a morada e tudo o que nela es tava" (Ex 40,9) ,

Moisés inaugura e oficial iza o cul to , com um holocausto e a oblação

que oferece:

" D i a n t e d a e n t r a d a d o S a n t u á r i o , d a t e n d a d e r e u n i ã o , c o l o c o u o a l t a r d o s h o -l o c a u s t o s , e o f e r e c e u o h o l o c a u s t o e a o b l a ç ã o , a s s i m c o m o S e n h o r t i n h a

m a n d a d o a M o i s é s . In s t a l o u a b a c i a e n t r e a t e n d a d e r e u n i ã o e o a l t a r , e p ô s

a á g u a p a r a a s a b l u ç õ e s , o n d e M o i s é s , A a r ã o e o s f i l h o s l a v a v a m a s m ã o s e o s p é s . La v a v a m - s e t o d a v e z q u e e n t r a v a m n a t e n d a d e r e u n i ã o e s e a p r o x i -

m a v a m d o a l t a r , a s s i m c o m o I a h w e h h a v i a m a n d a d o a M o i s é s . L e v a n t o u o á -

t r i o e m t o r n o d a m o r a d a e d o a l t a r , e p e n d u r o u a c o r t i n a n a e n t r a d a d o á t r i o . A s s i m M o i s é s d e u p o r c o n c lu í d a a o b r a " ( E x 4 0 , 2 0 - 3 3 ) .

"Assim Moisés deu por concluída a obra" (E x 40,33) e tão lo-

go isso sucede Iahweh se manifesta, se ex terioriza na "nuvem" (Ex

13,21-22) e toma posse do santu ário:

" E n t ã o a n u v e m e n v o l v e u a t e n d a d e r e u n i ã o , e a g l ó r i a Ia h w e h t o m o u c o n t a

d a m o r a d a . M o i s é s n ã o p o d i a e n t r a r n a t e n d a d e r e u n i ã o , p o r q u e s o b r e e l a

r e p o u s a v a a n u v e m , e a g l ó r i a d e Ia h w e h o c u p a v a a m o r a d a . E m t o d a s a s e t a -p a s d a v i a g e m o s i s r a e l i t a s p u n h a m - s e e m m o v i m e n t o s e m p r e q u e a n u v e m s e

e l e v a v a d e c i m a d a m o r a d a ; n u n c a p a r t i a m a n t e s q u e a n u v e m s e l e v a n t a s s e .

D e f a t o , a n u v e m d e Ia h w e h f i c a v a d u r a n t e o d i a s o b r e a m o r a d a , e d u r a n t e a n o i t e h a v i a u m f o g o v i s í v e l a t o d o s o s i s r a e l i t a s , a o l o n g o d e t o d a s a s e t a p a s

d a v i a g e m " ( E x 4 0 , 1 6 - 3 8 ) .

Nuvem, s inal v is íve l da Glória de Iahweh (Ex 13,21 -22; 16,10;

24,15-18 / Nm 9,15-23) , que conduzirá o Povo de Deus à Terra Prom e-

t ida, - mais uma etapa cumprida do Des ígnio de Deus, para reconduzir

o Homem ao lugar dele no Paraíso, - es tabelecendo os princípios bás i -

cos da comunhão , a part i r do Cul to a Iahweh. Ess e Cul to vai culminar

no Sacri f ício, o Centro Gravi tacional desde os Patr iarcas , f igura do

defini t ivo de Jesus Cris to . O cerimonial Eucarís t ico que lhe corre s -

ponde, nas Igrejas Orientais , Angl icana e Catól ica e em outras deno-

minações Cris tãs , é ainda cercado e ornamentado de paramentos, de

utensí l ios e até mesmo de r i tuais aqui inspirados. Sem o seu conhec i-

mento não se vai entendê -los parecendo tudo uma encenação fora de

propósi to , de época e sem sent ido. Principalm ente pelo desconhec i -

mento do Sacri f ício, que será objeto principal e tema central do L ivro

que se es tudará em seguida.

Fonte: www.mundocatol i co.com.br/Bib l ia/curso.htm