acta reumatológica portuguesa · editorial história breve do tratamento da artrite reumatóide...

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Publicação Trimestral • ISSN: 0303-464X • 4,98 Acta Reumatológica Portuguesa Vol 26 • Nº3 Julho/Setembro 2001

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Acta

Reumatológica

Portuguesa

Vol 26 • Nº3Julho/Setembro 2001

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Acta Reumatológica

Portuguesa

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RedacçãoSociedade Portuguesa de ReumatologiaRua D. Estefânia 177, 1º D1000-154 Lisboa

RegistoInscrita no I.C.S. com o nº 101.897

Depósito Legal: 86.955/95

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Tiragem: 7.500 exemplares

Preço: 1.000$00 • 4,98 €

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Produção GráficaRita Correia

Periodicidade: Publicação Trimestral

Proibida a reprodução, mesmo parcial, de artigos e ilustrações, sem prévia autorização da Acta Reumatológica Portuguesa. Exceptua-se a citação ou transcrição de

pequenos excertos desde que se faça menção da fonte.

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D I R E C Ç Ã O

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acta reumatológica portuguesa

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S U M Á R I O / C O N T E N T S

E D I T O R I A L

História breve do tratamento da artrite reumatóide com 145fármacos modificadores da doença.As armas e a estratégia.

Brief history of disease modifying treatment in rheumatoid arthritis

Mário Viana de Queiróz

A Reumatologia vive momentos extremamente estimulantes de desenvolvimento técnico e tera-pêutico. Muitas das novas terapêuticas representam uma profunda mudança dos paradigmas quevêm conduzindo o tratamento da artrite reumatóide. A adaptação mais adequada exige, segura-mente, a reflexão apurada e a experiência que são apanágio do autor.

A R T I G O S O R I G I N A I S / O R I G I N A L P A P E R S

Sobrevida cumulativa das terapêuticas modificadoras de doença 163em doentes com artrite reumatóide do Instituto Português de Reumatologia

Cumulative survival of disease modifying drugs in patients with rheumatoid arthritis from Instituto Português de Reumatologia.

Paula Araújo, Manuela Parente, M. Jesus Mediavilla,Luís Miranda, Helena Santos, Eugénia Simões,Augusto Faustino, João Ramos, Cristina Catita

A exigência científica crescente da prática médica e a procura sistemática de excelência impõem umanecessidade de artigos que, como este, procedam a uma revisão crítica da experiência acumulada,apreciando o alcance e limitações das estratégias terapêuticas que propomos aos nossos pacientes.

L Í D E R E S D E O P I N I Ã O / O P I N I O N L E A D E R S

Micofenolato mofetil: uma opção terapêutica emergente no lúpus 153eritematoso sistémico

Mycophenolate mofetil: an emerging therapeutic option for systemic lupus erythematosus

Luís Sousa Inês, Michelle Petri

Apesar do enorme progresso conseguido na sobrevida e qualidade de vida dos doentes com lúpuseritematoso sistémico,frequentemente enfrentamos situações que questionam a eficácia e a tolerabili-dade das opções terapêuticas disponíveis. O advento de novas modalidades imunossupressoras nãopode, por isso, escapar à atenção dos Médicos que se ocupam destes pacientes. Este texto traz-nosrenovados motivos de esperança na apreciação crítica e experiência pessoal de Michelle Petri, umdos maiores expoentes mundiais nesta área, e do Dr. Luis Inês que com ela trabalhou recentemente.

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ÓRGÃO OF IC IAL DA SOC IEDADE PORTUGUESA DE REUMATOLOGIA

S U M Á R I O / C O N T E N T S

Exame neurológico em Reumatologia 201

Neurological examination in Rheumatology

Anabela Barcelos, José António P. Silva

A Reumatologia apresenta, enquanto especialidade, amplas e recortadas fronteiras com várias ou-tras especialidades com consequente enriquecimento bilateral.A apreciação de sinais e sintomasneurológicos é essencial à correcta interpretação e orientação de um grande número de casoscom apresentação primariamente músculo-esquelética. Este texto propõe uma abordagem estru-turada e prática para estes problemas.

IMAGENS EM REUMATOLOGIA / IMAGES IN RHEUMATOLOGY

Artralgias, febre e lesões cutâneas. Um exercício diagnóstico 213

Fever, arthralgia and cutaneous lesions.A diagnostic exercise

Bárbara Fernandes, José António P. Silva,Américo Figueiredo,Armando Porto

Casos reumatológicos, tal como se apresentam ao Médico prático, constituem um excelente exer-cício de aprendizagem e revisão de conceitos. Este artigo traz-nos um exemplo importado dasricas terras da fronteira dermato-reumatológica.

Prolactina e lúpus 189

Prolactin and lupus

Luis Cunha Miranda, Mª Jesus Mediavilla,Augusto Faustino e Mª Eugénia Simões

O esclarecimento das intricadas interacções entre o sistema imunológico e endocrinológico cons-titui um dos desenvolvimentos mais complexos e estimulantes observados na área das doençasautoimunes, ao longo dos últimos anos.As perspectivas fisiopatológicas e terapêuticas que assimse abrem não podem deixar de interessar o Reumatologista.

A R T I G O S D E R E V I S Ã O / R E V I E W S

Dor crónica: aspectos psicológicos, sociais e culturais (I) 171

Chronic pain: psychological, social and cultural aspects (I)

Manuel João R. Quartilho

A visão dicotómica clássica que distingue as doenças psicológicas e orgânicas não pode já resistirà evidência prática e científica demonstrando a profunda interpenetração que existe entre ambasas áreas. Esta verificação é particularmente evidente no âmbito da dor crónica, cuja abordagemnão pode ser completa, nem eficaz, fora de uma perspectiva bio-psico-social integradora, como aque nos propõe este trabalho, a continuar no próximo número.

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S U M Á R I O / C O N T E N T S

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REUMATOLOGIA EM MEDIC INA FAMIL IAR / RHEUMATOLOGY IN FAMILY PRACT ICE

Cintigrama osteoarticular: indicações principais e base de interpretação 217

Bone scintigraphy: major indications and interpretation

Margarida Cruz

O cintigrama osteoarticular pode constituir um excelente complemento para o diagnóstico clíni-co em Reumatologica. Mal usado ou interpretado, pode ter o efeito contrário. Como com todosos meios auxiliares é fundamental explorar-lhe cabalmente o alcance, sem descurar as limitaçõese as falsas pistas.

AGENDA NAC IONAL / NAT IONAL AGENDA

AGENDA INTERNAC IONAL / INTERNAT IONAL AGENDA

NORMAS DE PUBL ICAÇÃO / INSTRUCT IONS TO AUTHORS 239

Ombro doloroso 225

Painful shoulder

Maria João Salvador e José António P. da Silva.

O ombro doloroso constitui uma das situações clínicas mais frequentes em Reumatologia ambu-latória e Clínica Geral. O estudo semiológico constitui a chave para o diagnóstico, mas é funda-mental que interrogatório e exame objectivo sejam executados com estratégia definida e técnicaprecisa. É esta abordagem pragmática, na perspectiva do Médico de Família, que nos é apresenta-da neste texto.

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E D I T O R I A L

As armas

O primeiro D.M.A.R.D. (Disease Modifying Anti-rheumatic Drug) a ser usado no tratamento daartrite reumatóide (A.R.), em 1935, por J. Forestier,foi a aurotioglicose (sal de ouro)1.

O seu uso nesta doença fundamentou-se nofacto de desde 1927 se pensar que a AR podia serdevida a uma micobactéria que naquela altura sepensava ser suprimida pelos sais de ouro. Paraalém disso a aurotioglicose revelava alguma eficá-cia no tratamento da artrite da febre reumática eda endocardite.

O fármaco revelou-se eficaz no tratamento daAR1, não obstante só em 1961 o Empire Rheuma-tism Council o ter comprovado em estudo contro-lado e multicêntrico2. Infelizmente, ou porquedesde o início não se verificava resposta terapêu-tica, ou porque esta se verificava, mas cessava aofim de algum tempo de tratamento ou, ainda,porque os efeitos adversos obrigavam a inter-rompê-los, só uma minoria de doentes tomava ossais de ouro ao fim de 3 a 5 anos de tratamento3.Por outro lado, vários estudos demonstraram quea crisoterapia ao fim de cinco anos de tratamentonão modificava a história natural da artrite, sobre-tudo no que dizia respeito à capacidade fun-cional4. Continuaram, contudo, a usar-se pelomenos até ao início dos anos 80, altura em queforam destronados pelo metotrexato.

Pessoalmente tive uma longa experiência comos sais de ouro e, ainda hoje, volvidos 30 anos declínica reumatológica, tenho alguns doentes emremissão há largos anos com 50mg/mês de auro-tiomalato de sódio. Poder-se-à argumentar queesses doentes há muito entraram em remissão,

mas a verdade é que quando penso assim e inter-rompo a crisoterapia assisto, em geral, a umareactivação da doença.

Outro facto que tenho constatado é que quan-do há falência do fármaco, o que acontece nãoraramente por mais de uma vez, o mesmo retomaa sua actividade re-introduzindo-o, de novo, nadose de 50mg/semana durante seis meses.

Nunca tive nenhum caso mortal com o uso dossais de ouro, e o caso mais grave ocorrido numdoente meu foi uma grave depressão medularnum doente que simultaneamente tomava fe-nilbutazona, o que me deixou naturalmente con-fuso.

Utilizei muito, também, os sais de ouro nasartrites periféricas das espondilartrites sero-nega-tivas e ainda hoje os uso com bons resultados notratamento do reumatismo palindrómico quandoas crises se tornam muito frequentes e refractáriasao uso dos AINE ou dos corticosteróides em dosesbaixas. Já nos doentes com artrite reumatóideinfectados pelo vírus da hepatite C os resultadosobtidos têm sido controversos.

Os antimaláricos, mais concretamente, aquinacrina, foram utilizados pela primeira vez notratamento da artrite reumatóide em 1935 porWallace, que já anteriormente a usava no trata-mento do lúpus5.

Os primeiros estudos controlados com estesfármacos no tratamento da AR revelaram supres-são do processo inflamatório articular com acloroquina e a hidroxicloroquina6 ,7.

Desde sempre os antimaláricos têm sido usa-dos como fármaco de primeira escolha nas for-mas ligeiras de artrite reumatóide, e foi esse, tam-bém, o nosso comportamento até há alguns anosatrás, altura a partir da qual usamos sempre ometotrexato como fármaco de 1ª linha e procede-mos à sua substituição por antimaláricos quando

* Chefe de Serviço de Reumatologia do Hospital de S. Maria.Professor Associado/Agregado da Faculdade de Medicina de Lisboa

H I S T Ó R I A B R E V E D O T R AT A M E N T O

D A A R T R I T E R E U M AT Ó I D E C O M

F Á R M A C O S M O D I F I C A D O R E S D A D O E N Ç A .A S A R M A S E A E S T R AT É G I A .

Mário Viana de Queiroz*

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ao fim de 2 anos de tratamento a artritereumatóide continua benigna.

Os antimaláricos têm como efeito adversomais temível a retinopatia e, não obstante osoftalmologistas americanos afirmarem que comdoses baixas (500mg de cloroquina) ou 6-7 mg//kg/dia de hidroxicloroquina estes fármacos sãoseguros8, nós não estamos de acordo com estaasserção pois tivemos já vários casos de retinopa-tia em doentes com artrite reumatóide ou lúpussem jamais ultrapassarmos as doses conside-radas seguras pelos referidos oftalmologistas. Porisso, continuamos, também, a solicitar examesoftalmológicos semestrais e, por isso também,cada vez os utilizamos menos na AR, que não nolúpus onde os receitamos à quase totalidade dosdoentes.

A D-Penicilamina foi pela primeira vez em-pregue no tratamento da AR, em 1969, por Jaffe,fundamentando-se a sua acção na rotura daspontes dissulfito dos factores reumatóides IgM ena queda dos títulos séricos destes autoanticor-pos9.

Em estudos controlados então realizados com-provou-se que a D-Penicilamina era tão eficazcomo os sais de ouro ou a azatioprina10. Com apenicilamina aconteceu o mesmo que se haviaverificado anos antes com os sais de ouro, isto é,o fármaco começou a ser usado em doses altas(600mg/dia) com inúmeros efeitos adversos e ter-minou a ser empregue em doses de 250mg/diacom eficácia idêntica à obtida com as doses maiselevadas, o que levou Jaffe a afirmar: «Go slow, golow»9.

Tivemos uma larga experiência com este fár-maco durante mais de uma década, mas oaparecimento de efeitos adversos graves mesmousando doses baixas, como depressão medular,agranulocitose e aparecimento de doenças auto--imunes (miastenia gravis, polimiosite, lúpus eoutras) levaram-nos a abandoná-la no início dadécada de oitenta do século passado.

A sulfasalazina foi o primeiro fármaco a serdesenvolvido especificamente para o tratamentoda AR em 1939 por Nana Svartz, em Estocolmo,mas um estudo não controlado efectuado em1949 por Sinclair11 em que os resultados foramdesapontadores levou ao seu abandono durante30 anos. Aconteceu, porém, que em 1978 McConkey e colaboradores12 revelaram ser o fármacoeficaz no tratamento da AR o mesmo acontecen-do e mais tarde com outros Autores como New-

mann13, Pinals14 e outros. Na nossa experiência, desde que usada na dose

de 2g/dia, a sulfasalazina é um fármaco eficaz ebem tolerado, embora muito menos eficaz do queo metotrexato. Doses inferiores a 2g/dia são, emgeral, pouco eficazes.

Imunosupressores: o primeiro imunosupres-sor a ser utilizado no tratamento da artritereumatóide foi a mostarda nitrogenada, em 1951,por Jimenez Diaz15, abandonado por gravesefeitos adversos.

A azatioprina foi o segundo imunosupressor aser utilizado, em 1972, por Levy e colaboradores16

revelando-se nesse e em outros estudos um fár-maco eficaz no tratamento da AR17, 18. Usada ini-cialmente na dose de 150mg/dia, mostrou-seigualmente eficaz quando empregue na dose de75mg/dia17.

Usámo-la muito nas décadas de 70 e 80, alturaa partir da qual passamos a privilegiar o metotre-xato, mas ainda hoje temos doentes com pulmãoreumatóide perfeitamente controlados com estefármaco associado a pequenas doses de corti-costeróides.

A ciclofosfamida, um alquilante potente, foiusada no tratamento da artrite reumatóide, masabandonada em consequência da sua gravetoxicidade a longo termo, traduzida por efeitosadversos graves entre os quais se destaca oaparecimento de neoplasias19, o mesmo aconte-cendo com o clorambucil. Pessoalmente só uti-lizamos a ciclofosfamida nas formas graves,potencialmente fatais, de vasculite necrosantereumatóide, e o clorambucil nos raros casos quetratamos de amiloidose renal complicando aartrite idiopática juvenil.

Metotrexato: foi aprovado para o tratamentoda AR pela F.D.A. em 198720, mas todos nós já ousavamos desde meados da década de 80 após osexcelentes resultados relatados por Weinblatt21 eoutros22. O metotrexato é não só o fármaco maiseficaz para o tratamento da AR como aquele queao termo de 5 anos continua a ser útil a mais de50% dos doentes em comparação com os 15% a20% dos doentes tratados com outros D.M.A.R.D.23,24. Recentemente foi demonstrado que estefármaco retarda o aparecimento de erosões nosdoentes com AR25, e é susceptível de aumentar aesperança média de vida mesmo em doentes comformas avançadas da doença27.

O metotrexato tem diversos efeitos adversos, amaioria dos quais pode ser prevenido com a

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suplementação de ácido fólico. A pneumonitealérgica desencadeada pelo metotrexato é muitorara mas, também, muito grave e potencialmentefatal. Temos tido algumas complicações respi-ratórias, nenhuma delas fatal, atribuídas aometotrexato que melhoraram com a interrupçãoda terapêutica e a introdução da azatioprina.

Ciclosporina: foi utilizada pela 1ª vez no trata-mento da AR em 1979, com efeitos adversos bru-tais26. Posteriormente as doses foram reduzidaspara 5 - 2,5mg/kg/dia a partir de metade da déca-da de 80, com menos efeitos adversos, mas anefropatia que pode ser reversível ou irreversível,a hipertensão, a hipertricose e outros efeitosadversos têm limitado muito o seu uso. Não te-mos experiência com este fármaco no tratamen-to da AR.

Leflunamida: foi aprovada em 1998 nos Esta-dos Unidos da América do Norte para o trata-mento da AR. Em três estudos controlados efec-tuados; um nos EUA e no Canadá em que osdoentes tomavam 20mg/dia de leflunamida ver-sus 7,5-15mg/semana de metotrexato25; outro naEuropa em que os doentes tomavam 20mg/dia deleflunamida versus 2g/dia de sulfasalazida28; e umterceiro na Europa, Austrália e Nova Zelandia emque os doentes recebiam 10mg/dia de leflunami-da versus 7,5-15mg/semana de metotrexato29,revelaram que a leflunamida na dose de 20mg/dia é tão eficaz como o metotrexato e a sul-fasalazina, mas na dose de 10mg/dia é menos efi-caz do que o metotrexato. A leflunamida, talcomo o metotrexato, retarda o aparecimento deerosões ósseas25.

Na altura em que escrevemos este editorial nãoestá, ainda, comercializada em Portugal.

Terapêutica Combinada: Apesar de mais de50% dos doentes continuarem controlados com ometotrexato 5 anos depois deste fármaco ter sidoiniciado, justifica-se a terapêutica combinada nosrestantes doentes. A terapêutica combinada tempor objectivo aumentar a eficácia dos fármacosem associação sem aumentar, e se possível re-duzir, os seus efeitos adversos. Nos últimos anosvários esquemas têm sido utilizados tendo todoseles a particularidade de a droga âncora ser sem-pre o metotrexato. Em 1995 Tugwell associou ometotrexato à ciclosporina com aumento deeficácia e redução dos efeitos adversos30, o mes-mo acontecendo em 1996 com O’Dell ao associaro metotrexato à sulfasalazina e à hidroxicloro-quina31. Nos últimos anos com o aparecimento

dos antagonistas do TNF-a, quer o Infliximab32,quer o Etarnacept33 têm sido associados aometotrexato com aumento de eficácia e reduçãoda imunogenecidade.

Temos uma boa experiência com a associaçãotripla.

Antagonistas do TNF-a: O TNF-a é uma citoci-na pró-inflamatória que tem um papel impor-tante na patogenia da AR. Para além de ser acitocina mais pró-inflamatória, estimula a pro-dução de outras citocinas do mesmo sinal como aIL-1, a IL-6 e a IL-8. O TNF-a também induz a li-bertação de metaloproteases dos fibroblastos,condrócitos e neutrófilos e aumenta a expressãodas moléculas de adesão e a síntese de proteína Creactiva pelos hepatócitos. Contribui, pois, para ainflamação da sinovial e para a sua infiltraçãocom células mononucleares crónicas. O primeiroantagonista do TNF-a a ser aprovado pela F.D.A.foi o Etarnacept em Novembro de 1998, sendo osegundo o Infliximab em Novembro de 1999.

O Etarnacept é uma proteína de fusão doreceptor solúvel p.75 do TNF-a com o fragmentoFc da IgG humana. Esta proteína de fusão teve agrande vantagem de aumentar de 3 horas para 3dias a semi-vida plasmática do receptor solúvelp.75 do TNF-a. No soro esta proteína, sob a formade dímero, capta o TNF-a circulante impedindo asua acção sobre os receptores de uma grande va-riedade de células como os fibroblastos, os leu-cócitos e as células endoteliais.

O Etarnacept em vários estudos controlados34,35

revelou eficácia no ACR 20 em 75% dos doentes emelhoras mais modestas nos ACR 50 e ACR 70,sendo a tolerância boa. Posteriormente, o Etarna-cept foi administrado em associação ao meto-trexato, com aumento da sua eficácia e reduçãoda sua imunogenicidade33. Estes estudos tiveramuma duração de 6 meses, mas em 1999, no decur-so da reunião anual do American College ofRheumatology (A.C.R.)36 efectuada em Boston,foram relatados os resultados de um estudo alongo termo em 713 doentes seguidos longitudi-nalmente com uma exposição cumulativa ao fár-maco de 1152 doentes/ano. Os resultados dessetrabalho demonstraram que o Etarnacept manti-nha a eficácia revelada nos estudos anteriores,sem efeitos adversos adicionais, nomeadamenteprocessos infecciosos e neoplasias. Efectiva-mente, e no que concerne à malignidade, surgi-ram 9 casos quando o esperado calculado peloNational Cancer Institute Surveillance, Epidemio-

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logy and End Results (NCI SEER) era de 10,7. Ne-nhum dos doentes desenvolveu lúpus like nemanticorpos anticardiolipina.

O Etarnacept tem o seu uso aprovado noscasos de artrite reumatóide refractária a váriosD.M.A.R.D., sendo que um deles deve ser sempreo metotrexato potenciado até à dose de 15mg/semana. Recentemente o fármaco foi estudadoem doentes com artrite reumatóide precoce(estudo ERA)37. Neste estudo, englobando 632doentes com menos de 3 anos de duração da suaAR, estes foram divididos em três braços: o 1ºbraço incluía doentes a tomar Etarnacept na dosede 25mg, 2 vezes por semana, via sc e placebo oraluma vez por semana; o segundo braço incluíadoentes a tomar 10mg de Etarnacept 2 vezes porsemana, via sc e placebo e o 3º braço incluía osdoentes a tomar 7,5mg/semana de metotrexatoem dose rapidamente crescente até 20mg/se-mana e placebo. Todos os doentes receberam1mg/dia de ácido fólico. No que diz respeito aosresultados o Etarnacept foi superior ao metotre-xato ao fim de 6 e de 12 meses respectivamente.As interrupções do tratamento foram mais fre-quentes no grupo dos doentes a tomar metotre-xato. Os efeitos adversos foram idênticos exceptoa elevação das transaminases que foi mais fre-quente nos doentes submetidos ao tratamentocom o metotrexato. Verificou-se uma redução daprogressão da evolução das lesões radiológicasidêntica nos doentes a tomar Etarnacept emetotrexato em doses elevadas e maior nosdoentes a tomar Etarnacept, quando comparadoscom os doentes a tomar metotrexato em dosesbaixas.

O Infliximab é um anticorpo monoclonalquimérico (fragmento constante de imunoglobu-lina humana e porção variável de ratinho) comalta afinidade para o TNF-a. Os primeiros ensaiosclínicos efectuados38,39 revelaram eficácia e tole-rância idênticas às obtidas com o Etarnaceptquando o agente biológico foi utilizado emdoentes com artrite reumatóide refractária avários D.M.A.R.D. Tal como acontece com o Etar-nacept a eficácia é aumentada e a imunogenici-dade reduzida com a combinação com ometotrexato40. Posteriormente, num trabalhoefectuado em combinação com o metotrexato, oInfliximab revelou, também, reduzir a progressãoradiográfica da doença41.

Os resultados obtidos com os antagonistas doTNF-a são bons, por vezes excelentes. Para além

de muito caros (mil dólares/mês) é preciso nãoperder de vista que o TNF-a tem uma acção im-portante na vigilância tumoral, pelo que os seusefeitos a longo termo (5 anos) são desconhecidos.

Ao longo dos últimos 30 anos outros fármacosde acção lenta foram usados no tratamento daartrite reumatóide tendo sido abandonados porineficácia, como foi o caso da auranofina, ou peloaparecimento de efeitos adversos graves comoaconteceu, por exemplo, com o levamisol.

A estratégia

O primeiro paradigma da estratégia terapêuticada artrite reumatóide foi a pirâmide que se man-teve até 1990. Nessa estratégia o doente começa-va por ser tratado com repouso, medicina física ede reabilitação, ortóteses, ácido acetil-salicílico e,mais tarde, com outros anti-inflamatórios nãoesteróides. Se ao fim de algum tempo, que nuncaera curto, a doença não era controlável, adiciona-va-se à terapêutica os chamados fármacos desegunda linha, entre os quais se destacavam ossais de ouro parentéricos e os antimaláricos.Esperava-se mais algum tempo (nunca menos deseis meses) e se a doença continuava incontrolá-vel juntavam-se a azatioprina e/ou a ciclofos-famida e, por último, quando todas as armas uti-lizadas se mostravam insuficientes, os corti-costeróides por via sistémica como escreveuLightfoot em 1985 na, então, última edição doArthritis and Allied Conditions42. Como se veio acomprovar mais tarde, esta estratégia que nuncaseguimos (os corticosteróides na dose de 5mg/dia de prednisona e os sais de ouro parentéricosna dose de 50mg/semana durante seis semanas adecrescer ulteriormente, sempre foram por nósintroduzidos no início do diagnóstico, o que nãoé o mesmo que início da doença) foi uma tragédiapara os doentes e na sua manutenção não podedeixar de se lamentar que Copeman, um dosreumatologistas mais prestigiados de todos ostempos, tivesse contribuído para isso ao escreverem 1965, no seu livro de texto muito lido que«gold should never be the treatment of first choicein early cases, many of whom do remarkably wellon simple conservative measures»43. Entretanto, eno que diz respeito aos corticosteróides, dois tra-balhos recentes44,45 revelaram que os mesmos, emdoses baixas, retardaram o aparecimento deerosões radiológicas nos dois primeiros anos da

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doença. Nesta era negra da história do tratamento da

artrite reumatóide destacam-se como aspectospositivos dois factos: os avanços na cirurgiaortopédica e o uso progressivamente crescente ecada vez mais precoce do metotrexato, indiscu-tivelmente o fármaco de eleição no tratamentodesta doença.

Graças aos avanços da cirurgia ortopédica,nomeadamente ao avanço na técnica das artro-plastias totais, muitos doentes inválidos levamuma vida praticamente normal tendo melhoradomuito no que concerne à qualidade e, provavel-mente, também, no que diz respeito à quantidadede vida46.

Entretanto, no início da década de 90, Wolfe47 ePincus48 observando doentes com artrite reuma-tóide em unidades especializadas de reumatolo-gia verificaram, com espanto, que dez anosdepois do diagnóstico ter sido efectuado muitosdoentes jamais haviam tomado um fármaco de 2ªlinha e que os corticosteróides não eram usadospor uma larga percentagem de doentes. Com aintrodução da metrologia em reumatologia e ouso de questionários de avaliação do estado fun-cional dos doentes em ensaios de novos fármacoscomo Health Assessment Questionnaire (HAQ) e oArthritis Impact Measurement Scale (AIMS)49

tornou-se evidente que havia uma correlaçãopositiva entre a gravidade da doença e a sua mor-talidade50. Praticamente em simultaneidade comos trabalhos de Wolfe e de Pincus, Wilske e Healeypropuseram a remodelação da pirâmide, um con-ceito que segundo eles o tempo havia ultrapassa-do51 e propuseram um novo olhar sobre a estraté-gia terapêutica da artrite reumatóide52.

A nova estratégia (« step by the bridge») sugeri-da por Wilske e Healey fundamentava-se no mo-derno tratamento do cancro, isto é, início da tera-pêutica com uma combinação de fármacos como objectivo de obter a remissão da doença e, umavez esta conseguida, retirada progressiva e gra-dual dos fármacos usados de modo a conseguir--se a manutenção da remissão da artrite reuma-tóide com o menor número possível de drogas.De grande importância para a implementaçãodesta estratégia foi a concordância entusiásticade Mc Carty, um reumatologista com grandeprestígio, que a propósito da proposta de Wilske eHealey escreveu num célebre editorial do Journalof Rheumatology «supress rheumatoid inflamma-tion early and leave the pyramid to the egyp-

tians»53. À estratégia de Wilske e Healey entusias-ticamente apoiada por Mc Carty, Fries propôsuma outra estratégia alternativa baseada narecolha de dados do sistema ARAMIS, a qual lhepermitiu comprovar que os AINE eram, provavel-mente, tão ou mais tóxicos do que os fármacos desegunda linha. Essa estratégia («a saw-tooth stra-tegy») baseava-se no uso precoce e continuadodos D.M.A.R.D. com mudanças sequênciais paranovos D.M.A.R.D. sempre que os primeiros fa-lhavam, utilizando os AINE como fármacos adju-vantes e não como drogas de base54. Esta estraté-gia deu origem à terapêutica combinada55,56,57,58,com aumento da eficácia e redução dos efeitosadversos dos fármacos em combinação, quandocomparada com os mesmos em monoterapia edeu, também, origem a um novo paradigma: oobjectivo do tratamento da AR é obter a remissãoda doença.

Em resumo

O aparecimento de novos fármacos no decursodos últimos anos, e a mudança estratégica opera-da no tratamento da artrite reumatóide conduzi-ram à atitude consensual de que a inflamaçãoreumatóide deve ser controlada tão completa-mente e tão cedo quanto possível e mantida tãolongamente quanto possível, não obstante, einfelizmente, continuar a haver doentes refractá-rios a todas as terapêuticas. Por outro lado, é pre-ciso não esquecer que todos estes avanços têm deser compatíveis com a segurança do doente emtermos de morbilidade e de mortalidade, o quenos deve levar a ser prudentes com as novas tera-pêuticas que antagonizam proteínas fundamen-tais na defesa do hospedeiro contra as infecções ena vigilância tumoral. Finalmente, é preciso,ainda, não olvidar que os doentes em remissãoentram facilmente em actividade quando a tera-pêutica é interrompida, o que nos leva ao fundoda questão: conhecemos, hoje, bem a patogeniada AR, mas continuamos a desconhecer a suaetiologia.

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TREATMENT OF SLE WITH

MYCOPHENOLATE MOFETIL

Luís Sousa Inês

Michelle Petri

Serviço de Medicina III e ReumatologiaHospitais da Universidade de Coimbra

Johns Hopkins University School of MedicineBaltimore, Maryland, U.S.A.

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A B S T R A C T

Management of systemic lupus erythematosus (SLE) with corticosteroids and immunosuppressives hasdramatically improved survival and reduced disease morbidity. However, refractory disease and adverseeffects from medication remain significant problems. Mycophenolate mofetil (MMF) is a new immuno-supressive drug that is of established efficacy and safety in renal transplantation. Borrowing from thetransplantation field, MMF has been successfully used for SLE for the past 5 years. The major indicationshave been for lupus nephritis and severe cutaneous lupus unresponsive to antimalarials. MMF is also apromising alternative option in cases of SLE refractory to conventional immunossupressive treatment.

R E S U M O

O tratamento do lúpus eritematoso sistémico (LES) com corticosteróides e imunossupressores, condu-ziu a um notável aumento da sobrevida e redução da morbilidade da doença. Contudo, a existência deresistência à terapêutica e o risco de efeitos adversos destas medicações permanecem como problemassignificativos. O micofenolato mofetil (MMF) é um novo fármaco imunossupressor, cuja eficácia e tera-pêutica foi já estabelecida na transplantação renal. Derivando desta experiência no campo da trans-plantação, o MMF tem sido usado com sucesso no LES nos últimos 5 anos. As principais indicações parao seu uso no LES têm sido a glumerulonefrite lúpica e as lesões cutâneas graves e resistentes à terapêu-tica com antimaláricos. Para além destas indicações, o MMF é uma alternativa promissora em todos oscasos de LES resistente à terapêutica imunossupressora convencional.

Palavras-Chave: Micofenolato mofetil, Lúpus eritematoso sistémico, Glumerulonefrite lúpica.

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L Í D E R E S D E O P I N I Ã O

M Y C O P H E N O L AT E M O F E T I L : A N E M E R G I N G T H E R A P E U T I C

O P T I O N F O R S Y S T E M I C L U P U S E R Y T H E M AT O S U S

Luís Sousa Inês, M.D.*

Michelle Petri, M.D., M.P.H.**

Systemic lupus erythematosus is a chronic multi-system autoimune disease characterized byabnormalities in T and B cell function. Advancesin SLE management, in particular the introduc-tion of corticosteroids and immunosuppressives,have dramatically improved survival and reduceddisease morbidity over the past several decades.However, numerous adverse effects are associatedwith use of these agents in SLE1-3. Additionally,major organ disease refractory to standard thera-py remain a significant problem, particularly inlupus nephritis4. For these reasons, newer immu-nosupressive agents, with equal efficacy but lesstoxicity, are needed for SLE management.

Mycophenolate mofetil (MMF) is a new immu-nosupressive drug, is generally well tolerated andmore effective than standard azathioprine regi-mens in preventing acute rejection of renal allo-grafts5-7. In small pilot studies, MMF also showedefficacy in cardiac and liver transplantation8-10. Onthe basis of these results in solid organ trans-plants, MMF has been used in several autoim-mune diseases, including rheumatoid arthritis11,diffuse scleroderma12, cutaneous blistering auto-immune diseases13 and autoimmune haemolyticanemia14, with encouraging results. In the past fewyears, there has been growing evidence of MMFefficacy and tolerability as a therapeutic optionfor SLE, particularly in lupus nephritis.

Pharmacology of Mycophenolate Mofetil

Mechanism of Action.Mycophenolate mofetil is a newly available orga-nic synthetic derivative of mycophenolic acid

(MPA), a natural product isolated from the moldPenicilin glaucum more than 100 years ago. Afteroral administration, MMF is rapidly hydrolyzed toMPA, the active immunosuppressive compound.The mechanism of action of MPA is based oninterference with purine synthesis, through a po-tent, noncompetitive, reversible inhibition of ino-sine monophosphate dehydrogenase (IMP-DH).IMP-DH is a critical, rate-limiting enzyme in thede novo synthesis of purines15,16.

Guanine and adenine nucleotides are manu-factured in mammalian cells through a de novopathway or by recycling purine bases through asalvage pathway. Most cell types are able to useboth, but proliferating B and T lymphocytesappear to rely mostly on the de novo pathway16.MMF exerts a fivefold more potent inhibition ofthe IMP-DH type II isoform, expressed in stimu-lated lymphocytes, compared with IMP-DH typeI, constitutively expressed in nonreplicating celllines17. This results in selective inhibition of T andB lymphocyte proliferation by MMF, with minimaleffects on other organ systems18.

In vitro, MMF blocks T and B cell proliferation,generation of cytotoxic T cells and antigen-speci-fic antibody responses of memory B cells19,20. Bythese effects, MMF is expected to inhibit both cell--mediated and humoral immune responses. Athigh doses, MMF also inhibits proliferativeresponse of fibroblasts, endothelial and smoothmuscle cells19. The cytostatic effects of MMF arerapidly and fully reversible 16. Of note is thatMMF blocks the proliferative response to cytoki-nes, but does not inhibit the production of lym-phokines by activated human helper T clones ofthe TH0 and TH2 subsets16.

MMF depletes guanosine triphosphate (GTP)in lymphocytes, which is required for the glycosy-lation of adhesion molecules, including selectinsand integrins21. Hence, it causes inhibition of the

*Serviço de Medicina III e Reumatologia,Hospitais da Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal.**Johns Hopkins University School of Medicine,Baltimore, Maryland, U.S.A.

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TREATMENT OF SLE WITH MYCOPHENOLATE MOFETIL

interactions of lymphocytes with endothelial cellsand other cell types. By this mechanism, MMFmay affect lymphocyte homing and recruitinginto sites of inflamation.

PharmacokineticsMMF is usually administered by the oral route.Oral bioavailability is approximately 94%. Rapidand complete conversion of MMF to MPA by theliver occurs after oral administration. Plasma con-centrations of MPA peak within 1-3 hours of a sin-gle oral dose. In circulation, MPA is approximate-ly 98% bound to albumin. MPA undergoes glu-curonidation in the liver and renal tubular cells toan inactive metabolite. Its elimination half-life isapproximately 17 hours , and up to 70% of the oraldose is recovered in urine in humans15,22. PlasmaMPA AUC is affected by renal and hepatic insuffi-ciency, being higher in subjects with severechronic renal impairment and lower in subjectswith hepatic insufficiency15,23. Drug interactionsappear to be limited with oral administration. Ofnote, absorption of MMF is decreased afteradministration of cholestyramine and antacidscontaining magnesium and aluminum, whichtherefore should be avoided15.

Clinical Efficacy of Mycophenolate Mofetil in SLE

Knowledge about the mechanism of action ofMMF, its successful use in prevention of rejectionin solid organ transplants, and positive results inother autoimmune diseases, suggested that itmight be a useful immunosuppressive drug forSLE. Additionally, in the NZB/NZW and MRLlpr//lpr murine models of SLE 24, 25, MMF has beenshown to inhibit the development and severity ofnephritis and prolong survival.

Early clinical evidence of MMF efficacy in SLE came from reports of small series of patients.Briggs et al.26, from the Johns Hopkins Hospital,were the first to report successful use of MMF inlupus nephritis. Two SLE patients, with WHO classIII class IV nephritis and proteinuria in thenephrotic range, experienced substantial reduc-tion of the urinary protein excretion followingintroduction of MMF 1500-2000 mg daily.

Glicklich & Acharya27 reported two patientswith diffuse proliferative glumerulonephritis re-fractory to IV cyclophosphamide, subsequentlytreated with MMF. One patient responded favo-

rably to MMF 1000 mg daily (500 mg bid), with adecrease of proteinuria to low levels, normaliza-tion of CH50 and anti-DNA antibody levels, andstabilization of serum creatinine. The second pa-tient, after an initial improvement of renal func-tion with 2000 mg/day (1000 mg bid) of MMF, dis-continued therapy due to adverse effects.

Dooley et al.28 reported 13 patients with lupusnephritis class IV (12 cases) or V (1 case). Meanduration of SLE was 9.5 years, but duration ofnephritis was not reported. Twelve patients hadrelapsing or resistant nephritis previously treatedwith IV cyclophosphamide. One additional pa-tient refused cyclophosphamide as initial therapy.The starting dose of 500-2000 mg/day of MMFwas increased to 1000-2500 mg/day, divided intwo administrations/day. The mean duration oftherapy was 12.9 months. During MMF therapy,proteinuria significantly decreased from a meanprotein-to-creatinine ratio (P/C) of 5.453.37 to2.922.52 (p<0.05). Proteinuria declined in 10patients and serum creatinine improved orremained stable in 12 patients. The urine sedi-ment, abnormal in all patients at baseline, nor-malized in six.

Li et al. 29 treated 23 SLE patients, with diffuseproliferative lupus nephritis refractory to cyclo-phosphamide and steroids, with MMF 1000-1500mg/day. Over 9 months, the mean 24 h urine pro-tein decreased from 3.88 to 0.75 gr and the serumcreatinine from 178.4 to 94.5 mol/l. Chen et al.30

treated 6 patients with lupus nephritis WHO classIV with predisolone and MMF 1000-1500 mg/dayfor 6 months and then 750-1000 mg/day. Five ofthe six patients had a significant improvement inrenal function and proteinúria.

Gaubitz et al.31 treated 10 SLE patients with1500-2000 mg/day of MMF for 8 to 16 months in aopen-label, uncontrolled trial. At baseline, allpatients had a SLAM disease activity score of morethan 12 points. Three patients had nephritis WHOclass III or IV, one had CNS vasculitis, four hadleuko- or thrombocytopenia, two had pleuritisand one discoid skin lesions. One patient had onlymusculoskeletal manifestations. Four patientshad received six monthly pulses of cyclophos-phamide and remained under quarterly pulsesduring this trial. SLAM score decreased in allpatients, from a mean of 15.65.5 at baseline to8.03.3 at six months. Mean prednisone dosage wasdecreased from 10.05.1 to 4.63.5 mg/day duringthis period.

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LUIS SOUSA INÊS E COL.

The best evidence of MMF efficacy in SLEcomes from the very recently published rando-mised trial of MMF versus IV cyclophosphamidein diffuse proliferative lupus nephritis, by Chan etal.32. In this trial, 21 patients were assigned to aregimen of MMF 2000 mg/day (1000 mg bid) plusoral prednisolone (group 1). The dose of MMF wasreduced to 1000 mg/day at 6 months. The secondgroup, also with 21 patients, received oralcyclophosphamide at a dose of 2.5 mg/kg/dayplus oral prednisolone. At 6 months, cyclophos-phamide was replaced by oral azathioprine (1.5mg/kg/day). After 12 months, patients from bothgroup 1 and 2 were given azathioprine 1 mg/kg//day plus oral prednisolone. In 16 of the patientsin group 1 and 13 of those in group 2, the diagno-sis of SLE was new. The mean duration of nephri-tis was 4.55.3 years in group 1 and 6.46.3 years ingroup 2. The mean nephritis activity score onrenal biopsy was 8.6 in both groups (maximumscore in the index = 24). At 12 months of therapy,81% of the patients treated with MMF had a com-plete remission and 14% had a partial remission,as compared with 76% and 14%, respectively, ofthe patients treated with oral cyclophosphamidefollowed by azathioprine. The rates of relapsewere 15% and 11%, respectively. The proportion ofpatients with high serum levels of anti-dsDNAantibody decreased from 81% to 10% in group 1and from 76% to 52% in group 2. The authors con-cluded that the combination of MMF and pred-nisolone is as effective as a regimen of cyclophos-phamide and prednisolone followed by azathio-prine and prednisolone for the treatment of dif-fuse proliferative lupus nephritis. However, it iscurrently not known whether MMF is as effectiveas the standard therapy of diffuse proliferativeglumerulonephritis, with intravenous pulsecyclophosphamide33-35.

Safety of Mycophenolate Mofetil

MMF is a potent immunosupressive drug withmore selective cytotoxic effects than other immu-nosupressives, such as cyclophosphamide andazathioprine. As such, a favorable safety profilewas to be expected. In fact, most adverse effects ofMMF are mild and seldom require discontinua-tion of therapy. Neurotoxicity, hepatotoxicity andnephrotoxicity are infrequent with MMF. Safety ofMMF in pregnancy is not established. To date, fivenormal children have been born to women taking

MMF36. However, MMF is teratogenic in rats andrabbits37. It is not known if MMF increases risk ofmalignancy. However, MMF suppresses prolifera-tion of Epstein-Barr virus-transformed B lympho-cytes in vitro, so that long term use might even beassociated with a decreased risk of EBV-relatedlymphoma16.

The best evidence of safety of MMF comes fromits administration to a large number of patients indouble-blind clinical trials for prevention of acuterejection in renal transplantation5-7. In these trials,a total of 501 patients received MMF 2000 mg/dayand 490 patients were treated with MMF 3000mg/day, for 6 or 12 months. The controls in onestudy received cyclosporine and oral corticos-teroids5, and in the other two studies, controls alsoreceived azathioprine in addition to cyclosporineand oral corticosteroids6,7. The principal adverseeffects and opportunistic infections in these stu-dies are shown in table I and II, respectively.

Gastrointestinal adverse events were more fre-quently reported in the MMF groups, particularlywith the 3000 mg dosage. Patients with mild gas-trointestinal complaints mostly improved with ei-ther a dose division to 3-4 times/day or dose re-duction. Gastrointestinal hemorrhage, large-bo-wel perforation and pancreatitis were seen insmall numbers of patients on MMF. Leukopeniawas reported in a similar proportion in the aza-thioprine and MMF 2000 mg group. Pancytopeniaand agranulocytosis were infrequently reported inpatients receiving MMF. The observed haemato-logical adverse events generally reverted within aweek of discontinuation. Opportunistic infectionswere slightly more common with MMF than in thecontrol group, but not perceptibly different frompatients receiving azathioprine. In the Triconti-nental study 6, overall incidence of noncutaneousmalignancies after 12 months of follow-up were3.7% in the MMF 3000 mg group, 1.8% in thepatients receiving MMF 2000 mg and 2.5% in thegroup on azathioprine 100-150 mg/day.

In the European study5, the proportion ofpatients with adverse events causing prematurewithdrawal was 17.6% in the MMF 2000 mg group,25.6% in the MMF 3000 mg group and 13.9% inthe control group. In the Tricontinental study6,withdrawals because of adverse events ocurred in13.5% of the patients from the MMF 2000 mggroup, 15.2% of the MMF 3000 mg group and14.2% of the azathioprine group. In the three stu-dies, the slight gain in clinical benefit with the hi-

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Table II: Principal opportunistic infections in renal transplantation trials (%)

U.S.+Tricontinental Studies6, 7 European Study5

Adverse Effect AZA MMF 2 g MMF 3 g Control MMF 2 g MMF 3 g

(n=326) (n=336) (n=330) (n=166) (n=165) (n=160)

Herpes simplex 19.0 17.3 20.0 6.0 14.5 11.3

Herpes zoster 5.5 6.0 7.3 1.8 6.7 5.0

CMV viremia 13.8 13.4 9.1 13.3 15.8 15.0

CMV invasive disease 6.1 8.0 10.9 2.4 3.0 6.9

Candida 17.5 15.8 17.3 7.8 9.7 5.6

Aspergillus/Mucor 0.3 0.3 1.2 0.6 0.0 0.0

P. carinii pneumonia 1.5 0.3 0.0 2.4 0.0 0.0

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TREATMENT OF SLE WITH MYCOPHENOLATE MOFETIL

gher dosage of MMF was offset by the increase inadverse effects.

In SLE, MMF is generally used in doses up to3000 mg, as in renal transplantation, so that tole-rability similar to what was found in the trans-plantation trials would be expected. In table III,we present the adverse events reported in patientswith SLE treated with MMF27,28,31,32. Gastrointestinalcomplaints were amongst the most frequentlyreported. In some patients these complaints dis-appeared without modification of therapy31, andin others remitted with a reduction of the MMFdose28. However, a few patients with severe diar-rhea required a temporary or permanent discon-

tinuation of MMF27,28,32. Leukopenia was reportedin a few patients, and MMF was discontinued inone case of pancytopenia with associated staphy-lococcal pneumonia27,28. Interestingly, one patientwith long-standing immune-mediated leukope-nia and another with thrombocytopenia, experi-enced an increase in the haematological countswhile receiving MMF28,31. Infections were reportedin some patients, but were usually mild and justi-fied discontinuation of MMF in only one patient,who presented with pancytopenia, staphylococ-cal pneumonia and fungal esophagitis27. In theonly comparative trial in lupus nephritis reportedso far32, MMF showed a favorable safety profile as

AZA: azathioprine; MMF: mycophenolate mofetil.

Table I: Principal adverse events in renal transplantation trials (%)

U.S.+Tricontinental Studies6,7 European Study5

Adverse Effect AZA MMF 2 g MMF 3 g Control MMF 2 g MMF 3 g

(n=326) (n=336) (n=330) (n=166) (n=165) (n=160)

Abdominal pain 23.0 24.7 27.6 10.8 11.5 11.3

Nausea 24.5 19.9 23.6 2.4 4.2 6.3

Vomiting 9.2 12.5 13.6 1.2 2.4 3.8

Diarrhea 20.9 31.0 36.1 12.7 12.7 15.6

Dyspepsia 13.8 17.6 13.6 5.4 3.0 5.0

Anemia 23.6 25.6 25.8 1.8 4.2 6.8

Leukopenia 24.8 23.2 34.5 4.2 10.9 13.8

AZA: azathioprine; MMF: mycophenolate mofetil.AZA groups in the tricontinental and U.S. studies received cyclosporine,corticosteroids, azathioprine and placebo. Control group in the european study received cyclosporine, corticosteroids and placebo

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LUIS SOUSA INÊS E COL.

compared to an oral cyclophosphamide regimen(Table IV).

Clinical Experience with MycophenolateMofetil at the Johns Hopkins Lupus Center

Borrowing from the renal transplantation field,

MMF has been used for SLE for thepast 5 years. The major indicationshave been for lupus nephritis (eitherinitial therapy for focal proliferative,mesangial proliferative and membra-nous nephritis, and as maintenancetherapy after 6 months of intravenouscyclophosphamide induction thera-py for diffuse proliferative glumeru-lonephritis), and severe cutaneouslupus unresponsive to antimalarials.MMF is usually started at 2000 mgdaily (1000 mg bid). If there is insuffi-cient response, at one month thedose is increased to 3000 mg (1000mg tid or 1500 mg bid).

The open-label experience withMMF at the Johns Hopkins LupusCenter has been reported 38 (TableV). MMF led to a rapid and sustainedimprovement in disease activity in 14of 22 SLE patients. In addition, it wascorticosteroid-sparing, with a reduc-

tion in mean prednisone dose from 22 to 11 mg.There was significant improvement in serologicparameters, such as complement and anti-dsDNA. In patients with lupus nephritis,although there was a reduction in proteinuriafrom 4 to 2 gr daily, this failed to reach statisticalsignificance. This means that some patients donot achieve a «complete response» with MMF,defined using NIH criteria (a reduction in pro-teinuria to less than 1 gr daily).

Currently the Hopkins Lupus Center is one ofmany sites participating in the FDA sponsored(Ellen Ginzler, M.D., M.P.H., principal investiga-tor) randomized trial of MMF versus intravenouscyclophosphamide for lupus nephritis. This trialwill address the complete response rates and to-xicity of both regimens, including the subgroupof African-American patients, who have pre-viously been reported to be less responsive to in-travenous cyclophosphamide than Caucasians.

Conclusions

MMF is a potent immunosupressant with a goodsafety profile. It is effective in reducing overall di-sease activity in patients with moderate to severeSLE31,38. MMF is a promising alternative option incases of SLE refractory to conventional immunos-

Table III: Adverse events reported in 46 SLE patients treatedwith MMF27,28,31,-32.

Adverse Event Number of % of Patients Patients

Nausea 5 10.9

Diarrhea 10 21.7

Vomiting 2 4.3

Pancreatitis 1 2,2

Leukopenia 2 4.3

Pancytopenia 1 2.2

Hair loss 1 2.2

Infections 18 39.1

Respiratory 11 23.9

Fungal 2 4.3

Herpes simplex 3 6.5

Herpes zoster 2 4.3

Discontinuation of MMF 3 6.5due to adverse events

MMF: mycophenolate mofetil.

Table IV: Number of patients with adverseevents under treatment with MMF (group 1) orcyclophosphamide (group 2) for lupus nephritis32

Adverse Event Group 1 Group 2 (n=21) (n=21)

Infection 4 7

Respiratory 4 5

Tuberculosis 0 1

Urinary tract 0 2

Herpes zoster 2 2

Leukopenia 0 2

Hair loss 0 4

Amenorrhea 0 3

Diarrhea 1 0

Death 0 2

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TREATMENT OF SLE WITH MYCOPHENOLATE MOFETIL

supressive treatment31. There is evidence thattreatment with MMF is as effective and has fewerside effects than sequential treatment with cyclo-phosphamide followed by azathioprine for pa-tients with diffuse proliferative lupus nephritis32.More studies are required to establish the role ofMMF in SLE, especially in the treatment of lupusnephritis. Cost-benefit analysis should also be ad-dressed, as the high cost of MMF may limit morewidespread use.

Endereço para correspondência:

Dr. Luís Sousa Inês.Serviço de Medicina III e Reumatologia dos Hospitais da Universidade de Coimbra. Praceta Mota Pinto, 3000-075 Coimbra.

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Table V: Outcome of treatment of 22 SLE patients with MMF at the Johns Hopkins Lupus Center38

Parameters Baseline One month p value Last month p value

PGA 1.82 1.32 0.03 1.09 0.002

SLEDAI 6.00 3.39 0.05 2.70 0.009

Prednisone (mg/dl) 22.00 24.24 n.s. 11 0.01

Proteinuria (dip) 1.93 1.61 n.s. 1.32 n.s.

C3 (mg/dl) 89.75 102.40 n.s. 104.20 n.s.

C4 (mg/dl) 18.75 22.43 n.s. 25.2 0.05

Anti-dsDNA 159.75 99.13 n.s. 12.7 0.04

24-h urine proteine (g) 4.36 1.77 n.s. 2.01 n.s.

PGA: Physician Global Assessment of disease activity. MMF: Mycophenolate mofetil.

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SOBREVIDA CUMULATIVA DAS

TERAPÊUTICAS MODIFICADORAS

DE DOENÇA EM DOENTES COM

ARTRITE REUMATÓIDE DO INSTITUTO

PORTUGUÊS DE REUMATOLOGIA

Paula Araújo, Luís Miranda,

M. Jesus Mediavilla, Manuela Parente,

Helena Santos, Eugénia Simões

Augusto Faustino, João Ramos,

Cristina Catita

Instituto Português de ReumatologiaHospital de Santa Maria

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R E S U M O

Introdução: A maioria dos estudos convencionais existentes que avaliam a eficácia das terapêuticas de fundo da artritereumatóide são de curta duração, uma vez que estudos de longa duração requerem uma complexa logística e são de ele-vado custo. Como alternativa à avaliação da eficácia duma terapêutica de fundo é a avaliação da sua sobrevida comula-tiva, isto é, compara-se a probabilidade comulativa de um doente continuar sob uma determinada terapêutica de fundoe a análise das razões da sua descontinuação.Objectivos: Avaliar a duração do tratamento com terapêuticas modificadoras da artrite reumatóide (AR) e as razões dasua descontinuação em doentes com AR do Instituto Português de Reumatologia.Material e métodos: Foram estudados os registos de 128 doentes com o diagnóstico de AR, tratados consecutivamentecom seis disease modifying anti-rheumatic drugs (DMARDs), nomeadamente o metotrexato, os sais de ouro, a D-peni-cilamina, a ciclosporina, a sulfasalazina e os anti-maláricos entre os anos de 1974 e 2000. A azatioprina foi excluída doestudo devido ao reduzido número de administrações. Foi usado o teste Kaplan-Meier para o cálculo da sobrevida comu-lativa terapêutica, tendo-se assumido como estatisticamente significativo os valores de p<0,05.Resultados: Dos 128 doentes com artrite reumatóide estudados, 114 eram do sexo feminino e 14 do sexo masculino. Aidade média foi de 60,1±13,0 dp anos. A duração média de doença foi de 195,4 meses, sendo o início monoarticular em17 doentes e poliarticular em 82 doentes. A seropositividade para factores reumatóides com título >1/80 esteve presenteem 95 doentes (74,2%). Das manifestações extra-articulares salienta-se a presença de nódulos subcutâneos em 22doentes (17,2%) e a amiloidose AA em 8 doentes (6%). Todos os doentes foram tratados em algum período da sua ARsimultaneamente com AINES e corticosteróides (prednisona em doses médias ≤ 10mg/dia). Durante o período queabrangeu o estudo foram efectuadas 315 prescrições terapêuticas com DMARDs: 99 tratados com sais de ouro, 84 commetotrexato, 50 com anti-maláricos, 35 com sulfasalazina, 30 com ciclosporina A e 22 com D-Penicilamina. Das 315 pres-crições registaram-se 96 descontinuações terapêuticas. A principal causa de descontinuação por efeitos secundários,foram as alterações mucocutâneas com os sais de ouro (63,2%) e os efeitos gastro-intestinais com o metotrexato (61,5%).Conclusão: A sobrevida terapêutica com MTX foi significativamente superior que com outros DMARDs (p<0,05), exceptopara a ciclosporina A. No entanto a ciclosporina A e outros DMARDs comparados entre si não apresentam uma diferentesobrevida comulativa com significado estatisticamente significativo. Se analisarmos os efeitos secundários que reque-rem a descontinuação terapêutica, o metotrexato foi superior aos sais de ouro e aos anti-maláricos. Se analisarmos aeficácia terapêutica, o metotrexato é a terapêutica de fundo mais eficaz e destaca-se dos sais de ouro e dos anti-malári-cos. Os sais de ouro destacam-se pela sua ineficácia, seguido da sulfasalazina e da ciclosporina A.

A B S T R A C T

Introduction: Conventional studies of anti-rheumatic therapy efficacy are short-term studies. Long term comparativestudies are complex and have high costs. An alternative is to assess the long-term effectiveness (duration of treatmentmeasure) of DMARDs. Objective: To evaluate the duration of treatment and the reasons for discontinuing therapy in rheumatoid arthritis (RA)patients from the Portuguese Institute of Rheumatology.Patients and Methods: We studied 128 RA arthritis patients treated with six DMARDs, cyclosporine A, sulfasalazine, anti-malarians, gold salts, methotrexate, D-penicillamine, between 1974 and 2000. Azathioprine was excluded from the studybecause of the small number of administrations. We analyse the average median survival of each six DMARDs, calculat-ed by Kaplan-Meier method. Statistical significance p<0,05.Results: From the 128 RA patients studied 114 were female. The mean age was 60,1±13,0 SD years. The mean duration ofdisease was 60,1±13,0 SD years. There was a polyarthritic beginning in 82 patients and monoarthritic in 17 patients.Seropositive arthritis (rheumatoid factor titter > 1/80) was detected in 95 patients (74,2%). The most common extra-articular manifestations weresubcutaneous nodules at 22p. (17,2%) and amyloidosis AA in 8 patients (6%). All patientswere treated with NSAIDs and corticosteroids (mean dose < 10 mg/day) at some period of the disease. During the studyperiod, DMARDs were started 315 times: gold salts (99), methotrexate (84), anti-malarians (50), sulfasalazine (35),cyclosporine A (30), D-penicillamine (22). We recorded 96 discontinuations after a total of 315 starts of DMARD treat-ment. The most common adverse reactions were mucocutaneous abnormalities with gold salts (62,3%) and gastroin-testinal side effects with methotrexate (61,5%).Conclusion: Drug survival for methotrexate was significantly higher than that of the other DMARDs (p<0,05) except forcyclosporine A. Besides that, cyclosporine A and all the others cross compared DMARDs didn’t have different cumulativesurvival with statistical significance. If we analyse adverse reactions that required discontinuation, methrotexate wassuperior to gold salts and anti-malarians. Methotrexate is the most effective and detached from gold salts and anti-malarians. Gold salts are detached for their ineffectiveness followed by sulfasalazine and cyclosporine A.

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A R T I G O S O R I G I N A I S

S O B R E V I D A C U M U L AT I VA D A S

T E R A P Ê U T I C A S M O D I F I C A D O R A S D E D O E N Ç A

E M D O E N T E S C O M A R T R I T E R E U M AT Ó I D E D O

I N S T I T U T O P O R T U G U Ê S D E R E U M AT O L O G I A

Paula Araújo,* Luís Miranda,* M. Jesus Mediavilla**

Manuela Parente,** Helena Santos,** Eugénia Simões**

Augusto Faustino,** João Ramos,*** Cristina Catita***

Introdução

A maioria dos estudos convencionais existentesque avaliam a eficácia das terapêuticas de fundoda artrite reumatóide são de curta duração, umavez que estudos de longa duração1-2 requeremuma complexa logística e são de elevado custo.Estudos clínicos randomizados comparativosentre terapêuticas de fundo na artrite reumatóidenão evidenciam vantagens de uma terapêuticasobre outra3, assim a escolha duma terapêutica defundo deve basear-se na máxima eficácia e toxici-dade mínima4.

Como alternativa à avaliação da eficácia dumaterapêutica de fundo é a avaliação da sua sobrevi-da comulativa, isto é, compara-se a probabilidadecomulativa de um doente continuar sob umadeterminada terapêutica de fundo e a análise dasrazões da sua descontinuação.

Vários estudos indicam uma maior sobrevidacomulativa do Metotrexato (MTX), comparativa-mente à Sulfasalazina5 (SSZ) à Ciclosporina A6

(CyA) à D- Penicilamina7 (D-P) à Azatioprina7 oumesmo aos Sais de Ouro7 (SO).

Objectivos

Avaliar a duração do tratamento com terapêuticasmodificadoras da artrite reumatóide e as razõesda sua descontinuação (efeitos secundários, per-

da de eficácia) em doentes com artrite reuma-tóide do Instituto Português de Reumatologia.

Material e Métodos

Neste estudo, foram revistos e estudados os regis-tos de 128 doentes com o diagnóstico de artritereumatóide (de acordo com os critérios da Ameri-can Reumatic Association, 19878), tratados conse-cutivamente com seis disease modifying anti--rheumatic drugs (DMARDs), nomeadamente oMTX os SO, a D-P, a CYA, a SSZ e os anti-maláricos(AM) entre os anos de 1974 e 2000, inclusivamen-te. Neste estudo retrospectivo a selecção e inclu-são dos doentes abrangeu um largo período deanálise, com consequentemente elevado númerode conjugações de DMARDs.

A escolha dos DMARDs foi feita de acordo coma preferência do médico assistente. Quando umaterapêutica se demonstrou ineficaz ou não podeser continuada devido a toxicidade, foi substituí-da por outro DMARD.

Os DMARDs foram administrados nas seguin-tes doses:MTX (PO): mínimo 5 mg/semana; máximo 15 mg/semanaSO (IM): mínimo 20 mg/semana; máximo 50 mg/semanaCyA (PO): mínimo 75 mg/ dia; máximo 150 mg/diaSSZ (PO): mínimo 1,5 gr/ dia; máximo 2 gr/diaAM (PO): 400 mg/ diaD-P (PO): 600mg/ dia

Os doentes tratados com azatioprina foramexcluídos do estudo devido ao reduzido númerode administrações.

*Interno do 5o ano do Internato Complementar de Reumatologia**Assistente Hospitalar de Reumatologia do Instituto Português deReumatologia*** Assistente Hospitalar de Reumatologia do Hospital de SantaMaria (Ex-Reumatologista do Instituto Português de Reumatologia)

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SOBREVIDA CUMULATIVA DAS TERAPÊUTICAS MODIFICADORAS DE DOENÇA EM DOENTES COM ARTRITE REUMATÓIDE

A) Critérios de descontinuação terapêutica:As causas de descontinuação terapêutica foram:– Toxicidade: consiste em todo o efeito adversoque requer a descontinuação terapêutica9-10.– Ineficácia: definida pela ausência de benefícioclínico em qualquer altura do seguimento depoisde um tempo mínimo de administração de 4 se-manas e máximo de 6 meses consoante o tipo deDMARDs e após o ajustamento da dose11.

O seguimento dos doentes foi efectuada cada 3a 4 meses com:– avaliações clínicas: pela análise dos registos

referentes ao início da terapêutica, a dose máxi-ma administrada, a data e a causa da descon-tinuação terapêutica e os efeitos secundários.

– avaliações laboratoriais: doentes sob terapêutica com SO e D-P

– hemograma , urina IIdoentes sob terapêutica com MTX

– hemograma, provas de função hepática(TGO, TGP, FA, gGT), provas de função renal(ureia, creatinina), albumina

doentes sob terapêutica com CyA– hemograma, provas de função renal, urina

II, ác.urico, perfil lipídicodoentes sob terapêutica com SSZ

– hemograma, urina IIdoentes sob terapêutica com AM

– hemograma– avaliações anuais Oftalmológicas (nos

doentes sob terapêutica com AM)

B) Análise estatística:Foi calculada a sobrevida comulativa terapêutica,isto é, a probabilidade cumulativa de um doentecontinuar o tratamento, pelo teste Kaplan-Meier.A análise inicial tem como «end point» a descon-

tinuação terapêutica, sem estratificação. Poste-riormente, foi feita a análise das causas de des-continuação terapêutica em função da toxicidadee da ineficácia, separadamente. Foram incluídosdo estudo os doentes que mantinham a terapêuti-ca de fundo no momento da análise (vantagemque o método estatístico usado permite). Foi as-sumido como estatisticamente significativo osvalores de p<0,05.

As análises categóricas foram efectuadas peloteste x2.

Resultados

A) Características dos doentesDos 128 doentes com artrite reumatóide estuda-dos, 114 eram do sexo feminino e 14 do sexo mas-culino. A idade média foi de 60,1±13,0 dp anos(mínimo 25, máximo 89), resultante dum pre-domínio de doentes na 6a década (Quadro 1).

Esta população apresentava em média 195,4meses (16,2 anos) de duração de doença, sendo oinício monoarticular em 17 doentes e poliarticu-lar em 82 doentes. A seropositividade para facto-res reumatóides com título >1/80 esteve presenteem 95 doentes (74,2%). Das manifestações extra--articulares salienta-se a presença de nódulossubcutâneos em 22 doentes (17,2%), amiloidoseAA em 8 doentes (6%). Todos os doentes foramtratados em algum período da sua AR simultanea-mente com AINES e corticosteróides (prednisonaem doses médias 10mg/dia; mínimo 5mg/dia emáximo 15mg/dia).

Dos 128 doentes com artrite reumatóide sobterapêutica com DMARDs foram efectuadas 315prescrições: 99 tratados com SO, 84 com MTX

(tratamento com MTX desde1989), 50 com AM, 35 comSSZ, 30 com CyA e 22 com D-P.Foi incluído no estudo quer asnovas administrações quer asreadministrações.

B) Análise da sobrevida média(Figura 1)A sobrevida média variou en-tre 63,1 meses e 28,2 meses. Asterapêuticas de fundo com asobrevida média mais curtaforam os AM (28,2 meses) e aSSZ (29,4 meses); sobrevida

0%

Décadas

40%

30%

20%

10%Per

cen

tage

m

2%

20- 30- 40-49 50-59 60-69 70-79 80-89

8,7% 9,4%

24,4%

29%

23%

3,5%

Quadro 1. Idade dos doentes distribuído por décadas

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média intermédia CyA (31,4 meses), D-P (38,9meses) e SO (55,9 meses).

C) Análise da sobrevida comulativa (tabela 1)Das 315 prescrições de DMARDs, foram regista-das 96 descontinuações.

A figura 2 representa a sobrevida comulativados 6 DMARDs administrados sem estratificação,isto é, tendo como «end point» a descontinuaçãoterapêutica.

A probabilidade de um doente com artritereumatóide em que foi administrado MTX decontinuar a terapêutica ao fim de 2 anos é de 65%e ao fim de 4 anos é de 46,7%. Com a SSZ a proba-bilidade de um doente medicado com SSZ con-tinuar a terapêutica ao fim de 2 anos é apenas de

27% e ao fim de 4 anos é nula. A análise da sobre-vida comulativa com a CyA aos 4 anos foi excluí-da dada a ausência de tratamentos aos 4 anos deseguimento.

D) Causas da descontinuação dos DMARDs(tabela 2)Existem múltiplas razões para a descontinuaçãodos DMARDs, desde a ineficácia, efeitos secun-dários, custo, factores psicológicos, fibromialgia,remissão, não compliance, factores não médicoscomo o expirar da prescrição ou o mau entendi-mento entre médico e doente.

Neste estudo a principal causa de desconti-nuação dos DMARDs deveu-se à toxicidadeexcepto para os AM, que se deveu sobretudo à

ineficácia terapêutica.A figura 3 representa a

sobrevida comulativa daterapêutica em função daineficácia e revela o MTXcomo a terapêutica maiseficaz, destacando-se dosSO e dos AM. Comparati-vamente aos restantesDMARDs a superioridadeda eficácia do MTX não foiestatisticamente significa-tiva. Os SO distinguem-sepela sua ineficácia seguidoda SSZ e da CyA.

A figura 4 representa asobrevida terapêutica emfunção da toxicidade e re-vela a superioridade esta-

PAULA ARAÚJO E COL.

Figura 1. Tempo de sobrevida média dos 6 DMARDs na artrite reumatóide

DMARDs Sobrevida Sobrevida Sobrevida Descontinuação Descontinuaçãomédia comulativa comulativa por Ineficácia por toxicidade

(2 anos) (4 anos)

Metotrexato 63,1 m. 65,2% 46,7% 13,1% 25%

Sais de Ouro 55,9 m. 48,9% 29,8% 21,2% 48,4%

D-Penicilamina 38,9 m. 50% 27,3% 33,3% 59%

Ciclosporina A 31,4 m. 57,2% 0 16,7% 23,3%

Sulfasalazina 29,4 m. 27% 0 22,8% 42,8%

Anti-maláricos 28,2 m. 37% 16% 52% 28%

Figura 1. Tempo de sobrevida média dos 6 DMARDs na artrite reumatóide.

E

3002001000-100

Cum

Sur

viva

l

1.2

1.0

.8

.6

.4

.2

0.0

-.2

5,00

-censored

4,00

4,00

-censored

3,00

3,00

-censored

2,00

2,00

-censored

1,00

1,00

-censored

Figura 2. Sobrevida cumulativa dos 6 DMARDs sem estratificação

Metotrexato

Sais de Ouro

D-Penicilamina

Ciclosporina A

Sulfasalazina

Anti-maláricos

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tisticamente significativa do MTX comparativa-mente aos SO e aos AM.

Dos efeitos secundários dos DMARDs (Tabela2) as alterações mucocutâneas foram a principalcausa de descontinuação dos SO (63,2%)12, segui-do da proteinúria (16,3%).

A incidência das queixas gastro-intestinais foio principal factor limitante no uso de MTX nosdoentes com artrite reumatóide (61,5%). Tambémo uso de AM causou intolerância GI em 50% dosdoentes.

Discussão

O presente estudo resumiu a experiência do usodas terapêuticas de fundo em 128 doentes doInstituto Português de Reumatologia com artritereumatóide. As conclusões relativas à toxicidadee eficácia devem ser efectuadas com cuidadodado às várias limitações do estudo (os critérios

do estudo podem constituir um factor de erro):1.Apesar da decisão de iniciar ou parar uma tera-

pêutica de fundo ter sido guiada por factoresobjectivos, a decisão final dependeu da opiniãodo médico assistente. Assim, os resultados obti-dos não excluem uma possível influência domédico assistente.

2.Separar a toxicidade da eficácia terapêutica éuma forma simplista de explicar um processoque interage. É importante reconhecer que aeficácia e os efeitos secundários duma terapêu-tica por vezes interagem. Por exemplo: se pe-rante uma terapêutica houver uma considerá-vel eficácia, os efeitos secundários ligeiros amoderados podem ser tolerados, contraria-mente quando a eficácia é limitada ou ausente,a existência simultânea de toxicidade ligeirapode causar a descontinuação terapêutica.Sendo este estudo retrospectivo, é provável

que as verdadeiras razões da descontinuação te-rapêutica não tenham sido obtidas em todos os

SOBREVIDA CUMULATIVA DAS TERAPÊUTICAS MODIFICADORAS DE DOENÇA EM DOENTES COM ARTRITE REUMATÓIDE

Tabela I. Sobrevida média, sobrevida comulativa aos 2 e 4 anos e causas de descontinuação terapêutica

DMARDs Sobrevida Sobrevida Sobrevida Descontinuação Descontinuaçãomédia comulativa comulativa por Ineficácia por toxicidade

(2 anos) (4 anos)

Metotrexato 63,1 m. 65,2% 46,7% 13,1% 25%

Sais de Ouro 55,9 m. 48,9% 29,8% 21,2% 48,4%

D-Penicilamina 38,9 m. 50% 27,3% 33,3% 59%

Ciclosporina A 31,4 m. 57,2% 0 16,7% 23,3%

Sulfasalazina 29,4 m. 27% 0 22,8% 42,8%

Anti-maláricos 28,2 m. 37% 16% 52% 28%

Tabela II. Causas de descontinuação terapêutica (DMARDs) por toxicidade

DMARDs Gastro- Derma. Nefro. Hemato. S. Nervoso Oftal. Obste. Pulm. Cardiovasc.intestinal

Metotrexato 61,5% 30,7% 23,5% 3,8% 0 0 0 0 0

Sais de Ouro 8,2% 63,2% 16,3% 12,2% 0 0 2% 0 0

D-Penicilamina 25% 0 0 25% 50% 0 0 0 0

Ciclosporina A 57,1% 14,3% 0 0 0 0 0 14,3% 14,3%

Sulfasalazina 40% 60% 0 0 0 0 0 0 0

Anti-maláricos 50% 10% 10% 0 0 30% 0 0 0

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casos. Por exemplo, seria de esperar encontraruma percentagem de casos em que a desconti-nuação terapêutica resultasse da combinaçãoineficácia e toxicidade.

Uma vez que todos os doentes incluídos nesteestudo foram tratados nalgum período da suadoença simultaneamente com AINES e corticos-teróides a incidência das queixas dispépticas po-derá ser motivada por esta associação, sendo difi-cil imputá-las apenas aos DMARDs.

Devido a todas as dificuldades que encontra-mos, é preferível considerar como melhor mode-lo de expressão do balanço entre a eficácia e a

toxicidade a análise da so-brevida comulativa (tem-po de uso da terapêutica).

Apesar das limitaçõesatrás referidas, os resulta-dos obtidos podem serúteis na escolha dosDMARDs na terapêuticada artrite reumatóide, de-vido quer ao longo perío-do que abrangeu o estu-do, quer ao elevado nú-mero de doentes envolvi-dos.

De salientar que dacomparação deste estudocom estudos anteriores7,obteve-se melhores resul-tados na sobrevida médiacom os SO13 e a D-P epiores resultados com osAM. No entanto, o nossoestudo mostrou resulta-dos semelhantes à maio-ria dos estudos com MTXe a SSZ14-15-16-17-18.

De referir que apesar dapopulação alvo deste es-tudo apresentar uma mé-dia de idade elevada (60anos), o perfil de toxici-dade encontrado que in-duziu a descontinuaçãoterapêutica foi semelhan-te a outros estudos9–10–18–19.

Uma enorme varieda-de de factores genéticos e

ambienciais podem explicar asdiferenças encontradas, nomeada-

mente:– factores genéticos: a tipagem HLA pode estar

na base do padrão de toxicidade encontradona nossa população.

– factores ambienciais: álcool, obesidade, doen-ças intercorrentes, podem ser factores modifi-cadores da sobrevida dos DMARDs na nossapopulação.No futuro, novos estudos da sobrevida comula-

tiva das terapêuticas de fundo devem analisaroutros factores não estudados no presente estu-do, que podem influenciar a sobrevida média,como:

PAULA ARAÚJO E COL.

Figura 3. Sobrevida cumulativa dos 6 DMARDs em função da ineficácia

Figura 4. Sobrevida cumulativa dos 6 DMARDs em função da toxicidade

Survival Functions

E

3002001000-100

1.2

1.0

.8

.6

.4

.2

0.0

5,00

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4,00

4,00

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3,00

3,00

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2,00

2,00

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1,00

1,00

-censoredCum

Sur

viva

l

Metotrexato

Sais de Ouro

D-Penicilamina

Ciclosporina A

Sulfasalazina

Anti-maláricos

Survival Functions

E

3002001000-100

Cum

Sur

viva

l

1.2

1.0

.8

.6

.4

.2

0.0

-.2

5,00

-censored

4,00

4,00

-censored

3,00

3,00

-censored

2,00

2,00

-censored

1,00

1,00

-censored

Metotrexato

Sais de Ouro

D-Penicilamina

Ciclosporina A

Sulfasalazina

Anti-maláricos

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– idade do doente, nível educacional, estado psi-cológico, presença de fibromialgia, ordem deadministração dos DMARDs (os primeirosDMARDs administrados têm maior probabili-dade de apresentar maior sobrevida terapêuti-ca), gravidade da doença ou administraçãosimultânea de corticosteróides.

Conclusões

O estudo da sobrevida de 6 terapêuticas de fundoem 128 doentes com artrite reumatóide do Insti-tuto Português de Reumatologia num período de26 anos permitiu concluir:– A sobrevida terapêutica com MTX foi significa-

tivamente superior que com outros DMARDs(p<0,05), excepto para a CyA. No entanto, aCyA e outros DMARDs comparados entre sinão apresentam uma diferente sobrevidacomulativa com significado estatisticamentesignificativo.

– Se analisarmos os efeitos secundários querequerem a descontinuação terapêutica, oMTX foi superior aos SO e aos AM.

– Se analisarmos a eficácia terapêutica, o MTX éa terapêutica de fundo mais eficaz e destaca-sedos SO e dos AM. Os SO destacam-se pela suaineficácia, seguido da SSZ e da CyA.Neste estudo é possível obter informações

sobre a eficácia/tolerância dos DMARDs numgrupo de doentes com AR, que representam umarealidade clínica particular do Sul da Europa(explicado por diferentes factores genéticos, am-bientais). Este estudo fornece dados importantespara a prática reumatológica portuguesa.

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SOBREVIDA CUMULATIVA DAS TERAPÊUTICAS MODIFICADORAS DE DOENÇA EM DOENTES COM ARTRITE REUMATÓIDE

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DOR CRÓNICA:

ASPECTOS PSICOLÓGICOS,

SOCIAIS E CULTURAIS

Manuel João R. Quartilho

Universidade de Coimbra

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A R T I G O S D E R E V I S Ã O

D O R C R Ó N I C A : A S P E C T O S P S I C O L Ó G I C O S , S O C I A I S E C U LT U R A I S

1

Manuel João R. Quartilho*

Sentir a dor depende da existência de uma razão para esta experiência; se a pessoa tiver uma razão, terá dor, mesmo que não tenha qualquer lesão ...

Thomas S. Szasz

Podemos identificar no século XIX uma tentativade melhor compreensão da dor, mediante umasubstituição da anterior teoria biomédica estrita,de carácter reducionista, por uma abordagembiopsicossocial que prometeu, desde logo, umaintervenção terapêutica mais eficaz nas situaçõesclínicas de dor crónica1 (Gatchel, 1999).

A dor crónica é caracterizada, como sabemos,por uma heterogeneidade de lesões ou doençassubjacentes, bem como pela reconhecida hetero-geneidade das respectivas circunstâncias de iní-cio. Muitos doentes com dor crónica, no entanto,podem ser reconhecidos através de manifes-tações clínicas que incluem, para além do habi-tual critério temporal, uma história de tentativasmédicas e cirúrgicas mal sucedidas para o alíviodo sintoma, uma incapacidade física aparente-mente excessiva, por vezes com uma assinaláveldiscrepância entre o comportamento visível e asqueixas subjectivas, e uma proliferação de com-portamentos e sintomas psicossociais que in-cluem experiências de natureza depressiva, con-flitos com familiares e profissionais de saúde, e aadopção do papel de doente (Hanson e Gerber,1990)2. Muitas vezes, os exames complementaressão negativos, ou inconclusivos, e os médicos sen-tem naturais dificuldades terapêuticas, frustradosperante a impossibilidade de uma ajuda eficaz(Sharpe e col., 1994). Nestas condições, quando ador perde a sua função adaptativa inicial e deixade sinalizar uma lesão orgânica, o sintoma deveser estudado à luz de modelos que privilegiem a

influência de factores psicológicos, sociais e cul-turais.

Um bosquejo histórico

A compreensão da dor, aliás, deve respeitar asalterações históricas que se verificaram na medi-cina, em termos gerais. A valorização médica deuma interacção única entre o corpo e o espírito,como é sabido, consagrou uma filosofia holistaque empalideceu ao longo do século XVII. A pers-pectiva dominante segundo a qual o espíritoinfluenciava o corpo caíu em descrédito, e a tare-fa de compreender a alma deslocou-se para o âm-bito da religião e da filosofia. A compreensão cien-tífica do corpo, por sua vez, ficou destinada às fiá-veis cogitações da medicina física. As experiênciasde dissecção do corpo humano estimularam ointeresse geral pela observação, experimentação,e quantificação objectiva. O Iluminismo e o méto-do científico, bem como uma crença paralela no

* Professor Auxiliar da Faculdade de Medicina de Coimbra.Assistente Graduado de Psiquiatria dos Hospitais da Universidade de Coimbra.

1 A dor crónica, neste trabalho, refere-se à persistência de umsintoma para o qual não existem alterações biológicasexplicativas. Simultaneamente, tende a sugerir a presençade factores individuais e ambientais que, de algum modo,concorreram para o desenvolvimento de um síndromedoloroso. Nestas situações clínicas, por vezes, a investigaçãobiológica pode fazer mais mal do que bem, ao suscitar, juntodo doente, a expectativa de uma cura através da ciênciamédica. Por outro lado, tendem a ser desvalorizados os fac-tores psicológicos ou psiquiátricos envolvidos, as experiên-cias traumáticas, o grau de satisfação profissional e os con-flitos familiares, os constrangimentos financeiros, ou então,numa palavra, todas aquelas situações que perturbam dras-ticamente as relações entre o indivíduo e o seu contextosituacional e contribuem, assim, para a manutenção da dore do sofrimento.

2 O conceito sociológico do papel de doente designa, basica-mente, uma isenção temoporária das responsabilidadessociais e profissionais, associada à necessidade de procurade cuidados de saúde, na expectativa de uma recuperaçãosatisfatória dos papéis sociais normais. Para uma análisemais detalhada do conceito e aspectos relacionados, verQuartilho (1998)

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MANUEL JOÃO R. QUARTILHO

avanço do conhecimento humano através datecnologia, implantaram uma visão completa-mente distinta da dor (Gatchel, 1999).

O corpo humano passou desta forma a serexplicado pelos seus próprios mecanismos. Oreducionismo biomédico operou uma impor-tante revolução no conhecimento, através dodesenvolvimento simultâneo da anatomia, biolo-gia, fisiologia e física, diferentes disciplinasbaseadas nos princípios consensuais da investi-gação científica. No domínio específico da dor, omodelo biomédico centrou a sua atenção nopapel do input sensorial periférico, a partir dereceptores específicos, e na modulação e trans-formação desta informação da periferia para osistema nervoso central (Turk e Flor, 1999). Pre-dominava então uma ênfase nas estruturas peri-féricas da sensação dolorosa, na presunção deuma relação directa, mais ou menos linear, entreo registo subjectivo de dor e a intensidade do estí-mulo doloroso.

Mas esta nova perspectiva de estudo tambémalimentou uma visão dualista sobre o funciona-mento do corpo e do espírito, como se estes fun-cionassem de um modo separado e indepen-dente. O principal mentor desta visão dualista,entre outros, foi Descartes, um autor para quem oespírito era uma entidade autónoma, incapaz deafectar os processos somáticos. Este ponto devista dualista foi reforçado durante o século XIX,uma vez que algumas doenças, segundo sedescobriu, podiam ser causadas por microorga-nismos patogénicos.

Teorias iniciais da dorCom efeito, Descartes encarou o sistema da dorcomo um canal que unia directamente a pele e océrebro, ao oferecer uma analogia segundo a qualeste sistema funcionava como um sino, na torreda igreja. Se uma pessoa puxasse a corda cá embaixo, o sino tocava lá em cima. Do mesmo modo,se uma chama fosse aplicada a um pé, este factocausaria um movimento de partículas que setransmitiria à perna e depois ao cérebro, ondeactivaria uma espécie de sistema de alarme.

If for example fire comes near the foot, minute par-ticles of this fire, which you know move at greatvelocity, have the power to set in motion the spot ofskin on the foot which they touch, and by thismeans pulling on the delicate thread which isattached to the spot of the skin, they open up at the

same instant the pore against which the delicatethread ends, just as by pulling on one end of a ropeone makes to strike at the same instant a bellwhich hangs at the end (Descartes, 1640, cit. inWall, 1999)

Von Frey, em 1894, propôs a chamada teoria daespecificidade da dor. Quando a medula espinhaldos animais de laboratório era lesada, verificava--se que a dor e o toque eram independentes entresi e dependentes da área atingida. Esta teoria de-fendeu que havia receptores sensoriais específi-cos, que por sua vez seriam responsáveis pelatransmissão de sensações diferentes, como a dor,o toque ou a pressão. Estes diferentes receptoressensoriais teriam diferentes estruturas e estasdiferenças torná-los-iam sensíveis a diferentes ti-pos de estimulação sensorial. Tal como na teoriade Descartes, assumia-se a existência de umarelação directa e invariante entre um estímulofísico e a sensação produzida. Esta teoria não eramais, portanto, do que uma versão científica mo-derna da doutrina cartesiana, ao separar, maisuma vez, os factores psicológicos da dor «ver-dadeira».

Independentemente doutros contributos teó-ricos iniciais, o fenómeno da dor continuava porexplicar, em toda a sua imensa complexidade.Para além da incapacidade médica e cirúrgicapara se resolverem muitas situações clínicas dedor, várias outras observações vieram desafiar omodelo biomédico (Turk e Flor, 1999). Se hou-vesse uma transmissão directa da periferia para amedula espinhal e depois para o cérebro, comopropunha o referido modelo, era difícil explicar,por exemplo, porque é que diferentes indivíduoscom o mesmo diagnóstico e a mesma patologiafísica evidenciavam respostas diferentes a trata-mentos similares. A ausência de patologia na pre-sença de dor, como parecia acontecer em muitoscasos de cefaleias e lombalgias crónicas, bemcomo a presença de alterações patológicas naausência de dor, noutros casos, constituíam argu-mentos adicionais contra o modelo biomédico. Arelação isomórfica entre patologia orgânica e aincapacidade resultante, proposta pelo mesmomodelo, também suscitou dúvidas no contextoclínico. A dor teria que ser melhor entendida,portanto, à custa de uma complexa interacçãoentre factores biomédicos e psicossociais.

Muitos autores assinalaram a importância defactores psicológicos na experiência subjectiva da

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dor. Os trabalhos de Sigmund Freud na Europa ede Benjamin Rush nos Estados Unidos reno-varam o interesse pela influência destes factorespsicológicos e pelo conceito de psicogénese3. Esteúltimo baseava-se na crença segundo a qual osfactores psicológicos podiam influenciar, de al-gum modo, os processos do corpo (Lipowsky,1986).

O século XX tornou-se ainda mais permissivoface a uma renovada abordagem holista da saúdee da doença, sobretudo por causa do advento dapsiquiatria moderna e da medicina psicossomáti-ca. Mas esta última, de algum modo, veio expres-sar um descontentamento com as explicaçõeslineares da psicanálise, sustentadas na importân-cia privilegiada de factores psicológicos que, deuma forma mais ou menos linear, conduziriamao aparecimento das «doenças psicossomáticas».O conceito de psicogénese foi posto em causa.Em seu lugar, foi amplamente difundido ummodelo sistémico, o chamado modelo biopsicos-social, sublinhando a importância das interac-ções entre os factores biológicos, psicológicos esociais, na expectativa de uma compreensão maiseficaz dos estados de saúde e de doença (Engel,1977).

Este movimento conceptual integrou igual-mente as perspectivas sobre a dor, que começa-ram por reconhecer a importância do estado psi-cológico do indivíduo, sobretudo na forma diver-sa como este podia reagir ao sintoma doloroso. Oestudo deste sintoma em dois grupos popula-cionais, dentro e fora dos palcos de guerra, cons-tituíu um dos exemplos favoráveis à importânciado contexto psicológico, em indivíduos com feri-mentos de gravidade similar4. O alívio da dor me-diante a administração de placebo, as dores domembro fantasma e as lesões auto-infligidas semexperiência de dor, constituíram evidências adi-

cionais favoráveis a uma influência determinantedos factores psicossociais (Gamsa, 1994 a e b).

Gate Control TheoryMas a principal teoria que salientou a importân-cia da relação entre factores fisiológicos e psi-cológicos foi proposta por Melzack e Wall, em1965, ao defenderem uma integração dos diver-sos factores, centrais e psicológicos, envolvidosna percepção da dor (Gatchel, 1999). Esta teoriaassumiu a presença de várias estruturas, no SNC,responsáveis pelo sintoma. Propôs a existência deuma «porta», na medula espinhal, que podia seraberta ou fechada por sinais ascendentes oudescendentes. Ou seja, o atleta com uma lesãoaguda que continuasse a competir sem sentirdores não estaria consciente da lesão porque ossinais acendentes, com origem no local do trau-matismo, seriam bloqueados, ao nível da «porta»,por sinais descendentes, incluindo, por exemplo,um elevado nível de concentração competitiva.

Mais especificamente, a teoria da «porta»referiu a existência de três sistemas relacionadoscom o processamento da informação nociceptiva– sistema discriminativo-sensorial, sistema moti-vacional-afectivo e sistema cognitivo-avaliativo –todos eles contribuindo para a experiênciasubjectiva de dor. Deste modo, a experiência dador não seria, como tinham proposto as teoriasanteriores, o resultado simples de uma trajectóriadirecta entre a pele e o cérebro. Este caminho,pelo contrário, seria muito mais complexo, commodificação eventual dos impulsos periféricos,causada por impulsos inibidores com origemcentral. Nestas condições, era reconhecida a me-diação descendente do sistema nervoso centralna percepção da dor e considerada a hipótese deque esta mediação fosse feita, eventualmente, àcusta de factores psicológicos, não obstante uma

3 A medicina psicossomática moderna resultou da confluência de duas ideias fundamentais: psicogénese e holismo (Lipowsky,1986). O conceito de psicogénese consistiu na crença de que os factores psicológicos («emoções» ou «paixões», como eram entãodesignados) podiam causar doenças, um postulado que vigorou até aos anos 60 e alicerçou as teses da psicanálise, inicialmenteprotagonizadas por um autor, Franz Alexander, que afirmou a existência das “doenças psicossomáticas”, como a hipertensão arte-rial, artrite reumatóide, úlcera péptica e asma brônquica, mediante uma alegada teoria da especificidade. Esta teoria explicativasugeriu, basicamente, que os conflitos inconscientes não resolvidos eram geradores de tensões emocionais crónicas cujos corre-latos fisiológicos, assim determinados, provocavam disfunções ou mesmo alterações estruturais em órgãos específicos. Esta pers-pectiva encontra-se hoje largamente desacreditada, considerando-se que o conceito de psicogénese resulta de um raciocíniosimplista, linear, incompatível com as assunções actuais sobre interacções e multicausalidade (Quartilho, 1998).

4 Patrick Wall refere vários exemplos que valorizam a importância do contexto, incluindo os palcos de guerra. Em situações de dor,segundo o autor mencionado, o indivíduo avalia a sua «miséria privada» e exibe um comportamento público. A sua «miséria pri-vada» não tem, necessariamente, a ver com a sua dor. Um soldado israelita com uma perna estilhaçada, por causa de uma bomba,foi questionado sobre as dores que tinha, na sequência da explosão. Respondeu que «a dor não é nada … quem é que vai casarcomigo agora?» (Wall, 1999).

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MANUEL JOÃO R. QUARTILHO

escassa elaboração não fisiológica do modeloproposto. A experiência da dor passava assim aser considerada como resultando de umasequência de actividades – de natureza larga-mente reflexiva no início, mas modificável desdeas fases iniciais por uma ampla variedade deinfluências excitatórias e inibitórias, tanto ascen-dentes como descendentes, relacionadas com aactividade do sistema nervoso central. O anun-ciado modelo biopsicossocial era claramentecompatível com a formulação de Melzack e Wall.

Modelo biomédico versus modelo biopsicossocialComo vimos, este modelo propõe uma integra-ção de estímulos periféricos com variáveis psico-lógicas, como a ansiedade ou o estado de humor,na percepção da dor. Contraria portanto a noçãode que a dor é somática ou psicogénica, defen-dendo antes que ambos os factores, físicos epsicológicos, influenciam a percepção da dor. Poroutro lado, ainda em contraste com o modelobiomédico, centra a sua atenção na experiênciasubjectiva da dor, e no modo peculiar como opessoa, a sua família e rede social de apoio inter-pretam e respondem aos sintomas de dor e inca-pacidade associada5. Deste ponto de vista, adiversidade observada na expressão da dor e suasconsequências é interpretada no cruzamento dasalterações biológicas com os contextos psicológi-cos, sociais e culturais que influenciam a per-cepção e as respostas do indivíduo ao sintomadoloroso (Turk, 1996).

O modelo biopsicossocial passou deste modoa contrastar com o chamado modelo biomédico.Engel (1977) referiu que o modelo biomédicoconstituía o modelo de doença dominante, assu-mindo-se então que as doenças seriam completa-mente explicáveis à custa de variáveis biológicasmensuráveis. Em alternativa, propôs um modeloque garantisse uma maior atenção à pessoadoente, e não apenas à doença, em contraste como «imperativo cultural» da biomedicina. De uma

forma mais concreta, e tendo em conta os váriosmodelos de dor, alinhados ao longo do tempohistórico, podemos agora afirmar que 1) o mode-lo biomédico é mais apropriado na dor aguda,enquanto que o modelo biopsicossocial é maisútil na compreensão da dor crónica; 2) o modelobiomédico valoriza mais a nocicepção periférica,ao passo que o modelo biopsicossocial reconhecea importância de mecanismos centrais; 3) omodelo biomédico valoriza sobretudo os meca-nismos de doença físicos, enquanto que o mode-lo biopsicossocial valoriza o comportamento dedoença6; 4) o modelo biomédico propõe umavisão reducionista, e o modelo biopsicossocial,pelo contrário, defende uma abordagem sistémi-ca (Hanson e Gerber, 1990). Do ponto de vista te-rapêutico, portanto, a passagem de um modelobiomédico para um modelo psicossocial con-sagra uma transição de atitudes que trocam umaênfase nos exames complementares e na cirurgiapor uma atitude mais realista de contensão eapoio individual e familiar (Bass, 2000).

Os factores psicológicos e sociais deixaramassim de ter um estatuto secundário, em relaçãoao sintoma dor. Passam a exercer, pelo contrário,uma influência assinalável na intensidade, per-sistência e exacerbação das suas manifestaçõesclínicas. Mas não obstante a referência à impor-tância dos factores psicológicos, o modelo biopsi-cossocial não se pronuncia sobre a naturezadestes factores nem define as variáveis específi-cas habitualmente associadas à dor. Por outrolado, não está isento de críticas, dado o seu carác-ter genérico, abstracto, contemplativo, e a suaaparente transformação numa espécie de amule-to conceptual, banalizado pela justaposição acrí-tica de variáveis. Ou seja, o modelo biopsicosso-cial deu-nos os ingredientes, mas não nos deu areceita (Quartilho, 1998).

As contribuições de Wilbert FordyceFordyce centrou a sua atenção não tanto naexperiência subjectiva do sintoma dor, mas mais

5 Esta é uma distinção clássica entre disease e illness. Eric Cassel utilizou o termo illness para designar o que o doente sente quan-do vai ao médico. Mas também utilizou a palavra disease para caracterizar o que ele traz para casa, quando sai do gabinete deconsulta. Na sua opinião, portanto, a disease é algo que o órgão tem; a illness, por sua vez, é algo que a pessoa tem. É constituídapela resposta subjectiva do indivíduo e dos seus familiares e conhecidos à sua situação de saúde, em particular os modos comoé interpretada a origem e relevância dos seus sintomas, o modo como estes afectam a relação com as outras pessoas e os váriospassos que tem de percorrer para resolver a situação (Quartilho, 1998)

6 O conceito de comportamento de doença deve muito aos trabalhos de David Mechanic. Designa o modo peculiar como as pes-soas monitorizam e interpretam os seus sintomas, bem como as acções reparadoras que realizam (ou não realizam) para trataresses sintomas. Para uma avaliação mais detalhada deste conceito e aspectos relacionados, ver Quartilho (1998)

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no designado comportamento de dor, incluindonão só as verbalizações do doente, mas também oseu comportamento observável. A dor, com efei-to, é caracterizada pela presença de dois compo-nentes distintos: a sensação original e a reacção àsensação. Esta reacção, voluntária ou não, surgesob a forma de um comportamento, o comporta-mento de dor, que pode incluir alterações naexpressão facial, alterações na actividade físicaou no comportamento global, o recurso a certaspalavras ou sons que testemunham, em geral, umestilo descritivo e/ou um pedido de ajuda parti-culares7. Este comportamento de dor, variável deacordo com o contexto clínico, é muito frequentena ausência de estímulo nociceptivo. O doentemanifesta-se, assim, através de uma dor exclusi-vamente «pública». Mas o mesmo comportamen-to, por outro lado, pode não ser visível na pre-sença de um estímulo doloroso. Aqui, pelo con-trário, pode prevalecer uma dor exclusivamente«privada», clandestina, que não se transferiu parao espaço partilhado das relações sociais. Aosalientar a importância da avaliação comporta-mental na dor crónica, Fordyce referiu:

Os métodos comportamentais para se trata-rem os comportamentos de dor crónica não sedestinam a «tratar a dor» no sentido tradicionalem que isto implica uma atenção directa àsfontes e mecanismos dos estímulos nocivos quegeram sinais de lesão e determinam «dor». Osmétodos comportamentais não têm como princi-pal objectivo a modificação da nocicepção, nem amodificação directa da experiência de dor, embo-ra aconteça com frequência que ambas sejaminfluenciadas por estes métodos. Em vez disso, osmétodos comportamentais visam tratar a inca-pacidade excessiva e as expressões de sofrimen-to... o objectivo consiste em tornar novamentefuncionais os doentes com dor crónica, com umcomportamento tão normal quanto possível...(Fordyce e col., 1985; cit. por Gatchel, 1999).

A ênfase é, portanto, colocada na necessidadede observação objectiva do comportamentoobservável, juntamente com o auto-registo, naexpectativa de uma avaliação compreensiva doscomportamentos de dor crónica. Ou seja, a ava-liação e tratamento dos comportamentos de dordeveria incluir vários componentes – auto-regis-to, comportamento visível, índices fisiológicos -(Gatchel, 1999). Na verdade, a dor é um fenó-meno muito complexo, não é apenas um acon-tecimento sensorial. No caso particular da dorcrónica, é comum dizer-se que o sintomadoloroso perdeu a sua função biológica. Se élegítimo (e útil) invocar mecanismos biológicosna fase inicial do sofrimento doloroso, a verdadeé que a sua persistência temporal transfere-opara um espaço partilhado com outras pessoas,dentro e fora da família, tornando deste modoinsatisfatórias as possibilidades de compreensãoque são oferecidas por um paradigma biológicoestrito. Na práctica clínica da Reumatologia, onúmero de sinais inflamatórios articulares nãotem uma correspondência linear com os compor-tamentos de dor. Existem doentes com evidênciaescassa de actividade inflamatória que apresen-tam queixas exuberantes, dramáticas, e doentescom deformação articular generalizada que, pelocontrário, ilustram uma atitude mais ou menossilenciosa de estoicismo e resistência ao sintomadoloroso. As explicações biológicas tornam-secada vez menos pertinentes à medida que a dorprivada se metamorfoseia em fenómeno público(Quartilho, 1996).

Dor e factores psicológicos

Sendo hoje consensual a influência dos factorespsicológicos na dor, importa agora definir as va-riáveis específicas e os conceitos relacionados.Consideremos os factores comportamentais,

DOR CRÓNICA: ASPECTOS PSICOLÓGICOS, SOCIAIS E CULTURAIS

7 A linguagem utilizada pelos doentes é ilustrativa. Os doentes com o diagnóstico de fibromialgia, por exemplo, parecem recorrera um vocabulário «mais intenso» para descreverem as suas dores, em comparação com doentes sofrendo de artrite reumatóide.As palavras utilizadas pelos doentes, portanto, podem ser diferentes consoante os quadros clínicos. O recurso a expressõesmetafóricas destinadas a caracterizar as experiências subjectivas de dor, como se os braços estivessem a ser «cortados» ou «par-tidos», como se o joelho estivesse a «explodir» ou o próprio doente estivesse a ser «queimado pelo fogo», pode denotar uma difi-culdade genuína na exposição pública de um sintoma complexo (Soderberg e Norberg, 1995). Trata-se de um modo descritivo,exuberante, comum em doentes com o diagnóstico de fibromialgia. Outros exemplos destas expressões metafóricas incluem as«dores de morrer», «dores de chorar», «dores de gritar», «dores de não me poder mexer», «dores de ficar tolhido», «dores de batercom a cabeça nas paredes», «dores de me atirar para o chão», «dores de apetecer atirar-me da janela abaixo» (Nogueira, 1996).Mais do que um sintoma, são expressões que denotam um estilo avaliativo peculiar, influenciado por factores individuais, sociaise culturais (Quartilho, 1999).

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afectivos, e cognitivos. Vejamos o que se sabesobre as relações entre personalidade e dor, bemcomo ainda outros aspectos, mais específicos,relacionados com a avaliação clínica destesdoentes. Serão incluídos os acontecimentos devida, as experiências de abuso e negligência afec-tiva, e ainda algumas questões interpessoais rela-cionadas com a dor crónica. Na segunda partedeste trabalho faremos algumas consideraçõessobre a importância dos factores culturais naexperiência e expressão da dor. Numa palavra,tentaremos descobrir «a pessoa por detrás dador» (Roy, 1992).

Factores comportamentaisFordyce (1979) inaugurou uma nova era de pen-samento sobre a dor, como vimos, ao descrever aimportância dos factores operantes na dor cróni-ca. De acordo com o modelo operante, as mani-festações comportamentais da dor assumemuma relevância central. Os comportamentos dedor (por ex., queixas, auto-medicação, inactivi-dade física) podem ser reforçados directamentepelo companheiro ou pelo sistema de cuidadosde saúde, mediante uma atenção ou solicitudeespeciais para com os sintomas apresentadospelo doente. De acordo com este modelo, umestudo verificou que a atenção positiva da com-panheira se associava a uma redução nos níveisde actividade física do doente com dor crónica,enquanto que as respostas percebidas pelodoente como passivas ou punitivas, pelo con-trário, se associavam a um aumento da sua activi-dade física. Ou seja, os doentes cujos cônjugesignoraram a sua dor ou lhe responderam de umaforma negativa, revelaram maior actividade física(Flor e col., 1987).

Os comportamentos de dor podem tambémser mantidos indirectamente, quer pelo evita-mento de estímulos que causam dor, quer atravésdo consumo de analgésicos ou recurso ao des-canso passivo, ou ainda à custa de um evitamen-

to antecipatório de actividades indesejáveis, emcasa ou no local de trabalho. Tal como referiuFordyce (1979), uma pessoa com dor na faseaguda ou respondente pode verificar que oaumento da actividade física origina desconfortoe que o repouso, pelo contrário, alivia o sintomadoloroso. Mas quando a dor se torna crónica, aspropriedades terapêuticas do repouso tendem aser nulas, ao mesmo tempo que se acentuam osfenómenos de descondicionamento físico e sereduz claramente a eficácia terapêutica dos com-portamentos saudáveis8. Ou seja, estes comporta-mentos saudáveis, como o exercício físico, asrelações sociais ou a actividade profissional,podem não ser suficientemente reforçadores, emcontraste com o reforço consistente dos compor-tamentos de dor que, deste modo, tendem a sermantidos, perpetuando situações de incapaci-dade. O comportamento de dor que foi inicial-mente causado por factores orgânicos pode vir aocorrer, no todo ou em parte, em resposta a con-tingências de reforço ambiental. Ou seja, de acor-do com o modelo operante, os comportamentosde dor podem persistir muito tempo depois deremovida ou aliviada a causa inicial da dor, geral-mente associados a queixas subjectivas de inca-pacidade. De acordo com Fordyce, a propósitodas relações sinérgicas entre incapacidade ecomportamentos de dor, os tubarões mantêm-seem movimento, dentro de água, para poderemrespirar e sobreviver. O organismo humano, porseu lado, começa a morrer, ou pelo menos a dete-riorar a qualidade do seu estado geral, quandodeixa de se movimentar (Fordyce, 1988).

O modelo operante, portanto, não parece in-teressado nas causas iniciais do sintoma doloro-so. Interessa-se bem mais pela função comunica-tiva dos comportamentos de dor, que devem serencarados como formas particulares de comuni-cação social, cujos significados devem ser desco-bertos em cada caso individual9. As consequên-cias mais favoráveis dos comportamentos de dor

MANUEL JOÃO R. QUARTILHO

8 O descondicionamento físico pode ser considerado como um importante factor de manutenção nalguns síndromes de dor cróni-ca (ex: fibromialgia, síndrome de fadiga crónica). Este dado tem importantes implicações terapêuticas, numa perspectiva cogni-tivo-comportamental.

9 Os sintomas somáticos funcionais, ou os comportamentos de dor crónica, podem ser interpretados como mensagens dirigidas aoutras pessoas, a propósito de sentimentos ou circunstâncias específicas. É difícil assumir o carácter voluntário ou involuntáriodestes comportamentos, mas é muitas vezes óbvio o significado potencial das queixas do doente, junto das outras pessoas, sobre-tudo no espaço familiar. Aqui, podem existir contingências que reforçam os sintomas físicos e proíbem as queixas emocionais,promovendo um estilo expressivo somático. No contexto de uma relação conjugal tensa, caracterizada por relações de poderdesiguais, a dor crónica pode constituir uma expressão oblíqua de insatisfação na impossibilidade de um confronto directo, ver-bal, com a eventual prepotência ou animosidade do cônjuge (Quartilho, 1999).

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são geralmente condensadas em termos deganho pessoal (primário e/ou secundário)10. Masa expressão destes comportamentos, por sua vez,está muitas vezes associada a uma complexa in-teracção de factores físicos, cognitivos e afectivos(Turk e Okifuji, 1997).

O comportamento manifesto das pessoas comdor integra elementos voluntários e involun-tários, tal como acontece em muitas outras situa-ções de doença. Com efeito, assiste-se frequente-mente a uma mistura de «respostas voluntárias einvoluntárias na expressão da doença ... em que odoente tem algum controlo sobre a forma comose manifesta a sua doença... sendo o seu compor-tamento influenciado pelo contexto em que seencontra...» (Lewis, 1980). As reacções volun-tárias à dor crónica que envolvem outras pessoassão especialmente vulneráveis à influência deconvenções sociais e culturais, para além dosfactores acima referidos. Mas embora os factoresoperantes sejam importantes na manutenção daincapacidade, o modelo operante tem sido sobre-tudo criticado por dar prioridade ao comporta-mento motor, mais visível, denotando destaforma uma aparente indisponibilidade paraincluir os aspectos emocionais e cognitivos dosintoma, ou seja, a experiência da dor.

Os factores que contribuem para a instalaçãoda cronicidade também podem ser iniciados emantidos através do condicionamento respon-dente. A não ocorrência de dor é um poderosoreforço para a redução da actividade e, portanto,o condicionamento respondente original podeser seguido por um processo de aprendizagemoperante através do qual o estímulo nociceptivo eas respostas associadas não precisam de estarpresentes para que ocorra o comportamento deevitamento. Na dor aguda, pode ser muito útilreduzir o movimento e evitar a dor, por forma aacelerar o processo de recuperação. Ao longo dotempo, contudo, pode instalar-se uma ansiedadeantecipatória relacionada com a actividade física,que actua desta forma como um estímulo condi-cionado para a activação simpática (respostacondicionada), que se pode manter depois deterem desaparecido o estímulo incondicionado(lesão) e a resposta incondicionada (dor e activa-ção simpática) originais.

Na dor aguda, muitas actividades neutras ouagradáveis podem causar ou agravar a dor. Destemodo, são consideradas como aversivas e ten-dem a ser evitadas. Ao longo do tempo, cada vezmais actividades podem vir a ser encaradas como«perigosas», susceptíveis de causar ou agravar ador, e também tenderão a ser evitadas (generali-zação do estímulo). O medo da dor pode ficarcondicionado a um número cada vez maior desituações, incluindo a actividade física, profis-sional ou de lazer, ou ainda a actividade sexual.

O doente pode assim aprender a associar umaumento na intensidade da dor a todos os estí-mulos que se ligaram inicialmente ao estímulonociceptivo (generalização do estímulo). Com-portamentos como sentar, andar a pé, ler ouinteragir com outras pessoas, as relações sexuaisou os simples pensamentos àcerca de todas estasactividades, podem causar ansiedade anteci-patória, com manifestações de activação simpáti-ca e aumento da tensão muscular. Neste contex-to, os doentes podem exibir respostas maladapta-tivas a muitos estímulos e reduzir a prática demuitas actividades, para além das que se associa-ram à estimulação nociceptiva original. Na medi-da em que persistem os sintomas de dor, cada vezmais situações podem causar ansiedade e dor porantecipação. No caso específico da dor crónica, aantecipação ou prevenção do sintoma dolorosopodem ser suficientes para a persistênciaduradoura do comportamento de evitamento(Turk e Flor, 1999).

Factores afectivos

As relações entre informação sensorial e estadoafectivo são hoje reconhecidas na literatura. A dornão é apenas uma sensação gerada por nocicep-tores, é também uma percepção com característi-cas emocionais particulares. Não obstante poder-mos separar os componentes sensoriais e afecti-vos da dor, esta separação não implica inde-pendência (Fernandez e Turk, 1992). Os compo-nentes afectivos da dor incluem muitas emoçõesdiferentes, geralmente com uma qualidade nega-tiva. A ansiedade e a depressão, em especial, têmrecebido uma atenção considerável da literatura,

DOR CRÓNICA: ASPECTOS PSICOLÓGICOS, SOCIAIS E CULTURAIS

10 Ganho primário refere-se a um mecanismo psicológico cujo objectivo consiste no alívio de um afecto ou conflito inaceitáveis. Oganho secundário, por sua vez, designa o benefício interpessoal ou ambiental que é oferecido pelo comportamento de dor.

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em doentes com dor crónica.É possível que entre 40 a 50% de doentes com

dor crónica sofram de depressão. Em muitoscasos, parece que a depressão constitui umaresposta do doente à sua condição sintomática.Mas também é importante perguntar porque éque nem todos os doentes com dor crónica depri-mem, dada a natureza do sintoma e o seuimpacto global. É possível que a avaliação que osdoentes fazem sobre o impacto da dor nas suasvidas e a sua capacidade de controlar a dor, porexemplo, funcionem como um factor de media-ção entre a dor e a depressão. Mas as frustraçõesrelacionadas com a persistência dos sintomas, aescassez de informação sobre a causa das dores ea habitual sucessão de fracassos terapêuticos,tudo isto contribui para o humor disfórico geraldestes doentes, independentemente da acção deoutros factores.

Relações entre sintomas depressivos e dorcrónicaAs relações entre os sintomas depressivos e a dorcrónica têm merecido um vasto debate na lite-ratura científica. É provável que estes sintomasnão resultem, simplesmente, de uma situação dedor crónica (Hawley e Wolfe, 1993). O reconheci-mento da sua coexistência não permite, na ver-dade, estabelecer uma relação de causalidadesimples. Em termos gerais, podemos considerarquatro hipóteses possíveis: 1) os sintomas de-pressivos aumentam a sensibilidade somática; 2)a depressão pode causar dor crónica; 3) adepressão resulta da experiência de dor crónica;4) a depressão e a dor crónica são experiênciasconcomitantes, geradas por mecanismos biológi-cos comuns (Robinson e Rilley III, 1999).

A primeira hipótese sugere que a depressãoaumenta ou perpetua os registos de dor crónicaatravés de um mecanismo sensorial. A interpre-tação negativa dos acontecimentos, característicados doentes deprimidos, também poderia facili-tar uma «interpretação dolorosa» das sensaçõesfisiológicas. Mas muitos doentes, sabemo-lo pelaprática clínica, continuam a exibir registos sub-jectivos de dor intensa, mesmo quando não estãodeprimidos. A segunda hipótese sugere que a dor

crónica pode ser causada pela depressão. Masexistem muitos doentes com dor crónica que nãotêm manifestações depressivas nos seus antece-dentes. A terceira hipótese sustenta que adepressão seria uma reacção psicológica à dorcrónica. Esta relação tem sido explicada à custade vários factores de mediação cognitiva, comosejam o estilo atribucional, as cognições catastró-ficas, uma auto-imagem negativa ou aindacrenças não adaptativas, relacionadas com a dor.Mas estes factores também não provam, obvia-mente, a existência de uma relação de causali-dade entre dor crónica e depressão. Afinal, comosabemos, a depressão pode anteceder a dorcrónica. Uma quarta hipótese, finalmente, sus-tenta que a dor e a depressão são fenómenossimultâneos, ambos relacionados com alteraçõesbiológicas comuns. No entanto, a relação crono-lógica entre os dois tipos de manifestação clínica,em muitos doentes, contraria esta assunçãocausal.

Mas quando os sintomas depressivos ocorremno contexto da dor crónica, é lícito pensarmosque existe uma relação específica entre o sintomador e os sintomas psicológicos? A dor crónicaencerra alguma qualidade essencial, algum atri-buto específico que predisponha o doente aoaparecimento de sintomas depressivos? Conside-remos, sucessivamente, o modelo de distorçãocognitiva, o modelo de desespero aprendido e osmodelos comportamentais da depressão, rela-cionados com situações de dor crónica (Banks eKerns, 1996).

O modelo de distorção cognitiva sustenta quecertos indivíduos são mais vulneráveis à depres-são porque adquirem, numa fase precoce do seudesenvolvimento, esquemas negativos relaciona-dos consigo próprios e com as suas experiências.Quando confrontados com factores de stress,estes esquemas são activados, recuperando pen-samentos negativos sobre o próprio, o mundo e ofuturo, a conhecida tríade cognitiva de Beck11.Aplicado à dor crónica, este modelo sugere quecertos indivíduos têm uma vulnerabilidadecognitiva prévia para a depressão, sob a forma deesquemas cognitivos. Esta vulnerabilidade seriaactivada pela experiência da dor crónica, aqui

MANUEL JOÃO R. QUARTILHO

11 A tríade cognitiva de Beck é característica da depressão. As pessoas deprimidas, com efeito, têm muitas vezes uma atitude nega-tiva em relação a si próprias, uma posição negativa face ao mundo e ainda uma expectativa negativa, pessimista, em relação aofuturo.

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entendida como um factor de stress individual.Quanto ao modelo do desespero aprendido, a

sua reformulação sublinhou a importância da in-terpretação individual dos acontecimentos in-controláveis, propondo que as atribuições causaisfazem a mediação entre a ausência de controlo eo desenvolvimento da depressão (Abramson ecol., 1978). As atribuições para a ausência de con-trolo, sentida pelo indivíduo, podem ser classifi-cadas de acordo com as dimensões de internali-dade, cronicidade e globalidade (Vaz Serra, 1989).As pessoas que tendem a fazer atribuições inter-nas, estáveis e globais, caracterizadas por teremum estilo atribucional depressivo, correm ummaior risco de desenvolverem sintomas depres-sivos sempre que são confrontadas com aconte-cimentos negativos incontroláveis. Aplicado aocontexto da dor crónica, este modelo sugere que osintoma doloroso, ele próprio, é uma circunstân-cia negativa incontrolável. Ao longo do tempo, aexperiência persistente da dor pode criar a noção,junto do indivíduo, de que não há nada que elepossa fazer, para controlar o sintoma. Ao pergun-tar a si próprio porque tem dor, ou a razão pelaqual não a consegue controlar, o indivíduo faria,de acordo com o modelo reformulado, atribui-ções internas («não consigo aguentar a dor por-que sou fraco»), estáveis («sempre que faço algumesforço, fico cheio de dores») e globais («tudo mecorre mal») que, eventualmente, se poderiamgeneralizar a vastos domínios de actividade.

O modelo comportamental da depressão podeajudar-nos a compreender a sequência dor cróni-ca-depressão, por exemplo em doentes comfibromialgia (Quartilho, 1999). Estes doentes,como sabemos, queixam-se geralmente com dore outros sintomas somáticos, em vários sistemasorgânicos. Deste modo, é admissível, por partedestes doentes, um menor envolvimento emmuitas actividades que, no passado, constituíramfontes de reforço positivo. Estas actividades, nopresente, fazem-se acompanhar de dores e sãotomadas, portanto, como aversivas. Assim, odoente com fibromialgia reduz ainda mais assuas actividades instrumentais, alegando inca-pacidade física ou receio pelo agravamento dossintomas. Iniciar-se-ia, deste modo, um ciclo vi-cioso caracterizado por uma redução do reforço,redução da actividade, sintomas somáticos e

depressão. Esta surgiria, deste modo, como umaconcomitante psicológica do descondiciona-mento físico (Banks e Kerns, 1996).

Todos os modelos considerados, portanto,podem ser considerados em termos de vulnera-bilidade à depressão, uma vulnerabilidade que éactivada pelo cruzamento com um factor ou con-texto de stress. Mas são modelos que sacrificam aimportância do factor de stress, ou seja, da dorcrónica, em favor da vulnerabilidade menciona-da. Uma integração eficaz dos dois componentespermitiria a construção de um modelo dediátese-stress para as relações entre dor crónica edepressão. De um lado, as vulnerabilidades pre-conizadas pelos modelos cognitivo-comporta-mentais acima referidos. Do outro, a dor crónica,caracterizada pela concentração negativa dosseus elementos sensoriais e emocionais, perdassecundárias, incapacidade e respostas deslegiti-madoras12, no contacto com os serviços de saúde(Banks e Kerns, 1996).

Uma conclusão legítima, a propósito das rela-ções entre dor e depressão, é a de que todas ashipóteses são plausíveis. Nos doentes com odiagnóstico de fibromialgia, os sintomas depres-sivos podem coexistir com as manifestações ca-racterísticas do síndrome doloroso. Mas tambémpodem aparecer antes, ou depois, dessas mani-festações clínicas. A vaga possibilidade de umaetiologia comum, remetendo-nos para uma dis-função biológica mal definida, é uma hipóteseque surge por exclusão das hipóteses anteriores(Hudson e Pope, 1996). Logo, é possível que as re-lações entre dor crónica e depressão sejam me-diadas, afinal, por outras variáveis, biológicas epsicossociais, tal como acontece nas relações,mais genéricas, entre as perturbações do afecto eas doenças orgânicas (Cohen e Rodriguez, 1995).

Contextos sociais e interpessoaisO processo de somatização (Quartilho, 1998)pode constituir uma das variáveis, justificando acomorbilidade entre dor crónica e depressão.Alguns estilos cognitivos, como a catastrofização,considerada como uma variável independente dadepressão (Geisser e col., 1994), podem tambémfazer a ponte entre dor crónica e sintomas de-pressivos. Os factores de natureza social ou inter-pessoal, finalmente, podem contribuir para uma

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12 Para uma análise dos processos de deslegitimação na dor crónica e na fibromialgia, ver Good e col. (1992) e Quartilho (1999).

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deficiente adaptação a situações de dor crónica,ajudando assim à emergência de sintomatologiadepressiva. Uma percepção de ausência de apoiosocial, a precariedade do ambiente familiar ou oprocesso de deslegitimação das queixas de dorapresentadas pelo doente, são apenas algunsexemplos desta mediação social/interpessoal,entre dor crónica e depressão.

Por outras palavras, uma definição biomédicaestrita de dor crónica e uma associação linear,não reflexiva, com uma categoria psiquiátrica,neste caso uma depressão, é parcialmente res-ponsável pela desvalorização das variáveis sociaise interpessoais no desenvolvimento da sintoma-tologia depressiva. A experiência da dor crónicarequer uma validação social do sofrimento. Esteprocesso de validação, ou a sua ausência, influen-cia o comportamento do doente, que por sua vezinfluencia as respostas das outras pessoas, no seumundo familiar e social, ou no âmbito dos cuida-dos de saúde. Os doentes podem sentir-se maisfrustrados quando tentam explicar ou legitimaros seus sintomas junto de pessoas que não fazemparte do seu círculo social mais próximo, incluin-do os profissionais de saúde. Daí que estesdoentes, que não têm patologia orgânica visível,recolham mais vezes ao domicílio para obterem oapoio pretendido (Faucett e Levine, 1991). Osdoentes com dor crónica, por outro lado, prota-gonizam muitas perdas que devem ser vistas noseu contexto ecológico, e não apenas na bio-química do cérebro. Podem estar deprimidos semestarem clinicamente deprimidos. Podem con-cluir que a dor é inacessível à sua capacidade decontrolo. Podem reconhecer um compromissoprogressivo do seu estado de saúde global, comlimitações físicas crescentes e sacrifício da activi-dade profissional. Uma eventual situação de de-semprego ameaça o equilíbrio financeiro do agre-gado familiar. O doente fica diminuído na suaauto-estima. As ambições pessoais ficam irreme-diavelmente bloqueadas. O doente fica «conde-nado» a uma ausência de esperança na sua recu-peração, a um sentimento inespecífico de desmo-ralização que não se deve confundir, obrigatoria-mente, com uma situação de depressão clínica(Roy, 1992:39).

Factores cognitivos

Os doentes com dor crónica tendem a acreditar

que têm uma capacidade limitada para exercerqualquer controlo eficaz dos seus sintomas. Aauto-eficácia, designando uma crença pessoal nacapacidade de lidar com a dor e de funcionarapesar da sua persistência, do mesmo modo quea intensidade da dor, contribui para o desenvolvi-mento da incapacidade e depressão em doentescom dor crónica (Arnstein e col., 1999). As avalia-ções negativas sobre a auto-eficácia podemreforçar a experiência de desmoralização, ainactividade física e a resposta exagerada à esti-mulação nociceptiva (Brown e Nicassio, 1987). Asauto-verbalizações negativas, do tipo «não prestopara nada» ou «vou ficar inválido» evidenciamuma associação consistente com baixos níveis deajustamento global, em situações de dor crónica(Stroud e col., 2000). As crenças relacionadas coma dor, como por exemplo uma crença pessoal naincapacidade de controlo da dor, podem serpreditivas da incapacidade física e da depressão(Turner e col., 2000).

As crenças, avaliações, e estratégias de lidarcom a dor têm enorme relevância na avaliação etratamento dos doentes com dor crónica. Reesore Graig (1988), por exemplo, mostraram que aprincipal diferença entre doentes com lombalgiacrónica e muitos «sinais medicamente incon-gruentes», e um outro grupo de doentes sem ossinais mencionados, eram precisamente os pen-samentos maladaptativos. Parece pois existiruma associação entre as crenças do doente e oseu funcionamento, tal como é defendido pelomodelo cognitivo-comportamental de adaptaçãoà dor crónica. As crenças segundo as quais a dortraduz a presença de uma lesão e a actividade físi-ca, nestas condições, deve ser evitada, podem as-sociar-se aos índices de funcionamento e com-portamento de dor do indivíduo. Intervenções te-rapêuticas que visem a correcção destas crençasmaladaptativas podem, presumivelmente, redu-zir o comportamento de dor, aliviar a incapaci-dade física e a depressão destes doentes (Jensen ecol., 1999). A actividade cognitiva dos doentescom dor crónica, portanto, pode contribuir parao agravamento, alívio ou manutenção do sin-toma, do comportamento de dor, do mal-estarafectivo e dos índices globais de ajustamento dis-funcional (Turk e Rudy, 1992).

Os factores biomédicos que podem iniciar osintoma dor desempenham um papel cada vezmenos importante ao longo do tempo, tambémno que diz respeito à incapacidade. O descondi-

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cionamento físico, sobretudo, pode manter emesmo agravar o problema13. Esta inactividadeaumenta a atenção e a preocupação com o corpoe com a dor, sendo que estas alterações cognitivasaumentam a possibilidade de uma distorção nainterpretação dos sintomas, reforçando a per-cepção de incapacidade. A restrição da actividadefísica, a ausência de compensações e a presençacontinuada de um ambiente que suporta invo-luntariamente o papel de doente, abrangendo afamília e o sistema de cuidados de saúde, podemimpedir o alívio da dor, uma reabilitação eficaz, aredução da incapacidade e uma melhoria globaldo ajustamento.

As interpretações cognitivas também afectamo modo como os doentes apresentam os sinto-mas às outras pessoas, incluindo os profissionaisde saúde. A comunicação da dor, do sofrimento edo mal estar pode suscitar respostas que refor-çam os comportamentos de dor. Ou seja, asqueixas do doente podem levar o médico a pres-crever medicação mais potente, a pedir mais exa-mes complementares e a sugerir, nalguns casos,uma intervenção cirúrgica. Os familiares podemexpressar simpatia, livrar o doente das respon-sabilidades habituais e encorajar a passividade,assim promovendo um maior descondiciona-mento físico.

As pessoas com dor crónica têm expectativasnegativas sobre a sua capacidade e responsabili-dade de exercerem controlo sobre o sintoma.Geralmente, vêem-se a si próprias numa situaçãode desespero. Estas avaliações negativas da suacondição clínica, da sua situação de vida, e da suaeficácia para controlar a dor e problemas associa-

dos servem para reforçar as suas experiências dedesmoralização e inactividade.

A incapacidade relacionada com a dor assumeproporções epidémicas (Aronoff, 1991) e a suarelevância clínica sugere pelo menos três leiturasalternativas14. O chamado modelo de incapaci-dade defende que esta é uma consequênciadirecta do sintoma doloroso, assumindo umarelação isomórfica entre grau de incapacidade eextensão do dano físico. A velha hipótese psicos-somática propõe que a incapacidade relacionadacom a dor é uma consequência de factores psico-lógicos. Um modelo de percepção diferenciadado sintoma, finalmente, sublinha a existência devariações individuais, cognitivas e afectivas, napercepção e registo dos sintomas físicos (Millarde col., 1991).15 A percepção da dor e respectivaintensidade, por sua vez, constituem um impor-tante factor de recurso aos cuidados de saúdepara os doentes com dor crónica (Andersson ecol., 1999).

Num estudo de investigação recente, realizadonos HUC, os doentes com o diagnóstico de fibro-mialgia (FM) denotaram um menor recurso aestratégias de coping activo e um maior recurso aestratégias de coping passivo, em comparaçãocom os doentes com o diagnóstico de artritereumatóide (AR) (Quartilho, 1999). Ou seja, osdoentes FM parecem fazer mais apelo a recursosexternos, ou assumem uma atitude de «desistên-cia», quando têm sintomas. Nestas condições, oestudo verificou a presença de uma associaçãocaracterística entre coping passivo, depressão epsicopatologia geral, tal como foi referido nou-tros estudos (Snow-Turek e col., 1996). Mas a na-

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13 O síndrome de fadiga crónica é um bom exemplo de como o descondicionamento físico, ou inactividade, entre outros factores,podem funcionar como factores de perpetuação da incapacidade e do sofrimento.

14 A questão da relação entre dor crónica e incapacidade é complexa. Esta complexidade é testemunhada pela abundância de lite-ratura disponível sobre o assunto que não tem, neste trabalho, um tratamento detalhado. A este propósito, um estudo recentesugeriu que a candidatura a uma pensão de incapacidade influencia notoriamente o padrão de utilização dos cuidados de saúde.Mais especificamente, os doentes com dor crónica que receberam a referida pensão restringiram consideravelmente o seu aces-so aos serviços de saúde. Os que não receberam pensão ou ficaram insatisfeitos com a pensão recebida mantiveram a frequên-cia anterior de procura dos cuidados. A ausência ou deficiência de compensação financeira por parte do Serviço Social, concluio estudo, pode perpetuar o comportamento de dor e manter, igualmente, uma situação de custo acrescido para os cuidados desaúde (Hojsted e col., 1999).

15 A hipótese de uma percepção diferenciada dos sintomas somáticos salienta a importância do conceito de afectividade negativa.Este conceito corresponde a uma disposição individual, estável, associada a situações de mal estar individual e insatisfação numavasta gama de contextos. Os indivíduos com elevados índices de afectividade negativa tendem a ser mais introspectivos e nega-tivistas, centrados nos aspectos negativos de si próprios e dos outros, hipervigilantes em relação aos seus corpos (Quartilho,1999). Os indivíduos que pontuam mais alto neste construto seriam mais susceptíveis de perceber, lembrar, reagir e apresentarqueixas relacionadas com sintomas físicos funcionais. Os mecanismos envolvidos, eventualmente responsáveis por um maiorregisto de sintomas somáticos em pessoas com elevada afectividade negativa, podem incluir uma maior sensibilidade à dor,hipervigilância corporal, tendência à introspecção e distorção evocativa (Watson, 2000).

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tureza da associação não ficou esclarecida. Tantoa dicotomia passivo-activo como as diferençasindividuais, independentemente dos grupos,impedem quaisquer generalizações. As recidivasdolorosas em doentes AR, por exemplo, podemobrigar à adopção de estratégias passivas,adaptativas. O repouso ou a restrição da activi-dade física, nestas condições, é uma prescriçãocomum nas consultas de Medicina e Reumatolo-gia (Brown e Nicassio, 1987).

Podemos suspeitar que, em termos globais, asestratégias de coping activo sejam preditivas dofuncionamento actual e futuro (grupo AR), en-quanto que as estratégias de coping passivo, pelocontrário, seriam preditivas de uma disfunçãoactual e futura (grupo FM). Mas talvez seja maisútil olhar para cada uma das estratégias escolhi-das e avaliar a sua importância diferencial,mesmo que incluídas no mesmo grupo. Os itemsrelacionados com os estilos de coping, no ques-tionário utilizado, incluíram estratégias de catas-trofização («sinto que não vale a pena viverassim»), oração («rezo a Deus para que as doresdesapareçam»), reinterpretação da dor («tentodistanciar-me das dores, como se estivessemnoutra pessoa»), ignorância da dor («tento nãoprestar atenção às minhas dores»), desvio daatenção («tento pensar em qualquer coisaagradável») e participação em actividades de dis-tracção («saio de casa, faço qualquer coisa, falocom a vizinha, vou às compras»).

Ora, uma revisão recente dos trabalhos rela-tivos a cada uma destas estratégias, efectuadosdepois de 1991, pronunciou-se a favor de umarelação consistente entre catastrofização e ajusta-mento a situações de dor crónica (Boothby e col.,1999). Com efeito, esta mesma estratégia – catas-trofização – definida pelo uso de auto-verbaliza-ções negativas, exageradas, quando a pessoa temdores, mostrou associar-se, nos estudos revistos,a índices mais elevados de sofrimento psicológi-co, taxas mais elevadas de uso analgésico e dorpós-operatória, pior funcionamento físico e inca-pacidade, índices mais elevados da intensidadeda dor, mais registos de interferência das doresnas actividades do dia a dia, níveis inferiores deactividade geral, índices mais altos de disfunçãopsicossocial e diminuição da capacidade de tra-balho. Num dos estudos considerados, verificou--se que os doentes com situações de dor crónicainconsistente com padrões anatómicos ou fisio-lógicos reconhecidos, e com sintomas vagos ou

mal localizados, referiram índices mais elevadosde catastrofização, em comparação com outrosdoentes nos quais a dor crónica, pelo contrário,era mais congruente com conhecimentos anato-mofisiológicos (Hadjistavropoulos e Craig, 1994).Os estudos com as estratégias de oração, ou espe-rança nas melhoras, por sua vez, exibiram resul-tados contraditórios. Em termos globais, pareceuque esta estratégia se associava a importantesmedidas de ajustamento em certas ocasiões, masnão noutras. Sempre que se verificou umaassociação significativa, contudo, esta estratégiaassociou-se de um modo positivo à disfunção ede modo negativo às medidas de adaptação fun-cional. Seja como for, ficamos sem saber se aspessoas rezam mais quando se sentem mais infe-lizes, por oposição às ocasiões em que se sentemmelhor, ou se, na verdade, as estratégias de ora-ção/esperança contribuem mesmo para uma dis-função mais acentuada, em situações de dorcrónica. Além do mais, rezar pode corresponder auma estratégia activa, mais do que passiva(Snow-Turek e col., 1996).

A reinterpretação das sensações de dor, em ter-mos gerais, tendeu a mostrar associações débeis,não significativas, com a maioria das variáveisfuncionais, tais como interferência da dor nasactividades ou na capacidade para o trabalho,sofrimento emocional e intensidade da dor. Noseu conjunto, os estudos revistos sugeriram que areinterpretação das sensações de dor tem umpapel pouco significativo no ajustamento à dorcrónica. A ignorância da dor, por sua vez, mos-trou, na maioria dos estudos, uma incapacidadepreditiva para a interferência com as actividadesde rotina ou com a capacidade de trabalho, dis-função psicossocial e intensidade da dor. Ignorara dor, portanto, tem provavelmente muito poucainfluência no ajustamento à dor crónica, para amaioria das pessoas. O desvio da atenção tambémguarda uma relação inconsistente com o funcio-namento, nos doentes com dor crónica. Destemodo, pode constituir uma estratégia similar àignorância da dor, talvez mais útil em casos dedor aguda. No entanto, é possível que o acto deprestar atenção à dor, pelo menos nos casos dedor crónica, corresponda a uma estratégia mal-adaptativa. Pelo menos nos casos de lombalgiacrónica, uma maior atenção à dor parece asso-ciar-se a um aumento na intensidade do sintoma,a maior sofrimento emocional e incapacidade, eainda a um maior recurso aos serviços de saúde,

MANUEL JOÃO R. QUARTILHO

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por causa da dor (McCracken, 1997). A partici-pação em actividades de distracção, finalmente,mostrou ter muito pouca influência sobre o ajus-tamento à dor crónica.

A estratégia de catastrofização, portanto, pare-ce ser a que mostra uma associação mais forte econsistente com o funcionamento do indivíduo,em situações de dor crónica. Pode acontecer queesta particular estratégia, catastrofização, sejamais preditiva da depressão do que da incapaci-dade física, nas mesmas condições de dor cróni-ca (Turner e col., 2000). Mas não devemos esque-cer a natureza correlacional da maioria dos estu-dos. Ou seja, uma associação significativa nãoconstitui evidência de que uma resposta de co-ping influencie a medida de ajustamento ou queesta última, por sua vez, seja preditiva da respos-ta considerada. Por outro lado, as estratégias decoping podem ser apenas um mero reflexo dofuncionamento global de um indivíduo. No casodos doentes FM, a tendência verificada para asrespostas de catastrofização pode constituir, tãosomente, apenas mais «um elemento na paisa-gem», sem qualquer tipo de associação causal(Quartilho, 1999).

Abuso e negligência

O abuso físico e sexual durante a infância temtambém sido relacionado com o estado de saúdena idade adulta, não obstante o desconhecimen-to sobre a natureza desta relação. Contudo, asexperiências de abuso físico e sexual guardamcertamente uma relação não específica com asvárias manifestações patológicas com que têmsido relacionadas na vida adulta: depressão, com-portamento antisocial, dificuldades interpes-soais, abuso de substâncias, etc. Têm sido impli-cados ainda diversos quadros clínicos nesta asso-ciação, abrangendo a dor facial, dor pélvicacrónica, lombalgia, fibromialgia e perturbaçõesgastrintestinais (Goldberg e col., 1999).

O facto de algumas condições clínicas, como ador pélvica crónica e o síndrome do cólon irritá-vel, terem sido associadas a experiências de abu-so físico e sexual (Walker e col., 1995; Drossman ecol., 1995), suscitou a eventual presença das mes-mas experiências de abuso, físico e sexual, na his-tória biográfica dos doentes com o diagnóstico defibromialgia. Walker e col. (1997) sugeriram umahipótese segundo a qual as mulheres com fibro-

mialgia, em comparação com um outro grupo demulheres com o diagnóstico de artrite reuma-tóide, deveriam apresentar taxas mais elevadasde abuso físico e sexual ao longo da vida, assimcomo uma maior frequência e gravidade deabuso emocional, físico e sexual durante a infân-cia. Para além desta hipótese, os autores sugeri-ram igualmente uma associação entre a fibro-mialgia e uma maior prevalência de problemasinterpessoais ao longo da vida. Os resultados fi-nais evidenciaram uma prevalência significativa-mente superior de todas as formas de vitimiza-ção, ao longo da vida e durante a infância, nosdoentes com fibromialgia, confirmando assim ashipóteses iniciais. A gravidade dos traumatismosocorridos na infância mostrou-se também supe-rior neste grupo de doentes. Mas as experiênciasprévias de qualquer tipo de abuso, incluindo oabuso sexual, não revelaram uma relação especí-fica com o desenvolvimento futuro da fibromial-gia. As agressões físicas durante a idade adulta,pelo contrário, mostraram uma associaçãorobusta e específica com a fibromialgia. A gravi-dade dos traumatismos também mostrou umarelação significativa com a incapacidade fun-cional observada, apenas nos doentes com odiagnóstico de fibromialgia. Ou seja, a presençade uma história de vitimização na fibromialgiapode constituir um marcador para uma maiorincapacidade física e uma maior resistência aostratamentos instituídos.

Alexander e col. (1998) pretenderam investigara relação entre o abuso físico/sexual e a utilizaçãodos cuidados de saúde, num grupo de 75 mu-lheres com fibromialgia, na expectativa de que asdoentes vítimas de experiências de abuso, emcomparação com as que não tivessem sido abu-sadas, teriam as seguintes características: 1)maior recurso à medicação analgésica e aosserviços de cuidados de saúde; 2) índices maiselevados de dor, fadiga e incapacidade funcional;3) número superior de diagnósticos psiquiátricosao longo da vida; 4) índices superiores de stress nodia a dia; 5) índices mais baixos de limiar à dor,associados a uma elevada disposição para o re-gisto da sua presença; 6) uso mais frequente deestratégias de coping maladaptativas e de crençasnegativas, relacionadas com a dor; e 7) índicesmais baixos nas aptidões de controlo dos sin-tomas (auto-eficácia). Deste modo, os autoresquiseram não apenas explorar as relações entreabuso físico/sexual e utilização dos cuidados de

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saúde, mas também estudar, em simultâneo, asvariáveis que pudessem influenciar esta relação.

A frequência de abuso físico/sexual encontra-da foi de 57%, um valor similar ao encontrado emdoentes com patologia gastrintestinal (Lesermane col., 1996). As doentes FM vítimas de abuso re-velaram índices mais elevados de intensidade dador, fadiga e incapacidade funcional, para alémde uma maior frequência de dores de «estômago»ou dores «pélvicas». Também obedeceram aoscritérios de um número significativamente supe-rior de diagnósticos psiquiátricos ao longo davida e referiram índices mais elevados de stress noseu dia a dia. Além do mais, mostraram uma ten-dência consistente para referir dor em resposta aum vasto conjunto de estímulos dolorimétricos,aplicados em diversos locais anatómicos, inde-pendentemente da intensidade dos estímulosdolorosos. Ou seja, revelaram uma percepção dedor anormal. Também se mostraram menos sus-ceptíveis a acreditar na realização de comporta-mentos que pudessem reduzir os seus índices defadiga e depressão. Em resumo, este estudoencontrou uma relação significativa entre abusofísico/sexual, recurso a consultas médicas e uti-lização de medicação analgésica em doentes comfibromialgia. Identificou igualmente diversas va-riáveis que podem influenciar esta relação, taiscomo os elevados índices de intensidade da dor,fadiga, stress, incapacidade funcional, anomaliasna percepção da dor e morbilidade psiquiátrica.

É possível, portanto, que a associação verifica-da entre vitimização e fibromialgia constitua ape-nas um exemplo de uma associação mais vasta,inespecífica, entre experiências de abuso e pro-cesso de somatização. O facto de não haver umarelação específica entre as histórias de abuso,independentemente da sua natureza, física ousexual, e o desenvolvimento da fibromialgia, su-gere por outro lado a conveniência de prestarmosuma maior atenção à qualidade global da vidafamiliar e à sua relação com o aparecimento,eventual, do síndrome reumatológico (Walker ecol., 1997).

A literatura sustenta portanto a existência deuma relação entre abuso na infância e dor cróni-ca, na idade adulta, não obstante uma escassezde explicações causais, quanto aos mecanismosenvolvidos. A relação entre negligência afectivaou privação emocional durante a infância e oaparecimento de dores na idade adulta temmerecido também a atenção da literatura (Roy,

1998). Este conceito de privação emocional devetalvez muito aos trabalhos de Bowlby e da suateoria de ligação. Segundo esta teoria, a impossi-bilidade de uma criança se ligar a uma figuramaternal, ou a outros familiares, é susceptível deter um impacto negativo no processo de desen-volvimento. Mas apesar do consenso existentesobre o carácter negativo destas consequências, asua relação com os fenómenos de negligência ouprivação também não é clara. As situações deabuso conjugal e violência doméstica, comovimos a propósito da fibromialgia, têm sido igual-mente associadas a contextos clínicos de dorcrónica na vida adulta.

Acontecimentos de vida e personalidade

A relação entre acontecimentos de vida e a expe-riência de dor na idade adulta também tem sidoobjecto de atenção. As conclusões são, no entan-to, equívocas. Existem evidências contraditórias.No entanto, pode afirmar-se que os aconteci-mentos negativos ou indesejáveis podem exacer-bar situações clínicas de dor prévias, determinan-do uma procura de ajuda. Por outro lado, acon-tecimentos minor, de natureza traumática, po-dem desencadear um vasto conjunto de factoresque, em última análise, determinam a instalaçãoda dor crónica (Roy, 1992: 56).

As relações entre dor e personalidade são com-plexas. Não parece existir qualquer evidênciafavorável a uma relação consistente entre dorcrónica e um perfil específico de personalidade,não obstante uma maior prevalência eventual decertos traços, sobretudo testemunhados peloMMPI (Minnesota Multiphasic Personality Inven-tory). Também não parece que os atributos depersonalidade dos doentes com dor crónica per-mitam uma previsão de incapacidade subse-quente (Linder e col., 2000). Mas podemos dizerque, ao longo dos últimos 100 anos, têm sido con-sideradas três categorias básicas, a propósito darelação entre dor e personalidade: teorias psico-dinâmicas, teorias traço e teorias biopsicosso-ciais (Weisberg e Keefe, 1999).

As teorias psicodinâmicas sugerem que osconflitos inconscientes residem na origem da dorcrónica ou constituem factores de perturbaçãono seu tratamento. De acordo com a perspectivapsicanalítica clássica, os conflitos emocionaissubjacentes, geralmente inconscientes, seriam

MANUEL JOÃO R. QUARTILHO

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importantes para a compreensão geral da dor.Estes conflitos seriam convertidos, através demecanismos psicodinâmicos, em sintomas físi-cos dolorosos. Estes sintomas, por sua vez, se-riam uma tradução simbólica dos conflitos emo-cionais subjacentes. Uma dor pélvica, por exem-plo, poderia traduzir um conflito não resolvidorelacionado com impulsos sexuais inaceitáveis.

Numa outra perspectiva, ainda de acordo coma revisão efectuada por Weisberg e Keefe (1999), ador poderia surgir como um substituto actualpara certos traumatismos emocionais do passa-do, que a pessoa não teria podido sentir ou ex-pressar de um modo apropriado. As descrições dador física, neste contexto, seriam uma forma«aceitável» de comunicar o referido sofrimentoemocional, e constituiriam, em simultâneo, umadefesa adicional contra o mesmo sofrimento16.

George Engel também marcou os estudossobre dor e personalidade, ao definir o «pain-prone patient». Acreditando que a dor podia ser-vir importantes funções psicológicas, este autordefendeu que o sintoma doloroso podia absolvero indivíduo face a sentimentos subjectivos deculpa. Uma focagem selectiva na dor poderiatambém permitir ao indivíduo afastar a sua aten-ção de sentimentos agressivos ou hostis que nãofosse capaz de expressar de uma forma directa.Finalmente, a dor crónica poderia estar rela-cionada com uma longa história de fracasso esofrimento pessoais, operando como um prota-gonista que permitiria ao indivíduo conservar umlegítimo estatuto de vítima, ao longo do processo.

As teorias traço defendem que os traços ou dis-posições da personalidade influenciam o modocomo a pessoa responde ao início, persistência etratamento da dor. No caso particular da dorcrónica, a ambiguidade do sintoma pede umaatribuição de significado que depende, pelomenos em parte, da personalidade do indivíduo.Certos factores da personalidade, numa outraperspectiva, poderiam predispôr algumas pes-soas para alguns síndromes dolorosos crónicos.

As teorias biopsicossociais são sobretudoimportantes na compreensão da dor crónica,

como vimos. O modelo de diátese-stress é umavariante destas teorias, aplicadas à dor, ao sugerirque o sintoma se desenvolve à custa de umainteracção entre um substrato biológico ougenético (diátese) e a expressão deste substrato,em determinadas condições (stress)17. Em muitoscasos de dor crónica, a diátese incluiria tambémas características de personalidade do doente. Ostress, por seu lado, englobaria as alterações bio-químicas e nociceptivas que ocorrem no início dosíndrome doloroso (Banks e Kerns, 1996).

Em termos gerais, a revisão da literatura sobredor e personalidade permite duas conclusões, deacordo com Weisberg e Keefe (1999). Em primeirolugar, a avaliação da personalidade dos doentescom dor crónica pode ser útil para a identificaçãode traços e perturbações que podem influenciar aevolução e tratamento do síndrome doloroso. Emsegundo lugar, as perturbações da personalidadeparecem ser mais frequentes nas pessoas comdor crónica, em comparação com a populaçãogeral. No entanto, este dado não permite quais-quer inferências causais (Weisberg e Keefe, 1999).

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DOR CRÓNICA: ASPECTOS PSICOLÓGICOS, SOCIAIS E CULTURAIS

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17 Na elucidação dos mecanismos etiológicos da fibromialgia, Okifugi e Turk (1999) propõem um modelo dinâmico que integra fac-tores predisponentes, neuroendócrinos e psicossociais, associados a factores precipitantes, físicos e psicológicos, que surgemcomo factores de stress. Assim, o modelo proposto é um modelo de diátese (biológica e psicossocial) – stress.

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DOR CRÓNICA: ASPECTOS PSICOLÓGICOS, SOCIAIS E CULTURAIS

Acta

Reumatológica

Portuguesaórgão oficial da sociedade portuguesa de reumatologia

A S S I N E

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PROLACTINA E LÚPUS

Luís Cunha Miranda

Maria Jesus Mediavilla

Augusto Faustino

Maria Eugénia Simões

Instituto Português de Reumatologia

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R E S U M O

A prolactina é uma hormona polipéptídica lactotrófica sendo secretada por células na região anterior dahipófise. A prolactina interage com o sistema imune em quase todos os níveis afectando as células B, T,macrófagos e células natural killer. Sabendo-se que hiperprolactinémia parece não ser um achado fre-quente na população em geral, vários trabalhos e autores têm demonstrado a relação entre diversasdoenças autoimunes e os níveis elevados de prolactina, especialmente no LES. Relativamente á associa-ção entre os valores da prolactina e a actividade do LES poderemos afirmar que foram encontradosresultados contraditórios.

Palavras-chave: Lúpus erimatatoso sistémico (LES); prolactina; hiperprolactinémia; causas de hiperpro-lactinémia; actividade da doença; bromocriptina; anticorpo anti-prolactina; «big big» prolactina

A B S T R A C T

Prolactin is a polypeptide hormone produced by the anterior cells of the pituitary gland. Prolactin inter-acts with the immune system in almost every level interfering with T; B; Macrophages and Natural Killercells. Hyperprolactinemia is uncommon in the general population however several authors have beenproving a close relationship between high prolactin levels and autoimmune diseases especially in SLE.Contradictory results have been found between Prolactin levels and disease activity in SLE

Key-words: SLE; prolactin; hyperprolactinemia; causes of hyperprolactinemia; disease activity;bromocriptin; anti-prolactin antibody; “big, big” prolactin

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A R T I G O S D E R E V I S Ã O

P R O L A C T I N A E L Ú P U S

Luís Cunha Miranda,* Maria Jesús Mediavilla**

Augusto Faustino,** Maria Eugénia Simões**

Prolactina – Regulação e Funções Metabólicas

A prolactina é uma hormona polipéptídica lacto-trófica que compreende 199 amino-ácidos e apre-senta três ligações dissulfídricas, sendo secretadapor células na região anterior da hipófise.

Apresenta um papel activo no crescimento e di-ferenciação da glândula mamária e na regulaçãoda reprodução.

Sabe-se, actualmente, que esta hormona étambém produzida num número de sítios extra-hipofisários, incluindo outros locais do cérebro, eos linfócitos. Mais ainda, descreve-se hoje que aprolactina tem uma influência importante naproliferação e maturação duma variedade decélulas, nomeadamente do sistema imunitário,comportando-se desta forma como uma cito-quina, com um papel activo na imuno-competên-cia, especialmente nas respostas mediadas pelascélulas T40.

Na ausência de estímulos como a amamenta-ção ou o stress, a prolactina é inibida pela dopami-na hipotalâmica, que actua nos receptores D2.

Os agentes pró-libertadores da prolactina in-cluem a histamina, noradrenalina, serotonina,opiáceos, estrogéneos, prostoglandinas, hormonalibertadora da tirotrofina (thyrotrofin-relasinghormone TRH), péptido vasoactivo intestinal(VIP) e a colescistoquinina.

Tal como todas as hormonas pituitárias, a pro-lactina é libertada em ciclos de 90 minutos, comum pico nocturno após o adormecer.

Os valores normais situam-se abaixo dos 500 mU/L, por ser uma hormona pulsátil e sensí-vel ao stress. Podem ser encontrados valoresaumentados após a venopunção (com aumentosaté 100mU/L) pelo que a repetição da determi-

nação pode ser necessária em certos casos.A libertação de hormonas hipofisárias é regula-

da pelos efeitos estimuladores das hormonashipotalâmicas; contrariamente, a prolactina é ini-bida por uma acção hipotalâmica. Desta forma, odesarranjo entre os centros hipotalâmicos e a hi-pófise deverá resultar numa diminuição acentua-da da libertação de hormonas hipofisárias (ACTH,GH,TSH, gonadotrofinas). Tais anormalidades le-vam no, caso da prolactina, a uma excessiva pro-dução e com isso a hiperprolactinémia.

As neurohormonas que regulam o aumento daprolactina só actuam de uma forma rápida e tran-sitória mediante as necessidades do organismo.

A dopamina hipotalâmica detem um papelfundamentável no controle da prolactina, ini-bindo a sua biosíntese e excreção, pelo que ainibição dos efeitos da dopamina provocará umaexcreção excessiva de prolactina. Igualmente oácido gama-aminobutirico (GABA), outro neuro-transmissor, tem uma função de controle da liber-tação da prolactina8.

Nas mulheres lactantes, o periodo pós-partohiperprolactinémico parece associar-se com umadepleção de células B. Estas mulheres apresentampercentagens inferiores de linfócitos CD19+,quando comparadas com mulheres que não ama-mentam, relacionando-se estes valores negativa-mente com os valores de prolactina.

Em termos clínicos, a hiperprolactinémia podeser responsável nas mulheres pela diminuição dolíbido, galactorreia, aumento do volume mamá-rio, amenorreia ou ciclos regulares mas anovula-tórios. Pode ocorrer um hirsutismo moderado emmulheres devido à actividade androgénica mo-derada que se descreve para a prolactina, com umconsequente aumento de peso18.

No homem, poderemos encontrar igualmentediminuição do líbido, impotência, diminuição dovolume do fluído seminal, com ou sem galactor-reia ou ginecomastia.

A hiperprolactinémia parece não ser um acha-

* Interno do Complementar de Reumatologia do Instituto Português de Reumatologia** Especialista em Reumatologia do Instituto Português deReumatologia

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geral é muito baixa (1,55 por 100.000 habitantes). Os fármacos são, sem dúvida, um dos grandes

responsáveis pelo aumento da prolactina, peloque poderemos dividir as causas de hiperpro-lactinémia em farmacológicas e não farmacológ-icas (quadros 1 e 2).

Algumas vezes não se identifica a causa dehiperprolactinémia, sendo que a presença demicro-adenomas (não identificáveis pelos meioscomplementares de diagnóstico disponíveis)poderão explicar parte destes casos. Os outrospoderão ser explicados por uma formação extra-hipofisária, nomeadamente pela capacidade dotecido linfóide em produzir a prolactina39.

Em condições fisiológicas existem concen-trações muito elevadas de prolactina no terceirotrimestre da gravidez e na lactação. As concen-

trações de prolac-tina encontram-seaumentadas duran-te o sono, antes dedespertar, durante ahipertermia (sauna,banhos quentes) ecom o exercício.Igualmente encon-tramos valores au-mentados associa-dos a um aumentodos valores de estro-géneos, bem comona deficiência tiroi-deia.

Em condiçõespatológicas temosvalores elevados emdoentes com pro-lactinomas, subme-tidos a stressoressomáticos (hipogli-cémia, cirurgia outerapêutica eletro-convulsivante), efei-tos nutricionais eem doentes medica-dos com terapêuticaant i-dopaminér-gica. A insuficiênciarenal pode tambémser causa de ele-vação da prolacti-na33.

Quadro 1. Causas Não Farmacológicas de Hiperprolactinémia(adaptado de Korbonitis M,. Prescriber’s Journal 2000 ; 40 (2): 157-164)

Causas Não Farmacológicas de Hiperprolactinémia

Fisiológicas Gravidez

Lactação

Período neonatal

Stress

Patologia Hipotalâmica Tumores

Doença Granulomatosa

Irradiação Craniana

Secção Peduncular Hipofisário (traumática ou cirúrgica)

Patologia Hipofisária Micro ou Macroprolactinomas

Adenomas Secretores Mistos

Acromegália

Síndrome de Cushing

Tumores Causando Compressão Peduncular

Hipofisária

Síndrome da Sela Vazia

Diversos Hipotiroidismo Primário

Síndrome dos Ovários Poliquísticos

Insuficiência Renal Crónica

Cirrose

Secreção Ectópica de Prolactina (Carcinoma

broncogénico, Hipernefroma)

Convulsões

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do frequente na população em geral; numa ava-liação de 4.199 mulheres com ciclos menstruaisnormais, com baixa fertilidade, com distúrbiosmenstruais, com hirsutismo, ou ainda com galac-torreia, a percentagem de mulheres com níveiselevados de prolactina (superior a 20ng/ml) foi de3,3%3. Igualmente, num estudo realizado no Ja-pão em que 10.550 trabalhadores aparentementesaudáveis foram analisados para detectar níveisde prolactina superiores a 75 ng/ml, encontram--se valores superiores em apenas 1,2% das mu-lheres (26/2600) (sendo que a gravidez possivel-mente explicaria esse aumento em 7 mulheres) e0,17% nos homens estudados (14/8450)26.

Por outro lado, embora os adenomas da hipó-fise não sejam raros em estudos de necrópsia(10,9-22,5%), a sua detecção na população em

PROLACTINA E LÚPUS

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IL-4, IL-5, IL-6, IL--7), hormona decrescimento e eri-tropoietina. São ex-pressos desta for-ma em diversostecidos, incluindolinfócitos murinos,células T e B huma-nas, monócitos ecélulas epiteliais tí-micas39.

Esta variedadede expressão dos re-ceptores pode ex-plicar em parte agrande actividadeda prolactina.

A ligação entre aprolactina e o re-ceptor induz a li-bertação de umasubstância prolacti-na-like que ampli-fica quer a respostada célula em quefoi produzida paraa libertação de lin-foquinas, quer aresposta mitogéni-ca dos linfócitos vi-zinhos. Assim, aprolactina é umahormona imunoes-timuladora endó-

gena e a sua presença é necessária para a prolife-ração periférica de células sanguíneas mononu-leares, estimulando-as para a mitogénese27,29.

O factor regulador do interferão –1 (IRF – Inter-feron regulatory factor –1), que é um factorimportante na regulação da diferenciação celulardas células B e T é, aparentemente, sensível aestimulação pela prolactina12.

Igualmente podemos afirmar que a prolactinainfluencia a resposta imune directamente atravésdo timo e induzindo os receptores IL-2 nos linfó-citos, e actua como factor de crescimento desteslinfócitos37.

A prolactina regula ainda um número variávelde processos bioquimicos necessários para ocrescimento e divisão celular, activando igual-mente a proteína kinase C e estimulando o gene

LUÍS CUNHA MIRANDA E COL.

Os aumentos séricos da prolactina relaciona-dos com fármacos são, habitualmente, inferioresaos 2.500 mU/L, mas podem atingir valores de6.000 mU/L.

Prolactina: Resposta Imune e Autoimunidade

Os receptores para a prolactina incluem-se nafamília dos receptores do tipo Citoquinas/Hor-mona de Crescimento/Prolactina, que compreen-dem, pelo menos, 10 receptores, apresentandoum dominio citoplasmático variável, uma áreatransmembranar hidrofóbica e uma área extrace-lular estável com uma cadeia de 100 aminoácidos.

Esta família de receptores inclui receptores pa-ra citoquinas (cadeias 2-Interleucinas (IL), IL-3,

Quadro 2. Causas Farmacológicas de Hiperprolactinémia (adaptado de Korbonitis M,. Prescriber’s Journal 2000 ; 40 (2): 157-164)

Causas Farmacológicas de Hiperprolactinémia

Antagonistas dos receptores dopaminérgicos

Neurolépticos clássicos Perfenazina, Flufenazina, Flupentixol,Tioridazina,

Promazina, Haloperidol, Loxapina, Cloropromazina,

Sulpiride

Neurolépticos atípicos Amilsupride, Sertindole, Respiridona

Anti-eméticos Metoclopramida, Domperidona

Inibidores selectivos do recaptação da serotonina

Antidepressívos tricíclicos (raramente)

Drogas cardio-vasculares Verapamil, Reserpina, Metildopa

Estrogéneos Altas doses de anticonceptivos orais

Opiáceos

Diversos Benzifibrato, Omeprazole,Trimeptoprim,

Antagonistas histamínicos H2

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RNAm relacionado com o crescimento (growth--related RNAm gene)39.Em experiências animais (ratos) a prolactina foiimplicada na estimulação de macrófagos comaumento da produção de IL-1 e oxido nítrico,estimulando nomeadamente a fagocitose; pelocontrário, a sua diminuição estava relacionadacom a depleção macrofágica12. In vitro a prolacti-na induz a produção de interferon γ pelos ma-crofágos humanos.

Da mesma foma a prolactina actua em siner-gismo com a IL-2 para a promoção da diferen-ciação das células natural killer em células killeractivadas pelas linfocinas.

A prolactina é secretada pelos linfócitos e emalgumas instâncias é necessária para a prolifera-ção mitogénica induzida de células do baço epara a proliferação de linfócitos T-helper induzidapela IL-2.

Por este conjunto de acções e interligaçõesentre o sistema endócrino e imunitário, a prolac-tina pode ter um papel potencial na patogénesedas doenças auto-imunes40.

A prolactina interage com o sistema imune emquase todos os níveis, afectando as células B, T,macrófagos e células natural killer. Sabe-se, hámais de 20 anos, que a prolactina é necessária pa-ra manter a resposta celular T.

O gene do factor de transcrição (transcriptionfactor gene), factor 1 regulatório do interferão(interferon regulatory factor – 1, IRF-1), dá a pos-sibilidade à prolactina de regular a resposta imu-ne. O IRF-1 é um importante regulador da dife-renciação e maturação das células T e B e pensa--se que tem igualmente um papel activo na acti-vação dos linfócitos T. Nestes a expressão de IRF--1 é extremamente sensível á estimulação pelaprolactina de IL-2 e concanavalina A.

Algumas das funções imunológicas da prolac-tina são mediadas pelas células tímicas epiteliais.

A inflamação, com um efeito aumentado dascitoquinas pode, por si só, afectar a sensibilidadedos lactotrofos hipofisários e amplificar a estimu-lação neuronal da secreção da prolactina. Algu-mas citoquinas (IL-6, IL-1) poderão influenciardirectamente o aumento da libertação das hor-monas hipofisárias, incluindo a prolactina, pro-vavelmente através da via hipotalâmica33.

Certas doenças humanas auto-imunes asso-ciam-se com valores elevados de prolactina(quando comparados com a população em geral)nomeadamente iridociclite10, Doença de Addi-

son22, tiroidite auto-imune6 e a hipofisite linfocí-tica11.

Podendo mesmo esta hiperprolactinémia an-teceder a instalação das doenças auto-imunes;estão descritos 7 casos (Doença de Graves, Der-matomiosite, Síndrome de Sjögreen e LES) emque a doença autoimune se instala num quadrode hiperprolactinémia prévia, o que reforça arelação entre a prolactina e as doenças autoimu-nes37.

A prolactina tem sido igualmente associada aoutras doenças autoimunes para além do LES,nomeadamentre a Artrite Reumatóide; nesta, orisco de desenvolver a doença é superior em mu-lheres que amamentaram na primeira gravidez,sugerindo-se que a prolactina possa ter um papelno início e manutenção do quadro articular, nãose sabendo, porém, se através da prolactina deorigem linfocitária ou hipofisária.

Igualmente, estudos realizados em pacientescom Síndrome de Sjögren, Artrite Reactiva e Es-clerodermia revelaram que, respectivamente 46%,36% e 59%, eram hiperprolactinémicos40,37,8,15,23.

Num estudo em 23 doentes com hiperprolacti-némia foram encontrados valores de anticorpoanti-cardiolipina de 22% (5 em 23 doentes)35.

Os doentes com hiperprolactinémia apresen-tam uma predisposição para produzir anti-cor-pos anti-nuclear mesmo na ausência de activi-dade da doença.

Em mulheres jovens com anticorpos anti-DNADs determinou-se1 a presença de 20% de mulhe-res com hiperprolactinémia, sendo a associaçãonas mulheres mais idosas (51-81anos) com osanticorpos SSA/Ro e SSB/La.

Prolactina e L.E.S.

Os modelos animais são essenciais para com-preender a relação entre o lúpus eritmatoso sisté-mico e a prolactina.

Os ratos híbridos F1 da Nova Zelândia [(NewZeland Blacks X New Zeland Whites) (NZB XNZB)], desenvolvem uma doença Lúpus-Like tor-nando-se uma excelente escolha de modelo ani-mal para o estudo do LES. Estes ratos, quandotornados hiperprolactinémicos (mediante atransplantação de extra-hipófises), desenvolve-ram um agravamento da doença com morte pre-matura por doença renal auto-imune39. Por outrolado, a terapêutica com bromocriptina (droga

PROLACTINA E LÚPUS

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que suprime a prolactina) foi benéfica, melho-rando o prognóstico da doença lúpica16.

No modelo NZB X NZW demonstrou-se aindaque os níveis cronicamenmte elevados de pro-lactina provocavam a supressão da hormona folí-culo estimulina (FSH) e da hormona luteínica(LH), mas não apresentam nenhuns efeitos relati-vamente à testosterona nos ratos machos. Con-cluiu-se, desta forma, que a hiperprolactinémiaestava associada a aumento da autoimunidadeem ambos os sexos, sendo que no sexo masculinoeste efeito não era conseguido através da supres-são dos estrogénios protectores39.

Também em doentes com LES se associou a hi-perprolactinémia.Demonstrou-se valores eleva-dos em 22% mulheres grávidas com agudizaçõesda doença14 e homens com LES apresentavamvalores elevados desta hormona19.

As vias que provocam a hiperprolactinémianos doentes com LES não são ainda conhecidas.A prolactina é influenciada por condições fisioló-gicas, neuronais, hormonais e outras, pelo quenão se pode identificar um só factor que seja res-ponsável por este aumento sérico.

A hiperprolactinémia poderá ser igualmenteexplicada pelo distúrbio neuroendócrino poten-cialmente associado às doenças auto-imunes.

No caso dos doentes com LES, a prolactina pa-rece ter uma tendência para ser secretada emexcesso através de uma desregulação entre o eixohipalâmico-hipofisário. Esta hormona apresenta--se, ainda, como uma das hormonas imunoesti-muladoras contraagindo igualmente os efeitosimunoreguladores do cortisol9.

Os timócitos circulantes dispõem de RNAm daprolactina, podendo assim secretar esta hormo-na, o que deveria ser detectado nas determina-ções sanguíneas. Contudo, a prolactina linfocitá-ria aparenta funcionar como um estimuladorautócrino ou parácrino, ou estimulador do cresci-mento linfocitário e, desta forma, será improvávelque se encontrem quantidades significativas emcirculação.

É também possível nos doentes com LES que ahipófise anterior seja estimulada por níveis eleva-dos de citoquinas, libertando excessivamenteprolactina.Sabe-se que um número significativode mediadores solúveis podem estimular a liber-tação de prolactina em sistemas experimentais,nomeadamente TNF-α, IL-1, IL-2, Interferon(IFN) - γ e IL-6. A presença de receptores para aIL-1, IL-2 e IL-6 nas células hipofisárias anteriores

parecem reforçar tal teoria.Um número importante de trabalhos demons-

tram níveis elevados de imuno-moduladores cir-culantes no LES (TNF-α, IL-2, IFN - γ e IL-6) e aassociação entre a IL-6 e a hipersecreção de pro-lactina nos doentes com LES, em particular nosque apresentavam envolvimento cerebral. Nestesdoentes detectavam-se níveis elevados de IL-6 noliquido céfalo-raquidiano e correlacionavam-secom níveis aumentados de prolactina no mesmolíquido13.

A actividade do LES parece exacerbar-se emestados de hiperprolactinémia (gravidez e puer-pério). Estas observações podem indiciar um de-sarranjo neuroendócrino, demonstrando que aprolactina estimula a resposta imune.

A hiperprolactinémia está associada ao lúpusem diversos trabalhos e em ratos associou-se aoaumento da produção de anticorpos contra oDNA, resultando em hipergamaglobulinémia eproduzindo doença renal e morte prematura.

Estudos clínicos demonstraram a presença dehiperprolactinémia em 28% de doentes com LESe uma possivel associação com doença renal. Poroutro lado, um ensaio com bromocriptina (2,5mg/dia) parece melhorar significativamente oíndice funcional dos doentes tratados12.

O primeiro relato conhecido sobre a relaçãoentre a prolactina e o LES é de Lavalle e colabo-radores em 198719 demonstrando que os níveisséricos de prolactina se encontravam significati-vamente elevados em 8 doentes do sexo masculi-no com LES; Demonstraram, igualmente, que osníveis de estrona circulantes estavam tambémaumentados e que, em contrapartida, a testoste-rona e a dihidrotestosterona se encontravamdiminuidos. Estes valores não foram corrigidosapós a admnistração de LH releasing hormone(LHRH) sugerindo tais resultados que estariamosperante um defeito intrínseco do eixo hipotâmi-co-hipofisário-gonadal. Outro estudo demons-trou a presença de níveis elevados de prolactinaem 29 homens, quando comparados com con-troles, bem como níveis dentro da normalidadeem 14 homens com Artrite Reumatóide (AR)7.

A associação de hiperprolactinémia e lúpustem vindo a ser estudada em diversos trabalhos,quer em homens, quer especialmente em mu-lheres; Jara et al14 demonstraram que 10 em 45doentes (incluindo 2 grávidas) apresentavamhiperprolactinémia e que 7 em 10 doentes hiper-prolactinémicos apresentavam lúpus activo; con-

LUÍS CUNHA MIRANDA E COL.

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trariamente, apenas 5 em 35 pacientes com valo-res normais de prolactina apresentavam doençaactiva39.

No LES, os estudos encontraram resultadosvariáveis, valores acima do normal em 16 a 30%dos doentes nos diversos trabalhos nesta área,sempre significativamente diferente dos resulta-dos nos diversos grupos de contrôle utillizados.

No que se refere às manifestações clínicasassociadas com a hiperprolactinémia, existe umaevidência de que os doentes com LES não apre-sentam as características clínicas que acompa-nham tal condição, nomeadamente amenorreiaou galactorreia, entre outras20.

Relativamente à associação entre os valores daprolactina e a actividade da doença, poderemosafirmar que foram encontrados resultados con-traditórios : se em alguns trabalhos os valores daprolactina estão directamente relacionados coma actividade da doença, noutros14, ou não existehiperprolactinémia, ou esta não se relaciona coma actividade da doença4,16,29,31.

Quando Mok (1998) avaliou apenas os ho-mens, encontraram igualmente uma falta de re-lação entre a actividade da doença e os valores deprolactina.

Aparentemente a hiperprolactinémia não pa-rece associar-se a nenhuma manifestação clínicaespecífica, nem a correlacionar-se de forma ine-quívoca com a actividade da doença, quer clíni-camente quer serológicamente, e desta mesmaforma não permite monitorizar a actividade dadoença ou antecipar as crises associadas a esta27.Tal achado pode ser explicado pelos múltiplosfactores que intervêm nesta doença e que dificil-mente poderá ser reflectido por um único parâ-metro bioquímico.

Mas a ambiguidade dos resultados que rela-cionam a prolactina com a actividade no lúpusganhou novo alento quando J M Miranda et al25

conseguiram correlacionar a associação entre aactividade renal no lúpus e a hiperprolactinémia,excluindo como causa desta a insuficiência renal;mais indiciaram, tal como Neihart30, que a hiper-prolactinémia se associava com o aumento dapresença de anticorpos Ds-DNA. A presença devalores elevados de prolactina sérica e urinárianos doentes com LES e envolvimento renal foifrequente e variável com a terapêutica.

Neihart, por sua vez, encontrou inclusivamen-te uma relação entre hiperprolactinémia, marca-dores de actividade da doença, a presença de

anticorpos Ds-DNA e, em alguns, a presença deanticorpos anti-cardiolipina.Um trabalho de El Graft5 sugeriu que a actividadedo LES juvenil se relacionava com a prolactina,servindo esta como marcador da actividade dadoença igualmente ao nível do sistema nervosocentral.

Outro estudo recente de Rovensky32 emboranegando a associação entre a hiperprolacti-némia, o índice de actividade ECLAM e a presen-ça de anticorpo anti-ds DNA, apresenta umarelação directa entre os níveis séricos de prolacti-na e o uso de corticosteróides, o que só por sipoderá indiciar quadros clínicos de maior agres-sividade ou uma diminuição da resposta à tera-pêutica. Da mesma forma, perante estes resulta-dos se realça a afirmação de Bernton que propôsque a prolactina poderia antagonizar os efeitosdos corticosteróides a nível fisiológico32. Até hojenão foi encontrado nenhum efeito estimulanteda secreção dos corticosteróides na secreção daprolactina.

A causa da existência de valores elevados deprolactina nos doentes com LES não tem até hojeuma resposta cabal. Alguns destes pacientesapresentam adenomas hipersecretores na hipó-fise, outros apresentam causas secundárias paraeste aumento da prolactina circulante (hipotiroi-dismo, drogas ou insuficiência renal).

Como sabemos os linfócitos humanos circu-lantes têm a capacidade de produzir prolactina eacredita-se que esta actua localmente estimulan-do a proliferação dos linfócitos de uma formaautócrina ou parácrina. No LES as células circu-lantes produzem activamente a prolactina, sendopossível que parte desta hormona em circulaçãoseja de origem linfocitária40.

Temos, igualmente, de ter em consideração apresença de anticorpos contra a prolactina comopossível causa de hiperprolactinémia, tal comofoi demonstrado por Leaños Miranda20 que numtotal de 259 pacientes com lúpus encontraram16,2% (41 pacientes) hiperprolactinémicos; edestes, 14 mulheres apresentavam anticorposanti-prolactina, o que parece indiciar um papelactivo destes anticorpos na presença de valoreselevados de prolactina. Provaram, igualmenteneste grupo de doentes, que a presença de anti-corpo anti-prolactina se associava a um aumentodo C3 e do número de linfócitos, relacionando-seainda com uma diminuição do score do SLEDAI edos níveis de anticorpo anti-DNA.

PROLACTINA E LÚPUS

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Estes anticorpos anti-prolactina podem-setambém encontrar em doentes hiperprolactiné-micos, mas sem doença autoimune. Por outrolado, no mesmo trabalho, Leaños e colaborado-res20 conseguiram demonstrar que a existência dehiperprolactinémia idiopática, acompanhadapor anticorpos anti-prolactina, implicava nosdoentes com LES uma menor actividade da doen-ça se comparados com pacientes com as mesmascaracterísticas, mas sem os anticorpos.Tal achadoparecem confirmar os resultados de Hattori et al16

que conseguiu igualmente relacionar a presençade anticorpos anti-prolactina em doentes comhiperprolactinémia idiopática, relacionando po-sitivamente os valores do anticorpo com os va-lores da prolactina.

Existem duas possibilidades para explicar a ra-zão pela qual os anticorpos anti-prolactina ele-vam os níveis séricos de prolactina; em primeirolugar, a prolactina livre é mais rapidamente filtra-da pelo glomérulo, o que não acontece com ocomplexo prolactina anticorpo; em segundo lu-gar, existe um sistema auto-regulatório entre a hi-pófise anterior, hipotálamo e o soro, sendo queeste mecanismo de feed-back poderá estar alte-rado através dum bloqueio efectuado pelo anti-corpo resultando numa percepção errada do ní-vel sérico de prolactina.

A cloroquina é um fármaco utilizado na tera-pêutica dos doentes com lúpus; demonstrou-sein vitro que diminui a secreção de prolactinapelas células hipofisárias cultivadas, parecendocontudo que tal relação não foi encontrada comoexplicação da variação dos valores da pro-lactina31; não é claro ainda se a utilização dehidroxicloroquina terá o mesmo efeito.

A ciclosporina A compete directamente com aprolactina na ligação ao seu receptor nas célulasB e T, pelo que é de supôr que os níveis séricos deprolactina dos doentes medicados com ciclospo-rina A possam variar29.

Outra questão que tem vindo a ser cada vezmais referida na literatura é a presença de doistipos de prolactina, uma com um peso molecularde aproximadamente 23kDA («little» prolactina),e outra encontrada em menor quantidade, comoutro peso molecular (50KDA – «big» prolactina ecerca de 100kDA – «big big» prolactina). Estas di-ferenças de peso molecular têm um interesse es-pecial, pois tem sido sugerido que a chamadamacrohiperprolactinémia (com a presença de«big big» prolactina) se associa a pacientes assin-

tomáticos. Tal resultado também se observa, co-mo referimos, em alguns pacientes hiperpro-lactinémios com anticorpos anti-prolactina quenão apresentam doença autoimune. Esta seme-lhança pode ser explicada pelo facto de a macro-prolactinémia partilhar algumas característicacom o complexo prolactina-anticorpo, o que vemreforçar a noção que a prolactina quando ligadaao seu anticorpo apresenta uma acção biológicaatenuada.

Prolactina, L.E.S. e Terapêutica

A bromocriptina é um derivado ergotamínico queapresenta uma potente actividade agonista doreceptor dopaminérgico. Inibe selectivamente asecreção pela hipófise anterior da prolactina.Com a excepção da supressão da hormona decrescimento na acromegália, a bromocriptinaparece ter pouco ou nenhum efeito nas outrashormonas hipofisárias.

Em modelos animais, a bromocriptina foiexperimentada com sucesso no tratamento deencefalite alergica e na artrite induzida.

Igualmente nas doenças oculares autoimunesse obteve sucesso com a terapêutica com bromo-criptina. Na uveíte autoimune, 8 em 14 doentesmelhoraram após receber baixa dose de ciclospo-rina e bromocriptina, de que resultou a baixa dosníveis séricos de prolactina (< a 2ng/ml). Isolada-mente a bromocriptina foi utilizada com bons re-sultados no tratamento de pequenas séries depacientes com iridocíclite ou írite.

Da mesma forma, num grupo de 7 pacientescom lúpus constitucional, cutâneo, circulatórioou com envolvimento articular, um tratamentocom doses de 5 a 7,5 mg de bromocriptina duran-te 6 meses pareceu eficaz na redução da sintoma-tologia e a sua interrupção implicou uma agudi-zação dos sintomas24.

Num estudo duplamente cego com dose fixade bromocriptina (2,5 mg/dia) obteve-se umaredução no número esperado de agudizações doLES2. Noutro estudo comparativo entre a hidroxi-cloroquina (6 mg/kg) e a bromocriptina (dose ne-cessária para se obter níveis de prolactina infe-riores a 1 ng/ml) demonstrou-se valores seme-lhantes da melhoria do SLAM, quer para abromocriptina (SLAM de 14+/- 1,1 para 7,5 +/-0,8; p<0.05), quer para a hidroxicloroquina (SLAMde 13,4+/- 1,3 para 9+/- 1,4 p<0.001), sendo que

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todas as outra variáveis foram similares38.A utilização da bromocriptina e de outros ago-

nistas dos receptores dopaminérgicos na tera-pêutica da Artrite Reumatoide têm até este mo-mento obtido resultados pouco satisfatórios; taisresultados poderão indiciar que a prolactina daArtrite Reumatóide não se relaciona com a activi-dade da doença e, mais ainda, que o potencialinflamatório articular da prolactina na ArtriteReumatoide se relacionara com a prolactina lin-focitária, não dependendo da regulação hipofi-sária.37

Conclusão

A prolactina tem nestes últimos anos vindo a ga-nhar um lugar de destaque nos estudos que sedebruçam sobre a autoimunidade.

Para além de uma acção hormonal definidaapresenta numerosas funções na imunidade ce-lular, influenciando um grande número de acçõese de células.

A questão fulcral no Lúpus Eritmatoso Sistémi-co é a de se saber até que ponto a prolactina de-sempenha um papel activo na doença, quer emtermos de patogenia, quer em termos de activi-dade.

Se as experiências realizadas em modelos ani-mais ou celulares parecem indiciar claramenteuma intervenção na patogenia e na actividade dadoença, já os modelos humanos não conseguemde forma categórica corroborar estes resultados.

Não podemos ignorar a existência de diversostrabalhos que demonstram uma relação entre osníveis séricos da prolactina e a actividade dadoença; contudo, trabalhos posteriores vieramem certos casos, negar tal hipotése.

A presença de níveis elevados de prolactina nodoente com LES pode claramente ser explicadapor um grande número de possíveis alteraçõesque ocorrem nesta doença. Contudo, a presençade valores aumentados da prolactina noutrasdoenças autoimunes parece reforçar a ideia daexistência de um desarranjo neuroendócrinocom implicações directas ao nível do sistemaimunitário.

De toda esta controvérsia deveremos sobretu-do reter a noção que o papel da prolactina no LESé de grande importância, se bem que até hoje osdiversos estudos apresentados não tenham con-seguido demonstrar de uma forma clara qual ou

quais os mecanismos envolvidos e as verdadeirasimplicações de tais obsrvações na evolução eprognóstico da doença.

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PROLACTINA E LÚPUS

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LUÍS CUNHA MIRANDA E COL.

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EXAME NEUROLÓGICO

EM REUMATOLOGIA

Anabela Barcelos

José António P. Silva

Serviço de Medicina III e ReumatologiaHospitais da Universidade de Coimbra

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A R T I G O S D E R E V I S Ã O

E X A M E N E U R O L Ó G I C O E M R E U M AT O L O G I A

Anabela Barcelos*

José António P. Silva**

Introdução

A Neurologia e a Reumatologia apresentamamplas áreas de sobreposição clínica. Muitasdoenças neurológicas apresentam quadros clíni-cos dominados por manifestações músculo--esqueléticas que exigem diagnóstico diferencialcom doenças reumáticas. Siringomielia, distrofiasmusculares, doenças do neurónio motor e poli-neuropatias são apenas alguns de numerososexemplos que se poderiam invocar. Por outrolado, são variadas as condições primariamentereumáticas que se podem acompanhar de mani-festações neurológicas que importa incluir naapreciação global do paciente e na sua orientaçãoterapêutica. Radiculopatias, neuropatias de com-pressão e miopatias inflamatórias são exemploscomuns, a que importa adicionar associaçõesmais indirectas, como as manifestações neuro--musculares de doenças do tecido conjuntivo,vasculites e síndroma anti-fosfolípidica, entreoutros. A terapêutica reumatológica pode impli-car, em muitos casos, efeitos secundários de na-tureza neurológica que é imperioso conhecer edespistar. Finalmente, certas condições primaria-mente alheias a ambas as especialidades podemdeterminar alterações em ambas as áreas, como,por exemplo, a diabetes, o hipoparatireoidismoou a carência de vitamina B12.

Por tudo isto, é fundamental que o exame reu-matológico, mesmo simplificado, integre o exameneurológico, ao menos sumário, incluindo a ava-liação da força muscular, sensibilidade e reflexosnos membros afectados, sob risco de deixarmosescapar alterações de extrema importância para odiagnóstico e orientação terapêutica do paciente.

Procuramos, neste trabalho, apresentar uma

revisão prática e estruturada desta interface, deli-beradamente organizada na perspectiva da reu-matologia.

Manifestações do sistema nervoso central

Dada a enorme prevalência, tanto das doençasreumáticas, como das afecções do S.N.C. napopulação em geral, especialmente em idosos, éprovável que a apresentação de sintomas deste fo-ro, em doentes reumáticos, corresponda, namaioria dos casos, a coexistência de afecçõesindependentes em ambos os foros.

Um razoável nível de conhecimentos sobre apatologia primária do S.N.C. (tais como demên-cias, neuroses, A.V.C., encefalopatia hipertensiva,metabólica e infecciosa, etc.) são, naturalmente,essenciais ao diagnóstico diferencial e fazemparte da formação do Reumatologista.

Dedicar-nos-emos, contudo, essencialmenteao envolvimento do S.N.C. no âmbito de doençasreumáticas e do seu tratamento.

As principais manifestações que devem levan-tar a suspeita de atingimento do S.N.C. incluemcefaleias, vertigens, lipotímias, depressão, disar-tria, alterações visuais, alterações do comporta-mento, parestesias, incontinência de esfíncteres,etc.

A apresentação de tais manifestações numdoente reumático deverá levar à consideração deduas hipóteses:A. Efeitos secundários de fármacos usados notratamento da doença reumática; (Quadro 1)B. Envolvimento do S.N.C. por doença reumática.

A. Efeitos secundários de fármacos usados notratamento da doença reumática.O Quadro 1 apresenta uma listagem dos princi-pais efeitos secundários de fármacos usados emreumatologia a nível do S.N.C.. A natureza das le-sões associadas, seus mecanismos e manifes-

* Médica do Internato Complementar de Reumatologia** Assistente Hospitalar de Reumatologia. Professor Auxiliar de Reumatologia

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ANABELA BARCELOS E COL.

tações clínicas são extremamente variadas epoderão passar frequentemente despercebidasnuma apreciação mais superificial.

Alguns dos riscos estão bem presentes na for-mação corrente do Reumatologista e fazem partede protocolos estandartizados de vigilância,como a retinopatia dos antipalúdicos e as alte-rações comportamentais associadas aos corti-costeróides.

Outras, contudo, provavelmente mais fre-quentes, mas igualmente mais subtis, serãoobjecto de apreciação menos fina, apesar depoderem contribuir de forma muito significativapara o quadro clínico global e para o sofrimentodo paciente.

B. Envolvimento do S.N.C. por doença reumática (Quadro 2).Pode dizer-se que, em termos gerais, o envolvi-

mento do SNC éraro nas doençasreumáticas, sendo,na maioria das ve-zes, discreto e au-to-limitado. Algu-mas doenças reu-máticas, contudo,são acompanhadasde frequente envol-vimento do S.N.C.,o qual pode terconsequências de-vastadoras e exigirmedidas terapêuti-cas urgentes e, nãoraro, heróicas.

Destacam-se, aeste propósito, asdoenças do tecidoconjuntivo e a sín-drome anti-fosfoli-pídica, circunstân-cias em que a ava-liação neurológicadeve fazer partesistemática e obri-gatória da apreci-ação clínica regulardo doente.

O diagnósticodiferencial destasm a n i f e s t a ç õ e s

coloca ao reumatologista alguns dos desafiosmais complexos de toda a sua experiência clínica.O diagnóstico diferencial tem, quase sempre, queincluir uma enorme variedade de causas emecanismos possíveis, incluindo patologia neu-rológica e psiquiátrica primária, efeitos secun-dários medicamentosos, distúrbios metabólicos,infecções, etc. Mesmo com uma abordagemestruturada e sistemática, enfrentamos inúmerasdificuldades resultantes do escasso esclareci-mento biológico, bem como da fragilidade deconsenso quanto aos critérios de diagnóstico,sinais específicos, testes de laboratório e técnicasimagiológicas.

O envolvimento mais comum e melhor estu-dado ocorre no LES e na síndroma antifosfolípidi-ca. A sua natureza complexa e multivariada bemcomo a dificuldade do diagnóstico diferencialultrapassam o âmbito e objectivos deste trabalho.

Quadro I. Efeitos secundários de fármacos usados em reumatologia a nível do S.N.C.

Fármaco Efeitos Secundários

AINE • Cefaleias, vertigens, lipotímias, confusão,

(indometacina, diclofenac, depressão, psicose (indometacina)

ibuprofeno) • Ototoxicidade (indometacina, naproxeno e

salicilatos)

• Neuropatia óptica (indometacina, ibuprofeno)

• Cegueira cortical (salicilatos)

• Meningite asséptica (ibuprofeno)

• Alterações do paladar (salicilatos)

Corticósteróides • Alterações da personalidade

• Psicose, miopatias

• Hipertensão intracraniana benigna

Cloroquina • Distúrbios extrapiramidais

• Retinopatia

• Psicose, confusão, delírio

• Ototoxicidade

Metotrexato • Encefalopatia, alucinações

D-Penicilamina • Neuropatia óptica

Azatioprina • Alterações do paladar

Alopurinol • Lipotímias

• Alterações do paladar

Ciclosporina • Alucinações

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EXAME NEUROLÓGICO EM REUMATOLOGIA

O leitor é, contudo, refe-renciado para algumasrevisões recentes destesassuntos7-16.

O compromisso neu-rológico por luxaçãoatloido-axoideia podepassar facilmente des-percebido, particular-mente em doentes comartrite reumatóide evo-luída ou de idade maisavançada. De acordocom estudos recentes17

realizados pelo nossogrupo, a luxação, apre-ciada radiologicamente,está presente em cercade 62,6% dos doentescom artrite reumatóide.Contudo, só em 46,7%esta alteração radiológi-ca estava associada asintomatologia sugesti-va. Destacam-se, a estepropósito, a presença decervicalgia recente (me-nos de 18 meses) ou ne-vralgia occipital, bemcomo parestesias (po-dem ser em meia-luva)ou adormecimento dosmembros ou tronco.Alguns doentes referemainda «choques eléctri-cos» com os movimentoscervicais, tais como le-vantar a cabeça da almo-fada. Podem ainda ocor-rer sintomas e sinais dedeficite motor.

Sintomas de insufi-ciência vertebrobasilar,devida a compressão oucompromisso inflamató-rio da artéria vertebral,podem surgir numa va-riedade de condiçõesreumatológicas, comoindicado no Quadro 1. Asprincipais manifestaçõesincluem disartria, diplo-

Quadro 2. Doenças Reumáticas com envolvimento do SNC

LES • Depressão, lipotímias, cefaleias

• Alterações subtis da memória e

da aprendizagem

• Convulsões, psicose

• Mielite transversa

• A.V.C.

Síndroma • Tromboses cerebrais

antifosfolipidica • Demência progressiva, isolada ou em

associação com AVC de repetição

• Acidentes isquémicos transitórios

• Coreia

• Amnésia global

• Mielite transversa

Artrite reumatóide • Mielopatia cervical

Artrite crónica juvenil • Insuficiência vertebrobasilar

Artrite psoriática

Espondilite anquilosante • Síndrome de cauda equina

Doença de Behçet • Irritação meníngea

• Sintomas de hipertensão intracraniana

• Uveíte posterior

• Vasculite retiniana

Arterite de células gigantes • Insuficiência vertebrobasilar

Arterite de Takayasu • Insuficiência vertebrobasilar ou carotídea

• Retinopatia anastomótica

Angeítes primárias do SNC • Cefaleias

• Diminuição cognitiva

• Lesões medulares

• Hemorragia cerebral

Síndrome de Cogan • Disfunção audio-vestibular (Pseudo-Ménière)

Sarcoidose • Lesões dos pares cranianos

• Meningite asséptica

• Hidrocefalia

Doença de Paget • Síndrome de cauda equina

• Síndromes medulares e radiculares

Doença de Lyme • Meningite asséptica

• Meningoencefalite

• Lesões dos pares cranianos

Artrose da coluna cervical • Mielopatia espondilótica

• Isquémia vertebro-basilar transitória

• Síndrome simpático cervical posterior

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ANABELA BARCELOS E COL.

plia, vertigens, acufenos, confusão transitória,ataxia, paraparésia e lipotímia, que nem semprese encontram dependentes de posições extremasda coluna cervical.

As manifestações de mielopatia compressiva(artrite reumatóide, osteoartrose, Paget...) depen-dem do nível e gravidade da compressão.

Dificuldade em subir escadas, sensação depeso e rigidez dos membros inferiores e ou supe-riores, sugerindo parésia espática, são manifesta-ções comuns. Estas manifestações são, habitual-mente, acompanhadas de parestesias. Raramente,podem também ocorrer distúrbios dos esfíncte-res. A associação desta última manifestação a per-turbação de sensibilidade em sela, sugere o diag-nóstico de síndrome da cauda equina que deveconsiderar-se uma urgência cirúrgica.

O exame neurológico pode revelar alterações,como parésia de extensão variável, acompanhadade hiperreflexia ou mesmo sinal de Babinski.Contudo, a sua presença não é constante, peloque não deve constituir elemento indispensável àsuspeição diagnóstica.

Por outro lado, a flexão da coluna cervical(mais raramente a extensão) desencadeia umasensação de choque eléctrico ao longo da coluna,por vezes estendendo-se aos membros (Sinal deLhermite) devendo-nos fazerpensar em mielopatia cervical.

Manifestações do sistemanervoso periférico e músculos

O atingimento do sistema ner-voso periférico não é raro nocontexto de doença reuma-tismal. Pode resultar de umenvolvimento directo peladoença ou ser manifestação detoxicidade de fármacos em-pregues no seu tratamento.

As alterações de sensibili-dade constituem a manifes-tação mais frequente do envol-vimento do sistema nervosoperiférico em doentes comartropatia. Deve, por isso, sersistematicamente pesquisadasempre que a natureza dadoença ou do seu tratamento

sugerirem esta possibilidade.O exame neurológico é, naturalmente, a chave

do diagnóstico. Contudo, este exame pode tornar--se difícil num membro já limitado e deformadopor artrite, pelo que o reconhecimento destascomplicações exige um elevado índice de suspeitae o auxílio de exames complementares adequados.

A. Efeitos secundários de fármacosOs fármacos anti-reumatismais que mais fre-quentemente se associam a toxicidade do S.N.P.estão listados no Quadro 3. Dada a natureza dasmanifestações associadas, poderão apresentar-seao Reumatologista manifestações deste tipo de-vidas a medicamentos com indicação não reuma-tológica.

A descrição destes quadros será encontradanos parágrafos seguintes.

B. Envolvimento do S.N.P. por doença reumáticaEste envolvimento pode ser dividido, para melhorentendimento, em Radiculopatias e NeuropatiasPeriféricas.

B.1. Radiculopatias:As radiculopatias cervicais mais comuns sãodevidas a lesão das raízes C5 a C8. O quadro clíni-

Quadro 3. Efeito secundário de fármacos usados em Reumatologiaa nível do S.N.P.

Fármaco Efeitos Secundários

Corticosteróides • Miopatia

Cloroquina • Neuropatia sensitivo-motora periférica

(>0.5g dia)

Sais de ouro • Neuropatia periférica

• Cãimbras

Talidomida • Neuropatia sensitivo-motora periférica

• Fasciculações

Antibióticos fluoretados • Tendinites

Hipolipemiantes • Miopatia

Cimetidina • Neuropatia periférica predominantemente

motora

• Cãimbras

Colchicina • Miopatia

• Neuropatia sensitivo-motora periférica

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EXAME NEUROLÓGICO EM REUMATOLOGIA

co caracteriza-se por dor cervical de início súbitoou progressivo que se irradia ao longo do mem-bro superior (cervicobraquialgia). Tipicamente, ador é exacerbada com os movimentos extremosdo pescoço. Contudo, com frequência, cede malao repouso, podendo apresentar exarcebaçãonocturna com alterações do sono.

Pode acompanhar-se de parestesias no dermá-tomo afectado (Vd Quadro 5) o que, frequente-mente, constitui a única queixa do doente.

Na maior parte dos casos, a cervicobraquialgiasurge na evolução de cervicartrose (cervico-braquialgia comum). Mais raramente, trata-se deuma cervicobraquialgia secundária, tradutora depatologia raquidiana inflamatória, tumoral ouinfecciosa, ou ainda de compressão intra ou extraraquidiana das raízes cervicais (Quadro 4).

O diagnóstico diferencial entre os dois tipos de

cervicobraquialgias (comum e secundária), bemcomo a definição da raiz afectada é essencial àorientação terapêutica. Para tal é fundamentalrecolher uma história clínica detalhada e proce-der a exame reumatológico e neurológico minu-cioso da coluna cervical e regiões vizinhas (crâ-neo, dorso e membros superiores) (Quadro 5).

A cervicobraquialgia secundária é sugeridapela presença de dor permanente, de intensidadecrescente, com exarcebação nocturna, comrigidez global, acompanhando-se de alteraçõesdo estado geral como febre, emagrecimento, etc.

Não devemos, contudo, esquecer o diagnósti-co diferencial com radiculite zosteriana, radicu-lite da doença de Lyme ou Síndroma de Parsona-ge e Turner.

Na prática reumatológica as radiculopatiasmais comuns no membro inferior traduzem-se

Quadro 4. Etiologia da Cervicobraquialgia secundária

Patologia raquidiana Patologia intra-raquidiana Patologia extra-raquidiana

Tumor benigno (Ex: osteoma Tumor intramedular Envolvimento do plexo braquial

osteóide, condroma, quisto) (astrocitoma, epêndimoma) por compressão metastática

latero-vertebral ou esclerose

pós-radioterapia no cancro da mama

Tumor maligno (Ex: metástase, Neurinoma duma raiz Tumor do vértice do pulmão ou

mieloma, linfoma) cervical (raro) metástase local (território de C8-D1)

Espondilodiscite infecciosa (raro) Seringomielia (raro)

Traumatismo

Quadro 5. Cervicobraquialgias por lesão das raizes C5 a C8

Raiz Sensibilidade Fraqueza Muscular Reflexos

C5 Face externa da espádua Abdução do ombro e Diminuição do bicipital

e do braço (por x omoplata) flexão do cotovelo (e radial)

C6 Face antero-externa da Extensão e pronação Diminuição do radial

espádua, braço, antebraço do punho (e bicipital)

e 1º dedo

C7 Face posterior da espádua, Extensão do cotovelo Diminuição do tricipital

braço, antebraço, face dorsal do e dos dedos

punho, 2º e 3º dedos da mão

C8 Face interna do braço, antebraço, Flexão dos dedos e punho Diminuição do tricipital

4º e 5º dedos da mão

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ANABELA BARCELOS E COL.

por lombociatalgia. A ciatalgia caracteriza-se pordor que desce unilateralmente da região glútea,ao longo da face posterior ou postero-externa dacoxa, perna e pé, e deve-se a lesão das raízes L5ou S1. Contudo, excepcionalmente, pode serbilateral, embora com predomínio num doslados.

Também aqui importa distinguir entre as decausa mecânica e as de origem tumoral ou infla-matória (Quadro 6). Embora alguns elementosclínicos possam ajudar nesta distinção, não têm,por si só, valor absoluto e só a avaliação de con-junto favorece uma ou outra etiologia (Quadro 7).

O quadro clínico é dominado por queixas dedor lombar com irradiação para a porção supero-

-externa da nádega e membro inferior, segundotopografia dependente da raiz lesada. Tipicamen-te, o início é súbito ou progressivo, sendo exarce-bada pela marcha e pela manobra de Valsava.

As articulações inter-apofisárias posteriores esua deterioração são causa frequente de lombo-ciatalgia de causa mecânica (L5 ou mais frequen-temente S1) por estenose dos buracos de conju-gação ou por quisto sinovial, caracterizando-sepor dor difusa ao longo da linha média da colunalombar, após um período de grande actividade,em indivíduos com hiperlordose lombar.

Outra causa muito frequente é a síndrome docanal lombar estreito, traduzindo-se por lombal-gia com irradiação aos membros inferiores, na

forma de dor ou hiposte-sia/parestesias, atingindoterritórios cutâneo-muscu-lares abaixo do joelho. Aclaudicação neurogénica éa manifestação mais típicana apresentação deste sín-drome. A dor, que afecta osmembros inferiores, surgeapós certo perímetro demarcha, obrigando o doen-te a repousar. Tipicamente,a dor é mais intensa adescer uma ladeira do quea subi-la, devido à flexãoextensão lombar de com-

Quadro 6. Etiologia das lombociatalgias

Lombociatalgia de causa mecânica Lombociatalgia secundária

Conflito disco-radicular Metástases ósseas e mieloma

Canal lombar estreito Tumor intraraquidiano

Artrose das interapofisárias Espondilodiscite infecciosa

Espondilolistese por espondilólise Meningoradiculite

Anomalias do saco dural Sacroiliíte

Fractura vertebral osteoporótica

Fibrose epidural

Quadro 7. Diagnóstico diferencial clínico da causa provável da lombociatalgia

Elementos a favor da origem mecânica Elementos a favor da origem tumoralou inflamatória

Antecedentes de crises de lombalgia Inexistência de antecedentes de lombalgia

Início brutal aquando da realização de um esforço Início progressivo, insidioso, sem factor desencadeante

Dor relacionada com os movimentos e esforço Dor contínua e aumentando de intensidade

Dor unilateral e monoradicular Dor pluriradicular

Rigidez lombar antálgica Rigidez vertebral importante

Sinal da campainha positivo Sinal de Lasègue < 45º

Aumento da dor com a manobra de Valsava Dor intensa desencadeada pela tentativa de mobilização

Alterações neurológicas e do estado geral

Antecedentes de neoplasia

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pensação. Ao contrário do que sucede na claudi-cação vascular, o doente tolera mobilização pro-longada dos membros inferiores, se executadosem decúbito dorsal.

O diagnóstico é baseado na história clínica eexame minucioso.

No caso de lesão da raiz de L5, o doentedescreve dor com o seguinte trajecto: face poste-rior da coxa – face externa ou antero-externa daperna – maléolo externo até ao 1º dedo do pé; nocaso de envolvimento de S1: face posterior domembro inferior até ao calcanhar – bordo exter-no da planta do pé até ao 5ºdedo (Quadro 8).

Frequentemente, a dor radicular não apresen-ta o trajecto completo, parando na massa dosgémeos ou na região poplítea, sendo designadade ciática truncada.

Pode existir uma região dolorosa à pressão(mediana ou paramediana), ao nível dos discosL4-L5 e L5-S1, cuja compressão reproduz a dorciática (Sinal da campainha).

O exame neurológico é sugestivo, com positivi-dade do sinal de Lasègue, incapacidade para amarcha em ponta dos pés (no caso de lesão de S1)e sobre os calcanhares (no caso de lesão de L5).Contudo, só raramente o exame neurológico épositivo, traduzindo lesão nervosa crónica.

A história clínica e o exame minucioso sãomuito importantes para proceder ao diagnósticodiferencial com uma variedade de condições:• cólica renal- cujo ponto de partida é lombar e,

por vezes, não se faz acompanhar de queixasurinárias;

• dor sacro-ilíaca- caracterizada por dor locali-zada à região glútea, por vezes irradiando aolongo da coxa. Não há defícite neurológico, osinal de Lasègue é negativo e a realização demanobras para as sacro-ilíacas permite identi-ficar a origem;

• nevralgia crural- traduz lesão de uma dasraízes constitutivas do nervo crural (L3, L4, L2acessoriamente) cuja clínica evidencia dorlombar com irradiação para a porção supero-externa da nádega e membro inferior segundotopografia dependente da raiz lesada.

• meralgia parestésica- resulta da compressãodo nervo fémuro-cutâneo (o qual tem origemnas raízes L1 e L2) sob o ligamento inguinaljunto à inserção deste na espinha ilíaca antero--superior. Clínicamente traduz-se por dor eparestesias na face antero-externa da coxa;

• claudicação intermitente- devida a arteriopa-tia do membro inferior. Embora a palpaçãodos pulsos e o Doppler arterial sejam muitoimportantes, a distinção entre queixas neuro-lógicas e vasculares é, por vezes, muito difícil;

• Síndrome do piriforme- caracterizado porlombo-sacralgia com irradiação à parte distaldo membro inferior. O Lasègue pode ser posi-tivo. A rotação interna da coxa é particular-mente dolorosa. Há pressão dolorosa junto àarticulação sacro-ilíaca e o exame neurológicoé, de resto, negativo;

• Fasciíte lata- manifestando-se por dores aonível da face externa da região trocantérica,por vezes com irradiação ascendente (nádega,crista ilíaca) e descendente (face externa dacoxa e perna). O sinal de Lasègue pode ser po-sitivo;

• Outras pseudoradiculalgias que se caracteri-zam por dores projectadas ou referidas a par-tir de estruturas osteo-articulares, tendinosasou ligamentares, incluem tendinopatiasisquiáticas, que irradiam ao longo da faceposterior da coxa, simulando uma radiculopa-tia S1 e ligamentite ilío-lombar que irradiapara a nádega, região inguinal e face externada coxa.

EXAME NEUROLÓGICO EM REUMATOLOGIA

Quadro 8. Lombociatalgias por lesão das raízes de L4, L5 e S1

Raiz Sensibilidade Fraqueza Muscular Reflexos

L4 Face antero-interna da perna Extensão do joelho e Diminuição do rotuliano

dorsiflexão do pé

L5 Face externa da perna, dorso Flexão do joelho e

do pé e 1º dedo dorsiflexão do pé e dedos

S1 Face plantar, bordo externo Flexão do joelho e flexão Diminuição ou abolição

do pé e 3 últimos dedos plantar do pé do aquiliano

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B.2. Neuropatias periféricas (Quadro 9):As neuropatias periféricas podem ser subdividi-das em mononeuropatias por compressão, mo-noneuropatia multiplex, polineuropatias e neu-ropatia autonómica.

São muito frequentes as mononeuropatias porcompressão, situação em que os nervos periféri-cos são lesionados pela pressão exercida pelasarticulações deformadas ou estruturas peri-arti-culares.

O início é, habitualmente, insidioso com dor,parestesias ou fraqueza no território nervosoenvolvido.

É importante o diagnóstico diferencial comoutras causas de dor regional, tais como a neural-gia braquial, mononeurite multiplex por vas-culite, etc.

Alguns exemplos comuns, na prática reuma-tológica, de mononeuropatias por compressão:

Nervo cubital• Dores e parestesias na face cubital da mão e

nos 4º e 5º dedos.• Sinal de Tinnel positivo ( a percussão do canal

de Guyon reproduz as queixas do doente).

Nervo mediano• Dores e parestesias na face palmar do 1º, 2º e

3º dedos.• Sinal de Tinnel positivo ( a percussão do canal

cárpico provoca o aparecimento ou o agrava-mento das dores e parestesias na região da

mão e dos dedos enervados pelo mediano).• Sinal de Phalen positivo (a colocação do punho

numa posição de flexão extrema durante 1 ou 2minutos reproduz as queixas do doente).

Nervo radial• Fraqueza à dorsi-flexão do punho.• Perda de sensibilidade no dorso da mão é mí-

nima.

Nervo tibial posterior • Dores tipo queimadura e parestesias na planta

do pé, por vezes com irradiação ascendente àface interna da perna

• Alterações da sensibilidade na face plantar dopé, incluindo calcâneo (mais evidente no bor-do interno do pé) e, numa fase tardia, dimi-nuição da força de flexão das MTF, em especialdo 4º e 5º dedos, assim como compromisso daabdução e aducção dos dedos

• Tinnel positivo a nível do canal társico (sob omaleolo interno).

Meralgia parestésica• Dor tipo queimadura e parestesias na face

antero-externa da coxa.• A sintomatologia pode ser reproduzida pela

pressão do nervo na arcada crural junto àespinha ilíaca antero-superior.

Na mononeuropatia multiplex ocorre lesãodos diferentes constituintes do tronco nervoso

periférico e caracteriza-se pela asso-ciação de sinais motores (paralisia ouparésia flácida com amiotrofia maisou menos importante, reflexos osteo-tendinosos habitualmente abolidos),sinais sensitivos (parestesias, hipo ouanestesia superficial com topografiatroncular com uma predominânciadistal) e de perturbações simpáticas(membros frios, por vezes cianosa-dos, com hipersudação).

É a assimetria das perturbações e alesão sucessiva no tempo dos dife-rentes troncos nervosos que dão par-ticularidade ao quadro clínico.

Um terço dos doentes apresentamum quadro claro de transtornos des-mielinizantes, habitualmente comfocos múltiplos de bloqueio persis-tente da condução no electromiogra-

ANABELA BARCELOS E COL.

Quadro 9. Neuropatias periféricas em Doenças Reumáticas

Polineuropatiaa) Motora • Sínd. Sjögren (mista)

b) Sensitiva • Artrite Reumatóide

Mononeuropatia (incluindo • Artrite reumatóide (STC)

N. Compressão) • Esclerodermia (STC)

Mononeuropatia multiplex • Poliartrite nodosa (50-70%)

• Sínd. Sjögren

• Artrite Reumatóide

• LES

Neuropatia autónoma • Artrite reumatóide

• LES

• CREST

• Esclerose sistémica

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ma, enquanto que os dois terços restantes apre-sentam um electromiograma com afectaçãoaxonal de distribuição heterogénea.

Embora se possa suspeitar de uma base is-quémica na neuropatia destes doentes, sómetade deles apresentam vasculite. Os outrospermanecem sem diagnóstico.

As vasculites primárias do grupo da Poliar-terite Nodosa constituem a causa mais frequente,seguida pela vasculite associada às conectivopa-tias, por ordem decrescente de frequência: ArtriteReumatóide (habitualmente bilateral e localizadaàs pernas), Lúpus Eritematoso Sistémico eDoença Mista do Tecido Conjuntivo.

Outras causas pouco frequentes: Crioglobu-linémia mista, Síndroma de Sjögren, Granulo-matose de Wegener, Esclerose Sistémica progres-siva, Granulomatose Alérgica de Churg-Strauss eAngiíte por Hipersensibilidade.

A mononeuropatia multiplex também podeocorrer como manifestação de Lepra, Sarcoidose,certas formas de Amiloidose, Síndrome hipereo-sinófilo, etc.

As polineuropatias caracterizam-se por umalesão bilateral e simétrica dos troncos nervososperiféricos dos membros e que se traduz por sin-tomatologia sensitivo-motora, de predominiodistal, associada a perturbações tróficas. É estabilateralidade, simetria e carácter distal da lesão,que com o sincronismo de desenvolvimento notempo, dão particularidade ao quadro clínico.

As perturbações motoras, paralisia ou parésia,afectam dois ou mesmo os quatro membros deforma bilateral e simétrica com predomínio dasextremidades. Os reflexos miotáticos estãodiminuídos ou mesmo ausentes, sobretudo nosmembros inferiores. As perturbações sensitivas,traduzidas em hipoestesias e parestesias, têmtambém distribuição distal mais do que proxi-mal, habitualmente simétrica, afectando os pés epernas antes das mãos e braços. As perturbaçõestróficas (atrofia muscular, retracções tendinosas)são habitualmente muito tardias.

Existem várias formas clínicas de acordo com aextensão, evolução, predominância de lesãomotora e/ou sensitiva. Na realidade, todos estesfactores estão relacionados com a etiologia, dis-tinguindo-se três grandes grupos entre as princi-pais causas: polineuropatias tóxicas (álcool, ar-sénico, chumbo, isoniazida, sulfamidas,...), infec-ciosas (diftérica, febre tifóide, erisipela, tubercu-lose,..) e metabólicas (diabetes e insuficiência

renal, por exemplo). A mononeuropatia autonómica é uma mani-

festação de um processo polineuropático maisgeneralizado que afecta também a função ner-vosa periférica somática, como ocorre na neu-ropatia diabética, por exemplo.

Clínicamente pode-se traduzir por hipotensãopostural, síncope, hipotermia, atonia vesical,boca e olhos secos por insuficiência das glându-las salivares e lacrimais, impotência sexual noshomens, rubor, sudorese, perda da taquicardiareflexa à manobra de Valsalva.

C. MiopatiasNa prática reumatológica, sintomas de miopatia(fraqueza muscular, mialgias e cãimbras) são fre-quentemente evocados pelos doentes. É, por isso,fundamental reconhecer os dados da históriaclínica e do exame objectivo que suportam a suacorrecta valorização (Quadro 10).

As miopatias determinam fraqueza muscularcom distribuição claramente proximal e simétri-ca, embora as formas mais graves se possamtornar generalizadas. Em contraste, a fraquezamuscular de origem neuropática tende a serassimétrica com envolvimento preferencial-mente distal, asssociando-se, em regra, a altera-ções da sensibilidade.

As neoplasias devem ser consideradas na ava-liação dos doentes com sintomas miopáticos, jáque eles podem ocorrer como síndroma paraneo-plásica. A história medicamentosa é tambémimportante. Os hipolipemiantes podem desen-cadear miopatia, com alterações primárias dasfibras musculares energéticas, os diuréticostiazídicos por induzirem hipocaliémia. A Zidovu-nine (AZT) pode induzir miopatia mitocondrial.O álcool por efeito tóxico directo sobre as fibrasmusculares.

Numerosas infecções podem causar miopatiassendo as virusais as mais comuns. Crianças cominfecções por influenza A e B podem referirmialgias severas associadas a níveis elevados deCPK.

A fraqueza muscular é uma característicacomum aos doentes com SIDA que pode tervárias origens: caquexia, doenças do sistema ner-voso central e periférico, polimiosite resultantede alterações da função imune, toxicidade ao AZTou infecções oportunistas.

As miopatias inflamatórias e metabólicas sãorelativamente raras.

EXAME NEUROLÓGICO EM REUMATOLOGIA

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ANABELA BARCELOS E COL.

Endereço para correspondência:José António P. SilvaMedicina III/Reumatologia3000-075 CoimbraFax: 239 400 491

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Quadro 10. Diagnóstico diferencial de miopatias

Doenças Inflamatórias • Polimiosite

Idiopáticas • Dermatomiosite

Doenças Endócrinas • Hipo e Hipertiroidismo

• Hipo e Hiperparatiroidismo

Doenças Metabólicas • Hipocalcémia

• Hipocaliémia

Doenças Neurológicas • Distrofias musculares

• Síndrome de Guillain-Barré

• Miastenia Gravis

Doenças Infecciosas • Virusais (Adenovirus, CMV, HIV,

Influenza, Hepatite B e C, etc)

• Bacterianas (Tuberculose,

Mycoplasma, Clostridium)

• Fúngicas (Cryptococcus, Candida)

• Parasitárias (Toxoplasma,

Trichinosis, Cysticerosis)

Fármacos • Amiodarona

• Clofibrato

• Gemfibrozil

• Cetoconazol

• Hidroxicloroquina

• D-Penicilamina

• Ciclosporina

• Enalapril

• Colchicina

• Zidovudine (AZT)

Tóxicos • Álcool

• Cocaína

• Heroína

Neoplasias • Síndrome de Eaton-Lambert

• Síndrome Paraneoplásico

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ARTRALGIAS, FEBRE

E LESÕES CUTÂNEAS.

UM EXERCÍCIO DIAGNÓSTICO

Bárbara Fernandes

José António P. Silva

Américo Figueiredo

Armando Porto

Serviços de Dermatologia e Medicina IIIReumatologia dos Hospitais da Universidade de Coimbra

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I M A G E N S E M R E U M AT O L O G I A

A R T R A L G I A S , F E B R E E L E S Õ E S C U T Â N E A S . U M E X E R C Í C I O D I A G N Ó S T I C O

Bárbara Fernandes*, José António P. Silva,**

Américo Figueiredo,*** Armando Porto****

A.B., sexo feminino, 44 anos de idade, empregadadoméstica. Observada pela primeira vez noserviço de Dermatologia em Outubro de 1999apresentando lesões nodulares sub-cutâneas,dolorosas, com tonalidade eritemato-violácea,localizadas de forma bilateral à face anterior deambas as pernas (fig.1). Estas lesões eram acom-panhadas de astenia, febrícula (37-37,5o C) epoliartralgias tendo resolvido, sem sequelas, aofim de 5 semanas. Em Dezembro de 2000 foireobservada em consulta por modificação dascaracterísticas de uma cicatriz localizada à regiãofrontal esquerda, resultante de um traumatismoaos 14 anos. Ao exame objectivo a cicatriz apre-sentava-se túmida, infiltrada e com tonalidadeeritemato-violácea (fig.2). O quadro apresentadotinha uma evolução de cerca de 2 meses e eraacompanhado de tosse seca e astenia.

Qual o seu diagnóstico?As lesões cutâneas nodulares localizadas aosmembros inferiores poderiam evocar as seguinteshipóteses diagnósticas:• Síndroma de Sweet: as lesões características

desta entidade são placas eritematosas, infil-tradas, edemaciadas, com esboço de vesicu-lação em superficíe. As localizações mais fre-quentes são a face, o pescoço e os membrossuperiores. Quando, no entanto, as lesões selocalizam aos membros inferiores, podem adquirir aspectos a tipo de eritema nodoso.

São elementos para o diagnóstico diferencial apresença de lesões cutâneas noutros locais, aassociação com febre (38-39ºC), a presença deleucocitose com neutrofilia e, quando neces-sário, a biopsia cutânea que no S. de Sweet écaracterizada por marcado edema da derme einfiltrado de polimorfonucleares neutrófilos,sem vasculite.

• Vasculite nodular: onde, no entanto, as lesõessão mais persistentes, predominam na faceposterior das pernas, tendem a ulcerar e re-

* Interna do Internato Complementar de Dermatologia ** Reumatologista, Professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra*** Director do Serviço de Dermatologia, Professor da Faculdadede Medicina da Universidade de Coimbra**** Director do Serviço de Medicina III e Reumatologia,Professor Catedrático da Faculdade de Medicina da Universidadede Coimbra Figura 1. Um caso de eritema nodoso

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solvem deixando lesões cicatriciais residuais.• Picadas de insecto: as lesões são, por norma,

mais papulosas que nodulares, intensamentepruriginosas e no interrogatório consegue-secom frequência identificar um factor epide-miológico desencadeante. Localizam-se habi-tualmente às áreas expostas e, portanto, as le-sões podem surgir noutros locais além dosmembros inferiores.

• Urticária aguda: caracterizada pelo carácterpruriginoso e móvel das lesões. Qualquer localdo tegumento cutâneo pode ser afectado.

• Periarterite nodosa cutânea: onde surgemlesões nodulares sub-cutâneas dolorosas compredomínio aos membros inferiores. São ele-mentos para o diagnóstico diferencial a dis-tribuição ao longo de um trajecto vascular, ocaracter recorrente das lesões, associaçãocom livedo reticular, a presença de púrpuraperi-lesional e, por vezes, a evolução paraulceração e necrose.

No entanto, neste contexto, de lesões nodu-lares sub-cutâneas inflamatórias, localizadas àface anterior das pernas, com evolução aguda eque resolvem sem deixar lesões cicatriciais, a hi-pótese clínica mais provável é a de eritemanodoso.

O eritema nodoso é um padrão de reacçãocutâneo, caracterizado por lesões nodularesinflamatórias, dolorosas, espontaneamente re-gressivas, localizadas predominantemente à su-perfície de extensão dos membros inferiores.

BÁRBARA FERNANDES E COL.

Pode estar associado a várias enti-dades clínicas, pelo que a suaobservação deve sempre desen-cadear a investigação da etiologiasubjacente.

As causas mais frequentes sãoas seguintes:• Infecção por Estreptococus he-

molítico: surge, geralmente, 3semanas após uma infecção res-piratória superior. Classicamen-te nesta situação o eritema no-doso é muito inflamatório e temum carácter potencialmenterecidivante, coincidindo com re-infecções.

• Sarcoidose: geralmente associa-do a adenopatias mediastínicas,febre e artralgias, constituindo oS. de Löfgren.

• Yersiniose: Habitualmente num contexto dedores abdominais ou diarreia prévias.

• Outras causas infecciosas: Tuberculose, hepa-tite B, linfogranuloma venéreo, mononucleoseinfecciosa...

• Causa farmacológica: Os fármacos mais impu-tados são as sulfamidas e os contraceptivos orais. Em outros casos podem ser inadequa-damente imputados antibióticos e anti-infla-matórios não esteróides, prescritos na fase pro-drómica do eritema nodoso.

• Enteropatias: Colite ulcerosa e doença deCrohn

• Outras causas: Doença de Behcet, linfomas,leucemias, post-radioterapia.

O estudo em fase aguda deve sempre incluirum hemograma, determinação da velocidade desedimentação, doseamento das transaminases,serodiagnóstico estreptocóccico, estudo bacte-riológico de zaragatoa faríngea, radiografia dotórax, prova da tuberculina e coprocultura paraYersinia. Frequentemente (20% dos casos) não seconsegue, no entanto, identificar a causa desen-cadeante.

No caso clínico apresentado, não existia histó-ria de processo infeccioso ou ingestão de fárma-cos a preceder o aparecimento do eritema nodo-so e os antecedentes pessoais da doente eram ir-relevantes. Dos exames complementares de diag-nóstico realizados à data, o hemograma mostrouleucopenia de 3,40 G/L, a velocidade de sedimen-tação era de 60 mm na 1ª hora e a enzima de con-

Figura 2. Um caso de eritema nodoso

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ÓRGÃO OF IC IAL DA SOC IEDADE PORTUGUESA DE REUMATOLOGIA - ACTA REUM PORT. 2001;26:213-216

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Outubro de 1999, adenopatias hilares bilaterais epara-traqueais à direita, associadas no entanto ainfiltrado difuso pulmonar. O lavado bronco-alveolar apresentava uma relação CD4/CD8 de5,9. A calcémia, a calciúria, e as provas funcionaisrespiratórias foram normais.

Iniciou em Janeiro de 2001 tratamento comcorticoterapia tópica (betametasona pomada id)sobre a cicatriz e corticoterapia oral (32 mg metil-prednisolona p.º id). Actualmente, mantém-seem consultas de Dermatologia e Pneumologia,observando-se ligeira diminuição da infiltraçãoda cicatriz, bem como da tosse e astenia.

Endereço para correspondência:

Bárbara FernandesServiço de DermatologiaHospitais da Universidade de CoimbraPraceta Prof. Mota Pinto3000-075 CoimbraTelefone: 239 400 420Fax: 239 400 490E-mail: [email protected]

Referências Bibliográficas

1. Crystal RG. Sarcoidosis. In: Fauci AS, Braunwald E,Isselbacher KJ, Wilson JD, Martin JB, Kasper DL etal. Principles of internal Medicine. New York. Mc-Graw-Hill, 1998: 1922-1928.

2. Sharma OP. Sarcoidosis of the skin. In: FitzpatrickTB, Freedberg IM, Eisen AZ, Wolff K, Austen KF,Goldsmith LA et al. Dermatology in general prac-tice. New York. McGraw-Hill, 1999: 2099-2106.

3. Grosshans E, Laugier P. Granulomes cutanés noninfectieux. In:Saurat JH, Grosshans E, Laugier P,Lachapelle JM. Dermatologie et maladies sexuelle-ment transmissibles. Paris. Masson, 1999: 506-517.

4. Braun-Falco O, Plewig G, Wolff HH, Burgdorf WHC.Dermatology. Berlin: Springer Verlag, 2000: 1380-1387.

ARTRALGIAS, FEBRE E LESÕES CUTÂNEAS. UM EXERCÍCIO DIAGNÓSTICO.

versão da angiotensina (SACE) de 84 U/l. A radio-grafia do tórax mostrou adenopatias hilares bila-terais e para-traqueais à direita. O título de anti-estreptolisina, a calcémia, a calciúria, a cultura dezaragatoa faríngea e de fezes foram normais ounegativos.

Estabeleceu-se, então, o diagnóstico de S. deLöfgren, que corresponde a uma forma aguda desarcoidose e que, clinicamente, se caracteriza pe-la associação de eritema nodoso, adenopatias hi-lares bilaterais, poliartralgias e febrícula. Atinge,habitualmente, mulheres jovens e tem bom prog-nóstico dada a elevada percentagem de remis-sões espontâneas. Por essa razão, do ponto devista terapêutico, foi apenas medicada com anti--inflamatórios não esteróides (nimesulide 100 mgvo 2 id) e repouso, com resolução do quadro clíni-co em 6 semanas.

Em Dezembro de 2000 volta à nossa consultapor modificação das características clínicas de ci-catriz antiga, que se tornou mais saliente e infil-trada. Tal facto poderia corresponder a um granu-loma de corpo estranho ou a lesões de sarcoidosesobre cicatriz. Embora seja uma manifestaçãorara de sarcoidose, a infiltração de cicatrizes pré-vias é muito característica desta entidade. Nocaso presente, a associação com eritema nodosoveio consubstanciar a hipótese clínica de sar-coidose.

A biópsia cutânea da lesão cicatricial mostroua presença de granulomas sarcoidóticos consti-tuídos por células epitelióides, sem caseificação ecom escasso infiltrado inflamatório. De salientarque biópsias realizadas em lesões de eritema no-doso, não mostram estruturas granulomatosas,mas sim as alterações características do eritemanodoso, isto é, hipodermite septal sem vasculite.Do restante estudo realizado destacava-se 3,60G/l leucócitos, VS 69 mm na 1ª hora e SACE 95U/l. A radiografia do tórax mostrou, tal como em

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Unidade de ReumatologiaHospital de Egas Moniz

CINTIGRAMA OSTEOARTICULAR:

INDICAÇÕES PRINCIPAIS

E BASE DE INTERPRETAÇÃO

Margarida Cruz

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R E S U M O

A cintigrafia osteoarticular é um exame de imagem que se desenvolveu pela necessidade de aumentar asensibilidade da radiografia simples na avaliação de alterações osteoarticulares. Desde que, em 1961, sedemonstrou que a captação de estrôncio pelo osso aumentava com a existência de patologia local,foram-se utilizando progressivamente radiofármacos mais adequados e aparelhos de imagem com tec-nologia mais avançada para o estudo de diversas patologias osteoarticulares. O agente radiofarmacêuti-co actualmente mais utilizado é o tecnécio (Tc 99m), ligado a polifosfato ou difosfonato e, como com-plemento em patologia inflamatória ou infecciosa, utiliza-se o citrato de Ga 67, marcador de leucócitos.

A cintigrafia osteoarticular caracteriza-se por ser uma técnica muito sensível, embora pouco específi-ca. Está indicada no estudo de variada patologia osteoarticular: diagnóstico e localização de metástasesósseas, diagnóstico de osteomielite e sua diferenciação de celulite, avaliação de dor em doentes comprótese articular, estudo de artrites, caracterização de lesões ósseas benignas, estadiamento de fracturas,diagnósticos de osteonecrose, miosite ossificante, doença óssea de Paget e algoneurodistrofia. O padrãode algumas patologias pode ser distinto e característico, necessitando-se por vezes de técnicas cintigrá-ficas complementares para maior especificidade de diagnóstico.

Palavras-chave: Cintigrafia osteoarticular; Indicações

A B S T R A C T

Bone scintigraphy is an imaging technique which was developed with the objective of expanding thesensitivity obtained with standard radiographs in the evaluation of bone and joint diseases. Followingthe demonstration, in 1961 that bone affinity for strontium was enhanced by local pathology, new andmore specific radioactive markers were introduced together with improved techniques. Tecnetium (Tc99m), linked to poliphosphate or bisphosphonate, is the most commonly used agent and, as a comple-ment, in inflammatory or infectious diseases galium citrate (Ga 67) is employed as a marker for leuco-cytes.

Bone scintigraphy is a very sensitive technique but with low specificity. It may be useful in the inves-tigation of a variety of osteoarticular conditions, such as in the diagnosis and localization of bone metas-tasis, diagnosis of osteomyelitis, pain in joint prosthesis, study of arthritis, characterization of benignbone lesions, evaluation of fracture healing and the diagnosis of osteonecrosis, Paget’s disease and sym-pathetic dystrophy. The imaging pattern may be quite distinctive in some of these conditions and thediagnosis may be improved by additional scintigraphic techniques.

Key-words: Bone scintigraphy; Indications.

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C I N T I G R A M A O S T E O A R T I C U L A R : I N D I C A Ç Õ E S

P R I N C I P A I S E B A S E D E I N T E R P R E T A Ç Ã O

Margarida Cruz*

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REUMATOLOGIA EM MEDIC INA FAMIL IAR

A técnica

O reconhecimento de que a radiografia simples éuma técnica relativamente pouco sensível paraavaliar alterações ósseas levou ao desenvolvimen-to de um método de imagem com maior sensibi-lidade1.

Em 1961 demonstrou-se a apetência do estrôn-cio 85 para se localizar em osso normal, bem co-mo o aumento da captação deste radionuclídeoem locais com alterações ósseas1 e verificou-seque a sua cinética é semelhante à do cálcio2. Apartir de então, tem sido fundamentada a altasensibilidade da cintigrafia óssea com radionu-clídeos, particularmente após a evolução daspreparações radiofarmacêuticas e dos aparelhosde imagem1.

A cintigrafia pode revelar patologia óssea antesde haver sinais na radiografia. É um método deimagem muito sensível, mas pouco específico;qualquer processo que altere o normal balançoentre formação/reabsorção ósseas pode produziralterações na cintigrafia, que se manifestam comoregiões de actividade aumentada ou diminuída. Amaioria das lesões surge como áreas focais deactividade aumentada, já que a resposta habitualà lesão óssea é a osteogénese e/ou o aumento davascularização.

Caracteristicamente, uma cintigrafia normalmostra graus de captação diversos em locais dife-rentes, devido a turnovers ósseos distintos. Porexemplo, em crianças as epífises e metáfises sur-gem como focos de captação intensa do traçador.Também em adultos jovens as metáfises dos ossoslongos podem mostrar maior actividade que asdiáfises. A quantidade de agente radiofarmacêuti-co acumulado numa dada região depende de doisfactores: a velocidade do turnover ósseo e, mais

importante, a integridade do aporte sanguíneo1.A técnica de cintigrafia osteoarticular consiste

em injectar um radiofármaco por via endovenosae, algum tempo depois, dependendo da cinéticado marcador utilizado, fazer um registo de ima-gem radioactiva, de corpo inteiro ou de uma zonaseleccionada. Esta aquisição é realizada por umag câmara, observando-se a captação de radiofár-maco pelas estruturas osteoarticulares. No casodo Tc 99m as imagens são feitas geralmente 3hapós a injecção.

Agentes radiofarmacêuticos

Desde que esta técnica surgiu, várias preparaçõesradiofarmacêuticas têm sido utilizadas. O pri-meiro radionuclídeo a mostrar utilidade na iden-tificação de alterações ósseas foi o Str 85; é ummau agente para uso clínico, pela sua vida médiade 65 dias e emissão de energia g. O Str 87 é umagente mais eficaz, por ter menor emissão deraios g e vida média de 2,8h; no entanto, é extre-mamente caro. O Fluor18 tem uma vida físicamédia de 1,9h, não sendo portanto tão disponível.

O polifosfato de Tecnécio 99m foi introduzidocomo radionuclídeo em 1971; trabalhos posterio-res levaram à descoberta de outros compostos li-gados ao Tc, como o difosfonato de hidroxietileno,pirofosfato e difosfonato de metileno, que melho-raram muito a capacidade de resolução daimagem. Tem uma vida física média de 6 h eactualmente é o radionuclídeo mais utilizado empatologia osteoarticular1.

Outras técnicas de cintigrafia

1. Associada a estudo dinâmicoUma forma de melhorar a especificidade da cinti-grafia é associá-la a um estudo dinâmico, utilizan-do hidroximetileno-difosfonato (HMDP) de Tc

* Interna do Internato Complementar de ReumatologiaHospital de Egas Moniz; Lisboa.

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99m. O exame é feito em duas etapas: após ainjecção do agente são feitas 60 poses sequen-ciais de 3 segundos em g câmara que visualizaduas articulações simétricas (é feita a análise davascularização e do pool sanguíneo: fases 1 e 2).Registam-se simultaneamente 20 imagens analó-gicas de 10 segundos. Duas a três horas após a in-jecção fazem-se aquisições estáticas da captaçãoóssea (fase 3). Deste modo, estuda-se, em 3 fases,a vascularização, o pool sanguíneo e a captaçãoóssea, em duas articulações simétricas. Esta téc-nica está limitada para algumas zonas articulares,como por exemplo os ombros, por o diâmetro dodoente ser geralmente superior ao da câmara epara as coxofemorais, pelo ruído de fundo vascu-lar das artérias femorais, que impede visualizar ascabeças femorais.

O diagnóstico diferencial entre osteonecrose ealgoneurodistrofia a nível do joelhos com a cinti-grafia dinâmica baseia-se no facto de umahiperémia não focalizada, associada a captaçãotardia, em várias ou todas as regiões periarticu-lares ser a favor da algoneurodistrofia e uma hi-pervascularização bem focalizada com captaçãotardia predominando na região do côndilo femo-ral ser a favor de osteonecrose pré-radiológica3.

2. Tomocintigrafia ósseaNesta técnica, 3h após a injecção de radiofárma-co, durante as quais se promove hiperdiurese,aumentando a eliminação do agente não captadopelo osso, é feita cintigrafia plana em g câmara;em seguida fazem-se 64 ou 128 projecções de 20 a40 segundos cada, durante a rotação da cabeça dag câmara em torno da região sob investigação.São então reconstruídos cortes frontais, sagitais eoblíquos.

A exploração das cartilagens de crescimentodos ossos longos da criança é um excelente exem-plo da utilidade desta técnica. Sabe-se que a des-truição completa de uma região de crescimentoósseo num membro origina a sua dismetria emrelação ao membro contralateral, assim como aexistência de gradientes de crescimento na metá-fise alterada conduz a uma deformação axial domembro, com ossificação da região destruída(que adquire o nome de ponte de epifisiodese).Estas alterações podem ser corrigidas cirurgica-mente. A localização, por esta técnica, de epifisio-deses em placas de crescimento nos ossos longosem crianças oferece a possibilidade de mapearzonas estéreis e férteis de osso nessa região, o que

vai permitir a reconstrução da zona e o restabe-lecimento do crescimento normal numa placaparcialmente ossificada. A tomocintigrafia ósseatambém é útil para confirmar um diagnóstico deespondilólise sugerido por cintigrafia plana4.

Aplicações clínicas

A cintigrafia osteoarticular é um exame útil noestudo de várias patologias1: despiste de metás-tases ósseas, localização de metástases para seefectuar biópsia diagnóstica, diagnóstico precocede osteomielite (quando ainda não há alteraçõesradiográficas), diagnóstico diferencial entre celu-lite e osteomielite, avaliação de dor em doentesportadores de próteses articulares (despiste deinfecção vs laxidão), detecção e avaliação daextensão de atingimento articular em várias for-mas de artrite, caracterização de lesões ósseasbenignas, auxílio no manejo de fracturas de com-pressão (particularmente quando é importantesaber se são recentes), avaliação de dor óssea deetiologia variada quando a radiografia é normal,diagnóstico de necrose óssea avascular, auxíliono diagnóstico de miosite ossificante, diagnósti-co e avaliação da extensão de doença óssea dePaget, auxílio no diagnóstico de algoneurodis-trofia.

1. NeoplasiasA cintigrafia é um método sensível para detectaralterações ósseas precoces, como metástasesesqueléticas e outros tumores malignos, muitasvezes quando a radiografia é ainda normal.Caracteristicamente, os tumores anaplásticos e omieloma múltiplo não estimulam suficiente-mente a osteogénese para se poder detectar qual-quer foco de captação na cintigrafia.

Em alguns casos de metástases encontra-selesão única no exame. Cerca de metade das lesõessolitárias são malignas, mas 90% das lesõessolitárias em costelas são benignas (geralmentecorrespondem a traumatismo, fractura ou radio-terapia post-operatória e diminuem de intensi-dade em 3 a 6 meses).

Uma limitação da cintigrafia nestas situaçõesclínicas é que as alterações observadas dão umaindicação imprecisa da agressividade da lesão, em-bora geralmente as lesões malignas sejam hipe-rémicas, logo mais «quentes» do que as benignas.

Relativamente à imagem de tumores ósseos

CINTIGRAMA OSTEOARTICULAR: INDICAÇÕES PRINCIPAIS E BASE DE INTERPRETAÇÃO

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benignos e lesões «tumor-like», o osteoma osteói-de, sendo dificilmente detectado na radiografiasimples, aparece como uma lesão solitária bas-tante captadora («quente»). O seu padrão cinti-gráfico consiste em lesão de dupla densidade,com um ninho central mais quente e osso escle-rótico circundante mais frio. Outros tumores oupseudo-tumores que geralmente captam radio-nuclídeo são o granuloma eosinófilo, o defeitocortical fibroso, o encondroma, o quisto ósseoaneurismático e o osteocondroma1.

Nas neoplasias, há factores que podem con-fundir a interpretação da cintigrafia. São os casosdas síndromes paraneoplásicas (por exemploosteoartropatia hipertrófica, poliartrite do carci-noma), ou das alterações após terapêutica daneoplasia (como o efeito «flare», em que existeaumento de captação nas lesões por aumento deactividade osteoblástica, como resposta à tera-pêutica). A artrite do carcinoma é em geral aguda,assimétrica e atinge os membros inferiores,enquanto a artrite metastática geralmente émonoarticular, atingindo preferencialmente ojoelho. O padrão cintigráfico habitual da primeiraé o de uma captação articular aumentada deforma assimétrica, a qual desaparece com a tera-pêutica do tumor. A imagem cintigráfica corres-pondente à osteoartropatia hipertrófica é decaptação óssea pericortical irregular e difusa.

A cintigrafia osteoarticular pode revelar altera-ções ósseas de causa iatrogénica, no contexto deneoplasia. Pouco tempo depois de um tratamen-to com radioterapia pode haver um ligeiro au-mento de captação do radiofármaco secundário ahiperémia inflamatória. Mais tarde, a captaçãovai depender do estado da microcirculação local:a reduzida captação pelo osso num campo irra-diado reflecte diminuição da captação pelamedula óssea, por redução do fluxo sanguíneo e,consequentemente, redução da actividade fago-cítica. Também o tratamento com quimioterapiapode provocar osteonecrose, por oclusão micro-vascular. No entanto, as osteonecroses mais fre-quentes são as provocadas pelo uso prolongadode corticóides, usados no tratamento de algumasdoenças oncológicas. Outro fenómeno iatrogéni-co observado em cintigrafia é o aumento decaptação óssea como expressão de reacçãoosteoblástica à terapêutica hormonal ou quimio-terapia. Este fenómeno de «flare» pode surgir emlesões conhecidas ou revelar novas lesões. Trêsmeses após a terapêutica da neoplasia, quando se

observa a cura de lesões líticas em radiografias,este fenómeno de «flare» cintigráfico não se dife-rencia da doença neoplásica progressiva. Porém,6 meses depois do tratamento, se ele for eficaz acaptação diminui, não havendo surgimento denovas lesões5.

2. InfecçõesA cintigrafia tem um papel relevante na investi-gação e seguimento da patologia osteoarticularinfecciosa ao permitir a detecção precoce, a dife-renciação entre ostomielite e celulite e a identifi-cação da actividade de uma osteomielite crónica.No entanto, a cintigrafia com Tc 99m apresentaalguns falsos negativos. Este problema pode sercontornado recorrendo à cintigrafia com citratode Ga 67, que se liga aos leucócitos. Para além deser utilizada em neoplasias e várias doenças infla-matórias, a cintigrafia com Ga 67 é útil em caso desuspeita de infecção osteoarticular, obtendo-semelhores resultados quando em conjunto com acintigrafia com Tc99m (cintigrafia sequencial).Injecta-se o citrato de Ga 67 e, 48h depois, obtém--se a imagem corporal total com g câmara e tam-bém imagens das zonas a estudar; injecta-seentão o Tc99m e, 3h depois, procede-se a novaimagem corporal total6. Com a técnica sequencialpodemos afirmar, quase com certeza, infecção,quando observamos captação aumentada com osdois traçadores. As infecções mais correntes pro-duzem grande hiperfixação de Ga 67 em 78% doscasos, enquanto as tuberculosas apresentam ape-nas fixação moderada em 50% dos casos com Ga 67. A cintigrafia com Ga 67 permite, ainda,seguir a evolução da infecção dado que, após 3 meses de tratamento, com boa evolução, asimagens desaparecem, ao passo que com o Tc99m tal não sucede. A cintigrafia com esteraduionuclídeo está indicada na suspeita deinfecção em artropatia pré-existente, infecção emprótese articular, espondilodiscite após cirurgiadiscal, evolução de osteomielite crónica e artriteou espondilodiscite infecciosa cuja causa sejaduvidosa6.

Ocasionalmente, num estádio muito precoceda osteomielite, a lesão corresponde, na imagemcintigráfica com Tc 99, a um foco «frio», de menorcaptação de radionuclídeo. Esta imagem podedever-se à interrupção do fluxo sanguíneo secun-dária à trombose induzida por infiltração celularinflamatória. Progressivamente, este foco dá lu-gar a uma zona de captação aumentada.

MARGARIDA CRUZ

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A distinção clínica entre osteomielite e celulitepode ser difícil, mas a cintigrafia em três ou qua-tro fases pode ser usada no sentido de as diferen-ciar. Geralmente, em ambas as situações observa--se um padrão de vascularização aumentada, nasfases 1 e 2 (imagens após a injecção do radiofár-maco e duas horas depois), com aumento decaptação na zona da lesão. Na fase 3, em que seregista a imagem 5 horas após a injecção, obser-va-se aumento de captação na zona em estudocomparativamente ao osso adjacente, na osteo-mielite, o qual se acentua ainda mais na fase 4, 24horas após a injecção. Na celulite, pelo contrário,o aumento de captação inicial local de radiofár-maco vai-se esbatendo ao longo do tempo, vistoela corresponder à hipervascularização nos teci-dos moles inflamados1.

A localização de algumas infecções mais espe-cíficas pode beneficiar das imagens cintigráficas.As sacroileítes infecciosas podem acompanharoutras artrites ou espondilodiscites; têm umaclínica geralmente atípica e o seu diagnóstico édifícil, por serem infecções em articulações pro-fundas e de morfologia complexa. Os agentesmais frequentemente encontrados são piogéni-cos, sendo mais raras as etiologias brucélica outuberculosa e a cintigrafia com Tc 99m pode reve-lar-se muito sensível, mostrando hipercaptaçãolocal, como é referido em alguns estudos7,8.

Um estudo com o objectivo de avaliar o valordiagnóstico da cintigrafia com Ga 67 na tubercu-lose esquelética vertebral e periférica, em com-paração com a cintigrafia com o Tc 99m revelouuma sensibilidade de 92% para a cintigrafia como Tc 99m e 88,5% para a cintigrafia com o Ga 67(as duas técnicas em conjunto tiveram sensibili-dade de 96,1% para detectar a infecção). As cinti-grafias com Tc 99 e com Ga 67 podem apresentarimagens falso-negativas na osteomielite tubercu-losa, mais frequentemente na coluna vertebral. Acausa destes falsos negativos é desconhecida,mas é possível que as imagens sejam negativas naosteomielite ligeira, indolente ou muito destruti-va. Relativamente ao diagnóstico da tuberculoseóssea, uma vantagem da cintigrafia, para além dasua sensibilidade, é a possibilidade de, com estatécnica, se obter uma imagem de corpo inteiro9.

O atingimento ósseo aparece em cerca de 1%dos doentes com tuberculose, sendo provavel-mente a forma mais comum de tuberculose ex-tra-pulmonar. Nos adultos, geralmente atinge asarticulações mais sujeitas a traumatismos (colu-

na, coxofemorais, joelhos, costelas). Por vezes,uma tuberculose disseminada pode revelar umpadrão cintigráfico sugestivo de neoplasia metas-tática, com lesões hipercaptantes poliostóticasdispersas10.

Raramente, podem aparecer lesões frias ou fo-topénicas na osteomielite piogénica grave, pro-vavelmente porque a inflamação interfere com ofluxo sanguíneo nutritivo da medula óssea; tam-bém após a terapêutica da tuberculose óssea estefenómeno pode suceder, possivelmente porpreenchimento fibroso da substância osteóide;geralmente as imagens normalizam 3 a 6 mesesapós a terapêutica. Outros casos referidos defotopénia são o enfarte ósseo agudo, o mielomamúltiplo, as metástases, o hemangioma e o statuspost-radioterapia11.

Num estudo realizado em 140 doentes comdiagnóstico clínico de brucelose, a cintigrafiaosteoarticular provou ser mais sensível do que aradiografia, tanto a nível do esqueleto axial comoperiférico, em doentes com suspeita de bruceloseosteoarticular, permitindo localizar a lesão. Ima-gens de corpo inteiro efectuadas 3h após injecçãode Tc 99m mostraram, em três ossos longos, alte-rações limitadas à cavidade intramedular (corres-pondendo à localização da Brucella) e, a nívelraquidiano, envolvimento preferencial da colunalombar (contrariamente à tuberculose), maisconcretamente da parte anterior da vértebra,poupando o disco intervertebral12.

Outro estudo com o objectivo de avaliar o valorda cintigrafia com Tc 99m MDP no diagnósticodiferencial da sacroileíte brucélica, realizado em24 doentes com brucelose e lombosacralgia,demonstrou que 54% dos doentes tinha sacroileí-te clínica e 50% tinha sacroileíte cintigráfica. Acintigrafia revelou alterações 3 a 4 dias após odiagnóstico, enquanto a radiografia mostroulesões apenas 2 semanas depois do diagnóstico. Amaior sensibilidade foi obtida com o estudo em 3fases13.

3. FracturasA cintigrafia óssea demonstra grande sensibili-dade na detecção de fracturas de stress e de insu-ficiência, bem como de outras lesões do periós-teo. Nestas fracturas revela aumento da captaçãoque, em osso longo, atravessa horizontalmente adiáfise, diferindo do padrão do tipo «shin splint»,em que há deposição do agente no periósteo. Àmedida que uma fractura vai formando calo

CINTIGRAMA OSTEOARTICULAR: INDICAÇÕES PRINCIPAIS E BASE DE INTERPRETAÇÃO

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ósseo, a captação do radiofármaco vai diminuin-do1.

4. Doenças ósseas metabólicasA cintigrafia é um método sensível na detecção dealterações ósseas focais nas doenças ósseasmetabólicas.

Em alguns doentes com osteomalácea, aimagem cintigráfica é suficientemente diferenteda de indivíduos saudáveis, mostrando umarelação de captação aumentada entre os tecidosmoles e os ossos. No entanto, a alteração cintigrá-fica mais consistente na osteomalácea é o au-mento da captação nos ossos longos, punhos, ca-lote craniana e mandíbula, podendo ocorrer umpadrão semelhante no hiperparatiroidismo. Umacomplicação da osteomalácea, a pseudofractura,pode identificar-se como área focal de hiper-captação. No hiperparatiroidismo, observam-seregiões focais de captação nas áreas onde selocalizam os tumores castanhos.

A imagem cintigráfica em doentes com osteo-porose é muito variável, podendo ser normal ourevelar hiper ou hipofixação óssea. Geralmente énormal a retenção no corpo inteiro dos fosfatosmarcados.

Na algoneurodistrofia e na osteoporose regio-nal migratória, são visíveis alterações ósseasfocais mesmo antes de haver alterações evidentesna radiografia simples1.

5. Doença óssea de PagetO aumento da osteogénese e do fluxo sanguíneoao osso originam aumento da captação doradiofármaco nas áreas afectadas. Tal como naradiografia, a deformação óssea é bem visível nacintigrafia. Na fase lítica precoce (que ocorreprincipalmente no crâneo) há aumento da capta-ção nas margens da lesão e diminuição da capta-ção na porção central e na fase esclerótica tardia,as lesões sem actividade aparecem sem alteraçãoda captação. Assim, a cintigrafia é útil para deter-minar a verdadeira actividade da doença e a suaresposta à terapêutica1.

6. Doenças vascularesA cintigrafia é um método útil na suspeita de os-teonecrose, porque é mais sensível do que aradiografia. Precocemente há diminuição doaporte vascular, observando-se diminuição dacaptação do radiofármaco na área da lesão e pos-teriormente a revascularização e reossificação

levam a um aumento da captação (entre estasduas fases, a cintigrafia pode ser normal). Com oobjectivo de prever a viabilidade do osso comnecrose, pode realizar-se uma cintigrafia damedula óssea. Geralmente, a ausência de capta-ção do radiofármaco pela medula óssea dacabeça e do colo femorais indica disfunçãovascular, enquanto que a sua presença indicasuprimento vascular intacto.

A diferenciação entre osteonecrose e osteo-mielite em doentes com drepanocitose e dor édifícil, mesmo quando se realiza cintigrafia óssea,da medula óssea com Ga 671.

A cintigrafia óssea apresenta também umasensibilidade superior à da radiografia no estudoda doença de Legg-Calvé-Perthes, mostrando ini-cialmente diminuição da captação ântero-lateralda epífise do fémur e, após revascularização,aumento da captação na cabeça e no colo dofémur1.

7. Patologias articulares Após a introdução da cintigrafia com fosfato deTc 99m para obter imagens do osso, esta técnicacomeçou a ser também aplicada para estudo dasarticulações. Em patologia articular inflamatóriaaumenta a osteogénese no osso periarticular e avascularização da sinovial, o que leva a umaumento da captação do radiofármaco no ossoadjacente à artrite1.

O Tc 99m, como pertecnetato ou albuminaaspertecnada, são captados pela sinovial. Podeutilizar-se no exame de doentes com artritereumatóide, gota úrica, artropatia hemofílica,artrite tuberculosa, osteoartrose com sinovite eartrite post-traumática, havendo uma boa corre-lação clínico-cintigráfica em todas estas artropa-tias14. A cintigrafia articular, apesar de ser o méto-do de imagem mais sensível para doença activa1,não indica a etiologia da lesão, sendo a expressãodo aumento de fluxo sanguíneo e de permeabili-dade capilar da membrana sinovial comum às ar-trites; no entanto, informa-nos acerca do padrão,grau e extensão do atingimento articular15.

8. Patologias de tecidos molesVárias lesões de tecidos moles podem captar ra-diofármaco. Para identificar a causa da captação,é importante correlacionar a imagem da cinti-grafia com a radiografia da região afectada (porexemplo, pode ser evidente uma calcificação dostecidos moles). A cintigrafia da medula óssea

MARGARIDA CRUZ

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usando Tc 99m ligado a um colóide, que é capta-do pelas células do sistema monócito-macrofági-co da medula, revela captação em osso ectópicoapenas quando este tem medula, o que indica asua maturidade1.

Endereço para correspondência

Margarida CruzHospital de Egas MonizUnidade de ReumatologiaR. Junqueira, 126. 1300 LisboaTel.: 213 650 335Fax: 213 627 296Email: [email protected]

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CINTIGRAMA OSTEOARTICULAR: INDICAÇÕES PRINCIPAIS E BASE DE INTERPRETAÇÃO

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Reumatológica

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OMBRO DOLOROSO

Maria João Salvador

José António P. Silva

ReumatologiaHospitais da Universidade de Coimbra

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R E S U M O

A dor do ombro é causa frequente de consulta em Medicina Geral e Reumatologia ambulatória. A com-plexidade da anatomia local e das funções executadas pelo ombro tornam o diagnóstico preciso muitoexigente sob o ponto de vista semiológico. O rigor de avaliação é, contudo, premiado por uma eficáciaterapêutica extremamente compensadora, tanto para o doente como para o Médico. O objectivo destetrabalho é fazer uma revisão pragmática sobre o tema, incluindo métodos de diagnóstico e tratamento,visando contribuir para a melhor orientação destas condições tão vulgares entre nós.

Palavras-chave: Omalgia; ombro doloroso; observação do ombro.

A B S T R A C T

Shoulder pain is a common reason for Medical consultation, both in General Practice and ambulatoryrheumatology. The complexity of local anatomy and functions makes the precise diagnosis quite requi-ring from the clinical evaluation point of view. Precise evaluation is, however, compensated by a veryrewarding treatment efficacy, for both patient and physician. In this paper, we present a pragmaticreview of this topic, including means of diagnosis and treatment, as a contribution for an improvedapproach to these common conditions.

Key-words: Shoulder pain and evaluation

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O M B R O D O L O R O S O

Maria João Salvador*

José António P. Silva*

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REUMATOLOGIA EM MEDIC INA FAMIL IAR

A omalgia (dor do ombro) é um causa comum deconsulta médica de ambulatório, especialmenteem Clínica Geral, que observa em primeira mãocerca de 95% destes doentes1. Atinge, cumulativa-mente, cerca de 10% de toda a população emalguma fase da vida1. Num inquérito realizado a312 pessoas consecutivamente observadas numaconsulta de clínica geral, cerca de 50% referencia-ram ter ombro doloroso, embora esta percen-tagem variasse consoante a pergunta era referen-ciada especificamente ao ombro, na zona envol-vente, zona adjacente do tronco, etc.2.

Numa análise retrospectiva da consulta deReumatologia do Hospital Militar em Lisboa e declínica privada3, de 5680 doentes observados, 468tinham ombro doloroso (8%), predominando osexo feminino (65%), sendo que as actividadesprofissionais mais referenciadas foram as domés-ticas (41%). A duração das queixas à data da con-sulta variou entre 2 meses (46%) e superior a 12meses (24%), tendo surgido de forma subagudaou crónica em 85% dos casos. A dor era unilateralem 84% dos casos.

Esta dor pode muitas vezes ser intensa e levar aperturbações do sono e considerável limitaçãofuncional. Procedemos neste texto a uma breverevisão das patologias implicadas, métodos dediagnóstico e tratamento.

Anatomia funcional do ombro

A exploração semiológica adequada do ombro éimpossível sem um conhecimento razoável dasua anatomia funcional. O ombro é constituídopor um grupo de articulações e estruturas deapoio (a cintura escapular) que, em conjunto, otornam a estrutura articular mais móvel do corpo

(enartrose). É composto pelas articulações gleno--umeral, acrómio-clavicular, esterno-clavicular eescapulo-torácica. O deslizamento das estruturasósseas, musculares e tendinosas é facilitado pelasbolsas serosas sub-acrómio-deltóideia e escápu-lo-omo-torácica. Estas bursas não comunicamcom a articulação excepto se houver ruptura ten-dinosa.

As articulações são estabilizadas pelos múscu-los, tendões, ligamentos, debrum glenoideu e cá-psula articular (Fig. 1). A extraordinária mobilida-de do ombro resulta em prejuízo da estabilidadearticular. Daqui resulta uma tensão adicionalsobre as estruturas periarticulares (ligamentos,tendões e cápsula), que assim ficam sujeitas a

* Interna de Reumatologia**Assistente de Reumatologia e Professor da Universidade deCoimbra

Figura 1. Anatomia do ombro.* Adaptado de Manual Fotográfico de testes ortopédicos e

neurológicos de Joseph Cipriano.

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maior stress e risco de lesão. Os músculos da cintura escapular podem

dividir-se em grupos anatómicos: 1. Grupo muscular anterior: subclávio, pequenopeitoral e grande peitoral 2. Grupo muscular interno: grande dentado 3. Grupo muscular posterior: infra-escapular, su-pra-espinhoso, infra-espinhoso, pequeno redon-do, grande redondo, grande dorsal 4. Grupo muscular externo: deltóide

Este conjunto muscular confere ao ombro umaextraordinária amplitude e variedade de movi-mentos:a) Flexão (180o) – como músculos principais destemovimento temos a porção anterior do deltóide eo coraco-braquial, e como músculos acessórios ogrande peitoral e o bicípite;b) Extensão (40 a 70o) – realizada pelo grande dor-sal, grande redondo e porção posterior do deltói-de e, acessoriamente, pelo pequeno redondo elonga porção do tricípite;c) Abdução (180o) – realizada principalmente pelaporção média do deltóide e supra-espinhoso, e deforma acessória pelas porções anterior e poste-rior do deltóide e grande dentado;d) Adução (30 a 50o) – o músculo principal é ogrande peitoral e o acessório o grande redondo;e) Rotação externa (70 a 80o) – essencialmente daresponsabilidade do infra-espinhoso e pequenoredondo e de forma secundária pela porção pos-terior do deltóide;f) Rotação interna (70 a 90o) – os músculos princi-pais são o infra-escapular, grande peitoral, gran-de dorsal, grande redondo e o acessório a porçãoanterior do deltóide.

Pela importância que têm a nível da patologiado ombro salienta-se o conjunto conhecido co-mo a coifa dos rotadores, que é constituído pelostendões dos músculos supra-espinhoso, infra--espinhoso, pequeno redondo e infra-escapular,que se reúnem e inserem no úmero no troquiter eno troquino (infra-escapular).

Também importante sede de síndrome deombro doloroso é o tendão da longa porção domúsculo bicípede braquial que se insere no tu-bérculo supra-glenoideu da omoplata, atravessao interior da articulação de onde sai, pelo espaçointertuberositário troquiter-troquino, envolvidopor um prolongamento da membrana articular.Percorre a goteira bicipital do úmero e insere-sena face anterior do úmero (Fig. 1).

A inervação desta zona é feita por dois ramosdo plexo braquial: o nervo supra-escapular e ocircunflexo.

Causas de ombro doloroso

A esmagadora maioria das causas de ombro do-loroso observadas em clínica corrente caem sobdois tipos principais4,5:

1. Periarticulares• Tendinite da coifa dos rotadores (inflamatória,

degenerativa, calcificada)• Bursite sub-acrómio-deltoideia• Tendinite da longa porção do bicípede bra-

quial• Periartrite não especificada

2. Articulares• Artrite (Inflamatório, séptica, microcristalina)• Artrose• Capsulite adesiva

3. Dor referida:• Dor de origem radicular• Neoplasia do pulmão, pleurisia, pneumonia• Pericardite, angina e enfarte do miocárdio• Embolia pulmonar• Doenças hepatobiliares e subfrénicas• Doenças esplénicas

Naturalmente, o ombro pode ser ocasional-mente envolvido numa variedade de outras cir-cunstâncias mais raras, tais como metástases etumores primitivos, doença óssea de Paget, sirin-gomielia, algoneurodistrofia, osteonecrose, etc. Asua abordagem ultrapassa o espírito pragmáticoque decidimos dar a este texto.

No ombro, mais do que em qualquer outra lo-calização, a patologia periarticular predominalargamente em frequência sobre as outras causas.Uma dor isolada do ombro é, até prova contrária,de origem periarticular!

No estudo atrás referido3 sobre 468 doentescom ombro doloroso, a origem da dor era periar-ticular em 72% dos casos, seguida de patologiadegenerativa (26%). Da primeira situação a maiscomum foi a tendinite da coifa dos rotadores(50,6%) seguida da bursite subacromial (10,4%) ecapsulite adesiva (10,1%).

A tendinite da coifa dos rotadores deve-se

OMBRO DOLOROSO

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geralmente a conflito sub-acromial, isto é, com-pressão dos tendões entre a cabeça do úmero etecto osteo-ligamentar acrómio-coracoideu. Abursite sub-acromio-deltóideia deve-se a trau-matismo local, depósito de microcristais ou calci-ficação local, conectivites ou infecção local. É re-conhecida a existência de um risco ocupacional,sendo o ombro das articulações mais atingidas.Para isso contribuem vários factores de risco,entre eles as posturas viciosas, cifose dorsal (adiminuição da mobilidade da coluna cervical edorsal é um reconhecido factor de risco), trabalhomanual repetitivo, trabalho com as mãos acimados ombros, sobrecarga do trabalho, trabalho sobstress, existência prévia de patologia do ombro,traumatismo local prévio, etc..

A tendinite do bicipital surge geralmente asso-ciada à tendinite da coifa, mas pode surgir porstress repetitivo da zona (ex. transportar crianças).

A artrose do ombro é rara por não ser articu-lação de carga, mas pode, contudo, ocorrer asso-ciada a actividades físicas violentas, trauma-tismos, luxações recidivantes e, sobretudo, comomanifestação de doenças metabólicas causais.

A capsulite adesiva surge, na maior parte dasvezes, em consequência de traumatismo com es-tiramento. No entanto, pode ser secundária apatologia periarticular ou articular, tumores pul-monares, tuberculose pulmonar, isquémia coro-nária ou associar-se a diabetes.

Avaliação do ombro doloroso

O estabelecimento de um diagnóstico correctodepende fundamentalmente de um interroga-tório e exame cuidados6,7,8. Os exames comple-mentares dão auxílio muito limitado nestas cir-cunstâncias.

Os elementos clínicos que permitem a distin-ção entre os três grandes grupos de causas acimadelineados são sumarizados nos quadros I a III.

As diferenças acima indicadas são facilmentecompreensíveis. Se admitirmos que um processoinflamatório ou degenerativo atinge a articulaçãogleno-umeral, é de esperar que a dor se faça sen-tir qualquer que seja o movimento executadopelo doente, já que em todos participa a articu-lação. Pelo contrário, se o processo inflamatórioenvolve apenas um tendão (p.ex. a coifa dos rota-dores) só serão dolorosos os movimentos queenvolvem essa estrutura sendo (relativamente)

livres de dor os restantes. Assim, na tendinite dacoifa dos rotadores, o doente refere dor especial-mente quando afasta os braços do tronco ou osroda externamente, como, por exemplo, quandoveste o casaco. A dor é ligeira ou nula na elevaçãoanterior dos braços. O contrário sucede natenosinovite da longa porção do bicípete, já que aflexão do antebraço e elevação anterior dosbraços exige tensão deste músculo, mas não dacoifa. Este conhecimento constitui a base para aexecução de manobras específicas de exameobjectivo que explicitamos abaixo.

Da mesma forma se explica que a mobilidadeactiva (feita pelo doente) seja muito mais dolo-rosa do que a passiva, em que o médico move omembro relaxado. A tensão colocada pelo movi-

MARIA JOÃO SALVADOR E COL.

Quadro I. Características de dor periarticular

Dor de predomínio nocturno

Dor com certos movimentos (mas não com todos)

Dor aumentada ao decúbito homolateral

Envolvimento (geralmente) isolado do ombro

Mobilidade passiva mantida

Mobilidade activa muito mais dolorosa que a passiva

Mobilidade activa dolorosa em certas direcções

Quadro II. Características de dor articular

Dor com vários (ou todos) movimentos do ombro

Envolvimento (habitual) de outras articulações

Mobilidade passiva diminuída várias direcções

(mas não todas)

Mobilidade passiva tão dolorosa como a activa

Mobilidade dolorosa em várias direcções

Quadro III. Características de dor referida

Dor de ritmo variável (consoante patologia causal)

Ausência de relação com o movimento

Queixas extra-articulares sugestivas

Exame loco-regional normal

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mento activo não existe se o doente estiver real-mente relaxado durante a mobilização passiva.Desta forma, as estruturas tendinosas inflamadasdoem menos. Já a articulação participa igual-mente em ambos os tipos de movimento sendoigualmente dolorosos os movimentos activos epassivos no portador de patologia articular.

Pela mesma razão se observa que o doentecom patologia periarticular tem limitação dolo-rosa da mobilidade em certas direcções (as queenvolvem a estrutura afectada), mas não nas res-tantes. Se o sofrimento é articular todos os movi-mentos tendem a estar atingidos, ainda quedesigualmente. Inclui-se nesta regra, a capsuliteadesiva, já que a cápsula integra a articulação(apesar de constituída por tecidos moles) e a suainflamação se comporta clinicamente como pa-tologia articular. Nesta situação, a cápsula estáinflamada, espessada e retraída sobre a articu-lação. Daqui resulta uma redução da mobilidadeem todas as direcções, quer em movimento acti-vo, quer passivo. A redução significativa da rota-ção interna é quase patognomónica de capsuliteadesiva, já que é muito rara e tardia nas restantessituações. A normalidade do Rx auxilia o diagnós-tico diferencial por contraposição à artropatia.

A dor periarticular apresenta, muitas vezes,predomínio nocturno, especialmente no decúbi-to homolateral, por resultar em pressão da estru-tura inflamada. Esta característica é mais evi-dente na tendinite da coifa do que na da longaporção do bicípede. A dor articular terá um ritmodependente da natureza da afecção: predomínionocturno e matinal, aliviada com movimentossuaves nos processos inflamatórios e predomíniovespertino, dependente de movimentos, nos pro-cessos degenerativos.

De uma maneira geral o portador de patologiaperiarticular tem dor apenas em uma articulação.Não sendo impossível a sua associação fortuitacom lesões periarticulares ou articulares de outrasede, esta não é a regra. Pelo contrário, o envolvi-mento isolado do ombro em patologia articular,quer inflamatória quer degenerativa, é excepcio-nal. Nestes casos, quase sempre o atingimento doombro faz parte de um contexto pluriarticularque evoca o diagnóstico.

A dor referida tem um carácter «surdo» e difu-so. O doente não nota agravamento com os movi-mentos do ombro. O ritmo não é influenciadopelas actividades diárias, mas sim pelas que afec-tam a patologia causal: respiração, tosse, refei-

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OMBRO DOLOROSO

ções, etc. O exame objectivo local é normal. O in-quérito sistemático e o exame objectivo geralfazem o diagnóstico.

Concluído o interrogatório orientado, o exameobjectivo deverá ser idealmente realizado de umaforma estruturada e sequencial.

Na nossa prática, o doente é examinado de pé,de frente para o Médico, que começa pela inspec-ção para apreciar a existência de tumefacçãovisível (rara) ou atrofias musculares. Pedimos deseguida ao doente para elevar os membros supe-riores em extensão e abdução até ao máximo,batendo as palmas sobre a cabeça.

Na presença de tendinite da coifa dos rota-dores ou bursite subacromial, o doente refere dornum ângulo (habitual) entre os 60 e os 120o. Dorque surja só acima desse ângulo sugere patologiaacromio-clavicular. A dor de origem articular étambém sentida, mas o portador de lesão isoladada longa porção do bicípete faz o movimento semdor.

De seguida pedimos ao doente, exemplifican-do, que eleve os braços estendidos, para a frente.A dor neste movimento sugere tenosinovite dalonga porção do bicípete braquial ou patologiaarticular, sendo livre nos portadores de lesão dacoifa ou da bursa subacromial.

Em qualquer destas circunstancias, o movi-mento, activo, pode estar limitado por dor.

O passo seguinte consiste em pedir ao doenteque relaxe o membro completamente e deixe oMédico realizar os movimentos dolorosos. Se ador é tão intensa como foi no movimento passivoe se persiste a limitação de mobilidade observa-da, o processo é quase seguramente articular. Sea dor é agora muito menos intensa e não existelimitação significativa de mobilidade, o processoé, provavelmente, de tendinite ou bursite.

Procedemos de seguida a manobras de provo-cação orientadas para a patologia sugerida pelospassos anteriores. Trata-se de pedir ao doenteque execute os movimentos dolorosos, contraresistência oposta pelo examinador.

Na suspeita de tendinite da coifa dos rotadoresou bursite subacromial, colocamos os braços dodoente em abdução a 90o, puxamo-los anterior-mente a cerca de 30o e rodamos os polegares parabaixo. Pede-se, então, ao doente para manter essaposição enquanto forçamos os braços para baixoapoiando no antebraço (Figura 2) – manobra deJobe. Na presença de qualquer daquelas lesões odoente sente uma dor, geralmente intensa sobre

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o ombro afectado, sendo frequentemente inca-paz de resistir. Se houver ruptura completa dacoifa o doente não é capaz de fazer abdução dobraço ou de manter esta posição.

A presença de tendinite da coifa ou bursitesubacromial é reforçada pela manobra exemplifi-cada na Figura 3 – teste de Yocum. O doente colo-ca a mão do lado doente sobre o ombro con-tralateral. O cotovelo é levado à altura do ombros.O doente tenta manter a posição enquanto oMédico força o cotovelo para baixo. A manobra épositiva se o doente sentir dor no ombro. O estu-do destas patologias é completado por palpaçãodirecta do tendão e bursa, imediatamente parafora e abaixo do bordo externo do acrómio.

A tenosinovite da longa porção do bicípetebraquial é explicitada pelo «palms up test»: pede-se ao doente que eleve os braços, em extensão docotovelo, à frente do tronco a cerca de 45o, man-

tendo esta posição enquanto o Médico força aspalmas das mãos para baixo (Figura 4). O teste épositivo se o doente referir dor na face anterior doombro.

Noutra manobra, a de Yergason (Figura 5), odoente flecte o cotovelo a 45o. O Médico segura asua mão em posição neutra e resiste enquanto odoente tenta flectir o cotovelo e rodar a mão parasupinação. A dor na face anterior do ombro revelaa presença de tenosinovite da longa porção dobicípete braquial, hipótese reforçada por dor àpalpação directa da goteira bicipital na face ante-rior do terço superior do úmero.

Meios auxiliares de diagnóstico

Os exames complementares dão, em regra, con-tributo limitado ao diagnóstico diferencial.

MARIA JOÃO SALVADOR E COL.

Figura 3. Teste de Yocum

Figura 4. Palm-up teste Figura 5. Manobra de Yergason

Figura 2. Manobra de Jobe

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A radiografia clássica é particularmente produ-tiva na patologia articular, em que apresentacaracterísticas idênticas às observadas com igualpatologia noutras localizações: perda de espaçoarticular, associada a esclerose subcondral eosteófitos em caso de artrose. Nas artrites do om-bro, a diminuição da entrelinha articular é acom-panhada de osteopenia e, por vezes, erosões pe-riarticulares.

A capsulite adesiva é melhor demonstrada porartrografia que revela a retracção da capsula so-bre as estruturas ósseas.

A suspeita de patologia periarticular tornamais indicado o recurso à ecografia, que permiteidentificar a estrutura afectada, detectar a pre-sença de ruptura tendinosa e guiar a recolha delíquido para análise, por exemplo em bursites.Note-se, contudo, que a produtividade desta téc-nica está profundamente dependente da expe-riência de quem a executa, podendo, na sua au-sência, estar associada a elevado número de fal-sos negativos e positivos. A radiografia simplesmostrará, em alguns casos, a presença de calcifi-cação dos tendões ou bursas e, por vezes, irregu-laridade da superfície de inserção da coifa no tro-quíter. A presença destes achados traduz cronici-dade do processo e indicia maior resistência àterapêutica, mas não é indispensável ao diagnós-tico.

Tomografia axial computorizada e ressonânciamagnética podem trazer contributos adicionais,mas somos de opinião que o recurso a estastécnicas só se justifica quando se coloca ahipótese de cirurgia, num âmbito de consultaespecializada.

A realização de artrocentese e exame do líqui-do articular é mandatória nos casos de monoar-trite do ombro. Exames laboratoriais como he-mograma, VS, uricemia, pesquisa de factor reu-matóide são, naturalmente, integradas, de acordocom o contexto de diagnóstico diferencial emcausa.

Orientação terapêutica

O tratamento adequado das situações de ombrodoloroso exige, naturalmente, um diagnósticocorrecto.

Nas situações periarticulares deve promover--se o repouso da estrutura afectada e evicção dosmovimentos e esforços que despertam dor. A dor

pode ser aliviada por analgésicos e anti-infla-matórios. Aconselhamos, geralmente, o doente afazer uma terapêutica regular, em dose adequadapor um período de 2 a 4 semanas, na tentativa deeliminar o processo inflamatório. Este objectivopode ser reforçado pela aplicação regular deAINE tópico, antecedida do aquecimento localpor saco de água quente. A fisioterapia pode darajuda decisiva nos casos renitentes a medidassimples.

O doente deve ser instruído quanto às activi-dades de risco e meios de as evitar. Por exemplo,se o doente com tendinite da coifa ou bursitesub-acromial tem que trabalhar frequentementecom os braços elevados, poderá fazê-lo sobre umestrado, de forma a manter os braços abaixo donível dos ombros. Esta medida ajuda a combatera tendência à recorrência, comum nestas situa-ções.

As infiltrações locais são extremamente úteisneste tipo de patologia, devendo ser aplicadasquando as medidas anteriores falham. Nalgumassituações de diagnóstico mais complexo, a infil-tração de anestésico local pode ser decisiva noesclarecimento da situação. Note-se, contudo,que a infiltração exige experiência e conhecimen-to adequado da técnica, sob risco de ser maisnefasta que produtiva. O Médico que não conhe-ce a técnica deve abster-se de a praticar, orien-tando o doente para o especialista.

Quando as lesões periarticulares se mostramresistentes a estas medidas ou recorrem com fre-quência, e são incapacitantes, deve colocar-se ahipótese de abordagem cirúrgica por ortopedistaexperiente em ombro.

A artrose do ombro, deve ser sempre vistacomo atípica, procedendo-se a uma investigaçãoapropriada de eventuais causas traumáticas oumetabólicas. Fora de circunstâncias muito espe-ciais, de trabalho muito exigente sobre o ombro,quase sempre a artrose desta localização estáassociada a condições favorecedoras de calcifi-cação da cartilagem e outros tecidos moles, queimporta explorar, eventualmente no contexto deconsulta especializada.

Em caso de artrite, a orientação é semelhante àde outras localizações. O contexto clínico podefacilitar o diagnóstico se estiverem envolvidasoutras articulações. Em face de monoartrite ashipótese de artrite séptica e microcristalinamerecem destaque e justificam, por si só, umaconsulta especializada urgente, já que o atraso no

OMBRO DOLOROSO

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tratamento adequado pode levar a sequelas signi-ficativas e irrecuperáveis. Na nossa opinião, todoo caso de artrite deve ser orientado para consultaespecializada logo que possível.

Na capsulite adesiva deve-se despistar umaeventual causa predisponente e adoptar um pro-grama de exercícios adequado e persistente, emcentro experiente. A recuperação integral da mo-bilidade pode levar um a dois anos e exige, porvezes, manipulação da articulação sob anestesiapara libertação de aderências. Na presença de dorintensa, pode ser administrada uma infiltraçãointra-articular.

Em 1990, o Dutch College of General Practitio-ners editou guidelines nacionais para o diagnósti-co e tratamento do ombro doloroso (cit. in 1).Resumimos aqui as principais recomendações, jádepois de revistas em 1999:– Se o diagnóstico não é claro, espere durante 2

semanas pelo evoluir do quadro, podendoadministrar-se paracetamol para alívio da dor(até 3g dia). Aconselhe o doente a manter-seactivo embora evitando movimentos dolo-rosos;

– Se não melhorar então administrar ibuprofeno(até 1600 mg dia), naproxeno (até 750 mg dia)ou diclofenac (até 200mg dia) durante 2 a 4semanas;

– se persistir dor, com rotação externa gleno-humeral muito limitada, então administrarinfiltração intra-articular de corticosteroide(até um máximo de 3);

– se houver dor com a abdução (sugestivo depatologia da coifa ou bursite) então ministrarinfiltração subacromial de lidocaína ou corti-costeróide (até um máximo de 3);

– a fisioterapia está indicada em doentes comombro doloroso há mais de 6 semanas comlimitação marcada das actividades diárias.

A tentação pela aplicação precoce de infiltra-ção é grande. Note-se, contudo, que muitos estu-dos não encontraram diferenças significativasentre o tratamento com as várias formas descritasno que diz respeito à dor e função, em doentesnão seleccionados. Num estudo efectuado naCalifórnia pelo grupo de Michelle Petri, aprecia-ram-se o tratamento com naproxeno oral, injec-ção de triamcinolona, os dois associados e place-bo, em doentes com suspeita de tendinite dacoifa. Os autores verificaram melhoria com usodos medicamentos em relação ao placebo, sem

contudo haver diferença entre a terapêutica com-binada e a triamcinolona isolada. Esta é superiorao naproxeno em termos de alívio da dor e avalia-ção clínica geral, mas não em relação à abduçãoactiva e limitação funcional9. O principal deter-minante do sucesso terapêutico foi o estado clíni-co antes do tratamento.

Noutro estudo efectuado em Cambridge porAdebajo et al, os resultados obtidos com o uso dediclofenac (150mg dia) e com infiltração local detendinites da coifa dos rotadores foi semelhanteno que diz respeito ao alívio da dor, melhoria daabdução e da limitação funcional10.

Em relação aos efeitos secundários estes sãoraros. Com os AINES podem ocorrer sintomasgastrointestinais, úlcera gástrica, hemorragia gas-trointestinal, insuficiência renal, hepatite, bron-coespasmo, que devem vigiar-se e prevenir. São,contudo, benéficos neste grupo de patologias,embora o seu papel a longo prazo e na prevençãode recidivas não esteja demonstrado1.

Com as infiltrações podem ocorrer, devido àinjecção em si, atrofia dérmica no ponto de injec-ção, artrite bacteriana, hemartrose e trombo-flebites. São ocorrências excepcionais quando atécnica é realizadas por médicos experientes. Osefeitos metabólicos sistémicos são negligen-ciáveis.

As injecções repetidas nos tendões ou namesma articulação podem conduzir a laxidez li-gamentar, instabilidade articular, calcificação ouruptura dos tendões ou da cápsula. São muitoúteis no alívio sintomático, mas o seu papel alongo prazo, na prevenção de recidivas, estáainda por definir.

Em certos casos há necessidade de recorrer àcirurgia, que pode ser por artroscopia (extracçãode calcificação, bursectomia, descompressiva,rupturas agudas e pequenas da coifa, desbrida-mento do debrum glenoideu, luxação recidi-vante) não tendo os riscos de uma cirurgia aber-ta, que no entanto é necessária em casos maisgraves (rupturas grandes da coifa)11.

Nalgumas situações, como a artrose pós-trau-mática, necrose asséptica, artrite reumatóide,fractura cominutiva do idoso, impõe-se recorrer aartroplastia do ombro.

O prognóstico deste grupo de patologias émuito variável e difícil de estabelecer. Cerca de23% dos casos resolvem ao fim de 6 meses, mas50% persistem ao fim de 1 ano1. O prognóstico émais favorável se houver história de um pequeno

MARIA JOÃO SALVADOR E COL.

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traumatismo antes do aparecimento dos sinto-mas, formas de apresentação precoces, excessode uso da articulação, aparecimento agudo desintomas, VS elevada, uso escasso de medicação.Têm pior prognóstico os casos em que se observauma dor severa como apresentação inicial, outrosepisódios semelhantes anteriores, restrição mar-cada da abdução passiva. O prognóstico tambémé mau em doentes com diabetes mellitus, dor cer-vical concomitante, espondilartrose cervical esintomas radiculares, idade avançada, envolvi-mento do lado dominante, baixa médica. É desalientar que os factores psicológicos, nomeada-mente a depressão, tendem a prolongar asqueixas e incapacidade destes doentes1.

Endereço para correspondência

ReumatologiaHospitais da Universidade de Coimbra3000-075 CoimbraFax: 239 400 491e-mail: [email protected]

Referências Bibliográficas

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2. Pope D P, Croft P R, Pritchard C M, Silman A J.Prevalence of shoulder pain in the community: the

influence of case definition. Ann Rheum Dis 1997 ;56:308-312

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8. Croft P. Measuring up to shoulder pain. Ann RheumDis 1998; 57: 65-66

9. Petri M, Dobrow R, Neiman R, Whiting-O’Keefe Q,and Seaman W E. Randomized, Double-blind,Placebo-controlled study of the Treatment of thePainful Shoulder. Arthritis Rheum September 1987;Vol. 30, nº 9: 1040-1045

10. Adebajo A O, Nash P, and Hazleman B L . AProspective Double Blind Dummy Placebo Con-trolled Study Comparing Triamcinolone Hexace-tonide Injection with Oral Diclofenac 50 mg TDS inPacients with Rotator Cuff Tendinitis . J Rheumatol1990 ; 17:9 : 1207-1210

11. Turner-Stokes L. MRI and arthroscopy surgery: acombined breakthrough in the management ofshoulder pain. Ann Rheum Dis 1996; 55: 405-406

OMBRO DOLOROSO

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A G E N D A N A C I O N A L

n Jornadas de Reumatologia da Madeira

Local e Data: Funchal, 4 e 5 de Outubro de 2001.

Informações: Ad Medic, Lda

Calçada de Arroios, 16C – Sala 3, 1000-027 Lisboa

Tel: 218 429 710 Fax: 218 429 719 e-mail: [email protected]

n Reunião Monotemática da S.P.R. Lúpus e Outras Doenças do Tecido Conjuntivo.

Local e Data: Viseu, 4 de Outubro de 2001.

Informações: Sociedade Portuguesa de Reumatologia

Rua D. Estefânia, 177 – 1ºD, 1000-154 Lisboa

Tel: 213 534 395 Fax: 213 159 780 e-mail: [email protected]

n Reunião de Outono da S.P.R.

Local e Data: Caramulo, 5 a 7 de Outubro de 2001.

Informações: Sociedade Portuguesa de Reumatologia

Rua D. Estefânia, 177 – 1ºD, 1000-154 Lisboa

Tel: 213 534 395 Fax: 213 159 780 e-mail: [email protected]

n IV Jornadas do Aparelho Locomotor do Hospital Conde de Bertiandos

Local e Data: Ponte de Lima, Universidade Fernando Pessoa, 18 e 19 de Outubro de 2001.

Informações: Serviço de Reumatologia

Hospital Conde de Bertiandos, Largo Conde de Bertiandos.

4990 Ponte de Lima

Tel: 258 909 500 Fax: 258 909 501

n XXII Curso de Reumatologia

Local e Data: Coimbra, HUC, 19 e 20 de Outubro de 2001.

Informações: Serviço de Medicina III e Reumatologia.

Hospitais da Universidade de Coimbra, 3000-075 Coimbra

Tel: 239 400 439 Fax: 239 400 491 e-mail: [email protected]

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A G E N D A N A C I O N A L

n 4º Forum de Apoio ao Doente Reumático

Local e Data: Lisboa, 27 e 28 de Outubro de 2001

Informações: Liga Portuguesa contra as Doenças Reumáticas

Apartado 50030, 1701-001 Lisboa

Tel: 217 264 075 Fax: 217 264 078

n XVI Curso de Reumatologia para Clínicos Gerais

Local e Data: Lisboa, Hotel Altis, 22 e 23 de Novembro de 2001.

Informações: Núcleo de Reumatologia

Hospital de Santa Maria. Av. Prof. Egas Moniz, 1600-190 Lisboa

Tel: 217 931 339 e-mail: [email protected]

n IX Jornadas Internacionais do IPR

Local e Data: Lisboa, Gare Marítima de Alcântara, 6 e 7 de Dezembro de 2001.

Informações: Instituto Português de Reumatologia

Rua da Beneficiência, 7, 1050-034 Lisboa

Tel: 217 935 821 Fax: 217 970 210

n XI Congresso Português de Reumatologia.

Local e Data: Lisboa, 20 a 23 de Março de 2002

Informações: Sociedade Portuguesa de Reumatologia

Rua D. Estefânia, 177 – 1ºD, 1000-154 Lisboa

Tel: 213 534 395 Fax: 213 159 780 e-mail: [email protected]

Nota do Editor: A Acta Reumatológica Portuguesa solicita e agradece informação atempada de eventos nacionais de potencial interesse para os nossos leitores.

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A G E N D A I N T E R N A C I O N A LA G E N D A I N T E R N A C I O N A L

n Myopain 2001. 5th World Congress on Myofascial Pain and Fibromyalgia

Local e Data: Portland, E.U.A., 9 a 13 de Setembro de 2001.

Informações: Continuing Medical Education, Dept 7980, Univ. of Texas

HSC, 7703 Floyd Curl Drive. San Antonio. Tx 78229-3900, USA.

Fax: 00.1.2105676964 e-mail: [email protected]

n 2nd International Conference on the Neuroendocrine Immune Bases of the Rheumatic Diseases

Local e Data: Génova. Itália, 21 a 23 de Setembro de 2001.

Informações: Studio Viale von der Goltz

Via Goito, 26/7. 16122 Genoa. Italia.

Fax: 00.39.10.8318246 e-mail: [email protected]

n ASBMR 2001. 23rd Annual Meeting of the American Society for Bone and Mineral Research

Local e Data: Phoenix, EUA, 12 a 16 de Outubro de 2001.

Informações: ASBMR. Suite 300.1200. 19th Street, NW

Washington DC 20036, USA

Fax: 00.1.2022234579 e-mail: [email protected]

n ACR 2001. 65th Annual Scientific Meeting of the American College of Rheumatology

Local e Data: S. Franscisco, CA, EUA, 11 a 15 de Novembro de 2001.

Informações: American College of Rheumatology

1800 Century Place, Suite 250

Atlanta, GA 30345-4300. USA

Fax: 00.1.4046333777 e-mail: [email protected]

n IOF – World Congress of Osteoporosis

Local e Data: Lisboa, 10 a 14 de Maio de 2001

Informações: International Osteoporosis Foundation

71, Cours Albert Thomas, 69447 Lyon, France.

Fax: 00.33. 47. 2369052 ou SPODOM Fax: 217786594

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N O R M A S D E P U B L I C A Ç Ã O

A Acta Reumatológica Portuguesa publica artigosoriginais sobre todos os temas da Reumatologia oucom ela relacionados. São também publicados arti-gos de revisão ou actualização, casos clínicos, cartasao editor e outros que se incluam na estrutura edito-rial da revista (notícias de reuniões de sociedadescientíficas, por ex.).

Os artigos podem ser redigidos em português ouinglês.

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a) aceites sem alterações;b) aceites após modificações propostas pelos

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EditorActa Reumatológica Portuguesa

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com os seguintes subtítulos: Introdução, Objectivos,Material e Métodos, Resultados, Discussão, Con-clusões, Agradecimentos, Bibliografia.

Em se tratando de casos clínicos, os subtítulosserão: Introdução, Caso clínico, Discussão, Biblio-grafia.

A partir da segunda página, inclusive, todas aspáginas devem ter em rodapé o título breve indicadona página título.

O manuscrito não deve ultrapassar as 20 páginaspara os artigos originais e revisões e as 6 páginas paraos casos clínicos.

Referências: As referências devem ser classifi-cadas e numeradas por ordem de entrada no texto.As abreviaturas usadas na nomeação das revistasdevem ser as utilizadas pelo Index Medicus.

Nas referências com 6 ou menos autores todosdevem ser nomeados. Nas referências com 7 ou maisautores devem ser nomeados os 3 primeiros segui-dos de et al.

Seguem-se alguns exemplos de como devemconstar os vários tipos de referências:

– RevistaNome(s) e iniciais do(s) autor(es). Título do artigo.

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Nome da revista Ano; Volume: Páginas.Ex.: Hill J, Bird HA, Hopkins R, Lawton C, Wright V.

Survey of satisfaction with care in a rheumatologyoutpatient clinic. Ann Rheum Dis 1992; 51:195-197.– Capítulo de livro

Nome(s) e iniciais do(s) autor(es) do capítulo.Título do capítulo. In: Nome(s) e iniciais do(s) edi-tor(es) médico(s). Título do livro. Cidade: Nome dacasa editora, ano de publicação: primeira a últimapágina do capítulo.

Ex.: Stewart AF. Hypercalcemia resulting frommedications. In: Favus MJ, ed. Primer on theMetabolic Bone Diseases and Disorder of MineralMetabolism. New York: Raven Press, 1993: 177-178.– Livro

Nome(s) e iniciais do(s) autor(es). Título do livro.Cidade: Nome da casa editora, ano de publicação:página(s).

Ex.: Lorig K. Patient Education. A practicalapproach. St. Louis: Mosby-Year Book;1992: 51.

As referências a trabalhos ainda não publicados,comunicações em reuniões, não publicadas emlivros de resumos, ou comunicações pessoais devemser citadas no texto e não como referências formais.

A exactidão e o rigor das referências são daresponsabilidade do autor.

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Figuras: As figuras a inserir devem ser assinala-das no texto em numeração árabe. As legendas dasfiguras devem ser dactilografadas a dois espaçosnuma folha separada, depois da bibliografia. Devemser enviados três originais das figuras, que deverãoapresentar uma boa qualidade de desenho ou seremfeitas em impressora de alta resolução. As fotogra-fias devem ser em papel brilhante, bem contrastado,com as dimensões 10x15 cm. Todas as figuras devemapresentar no verso uma etiqueta autocolante como número da figura, o nome do 1.o autor, o títulobreve do artigo e a indicação da parte superior dafigura.

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Manuscripts must be accompanied by a submittalletter, signed by all authors, stating the name of thearticle, that it is an original work, that the authorsheld the copyright of the manuscript, that it does notrepresent any conflict of interest, and that they trans-fer the copyright to the journal (se form below).

Text should be typed double-spaced on only oneside of A4 size paper sheets, type 12, with 1-inchmargins. All pages must be sequentially numbered.Manuscripts, tables and figures must be submittedin triplicate, and accompanied by a digital file indiskette (Word for Windows).

Manuscripts should be organized as explainedbelow:

Page 1Title; authors’s names and degrees; institutions

represented; source of grants support; address andtelephone number of the author responsible forcommunications with the editor and reprints; sorttitle for footnote.

Page 2a) Title (without authors)b) Abstract

Abstract in portuguese and in english structured asfollows for the original articles: Objectives; Patientsand Methods; Results; Conclusions. The abstractshould not exceed 250 words for original articles and150 words for case reports.

c) KeywordsA maximum of 5 keywords should be presented afterthe abstract.

Page 3 and following pagesThe text of original papers should be presented

with the following subtitles: Introduction, Objecti-ves, Patients and Methods, Results, Conclusions,Acknowledgements, References. Subtitles for casereports should be: Introduction, Case report, Discus-sion, References.

From the second page on, all pages should have ashort title on footnote.

Manuscripts should not exceed 20 pages for origi-nal articles and reviews and 6 pages for case reports.

References: References should be cited by thenumerical system and listed, in the order cited in thetext. Journal titles are abbreviated in accordancewith the style of Index Medicus.

List all authors when 6 or less; when 7 or more listonly first 3 and add “et al”.

References of unpublished work, presentations orpersonal observations should be inserted in the text(in parenthesis).

Authors are responsible for the accuracy of thereferences.

Examples:

– Journal articleName(s) and initials of author(s). Article title.

Journal name Year; Volume or number: Page(s).Ex: Hill J, Bird HA, Hopkins R, Lawton C, Wright V.

Survey of satisfaction with care in a rheumatologyoutpatient clinic: Ann Rheum Dis 1992; 51: 195-197.

– Chapter in BookName(s) and initials of author(s) of chapter.

Chapter title. In: Name(s) and initials of editor(s).

Page 99: Acta Reumatológica Portuguesa · EDITORIAL História breve do tratamento da artrite reumatóide com 145 ... da neste texto. ... Para além disso a aurotioglicose revelava alguma

ÓRGÃO OF IC IAL DA SOC IEDADE PORTUGUESA DE REUMATOLOGIA - ACTA REUM PORT. 2001;26:241-242

242

Book title. City: Name of publisher, year of publica-tion: pages.

Ex: Stewart AF. Hypercalcemia resulting frommedications. In: Favus MD, ed Primer on theMetabolic Bone Diseases and Disorders of MineralMetabolism. New York: Raven Press, 1991: 177-178.

– BookName(s) and initials of author(s). Book title. City:

Name of publisher, year of publication: page(s).Ex: Lorig K. Patient Education. A practical

approach. St Louis: Mosby-Year Book, 1992: 51.

Tables: Tables should be cited in the text withRoman numerals. Each table should be doubletyped on a separate sheet, have a title and containno vertical rulers. Horizontal lines should be usedonly as separators between titles and subtitles.Explain all abbreviations at the bottom.

Figures: Cite each figure in the text in consecutiveorder using Arabic numerals. Legends should be lis-ted on a separate sheet, double typed. Send threecopies of each figure. Figures should be professionaldrawn and photographed. Photographs should be10x15 cm and on the back should be labelled withthe number, article title, first author name, and havetop indicated.

The total of figures should not exceed 8 for origi-nal articles and 4 for case reports. Coloured illustra-tions or excess figures may be published with costscharged to the author.

Modifications and proofreading: Articles accep-ted subject to modifications, will be sent to authorsthat will have 15 days to modify them according tosuggestions. Contributors will receive page proofsand are asked to proofread them for printers’ errors.

Editorials: Editorials will be requested by the edi-tor and will be comments on important issues or onarticles published in the journal. Editorials shouldnot exceed 1200 words, with a maximum of 15 refe-rences and no tables or figures.

Review articles: Review articles will be commis-sioned by the editor. However, authors interested inpresenting a review article are welcomed to contactthe editor.

Letters: Letters to the editor must be a commenton a journal article or a short clinical study or casereport. It cannot exceed 600 words, a maximum of10 references and a table or figure.

Offprints: Authors will be sent 10 copies of theJournal issue. Offprints may be charged to theauthors upon request during the proofreading.

Letter draft:Send with manuscript to The Editor:

The authors certify that the manuscript entitled_________________________________________ isoriginal, all data are based on their own researchand that the manuscript does not violate copy-right or privacy regulations. They further statethat the manuscript hasn’t been partly or totallypublished or submitted to publication elsewhere.The authors declare that they hold total copyrightfor this paper and that they assume collectiveresponsibility for it’s contents and also that anyconflict of interest is acknowledged.And submitting this paper, the authors transfercopyrights interests to Acta Reumatológica Por-tuguesa.

All authors must sign.Name (capitals): ____________________________Date: ______________________________________Signature: __________________________________