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Gênese, história e importância das publicações independentes do Brasil e do mundo:os Fanzines e as Revistas Alternativas.
Gazy Andraus - gazya@yahoo.com.br - http:geocities.yahoo.com.br/gazya/index.htm
Doutorando em Ciências da Informação e Documentação pela ECA-USPMembro do NPHQ da ECA-USPBolsista do CNPQ
Orientador: Waldomiro de Castro Santos Vergueiro
Resumo: Neste artigo, mencionar-se-ão alguns dos principais elementos que fizeram a gênese e a
história evolutiva dos fanzines e revistas alternativas, salientando a importância social que
estes veículos têm delineado no Brasil (e conseqüentemente no mundo), e como
propulsores e moldadores imprescindíveis de intercâmbio e cultura geral nas sociedades
contemporâneas. Um fanzine ou revista independente é uma publicação de grande
influência alternativa no Brasil e no exterior, servindo como veículo comunicacional e
como meio de divulgação de idéias, quer sejam na forma coletiva ou isoladas,
funcionando como laboratório para futuros jornalistas, escritores, poetas e quadrinhistas,
e também como único meio mais acessível de se promover autores de HQs que talvez
jamais veriam seus trabalhos publicados nas editoras comerciais.
Palavras-chave: Fanzines - Publicações Alternativas - HQs
2
1. Os Fanzines e Revistas Alternativas1.1. A gênese dos fanzines:
início dos fanzines remonta à idéia da expressão humana, da comunicação
em si, necessária ao homem, e mesmo à livre expressão. Há dois mil anos trás
surgiu em Roma uma forma embrionária do jornal impresso: a Acta Diurna, um
jornal escrito em tábuas brancas sob a orientação do imperador Julio César, que era
fixado diariamente nos muros do Fórum. Trazia inicialmente informações do governo para
o povo, e posteriormente “elas foram ficando mais apetitosas. Começaram a falar de
casamentos, de mortes, de divórcios, de algum acidente ocorrido com gente importante,
dos espetáculos do circo, etc.” (INCONTRI: 1991, p.17). Como se vê, este tipo de “jornal”
obviamente não possuía uma vertente de livre expressão, pois no início era atrelado ao
imperador de Roma, que também possuía um magnífico serviço de correios entre suas
estradas e cidades.
O
Na Idade Média surgiu um tipo de jornalista-repórter, que era o trovador, que
cantava além de belos poemas de amor, fatos e gozações críticas sociais e políticas.
Naquela época, apenas uma pequena parte da população sabia ler: o clero, que copiava
os textos religiosos manualmente em livros imensos de difícil manuseio. Em 1935, Carlos
VI, rei da França, proíbe na livre expressão desses trovadores, inserções acerca de tudo
que envolva o reinado e seu governo: é o braço da censura, desde tempos pretéritos até
hoje em muitos países.
Até esta época, quando havia leitura de algum texto, esta o era feita em voz alta,
pois não havia o hábito de se ler mentalmente, principalmente porque a maioria era
iletrada, e também devido aos textos não terem espaços entre suas palavras, o que pedia
uma atenção especial daquele que fosse incumbido de ler.
3
Ao término da Idade Média, e com o surgimento do que se convencionou chamar
de Renascimento, as cidades estavam maiores e mais populosas, e com o comércio em
crescente expansão por volta de 1350 a Europa começou a ampliar seus sistemas de
comunicação, propulsionando os correios, de incentivos particulares. Mais tarde, por volta
de 1500, quando os correios passaram a ser comandados pelos governos, a população
civil pôde se comunicar com cartas pessoais, que traziam informações familiares, de
amigos, e novidades de suas terras natais a outras cidades e países da Europa.
Pode-se detectar aí, a epigênese do fanzine (e jornal): em “Veneza, a cidade-berço
do jornal” (INCONTRI: 1991, p. 24), foi o local que a Gazeta1 foi disseminada, pois ela
funcionava em concomitância com os envios de cartas pelos correios. E alguns trechos de
conteúdos destas cartas, que traziam novidades e curiosidades de vários assuntos, eram
passados a limpo e copiados à mão em várias cópias que por sua vez eram vendidas nas
ruas.
Como os jornais pressupõem uma periodicidade, variedades de notícias e assuntos
atuais, pode-se dizer que estas cartas (gazetas), que vinham pelos correios, possuindo
tais qualidades, faziam a vez dos jornais que existem atualmente, mas também podem
guardar certas semelhanças em sua metodologia às publicações alternativas, como os
fanzines, contendo assuntos diversos, que podem ser manufaturados e fotocopiados, e
então “passados” de mão em mão.
Na Idade Média, os livros eram escritos à mão pelos copistas, e havia a inserção
de muitas ilustrações (Iluminuras) muito bem trabalhadas artisticamente. Com o
desenvolvimento da xilogravura e a xilografia, possibilitou-se um pouco mais a elaboração
de cópias, mas foi depois com o advento dos tipos móveis de metal graças ao alemão
Johann Gutemberg, que os livros, jornais e revistas começaram a ser mais acessíveis.
Porém, a utilização da prensa de Gutemberg para impressão de “gazetas” só foi
feita muitos anos depois de sua invenção, pois pensava-se que sua utilização só poderia
ser para fins nobres, logo, os livros apenas, já que os jornais-cartas eram descartáveis,
além do que as monarquias e o clero vigiavam as tipografias, cerceando e coibindo a
1 Gazeta é um termo que pode ter sido dado por causa de uma moeda usada em Veneza, que era o preço deste “jornal”, ou então a algazarra que faziam os vendedores dele, tal como os sons de um pássaro: a gazza. (INCONTRI, 1991)
4
divulgação de idéias livres, que ainda transitavam manualmente pelas gazetas-cartas (os
“jornais” e “fanzines” da época).
Assim, com as tecnologias melhorando a cada etapa humana, e com o advento da
revolução industrial iniciada na Inglaterra, os jornais se espalharam pelo mundo, e,
embora a imprensa em geral seja de caráter informacional, ela pode ter ligações
governamentais que coíbam uma vazão mais democrática de suas notícias, quer pela TV,
pelo rádio ou pelo jornal impresso.2
1.2. Os Fanzines e Revistas Alternativas:essa forma chega-se aos fanzines e /ou revistas alternativas, criados na
década de trinta, nos EUA. O primeiro fanzine de que se tem notícia chamava-
se "The comet", que era voltado para a ficção científica, tida na época como
subliteratura. A partir de então espalhou-se pelo mundo.
DO termo fanzine3 é um neologismo advindo da junção de duas palavras inglesas:
fanatic+magazine (revista do fã), criado na década de quarenta, bem depois da invenção
do objeto (o próprio “fanzine”), e começou a ser amplamente utilizado nos anos 70 pelos
jovens estudantes, para divulgação de trabalhos contra a ditadura e como contestação do
sistema social vigente. Seria a contra-cultura ou mesmo o "underground" (movimento
independente de tudo que diz respeito à cultura massificada ou de consumo, onde temos
como figura principal nas Histórias em Quadrinhos ou HQs, o norte-americano Robert
Crumb, o "papa" do movimento).
Esse veículo de comunicação alastrou-se pelo mundo inteiro, expressando idéias e
informações adjuntas de um determinado assunto, de forma livre e independente, graças
ao seu baixo custo, pois geralmente é rodado em fotocopiadoras4 (xerox) e divulgado
através dos correios e, atualmente, pela Internet (os e-zines).
A similaridade da intenção do movimento fanzineiro com as atitudes dos trovadores
da Idade Média e os gazeteiros de Veneza está intimamente ligada com a livre expressão,
2 Apesar de que este último possa ser considerado mais “livre” que os outros, pois não está atrelado à concessões do governo para que funcione, como nas duas outras mídias mencionadas, há agora a Internet, mais democrática e de certa forma, quase impossível de ser controlada: vide os sites pornográficos, e os vírus e hackers. 3 Também chamado de Zine.4 Muitos zines brasileiros começaram na época do mimeógrafo, passando depois para as fotocopiadoras.
5
independente dos órgãos de censura (clero/monarquia/governo), o que atualiza os
ditames dos corações e mentes dos seres humanos (pode-se até aventar um paralelo
entre os fanzines e o Cordel, que ganhou em maio de 2001 uma exposição em São
Paulo, capital5, pois, se o folclore é uma manifestação de cunho popular e tradicional, é
bem possível que o Fanzine possa ser tido e pesquisado no futuro, também como um
objeto folclórico comunicacional).
A imprensa alternativa no Brasil teve seu início nos anos 60, com o jornal Pif-Paf,
cujos autores vieram a criar o famoso Pasquim, que teve colaboradores como Jaguar,
Ziraldo, Henfil e Millôr Fernandes, entre outros artistas de expressão. Os fanzines
surgiram no Brasil em outubro de 1965, com os boletins de histórias em quadrinhos. Foi
nesta época que começaram a circular, entre os fãs, as pequenas publicações amadoras
com as críticas e comentários sobre esta arte. Por fanzine, entendem-se as publicações
amadoras reflexivas e críticas produzidas por fãs e dirigida aos apreciadores de
determinada arte ou hobby (MAGALHÃES, 1993).
Até hoje os fanzineiros buscam movimentar o pop alternativo, combatendo a
cultura padronizada, informando acerca de seus ideários, projetando em forma de textos,
poemas, ilustrações, HQs, etc, o que lhes for possível, vertendo estas concepções em
revistas alternativas e/ou fanzines.
5 Exposição “Um Século de Cordel” , evento realizado no Sesc Pompéia em São Paulo, SP, m maio de 2001, divulgado na Revista Época, ano III, n. 157, Globo: Rio de Janeiro, 21 de maio de 2001.
6
1.3. Distinção entre Zines e Revistas Alternativas abe aqui uma pequena diferenciação entre Fanzine e Revista Alternativa.
Embora ambas sejam independentes, a primeira trata de assuntos pertinentes a
determinados temas com artigos, textos, resenhas críticas sobre, por exemplo,
cinema, quadrinhos, música, etc.; já a segunda traz em suas páginas trabalhos artísticos
como HQs (histórias em quadrinhos), ilustrações e poesias além de outras criações. Tal
classificação foi feita por Henrique Magalhães, que se doutorou na França acerca dos
fanzines, e lançou no Brasil o livro O que é Fanzine da Ed. Brasiliense, em 1993.
CMas é bem verdade que esta classificação, por vezes, pode não ser possível, pois
há materiais publicados que misturam ambas, textos críticos e HQs, como apostilas
explicativas governamentais de cunho social e de saúde, ou cartilhas destinadas a
esclarecimentos ecológicos a membros de determinadas entidades e/ou público em geral.
Neste artigo frisa-se mais diretamente os fanzines brasileiros e seu caráter
democrático, mencionando-se alguns dos autores que fizeram e/ou fazem um trabalho de
mais consistência, seja como autores e/ou editores independentes.
1.4. Ocorrências:m fanzine, como dá a entender o próprio nome, é uma
revista gerada pelo fã de determinado assunto, quer
seja de cinema, de música, ou de poesia ou HQs
(Histórias em Quadrinhos), que disserta acerca de tudo que
pode obter de seu objeto de paixão, ou ainda, atualmente, um
veículo de expressão e vazão do autor apaixonado por
determinado gênero ou assunto, que não tem outro modo de
divulgar suas idéias.
U
No Brasil, milhares de títulos têm inundado o circuito nacional. Muitos fanzines não
passam do número dois, outros já estão há mais de vinte anos no ar,
como é o caso do "Barata", de Santos/SP; outros funcionam como
7
Figura 1: Fanzine (revista alternativa)
Barata, de Santos-SP
auto-edições independentes (livros) de autores, como escritores que não são aceitos
pelas editoras comerciais.
Em São Paulo acontece anualmente o HQMix, evento que premia entre outros, o
melhor fanzine do ano e a melhor revista independente. Costumava haver vários eventos
de fanzines no Brasil, como em Jaboticabal e Araraquara (Araraquarazine). Em Ourense,
na Espanha, também anualmente, é realizada uma exposição Mundial de fanzines e
Prozines (termo que tenta dar um aspecto semiprofissional a alguns zines de concepção
gráfica melhorada), além de Almada em Portugal. Já, na cidade de Poitiers, França, existe
uma Fanzinoteca (Fanzinothéque de Poitiers) que reúne edições alternativas do mundo
inteiro num acervo original. Inúmeros sites também existem concernentes a HQs
(Histórias em Quadrinhos) e fanzines.
1.5. Veículo de HQs e propagador cultural ostuma-se chamar de fanzine qualquer suporte de papel que contenha tanto
uma como a outra publicação citada nos itens anteriores, para facilitar esta
grande corrente de caráter libertário que se utiliza do correio como seu melhor
modo de propagação (atualmente com a franca utilização da Internet, apareceram os
mencionados e-zines que nada mais são que os fanzines eletrônicos, o que facilitou em
muito a divulgação dos mesmos.).
CInteressa frisar que, mesmo as HQs veículadas pelos fanzines (ou mais
especificamente, nas revistas independentes), passeiam por diversos gêneros, inclusive
tendo caráter de vanguarda, de experimentalismo, pois o caráter anárquico dos também
chamados zines permite tais experimentações.
Nas revistas alternativas independentes ou fanzines, seus autores/editores buscam
espraiar ideologias e filosofias, estimulando a produção cultural e revelando novos
artistas, novos escritores e quadrinhistas, que, devido à forma competitiva capitalista
exagerada que tomou o mercado editorial, jamais, em sua grande maioria, serão
comercializados de maneira oficial (principalmente no Brasil, que tem o hábito de comprar
HQs estrangeiras a preços mais baratos que pagaria pelas nacionais). Com isto, têm nos
fanzines, tanto seus autores como os possíveis leitores, um modo único de poder ver
8
suas idéias circularem e serem vistas, já que, aos fanzineiros, caso se abstivessem da
utilização de tal veículo, privar-se-iam de poder expressar qualquer idéia, o que
fatalmente coibiria totalmente a relação autor/leitor, fadando ao extermínio todo um
caminho de construção cultural social e limitando o leque de obras criativas ao rol das
produções, pertinentes a somente aqueles poucos que são comercializadas oficialmente.
Em outras palavras, só alguns poucos teriam o privilégio de ter circulando seus trabalhos,
dependendo da aceitação de, por exemplo, determinado editor, em detrimento de muitos
outros que jamais teriam tal chance.
A importância deste artigo referente aos fanzines justifica-se assim, também pelo
fato de, por exemplo, muitos autores brasileiros de HQs autorais adultas (de temática
reflexiva e filosófica), estarem publicando nestas revistas independentes, e que são
muitas vezes auto-editadas, devido às editoras brasileiras não terem ainda percebido a
importância (e existência) deste tipo e gênero de Histórias em Quadrinhos.
A respeito disso e concernente também às raízes do fanzinato, pode-se apontar o
pintor e gravador inglês do final do século XVIII, William Blake, que foi igualmente poeta e
artista:
“Para ver um mundo num grão de
areia
E um céu numa flor silvestre,
Segure o Infinito na palma de tua mão,
E a eternidade numa hora.”
Figura 2: Homo Eternus, vol.2
No posfácio da obra alternativa “Homo Eternus”6, atribue-se a Blake o pioneirismo
dos Fanzines, pois ele editava seus álbuns, contendo textos próprios, ilustrados com
gravuras pessoais, pintadas à mão, uma a uma, tal como eram feitas as cópias de livros
6 ANDRAUS, Gazy. Homo Eternus. Co-Edição Edgard Guimarães e Gazy Andraus. 1993. Quatro tomos contendo HQs filosófico-místicas
9
sagrados na Idade Média. De certa forma ele pode também ter sido o propulsor do
fanzine autoral, e o “pai” de todos os autores (principalmente os injustiçados nacionais)
que criam e divulgam seus fanzines, principalmente os que visam o público maduro.
É mister que se reitere nesta questão: as HQs para o público adulto, e seus
autores, existem no Brasil, embora raramente se notifique tal fato na mídia em geral.
Os Fanzines e revistas independentes suprem tal lacuna.
Quiçá, futuramente, estas HQs, deixem de ser vistas como arte menor, como
espera o autor norte americano já mencionado, Will Eisner.
Quanto a este fato, o mesmo autor, em entrevista a um jornal brasileiro, responde à
questão quanto a uma mudança na forma de se ver esta arte:
Vai levar tempo. E vai depender da qualidade das histórias sendo contadas. Afinal de contas, houve um tempo em que o cinema era considerado lixo. Cantores de ópera se recusavam a participar de filmes porque consideravam uma forma de expressão menor. O problema é o que eu chamo de mentalidade escrava. Se te tratam como escravo muito tempo, você começa a viver como se fosse um escravo. As pessoas que escrevem HQs não pensam que são responsáveis. (...) Mesmo em convenções como essa, as pessoas me diziam até pouco tempo atrás que adoravam meu trabalho como desenhista. E eu só queria que alguém elogiasse minha história.7
É claro que Eisner estava se referindo ao mercado norte-americano, pois no Brasil,
quase inexistem autores publicando oficialmente, e os “escravos” e “irresponsáveis”, a
que ele se refere, se adequam perfeitamente também aos desenhistas brasileiros que
servem de peões ao mercado saturado (de também peões) dos EUA.
Neste ponto, os autores brasileiros acabaram criando escolas em suas publicações
alternativas, e muitos deles enveredam até hoje, imbuídos da mais sincera essência
autoral e conscienciosa, a que Eisner se referia como qualidade necessária a um
escritor/desenhista de HQs.
Na França, os fanzines são como laboratórios, onde os autores vão adquirindo
maturidade. As editoras francesas, sabendo disso, costumam procurar no fanzinato,
novos profissionais, editando projetos pessoais ao público.
7 BASTOS, Gabriel. In Will Eisner faz a história da Arte com emoção. Estado de São Paulo, 18/07/96, Caderno 2, p. D9.
10
Um grande crítico dos quadrinhos, o psicólogo norte-americano Fredric Wertham,
que na época macarthista lançou o livro Seduction of Innocents, fadando ao preconceito a
maioria das HQs, taxando-as de perigosas à educação dos jovens, concluiu
paradoxalmente em seu último livro The World of Fanzines (1973), que os fanzines eram
construtivos culturais, conforme citado no artigo publicado na revista Wizard, n. 7, p.43,
Globo: RJ, fevereiro de 1997:
os “fanzines mostram uma combinação de independência que não se encontra facilmente em outras partes da nossa cultura” e (Wertham8) acabou concluindo que “eles são válidos e construtivos. A comunicação é o oposto da violência. E toda faceta de comunicação tem um lugar legítimo”. (William Christensen e Mark Seifert)
Isto fica em aberto para estudos posteriores; no momento satisfaz-se colocar o
objeto Fanzine ou zine como veículo de comunicação propulsor cultural, principalmente
no Brasil, necessitado de divulgação geral acadêmica, motivo pelo qual ele figura como
objeto deste artigo.
1.6. Publicações independentes Brasileiras:dgar Franco menciona no livro As histórias em quadrinhos no Brasil: Teoria e
prática, organizado por Flávio CALAZANS, em seu capítulo: Panorama dos
Quadrinhos Subterrâneos no Brasil, p. 52, que EUm dos primeiros fanzines do Brasil surgiu nos anos setenta, na FAU-USP (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo). Seu nome era Balão e ele veiculava histórias em Quadrinhos em suas páginas. Revelou nomes como Luís Gê e os irmãos Caruso. A partir desse impulso inicial, os fanzines de quadrinhos proliferaram-se pelos quatro cantos do país e não pararam mais.
Edgar, na p. 54, menciona linhas (na verdade gêneros), como uma primeira forma
de se catalogar os estilos de HQs encontrados nos zines:
Linha poético-filosófica HQs filosóficas de caráter experimental;
Linha Expressionista: traços nervosos, HQs que trazem o vazio e o deprimente
como temática;
8 Nota do autor deste artigo.
11
Linha Visceral-Macabra: HQs influenciadas pelos filmes de horror classe B,
produzidos então a partir da década de 50 do século passado. Há citações nessas
HQs de novos cineastas autores da literatura que influenciaram o cinema, como
Clive Barker e Stephen King;
Linha Tradicional: grupos de novos quadrinhistas estrangeiros e nacionais que
seguem as linhas de HQs tradicionais, seja no humor, na aventura, super-heróis,
político, etc.
Aliás, o Brasil é muito mencionado em catálogos de exposições internacionais de
fanzines, seja por sua grande participação, como também por sua qualidade.
Na verdade, os fanzines brasileiros, antes de serem impressos em gráficas ou
fotocopiados, também tiveram sua fase de mimeógrafo. O fanzine santista Barata, que
existiu por mais de vinte anos, foi publicado em seus primeiros números graças ao
mimeógrafo, para depois seguir curso pela impressão em gráfica, no sistema de
impressão através de uma chapa de cartão, sempre em preto e branco, mas com capas
p&b impressas em papel cartonado colorido, dependendo do número. Ultimamente tem
sido fotocopiado em menos quantidade de exemplares. Até o momento publicaram-se 26
números, e ela já foi catalogada na Biblioteca Nacional Norte-Americana.
Pretende-se agora listar alguns poucos "ousados" do meio dos fanzines, que
contribuem culturalmente nacional e internacionalemente nesta arte tão mal pesquisada.
São os autores e editores nacionais do meio alternativo: Edgar Franco, Glauco Matoso,
Mutarelli, Flávio Calazans, André Diniz, Edgard Guimarães, Lacarmélio, Antonio Amaral,
Henry Jaepelt, Henrique Magalhães, Marcatti, Wellington Srbek, Gian Danton, Laudo,
Joacy James, Luciano Irthuum, Eduardo Barbieri (residente na França) além de muitos
outros autores que também são profissionais antigos e contribuem incentivando, como :
Shimamoto, Colin (falecido recentemente), Mozart Couto, etc.
Quanto a sites e e-zines (zines feitos para Internet), existem muitos, mas ressalta-se
no momento um, criado pelo zineiro Joás Dias, que funciona como uma enciclopédia do
fanzinato nacional: www.enciclozines.hpg.com.br.
12
Na Espanha (Galícia), temos Henrique Torreiro que é coordenador e organizador da
“Xornadas de Fanzines”, evento anual internacional de exposição e catalogação acerca
dos Fanzines que ocorre em Ourense/Espanha.
Poder-se-ía continuar apontando dezenas, ou até centenas de autores brasileiros e
sites. Mas isto seria uma tarefa que está muito além deste singelo esboço, que só se
presta a apresentar um pouco do histórico e tão injustiçado mundo dos quadrinhos e
fanzines. Autores já conhecidos no meio, como Shimamoto, ainda resistem bravamente
em tal luta cultural. Outros que já se foram, como Henfil, Jaime Cortez ou Flávio Colin,
persistem na memória dos atuais, motivando-os a continuar. Ivan Carlo, Antônio Amaral,
Laudo, J. James, E. Franco e outros tantos sabem da responsabilidade que têm, a qual
nada mais é do que auxiliar para uma educação futura, inculcando uma nova mentalidade
nos leitores brasileiros, a que tenham uma madura visão para com esta "arma" cultural
contra a tola ignorância de belos ignotos mundos criados a partir de imagens e textos,
unidos num matrimônio de informação “anárquica” com lazer, que são as tão
espezinhadas Histórias em Quadrinhos, no Brasil, geralmente publicadas em Fanzines,
veículos “populares” que tomam suma importância nos tempos atuais, principalmente
graças à tecnologia digital, com os contemporâneos e-zines.
1.7. Diminuição da atuação independente no Brasil:As publicações independentes têm perdido força nos últimos anos, e talvez tenha a ver
com uma série de razões:
1) Mudança de suporte para a Internet (o acesso ainda não é tão vasto e fácil, como o
correio postal);
2) Desânimo dos fanzineiros em continuar um trabalho que não parece ter mais a
força que possuía de movimentação informacional e cultural e de troca de
correspondência, já que antes em sua grande maioria utilizavam-se dos serviços
postais do correio, e agora as permutas são em sua maioria através de e-mails.
Embora aparentemente pela Internet este sistema acelere as correspondências,
por outro lado, aos que podem acessar a rede virtual, ampliou-se em muito a
quantidade de “cartas” a serem respondidas, tornando o caráter crítico mais rápido
13
e superficial. Assim, os fanzineiros, propulsionados por outros trabalhos
profissionais e/ou acadêmicos começam a diminuir suas produções. Os novos
fanzineiros, abarcados pela Internet, passam a se utilizar mais deste sistema, e
assim, não se atinge ainda uma mesma gama de membros como ocorria nos
fanzines impressos, devido ao computador e conexão estarem ainda em fase de
expansão. Estes novos zineiros parecem também estar menos preocupados com
ideários e mais atarefados com o deslumbramento da tecnologia virtual, o que
acarreta uma aparente superficialidade
3) Desta forma, a rede de conexão zineira parece ter diminuído em muito sua atuação
e objetivo(s), como nas décadas passadas.
14
2. Considerações Finaise um fanzine ou revista alternativa, cujo início oficial data desde a década de 30
e 40, do século XX (embora como fora visto, remonta em idéia básica, desde os
trovadores medievais ou ainda à Roma de dois mil anos atrás) pode ser tido
como manifestação artístico-comunicacional de um segmento popular, tornando-se quase
como uma tradição “obrigatória” principalmente para os autores de HQs no Brasil, a fim de
poderem escoar suas produções, já que há carência de editoração oficial de HQs
brasileiras, e se o fanzine se estende para outros países, ganhando espaços em mídias e
eventos, tal como o Cordel, e o folclore é uma manifestação de cunho popular e
tradicional, é bem possível que o Fanzine também o seja, mesmo que de certa forma
direcionado.
S
De qualquer modo, o objeto fanzine é mais do que digno de citação, pois é através
dele que muitos podem fazer escoar suas idéias, bastando para isso boa vontade, papel,
tesoura e cola, e pequenas tiragens por fotocopiadoras, baratas atualmente devido à
popularização das máquinas de reprodução, ou ainda, atualmente, pela inserção dos e-
zines, pela Internet.
Com isto, mesmo indispondo-se de editoras interessadas, o pseudo-autor pode se
tornar um auto-editor e ver escoadas suas idéias “anárquicas” artísticas ou jornalísticas,
tal qual o faz um escritor de cordel.
É neste ponto da livre iniciativa e liberdade de expressão que importa subsistir este
artigo acerca dos fanzines como manifestação autoral e de livre imprensa.
Como se vê, a importância dos fanzines numa sociedade sempre em evolução é
bem maior do que aparentaria em uma visão superficial e apressada. Ainda mais no
15
Brasil, país que prescinde de uma consistência maior no tocante à publicação de histórias
em quadrinhos: neste ponto é que, como se disse, coloca-se a importância do fanzinato
como meio divulgador das produções brasileiras (e estrangeiras).
16
3.Bibliografia:
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http://geocities.yahoo.com.br/fanzinelandia/Fanzineteca2000.htm
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FEIJÓ, Mário. Quadrinhos em ação:um século de história. Ed. Moderna: São Paulo.
1997.
FRANCO, Edgar Silveira. Hqtrônicas – Histórias Em Quadrinhos
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GARCIA, Lauro Lisboa e Beatriz Velloso. Um século de Cordel in Revista Época, ano III,
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IANNONE, Leila Rentroia & IANNONE, Roberto Antonio. O mundo das Histórias em Quadrinhos. Moderna: São Paulo, 1994.
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http://www.enciclozines.hpg.ig.com.br/index.htm
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Revista Época, ano III, n. 157, Globo: Rio de Janeiro, 21 de maio de 2001.
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18
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