investigador: se possível, de forma breve, gostaria que me...
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Entrevista Inicial: 16/03/2009
Investigador: Se possível, de forma breve, gostaria que
me dissesse há quanto tempo é que lecciona, se lecciona
por vocação, se começou a leccionar por acaso...enfim,
como veio para à profissão?
Professora: Este ano é o 30º ano que sou professora,
sou professora há 30 anos. Vim cá parar por condições do
destino. Terminei o 7º ano logo a seguir ao 25
de Abril, em 76 e tínhamos uma no de serviço cívico.
Como no ano em que eu acabei, no ano de serviço cívico
já não íamos fazer nada, já não nos era atribuída nenhuma
tarefa fora da cidade, fora do que se fazia, resolvi
aproveitar o ano de serviço cívico, para não perder um
ano e ir para o Magistério. Tinha duas hipóteses: (vivia
em Castelo Branco) ou ia para o Magistério ou ia para
enfermagem. Grande parte dos meus colegas...a gente
dividiu-se, uns foram para o Magistério outros foram para
enfermagem, no fundo para não perdermos um ano de vida.
Não podia ver sangue, não gostava de ver sangue, não
podia ir para enfermagem, fui para o Magistério. Fiz o
primeiro ano do Magistério, cheguei ao fim desse primeiro
ano fiz aptidão à faculdade (nesse ano fazia-se aptidão),
entrei... ainda tentei fazer as duas coisas, eu já
trabalhava na altura, dava explicações...não tendo
condições tive de me sujeitar, ainda vim a Lisboa nos
segundo ano, matriculei-me, tentei fazer umas cadeiras mas
era um esforço muito grande pois não podia deixar de dar
explicações...depois de um tempo conflituoso terminei o
Magistério, tive de me render à evidência e disse que
estaria como profissional cerca de 5 anos para ver o que
é que isto dava...Fui colocada no Alentejo no primeiro ano
a dar telescola, sem televisão, sem electricidade, sem
estrada, sem água, sem luz...foi uma ano de intervenção
social. Fazia-se alfabetização, naqueles anos quentes
tínhamos um grupo de intervenção social e portanto era
tudo muito quente... e aquele ano até foi interessante.
Mas eu não podia ficar no Alentejo até porque dependíamos
das pessoas. As pessoas davam-nos cama, davam-no comer...
davam-nos tudo... transportes para os transportes, enfim.
Não era uma situação em que eu pudesse continuar de modo
que fiquei outra vez na telescola em Sacavém e fui
apanhada muita vez com a televisão desligada, os miúdos
não percebiam o que estava a dar na televisão e aquilo
era aquela hora...achei que não era sítio para eu continuar.
Entretanto fiz um concurso para a CGD para trabalhar
como bancária.
Inv: Não se estava a ver como professora...
Prof: Nunca foi a minha intenção ser professora exactamente
por causa da estrutura, do sistema em que isto funcionava
Então ser professora do 1º ciclo era uma coisa naquela
altura muito complicada, estava conotada com um conjunto de
coisas... e não era só isso, era também a estrutura em que
eramos metidas, era a maneira como as escolas funcionavam,
eram as delegações mais "o chefe manda"...realmente a
estrutura do ensino era uma desgraça e eu não me estava a
ver a viver toda a vida enfiada naquela estrutura com
aquelas colegas, a viver naquele meio.
Parecendo que não, a gente passa muito tempo na escola,
parecendo que não passa-se muito tempo na escola e depois
é um meio fechado em que a gente está ali.
Entretanto optei por dar aulas do 1ºciclo,
o primeiro ano que dei a um segundo ano gostei muito
gostei muito de ver os miúdos aprender. Depois fui para
um bairro da periferia...enfim, da segunda circular mas era
com casos muito complicados e tive um conjunto de colegas,
já todas tinham tirado o Magistério mais ou menos
na mesma altura que eu, portanto comecei a contactar
com professores diferentes daqueles onde eu não me estava a
ver trabalhar e no ano seguinte fui trabalhar para uma escola
na Rua Actor Vale ao pé da fonte luminosa em que
trabalhei com senhoras que tinham 70 e 72 anos...estavam à
espera dos 72 anos para se reformar. pessoas que tinham
sido formada na escola normal superior antes do Magistério
Primário e...eu tinha um 4º ano, ela também, fizemos um
grupo...trabalhámos em grupo e...elas conquistaram-me para
isto de ser professor, porque eram pessoas que estavam nisto
hà muito tempo, tinham uma postura completamente diferente e
eu consegui perceber...além disso tive uma turma que teve
uma evolução incrível, e eu comecei a gostar de ver os miúdos
aprender. Nesse ano ainda frequentei Psicologia, fiz 4
cadeiras... fazia as duas coisas ao mesmo tempo, reentrei na
faculdade, fazia Psicologia ao mesmo tempo, mas já não aceitei
o lugar para ir para CGD porque não me estava a ver toda a
vida tratar de papéis, enquanto que o trabalho com os miúdos
era muito mais criativo e tinha muito mais a ver comigo,
com outra maneira de estar. Depois desse ano, ao fim de 5
anos decidi que ficava na profissão e a partir daí comecei
a investir em formação dentro da profissão, e comecei a
gostar de ser professora.
Inv: Queria mesmo perguntar-lhe isso, tem feito então formação
ao longo do tempo visando a valorização profissional...
Prof: Sim, portanto houve ali uns anos, quando as filhas
são mais pequenas que estamos mais presos, mas mesmo assim,
logo naqueles anos, a primeira ligação foi ao Sindicato e ao
MEM, Movimento Escola Moderna, depois reentrei outra vez na
faculdade pela terceira vez e fiz Ciências da Educação,
demorei 6 anos a fazer mas tinha duas filhas pequenas e havia
que conciliar muita coisa...depois, realmente estive um ano
que não estudei, depois entrei logo para o mestrado. Foi
sempre um grande investimento na profissão. Primeiro para
perceber onde é que andava, depois quais eram as opções,
depois onde é que se podia mudar isto da educação depois...
como é que eu me podia situar.
Inv: Isso foi a nível pessoal, e com alunos, costuma
envolver-se em projectos de natureza pedagógica?
Prof: Sim desde sempre, desde que haja possibilidades
Isto é assim, durante 18 anos fui professora vinculada,
portanto raramente estava mais de ano numa escola, de vez
em quando estava dois anos numa escola e houve um ano que
eu escolhi uma escola muito "mazinha" que ninguém queria e
eu consegui estar 3 anos com os meninos, do primeiro ao
terceiro, no quatro alguém se enganou a concorrer e eu sai.
Os primeiros investimentos desse ponto de vista com alunos
e com a escola toda foi com a Mediateca, com o Centro de
Recursos e mediateca, depois estive ligada à criação do
Centro de Recursos de VFXira, depois nos Novos Programas
fizemos um grande encontro, mobilizamos o pessoal todo,
todos os professores de VFranca foram aquele grande
encontro quando foram os programas aí em 91, 92 penso eu,
na sequência da reforma de 80 e tal, depois novamente o
Centro de Recursos de uma escola grande, do Forte da Casa
e foi o trabalho de montar um grande centro de recursos
que correspondesse a uma escola que tinha 800 alunos.
Portanto, uma escola do primeiro ciclo com 800 alunos era
uma escola muito grande, estive um ano lá em que era a
mais nova estava em apoio, mas esse trabalho deu para
montar projectos que no fundo envolviam todos os
professores, envolviam o trabalho pedagógico, mexiam com
trabalho pedagógico, gostei muito desse trabalho. A partir
da dinâmica de um centro de recursos, influenciar o tipo
de trabalho que um professor tem na sala de aulas, ou
obrigar um conjunto de pessoas a reflectir sobre como é que
as coisas se fazem na sala de aulas, quais as finalidades,
isso é uma coisa muito interessante. Depois acabei por fazer
o trabalho final em Ciências da Educação nessa área, e
realmente, sem mexer numa escola, a partir de uma destas
coisas, ou da biblioteca ou do centro de recursos é
possível mexer com os professores todos e mexer na prática
pedagógica deles...isso é possível com dinâmicas, com
estruturação do trabalho certo, organização de actividades...
Inv: Se calhar, é por isso também que veio parar à APM...
sucintamente pode dizer que cargos foi desempenhando além
deste da APM (vice-presidente)?
Prof: Começando pelo Centro de Recursos de VFXira em
que estive da direcção, na fundação, fui muitas vezes
directora e subdirectora de escolas quando
eram escolas pequenas, estive nesse projecto do Forte
da Casa, ganhei um dinheiro muito grande, na altura era
muito dinheiro num projecto de mediatecas, depois ganhei
um projecto do IIE, mas como num ano concorríamos,
apresentávamos o projecto mas o dinheiro só vinha no ano
seguinte, e nesse ano já não estava na escola, portanto o
Director devolveu o dinheiro porque ninguém assumiu...
Depois estive na APM destacada a tempo inteiro durante
dois anos, aprendi imenso, foi nos dois anos antes de
acabar a licenciatura em Ciências da Educação, aprendi
imenso, envolvi-me em imensas coisas, estive ligada ao
centro de recursos, depois entrei para a redacção da
revista onde estou até agora, também ligada ao centro de
recursos aqui da APM. Depois mantive-me no grupo do primeiro
ciclo, onde desde os encontros, às formações...enfim,
várias coisas que se vão fazendo pelo caminho sempre nesta
dinâmica. Depois fui Directora da escola onde estou.
Antes disso estive na Uarte, porque estava efectiva
na outra escola e para não voltar para trás.
Estive na Uarte um ano depois, depois um ano de
sabática e depois outra vez na Uarte. Também aprendi
imenso a nível desta coisa das TIC a nível nacional,
das autarquias, das ESE, da dinâmica da formação a partir
das ESE, era eu que estava muito responsável por esses
projectos e pelos projectos em modalidade on-line que
mobilizava imenso as escolas. Portanto foram dois anos
muito cheios, muito ricos que também deram muitos
conhecimentos.
Inv: E a Matemática, sendo professora primária tem de
ensinar também outras disciplinas, mas a Matemática, é
a disciplina que mais prazer lhe dá a ensinar, ou nem por
isso é como outra qualquer? Tem uma relação especial com a
Matemática?
Prof: Eu vim de ciências, do liceu vim de ciências e sempre
gostei da área de ciências, mas gostei mais da área de
Biologia, no primeiro ciclo dá-se muito pouco...Biologia e
Química. Depois, entrei para o MEM muito cedo e percebi as
dinâmicas do ensino da língua. Quando acabei o Magistério
era aquele método analítico-sintético e a partir de certa
altura houve um grande investimento para passar para o
método natural, e com outros colegas, isto nunca foi feito
sozinha,e com grupos, um ano tinha companhia e abalancei-me
ao método natural, achei muita piada, aprendi imenso,
estudei imenso como é que aquilo se fazia e depois havia um
grande desnível, uma grande décalage entre a forma como se
ensinava a língua, a forma como se ensinava o Estudo do
Meio e a forma como se ensinava a Matemática que andava ali
sempre a reboque. A Matemática era uma coisa que gostava
e gosto de estudar e de ensinar, essencialmente gostava
muito de ensinar e andava ali sempre...era diferente a forma
como nós montávamos actividades para os miúdos dentro da
língua e de estudo do meio, e depois no fim enfiava-se a
Matemática, isso levantava-me imensas questões. Por isso
resolvi estudar como é que a Matemática entrava
no currículo, dentro da sala de aula. Quando fiz o mestrado,
já fiz o mestrado em ensino e aprendizagem da Matemática.
Inv: Relativamente à aprendizagem, O que acha fundamental
que os alunos aprendam neste nível de escolaridade em
Matemática?
Prof: Eu acho fundamental que aprendam a pensar. Durante
muitos anos, já tenho dito às estagiárias, durante muitos
anos escrevíamos na avaliação dos alunos que era muito bom
a Matemática e mas muito fraco a raciocínio, não
tem raciocínio nenhum. Nós escrevíamos isto naqueles
boletins de avaliação...ora isto não fazia sentido nenhum.
O que é que a gente dizia quando ele era muito bom a
Matemática, quer dizer que do ponto de vista processual
resolvia tudo, fazia as contas, do ponto de vista da
mecânica, agora punha-se-lhe um problema e ele não sabia
para que lado se virar e isto não é aprender Matemática.
Não é preciso dizer que quando eu comecei a dar
aulas no Primeiro Ciclo não ensinava Matemática,
ensinava aritmética, a Matemática aparece nos
anos 90, muito mais tarde. No Primeiro Ciclo a Matemática
só aparece com os novos programas basicamente.
Inv: Mas agora o currículo parece-lhe adequado?
Prof: O novo programa que vai entrar...para o ano já vai
entrar em algumas escolas que queiram e que para o outro
ano vai ser generalizado, este novo programa está mais
ajustado mas ainda tem muita coisa que...
Inv: Então mudaria alguma coisa? Quer precisar?
Prof: Essencialmente está muito...o que é que fez...
pegou no antigo programa e mudou-lhe algumas coisas,
lavou-lhe a cara e isto em termos de ir para a
prática, de ir para o real, de entrar nas escolas vai
ser assimilado com muita facilidade. Não é muito claro
neste novo programa o tipo de trabalho que se exige e
o tipo de coisas que é preciso por as crianças a trabalhar
para se desenvolverem de uma forma equilibrada em termos
de raciocínio e em termos de pensamento e em termos de
compreensão matemática. O programa precisava de ir mais
além, por exemplo na geometria não praticamente
alterações nenhumas.
Inv: Então acha que a aprendizagem deve ser feita pela
descoberta do aluno, pondo o aluno a resolver desafios,
problemas, fazer investigações...como é que deve ser feito?
Prof: Perante um conjunto de alunos, nós temos um desafio
que é adaptar aquilo que dizemos, aquilo que queremos que
eles aprendam à natureza deles, à maneira como eles
funcionam e não nos podemos esquecer que os miúdos trazem
expectativas para a escola, portanto não há uma resposta
linear para isso. Há alunos que têm um tal nível de
expectativas que lhe sejam dadas coisas que esses alunos,
primeiro temos de lhes dar coisas para depois os conquistar
para as descobertas. Há um conjunto de alunos mais abertos,
têm um nível sociocultural diferente e aí é inteiramente
de os levar à descoberta, levá-los a sistematizar o
que descobrem e pô-los perante situações que sejam
muito desafiantes e que os levem a tirar conclusões.
Inv: Mas como é que gostaria de ensinar Matemática?
Dessa forma que acabou de dizer?
Prof: Sim, eu ensino Matemática dessa forma se bem que de
vez em quando...tenho de ter em conta os alunos que tenho
à frente, os pais que tenho à frente, as expectativas que
eles têm, e às vezes há choques que é preciso resolver.
Com o tempo, quando eu tenho os alunos quatro anos como
tem sido agora esta experiência, essas coisas vão sendo
superadas, são trabalhadas, há formas de intervir que
superam...mas nitidamente há pais que, muito traumatizados
com a sua escola, essencialmente muito traumatizados e
que depois refletem isso nos alunos e os alunos precisam
de ter alguma segurança. Primeiro é criar segurança nos
alunos e a partir daí podemos então entar... mas não se
pode entrar num trabalho destes de qualquer maneira.
Nem o tipo de trabalho de os por à descoberta ou um tipo
de trabalho de natureza mais aberta...há alunos que ficam
de tal maneira incapazes de se mexer de ...que é
contraproducente. Este tipo de trabalho tem de se ganhar
os alunos para ele. Não pode ser imposto.
Inv: Na sequência do que diz, quais são então as suas
preocupações principais ao preparar as suas aulas?
Prof: As preocupações principais é que a situação de
aprendizagem perante a qual os alunos são colocados,
essa situação tenha pontes com algumas coisas que o aluno
já tenha, com conhecimentos que o aluno já tenha, que
estabeleça ligações com conhecimentos que o aluno já
tenha e depois alicerçado em alguns conhecimentos que
já têm seja desafiante, mas que seja desafiante e que
os alunos se sintam em segurança, que sejam capazes de
corresponder. Nunca os deixar numa situação de confronto
em que eles não se sintam seguros senão era
contraproducente, senão...essencialmente tem de haver
gosto, tem de haver prazer. Eu tenho prazer e muito gosto
em vê-los crescer, desenvolver-se e mexer nas coisas com
muita vontade. É preciso que eles também se sintam à
vontade para eles estarem à vontade para os ver crescer,
para os ver raciocinar sobre as coisas é preciso que eles
se sintam à vontade então é preciso criar esse clima,
essa cultura de desenvolvimento.
É preciso depois também ter muito cuidado porque os
alunos vêm para a escola, e eu quando os apanho no
primeiro ano... são "pequenos reizinhos" e são muito rudes
e são muito cruéis uns para os outros. Ao mesmo tempo
que se faz este trabalho, do ponto de vista da relação
social, que na minha tese eu chamei normas
socio-matemáticas, há normas de respeito pela opinião
do outro, de respeito pelo desenvolvimento do outro...
Há que criar entre os alunos a capacidade de respeitar
que o outro ainda lá não chegou mas que não podem
rir-se, que não podem gozar, que têm é que explicar,
que têm é que estar cooperantes e isto leva muito
tempo a criar. Há um conjunto de normas que é preciso
seguir que não é só para a Matemática, mas na Matemática
às vezes são muito...ficam muito em destaque, porque um
miúdo diz um disparate e o outro rapidamente...
Inv: Atendendo a todas essas preocupações, era capaz
de caracterizar uma aula-tipo? como é que é uma
aula-tipo? Que tarefas faz?
Prof: Uma aula-tipo, e isso é feito por mim quase todos
os dias, é colocar as crianças perante uma situação
que pode ter origem ou numa história que leram, ou numa
situação da sala, uma situação real, ou uma situação da
vida deles, ou uma situação que eu levo, que é preparada,
e os alunos ou em grupo de dois ou em grupo mesmo, são
obrigados a questionar essa situação. Ou eles colocam
questões, algumas vezes, ou quando eu quero a coisa um
bocadinho mais desembaraçada já eu levo as questões
colocadas...isso não pode ser sempre igual.
Inv: Mas na maneira de apresentar as coisas...ao longo
do tempo tem sofrido alterações ou tem sido feito sempre
da mesma forma?
Prof: Não, tem sofrido muitas alterações. E depois
dos alunos trabalharem é discutido...põem à discussão o
sitio onde chegaram. Podem não ter chegado a uma solução,
mas podem por à discussão o raciocínio, como é que
pensaram sobre a situação. Ou podem ter chegado a várias
soluções ou podem ter chegado por diferentes caminhos e
esses caminhos são todos mostrados, depois escolhemos o
caminho mais económico, aquele que nos dá mais gosto,
aquele que a gente percebe melhor, que é comum a todos,
isto no sentido de caminhar para...como a Matemática
funciona tradicionalmente, porque no fundo a Matemática
já está de tal maneira tão apurada que já tem formas muito
económicas de funcionar, agora os alunos vão chegando lá.
Inv: Falou como costuma organizar os alunos...gosta mais
de os organizar em grupos de dois, três, quatro grupo-turma...
como é que isso funciona?
Prof: Há tempos de trabalho em turma, há sempre tempos
de trabalho em grande grupo. Há trabalho em grupos de
dois, depois do que é solicitado e da natureza da tarefa.
Podem ser grupos de dois ou grupos de quatro. Eles estão
normalmente na turma em quatro grupos, quatro mesas, quatro
grandes grupos.
Nem sempre funcionam os grupos, às vezes partem-se os
grupos ao meio, mas também há grupos que nem todos os alunos
acompanham neste tipo de trabalho, portanto vamos gerindo
conforme, consoante o que se pretende, mas normalmente há
uma descoberta em grupo, e mesmo se não é bem um trabalho
de grupo, que isso exige que só tem um resultado final,
um papel em comum...podem conversar entre eles.
Inv: Na gestão das aulas e relativamente às tarefas que
propõe, costuma disponibilizar materiais diversos como
os manipuláveis, sólidos ou o que seja para envolver os
alunos de uma maneira mais efectiva? E o manual é muito
utilizado?
Prof: Eles em princípio têm muito material na sala e
depois tenho aqui o centro de recursos, posso levar
tudo o que me faz falta, normalmente a partir do terceiro
ano passam todos a ter calculadora para explorar, para
investigar. É uma maneira de usar a tecnologia, normalmente
para fazer em pouco tempo 100 operações, para chegar, para
retirar uma conclusão. Imagine que quer tirar uma conclusão
que a soma de dois ímpares é sempre qualquer coisa...ou
que um número quadrado é sempre a soma de dois ímpares...
Têm de se fazer muitas operações e eles nunca chegam à
demonstração, eles vão por exaustão, têm de fazer muita
coisa em pouco tempo, nesse caso a calculador a mobilizada.
Depois têm muito material manipulável, todo o que precisam,
estruturado e não estruturado, têm tampinhas, têm essas
coisas...o manual serve normalmente para fazer trabalho de
casa. Dentro da aula são discutidas algumas situações,
levantam dúvidas, quando não percebem, para reinterpretar
algumas questões, fundamentalmente é para trabalho de casa.
Inv: em geral, como ocupa a maior parte do tempo da aula,
com que tipo de actividade? na resolução de exercícios,
exposição...
Prof: Não, não. O que ocupa mais tempo é mesmo este trabalho
de procura de soluções para um problema e depois a partilha
das soluções encontradas e de sistematização de um caminho que
seja comum à turma toda que seja partilhado.
Inv: Não é portanto, claramente em exercícios repetitivos.
Prof: Não raramente eles fazem exercícios. Fazem exercícios
mas em tempo de trabalho autónomo no PIT no chamado PIT.
Quando sou eu a organizara a aula toda, eu deixo um tempo
ao fim do dia... têm um trabalho forte de manhã, têm um
trabalho forte das 11 ao meio dia, têm um trabalho forte à
uma e um quarto e depois até às três e um quarto há ali um
tempo em que eles fazer as suas fichas e que ganha quem
tiver mais coisas pintadas... eles aí fazem muito.
Inv: Nesse clima de aprendizagem que vai criando, gostaria
de perceber se considera que de algum modo as tarefas
investigativas podem contribuir par uma melhoria das
aprendizagens, ou isso não é relevante?
Prof: Eu acho que as tarefas...nem todas as tarefas que eu
proponho são investigativas, mas as investigativas têm um
grande contributo e têm um grande contributo porque
obrigam os alunos a pensar para todos os casos e a dizer
" e se..., e virando, e se puder, e será que já fiz tudo o
possível?", ora isto obriga a um trabalho muito grande da
parte dos alunos e principalmente obriga-os a virar a
situação ao contrário, a ver a situação do fim para o
princípio e pensar na situação no seu contexto todo, e
isso é muito importante para os alunos.
Quando eles começam a agarrar o tipo de dinâmica de uma
tarefa investigativa e começam a trabalhar dessa maneira,
depois nas outras situações todas eles começam a colocar
essas questões todas, "então e se...", imaginemos, estamos
a ver o terço ou a ver..."então e se fosse o sexto, se fosse
o quarto..."e esse tipo de questões que eles colocam a si
próprios é que é fundamental.
Inv: Mas a implementação de tarefas investigativas de forma
regular é complicada ou até por haver constrangimentos
acaba por não o fazer tantas vezes como gostaria?
Prof: Tento fazer pelo menos uma vez por semana nos alunos
de 2º, 3º, 4ª ano. No primeiro ano é diferente, investigam
muita coisa mas às vezes não é bem ainda...mas tentamos
fazer uma vez por semana. Às vezes é mais do que eu
gostaria, se eles me colocam noutra situação qualquer uma
questão e já estão eles a colocar a questão e a conjecturar
e nunca a deixo fugir, agarro-a logo, essas são as que dão
mais luta, normalmente tenho esse cuidado. Também faço
alguma gestão entre isso e o desenvolvimento de projectos,
e o desenvolvimento de projectos demora mais do que um dia,
arrastam-se um pouquinho mais no tempo. E preciso conciliar
isto tudo, e depois é preciso dar situações problemáticas
para desenvolver, no fundo, as ferramentas necessárias para
depois se conseguirem fazer as investigações efazerem os
projectos. Isto tem de ser muito bem caldeado para se
chegar lá.
Inv: E acha que as investigações contribuem para que o
aluno tenha uma visão da Matemática diferente, para mudarem
de algum modo a opinião que têm da Matemática?
Prof: Sim, desse ponto de vista tem muito peso, porque
estes alunos não têm ainda muito bem formada uma
opinião sobre a Matemática, eles transmitem, eles
reflectem a opinião que os pais têm. Os mais pequenino,
o no que eles nos trazem para a sala é a opinião dos pais,
é o reflexo, é aquilo que os pais lhes dizem. Quando
a gente começa a trabalhar e os miúdos começam a sentir-se
muito potentes a resolver certas situações a opinião
deles altera-se e depois começam eles próprios a
querer colocar questões e andar para a frente e
sentem-se capazes de fazer muita coisa e isso é muito
importante até porque o que mais acontece é um choque
com os pais indirectamente. É um choque quando não aparecem
as contas em pé, é um choque quando eles começam a ter um
grande raciocínio mental sem fazer contas e os pais não
percebem como é que aquilo acontece, nem como é
que eles fazem e portanto há que fazer sessões de
esclarecimento aos pais. Isto tem de ser muito
acompanhado. Para se ter este tipo de trabalho, e
para que os pais não tenham muita influência,
porque às vezes os pais têm tendência a ensinar as contas
em pé, os algoritmos muito cedo, e a dizer-lhes que
assim é que se faz, e como os pais não encontram
solução para aquilo que os miúdos levam para casa,
porque às vezes têm preguiça de fazer...e pedem aos pais
para partilhar, os pais aí não encontram solução, não
se sabem desembaraçar e primeiro que tenham à vontade
para dizer "eu não sei"...a esta altura que eu já tenho
um ano e meio de trabalho com eles...já me escrevem no
caderno, "professora, não sei esta lição..." ainda
hoje me apareceu e então eu explico lá, explico à menina,
e agora chegas a casa e explicas à mãe. É para haver
alguma relação, isto exige um trabalho bem “caldeadinho”
com os pais, porque se não sentem-se inseguros e
transmitem insegurança aos miúdos.
Inv: E ao nível das TIC, quando lhe é possível, utiliza as
TIC ou não lhe é muito possível? Tem motivação para o fazer?
Prof: Motivação não me falta. Quando estou em casa às vezes
perco-me naqueles sites...depois digo, não tenho nada disto
sistematizado, havia imensas coisas que os miúdos podiam
fazer, se eu levasse esta situação isto dava-me saltos
muito mais avançados mais rapidamente com as crianças...
a verdade é que na escola não temos computador ligado à
internet. Já tive trabalho sistemático com as TIC porque
tínhamos sete computadores ligados à internet e portanto...
a turma tinha treze alunos e portanto era possível fazer
isto regularmente. Com estes alunos o ano passado iniciei
um processo muito acelerado, todos têm mail, tenho uma
plataforma Moodle, os pais alguns estão lá inscritos...
mas depois quando quero trabalhar isso na sala de aulas,
mesmo para uma reunião de pais tenho de levar a minha
internet, às vezes funciona outras vezes não, depois às
vezes há projector e às vezes não. E estes últimos anos,
até pelas condições em que as escolas estão metidas por
todas as leis que saíram, nestes últimos anos as escolas
foram avassaladas, submergidas por um conjunto de leis, e
então a maneira como isso está a ganhar forma nas escolas,
cada vez se tem menos acesso, cada vez tenho menos acesso
às TIC. Não sei se está bem se está mal, mas a verdade,
o que acontece é isto.
Inv: Mas a utilização das TIC, sempre que possível e
quando o faz...que conclusões tira para si ao nível da
aprendizagem, contribui para uma melhoria das aprendizagens
ou torna-se irrelevante?
Prof: Com as TIC, nós podemos envolver os alunos em
situações muito desafiantes e que contribuem para muitas
aprendizagens em simultâneo. Há uma situação que tenho
pena ainda não ter feito com estes alunos mas que ainda
vou montar que é...existem possibilidades na internet de
fazer alguns jogos que dão pontos, da ordem dos duzentos,
cento e tal, duzentos e tal, trezentos e tal...e eu não
lhes ensinei o algoritmo...e agora cada um joga três jogos...
e agora têm de saber os resultados. Esta situação em que
têm de saber quantos pontos é que eu tenho a mais que o
outro, é uma situação extraordinariamente desafiante,
extraordinariamente envolvente, eles arranjam todas as
estratégias e mais uma para perceber como é que se juntam
pontos, ou como é que se subtraem, ou como é que...qualquer
coisa.
Existem aplicativos na internet e existe o excel...
tenho uma vizinha que foi lá para casa e disse para a
minha filha, "deixa-me brincar com o x grande verde"
porque e tinha-a posto um dia destes a brincar como o x
grande verde, e os meus alunos também gostam de brincar
com o x grande verde. Eu abro-lhes uma tabela e eles põem
os números, e depois têm de por de 5 em 5, de 10 em 10...
e no fim da tabela toda feita, aquilo imprime-se e aquilo
está ali uma relação para eles...ou pintam, ou seleccionam,
ou põem a cor. Isso são coisas fundamentais em que eles
estão a estabelecer as relações todas da multiplicação,
das relações entre os números de uma forma automática, não
é preciso mais nada.
Inv: Torna-se difícil implementar de forma regular as TIC,
mas essa dificuldade não passa pela motivação, passa pela
gestão dos recursos materiais. E a nível do tempo que lhe
ocupa na aula? Por aí não haveria problema, tem só a ver
com a gestão material...
Prof: Sim. Até porque os alunos estão muito habituados a
que, os alunos estão a trabalhar em grupo, e há um ou
outro que sai e vem passar o seu texto em computador, está
lá a lista, ele deixa de fazer o que está a fazer e vai
fazer aquilo. Pode haver uma tarefa ou outra que ele não
faz como os outros, e como só há um computador ou dois,
temos de nos optimizar, temos que rodar e eles desde que
se habituem a esse ritmo não têm problema. Agora vieram
os Magalhães...não se podem ligar a um projector...
Inv: Perguntei-lhe se as investigações podiam mudar a
visão que os alunos tinham sobre a Matemática, agora
gostaria de perceber se utilizando as TIC na
aprendizagem da Matemática, podem ou não as TIC mudar
a opinião que os alunos têm da Matemática? Podem
contribuir para uma visão que têm da Matemática?
contribuem de forma efectiva?
Prof: Sim se forem trabalhadas de certa maneira, nem
todos os trabalhos com as TIC... a visão que os alunos
têm da Matemática tem a ver com a visão que o professor
tem da Matemática, a maneira como o professor encara a
Matemática. Se o professor encarar de certa maneira,
tanto faz utilizando TIC como não utilizando TIC. Já
vi as TIC serem muito mal utilizadas, o ME subscreve
um site que tem múltiplos exemplos da Matemática
pessimamente mal posta em prática com as TIC nomeadamente
com quadros interactivos que é o R21, se for ao R21, tem
lá exemplos bastante lamentáveis e ... está ali.
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