matthews, roger - o mito da punitividade
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O mito da punitividade
Roger Matthews
London Southbank University, Reino Unido
Introdução
A área tema da criminologia sempre foi caracterizada por controvérsia e debate. Entretanto, nesses
últimos anos, esse debate parece ter dado lugar a um consenso pouco articulado. Um dos pontos principais desse
consenso é a crença de que testemunhamos uma onda de punitividade. Na verdade, a afirmação de que a política
recente de controle do crime está dominada por mentalidades punitivas parece ser aceita de modo predominante
por criminólogos acadêmicos. Há uma divisão entre aqueles que enxergam essa onda de punitividade emergir
desde “baixo”, dirigida pelo público em geral, e aqueles que a veem como um processo, em essencial, de “cima-
para-baixo”, no qual políticos ambiciosos e manipuladores jogam com medos públicos e ansiedades para pegar
pesado contra o crime e aumentar sua base eleitoral.
Um dos primeiros contribuidores dessa literatura é Anthony Bottoms (1995), que, em um artigo sobre
políticas de sentenciamento e filosofia da punição, esboça a noção de “punitividade populista”, a qual afirma ser
um dos principais componentes do sentenciamento e política penal, junto com preocupações com direitos
humanos, comunidade e formas de gerencialismo. De modo significativo, entretanto, é em relação à
“punitividade populista” que esse artigo tem sido com mais frequência citado por criminólogos.
David Garland (2001) também incorporou as noções de punitividade e populismo em seu relato da
natureza cambiante do controle do crime na sociedade contemporânea, tomando-os como processos
relativamente autônomos, embora relacionados. Garland defende que há agora uma tendência mais populista na
política penal, de forma que a voz dominante dessa política não é mais aquela dos especialistas ou mesmo dos
operadores, mas de um público muito sofrido e mal-servido. Garland afirma que testemunhamos um “giro
punitivo”, o qual é responsável por promover:
Sentenciamento mais duro e amplo uso do aprisionamento, “three strikes” e leis de sentenças mínimas compulsórias; “verdade no sentenciamento” e restrições no livramento condicional; prisões “sem regalias” e “prisões austeras”; retribuição nos juizados juvenis e o aprisionamento de crianças; a volta da “leva-de-forçados” e da punição corporal, dos campos de treinamento e de prisões de segurança máxima, a multiplicação de penas capitais e execuções; leis de notificação comunitária e registros de pedófilos, políticas de tolerância zero e medidas contra comportamento anti-social. Há agora um longa lista de medidas que aparecem para simbolizar um giro punitivo na penalidade contemporânea. (Garland, 2001: 142)
Em uma variação sobre esse tema, John Pratt (2002) afirma que a punitividade populista está ganhando
terreno e que um novo eixo de poder penal emergiu sob os auspícios de um programa político neoliberal; “no
qual a indiferença do público em geral está cada vez mais cedendo lugar à intolerância e demandas por
2 manifestações ainda maiores de punição repressiva” (2002: 182). Pratt vê o processo mais em termos de um
público ansioso que postula crescentes demandas a uma burocracia estatal reticente. Citando exemplos similares
aos oferecidos por Garland, Pratt vê a introdução da leva de forçados, registros de pedófilo e novas formas de
estigmatização como exemplos perturbadores da introdução de formas mais “ostentatórias e emotivas de punição
(Pratt, 2000).
Loïc Wacquant (2000), como Pratt, identifica o neoliberalismo como um fator chave no encorajamento
de uma resposta mais punitiva, mas apresenta uma abordagem mais de cima-para-baixo. Para Wacquant, o
aumento na punitividade é exemplificado pelo desenvolvimento do encarceramento de massa nos EUA e os
crescentes números de Afro-americanos aprisionados. Defende que a expansão da prisão tem pouco ou nada a
ver com as taxas de crimes, mas que veio substituir o gueto como uma instituição para conter e controlar os
negros da classe baixa, uma vez que a gerência penal da pobreza passa a substituir a seguridade social. A prisão
emerge como uma instituição de contenção forçada em função da crise do gueto e como um dispositivo de
controle de casta. Entre a prisão e o gueto afirma-se que há uma “equivalência funcional, homologia estrutural e
fusão cultural, que desova em um continuum carcerário que apanha uma população de jovens negros rejeitados
pelo mercado de trabalho desregulado” (Wacquant, 2001: 95).
Jonathan Simon (2001) oferece uma versão ligeiramente diferente da tese da punitividade. Como John
Pratt, espanta-se com a emergência de formas de punição que parecem cada vez mais severas, anacrônicas, ou
estigmatizantes, e que parecem sinalizar um novo começo na modalidade de punição ou, de forma alternativa,
representam um retorno a formas de punição datadas e fora de moda. A re-emergência de “campos de
treinamento” com sua ênfase na disciplina militar e regimes restritos é apresentada como um exemplo primário
de tal reversão (Simon, 1999). Como Wacquant, enxerga as medidas penais como desproporcionalmente
dirigidas aos pobres e aos grupos de minorias étnicas, criando uma “porta-giratória” em que membros desses
grupos passam repetidamente através da prisão durante o curso de suas vidas com consequências devastadoras
sobre indivíduos, famílias e vizinhanças (Caplow e Simon, 1999).
Simon também identifica o que vê como um desenvolvimento ainda mais perturbador em algumas
formas contemporâneas de punição que parecem ir além da simples retribuição e pretensão de proteger o público
ou reduzir o crime, para envolver formas de “crueldade” em que o objetivo é extrair prazer na dor dos outros. A
pena, defende Simon, se tornou um tipo de “teatro terapêutico”, no qual o infrator publicamente expressa
sentimentos de dor e infâmia moral. Embora não afirmando que essas manifestações de crueldade representem
uma característica dominante da penalidade contemporânea, ele vê esses sentimentos expressos de forma mais
proeminente na pena de morte, nas muito longas sentenças que destroem a vida dos apenados como as da lei de
“three strikes” da Califórnia e em uma variedade de medidas infamantes e estigmatizantes. Simon afirma,
entretanto, que a “governança através do crime” está se tornando uma feição mais pronunciada da sociedade
contemporânea e que o engajamento com a crueldade pode se tornar um novo tipo de direito distribuído pelo
governo, pois “o criminoso” passa a ser um alvo cada vez mais legítimo de hostilidade pública (Caplow e Simon,
3 1999).
Mesmo por meio desse mergulho bastante seletivo e curto na crescente literatura sobre a punitividade, há
inúmeros temas que surgem e que requerem exame. Primeiro, a definição da punitividade e sua relação com
outros conceitos chave, tais como crueldade, revanchismo e tolerância. Segundo, a questão da etiologia, que
envolve certa consideração das condições associadas com a emergência da punitividade, assim como os fatores
tidos por modelar seu desenvolvimento. Terceiro, a relação entre punitividade e outras tendências dominantes na
política penal, como o gerencialismo, que parecem envolver correntes diferentes e mesmo opostas. Quarto, o
papel do populismo nesse processo e sua relação com a política, elites e o papel dos especialistas. Quinto, as
noções de opinião pública e atitudes públicas, as quais são em geral tomadas como pontos de referência chave
para avaliar níveis cambiantes de punitividade pública. Finalmente, há a questão da investigação empírica e da
necessidade de se examinar o grau em que esse aumento percebido na punitividade é compatível com a
evidência disponível.
O conceito de punitividade
Embora o termo “punitividade” seja amplamente usado na literatura, existem poucas tentativas de defini-
lo ou desconstruí-lo. A consequência é que a punitividade permanece um conceito “fraco” e sub-teorizado. Sua
natureza bastante indiferenciada e a indeterminação geral que a cerca, entretanto, não tem sido um impedimento
para sua adoção. Na verdade, a falta geral de especificidade parece haver contribuído para seu amplo aceite, já
que parece, à primeira vista, ter a capacidade de “explicar” um amplo leque de mudanças penais.
Uma das poucas tentativas de fornecer uma “definição de trabalho” do termo “punitivo” é oferecida por
Stanley Cohen (1994: 67-8). Ele salienta que a punitividade é caracterizada por coerção, formalismo, moralismo
e a inflição de dor em sujeitos legais individuais por um terceiro. De modo interessante, sua própria visão do
controle social enfatiza os mecanismos mais sutis, menos visíveis e discretos através dos quais o controle é
realizado na sociedade contemporânea (Cohen, 1983, 1985). Cohen, como inúmeros outros teóricos do controle
social oferecem uma visão orwelliana, que reside menos nas estratégias abertas que envolvem força física ou
crueldade mental do que no aprimoramento de formas de regulação mais contínuas e menos perceptíveis.
Uma vez que sanções punitivas e emotivas em suas diversas formas são uma característica duradoura da
política penal, a questão que surge a partir da definição de Cohen é “o quê é novo”? O alcance das sanções
identificadas pelos diversos comentadores como exemplos de um “giro punitivo” realmente indicam um novo
começo ou apenas representam as formas fenomenais de um sistema de regulação cada vez mais elaborado e
complexo? A definição de Cohen também levanta questões sobre o papel de controles administrativos, assim
como formas de monitoramento e vigilância, mas, antes que tentemos responder algumas dessas questões,
precisamos retornar ao problema da definição. A noção de punitividade é mais comumente associada com
retribuição e vingança. É vista como essencialmente reativa mais do que consequencialista. Entretanto, quando a
retribuição envolve o uso da sentença menos restritiva ou a proporcionalidade estrita, e sempre que o objetivo for
4 o de limitar a severidade e duração das sanções, não é essencialmente uma expressão de punitividade – atingindo
ou não seu objetivos desejados. Ao mesmo tempo, estratégias de sentenciamento que são concebidas para
proteger o público através da incapacitação ou dissuadir infratores potenciais podem envolver níveis mais altos
de intervenção, mas tais medidas não estão primordialmente preocupadas com o aumento do grau de punição em
si infligido sobre indivíduos, embora bem possam envolver números maiores de pessoas sujeitas à intervenção
formal. De modo similar, a busca de estratégias reabilitativas pode levar a formas de regulação mais prolongadas
e intensivas. Na tentativa de se fazer mais bem, é sempre possível, como os críticos repetidamente indicam,
causar mais mal. Embora seja difícil distinguir entre essas racionalizações diferentes na prática, é necessário
diferenciar, no tanto quanto possível, essas justificações para a punição, pois, do contrário, um aumento no
alcance e intensidade de intervenções formais – qualquer que seja sua lógica ou objetivo subjacente – pode ser
interpretada como uma expressão de punitividade (O'Malley, 1999).
O termo “punitividade”, em geral, carrega conotações de excesso. Isto é, a busca da punição além e
acima daquela que é necessária ou apropriada. É, assim, mais do que distribuir “just deserts”i. Envolve a
intensificação da causação de dor, seja por estender a sua duração ou a severidade da punição acima da norma.
Para colocar de outra forma, a noção de punitividade sugere um uso desproporcional da sanção e, assim, um
desvio do princípio da proporcionalidade. Para essa afirmação ser sustentada, entretanto, seria necessário
demonstrar que sentenças aplicadas a crimes particulares ou a certos tipos de crimes têm aumentado, já que, sem
qualquer ciência da severidade dos crimes relevantes e o passado infracional dos envolvidos, tais asserções não
têm base nenhuma. Na verdade, a separação de uma consideração detalhada do crime e da vitimização e sua
relação com a punição inevitavelmente faz as sanções impostas parecerem arbitrárias.
Esse aspecto da definição também levanta questões sobre mudanças nas expectativas normativas e
sensibilidades públicas cambiantes. Se, por exemplo, um tipo particular de atividade, tal como a violência
doméstica, muda nas percepções públicas, deixando de ser um assunto “privado” para que mereça sanções legais
formais, ma medida em que a sanção dirigida aos infratores seja considerada apropriada e não excessiva, não
podemos identificar tal mudança como um exemplo de punitividade. Categorias legais estão, claro, mudando
continuamente, assim como são os processos de criminalização e descriminalização. Há também o hiato entre o
“direito no papel” e o “direito em ação”ii e a aprovação de legislação que é concebida para ser simbólica ao invés
de prática. Como devemos ver mais tarde, inúmeras dessas sanções, que emergiram em anos recentes e que têm
sido apresentadas como exemplos de punitividade, são, em grade medida, simbólicas. Para afirmar um aumento
da punitividade, seria necessário distinguir entre conceitos cambiantes de adequação e aquilo que constitui
punições desproporcionais ou excessivas. Ao mesmo tempo, devemos distinguir entre as penalidades que têm
sido introduzidas para proteger grupos específicos e aquelas que envolvem a intensificação de sanções
existentes.
Em muitas versões da “tese punitiva”, o uso do encarceramento é visto como um indicador crítico. É na
estratégia da segregação punitiva, especialmente quando associada à crescentes populações prisionais e
5 aumentos na duração das sentenças de prisão, que se considera que o caso da punitividade tem sua mais sólida
fundação. Na lógica dessa posição, sanções comunitárias são vistas essencialmente como não punitivas, pois
representam “alternativas” ao encarceramento. Os críticos da punitividade em geral defendem a expansão de
sanções comunitárias “inclusivas” como uma opção preferível à custódia. O fato de que, tanto no Reino Unido
como nos EUA, o número de pessoas condenadas a “alternativas” comunitárias aumentou na mesma proporção
que o encarceramento nas duas últimas décadas – e em alguns casos mais rápido – sugere que assistimos a
expansão simultânea de sanções “punitivas” e “não-punitivas” (Caplow e Simon, 1999). Isso para não mencionar
a rápida expansão das estratégias de monitoramento e vigilância que não são nem inclusivas nem excludentes,
mas, ao invés, oferecem um leque de medidas, que são em geral vistas como alternativas à punição. Poderíamos
também fazer referência às formas de “justiça informal” que se desenvolveram durante os anos oitenta e que têm
sido reinventadas sob a rubrica de justiça restaurativa (Matthews, 1988; Daly, 2002).
Como inúmeros críticos já indicaram, mais do que constituir uma alternativa intrinsecamente progressiva
ou não punitiva a formas de controle formais e segregativas, a justiça informal ou restaurativa implica a criação
de maior pluralidade de praças de adjudicação, que no final das contas serve para expandir e aumentar o sistema
existente de controle do crime – embora envolvendo a erosão de direitos e garantias legais (Santos, 1987;
Ashworth, 2003). Em casos de “ampliação da rede” ou a formalização de sanções antes informais, o uso de
medidas “não-punitivas” pode, claro, acarretar a expressão de respostas mais punitivas.
É visível como muitos analistas do controle social negligenciam os desenvolvimentos “não-punitivos” na
política penal. Da mesma forma, há bem pouco comentário crítico quando a população prisional se estabiliza ou
decresce, como ocorreu no Reino Unido no fim dos anos oitenta e em outros países europeus na década passada
(Tonry, 2001). Por razões similares, a queda das taxas de crime, que marca um dos mais significantes divisores
de águas na história do crime em memória recente, recebeu relativamente pouca atenção tanto de criminólogos
como dos meios de comunicação (Blumstein e Wallman, 2000; Karmen, 2000). É também o caso de que, menos
de uma década atrás na Inglaterra e em Gales, cerca de 20.000 pessoas por ano eram encarceradas pelo não
pagamento de multas, de modo que cerca de um em cada cinco dos enviados para a prisão por ano foram presos
por essa ofensa. No final dos anos noventa, o número caiu para menos de 4.000, como resultado de esforços
conjuntos para afastar esse grupo da cadeia. Essa grande mudança na política penal têm sido pouco observada,
em contraste com a extensa literatura sobre a crescente população prisional e o desenvolvimento de políticas de
sentenciamento “mais duras”. Em sintonia com os meio de comunicação, muitos acadêmicos acharam que
apenas más notícias valem a pena ser contadas.
É evidente que, nas discussões das políticas penais cambiantes, há certo resvalamento entre aquelas
sanções que envolvem um aumento na inflição de dor e aquelas que implicam a emergência de punições
“emotivas e ostentatórias”. Em inúmeros relatos, esses desenvolvimentos penais se embaraçam uns nos outros,
de forma que o aumento no uso e na duração das sentenças de prisão, a re-emergência de sanções infamantes e
estigmatizantes, vigilantismo e pena de morte passam a ser vistos como desdobramentos relacionados e como
6 parte de uma nova “configuração” de controles penais nos quais a punitividade e o revanchismo desempenham
um papel principal. A punitividade e o reaparecimento de punições emotivas são em geral vistos como dois lados
da mesma moeda, mas, já que a punição tem historicamente uma função emotiva e expressiva, não é bem claro o
que mudou em anos recentes.
Na verdade, a divisão das sanções em “punitivas” e “não-punitivas” é em si mesma muito simplística e
pouco ajuda na explicação da diversidade e variabilidade das mudanças penais. Nem é adequado posicionar as
muitas sanções disponíveis em um continuum de punitividade. Assim, antes de falar de sanções penais como se
pudessem ser divididas entre dois tipos distintos, precisamos de um arcabouço conceitual para mapear o cada
vez mais complexo e maior conjunto de sanções penais. Embaralhar junto os campos de treinamento, os registros
de pedófilos, as formas públicas de infâmia e estigmatização, o encarceramento, e a pena de morte como
exemplos do desenvolvimento de um novo “campo” de sanções penais obscurece a natureza diversa, irregular e
contraditória dos processos penais (O'Malley, 1999).
Encontramos problemas similares com o termo “bifurcação”. Enxergar a esfera penal como pistas
paralelas ou sistema bifurcado, com controles coercivos e segregativos, de um lado, e controles comunitários
inclusivos, de outro, é bastante restritivo e perde a perspectiva da variabilidade e da crescente complexidade de
estratégias regulatórias. Se fez sentido alguma vez se falar de pistas paralelas ou sistema bifurcado, o
desenvolvimento de sanções intermediárias, como a integração de sanções na forma de “sentenças sem
costuras”iii ou “pacotes de sentenças”iv, cada vez mais erode a distinção entre sanções inclusivas e excludentes e
entre comunitárias e custodiais, enquanto debilita a noção de “alternativas” à prisão (Bottoms, 1995).
Em muitos aspectos, a noção de tolerância, que com frequência aparece na literatura, embora também
pouco teorizada, pode ser uma ferramenta heurística útil para tratar algumas dessas questões. A tolerância é um
termo mais dinâmico, relacional e menos rígido do que a punitividade e carrega consigo um elemento de tensão
e ambiguidade, ao mesmo tempo em que sugere mais um sentido de limite do que condenação total de certas
ações (Downes, 1988; Turner et al., 1997; Hancock e Matthews, 2001).
A etiologia da punitividade
Embora relativamente pouco tempo e esforço tenha sido gasto em identificar com precisão o que se quer
dizer por punitividade na literatura, um pouco mais de atenção foi dada à tentativa de identificar as condições de
sua emergência e desenvolvimento.
Há, desnecessário dizer, variação considerável nos tipos de história oferecidas para se dar conta do surto
percebido na punitividade. Entretanto, seguindo Foucault, tornou-se moda produzir “histórias do presente”.
Considera-se que essas genealogias evitam os problemas do determinismo, estrutura e livre-arbítrio, da essência
e aparência, assim como também o inquietante tema da causalidade. Os processos que foram identificados como
desempenhando um papel chave no aumento da punitividade são: o declínio do bem-estar, com sua ênfase em
necessidades e inclusão social; a morte do ideal de reabilitação como a principal razão para a punição e o
7 aprisionamento; o “desarraigamento” das relações sociais; o crescimento de “insegurança ontológica”; a
fragmentação de comunidades; crescente individualismo; a emergência de novos estilos de gerencialismo, assim
como o advento da “sociedade de risco”. Todos são vistos individualmente ou em combinação na produção de
um mundo (tardo-moderno) caracterizado por uma sensação cada vez maior de insegurança e ansiedade entre
diferente setores da população. Nesse mundo incerto, afirma-se que sentimentos populistas dão uma guinada
para o lado mais punitivo do espectro, resultando em uma mudança pública e política para a direita. Além do
mais, o crescimento dos meios de comunicação de massa é visto como elemento crítico para estimular
sentimentos públicos e criar as condições nas quais retribuição e vingança podem ser mais prontamente
expressas.
Existe uma certa lógica e evidente apelo nesse tipo de explanação. Mas o salto de condições sociais e
estruturais cambiantes para asserções de crescente punitividade, entretanto, é muito veloz e muito incerto. Não
está claro, por exemplo, que todos esses processos estejam se movendo na mesma direção ou que mudanças nas
relações sociais envolvidas estejam necessariamente pressionando para o aumento de punições emotivas ou
punitivas. Poderia-se esperar que essas mesmas condições criassem formas de retraimento, fatalismo ou
encorajar uma mudança em direção a estratégias mais administrativas ou gerenciais, nas quais sentimentos
morais e a inflição de dor física e mental tivessem um significado decrescente.
Loïc Wacquant (2001) tenta explicar o surto de punitividade e o desenvolvimento da crescente
desproporcionalidade racial no interior de um sistema prisional e carcerário rapidamente expansível como
função de inúmeros fatores interconectados, incluindo o declínio do Estado keynesiano de bem-estar, o advento
do pós-fordismo, o surgimento do neoliberalismo e o fracasso do gueto na contenção e controle dos negros
pobres americanos nas áreas decadentes das cidades. Por conseguinte, defende que tem havido uma mudança no
tratamento da pobreza nos Estados Unidos do social para o penal, em que a prisão se torna um aparato
substitutivo destinado a manter os pobres negros americanos “em seu devido lugar”. Esse relato estrutural
funcionalista, entretanto, deixa de explicar especificamente porque essas medidas penais recebem destaque no
período atual ou porque a prisão deveria substituir o gueto como lugar principal de controle. Na primeira
instância, há inúmeros países ocidentais de capitalismo avançado que experimentaram um declínio na provisão
de bem-estar, uma transição para o pós-fordismo e o surgimento do neoliberalismo, mas não experimentaram um
aumento em suas populações prisionais. Em segundo lugar, ver o gueto e a prisão como equivalentes funcionais
é perder o sentido de especificidade do lugar e do significado social e impacto de diferentes formas de exclusão.
Há indícios de uma crescente proporção de minorias étnicas nas prisões europeias, mas não há o mesmo passado
de criação de hiper-guetos que foi uma característica da paisagem urbana americana nas últimas décadas
(Abrecht, 1997).
Pode não haver dúvidas de que todos esses fatores estruturais estão em jogo em alguma medida, mas o
ponto da análise é mostrar as conexões causais, mais do que apenas afirmá-las ou inferi-las. O que, em um
primeiro olhar, parece uma análise histórica e institucional sofisticada se mostra ser, em uma análise mais detida,
8 uma forma mais crua de funcionalismo mecânico que está apoiada por aquilo que foi habilmente descrito como
política monocromática (Anderson, 2002). Nesse relato altamente conspiratório, há pouca consideração sobre
livre-arbítrio ou sobre divisões no interior de classes e grupos raciais que podem ser encontradas nas áreas
decadentes da cidade.
David Garland (2001) é menos otimista sobre a possibilidade de se “derivar” mudanças na natureza da
punitividade de mais amplas mudanças estruturais. Na verdade, embora apresente um relato de
desenvolvimentos internacionais no controle do crime, ele presta atenção só de passagem às mudanças
substanciais que ocorreram nas relações produtivas das mais avançadas sociedades capitalistas ocidentais em
anos recentes (Matthews, 2002). Ao invés, ele afirma, seu objetivo é identificar os elementos distintivos que são
capazes de transformar condições estruturais oscilantes em escolhas políticas específicas. Um fator chave nesse
processo, ele sugere, são as mudanças nas posturas e experiências das classes médias profissionais. Embora
grupos sociais diferentes tenham experimentado “insegurança ontológica” pelas últimas duas ou três décadas,
são as classes médias educadas e os profissionais do setor público, como afirma, quem seriam os principais
apoiadores do bem-estar penal, mas que recentemente vieram a fazer a pressão por uma maior punitividade.
É uma explicação nova, mas no final das contas pouco convincente. Embora possa haver pouca dúvida
de que as classes médias educadas foram economicamente “espremidas” em anos recentes e cada vez mais
expostas ao crime direta e indiretamente pelos meios de comunicação de massa, os dados sobre a nova
distribuição da vitimização, no Reino Unido ao menos, indica que ela se tornou mais concentrada e compactada
entre os pobres e vulneráveis (Trickett et al., 1992; Hope, 2001). É o pobre, desamparado e marginalizado que
sofreu o pior do aumento da insegurança de emprego, da ruptura de comunidades estabelecidas e de sistemas
informais de controle. De modo significativo, em relação à afirmação de que as classes médias educadas têm se
tornado mais punitivas, Garland não apresenta provas reais de tal mudança. Embora cite pesquisas de opinião
pública que indicam um surto geral de punitividade, ele não apresenta prova substantiva de uma mudança de
comportamento no grupo que afirma ser a principal força nesse desdobramento.
Se tão dramática mudança de atitudes tivesse ocorrido nas classes médias, poder-se-ia esperar que
tivesse sido traduzida na criminologia acadêmica. Entretanto, com exceção de bem poucos criminólogos
conservadores americanos, a grande maioria de criminólogos profissionais defendem uma versão de
reducionismo ou abolicionismo e permanecem profundamente associados à alguma forma de liberalismo. Na
verdade, a maioria esmagadora de criminólogos não defende sentenças mais severas ou maior uso do
encarceramento. Ao invés, enxergam a si mesmos como um corretivo do público punitivo e políticos
manipuladores. São os jornais sensacionalistas, e seu impressionante número de leitores, junto com políticos
inescrupulosos que são repetidamente acusados pelas mudanças recentes na política penal – não os leitores dos
jornais tradicionais.
De maneira interessante, classes sociais aparecem em inúmeros outros relatos da emergência da
punitividade, embora com ênfase bem diferente. Em contraste com Garland, Bottoms afirma que uma das
9 características distintivas da sociedade contemporânea é o declínio relativo da classe como um diferencial social
e uma crescente ênfase em “cidadãos” e “consumidores”, com noções de igualdade atribuídas com maior
frequência em relação à raça, gênero e política de grupos de pressão.
A versão da história de John Pratt, por outro lado, baseia-se bastante no trabalho de Norbert Elias, que
enfatiza o papel central das classes altas na promoção do “processo civilizador”. Entretanto, na análise de Pratt
dos desdobramentos atuais, fala-se da erosão das solidariedades de classe e tende-se a se referir ao “público em
geral” e à “opinião pública” na modelagem da política penal e geração do populismo penal. Seguindo o trajeto
de Elias, a análise de Pratt envolve uma combinação de evolucionismo, elitismo e historicismo e, de modo ainda
mais importante, parece ter um poder explicativo limitado nos desenvolvimentos recentes do controle do crime
(van Krieken, 1989; Vaughan, 2000). O aparente aumento de punitividade é visto como um tipo de reversão na
“lógica da história” ou um processo descivilizatório; enquanto punições “emotivas e ostentatórias”, assim como
novas formas de monitoramento e vigilância, não se encaixam confortavelmente na trajetória de Elias (Pratt,
1998). De forma indicativa, Jonathan Simon (2001) expressa sérias reservas sobre o valor e relevância
explicativos da análise de Elias, enquanto David Garland (1990), que tinha antes expressado seu apoio a essa
abordagem, parece em escritos recentes achá-la muito menos convincente (Garland, 2001). Malcolm Feeley e
Jonathan Simon (1992) veem as dimensões de classe de estratégias de controle recentes em termos distintamente
diferentes do que esses outros autores. Para eles, a política penal tem sido cada vez mais condicionada por uma
crescente divisão entre a sociedade tradicional e a “subclasse”, e na sociedade de risco são os marginalizados e
despossuídos que são vistos como crescentemente o objeto de sanções penais punitivas. Há, entretanto, amplo
reconhecimento entre historiadores que a prisão moderna, desde seu começo no século 19, tem se preocupado
desproporcionalmente como o aprisionamento do “lumpemproletariado”, as “classes perigosas”, os pobres e os
fracos. Assim, a sugestão de que, sob a influência do atuarialismo, o encarceramento se dirige à “subclasse” não
parece significar uma mudança relevante. Ao mesmo tempo, está claro que a prisão foi historicamente dirigida
para certos grupos sociais e indivíduos específicos no seu interior. Dessa forma, a afirmação de que estamos nos
afastando de um foco sobre indivíduos para grupos é difícil de se sustentar, assim como a própria distinção
grupo/indivíduo nesse contexto.
Essas várias histórias não oferecem um relato consistente ou convincente da emergência e
desenvolvimento da punitividade e, como John Braithwaite (2003) argumentou, “histórias do presente” tendem a
não se interessar por aqueles ramos de desenvolvimento histórico que morrem antes do presente. Também nessas
“histórias” há pouca discussão das tensões, conflitos e lutas sobre a implementação e desenvolvimento de
políticas. Isso é particularmente problemático, dada a centralidade das classes nessa literatura.
Consequentemente, histórias se tornam unidimensionais e, embora nos seja dito de maneira repetida “que
poderia ter sido diferente”, é difícil ver a partir dessas fontes oferecidas como poderia ter sido de outra maneira.
Há uma deprimente sensação de inevitabilidade incrustada na análise, como se todos os caminhos conduzissem
ao presente punitivo. Assim, o que parece, à primeira vista, ser uma crítica liberal das políticas e práticas
10 existentes pode se converter rapidamente em uma defesa conservadora do status quo. A imprecisão que circunda
o conceito de punitividade é composta por formas de compreensão histórica que falham em identificar os
mecanismos específicos que poderiam explicar o “giro punitivo”.
Poder-se-ia esperar que, como muitas dessas tentativas para identificar as condições históricas associadas
à punitividade situam-se na “modernidade tardia”, houvesse certo engajamento e exame das mais amplas
mudanças estruturais que ocorreram nos anos recentes relacionadas com a globalização, a re-estruturação do
mercado de trabalho e o advento da “sociedade da informação”. Embora alguns autores prestem alguma atenção
a esses desenvolvimentos, e façam certa referência à mudança estrutural, a relevância e impacto dessas
mudanças é comumente inferida mais do que explicada.
Punitividade, gerencialismo e risco
A introdução de novos estilos de gerencialismo durante as últimas duas décadas e o papel que
desempenharam na formulação do sistema de justiça criminal têm sido amplamente noticiados (Brownlee, 1998;
McLaughlin et. al, 2001). Considera-se que essas formas de gerencialismo se desenvolvem juntamente com a
punitividade, embora sejam com frequência tomadas como desdobramentos contrastantes que envolvem
dinâmicas diferentes e mesmo opostas. Uma das modalidades através das quais essa nova forma de
gerencialismo é expressa é através da justiça atuarial baseada na análise de risco.
Como Anthony Bottoms (1995) indica, há uma tensão entre as afirmações de que experimentamos
maiores níveis de crueldade e punitividade, com ênfase na intensificação de formas moralistas e cruéis de
punição, por um lado, e a asserção simultânea de que testemunhamos a ascendência da justiça atuarial que opera
em uma base predominantemente administrativa, se apresentando como moralmente neutra, por outro. Assim, a
mudança em direção ao que Malcolm Feeley e Jonathan Simon (1992) chamam de a “nova penalogia”, com sua
ênfase nas análises de risco, envolve, argumentam, uma mudança relevante não apenas na linguagem da política
penal, mas também em seus objetivos e práticas. Assim:
A ação governamental contra a atividade criminal, mesmo quando misturada com funções punitivas tradicionais, está cada vez mais sujeita a padrões constitucionais diferentes porque, ao invés de se enfatizar os objetivos de justiça pública, enfatiza os objetivos de gerência do risco. É preventiva mais do que responsiva. Procura não punir, mas excluir aqueles com proclividades criminais. (Feeley e Simon, 1994: 185)
Essa passagem defende que preocupações e concepções tradicionais sobre o crime e punição estão
cedendo lugar à estratégias menos preocupadas com a reforma individual do que com o gerenciamento de certos
grupos e populações particulares. Isso envolve a adoção de medidas administrativas impessoais, formas de
análises de sistemas e cálculo utilitário. O objetivo, como se sugere, não é nem punir nem reabilitar, mas
gerenciar. A partir dessa posição, haveria um decréscimo relativo nos níveis de retribuição e expressões de
vingança, crueldade e punitividade, que seriam cada vez mais substituídas por estratégias gerenciais mais
11 impessoais. Mas Feeley e Simon (1992) afirmam que, apesar do advento da “nova penalogia”, punitividade e
crueldade estão também se tornando mais proeminentes. Assim, em determinado momento, a “nova penalogia”
é tida por estar na ascendência e substituir a “antiga penalogia”; em outro, é tida por estar oferecendo as
condições para sua sobrevivência e expansão. Assim, a terminologia da “nova penalogia” e “antiga penalogia”
parece inapropriada – de modo particular quando se considera que esse processo envolva uma mudança de
paradigma mais do que sirva apenas como uma contribuição para um leque cada vez mais diverso de sanções
(Feeley e Simon, 1994). Embora possa haver pouca dúvida de que formas de análise de risco se tornam mais
prevalentes no sistema de justiça criminal, a lógica da justiça atuarial não explica adequadamente o aumento
percebido na punitividade, nem o amplo interesse pela justiça restaurativa, nem a crescente ênfase na
reabilitação em suas várias formas, tanto dentro como fora das prisões (Zedner, 2002).
Feeley e Simon (1992) tentam encaixar um círculo em um quadrado ao afirmar que: “A lógica atuarial
da nova penalogia dita a expansão do continuum de controle para uma gerência de risco mais eficiente” (p. 457).
Essa afirmação levanta inúmeras outras questões. Primeiro, seria um exagero sugerir que análises de risco ditam
uma expansão do continuum de controle, uma vez que tal expansão já estava em andamento antes que as análises
de risco se elevassem a um nível de maior relevância. Segundo, não é claro porque a justiça atuarial deveria
“requerer” tão aumentado, pesado, dispendioso e, em geral, contra-produtivo sistema de controle do crime.
Análises de risco em suas várias formas, entretanto, são uma parte da matriz penal e ganharam terreno
principalmente porque se conectam com certos aspectos do gerencialismo e porque críticas acadêmicas e
políticas foram silenciadas (Jones, 1996; Clear e Cadora, 2001; Silver e Miller, 2002). O fato de que essa
pseudo-científica empreitada mascara um moralismo e subjetivismo tenuemente velado, enquanto oferece uma
bastante limitada contribuição para a melhoria da segurança comunitária, passa a ser reconhecido por
administradores públicos mas apenas com atraso por criminólogos (Hudson, 2003).
Jonathan Simon (1993) estava entre os primeiros a apontar que uma contribuição fundamental para o
aumento da população prisional nos EUA em anos recentes foi o incremento de práticas gerenciais que envolvem
o encarceramento de um relevante número de infratores da liberdade condicional. O fato de que mais de 30 por
cento das admissões em prisões estaduais e federais nos EUA são violações do livramento condicional é assaz
pertinente para explicações do aumento da população prisional americana (Petersilia, 2003). O que se depreende
é que se não fosse pelas consequências imprevistas de se adotar uma política mais rigorosa de aplicação da lei
em relação à violação do livramento condicional ou da infringência de penalidades comunitárias, populações
prisionais nos EUA estariam estabilizando ou mesmo diminuindo (Blumstein e Wallman, 2000) Também sugere
que uma proporção considerável do crescimento da população prisional é um resultado imprevisto de práticas
gerenciais mais estritas do que um surto de punitividade. Essas formas de gerencialismo não são necessariamente
baseadas no risco. Podem ter pouco ou nada a ver com com avaliações de risco ou justiça atuarial e mais com a
busca de indicadores de performance e um compromisso mais rígido com o alcance de cotas e objetivos
estipulados.
12 Outro indício de um nível importante de transcarceramento foi apresentado em um recente relatório da
Human Rights Watch (2003), que descobriu que as prisões estaduais nos Estados Unidos estão cada vez mais se
tornando um repositório para os portadores de sofrimento mental, com três vezes mais pessoas portadoras de
sofrimento mental nas prisões do que em manicômios. Um estudo mais aprofundado da Associação Correcional
de Nova Iorque (2003) descobriu que metade dos detentos em confinamento solitário seriam identificados com
grave transtorno mental, enquanto a quarta parte em sistemas de trancafiamento disciplinares seriam parte dos
encargos dos serviços de saúde mental. Há claros indícios de que o sistema prisional falha ao atender aos
problemas desses detentos e em muitos casos os tornam ainda piores. Em relação ao Reino Unido, não há falta
de exemplos de prisões sendo usadas como repositórios para a contenção daqueles para quem os serviços
médicos e de bem-estar não estão disponíveis (Carlen, 1998; Birmingham, 1999). Apesar de perturbadoras como
são essas descobertas, elas indicam que um fator significante que contribui para o crescimento da população
prisional não é apenas a punitividade exacerbada em relação a infratores, mas, antes, o amplo uso da prisão
como um aterro para aqueles que o Estado não é capaz ou não deseja oferecer cuidado e apoio adequado.
A difusão do gerencialismo pode também ser vista como em oposição ao foco sobre punições emotivas.
A principal mudança na política penal não tem sido tanto em direção a punições expressivas e emotivas, mas no
desenvolvimento de estilos mais administrativos e impessoais de regulação. O pós-bem-estar tem sido tomado
como prenúncio do “pós-emocionalismo”, com uma preocupação cada vez menor com as necessidades e
mentalidades dos sujeitos e um foco em novas formas de behaviorismo, por meio de monitoramento e vigilância
aliados a uma crescente preocupação com “o que funciona?” e um compromisso formal com a busca de políticas
comprovadas (Tilley, 2001).
Populismo, política e elites
O conceito de punitividade e a noção de populismo como apresentados na literatura criminológica
recente têm duas coisas em comum – ambas são sub-teorizadas e ambas carregam conotações negativas.
Considera-se que populismo veio para o primeiro plano nas últimas duas ou três décadas e deslocou
gradualmente as elites profissionais que antes assumiam responsabilidade pelo desenvolvimento da política
penal (Ryan, 1999; Garland, 2001).
Considera-se que o populismo alimenta o “giro punitivo” porque o público nutre sentimentos punitivos
arraigados. Esses sentimentos, argumenta-se, eram antes mantidos sob controle por um grupo afável e
esclarecido de especialistas. Entretanto, em anos recentes, o público em geral tem sido capaz de expressar suas
visões de maneira mais aberta e influenciar o desenvolvimento da política penal. Vigilantismo e demonstrações
públicas de hostilidade contra pedófilos, por exemplo, são com frequência tomadas como indicadores de uma
arraigada punitividade pública. Essa tenuemente velada punitividade, argumenta-se, é encorajada e ventilada
pelos meios de comunicação de massa que procuram por bodes-expiatórios e inimigos adequados para os quais
dirigir sua atenção, estimulando a preocupação do público e, assim, maximizando índices de audiência e vendas
13 de jornais.
Nessas representações, pouco se reconhece as várias formas que o populismo pode tomar e seus
componentes tanto progressistas como reacionários. Como defendeu Margaret Canovan (1999), o populismo não
é intrinsecamente “retrógrado” ou forma patológica de mobilização política. Ao invés, deveria ser visto como
uma sombra projetada pela própria democracia. Formas de populismo que tem apoiado políticas progressistas
são menosprezadas e o público é percebido como uma força em grande medida reacionária nutrindo
ressentimentos e animosidades, enquanto a relação entre o populismo e novos movimentos sociais e políticas
democráticas é ignorada (Arditti, 2003). Nem há muita discussão sobre as formas em que o populismo tem sido
mobilizado para limitar a opressão estatal, promover igualdade e defender direitos humanos. Como nos caso de
Stephen Lawrence e Rodney King, correntes populistas desempenharam um papel crítico no confrontamento da
injustiça.
Entretanto, reconhecer as muito diferentes direções políticas que o populismo pode tomar não é
sobrevalorizar o papel que o populismo desempenhou na determinação da política penal. As demandas gerais
que os membros do público podem expressar de tempos em tempos são filtradas, modeladas e moderadas antes
de serem traduzidas em política penal. As complexidades da formação de políticas são tais que seria inocente
atribuir seu desenvolvimento a puro populismo. No tanto em que o populismo em suas várias formas
desempenha um papel, tende a tomar a forma daquele que tem sido descrito como populismo “ventríloquo”, que
envolve políticos que falam em nome do povo contra interesses setoriais (Jessop, 1988).
A sugestão de que houve um declínio dos especialistas profissionais no modelamento e implementação
da política penal está equivocada. Pode haver mudanças na composição das elites e daqueles que formulam a
política penal, mas esse papel permanece amplamente nas mão de profissionais e especialistas. De modo
relevante, análises de risco têm sido desenvolvidas por elites profissionais apesar do fato de que sua linguagem e
práticas não ressoem com o público em geral (Feeley e Simon, 1994).
Pode ser o caso de que elites burocráticas antiquadas tenham sido deslocadas em alguma medida por
novas formas de governança e novos organismos de tomada de decisão. Está longe de ficar claro, entretanto, que
esses novos organismos sejam mais escrutináveis ou acessíveis do que administrações anteriores. O que está
claro é que, no interior de um sistema de justiça criminal em contínua expansão, temos visto uma proliferação de
todos tipos de especialistas que são tanto capazes de influenciar a criação de políticas como mediar demandas do
público. Incluem não apenas os especialistas já estabelecidos, tais como psicólogos, terapeutas sexuais,
toxicólogos e educadores, mas especialistas que estão preocupados com considerações muito mais amplas
relacionadas a diferentes aspectos de estilos de vida. Ademais, arquitetos e designers, ambientalistas, urbanistas e
outros profissionais, que previamente tinham pouco interesse nesses assuntos, agora desempenham um papel
cada vez mais central. Além disso, a proliferação de parcerias multi-agências significa que um leque amplo de
agências tem agora interesse no desenvolvimento de políticas e práticas de controle do crime. O fato de que
muitos desses especialistas vistam jeans e moletons ao invés de ternos e gravatas não os tornam nem um pouco
14 menos especialistas nem menos influentes (Cohen, 1994).
Em termos políticos, considera-se que a ascensão do neoliberalismo e a flutuação para a direita do
espectro político explicam o “giro punitivo”. Reagan, Thatcher e Bush são vistos como os principais atores nesse
processo, seguidos de perto por Clinton e Blair, que, em um esforço para não serem superados por seus
oponentes políticos, expressaram sentimentos punitivos similares. Há, claro, um elemento de verdade nessa
proposição, mas apresentar todos esses líderes políticos e seus partidos como promotores de variedades
diferentes da “punitividade populista” confunde mais do que explica.
Apesar de toda retórica de se “pegar pesado” e o foco na “lei e ordem” durante o governo Thatcher, o
número de pessoas enviadas para a prisão anualmente ao final da década era menor do que em 1980. Além do
mais, a média diária da população prisional caiu em direção ao final dos anos 80. Durante aquela década, dois
Ministros do Interior introduziram esquemas de livramento antecipado, os quais libertaram milhares de
prisioneiros. Foi durante o mesmo período que assistimos a uma redução considerável do encarceramento
juvenil, já que o delinquente juvenil se tornou um “recurso escasso” no Reino Unido (Pratt, 1985; Graham,
1989). Como bons monetaristas, o governo Thatcher percebeu que a prisão era “uma forma dispendiosa de tornar
piores pessoas ruins”. Ao mesmo tempo, engajaram-se em um grande programa de construção e reforma de
prisões, o qual envolveu uma grande melhora das condições em muitas prisões e praticamente o fim das celas
sem água encanada. A década de oitenta também testemunhou o começo de uma série de programas de televisão
sobre a vida e as condições nas prisões, que ofereceram um novo nível de consciência e informação sobre o
anteriormente fechado mundo do aprisionamento.
Não foi até o começo da década de 90 que a população prisional da Inglaterra e do País de Gales
começou a decolar. Embora houvesse alguma continuidade entre as políticas de se “pegar pesado” do governo
Conservador e o “ser duro com o crime” do recém chegado governo do Novo Trabalhismo, quase não há dúvida
de que as políticas de controle do crime desenvolvidas por esse novo governo expressem decrescente apoio ao
uso do encarceramento. Representar a atual política penal predominantemente em termos de punitividade
implica um fracasso em se apreciar a diversidade e ambiguidade da política governamental recente (Crawford,
2001). Há mensagens mistas e imperativos concorrentes que emanam de fontes oficiais. Em um momento, fala-
se de medidas alternativas e desencarceração, e, em outro, de mais rigorosa aplicação das sanções. Por exemplo,
o relatório Halliday incorpora vários objetivos aparentemente conflitantes e defende, ao mesmo tempo, a busca
de uniformidade e flexibilidade, rigidez e discricionariedade, enquanto advoga expediência e justiça social
(Home Office, 2001).
Mesmo um breve exame de publicações governamentais recentes na Inglaterra e no País de Gales sobre
o sentenciamento e a política penal indica a crescente antipatia com a expansão da prisão e o reconhecimento,
em geral, das consequências do aprisionamento para os indivíduos, famílias e comunidades. Um tema central e
recorrente nos documentos oficiais recentes é a noção de exclusão social (ver Young e Matthews, 2003). O
influente relatório, por exemplo, da Unidade de Exclusão Social (2002) sobre “Reduzir a reincidência de ex-
15 prisioneiros” expressa a visão de que, enquanto o aprisionamento pode ser justificado para infratores perigosos,
violentos e persistentes, o encarceramento de muitos daqueles atualmente presos serve para compor uma história
de exclusão.
Um número cada vez maior de relatórios oficiais publicados no Reino Unido durante os últimos anos
poderia ter sido formulado por criminólogos radicais ou críticos dos anos 80 – e alguns o foram. Propostas
recentes para limitar o tamanho da população prisional incluem a desencarceração de infratores cumprindo
sentenças de menos de 12 meses, a expansão de programas de livramento antecipado e a introdução de custódia
intermitente. Há uma contínua ênfase formal sobre usar a prisão como último recurso, apenas quando outras
opções de sentenciamento tenham sido exauridas. O tom dessas publicações governamentais sobre as prisões e a
política penal é, em geral, defensivo e, às vezes, apologético. O aprisionamento não é anunciado como uma
opção positiva, mas um mal necessário (Morris, 2004).
Como Mick Ryan (1994) sugeriu, a natureza do populismo no Novo Trabalhismo é significativamente
diferente do que as formas de populismo que foram estabelecidas no Thatcherismo. No Novo Trabalhismo,
considera-se que indivíduos e comunidades têm um dever de participar na redução do crime e contribuir para a
criação de comunidades mais seguras. A ênfase na civilidade não deveria ser descartada como apenas uma
“estratégia de responsabilização”, mas deveria, ao invés, ser tomada como uma tentativa de estender a
democracia participativa e aumentar o envolvimento público na elaboração de políticas públicas. Ampliar o nível
de participação ativa na formulação política poderia encorajar mais moderação nos debates sobre o controle do
crime, não menos (Johnstone, 2004).
Uma nota sobre a opinião pública
A noção de opinião pública é um ponto e referência central na literatura da punitividade. Entretanto,
como se têm indicado com frequência, há sempre o perigo de que, ao invés de reportá-la, os cientistas sociais a
construam (Osborne e Rose, 1999). Muitos desses estudos fracassam em distinguir claramente entre diferentes
aspectos da “opinião pública”, tais como conhecimento, atitudes e sensibilidades, nem explicam porque as
pessoas mantém certas opiniões e quão firmemente aderem a elas (Durham, 1993; Hancock, 2004).
Ao invés de demonstrar uma inclinação para a punitividade, as pesquisas de posicionamentos públicos
sobre o sentenciamento e a punição têm repetidamente demonstrado que os respondentes apoiam múltiplos
objetivos para a condenação. Expressões de retribucionismo coexistem junto com apoio para a reabilitação,
assim como para outras opções de sentenças. Os cidadãos defendem uma abordagem mais equilibrada para o
crime, que envolveria uma mistura de punição, reabilitação e proteção pública (Cullen et al., 2002). Dados
coletados por Russell e Morgan (2001) para a Revisão do Sentenciamento do Ministério do Interior oferecem
poucos indícios de que o público quer um serviço de condicional mais duro. Em seu lugar, querem um serviço
eficiente que reduza a probabilidade de que aqueles em condicional venham a reincidir. Descobriu-se que:
16 As respostas mais comuns dos membros do público à questão aberta: “O que se deve atingir com a condenação?” não incluem as palavras “punição”, “dissuasão” ou “reabilitação”, termos que em geral são tomados por resumir os objetivos da punição. As respostas mais comuns são “parar de delinquir”, “reduzir a criminalidade” ou “criar uma comunidade mais segura” sem qualquer articulação de como a condenação deveria atingir esse resultado. Em geral, as pessoas não são vinculadas a uma filosofia de punição particular; elas apenas querem que algo seja feito que mude o comportamento dos infratores. (Morgan, 2002: 221)
John Doble (2002), um dos principais pesquisadores americanos nessa área, argumenta que, por causa da
concentração nos elementos punitivos dos ânimos públicos e uma falta de apreciação da diversidade e
variabilidade dessas visões, “a opinião pública foi mal interpretada pelas ditas autoridades e líderes políticos” (p.
149). Ele cita evidência de que a ênfase seja a mudança de sentenças prisionais longas para a prevenção e
reabilitação. Não obstante, a mútua referência cruzada e o comentário acrítico de inúmeros criminólogos
ajudaram a reificar a “punitividade” como um fato social. Infelizmente,
Uma vez construída, realidades sociais são difíceis de se desconstruir. Nos Estados Unidos, a visão dominante de que o público é exclusivamente punitivo tem o potencial de constranger a busca de políticas progressistas alternativas em muitas jurisdições. Políticos e demais elaboradores de políticas públicas interpretam mal, de maneira desafortunada e persistente, as visões públicas sobre o controle do crime. (Cullen et al., 2002: 143)
Para alguns comentadores, como Jonathan Simon, a tendência para políticas penais mais punitivas e
vingativas é vista como um reflexo de uma mudança mais básica nas atitudes públicas. Entretanto, há uma outra
corrente contrastante que juntou forças no Reino Unido no período pós-guerra, a qual envolve crescente
intolerância com a maioria das formas de violência interpessoal. Assim, a violência doméstica, endêmica mas
muito ignorada até os anos setenta, o estupro no interior do casamento, ataques raciais, abuso infantil, crimes de
ódio, bullying, assim como várias formas de assédio e intimidação têm cada vez mais se tornado um motivo de
preocupação e foco de intervenção. Há também maior oposição no Reino Unido à disciplina parental contra
crianças por meio de golpes e palmadas. Na verdade, têm ocorrido algo como uma “revolução silenciosa” em
comportamentos sociais em relação a violência interpessoal pelos últimos 20 ou 30 anos, mas essa história ainda
aguarda ser escrita.
Avaliando os indícios empíricos
Costuma-se sugerir, ou ao menos deduzir-se, que a crescente população prisional durantes os anos 90,
especialmente em um período de taxas decrescentes de criminalidade, pode ser atribuída a uma onda de
punitividade, quer seja populista ou não. Níveis de aprisionamento, entretanto, podem ser influenciados por uma
variedade de fatores que incluem perfis democráticos cambiantes, diferenças na distribuição do crime e
vitimização, taxas de solução de casos, taxas de condenação, a disponibilidade e uso de sanções não-custodiais,
assim como pelo emprego de mecanismos de livramento antecipado (Zimring and Hawkins, 1991). A influência
17 desses fatores precisaria ser avaliada antes que se façam quaisquer afirmações de que o aumento da população
prisional se daria em função da punitividade. Caso contrário, tais asserções permanecem puramente
especulativas e gravitam ao redor do empiricismo.
Já para os vários exemplos de punitividade que têm sido apresentados de maneira repetida na literatura,
os indícios empíricos disponíveis sugerem que sejam limitados em tempo e espaço ou, de outro modo, sejam
mais simbólicos do que reais. Se olharmos para as leis de "three strikes" e de sentenciamento obrigatório e
presuntivov, por exemplo, descobrimos que seu impacto têm sido consideravelmente menor que o esperado.
Apesar de toda a publicidade e previsões de crescimento espiral da população prisional nos EUA, as leis de
"three strikes" tiveram muito menos impacto em juízo, cadeias locais e prisões estaduais, com exceção da
Califórnia, do que aquilo que foi antecipado (Shichor e Sechrest, 1996). Seu impacto foi amplamente simbólico,
e quando implementadas, serviram apenas para consolidar a legislação existente (Austin et al., 1999).
Tem havido pouco interesse no sentenciamento presuntivo fora dos EUA e, embora haja algum debate no
Reino Unido, nenhuma diretriz foi adotada. De maneira similar às leis de tempo mínimo obrigatório existem,
mesmo nos EUA, amplas cláusulas de exceção que permitem aos juízes impor uma outra sentença (Tonry, 1999).
Nos últimos anos, 25 Estados aboliram as leis de sentenciamento mínimo obrigatório, aceleraram o livramento
condicional, aumentaram o “bom tempo” prisionalvi e desviaram infratores para tratamento (Greene, 2003). Na
Inglaterra e País de Gales, apenas oito condenados por violação de domicílio foram sentenciados ao mínimo de
três anos dos dispositivos introduzidos por Jack Straw em 2000. Do mesmo modo, a sentença mínima obrigatória
de sete anos para a terceira infração de tráfico de drogas somente foi usada na Inglaterra e País de Gales três
vezes desde sua vigência (Travis, 2003). Assim, parece que os membros do judiciário simplesmente não
implementam as políticas de sentenciamento que consideram ser inapropriadas.
Enquanto os campos de treinamento se tornaram cada vez mais populares nos EUA durante os anos 90,
apenas uma instituição experimental para jovens baseada nesse modelo foi introduzida na Inglaterra. Esse
projeto piloto foi montado em Colchester em 1996 por Michael Howard. Foi, no entanto, fechado pelo governo
trabalhista em 1998, antes mesmo de ter sido plenamente avaliado. Oposição a esse estabelecimento
experimental não veio só de políticos, mas de diretores de penitenciárias, grupos de reforma de prisões e até
mesmo do Exército. A razão formal dada para o fechamento do estabelecimento foi a de que seria muito caro e
faria pouco para diminuir as taxas de reincidência (Farrington et al., 2002).
Enquanto existe muito debate sobre regimes de prisão “austeros” e “sem regalias”, ocorre que, ao menos
na Inglaterra, as condições prisionais em geral melhoraram durante as últimas duas décadas, particularmente em
relação aos serviços de saneamento, dieta e saúde. Mais tratamento, programas recreativos e educacionais foram
ofertados junto com esforços para permitir aos prisioneiros mais tempo fora de suas celas em algumas prisões
(HM Inspectorate of Prisons, 2003). De modo significativo, há um número crescente de casos em que guardas
prisionais são suspensos ou dispensados por comportamento brutal contra detentos na Inglaterra e País de Gales
e tem também havido uma maior preocupação com a vitimização de prisioneiros (Dodd, 2001). Pode ser que
18 esses relatórios reflitam níveis cada vez maiores de abuso e violação de direitos dos prisioneiros, mas também
sugere que tem havido uma mudança nas respostas oficiais em relação ao tratamento de prisioneiros e que
alegações de maus-tratos e vitimização estejam mais propensas a serem tratadas com seriedade.
No Reino Unido, as antigas prisões locais vitorianas, entretanto, permanecem desoladoras e, em geral, as
instituições mais superlotadas. No entanto, apesar dessas “lixeiras penais”, mesmo os mais ardentes críticos do
aprisionamento no país tiveram que reconhecer, de má vontade, que tem havido algumas melhorias significativas
nas condições prisionais em anos recentes. Nas prisões de “novo design”, coloca-se ênfase na redução do
número de funcionários, aumento da vigilância e desenvolvimento de funções automatizadas. O que a maioria
dos prisioneiros nessas instituições acha problemático não é tanto a brutalidade dos guardas, mas os longos
períodos de tempo em que se encontram confinados em suas celas e a falta de contato interpessoal.
Muito se tem falado das campanhas que foram conduzidas e da legislação que foi aprovada para tratar do
assunto dos pedófilos. Referência contínua foi feita aos eventos em Paulsgrove em 2000vii. Esse “pânico moral”
foi, entretanto, relativamente efêmero, apesar dos esforços concentrados dos tabloides para perpetuar e aumentar
a preocupação pública. Houve pouco debate sobre esse tema no Reino Unido nos últimos anos e parece haver
diminuído a atenção na agenda social e nos meios de comunicação. De modo similar, a muito citada reaparição
das “levas de forçados” parece ter sido limitada a certos Estados sulistas dos EUA e parece ser uma política
idiossincrática e fugaz.
O uso acentuado da pena de morte nos EUA é visto, de modo compreensível, como uma indicação de
punitividade pública e sentimento de crueldade. No entanto, há sinais de que o crescente apoio ao uso ampliado
da pena de morte nos EUA durante os anos 90 começa a declinar. Nova legislação tem sido aprovada em
inúmeros Estados, atendendo à preocupação cada vez maior com condenações equivocadas. A influente
Associação Americana dos Advogados (ABA) adotou uma resolução, em 1997, que estabeleceu diretrizes para
minimizar o risco de que inocentes fossem executados e, em 2000, o presidente que assumiu a Associação emitiu
apelos por uma moratória nas execuções. A Assembleia Psiquiátrica Americana também pediu uma moratória
nas execuções e essa iniciativa ganhou o apoio de grupos religiosos. De maneira indicativa, o número de
execuções realizadas nos Estados Unidos decaiu agudamente durante os últimos 3 anos, de 98 em 1999 para 66
em 2001 (Hood, 2002; Lilly, 2002). No Reino Unido, entretanto, há um clima diferente. Os debates acerca da
pena de morte ressurgiram nos anos 80, mas nunca pareceram ter apoio suficiente para justificar sua
reintrodução. Durante a última década, dificilmente se pode encontrar qualquer referência séria sobre a
possibilidade de trazer de volta a pena de morte no país, mesmo depois do muito publicizado caso de Bulgerviii ,
das revelações sobre Harold Shipmanix, o assassino em série mais prolífico na história, ou dos assassinatos de
Sohamx. O que é mais impressionante é, a despeito de uma série de assassinatos extremamente brutais e muitos
publicizados, quão tolerante o público tem sido.
A introdução do policiamento “tolerância zero” no Reino Unido também foi efêmero. Como nos EUA, o
grau de sua adoção e implementação nunca foi claro (Stenson, 2000; Braithwaite, 2003). O termo “tolerância
19 zero” é um pouco errôneo e seria mais precisamente descrito como “tolerância seletiva”, já que o policiamento
envolve seletividade e discrição. Onde o policiamento de “tolerância zero” foi introduzido no Reino Unido,
resultou em altos níveis de reclamações contra a polícia e, em um caso, com a remoção de um oficial de alto
posto associado com essa abordagem. Em seu lugar, ganhou proeminência um policiamento mais comunitário e
orientado por problemas e formas privatizadas de patrulhamento.
Na República da Irlanda, muitas dessas mudanças, que são tidas por sinalizar uma transformação
dramática na política de controle do crime, também não ocorreram. Referência à pena de morte foi apagada da
Constituição Irlandesa e não há nenhuma “sensação de crise perpétua”. Nunca houve um declínio no ideal de
reabilitação, enquanto a retribuição não emergiu como um objetivo político generalizado. Ao invés,
desenvolveu-se uma política de controle do crime que, como em muitos outros países, é variável e volátil
(O'Donnel e O'Sullivan, 2003).
Mesmo uma breve revisão dos dados empíricos apresentados na literatura não oferece um caso
convincente para apoiar a afirmação de que a punitividade desempenhou um papel central em desdobramentos
recentes. Os indícios americanos são mais fortes, mas a punitividade é muito menos pronunciada do que muito
criminólogos sugerem. Existem claras indicação de excepcionalismo americano, mas vários autores, na tentativa
de dizer algo profundo sobre a modernidade tardia, querem caracterizar esses desenvolvimentos como detentores
de significado internacional (Zimring, 2001; Young, 2003).
Conclusão
Não é difícil achar exemplos do desenvolvimento e implementação de estratégias punitivas, mas há a
questão de se determinar o significado relativo de tais estratégias na sociedade contemporânea. Já que estratégias
punitivas e emotivas foram historicamente uma característica endêmica das políticas de controle do crime, existe
a necessidade de se explicar o que é novo. Sugeriu-se que a maioria dos exemplos de punitividade apresentados
representa desenvolvimentos mais extremos e excepcionais e que a maioria está limitada espacial ou
temporalmente. A punitividade e conceitos relacionados são pouco teorizados e as histórias que nos são
apresentadas são seletivas e não convincentes, enquanto conexões críticas tendem a ser presumidas ou afirmadas
mais do que explicadas.
Há uma preocupação com oposições limitadas e polaridades que não fazem justiça à diversidade,
contradições, reversões e tensões na atual política de controle do crime. Nesse mundo de duplo enfoque,
bifurcado e soma-zero de punitivo versus não-punitivo, inclusão versus exclusão, populismo versus elitismo,
“novas” versus “velhas” penalogias, processos “civilizatórios” versus “descivilizatórios”, corremos o perigo de
ficarmos perdidos em uma série de falsas dicotomias.
Embora haja a promessa de algo radical e novo aqui, a maioria desses relatos oscila entre um humanismo
liberal e o pessimismo, e até um certo ponto corre-se o perigo da dissolução no conservadorismo. Não há
programa estratégico ou político que se siga a esses relatos. Ao invés, há uma dominante sensação de fatalismo e
20 inevitabilidade. Sua insuperável limitação não é apenas que apresentem um relato parcial, exagerado ou mítico
do desenvolvimento do controle criminal, mas que essas várias abordagens não nos ofereçam ferramentas
conceituais pelas quais pudéssemos realisticamente resolver esses problemas.
O fracasso de se desenredar tanto conceitualmente quanto empiricamente os elementos constitutivos da
“punitividade” levou inúmeros criminólogos a enxergar a recente expansão da indústria de controle do crime
como uma função do desejo de se “pegar pesado”. Melhor seria ver o crescente conjunto de agências e
instituições com seus diferentes papéis, discursos e especialidades, como parte de uma rede de controle do crime
cada vez mais complexa, opaca e expansiva, que envolve um alcance diverso de estratégias intervencionistas.
Por conseguinte, há uma tendência a reduzir esses desdobramentos a uma punitividade ou populismo
subjacentes.
Se forem válidos os argumentos de que a preocupação com a punitividade é exagerada, então somos
deixados com o problema de explicar porque tantos criminólogos e reformadores penais abraçaram essa
concepção essencialmente voluntarística e fenomenalista do desenvolvimento penal. Não é tão difícil ver porque
grupos de reforma penal acham esse tipo de explicação atraente, já que lhes oferece a oportunidade de se
encarregarem da função de limitar os excessos de políticos malévolos, por um lado, e educar um público mal
informado, por outro. Criminólogos acadêmicos são também capazes de fazerem afirmações similares, enquanto
ganham os benefícios que se originam da crença de que ocupam um plano moral elevado. Entretanto, o enfoque
desproporcional na punitividade pode bem refletir sensibilidades sociais cambiantes e uma crescente
ambivalência em relação ao uso de sanções punitivas – medidas segregativas em particular. Assim, mais do que
estar na ascendente, sanções punitivas e emotivas podem, na verdade, estar se tornando cada vez mais
insustentáveis.
Agradecimentos
Gostaria de agradecer a Lynn Hancock, Phil Carney, John Pitts e os revisores do periódico por seus
comentários em versões anteriores desse artigo e por suas valiosas sugestões.
i A expressão just deserts tem origem bastante antiga no idioma inglês e pode ser melhor compreendida como “aquilo que justamente se merece” [what you justly deserve]. No contexto da punição, se refere à pena que alguém deve receber, de modo proporcional ao crime praticado. Essa expressão marcou seu retorno ao vocabulário penal durante a década de 1970. (N. T.) ii Os termos direito no papel e direito em ação referem-se à clássica distinção entre law in the books e law in action, que aponta para a defasagem entre validade e eficácia das normas jurídicas. (N. T.) iii O termo sentenças sem costuras foi utilizado aqui para traduzir seamless sentences, que consiste em punições que combinam elementos custodiais e de supervisão comunitária. Esse modelo de sentença previa basicamente a pena de prisão seguida de livramento condicional, mas passou a incorporar outros mecanismos, como a custódia intermitente, na qual períodos de prisão se alternam com períodos de supervisão comunitária. (N. T.) iv A regra de pacotes de sentença é um princípio penal em que um acusado pode ser re-sentenciado no caso de uma condenação por múltiplas infrações quando consegue reverter algumas delas por meio de apelação. (N. T.) v Sentenciamento presuntivo baseia-se nas diretrizes de sentenciamento, em que se procura respeitar a proporcionalidade entre punições e crimes, mas que também leva em consideração o histórico de delinquência do acusado. O quadro de diretrizes para sentenciamento estabelece uma sentença presumida para determinadas ofensas e graus de reincidência, mas pode ser alterada com a existência de condições atenuantes ou agravantes no caso específico. (N. T.) vi “Tempo bom” [good time] é o crédito resultante do período em que o prisioneiro se mantém com bom comportamento e que se utiliza para reduzir seu tempo de prisão. (N. T.)
21 vii Em 2000, na localidade de Paulsgrove, a divulgação pela imprensa de que um dos habitantes da comunidade havia sido condenado por pedofilia no passado acarretou a fúria da população e resultou em uma noite de vandalismo e protesto. (N. T.) viii Em 1993, James Bulger, com apenas 2 anos, foi sequestrado, torturado e morto por dois meninos de dez anos. Após intenso furor midiático, a sentença imposta aos perpetradores tornou-os os dois condenados mais jovens da história moderna do direito inglês. (N. T.) ix Como afirma-se no texto, considera-se que Harold Shipman foi um dos maiores assassinos em série da Inglaterra. Médico inglês, foi condenado em 2000 pela morte de 15 de seus pacientes, mas muitas outras dezenas de mortes são também a ele atribuídas. (N. T.) x O episódio dos assassinatos de Soham, também fonte de intenso clamor público, refere-se ao homicídio de duas meninas de 10 anos pelo zelador da escola em que estudavam. (N. T.)
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