artigo - cultura faroleira

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À BEIRA DAS ATALAIAS: Faróis de Aracaju e sua diversidade contextual. INTRODUÇÃO Davisson S. Oliveira | Eric Marcel S. Lima | Felipe do N. Rodrigues | Marcel Raely F. G. Nascimento | Roberta da S. Rosa | Thaysa Mirths A. dos Santos | Vinicius Pedra | Wendson N. Barbosa * O Homem do mar é quem mais sabe sobre a felicidade de avistar um farol. É como rever um amigo. Na costa deste nosso Brasil Continental existem centenas desses amigos feitos de luz, aço, concreto e madeira, guiando aqueles que vivem no marNey Dantas. Dentro do âmbito da Arqueologia de Ambientes Aquáticos, o referente artigo vem a tratar da temática cultura faroleira, presente no território aracajuano (ver Apêndice). Utilizando-se das evidências materiais fornecidas pelos faróis aqui estudados, da documentação escrita sobre os mesmos e a experiência das pessoas, a eles relacionados. Buscamos entender as transformações e permanências desses marcos estruturais, e o que estas representaram na realidade social de suas épocas, seja no âmbito de Sergipe, Brasil e porque não no mundo. Essa pesquisa foi pensada como parte do trabalhados desenvolvidos na disciplina arqueologia de ambientes aquáticos II, sob a orientação do professor Dr. Leandro Domingues Duran. Partindo de uma perspectiva mundial, os primeiros faróis teriam surgido na antiguidade, elaborados em formato de grandes fogueiras acesas no alto de montanhas, com intuito de sinalizar para os navegadores a presença de terra e também sobre os perigos constantemente presentes na região que eles estivessem adentrando. Com o passar do tempo e com o avanço tecnológico, os faróis como conhecemos hoje sofreram mudanças tanto na estrutura quanto na forma de iluminação. A exemplo disso temos: o uso e transformação das lentes convergentes; o combustível para se gerar luz desde a simples queima da madeira, passando óleos animas e minerais, até o gás acetileno e enfim a * Graduandos do Curso de Arqueologia Bacharelado – Universidade Federal de Sergipe.

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Dentro do âmbito da Arqueologia de Ambientes Aquáticos, o referente artigo vem a tratar da temática cultura faroleira, presente no território aracajuano. Utilizando-se das evidências materiais fornecidas pelos faróis aqui estudados, da documentação escrita sobre os mesmos e a experiência das pessoas, a eles relacionados. Buscamos entender as transformações e permanências desses marcos estruturais, e o que estas representaram na realidade social de suas épocas, seja no âmbito de Sergipe, Brasil e porque não no mundo. Essa pesquisa foi pensada como parte do trabalhados desenvolvidos na disciplina arqueologia de ambientes aquáticos II, sob a orientação do professor Dr. Leandro Domingues Duran.

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Page 1: Artigo - Cultura Faroleira

À BEIRA DAS ATALAIAS:

Faróis de Aracaju e sua diversidade contextual.

INTRODUÇÃO

Davisson S. Oliveira | Eric Marcel S. Lima | Felipe do N. Rodrigues | Marcel Raely F. G.

Nascimento | Roberta da S. Rosa | Thaysa Mirths A. dos Santos | Vinicius Pedra |

Wendson N. Barbosa*

“O Homem do mar é quem mais sabe sobre a felicidade de

avistar um farol. É como rever um amigo. Na costa deste

nosso Brasil Continental existem centenas desses amigos

feitos de luz, aço, concreto e madeira, guiando aqueles que

vivem no mar” Ney Dantas.

Dentro do âmbito da Arqueologia de Ambientes Aquáticos, o referente artigo vem a tratar

da temática cultura faroleira, presente no território aracajuano (ver Apêndice). Utilizando-se

das evidências materiais fornecidas pelos faróis aqui estudados, da documentação escrita

sobre os mesmos e a experiência das pessoas, a eles relacionados. Buscamos entender as

transformações e permanências desses marcos estruturais, e o que estas representaram na

realidade social de suas épocas, seja no âmbito de Sergipe, Brasil e porque não no mundo.

Essa pesquisa foi pensada como parte do trabalhados desenvolvidos na disciplina arqueologia

de ambientes aquáticos II, sob a orientação do professor Dr. Leandro Domingues Duran.

Partindo de uma perspectiva mundial, os primeiros faróis teriam surgido na antiguidade,

elaborados em formato de grandes fogueiras acesas no alto de montanhas, com intuito de

sinalizar para os navegadores a presença de terra e também sobre os perigos constantemente

presentes na região que eles estivessem adentrando.

Com o passar do tempo e com o avanço tecnológico, os faróis como conhecemos hoje

sofreram mudanças tanto na estrutura quanto na forma de iluminação. A exemplo disso

temos: o uso e transformação das lentes convergentes; o combustível para se gerar luz desde a

simples queima da madeira, passando óleos animas e minerais, até o gás acetileno e enfim a

* Graduandos do Curso de Arqueologia Bacharelado – Universidade Federal de Sergipe.

Page 2: Artigo - Cultura Faroleira

eletricidade; e a própria armação do corpo do farol, confeccionado a partir de rochas, madeira,

alvenaria e metálica (LIGHTING, 2013).

Para se notar a importância que os faróis têm no decorrer da história da humanidade,

temos o farol de Alexandria, como uma das sete maravilhas do mundo Antigo; construída no

ano de 280 A.C com a finalidade de sinalizar o porto de Alexandria e facilitar a navegação da

costa norte do Egito, além de servir até hoje como modelo construtivo de faróis.

Outro local que merece destaque é a torre de Hércules, este ainda preservado, com seus

atuais 57 metros de altura, existente desde o século II D.C. é um dos faróis mais antigos do

mundo em uso constante. Devido a sua importância histórico-cultural foi declarado

patrimônio mundial da UNESCO em 2009.

Utilizando-se da torre de Hércules, partimos para outra categoria aos quais os faróis

podem ser colocados, o de Monumento. Segundo Choay (apud Reis, p. 91, 2008) monumento

é o que traz à memória, o que faz lembrar algo ou alguém. Nesse caso, estaria lembrando a

importância dos faróis desde a antiguidade até os dias de hoje. Sinalizando a terra durante

intempéries e mostrando o caminho seguro a seguir, protegendo assim as vidas dos

marinheiros que se arriscam em alto mar. E relembrando as pessoas por trás de toda essa

estrutura monumental que é o farol.

Atualmente, alguns faróis são consagrados como título de patrimônio mundial pelo seu

caráter arquitetônico, sua relevância cultural para a humanidade, importância para o comércio

mundial e acima de tudo para as vidas de quem vive do ambiente marítimo, exemplo disso: o

farol da Guia que está localizado na península de Macau, na costa do mar do sul da China.

No Brasil, alguns exemplos de faróis declarados como patrimônio são: o Farol da Barra

em Salvador - BA e o Farol da Farolândia em Aracaju - SE. O Farol da Barra, construído

dentro do forte de Santo Antônio da Barra, na Bahia de todos os santos no século XVIII, após

o naufrágio do Galeão Sacramento em 1668, para auxiliar a navegação dos navios que vinham

em busca de matéria prima para a metrópole. É considerado o farol mais antigo do continente

(BAEZ, 2010, p. 6; 63-64).

No campo da arqueologia brasileira são poucos os trabalhos relacionados ao tema. Dois

exemplos que podemos citar, são: o farol do Bom Abrigo de 1886, localizado na baía de

Trapandé, no litoral sul de São Paulo e que foi alvo de pesquisa arqueológica realizada sob a

forma de uma tese de doutoramento pelo pesquisador Dr. Leandro Domingues Duran em

Page 3: Artigo - Cultura Faroleira

2008 (DURAN, 2008). E mais recentemente em 2011, através de um vistoria técnica o Farol

São Francisco do Norte da segunda metade o século XVIII, localizado no antigo povoado

Cabeço, Ilha de Arampibe, município de Brejo Grande, na região do Baixo São Francisco, se

tornou o primeiro sítio arqueológico submerso do estado de Sergipe a ser tombado, devido

aos seus diversos valores socioculturais. O mesmo desde 1998 se encontra semi-submerso e

sem condições de funcionamento (RIBEIRO, RAMBELLI; SANTOS, 2012).

FARÓIS DE ARACAJU

Para tratarmos da cultura faroleira em Aracaju, decidimos trabalhar com as três diferentes

estruturas de faróis da região. Na arqueologia elas podem ser consideradas como mega-

artefatos e entendidas como parte integrante da interpretação de uma cultura de ambientes

aquáticos. No caso do objeto de nossa pesquisa, especificamente fazem parte da cultua

marítima (DURAN, 2008, p. 94).

Se observarmos a cultura faroleira no âmbito geral, vamos nos deparar com uma grande

variedade de estilos arquitetônicos, matérias primas, graus de tecnologia utilizadas, assim

como na importância histórica que cada estilo arquitetônico agrega a seu contexto.

Dessa forma, como ponto de partida de nossas reflexões, utilizaremos de uma

metodologia comparativa, para análise desses mega-artefatos, afim de entender as diferentes

realidades as quais os faróis de Aracaju estiveram sujeitos, destacando seu nível de

importância regional, em suas diferentes épocas.

A análise comparativa vai nos permitir estudar esses baluartes da cultura faroleira,

correlacionando suas singularidades e diferenças através do contexto espacial e temporal,

visto que se tratam de um tipo especifico de cultura, e assim compartilham elementos

característicos dela. Mas ao mesmo tempo, cada qual tem seus atributos próprios, assim é

desse conjunto de informações, que retiramos nossas reflexões.

Como meio para desenvolver essa comparação, usamos os dados provenientes da

pesquisa de campo, a exemplo: fontes orais, os registros iconográficos, registros das

estruturas arquitetônicas e como estavam dispostos na paisagens, tal como das fontes

bibliográficas.

Page 4: Artigo - Cultura Faroleira

A funcionalidade dos faróis está relacionada a orientação das embarcações no ambiente

aquático, para que trafeguem de forma segura, deslocando cargas e pessoas de um ponto a

outro. Na capital sergipana, a primeira construção desse tipo, oficialmente só ocorreu a partir

de 1861, com a criação do Farol de Aracaju.

Conforme a descrição de Ney Dantas (1999, p. 39), o presidente da Província de Sergipe,

em 1854, teria remetido ao Governo uma planta com orçamento para a criação do farol na foz

e na margem direito do então chamado rio Cotinguiba ou Aracaju, localidade onde se

encontrava o território aracajuano. Em decorrência da aceitação do pedido, em 1860, foram

encomendados da Inglaterra uma lanterna (possuiu três faces, luz fixa com três tipos de cores

verde, branca e encarnada) e acessórios, que um ano depois foram acoplados a uma armação

de madeira, que passou a servir de Atalaia, tendo um alcance de visibilidade entre seis e nove

milhas náuticas (11-16 km).

Um acontecimento de âmbito nacional que precedeu a criação do Farol de Aracaju, e

esteve diretamente ligado ao processo para a criação do mesmo no litoral sergipano, foi

surgimento da Junta de Navegação. Segundo Baez (2010, p. 59), essa ação governamental

iniciou-se ainda na primeira metade do século XIX, visando um controle maior da atividade

mercante e com a segurança da navegação na costa do Brasil. O que repercutiu na

organização das Capitanias dos Portos do Brasil em 14 de agosto de 1845, instituições quem

passaram ser responsáveis pela organização e sinalização marítimas nas províncias (ver,

Decreto nº 358 de 14 de agosto de 1845).

O interesse que o Governo passou a tomar perante as questões de navegação marítima, é

justificado, a partir do momento que relembramos que o principal meio de circulação e

comercio entre o Brasil e a Europa, se dava pelo mar. E que também devido as precárias

condições da maioria das estradas, o deslocamento via costa era mais ágil. Logo, a construção

de faróis, neste período, teve um peso relevante para a organização e modernização do

transito naval, como na atividade comercial. (BAEZ, 2010, p. 60)

Para situarmos o que estava ocorrendo no século XIX, Sergipe estava em pleno

desenvolvimento urbano, comercial entre outros, sendo que 1855 já havia ocorrido a mudança

da capital de São Cristóvão para Aracaju, devido a motivos político-econômicos, o principal

deles referente ao porto de São Cristóvão que não conseguia suprir o aumento da demanda de

açúcar para o mercado exterior.

Page 5: Artigo - Cultura Faroleira

Duas décadas após sua inauguração, o primeiro farol de Aracaju em madeira ameaçava

ruir, o que sem a devida manutenção acabou por, na noite de 27 de março de 1884, ser

consumido por um incêndio (DANTAS, 1999, p.48). Vale ressaltar, que não há mais vestígios

dessa primeira edificação, visto que em decorrência dos acontecimentos relacionados a

mesma não se preservou. Como medida provisória, foi instalada uma torre temporária que

durou até 1886, quando se deu o começo do levantamento da novo farol que deveria receber o

aparelho luminoso de 3ª ordem, grande modelo (0,50 m de distância focal), encomendado em

1885, à casa de Barbier, Benard & Turenne (Paris), (DANTAS, 2002 no livro de Siqueira).

A nova torre construída, leva por características o sistema

Mitchell de construção, nome em homenagem ao seu criador

Alexander Mitchell, em 1828. O esquema consistiria numa torre esqueleto ou sobre esteio de

roscas composta por ferro fundido, um tubulão central que serve como residência (ver figura

2), apresentando estacas com parafusos (ver figura1) de 1,2m de

diâmetro com profundidade de cinco e dez metros que podia ser

parafusadas no chão, mas cujos números de bases de sustentação não

podiam ser menores que quatro, no Brasil o número de bases de

sustentação não passou de oito (DANTAS, 2000, p. 27).

Era um sistema simples e eficaz de construção de faróis duráveis em águas profundas,

bancos de lama e areia com fixação de balizas de navios de amarração. Este método foi

testado pela primeira vez em 1838, sobre o estuário do rio Tâmisa (ALEXANDER

MITCHELL, 2013).

Figura 1 – Esteio de

Roscas

Fonte: http://irishscientists.tripod.com/scientists/ALEXANDE.HTM

Page 6: Artigo - Cultura Faroleira

Fonte: http://www.leuchtturm-

welt.net/HTML/SAPK/ORIGINAL/AR

ACAJU.JPG

Dentro do território aracajuano, esse estilo de

farol adaptado a localidades instáveis, acabou por

funcionar perfeitamente aos interesses de seus

implementadores. Já que na época de sua criação, o

local ainda era repleta de dunas, um ambiente lacustre

de adversidades, que requereria muito mais

investimento e tempo, caso se quisesse um torre de

alvenaria (ver figura 2). Todavia, o transporte do

equipamento do Farol de Aracaju até o localidade de

construção não foi simples. De acordo com Ney

Dantas, no livro de Siqueira (2002), o equipamento da

torre, não foi entregue na cidade de Aracaju por

motivos de difícil acesso de embarcações de maior

calado ao porto da cidade. Assim coube a cidade de

Salvador, local de sede do Arsenal da Marinha, receber

a carga e ajudar no transporte até Aracaju, o que

exigiu muito trabalho, devido ao grande peso da

estrutura e a delicadeza dos prismas de cristal da

lanterna.

No que se refere esses prismas de cristal, outro

componente do Farol de Aracaju que se destava na época, e

ainda considerado de otima qualidade é a lente tipo Fresnel

(ver figura 3, esquema 1). Sendo um dispositivo que possui

propriedades refratoras que permitem seu uso para coletar

raios paralelos de radiação (visível ou infravermelha),

concentrando-os num único ponto denominado foco.

Esse tipo de lente se sobressaia em comparação as

demais convencionais (ver figura 3, esquema 2), devido a sua

configuração de anéis circulares concêntricos sucessivos

numa sua superfície, que proporcionam um aumento na

distância da luz emitida pela lanterna, sendo também uma

lente de espessura e volume menores.

Figura 3 - Farol de Aracaju, Século XX.

Fonte:

http://modulatedlight.org/optical_c

omms/401px-Fresnel_lens.png

Figura 2 - Exemplo Lente Fresnel (1)

e Lente Convencional (2).

Page 7: Artigo - Cultura Faroleira

Com esses aspectos apresentados, podemos aferir que a instalação de uma torre de

avançada tecnologia, que é o caso da torre de Mitchell acoplada de uma lente Fresnel,

semelhante em nível de potencial tecnológico, foi de suma importância para o

desenvolvimento do comercio marítimo sergipano com o exterior, no final do século XIX.

Já na segunda metade do século XX, o farol estava interferindo de forma direta na

dinâmica do crescimento vertical da região em expansão, uma vez que foi englobado pela

malha urbana, sendo alvo de críticas da especulação imobiliária que almejava poder construir

livremente na localidade. (DANTAS, no Livro de SIQUEIRA, 2002). Na década de 1990

devido a essas pressões, transferiram o equipamento luminoso e a responsabilidade do Farol

de Aracaju para o substituto, o Rádio Farol de Sergipe, inaugurado em 12 julho de 1991,

localizado no Bairro Coroa do Meio, na época com cerca de uma década de criação (anos de

1980), após passar pelo aterro de regiões alagadas, consequências da dinâmica da foz do rio

Sergipe (CINFORME, 2014).

Segundo Andréa Filgueiras et al (2011), no ano de 1995, o monumento foi tombado

pelo patrimônio histórico e artístico de Sergipe, numa esfera estadual através do decreto

15.242 de 21 de abril. Em 1999 a antiga torre foi incendiada criminalmente e várias

manifestações foram realizadas a favor de sua revitalização.

Durante o período compreendido entre a desativação e o início da revitalização, esse

farol se encontrava totalmente deteriorado (ver figura 4), e a área onde se implantou a atual

praça Tem. Domingues Fontes (ver figura 5) era tomada por vegetações mal cuidadas,

resultando em um ambiente impróprio para circulação da população.

A obra de restauração começou a ser executada em 2008. Antes disso, em 2006 teria

recebido uma intervenção, pelo artista plástico Fábio Sampaio, a fim de estabilizar algumas

estruturas em risco de desabar. A restauração foi custeada pelo Governo do Estado, por meio

do Banese, consistindo na revitalização da armação metálica do farol. (FILGUEIRAS ET AL,

2011, p. 16). Para isso, foi contratada a empresa especializada Jedida Projetos e Manutenções

Industriais Ltda, sediada em Salvador.

Page 8: Artigo - Cultura Faroleira

O Rádio Farol de Sergipe diferente do seu antecessor, apresenta um outro modelo

arquitetônico ligado a construção de alvenaria. Onde seu formato de torre é quadrangular com

40 metros de altura, com um aparelho luminoso com alcance de 38 milhas náuticas (70,376

km). Leva um estilo arquitetônico inspirado em construções coloniais dos séculos XVII e

XVIII, e uma pintura intermitente preto e branco (ver figura 6). Sendo que a sua estetica é

fruto de um concurso de desenho que foi realzado pelo

poder publico na rede de ensino, mostrando uma integração

da sociedade na concepção desse espaço.

Mesmo sua aparência remetendo a séculos

anteriores, esse farol moderno, vai agrupar em seu

conjunto de equipamentos, a lente de modelo Fresnel do

Farol de Sergipe que fora transferido pra ele, atuais

mecanismos de geo-referenciamento do século XXI a

partir da instalação da torre de rádio junto ao farol (ver

figura 7), que contribui especificamente no envio e

recebimento de dados, entre o farol e as embarcações,

como exemplos: GPS (Sistema de Posicionamento Global

e o GMDSS (Sistema Global de socorro e segurança

Figura 6 - Rádio Farol de Sergipe

Fonte: Davisson S. Oliveira, 2013.

Figura 5 - Farol de Aracaju após revitalização de 2009. Figura 4 - Farol de Aracaju antes da revitalização.

Fonte:

http://i222.photobucket.com/albums/dd59/titogarcez/unti

tled-11.jpg

Autor: Felipe do N. Rodrigues, 2014.

Page 9: Artigo - Cultura Faroleira

maritima, tradução do Inglês), que é um sistema

internacional que utiliza tecnologia de sistemas

terrestre e de satélite, bem como os sistemas de

radiocomunicação a bordo do navio, de forma a

assegurar alerta rápido e automático nos casos de

socorro marítimo, e de melhoria nas telecomunicações

para a comunidade marítima.

Importante notar que com o advento de

equipamentos GPS e GMDSS, orientação atráves da

luz dos farois passa a ficar em segundo plano. Prova

disso é a diminuição de investimento para desenvolver

novos tipos de lentes, no caso do Rádio Farol de

Sergipe, que o levou a permanencer com a lente do

século XIX, nos dias atuais.

No caso do Farol de São Cristóvão (ver figura 8), o terceiro dos faróis de Aracaju, a

ser estudado foi construído em 1995, na foz do rio Vaza-Barris, numa região estratégica para

evitar pontos escuros na costa, entre o Rádio Farol de Aracaju e o Farol de Mangue Seco,

informação nos passada pelo Sargento Lima,

faroleiro de Aracaju, da Marinha do Brasil,

Capitania dos Portos Sergipe.

O farol possui 40 metros de altura com

alcance de 23 milhas náuticas (42,596 km), tem sua

armação montada em pré-moldado, com sua forma

quadrangular, base branca com duas listras

encarnadas. Tanto o formato quanto as cores

identificam e distinguem os faróis entre si, assim,

como o tipo de sinal luminoso emitido que no caso

do Farol de São Cristóvão são dois lampejos

simultâneos mais um intermitente. Diferentemente

dos outros faróis citados acima este encontra-se

Figura 8 - Farol de São Cristóvão

Fonte: Davisson Oliveira, 2013.

Autor: Roberta da Silva Rosa, 2013.

Figura 7 - Vista da torre de rádio -

Rádio Farol de Sergipe.

Page 10: Artigo - Cultura Faroleira

inserido em uma região isolada do meio urbano e de difícil acesso, fator que pode justificar

sua automação e quase independência da presença do faroleiro, exceto para manutenções

esporádicas. Com isso é justificada a ausência da casa do faroleiro.

Segundo Ney Dantas (2000) antes do advento

tecnológico de automação dessas estruturas no séc. XX

era necessária a presença humana de forma constante

para que seu desempenho fosse executado

assiduamente. Em relação aos representantes da cultura

material estudada na pesquisa, notamos diferenças

pontuais a serem destacadas, como por exemplo: a casa

do faroleiro no Farol de Aracaju que foi projetada na

Europa, como uma caixa metálica integrada a torre

Mitchell (ver figura 9). Todavia, devido a estrutura ser

toda composta de ferro, poderia não existir o minimo de

conforto térmico para ser habitada em clima tropical

brasileiro, visto as altas temperaturas que talvez

ocorreriam no interior da mesma.

Ao analisar fontes iconográficas do Farol de Aracaju (ver figuras 9 e 10 mais adiante)

notamos especificidades arquitetônicas, a exemplo, a tonalidade branca caracterizada na face

externa da armação, que provavelmente serviu para diminuir o impacto das altas

temperaturas, a que estava exposto o volume metálico.

Ainda se utilizando da

ilustração (figura 10), podemos

analisar uma segunda hipótese, ao

observar o ambiente de maré no entorno

do farol, atentamos que provavelmente

seria inviável a construção de outra

residência próxima que servisse de

abrigo.

Figura 9 - Farol de Aracaju

Fonte: SILVA, 1920, p. 283.

Figura 10 – Antiga paisagem do Farol de Aracaju, antes de ser

englobado pela malha urbana.

Fonte: http://antiguidadecolecoeseartes.blogspot.com.br/search?q=Farol+de+Aracaju

Page 11: Artigo - Cultura Faroleira

O que nos leva a pensar, na possibilidade da casa do faroleiro, se não no próprio corpo

do farol, ter sido mais distante numa zona onde não fosse afetada com movimento das águas

do mar.

Em relação ao Rádio

Farol de Sergipe de 1991, o

ambiente de maré não será mais

um empecilho para a construção

de residências faroleiras ou do

próprio, pois se estabelece numa

zona urbanizada, uma vez que o

bairo Coroa do Meio, onde o

farol encontra-se localizado

passou por processos de

aterramento. Assim, o parque

arquitetônico atual deste farol é

composto pela torre de

iluminação (ver figura 6), a torre de rádio (ver figura 7) e duas casas (ver figura 11), cercados

por muros que restringem o acesso de pessoas não autorizadas pela Marinha.

No que diz respeito aos entornos dessas estruturas, podemos dizer que apresentam

semelhanças e disparidades. O antigo Farol de Aracaju e o Farol de São Cristóvão estão

localizados, cada um ao seu tempo, afastados do centro urbano e em locais de díficil acesso,

às vezes hostis à habitação contínua do homem. Enquanto que o Rádio Farol de Sergipe foi

construído em plena região urbana e um dos centros turísticos importantes da cidade.

A partir do que foi visto no decorrer desse trabalho, podemos levantar alguns

questionamentos: O porque do não aproveitamento desses momumentos para fins turisticos e

culturais? Uma vez que essa pratica já é utilizada com sucesso em outros locais do mesmo

tipo, a exemplo, como é o caso do Farol do Cabo Branco, em João Pessoa, Paraíba e o Farol

da Barra em Salvador – BA. Outro fator limitador foi a falta de referencias para o

desenvolvimento de trabalhos arqueologicos com relação ao tema pesquisado, onde esse se

configura junto com o de DURAN (2008), RIBEIRO, RAMBELLI; SANTOS (2012) como

um entre os pioneiros.

Fonte: http://antiguidadecolecoeseartes.blogspot.com.br

Figura 11: Vista das casas faroleiras – Rádio Farol de Sergipe.

Page 12: Artigo - Cultura Faroleira

Relevando o espaço temporal da construção do Farol de Aracaju para a construção de um

conjunto arquitetonico residencial, que ocorreu na decada de 1940, questiona-se onde este

faroleiro teria se abrigado durante este intervalo de tempo?

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Se tratando dos nossos faróis, percebe-se ser atribuídos novos usos sociais, tanto ao

farol como ao seu entorno. Assim, nesse artigo tentamos recuperar não só a importância

destes monumentos enquanto sinalizadores marítimos mas também como delimitadores

paisagísticos, que foram e são essenciais para a orientação do comércio marítimo e dos

pescadores tradicionais, de grande importância no estado de Sergipe. Interpretamos os faróis

como elementos formadores de uma paisagem litorânea brasileira e percebemos que

tornaram-se marcos repensados pela dinâmica social.

Sendo assim, com todas as transformações nos usos sociais verificados em nossa

pesquisa, podemos afirmar que a função antiga de um deles se perdeu em meio aos avanços

dos séculos XX e XXI, o Farol de Aracaju. Pois observamos que o mesmo ganhou novos

símbolos e sentidos, dentro de um novo contexto. Mas de certa forma continua a representar a

cultura faroleira.

O descaso das autoridades responsáveis é um dos motivos pelos quais esses se tornam

“elefantes brancos” na nossa configuração social. Fato comprovado ao tentar ter acesso ao

Farol de Aracaju, tombado como patrimônio histórico e artístico de Sergipe (de

responsabilidade desconhecida, que não da Marinha do Brasil), mas sendo impossibilitado

devido à falta de informação sobre quem detém sua guarda.

A cultura faroleira de Aracaju composta por seus representantes (ver anexo), nos

mostra que a abordagem arqueologica analisando a função, o contexto e a paisagem somados

a tecnologia, vão constituir mega-artefatos pelos quais poderemos ter a interpretação e

construção discursiva das sociedades e seus costumes em torno do mesmo.

Page 13: Artigo - Cultura Faroleira

AGRADECIMENTOS

Primeiramente, gostaríamos de agradecer ao Prof. Dr. Leandro Domingues Duran, por

ter compartilhado de seus ideais de pesquisa, nos proporcionando adentrar na temática

faroleira sob o ponto de vista da arqueologia de ambientes aquáticos.

Agradecemos ao Sargento Lima e ao Cabo Sousa por ter nos assistido durante às

visitas ao farol de São Cristóvão e no Radio Farol de Sergipe. Auxiliando na chegada e no

acesso ao interior dos mesmos e por nos ter prestado informações de suas experiências como

faroleiros que contribuíram para melhor entendimento dessa temática.

Agradecemos também a Capitania dos Portos de Sergipe por ter nos autorizado

adentrar a área militar onde estão localizados os Faróis.

Ao colega Daniel Martins Gusmão por ter aberto as portas de sua casa de modo a

complementar o registro de campo das estruturas anexas aos faróis e por ter auxiliado durante

as visitas técnicas aos faróis.

E aos demais que auxiliaram nas nesta investigação, direta e indiretamente,

contribuindo para a elaboração do trabalho.

Page 14: Artigo - Cultura Faroleira

APÊNDICE

Localização dos Farois de Aracaju - SE

Coordenadas Geográficas: Farol de Aracaju (10°58'14.32"S 37° 3'19.26"O), Farol de São Cristóvão (11°

7'48.86"S 37° 8'42.18"O) e Rádio Farol de Sergipe (10°58'10.92"S 37° 2'10.45"O).

Fonte: Google Earth, 2014.

Page 15: Artigo - Cultura Faroleira

BIBLIOGRAFIA

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sobre os Faróis Marítimos no Nordeste Brasileiro. Dissertação (Mestrado em Geografia) –

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CARON, Luana; LUNAZZI, José Joaquim. Demonstração de Imagens reais utilizando

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DANTAS, Ney. Ministério Da Marinha. Histórico de Fharoes Existentes no Brasil e

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reimpresso pelo DHN, Rio de Janeiro, 1999.

DANTAS, Ney. A História da Sinalização Náutica Brasileira e Breve Memórias. Editora:

Fundação de Estudos do Mar - FEMAR - Rio de Janeiro 2000. 838 páginas;

DURAN, Leandro Domingues. Arqueologia marítima e um bom abrigo. Tese (Doutorado

em Arqueologia) – Museu de Arqueologia e Etnologia, Universidade de São Paulo, São

Paulo, 2008.

FILGUEIRAS, Andréa; OLIVEIRA, Daniela; GUIMARÃES, Flávia; CAMPOS, Rosana;

SILVA, Rooseman. A revitalização do farol do bairro farolândia: Uma análise sobre a

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