avaliaÇÃo da qualidade de igniÇÃo para utilizaÇÃo de...

104
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE QUÍMICA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA QUÍMICA AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DE IGNIÇÃO PARA UTILIZAÇÃO DE PETRÓLEOS PESADOS E ASFÁLTICOS COMO COMBUSTÍVEIS MARÍTIMOS Antonio Fernandez Prada Junior Orientadores: Prof. Dr. Marco Antonio Gaya de Figueiredo Dr. Ricardo Rodrigues da Cunha Pinto Rio de Janeiro, Agosto, 2007

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO DE QUMICA PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM ENGENHARIA QUMICA

AVALIAO DA QUALIDADE DE IGNIO PARA

UTILIZAO DE PETRLEOS PESADOS E ASFLTICOS

COMO COMBUSTVEIS MARTIMOS

Antonio Fernandez Prada Junior

Orientadores:

Prof. Dr. Marco Antonio Gaya de Figueiredo

Dr. Ricardo Rodrigues da Cunha Pinto

Rio de Janeiro, Agosto, 2007

Livros Grtis

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Milhares de livros grtis para download.

i

P896 Prada Junior, Antonio Fernandez

Avaliao da qualidade de ignio para utilizao de petrleos pesados e asflticos como combustveis martimos. / Antonio Fernandez Prada Junior. 2007. Xviii 102 f

Orientador: Marco Antonio Gaya de Figueiredo.

Orientador: Ricardo Rodrigues da Cunha Pinto. Dissertao (mestrado) Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Instituto de Qumica.

1. leo combustvel Teses. 2. Petrleo - Derivados - Teses. 3. Petrleo como combustvel Teses. I . Figueiredo, Marco Antonio Gaya de. II. Pinto, Ricardo Rodrigues da Cunha. III. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Instituto de Qumica. IV. Ttulo.

CDU 665.637

ii

Esta Dissertao dedicada minha me

e ao meu pai. A eles devo minha formao

como pessoa, os princpios de integridade

de carter, de honestidade e de

responsabilidade nos meus atos.

iii

AGRADECIMENTOS

A Deus, sempre presente.

Aos meus pais, Antonio e Maria do Carmo, e minha irm Melissa, pelo apoio

constante em todos os momentos.

minha noiva Ana Claudia, fonte de inspirao e pela compreenso e incentivo

durante todo o perodo do mestrado.

s amigas Regina, Assuno e Vera, pela amizade, carinho e zelo inestimveis.

Aos amigos da Gerncia de Combustveis do CENPES, em especial ao Felipe,

Mirres, Rangel e Rogrio, pelo auxlio tcnico sem o qual no seria possvel este

trabalho.

Ao Juarez, Taborda, ngelo, Rafael, Pampuch, Llian, e demais colegas da

PETROBRAS, por todo o suporte tcnico.

Aos amigos Alander, Alchorne, Andr, Celso, Clara, Cludio, Edimilson, Fbio,

Fernanda, Helineia, Ktia, Luciano, Marcelo, Mauro, Roberta, Roberto, Silmara,

Tiago e Vera, pelo precioso incentivo e fundamental troca de idias.

Aos colegas de Mestrado Ana Luiza, Anglica, Beth, Bruna, Danielle, Faustino,

Juarez, Omena e Zilacleide, pelos grandes e inesquecveis momentos em sala de aula.

Este trabalho no teria sido possvel sem a especial colaborao destes.

iv

EPGRAFE

"O homem sbio se preserva hoje para o

amanh e no arrisca tudo em um dia"

Miguel de Cervantes (1557-1616)

v

RESUMO

As correntes pesadas do refino de petrleo podem ser utilizadas para a produo de

leos combustveis para uso industrial ou martimo, sendo esse ltimo conhecido como leo

bunker. Para tal, necessria a diluio dessas correntes pesadas com fraes de refino mais

leves para ajuste da viscosidade. Enquanto o uso industrial do leo combustvel vem sendo

significativamente reduzido em funo de restries ambientais, o mercado de leo bunker

apresenta crescimento importante face a expanso do comrcio martimo mundial. No Brasil,

h um aumento da produo de petrleos pesados, extrapesados e asflticos, que exigem

complexos esquemas de refino para a sua converso em fraes mais leves. Dessa forma,

ocorre uma reduo da quantidade de correntes disponveis para a produo de bunker, alm

da variao da qualidade das correntes usadas na sua formulao.

Esta dissertao avalia a utilizao de petrleos pesados e asflticos na produo de

bunker, sem a necessidade do processamento tradicional em refinarias de petrleo. A

comparao da qualidade de ignio e de combusto da nova formulao deste produto com o

combustvel martimo preparado a partir de correntes residuais realizada por duas

metodologias diferentes. Aps a realizao de um pr-tratamento, a mistura formulada a partir

dos cortes dos petrleos apresenta melhor desempenho que os combustveis formulados com

as correntes residuais. Alm disso, este trabalho compara o efeito de diferentes diluentes e a

contribuio da corrente pesada utilizada na qualidade de ignio e de combusto do produto.

Palavras-chave: combustvel martimo, petrleo, qualidade de ignio.

vi

ABSTRACT

Heavy streams from crude oil refining can be used to prepare fuel oils for industrial or

maritime purposes, the latter known as bunker fuel. In order to prepare them, it is necessary to

set viscosity to its appropriate value by dilution with lighter fractions from petroleum refining.

While industrial usage of fuel oils is decreasing significantly due to environmental

restrictions, the bunker fuel market shows an important increasing face to the growing in

world maritime trading. Production of heavy, extra heavy and asphaltic crude oils in Brazil is

rising and more complex refining process are required to convert them into lighter petroleum

products. Because of that, the amount and the quality of available streams to prepare bunker

fuel are decreasing.

The present dissertation evaluates the feasibility of using heavy and asphaltic crude

oils to prepare bunker fuel without traditional processing into petroleum refineries. The

comparison of ignition and combustion quality considering the bunker fuel prepared from

residual streams are made considering two different methodologies. After pre-treating the

crude oils to prepare bunker fuels, that mixture shows a better ignition and combustion

performance than those prepared with residual streams. Finally, this study compares the effect

of different diluent streams and the heavy fraction contribution to products ignition and

combustion quality.

Keywords:crude oil, ignition quality, marine fuel

vii

SUMRIO

Resumo............................................................................................................. v

Abstract............................................................................................................ vi

Lista de Figuras................................................................................................ x

Lista de Tabelas................................................................................................ xii

1. INTRODUO............................................................................................. 1

2. REVISO BIBLIOGRFICA........................................................................ 3

2.1 Petrleo...................................................................................................... 4

2.1.1 Classificao do petrleo em funo do tipo de hidrocarboneto presente 4

2.1.2 Classificao do petrleo em funo da volatilidade.................................. 7

2.1.3 Classificao do petrleo em funo da densidade..................................... 8

2.1.4 Classificao do petrleo em funo do teor de enxofre............................. 9

2.2. Processos de refino..................................................................................... 10

2.2.1 Destilao................................................................................................ 11

2.2.2. Craqueamento cataltico.......................................................................... 13

2.2.3. Desasfaltao a propano.......................................................................... 15

2.3 leo combustvel martimo - bunker............................................................ 17

2.3.1 Formulao do bunker.............................................................................. 18

2.3.2 Classificao dos combustveis martimos................................................. 20

2.3.3. Especificao dos leos combustveis martimos.................................. 21

2.3.3.1 Massa Especfica................................................................................... 24

2.3.3.2 Viscosidade........................................................................................... 24

2.3.3.3 Ponto de fulgor...................................................................................... 25

2.3.3.4 Qualidade de Ignio............................................................................. 25

2.3.3.5 Teor de Enxofre..................................................................................... 26

2.3.3.6 Teor de gua.......................................................................................... 26

viii

2.3.3.7 Metais................................................................................................... 27

2.3.3.8 Resduo de carbono............................................................................... 28

2.3.3.9 Teor de leo lubrificante usado.............................................................. 28

2.3.4. Usos do leo bunker................................................................................ 29

2.3.4.1 Motor diesel.......................................................................................... 29

2.3.4.2 Limitao no uso do leo bunker devido ao teor de enxofre.................... 31

2.4 Qualidade de ignio do leo bunker........................................................... 32

3 METODOLOGIA PARA MEDIO E ESTIMATIVA DA QUALIDADE DE IGNIO E DE COMBUSTO........................................................................ 38

3.1 Calculated Carbon Aromaticity Index (CCAI)... 41

3.2 Fuel Ignition Analyzer (FIA) ................................................................... 43

4. MATERIAIS E MTODOS........................................................................... 48

4.1 Correntes pesadas e diluentes................................................................... 48

4.2 Preparao das amostras de leo bunker....................................................... 49

4.3 Anlise das propriedades das correntes e amostras................................... 54

4.3.1 Viscosidade cinemtica (ASTM D445).................................................... 54

4.3.2 Densidade/Massa especfica (ASTM D4052)............................................ 55

4.3.3 Qualidade de ignio e de combusto....................................................... 56

5. RESULTADOS............................................................................................. 58

5.1 Avaliao da influncia da corrente pesada na qualidade de ignio da mistura............................................................................................................. 60

5.1.1 Avaliao das amostras preparadas com resduo de vcuo (RV)................ 60

5.1.2 Avaliao das amostras preparadas com resduo asfltico (RASF)............ 63

5.1.3 Avaliao das amostras preparadas com o corte do petrleo 1.................. 65

5.1.4 Avaliao das amostras preparadas com o corte do petrleo 2.................. 67

5.1.5 Avaliao das amostras preparadas com o corte do petrleo 3................ 69

5.2 Efeito dos diluentes na qualidade de ignio da mistura............................ 70

ix

5.3 Avaliao da qualidade de ignio e de combusto das amostras classificadas como MF 180............................................................................... 73

5.4 Avaliao da qualidade de ignio e de combusto das amostras classificadas como MF 380............................................................................... 78

6. CONCLUSES............................................................................................. 81

7. RECOMENDAES.................................................................................... 83

REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS................................................................. 84

x

LISTA DE FIGURAS

Figura 2.1 Exemplo de alcano tpico n-butano............................................................... 5

Figura 2.2 Exemplo de naftnico tpico ciclohexano...................................................... 6

Figura 2.3 Exemplo de aromtico tpico benzeno.......................................................... 6

Figura 2.4 Exemplo de molcula de asfalteno................................................................... 7

Figura 2.5- Exemplo de composto sulfurado etil mercaptana.................................. 9

Figura 2.6 Esquema simplificado de uma torre de destilao atmosfrica....................... 11

Figura 2.7 Torre de destilao a vcuo.. .......................................................... 12

Figura 2.8 Diagrama de blocos do processo de FCC............................................ 13

Figura 2.9 Fracionadora principal do FCC..................................................... 14

Figura 2.10 Seleo de solventes para o processo de desasfaltao........................... 16

Figura 2.11 Esquema simplificado do processo de Desasfaltao............................. 16

Figura 2.12 Esquema simplificado da produo do leo bunker a partir do RV......... 19

Figura 2.13 Esquema simplificado da produo do leo bunker a partir do RASF........ 19

Figura 2.14 Esquema simplificado da produo do leo bunker nos terminais.......... 19

Figura 3.1 Equipamento FIA......................................................................... 44

Figura 3.2 Representao grfica do atraso de ignio (AI) e do incio da combusto principal (ICP) obtidas no Fuel Ignition Analyzer.................................................. 46

Figura 3.3 - Representao grfica da taxa de liberao de calor (ROHR) obtidas no Fuel Ignition Analyzer................................................................................... 46

Figura 3.4 - Representao grfica do nmero de cetano FIA (FIA CN) obtido no Fuel Ignition Analyzer... 46

Figura 4.1 Foto do viscosmetro..................................................................... 54

Figura 4.2 Foto do densmetro digital.............................................. 56

xi

LISTA DE TABELAS

Tabela 2.1 Classificao dos petrleos segundo a densidade............................................ 9

Tabela 2.2 - Nomenclatura adotada para os combustveis martimos por algumas das companhias produtoras..................................................................................................... 21

Tabela 2.3 - Especificao dos combustveis martimos destilados segundo a norma ISO 8217....................................................................................................................................... 22

Tabela 2.4 - Especificao dos combustveis martimos residuais segundo a norma ISO 8217....................................................................................................................................... 23

Tabela 3.1 Proposta de Classificao de amostras de combustveis martimos segundo o nmero de cetano FIA (FIA CN)....................................................................................... 47

Tabela 4.1 - Caractersticas dos petrleos em estudo (densidade, viscosidade, acidez total e teor de enxofre).................................................................................................................. 48

Tabela 4.2 - Caractersticas das correntes pesadas em estudo (densidade e viscosidade) 49

Tabela 4.3 - Caractersticas dos diluentes (densidade e viscosidade)............................... 49

Tabela 4.4 - Especificao dos MF 180 e MF 380 produzidos pela Petrobras (MEP)......... 51

Tabela 4.5 - Composio volumtrica (%v/v) das misturas experimentais de leo bunker. 52

Tabela 4.6 - Propriedades determinadas em laboratrio para as misturas experimentais de leo bunker........................................................................................................................ 53

Tabela 5.1 - Propriedades das misturas experimentais de combustveis martimos............. 59

Tabela 5.2 - Composio, viscosidade e densidade das misturas produzidas com o RV..... 60

Tabela 5.3 - Parmetros de qualidade de ignio e de combusto para as misturas produzidas com o RV............................................................................................................ 60

Tabela 5.4 - Composio, viscosidade e densidade das misturas produzidas com RASF.... 63

Tabela 5.5 - Parmetros de qualidade de ignio e de combusto para as misturas produzidas com RASF.......................................................................................................... 63

Tabela 5.6 - Composio, viscosidade e densidade das misturas produzidas com o corte do petrleo 1......................................................................................................................... 65

Tabela 5.7 - Parmetros de qualidade de ignio e combusto para as misturas com o corte do petrleo 1................................................................................................................ 65

Tabela 5.8 - Composio, viscosidade e densidade das misturas produzidas com o corte do petrleo 2......................................................................................................................... 67

xii

Tabela 5.9 - Parmetros de qualidade de ignio e combusto para as misturas com o corte do petrleo 2.................................................................................... 67

Tabela 5.10 - Composio, viscosidade e densidade das misturas produzidas com o corte do petrleo 3......................................................................................................................... 69

Tabela 5.11 - Parmetros de qualidade de ignio e combusto para as misturas com o corte do petrleo 3.................................................................................... 69

Tabela 5.12 - Composio, viscosidade e densidade das misturas com RV e RASF... 71

Tabela 5.13 - Parmetros de qualidade de ignio e combusto para as misturas com RV e com RASF.......................................................................................... 71

Tabela 5.14 - Composio, viscosidade e densidade das misturas classificadas como MF 180.................................................................................................................................. 75

Tabela 5.15 - Parmetros de qualidade de ignio e de combusto para as misturas classificadas como MF180.................................................................................................... 75

Tabela 5.16 - Composio, viscosidade e densidade das misturas classificadas como MF 380.................................................................................................................................. 78

Tabela 5.17 - Parmetros de qualidade de ignio e combusto para as misturas de MF380................................................................................................................................... 78

1

1. INTRODUO

Em sua maioria, os petrleos descobertos no Brasil, nos ltimos 10 anos, apresentam

elevada densidade, sendo classificados como petrleos pesados, extrapesados e alguns

asflticos. Uma caracterstica positiva encontrada nos petrleos nacionais o seu baixo teor

de enxofre. Essa propriedade permite a obteno, com baixo grau de refino, de produtos

derivados tambm com baixos teores de enxofre, ou seja, geradores de pequenas emisses de

poluentes para a atmosfera.

Os petrleos mais pesados tendem a apresentar menor rendimento, por destilao, em

derivados leves e de maior interesse, como a gasolina e o leo diesel, por exemplo. As fraes

mais pesadas, como o resduo da destilao, podem ser utilizadas como leos combustveis

para uso industrial ou combustveis martimos, derivado de baixo valor comercial, ou como

carga para processos de converso, de forma a aumentar o rendimento em derivados leves.

Para sua utilizao como leos combustveis industriais ou combustveis martimos, as

correntes pesadas so misturadas com correntes mais leves, chamadas diluentes e que tambm

so produzidas nas refinarias, como leo diesel, querosene ou fraes intermedirias do refino

de petrleo.

O consumo dos leos combustveis para uso industrial vem apresentando uma queda

significativa, principalmente, devido sua substituio pelo gs natural. Com isso, mais uma

situao se apresenta para ser resolvida: qual o destino que ser dado ao excesso das correntes

residuais dos processos de refino? Existem outras aplicaes nas quais elas possam agregar

valor?

Por outro lado, o mesmo comportamento de mercado no observado para os

combustveis martimos. Estes so usados nos motores destinados a dar propulso aos navios

de grande porte. O desenvolvimento de novas tecnologias e conceitos de motores possibilita

que um mesmo combustvel martimo, chamado de bunker, seja usado tanto no motor que

gera energia, como no motor que propulsiona o navio. Assim, ocorre um aumento do

consumo de fraes pesadas de petrleo destinadas produo de combustveis martimos e

uma preocupao com a qualidade que os combustveis martimos devem possuir para

garantir a sua utilizao adequada nos dois tipos de motores diesel de navios.

Entretanto, os avanos tecnolgicos nos processos de refino, no sentido de extrair do

petrleo os produtos de maior valor agregado, reduziro a quantidade das correntes residuais

obtidas. Como conseqncia, essas correntes tendero a apresentar qualidade inferior s

2

existentes atualmente. Fatores como o tipo e as propriedades das correntes disponveis tero

um forte impacto para a formulao dos leos combustveis industriais e martimos, podendo

representar uma perda considervel na qualidade do produto, principalmente em sua

viscosidade, densidade, ponto de fulgor e qualidade de ignio e de combusto.

Para o atendimento adequado ao mercado de combustveis martimos, torna-se ento

importante a identificao de novas correntes para a formulao desses combustveis e uma

avaliao correta da qualidade desses produtos. Uma possibilidade importante para a soluo

dos problemas levantados o estudo do uso de petrleos pesados e asflticos na produo de

combustveis martimos, reduzindo os problemas decorrentes do seu processamento em

unidades de refino tradicionais.

O objetivo desta dissertao de mestrado avaliar a possibilidade de utilizao dos

petrleos pesados e asflticos como combustveis martimos, em comparao com matrias

primas tradicionais como os resduos dos processos de destilao e de desasfaltao. Para

isso, so avaliadas as principais propriedades fsico-qumicas de misturas produzidas pelas

diferentes correntes pesadas, resduos e petrleos, e diferentes diluentes. Informaes sobre a

qualidade de ignio e de combusto so obtidas por duas metodologias distintas. Alm disso,

avalia-se a influncia do diluente utilizado sobre essas propriedades e as metodologias

empregadas para a avaliao da qualidade de ignio e de combusto.

No Captulo 2, apresentada uma reviso bibliogrfica com algumas informaes

tericas sobre o petrleo e sua classificao, sobre os processos de refino mais importantes

para a produo do bunker, bem como a obteno, a utilizao e as especificaes desse

produto.

O Captulo 3 aborda as informaes referentes s metodologias usadas para avaliao

da qualidade de ignio dos combustveis martimos, enquanto que o Captulo 4 apresenta os

petrleos e correntes utilizadas, o equipamento empregado para a avaliao da qualidade de

ignio e de combusto e a matriz de experimentos definida para o estudo.

No Captulo 5, os resultados so apresentados e discutidos, para que as concluses do

trabalho sejam mostradas no Captulo 6.

O Captulo 7 aborda as sugestes de temas para trabalhos futuros, enquanto que no

Captulo 8, esto relacionadas as referncias bibliogrficas utilizadas no desenvolvimento

desta dissertao.

3

2. REVISO BIBILIOGRFICA

O estudo da qualidade de ignio dos combustveis martimos preparados a partir de

correntes residuais um assunto relativamente novo, com muitos tpicos de discusso como,

por exemplo, a melhor metodologia de avaliao desse parmetro e a influncia de

propriedades como o teor de enxofre, entre outras.

O uso de petrleos pesados e asflticos diretamente como combustvel martimo pode

ser considerado como uma inovao. A reviso bibliogrfica mostrou que no h relatos de

estudos desse tipo na literatura. Considerando os dados disponveis, natural que, neste item

da dissertao, estejam includas informaes sobre os tipos de petrleo encontrados e suas

caractersticas, os processos de refino normalmente utilizados para produo do bunker e

sobre as caractersticas de maior significncia para a qualidade do produto.

O Captulo 2 aborda os seguintes tpicos:

Petrleo

Processos de refino envolvidos na produo do bunker

Bunker

Qualidade de ignio dos combustveis martimos

4

2.1 Petrleo

O petrleo constitudo predominantemente por uma mistura de compostos de

carbono e hidrognio, denominados hidrocarbonetos. Tambm podem ser observadas em sua

composio pequenas quantidades de compostos sulfurados, nitrogenados e oxigenados, alm

de compostos metlicos. Os hidrocarbonetos esto presentes no petrleo representados por

molculas que contm desde um tomo de carbono at molculas com 60 ou mais tomos de

carbono (FARAH, 2006; JONES e PUJAD, 2006; SIMANZHENKOV e IDEM, 2003).

A composio de cada petrleo pode variar significativamente de acordo com sua

origem. Mesmo petrleos que pertenam a uma mesma rea geolgica podem ter sua

composio variada devido a diferentes estratificaes que tenham ocorrido ao longo das eras

geolgicas durante sua formao. Os cuidados e requisitos especficos dos processos que

estaro envolvidos no manuseio de um determinado petrleo e seu processamento esto

diretamente relacionados complexidade de sua composio (HAGA et al., 2005).

A classificao dos petrleos muito importante sob diversos aspectos. Com esta

informao, alm de estimar o perfil de derivados a ser obtido nos processos de refino,

possvel inferir o valor de comercializao do petrleo a partir de sua volatilidade (petrleo

leve ou pesado), da sua composio (caractersticas parafnicas ou aromticas) e do seu teor

de enxofre.

As formas mais usuais de classificao de um petrleo so dadas de acordo com

(FARAH, 2006; SZKLO, 2005):

os tipos de hidrocarbonetos presentes;

a sua volatilidade;

a sua densidade e

o seu teor de enxofre.

2.1.1 Classificao do petrleo em funo do tipo de hidrocarboneto presente

Os petrleos podem ser classificados em funo da predominncia do tipo de

hidrocarbonetos em sua composio. Estes compostos de carbono e hidrognio podem ser

divididos em trs classes principais, baseado naclassificao dada por Speight, de acordo com

5

a forma com que se apresentam suas cadeias carbnicas (FARAH, 2006; JONES e PUJAD,

2006; SIMANZHENKOV e IDEM, 2003; SZKLO, 2005):

parafnicos;

naftnicos e

aromticos

Cada petrleo contm os trs diferentes tipos de hidrocarbonetos, embora o percentual

de distribuio deles varie significativamente. Essa variao devida s diferentes formaes

geolgicas das quais se originam e, portanto, raramente sero observados dois petrleos com

as mesmas caractersticas (SIMANZHENKOV e IDEM, 2003).

Os hidrocarbonetos parafnicos so compostos de carbono saturados, de cadeia normal

ou ramificada, tambm conhecidos como alcanos (Figura 2.1). So os constituintes

majoritrios dentre as fraes mais leves do petrleo, compreendendo desde o metano (um

nico tomo de carbono) at compostos com 40 tomos de carbono (FARAH, 2006; JONES e

PUJAD, 2006; SZKLO, 2005).

Figura 2.1 Exemplo de alcano tpico n-butano (JONES e PUJAD, 2006).

Os hidrocarbonetos naftnicos (Figura 2.2) so compostos de tomos de carbono

saturados que podem conter uma ou mais cadeias cclicas. Normalmente so encontrados no

petrleo na proporo de 20 a 40% em volume, apresentando como estruturas bsicas o

ciclopentano e o ciclohexano (FARAH, 2006; JONES e PUJAD, 2006; SZKLO, 2005).

6

Figura 2.2 Exemplo de naftnico tpico ciclohexano (JONES e PUJAD, 2006).

Os hidrocarbonetos aromticos (Figura 2.3) so aqueles que contm de um a cinco

anis benznicos, com cadeias curtas em sua estrutura. Estes hidrocarbonetos se concentram

nas fraes mais pesadas do petrleo. Podem ser monoaromticos ou poliaromticos ligados

de forma isolada, conjugada ou condensada.

Figura 2.3 Exemplo de aromtico tpico benzeno (JONES e PUJAD, 2006).

As resinas e os asfaltenos (Figura 2.4) so compostos de estrutura complexa policclica

aromtica ou naftnico-aromtica de elevada massa molar, variando desde 500 kg/kmol at

valores acima de 50.000 kg/kmol. Apresentam elevada relao carbono/hidrognio e altos

teores de nitrognio, enxofre, oxignio e metais em suas molculas.

As resinas, quando comparadas com os asfaltenos, apresentam menor grau de

associao molecular, menor massa molar e menor relao carbono-hidrognio. Elas so

molculas instveis sofrendo decomposio sob a ao do ar e da luz solar. J os asfaltenos

so responsveis pela formao de depsitos em tanques e tubulaes dentro da refinaria e so

percursores das reaes de formao de coque.

7

Figura 2.4 Exemplo de molcula de asfalteno (RANA et al., 2007).

Apesar da variedade quanto ao tipo de hidrocarboneto predominante em sua

composio, diversos petrleos brasileiros da Bacia de Campos podem ser classificados como

naftnicos. Tal caracterstica confere propriedades muito importantes como, por exemplo,

baixa probabilidade de incompatibilidade na mistura entre petrleos de diferentes origens,

enquanto que a maior probabilidade normalmente observada quando petrleos com

diferentes caractersticas em termos de polaridade (aromticos com parafnicos, por exemplo)

so misturados. Quando essa situao ocorre, os asfaltenos, que estavam dispersos no sistema

coloidal, floculam e precipitam. A precipitao dessas molculas responsvel pelo

entupimento das linhas de transferncia do petrleo dentro de uma refinaria, depsitos em

trocadores de calor, entre outros problemas.

2.1.2 Classificao do petrleo em funo da volatilidade

O petrleo constitudo por componentes slidos e gasosos que esto dispersos na

fase lquida, formando uma emulso coloidal. Por meio de aquecimento, ocorre a sua

separao nas fraes de hidrocarbonetos, em funo da diferena dos pontos de ebulio

(FARAH, 2006).

8

5,1315,141 =

dAPI

A destilao do petrleo permite, usando os Pontos de Ebulio Verdadeiros (PEV),

estimar o rendimento dos derivados. Essa separao pode ocorrer em condies de presso

atmosfrica, de acordo com o mtodo ASTM D2892 (ASTM, 2005) ou sub-atmosfrica, de

acordo com o mtodo ASTM D5236 (ASTM, 2003). O nmero de fraes ser determinado

pelo grau de complexidade das informaes desejado.

A composio dos cortes obtidos deve ser tal que atenda aos diferentes perfis de

produo dos derivados. Os critrios para definio das temperaturas dos cortes consideram o

planejamento, quais os derivados que se deseja produzir e qual a qualidade que devem

apresentar.

A curva PEV construda a partir dos dados de temperatura e volume recolhido de

cada corte. Assim, a partir da estimativa das temperaturas desejadas para o corte podem ser

obtidos os rendimentos tericos esperados para cada derivado. Essa informao muito til

no caso de comparar petrleos para que sejam selecionados qual ou quais so mais adequados

para um dado esquema de refino.

Dessa forma, possvel avaliar o potencial produtivo dos petrleos, em diferentes

hipteses de demanda dos derivados, e selecionar qual ser o mais adequado para ser

processado no esquema de refino existente.

2.1.3 Classificao do petrleo em funo da densidade

Outra forma de classificao adotada para diferenciar os tipos de petrleo obtida em

funo da sua densidade, normalmente expressa em grau API. O grau API uma escala de

medida de densidade criada pelo American Petroleum Institute para comparar de forma rpida

e direta diferentes petrleos. A expresso utilizada para obteno dessa propriedade dada

pela Equao 1 (FARAH, 2006; JONES e PUJAD, 2006; SZKLO, 2005):

(1)

onde:

d = densidade do produto a 15,6C/15,6C ou 60F/60F

9

A partir da Equao 1, verificado que quanto menor a densidade, maior o grau API e

mais leve o petrleo. As faixas para classificao adotadas internacionalmente esto

representadas na Tabela 2.1.

Tabela 2.1 Classificao dos petrleos segundo a densidade (FARAH, 2006).

API CLASSIFICAO

API > 40 EXTRALEVE

40 > API > 33 LEVE

33 > API > 27 MDIO

27 > API > 19 PESADO

19 > API > 15 EXTRAPESADO

API < 15 ASFLTICO

Os petrleos nacionais so encontrados praticamente em todas as faixas citadas acima.

Entretanto, a maioria das descobertas de campos petrolferos no Brasil, nos ltimos 10 anos,

permite classificar os petrleos como pesados, extrapesados e alguns como asflticos. Essa

caracterstica se traduz em grandes volumes de resduos durante o processamento do petrleo,

necessitando de um maior grau de complexidade de equipamentos e processos dentro da

refinaria para transform-los em produtos mais nobres.

2.1.4 Classificao do petrleo em funo do teor de enxofre

Depois do carbono e do hidrognio, o enxofre o tomo mais abundante no petrleo.

Os teores de enxofre nos petrleos podem chegar at 5% em massa. As formas mais comuns

de ocorrncia do enxofre no petrleo so: as mercaptans, os sulfetos, os polissulfetos, o cido

sulfdrico, os benzotiofenos e seus derivados (Figura 2.5).

Figura 2.5 - Exemplo de composto sulfurado etil mercaptana (JONES e PUJAD, 2006).

10

Uma das classificaes mais importantes do petrleo dada pelo seu teor de enxofre,

podendo ser do tipo alto ou baixo. Ele considerado de baixo teor de enxofre, ou BTE,

quando o teor for menor que 1% em massa (FARAH, 2006; SZKLO, 2005).

Os compostos de enxofre, como o cido sulfdrico (H2S), so alguns dos responsveis

pela corrosividade do petrleo e seus derivados. Alm disso, provocam o envenenamento dos

catalisadores de processo e sua combusto produz gases poluentes atmosfera, como o SO2 e

o SO3 (FARAH, 2006).

Os petrleos nacionais, em sua maioria, podem ser classificados como pertencentes

classe de baixo teor de enxofre. Essa caracterstica muito importante e vantajosa no s para

o petrleo, mas tambm para todos os derivados de petrleo, em especial o leo bunker,

principalmente quanto ao aspecto de emisses atmosfricas. Quanto menor o teor de enxofre,

mais valorizado o produto no mercado, seja ele um petrleo ou seu derivado, em funo da

menor necessidade de tratamento para atendimento s exigncias ambientais.

2.2. Processos de refino

O perfil dos derivados que podem ser obtidos no processo de destilao, aliado s

caractersticas das demais unidades das refinarias e de seus mercados-alvo, so os principais

parmetros que definiro o tipo de petrleo a ser adquirido.

Assim, por exemplo, os petrleos leves, que no processo de destilao originam uma

maior quantidade de gs liquefeito de petrleo (GLP) e naftas, so muito utilizados em

refinarias com vocaes petroqumicas ou com esquema de refino mais simples. J os

petrleos que geram grandes volumes de leo diesel so muito utilizados em refinarias cujo

mercado-alvo desse derivado elevado. Por outro lado, os petrleos pesados, que resultam em

grandes quantidades de produtos pesados, como o leo combustvel, so destinados para

refinarias mais complexas, que possuem grande capacidade de converso. Isso possibilita sua

transformao, quando desejada, em gasolina e leo diesel.

Apesar das diferentes caractersticas dos petrleos, possvel obter, a partir dos

processos de refino, todos os derivados de petrleo e tambm as correntes que iro compor o

bunker. Os principais processos envolvidos na produo dos combustveis martimos so: a

destilao atmosfrica e a vcuo, o craqueamento cataltico e a desasfaltao a propano.

11

2.2.1 Destilao

Em uma refinaria de petrleo, a destilao o primeiro processo para a produo de

derivados. Ela consiste na separao fsica das fraes do petrleo por meio de vaporizaes e

condensaes sucessivas devido diferena de volatilidade entre os derivados

(ABADIE, 2003; NDIO do BRASIL, 2003; JONES e PUJAD, 2006; SZKLO, 2005).

Presso prxima a atmosfrica e temperaturas superiores a 400oC conduzem a reaes

indesejveis de craqueamento dos hidrocarbonetos presentes no petrleo. Por este motivo,

normalmente so usadas duas torres em seqncia que operam em dois nveis de presso

diferentes (NDIO do BRASIL, 2003; JONES e PUJAD, 2006; SZKLO, 2005).

A primeira etapa da destilao ocorre em um equipamento que opera presso

prxima da atmosfrica. Ao longo da torre de destilao atmosfrica ocorrem diversas

transferncias de massa entre a fase lquida, que flui do topo para o fundo da torre, e a fase

vapor, que flui em sentido contrrio.

A Figura 2.6 apresenta o esquema simplificado de uma torre de destilao atmosfrica,

a partir da qual podem ser obtidas as seguintes fraes do petrleo:

mistura de nafta leve e GLP, obtida no topo;

fraes de nafta, de querosene e de gasleo atmosfrico leve e pesado (fraes com

faixa de destilao do leo diesel), obtidas nas sadas laterais da torre; e

resduo atmosfrico (RAT), nome dado ao produto de fundo da torre.

Figura 2.6 Esquema simplificado de uma torre de destilao atmosfrica.

Petrleo

GLP + nafta leve

Nafta

Querosene

Gasleo leve

Gasleo pesado

Resduo atmosfrico

Torre de destilao

atmosfrica

12

Os produtos retirados, com exceo do RAT, so todos direcionados para tratamento,

onde suas propriedades so ajustadas conforme previsto na legislao. Dentre as correntes

produzidas na Unidade de Destilao Atmosfrica que podem ser utilizadas como diluente do

leo bunker, so citadas as fraes de querosene e de gasleo atmosfrico leve e pesado.

A destilao do resduo atmosfrico, sem que haja o craqueamento significativo das

molculas que o compem, s possvel em presses inferiores atmosfrica. Dessa forma, o

RAT a carga da torre de destilao a vcuo, onde a presso sub-atmosfrica, o que

possibilita a separao por destilao das fraes pesadas em temperatura inferior ao ponto de

ebulio normal dos componentes.

As correntes oriundas desse processo, cuja torre de destilao est representada na

Figura 2.7, so:

pelo topo da torre: vapor dgua e nafta no condensada;

nas sadas laterais da torre: o gasleo leve de vcuo (GOL) e o gasleo pesado de

vcuo (GOP), que se constituem em cargas do processo de craqueamento cataltico; e

pelo fundo da torre: o resduo de vcuo (RV), que pode ser utilizado como carga para

os processos de desasfaltao a propano e coqueamento retardado ou para a produo

do leo combustvel industrial e martimo.

Figura 2.7 Torre de destilao a vcuo.

Vapor dgua + nafta no condensada

Gasleo leve de vcuo

Gasleo pesado de vcuo

Resduo de vcuo

Torre de destilao

vcuo

Resduo atmosfrico

13

Neste processo, importante ressaltar a existncia de correntes normalmente usadas

na preparao do bunker nas refinarias de petrleo: o RV, principal componente da parte

residual, e os gasleos de vcuo que exercem a funo de diluentes para acerto de

viscosidade.

2.2.2. Craqueamento cataltico

O processo de craqueamento cataltico em leito fluidizado (Fluid Catalitic Cracking -

FCC) um dos processos que mais contribui com correntes de diluentes para a produo dos

combustveis martimos. Seu princpio de operao est baseado na ruptura das molculas da

carga (resduos e gasleos), mediante a ao de um catalisador a base de alumino-silicatos,

em alta temperatura.

A carga utilizada no FCC pode ser tanto o RAT quanto o gasleo de vcuo,

dependendo da disponibilidade de correntes e do arranjo da refinaria. Como produtos, so

obtidos: gs combustvel (composto principalmente por metano e etano), GLP, nafta, gasleo

e uma corrente mais pesada rica em compostos aromticos. Os rendimentos nos produtos iro

variar de acordo com a seletividade do catalisador e com as condies operacionais, mas os

produtos majoritrios so o GLP e a nafta (ABADIE, 2003).

As principais sees que compreendem o processo de FCC so (ABADIE, 2003): pr-

aquecimento da carga, converso (conjunto reator-regenerador), fracionamento dos produtos,

recuperao de gases, recuperao de calor e tratamentos das correntes, conforme pode ser

observado no diagrama de blocos simplificado da Figura 2.8.

Figura 2.8 Diagrama de blocos do processo de FCC.

CARGA

PR-AQUECIMENTO

DA CARGACONVERSO FRACIONADORA

RECUPERAO DOSGASES

RECUPERAO DECALOR

TRATAMENTO DASCORRENTES

14

O processo se inicia com o craqueamento cataltico da carga, a uma temperatura de

aproximadamente 550C, em fluxo ascendente juntamente com o catalisador em um reator

tubular, tambm chamado de riser.

Ao final do reator cataltico tubular, os produtos do craqueamento so separados da

massa de catalisador, seguindo para a fracionadora principal. O catalisador, recoberto por

coque, passa por retificao com vapor dgua visando recuperar os hidrocarbonetos retidos

em sua estrutura. O coque depositado , ento, queimado para que o catalisador possa ser

reutilizado, e para gerar a energia necessria ao processo.

Na fracionadora principal, conforme pode ser observado na Figura 2.9, ocorre uma

nova separao por destilao, obtendo como principais produtos:

pelo topo: gs combustvel (GC) e GLP, alm da nafta craqueada;

retiradas laterais de nafta pesada e de um gasleo chamado de leo leve de reciclo ou

light cycle oil (LCO);

pelo fundo: leo pesado de craqueamento. Caso exista um sistema de separao de

slidos, o produto de fundo ser o leo decantado ou leo clarificado.

Figura 2.9 Fracionadora principal do FCC.

Os gases do topo da fracionadora principal seguem para as absorvedoras, primria e

secundria, que visam otimizar a recuperao de fraes de nafta pesada que possam ter sido

Gasleo devcuo ouRAT

GC + GLP + naftacraqueada

Nafta pesada

LCO

leo pesado de craquemanto, leodecantado ou leo clarif icado

FracionadoraPrincipal

15

arrastadas pelos gases. O destino dos gases, aps tratamento, a alimentao do sistema de

gs combustvel da refinaria.

As retiradas de nafta devero ser tratadas para a remoo de contaminantes, de forma a

atingir a qualidade necessria para sua utilizao na produo de gasolina.

O LCO um dos produtos do FCC que apresenta mais opes de uso, como por

exemplo (ABADIE, 2003):

ser adicionado ao leo diesel aps sofrer hidrotatamento;

ser armazenado para servir como diluente para os combustveis martimos e para o

leo combustvel; ou

ser usado como leo para o sistema de selagem de bombas.

O produto de fundo pode ser armazenado em tanque para queima na refinaria ou servir

de diluente da carga da Unidade de Desasfaltao a Propano. Quando existem os sistemas de

decantao, o leo decantado ou o leo clarificado podem ser aproveitados como matria-

prima para a produo de resduo aromtico (RARO) ou como corrente de diluio para os

leos combustveis martimos.

2.2.3. Desasfaltao a propano

A desasfaltao a propano um processo de extrao utilizado para remover

asfaltenos de correntes para produo de leos bsicos lubrificantes, para produo de asfaltos

comerciais ou ainda para preparar cargas para a Unidade de Craqueamento Cataltico

(ABADIE, 2003).

A carga mais largamente utilizada o resduo de vcuo (RV), podendo tambm ser

usado o gasleo pesado de vcuo ou o resduo atmosfrico (RAT), dependendo da

disponibilidade de correntes e da relao custo-benefcio dentro da refinaria (ABADIE, 2003;

RANA et al., 2007; SIMANZHENKOV e IDEM, 2003).

Hidrocarbonetos parafnicos de baixa massa molar so capazes de solubilizar as

cadeias parafnicas que esto presentes no resduo de vcuo fazendo com que as resinas e os

asfaltenos precipitem. Na Figura 2.10 apresentado um diagrama comparando o poder de

solvncia dos hidrocarbonetos parafnicos leves e sua seletividade.

16

Figura 2.10 Seleo de solventes para o processo de desasfaltao.

Dentre os solventes de baixa massa molar, o propano normalmente o escolhido

porque apresenta uma excelente solvncia aliada a uma boa seletividade. A solubilidade dos

compostos presentes na carga no propano diminui com o aumento da massa molar, do ponto

de ebulio e da aromaticidade.

As trs sees principais que constituem o processo de desasfaltao, cujo esquema

simplificado est representado na Figura 2.11, so (ABADIE, 2003; UOP, 2003):

extrao;

recuperao do extrato; e

recuperao do rafinado.

Figura 2.11 Esquema simplificado do processo de Desasfaltao.

Extratoras Resduo de vcuo

Recuperao de solvente do extrato

Retificao do extrato

leo desasfaltado

Purificao do solvente gua

Recuperao de solvente do rafinado

Retificao do rafinado Resduo

Asfltico

Vapor

Propano

Poder desolvncia

EtanoPropanoButanoPentanoHexano

Seletividade

17

No interior do extrator, a carga (RV) alimentada na parte superior da torre e o

propano prximo a base estabelecendo um regime de contracorrente, devido diferena de

densidades entre as duas fases lquidas.

A relao propano/leo ou carga/solvente tambm uma varivel de grande

importncia para o processo. De um modo geral, pode-se dizer que um aumento na relao

propano/leo aumenta sempre a seletividade da extrao, produzindo leos de melhor

qualidade. Quando o propano usado como solvente, valores encontrados para essa relao,

que tornam o processo economicamente interessante, situam-se na faixa de 6:1 a 10:1 em

volume (ABADIE, 2003`; UOP, 2003).

Pelo topo da torre, so obtidas a fase extrato composta de leo desasfaltado (ODES) e

propano. O extrato enviado para uma seqncia de duas torres, de mdia e alta presso, onde

a separao ODES/propano realizada.

Aps essa primeira separao, o ODES retificado com vapor dgua para eliminar o

solvente remanescente, em baixa presso, e enviado para armazenamento. Em seguida, o

ODES enviado para Unidade de Tratamento de Lubrificantes ou para Unidade de

Craqueamento Cataltico.

Pelo fundo da torre, recolhida a fase rafinado, composta de resduo asfltico (RASF)

com pequena quantidade de solvente. O RASF, aps ser aquecido, separado do propano e

armazenado para ser utilizado como uma das correntes para a produo do leo combustvel

martimo em refinarias. Outra aplicao importante sua comercializao como cimento

asfltico de petrleo (CAP).

2.3 leo combustvel martimo - Bunker

O combustvel inicialmente usado na movimentao dos navios era o leo diesel

martimo, um produto com faixa normal de ebulio entre 100C e 385C. No entanto, a partir

da crise do petrleo na dcada de 70 e com o conseqente aumento de preos dos derivados,

os armadores se viram obrigados a encontrar uma alternativa de menor custo. Assim, como

opo, foram desenvolvidos motores capazes de utilizar leos combustveis produzidos a

partir de resduos de processos de refino, de menor valor comercial que o leo diesel

(CEDERSTAV, 2003).

18

O leo bunker, tambm conhecido como marine fuel ou leo combustvel martimo,

uma mistura de correntes oriundas do refino do petrleo, constituda por uma parte residual

combinada com diluentes para ajuste de viscosidade do produto. No passado, esse produto

que era de difcil destinao dentro da refinaria, encontrou aplicao na indstria naval devido

a sua alta capacidade energtica (DENTON, 2004).

Vrios foram os investimentos necessrios para a adequao das estruturas existentes

ao uso do novo produto como, por exemplo, a instalao de um sistema de aquecimento nos

tanques de armazenamento de combustvel nos navios. Esse sistema importante para que

seja reduzida a viscosidade do leo bunker, permitindo seu manuseio de forma adequada.

A quantidade e a qualidade das correntes pesadas do refino do petrleo, que so as

matrizes para formulao dos leos combustveis martimos, vm diminuindo ao longo do

tempo. Esse fato resultado dos avanos tecnolgicos no refino do petrleo que aumentam o

rendimento dos produtos leves e mdios.

Ao mesmo tempo, os motores de navio que esto sendo desenvolvidos so cada vez

mais sofisticados. Com isso, valores mais estreitos de tolerncia no que tange especificao

do produto so requeridos e, conseqentemente, muito maior ser a susceptibilidade a danos,

se houver a presena de determinados componentes, como por exemplo, sedimentos, sdio e

vandio (DENTON, 2004).

Por outro lado, garantir que o combustvel atenda plenamente aos novos requisitos dos

motores, torna-se uma atividade muito complexa, se considerarmos que os navios esto em

constante movimento ao redor do mundo. Cerca de 95% dos produtos comercializados

mundialmente transportado por este modal, sendo que aproximadamente 20% da demanda

total de leo combustvel destinada para os leos combustveis martimos (PAPPOS e

SKJOLSVIK, 2002). Assim sendo, o abastecimento de um navio pode acontecer com

diferentes fornecedores de combustvel, nos diversos portos pelo qual trafega, e, em cada um

desses portos, o produto pode apresentar diferentes especificaes, em funo de

caractersticas regionais.

2.3.1 Formulao do bunker

O leo bunker produzido a partir da mistura de resduos do processo de destilao a

vcuo (RV) ou do processo de desasfaltao a propano (RASF) com correntes de diluentes.

Como diluentes, podem ser destacadas uma corrente oriunda do processo de craqueamento

19

cataltico, o leo leve de reciclo (LCO), duas do processo de destilao atmosfrica,

querosene e gasleo atmosfrico pesado e o leo diesel produto. As Figuras 2.12 a 2.14

apresentam esquemas simplificados da produo de leo bunker.

Figura 2.12 Esquema simplificado da produo do leo bunker a partir do RV.

Figura 2.13 Esquema simplificado da produo do leo bunker a partir do RASF.

Figura 2.14 Esquema simplificado da produo do leo bunker nos terminais.

DestilaoAtmosfrica

CraqueamentoCataltico

Querosene

Gasleos

ResduoAsfltico

LCO

leo Decantado

leo combustvel martimo

Gasleos de

Vcuo

Desasfaltaoa propano

Destilao aVcuo

leo combustvel martimo

de maior viscosidade

Diluentes

(LCO, leo diesel martimo, querosene etc)

leo combustvel martimo de menor viscosidade

DestilaoAtmosfrica

CraqueamentoCataltico

Querosene

Gasleos

ResduoVcuo

LCO

leo Decantado

combustvel martimo

Gasleos de

Vcuo

Destilao aVcuo

20

As correntes usadas na formulao do leo bunker e suas quantidades variam de

acordo com a refinaria em funo dos tipos de petrleos processados, da quantidade de

correntes disponveis para a mistura, do balano de massa e econmico da refinaria e da

qualidade requerida para o produto. No caso dos terminais, o leo combustvel martimo

normalmente recebido com uma viscosidade elevada, possibilitando a diluio para obter o

produto desejado no momento da comercializao do produto. Essa alternativa permite uma

maior flexibilidade quanto aos tanques para armazenamento de produto, uma vez que a

diluio efetuada no momento de sua transferncia para o cliente.

A maior disponibilidade de petrleos pesados, extrapesados e asflticos faz com que

novas unidades de processo sejam implantadas nas refinarias para aumentar a produo de

derivados leves e mdios de petrleo. Essas novas unidades implicaro em um novo balano

tcnico-econmico das correntes utilizadas para a produo dos derivados, entre eles, os

combustveis martimos.

2.3.2 Classificao dos combustveis martimos

Por serem padronizados mundialmente, os leos combustveis martimos so

conhecidos pela nomenclatura em ingls. Eles abrangem desde aqueles que so produzidos

usando derivados de petrleo na faixa dos gasleos, como o caso do leo diesel martimo

(marine diesel oil - MDO) e do gasleo martimo (marine gas oil - MGO), at aqueles que so

produzidos a partir das correntes residuais dos processos de refino. Esses ltimos compem a

classe mais extensa dos leos combustveis martimos, e so chamados marine fuels, MF

(ISO, 2005).

No caso dos combustveis residuais, a terminologia mais comum utiliza as

abreviaturas de marine fuel (MF), bunker fuel oil (BFO) ou intermediate fuel oil (IFO)

seguido do valor da viscosidade cinemtica mxima, em mm/s, temperatura de 50C.

Outras nomenclaturas tambm encontradas so leo bunker C fuel e heavy fuel oil (HFO).

Nesta dissertao de mestrado, ser adotada a mesma denominao utilizada no Brasil

para classificar os leos combustveis martimos que sero objetos de estudo: marine fuel

(MF). Na Tabela 2.2, so apresentadas as principais nomenclaturas utilizadas por algumas das

maiores empresas de petrleo do mundo.

21

Tabela 2.2 Nomenclatura adotada para os combustveis martimos por algumas das

companhias produtoras

Petrobras Chevron ExxonMobil Shell

Marine Fuel (MF)

Intermediate Bunker Fuel (IBF)

Bunker Fuel Oil (BFO) Intermediate Fuel (IF)

Marine Fuel Oil (MFO)

Marine Diesel Oil (MDO)

Marine Diesel Oil (MDO)

Marine Diesel Oil (MDO)

Marine Diesel Oil (MDO)

Marine Diesel Fuel (MDF)

Marine Gas Oil (MGO)

Gas Oil (GO) Marine Gas Oil (MGO) Gas Oil (GO)

A International Organization for Standardization (ISO), por meio da norma

ISO 8217, procura padronizar os combustveis martimos internacionalmente, classificando e

definindo especificaes relativas aos diferentes tipos desses combustveis. Ela os divide em

duas categorias: os preparados a partir de correntes de produtos destilados e os obtidos a partir

de correntes residuais. Para cada grupo, as diferenas, de um modo geral, se devem aos

valores mximos de viscosidade, massa especfica, resduo de carbono, vandio e teor de

enxofre.

2.3.3. Especificao dos leos combustveis martimos

Os produtos derivados do petrleo comercializados no Brasil seguem as

especificaes do rgo regulamentador, no caso a Agncia Nacional do Petrleo, Gs

Natural e Biocombustveis (ANP). No caso do leo bunker, adotada a norma ISO 8217

Petroleum Products Fuels (class F) Specifications of Marine Fuels - que define as

caractersticas dos principais combustveis martimos que podem ser comercializados

internacionalmente.

Nas Tabelas 2.3 e 2.4, podem ser observados os limites adotados para cada categoria

de combustvel martimo segundo a ISO 8217.

22

Tabela 2.3 - Especificao dos combustveis martimos destilados segundo a norma ISO 8217.

Propriedade Limite DMX DMA DMB DMC Aspecto Claro e lmpido a - Massa especfica a 15C, kg/m Max. 890,0 900,0 920,0 Ponto de Fulgor, C Min. 043 0060 0060 0060

Min. 1,40 01,50 - - Viscosidade Cinemtica a 40C, mm/s Max. 5,50 06,00 011,0 014,0

Ponto de Fluidez (superior), C Inverno Max. - 00-6 0000 0000 Vero Max. - 0000 0006 0006

Ponto de Nvoa, C Max. -16 - - - Enxofre, % m/m Max. 1,00 01,50 02,00 02,00 ndice de Cetano Mn. 045 0040 0035 - Resduo de Carbono 10% v/v finais da destilao, % m/m Max. 0,30 00,30 - - Resduo de Carbono, % m/m Max. - - 00,30 02,50 Cinzas, % m/m Mx. 0,01 00,01 00,01 00,05 Sedimento Total Existente, % m/m Mx. - - 00,10 00,10 gua, % v/v Mx. - - 000,3 000,3 Vandio, mg/kg Mx. - - - 0100 Alumnio mais silcio, mg/kg Mx. - - - 025 leo Lubrificante Usado Isento Zinco, mg/kg Mx. - - - 015 Fsforo, mg/kg Mx. - - - 015 Clcio, mg/kg Mx. - - - 030

23

Tabela 2.4 - Especificao dos combustveis martimos residuais segundo a norma ISO 8217.

Propriedade Limite RMA 30

RMB 30

RMD 80

RME 180

RMF 180

RMG 380

RMH 380

RMK 380

RMH 700

RMK 700

Massa especfica a 15C, kg/m

Max. 960,0 975,0 980,0 991,0 991,0 991,0 991,0 1010,0 991,0 1010,0

Viscosidade Cinemtica 50C, mm/s Max. 030,0 030,0 080,0 180,0 180,0 380,0 380,0 0380,0 700,0 700,0 Ponto de Fulgor, C Min. 0060 0060 0060 0060 0060 0060 0060 00060 0060 0060 Ponto de Fluidez (superior), C [a] Inverno Max. 0000 024 0030 0030 0030 0030 0030 00030 0030 0030

Vero Max. 0006 024 0030 0030 0030 0030 0030 00030 0030 0030 Resduo de Carbono, % m/m Max. 0010 010 0014 0015 0020 0018 0022 00022 0022 0022 Cinzas, % (m/m) [b] Mx. 00,10 0,10 00,10 00,10 00,15 00,15 00,15 000,15 00,15 00,15 gua, % (v/v) Mx. 000,5 00,5 000,5 000,5 000,5 000,5 000,5 0000,5 000,5 000,5 Enxofre, %m/m Max. 03,50 3,50 04,00 04,50 04,50 04,50 04,50 004,50 04,50 04,50 Vandio, mg/kg Mx. 0150 150 0350 0200 0500 0300 0600 00600 0600 0600 Sedimento Total Potencial, % (m/m) Mx. 00,10 0,10 00,10 00,10 00,10 00,10 00,10 000,10 00,10 00,10 Alumnio mais silcio, mg/kg Mx. 0080 080 0080 0080 0080 0080 0080 00080 0080 0080 leo Lubrificante Usado Isento [c] Zinco, mg/kg Mx. 15 Fsforo, mg/kg Mx. 15 Clcio, mg/kg Mx. 30 Legenda: [a] Os usurios devero assegurar que o ponto de fluidez do produto adequado para seu propsito, especialmente se viaja pelos dois hemisfrios.

[b] Nas reas de controle de emisso de SOx nomeadas pela International MaritimeOrganization o limite aplicado 1,5% m/m. Podem existir variaes locais para este limite. [c] Considera-se contendo OLU o produto em que os teores de zinco, fsoforo e clcio so superiores ao limite indicado.

24

A seguir, so comentadas algumas das principais propriedades avaliadas nos

combustveis martimos.

2.3.3.1 Massa Especfica

fundamental o conhecimento dessa propriedade, pois a entrega do produto pelo

produtor ao consumidor ocorre por volume e o seu faturamento feito por massa. A massa

especfica exprime a relao entre a massa e o volume de um determinado produto a uma

determinada temperatura (FARAH, 2006; ISO, 2005; JONES e PUJAD, 2006; JUOPERI,

2004; SPREUTELS e VERMEIRE, 2001).

A partir da densidade, possvel obter, por correlaes empricas, o poder calorfico e

a qualidade de ignio, entre outras caractersticas dos derivados de petrleo.

2.3.3.2 Viscosidade

A viscosidade uma propriedade utilizada para a principal classificao dos leos

combustveis martimos. Na nomenclatura adotada, as iniciais MF (marine fuel) vem

acompanhadas de um nmero que representa a mxima viscosidade cinemtica do produto,

em mm/s, temperatura de 50C, por exemplo, MF 380 (FARAH, 2006; ISO, 2005).

A partir desta propriedade, possvel estimar as temperaturas requeridas para o

armazenamento, o bombeamento, a transferncia dos combustveis e, principalmente, para a

injeo no motor visando a sua queima mais completa possvel.

A viscosidade varia de acordo com a temperatura. Segundo a norma ISO 8217, a

temperatura de referncia para combustveis martimos 50C. Sabendo-se que a viscosidade

varia inversamente com a temperatura, os leos combustveis residuais, como o caso do leo

bunker, invariavelmente devem ser aquecidos para reduzir a viscosidade quela requerida

para nebulizao e posterior queima.

2.3.3.3 Ponto de fulgor

25

Por definio, o ponto de fulgor de um produto a temperatura na qual os vapores de

hidrocarbonetos desprendidos deste produto produzem uma chama que no seja capaz de se

sustentar, quando uma fonte de ignio aplicada sob condies especficas de teste (ISO,

2005).

O ponto de fulgor uma propriedade que est intrinsecamente relacionada com as

questes de segurana e manuseio adequado dos produtos derivados do petrleo. O valor

mnimo especificado para o leo bunker, para garantir a segurana de seu manuseio dentro de

navios, definido por legislao internacional em 60C (ISO, 2005).

2.3.3.4 Qualidade de Ignio

A qualidade de ignio do leo bunker uma caracterstica que no especificada na

norma ISO 8217, adotada internacionalmente para os combustveis martimos, embora o seu

clculo conste no Anexo B da norma (ISO, 2005).

A medio do desempenho em termos de ignio complexa e deve considerar o tipo

de motor no qual o combustvel usado, as condies de operao do motor e caractersticas

intrnsecas do combustvel. Uma determinada condio operacional e de qualidade do bunker

que no se aplica a um tipo de motor, por exemplo, pode ser adequada para um motor com

outra tecnologia (SPREUTELS e VERMEIRE, 2001).

Por estes motivos, a norma ISO 8217 no define limites gerais para a qualidade de

ignio. Entretanto, na comercializao dos marine fuels, usual o estabelecimento de limites

recomendados para o Calculated Carbon Aromaticity Index (CCAI), uma correlao emprica

funo da viscosidade e massa especfica, usada como referncia da qualidade de ignio.

O CCAI fornece uma estimativa da quantidade de carbono aromtico presente no

combustvel. Quanto maior o valor do CCAI, maior o teor de carbono aromtico presente, o

que faz com que o combustvel apresente maior retardo ou atraso de ignio no motor. Assim,

quanto maior o CCAI, pior ser a qualidade de ignio do bunker.

A determinao da qualidade de ignio do bunker tambm pode ser realizada

utilizando a tcnica da combusto a volume constante. A partir dela possvel medir

parmetros de ignio e de combusto, como por exemplo, o atraso de ignio e o incio da

combusto principal.

26

2.3.3.5 Teor de Enxofre

uma das propriedades mais importantes para os leos combustveis martimos, pois

est associada tanto com o valor de comercializao do produto, quanto com a questo das

emisses.

No s o petrleo, mas tambm o bunker, tm seu valor diferenciado em funo do

teor de enxofre. Quanto menor for esse teor, mais valorizado ser o produto. O teor de enxofre

presente no bunker funo principalmente do petrleo de origem, uma vez que no existem

processos de tratamento de correntes pesadas. Enquanto os valores mximos especificados

pela ISO podem variar entre 3,5 %m/m e 4,5 %m/m, dependendo do tipo de combustvel

martimo, os valores tipicamente encontrados no Brasil esto em torno de 1,5 %m/m ou

menores.

Desde maio de 2005, com a criao das reas de controle de emisses no norte da

Europa, tambm conhecidas como SECAs (SOx Emission Control Areas), o teor mximo de

enxofre nessas regies passou a ser limitado a 1,5 %m/m. Essa tendncia tambm dever ser

adotada para uso de combustveis em guas territoriais de outros pases da Unio Europia

(DIESEL FACTS, 200-).

Os usurios e fornecedores desse combustvel tm feito muitos esforos no sentido de

prover solues para minimizar a emisso dos xidos de enxofre. Entre as aes adotadas

atualmente, podem ser citadas adaptaes e aumento da severidade no processo de remoo

de enxofre no petrleo ou, ainda, a implantao de equipamentos nos sistemas de combusto

visando diminuir a emisso desses gases poluentes. (JUOPERI, 2004)

2.3.3.6 Teor de gua

A gua o mais comum contaminante de um combustvel martimo. O teor de gua

encontrado em combustveis martimos, tipicamente entre 0,1 %v/v e 0,2 %v/v,

normalmente inferior ao limite especificado de 0,5 %v/v. Essa contaminao pode ter vrias

fontes, que incluem a condensao de umidade do ar nos tanques, o vazamento de vapor nas

serpentinas de aquecimento e a gua presente nos diluentes (ISO, 2005; JONES e PUJAD,

2006).

Dentre os potenciais problemas causados pela presena de gua, podem ser citados:

27

reduo do poder calorfico do combustvel;

possibilidade de formao de borra microbiolgica;

corroso em tanques e dutos;

eroso nos injetores por cavitao das bombas de carga;

nebulizao deficiente;

retardo da propagao da chama; e

contaminao com o sdio presente na gua marinha.

2.3.3.7 Metais

Os problemas acarretados pela presena de metais nos leos combustveis martimos

esto relacionados principalmente com os teores de sdio (Na), de vandio (V) e de finos de

catalisadores, provenientes dos processos de refino, constitudos principalmente de silcio (Si)

e de alumnio (Al).

A quantidade de finos de catalisador presentes no bunker, segundo a norma ISO 8217,

determinada pela soma dos teores de Al e Si presentes. A reduo de tais contaminantes

deve ser conseguida por meio de um tratamento adequado do produto, de modo que seja

reduzida a sua natureza abrasiva em equipamentos tais quais bombas, pistes, injetores e

cilindros, entre outros.

importante destacar que somente a estocagem do combustvel por um longo perodo

no garante a remoo adequada destes finos de catalisador, sendo necessrio optar pelo uso

de centrfugas.

O vandio um metal presente em todos os petrleos, na forma de compostos organo-

metlicos. Os teores encontrados no leo bunker dependem principalmente da origem do

petrleo. Valores tpicos para este metal, em leos residuais, esto em torno de 150 mg/kg.

Os teores de sdio so geralmente baixos, tipicamente inferiores a 50 mg/kg, nos

combustveis martimos. Valores maiores que os tpicos podem estar relacionados com

contaminao por gua do mar.

Um controle especial deve ser feito sobre os teores de sdio e vandio. Uma relao

entre os teores de Na e V igual a 1:3 propicia a formao de um euttico de baixo ponto de

fuso e muito corrosivo, que ir gerar corroso por cinzas fundentes. O ponto de fuso deste

28

euttico est em torno de 535C, podendo chegar a menos de 400C na presena de soluo de

vanadato de sdio com outros xidos metlicos (ISO, 2005).

A formao de cinzas fundentes, devido a relaes entre os metais superiores citada,

pode agravar os problemas de eroso de bicos, entre outros. Algumas das medidas adotadas

para minimizar os efeitos adversos citados so a limitao do teor de vandio na produo do

leo bunker, uma vez que no possvel sua remoo, e a utilizao de aditivos,

principalmente nos motores menos modernos, os quais so mais sensveis presena destes

metais.

2.3.3.8 Resduo de carbono

uma medida da quantidade de material carbonceo que permanece no leo

combustvel ou no leo bunker aps a vaporizao dos componentes volteis, na ausncia de

ar. Essa propriedade fornece uma aproximao da tendncia de formao de depsitos em

queimadores e vaporizadores, onde existe uma atmosfera deficiente de ar.

Um elevado valor para o resduo de carbono est relacionado no somente com

problemas de combusto, mas tambm com a questo das emisses. Alm da formao de

depsitos, a presena de depsitos na regio de combusto pode propiciar a emisso de

material particulado pela queima incompleta do combustvel (ISO, 2005; SIMANZHENKOV

e IDEM, 2003; SPREUTELS e VERMEIRE, 2001).

2.3.3.9 Teor de leo lubrificante usado

Os comustveis martimos residuais so produtos de colorao escura. Por este motivo,

podem ser encontradas contaminaes de todos os tipos, com registros inclusive da adio de

leos lubrificantes usados (OLU).

Embora no existam evidncias e comprovaes de efeitos nocivos decorridos dessa

adio, a regulamentao dessa prtica pode permitir a adio de outras correntes. Os

solventes industriais, por exemplo, podem causar srios danos aos motores, tais como ataque

aos sistemas de elastmeros de injeo de combustveis. (ISO, 2005)

Como medida de preveno, foi adotada pela comunidade de usurios do leo bunker,

por meio da norma ISO 8217, uma restrio pela qual se tenta impedir a contaminao com

29

leos lubrificantes usados. A soluo proposta foi limitar o teor de clcio, fsforo e zinco,

constituintes tpicos desse produto. Atualmente, os valores mximos dados pela norma ISO

8217, para estes elementos, so 30 mg/kg, 15 mg/kg e 15 mg/kg para o clcio, fsforo e zinco,

respectivamente (ISO, 2005).

Apesar dessa restrio, a presena de OLU somente pode ser evidenciada no caso dos

teores dos trs metais estarem acima dos limites propostos. Entretanto, nem mesmo com a

presena de leos lubrificantes usados, pode-se considerar o combustvel inadequado para o

uso, devendo ser investigada a causa da adio desse contaminante. (ISO, 2005)

2.3.4. Usos do leo bunker

Cerca de 95% dos produtos comercializados mundialmente transportado por navios.

A significncia desse valor tal que, aproximadamente 20% da demanda total de leo

combustvel destinada aos combustveis martimos (PAPPOS e SKJOLSVIK, 2002).

Sua aplicao nos navios inicialmente foi restrita ao uso como combustvel dos

motores principais, que so responsveis pela movimentao do navio nas longas viagens.

Nos motores auxiliares, que fornecem a energia para o navio, sempre foi usado um

combustvel mais leve, como por exemplo, o leo diesel martimo (MDO). Para tanto,

necessrio que o navio possua dois tanques de combustvel: um para o leo bunker e outro

para o MDO (NEWSLINK, 2004).

Os fabricantes de motores vm investindo em tecnologia de modo que o mesmo

combustvel, no caso o leo bunker, possa atender aos dois tipos de motores e, com isso,

somente um tanque de armazenamento seria necessrio no navio.

Os navios so movimentados por motores de combusto interna do tipo ciclo diesel. O

funcionamento desses motores ser discutido no item a seguir.

2.3.4.1 Motor diesel

O motor diesel foi inventado por Rudolf Diesel no final do sculo XIX, em Munique,

Alemanha. A elevada eficincia trmica do motor, quando comparado com o motor movido

gasolina, direcionou sua aplicao para as instalaes industriais e movimentao de veculos

pesados como os caminhes e os navios.

30

Os motores de combusto interna operam transformando o calor resultante da reao

de combusto em energia mecnica. Essa operao ocorre de forma cclica e a combusto

ocorre dentro de um cilindro. A presso gerada pela queima do combustvel movimenta um

pisto e a energia mecnica resultante usada para movimentar o veculo.

Os motores do Ciclo Diesel mais comuns operam em quatro fases distintas (FARAH,

2006):

admisso;

compresso;

combusto: nebulizao e expanso;

descarga.

O processo de combusto se inicia com a fase de admisso, onde o pisto se desloca

do ponto morto superior (PMS) em direo ao ponto morto inferior (PMI), permitindo a

entrada de ar atravs da vlvula de admisso.

A etapa seguinte, compresso, ocorre pelo movimento ascendente do pisto do PMI ao

PMS. No incio do deslocamento, a vlvula de admisso se fecha e o ar presente no interior da

cmara de combusto comprimido. O ar, quando sujeito a esta compresso, sofre um

aumento de temperatura que ser diretamente proporcional taxa de compresso. Um pouco

antes de o pisto atingir o PMS, o ar comprimido atinge uma presso que pode variar entre

6,38 MPa e 12,75 MPa (30 kgf/cm e 65 kgf/cm), enquanto que a temperatura atinge um

valor entre 600C e 800C.

Na etapa da combusto, o combustvel, fortemente comprimido, nebulizado por meio

do injetor para o interior da cmara. Ao entrar em contato com o comburente, a altas presses

e temperatura, incendeia-se espontaneamente resultando na movimentao do pisto

novamente em direo ao PMI.

O quarto e ltimo tempo do ciclo, a descarga, iniciado um pouco antes de o pisto

atingir o PMI. Nessa etapa, a vlvula de descarga se abre, permitindo a sada de uma parte dos

gases de combusto, que se encontram em alta presso. medida que o pisto se desloca para

o PMS, ocorre a expulso dos gases remanescentes.

Os motores diesel para navios podem ser classificados nas seguintes categorias

(DENTON, 2004):

31

Categoria 1: motores similares aos usados nos equipamentos encontrados em

construes e fazendas com um deslocamento de combustvel por cilindro menor que

5 litros;

Categoria 2: motores similares aos encontrados em locomotivas com um deslocamento

de combustvel por cilindro entre 5 litros e 30 litros;

Categoria 3: motores muito grandes usados para propulso em navios de grande porte,

como, por exemplo, os transatlnticos. O deslocamento de combustvel por cilindro

superior a 30 litros. Tambm existem motores desse tipo que podem ser usados para

gerar eletricidade em plantas para gerao de energia.

Resumidamente, os motores das categorias 1 e 2 so usados como motores de

propulso em embarcaes de pequeno porte, direcionando-as e movimentando-as. Outra

aplicao desses motores o uso como motor auxiliar em embarcaes de grande porte,

fornecendo a energia necessria para os equipamentos de navegao e outros servios. Por

outro lado, os motores que pertencem categoria 3, que so os motores principais de navios

de grande porte, so responsveis pela movimentao ao longo dos oceanos.

2.3.4.2 Limitao no uso do leo bunker devido ao teor de enxofre

Em alguns lugares, j existem restries ao uso do bunker de alto teor de enxofre

como, por exemplo, no norte europeu. O teor mximo admitido nas reas de controle das

emisses de xidos de enxofre (SECAs) igual a 1,5 %m/m (DIESEL FACTS, 200-). Assim,

atender a este critrio implica em optar por uma das seguintes opes na produo:

Mistura de produto com alto teor de enxofre com outro que apresente baixo teor de

enxofre e esteja disponvel no mercado;

Processar petrleos de baixo teor de enxofre, o que nem sempre possvel e depende

da disponibilidade de tais petrleos; e

Investir em processo de dessulfurizao do resduo, o que envolve elevados

investimentos e o tempo de adequao longo.

Um ponto que impacta a opo de misturar leos bunker com diferentes teores de

enxofre, visando adequar essa propriedade, o risco de que o novo produto gerado seja

32

instvel. Assim, embora o produto atenda a especificao quanto ao teor de enxofre, poder

causar uma instabilidade nos asfaltenos dispersos em soluo de modo que eles precipitem e

ocasionem problemas de entupimento de bico injetor ou mesmo conduzam formao de

borras nos tanques de armazenamento do produto.

importante lembrar que a estabilidade do produto um dos parmetros para o seu

manuseio dentro dos navios. A instabilidade que pode ocorrer se deve adio de correntes

predominantemente parafnicas em um produto de caractersticas aromticas. Os asfaltenos,

conjunto de molculas aromticas de elevada massa molar, tm maior afinidade por correntes

de carter qumico semelhante para que possam se manter em suspenso.

No caso do Brasil, o reflexo da restrio ambiental quanto ao teor de enxofre menor.

Nossos petrleos so tipicamente de baixo teor de enxofre e tal caracterstica refletida nos

marine fuels.

2.4 Qualidade de ignio do leo bunker

O estudo com maior profundidade dos fatores que influenciam a qualidade de ignio

do leo bunker um fato recente. A ausncia de indicadores adequados para medir a

qualidade de ignio do leo bunker estimulou muitos estudos visando melhor entender os

fatores envolvidos nesse fenmeno.

As primeiras tentativas realizadas foram no sentido de aplicar para o leo bunker os

mesmos parmetros adotados para a combusto do leo diesel, como, por exemplo, o nmero

de cetano, o ndice de cetano e o ndice diesel (ZEELENBERG et al., 1983). No entanto,

alguns inconvenientes impossibilitaram sua aplicao, como por exemplo:

as diferenas entre os motores, como por exemplo, o dimetro do orifcio do bico

injetor caracterstico de motores menores que os martimos. As modificaes

necessrias para adaptar o motor para teste com o leo bunker seriam de elevado custo

e complexidade;

a dificuldade de determinao do ponto mdio de ebulio para os combustveis

residuais, como requisito para aplicar o ndice de cetano. A frao residual desses

combustveis no pode ser destilada pelos mtodos convencionais e mesmo que fosse

33

possvel, a correlao foi determinada baseada em um conjunto de dados aplicveis a

fraes mais leves que o leo bunker;

a determinao do ponto de anilina, que um mtodo cujo resultado apresenta

dificuldade de visualizao devido colorao escura dos combustveis martimos

residuais. O mtodo alternativo desenvolvido para esta propriedade possui baixa

preciso e confiabilidade, para aplicao no clculo do ndice diesel.

Segundo JUOPERI (2004), uma pobre qualidade de ignio causa um longo atraso de

ignio, fazendo com que o aumento de presso ocorra fora do ponto timo, levando a

depsitos no topo do pisto, nas vlvulas e sistema de exausto. Para um combustvel

martimo, esse problema mais perceptvel quando so realizadas partidas a frio com o motor

e operaes a baixa carga.

Atualmente, com o avano na tecnologia de fabricao dos motores, existe a tendncia

do uso de marine fuels (MF) no s nos motores principais, mas tambm nos auxiliares. O

motor auxiliar responsvel por gerar energia para dentro da embarcao e utiliza,

normalmente, leo diesel martimo. J o motor principal responsvel pela sua

movimentao. Com o uso de somente um combustvel para os dois motores, os auxiliares

estaro mais propensos a danos, principalmente, se forem de tecnologia mais antiga

(CEDERSTAV, 2003; NEWSLINK, 2004).

O estudo da combusto permitiu verificar que a aromaticidade do combustvel um

fator importante para a qualidade de ignio do leo bunker (ZEELENBERG et al., 1983) e

para o desempenho em motores diesel (VALENCIA e ARMAS, 2005). Entretanto, a

avaliao dessa caracterstica fora de laboratrios no tarefa simples, pois necessita de

equipamentos com alto grau de complexidade e estrutura nem sempre disponvel no local de

anlise.

No comeo da dcada de 80, aps investigaes na busca de um mtodo simples e

rpido para determinar a aromaticidade dos combustveis martimos, foi desenvolvida a

correlao emprica conhecida como Calculated Carbon Aromaticity Index (CCAI). Foram

usadas como base propriedades fsico-qumicas cujas anlises so requeridas na especificao

do produto: massa especfica temperatura de 15C e viscosidade cinemtica temperatura

de 50C.

O CCAI o mtodo mais adotado para avaliao da qualidade de ignio dos

combustveis martimos, devido sua facilidade de determinao, e tornou-se amplamente

difundido pela cadeia do leo bunker. Na prtica, considerado como parmetro informal

34

para sua comercializao. Existem valores recomendados para diferentes tipos de motores,

sendo o usual adotar-se a faixa entre 800 e 860 (AABO, 2003; HLSMANN et al., 1991;

LEWIS et al., 1998; RAO et al., 2005; SHIODE et al., 1998; TECHNICAL BULLETIN,

2002; VALENCIA E ARMAS, 2005; ZEELENBERG et al., 1983). Um valor superior a 860

indica a presena de uma grande quantidade de compostos aromticos, o que leva o

combustvel a apresentar um elevado retardo de ignio. Por outro lado, se for menor que 800,

pode significar a adio de grande quantidade de diluente de m qualidade que pode

contribuir negativamente para a qualidade de ignio e de combusto do leo bunker.

CEDERSTAV (2003) comenta que o CCAI pode ser considerado como uma boa

indicao da qualidade de ignio do leo bunker. Muitos autores concordam que este

parmetro no se trata de uma medida absoluta da qualidade de ignio do combustvel

(HASHIMOTO e SASAKI, 2004; JUOPERI, 2004; VALENCIA e ARMAS, 2005). Por ser

funo apenas da viscosidade cinemtica e massa especfica do produto, este parmetro no

capaz de detectar que produtos inadequados podem apresentar bom desempenho com o uso de

aditivos melhoradores da combusto (cetane improvers). Assim sendo, um leo bunker com

um valor de CCAI acima do limite superior recomendado, pode apresentar um bom

desempenho em termos de ignio no motor.

Outro ponto importante a considerar o fato de que a correlao para clculo do CCAI

foi desenvolvida para formulaes de combustveis martimos com correntes existentes em

uma determinada poca. Vrias novas correntes esto disponveis para a produo dos MFs e,

no entanto, o CCAI no foi validado para o uso com elas.

Apesar da adoo do CCAI, o estudo do desempenho em motores de navio continuou

sendo o mtodo mais adequado para avaliar a qualidade de ignio dos leos bunker por meio

da determinao do atraso de ignio. Alguns autores citam que nos motores martimos de

baixa velocidade, as variveis de maior influncia so o tipo de motor usado e suas condies

operacionais, enquanto que os de mdia velocidade so mais sensveis ao combustvel

(CEDERSTAV, 2003; NEWSLINK, 2004; SHIMIZU, 2000; VALENCIA e ARMAS, 2005).

VALENCIA e ARMAS (2005) descrevem a existncia de uma boa correlao entre o

atraso de ignio dado pelo motor e o CCAI. No entanto, o seu trabalho no apresenta os

resultados, dados do motor ou de composio para uma melhor avaliao dessa concluso.

HASHIMOTO e SASAKI (2004) e VALENCIA e ARMAS (2005) tentaram avaliar

novos parmetros que contribussem para diferenciar a qualidade de ignio entre amostras de

combustveis martimos. Os que obtiveram melhor correlao foram a relao mssica

carbono/hidrognio (C/H), a relao entre as composies mssicas de carbono parafnico e

35

de carbono aromtico (%Cp/Ca) e o teor mssico de carbono aromtico (%Ca). De um modo

geral, maiores valores para estes parmetros, exceto para a relao %Cp/Ca, resultam em uma

pior qualidade de ignio.

Contudo, em uma comparao entre trs amostras, duas com boa qualidade de ignio

e uma com m qualidade, foi verificado que no existe uma tendncia para o conjunto de

resultados (C/H, %Cp/Ca, %Ca) que justifique a classificao de uma determinada amostra

em uma categoria especfica (HASHIMOTO e SASAKI, 2004).

Estudos adicionais sobre a qualidade de combusto e de ignio visaram desenvolver

um equipamento que fosse capaz de reproduzir, em pequena escala, o motor de um navio. A

partir do desenvolvimento de um teste em uma bomba calorimtrica, teve origem o conceito

da cmara de combusto a volume constante (CCVC). O trabalho inicialmente desenvolvido

pelo Southwest Research Institute (SwRI) resultou no desenvolvimento do Ignition Quality

Tester (IQT) e posteriormente, do Fuel Ignition Analyzer (FIA). Enquanto que o IQT,

desenvolvido pela empresa canadense Advanced Engine Technology, aplicvel a amostras

de leo diesel, o FIA, desenvolvido pela empresa norueguesa Fueltech A.S., usado para os

marine fuels (CUNHA PINTO, 2001; http://www.fueltech.no).

O uso do Fuel Ignition Analyzer permitiu a realizao de novos estudos com os

combustveis martimos, com respostas mais rpidas na obteno do atraso de ignio e com

menor consumo de amostra que o teste em motor.

SHIMIZU et al. (2000) testaram trs tcnicas para avaliar a qualidade de ignio e de

combusto do leo bunker e garantir a qualidade do produto. Foram estudadas trs tcnicas

diferentes: Anlise Trmica Diferencial associada a Termogravimetria (Thermalgravimetry-

Differential Thermal Analysis - TG-DTA), Analisador da Combusto da Gota (Droplet

Combustion Analyzer - DCA) e Fuel Ignition Analyzer (FIA). A composio e quantidade das

amostras utilizadas no estudo no foram disponibilizadas.

Segundo os autores, a anlise dos resultados do TG-DTA em conjunto com o DCA

fornece elementos importantes para analisar o comportamento de ignio e de combusto do

leo bunker. Os parmetros medidos pelas metodologias (temperaturas de incio da

combusto e de queima completa do combustvel, entre outras) combinados com a

visualizao das etapas da combusto, permitem diferenciar a qualidade entre os

combustveis.

Para o FIA, SHIMIZU et al. (2000) propuseram uma correlao entre os valores de

nmero de cetano e os de atraso de ignio para um grupo de misturas entre o hexadecano

(nmero de cetano convencionado igual a 100) e heptametilnonano (nmero de cetano igual a

36

15), considerando dois nveis de presso: 2,0 MPa e 4,5 MPa, respectivamente. Segundo os

autores, os melhores resultados so obtidos na regio em que o nmero de cetano menor que

50.

HASHIMOTO e SASAKI (2004) testaram seis tipos diferentes de MFs, na faixa do

leo diesel martimo (MDO), com ndice e nmero de cetano conhecidos para verificar a

confiabilidade do ensaio com o FIA. As condies fixadas para a cmara foram 2 MPa de

presso e 450oC de temperatura, tpicas para anlise de MDO, simulando as condies

prximas s encontradas em motores reais.

Embora os autores tenham feito restries quanto ao equipamento por no apresentar

partes mveis, como por exemplo, os pistes, opinaram que este se mostrou adequado a

proposta de diferenciar a qualidade de ignio de amostras de leo bunker. Em seguida,

realizaram testes com 21 amostras de MDO. Alm dos ensaios de combusto pelo FIA,

tambm foram analisadas as propriedades especificadas destes combustveis e outras que

podem ser relacionadas com o fenmeno da combusto como, por exemplo, relao

carbono/hidrognio, percentual de carbono naftnico, parafnico e aromtico etc.

TAKASAKI et al. (2001) estudaram as caractersticas de ignio do leo bunker

utilizando o FIA e a visualizao em alta velocidade do processo de combusto em u