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Caminhos de uma colina: Uma resposta no Século XXI para um problema milenar Tiago Simão Fernandes Garcia DARQ - FCTUC 2008

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Caminhos de uma colina:Uma resposta no Século XXI para um problema milenar

Tiago Simão Fernandes Garcia

DARQ - FCTUC 2008

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Caminhos de uma colina:Uma resposta no Século XXI para um problema milenar

Prova Final do Curso de ArquitecturaAluno: Tiago Simão Fernandes GarciaOrientador: Arq. António Lousa

DARQ - FCTUC 2008

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Para a elaboração deste trabalho, várias foram as pessoas importantes que me apoiaram,

deram as suas opiniões, disponibilidade e paciência. Não as vou enumerar todas, ficando assim um

agradecimento mais generalizado a todos os meus amigos. Agradeço mais particularmente à Sra.

Susana Coutinho pela disponibilidade que teve ao esclarecer as dúvidas essencialmente técnicas que

fui tendo relativas a elevadores ao longo do trabalho e especialmente aos seus conselhos sobre as

novas tecnologias do ramo.

Obviamente tenho de agradecer ao orientador desta prova, o arquitecto António Lousa, que

nas poucas e curtas conversas que tivemos, muito por minha culpa, conseguiu dizer o que era

realmente importante para o desenvolvimento do trabalho. De referir também que achei muito

interessante ter adicionado uma parte teórica ao trabalho práctico, fazendo-me assim reflectir em

muitas questões, algumas não explicitadas no trabalho, que de outra forma me teriam despertado

menos atenção.

Parte do meu agradecimento vai também para a minha colega Inês Nunes, pelo tempo

disposto a comentar o meu trabalho, pela sua importante ajuda na própria elaboração deste e por

ser uma amiga exemplar. Para finalizar agradeço aos meus pais e irmãs pela ajuda que me foram

oferecendo e também pelas condições propiciadas para que me fosse possível concluir este projecto,

neste sentido sou uma pessoa com muita sorte.

Agrdecimentos

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As curvas que desenham uma cidade 4

Um Ponto, uma Proposta 8

A Origem de uma Necessidade 11

Primeira Fase – Um lugar privilegiado 13

Segunda Fase – Inversão do papel da colina 17

Terceira Fase – Um programa dinamizador

20

Quarta Fase – O ínicio do fim das cidades tradicionais 28

Quinta Fase - A cidade abandona a Alta 33

Sexta Fase – Novas oportunidades para um renascimento 35

Indice

Page 5: Caminhos de uma colina: Uma resposta no Século XXI para um problema milenar Tiago Simão Fernandes Garcia DARQ - FCTUC 2008

Uma resposta moderna a um problema antigo 39

O Lugar 40

A Paisagem 43

Programas Semelhantes 50

Conclusão 53

Dados Técnicos 54

Green Wall 56

Green Wall no elevador 58

Bibliografia 74

Anexos

Indice

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As curvas que desenham uma cidade

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Coimbra tem um interessantíssimo e muito particular desenvolvimento ao longo dos tempos, já que

desde sempre conviveu com colinas e vales e sofreu com a forte dinâmica do Mondego. Estas características

que criaram a sua marca, hoje em dia são particularidades perfeitamente ou mesmo aconselhavelmente

dispensáveis a qualquer urbe que se queira adaptada às novas necessidades da vida moderna. Estas no

entanto foram no passado importantes geradores de aglomerados humanos e daí a razão de várias cidades se

debaterem continuamente com problemas semelhantes.

Efectivamente foi a existência de uma colina que determinou o preciso local do surgimento do

aglomerado, era comum em acontecimentos topográficos parecidos serem fundadas cidades que por ocasiões

de guerra e instabilidade ganhavam grande notoriedade. Numa altura em que uma muralha muitas vezes

tornava-se intransponível para exércitos invasores, estas posições, com a sua defesa facilitada pelas

características naturais, eram peças fundamentais no domínio do território. Porém, quando estas tiveram de

se adaptar aos novos tempos e não o conseguiram, simplesmente desapareceram ou viram a sua importância

drasticamente reduzida. A topografia que os protegia era, ao mesmo tempo, muito exigente para as pessoas,

para as construções e para o ordenamento. Para estes núcleos urbanos chegarem à actualidade foi essencial

possuir outras características que mantivessem a importância da sua existência, compensado assim as

desvantagens que o terreno propiciava. Uma das mais importantes era terem espaço suficiente no arrabalde

que permitisse o crescimento mais descontraído da cidade, abandonando em grande medida o anterior

centro de acesso comprometido.

O espaço que Coimbra tinha para o seu crescimento era essencialmente... mais colinas e vales. Como

grandes alterações na topografia nunca foram a solução, os acessos surgiram integrando-se de uma forma

natural ao terreno existente, aproveitando as vertentes menos íngremes e adaptando-se aos interesses dessa

época. No entanto, com o passar do tempo muitas das soluções de acessos encontradas previamente

As curvas que desenham uma cidade 5

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começaram a ficar ultrapassadas pelas exigências de novos costumes e necessidades. Várias seriam as razões

para Coimbra perder o protagonismo quando os motivos defensivos assegurados pelas muralhas

desapareceram, mas, por diversas razões que serão abordadas mais à frente, a cidade manteve-se com

alguma importância dentro do território nacional até à actualidade, conseguindo sobreviver com as muitas

contrariedades que este terreno agressivo lhe impunha.

Como morador de Coimbra e adepto de caminhadas, desde cedo me deparei com algumas destas

dificuldades que a topografia nos coloca, especialmente nas deslocações pedonais pelos vários lugares da

cidade. Mesmo sítios vizinhos tornam-se demasiado “distantes” quando o contacto não existe através de

acessos adequados, podendo inclusivamente uma das zonas sair bastante discriminada.

Durante vários anos morei na Rua Verde Pinho, esta acompanha parte do viso de uma colina e a partir

da qual conseguimos vislumbrar directamente os edifícios da Universidade. Desci o vale adjacente, até à

Arregaça, e subi a Ladeira das Alpenduradas centenas de vezes, outras tantas vezes pensava o bom que seria

se houvesse uma ponte de uma colina à outra, assim em vez dos vinte sete minutos que demorava até à

faculdade talvez demorasse no máximo uns quinze, ou mesmo menos. Se a isto adicionarmos o desconforto

que é subir uma encosta íngreme num dia de calor ou chuva, fica bastante claro o porquê das pessoas

optarem maioritariamente por outros meio de transporte. Presumo que Coimbra seja uma cidade propícia a

este género de pensamentos, vários os devem ter tido nos mais diversos locais: escadas rolantes, túneis,

pontes e elevadores com certeza fazem parte do imaginário comum.

A vida moderna exige condições que inviabilizam grande parte das soluções anteriormente criadas, mas

felizmente, além das novas exigências, também vieram com a modernidade inúmeras melhorias e inovações

tecnológicas que aumentaram grandemente a panóplia de soluções capazes de dominar o terreno hostil, no

entanto estas novas possibilidades ainda estão pouco exploradas nesta cidade. Assim, faz parte da

As curvas que desenham uma cidade 6

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nossa herança lidar com as especificidades que um território deste tipo nos proporciona, não o encarando

como uma adversidade, mas sim como uma característica que nos impele a utilizar toda a nossa imaginação

para adaptar as aparentes contrariedades em algo que valorize a cidade, o bairro, a rua, a casa e a torne

única, contribuindo para o desenvolvimento da sua identidade.

As curvas que desenham uma cidade 7

Page 10: Caminhos de uma colina: Uma resposta no Século XXI para um problema milenar Tiago Simão Fernandes Garcia DARQ - FCTUC 2008

Um ponto, uma proposta

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Um ponto, uma proposta

Mesmo tendo em conta as vantagens que uma ponte que cruzasse o Vale da Arregaça, ligando as duas

colinas, eventualmente traria, penso que não ia gostar muito de a ver a ligar uma localização à outra, o

impacto na paisagem seria muito provavelmente demasiado forte e uma obra dessa envergadura vai um

pouco contra a ideia que estou habituado a associar a Coimbra. Porém, vários são os lugares onde projectos

com este tipo de finalidade se poderiam mais facilmente implantar, ajudando a diminuir distâncias entre os

lugares, a aproximar pessoas e aumentando assim a eficácia de movimentos que uma topografia destas não

quer oferecer.

É precisamente relativo a este tema que se vai desenvolver o meu projecto. No caso, refazendo uma

ligação existente, que outrora foi bastante utilizada e é agora não menos necessária, entre a Alta e a

Portagem através das couraças de Lisboa e da Estrela, à qual, utilizando novas tecnologias, agora proponho

ser feita por um elevador aproximando novamente estas duas localizações que com o passar dos séculos,

devido a novas condicionantes, se foram afastando e mantendo hoje uma relação quase unicamente

paisagística.

A área onde este projecto tem a sua implantação é, ao nível superior, uma parte da colina não

construída, apenas com alguns muros de contenção de terreno, que ladeia a Couraça de Lisboa e, a um nível

inferior, um lugar que esteve ocupado por uma casa do Séc. XIX na Avenida Emídio Navarro, da qual

actualmente só resta a fachada. Assim, com a demolição dessa fachada é possível abrir para a avenida um

espaço público que garante um acesso fácil e bastante visível para o elevador. Este parte enterrado e surge na

encosta, onde continua a subir já completamente exposto até ficar ao nível da Couraça, voltando-se para

outro espaço que vai funcionar como um interface, permitindo assim o deslocamento para diferentes partes

da Alta, principalmente Universidade, Botânico e a zona histórica.

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Um ponto, uma proposta

Fig. 1 - A imagem mostra algumas das principais zonas com as quais o elevador se relaciona mais directamente, sendo que a área projectada está representada a vermelho vivo, a verde escuro o

Jardim Botânico, a verde claro o parque Dr. Manuel Braga, a laranja a zona histórica da Alta e

finalmente a vermelho claro a Universidade.

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A origem de uma necessidade

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Este capítulo irá expor o estudo histórico que inevitavelmente foi feito para que pudesse entender

melhor a memória do local, tratando-se esta de uma história muito rica e antiga, com o seu envolvente a

revelar marcas de várias épocas e ideias muito diferentes. Este estudo focou essencialmente as razões que

levaram a uma ocupação de um lugar com uma topografia tão acidentada e as evoluções que foram

ocorrendo ao longo do tempo na cidade que influenciaram essa ocupação e os seus acessos. No entanto, a

pesquisa foi tratado apenas de uma forma superficial, muitos eventos importantes da cidade não vão estar

explícitos e possivelmente existem autores que actualmente discordem de alguns pontos que aqui possam

estar referidos. Não fazia parte das minhas pretensões descrever a história do sítio com grande objectividade

e profundidade, apenas me interessava perceber o percurso aproximado que a cidade fez, e em especial a

Alta, para que neste momento existisse a necessidade de um novo acesso nesta localização e ao mesmo

tempo deixando espaço para que essa pesquisa acabasse por influenciar também o projecto.

Considero que na evolução da cidade ocorreram diversas etapas que implicaram grandes alterações no

modo de ocupação e utilização da Almedina, são essas fases que realmente me interessam pois considero

que, com o novo milénio, estamos efectivamente a começar uma fase diferente.

A origem de uma necessidade 12

Fig. 2 – António Gonçalo Neves, Vista de Coimbra, 1865 (página anteior)

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Primeira fase – Um lugar privilegiado

Recuando no tempo dois milénios, ao entendermos algumas das características das sociedades da

época torna-se fácil perceber o porquê da existência de uma fixação humana no sítio de Coimbra. A um nível

mais geral de território, a cidade ocupa um importante lugar na transição do norte para o sul e, ao mesmo

tempo, do litoral para o interior. Nesta altura, em que os rios são os principais meios de comunicação e

transporte, Coimbra possui uma localização privilegiada ao dispor e marcar a transição do Alto para o Baixo

Mondego. É aqui que o rio se liberta dos vales íngremes nos quais se desenvolvia e se estende pelas planícies

até ao mar. Assim, a “última” colina ganha uma importância estratégica no seu controlo para montante, sendo

que a própria topografia desta, com uma forma aproximadamente circular e com grande parte das suas

vertentes com declives muito acentuados, assegura uma boa autodefesa, facilitando o controlo da sua área.

É durante o domínio romano que Coimbra, na altura Aeminium, se começa a afirmar chegando a ser

capital regional devido à sua importância estratégica de controlo de território. Isto ocorreu principalmente

durante os períodos de maior turbulência do império romano, culminando com as invasões bárbaras por volta

do séc. V em que a cidade foi praticamente destruída. É nesta época conturbada que a Alta, para se tornar

ainda mais segura, foi amuralhada, correspondendo o limite essencialmente à linha onde a colina se tornava

demasiado inclinada para ser ocupada pela cidade e passando nos locais onde se localizavam as entradas da

cidade.

Poder-se-á dizer que, nesta altura, o “sacrifício” de morar no topo da colina era compensado pela

segurança que ela oferecia. A sua utilização anterior por outras culturas já tinha definido os caminhos

principais, que naturalmente surgiram adaptando-se totalmente ao terreno, aproveitando as pendentes

menos

A origem de uma necessidade 13

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agressivas e às quais os romanos não sentiram grande necessidade de modificar na sua essência devido à sua

lógica intrínseca, acabando estes por se manter até à actualidade praticamente inalterados em termos de

posição, mesmo após as destruições que afectaram toda a Alta nos séc. V e X.

Uma das estradas mais importantes da época na Península Ibérica Ocidental era a que ligava Olisipo a

Bracara Augusta e que cruzava o rio Mondego precisamente às portas de Coimbra através da ponte que

terminava na Portagem. Este facto aumentava também a importância da cidade como ponto de paragem de

quem percorria essa estrada. Por este motivo, assim como o de ser o rio um elemento dinamizador das

cidades, o acesso mais movimentado à Alta era efectuado pelo lado do Mondego. A forma da colina que se

assemelha a uma ferradura aberta em direcção ao rio, desenvolvia uma pendente menos acentuada

precisamente nessa abertura e foi aí que se desenvolveu a principal entrada da urbe: a Porta da Almedina. Foi

a partir do eixo que partia dessa porta que se desenvolveu o primeiro centro de Coimbra, no fórum romano,

que ocupava o lugar do actual Museu Machado de Castro e se estendia até ao Largo da Feira, hoje da Sé Nova,

impondo-se de uma forma monumental sobre a encosta. Este eixo culminava junto à Porta do Sol (1) onde a

colina terminava e havia um acesso a uma artéria importante que ligava a Bobadela. Nesta altura a Couraça de

Lisboa e da Estrela já serviam uma parte significativa do trânsito da Alta, em especial, efectuando uma ligação

mais livre entre a Portagem e o caminho de Bobadela.

Como sintoma recorrente deste tipo de cidades, quando estas se libertavam das contingências

defensivas durante as épocas de paz, os habitantes tendiam a descer para território mais plano e para mais

próximo de onde desenvolviam as suas actividades. No caso de Coimbra, muito provavelmente descia

primeiro quem lidava mais directamente com os viajantes que percorriam as estradas e quem trabalhava em

áreas relacionadas com os portos. Assim começava a surgir um grupo de pessoas estabelecido fora das

muralhas e daí até essa vontade se generalizar era um pequeno passo. No entanto, era do interesse dos

governantes que a

A origem de uma necessidade

(1) ALARCÃO, As origens de Coimbra, 1979

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A origem de uma necessidade

Fig. 3 – Núcleo primitivo da cidade de Coimbra segundo Vasco mantas

Legenda:

Criptopórtico (Fórum de Aeminium) - 1 Pretorium (Paços Reais) - 2

Aqueduto romano - 3 Arco da Estrela - 4 Ponte romana - 5

Teatro - 6 Mosteiro de Santa Cruz - 7

Rua da Sofia - 8 Praça do Comércio - 9

Arnado - 10 Zona portuária - 11

Mosteiro de Santa Clara - 12

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população se mantivesse dentro do perímetro controlado e tentavam contrariar o inevitável com regalias ou

penalizações para quem quisesse ir contra esse objectivo. Este tipo de movimentações, cidade fechada na

muralha e cidade a espraiar para terrenos mais planos, funcionavam ciclicamente enquanto houvesse

transições de períodos de paz e de guerra. Quando estes ciclos deixaram de acontecer, muitas cidades

perdiam a sua lógica existencial.

Coimbra, por seu lado, manteve sempre uma importância considerável, pois era precisamente no

Mondego que terminava a Galiza e este território era muito cobiçado e por conseguinte, muito instável. Na

sequencia de várias disputas ao longo dos séculos a cidade voltou mesmo a ser destruída novamente, desta

vez por Al-Mansor em 987. Foi, no entanto reconstruída sete anos mais tarde e chegou mesmo a tornando-se

o principal entreposto entre o sul islâmico e o norte cristão da Península Ibérica Ocidental. A actual

urbanização da Alta histórica ainda deve muitas das suas características a esta época, tendo sido criada de

uma forma muito orgânica, com ruas estreitas, pátios fechados e becos, seguindo as tradições islâmicas.

A importância da cidade manteve-se após a Reconquista Cristã e chegou inclusivamente a ser capital de

Portugal no reinado de D. Afonso Henriques, durante o qual foi renovada a muralha, construída uma nova

ponte sobre o Mondego, consolidado o castelo e actualizada a catedral moçárabe. Nesta altura a cidade

dividia-se em duas zonas perfeitamente distintas, a Almedina, no interior das muralhas, e o Arrabalde que se

começava a desenvolver. Também estava bem marcado, pela ocupação do território, para onde a cidade se

queria virar ao sobrelotar a encosta virada a sudoeste e mantendo com poucas construções as zonas norte e

nordeste da Alta. Nesta altura foram aproveitadas muitas das edificações precentes que viriam a reflectir o

mosaico de culturas diferentes que deixaram marcas na urbe.

A origem de uma necessidade 16

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Segunda fase – Inversão do papel da colina

Até este momento da fundação da nacionalidade, a lógica da cidade se desenrolar principalmente na

Almedina continuava bastante actual com os períodos de instabilidade que se iam vivendo. Após a

capitalidade ter sido mudada para Lisboa, começou um período de relativa paz na zona de Coimbra e foi com

esse ambiente que a decadência da cidade se começou a revelar. Apesar de ter continuado a crescer, dado

que coincidiu com uma fase de renascimento das cidades europeias, a sua importância ficou bastante

afectada quando comparada com o seu passado recente e com outras cidades que despertavam nesta altura.

A vantagem que outrora existiu em viver dentro das muralhas desapareceu e a esta zona não mais voltou de

uma forma verdadeiramente importante. O antigo aglomerado urbano que tinha surgido naquele preciso local

devido à necessidade de se defender viu o seu centro mudar várias vezes num curto espaço de tempo, sempre

em direcção ao rio. Primeiro desceu para o largo da Sé Velha, depois, paradoxalmente, para a Porta da

Almedina e posteriormente estabeleceu-se na Baixa, deixando a Alta parcialmente desabitada. É certo que a

zona que se estava a abandonar estava mais desenvolvida e que muitos dos edifícios principais continuavam a

localizar-se lá: a Sé Velha, erguida na segunda metade do séc. XII, o Castelo, junto à Porta do Sol, e embora

não se soubesse quando voltaria a próxima época de instabilidade para provocar um movimento de recúo

para o interior do perímetro amuralhado, lentamente a transição definitiva pareceu inevitável.

No final do séc. XIII surgiu um ponto crítico no desenvolvimento desta nova fase coimbrã, quando já

existiam quatro freguesias fora de muralhas, essencialmente distribuídas à volta do Mosteiro de Santa Cruz,

erguido a partir de 1131 (1), e a Praça Velha, que se estava a tornar um centro de comércio relacionado com a

estrada que percorria o país. A cidade estava a crescer e queria continuar a desenvolver-se em terrenos mais

A origem de uma necessidade

(1) Gonçalves, Nogueira, Inventário Artístico de Portugal, 1947

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planos e próximos do rio, mas não havia espaço para tal e o Mondego, que não era fácil de domar com as suas

cheias imprevisíveis, impedia que se ganhasse espaço nessa direcção. Além de que, vastas áreas do arrabalde

tinham sido cedidas e adquiridas pelas ordens religiosas que, com o crescimento da cidade, acabaram por

enclausurar a cidade impedindo a sua expansão para as zonas propícias por eles dominadas. Estes factores

fizeram com que o abandono da colina não tivesse sido tão forte quanto poderia ter sido, ficando este num

meio termo. Este facto acabou por tornar a possibilidade de reversão do processo de desocupação da colina

possível, mas ao mesmo tempo não favorecia o crescimento natural da cidade que procurava zonas mais

planas, correndo assim o sério risco de estagnar o desenvolvimento desta. , que foi efectivamente o que veio

a acontecer nos próximos séculos.

Várias foram as tentativas de recuperação da centralidade por parte da Alta, preocupação comum a

muitas cidades portuguesas. Os governantes temiam que voltasse a ser necessária a defesa por ela assegurada

e com o desenvolvimento que as cidades estavam a ter fora desses limites, ficavam seriamente ameaçadas ao

poderem perder rapidamente os seus novos “centros”. Coimbra não foi excepção, no entanto as medidas

adoptadas, quanto muito, só conseguiam atrasar ligeiramente esse abandono. No inicio do séc. XVI, D.

Manuel I visitando Coimbra verificou que esta estava a passar ao lado do desenvolvimento que Portugal

assistia devido às viagens marítimas. A cidade estava em grande decadência e por isso promoveu uma

reestruturação urbana que, embora tenha acabado por incidir essencialmente na Baixa, onde a cidade se

estava a desenvolver, também tentou requalificar parte da Alta. Este período Manuelino acabou por marcar

profundamente a reorganização conimbricense, reflectindo a intenção de melhorar toda a urbe, podendo-se

considerar assim a primeira intervenção urbanística efectuada na cidade. Infelizmente a Alta manteve a sua

decadência, ficando praticamente desabitada, continuando a ser a excepção a vertente a sudoeste,

novamente pelas razões referidas anteriormente.

A origem de uma necessidade 18

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A origem de uma necessidade

Fig. 4 – Planta de Coimbra no Século XII

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Terceira fase – Um programa dinamizador

É com o reinado de D. João III que os destinos da cidade vão mudar completamente. O monarca, que

tinha em mente uma reforma do ensino, ordena a transferência definitiva da Universidade para Coimbra,

facto este que veio provocar uma renovadora orientação urbanística para a cidade, dando-lhe o impulso

necessário para a alteração do estado em que se mantinha desde o início da nacionalidade.

Em 1537 a Universidade é oficialmente transferida de Lisboa para Coimbra. O plano incluía um novo

esquema pedagógico e era atribuído ao Mosteiro de Santa Cruz a sede dos Estudos Menores, associando-lhes

a Rua da Sofia. Simultaneamente propôs-se a construção de escolas específicas para a Universidade na Alta de

Coimbra, na zona dos paços reais, destinadas ao ensino de Teologia, Cânones, Leis e Medicina. Deste modo, o

ensino renascentista ficava associado à tradição com os monges de Santa Cruz, sendo estes responsáveis pelo

ensino base preparatório a ser dado nos Colégios, e com os novos métodos no ensino universitário que seria

desenvolvidos na Alta. No entanto, como não havia edifícios disponíveis, e para que este plano pudesse ser

executado imediatamente, a Universidade ocupou provisoriamente o Mosteiro de Santa Cruz. Nesse mesmo

ano, o rei cedeu os paços reais na Alta para a instalação do ensino de Direito, permanecendo o ensino de

Medicina e Teologia no mosteiro.

Em 1544, após alguma rivalidade entre o Mosteiro de Santa Cruz e a Universidade, D. João III

determinou a transferência de todo o ensino universitário (Faculdades de Teologia, de Medicina e Artes) para

os paços reais, ficando apenas a funcionar no mosteiro crúzio o ensino nos Colégios. Foi retomado assim o

plano inicial que visava a concentração, num espaço próprio, de todas as dependências do ensino

universitário. Segundo José Branquinho de Carvalho “começou então, verdadeiramente, o período áureo da

Universidade

A origem de uma necessidade 20

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portuguesa. Funcionando junto dela, surgiram os colégios, instituições que sob a direcção das diversas ordens

religiosas e com a protecção régia, visavam, uns a preparação dos alunos para entrarem nos estudos

superiores (colégio das Artes), outros onde doutores e licenciados tirocinavam para o professorado

universitário (Colégios de S. Pedro e de S. Paulo) e os restantes, o grande número, constituíam comunidades

de alunos e membros das respectivas ordens para seguirem os estudos universitários.”

Este programa que modificou completamente a direcção que a cidade estava a tomar, com os novos

interesses associados a Alta sofreu uma revitalização completa voltando a ocupar o espaço entretanto

deixado vago. A presença da Universidade veio também devolver a capitalidade a Coimbra dentro do império

português, desta vez como capital do conhecimento. Com estas alterações a cidade duplicava o número de

habitantes no espaço de 50 anos (1) e o seu crescimento começava a sair das zonas tradicionais e a espalhar-

se pelas colinas próximas. Esta re-centralização na Alta, após nela ter sido implantado o programa mais

dinamizador da cidade, volta a trazer questões relacionadas com as acessibilidades. Porém, embora tenham

passados vários séculos desde o seu “abandono”, os acessos continuavam relativamente actuais, dado que os

meios de transporte continuavam aproximadamente os mesmos e os costumes da maioria do povo não se

tinham alterado significativamente, continuando a grande maioria do trânsito a ser pedonal e assim sendo o

que se pedia essencialmente era a reabilitação das vias existentes que entretanto tinham ficado degradadas.

D. João V (1689 – 1750) chega a promover algumas reformas, mas estas não têm impacto urbanístico

muito significativo, concretizando-se apenas algumas obras pontuais como a Biblioteca Joanina e a Torre da

Universidade. Porém o impacto que a cidade necessitava iria brevemente ser estudado, desta vez com a

objectividade de um espírito da novo.

A origem de uma necessidade

(1) Lobo, Rui, Coimbra: evolução do espaço urbano, in ecdj 6 – novos mapas para velhas cidades, p27

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Fig. 5 – Conimbriae, J. Jansonus, 1620

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A origem de uma necessidade

Fig. 6 – Mapa Thopografico da cidade de Coimbra com a divizão das antigas freguezias,

desconhecido, Séc. XVIII

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Em 1772 o Marquês de Pombal manda efectuar planos de reforma para a Alta da Universidade. Desses

estudos foram concretizadas as actuais Praça Marquês de Pombal e o Paço das Escolas (esta última, no

entanto, não foi concluída) e a principal obra planeada, o grandioso Observatório Astronómico, embora se

tenha começado a sua construção, nunca chegou a ganhar dimensão e não chegou a passar sequer do

primeiro piso. Este projecto, dada a sua relação com a Couraça de Lisboa, fez com esta fosse estudada

também e foi projectada uma solução, que passaria pela sua reabilitação e embelezamento promovendo

assim um acesso mais satisfatório da Universidade à Portagem e mais digno de uma via onde se encontrava a

obra que marcaria as novas reformas.

É no entanto com a nacionalização dos bens das ordens religiosas que uma grande alteração na cidade

vai ocorrer. Como já tinha sido referido, muitos dos domínios destas ordens estavam a criar barreiras na

cidade que não a deixavam crescer convenientemente, quando esses domínios se tornaram públicos a cidade

ganhou um novo fôlego para se expandir. Um dos lugares principais a beneficiar a cidade com estas alterações

foi o Vale da Ribela, onde se encontrava a Quinta de Santa Cruz e é nesta altura aberto um boulevart (actual

Avenida Sá da Bandeira) que muda bastante a forma como as deslocações se davam por dentro da cidade,

além de que permitiu que se urbanizassem as encostas adjacentes. A partir deste momento surgiram novos

acessos à Alta. O Quebra Costas deixava de ser a entrada quase exclusiva de quem vinha da Baixa para esse

trânsito se dividir pela encosta norte e nascente, estes dois novos acessos possuíam vertentes menos

inclinadas e as vias eram bem mais largas que as existentes até à altura, começando esta última característica

a ser importante como adaptação às ideias da época, ideias essas que vinham essencialmente de Paris e que

vinham comprometer seriamente a antiga ideia da cidade tradicional.

A origem de uma necessidade 24

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A origem de uma necessidade

Fig. 7 – Mapa da Couraça de Lisboa – Projecto de reforma, José Carlos Magne, finais do séc.. XVIII

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A origem de uma necessidade

Fig. 8 – Dois perfis da Couraça de Lisboa, desde o fim da muralha até ao Arco da Traição, José Carlos

Magne, finais do séc. XVIII

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A origem de uma necessidade

Fig. 9 – Perfil de rua, desde o Arco da Alegria até à Capela de Santo António da Estrela, José Carlos

Magne, finais do séc. XVIII

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Quarta fase – O início do fim das cidades tradicionais

Com a revolução industrial, uma nova fase começava a afectar decisivamente as cidades um pouco por

todo o lado. A população cresceu exponencialmente e deixou de haver espaço para as pequenas soluções – a

cidade ou era competitiva ou era ultrapassada pelas demais. Coimbra pertencia ao tipo de cidades que lidava

mal com estas alterações, principalmente devido à falta de espaço que imperava. As colinas eram tudo menos

indicadas para o estabelecimento de indústrias e assim foi urgente ganhar espaço ao rio.

Para complementar os meios de transporte existentes e para se actualizar no âmbito nacional, o

caminho de ferro surge em Coimbra no ano de 1864 e pouco tempo depois é anunciada a construção do

ramal da Lousã em 1873 (este é apenas inaugurado em 1906). Nesta altura a ideia generalizada, incluindo da

elite, era que o tipo de cidade que Coimbra representava era completamente inadaptado aos novos tempos e

a arquitectura tradicional era desprezada. Em 1870 Camilo Castelo Branco escreveu que «o progresso é

barrigudo: não cabe em ruas estreitas» demonstrando assim o sentimento que iria dominar as próximas

gerações em relação à cidade histórica. É fácil de perceber o porquê destas afirmações, ruas tortuosas e

íngremes era o que não faltava nas cidades portuguesas, afectando muito a salubridade destas e assim estas

características eram vistas mais como uma praga do qual as pessoas se queriam livrar do que propriamente

algo a preservar. Com este sentimento vigente obviamente não surgiu um pensamento adequado que

pudesse resolver, de uma forma não demasiado radical, os problemas da Alta e as atenções viravam-se para

terrenos mais facilmente trabalháveis de acordo com as novas ideias, essencialmente os terrenos planos

próximos ao rio.

A origem de uma necessidade 28

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Nestas evoluções, as cidades em terrenos complicados levavam uma segunda “machadada” na sua

importância. Nesta altura, mesmo as que tinham continuado a sobreviver por estarem associadas a algum

itinerário importante corriam o risco de desaparecer, dado que a actualização dos transportes fez com que

fossem necessárias bem menos paragens que antigamente. Coimbra, que também perdia alguma importância

ao deixar de ser paragem obrigatória na milenar estrada Lisboa-Braga, podia ter muito bem sido remetida

para um plano secundário no âmbito nacional novamente, isto caso não possuísse um programa que tornava

a sua existência inquestionável mesmo quando exposta a estas alterações , a Universidade continuava assim a

salvar Coimbra. Os acessos à Alta, mesmo com estas alterações, não ficaram comprometidos porque não

havia a necessidade de grandes transportes para o topo da colina e o transporte de passageiros era

perfeitamente viável para as exigências da época devido aos acessos ganhos pelo local da antiga Porta do Sol

e pela vertente norte que havia sido retirada aos monges crúzios.

A origem de uma necessidade 29

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A origem de uma necessidade

Fig. 10 – Vista da cidade a partir da margem esquerda, Arséne Hayes, finais do séc. XIX

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Durante o primeiro terço do séc. XX, foram vários os projectos de remodelação centrados na baixa da

cidade, no entanto havia de ser na Alta que eles subitamente começaram a ser executados. A cidade com 40

mil habitantes em 1930 estendia-se por todas as colinas à volta, inclusivamente para o outro lado do rio, mas

mantinha o seu centro principal na Almedina com a Universidade e toda a vida que se tinha gerado à volta.

Esta era a zona de maior relevo económico e mesmo com o surgimento do trânsito automóvel, as ruas da

altura eram perfeitamente viáveis para responder a esse tráfego. Nesta época a Alta era cidade, tinha

bastante comércio, emprego e muitos habitantes, não existindo segregação entre as zonas, porém as

reformas que o Estado Novo queria implementar vinham alterar fatalmente esta união. Com o plano de

Cottinelli Telmo a Alta ir-se-ia mono funcionalizar, especializando-se ainda mais no ensino universitário e é em

1943 que começa a última grande reforma na Alta da Universidade, esta modificaria enormemente a vida dos

seus habitantes. Foram demolidos mais de 200 prédios para dar lugar aos novos blocos das faculdades,

comprometendo definitivamente a eventual unidade que pudesse existir no aglomerado urbano e

acrescentando uma marca imponente na paisagem de Coimbra, respondendo desta forma à imagem que a

ditadura queria dar com esta reforma. Esta provoca efeitos muito rápidos na vida da Alta, grande parte da

população mudou-se para novos bairros, o comércio obviamente também se ressentiu e foi abandonando a

zona, esta não mais voltou mais a ser a mesma.

A origem de uma necessidade 31

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A origem de uma necessidade

Fig. 11 – Fotografia retirada do site http://aen.com.sapo.pt/Nacional/obras.html

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Quinta fase – A cidade abandona a Alta

Após as grandes alterações provocadas pelas reformas do Estado Novo e ainda na década de 40 é

lançado um estudo para o planeamento global de Coimbra conhecido como Plano de De Gröer, este vai dividir

a cidade em sectores consoante a finalidade, continuando assim a separação de funções começada com a

criação da nova Universidade. Nesta separação vemos atribuída à zona antiga da Alta, nomeadamente à

encosta virada para o Mondego, o estatuto de cidade-museu.

Embora ainda muito embrionária na altura, esta atitude mostra uma alteração na imagem que se tinha

deste tipo de ambiente urbano, começando a surgir em Coimbra um pensamento conservador em relação às

zonas históricas. Este efeito deverá ter sido, muito provavelmente, despertado pelo resultado de uma

percepção de que o que se perdeu com a destruição de parte da Alta era algo que se devia ter sido preservado

e por conseguinte uma mística que a Universidade tinha não mais se recuperaria. Porém, este mesmo

sentimento protectivo acabou por ter um efeito perverso. Ao querer proteger em demasia o existente,

fechou-se a porta à possibilidade de um adaptação mais fácil deste lugar aos novos tempos, ficando apenas a

carcaça de cidade que a abandonou. O que não se perdeu com eventuais erros urbanísticos, estilísticos ou

construtivos começou a ser consumido pelo tempo e desuso. Vários outros planos foram surgindo ao longo do

Século XX em que alguns dos pontos focados por este plano foram utilizados, no entanto pouco se fez para

inverter o processo de desocupação desta zona antiga.

A sociedade actual modificou muito os seus hábitos nas últimas dezenas de anos. Com a generalização

dos transportes privados e o desenvolvimento dos transportes públicos a antiga maneira de se desenvolver o

trânsito pedonal ficou bastante alterada, a grande maioria das pessoas já não se sujeita mais a fazer os seus

percursos diários numa calçada, muito menos num dia de chuva ou de muito calor. Este efeito, associado aos

A origem de uma necessidade 33

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movimentos pendulares, vem sobrecarregar muito os dois principais acessos viários à Alta, pela Rua Padre

António Vieira e Calçada Martim de Freitas (os únicos realmente viáveis) e deixa livres os antigos acessos

pedonais, agora completamente ultrapassados pelo tempo.

A origem de uma necessidade 34

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Sexta Fase – Novas oportunidades para um renascimento

Actualmente têm sido implementadas medidas para tentar recuperar o espaço perdido nos últimos

anos, estas começam a pensar a zona antiga de uma forma diferente. A explosão de transportes privados

ocorrida no último século abrandou e começam a existir várias outras opções para as deslocações do

quotidiano. Também a ideia de beleza associada à cidade tradicional ficou bem estabelecidade e caso existam

condições para tal, a habitação nestas zonas pode voltar a florescer. Com estas alterações da sociedade

começaram a surgir projectos e planos para tornar estas zonas mais cómodas, começando obviamente por

assegurar acessos mais facilitados.

Uma das últimas medidas que marca uma nova estratégia para a Alta foi a construção de um elevador

urbano com o intuito de melhorar o acesso pedonal à Alta, o Elevador do Mercado. Esta medida demonstra

uma crescente necessidade de criar alternativas às já estabelecidas e saturadas e propõe o trânsito pedonal

como viável para esse efeito. Este tipo de transporte também vem ajudar a resolver o problema das

acessibilidades condicionadas, já que a Alta é uma zona com muitos problemas neste sentido. Foi na

sequência desta mesma discussão que surgiu o Pantufinhas, tratando-se este de um pequeno autocarro,

adaptado à circulação pelas ruas estreitas da Alta servindo essencialmente a população residente, esta

encontra-se bastante envelhecida e assim requer cuidados especiais. Estas medidas vêm ajudar em boa parte

a que a habitabilidade da Alta melhore, a zona desfruta obviamente de uma boa centralidade e assim sendo,

com um bom desenvolvimento dos acessos a parte Alta, esta poderia ser bastante revitalizada.

Por fim, fica de referir um projecto feito por Manuel Graça Dias e Egas José Vieira de um acesso do

Parque da Cidade à Alta. Este propõe-se a tornar rápida a viagem entre a paragem da linha de Serpins e a

A origem de uma necessidade 35

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Universidade, percorrendo um desnível de 68 metros maioritariamente por cima do Jardim Botânico. Trata-se

de uma “ponte em arco” através da qual cabines transportam as pessoas. Este projecto, conciliado com a

forte possibilidade da concretização do metro de superfície a passar no local, viria também a ajudar a

melhorar os acessos à Alta, em especial à grande quantidade de pessoas que viaja na linha actual da

automotora (com a possibilidade do número aumentar com o metro) e as quais têm ainda de fazer um grande

percurso das suas paragens até chegar aquela zona.

A origem de uma necessidade 36

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A origem de uma necessidade

Fig. 12 – Imagens retiradas do blog http://infohabitar.blogspot.com/2006/10/mobilidade-no-centro-histrico-o-caso.html

, referentes às soluções de mobilidades à Alta em projecto e concretizadas recentemente.

O mapa mostra o percurso do Pantufinhas (foto do canto direito superior) com a linha azul escuro, a linha a azul claro cheia representa o Elevador do

Mercado (foto do canto inferior direito), a verde os projectos de corrimãos a aplicar em diversas ruas e

a linha a azul claro tracejado representa a localização onde está projectada a “ponte em

arco” de Manuel Graça Dias e Egas José Vieira.

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A origem de uma necessidade

Fig. 13 – Motagem retirada do site http://www.contemporanea.com.pt/arco_01.html, referente ao projecto de Manuel Graça Dias e Egas

José Vieira

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Uma resposta moderna a um problema antigo

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Uma resposta moderna a um problema antigo

O lugar

A encosta sudoeste da Almedina, como se pôde entender pela análise histórica, é a mais

consolidada e antiga. Também é a que mais sofreu no século passado quando os principais acessos

à Alta se mudaram para outras vertentes, afastando-a assim dos movimentos da população em

direcção à Universidade. No entanto esta ocupa uma posição privilegiada, quer pela sua exposição

solar e paisagística, quer por se situar no meio de duas das mais movimentadas zonas da cidade – a

Alta Universitária e a Baixa. Estes dois pólos estão actualmente de costas viradas devido à

inexistência de acessos viáveis que permita a ambos contactarem de uma forma eficiente, e assim,

é urgente restabelecer algumas das ligações que anteriormente fizeram essa ponte.

Ao observar a paisagem de Coimbra a partir de Santa Clara, facilmente podemos fixar-nos

nos muros de contenção de terreno existentes na encosta da Couraça de Lisboa contrastando

nitidamente com o denso bloco de construções vizinhas. Este é um terreno que se situa já fora do

antigo perímetro amuralhado, fora da zona histórica protegida, e em que, devido ao seu declive, a

única construção humana existente são umas escadas que ligam a Couraça à Rua da Alegria,

atalhando numa perigosa descida. Podemos também facilmente perceber, sem precisar de o

confirmar historicamente, que aquele espaço serviu de fronteira durante muito tempo, pois várias

são as diferentes épocas marcadas no seu envolvente – Alta Universitária, Alta histórica, Jardim

Botânico, Parque Dr. Manuel Braga e Portagem.

Sem dispor de estudos estatísticos para tal, penso poder associar, no nível superior, a

Universidade a um local onde muitas pessoas trabalham (estudantes e funcionários) e à qual os

acessos se encontram sobrelotados; a zona histórica a um lugar turístico muito importante e

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Uma resposta moderna a um problema antigo

potencialmente habitacional da cidade que possui várias dificuldades de acesso e ao Jardim

Botânico, um lugar de lazer que actualmente se encontra muito desprezado, em parte por conta dos

parques mais facilmente acessíveis que se encontram junto ao rio. A um nível inferior encontra-se a

Portagem com as suas inúmeras paragens de transportes públicos e rápido acesso à Baixa e os

parques Dr. Manuel Braga e Verde que actualmente se encontram cheios de vida, principalmente o

último, demonstrando que estão a “funcionar” de acordo com a vida da cidade. A tudo isto, juntando

o desenvolvimento que estes parques próximos do rio ainda vão ter quando os planos em curso que

os afectam se concluírem e ao metro de superfície que, ao que tudo indica será uma realidade, um

projecto nesta zona que os conseguisse articular de uma forma mais fácil, seria uma mais valia

muito importante para a cidade.

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A origem de uma necessidade

Fig. 14 - A imagem mostra algumas das principais zonas com as quais o elevador se relaciona mais

directamente, sendo que o acesso projectado está representada com a linha vermelhoa, as linhas amarelas cheias representam os acessos à Alta

viáveis, as linhas a tracejado, representam os acessos ultrapassados. A área a verde escuro

representa o Jardim Botânico, a verde claro os parques Dr. Manuel Braga e Verde do Mondego, a azul a zona da Portagem, a laranja a zona histórica

da Alta e finalmente a vermelho a Universidade. (fotografia aérea retirada do Google Earth)

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Uma resposta moderna a um problema antigo

A paisagem

Numa área com tantas marcas de tantas épocas e com uma imagem tão

reconhecível e querida, como se poderia intervir? Não me interessava “roubar” demasiada atenção

ao envolvente, provavelmente porque até simpatizo com a paisagem além de que não acho que

outra “Torre da Universidade” fosse aconselhável ou necessária, excluindo logo aqui uma proposta

muito extravagante e impactante. No entanto este é um programa público importante que não pode

ser simplesmente camuflado na paisagem construída, até porque seria contra a sua própria natureza

dado que é uma excepção em relação ao envolvente, é um elemento com uma estrutura diferente

dos demais assim como o seu programa, requerendo então uma atenção especial.

O pensamento foi relativamente simples, eu sabia o que não queria e não fazia

parte das minhas intenções criar um grande passadiço por cima de casas que fosse ligar a uma torre

de 45 metros de altura, ou qualquer outro tipo de estrutura com uma escala semelhante. Assim, a

hipótese virou-se logo para outra possibilidade e, após perceber o percurso que era necessário ser

feito, o esquema foi directo. Vinte metros de elevador exposto na colina, vinte enterrados e dois

lugares muito apropriados para fazer a ligação com o envolvente. O projecto começava logo por

dividir-se em três partes: o espaço público em baixo que dá acesso ao elevador; o próprio elevador,

de duas cabines e com possibilidade de levar até dezoito pessoas de cada vez; e a zona à cota da

Couraça que faz o interface com as diferentes partes da Alta.

Os vinte metros de elevador exposto dão a escala suficiente para que tenha algum

destaque na paisagem, dado que é este elemento que efectivamente vai servir de acesso na ligação

da cota alta à cota baixa, premissa inicial à qual o projecto se propunha a responder, e, por isso,

teria toda a

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Uma resposta moderna a um problema antigo

lógica que este recebesse um tratamento de destaque. No entanto, o destaque/protagonismo que

queria dar, como já referi, não era de todo semelhante ao instituído pela Torre da Universidade.

Queria antes algo que fizesse uma integração mais suave com o envolvente, mas também não

deixando de surpreender quem o observasse.

A solução adoptada para servir de suporte ao elevador acabou por ser a de uma estrutura

metálica com uma forma algo orgânica, tendo esta como objectivo ser totalmente diferente do resto

do envolvente e trazer assim uma tecnologia moderna para uma paisagem na qual, esta, é

praticamente inexistente. Para o fechamento dessa estrutura optei por uma “Green Wall” com o

objectivo de integrar a forma metálica na paisagem e, embora possa parecer algo contraditório,

diminuindo assim a singularidade e separação do elevador. Com esta dualidade complexa, o

interesse final é proporcionar uma obra que ao mesmo tempo fique explicita que pertence ao Séc.

XXI mas sem querer evidenciar-se em demasia em relação às épocas anteriores, quebrando assim a

linha de pensamento que mais tinha marcado a paisagem no século passado.

Na zona de interface superior não interessava, e nem era aconselhável manter a mesma

linguagem do elevador para não haver uma disputa de protagonismo dentro do projecto. Nessa parte

foram os muros de contenção do terreno que deram origem à ideia de integrar na colina o espaço

emergente de uma forma semelhante à que estes o faziam anteriormente, evitando com isto grandes

movimentações de terra e não havendo assim uma alteração significativa de escala que se pudesse

destacar no envolvente. Resultante deste pensamento, foi deixado o espaço amplo e aberto,

funcionando a vários níveis diferentes, apenas com um bar e instalações sanitárias públicas

fechadas, relacionando-se assim com o conjunto de caminhos que se intersectam no local e

funcionando ao mesmo tempo como miradouro devido à boa exposição para apreciar a bela

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Uma resposta moderna a um problema antigo

paisagem que o Mondego propicia. Esta zona, com os seus muros e programa construídos em betão

branco, integra-se facilmente no envolvente e vai provocar uma interessante imagem quando

confrontado com o elevador verde, referenciando uma característica muito comum em Coimbra, ao

simular um jardim privado no meio das construções.

Devido à existência de uma parte enterrada do elevador, duas das partes iriam ficar

visualmente separadas da terceira, daí ter surgido a ideia de manter a linguagem específica do

elevador na parte baixa, essencialmente através da zona coberta que liga à Avenida Emídio

Navarro. Esta estrutura metálica com parede verde novamente incorporada, obviamente fica

associada ao elevador. Assim que a pessoa veja os dois elementos, fica clara a existência de uma

relação entre as duas zonas, facilitando a orientação tanto para quem vem de baixo como de cima,

podendo então perceber onde vai dar cada uma das entradas deste acesso. O espaço à cota inferior

contém ainda várias linhas no seu desenho que tentam direccionar as pessoas para a entrada do

elevador. Este efeito tem como objectivo reforçar esse caminho que, devido a este se encontrar

numa galeria enterrada, poderia passar mais despercebido a quem cruzasse a avenida.

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Fig. 15 – Montagem de uma fotografia de Coimbra, tirada a partir de Santa Clara, mostrando

o efeito pretendido na paisagem com a proposta do elevador

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A origem de uma necessidade 47

Fig. 16 - Render a mostrar a parte da proposta.

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A origem de uma necessidade 48

Fig. 17 – Montagem de uma fotografia tirada a partir da Couraça de Lisboa, mostra a zona de

interface superior e o elevador.

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A origem de uma necessidade 49

Fig. 18 – A imagem superior da esquerda mostra um render aproximado do elevador; a da direita superior mostra uma foto montagem a partir da

Avenida Emídio Navarro com a entrada inferior do elevador; o render inferior mostra uma imagem

retirada a partir da Rua da Alegria, a mostrar o espaço público inferior da proposta.

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Uma resposta moderna a um problema antigo

Programas semelhantes

Pela análise histórica feita ao lugar, percebemos que actualmente uma nova estratégia está a

ser desenvolvida para melhorar os acessos à Alta, principalmente com a introdução de novos

acessos mecânicos aproveitando as novas tecnologias. Assim sendo, esta ideia de projectar um

elevador para o local está no tema do dia e ainda mais por causa do projecto de Manuel Graça Dias

e Egas José Vieira. Obviamente surge uma comparação inevitável entre este acesso projectado por

mim e o da “ponte em arco”, dado que me parece óbvio que apenas um deles teria lugar na zona.

Por este motivo, embora não queira discutir qualidade projectual porque os projectos pouco têm que

ver na sua essência e também porque, sinceramente, não me sinto qualificado para discutir

amplamente a outra proposta, vou apenas apresentar alguns pontos que os distinguem.

Para começar, no que é mais importante para mim, existe uma diferença gigantesca no efeito

criado por um e outro na paisagem, sendo que a ponte tem um impacto muito mais forte e faz-me

lembrar a que eu imaginava da colina de minha casa até à Universidade, indo esta solução

claramente contra a identidade que associo a Coimbra. No entanto gostava de deixar bem explícito

que isso não é necessariamente mau. Por vezes são estas obras que orientam as cidades em

direcções diferentes e que lhes podem trazer muitos benefícios. A escala da ponte acaba também

por trazer vantagens e desvantagens. Existe possivelmente uma vantagem em termos de

localização, embora a nível inferior a vantagem até possa estar do lado do meu projecto ao estar

mais próximo da Portagem e tendo em conta que a localização das futuras paragens da linha de

metro possam ser alteradas. Já ao nível superior, o projecto de Manuel Graça Dias e Egas José

Vieira parece-me ganhar alguma vantagem ao evitar o restante percurso pela Couraça de Lisboa

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Uma resposta moderna a um problema antigo

para atingir a Universidade a que o elevador fica sujeito. A última diferença, que me parece

significativa dentro das que consigo determinar, é a da complexidade da estrutura, que no caso da

ponte deve levar a preocupações muito maiores e muito provavelmente a um aumento significativo

dos custos de construção e manutenção.

Assim poder-se-ia dizer que o projecto que apresento teria muito mais que ver com o Elevador

do Mercado, no entanto parece-me que existem diferenças consideráveis. Enquanto a “ponte em

arco”, na minha opinião, afirma-se demais, o Elevador do Mercado tem o efeito inverso e presumo

que o meu projecto fique num patamar intermédio entre estes dois. Este acesso também perde ao

se dividir em ascensor e elevador, não criando assim uma identidade própria forte que, se possuísse

apenas uma das soluções, poderia mais facilmente criar. Esta última característica também tem um

efeito prejudicial para a circulação. Para finalizar estas comparações, a própria localização do

elevador na Couraça, sem possuir os tais dados estatísticos, parece-me que tem uma relevância

muito maior em termos de passageiros, principalmente por estar numa encosta onde hoje não

existem acessos fáceis a quem queira fazer esse percurso. No caso do Elevador do Mercado,

embora a encosta também seja íngreme, existe a possibilidade de trânsito automóvel, limitado à

largura das ruas é certo, e mesmo o trânsito pedonal também se faz com maior facilmente devido à

menor distância a ser percorrida.

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A origem de uma necessidade 52

Fig. 19 – Imagem da “ponte em arco” do projecto de Manuel Graça Dias e Egas José Vieira, imagem

retirada do site http://www.contemporanea.com.pt/arco_01.html

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Conclusão

Com esta proposta a Alta “recupera” um acesso no lugar da Couraça de Lisboa, adaptado às

novas exigências da vida moderna e que pode contribuir para um melhor aproveitamento do espaço

que entretanto foi sendo deixado vago devido ao declínio que tomou posse desta zona, em especial

desde a reforma imposta pelo Estado Novo. É um elevador que se afirma na paisagem de uma

forma serena e que, embora seja uma solução pontual, acaba por poder afectar zonas que se

encontravam bastante distantes, colocando-as em contacto directo. É também um ponto que marca

o encontro de várias épocas: as faculdades criadas pelo Estado Novo representando no Século XX;

o Parque Dr. Manuel Braga e os edifícios envolventes do Século XIX; o Jardim Botânico do XVIII; a

cidade antiga, representando esta várias outras épocas anteriores; e o Século XXI que ele

representa, demonstrando uma nova atitude em relação à cidade e mostrando-se como uma

adaptação que este novo milénio faz aos novos hábitos da população.

53Uma resposta moderna a um problema antigo

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Dados técnicos

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Nesta parte do trabalho apresentarei plantas, cortes e alçados da zona projectada a diferentes

escalas e promenorizo a estrutura do elevador, dado ter sido o objecto com o principal destaque na

proposta e pela sua estrutura de jardim vertical se repetir na zona de interface inferior.

Foram-me fornecidos dados técnicos do elevador propriamente dito, este utiliza uma nova

tecnologia chamada Flat Belt , promenorizada em anexo, que essencialmente necessita de uma

caixa das máquinas, tanto em cima como em baixo, bem menor. O peso geral da estrutura também

é muito menor e esta inovação por outras variadas razões torna-se muito mais ecológico que o

elevador tradicional. Também foi ponderada a hipótese de um elevador hidráulico, mas rapidamente

me foi desaconselhado por técnicos devido à altura que este acesso atingia e aos maiores custos de

manutenção e energéticos.

Relativamente à Green Wall, utilizada no fechamento da estrutura exterior do elevador e

também na zona em contacto com a Avenida Emídio Navarro, de referir que tentei obter a partir das

empresas do ramo dados técnicos, mas que devido a tratarem-se de informações confidenciais não

me foram fornecidas. No entanto consegui obter algumas explicações do funcionamento deste e a

partir das quais consegui elaborar um sistema ligeiramente diferente do que me foi exposto,

adaptando-se melhor à minha necessidade. Embora não estejam definidos alguns pormenores mais

técnicos e dos quais não dispunha de conhecimento, como a bomba de água com os nutrientes, a

globalidade da estrutura é desenvolvida.

55Dados Técnicos

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Green Wall

A estrutura da parede verde normal divide-se principalmente em 3 partes: uma estrutura metálica, uma

camada de PVC and uma camada de feltro. A estrutura metálica pode-se suportar por si mesma o

conjunto ou fixar-se a alguma parede, o PVC vai dar tornar o conjunto à prova de água de um dos lados e

ajuda na estabilização das várias camadas e a camada de feltro, feito de poliamida, é grampeada no PVC, este

material garante uma distribuição homogénea da água e não se degrada. As plantas ou sementes são

colocadas sobre o feltro e aí desenvolvem-se livremente .

Esta tecnologia ao aperceber-se de que as plantas utilizam o solo essecialmente para servir de suporte,

foi compreender o que mais era necessário, assim ao criar um suporte artificial e na própria água de rega se

colocarem os nutrientes necessários, o solo torna-se facilmente dispensável, como é este elemento, o solo,

que concentra a maior parte do peso dos pequenos jardins, com a sua ausência abrem-se inúmeras

possibilidades e muitas variações de técnicas podem ser desenvolvidas.

Um aspecto muito importante desta tecnologia, é que funciona muito bem como isolamento térmico e

acústico e ainda consegue tornar o ar mais puro e fresco, associando-se assim às novas tecnologias verdes que

estão tanto em voga e conseguindo trazer um jardim facilmente para qualquer parte da cidade.

De referir que para os casos de jardins verticais interiores, convém usar plantas especificas que se

adaptem a uma menor luminosidade, por exemplo plantas do solo de florestas tropicais - Begonia, Anthurium,

Nephrolepis – nestes casos convém utilizar iluminação com os necessários comprimentos de onda para a

fotossíntese acontecer.

56Dados Técnicos

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57Dados técnicos

Fig. 20 – Projecto da CaixaForum de Herzog e Meuron, foto retirada do site

http://www.arquitectura.pt/forum/f11/madrid-caixaforum-herzog-meuron-8619.html

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58Dados técnicos

Fig. 21 – Projecto de Jean Nouvel, Musée du quai Branly, técnica de Patrick Blac, foto

retirada do site http://www.arquitectura.pt/forum/f54/inhabitat-

jardins-verticais-de-patrick-blanc-4312.html

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Green Wall no elevador

A minha utilização do jardim vertical no elevador ganha uma característica que durante a minha

pesquisa não encontrei nas outras técnicas existentes. Para começar o jardim vai constituir uma das três

partes do fechamento, sendo as outras duas feitas de vidro e de chapa perfurada. O verde vira-se para os 2

lados, dando uma estrutura interior visivelmente semelhante à exterior e melhorando a qualidade do ar

também nos dois sentidos. As partes em vidro visam obter a luz suficiente para as plantas do interior

sobreviverem e ao mesmo tempo permite zonas de transparência no elevador, propriedade que também

interessava dado que as pessoas no interior conseguem ver através das cabines. Finalmente a chapa

perfurada vai facilitar a circulação de ar, impedindo assim que se forme um ar muito saturado que pudesse

criar problemas aos usuários. Com este desenvolvimento, consegue-se que a importância da existência de ar

condicionado dentro do elevador seja fortemente diminuida com a vegetação a manter uma temperatura

mais constante e pura dentro deste, além de que é um elemento verde, com todas as vantagens daí

associadas e cria uma imagem que está de acordo com os presupostos do projecto.

59Dados Técnicos

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60Dados técnicos

Fig. 22 – Render do elevador proposto

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ALVES, M. Amélia Lemos, Lisboa dos elevadores, Lisboa, Câmara Municipal, 2002.

ESTRELA, Edite, Lisboa: a cidade dos elevadores, Lisboa, Companhia Carris de Ferro de Lisboa,

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FRANÇA, José Augusto, A arte em Portugal no século XIX, Lisboa, Bertrand, 1966.

COSTA, Alexandre Alves Costa... [et al.], A Alta de volta: concurso de ideias para o plano de

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SOUSA, Luís Paulo, Jardim Botânico da Universidade de Coimbra: introdução ao estudo da sua

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LOBO, Rui, Os Colégios de Jesus, das Artes e de S. Jerónimo: evolução e transformação no espaço

urbano, Coimbra, [s.n.], “Prova Final de Licenciatura apresentada ao Departamento de Arquitectura

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PENHA, Maria Raquel Veloso de Brito e, Coimbra: caminhos de uma cidade: evolução morfológica

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Bibliografia 74

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http://www.arquitectura.pt/forum/f11/madrid-caixaforum-herzog-meuron-8619.html, 08/09/28

http://www.arquitectura.pt/forum/f54/inhabitat-jardins-verticais-de-patrick-blanc-4312.html,

08/09/28

Bibliografia

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Anexos

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Fig. 23 – Mapa da zona histórica de Coimbra (fonte http://www.cm-coimbra.pt/)

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Fig. 24 – Pormenores do mapa da zona histórica de Coimbra (fonte http://www.cm-

coimbra.pt/)