cartilha abp
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SaúdeTRANSCRIPT
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Sade mental e direitos humanosCar
tilha
Noes gerais sobre direitos humanos relativos rea de sade mental, de forma clara e acessvel.
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2008 Associao Brasileira de Psiquiatria.
Todos os direitos reservados. permitida a reproduo parcial ou total desta obra,
desde que citada a fonte e que no seja para venda ou qualquer fim comercial. A
responsabilidade pelos direitos autorais de textos e imagens desta obra da rea tcnica.
A cartilha Sade Mental e Direitos Humanos pode ser acessada na ntegra no site do
Programa ABP Comunidade: http://www.abpcomunidade.org.br
Tiragem: 1 edio 2008 1000 exemplares
Edio, distribuio e informaes:
ASSOCIAO BRASILEIRA DE PSIQUIATRIA ABP
Diretoria 2007-2010
Presidente: Joo Alberto Carvalho - PE
Vice-Presidente: Luiz Alberto Hetem- SP
1 Secretrio: Paulo Roberto Zimmermann - RS
2 Secretrio: Rosa Garcia Lima - BA
1 Tesoureiro - Joo Carlos Dias- RJ
2 Tesoureiro - Hlio Lauar de Barros - MG
Assessoria de Comunicao e Imprensa ABP
http://www.abpbrasil.org.br/imprensa
Telefone: (0XX11) 4123.1419 - So Paulo SP
Sede ABP - Secretaria Geral e Tesouraria
Av. Presidente Wilson, 164 / 9 andar.
CEP: 20030-020 - Telefax:(0xx21) 2199.7500
Cidade: Rio de Janeiro - RJ
E-mail: [email protected]
Sistematizao e Pesquisa sobre Legislao em Sade Mental
Coordenao-Geral: Programa ABP Comunidade Redao Tcnica: Centro de Direito
Humanos CDH e Associao Brasileira de Amigos, Familiares e Portadores de
Esquizofrenia ABRE Reviso: Marco Antonio Alves Brasil RJ e Antonio Leandro
Nascimento RJ Colaborao: Departamento Jurdico e Assessoria de Comunicao
da ABP
Impresso no Brasil / Printed in Brazil
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Sade mental e direitos humanosCar
tilha
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1. Apresentao ..................................................................................................... 00
2. Introduo .......................................................................................................... 00
3. Sade Mental e Direitos Humanos ............................................................ 00
4. Sade Mental no Direito ................................................................................ 00
I. Direito Internacional .................................................................................. 00
II. Direito Brasileiro ....................................................................................... 00
Constituio Federal
Capacidade Civil, Interdio e Curatela
Imputabilidade Penal
Tributos
Relao de Trabalho E Emprego
Direito Sade e Medicamentos
5. Sistema De Ateno Em Sade Mental ..................................................... 00
Hospitais Psiquitricos
Unidades/ Centros Psiquitricos Em Hospitais Gerais
Atendimento De Urgncia Em Pronto-socorro Geral
Hospital-dia
Caps
Oficinas TeraputicasAtendimento Ambulatorial
Servios Residenciais Teraputicos
Internao Psiquitrica
Centro De Convivncia E Cooperativa
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ndice Sade mental e direitos humanosCartilha
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6. Benefcios ............................................................................................................. 00
Benefcio Assistencial De Prestao Continuada
Segurados Da Previdncia Social
Auxlio-doena
Os Benefcios De Aposentadoria
Aquisio De Medicamentos
De Volta Para Casa
Cooperativas Sociais
7. Sade Mental nos Tribunais ......................................................................... 00
Capacidade Civil
Casamento
Curatela
Medida De Segurana E Tratamento Em Liberdade
Relao De Trabalho E Emprego
Auxlio-doena
Benefcio De Assistncia Continuada
Aposentadoria Por Invalidez
Medicamentos
Internao Em Hospital Psiquitrico
Internao Compulsria
Sade, Direito Do Cidado, Dever Do Estado
8. rgos Responsveis ....................................................................................... 00
Inss (Disque-prev)
Sus
Ministrio Pblico
Defensorias Pblicas E Procuradoria De Assistncia Judiciria
Oab
Organizaes Da Sociedade Civil
9. Informaes teis ............................................................................................. 00
10. Bibliografia ........................................................................................................ 00
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I. Apresentao
Esta Cartilha fruto da parceria entre as organizaes Centro de Direito Humanos - CDH, a Associao Bra-sileira de Amigos, Familiares e Portadores de Esquizo-frenia - ABRE e a Associao Brasileira de Psiquiatria - ABP.
Seu objetivo difundir noes gerais sobre direitos humanos
relativos rea de sade mental, de forma clara e acessvel.
A falta de informao um dos principais problemas enfren-
tados pelas pessoas com transtornos mentais. De um lado, a
sociedade no tem conhecimento das caractersticas dos trans-
tornos e de suas possibilidades de tratamento e, como conse-
qncia, passa a agir de forma preconceituosa, aumentando o
estigma e a excluso social dessas pessoas. De outro lado, as
pessoas com tais transtornos, seus amigos e familiares, muitas
vezes no tm acesso a informaes importantes e indispens-
veis para o exerccio completo de seus direitos.
O CDH, a ABRE e a ABP se propuseram, por meio desta Car-
tilha, a identificar os direitos relativos sade mental, disper-
sos nas mais diversas reas do direito, como civil, penal, tra-
balhista e previdenciria, alm das leis especificas desse tema.
Procuramos, ainda, apresentar os programas governamentais
destinados a promover a incluso e integrao dessas pessoas
na sociedade e os benefcios a que elas tm direito, como, por
exemplo, o acesso gratuito a medicaes.
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8Ainda so poucas as obras dedicadas ao tema e, as que existem, geralmente
no atingem a profundidade desejada e necessria. Os casos decididos no Ju-
dicirio, a chamada jurisprudncia, ainda no so expressivos no que tange
sade mental, sendo que a vasta maioria das aes de casos individuais.
Quer dizer, as aes so propostas por uma s pessoa de cada vez, na tentativa
de resolver um problema particular e especifico. No h muitos julgados que beneficiem a coletividade de pessoas com transtorno mental, como poderia ocorrer se aes coletivas, como a ao civil pblica e o mandado de segurana
coletivo, fossem propostas por associaes civis em defesa de direitos.
O Brasil teve papel histrico importante na construo da poltica de sade
mundial ao questionar o sistema de sade e o tratamento oferecido s pes-
soas com transtorno mental. A partir da dcada de 90, o poder Legislativo
passou a editar leis reestruturando o sistema de ateno em sade mental no
Brasil, construindo junto a outros pases como Itlia e Frana uma tendn-
cia mundial que indicava o atendimento em meio aberto de incluso social.
No entanto, o que se percebe que os benefcios conquistados pelas pessoas
com transtorno mental ainda so poucos se comparados queles destinados a
outros grupos merecedores de ateno especial, como as pessoas com defici-ncia fsica e at mesmo as pessoas com deficincias mentais que, de alguma forma, conseguiram uma maior incluso e mobilizao da sociedade em torno
de suas necessidades e seus direitos.
Os benefcios a que tm direitos as pessoas com transtorno mental devem
ser conhecidos e efetivamente pleiteados, para que de fato nossa sociedade
promova uma igualdade real entre seus diversos membros, proporcionando o
bem estar de todos e combatendo qualquer forma de discriminao.
Por tudo isso, a pesquisa que resultou nessa cartilha inovadora por trazer
informaes s pessoas que no atuam exclusivamente na rea jurdica. Outra
preocupao que tivemos foi a de usar linguagem simples e cotidiana, evitan-
do as expresses do meio jurdico, e a de explicar, em linhas gerais, o funcio-
namento do sistema de sade, a estrutura das leis no Brasil e os instrumen-
tos e rgos de promoo dos direitos humanos das pessoas com transtornos
mentais.
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9Procuramos, ainda, listar as associaes que atuam na rea de sade mental a
partir da pesquisa Inovaes na Promoo dos Direitos Humanos e da Sade
Mental, com o objetivo de facilitar a troca de experincias entre elas e de via-
bilizar a articulao de uma rede para defesa coletiva dos direitos das pessoas
com transtorno mental, tanto atravs da propositura de aes judiciais, como
por meio da presso poltica e da mobilizao popular.
importante salientar que, nesta Cartilha, no sero usados termos pejora-
tivos, como doentes mentais, Essa expresso, entre outras, embora comum
na imprensa e mesmo nos textos de lei, tm uma conotao negativa, j que
o termo doente mental define e rotula a pessoa por apenas uma de suas ca-ractersticas. Alm disso, assume que a nica possibilidade de uma pessoa ser
saudvel a de no ter uma doena, o que no verdade. A expresso porta-
dor de doena mental tambm foi evitada, pois o termo portador se refere
a algum que est portando alguma coisa, mas que pode deixar de port-la
se quiser. Assim, seguindo os mais recentes movimentos sociais e a evoluo
acadmica sobre o tema, optamos por expresses como pessoa com trans-
torno mental ou pessoa que tem transtorno mental, colocando o foco no
sobre o transtorno, mas sim sobre a pessoa, que como tal tem uma dignidade
a ser respeitada e direitos que no lhe podem ser negados.
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ABP ComunidadeUma das misses da Associao Brasileira de Psiquiatria a defesa de um sis-
tema que ampare a populao no que diz respeito ao atendimento e s infor-
maes necessrias compreenso dos transtornos mentais que concorrem
para o sofrimento de seus portadores e de seus familiares.
Neste sentido, uma das prioridades da entidade o ABP Comunidade, um
esforo da Associao em sua luta para desmistificar os vrios aspectos que envolvem os transtornos mentais e o estigma que pesa sobre seus portadores.
O ABP Comunidade tambm se constitui como uma iniciativa para aproximar
a populao dos mdicos psiquiatras, oferecendo assim queles a possibilidade
de acesso a informao de qualidade fornecida por profissionais habilitados e credenciados para tal.
O ABP Comunidade constitui-se em servio que pretende ultrapassar as bar-
reiras dos gabinetes e auditrios de congressos, falando diretamente popula-
o, ouvindo-a e orientando-a, atravs de diversas atividades, como o site ABP
Comunidade, palestras, cursos, inseres na mdia e contato pessoal.
O site ABP Comunidade rene textos escritos em linguagem clara e acessvel
sobre diversos transtornos mentais, alm de palestras e entrevistas (exibidas
em video e audio) realizadas por psiquiatras de destaque sobre alguns trans-
tornos mentais de interesse para o pblico por sua grande incidncia na po-
pulao, pela sua gravidade ou pelo desconhecimento associado a eles. Alm
disto, o site conta com um servio de resposta s dvidas da populao, em que
as dvidass enviadas atravs de um formulrio especfico so esclarecidas por especialistas em psiquiatria.
O Projeto Psiquiatria Para Uma Vida Melhor uma ao do ABP Comunidade
desenvolvida anualmente na cidade de abriga o Congresso Brasileiro de Psi-
quiatria (CBP). Todos os anos, durante o CBP, so realizadas palestras em um
local de grande afluncia de pessoas, como teatros ou shopping centres, em que psiquiatras de destaque esclarecem as dvidas da populao sobre temas
especficos. Durante todo o perodo de realizao do projeto, jovens psiquiatras
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permanecem nos locais das palestras durante todo o dia esclarecendo pessoal-
mente as dvidas da populao, fornecendo material educativo preparado pela
ABP e orientaes sobre como conseguir tratamento psiquitrico.
A ABP acredita que pode e deve prestar populao um servio indito, de
qualidade, com o selo da Associao Brasileira de Psiquiatra. O objetivo do
projeto , alm de prestar um servio de utilidade pblica, contribuir para me-
lhoria da assistncia em sade mental no Brasil e para o bem-estar dos porta-
dores de transtornos mentais e de seus familiares.
Visite: www.abpcomunidade.org.br
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II. Introduo
As pessoas com transtorno mental, durante muito tempo sofreram, e ainda sofrem, com a falta de in-formao, com o isolamento e com a discriminao da sociedade. So, muitas vezes, tratadas como desiguais
ou incapazes para certos atos. Como conseqncia so nor-
malmente segregadas da vida social e no desenvolvem
plenamente suas capacidades.
Lutar contra esta situao e contra esse senso comum pre-
sente em nosso meio social fundamental, e tarefa de cada
um de ns.
Todo ser humano nico, insubstituvel e tem direito
vida digna. H a igualdade de direitos entre todos os se-
res humanos, independente de suas diferenas. Os direitos
humanos igualdade, dignidade e a no discriminao,
assim como muitos outros que sero expostos ao longo de
toda a cartilha, esto assegurados na Declarao Universal
dos Direitos1, e na Constituio Federal2. , portanto, dever
do Estado e da sociedade, zelar para que tais direitos sejam
protegidos.
A cartilha Sade Mental e Direitos Humanos tem o obje-
tivo de informar s pessoas com transtorno mental, assim
1Para saber mais sobre a Declarao Universal dos Direitos Humanos consultar o item Direito Interna-
cional.
2Para saber mais sobre a Constituio Federal de 1988, consultar o subitem Constituio Federal, na
parte de Direito Brasileiro.
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como seus familiares e amigos, os direitos que elas possuem. Estes direitos
esto assegurados na legislao brasileira e internacional e no podem ser vio-
lados.
fundamental que as pessoas com transtorno mental conheam e exeram
seus direitos, pois s assim se tornaro cidados ativos. O desconhecimento
dos direitos pode facilitar o acontecimento de violaes, que ferem a dignidade
humana.
Esta cartilha tambm tem o objetivo de, por meio das informaes aqui expos-
tas, indicar caminhos da incluso das pessoas com transtorno mental em uma
sociedade que muitas vezes as discrimina. Com o exerccio constante dos seus
direitos, e a permanente luta para que eles sejam fortalecidos e ampliados,
incentiva-se uma cultura de incluso e de no discriminao.
A cartilha identifica, nas mais diversas reas do direito, aqueles de que as pes-soas com transtorno mental so titulares. Eles esto presentes em documen-
tos internacionais, na Constituio Federal, no direito civil, penal tributrio,
trabalhista, previdencirio e tambm em leis que tratam especificamente do tema.
Esta cartilha pretende dar s pessoas com transtorno mental, seus familiares
e profissionais da sade, uma noo geral de tais direitos, para facilitar o seu exerccio. Ela tambm pretende mostrar que nem sempre uma pessoa com
transtorno mental est incapacitada de exercer seus direitos diretamente.
Outra questo que deve ser abordada, e que muitas vezes causa dvidas, a di-
ferenciao entre transtorno mental e deficincia mental. Quando uma pessoa tem algum tipo de deficincia mental pode-se dizer que esta uma caractersti-ca dela, assim como ter olhos azuis ou cabelo enrolado. Tal pessoa nasceu com
aquela caracterstica, ou a adquiriu durante a vida e sempre estar com ela.
No caso do transtorno mental, pode-se dizer que ele se manifesta durante a
vida da pessoa, e que pode ser controlado atravs de tratamentos teraputicos,
e, eventualmente, pode desaparecer. Como exemplos de transtornos mentais
podemos citar a esquizofrenia, a depresso, o transtorno obsessivo compulsivo,
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a sndrome do pnico, entre outros. Tais transtornos podem se manifestar isola-
damente ou em conjunto (at ao mesmo tempo em que a deficincia mental).
Finalmente, ressaltamos que a luta pela efetivao e ampliao dos direitos
humanos, em especial aqueles ligados sade mental, tema presente e ex-
tremamente importante. necessria a luta diria contra o estigma, muitas
vezes reafirmada pelo meio social, e pela informao, no s das pessoas com transtorno mental acerca de seus direitos, mas tambm da sociedade sobre o
que so os transtornos mentais.
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III. Sade Mental e Direitos Humanos
1. Evoluo e Conquista de DireitosDurante sculos as pessoas com transtorno mental e as
pessoas com deficincia foram discriminadas e excludas
da sociedade. Falamos em transtorno e deficincia
porque, at mesmo hoje, eles tm sido amplamente
confundidos, embora sejam distintos. No entanto,
nesta cartilha enfocaremos especialmente a questo do
transtorno mental.
Historicamente podemos identificar quatro grandes fases
da poltica de ateno sade mental. Primeiramente, as
pessoas com transtorno mental padeceram de um proces-
so de excluso social completa, sendo deixadas sem am-
paro algum, prpria sorte, ou sendo vistas como aber-
raes.
A histria da loucura nos mostra que na Idade Mdia as
pessoas com transtorno mental e com qualquer tipo de de-
ficincia eram vistas como castigos de Deus e relegadas a
uma vida de mendicncia.
Num segundo momento da histria, passou-se segre-
gao institucional. Essas pessoas eram completamente
isoladas da sociedade em instituies destinadas exclu-
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sivamente a elas. Nesses locais, muitas vezes, eram privadas de visitas e de
qualquer informao sobre o mundo exterior, o que normalmente gerava
agravamento de sua situao ou surgimento de novos transtornos mentais;
algumas, inclusive, nem possuam transtorno algum. No nos esqueamos,
tambm, que em muitas dessas instituies praticavam-se corriqueiramen-
te maus tratos, realizavam-se experincias cientficas sem o consentimento dos pacientes e utilizavam-se de tratamentos cruis. Ainda hoje, em alguns
hospitais psiquitricos, possvel encontrar pessoas abandonadas pela fam-
lia e pelo Estado h dcadas e, conseqentemente, apresentando alto grau de
dependncia institucional e agravamento de seu transtorno mental.
Na esteira desses fatos, surgiram polticas de tratamento e assistncia em sa-
de mental alternativos ao hospital psiquitrico. Numa terceira fase, buscou-se
integrar as pessoas sociedade e, numa quarta fase, busca-se inclu-las.
H uma grande diferena entre integrao e incluso. Sob o modelo da inte-
grao, busca-se dar condies para que as pessoas com transtorno mental e
deficincia sejam capazes de se adaptar vida em comunidade, ou seja, in-tegram-se apenas os que conseguem viver de um modo semelhante maioria
das pessoas. Os que no o conseguem so deixados margem da comunidade.
J sob a viso da incluso, as pessoas com transtorno mental continuam par-
ticipando da sociedade, ou seja, no so excludas ou segregadas. Na incluso,
no so as pessoas com transtorno que devem se adaptar sociedade, mas a
sociedade que deve se adaptar para permitir a participao delas.
Assim, na dcada de 80 e 90, principalmente, foram realizadas discusses em
mbito internacional e nacional, que culminaram, em 1990, na Declarao de
Caracas da Organizao dos Estados Americanos (OEA) e em diversas normas
internas em muitos pases. Todas essas normas, assim como a Declarao de
Caracas, possuem como idia principal a integrao e, sobretudo, a incluso
das pessoas com transtorno mental na sociedade, por meio de uma polti-
ca de assistncia integral a essas pessoas e a seus familiares. H, inclusive,
a mudana no modelo de tratamento em relao a elas. Antes, a internao
em hospital psiquitrico era praticamente a nica forma de ateno em sade
mental; atualmente existe uma srie de tratamentos em meio aberto que bus-
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ca proporcionar a incluso das pessoas com transtorno mental na sociedade.
Ainda em mbito internacional, a Organizao das Naes Unidas (ONU)
aprovou, em 1/12/1991, por sua assemblia geral a Resoluo /119, que
trata dos Princpios para a proteo de pessoas acometidas de transtorno
mental e a melhoria da assistncia sade mental. Esse documento estabelece
uma srie de direitos relativos liberdade, igualdade, dignidade e sade
das pessoas com transtornos mentais, bem como uma srie de procedimentos
relativos internao e ao tratamento, inclusive medicamentoso, e de servios
mnimos a serem prestados nos estabelecimentos de sade para garantir tais
direitos. Essa resoluo da ONU foi adotada pelo conselho federal de medici-
na como guia a ser seguido pelos mdicos do Brasil em 199. (Anexo 1)
No Brasil, o ano de 198 o principal marco na mudana do modo como a
sociedade lida com as pessoas com transtorno mental. Foi nesse ano que um
grupo de trabalhadores do setor de sade mental se reuniu em Bauru, no Es-
tado de So Paulo, e fizeram o Manifesto de Bauru. Esses trabalhadores rei-vindicavam uma reestruturao social e estatal no sentido de mudar o rumo
da opresso sofrida nas fbricas, nas instituies de crianas e adolescentes e
nos crceres, alm de lutar contra a discriminao contra os negros, homosse-
xuais, ndios, mulheres e pessoas com transtorno mental. Foi nesse momento
que o Movimento de Trabalhadores de Sade Mental lana a bandeira Pelo
Fim dos Manicmios, associando essa forma de isolamento a todas as formas
de opresso citadas. Esse movimento foi tido como o marco inicial da Luta
Antimanicomial no Brasil, que teve papel de destaque na implementao dos
servios de sade substitutivos ao hospital psiquitrico, bem como na tentativa
de humanizar o tratamento despendido s pessoas com transtorno mental.
Foi tambm no ano de 198 que se implementou o primeiro Centro de As-
sistncia Psicossocial (conhecido pela sigla CAPS), na cidade de So Paulo.
Como veremos adiante, o CAPS uma das formas alternativas de ateno em
sade mental que existem em nosso pas atualmente. Em 1989, a prefeitura
de Santos, SP, interveio na Casa de Sade Anchieta, fato que teve grande re-
percusso e mostrou, de forma inequvoca, a possibilidade de uma rede de
cuidados efetivamente substitutiva ao hospital psiquitrico.
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Em 1988 editada a nossa atual Constituio e criado o SUS. Em 1989 entra
no Congresso o projeto de lei do deputado Paulo Delgado, que a origem da Lei
10.21/2001 (Anexo 2) que redireciona a assistncia em sade mental.
Desde 1987, e mais efetivamente na dcada de 1990, tem-se verificado uma re-forma do Sistema de Ateno em Sade Mental. Em 1991, o Ministrio da Sade
criou uma srie de servios alternativos aos hospitais psiquitricos para trata-
mento, integrao e incluso social das pessoas com transtorno mental3. So eles
o CAPS, as Unidades Ambulatoriais, as oficinas teraputicas e as visitas domi-ciliares. No ano seguinte, o mesmo ministrio regulamentou os servios cria-
dos pela Portaria anterior e criou outros, a saber: o Hospital-dia, o Servio de
Urgncia em Pronto Socorros Gerais e as Unidades de Psiquiatria em Hospitais
Gerais.
Em 1999, criou-se, por meio da Lei n 9.8, as Cooperativas Sociais para in-
tegrao de pessoas em desvantagem (conforme termos da lei). Entre essas
pessoas esto aquelas com transtorno mental e os egressos de hospitais psiqui-
tricos. No ano seguinte foi criado o servio de Residncias Teraputicas e o
programa De Volta para Casa (por meio da Lei 10.08). Ainda entre 1990 e
2000, conforme dados do Ministrio da Sade, hospitais psiquitricos foram
desativados em todo o territrio nacional, com a extino de 30 mil leitos e a
criao de mais de 100 servios de cuidados extra-hospitalares. Com a desati-
vao de 30 mil leitos no se observou uma atuao do Estado para dar ateno
a essas pessoas. Levando-se em conta que os servios de cuidados extra-hospi-
talares (Centro de Ateno Psicossocial CAPS) so insuficientes, esta poltica acaba sobrecarregando as famlias, que no so assistidas na sua nova condio,
considerando que esta reduo de leitos s est sendo levada a cabo porque eco-
nomiza verbas da sade. Entre 1988 e 2003 houve uma reduo de verbas para
a sade mental de 0% per capita. Este um fato grave considerando-se que
em casos de transtornos mentais graves h a necessidade de internao por um
perodo curto de tempo para o controle de eventuais crises.
3 Portaria SNAS no 189
Portaria SNAS no 22
Portaria GM 10, do Ministrio da Sade
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No Brasil, somando os leitos psiquitricos disponveis mais os servios fornecidos
pelos CAPS ainda h uma grande insuficincia nos atendimentos s necessidades em sade mental. Segundo estudo recente, existem 10.188.000 pessoas com trans-
torno mental grave das quais .23.000 so persistentes. Estes 10 milhes preci-
sam de ateno psiquitrica especializada. Por outro lado, temos no pas 89 CAPS
e 2.0 leitos psiquitricos. Considerando-se os leitos psiquitricos ocupados, resta
uma estimativa de 1.2 pessoas por CAPS, o que totalmente invivel, sinalizando
a necessidade da ampliao da rede de atendimento.
o conjunto desses servios e dessas polticas pblicas de tratamento, integrao e
incluso das pessoas com transtorno mental que chamamos de Sistema de Ateno
em Sade Mental. No captulo Sistema de Ateno em Sade Mental, veremos
cada um desses servios e dessas polticas pblicas
Cumpre destacar ainda que tm sido criadas comisses federais, estaduais e munici-
pais para averiguar a qualidade desses servios (inclusive dos hospitais psiquitricos)
e para propor polticas pblicas de ateno em sade mental. Este um instrumento
importante de participao nestas comisses, por meio de entidades organizadas e
representativas, para alterar a realidade dos tratamentos e da incluso das pessoas
com transtorno mental.
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2. Os principais marcos legislativos No tpico anterior vimos como a sociedade, ao longo da histria, modificou sua forma de lidar com os transtornos mentais e como o Brasil se inseriu nesse
contexto, com a criao de um Sistema de Ateno em Sade Mental. Neste
ponto cabe ressaltar os principais marcos legislativos existentes que servem de
base para a atual e futura implementao do tratamento e da incluso social
das pessoas com transtorno mental.
No mbito internacional, cujas regras tm validade no Brasil, existe a
Declarao Universal dos Direitos Humanos (198) um dos primeiros
documentos internacionais a estabelecer os direitos essenciais da pessoa
humana, resultado da mobilizao da comunidade internacional ps Segunda
Guerra. A Declarao Universal ser objeto de anlise mais aprofundada no
captulo sobre o Direito Internacional.
Ainda na esfera internacional, existe a Declarao de Caracas de 1990
que, embora no possua fora de lei, uma recomendao e um apelo aos
Governos nacionais para que implementem um sistema de ateno mais
adequado s pessoas com transtorno mental.
No mbito interno, a Constituio Federal estabeleceu como um dos
fundamentos da Repblica Brasileira a dignidade da pessoa humana e,
como um de seus objetivos, a promoo do bem estar de todos. Isso cria
uma obrigao ao Estado e sociedade civil de promover aes que atinjam
essas finalidades.
Temos ainda, no Brasil, a Lei 10.21, de 0 de abril de 2001. Essa lei tem
um significado importantssimo, pois, em conformidade com a Declarao
de Caracas, estabelece os novos rumos na rea de sade mental que foram
objeto de intensas discusses na dcada de 90.
Alm da mudana no modelo assistencial em sade mental, essa lei traz
tambm os direitos das pessoas com transtornos mentais, que devem
Marcelo Feij Filho et al. Epidemiologia da Sade Mental no Brasil. Artmed Editora, 200, pgs 2 e 138.
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ser assegurados sem qualquer tipo de discriminao. A lei assume que
responsabilidade do Estado o desenvolvimento da poltica de sade mental,
a assistncia e a promoo de aes de sade s pessoas com transtornos
mentais, com a devida participao da sociedade e da famlia. Esta posio
foi assumida a partir da Constituio Federal de 1988, que tambm trata
das diretrizes norteadoras da rea de sade.
No que diz respeito s internaes, a lei estabelece que elas devam visar
reinsero social do paciente em seu meio e que s sero indicadas
quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes. Deve-se
ressalvar, ainda, que as internaes involuntrias s podero ser realizadas
mediante laudo mdico que caracterize seus motivos e que devem ser
notificadas ao Ministrio Pblico, no prazo de 2 horas. Para a garantia do
tratamento com humanidade, a lei estabeleceu, ainda, diversos direitos aos
pacientes internados, que sero vistos no captulo Sistema de Ateno em
Sade Mental, no tpico Internao Psiquitrica.
As instituies em que se daro as internaes no podem apresentar
caractersticas asilares, desprovidas de servios mdicos, assistncia
social, psiclogos, terapeutas ocupacionais, atividades de lazer e outros.
Assim, essas instituies devem obedecer diretriz estabelecida na Lei
10.21/2001, qual seja, a internao deve visar exclusivamente atender
as pessoas com transtorno mental em momentos de crise, no podendo de
forma alguma significar uma excluso social.
A Lei ainda estabelece as principais formas de internao psiquitrica, o
que tambm ser visto no capitulo Sistema de Ateno em Sade Mental.
Os pacientes hospitalizados por muito tempo so considerados
dependentes institucionais, pois no possuem famlia capaz de ajud-los
ou a possibilidade de deixarem o hospital imediatamente. Esses tero a
sua reabilitao psicossocial como objeto da poltica especfica de alta
planejada reabilitao psicossocial assistida, conforme dispe a lei.
A idia que essas pessoas sejam tratadas adequadamente para serem
includas na comunidade. Dessas polticas merecem destaque o benefcio
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3. Responsabilidade do Estado e da SociedadeA SEGURIDADE SOCIAL8
A Seguridade Social um conjunto integrado de aes dos Poderes Pblicos
e da sociedade, baseado nos princpios do bem-estar da populao e da soli-
dariedade da sociedade, que visa assegurar os direitos relativos sade,
previdncia e assistncia social.
Conforme o texto da Constituio Federal a participao da sociedade com a
promoo do bem de todos se d: indiretamente, ao pagar seus impostos, for-
necendo meios financeiros para o Estado agir e, diretamente, atravs de atua-es de cada ator social, promovendo a incluso no dia-a-dia, ou entidades da
sociedade civil e da participao de todos na gesto do Sistema de Seguridade
Social.
Amparado pelo princpio da solidariedade, nem todos contribuem economi-
camente da mesma maneira e aproveitam os benefcios estatais do mesmo
modo. Quem possui um poder aquisitivo maior paga tributos mais elevados
(quem tem mais paga mais) e somente as pessoas consideradas em situao
de vulnerabilidade por motivos econmicos, de sade, de idade ou, ainda, por
possurem alguma deficincia podem desfrutar de determinados benefcios fornecidos pelo Estado e custeados por toda a sociedade.
Conforme dissemos, um dos objetivos do Estado brasileiro a promoo do
bem-estar de todos. Para que esse objetivo seja cumprido, a Constituio Fe-
deral e um conjunto de leis asseguram direitos mnimos para que os cidados
tenham segurana ao enfrentar os riscos inerentes vida, e para que seja ga-
rantida sua dignidade enquanto pessoa humana.
8Wagner Balera. Sistema de Seguridade Social. 3a ed. So Paulo: LTr, 2003.
Miguel Horvath Jnior. Direito Previdencirio. a ed. So Paulo: Quartier Latin, 200.
Jos Afonso da Silva. Curso de Direito Constitucional Positivo. 20a ed. So Paulo: Malheiros, 2002.
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Esses riscos so os mais variados, todos prejudicando de alguma forma o bem
estar da pessoa. Por exemplo, o risco de ficar doente, desempregado, impossi-bilitado para o trabalho face idade, acidente ou possuir uma deficincia.
O Sistema de Seguridade Social dividido em trs subsistemas, o da Assistn-
cia Social, o da Sade e o Previdencirio. Cada um deles possui um objetivo
especfico, conforme veremos nos itens seguintes.
a) O Sistema da Assistncia Social
O Sistema da Assistncia Social possui como objetivo principal a proteo das
pessoas que esto em situao de vulnerabilidade social, isto , aqueles que no
possuem renda para garantir a prpria subsistncia, nem possuem famlia que
os ampare. Assim, qualquer pessoa que se encontre nessa situao e que pre-
encha os requisitos estabelecidos em leis especficas pode ser beneficiada por este sistema, sem a necessidade de uma contribuio especfica para isso.
Por meio dessas aes do Estado so concedidos, por exemplo, cesta-bsica,
salrio-famlia e bolsa-escola, visando proteo da famlia, da maternidade,
da infncia e adolescncia e combatendo a pobreza e a excluso social. H, ain-
da, o dever do Estado de garantir a habilitao e reabilitao das pessoas com
deficincia ou doena e a promoo de sua incluso na vida comunitria.
A Constituio tambm garante um benefcio mensal s pessoas com deficin-cia e aos idosos que no possam prover sua subsistncia, nem serem ampara-
dos pela famlia. o chamado Benefcio Assistencial de Prestao Continu-
ada, que pela sua importncia para o tema desta cartilha, ser tratado com
mais detalhes no captulo Benefcios.
Sua organizao se d pela descentralizao poltico-administrativa e com par-
ticipao da populao. Isso significa que a Unio estabelece as normas gerais, a serem complementadas pelos Estados, Municpios e Distrito Federal, confor-
me situao da regio e do local, e coordena os programas do Sistema de Segu-
ridade Social em todo o pas. O Distrito Federal, os Estados e os Municpios
coordenam e executam os programas em seu territrio. Significa ainda que a populao pode participar, por meio de organizaes representativas, como
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associaes civis, e participando de conselhos administrativos quando previsto
em lei, na formulao, implementao, gesto, fiscalizao e acompanhamento das polticas pblicas e atividades da seguridade social.
b) O Sistema de Sade
O Sistema de Sade possui como principal objetivo a promoo da sade de
toda a populao, independente de contribuio especfica ou do poder aquisi-tivo da pessoa, por meio de aes que previnam doenas e de aes que prote-
jam e curem os enfermos.
Nas aes de recuperao, o Estado deve fornecer os servios mdicos, hospi-
talares, os remdios e todas as outras aes que sejam necessrias recupera-
o das pessoas que no estejam em plena sade, alm de cuidar da sade dos
trabalhadores.
J nas aes preventivas, o Estado deve garantir a reduo do risco da doena e
de outros agravos sade, por meio de polticas pblicas sociais e econmicas
nas mais diversas reas. Isso inclui aes como o saneamento bsico, a forma-
o de recursos humanos na rea de sade, a vigilncia nutricional , a orientao
alimentar e a proteo do meio ambiente, includo o do trabalho, fiscalizao e inspeo de alimentos e bebidas, bem como qualquer outro produto de qualquer
modo relacionado sade. Deve, ainda, promover o aprimoramento tecnolgico
na rea de sade e afins e instituir a poltica de sangue e seus derivados.
Note-se que a sade no a pura e simples ausncia de doenas, mas, confor-
me a Organizao Mundial da Sade (OMS), o estado de completo bem-estar
fsico, mental e social da pessoa. Vale dizer que o meio acadmico avana em
relao a esse conceito, por no acreditar ser possvel esse estado de bem-estar
permanente. Desta forma, a sade a constante busca por esse estado de equi-
lbrio, reafirmando a necessidade de cada um ser ativo nessa conquista.
Os recursos financeiros do Sistema de Sade tambm provm basicamente do oramento da seguridade social, porm h uma verba extra obtida por uma
porcentagem da arrecadao da Contribuio Provisria sobre Movimentaes
Financeiras CPMF tributo recolhido nas movimentaes bancrias.
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c) O Sistema Previdencirio
No Sistema Previdencirio, somente podem ser beneficiadas pelas aes es-tatais as pessoas que contribuem periodicamente para a Previdncia e seus
dependentes, alm de se encontrarem na situao do risco previsto na lei. Ve-
remos no captulo Benefcios, quais so as pessoas que podem ser favorecidas
(os segurados) e quem deve contribuir para esse sistema.
O Sistema Previdencirio compreende trs regimes de seguridade: o Regime
Geral da Previdncia Social9, o Regime Especial de Previdncia Social10, e o
Regime da Previdncia Privada.
Aqui nos interessa o Regime Geral de Previdncia Social, que abrange o maior
nmero de trabalhadores no pas. So muitos os benefcios concedidos por esse
regime. De um modo geral, eles possuem como objetivo assegurar os seguintes
riscos: doena, impossibilidade para o trabalho, morte, includos os resultan-
tes de acidente do trabalho, idade avanada, priso e desemprego involuntrio
(que no tenha ocorrido por opo do trabalhador).
O Regime Geral ainda ajuda a manuteno dos dependentes dos segurados de
baixa renda e protege a maternidade e a gestante.
Alm dos benefcios em dinheiro, o Regime Geral de Previdncia Social ainda
possui servios sociais e programas de habilitao e reabilitao profissional das pessoas que se tornem impossibilitadas, total ou parcialmente, para o tra-
balho, inclusive por motivos de transtorno mental. Os servios sociais ainda
compreendem um conjunto de aes para esclarecer os beneficirios desse re-gime sobre seus direitos e solucionar os problemas entre os segurados e a Pre-
vidncia Social, inclusive com participao da sociedade, atravs de entidades
representativas.
9So segurados os trabalhadores e seus dependentes, da iniciativa privada ou de empresa pblica, desde
que sejam contratados sob o regime da Consolidao das Leis do Trabalho (CLT).
10So segurados os funcionrios pblicos e seus dependentes, contratados sob as regras de lei especial.
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2
IV. Sade Mental na Legislao
1. Direito Internacional importante ressaltar que, para as finalidades da presente Car-
tilha, trataremos de uma rea especfica do Direito Internacional
geral, qual seja, o Direito Internacional dos Direitos Humanos,
que guarda maior similaridade com o tema Sade Mental e Di-
reitos Humanos. O Direito Internacional dos Direitos Humanos
teve origem no contexto do ps-Segunda Guerra Mundial, pero-
do no qual a indignao com a barbrie ocasionada pelo conflito
despertou, na comunidade internacional, o desejo de fixar regras
tratando dos direitos essenciais do ser humano universalmente
considerado, ou seja, independentemente do pas de origem.
Essa mudana de conscincia apontada por alguns autores
como um marco da modernidade, trazendo ao debate em todas
as partes do mundo a importante temtica dos Direitos Huma-
nos. Assim, ser feita referncia, a seguir, aos principais instru-
mentos do Direito Internacional dos Direitos Humanos, com
meno importncia deles no que toca ao tema Sade Mental
e Direitos Humanos.
Em 10 de dezembro de 198 foi aprovada pela Organizao das
Naes Unidas (ONU) a Declarao Universal dos Direitos
Humanos11.
11 Declaraes so diretrizes que exprimem um consenso de determinada co-
munidade, so recomendaes que no obrigam juridicamente, mas trazem as
aes ideais a serem assumidas pelos Estados.
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Pela primeira vez na histria a comunidade internacional expressava seu
desejo de considerar os seres humanos iguais em dignidade e direitos,
livres desde o nascimento, dotados de razo e de conscincia, devendo
agir uns para com os outros em esprito de fraternidade. O conceito de
dignidade humana (prembulo e art. 1) trazia na Declarao Universal
seus primeiros contornos, identificando-se com a idia de que todos os
seres humanos devem ser tratados com respeito. A Declarao Universal
tambm traz expressa previso do direito a um nvel de vida suficiente
para lhe assegurar, entre outros, assistncia mdica e servios sociais ne-
cessrios segurana na doena e em outras situaes (art. 2.1).
Em 19, a Comisso de Direitos Humanos da Organizao das Naes
Unidas - ONU12 aprovou dois tratados internacionais de grande impor-
tncia: o Pacto Internacional de Direitos Civis e Polticos e o Pacto
Internacional de Direitos Econmicos, Sociais e Culturais. Este
ltimo prev em seu texto o reconhecimento do direito de todos a usufruir
os mais altos padres possveis de sade fsica e mental (art. 12.1). Alm
disso, os dois Pactos previram o estabelecimento de um sistema de anlise
de relatrios, a serem enviados pelos pases, por meio do qual possvel
verificar se os compromissos assumidos estariam realmente sendo cum-
pridos.
Em 1 de dezembro de 1991, a Assemblia-Geral da ONU1 apresentou
uma resoluo1 contendo os Princpios para a Proteo de Pesso-
as com Doena Mental e Incremento dos Cuidados com a Sade
Mental. Esta resoluo um documento longo e detalhado sobre os direi-
tos das pessoas com transtorno mental. Conforme salientamos anterior-
12 rgo da ONU encarregado de tratar de questes envolvendo direitos humanos. Em maro de 200
a ONU aprovou a criao do Conselho de Direitos Humanos, que ir substituir a Comisso de Direitos
Humanos, basicamente com as mesmas funes.
13 Tratados internacionais so normas jurdicas que obrigam os pases que os aceitam. So ratificados
(aceitos) e depois internalizados no sistema jurdico nacional.
1 rgo composto por todos os pases que fazem parte da ONU.
1 Instrumento jurdico de carter recomendatrio (como as declaraes), aprovado por maioria.
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mente ela importante na medida em que o Conselho Federal de Medicina a
adotou como guia a ser seguido pelos mdicos do Brasil (Resoluo do CFM
10/9). Esta uma ferramenta importante para humanizar o tratamento
s pessoas com transtorno mental atravs de um rgo de classe central neste
tratamento. Dentre os princpios declarados encontram-se:
a. O direito que todas as pessoas tm aos melhores cuidados em sade
mental disponveis, que fazem parte do sistema de sade e assistncia
social;
b. O direito que todas as pessoas com doena mental, ou assim re-
feridas, de serem tratadas com humanidade e respeito decorrente da
prpria dignidade da da pessoa humana;
c. O direito que todas as pessoas com transtorno mental tm de serem
protegidas da explorao de natureza econmica, sexual , ou outros
abusos fsicos, bem como tratamento degradante;
d. O direito de viver e trabalhar, tanto quando possvel, em comuni-
dade.
Em 1993, na cidade de Viena, realizou-se a Segunda Conferncia Mundial
sobre Direitos Humanos, um dos grandes encontros das Naes Unidas de-
correntes de nova viso de mundo, vinda do contexto ps-Queda do Muro de
Berlim. Em tal ocasio, os pases presentes renovaram os valores pactuados
anos antes, na Declarao Universal dos Direitos Humanos, expressando,
atravs da Declarao de Viena e do Plano de Ao, dentre diversos aspectos:
a. A prioridade promoo e proteo dos Direitos Humanos conferi-
da pela comunidade internacional.
b. O reconhecimento e a afirmativa de que todos os Direitos Humanos derivam da dignidade e valor inerentes s pessoas humanas.
c. A relao estreita entre Direitos Humanos, Democracia e Desenvol-
vimento.
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DECLARAO DE CARACAS (ANEXO 3)
Em novembro de 1990 realizou-se em Caracas, na Venezuela, a Conferncia Regio-
nal para a Reestruturao da Assistncia Psiquitrica no Continente. Essa Confern-
cia foi convocada pela Organizao Pan-americana da Sade (OPAS)1 e pela Oficina Regional da Organizao Mundial da Sade para as Amricas1 e produziu a chama-
da Declarao de Caracas que, embora no possua fora de lei, consiste em uma
recomendao aos Governos nacionais para implementar mudanas legislativas e
sociais, configurando um parecer de especialistas da rea de sade mental acerca da melhor forma de se lidar com os transtornos mentais.
Organizaes, associaes, autoridades, legisladores e juristas reunidos fizeram um apelo aos diversos pases, para que seus Ministrios de Sade e de Justia, Parla-
mentos, Sistemas de Seguridade Social, organizaes profissionais, associaes de usurios, universidades e outros centros de treinamento e meios de comunicao de
massa apoiassem a Reestruturao da Ateno Psiquitrica18 proposta. Esse apoio
seria necessrio para assegurar o sucesso de seu desenvolvimento em benefcio das
populaes dos pases da Amrica Latina (Opas, 1990).
A Declarao estabelece que o modelo de Assistncia deve guiar-se pela descentra-
lizao (por meio dos Sistemas Locais de Sade19), mantendo a pessoa em seu meio
1rgo da Organizao dos Estados Americanos (OEA).
1A Organizao Mundial da Sade (OMS) um rgo da Organizao das Naes Unidas (ONU).
18A reestruturao da ateno psiquitrica proposta deve ter por objetivos garantir a dignidade e os direitos dos
pacientes, basear-se em critrios tecnicamente adequados e promover a manuteno do paciente no seu meio
social, evitando, assim, o isolamento do paciente, a violao de seus direitos humanos e a excluso social.
19O conceito de Sistema Local de Sade (SILOS) considera como aspectos fundamentais a reorganizao do
nvel central de administrao, a descentralizao e a desconcentrao da estrutura administrativa, o desen-
volvimento da participao social, a implantao da intersetorialidade, a readequao dos mecanismos de
financiamento do setor de sade e o desenvolvimento de um modelo de ateno que procure desenvolver a
capacidade de anlise da situao de sade das populaes, a estratgia de Vigilncia Sade, a integrao
dos programas de preveno e controle dos agravos, o reforo da capacidade administrativa local e a capaci-
tao continuada da fora de trabalho.
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social. Ela tambm determina que a legislao em sade mental deva proteger a dig-
nidade e direitos das pessoas que sofram de algum transtorno mental, assim
como organizar os servios comunitrios nesta rea.
A Declarao estabelece que o modelo de Assistncia deve guiar-se pela descen-
tralizao (por meio dos Sistemas Locais de Sade20), mantendo a pessoa em
seu meio social. Ela tambm determina que a legislao em sade mental deva
proteger a dignidade e direitos das pessoas que sofram de algum transtorno
mental, assim como organizar os servios comunitrios nesta rea.
O governo brasileiro participou das reunies que tiveram como resultado a De-
clarao de Caracas, sendo que o Ministrio da Sade do pas incorporou essas
diretrizes e agiu no sentido de reorientar o modelo de ateno em sade mental
no Brasil.
Na dcada de 90 diversas portarias21 foram expedidas no sentido de estabelecer
servios substitutivos aos hospitais psiquitricos, ampliar e diversificar os pro-cedimentos cobertos pelo Sistema nico de Sade SUS (Tabela do SIH/SUS22
e SIA/SUS23). Alm de determinar padres mnimos de recursos tcnicos e hu-
20O conceito de Sistema Local de Sade (SILOS) considera como aspectos fundamentais a reorganizao do
nvel central de administrao, a descentralizao e a desconcentrao da estrutura administrativa, o desen-
volvimento da participao social, a implantao da intersetorialidade, a readequao dos mecanismos de
financiamento do setor de sade e o desenvolvimento de um modelo de ateno que procure desenvolver a
capacidade de anlise da situao de sade das populaes, a estratgia de Vigilncia Sade, a integrao
dos programas de preveno e controle dos agravos, o reforo da capacidade administrativa local e a capaci-
tao continuada da fora de trabalho.
21Portarias so normas jurdicas atravs das quais autoridades de nvel inferior ao Chefe do Executivo (Presi-
dente, Governadores ou Prefeitos) dirigem-se a seus subordinados, transmitindo decises de efeito interno
(como andamento de atividades, questes relativas vida funcional de servidores etc).
22SIH/SUS: Sistema de Informaes Hospitalares do Sistema nico de Sade. Tem dentre inmeras funes
fornecer informaes para viabilizar a efetuao do pagamento dos servios hospitalares prestados pelo SUS.
23SIA/SUS: Sistema de Informaes Ambulatoriais do Sistema nico de Sade. Fornece informaes b-
sicas para o gerenciamento do SUS, devendo atender aos 3 nveis de gesto, quais sejam, o Ministrio da
Sade, as Secretarias Estaduais de Sade e Secretarias Municipais de Sade.
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manos, cuidados e tratamentos para o funcionamento dos servios de sade
mental no Brasil e modificar a forma de financiamento ao setor privado, medi-das condizentes com os compromissos assumidos pela Declarao de Caracas.
Em 2001, depois de demorada tramitao legislativa, foi finalmente aprovado o projeto de lei do Deputado Paulo Delgado com algumas das alteraes fei-
tas pelo Senado Federal, em conformidade com os ditames da Declarao de
Caracas, embora o projeto original fosse mais ambicioso, prevendo a extino
progressiva dos hospitais psiquitricos. Essa lei teve o propsito de reformar
significativamente a assistncia psiquitrica em nvel nacional. Trata-se da Lei 10.216/2001, que ser exposta no captulo sobre legislao especfica.
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2Para saber os locais de assistncia jurdica gratuita, consultar o item Informaes teis desta cartilha.
CONSTITUIO FEDERAL
2. Legislao Brasileira a) Constituio Federal (CF)
A Constituio Federal (CF) a lei mais importante do pas. Nela esto escritas as
normas que regulam os direitos e garantias dos cidados, a forma como deve ser o
governo, como deve ser o exerccio do poder do Estado, entre outras disposies.
Todos devem obedecer ao que diz a CF, incluindo os trs poderes que compe o
Estado (Executivo, Legislativo e Judicirio2). Todas as outras leis que forem criadas
tambm devem estar de acordo com as regras da Constituio.
A CF, por ser uma norma que estabelece as diretrizes essenciais do Estado, no
tratou especificamente dos direitos das pessoas que tm algum transtorno mental. Entretanto, por meio da anlise das diretrizes constitucionais (contidos nos art. 1,
inciso III, art.3, inciso IV e art. , caput), percebe-se que nenhuma pessoa pode
sofrer qualquer tipo de discriminao, tampouco as que tm algum tipo de trans-
torno mental.
Isso porque a Constituio estabelece que todos so iguais em direitos e obrigaes e
os tratamentos diferenciados somente so possveis quando visam igualdade ma-
terial, ou seja, quando se destinam a corrigir alguma injustia, dando as mesmas
oportunidades a um grupo de pessoas que por alguma razo no possuem seu direi-
to de igualdade efetivado.
Art. 1,
inciso III
Art. 1o A Repblica Federativa do Brasil, formada pela unio in-
dissolvel dos Estados e Municpios e do Distrito Federal, constitui-
se em Estado Democrtico de Direito e tem como fundamentos:
III - a dignidade da pessoa humana
Art. 3,
inciso IV
Constituem objetivos fundamentais da Repblica Federativa do
Brasil:
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raa,
sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminao
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A educao, direito de todos e dever do Estado e da famlia, ser
promovida e incentivada com a colaborao da sociedade, visando
ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exerccio
da cidadania e sua qualificao para o trabalho.
Art. 5,
caput.
Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas
a inviolabilidade do direito vida, liberdade, igualdade, segu-
rana e propriedade....
Art. 5,
inciso LXXIV
O Estado prestar assistncia jurdica integral e gratuita aos que
comprovarem insuficincia de recursos.
Art. 196 A sade direito de todos e dever do Estado, garantido mediante
polticas pblicas sociais e econmicas que visem reduo do risco
de doena e de outros agravos e ao acesso universal e igualitrio s
aes para sua promoo, proteo e recuperao
Art. 205
b) Capacidade civil, interdio e curatela
1) Capacidade Civil25
Todas as pessoas tm direitos, mas nem todas podem exerc-los pessoalmente, pois
falta a elas o discernimento exigido para tanto.
Essas pessoas so denominadas pelo Direito como incapazes de praticar os atos da
vida civil2, e essa incapacidade varia conforme as diferentes formas que a falta de
discernimento pode se apresentar.
Quando declarada pelo juiz, a incapacidade divida em dois graus: a absoluta e a
relativa. A incapacidade absoluta ocorre quando o indivduo no pode exercer seus
2Caio Mario da Silva Pereira. Instituies de Direito Civil, 20 ed., vol. 1, rev. e atual., Rio de Janeiro, Fo-
rense, 2001.
2Podemos citar como exemplos de atos da vida civil o casamento, a compra e venda, o aluguel de um imvel,
a assinatura de um contrato, realizao de um testamento, a doao, o emprstimo, entre tantos outros.
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direitos sem o auxlio de outra pessoa. J a incapacidade relativa acontece quando a pessoa tem a possibilidade de realizar apenas uma parte dos atos da vida civil.
Incapacidade Absoluta
Tanto na rea do direito quanto na mdica muito difcil afirmar ao certo o quanto o transtorno mental tornou o indivduo incapaz para os atos da vida civil, consideran-do a imensa diversidade que podem assumir seus estgios e conseqncias.
Em geral, considera-se como absolutamente incapaz aquela pessoa a quem a percia mdica indique que falte permanentemente o discernimento, que se mostra incapaz de avaliar perfeitamente os atos que pratica.
Os absolutamente incapazes tm direitos, mas no so permitidos de exerc-los pes-soalmente. So representados por pessoas que agem em seu nome, falam e decidem por eles, como o caso do curador da pessoa interditada, que veremos a seguir.
Quando o absolutamente incapaz pratica algum ato da vida civil, este ato pode ser declarado nulo judicialmente, isto , declara-se que nunca existiu, j que uma das partes que praticou o ato no tinha capacidade para entender o que estava fazendo e as conseqncias deste ato.
A existncia da incapacidade deve ser verificada em processo judicial, no qual se decidir, caso ela seja constatada, pela interdio da pessoa com a nomeao de um curador que o represente nos atos da vida civil.
O artigo 3 do Cdigo Civil determina que so absolutamente incapazes para exercer os atos da vida civil: os menores de dezesseis anos; os que, por enfermidade ou defi-cincia mental, no tiverem o necessrio discernimento para a prtica desses atos; e os que, mesmo por causa transitria, no puderem exprimir sua vontade.
Deve-se ressaltar que no so todos os casos de transtorno mental que geram a inca-pacidade, seja ela absoluta ou relativa.
Incapacidade Relativa
A incapacidade relativa se d em razo de circunstncias pessoais que levem algum a no possuir discernimento suficiente para praticar os atos da vida civil sem as-sistncia. Os relativamente incapazes devem ser assistidos, e no representados (como ocorre com os absolutamente incapazes), e isto quer dizer que podem pra-
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ticar os atos civis, mas sempre com a assistncia de quem for designado pelo juiz ou pela lei para exercer esta funo. Se os atos forem praticados sem assistncia, podero ser anulados.
O artigo 4 do Cdigo Civil define quem so as pessoas relativamente incapazes. Contudo, no h meno expressa em tal artigo s pessoas que tm transtornos mentais, havendo apenas referncia queles considerados, de acordo com a nomen-clatura inadequada do Cdigo, excepcionais e aos que tm deficincia mental.
Entretanto, devem ser entendidos como relativamente incapazes, aqueles casos de pessoas que tenham um transtorno mental que os impea de realizar apenas de-terminados atos da vida civil, no faltando o total discernimento para participar de outros tipos de negcios jurdicos.
So tambm considerados relativamente incapazes pelo artigo do Cdigo Civil aqueles que tm entre 1 e 18 anos, e os dependentes qumicos e de lcool.
Casamento e Alimentos
No que diz respeito ao casamento, a pessoa com transtorno mental tem os mes-mos direitos de escolher seu parceiro, casar e constituir famlia. O caso tem apenas algumas especificidades no que diz respeito manifestao de vontade, que deve ser livre e consciente para que a pessoa com transtorno mental no se prejudique praticando um ato o qual no compreenda.
O Cdigo Civil exige que toda a pessoa que decida se casar tenha plena consci-ncia do ato que est praticando, para que o casamento seja vlido.
O casamento pode ser nulo ou anulvel, dependendo das caractersticas de cada caso. Assim, o artigo 1.8 do Cdigo Civil prev o casamento nulo, que no gera nenhum efeito jurdico, quando a pessoa que se casou no tinha nenhuma condio de entender o ato que praticou. O casamento anulvel previsto pelo artigo 1.0 do Cdigo Civil, e pode ou no ser anulado. Se for, gera efeitos jur-dicos at o momento da sentena que declara sua anulao.
O casamento nulo quando a pessoa com transtorno mental absolutamente incapaz para os atos da vida civil. J o casamento anulvel (que pode ou no ser desfeito) aquele em que a pessoa incapaz de consentir ou de manifestar de
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modo inequvoco o seu consentimento, isto , a pessoa considerada relativa-
mente incapaz, e precisa ser assistida nos atos da vida civil.
importante ressaltar que o casamento de uma pessoa com transtorno mental
no pode ser anulado pelo simples fato de ela ter um transtorno. A anulao
uma medida extrema que s deve ser tomada para evitar que a pessoa se pre-
judique nos casos em que ela no tinha nenhuma conscincia do ato que pra-
ticou.
Outro assunto que interessa s pessoas com transtorno mental so os alimen-
tos, ou penso alimentcia como so popularmente conhecidos. Estes so va-
lores, normalmente pagos em dinheiro, a uma pessoa com quem se tem vnculo
familiar, que, por diversos motivos, no pode prover a prpria subsistncia.
Essa obrigao se baseia no princpio da solidariedade familiar. A lei exige que
os familiares amparem uns aos outros nos momentos de necessidade.
O artigo 1.9 do Cdigo Civil determina que podem os parentes, os cnjuges
ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para
viver de modo compatvel com a sua condio social, inclusive para atender s
necessidades de sua educao.
Dessa forma, a penso alimentcia no um favor, mas um direito de quem
necessita, e um dever do familiar (ou ex-cnjuge ou ex-companheiro, tanto
homem quanto mulher), que pode pagar. Poder, portanto, ser exigvel judi-
cialmente.
O valor dos alimentos vai ser estabelecido a partir de dois critrios: a necessi-
dade de quem os est pedindo e a condio econmica de quem os deve pagar.
Isso quer dizer que o juiz deve buscar um valor que satisfaa as necessidades
de quem precisa dos alimentos sem, no entanto, prejudicar o sustento da pr-
pria pessoa que deve pagar. o que diz, em outras palavras, o artigo 1.9 do
Cdigo Civil.
Normalmente recebem alimentos os filhos menores de 18 anos que no vivem com a pessoa que tem o dever de lhes garantir a subsistncia e os estudos.
Neste caso, essa necessidade notria, ou seja, no exige que se prove a inca-
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pacidade para a subsistncia, j que as crianas e adolescentes devem estudar,
no trabalhar.
Os maiores de 18 anos tambm podem pedir os alimentos, mas neste caso,
exige-se a prova de que a pessoa no pode se sustentar e necessita de ajuda
financeira. Isso porque se imagina que aps completar 18 anos a pessoa j seja capaz de se sustentar atravs seu prprio trabalho.
Porm, essa capacidade pode no ser verdadeira. o caso das pessoas que
possuem alguma deficincia ou transtorno mental que as impea de trabalhar ou, mesmo trabalhando, o salrio no seja suficiente para cobrir seus gastos essenciais.
Esse ponto muito importante. No o fato de a pessoa trabalhar que a impede
de receber alimentos. Para que a penso alimentcia no seja devida, necess-
rio que o montante recebido por seu trabalho lhe seja suficiente para uma vida digna. Nada impede que os parentes mais prximos sejam chamados a comple-
mentar a renda dessa pessoa2, segundo suas possibilidades econmicas.
Deve-se ressaltar que nem todo transtorno ou deficincia mental impede que a pessoa trabalhe e garanta sua prpria subsistncia.
A lei obriga os parentes a suprirem as necessidades daquele que precisa, mas
no exige que o faam na hiptese de no terem condies para tal. Essas con-
dies so medidas pela capacidade econmica para sustentar o parente que
necessite de alimentos sem comprometer sua prpria subsistncia.
Quem deve pagar os alimentos, em princpio so os pais, por serem os parentes
mais prximos. Mas outros parentes e o cnjuge, ou companheiro, podem ser
obrigados a pagar alimentos se os pais no tiverem condies econmicas para
tanto ou se forem ausentes.
2Os parentes mais prximos (pais) so os primeiros a possurem a obrigao de prestar alimentos. Na sua
ausncia, os, progressivamente mais distantes, primeiro os ascendentes (avs, bisavs), depois os descen-
dentes (filhos, netos) e ento os colaterais (irmos) Assim, tem-se a seguinte ordem de obrigaes: (i) os pais;
(ii) os avs; (iii) os filhos; (iv) os netos; e (v) os irmos.
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Somente na hiptese de no existncia, ou impossibilidade econmica, de um
dos obrigados da lista acima que se pode requerer alimentos aos parentes
do nvel seguinte. No existem diferenas entre o homem e a mulher, ambos
possuem o mesmo dever de sustento dos descendentes e ascendentes, afinal homens e mulheres so iguais em direitos e obrigaes.
O clculo para o valor dos alimentos no se restringe alimentao propria-
mente dita. Inclui-se tudo que necessrio para a vida digna da pessoa que os
requer como, por exemplo, gastos com moradia, vesturio, sade, transporte,
lazer e educao, no caso das crianas ou adolescentes menores de 18 anos.
De acordo com o artigo 1.99 do Cdigo Civil, o valor da penso pode ser altera-
do tanto para mais quanto para menos, dependendo de novos acontecimentos.
Se quem recebe penso passa, por algum motivo, a necessitar de uma quantia
maior e o devedor possui condies econmicas para pagar mais, deve-se re-
querer em juzo esse aumento. Da mesma forma se procede no caso em que o
devedor no puder mais arcar com a quantia inicialmente estipulada.
Se no houver sido corrigido o valor da penso, a pessoa que a recebe pode re-
querer aumento da quantia paga para recuperar o poder aquisitivo perdido pela
inflao. Da mesma forma, se a correo monetria dos alimentos tornou a sua prestao impossvel ou muito difcil, o devedor pode requerer a diminuio.
A pessoa com transtorno ou deficincia mental no precisa estar interditada para ter o direito a receber alimentos. A interdio, que pode ser total ou parcial,
pode ajudar a provar a necessidade de receber alimentos e, para alguns autores,
inquestionvel o direito de penso alimentcia nesse caso.
De qualquer forma, a interdio no necessria para que se consiga penso
alimentcia. Basta a prova, no processo judicial, de que a pessoa no possui con-
dies de se sustentar.
Deve-se lembrar que no h diferena alguma entre filhos adotivos e filhos na-turais no que diz respeito ao pagamento e recebimento de alimentos. Conforme
as disposies da Constituio Federal, a adoo idntica filiao natural. As-sim, quem foi adotado , para a lei, igual ao filho biolgico, possuindo os mesmos
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direitos e deveres, inclusive no que refere aos alimentos.
Quando ocorre o no pagamento de trs prestaes mensais da penso aliment-
cia, pode haver a priso do devedor. Nesse caso deve-se ingressar com uma ao
de execuo de alimentos para pedir que o devedor pague os atrasados no prazo
de trs dias, sob pena de priso .
No havendo pagamento, o juiz determinar que o devedor seja preso pelo pra-
zo de um a trs meses. Aps esse perodo, mesmo que continue devendo, ser
solto. Mas, enquanto perdurar o processo judicial de cobrana, basta que se deva
um nico ms de penso para que se possa voltar priso.
O direito prestao alimentcia acaba quando as circunstncias que os torna-
ram necessrios no mais existirem ou quando o devedor no possuir mais ne-
nhuma condio de arcar com o pagamento. A suspenso do dever de pagar a
penso deve ser requerida pelo devedor em ao judicial e demonstrada uma
das condies acima.
O simples desemprego do devedor, por si s, no significa o fim do pagamento dos alimentos, h que se demonstrar a real incapacidade de prest-los, pois o
devedor pode ter outros bens, inclusive aplicaes financeiras, que lhe garantam a sobrevivncia e ainda lhe permitam sustentar o parente que tenha necessidade.
Observe-se que se o devedor morre, a obrigao de pagar alimentos transmite-
se aos herdeiros . O ex-cnjuge, ou ex-companheiro, perdem o direito penso
alimentcia na hiptese de se casarem novamente, ou tiverem um companheiro.
2) Interdio28
O processo de interdio de uma pessoa com transtorno mental costuma ser do-
loroso, tanto para ela como para sua famlia. Por isso, ressalta-se que esta deve
ser uma medida excepcional, a ser tomada apenas como ltima alternativa.
No processo de interdio ser avaliada pelo juiz a capacidade da pessoa para
reger sua vida e administrar seus bens, situao em que se for declarada sua
incapacidade o juiz nomear um curador para assisti-la. Em primeiro lugar, po-
28Vicente Greco Filho. Prtica Jurdica, Braslia, ano 3, n.2, p.-, mar. 200.
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dem propor esta ao o pai, a me, o tutor, o cnjuge ou qualquer parente. Caso
estes estejam ausentes ou no o faam, o Ministrio Pblico poder dar incio ao
processo de interdio. Decretada interdio dever o juiz estabelecer alguns
limites para a curatela, tomando em considerao o estado ou desenvolvimento
mental da pessoa interditada. usual essa hiptese para casos em que o interdi-
tado tenha relativo discernimento e at por recomendao dos tcnicos dos ser-
vios de sade, deve manter certa atividade civil, como por exemplo movimentar
contas bancrias ou receber vencimentos ou penses.
3) Curatela
A curatela concedida pelo juiz em processo de interdio, a fim de que a pessoa que foi interditada tenha algum, o curador, capaz de defend-la e de adminis-
trar seus bens. Deve-se lembrar que o curador obrigado a apresentar ao juiz
balanos anuais e prestao de contas dos valores que administrou em nome
do curatelado, os quais sero tambm avaliados pelo Promotor de Justia.
A curatela interrompida quando o sujeito considerado incapaz readquirir
sua integridade mental, segundo o que se apurar em processo judicial de le-
vantamento de interdio.
Segundo o artigo 1. do Cdigo Civil, esto sujeitos a curatela as pessoas
que, por possurem deficincia ou transtorno mental, no tiverem a compre-enso de mundo suficiente para praticar os atos da vida civil; as pessoas que por outro motivo duradouro no puderem exprimir sua vontade; os depen-
dentes qumicos e de lcool e os prdigos, ou seja, pessoas que gastam mais
do que possuem, de forma to extremada que colocam em risco seu prprio
patrimnio.
c) Imputabilidade Penal
Os inimputveis so as pessoas que no so capazes de entender que praticam
atos proibidos ou de agir de acordo com esse entendimento. Nesses casos,
as penas previstas para o crime que praticam no podem ser aplicadas da
mesma forma que aquelas aplicadas a pessoas que no apresentam a falta de
discernimento.
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O Direito Penal um conjunto de regras que define crimes e estabelece pu-nies para tais condutas. Esse ramo do direito pretende proteger os bens e
os interesses da sociedade. Crime uma conduta humana que a lei probe e
estabelece, em regra, uma punio para quem pratic-lo. Os crimes que exis-
tem no ordenamento jurdico brasileiro esto contidos no Cdigo Penal e em
leis especiais.
Nem todas as pessoas que cometem crimes podem sofrer as penas que o C-
digo Penal e as leis especiais estabelecem. Para que alguma pessoa possa ser
submetida a penalidades, ela deve ser capaz de entender que praticou um ato
proibido e poder agir conforme esse entendimento. Isso no acontece em uma
srie de situaes previstas no Cdigo Penal. o caso dos menores de 18 anos
e de algumas pessoas com algumas deficincias ou transtornos mentais.
Uma pessoa com transtorno mental, por exemplo, pode, em meio a um qua-
dro agudo da doena, cometer um ato proibido pela lei. Nesse caso, esta pessoa,
mesmo que capaz de entender que no deveria fazer isso, no tinha condies
de agir de modo diferente porque se encontrava em um momento crtico de seu
transtorno.
Assim, as pessoas nessas condies de no serem capazes de entender que
praticam atos proibidos ou de agir de acordo com esse entendimento so cha-
madas pela lei de inimputveis. Isso significa que a pena prevista para o crime que praticaram no pode ser aplicada a elas.
De acordo com o artigo 2 do Cdigo Penal so inimputveis aqueles que tm
deficincia ou transtorno mental, e que em virtude disso, ao tempo em que pra-ticaram o crime no podiam, de forma nenhuma, entender o carter ilcito (proi-
bido) do que fizeram ou de agir de acordo com esse entendimento. Nessas hip-teses, o mesmo artigo traz a possibilidade de uma reduo de um a dois teros da
pena correspondente ao crime praticado.
Para que uma pessoa seja considerada pela justia como inimputvel, devem ser
provados os requisitos citados acima. Esses requisitos so provados por uma srie
de meios: testemunhas, exames anteriores que provam a existncia do transtorno
mental, entre outros. Porm, essencial que o advogado pea ao juiz que se faa um
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exame mdico especfico, chamado de exame de sanidade mental, e prove que h indcios da inimputabilidade da pessoa, para que o juiz aceite o pedido de exame.
Os inimputveis praticam um crime ou no?
Eles praticam um ato previsto como crime, mas devem ser absolvidos no proces-
so criminal. Assim, no podem ser considerados reincidentes (algum que volta
a cometer um crime) se praticarem outro crime, mas podem, desde a prtica da
primeira conduta proibida, serem obrigados a cumprir medida de segurana, o
que ser explicado a seguir.
O que pode acontecer com os inimputveis quando eles praticam um crime?
Eles podem ser obrigados a pagar os prejuzos que causarem, podem ser processa-
dos criminalmente e ter que cumprir o que a lei chama de medida de segurana.
O que medida de segurana?
De acordo com o artigo 9 do Cdigo Penal existem duas formas de medida de
segurana. Uma consiste na internao em hospital de custdia e tratamen-
to psiquitrico, os chamados manicmios judicirios. A outra consiste em
tratamento ambulatorial, cumprido em liberdade.
No tratamento ambulatorial a pessoa deve dirigir-se a um estabelecimento es-
pecial, determinado pelo juiz, e receber uma srie de tratamentos psiquitri-
Para que essas pessoas no sofram a pena prevista, so necessrios trs requisitos:
(i) Ter um transtorno mental.
(ii) No ter a possibilidade de entender que praticou uma conduta proi-
bida, ou, mesmo entendendo, no ser capaz de no pratic-la, sendo essa
circunstncia dependente de comprovao por meio de percia mdica
autorizada judicialmente.
(iii) Esses dois requisitos devem estar presentes no momento da prtica
do ato.
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No Em que caso se aplica cada uma das medidas de segurana?
O Cdigo Penal, no artigo 9, manda que se aplique a medida de internao em hos-
pital de tratamento psiquitrico sempre que presentes os dois requisitos abaixo:
(i) For praticada uma conduta descrita como crime;
(ii) Que esta conduta seja punida com recluso para pessoas imputveis (que tm discernimento de seus atos).
A recluso uma das espcies de pena de priso, prevista para crimes mais graves.
Na recluso o regime de cumprimento da pena pode ser fechado, semi-aberto ou
aberto.
A medida de tratamento ambulatorial, conforme o Cdigo Penal pode ser apli-
cada se:
(i) For praticada uma conduta descrita como crime;
(ii) Que esta conduta seja punida com deteno para pessoas imputveis.
A deteno o outro dos dois tipos de pena de priso, previsto para crimes menos
graves. O regime de cumprimento da pena s pode ser semi-aberto ou aberto, nunca
fechado.
cos definidos por mdico ou por uma equipe multidisciplinar. Esses tratamen-tos podem envolver a administrao de medicamentos, terapias individuais,
em grupo entre outras formas de tratamento. importante dizer que ningum
obrigado a se submeter a tratamentos invasivos, tais como cirurgias.
As medidas de segurana visam proteger a pessoa com o transtorno mental e
a sociedade, em razo da possvel existncia de perigo. Ressalte-se que o fato
de a pessoa ter um transtorno mental no determina que ela v representar
um perigo ao convvio social. A princpio, obrigatria a aplicao de uma
das duas espcies de medida de segurana citadas, mas isso no impede que
o juiz determine que a pessoa continue o tratamento que j realizava na
poca da prtica do crime, no sendo necessrio que seja aplicada medida
de segurana alguma.
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Note-se que o Cdigo Penal no permite explicitamente que se aplique a me-
dida de tratamento ambulatorial para os crimes cuja pena seja de recluso,
porm, j decidiu o Superior Tribunal de Justia que a medida de segurana
deve se ajustar ao tipo de tratamento que necessite o inimputvel ou semi-
imputvel (veja prxima pergunta); podendo, ento, ser aplicada a medida
de tratamento ambulatorial, em liberdade, tambm na prtica de crime pre-
visto com recluso29. No entanto, o inverso no possvel. Em caso de crime
previsto com deteno, a nica medida possvel o tratamento ambulatorial,
no sendo permitida a internao hospitalar.
O Cdigo Penal permite que o tratamento ambulatorial seja substitudo, por deci-
so do juiz, por internao hospitalar, se for demonstrada a necessidade da interna-
o para o tratamento curativo da pessoa. importante ressaltar que tal medida de
internao no possui carter punitivo e sim finalidade teraputica, destinada a um processo de adaptao ou readaptao vida social.
O que semi-imputvel?
Semi-imputvel a pessoa que, em virtude de transtorno ou deficincia mental, no podia, no momento da prtica do crime, entender a proibio da conduta que pratica-
va ou de agir em conformidade com esse entendimento. A diferena entre o inimput-
vel e o semi-imputvel que naquela a falta de discernimento total, nesta parcial.
As maiores conseqncias dessa diferena que o semi-imputvel, ao invs de ser
absolvido, ser condenado, mas a pena de priso ser reduzida de um a dois teros
ou ser substituda por medida de segurana, conforme a necessidade de tratamento
mdico da pessoa, de acordo com o artigo 98 do Cdigo Penal.
Qual o prazo das medidas de segurana?
De acordo com o pargrafo nico do artigo 9 do Cdigo Penal, ambas as medidas
internao e tratamento mdico ambulatorial sero de prazo indeterminado,
enquanto durar a periculosidade da pessoa. O juiz determinar um prazo mnimo
de 1 a 3 anos, antes do qual a medida de segurana no poder ser interrompida. Ao
29RESP 32091/SP
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trmino desse prazo ser feito novo exame mdico. Se comprovado que terminou a
periculosidade da pessoa que cometeu o crime, a internao ou tratamento ambula-torial no ser mais obrigatrio, embora seja possvel que os mdicos aconselhem a continuidade da medicao.
Se for observado no novo exame que ainda existe perigo para a pessoa ou para a so-ciedade, ela ser obrigada a permanecer internada ou em tratamento at que outro exame comprove o trmino da periculosidade.
Se at um ano depois do trmino da medida de segurana a pessoa praticar um ato que indique que a periculosidade continua existindo, ela ser internada novamente
ou retornar ao tratamento ambulatorial.
Nesses casos, preciso haver cuidado da sociedade para que a pessoa com transtor-
no mental no receba o estigma de perigosa. Da mesma forma, preciso que o juiz
tambm no contribua para este rtulo, determinando a internao ou tratamento
ambulatorial quando este no realmente necessrio.
O que acontece com quem adquire ou manifesta um transtorno mental enquanto cumpre pena?
H a possibilidade de uma pessoa, que era plenamente imputvel (possua pleno
entendimento de que praticava uma conduta proibida e podia no pratic-lo) quan-
do praticou o crime (e foi condenada a uma pena de priso por isso) adquirir ou
manifestar na cadeia um transtorno mental.
Nesse caso, havendo necessidade de tratamento psiquitrico, a pessoa deve ser
transferida para um hospital de custdia ou outro estabelecimento adequado ao seu
tratamento.
A no transferncia ilegal, conforme j decidiu o Superior Tribunal de Justia em
uma srie de decises30. Entende tambm esse tribunal que no transtorno posterior
prtica do crime a internao no se dar por tempo indeterminado, como ocorre
na medida de segurana, mas pelo restante do tempo de priso no cumprido31.
30Cf. HC 2 / SP, HC 2291 / MG, HC 133 / SP
31Cf. HC 2/SP
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32Cf. HC 18803 / SP33Conforme previsto no art. 1, pargrafo segundo da LEP, Lei de Execues Penais.3So eles a Unio, os estados, os municpios e o Distrito Federal.
Por exemplo, uma pessoa condenada por qualquer crime a uma pena de anos,
depois de 3 anos de priso, manifesta certas condies e tem o diagnstico de que
possui esquizofrenia. Em razo desse transtorno essa pessoa passa a necessitar de
tratamento psiquitrico especfico. O juiz da execuo da pena deve determinar que ele cumpra os 2 anos restantes num hospital de custdia ou outro estabelecimento
adequado ao tratamento que necessite.
A transferncia para esse hospital deve ser feita em no mximo 30 dias, conforme j
decidiu o Superior Tribunal de Justia32.
O preso que possui alguns transtornos mentais, manifestos na execuo da pena,
poder ter atendimento psicolgico (entendido como assistncia sade) no pr-
prio estabelecimento penal, caso esse esteja aparelhado para prover a assistncia
mdica necessria33.
d) Tributos
O Estado possui uma srie de obrigaes e, para cumpri-las, arrecada dinheiro atra-
vs da cobrana de tributos. Cada um dos entes pblicos que formam o Estado3
autorizado pela Constituio Federal a criar impostos prprios. Para o tema de
sade mental, nos importam o Imposto de Renda e os impostos relativos aquisi-
o de automveis (IPI, o ICMS, IPVA e o IOF), pois para alguns desses impostos
existe iseno (dispensa do pagamento) s pessoas com transtorno mental. Vejamos
alguns casos.
Imposto de Renda
Imposto de Renda uma quantia em dinheiro que o contribuinte deve pagar ao Estado toda vez que recebe uma renda. Essa renda, entre outras fontes, pode ser
proveniente do seu trabalho o salrio de aluguis, de investimentos financeiros e de benefcios previdencirios, inclusive a aposentadoria.
As pessoas com transtornos mentais, desde que consideradas pela Receita Federal
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como alienadas mentais, so isentas de tributao sobre alguns rendimentos. Ou
seja, no pagam Imposto de Renda sobre o valor de alguns benefcios, que so os
seguintes:
(i) Aposentadoria, inclusive a aposentadoria privada;
(ii) Penso, inclusive a alimentcia;
(iii) Reforma do militar.
No h limites de valor, todo o rendimento proveniente das fontes acima citadas
isento. J sobre a renda proveniente de qualquer outra fonte, como, por exemplo, a
de atividade profissional como empregado ou autnomo aluguis e investimen-tos financeiros, so cobrados impostos, mesmo que a pessoa possua algum transtor-no mental e esteja recebendo aposentadoria por esse motivo.
O termo alienado mental, conforme utilizado pela legislao, refere-se quelas
pessoas que, devido a algum transtorno mental, no possuem condies para gerir
sua vida sozinha, necessitando do auxlio de outra pessoa.
Assim, no qualquer transtorno mental que possibilita a iseno do imposto de
renda sobre os rendimentos listados na questo anterior, mas to somente aqueles
mais graves, que atinjam o discernimento das pessoas com tais transtornos.
Qual o procedimento para conseguir a iseno do imposto de renda?
H diferentes procedimentos, dependendo da origem do rendimento. Para a iseno
do Imposto de Renda sobre os benefcios pagos pelo INSS (Aposentadoria Social,
Penso e Reforma), deve ser levado ao prprio INSS laudo de exame mdico, emiti-
do por servio mdico oficial da Unio, Estados, DF ou Municpios3, comprovando que a pessoa possui transtorno mental grave que a torna alienada mental (confor-
me nomenclatura legal).
Esse servio mdico oficial no especificado pela legislao, podendo ser qualquer instituio do Sistema nico de Sade. Porm, a Receita Federal tem exigido (o que
3A necessidade do laudo mdico emitido por servio mdico oficial decorre de disposio expressa da Ins-
truo Normativa no da Secretaria da Receita Federal, artigo , pargrafo 1.
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pode ser considerado ilegal), que o exame seja realizado pelo INSS, o que pode ser
contestado em ao judicial.
Aceito o laudo de exame mdico pela Receita Federal, o desconto mensal do Impos-
to de Renda deixar de ser feito.
No caso da Aposentadoria Privada, o procedimento o mesmo, porm, ao invs de
levar o laudo do exame mdico ao INSS, a pessoa com transtorno mental deve lev-
lo instituio que lhe paga a aposentadoria.
Para a iseno do Imposto de Renda sobre a penso alimentcia, deve-se enviar o
laudo do exame mdico juntamente com sua declarao anual de Imposto de Ren-
da. Se quem paga a penso possui emprego e tem o Imposto de Renda descontado
na fonte, o laudo pode ser levado ao empregador para que ele deixe de fazer o des-
conto correspondente a iseno.
Note-se que a pessoa com transtorno mental continua obrigada a fazer a declarao
de Imposto de Renda. Essa declarao ser a de isento se ela no atingir o mnimo
estipulado em lei ano a ano para a cobrana do Imposto de Renda, excludo desse
clculo os rendimentos isentos a que nos referimos at o momento.
Na hiptese da pessoa ter rendimentos no isentos e atingir o valor estipulado para
a cobrana do Imposto, ela dever fazer a declarao padro, como todas as outras
pessoas. Porm, a lei permite que a pessoa com transtorno mental declarada aliena-
da mental seja includa na declarao do Imposto de Renda de seus pais ou respon-
sveis legais, independentemente de possuir rendimentos inferiores ou superiores
ao mnimo para a cobrana do Imposto.
Ressalte-se que no h necessidade alguma da pessoa com transtorno mental ser in-
terditada para a aquisio da iseno, uma vez que a lei traz somente como requisito
a apresentao do laudo que a considere alienada mental, ou seja impossibilitada
de gerir sua vida sozinha.
Existe iseno de algum imposto relativo aquisio de automvel para as pessoas com transtorno mental?
Existe uma srie de impostos cobrados no momento da aquisio de um automvel.
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Para muitos deles a legislao concedeu iseno para as pessoas que possuem certas
deficincias. Quanto s pessoas com transtorno mental, no h nenhuma previso que lhes conceda iseno.
Nesse ponto necessrio relembrarmos que deficincia mental e transtorno men-tal so distintos. Conforme visto no incio desta cartilha, quando uma pessoa tem
algum tipo de deficincia mental pode-se dizer que esta uma caracterstica dela, assim como ter olhos azuis ou cabelo enrolado. Tal pessoa nasceu com aquela ca-
racterstica, ou a adquiriu durante a vida e sempre estar com ela. No caso do trans-
torno mental, pode-se dizer que ele se manifesta durante a vida da pessoa, e que
pode ser controlado atravs de tratamentos teraputicos e, eventualmente, pode at
desaparecer.
No que tange s pessoas com deficincia, j so concedidas isenes na aquisio de veculos automotores em determinados casos, como veremos a seguir. Isso ainda
no ocorre no caso das pessoas com transtorno mental, mas valeria uma mobiliza-
o para que fosse estendida a concesso da iseno a estas pessoas, criando facilida-
des para o dia a dia, como o transporte aos servios de sade. Para que isso ocorra,
necessrio que o Congresso Nacional faa uma lei que conceda isenes de tributos
para as pessoas com transtorno mental. Vejamos agora os principais tributos envol-
vidos na aquisio de automveis e quem possui iseno a eles:
O primeiro imposto a ser visto o IPI, que consiste numa quantia de dinheiro que o
contribuinte deve pagar ao governo federal na compra de um produto industrializa-
do. Trata-se,assim como o Imposto de Renda, de um imposto federal.
A Instruo Normativa da Secretaria da Receita Federal no 3, de 23/12/2003,
concede iseno do IPI somente para as pessoas com deficincia fsica, visual, men-tal, severa ou profunda, ou autistas ao adquirirem automvel de passageiros ou ve-
culo de uso misto, que so aqueles que tanto podem levar