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CONSTITUIÇÃO DE SUBJETIVIDADES JOVENS NO DISCURSO MIDIÁTICO SOBRE A REFORMA DO ENSINO MÉDIO DOS ANOS 1990 Wesley Fernando de Andrade Hilário 1 Rosemeire de Lourdes Monteiro Ziliani 2 Introdução Desde a segunda metade do século passado a educação de crianças e jovens tem sido privilegiada como condição ao desenvolvimento e ao “progresso da nação”. Tomemos como exemplo os anos de 1970, no contexto da ditadura militar, momento em que o ensino profissionalizante foi tornado obrigatório em todas as escolas de ensino 1º e 2º graus, objetivando uma educação dirigida à “qualificação para o trabalho”, conforme aponta o texto da reforma inscrita na Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971 (BRASIL, 1971). Mas por efeito do fracasso desse modelo 3 , no início dos anos de 1980 tal obrigatoriedade foi retirada, tornando, a partir de mais uma reforma, desta vez instituída pela Lei nº 7.044, de 18 de outubro de 1982, a “preparação para o trabalho” (BRASIL, 1982), como finalidade do processo de escolarização. Na segunda metade dos anos de 1990 outra reforma veio à tona, mas esta abrangeu todos os níveis. Com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, inscrita na Lei nº 9.394, de 20 dezembro de 1996 (BRASIL, 1996), o nível médio ganhou espaço próprio no texto legal e foi tornada a última etapa da educação básica, ainda que sua obrigatoriedade não tenha sido assegurada a todos os jovens naquele momento 4 . Outros aspectos como, por exemplo, sua organização curricular e sua função foram modificadas 1 Mestrando pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal da Grande Dourados. Graduado em Letras pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. E-mail: [email protected] 2 Doutora em Educação. Docente do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal da Grande Dourados. E-mail: [email protected] 3 Apesar do pretendido desenvolvimento do País, a profissionalização técnica não foi uma necessidade do sistema produtivo nem correspondeu à lógica interna do sistema educacional. Ora, se encarada sob a dimensão industrial da profissionalização, a formação de técnicos e auxiliares técnicos não correspondia às artes industriais do 1º grau, pautadas mais pelo artesanato do que pela cultura fabril. Além disso, a especialização de técnicos e auxiliares técnicos era incongruente com a concepção dos cursos de graduação, em nível superior, os quais, conforme a Lei n. 5.540, de 28 de novembro de 1968 (BRASIL, 1968), deveriam começar com um ciclo básico, de caráter geral, de modo a evitar a precoce opção pela carreira. Sobre as motivações do insucesso da Lei n. 5.692, consultar Cunha (2014). 4 A obrigatoriedade da escolarização aos jovens foi instituída pela Emenda Constitucional nº 59 de 2009.

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CONSTITUIÇÃO DE SUBJETIVIDADES JOVENS NO DISCURSO

MIDIÁTICO SOBRE A REFORMA DO ENSINO MÉDIO DOS ANOS 1990

Wesley Fernando de Andrade Hilário1

Rosemeire de Lourdes Monteiro Ziliani2

Introdução

Desde a segunda metade do século passado a educação de crianças e jovens tem

sido privilegiada como condição ao desenvolvimento e ao “progresso da nação”.

Tomemos como exemplo os anos de 1970, no contexto da ditadura militar, momento em

que o ensino profissionalizante foi tornado obrigatório em todas as escolas de ensino 1º e

2º graus, objetivando uma educação dirigida à “qualificação para o trabalho”, conforme

aponta o texto da reforma inscrita na Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971 (BRASIL,

1971). Mas por efeito do fracasso desse modelo3, no início dos anos de 1980 tal

obrigatoriedade foi retirada, tornando, a partir de mais uma reforma, desta vez instituída

pela Lei nº 7.044, de 18 de outubro de 1982, a “preparação para o trabalho” (BRASIL,

1982), como finalidade do processo de escolarização.

Na segunda metade dos anos de 1990 outra reforma veio à tona, mas esta abrangeu

todos os níveis. Com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, inscrita na Lei nº

9.394, de 20 dezembro de 1996 (BRASIL, 1996), o nível médio ganhou espaço próprio

no texto legal e foi tornada a última etapa da educação básica, ainda que sua

obrigatoriedade não tenha sido assegurada a todos os jovens naquele momento4. Outros

aspectos como, por exemplo, sua organização curricular e sua função foram modificadas

1 Mestrando pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal da Grande Dourados.

Graduado em Letras pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. E-mail: [email protected] 2 Doutora em Educação. Docente do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal

da Grande Dourados. E-mail: [email protected] 3Apesar do pretendido desenvolvimento do País, a profissionalização técnica não foi uma necessidade do

sistema produtivo nem correspondeu à lógica interna do sistema educacional. Ora, se encarada sob a

dimensão industrial da profissionalização, a formação de técnicos e auxiliares técnicos não correspondia às

artes industriais do 1º grau, pautadas mais pelo artesanato do que pela cultura fabril. Além disso, a

especialização de técnicos e auxiliares técnicos era incongruente com a concepção dos cursos de graduação,

em nível superior, os quais, conforme a Lei n. 5.540, de 28 de novembro de 1968 (BRASIL, 1968),

deveriam começar com um ciclo básico, de caráter geral, de modo a evitar a precoce opção pela carreira.

Sobre as motivações do insucesso da Lei n. 5.692, consultar Cunha (2014). 4 A obrigatoriedade da escolarização aos jovens foi instituída pela Emenda Constitucional nº 59 de 2009.

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sob o signo da letra, função que passou da dualidade constituída entre ensino propedêutico

e ensino profissional para uma educação de caráter geral. Em razão deste acontecimento,

grande agitação tomou conta das instituições de ensino e da população civil, conforme

veiculado, por exemplo, em inúmeras reportagens do jornal O Progresso5 (DOURADOS,

1996; 1997a, 1997b, 1997c, 1997d), a partir da segunda metade daquela década.

Este texto problematizou a constituição de sujeitos/subjetividades jovens no

discurso midiático que tratou sobre a reforma do ensino médio dos anos 1990. O

argumento geral foi que, ao pautar a referida reforma, o discurso midiático o fez

articulando um enunciado que remete à racionalidade neoliberal, instituindo uma posição

de sujeito aos jovens, alinhada as perspectivas econômica, política e social hegemônica,

que adentraram nas políticas públicas, no início da referida década.

Como fontes foram privilegiados os seguintes documentos: uma revista produzida

na época pelo Governo Federal, intitulada “O novo ensino médio” (BRASIL, 2000) e

uma reportagem contida em uma edição da Revista Veja (1998). Para analisá-los,

utilizamos como metodologia a análise do discurso de inspiração foucaultiana, a qual

implicou trabalhar de forma árdua o próprio discurso, deixando-o aparecer na

complexidade que lhe é peculiar. Tratou-se de analisar enunciados e relações que o

discurso põe em funcionamento a cada momento histórico e tipos de sujeitos objetivados.

A noção de discurso, segundo essa perspectiva, é entendida como um “conjunto

de enunciados” (FOUCAULT, 2016), pois o enunciado funciona como unidade básica do

discurso e possui função de existência própria. O enunciado refere-se àquilo que é dito e

por estar imerso e ser produzido por relações de poder e saber institui práticas e constrói

as “coisas” sobre as quais tratam, os sujeitos e a realidade.

Na medida em que analisamos um enunciado, estamos, também, analisando o

processo de constituição de sujeitos ou subjetividades. Isto porque os enunciados apontam

para posições de sujeito, paras as formas de ser e estar no mundo. Desta perspectiva

5Jornal de ampla circulação na cidade de Dourados, sul do Estado de Mato Grosso do Sul. Ao ressaltar este

impresso, queremos afirmar que ditos sobre a reforma ecoaram em diversas localidades do País, das

menores cidades aos grandes centros urbanos. Nesse sentido, por sua dimensão, alcance e importância na

referida região, esse jornal contribuiu para fazer circular determinados enunciados sobre o ensino médio, e,

por efeito, produzindo modos de pensar sobre esse nível da educação e sobre os jovens.

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decorre que a subjetividade não é algo fixo, como o verdadeiro “eu” dos indivíduos, mas

sim construção da maneira como cada indivíduo se relaciona com sua exterioridade, com

os discursos que o atingem e o posicionam como sujeitos de determinados tipos. Ora, essa

relação dos indivíduos com os discursos não é sempre a mesma, pois é condicionada pelo

momento histórico em que ocorre. Poder e saber se articulam nos discursos de maneira

diferente em cada época; e por isto, ainda que os enunciados que o atingem o sejam, não

se trata, nunca, das mesmas práticas de subjetivação.

Feitas essas ponderações, para uma melhor aproximação ao objetivo proposto

dividimos o texto em duas partes. Na primeira tratamos da mídia como um dispositivo da

governamentalidade neoliberal, ou seja, a mídia como tecnologia levada a efeito por essa

racionalidade. Na segunda parte problematizamos um enunciado em circulação no

discurso midiático sobre reforma do ensino médio dos anos 1990, que se refere à

formação dos jovens “para a vida e para o trabalho” e que ajuda, ainda em nossa

atualidade, a sustentar o modo neoliberal de governo da população jovem e produz

subjetividades alinhadas a tal racionalidade.

1 A mídia como dispositivo da governamentalidade neoliberal

Quando argumentamos que no discurso midiático sobre a reforma do ensino

médio dos anos 1990 circulou enunciados alinhados ao neoliberalismo, somos levados a

enfatizar que a mídia funciona como um dispositivo da governamentalidade neoliberal.

E o que é um dispositivo? Seguindo as teorizações de Michel Foucault (2016), o

dispositivo é entendido como a relação entre diferentes elementos: práticas discursivas e

não discursivas, instituições, leis e regulamentações, por exemplo. Trata-se de uma

relação complexa e produtiva: complexa porque sua formação não é explicita, envolve

elementos de naturezas diversas, visíveis e invisíveis, enfim, o dito e o não dito, e

produtiva porque seus efeitos concretizam-se nas práticas dos indivíduos que atinge,

sendo estes transformados em sujeitos anteriormente “imaginados” pelo aparato

tecnológico do dispositivo. Constituído sob determinadas condições históricas e

sustentado por tipos específicos de saber, o dispositivo possui uma função estratégica:

responder a uma urgência que se coloca no campo de sua formação (FOUCAULT, 2016).

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Há, em nossa sociedade, diversos dispositivos que obstinam conformar pessoas

desde a mais tenra idade, dispositivos que se prolongam e atingem outras etapas da vida

para responder a determinadas urgências colocadas pelos contextos em que emergem.

Quando, por exemplo, afirma-se a existência de um dispositivo de escolarização, o que

está em jogo é a afinação entre inúmeros elementos que, segundo um conjunto de regras,

de poder-saber, obstinam constituir crianças, jovens e adultos segundo uma grade de

inteligibilidade, a qual, por sua vez, é regida pelo regime de verdade de sua época. Nesse

caso, trata-se de pensar que elementos como leis, enunciados, reformas e as práticas que

se desenrolam dentro das instituições escolares (e isso apenas para citar alguns exemplos),

estão envolvidos na composição de sujeitos escolarizados para um determinado tipo de

sociedade e para determinado contexto histórico, social, econômico etc.

Já governamentalidade é uma noção utilizada para pensar o processo de

governamentalização do Estado, o processo pelo qual o Estado Moderno ocidental chegou

a ser o que é hoje, com as práticas de governo da população que lhe são próprias. Para

evidenciar como a população tornou-se um “problema” a ser resolvido mediante práticas

racionalizadas, Foucault (2008a) ressalta os modos como a população tem sido conduzida

desde o século XVI até a contemporaneidade: de um governo que teve como base a

pastoral cristã, cujo sistema de verdade repousou nas leis divinas, às formas

contemporâneas de governo, que são o liberalismo (surgido no século XVIII) e o

neoliberalismo (que emergiu em meados do século XX), que possuem no mercado

econômico seu sistema de verdade. Em síntese, o filósofo conceitua governamentalidade

da seguinte maneira:

Por esta palavra ‘governamentalidade’, entendo o conjunto constituído

pelas instituições, os procedimentos, análises e reflexões, os cálculos e

as táticas que permitem exercer essa forma bem específica, embora

muito complexa, de poder que tem por alvo principal a população, por

principal forma de saber a economia política e por instrumento técnico

essencial os dispositivos de segurança. Em segundo lugar, por

“governamentalidade” entendo a tendência, a linha de força que, em

todo o Ocidente, não parou de conduzir, e desde há muito, para a

preeminência desse tipo de poder que podemos chamar de “governo”

sobre todos os outros – soberania, disciplina – e que trouxe, por um

lado, o desenvolvimento de toda uma série de aparelhos específicos de

governo [e, por outro lado], o desenvolvimento de toda uma série de

saberes. Enfim, por ‘governamentalidade’, creio que se deveria

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entender o processo, ou antes, o resultado do processo pelo qual o

Estado de justiça da Idade Média, que nos séculos XV e XVI se tornou

o Estado administrativo, viu-se pouco a pouco ‘governamentalizado’.

(FOUCAULT, 2008a, p. 143-144).

Em Nascimento da Biopolítica, Foucault (2008b) afirma que a partir da segunda

metade do século passado as sociedades capitalistas ocidentais passaram a ser governadas

pelo neoliberalismo, o que significa dizer da vigência de uma governamentalidade

neoliberal em nossa atualidade. E o que isso tem a ver quanto ao que aqui nos interessa?

Ora, se hoje as práticas de governo são produzidas mediante tal racionalidade, tudo o que

há na sociedade é pensado, produzido, conduzido de acordo com os pressupostos que

sustentam o neoliberalismo. Significa, nesse sentido, que os sujeitos têm sido orientados,

que as vidas têm sido governadas segundo essa racionalidade, forjadas no interior de uma

sociedade que tem o mercado como verdade e finalidade das práticas que nela se

desenvolvem, das instituições que nela funcionam, dos discursos que nela circulam.

O neoliberalismo, segundo o filósofo, é uma atualização das práticas de governo

liberal, mas que tem no funcionamento da liberdade econômica sua principal diferença.

Se o segundo, o liberalismo, a situava na ordem da natureza, o primeiro, o neoliberalismo,

defende que ela deve ser incitada, produzida e estendida para outros campos que não

sejam necessariamente o econômico. Nesse sentido, a liberdade econômica tem contornos

diferentes no tempo presente, é maximizada, colocada na ordem de discursos diversos

como uma verdade inquestionável de todos os âmbitos.

Assim, segundo o neoliberalismo, os indivíduos são objetivados como um homo

economicus: trata-se da compreensão de pessoa, de ser humano, de sujeito em que essa

racionalidade se apoia. Por ser capilar, estar disseminado em todas as instâncias sociais,

o neoliberalismo coloca em circulação a ideia de que o indivíduo

[...] é um empresário, e um empresário de si mesmo. Essa coisa é tão

verdadeira que, praticamente, o objeto de todas as análises que fazem

os neoliberais será substituir, a cada instante, o homo oeconomicus

parceiro da troca por um homo economicus empresário de si mesmo,

sendo ele próprio seu capital, sendo para si mesmo seu produtor, sendo

para si mesmo a fonte de [sua] renda (FOUCAULT, 2008b, p. 311).

O neoliberalismo funciona como uma grade de inteligibilidade pois, a partir dela,

diversas áreas que tem a vida humana como meio ou fim, como a educação e o trabalho,

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por exemplo, são pensadas, calculadas, racionalizadas. Nessa perspectiva, educar para o

trabalho implica em educar para as situações que são próprias dessa dinâmica social:

educar para as imprevisibilidades e inconstâncias que o trabalho coloca, daí a razão de se

ensinar a ser flexível, polivalente; educar para melhor usar as linguagens, as tecnologias,

pois em um mundo globalizado é preciso estar sempre à frente no uso dessas ferramentas.

Ora, sendo a mídia um dispositivo de subjetivação, a análise de um enunciado que

ela fez circular em momento histórico datado permite compreender seus efeitos na

constituição de subjetividades. Mas esta análise não é suficiente para pensar seu real

efeito sobre os indivíduos, já que a tarefa implica problematizar, também, se eles são

subjetivados pelos discursos que os atingem, ou, ainda, se realmente o são. De todo modo,

este exercício analítico é importante na medida em que “saber como nos governam e

como nos governamos é condição necessária para qualquer ação política que pretenda

colocar minimamente sob suspeita aquilo que estão fazendo de nós e aquilo que nós

estamos fazendo de nós mesmos" (VEIGA-NETO, 2011, p. 37).

2 A mídia subjetivando os jovens...

Nos anos seguintes à promulgação da Lei nº 9.394 (BRASIL, 1996), inúmeras

notícias foram veiculadas na mídia para divulgá-la ou tão somente para comentá-la quanto

aos seus “erros” e “acertos”. Em artigo publicado na revista Veja (1998), na Edição 1.545,

de 06 de maio de 1998, intitulado A segunda onda, o “novo ensino médio”, termo cunhado

para se referir ao novo rosto desse nível da educação, é apresentado por Alice Granato. O

título do artigo faz referência à expressão “onda jovem”, utilizada para caracterizar o

expressivo aumento da taxa de natalidade que ocorreu nos anos 1980 e que resultou na

ampliação da população jovem a partir de meados da década seguinte, portanto, período

concomitante à produção da reforma. Em razão disto, essa franja populacional foi tomada

como um problema a ser resolvido no século que se aproximava, sendo a educação

escolarizada “o” meio para que isso fosse possível.

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A autora destaca a ineficácia do ainda ensino de 2º grau, tratando-o como “um

modelo de ensino ultrapassado, que já não cumpre suas funções”, pois “não fornece

conhecimento técnico para quem pretende ingressar imediatamente no mercado de

trabalho nem prepara de forma adequada os alunos que desejam seguir adiante e fazer um

curso superior” (REVISTA VEJA, 1998, p. 93). Afirma que, objetivando acabar com a

histórica dicotomia que constitui o nível médio da educação, a reforma iria “devolver o

caráter de curso de formação geral”. Logo em seguida apresenta dados de pesquisa

realizada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), segundo

a qual apenas uma pequena parcela de jovens (31,5%), entre os que concluíram o nível

médio no ano anterior (429.775), desejava ingressar no ensino superior, e que número

bem inferior era o dos jovens matriculados nesse nível de ensino (11%). Esses dados

foram tomados como justificativa para a reforma, de alguma forma a sustenta, como

declarado pelo então Ministro da Educação Paulo Renato Souza, citado na matéria6.

No sentido anunciado, a educação para a vida encontra sua concretude nos

pressupostos da formação propedêutica e a educação para o trabalho, materializa-se no

programa da educação profissional.

Eis, portanto, um enunciado que perpassa os discursos sobre a reforma do ensino

médio dos anos 1990, e segundo o qual a educação é “para a vida e para o trabalho”.

Pensado a partir das teorizações foucaultianas, o enunciado sinaliza que a

educação idealizada a partir daquele momento buscou promover a junção entre ambos os

aspectos, ou ainda, os objetivos de uma educação para a vida foram tornados objetivos de

uma educação para o trabalho. Esta dinâmica reflete o funcionamento da sociedade

neoliberal, que toma as “competências” da vida humana como força de trabalho, ou que

toma o trabalho como princípio da vida, ou mais ainda, que subsome a vida ao trabalho.

O uso da linguagem, a autonomia, a flexibilidade, a criticidade e o domínio das

tecnologias, por exemplo, que, a priori, são aspectos capazes de garantir aos indivíduos

6 O saber estatístico é uma das tecnologias de governo levadas a efeito pela racionalidade neoliberal. Para

que a população possa ser melhor governada é preciso fazer emergir números e dados concretos que, sob o

signo da verdade, a revela em sua exatidão, constituem sua realidade. Assim, várias técnicas são agenciadas

para resolver os problemas aos quais a população está exposta ou, no limite, suscetível, conforme quando

antes anunciados pela estatística (POPKEWITZ; LINBLAD, 2001).

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o exercício de sua “cidadania”, passam a ser também instrumentos para o tipo de trabalho

que caracteriza as sociedades neoliberais, o trabalho abstrato, imaterial.

A centralidade desse enunciado pode ser conferida por sua aparição em diferentes

discursos e, sobretudo, por sua constância no discurso oficial. Não que este seja mais

importante do que aquele (afinal, todo e qualquer discurso opera na condição de produtor

da realidade e dos indivíduos), mas porque em nossa sociedade o discurso oficial faz parte

da política geral da verdade e produz efeitos de verdade. Por isso mesmo a Lei é lugar

privilegiado para sustentar e validar determinados enunciados7. A LDB/1996 afirma no

inciso III do Artigo 35 que uma das finalidades do ensino médio é “a preparação básica

para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser

capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento

posteriores” (BRASIL, 1996 apud SAVIANI, 2003, p. 173-174). Preparar para o

exercício da cidadania, sendo cidadania entendida como “as práticas sociais e políticas e

as práticas culturais e de comunicação [...e também] a vida pessoal, o cotidiano e a

convivência e as questões ligadas ao meio ambiente, corpo e saúde” (BRASIL/DCNEM,

1998), e, portanto, aspectos que constituem a vida mesma dos indivíduos, remete ao

preparo para as demandas que o trabalho na contemporaneidade coloca.

O enunciado “educação para a vida e para o trabalho” também reverbera no escrito

de Guiomar Namo de Mello, que foi Relatora das DCNEM (BRASIL, 1998), quando a

autora afirma que a finalidade do ensino médio é preparar para a vida, e que este preparo

implica “a aquisição de competências gerais ligadas à polivalência, flexibilidade,

capacidade de raciocínio e convivência solidária”, aspectos que “coincidem e se

aproximam cada vez mais das demandas do mercado de trabalho” (MELLO, 2000, p.

138-139). Este argumento foi colocado também nas PCNEM (BRASIL, 2000, p. 11) ao

apontar que “o desenvolvimento das competências cognitivas e culturais exigidas para o

7Em A ordem do discurso Foucault afirma que os discursos não são valorizados de maneira homogênea, há

como que um desnivelamento entre eles: “os discursos que ‘se dizem’ no correr dos dias e das trocas, e que

passam com o ato mesmo que os pronunciou; e os discursos que estão na origem de certo número de atos

novos de fala que os retomam, os transformam ou falam deles, ou seja, os discursos que, indefinidamente,

para além de sua formulação, são ditos, permanecem ditos e estão ainda por dizer. Nós os conhecemos em

nosso sistema de cultura: são os textos religiosos ou jurídicos, são também esses textos curiosos, quando se

considera o seu estatuto, e que chamamos de ‘literários’; em certa medida textos científicos” (FOUCAULT,

2011, p. 22, grifo do autor).

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pleno desenvolvimento humano passa a coincidir com o que se espera na esfera da

produção”.

Verifica-se desde esses escritos a tentativa de articular vida e trabalho na medida

em que as competências requeridas para a vida social passam a ser demandadas também

pelo trabalho. Isto fica mais evidente quando nos documentos oficiais afirma-se que os

alunos do ensino médio precisam ser dotados de uma série de competências que os

tornarão aptos ao mercado de trabalho, enunciado que atravessa e é enfatizado no discurso

midiático. Há, conforme a tônica deste discurso, uma pretensão de ofertar uma educação

que torne “o estudo mais próximo da vida real e preparar melhor nossos alunos para

enfrentar as dificuldades da vida prática e ajudá-los a se tornarem cidadãos conscientes e

participativos”, conforme assinado pelo Ministro da Educação Paulo Renato Souza no

Boletim Técnico do Ensino Médio (BRASIL/BOLETIM, 2000, p. 1).

Produzido pela Secretaria de Educação Média e Tecnológica (SEMTEC), órgão

do Ministério da Educação (MEC), o Boletim foi distribuído bimestralmente às escolas

para divulgar as mudanças no ensino médio por ocasião da reforma e “ajudar as equipes

de professores e diretores a construírem os projetos escolares e a aperfeiçoarem sua

prática pedagógica” (BRASIL/BOLETIM, 2000, p. 2), segundo o Editorial assinado por

Ruy Leite Berger Filho, Secretário de Educação Média e Tecnológica. Possui linguagem

didática e imagens amplas e coloridas ao longo de suas oito páginas. Sua distribuição foi

anterior à chegada dos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio (PCNEM) às

escolas, e por isso mesmo, foi a tônica do número aqui em pauta.

Tratando sobre o tema, Avelino Romero Simões Pereira, Coordenador Geral de

Ensino Médio, argumentava que as “competências” são o mote da reforma do ensino

médio, pois elas organizam as áreas que compõem o novo currículo do ensino médio, a

saber: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, Ciências da Natureza, Matemática e suas

Tecnologias e Ciências Humanas e suas Tecnologias. “As competências são estruturas

mentais que as pessoas desenvolvem e que são comuns a vários campos do saber. Como

o conhecimento não é algo estático, à medida que o sujeito vive situações novas, amplia

suas referências, desenvolvendo novas competências, que são desdobramentos das

anteriores” (BRASIL/BOLETIM, 2000, p. 3). Sendo as competências tomadas como o

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princípio epistemológico da reforma, constituem-se como bases pedagógicas da mesma

a interdisciplinaridade e a contextualização.

De acordo com o discurso oficial, reforçado pelo discurso midiático, as

competências demandadas em todas as áreas são as seguintes: capacidade vincular a

educação ao mundo do trabalho e à prática social; compreender os significados; ser capaz

de continuar aprendendo; preparar-se para o trabalho e o exercício da cidadania; ter

autonomia intelectual e pensamento crítico; ter flexibilidade para adaptar-se a novas

condições de ocupação; compreender os fundamentos e científico e tecnológicos dos

processos produtivos; e relacionar a teoria com a prática. Objetiva-se, a partir da aquisição

delas, que os jovens sejam preparados para as atividades práticas de seu cotidiano, que

utilizem os conhecimentos teóricos de maneira articulada às situações que a forma de

trabalho em ascensão demanda. Ao mesmo tempo em que essas competências são

imprescindíveis à vida do sujeito, pois em um mundo marcado pela rápida “evolução” é

preciso ser criativo, autônomo e capaz de solucionar problemas, elas são igualmente

necessárias ao trabalho imaterial, intelectual, que caracteriza as sociedades neoliberais.

O enunciado em questão também está presente na revista “O Novo Ensino Médio”

(BRASIL, 2000). Trata-se de um material produzido pelo MEC para divulgar a reforma

entre os alunos, professores e comunidade, daí a forte utilização de linguagem publicitária

e imagens que remetem ao universo jovem, assim como no Boletim. Ruy Leite Berger

Filho, secretário de Educação Média e Tecnológica do MEC, ao comentar na revista sobre

a finalidade desse nível da educação, qual seja o de

[...] desenvolver o pensamento abstrato, crítico [...] para chegar a

resultados comuns que são um conjunto de habilidades e

conhecimentos [...] que tem por objetivo a melhor inserção no mundo

como cidadão e a preparação básica para o trabalho, [...afirma que] o

cidadão de hoje deve estar instrumentalizado para compreender as

novas tecnologias, e por isso é fundamental que os conteúdos do ensino

médio sejam contextualizados (BRASIL/REVISTA, 2000, s/p).

O que está em jogo é a objetivação de sujeitos que privilegiem suas competências

intelectuais como instrumento de trabalho na mesma medida em que fazem de tais

qualidades atributos para viver e exercer sua cidadania.

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No âmbito da racionalidade neoliberal, essas competências podem ser pensadas

como o capital dos sujeitos. Trata-se de uma aproximação mais estreita da educação de

nível médio à teoria do Capital Humano. Esta foi formulada por Theodore Schultz entre

o final dos anos 1950 e início dos anos 1960, preconizando a ideia de que habilidades e

competências servem como força de trabalho que o indivíduo pode usar a seu favor no

concorrido jogo que o capitalismo comanda. Assim, o indivíduo é pensado como uma

empresa e ele próprio é seu gestor, tendo que, por essa razão, de potencializar suas

qualidades e aptidões e adquirir as que não possui para entrar ou permanecer nesse jogo.

Mas é preciso considerar que a concepção de Capital Humano que ronda o discurso sobre

o ensino médio, a partir dos anos 1990, é diferente de sua proposta inicial ou mesmo da

que se fez presente nos anos 1970, quando se instituiu a obrigatoriedade do ensino técnico

profissional visando qualificar mão de obra para o exercício de funções específicas.

Segundo Foucault (2008b), o capital humano é composto por elementos que se

dividem em capital inato e capital adquirido. São os elementos biológicos que constituem

o capital inato, os elementos que cada um possui desde seu nascimento, ainda que eles

possam ser melhorados por meio de estratégias específicas. Entretanto, “é muito mais do

lado do adquirido, ou seja, da constituição mais ou menos voluntária de um capital

humano no curso da vida dos indivíduos, que se colocam todos os problemas e que novos

tipos de análise são apresentados pelos neoliberais” (FOUCAULT, 2008b, p. 315). Isto

significa que os elementos do grupo do capital adquirido são mais focalizados pela

racionalidade neoliberal do que aqueles do capital inato. É nesse conjunto que se insere a

educação escolarizada de nível médio a partir dos anos 1990, pois tomada como

instrumento serve à constituição de sujeitos/subjetividades úteis à racionalidade

neoliberal.

Os discursos apregoam tornar os indivíduos mais competentes para uma sociedade

em que bons resultados e a excelência são supervalorizados. Demanda-se dos jovens

flexibilidade e melhor adaptação às condições e incertezas colocadas pelo mercado de

trabalho; melhor produtividade e maximização de resultados em todos os âmbitos da vida;

uso e domínio de tecnologias; autonomia e criticidade em relação aos acontecimentos e

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relações sociais; constante aprendizagem como forma de atualização frente às rápidas

mudanças do mundo produtivo, tecnológico e social; entre outras capacidades.

Objetiva-se formar um indivíduo ativo, que possui em seu trabalho seu próprio

capital, entendendo esse capital como “o conjunto de todos os fatores físicos e

psicológicos que tornam uma pessoa capaz de ganhar este ou aquele salário”

(FOUCAULT, 2008b, p. 308). Disto decorre que aquilo que se ganha, seu salário,

constitui-se como produto de si, de seu capital. Por isto é que, no neoliberalismo, é preciso

que o indivíduo tenha atributos e competências que façam com que seu capital seja

valorizado. Trata-se, pois, como já afirmamos anteriormente, de tornar o indivíduo uma

“competência-máquina” (FOUCAULT, 2008b). A propósito desse aspecto Gadelha

(2009, p. 149) afirma que:

[...] as competências, as habilidades e as aptidões de um indivíduo

qualquer constituem, elas mesmas, pelo menos virtualmente e

relativamente independente da classe social a que ele pertence, seu

capital; mais do que isso, é esse mesmo indivíduo que se vê induzido,

sob essa lógica, a tomar a si mesmo como um capital, a entreter consigo

(e com os outros) uma relação da qual ele se reconhece (e aos outros)

como uma microempresa; e, portanto, nessa condição, a ver-se como

entidade que funciona sob o imperativo permanente de fazer

investimentos em si mesmo – ou que retomem, a médio e/ou longo

prazo, em seu benefício – e a produzir fluxos de renda, avaliando

racionalmente as relações custo/benefício que suas decisões implicam.

(GADELHA, 2009, p. 149).

Considerações Finais

O enunciado “educação para a vida e para o trabalho” tem funcionado como uma

tecnologia de governo da população, especificamente da população jovem, buscando

conduzir as condutas desses sujeitos de modo a que contribuam com um determinado

projeto de sociedade. O nível médio da educação desde os anos 1990, por ocasião da

reforma, visa produzir sujeitos capazes de atuar na sociedade contemporânea, atendendo

a uma série de requisitos úteis à governamentalidade neoliberal. Os sujeitos pretendidos

pelo ensino médio são empreendedores, precisam ser flexíveis, capazes de se autogerir,

de continuar aprendendo continuamente. A educação pensada para essa franja da

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população pressupõe que o homem, e nesse caso os jovens, tem sido tomado como força

produtiva para o modelo de sociedade em voga, e que a escola tem sido lugar privilegiado

para formar sujeitos capazes de fazer da sua vida sua força de trabalho.

A colocação do enunciado “educação para a vida e para o trabalho” em discurso

foi resultado dos efeitos da racionalidade neoliberal que a partir dos anos 1990, no caso

do Brasil, tornou a vida e o trabalho elementos estritamente articulados, como que

inseparáveis e dependentes um do outro, por meio da educação. A educação destinada

para a vida, cujo objetivo residia na aquisição de competências como o uso da linguagem,

o desenvolvimento da autonomia, da flexibilidade, da criticidade e do domínio das

tecnologias, por exemplo, a partir da década de 1990, tornaram-se elementos para o

mundo do trabalho, ou mais ainda, como competências demandadas como força de

trabalho e, por isso, tornadas competências a serem adquiridas por meio da educação. A

educação confirma-se, nesse sentido, como instrumento privilegiado de formação de

pessoas, como meio de exercício biopolítico, do governo da população,

Pode-se dizer que a formação para a vida e para o trabalho tem concorrido para a

constituição de subjetividades jovens neoliberais. Isto permite afirmar que a educação, e

em especial o ensino médio, tem funcionado desde aquela década, como uma tecnologia

da governamentalidade neoliberal. Isto é, esse nível da educação tem operado, por meio

das práticas que se desenrolam nas instituições e dos discursos que estas fazem circular,

sobre a vida dos jovens, ensinando-os a serem, pensarem e agirem em conformidade ou

articulados aos pressupostos neoliberais. Demanda cada vez mais competitividade,

enfatizando a necessidade da constante atualização das competências e habilidades,

fazendo-as funcionar como “armas” dos sujeitos para o mundo do trabalho, mas também

para suas vidas.

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