conterrÂneas · 2019. 1. 15. · ticiane kÁrita gomes alves conterrÂneas memorial descritivo de...
TRANSCRIPT
UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO
INSTITUTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
DEPARTAMENTO DE JORNALISMO
CURSO DE JORNALISMO
TICIANE KÁRITA GOMES ALVES
CONTERRÂNEAS
Mariana
2018
TICIANE KÁRITA GOMES ALVES
CONTERRÂNEAS
Memorial descritivo de produto apresentado ao curso de Jornalismo da Universidade Federal de Ouro Preto, como requisito para aprovação na disciplina de Projetos Experimentais II.
Orientadora: Agnes Francine de Carvalho Mariano
Mariana
2018
AGRADECIMENTOS
Agradeço a todos os meus amigos e familiares que contribuíram para o meu trabalho e
compreenderam o momento pelo qual passei pesquisando, escrevendo e entrevistando. Agradeço
também as minhas amadas fontes, que tornaram possível a realização deste tão desejado trabalho.
RESUMO
O objetivo deste trabalho é explorar o campo da narrativa jornalística por meio da criação de um
livro de perfis que trate da trajetória de vida de seis personagens que vivem a experiência de
serem mulheres no contexto interiorano da cidade de Paineiras, em Minas Gerais. A realização
desse produto se justifica pela demanda social de entender e dar visibilidade ao modo como se
dão as experiências, hábitos e crenças que promovem as identidades dessas personagens enquanto
sujeitos sociais. Desse modo, buscou-se refletir sobre os papeis sociais da mulher ao longo da
história e sobre questões de identidade e de gênero dos sujeitos contemporâneos.
Palavras-chave: Jornalismo Biográfico; Gênero; Identidade; Memória.
ABSTRACT
The aim of this work is exploring the field of narrative journalism through the creation of a book
of profiles which deals with the life trajectory of six people who live the experience of being
women in an interior context of Paineiras town, in Minas Gerais. The making of this product is
justified by the social demand of understanding and hightlighting the way in which these
experiences, habits and beliefs occur. All those aspects promote those characters’ identities as
social subjects. Thus, we have tried to think about the social role of women over the history, as
well as identity and gender issues of contemporary subjects.
Keywords: Biographical Journalism; Gender; Identity; Memory.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................... 5
2 GÊNERO E MEMÓRIA............................................................................................................ 7
2.1 Identidade e gênero .............................................................................................................. 7
2.2 Memória e lugar ................................................................................................................. 14
3 JORNALISMO BIOGRÁFICO .............................................................................................. 19
3.1 A produção biográfica ....................................................................................................... 19
3.2 Perfil ................................................................................................................................ 22
3.3 Entrevista ........................................................................................................................ 24
4 PLANO DE TRABALHO E PAUTA ESTENDIDA ............................................................. 27
4.1 Personagens ........................................................................................................................ 28
4.2 Entrevistas .......................................................................................................................... 30
4.3 Confecção do livro de perfis .............................................................................................. 32
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................... 35
6 REFERÊNCIAS ....................................................................................................................... 36
ANEXOS ...................................................................................................................................... 39
5
1 INTRODUÇÃO
Este trabalho experimental será feito em forma de livro de perfis e tem como tema as
narrativas de vida de seis mulheres, que nasceram ou que vivem na pequena cidade de Paineiras,
no interior de Minas Gerais. As seis personagens escolhidas para os perfis são: Jeane Silva,
cabeleireira; Paula Souza, estudante universitária, Maria dos Anjos, ex-vereadora; Gil, professora
trans; Simone Alves, empregada doméstica, e Arlinda, minha avó. O objetivo deste trabalho é
explorar o campo da narrativa jornalística por meio da criação de perfis que revelem a trajetória
de vida das personagens que vivem a experiência de serem mulheres em um contexto interiorano
completamente tomado por tradições e discursos machistas.
Entende-se como uma necessidade dar visibilidade à experiência de mulheres que vivem
em contextos hostis, sem reconhecimento de seus lugares de fala e com pouca ou baixa atuação
em posições sociais e políticas de destaque. A realidade das mulheres brasileiras é, desde os
primórdios do Brasil, marcada pela anulação de seus corpos e de suas vontades. Embora muitos
direitos tenham sido conquistados, ainda lidamos diariamente com abusos e com discriminação
de nossas capacidades físicas e intelectuais. No contexto em que vivem as seis personagens
escolhidas para os perfis, há poucas discussões a respeito da identidade e das necessidades da
mulher. A pacata cidade de Paineiras possui 4.631 habitantes, de acordo com os dados1 do IBGE
de 2010. Sua cultura é especialmente voltada para comemorações religiosas e festas
agropecuárias. Não há cinemas próximos, teatros, livrarias ou sequer uma única banca de revista.
Além disso, Paineiras conta com uma única rádio comunitária, contudo, ela não tem conteúdo
jornalístico, apenas musical e publicitário. Essas características permitem pensar na dificuldade
do reconhecimento social da mulher e na necessidade de ter que vencer todos os dias obstáculos
que não existem para os homens.
Portanto, a realização desse produto justifica-se pela demanda social de colocar em
destaque e em discussão as experiências, hábitos e crenças, que promovem as identidades dessas
personagens, como elas vivem, seus anseios e seus grandes feitos. Compreende-se, portanto, a
1Informação disponível em: <http://cidades.ibge.gov.br/painel/painel.php?codmun=314640>. Acesso em: 28 jan. 2017.
6
importância de ter como base para a construção dos perfis teorias feministas, teorias de afetos e
de alteridade, que possam direcionar a feitura desse trabalho experimental.
A elaboração desse produto contará com levantamento bibliográfico, que conduzirá os
processos, as entrevistas em profundidade, organização dos dados, confecção dos perfis e o
memorial com toda a reflexão do trabalho. As entrevistas serão realizadas de modo presencial.
Pretendo também acompanhar a rotina dessas personagens, isto é, a interação com os locais nos
quais elas realizam suas atividades cotidianas. O gênero perfil foi escolhido pela possibilidade de
uma narrativa atraente para o leitor, com linguagem mais simples e intimista.
De acordo com os objetivos específicos pré-determinados para a confecção desse produto
jornalístico, pretendo, a partir de entrevistas, apurar as histórias contadas pelas personagens sobre
as quais serão escritos os perfis; interpretar, organizar e dar angulações específicas aos fatos
narrados de modo que possam conduzir o leitor pela perspectiva da experiência da alteridade, e
abordar os abusos e preconceitos, bem como os grandes feitos dessas mulheres, para, assim,
entendermos como isso influencia o presente e a construção das identidades delas. Esse trabalho
também tem como objetivo contribuir para os estudos sobre alteridade no jornalismo, por meio da
experiência de pesquisa bibliográfica e de campo, entrevista e confecção de perfis. O público ao
qual esse produto se destina é qualquer indivíduo que tenha interesse por memória e narrativa.
7
2 GÊNERO E MEMÓRIA
Este capítulo trará em seu primeiro tópico uma discussão a respeito de questões
relacionadas à identidade e ao gênero. No segundo tópico, falarei sobre memória, identidade e
lugares de memória.
2.1 Identidade e gênero
Maria Inês Ghilardi-Lucena (2012) explica que os estudos de questões de gênero
oferecem contribuições muito importantes para o conhecimento do ser humano, dos espaços
sociais que habitamos e dos valores que regem as atitudes e os comportamentos das pessoas.
Portanto, compreender e problematizar as questões de gênero e de identidade, que perpassam o
ambiente em que vivem as personagens escolhidas para esse trabalho, é de grande importância.
Para a discussão sobre gênero que quero fazer aqui, é essencial falar a respeito da sexualidade da
mulher e dos papeis sociais ocupados por nós e pelos homens e as implicações disso nas relações
sociais. Este trabalho pretende refletir sobre discussões de identidade cultural que dizem respeito
à ideia de pertencimento e de reconhecimento de um sujeito em sociedade, considerando,
conforme proposto por Stuart Hall (2000), que a identidade na pós-modernidade apresenta um
caráter cambiante, descentralizado. As discussões de gênero abordadas aqui se referem à
construção discursiva do sujeito, tomando a identidade de gênero como uma construção social,
assim como explicam os estudos de Judith Butler (2003) em “Problemas de gênero: feminismo e
subversão da identidade”.
É recorrente na sociedade ocidental a interpretação do corpo da mulher e de sua
sexualidade como subordinados às vontades dos homens, motivado pela ideia de supremacia
masculina, que estrutura a sociedade patriarcal e falocêntrica. A mulher, ao longo da história, traz
consigo uma herança de silenciamento, que tanto manteve e mantém, de formas sutis, mas muitas
vezes escancarado, certo poder do homem sobre nossos corpos, sobre nossas subjetividades e
sobre nossos direitos sociais. Referindo-se ao contexto europeu, Alves e Pitanguy (1991)
descrevem que as mulheres eram tratadas com desvalorização na Grécia antiga por parte dos
8
homens livres. Seu tratamento era semelhante ao dos escravos: seus corpos serviam como meros
meios reprodutivos e de subsistência do homem, no que diz respeito a trabalhos de tecelagem, de
plantio e de extração de minerais. As mulheres não tinham direito a educação formal. De acordo
com as duas autoras, existia uma crença de que os “deuses” haviam criado as mulheres para as
ocupações domésticas. Assim, as relações de poder entre homens e mulheres não eram baseadas
na ideia de complementaridade, mas sim de “submissão, coerção e resistência” (p. 15).
Na Idade Média, algumas mulheres tiveram a oportunidade de trabalhar em serviços fora
do ambiente doméstico, como aprendizes dos maridos, que atuavam como “mestres”. Assim, elas
puderam receber instruções profissionais e também chegavam a atuar como “mestres” por um
ano, em casos de falecimento dos companheiros e se não mantivessem relações sexuais com
outros homens, conforme explicam Alves e Pitanguy (1991). Contudo, as autoras chamam a
atenção para o fato de que sempre as mulheres tiveram o salário inferior, em relação ao dos
homens, o que contribuiu para a hostilização do trabalho feminino. A inserção da mulher no
mercado de trabalho também não significou reconhecimento social.
Na Idade Média e até a era renascentista, ocorreu a “caça às bruxas”, fenômeno social que
pode ser considerado um símbolo de silenciamento feminino. O assassinato das mulheres
consideradas bruxas era baseado na concepção preconceituosa do discurso religioso de uma
sociedade fortemente influenciada pela Inquisição. Assim, a imagem feminina aparece por vezes
associada à negatividade e ao pecado. Segundo Alves e Pintanguy (1991, p. 21), a perseguição às
mulheres tinha uma forte tendência a ocorrer pelo receio do homem da tomada do espaço de
atuação:
Existe, nessa perseguição às “feiticeiras”, um elemento claro de luta pela manutenção de uma posição de poder por parte do homem: a mulher tida como bruxa, supostamente possuiria conhecimentos que lhe conferiam espaços de atuação que escapavam ao domínio masculino.
No período colonial do Brasil, mulheres brancas e de famílias tradicionais foram
condicionadas aos desejos do pai e do marido. Elas viviam sufocadas pelos cuidados familiares.
Esperava-se que a sexualidade da mulher fosse despertada apenas em condições de “bom
comportamento”. Segundo Araújo (2006) em “A arte da sedução: sexualidade feminina na
9
colônia2”, a igreja católica exerceu grande pressão no “adestramento” da sexualidade da mulher.
O mito bíblico de Eva era sempre lembrado às mulheres da colônia como forma de mantê-las
cientes do papel negativo que essa personagem representou perante Deus. Além disso, as meninas
não tinham acesso ao mesmo tipo de educação formal que os meninos. De acordo com o autor, a
educação da mulher no período colonial se baseava em conteúdos que seriam úteis para o lar,
como: “ler, escrever, contar, coser e bordar” (p. 51). Portanto, a mulher recebia o tipo de
educação que lhe encaminharia obviamente para o casamento. O matrimônio era, na maioria das
vezes, decidido pelo pai e acontecia, frequentemente, de modo precoce. Logo, as meninas
aprendiam desde cedo que deviam “domar” seus sentimentos e obedecer à vontade da família.
Percebe-se que o casamento podia significar se ver livre da rigidez do pai e passar a viver sob a
do marido. A mulher era forçada a um destino que ela não tinha o direito de discordar: casava-se,
apaixonada ou não, tinha filhos e servia o lar com devoção, em nome do bom nome e da
aprovação da família, pensamento que ainda reverbera.
Finalmente, com prazer ou sem prazer, com paixão ou sem paixão, a menina tornava-se mãe, e mãe honrada, criada na casa dos pais, casada na igreja. Na visão da sociedade misógina, a maternidade teria de ser o ápice da vida da mulher. Doravante, ela se afastava de Eva e aproximava-se de Maria, a mulher que pariu virgem o salvador do mundo. (ARAÚJO, 2006, p. 52)
Muitas moças, nos primórdios do Brasil colonial, eram enviadas pela família a conventos
contra as suas vontades. Araújo explica que isso acontecia muitas vezes para impedir que a filha
herdasse o que seria dado ao único filho ou para que ela simbolizasse publicamente a
religiosidade da família.
A mulher negra, de origem africana, que viveu no Brasil durante o período da escravidão,
foi submetida à opressão de ser arrancada de suas origens e trazida para terras desconhecidas,
onde teve sua identidade anulada. Ela também sofreu violência sobre seus direitos e sobre seu
corpo, contudo encontrou, em muitos momentos, formas de resistir aos tratamentos impostos a
ela. De acordo com Silva (2010), entende-se que a sexualidade da mulher negra, em situação de
2 Capítulo presente no livro “História das Mulheres no Brasil”, organizado por Mary Del Priore e publicado pela Editora Contexto, 2006.
10
escravidão, não seguiu o mesmo modelo da mulher branca, pois não estava relacionada à ideia de
reprodução. As mulheres negras serviram, muitas vezes, de escravas sexuais de seus patrões, seus
corpos pertenciam a eles. Segundo a autora, as mulheres negras eram negligenciadas também
quando ficavam grávidas: não recebiam um tratamento adequado e eram forçadas a trabalhar
como de costume.
Inseridos nesse contexto estão as mulheres negras escravas, que sem dúvida estavam colocadas em um nível social inferior, tanto por ser mulher, como por ser negra e, também escrava. Ser mulher, e ser escrava dentro de uma sociedade extremamente preconceituosa, opressora e sexista, é reunir todos os elementos favoráveis a exploração, tanto econômica quanto sexual, e também ser o alvo de humilhações da sociedade nos seus diferentes seguimentos. (GIACOMINI, 1988, p. 26 apud SILVA, 2010, p. 3)
Uma das formas de resistência dessas mulheres era a fuga. De acordo com Silva: “A fuga
era uma forma de realizar o sonho de liberdade, era o desejo de livrar-se dos maus tratos do
senhor e do trabalho compulsório.” (2010, p. 4). Dessa maneira, essas mulheres, em muitos
momentos, se juntaram a grupos de fuga e passaram a viver na clandestinidade, com medo de
serem descobertas e de terem que voltar para a realidade da escravidão. Contribuíram para a luta
e para a manutenção dos grupos que viviam a fugir do domínio dos senhores poderosos.
O trabalho das mulheres escravas e também mulheres negras livres é considerado muito
importante para as relações comerciais que existiram no Brasil no século XIX, redefinindo o
papel social dessas mulheres nesse período. Conforme explica Soares (1996), a prática do
“ganho” era realizado por elas como forma de resistência dentro do sistema escravista. As
“ganhadeiras” comercializavam alimentos nas ruas, obrigadas pelos patrões ou por conta própria:
“Encontramos tanto mulheres escravas colocadas no ganho por seus proprietários, como
mulheres negras livres e libertas que lutavam para garantir o seu sustento e de seus filhos.” (p.
56).
Embora as mulheres negras não tenham desistido de lutar pela liberdade e para serem
reconhecidas socialmente, o tratamento de inferioridade, de abusos e de negligências dado a elas
no período da escravidão ainda ecoa nos dias de hoje. Graças a essa herança, elas ainda sofrem
preconceitos em relação ao reconhecimento de suas culturas, encontram dificuldades quanto ao
11
acesso ao ensino superior e ainda precisam lutar contra a representação estereotipada de seus
corpos na sociedade e contra a imagem servil vendida pela mídia.
Ao longo dos anos, a mulher passou por uma série de transformações e por conquistas na
tentativa de se libertar do julgamento masculino. Percebe-se que, historicamente, ela não teve um
papel social definido para além da ideia da reprodução e da servidão. Para a autora Judith Butler
(2003), o sujeito está em constante construção, o que permite refletir sobre as desigualdades de
gênero e sobre as relações de poder existentes nesse meio. Em “Problemas de gênero”, a autora
discute a diferença entre sexo e gênero, concebendo este como performatividade, ou como uma
construção social discursiva do sujeito. Concebida originalmente para questionar a formulação de que a biologia é o destino, a distinção entre sexo e gênero atende à tese de que, por mais que o sexo pareça intratável em termos biológicos, o gênero é culturalmente construído: conseqüentemente (sic), não é nem o resultado causal do sexo, nem tampouco tão aparentemente fixo quanto o sexo. Assim, a unidade do sujeito já é potencialmente contestada pela distinção que abre espaço ao gênero como interpretação múltipla do sexo. (BUTLER, 2003, p. 24)
O pensamento de Butler contesta o determinismo biológico que leva os indivíduos ao
destino da reprodução. Assim, o pensamento da autora considera o indivíduo e sua identidade
como em aberto e passível de mudanças em suas configurações. Seguindo esse reciocínio, a
identidade da mulher se transformou ao longo de processos sociais, que a levaram de um
contexto de submissão extrema a uma era de possibilidade de maior autonomia de seu corpo, de
direitos civis conquistados e de luta por qualificação profissional.
A luta das mulheres no Brasil, ao longo dos anos, possibilitou conquistas importantes
como o direito ao voto, em 1932, a criação e a comercialização da pílula anticoncepcional, que
impulsionou a liberdade sexual feminina na década de 1960, e a posse em cargos políticos, como
a da primeira deputada federal eleita no país, Carlota Pereira Queiróz, em 1934 3 . Esses
acontecimentos mudaram as rotinas pessoais e profissionais e redefiniram o papel social da
mulher. No entanto, ao observar a nossa vivência em sociedade, é inevitável questionar a
plenitude de nossas conquistas.
3 Disponível em:<http://www.brasil.gov.br/cidadania-e-justica/2017/03/conheca-as-principais-lutas-e-conquistas-das-mulheres>. Acesso em: 13 ago. 2017.
12
Stuart Hall (2000) apontou para um tipo de mudança estrutural que começou a
transformar as sociedades no final do século XX, ao categorizar o sujeito pós-moderno como um
indivíduo descentralizado. Assim, entende-se que a mudança estrutural descrita pelo autor
significa transformações que colocam em xeque a estabilidade de questões até então encaradas
como inerentes ao ser humano como o gênero, a cultura, raça, nacionalidade e sexualidade. Isso
significa que vivemos múltiplas identidades; uma única identidade não nos define. Considerando
a experiência da mulher na sociedade, podemos compreender que, embora tenhamos conseguido
abrir espaço para entrar na luta por nossos direitos como cidadãs e pela autonomia de nosso
corpo, termos conquistado o direito ao voto, o direito de frequentar o ensino superior e de
trabalhar fora de casa, sem precisar da autorização do marido, ainda lidamos com menores
salários, menor representatividade nas atividades públicas, com a misoginia, a banalização de
nossos corpos e com uma injusta divisão de tarefas domésticas, que compromete ou conturba
nosso crescimento profissional e nosso bem-estar pessoal. Conforme explica Carrasco (2006), a
atividade de cuidados do lar e da vida humana não recebe a mesma valorização que o trabalho
sistematizado pelo capitalismo, embora seja também um encargo árduo e repetitivo. Na maioria
das vezes, essa responsabilidade recai sobre a mulher e ela não obtém o reconhecimento de seu
trabalho de manutenção da família, de afeto e de outros cuidados. À falta de reconhecimento
desse papel da mulher a autora chama de “mão invisível do cotidiano”.
Os diferentes espaços, trabalhos e atividades que fazem parte dos processos de vida e reprodução não desfrutam do mesmo reconhecimento social, mas existe entre eles um componente hierárquico de valores, resultado de uma longa tradição patriarcal liberal. (CARRASCO, 2003, p. 16)
Embora esse trabalho não renda os lucros que o capitalismo visa, é, segundo a autora,
responsável pelo regulamento da vida cotidiana e por permitir que o mundo continue
funcionando. Portanto, ao compreender sobre o pouco reconhecimento do trabalho feito por uma
mulher no lar e sobre a condição de ser tradicionalmente ela a principal responsável por essa
tarefa, é pertinente pensar que nós mulheres encontramos dificuldades para nos percebermos e
nos assumirmos como sujeitos fragmentados diante de tantas expectativas que recaem sobre nós.
A mulher ocidental é representada ora como um ser frágil, ora de maneira sexualizada na
mídia, ora como uma super-heroína, capaz de dar conta simultaneamente de múltiplas tarefas. Em
13
determinados contextos, somos questionadas a respeito de nossa liberdade sexual. Nossa imagem
é vendida pela mídia de maneira estereotipada em capas de revistas, que objetificam nosso corpo
e propagam um padrão de vida perfeito, enquanto no mundo real temos que nos desdobrar para
trabalhar, ter filhos, cuidar da família e de nós mesmas. O preconceito se reflete
consequentemente na construção e na percepção de nossa identidade. A identidade de gênero
feminino é também associada à ideia do ser dominado e marginalizado desde os tempos mais
antigos. Isso torna complexa também a aceitação dos novos sujeitos que fogem a regra do sistema
binário tradicional de categorização dos indivíduos como mulher/homem. A hierarquia de gênero
presente nas relações sociais é evidente em um país como o Brasil, que tem uma legislação que
reconhece a necessidade de tipificar as violências cometidas contra as mulheres, como o
feminicídio, e de criar leis protetivas como a Lei Maria da Penha.
A partir do que foi exposto nesta discussão, é pertinente concluir que as identidades dos
indivíduos pós-modernos não se caracterizam de maneira óbvia, considerando a ideia de fluidez
desses sujeitos e das inúmeras possibilidades do ser. A identidade de gênero ou a noção de
pertencimento do sujeito corresponde à construção e à desconstrução de si, por meio dos atos
discursivos e também do olhar do outro. No que se refere aos papeis sociais de homens e
mulheres, é importante compreender que por eles perpassam relações de poder que são inerentes
à questão do gênero. Ao longo da história, as mulheres ocuparam um espaço destinado à
reprodução e à submissão aos desejos de sua família e de seus companheiros. Com o passar do
tempo e por meio de muita luta, conseguimos vencer muitos obstáculos e adquirir direitos antes
concedidos somente aos homens. Embora tenhamos reconfigurado nossas possibilidades de
identidade, ainda vivemos sob a opressão masculina e sob a responsabilidade de ter que “dar
conta” de todas as tarefas atribuídas a nós, o que cria dificuldades para nossa satisfação pessoal.
O homem ainda consegue influenciar na construção discursiva da identidade do nosso gênero e
em nossos papeis sociais. De acordo com Chimamanda Ngozi Adichie (2015), em seu manifesto
“Sejamos Todos Feministas”, existe o incômodo da expectativa de gênero na maneira como são
construídos os discursos na sociedade: “O problema da questão de gênero é que ela prescreve
como devemos ser em vez de reconhecer como somos. Seríamos bem mais felizes, mais livres
para sermos quem realmente somos se não tivéssemos o peso da expectativa do gênero” (p. 36).
Discutir e problematizar essas questões tem grande relevância para a igualdade de oportunidade
14
entre os gêneros, e é, portanto, de grande pertinência para a composição desse produto de
conclusão de curso.
2.2 Memória e lugar
A cidade de Paineiras é um elemento essencial para a construção das narrativas dos perfis
propostos para esse trabalho de conclusão de curso, porque todas as personagens tratadas aqui
têm como cenário esse lugar, no qual elas desempenham determinados papeis sociais. Portanto,
existe necessidade de discutir a relação entre a memória dos indivíduos e o local onde vivem, no
que tange o processo de construção de suas identidades.
Candau (2006), em “Antropologia da Memória”, afirma que “a memória é essencial ao
indivíduo em todos os momentos de sua vida, tem papel de importância maior na sua vida
social.” (p.5, tradução minha). Ele explica que o pensamento e a memória se organizam em torno
da existência do outro ou de um grupo. Segundo esse autor, “a memória, ao mesmo tempo em
que nos modela, é também por nós modelada”, (CANDAU, 2012, p.16). Assim podemos
compreender que a memória é uma instância que serve para dar sentidos aos fatos da história
humana, influenciando o sujeito e sendo influenciada por ele. Portanto, essa ideia compreende a
noção de Candau de que a memória e a identidade estão relacionadas a tal ponto que não é
possível considerar o processo de construção da segunda sem a primeira, porque apenas a
memória permite a consciência de si mesmo no tempo. Não é possível que exista memória sem
identidade, segundo ele: “não pode haver memórias sem identidade, porque o estabelecimento de
relações entre estados sucessivos do sujeito é impossível se não houver uma percepção a priori
de que essa cadeia de sequências temporais pode ter significado para ele. Com as reservas
habituais quando passa do indivíduo para o coletivo, podemos levantar o mesmo raciocínio para
um grupo ou para toda uma sociedade.” (p. 2006, p. 116, tradução minha). Portanto, entende-se
que a construção da identidade de um indivíduo ou de um grupo depende fundamentalmente da
faculdade da memória.
15
Pierre Nora (1993) explica que, no contexto contemporâneo da mundialização e da
mediatização, existe uma curiosidade pelos lugares onde a memória se cristaliza e se refugia, e
que isso está relacionado ao momento específico da nossa história. Segundo ele, este é o:
Momento de articulação onde a consciência da ruptura com o passado se confunde com o sentimento de uma memória esfacelada, mas onde o esfacelamento desperta ainda memória suficiente para que se possa colocar o problema de sua encarnação. O sentimento de continuidade torna-se residual aos locais. (NORA, 1993, p. 7)
O autor, portanto, afirma que não existe mais memória: “Há locais de memória porque
não há mais meios de memória.” (idem). Compreende-se que o autor atribui à história o papel de
localizar os indivíduos no que restou da memória, as lembranças. Nora afirma também que
“Desde que haja rastro, distância, mediação, não estamos mais dentro da verdadeira memória,
mas dentro da história.” (p.9). Para clarear mais sua explicação, Nora estabelece distinções entre
memória e história:
Memória, história: longe de serem sinônimos, tomamos consciência que tudo opõe uma à outra. A memória é a vida, sempre carregada por grupos vivos e, nesse sentido, ela está em permanente evolução, aberta à dialética da lembrança e do esquecimento, inconsciente de suas deformações sucessivas, vulnerável a todos os usos e manipulações, susceptível de longas latências e de repentinas revitalizações. A história é a reconstrução sempre problemática e incompleta do que não existe mais. A memória é um fenômeno sempre atual, um elo vivido no eterno presente; a história, uma representação do passado. (NORA, 1993, p. 9)
Logo, compreende-se que a memória é a experiência viva, é uma instância do presente. Já
a história é a tentativa de reconstruir a experiência que não existe mais, o que pode acontecer de
forma problemática e incompleta.
Nora apresenta o conceito de “lugares de memória”, que faz parte de uma categoria que
surgiu a partir da necessidade do indivíduo contemporâneo de se identificar com algo. Ela
representa espaços materiais, simbólicos e funcionais, que existem como locais de abrigo e de
manutenção de uma memória coletiva a partir de uma necessidade vinda do indivíduo de
identidade fragmentada. Os lugares de memória são, antes de tudo, restos. A forma extrema onde subsiste uma consciência comemorativa numa história que a chama, por que ela a ignora. É a desritualização do nosso mundo que faz parecer a noção. O que secreta, veste, estabelece, constrói, decreta, mantém pelo artifício e pela vontade uma coletividade
16
fundamentalmente envolvida em sua transformação e sua renovação. Valorizando mais do novo do que do antigo, mais o jovem do que o velho, mais o futuro do que o passado. [...] Os lugares de memória nascem e vivem do sentimento que não há memória espontânea, que é preciso criar arquivos, que é preciso manter aniversários, organizar celebrações, pronunciar elogios fúnebres, notariar atas, porque essas operações não são naturais. (NORA, 1993, p. 12-13)
Para compreender uma literatura produzida sobre o cotidiano de personagens de uma
determinada cidade, é preciso levar em consideração que a cidade é um espaço no qual habitam
as narrativas da experiência humana e é onde também se constituem, portanto, as identidades dos
indivíduos. De acordo com Lima (2012. p. 2), “A cidade é o lugar onde se inscreve a história do
urbano e preserva a memória do seu repertório coletivo.”.
Na contemporaneidade, com a dissolução da ideia de identidades estáveis e com a
fragilização das cidades em um contexto de globalização, “os lugares de memória constituem
fator de estabilidade capazes de referendar o que é familiar, conferindo um sentido de
pertencimento e completude.” (LIMA, 2012, p. 2). Portanto, em conformidade com a
conceituação de lugar de memória proposta por Nora (1993), é possível considerar a cidade com
um desses lugares de memória, bem como outros elementos presentes nela, que arquivam
experiências, características e costumes.
Conforme dizem Tardivo e Pratschke (2016), “A cidade abriga diferentes características e
manifestações culturais, que possibilitam várias leituras, cuja fixação na memória se transforma
no decorrer do tempo concomitante as mudanças produzidas no espaço e na sociedade.” (p. 04).
Logo, por meio desse pensamento, também é possível compreender as cidades como locais de
memória, nos quais estão as heranças culturais de um povo. Assim,
As cidades, sua arquitetura e lugares constituem paisagens simbólicas que evocam narrativas mnemônicas, portando, o modo com que cada pessoa interpreta suas experiências no lugar é o que produz significado ao espaço físico. Com o passar do tempo, um conjunto de significados e experiência dão origem a memória coletiva e passam a fazer parte da herança cultural do lugar. (TARDIVO E PRATSCHKE, 2016, p. 09)
Pesavento (2007) trata da temática das cidades do ponto de vista da sensibilidade e do
imaginário para falar a respeito da criação de sentido e da constituição da memória desse espaço.
17
Pois o imaginário é esse motor de ação do homem ao longo de sua existência, é esse agente de atribuição de significados à realidade, é o elemento responsável pelas criações humanas, resultem elas em obras exeqüíveis e concretas ou se atenham à esfera do pensamento ou às utopias que não realizaram, mas que um dia foram concebidas. (p. 11 – 12)
Essa autora vem dizer que a cidade é materialidade, no sentido de ser algo criado pelo
homem, é uma ação humana. Contudo, a cidade é também sociabilidade: “ela comporta atores,
relações sociais, personagens, grupos, classes, práticas de interação e de oposição, ritos e festas,
comportamentos e hábitos.” (p. 14). A cidade está associada ao humano, porque é um lugar
habitado pelo homem, construído por ele, que serve de moradia para muitos e se caracteriza como
uma obra feita pelo coletivo. A autora também considera que a cidade é também sensibilidade,
pois, segundo ela, cidades são um fenômeno cultural, “integradas a esse princípio de atribuição
de significados ao mundo. Cidades pressupõem a construção de um ethos, o que implica a
atribuição de valores para aquilo que se convencionou chamar de urbano.” (p. 14). Por
conseguinte, a cidade é objeto de imagens e de discurso. “Assim, a cidade é um fenômeno que se
revela pela percepção de emoções e sentimentos dados pelo viver urbano e também pela
expressão de utopias, de esperanças, de desejos e medos, individuais e coletivos, que esse habitar
em proximidade propicia.”. (p. 14). É um espaço de sensibilidade. Ainda de acordo com
Pesavento (2007):
A cidade sensível é aquela responsável pela atribuição de sentidos e significados ao espaço e ao tempo que se realizam na e por causa da cidade. É por esse processo mental de abordagem que o espaço se transforma em lugar, ou seja, portador de um significado e de uma memória;” (p. 14-15)
A partir do que foi exposto nesse tópico, é importante considerar a cidade como o local de
existência das experiências e de preservação das narrativas que ali ocorrem, das práticas culturais
e das interações. É um local no qual se busca familiaridade e se inserem os processos de
identificação dos indivíduos. Os lugares de memória da cidade permitem a produção de
diferentes interpretações sobre os discursos e sobre as lembranças que ali se encontram. O
processo de constituição das identidades se remete, o tempo todo, às narrativas presentes nos
18
lugares de memória. Estes tornam possível compreender as histórias das pessoas que ali vivem,
por isso a importância de considerá-los na produção desse trabalho.
19
3 JORNALISMO BIOGRÁFICO
Este capítulo trará, em um primeiro tópico, discussões a respeito da relação entre
jornalismo e literatura, no que se refere ao fazer biográfico. Depois discutirei sobre as teorias que
dissertam sobre a confecção de perfis, bem como do processo de entrevista.
3.1 A produção biográfica
Escrever sobre a vida do outro atrai os interesses do público. François Dosse (2009) traz
na introdução da obra “O desafio biográfico: escrever uma vida” considerações sobre o aspecto
temático e da atuação do biógrafo em seus afazeres. Segundo Dosse, “Escrever a vida é um
horizonte inacessível, que, no entanto sempre estimula o desejo de narrar e compreender.” (p.
11). Entende-se que a narrativa de uma vida é um objeto de interesse de leitores, de modo geral,
pois, por meio dela é possível chegar a experiências universais, ou seja, ao reconhecimento no
outro daquilo que é comum aos seres humanos, como explica Sérgio Vilas Boas (2003, p. 12):
“Acredito que os leitores sempre encontrarão tempo para narrativas que identificam seus destinos
com o destino de outras pessoas, como quando dizem ‘puts, isso pode acontecer comigo’.”.
A prática biográfica lida com questões importantes para as relações entre os sujeitos,
como a empatia, afetividades, a memória e a identidade. Esse tipo de trabalho pode criar
narrativas corajosas e criativas a respeito das experiências do outro, o que no jornalismo diário,
muitas vezes, é inviabilizado por questões de caráter mercadológico e de tempo. A narrativa
biográfica percorre caminhos que vão do jornalismo à literatura, muitas vezes por limites
imperceptíveis entre os dois. É uma narrativa que foge da objetividade encontrada nas notícias
factuais, que seguem, geralmente, a técnica da pirâmide invertida. Segundo Edivaldo Pereira
Lima (2009), O livro-reportagem cumpre um relevante papel, preenchendo vazios deixados pelo jornal, pela revista, pelas emissoras de rádio, pelos noticiários da televisão, até mesmo pela internet quando utilizada jornalisticamente nos mesmos moldes das normas vigentes na prática impressa convencional. Mais do que isso, avança para o aprofundamento do conhecimento do nosso tempo, eliminando, parcialmente que seja, o aspecto efêmero da mensagem da atualidade praticada pelos canais cotidianos da informação jornalística. (p. 4)
20
O texto jornalístico que conta a vida de alguém, de modo não fictício, se conecta ao
literário pelo caráter estilístico. Angélica Weise (2013), em sua coluna da edição 730 do
Observatório de Imprensa, explica a relação produzida pela conexão entre jornalismo e literatura:
O jornalismo é fato da realidade. A literatura, da realidade somada à ficção. O jornalismo literário, logo, é uma miscelânea de ambos. Cumpre a missão de informar, preservando a essência jornalística, porém com ganho em vocabulário, estrutura narrativa e aprofundamento de conteúdo. Esse trinômio alicerça e ornamenta o texto que é levado ao leitor. E o jornalismo, enquanto retrato fiel da realidade inspira a literatura, esta, em escala menor, também acresce ao mesmo. (WEISE, 2013)
Esse jornalismo que se conecta à literatura se tornou conhecido pelo nome de New
Journalism, nos anos de 1960, e se popularizou por meio de livros-reportagem, perfis e
reportagens, que se tornaram clássicos na área como “A sangue frio”, de Truman Capote, de
1965, e “O segredo de Joe Gould”, publicado em 1964. De acordo com Ritter (2013), o New
Journalism surgiu nos Estados Unidos em um contexto em que os jornalistas passavam por um
período de grande imersão no cotidiano das pessoas comuns, em busca de denúncias sociais.
Profissionais como Gay Talese usavam diversos tipos de técnicas para produzir seus textos,
incluindo recursos narrativos e descritivos típicos da literatura. Segundo Ritter, o New Journalism
se desenvolveu em um contexto em que o cenário cultural e político era favorável a uma nova
escrita. “Esse foi um período em que o jornalismo e a literatura tiveram um caso de amor livre”
(RITTER, 2013, p. 59). Embora essa popularização do jornalismo literário tenha acontecido na
década de 1960, Mônica Martinez (2009) afirma que as origens dessa vertente remontam a
escritores europeus do século XVII, como Daniel Defoe, autor de obras como Robson Crusoé, de
1719, e de o Diário da Peste, de 1722, obra que retrata detalhadamente a epidemia da peste
bubônica na Europa. No Brasil, a autora aponta como importantes escritores de narrativas que
mesclam o literário e o jornalístico: Euclides da Cunha, com a obra Os Sertões (1902), e João do
Rio, com A Alma Encantadora das Ruas (1908?).
Quanto à produção biográfica brasileira feita por jornalistas, historiadores e outros
profissionais, as décadas de 1930 e 1960 foram marcadas por uma grande popularidade dessas
narrativas, segundo Vieira (2015). A autora cita Andrade (2013) para explicar que as obras feitas
21
nesse período foram responsáveis pela renovação do gênero. A “epidemia biográfica4” aconteceu
por conta dos hábitos e gostos da época: “Uma face de nossa moderna sedução pela verdade, pela
busca ‘da realidade’ e de informações esclarecedoras, mas sem os excessos da irrealidade.
Valoriza a onda alta da biografia como um fenômeno universal’ [...]” (ANDRADE, 2013, p. 97
apud VIEIRA, 2015, p. 77). Nessa época, autores brasileiros escreveram produções biográficas,
sob influência de autores estrangeiros. Essas produções tinham forte caráter literário, como a obra
de Lúcia Miguel Pereira, de 1936, chamada “Machado de Assis – estudo crítico e biográfico”.
Em relação à década de 1980 até o ano de 2015, Vieira observa que houve um número maior de
jornalistas que optaram por trabalhar com gêneros biográficos, longe das rotinas de produção das
redações. Segundo ela, esses profissionais:
Levaram para outro suporte, o livro, a sua experiência de reportagem, promovendo a um novo status de autoria uma nova geração de jornalistas, que depois de constituírem uma carreira no jornalismo diário, encontram na produção de biografia – e das reportagens históricas, outro nicho – um lugar de fala e de expressão jornalística. (p. 80)
A autora explica que houve uma transferência das práticas do jornalismo, bem como dos
valores dessa área de atuação para o biografismo. Segundo ela, nesse processo, o ethos do
profissional do jornalismo não desaparece. A identidade do jornalista é discutida pela autora em
relação à censura de biografias, recorrentes nesse período de 1980 a 2015, no Brasil. Ela também
explica que o ethos jornalístico se manifesta em defesa de seu ofício, isto é, os valores como a
objetividade, a credibilidade e a verdade compõe a consciência de identidade desse grupo de
profissionais: “Esses valores formam um regimento da profissão e do campo” (VIEIRA, 2013, p.
83). Logo, no Brasil há muitos exemplos de jornalistas, como Fernando Morais, José Castelo,
Eliane Brum, Daniela Arbex e Fabiana Moraes, que se aventuraram pela escrita das narrativas de
vida, mesclando recursos jornalísticos com a estética literária, contando os acontecimentos de
pessoas, de forma humanizada, com inúmeros detalhes, causando no leitor a impressão de uma
imersão nas possibilidades criativas e estilísticas da literatura.
4 Expressão atribuída ao crítico Tristão de Athayde, conforme explica Vieira (2015, p. 77).
22
3.2 Perfil
Sergio Vilas Boas (2002) apresenta uma definição descritiva de perfil jornalístico,
conforme se dá o processo de produção:
O perfil jornalístico é um texto biográfico curto (também chamado short-term biography) publicado em veículo impresso ou eletrônico, que narra episódios e circunstâncias marcantes da vida de um indivíduo, famoso ou não. Tais episódios e circunstâncias combinam-se, na medida do possível, com entrevistas de opinião, descrições (de espaço físico, épocas, feições, comportamentos, intimidades etc.) e caracterizações a partir do que o personagem revela (às vezes sem dizer). (p. 93)
Maia (2013) compreende o perfil como uma produção que constrói uma narrativa escrita
da vida do sujeito perpassada pelas variáveis de tempo e espaço. De acordo com ela, “O perfil
pode ser compreendido como a possibilidade de composição do sujeito pela escrita de sua
trajetória no espaço e no tempo” (p.177). Segundo essa autora, a angulação da narrativa é uma
responsabilidade do jornalista que escreve o perfil. Maia define o perfil como uma composição
textual do sujeito feita por meio de angulações que devem ser capazes de traduzir as perspectivas
escolhidas pelo jornalista durante a entrevista e durante a edição do texto. Ela expõe duas
possíveis definições principais de angulação: a angulação ampliada e a angulação difusa. A
angulação ampliada é feita, de acordo com Maia, através de uma perspectiva linear apoiada em
uma lógica assertiva, constituindo assim uma narrativa convencional. Já a angulação difusa
ocorre quando a história de vida do sujeito é construída sob uma superfície irregular, que faz com
que o leitor seja o responsável por compor a trajetória dos fatos expostos. Esse tipo de angulação
permite a produção de narrativas não convencionais. A autora considera que a constituição do
sujeito por meio do perfil pode ser mais delineada a partir do segundo tipo de angulação, ou seja,
a angulação difusa, visto que a composição da trajetória do sujeito requer a articulação de muitas
partes, devido a sua complexidade.
Para Paniago (2008, p. 25), o perfil jornalístico é: “um texto que se detém naquilo que
deveria ser a essência do relato jornalístico – o ser humano em sua trajetória através da vida”. O
autor, nesta definição, coloca o ser humano como o centro do que o jornalismo deve tratar. Ele
também determina que esse tipo de texto precisa focar na visão de mundo que a pessoa perfilada
23
tem, ao invés de focar nos eventos nos quais ela se envolve. Segundo o autor, o perfil se
desenvolveu como gênero jornalístico com o objetivo de trazer em narrativa a vida do ser
humano comum.
Uma das características interessantes do perfil, apontadas por Paniago, é que: “O ser
humano não pode ser tratado de modo distanciado, mas na complexidade devida: tem passado,
família, relações de amizade, de trabalho, etc” (p. 27). A criação de um perfil, diferentemente da
escrita de uma biografia, tem por objetivo retratar a narrativa de vida de uma pessoa de modo
mais breve, focando em algum aspecto socialmente relevante da vida daquele personagem. Para o
autor, para escrever esse tipo de narrativa não é necessário escolher uma personagem que tenha
reconhecimento público. Segundo ele: “O drama humano pode ser melhor representado naqueles
que não necessariamente ‘se deram bem’ na vida” (p. 27). O autor chama a atenção para o fato de
que é preciso encontrar um caráter incomum no indivíduo que é visto como pessoa comum. Isso
leva a entender que colocar pessoas comuns como foco de um trabalho jornalístico é assumir um
compromisso de ouvir, contar e refletir sobre a realidade de alguém que tem a necessidade de ter
um espaço na mídia, para que todos conheçam a sua condição. Consequentemente, esse
compromisso também é feito com aquele público que se beneficia dessa atividade, pois ela
contribui para a compreensão da complexidade da vida humana.
A escrita de um perfil pressupõe a utilização de uma linguagem que permita a
proximidade entre o leitor e o personagem retratado na narrativa, com o intuito de envolver o
leitor pelo sentimento de empatia. Escrever sobre a vida de alguém é muito mais do que apenas
transcrever os fatos contados em uma entrevista, é preciso trabalhar para produzir empatia. Vilas
Boas (2003, p. 14) afirma:
A empatia é a preocupação com a experiência do outro, a tendência a tentar sentir o que sentiria se estivesse nas mesmas situações e circunstâncias experimentadas pelo personagem. Significa compartilhar as alegrias e tristezas de seu semelhante, imaginar situações do ponto de vista do interlocutor. Acredito que a empatia também facilita o autoconhecimento (de quem escreve e de quem lê).
O relato público da vida de alguém pressupõe saber selecionar os fatos de modo a
construir um discurso de representação de um indivíduo, considerando, essencialmente, sua
identidade, suas crenças, tristezas e alegrias. Dessa forma, entende-se que é impossível tratar de
24
maneira coerente o sujeito biografado sem considerar sua construção social ou seu contexto de
vida. Embora o jornalista exerça o trabalho de recuperar a memória de forma seletiva, uma
narrativa de história de vida, feita sem levar em conta o sujeito em seu espaço próprio de vivência
e de transformação, é apenas um texto superficial, incapaz de chegar a ter importância efetiva
para a experiência do leitor. Contudo é também necessário pensar o personagem de um texto
biográfico considerando a fragmentação do sujeito, suas inúmeras possibilidades e a noção de
que é impossível tê-lo em totalidade. Logo, deve haver um engajamento essencial na relação do
jornalista com o texto, com o personagem narrado e com o público consumidor de seu trabalho.
A produção de um perfil requer que o escritor saiba transmitir uma interpretação do que
lhe é relatado e lidar com as subjetividades de seu entrevistado. Compreender o que aqueles
acontecimentos significaram para um indivíduo e como sua rotina foi influenciada faz parte do
trabalho de mediação que o jornalista precisa fazer. Essa é uma das características que diferem a
escrita de perfis do jornalismo objetivo. Logo, para atingir esse propósito é imprescindível que o
jornalista assuma um comportamento responsável com sua fonte, da produção da pauta, até a
escrita da narrativa sobre o que lhe foi relatado em entrevista.
3.3 Entrevista
Cremilda Medina (2008), em “Entrevista: o diálogo possível”, fala da prática da entrevista
no jornalismo tratando da diferença entre a entrevista como uma técnica eficaz para obter
respostas pré-pautadas e a entrevista como diálogo. A autora considera que o primeiro tipo de
entrevista apresenta frieza na relação entrevistado – entrevistador. A entrevista como um diálogo
é pensada como uma atividade que pressupõe dar espaço às vozes sufocadas. A autora defende
que o jornalista veja nessa segunda o modo ideal para se fazer um jornalismo que realmente se
preocupa com os personagens que compõe a narrativa. “Se quisermos aplacar a consciência
profissional do jornalista, discuta-se a técnica da entrevista; se quisermos trabalhar pela
comunicação humana, proponha-se ao diálogo” (MEDINA, 2008, p. 5). De acordo com a autora,
o público percebe quando uma entrevista é feita com emoção e autenticidade, tanto pelo repórter,
quanto pelo entrevistado. Assim, o fenômeno da identificação ocorre de modo claro “os três
envolvidos (fonte de informação – repórter – receptor) se interligam nunca única vivência” (p. 6).
25
Edgar Morin (1973) classificou quatro tipos de entrevista em “A entrevista nas Ciências
Sociais, na rádio e televisão”. Segundo o autor, os tipos são: “entrevista-rito”, a “entrevista
anedótica”, a “entrevista diálogo” e as “neoconfissões”. De acordo com Medina (2008), as duas
primeiras seguem um modelo mais superficial, enquanto que as últimas seguem um modelo
aprofundado de conversa. A autora explica que, a partir dessas categorizações propostas por
Morin, seria possível pensar que os tipos de entrevista citados por ele seguem duas tendências: a
espetacularização e a compreensão ou aprofundamento: “No fundo, o primeiro resultado é
sempre uma caricatura das possibilidades humanas do segundo” (MEDINA, 2008, p. 15). Ela
explica que, conforme o jornalismo e a comunicação coletiva desenvolvem estilos de abordagem
em entrevistas, revelam-se categorias de subgêneros jornalísticos. De um lado estão subgêneros
pautados na espetacularização: o perfil do pitoresco, perfil do inusitado, perfil da condenação e o
perfil da ironia “intelectualizada”. Do outro lado estão subgêneros pautados na tendência de
aprofundamento: entrevista conceitual, entrevista/enquete, entrevista investigativa, entrevista de
confrontação e os perfis humanizados.
A entrevista feita com o intuito de produzir um perfil de uma pessoa segue
predominantemente os moldes da definição de Nilson Lage (2011) de “entrevista de
profundidade”. A definição é baseada no objetivo da conversa. Nesse caso a entrevista acontece
com a finalidade de obter informações sobre a figura do entrevistado, “a representação do mundo
que ele constrói, uma atividade que desenvolve ou um viés de sua maneira de ser, geralmente
relacionada com outros aspectos de sua vida” (LAGE, 2011, p.75). Quanto às circunstâncias em
que a entrevista é feita, dentro das classificações propostas pelo autor, entende-se a necessidade
do ato ser de caráter dialogal, que é o tipo de entrevista chamado por ele de “a entrevista por
excelência”. É uma conversa marcada com antecedência e que reúne o repórter e o seu
entrevistado em um ambiente adequado para tal atividade. Nesse caso: “Entrevistador e
entrevistado constroem o tom de sua conversa, que evolui a partir de questões propostas pelo
primeiro, mas não se limitam a esses tópicos: permite-se o aprofundamento e detalhamento dos
pontos abordados” (LAGE, 2011, p. 77).
Essa definição proposta pelo autor corrobora com o que Medina aponta como essencial
para o trabalho de um repórter em processo de entrevista com sua fonte. A conversa em tom
dialogal demonstra cuidado da parte do jornalista ao estabelecer uma comunicação humanizada e,
26
portanto, um esforço para compreender o outro. É possível considerar que a maneira pela qual o
mediador conduzirá seu trabalho, com base nas informações obtidas por meio do entrevistado,
pressupõe o exercício de alteridade. O jornalista trabalha com demandas sociais e, a partir disso,
precisa dar espaço e poder aos sujeitos que necessitam ser ouvidos. Thaís Oyama (2013) descreve
o ouvir como um ato de grande importância durante uma entrevista. Segundo ela:
O bom entrevistador é aquele que, antes de tudo, sabe ouvir. E saber ouvir implica, antes de tudo, ser curioso. Quando um repórter tem genuína curiosidade sobre o entrevistado ou sobre o assunto do qual ele trata, isso fica evidente na maneira como ele se comporta, reage, fala – e isso estimula o entrevistado a expor-se cada vez mais. (OYAMA, 2013, p. 28)
O jornalismo biográfico tem, portanto, uma função mediadora relevante para a construção
de discursos sobre pessoas conhecidas ou anônimas. Esse jornalismo propõe uma restituição da
memória e uma discussão dos acontecimentos da vida do sujeito personagem, sendo, portanto,
um agente poderoso que interfere na produção do discurso que representa aquele ser perante o
mundo. Assim, o narrador tem a responsabilidade de lidar com diversos aspectos da subjetividade
de um indivíduo e levá-los para serem conhecidos e discutidos pelo público. Logo, constata-se
que todo o processo, desde o primeiro contato com a fonte, as entrevistas, até a produção da
matéria jornalística, pode e deve ser realizado com um viés humanizador, por meio de um
exercício de olhar o outro com sensibilidade, considerar suas particularidades sem julgamentos.
Os gêneros biográficos podem trabalhar com a história de maneira pitoresca ou empoderadora, ou
com outros vieses, dependendo das escolhas do jornalista. Contudo, é imprescindível ao
profissional ser guiado pela ética e pelo engajamento social.
27
4 PLANO DE TRABALHO E PAUTA ESTENDIDA
A produção de um livro de perfis requer procedimentos metodológicos específicos,
pautados no objetivo do trabalho e na temática escolhida, como a discussão de teorias que
circundam o tema designado, a escolha das personagens, entrevistas, a produção das narrativas e
a reflexão crítica do trabalho. Inicialmente foi feito um levantamento bibliográfico de autores que
dialogam com a discussão da mediação jornalística na construção de perfis sobre a pouca
visibilidade dada à mulher em um contexto patriarcal e como essa condição influencia na
concepção da identidade feminina. Desse modo, procurou-se discutir a respeito da condição da
mulher desde a Antiguidade até os dias de hoje, por meio de uma escrita expositiva histórica.
Para essa discussão foram invocados autores como Branca Moreira Alves e Jacqueline Pintanguy
(1991), da obra “O que é feminismo”, e Emanuel Araújo (2006), que escreveu sobre o assunto em
“A arte da sedução: sexualidade feminina na Colônia”, publicado no livro “História das Mulheres
no Brasil”. Para tratar das discussões de gênero e identidade em contexto pós-moderno, foram
feitas análises de pensamentos de Judith Butler (2003), Carrasco (2013) e de Stuart Hall (2000),
entre outros autores, que problematizam antigas definições do sujeito e de identidade, tendo em
vista os novos discursos sociais.
A questão da memória e do lugar foi abordada neste trabalho porque estou aqui tratando
de histórias de vida, o que se remete obviamente à memória das pessoas entrevistadas. A questão
do lugar está relaciona à importância de se considerar o local onde se preservam as narrativas de
vidas das personagens, os discursos e as práticas sociais que contribuem para a formação das
identidades das perfiladas. Para isso foram trabalhados conceitos de memória e identidade de
Candau (2006), e a questão da problemática dos lugares e o conceito de lugares de memória de
Pierre Nora (1993). Também procurei discutir sobre o imaginário e a sensibilidade das cidades
como lugares de produção de sentidos e significados no espaço e no tempo, de Pesavento (2007).
O jornalismo biográfico foi discutido neste trabalho, levantando questões importantes a
respeito da memória, da empatia, e novamente da identidade – pontos trabalhados nos perfis. O
capítulo sobre jornalismo biográfico trata dos processos de produção de narrativas de vida que
possibilitam o reconhecimento do público, a relação com as fontes e técnicas de entrevista. Para
essas discussões revisitamos debates propostos por Cremilda Medina (2008), Sérgio Vilas Boas
28
(2003), Paniago (2008), Marta Maia (2013), Oyama (2013) e Nilson Lage (2011), que falam
sobre a empatia no texto jornalístico e procedimentos de produção dos perfis e de entrevista a
serem realizados para um trabalho de cunho biográfico
Outra etapa do trabalho foi a escolha das personagens para os perfis. Essa escolha foi feita
levando em conta o objetivo de contar histórias com eixos temáticos variados. A cidade de
Paineiras aparece nesse trabalho como um elemento que conecta as histórias, por meio da
interação, da memória e dos discursos que perpassam o ambiente. A escolha também leva em
conta o fato de as personagens serem minhas conterrâneas e compartilharem comigo a realidade
local. Portanto, tive como objetivo encontrar mulheres com diferentes repertórios de vida, que
possuem em comum o ambiente em que vivem e vivenciam lutas diárias para sobreviverem ali.
4.1 Personagens
As seis personagens escolhidas para terem suas histórias contadas neste trabalho possuem
em comum viverem ou já terem vivido no município interiorano de Paineiras e terem suas
histórias de vida atravessadas por opressões e por lutas que modificaram seus hábitos cotidianos.
As narrativas abordam como cada uma delas resistiu e ainda resiste ao contexto machista, no que
diz respeito às discussões de gênero, ao reconhecimento de seus lugares de fala e à emancipação
feminina. Cada perfil segue um eixo temático de acordo com as condições e acontecimentos da
vida dessas seis mulheres.
A primeira personagem escolhida é a cabeleireira Jeane Silva, de 45 anos. Ela nasceu em
Paineiras, contudo viveu a experiência de se mudar 17 vezes, inclusive para outras cidades. Sua
infância foi marcada por condições financeiras precárias e pela violência do pai. Ela lidou
também com uma tentativa de violação de seu corpo por parte de um ex-patrão, quando residia
em Belo Horizonte. Ao voltar para Paineiras, conheceu o marido e se casou com ele, após
descobrir uma gravidez não planejada. Ela é mãe de dois filhos, é uma cabeleireira bem sucedida
e gera a maior parte da renda familiar com seu salão que fica no fundo de sua casa. Jeane acredita
que casamento está longe de ser um destino maravilhoso.
Paula de Souza, de 27 anos, é a segunda personagem. Ela sempre foi uma pessoa muito
comunicativa e estudiosa, mas teve seus caminhos transformados pelo contato precoce com
29
drogas, aos 12 anos. Quando tinha 17 anos, foi internada voluntariamente em uma clínica de
reabilitação para dependentes químicos. Foi discriminada ao voltar da clínica e ao tentar procurar
um emprego. Seu passado com drogas e seus relacionamentos afetivos não foram tolerados por
algumas pessoas que passaram por seu caminho. Paula teve que sair da cidade. Ela recomeçou
sua vida em Uberlândia, no triângulo mineiro. Lá começou a fazer faculdade de filosofia, mas
desistiu. Conheceu seu marido Diego, com quem vive hoje em uma casa alugada perto da
universidade, onde cursa Letras. Paula ainda quer ser escritora.
Maria dos Anjos, de 55 anos, é ex-vereadora de Paineiras. Ela é a terceira mulher
escolhida para o trabalho de produção de perfil. Maria veio do campo, de uma família humilde de
fazendeiros. Em 2004, foi a primeira mulher eleita vereadora da cidade, e foi também a mais
votada na ocasião. Atuou na Câmara Municipal em um mandato e foi, até então, a única
vereadora da cidade. Sofreu com a hostilidade de colegas de governo, mas não desistiu do seu
propósito de fazer a diferença para a população. Ela foi candidata a vice-prefeita nas últimas
eleições, entretanto não venceu. Não teve filhos, nem se casou, mas construiu seu legado
contribuindo com muita dedicação para a vida pública e para a criação dos irmãos mais novos e
dos sobrinhos.
Gil G. Per é uma professora trans que dá aulas de Química em uma escola pública de
Paineiras. Gil não nasceu em Paineiras, mas vive na cidade há quase dez anos. Vive o problema
de nem sempre receber o respeito que merece em seu ambiente de trabalho e em outros contextos
cotidianos. É julgada por suas roupas, por sua personalidade e tem seu gênero questionado por
muitas pessoas. Já sofreu uma tentativa de homicídio em 2013, na saída de uma festa. Nessa
ocasião, Gil foi esfaqueada e esteve em estado grave por dias no hospital. Contudo, conseguiu
voltar as suas atividades e continua trabalhando e convivendo com as pessoas de Paineiras.
Simone Alves tem 37 anos e trabalha como empregada doméstica há algum tempo. Ela é
a quinta filha de seis irmãos, contudo, não foi criada com todos eles. Viveu sem receber muita
atenção do pai, que não vivia com a família. Simone sempre foi alvo de conversas maldosas
relacionadas à sua sexualidade, por preferir viver sua vida com total liberdade, longe dos padrões
pré-determinados pela sociedade. Ela lidou também com relacionamentos abusivos, mas hoje se
sente bem, tem um filho de sete meses e vive com o marido em uma casa simples.
30
A sexta mulher escolhida para o trabalho de perfil é minha avó materna, Dona Arlinda, de
78. Ela foi criada com seus oito irmãos na roça, trabalhando tanto com serviços domésticos,
quanto em plantações de arroz. Estudou até a segunda série do ensino fundamental. Aos dez anos,
levou um tiro no peito, graças a uma estupidez de um de seus tios, que brincava com uma
garrucha. Sobreviveu apesar de não ter recebido cuidados médicos, apenas orações de familiares.
Teve como destino o casamento. Uniu-se por vontade própria ao marido Francisco e teve com ele
cinco filhos. Trabalhou a vida toda em serviços pesados para ter dinheiro para pagar os estudos
dos filhos, pois o marido não fazia questão que as filhas recebessem educação formal. Viu a
cidade de Paineiras ser fundada e viveu a época da falta de acesso a bens e serviços nesse lugar.
Hoje, Arlinda é aposentada e vive na companhia de uma das filhas e de outros parentes que a
visitam com frequência. Recentemente, perdeu um filho e uma neta e viu suas perspectivas serem
transformadas pela melancolia.
4.2 Entrevistas
Durante a realização da primeira etapa do trabalho foram feitas entrevistas com as
personagens Jeane Silva, Maria dos Anjos, Gil e Dona Arlinda. Com Jeane foram feitas três
entrevistas, que aconteceram em seu salão de beleza, durante sua rotina diária de trabalho. Já com
Maria dos Anjos, Gil e Dona Arlinda foram feitas apenas uma entrevista. A média de duração de
cada uma delas foi de aproximadamente 2h30min. Os encontros com essas três personagens
aconteceram em suas residências. Essa parte do plano de trabalho foi realizada durante a
disciplina de Projetos Experimentais I, porque seria difícil concluí-la em apenas um semestre,
considerando que hoje moro muito longe da cidade em que residem essas personagens.
A entrevista com Jeane aconteceu no salão de beleza nos fundos da casa dela. Entre um
trabalho e outro que ela realizava, pudemos conversar descontraidamente. Além disso, Jeane
compartilhou comigo um antigo trabalho que fez na escola sobre a sua história de vida. Esse
material contribuiu para meu trabalho, porque complementou a nossa conversa e também trouxe
uma dimensão de imagens de momentos do passado dela, pois continha muitas fotografias.
31
O contato com Maria dos Anjos foi um dos mais interessantes, porque para chegar à casa
dela na fazenda, tive que percorrer um longo caminho, com muitos obstáculos e poeira. Conheci
uma parte do meu município que eu não imaginava. Nossa conversa foi voltada para política e
trouxe reflexões pessoais importantes para o meu trabalho, porque pude entender melhor sobre os
processos eleitorais que ocorrem na minha cidade e sobre a visão que essa personagem tem a
respeito deles.
A outra personagem entrevistada foi minha avó materna, Dona Arlinda. Nossa conversa
foi muito descontraída. Embora tenhamos um laço de proximidade grande, a entrevista que fiz
com ela foi algo novo para mim, porque tive que entrevistar uma pessoa que eu conheço a vida
toda utilizando algumas técnicas jornalísticas. A conversa com a minha avó me impressionou,
pois eu tinha expectativas de ouvir histórias de momentos muito conservadores de épocas mais
antigas de Paineiras, contudo ela revelou, por exemplo, que não se casou obrigada com meu avô,
diferentemente da maioria das mulheres da sua época. Ela também contou que meu avô era um
marido que fazia de tudo por ela. Escolher minha avó como fonte para esse trabalho foi relevante,
porque trouxe uma visão diferente da que preenchia meu imaginário sobre os costumes mais
antigos das pessoas da minha cidade.
Gil era a pessoa com a qual eu tive menos contato até a execução desse trabalho, no
entanto, ela se interessou pela ideia e foi muito solicita ao me receber em sua casa para a
conversa em agosto de 2017. Pude tomar conhecimento do espaço em que ela vive, da forma
como organiza a casa e dos objetos que guarda na intimidade do seu quarto. Ainda que pareça
uma pessoa de opinião tão forte e de respostas na ponta da língua, ela demonstrou muita
sensibilidade e coragem ao revelar momentos íntimos de sua vida, como a sua saída de casa para
viver longe dos pais com o objetivo de estudar. Esse perfil é diferente porque, embora todos os
outros envolvam problemas relacionados ao gênero, como a questão da divisão do trabalho e de
outras opressões que as mulheres são acometidas, este também trata do ponto marcante de sua
vida que foi a sua readequação de gênero e tudo que engloba esse fato, como o preconceito e as
dificuldades de inserção no mercado de trabalho.
Na segunda etapa desse trabalho de conclusão de curso, foram realizadas entrevistas com
as personagens Simone e Paula, e uma segunda entrevista com Gil. A entrevista com Simone
aconteceu na minha casa, onde ela trabalha. Conversamos enquanto ela fazia almoço. Simone
32
contou relatos de sua vida íntima, coisas que ela só confidenciava a minha irmã, que é sua grande
amiga. Fiquei surpresa com as revelações, até mesmo de histórias que eu já conhecia, porque ela
começou a falar timidamente e depois se sentiu a vontade com as próprias narrativas.
Com Paula a conversa aconteceu, em um primeiro momento, via Skype. Em setembro de
2018, pudemos conversar pessoalmente e fazermos as fotografias para o livro. Para escrever
sobre ela, também utilizei entrevistas anteriores, feitas para a produção de um perfil para outra
disciplina da graduação. Nas nossas conversas, ela me mostrou os cômodos de sua casa, seus
livros preferidos organizados na estante, seus cachorros e seu quarto. Foi uma conversa muito
valiosa, pois Paula revelou histórias que eu não conhecia, mesmo após muitos anos de amizade.
Definitivamente, essa personagem não poderia ficar fora do meu trabalho nem mesmo pela
dificuldade de prosseguir com a entrevista, pois, a partir de suas confissões, eu tive a vontade de
fazer esse livro, retratando outras mulheres que, como ela, possuem narrativas de lutas e tristezas
em Paineiras.
4.3 Confecção do livro de perfis O livro começou a ser escrito no primeiro semestre de 2018 após o termino das
entrevistas. A escrita levou alguns meses para chegar a um estágio que considerássemos
adequado para a apresentação final. Além dos perfis, escrevi uma apresentação, falando da ideia
de fazer um livro sobre personagens da minha cidade e sobre o quanto isso tem relevância
pessoal e profissional para mim.
Em outra seção do livro, escrevi também alguns parágrafos sobre a história de Paineiras,
com dados estatísticos e curiosidades. Essa parte do livro é de grande importância para apresentar
a cidade aos leitores, para que eles possam criar um imaginário sobre o lugar do qual eu falo.
Acredito que essa parte é decisiva para compreensão das realidades tratadas nos perfis.
Após muitas correções e reescritas, pude deixar o texto um pouco de lado para me
concentrar nas fotografias, no tratamento de imagem e na diagramação do livro. Realizei as
fotografias durante viagens que fiz a Paineiras. A ideia inicial era usar apenas uma fotografia para
cada perfilada. No entanto, consegui bons materiais de arquivos e pude complementar bem meu
trabalho. Assim, cada perfil possui, além das fotografias que eu fiz, imagens mais antigas de cada
33
uma das minhas entrevistadas. Em cada encontro com minhas conterrâneas, para fazermos as
fotos, tive a experiência de me aprofundar ainda mais na história de vida de cada uma delas.
Para a diagramação recorri a um amigo, Brener Mourolli, que contribuiu decisivamente
para meu projeto. Após muitas conversas a respeito do projeto gráfico do livro, decidimos que
daríamos a ele uma estética que fugisse um pouco do convencional, mas mantivemos o mínimo
de padrão lógico de livros. Planejamos juntos a capa do livro, as cores e a posição de cada item
nas páginas. Escolhi a cor rosa para a capa no mesmo tom das flores da árvore Paineira, que
originou o nome da minha cidade. Na contracapa do livro decidi colocar uma ilustração dessa
árvore encomendada especialmente para meu trabalho. Esse desenho foi feito pela minha mãe,
Iolanda, o que considero uma escolha relevante, pois foi feito por uma mulher que é também
minha conterrânea. Logo, quis produzir um diálogo entre os elementos do livro e as narrativas
escritas nele.
Na capa, o título do livro é feito em um formato tipográfico marcante, no qual o trecho
“terra” da palavra “conterrâneas” vem na fonte Axis Sans 120, em negrito. Esse trecho está em
destaque justamente para dar ênfase à ideia de que o livro traz narrativas de personagens de um
lugar específico, que tem muita influência nas experiências tratadas em cada perfil. Os títulos do
sumário, da apresentação, da história de Paineiras e do posfácio vem com fontes espelhadas para
dialogar com a noção das muitas faces de cada indivíduo retratado no livro. Nos textos dos perfis,
optamos por utilizar a fonte padrão Times, tamanho 12, pois essa fonte é serifada, o que permite
uma leitura melhor. No início de cada capítulo, utilizamos uma letra capitular para iniciar o
primeiro parágrafo. Fizemos isso para dar ao livro uma estética mais próxima do jornalismo. No
começo dos capítulos, colocamos um olho com um trecho interessante de cada entrevista. Isso foi
feito para dar ao leitor uma prévia de cada texto.
Decidimos colocar uma fotografia de página inteira em cada perfil, para trazer uma
presença maior de cada perfilada no texto. Escolhemos, para isso, sempre a foto mais atual de
cada uma delas. A ordem das imagens foi feita de acordo com o a ordem dos fatos de cada
narrativa.
Embora o plano inicial fosse fazer o livro impresso, mantivemos a versão digital para
apresentar à banca. Isso se deu pelo fato de eu não ter, no momento, condições financeiras para
34
imprimir o livro. No entanto, salvamos o arquivo também em modo de impressão, futuramente
pretendo imprimir exemplares do livro para dar às personagens que nele estão narradas.
35
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A construção do livro Conterrâneas trouxe importantes discussões para o meu cotidiano.
As leituras foram de extrema importância para as abordagens propostas no projeto de confecção
desse livro. Além das leituras que fiz para embasar meu trabalho, pude conviver com pessoas que
são as protagonistas das teorias de gêneros discutidas aqui, e acredito que isso tenha sido
essencial para a minha formação como jornalista.
A partir do meu trabalho, pude compreender que perfis são textos jornalísticos por meio
dos quais é possível tratar de importantes temas que permeiam o cotidiano de pessoas comuns e
que geralmente não são abordados profundamente pelo jornalismo diário, como questões de
gênero, sexualidade e autonomia da mulher.
Em meu trabalho, procurei tratar das histórias de vidas das seis mulheres de forma
humanizada, valorizando as singularidades de cada uma. Acredito que esse tipo de jornalismo é
realmente relevante para a sociedade, pois permite dar visibilidade para pessoas que estão à
margem das narrativas jornalísticas factuais.
Para realizar esse livro, me deparei com inúmeras dificuldades. A primeira delas foi
escolher os temas para os perfis e pensar na angulação de cada história. Decidir as fontes não foi
complicado, visto que as escolhidas são pessoas que eu conheço há muito tempo. No entanto,
encontrar cada uma delas foi difícil, porque moro em Mariana, que fica muito longe de Paineiras.
Mas no final, o plano traçado para esse projeto funcionou bem. Consegui realizar as entrevistas,
fazer as fotografias e confeccionar o livro da forma como imaginei desde o início.
As discussões dos temas escolhidos para os perfis não se encerram neste trabalho, pois
são assuntos de grande interesse e importância para a sociedade. Contudo, acredito que tenham
suprido aqui minhas expectativas como jornalista.
36
6 REFERÊNCIAS ADICHIE, Chimamanda Ngozi. Sejamos todos feministas. 1ª. Ed. Companhia das Letras, 2015. ALVES, B. M.; PITANGUY, J. Herança do silêncio. In: ______. O que é feminismo. (Coleção Primeira Passos). São Paulo: Brasiliense, 1991. ARAÚJO. Emanuel. A arte da sedução: sexualidade feminina na colônia. In: PRIORE, Mary Del (org). História das Mulheres no Brasil. 8 ed. São Paulo: Contexto, 2006. BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de cidade Paineiras. Disponível em: <http://cidades.ibge.gov.br/painel/painel.php?codmun=314640> . Acesso em: 20 fev. 2017.
BRASIL. Portal Brasil. Conheça as principais lutas e conquistas das mulheres. Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/cidadania-e-justica/2017/03/conheca-as-principais-lutas-e-conquistas-das-mulheres>. Acesso em: 12 de agosto de 2017.
BUTLER, Judith P. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Tradução, Renato Aguiar. 3 ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. CANDAU, Joël. Antropología de la Memória. 1ª. Ed. Buenos Aires: Nova Visión, 2006. CANDAU, Joël. Memória e identidade. São Paulo: Contexto, 2012. CARRASCO, Cristina. A sustentabilidade da vida humana: um assunto de mulheres? In: FARIA, Nalu; NOBRE, Miriam Nobre (Org.). A Produção do Viver: ensaios de economia feminista. São Paulo: Sempreviva Organização feminista – SOF, 2003. DOSSE, François. Introdução. In: ______. O desafio biográfico: escrever uma vida. São Paulo: Edusp, 2009. P. 11-18. GHILARDI-LUCENA, Maria Inês (Org.). Representações no feminino. In: Revista Discursividade (online) Campinas, SP: Átomo, 2003. Disponível em: <http://www.discursividade.cepad.net.br/EDICOES/06/Arquivos/LUCENA.pdf> Acesso em 17 jun 2017. HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de janeiro: DP&A, 2000. LAGE, Nilson. A reportagem: teoria e técnica de entrevista e pesquisa jornalística. 9ª. ed. – Rio de Janeiro: Record, 2011. LIMA, Edvaldo Pereira. Páginas ampliadas: o livro-reportagem como extensão do jornalismo e da literatura. 4ª.ed. Barueri, São Paulo: Manole, 2009.
37
MARTINEZ, Mônica. Jornalismo literário: a realidade de forma autoral e humanizada. In: Estudos em Jornalismo e Mídia - Ano VI - n. 1 pp. 71 – 83, jan./jun. 2009. Disponível em: <https://periodicos.ufsc.br/index.php/jornalismo/article/view/1984-6924.2009v6n1p71/10418>. Acesso em 06 de abril de 2018. MEDINA, Cremilda. Entrevista: o diálogo possível. 5ª. ed. – São Paulo: Ática, 2008. NORA, Pierre. Entre Memória e História: a problemática dos lugares. In: Projeto História. São Paulo: PUC, n. 10, pp. 07-28, dezembro de 1993. OYAMA, Thaís. A arte de entrevistar bem. – 2ª. São Paulo: Contexto, 2013. PANIAGO, Paulo Roberto Assis. Um retrato interior: O gênero perfil nas revistas The New Yorker e Realidade. (Tese de doutorado). UNB, 2008. PESAVENTO, Sandra Jatahy. Cidades visíveis, cidades sensíveis, cidades imaginárias. In: Revista Brasileira de História, vol. 27, n° 53, junho de 2007. RITTER, Eduardo. New Journalism: o livre amor entre o jornalismo e a literatura. In: Rizoma. Santa Cruz do Sul, v. 1, n. 1, p. 56 – 70. Julho, 2013. Disponível em: <https://online.unisc.br/ seer/index.php/rizoma/article/view/3459/2763>. Acesso em 02 agosto de 2017. SENRA, Márcia Cristina Marinho de Lima. Cidade, identidade e os lugares de memória. In: Unimontes Científica. Disponível em: <http://www.ruc.unimontes.br/index.php/unicientifica/ article/view/250/242>. Acesso em 15 jun. 2018. SILVA, Maria da Penha. Mulheres negras: sua participação histórica na sociedade escravista. In: Cadernos Imbondeiro. UFPB, João Pessoa, v.1, n.1, 2010. Diponível em: <http://periodicos.ufpb.br/index.php/ci/article/viewFile/13509/7668>. Acesso em: 20 jun 2017. SOARES, Cecília Moreira. As Ganhadeiras: mulher e resistência negra em Salvador no século XIX. In: Afro – Ásia. N. 17, 1996. p. 57 – 71. Disponível em: <https://portalseer.ufba.br/ index.php/afroasia/article/view/20856>. Acesso em 11 agosto 2017. TARDIVO, Jessica Aline e PRATSCHKE, Anja. Cidades como lugar de memórias. In: Revista Memória em Rede. Pelotas, v.8, n.15, Jul./Dez.2016 – ISSN- 2177-4129. Disponível em: < https://periodicos.ufpel.edu.br/ojs2/index.php/Memoria/article/view/7353/6698>. Acesso em 15 jun. 2018. MAIA, Marta. Perfil: a composição textual do sujeito. In: TAVARES, Frederico de Mello B.;SCHWAAB, Reges (org.). A revista e seu jornalismo. Porto Alegre: Penso, 2013.
38
VIEIRA, Karine Moura. Do fazer um saber: a construção do biografar: o discurso de autoria sobre a prática jornalística na produção de biografias por jornalistas brasileiros. (Tese de doutorado). UNISINOS: São Leopoldo, 2015. Disponível em: <http://www.repositorio.jesuita.org.br/bitstream/handle/UNISINOS/4993/Karine%20Moura%20 Vieira_.pdf?sequence=2&isAllowed=y>. Acesso em: 03 de agosto 2017. VILAS BOAS, Sérgio. Perfis e como escrevê-los. São Paulo: Summus, 2003. VILAS BOAS, Sérgio. Biografias e Biográfos: jornalismo sobre personagens. São Paulo: Summus, 2002. WEISE, Angélica Fabiane. Para compreender o jornalismo literário. In: Observatório de Imprensa. Edição 730, 2013. Disponível em: <http://observatoriodaimprensa.com.br/diretorio-academico/_ed730_para_compreender_o_jornalismo_literario/>. Acesso em 06 de abril de 2018.
39
ANEXOS
40