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- Janeiro 2019
CONTROLE GLICÊMICO E EDUCAÇÃO DO PACIENTE DIABÉTICO HOSPITALIZADO
Marina Pimenta Carreiro
Endocrinologista titulada pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia.
Mestre em Saúde do Adulto pela Faculdade de Medicina da UFMG.
Professora da Faculdade de Ciências Médicas Minas Gerais.
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Controle Glicêmico e Educação do Paciente Diabético Hospitalizado
RESUMO
A hiperglicemia em ambiente hospitalar é muito frequente, ocorrendo em pacientes diabéticos e
também em não diabéticos, na chamada hiperglicemia de estresse. Entre os pacientes diabéticos,
existem os já previamente diagnosticados, que informam esta condição, mas existe também um
grande percentual de indivíduos que desconhecem o diagnóstico, além daqueles que o omitem. Como
a hiperglicemia impacta negativamente na morbidade e mortalidade dos pacientes, é fundamental
que se faça um rastreamento ativo e uma abordagem terapêutica efetiva durante a permanência
hospitalar, com foco no controle glicêmico seguro, sem aumento de hipoglicemias graves. Trabalhos
recentes mostram que a abordagem terapêutica mais frequentemente utilizada no mundo e também
no Brasil, de uso de insulina apenas para correção de hiperglicemias (sliding scale), é inferior em
termos de eficácia e segurança comparada ao uso de insulinoterapia basal-bolus. A sistematização do
cuidado, com equipes treinadas, permite a otimização da terapêutica e do controle glicêmico. Em se
tratando de doença crônica com controle no longo prazo sabidamente ineficaz em grande percentual
de pacientes, a internação hospitalar constitui-se em uma boa oportunidade de educação em
diabetes. Uma abordagem adequada da hiperglicemia durante a internação hospitalar pode reduzir a
morbidade e a mortalidade dos indivíduos, bem como reduzir a permanência hospitalar. A educação
em diabetes contribui para a melhora do controle glicêmico, com potencial de redução de
reinternações.
PALAVRAS-CHAVE: diabetes mellitus, hiperglicemia, hipoglicemia, insulina, educação,
hospitalização
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Controle Glicêmico e Educação do Paciente Diabético Hospitalizado
SUMÁRIO
2. INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... 4
3. ABORDAGEM INICIAL E METAS GLICÊMICAS ......................................................................... 5
4. IMPACTO NEGATIVO DA HIPERGLICEMIA .............................................................................. 5
5. CONTROLE GLICÊMICO EFETIVO COM ESTRATÉGIAS DE TRATAMENTO ADEQUADAS
REVERTEO IMPACTO NEGATIVO SOBRE A MORBIMORTALIDADE ......................................... 6
6. TERAPIA INSULÍNICA E HIPOGLICEMIAS EM AMBIENTE HOSPITALAR ................................... 7
7. REALIDADE DO CONTROLE GLICÊMICO: ESTRATÉGIAS
TERAPÊUTICAS INADEQUADAS, NÍVEIS GLICÊMICOS INSATISFATÓRIOS
E INÉRCIA TERAPÊUTICA ....................................................................................................... 10
8. OTIMIZAÇÃO DO CONTROLE GLICÊMICO HOSPITALAR:
EQUIPES MULTIDISCIPLINARES E SISTEMATIZAÇÃO DO CUIDADO ..................................... 10
9. CONSIDERAÇÕES PRÁTICAS PARA O MANEJO GLICÊMICO HOSPITALAR-
Protocolo Hospitalar ............................................................................................................ 11
9.1. Monitorização glicêmica ............................................................................................. 11
9.2 Insulinoterapia ............................................................................................................ 12
9.2.1. Situações Especiais........................................................................................... 15
9.3. Hipoglicemias ................................................................................................................ 16
10. EDUCAÇÃO EM DIABETES E TRANSIÇÃO
PARA O CUIDADO AMBULATORIAL ................................................................................... 18
11. CONCLUSÃO ........................................................................................................................ 20
REFERÊNCIAS ............................................................................................................................. 20
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Controle Glicêmico e Educação do Paciente Diabético Hospitalizado
1. INTRODUÇÃO
O diabetes mellitus (DM) é uma doença de alta prevalência na população em geral, sendo a
mesma estimada no Brasil em cerca de 8% em todas as idades, chegando a 19,9% na faixa etária
entre 65 e 74 anos, segundo dados do IBGE de 2013 (1,2). A prevalência de DM em indivíduos
internados varia de 15% a 35%, aumentando com a idade e presença e gravidade de
comorbidades (3-5). Cerca de 20% a 50% dos pacientes desconhecem que têm DM e recebem o
diagnóstico durante passagem por pronto atendimento ou internação hospitalar (5-9). Além
disso, pacientes não diabéticos podem apresentar hiperglicemia durante a internação,
decorrente de suas doenças e/ou pelo uso de medicamentos. Essa condição, chamada de
hiperglicemia de estresse, afeta cerca de 10% dos pacientes internados e está associada a pior
prognóstico, além de indicar predisposição ao desenvolvimento futuro de DM (5,10).
Frequentemente, a hiperglicemia e o DM são subestimados nas unidades de internação. O
diagnóstico da doença é omitido em até 40% dos prontuários, a maioria dos diabéticos recebe
insulina apenas para correção da hiperglicemia e em até 60% dos casos observa-se hiperglicemia
persistente (9, 11, 12). Os erros de medicação (omissão ou dose excessiva de insulina) afetam um
terço dos pacientes e, não raro, causam cetoacidose e hipoglicemia grave (11).
O bom controle glicêmico é fundamental no cuidado do paciente internado, com impacto na
evolução e no desfecho, bem como nos custos de hospitalização. Os pacientes com DM têm
internações mais longas, a hiperglicemia agrava a evolução das doenças coexistentes causadoras da
internação e aumenta o risco de morte em pacientes com e sem DM (13, 14). Dessa forma, estima-
se que os custos de internação de pacientes diabéticos sejam 19% maiores que os de não diabéticos
(15).
Apesar disso, a abordagem dos pacientes hiperglicêmicos, avaliada em vários centros pelo mundo,
incluindo no Brasil, resulta em controle glicêmico insatisfatório, com aumento da morbimortalidade
e do tempo de internação.
Dessa forma, a implantação de programas e protocolos de controle glicêmico para pacientes
hospitalizados faz-se necessária para a adequada identificação de todos os pacientes com alterações
glicêmicas, bem como para se atingirem as metas de controle glicêmico em conformidade com as
evidências científicas e diretrizes das principais sociedades científicas do mundo.
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Controle Glicêmico e Educação do Paciente Diabético Hospitalizado
2. ABORDAGEM INICIAL E METAS GLICÊMICAS
Todos os pacientes devem ter uma avaliação admissional da glicemia. Aqueles com glicemias
>140mg/dL, sabidamente diabéticos ou não, deverão ser monitorados (16). A hiperglicemia em
pacientes sabidamente não diabéticos pode apontar para diabetes prévio não diagnosticado, ou
ocorre pelo aumento dos hormônios contrarreguladores causado pelo estresse da doença de base
ou administração de medicamentos, soluções e dietas hiperglicemiantes, sendo neste caso chamada
de hiperglicemia de estresse. A hemoglobina glicada (HbA1c) maior que 6,5% indica diabetes prévio
não diagnosticado. Este exame também é útil na avaliação do controle prévio dos pacientes
sabidamente diabéticos, ajudando no planejamento das orientações terapêuticas à alta hospitalar.
É indicado para todos os pacientes com hiperglicemia, exceto para aqueles que o tenham realizado
há menos de 3 meses da internação (16, 17).
A meta glicêmica recomendada para pacientes internados críticos e não críticos é de 140 a
180mg/dL. Controle glicêmico mais estrito já se demonstrou deletério, com aumento de
mortalidade (18). A hipoglicemia hospitalar é definida como glicemia abaixo de 70mg/dL e
hipoglicemia clinicamente significativa abaixo de 54mg/dL (16, 17). Pode haver flexibilização da
meta glicêmica para pacientes não críticos com baixo risco de hipoglicemia (100 a 140mg/dL) e para
pacientes terminais ou muito idosos, com metas mais altas (16). O esquema terapêutico para
controle da glicemia deverá ser ajustado diariamente com base em julgamento clínico e levando-se
em consideração a dieta, realização de procedimentos invasivos e início ou suspensão de
medicamentos hiperglicemiantes. Essas recomendações são consenso entre as principais
sociedades científicas do mundo e baseadas em evidências científicas nível A (17).
3. IMPACTO NEGATIVO DA HIPERGLICEMIA
O impacto negativo da hiperglicemia nos pacientes hospitalizados é bem evidenciado na literatura.
Estudos observacionais e estudos prospectivos randomizados mostram forte associação entre
hiperglicemia em pacientes internados e pior evolução clínica em relação a mortalidade, morbidade,
aumento de tempo de internação, infecções, entre outras (5, 19-24). Cerca de um terço dos
diabéticos permanece internado por mais de 14 dias e 15% deles por mais de 28 dias (3, 19).
Em importante estudo, Umpierrez et al. demonstraram que a hiperglicemia é um marcador
independente de mortalidade hospitalar. Foram avaliados de forma retrospectiva 1.886 pacientes
admitidos em um hospital geral e observou-se aumento de mortalidade entre pacientes que
apresentavam hiperglicemias (26% diabéticos e 12% não sabidamente diabéticos) em comparação
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Controle Glicêmico e Educação do Paciente Diabético Hospitalizado
aos que apresentavam normoglicemia (62%). A mortalidade no grupo de pacientes que apresentou
hiperglicemias e não eram sabidamente diabéticos prévios foi de 16%, sendo maior do que entre os
sabidamente diabéticos (3%) e entre os normoglicêmicos (1,7%). Além disso, pacientes com
hiperglicemia de estresse tiveram uma permanência maior no hospital, maior taxa de admissão em
unidade de terapia intensiva e eram menos propensos a receber alta para casa, exigindo
frequentemente transferência para uma unidade de cuidados de transição ou lar de idosos (5).
O aumento na taxa de infecção pós-operatória relacionado à hiperglicemia foi demonstrado em
várias publicações (20-24). Pomposelli et al. avaliaram de forma prospectiva a taxa de infecção
nosocomial pós-operatória em 100 pacientes diabéticos e demonstraram que pacientes que
apresentaram glicemias acima de 220 mg/dL no primeiro dia pós-operatório tiveram aumento de
2,7 vezes na taxa de infecção. Também nesse estudo, a presença de complicações infecciosas
consideradas graves, como sepse e pneumonia, foi 5,7 vezes maior em pacientes que apresentaram
glicemias superiores a 220 mg/dL em qualquer dia de pós-operatório, especialmente em cirurgias
cardiovasculares e abdominais (20).
Um estudo com 492 pacientes portadores de doença arterial periférica submetidos a intervenção
cirúrgica vascular demonstrou aumento significativo na média de tempo de internação entre os
diabéticos (15 ± 18,2 dias) comparados aos não diabéticos (10 ± 13,7 dias) (p < 0,01; 95% IC 2,70 e
8,00) e maior impacto econômico (22). O aumento de complicações e mortalidade associados à
hiperglicemia também foi demonstrado em pacientes não cirúrgicos. Falguera et al. e McAlister et
al., em estudos prospectivos distintos, mostraram que, em pacientes com pneumonia adquirida na
comunidade, o DM está associado a um pior prognóstico, aumentando a taxa de derrame pleural,
complicações hospitalares e mortalidade (23, 24).
Essas evidências reforçam a importância de um rastreamento ativo amplo, com medidas de
glicemias em todos os pacientes à internação, e não apenas entre os pacientes que relatam o
diagnóstico prévio de diabetes, para cuidados apropriados.
4. CONTROLE GLICÊMICO EFETIVO COM ESTRATÉGIAS DE TRATAMENTO ADEQUADAS REVERTE O IMPACTO NEGATIVO SOBRE A MORBIMORTALIDADE
Existem evidências claras de que a correção da hiperglicemia reverte o impacto negativo desta, ao
reduzir infecções, complicações hospitalares e a mortalidade (25-27).
Umpierrez et al. mostraram, em um ensaio controlado randomizado, que o tratamento insulínico basal-
bolus (n = 104) melhorou o controle glicêmico em pacientes com DM2 admitidos para cirurgia eletiva
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Controle Glicêmico e Educação do Paciente Diabético Hospitalizado
ou de urgência, e que as complicações pós-operatórias (infecção de ferida, pneumonia, bacteremia e
insuficiência renal aguda e respiratória) foram 3,39 vezes menos frequentes em comparação à aplicação
de insulina sob demanda (n = 107) (28).
No mesmo sentido, estudo randomizado controlado e metanálise recentes em pacientes cirúrgicos
também evidenciaram que níveis de glicemia perioperatórios menores que 180mg/dL estão associados
a menores taxas de mortalidade e complicações pós-operatórias em comparação com um alvo de
glicemia mais liberal (acima de 200mg/dL) (29, 30).
Wang et al. conduziram um estudo retrospectivo com 440 pacientes com DM 2 internados para
diagnóstico cardíaco ou relacionado à infecção, definindo com endpoint primário um desfecho
composto de vários marcadores de morbidade bem reconhecidos, como morte durante a
hospitalização, transferência para unidade de terapia intensiva, início de nutrição enteral ou
parenteral, infecção, nova infecção hospitalar ou infecção com duração superior a 20 dias de
internação, trombose venosa profunda ou embolia pulmonar, aumento da creatinina plasmática e
reinternações hospitalares. Os autores encontraram um impacto benéfico significativo do manejo
glicêmico por equipes treinadas no desfecho composto em pacientes com glicemia média menor
que 180mg/dL durante a internação hospitalar, com um número significativamente maior de
pacientes atingindo o desfecho primário no grupo de tratamento usual (p <0,02) (31).
5. TERAPIA INSULÍNICA E HIPOGLICEMIAS EM AMBIENTE HOSPITALAR
Apesar de já ter sido mostrado que a correta abordagem da hiperglicemia hospitalar e a melhora do
controle glicêmico levam à redução da morbimortalidade, vários estudos demonstram que o
controle glicêmico não é otimizado em ambiente hospitalar, por uso de estratégias inadequadas de
insulinoterapia, além de grande inércia terapêutica. Mesmo com a ocorrência de hiperglicemias,
frequentemente não são feitos ajustes na insulinoterapia (32).
Existe consenso na literatura de que em ambiente hospitalar o melhor tratamento para
hiperglicemia é a terapia com insulina, porém são observadas algumas barreiras para a sua correta
aplicação. Estudos demonstram que em vários centros do Brasil e do mundo a estratégia mais
utilizada para este objetivo é a aplicação de escalas de correção com insulina regular apenas sob
demanda, de acordo com glicemias (sliding scale), embora existam evidências suficientes de que
melhores desfechos são alcançados quando protocolos utilizando esquemas de insulina basal-bolus
são empregados (25-27, 33).
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Controle Glicêmico e Educação do Paciente Diabético Hospitalizado
Um estudo prospectivo acompanhando 107 pacientes diabéticos em um hospital de um grande
centro acadêmico americano evidenciou uso inadequado de insulinoterapia inicial e falha em ajustar
o esquema durante a internação. Apenas 3% deles tiveram prescrição de insulinas de ação rápida
programadas e 45% de insulinas de ação prolongada; 31% das glicemias foram maiores que
180mg/dL e 11% dos pacientes tiveram pelo menos um episódio de hipoglicemia. Dos pacientes que
tiveram hiperglicemias ou hipoglicemias, apenas 35% tiveram sua insulinoterapia ajustada nos
primeiros cinco dias de internação (34). Esta evidência foi reforçada por um estudo de uma
associação de noventa centros de estudos acadêmicos que demostrou o uso de insulinoterapia
efetiva (basal-bolus) em apenas 45% dos pacientes (35).
Uma das grandes barreiras para o bom controle glicêmico em ambiente hospitalar é o medo de
hipoglicemia. Dentre as principais causas de hipoglicemias, podemos citar a falta de coordenação
de horários de alimentação e doses de insulinas, inapetência, vômitos, suspensão de dieta para
exames ou procedimentos, interrupção não programada de dieta enteral, redução ou interrupção
de corticoterapia, a idade mais avançada e a gravidade da doença de base, constituindo uma das
complicações iatrogênicas mais frequentes no hospital (36, 37). Reconhece-se que a hipoglicemia
deve ser evitada, mas a solução não é o subtratamento da hiperglicemia.
Existe correlação da ocorrência de hipoglicemias com piora de desfechos, embora a causalidade
ainda não esteja definida e ainda existam dúvidas se a hipoglicemia poderia ser na verdade um
marcador de gravidade. A implantação de protocolos de prevenção e manejo de hipoglicemias e
rotinas relacionadas ao uso de medicamentos de alto risco reduz o risco deste evento adverso (16,
17).
Um estudo com 2.174 pacientes hospitalizados recebendo terapia anti-hiperglicemiante mostrou
que 9,5% dos pacientes apresentaram hipoglicemia (≤ 60mg/dL) e menos da metade dos pacientes
com eventos de hipoglicemia tiveram euglicemia documentada em 2 horas. A diminuição na
ingestão enteral foi responsável por 40% dos episódios de hipoglicemia (38). Também já foi
demonstrado que, a despeito da hipoglicemia, os esquemas de insulinoterapia muitas vezes não são
ajustados, falhando em evitar tanto picos de hiperglicemia quanto novos episódios de hipoglicemia
(37).
Estudos de terapias preventivas combinadas, incluindo a vigilância proativa de eventos
hipoglicêmicos e abordagem interdisciplinar orientada para o manejo glicêmico, mostraram que
muitos episódios de hipoglicemia no hospital poderiam ser evitados (17).
Visando comparar diferentes estratégias de controle glicêmico hospitalar, Umpierrez et al.
realizaram importante estudo randomizado com pacientes cirúrgicos utilizando insulina basal ou
apenas escalas de insulina para correção de hiperglicemias. Pacientes nos quais o controle glicêmico
foi realizado com uso de insulina basal ou basal-bolus conseguiram obter rápido controle glicêmico
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Controle Glicêmico e Educação do Paciente Diabético Hospitalizado
já no primeiro dia e mantiveram médias glicêmicas e variação glicêmica diária significativamente
mais baixas em relação aos que utilizaram tabelas de correção. De forma significativa, o uso de
esquema basal-bolus determinou menor incidência de infecções em feridas operatórias e
complicações hospitalares, além de menor tempo de internação (p<0,05). Outras complicações
hospitalares como pneumonia, insuficiência respiratória ou renal e bacteremia também
apresentaram tendência à redução. Nesse estudo, apenas 38% dos pacientes que usavam o
esquema de correção com insulina regular obtiveram controle dentro das metas estabelecidas,
contra 66% dos pacientes em esquema basal-bolus. Importante ressaltar que não houve aumento
do número de hipoglicemias graves (27).
Uma revisão sistemática publicada em 2017 avaliou cinco estudos randomizados e sete estudos
observacionais nos quais se comparava a eficácia de esquemas de controle glicêmico por escala de
correção versus insulina basal-bolus. Foi demonstrada média glicêmica significativamente mais
baixa com o esquema basal-bolus e maior incidência de hipoglicemias leves quando comparado ao
esquema de correção com insulina regular sob demanda, mas não de hipoglicemias graves
(<40mg/dL) (33).
Com base nessas evidências, o uso prolongado de insulinoterapia apenas para correções de
hiperglicemias (sliding scale) é fortemente contraindicado pelas principais sociedades do mundo
(16, 17, 39, 40).
Para pacientes com DM1, por sua vez, um regime de insulina com componentes basais e de correção
é obrigatório para todos os pacientes hospitalizados com a adição de insulina em bolus se a
alimentação estiver estabelecida (17).
Estratégias de gerenciamento glicêmico custo-efetivas são fundamentais para os hospitais. Além de
mais eficiente e seguro, o esquema de insulinoterapia basal-bolus também tem impacto positivo no
gasto com esses pacientes. Estudo recente demonstrou redução de 14% do custo-dia de tratamento
de pacientes com DM tratados com terapia insulínica basal-bolus em comparação com o regime de
correção com insulina regular (41).
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Controle Glicêmico e Educação do Paciente Diabético Hospitalizado
6. REALIDADE DO CONTROLE GLICÊMICO: ESTRATÉGIAS TERAPÊUTICAS INADEQUADAS, NÍVEIS GLICÊMICOS INSATISFATÓRIOS E INÉRCIA TERAPÊUTICA
Apesar das consolidadas evidências quanto às consequências da hiperglicemia e os benefícios de
seu controle por meio de insulinoterapia basal-bolus, existem muitas barreiras para que isto seja
alcançado nas unidades de internação hospitalar (12, 42). Cook et al. acompanharam 2.916
pacientes diabéticos na Mayo Clinic entre 2001 e 2004 e demonstraram hiperglicemia em 25,5% das
medidas por paciente durante internação. A terapia com insulina foi usada em 72% dos pacientes,
porém, na maioria das vezes, fez-se uso apenas de insulina regular sob demanda para correção de
hiperglicemias. No mesmo sentido, demonstrou-se que, mesmo entre os pacientes com
hiperglicemias mais pronunciadas e persistentes, nenhum ajuste no esquema de insulinoterapia foi
feito, comprovando a inércia terapêutica (42).
No Brasil, o panorama não é diferente. Em um estudo brasileiro multicêntrico com 2.399 pacientes
de 24 hospitais de cinco regiões do país, internados entre julho de 2010 e janeiro de 2012, observou-
se que a glicemia foi medida nas primeiras oito horas de admissão em apenas 31,2% dos pacientes
diabéticos na unidade de internação e em 47,1% em unidades de cuidados intensivos, sendo o
esquema de insulina regular sob demanda utilizado em 52% e 69,2% dos pacientes em unidade de
internação e de cuidados intensivos, respectivamente. O controle glicêmico não se mostrou
satisfatório, com 89,4% das medidas de glicemias acima de 180mg/dL e 30,9% abaixo de 70mg/dL.
Apenas 11% dos pacientes tiveram glicemia média do dia entre 80 e 139mg/dL (12).
7. OTIMIZAÇÃO DO CONTROLE GLICÊMICO HOSPITALAR: EQUIPES MULTIDISCIPLINARES E SISTEMATIZAÇÃO DO CUIDADO
Diante de tantas evidências do impacto negativo do mau controle glicêmico na evolução dos
pacientes, bem como dos resultados insatisfatórios alcançados com as estratégias de controle mais
utilizadas, foi identificada a necessidade de mudança na abordagem dos pacientes hiperglicêmicos
internados (40). A implantação de programas de controle glicêmico hospitalar tem sido proposta
por várias sociedades científicas, como a Associação Americana de Diabetes, a Sociedade de
Endocrinologia Americana e a Sociedade Brasileira de Diabetes (16, 17, 43). Estudos sugerem que
especialistas devidamente treinados ou equipes especializadas podem reduzir o tempo de
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Controle Glicêmico e Educação do Paciente Diabético Hospitalizado
permanência hospitalar, melhorar o controle glicêmico e os resultados dos pacientes no ambiente
hospitalar de forma custo-efetiva (17).
Uma revisão retrospectiva conduzida em um hospital americano mostrou que a implantação de um
programa de controle hospitalar da glicemia resultou em identificação de maior número de
pacientes diabéticos, detecção mais precoce dos pacientes hiperglicêmicos, utilização de estratégia
de controle glicêmico eficiente e redução do tempo de internação. Pacientes identificados como
diabéticos (DRG 250) excediam o tempo de internação previsto em três dias a mais do que pacientes
similares não diabéticos (3,4 x 6,4 dias). Após a implantação do programa, esta diferença caiu para
1,2 dias (3,2 x 4,4 dias) (44).
Em um grande hospital geral de Belo Horizonte foi implantado um Protocolo de Controle Glicêmico
em 2013. Trata-se do trabalho de equipe multidisciplinar (endocrinologistas treinados, equipe de
enfermagem e nutrição) com envolvimento diário no cuidado dos pacientes diabéticos ou que
apresentem hiperglicemias de estresse. O treinamento da equipe de enfermagem é reciclado
periodicamente, a monitorização é sistematizada e os resultados têm sido muito favoráveis. Os
marcadores de controle glicêmico (hiper e hipoglicemias) assemelham-se aos centros de excelência
pelo mundo e a permanência hospitalar tem sido reduzida ao longo do tempo.
8. CONSIDERAÇÕES PRÁTICAS PARA O MANEJO GLICÊMICO HOSPITALAR
8.1. Monitorização glicêmica
Todos os pacientes deverão ter sua glicemia medida à admissão e após intervenções
potencialmente causadoras de hiperglicemias, como cirurgias, nutrição parenteral e corticoterapia.
Todos os pacientes sabidamente diabéticos serão monitorizados durante a internação hospitalar.
Os demais pacientes serão mantidos em monitorização se a glicemia de admissão for superior a 140
a 180mg/dL (este limite deverá ser definido de acordo com o perfil de pacientes da
Instituição/Setor), com reavaliações diárias da necessidade de manutenção da monitorização.
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Controle Glicêmico e Educação do Paciente Diabético Hospitalizado
Fluxograma 1 - Medidas de glicemia capilar
Fonte: da autora.
A monitorização glicêmica deverá ser sistematizada e realizada antes das refeições (café da manhã,
almoço e jantar) e ao deitar. Pode haver adequação dos horários de monitorização conforme as
características clínicas dos pacientes. Devem ser utilizados monitores de glicemia adequados e
seguros, validados para uso hospitalar.
8.2 Insulinoterapia
Pacientes que apresentem hiperglicemias persistentemente acima de 180mg/dL deverão iniciar
insulinoterapia. Existe consenso que o tratamento ideal durante internação hospitalar é
insulinoterapia (16, 17, 43).
Os medicamentos orais não têm segurança e eficácia suficientemente comprovadas para uso
hospitalar. Ingesta alimentar variável, presença de vômitos, diarreia, alterações agudas de função
renal, são exemplos de situações nas quais o uso de antidiabéticos orais (ADOs) pode ser deletério.
Recomenda-se, na maioria das situações, a sua suspensão (16, 17, 43).
A exceção são os inibidores da enzima dipeptidil peptidase 4 (iDPP4), que, com seu excelente perfil
de segurança e tolerabilidade, podem ser utilizados em pacientes selecionados durante internação
hospitalar (45).
Glicemia capilar em todos os pacientes na admissão (incluindo pacientes
cirúrgicos que devem ser reavaliados após o ato cirúrgico)
Glicemia < 140 mg/dl e paciente
sem história de DM
Glicemia > 140 mg/dl ou
paciente com história de DM
Sem necessidade de
mais glicemias
Manter glicemias capilares por
24h para avaliação de controle e
solicitar A1c
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Controle Glicêmico e Educação do Paciente Diabético Hospitalizado
A insulinoterapia deve ser iniciada precocemente e os ajustes devem ser diários, com o objetivo de
manter níveis glicêmicos adequados, não se baseando apenas em doses corretivas de insulina. Os
esquemas de “insulina conforme glicemias” (sliding scale) causam grande variação de glicemias e
devem ser abolidos (Nível de Evidência A) (28).
Os ajustes serão baseados nas medidas de glicemia, realizadas em jejum, antes do almoço, antes do
jantar e à noite. Para pacientes com dieta enteral contínua ou nutrição parenteral, poderão ser
realizadas medidas de 6 em 6 horas. Quando necessário o uso de insulina venosa contínua, a
monitorização deverá ser intensificada (2/2h ou 1/1h).
O alvo terapêutico recomendado é até 140 a 180mg/dL (<140mg/dL pré-refeições, <180mg/dL
aleatórias), sendo boa prática de segurança manter a glicemia de jejum em não menos que 90 a
100mg/dL.
A insulinoterapia deverá conter as doses pré-programadas de insulina basal (NPH ou análogos de
longa duração) e os bolus pré-refeições de insulina de ação rápida (Regular ou análogos
ultrarrápidos), com os devidos ajustes em caso de jejum ou hipoglicemias. Somadas a essas doses
serão administradas doses suplementares de insulina rápida ou ultrarrápida pré-refeições, baseadas
nas glicemias.
O cálculo inicial de doses de insulinas está mostrado no Fluxograma 2, bem como na Tabela 1 de
doses suplementares de insulina rápida/ultrarrápida. As doses devem ser revistas diariamente.
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Controle Glicêmico e Educação do Paciente Diabético Hospitalizado
Fluxograma 2 – Cálculo da dose de insulina
Fonte: da autora.
Se a insulina basal for a NPH, idealmente deverá ser administrada em 3 doses (início da manhã, meio
do dia e noite). Ressalte-se que a administração de insulina NPH no final da tarde não é
recomendável, pois o pico de ação se daria de madrugada, com risco de hipoglicemia.
A dose total dos bolus deverá ser dividida entre as três refeições, adequando conforme o
comportamento glicêmico observado e a quantidade de carboidratos oferecida.
Cálculo da dose de insulina
> 70 anos e IRC
0,2 a 0,3 Ui/kg de peso
GI entre 141 e 200mg/dl
0,4 Ui/kg de peso
GI entre 201 e 400mg/dl
0,5 Ui/kg de peso
50% basal e 50% bolus
Dose de bolus pode ser calculada baseada na contagem de CHO da dieta
somada ao fator de correção (ideal) ou ajustada por escala que depende das
glicemia pré-prandiais.
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Controle Glicêmico e Educação do Paciente Diabético Hospitalizado
Tabela 1 - Insulina suplementar para correção de hiperglicemia
Glicemia (mg/dl)
Muito sensível Sensível Usual Resistente
>141 - 180 00 02 04 06
181 - 220 00 04 06 08
221 - 260 02 06 08 10
261 - 300 03 08 10 12
301 - 350 04 10 12 14
351 - 400 05 12 14 16
>400 06 14 16 18
Fonte: da autora.
Muito sensível: pacientes idosos, insuficiência renal, insuficiência hepática com quadro de maior
sensibilidade a insulina e risco de hipoglicemias.
Sensível: pacientes idosos, insuficiência renal, insuficiência hepática.
Usual: diabéticos tipo 1 e tipo 2 com peso normal.
Resistente: obesos, uso de corticosteroides.
Antes da refeição: suplemento da escala de insulina (número de unidades) – adicionar à dose
programada de insulina pré-refeição. Antes da dormir: não administrar dose de insulina
suplementar.
8.2.1. SITUAÇÕES ESPECIAIS
▪ Pacientes críticos: insulinoterapia venosa contínua deverá ser o esquema terapêutico
preferencial, até que exista estabilidade clínica e de ingesta alimentar que permitam a
implantação segura do esquema basal-bolus.
▪ Nutrição parenteral: adicionar insulina Regular às bolsas de parenteral, iniciando com 1ui para
cada 10g de dextrose, com ajustes diários. Doses de insulina suplementar serão administradas
SC. (American Diabetes Association, 2018).
16
Controle Glicêmico e Educação do Paciente Diabético Hospitalizado
▪ Dieta enteral contínua: em conjunto com a insulina basal, o uso de insulina de ação rápida em
horários predeterminados é interessante por permitir mudanças mais ágeis no esquema
terapêutico em comparação com dose diária total de insulina de ação prolongada (p. ex.:
suspensão de dose em caso de necessidade de suspensão inesperada da dieta). Pode haver
necessidade relativamente maior de insulina basal noturna.
▪ Corticoterapia: atenção para hiperglicemias, principalmente vespertinas. No caso de terapia
venosa com várias aplicações ao dia, haverá também a tendência a hiperglicemia de jejum.
Pulsoterapia com altas doses de corticoide é indicação de monitorização glicêmica, incluindo
pacientes sem diagnóstico prévio de diabetes.
▪ Hemodiálise: pode ser necessário variar as doses de insulinas nos dias com e sem diálise.
▪ Diálise peritoneal: pode ser necessário variar as doses de insulina pré-diálise de acordo com
alterações na concentração dos banhos.
▪ Hiperglicemias críticas com Cetoacidose ou Estado Hiperosmolar: deverão ser tratados com
insulina venosa contínua. Ressalta-se a importância da transição correta para insulinoterapia
subcutânea em todos os casos de uso de insulinoterapia venosa. A dose subcutânea deve
preceder a interrupção da infusão venosa em pelo menos 2h.
▪ Procedimentos cirúrgicos: deve-se garantir o aporte mínimo de glicose por soroterapia durante
períodos de jejum prolongado. Manter insulinoterapia, com redução, mas não suspensão, da
dose de insulina basal. Fazer monitorização glicêmica e uso de insulina suplementar se
necessário. Pacientes internados no dia do procedimento deverão ser previamente orientados a
ajustar a sua dose de insulina e/ou não fazer uso de hipoglicemiantes orais no dia do
procedimento.
▪ Portadores de diabetes mellitus tipo 1 (DM1): devem receber especial atenção quanto a
períodos sem aporte calórico adequado. A estratégia de deixar o paciente sem alimentos ou
soroterapia com glicose e sem insulina pode levar a cetoacidose diabética.
8.3. Hipoglicemias
No ambiente hospitalar existem várias situações que predispõem à ocorrência de hipoglicemias.
Protocolos de abordagem e prevenção de hipoglicemias devem ser implantados, com o
envolvimento ativo e treinamentos frequentes da equipe de enfermagem. Eventos de hipoglicemia
(≤70mg/dL) indicam necessidade de revisão imediata do esquema terapêutico. São consideradas
hipoglicemias clinicamente significativas aquelas < 54mg/dL (17).
17
Controle Glicêmico e Educação do Paciente Diabético Hospitalizado
Fatores de risco devem ser identificados e continuamente monitorados para a prevenção de
hipoglicemias: recusa alimentar, suspensão da dieta para exames ou procedimentos, redução do
aporte de glicose por soroterapia, redução ou suspensão de corticoterapia, uso de bolus de insulina
não sincronizados com a dieta ou em intervalos menores que o recomendado pela meia-vida da
droga e deterioração da função renal com redução da necessidade de insulina.
A equipe de enfermagem deve ser treinada para reconhecer situações de risco de hipoglicemia e
evitá-las, bem como reconhecer episódios de hipoglicemia e conduzir o primeiro atendimento com
administração de glicose e acionamento do atendimento médico. Nova glicemia capilar deverá ser
realizada após 30min de um evento de hipoglicemia. Se ocorrerem hiperglicemias de rebote, estas
não deverão ser tratadas com insulina suplementar.
Todos os eventos de hipoglicemia deverão ser identificados e revisados pela equipe médica e de
enfermagem. Medidas educativas e preventivas deverão ser implantadas.
Fluxograma 3 - Fluxo do Protocolo para Hipoglicemias
Fonte: da autora.
O valor de corte para Hipoglicemia < 70mg/dl
Paciente estiver acordado/alerta
Em condição de deglutir Incapaz de deglutir
Deve receber 2 sachês de
SGH50% 20ml
via ORAL
Deve receber glicose Enteral
(gastrostomia ou SNE) na mesma
dosagem para via oral
Realizar nova glicemia automaticamente em um
intervalo de 30 minutos para avaliação da resposta ao
tratamento
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Controle Glicêmico e Educação do Paciente Diabético Hospitalizado
Fluxograma 4 - Fluxo do Protocolo para Hipoglicemias
Fonte: da autora.
9. EDUCAÇÃO EM DIABETES E TRANSIÇÃO PARA O CUIDADO AMBULATORIAL
A hospitalização é um momento oportuno para a educação do paciente com hiperglicemia e DM.
Os pacientes devem ser orientados quanto à importância da prevenção do DM, bem como de seu
tratamento efetivo e no longo prazo, esclarecendo os riscos de complicações crônicas da doença e
também do impacto positivo do bom controle sobre estas.
Dentre os aspectos dessa educação na unidade de internação, destacam-se a orientação nutricional,
a aquisição de habilidade no manejo de glicosímetros e aplicação de insulinas, o aprendizado da
automonitorização glicêmica domiciliar e interpretação da glicemia e a orientação para prevenção
e tratamento da hipoglicemia (17,39).
Deve-se promover uma transição efetiva para o cuidado ambulatorial do paciente com DM, a fim
de prevenir complicações agudas e readmissões. Em pacientes com DM, a taxa de readmissão é
estimada entre 14 e 20% (46). Deve ser salientado que 30% dos pacientes com DM com duas ou
mais internações hospitalares representam mais de 50% das internações e aumento dos custos
Valores < que 40mg/dL e/ou paciente inconsciente
Acionar o plantonista
Com acesso: Aplicar 40ml de SGH50% EV
Sem acesso: Glucagon IM ou SC
Realizar nova glicemia automaticamente em um
intervalo de 30 minutos para avaliação da resposta ao
tratamento
19
Controle Glicêmico e Educação do Paciente Diabético Hospitalizado
hospitalares associados (47). Um plano de alta estruturado e individualizado pode reduzir a duração
da internação e as taxas de readmissão e aumentar a satisfação do paciente (17).
O paciente e/ou seus cuidadores devem ser orientados sobre os ajustes de tratamento feitos
durante a permanência hospitalar, assim como sobre a necessidade de agendamento do
seguimento ambulatorial e disponibilidade de retaguarda para atendimento de urgências. Os
pacientes que apresentaram hiperglicemia hospitalar sem diagnóstico de DM prévio ou atual devem
receber orientação sobre acompanhamento médico devido ao alto risco de se desenvolver a doença
no futuro (16, 24).
Recomenda-se que os seguintes aspectos sejam revistos e abordados antes da alta hospitalar do
paciente com DM (17, 43):
▪ compreensão do diagnóstico de DM e importância do controle no longo prazo;
▪ orientações dietéticas adequadas e consistentes de acordo com os hábitos do paciente;
▪ orientação clara sobre os medicamentos a serem utilizados após a alta, reforçando alterações
porventura realizadas durante a internação;
▪ automonitorização em horários adequados e capacitação para correta interpretação e registro
dos dados;
▪ orientação sobre a conservação e segurança no uso da insulina e descarte de agulhas e seringas;
▪ definição, reconhecimento, prevenção e tratamento de hiperglicemia e hipoglicemia;
▪ entender a influência de doenças agudas (gripe, gastroenterite, entre outras) sobre o controle
glicêmico e providenciar orientação sobre manejo nesses dias de doença;
▪ identificação do profissional de saúde que providenciará os cuidados com o DM após a alta.
Além disso, as prescrições de medicamentos novos ou ajustes daqueles já em uso devem ser
revisadas com o paciente e a família antes da alta. Uma comunicação clara com os profissionais
assistentes ambulatoriais, diretamente ou por meio do sumário de alta hospitalar, é necessária para
facilitar a transição segura para o atendimento ambulatorial. Informações sobre a causa da
descompensação glicêmica (ou o plano para determinar a causa), as complicações relacionadas e
comorbidades e os tratamentos recomendados podem auxiliar os cuidadores ambulatoriais (17).
A presença de uma equipe especializada multiprofissional é importante para assegurar esses
cuidados e a educação em diabetes para o paciente internado.
20
Controle Glicêmico e Educação do Paciente Diabético Hospitalizado
10. CONCLUSÃO
Hiperglicemia hospitalar é claramente relacionada ao aumento de desfechos clínicos importantes,
como infecção e mortalidade. A sua detecção precoce e o seu controle efetivo podem reverter essas
consequências desfavoráveis, conforme demonstrado nesta revisão da literatura. A melhor
estratégia de controle glicêmico hospitalar, com o objetivo de reverter tais consequências e oferecer
segurança aos pacientes, envolve a sistematização da atenção, com identificação precoce e
abordagem eficiente da hiperglicemia, bem como a redução e o tratamento pronto e adequado de
hipoglicemias. Medidas de educação devem ser implementadas para gerar uma cultura hospitalar
em controle glicêmico entre todos os profissionais. Equipes multidisciplinares treinadas devem se
envolver no cuidado e na vigilância diários de todos os pacientes. A alta hospitalar deverá ser
planejada e os pacientes deverão receber orientações sobre a continuidade do tratamento em nível
ambulatorial.
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