da escola pÚblica paranaense 2008 · instituições de educação infantil e séries iniciais do...
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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE
2008
Produção Didático-Pedagógica
Versão Online ISBN 978-85-8015-040-7Cadernos PDE
VOLU
ME I
I
Secretaria de Estado da Educação
Superintendência da Educação
Departamento de Políticas e Programas Educacionais
Coordenação Estadual do PDE
Universidade Estadual de Maringá
O ESTÁGIO SUPERVISIONADO COMO ESPAÇO DE DIÁLOGO ENTRE AS QUESTÕES TEÓRICAS E A PRÁTICA COTIDIANA
Prof. PDE - Lucia Aparecida Lopes Alves Moro
Orientadora- Prof. Ms. Sandra Regina Cassol Carbello
CIANORTE-PR.
2008
O ESTÁGIO SUPERVISIONADO COMO ESPAÇO DE DIÁLOGO ENTRE AS QUESTÕES TEÓRICAS E A PRÁTICA COTIDIANA
Prof. PDE- Lúcia Aparecida Lopes Alves Moro*
Orientadora- Prof. Ms. Sandra Regina Cassol Carbello**
1. INTRODUÇÃO
O presente texto é destinado a uma reflexão sobre a importância do estágio
supervisionado que, como parte do Curso de Formação de Docentes, é desenvolvido nas
instituições de educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental. O objetivo é contribuir
para o aprimoramento da relação prática-teoria-prática, pois a vivência adquirida no estágio
supervisionado, quando discutida entre alunos e professores, pode contribuir para transformar a
realidade.
A justificativa para a escolha do tema é a necessidade de se repensar a forma como, no
Curso de Formação de Docentes, são feitos e utilizados os registros das observações dos
estágios. Na maioria das vezes, eles não passam de práticas burocráticas sem objetivos
definidos. Percebe-se, por parte dos professores de estágio, uma dificuldade em trabalhar com
os relatos que os alunos fazem sobre essa atividade. Embora o estágio seja um espaço de
formação, os relatórios têm servido apenas como objeto de avaliação e não como um material
fundamental para discussões, análise e pesquisa.
A proposta neste texto é, portanto, dialogar teoricamente com os autores que abordam os
encaminhamentos dados ao estágio supervisionado, bem como fomentar discussões com os
professores do curso sobre a importância do debate posterior à prática vivenciada pelos alunos.
A discussão, quando do retorno à escola formadora, seria uma forma de levá-los a reconstruir a
teoria estudada. Ou seja, esta proposta de reflexão é voltada às questões teórico-práticas
vivenciadas no cotidiano escolar.
* Professora do Curso de Formação de Docentes da Rede Pública Estadual-PDE/2008.
** Professora do Departamento de Fundamentos da Educação da Universidade Estadual de Maringá.
Inicialmente, a discussão será desenvolvida com base nos aspectos legais do estágio
supervisionado, na concepção de prática, assim como nos conceitos teóricos que balizaram as
ações pedagógicas nos diferentes períodos históricos. Finalizando, apresenta-se a proposta de
encaminhamento a ser dado nas aulas teóricas desenvolvidas no Curso de Formação de
Docentes.
2. ESTÁGIO SUPERVISIONADO: BREVE HISTÓRICO E AMPARO LEGAL
Segundo Pimenta (2006), o estágio curricular é entendido como um conjunto de
atividades que os alunos realizam durante o curso junto às instituições de ensino. Por este
motivo, é identificado como a parte prática do curso, ao passo que as demais disciplinas são
consideradas como teóricas. Vale ressaltar que o estágio e todas as disciplinas do curso de
formação são atividades obrigatórias para a conclusão do curso.
No período de 1930 e seguintes, os cursos de formação de professores eram
denominados escolas normais. Esta nomenclatura permaneceu até a década de 1970, quando, de
acordo com a Lei 5692⁄71, foi criada a habilitação para o magistério. As escolas normais
tinham sido criadas em 1833, submetidas à lei nacional única e às leis orgânicas do ensino
surgidas com a Reforma Capanema. Antes desse período, cada estado possuía legislação própria
para o referido curso.
Durante muito tempo, o estágio supervisionado no Estado do Paraná esteve concentrado na
disciplina de Metodologia e Prática de Ensino. Ou seja, era nessa disciplina que se faziam os
devidos encaminhamentos para que o aluno do curso de magistério obtivesse os conhecimentos
práticos necessários para o exercício futuro da profissão.
Pimenta (2006) destaca que, nos anos 40 e subseqüentes, havia uma desigualdade entre
os Estados brasileiros quanto aos direcionamentos para o curso. Depois disso, com a Lei
Orgânica do Ensino Normal-Decreto-Lei 8530⁄46 de 02⁄01⁄46, houve uma padronização. De
acordo com esse decreto, o curso passou a ser organizado em dois ciclos: o primeiro, de nível
secundário, ofertado em quatro anos, destinado aos regentes do ensino primário. No segundo
ciclo, o curso era de nível colegial, ofertado em três anos. O decreto-lei previa também cursos
de especialização para professores já formados, que atuavam no então ensino primário, e cursos
de habilitação para administradores escolares do grau primário. Foram criados três tipos de
estabelecimentos de ensino normal: o Curso Normal Regional, a Escola Normal e o Instituto de
Educação. O currículo era único para todos os Estados, mas com autonomia para acréscimo ou
desdobramento de disciplinas para adequação do curso e implantação da disciplina Didática e
Prática de Ensino no 4º ano.
O Decreto-Lei 8530/46, no Título II, Cap.IV, item C, determina que:
Nas aulas de Metodologia deverá ser feita a explicação sistemática dos programas do ensino primário, seus objetivos, articulação da matéria, indicação de processos e formas de ensino, e ainda a revisão do conteúdo desses programas, quando necessário.
Entre 1946 e 1961, promoveu-se uma longa discussão dos pressupostos para a educação,
cujo resultado foi a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a Lei 4024/61. A aplicação
do que se preconizava nessa lei foi alvo de textos legais posteriores, Lei 5692/71 e Lei 9394/96.
A Lei 4024⁄61 foi a primeira a contemplar todos os níveis de educação e a ter validade
para o território nacional, mas não apresentou proposta de mudança para a formação dos
professores. Apenas salientou a possibilidade de que, no Instituto de Educação, respeitando-se
as normas previstas para os cursos pedagógicos das Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras,
se formassem professores para as Escolas Normais.
Com o golpe de 1964, os debates sobre a educação passaram por um período de silêncio,
ou seja, todas as iniciativas de revolucionar a educação brasileira foram reprimidas, dando lugar
ao tecnicismo norte-americano, promovido pelos acordos MEC-USAID.
Em 1971, com a lei 5692, organizou-se o 1º e 2º graus. O curso normal foi transformado
em uma habilitação profissionalizante do 2º grau, ficando reduzido a uma complementação do
mesmo. O curso foi organizado em três anos, caso em que os egressos podiam ministrar aulas
de 1ª a 4ª séries do antigo 1º grau, ou em quatro anos, caso em que podiam trabalhar com alunos
até a 6ª série e até a 8ª, quando se caracterizasse falta de professores habilitados.
Quanto à prática na Habilitação Magistério, o Parecer 349⁄72 do Conselho Federal de
Educação determinava:
A Didática fundamentará a Metodologia do Ensino, sob o tríplice aspecto: de planejamento, de execução do ato docente-discente e de verificação da aprendizagem, conduzindo à Prática de Ensino e com ela identificando-se a partir de certo momento. Essa prática deverá desenvolver-se sob a forma de estágio supervisionado. Deverá a Metodologia responder às indagações que irão aparecer na Prática de Ensino, do mesmo modo que a Prática de Ensino tem que respeitar o lastro teórico adquirido da Metodologia.
Em outras palavras, este Parecer ratifica que o estágio é a prática e a Didática é a teoria
que dá o embasamento a essa prática. Segundo Pimenta (2006), com as alterações na Lei
5692⁄71, o estrago na formação de professores primários foi maior, já que acabou de desmontar
um ensino que vinha precário, sem acenar com nenhuma possibilidade de melhoria real.
Várias pesquisas foram realizadas sobre o cenário do curso de formação de professores
descrito pela Lei 5692⁄71. As monografias e dissertações confirmam que as mudanças não
resultaram em nenhum avanço na formação dos docentes. Estes estudos possibilitaram, após os
anos 80, a mobilização docente em prol do curso Normal. O epicentro do movimento era:
[...] o reconhecimento de que a escola é uma instituição social cuja função específica é a produção e difusão do saber historicamente acumulado, como instrumentalização dos alunos para participarem das lutas sociais mais amplas, objetivando a necessária transformação da sociedade, em uma sociedade justa (PIMENTA, 2006, p.58).
Com o fim do regime militar na década de 80, retomaram-se as discussões a respeito da
educação por parte da sociedade civil e, após a aprovação e promulgação da Constituição de
1988, iniciaram-se no Brasil as discussões sobre a possibilidade de uma lei que direcionasse a
educação brasileira. A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de nº 9394⁄96,
destaca o professor como foco principal para a qualidade da educação e propõe alguns avanços
na preparação docente, dentre os quais a exigência da escolaridade necessária para atuar na
educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental e educação continuada para todos os
profissionais. Quanto ao estágio supervisionado, consta, no artigo 65, que a formação docente
incluirá prática de ensino de no mínimo 300 horas.
No Estado do Paraná, conforme Deliberação nº 10/99 do Conselho Estadual de Educação,
cumprindo a LDB Nº 9394/96, a Prática de Formação⁄Estágio Supervisionado contava com uma
carga horária de 800 horas distribuídas ao longo do curso. A carga horária do estágio
supervisionado é parte integrante do curso, componente indispensável para a integralização do
currículo. Segundo a própria Secretaria de Estado da Educação do Paraná, a Prática de
Formação se constitui em trabalho coletivo da instituição, estruturado no Projeto Pedagógico.
Desta forma, todos os professores e coordenadores responsáveis pela formação dos futuros
educadores deverão participar, em diferentes níveis, da formação teórico-prática discente.
Estes apontamentos históricos mostram, ainda que de maneira breve, o percurso do
Estagio Supervisionado no Brasil e no Paraná no decorrer do século XX e evidenciam que, no
século XXI, enfrentamos o desafio de encontrar, por meio de interlocuções, um caminho
profícuo para a superação dos problemas do encaminhamento do estágio.
3. ESTÁGIO E PRÁTICA NA FORMAÇÃO DOCENTE
Popularmente, entende-se estágio como a “parte prática” de um determinado curso. No
dicionário Aurélio; o termo “praticar” tem como sinônimo fazer, realizar algo ou ação; “prática”
está relacionada à experiência, ao uso, à rotina. Somos sabedores de que, para realizar qualquer
coisa, é preciso conhecer e ter em mãos os instrumentos necessários e adequados. De acordo
com Pimenta:
O exercício de qualquer profissão é prático nesse sentido, na medida em que se trata de fazer ‘algo’ ou ‘ ação’. A profissão de professor é também prática. E se o curso tem por função preparar o futuro profissional para praticar, é adequado que tenha a preocupação com prática. Como não é possível que o curso assuma o lugar da prática profissional (que o aluno exercerá quando for profissional), o seu alcance será tão-somente possibilitar uma noção da prática, tomando-a como preocupação sistemática no currículo do curso (PIMENTA, 2006, p.28).
Assim, a prática propriamente dita se efetivará no exercício profissional. A função do
estágio, nesta ótica, é proporcionar ao discente uma noção das ações na futura profissão.
Entre os anos 30 e 60, segundo a autora, o objetivo principal do curso Normal era
formar profissionais para atuarem nas escolas primárias e fortalecer o vínculo entre os dois
segmentos. A prática estabelecida nas escolas de ensino normal era considerada como uma
imitação de modelos teóricos existentes. Considerava-se que as escolas, tanto as da zona urbana
como as da zona rural, não apresentavam diferenças nem modificações significativas quanto à
prática adotada.
Pimenta (2006) destaca que vários estudos realizados acerca da prática exercida, ou
melhor, orientada, nas escolas de ensino normal apontam um trabalho voltado para uma criança
idealizada pela sociedade, ou seja, uma educação voltada para o que a sociedade esperava da
criança. Assim, “a escola parte de práticas e instrumentos tradicionalmente consagrados como
eficientes na literatura pedagógica (modelos) para ensinar” (2006, p.35). Se a criança não
apresentava rendimento escolar satisfatório, a culpa era tão somente dela, da família, da cultura,
entre outros.
A prática exigida na formação de futuros professores era aquela oferecida por algumas
disciplinas do curso. Nessa época, o estágio supervisionado não era uma exigência, visto que o
curso não era considerado propriamente profissionalizante: “a prática, portanto, consistia em
reproduzir os modelos de ensino considerados eficazes para ensinar aquelas crianças que
possuíam os requisitos considerados adequados para aprenderem” (PIMENTA, 2006, p.36).
Até esse momento, as discussões se restringiram a uma visão de prática como aquisição
de experiência e reprodução de modelos previamente concebidos. As décadas seguintes foram
marcadas por questionamentos acerca da prática pedagógica e pela mobilização para a
legitimação do magistério como profissão. Este movimento foi evidente na ação dos
intelectuais educadores que dirigiram o Instituto Nacional de Pesquisas Pedagógicas. Este
período foi considerado, segundo Pimenta (2006), como um tempo de consolidação da rede de
ensino no país, de expansão do número de escolas e de vagas, embora estas ainda fossem
insuficientes para o atendimento à demanda existente na época.
No ano de 1961, de acordo com os estudos de Pimenta (2006), o INEP e o Instituto de
Educação do Rio de Janeiro destacaram a importância para o período em que estavam vivendo
que as aulas abordassem problemas reais, que fossem estudados conteúdos ⁄assuntos referentes
ao ensino primário, que os problemas encontrados pelos professores no ensino primário fossem
discutidos e que as alunas do curso de magistério tivessem aulas de observação nas escolas de
ensino primário. No relatório do INEP, no ano de 1955, e na Conferência das Escolas para a
Compreensão Internacional-UNESCO, destacou-se a importância de se equilibrar teoria e
prática, antecipar os problemas que os futuros professores podiam encontrar, promover debates
e discussões que permitissem aos futuros professores o desenvolvimento de habilidades para
atuação nas salas primárias.
Segundo a autora, tinha-se a expectativa de que, com o estágio, viriam à tona as
deficiências, já que o ensino nas escolas de formação de docentes era irreal diante das
necessidades das escolas primárias. O problema apontava para a falta de planejamento dos
estágios por parte das escolas de ensino normal, que, portanto, não estava capacitada para
formar professores que pudessem atender às exigências dos alunos do então ensino primário.
Assim, segundo Pimenta (2006):
[...] a prática foi ficando cada vez mais ‘teórica’, ou seja, distanciada da realidade. Nem se poderia mais falar aqui em prática como experiência, como reprodução de modelos - que modelos? Onde estavam as ‘práticas bem sucedidas’? O que significava um professor ‘bem sucedido’? O que se esperava como finalidade do ensino primário? E do ensino Normal? Qual professor era necessário? (PIMENTA, 2006, p.44)
Com a Lei Federal N.º5.692/71, o ensino de primeiro e segundo graus foi reformulado.
Essa mudança representou um momento importante na história da educação profissional, já que
a profissionalização foi aplicada em todo o segundo grau. A aplicação da Lei não interferiu
diretamente na qualidade da educação profissional “tradicional” das instituições especializadas,
mas afetou o sistema público de ensino, que não conseguia oferecer um ensino profissional de
qualidade de acordo com as exigências de desenvolvimento de um mercado cada vez mais
competitivo.
Em relação à profissionalização do magistério nos anos 70, pode-se dizer que, do ponto
de vista legal, a profissão estava regulamentada. No entanto, segundo a própria lei, em seu art.
77, qualquer pessoa podia exercer a função de professor até a 5ª série. Além disso, a
terminalidade do 2º grau dizia respeito à habilitação profissional de grau médio, que
proporcionava as condições essenciais de formação técnica capaz de dar condições para o
exercício da profissão (PIMENTA, 2006).
Apesar da nova lei, poucas coisas mudaram com relação à concepção de teoria e
prática no curso normal. O trabalho curricular não condizia com a realidade das escolas
primárias. Quando confrontados com esta situação, os futuros professores passaram a exigir
mudanças no curso, alegando que havia pouca prática, que sentiam-se despreparados quando
entravam em contato com a realidade, ou seja, que não compreendiam a prática baseada na
teoria que recebiam.
Segundo Pimenta (2006), esse período foi marcado também por iniciativas de mudanças
no estágio, especialmente pelo emprego de novas técnicas no desenrolar das atividades
chamadas de ‘micro ensino’.
Partindo do pressuposto de que a atividade docente precisa ser cientificamente estudada, o micro ensino cria situações experimentais para que o futuro professor desenvolva as habilidades docentes consideradas eficientes, em situações controladas de ensino. (PIMENTA, 2006, p.53)
O micro ensino era entendido como um instrumento que preparava o futuro professor
para ser dinâmico e interativo e auxiliava a reduzir os problemas na realização da prática de
ensino. A autora destaca que “o entendimento da prática presente nas experiências de micro
ensino é o de desenvolvimento de habilidades instrumentais necessárias ao desempenho da ação
docente” (p.55). Dessa perspectiva, quanto mais treinamentos e atividades experimentais em
determinadas habilidades consideradas essenciais a um professor, mais o curso normal estaria
atendendo ao seu objetivo.
É possível perceber, neste encaminhamento metodológico, a marca da técnica na
formação profissional. De acordo com Libâneo (1994), a educação tecnicista introduzida no
Brasil na década de 70 tinha como princípio básico que a educação articulava-se diretamente
com o sistema produtivo. Seu objetivo era o de preparar indivíduos para o mercado de trabalho,
transmitindo informações precisas e rápidas.
Já a década de 80 marca o surgimento das principais forças vinculadas aos interesses dos
trabalhadores. Como se afirmou anteriormente, Pimenta (2006) destaca que, no Brasil, na
década de 80, os educadores não aceitaram passivamente a precariedade da habilitação para o
magistério. Realizaram movimentos, estudos e propostas com o objetivo de encontrar meios
para transformar essa realidade. As contribuições resultantes desse movimento podem ser
agrupadas em dois níveis: nível conceitual e nível operacional de orientação da prática. O
Paraná também se manifestou quanto às mudanças no antigo segundo grau.
Em 1989, o Governo do Paraná criou o projeto “Avaliação Curricular da Habilitação
Magistério” inserido no programa “Reestruturação do Ensino de 2º Grau”, cujo objetivo era
uma rigorosa análise do estágio nas escolas estaduais a partir das mudanças propostas em 1985,
baseadas na Lei 7044⁄82.
Nesse período, no Estado do Paraná, o estágio supervisionado do magistério era
desenvolvido em 408 horas, distribuídas entre os três anos de duração do curso: 68 horas
deveriam ser cumpridas no 1º ano, 136 horas no 2º ano e 204 horas no 3º ano. Ao professor de
Didática eram destinadas as aulas de estágio supervisionado.
Após análise criteriosa da prática desenvolvida no estágio supervisionado, por
considerá-lo essencial à formação dos futuros educadores, a Secretaria de Estado da Educação
do Paraná levantou pontos que indicavam problemas e distorções encontrados no curso. Entre
eles, destacam-se:
• Poucas escolas interessadas em receber estagiários;
• Dificuldade em acompanhar estágios pelo grande número de alunos e pela falta
de coordenador de estágio;
• Professores de escolas de 1ª a 4ª séries resistentes quanto aos estagiários;
• Distorção nas atividades de estágio;
• Professores do curso pouco preocupados com o estágio, deixando toda a
responsabilidade para o professor de Didática;
• Estágio considerado apenas como prática e atividade de conclusão;
• Dificuldade de garantir a relação teoria-prática;
• Estágio organizado em partes fixas: observação, participação e regência;
• Dificuldade quanto à observação, ficando o estagiário apenas como visitante;
• Estágio transformado em momentos para preenchimento de fichas, relatórios,
correção de atividades e outros;
• Falta de relacionamento entre escola de formação e escola de 1ª a 4ª séries;
• Dificuldade do aluno do noturno cumprir estágio;
• Falta de um plano de estágio comprometido com a realidade existente.
Estes pontos indicavam que, mesmo com todas as alterações propostas pela SEED,
muitos problemas ainda permaneciam nesses cursos de magistério. Contudo, essa situação não
se restringia ao Paraná. Pimenta (2006) salienta que a situação se estendia a muitos outros
estados brasileiros. Neste contexto, percebe-se a necessidade de interlocuções, estudos e novas
propostas para superar o calamitoso quadro existente no Brasil.
Dentre os pontos observados destaca-se a dificuldade na relação entre teoria e prática no
encaminhamento do estágio. Segundo Pimenta (2006), quando há excessivas afirmações de que
o curso é muito teórico, faz-se necessário uma análise criteriosa que permita averiguar até que
ponto, no trabalho com os conteúdos e com a análise do campo de estágio, o curso não está
falhando tanto teoricamente como praticamente. "Não se trata, portanto, de responder ‘com
mais prática’ e ‘menos teoria’. O curso não forma adequadamente porque é fraco teórica e
praticamente. Isto é, não assume a formação de um profissional para atuar na‘prática social’”
(PIMENTA, 2006, p.65).
Reportando-se aos estudos de Candau & Lelis (1983), Pimenta (2006) identifica duas
visões da relação teoria e prática. Uma delas, chamada pelas as autoras de dicotômica,
[...] que enfatiza a autonomia da teoria em relação à prática e vice-versa. A expressão mais radical dessa visão é o entendimento de que na prática a teoria é outra. Mas também consideram teoria e prática como pólos associados, diferentes e não necessariamente opostos. A teoria tem primazia em relação à prática e esta é a aplicação daquela, podendo, eventualmente, ser corrigida ou aprimorada pela prática. Mas, via de regra, a prática conforma-se à teoria.
Como segunda possibilidade, segundo Pimenta (2006, p. 67), as autoras defendem a
unidade entre teoria e prática. “Unidade esta que não é identidade, trata-se de uma relação
simultânea de autonomia e dependência”. Nesta visão, o fazer pedagógico, ou seja, “o que
ensinar e o como ensinar”, deve estar vinculado ao “para quem e para que”, declarando assim
uma reciprocidade entre os conteúdos desenvolvidos e os instrumentos do currículo.
Superar a visão dicotômica da relação teoria-prática ainda é um desafio na formação
docente. Diferentemente de outros Estados, o Paraná propôs, segundo a autora, um caminho
para viabilizar que o curso de magistério fosse baseado em uma elaboração teórica e
contemplasse também a operacionalização da proposta, o que simbolizava um avanço
importante.
Em 1989, após o diagnóstico apresentado anteriormente, a SEED apresentou uma nova
visão teórico-metodológica para o estágio, na qual destacava a indissociabilidade entre teoria e
prática. Com este objetivo, foi proposto o seguinte encaminhamento metodológico:
• Pesquisa-ação: identificação, estudo, intervenção;
• Atividades de recuperação e outras diretamente relacionadas ao processo de
ensino-aprendizagem, com diagnóstico, elaboração e execução de projetos;
• Seminários, debates, reuniões, cursos de pequena duração organizados e
desenvolvidos pelos estagiários para professores das séries iniciais;
• Oficina de material didático;
• Ação docente: observação, participação e atuação em classes.
Esse encaminhamento metodológico significou um avanço para o momento. Todavia, é
necessário avançar um pouco mais, ir além da indissociabilidade entre teoria e prática, tomar
como base o conceito de práxis. Como diz Pimenta (2006), deve-se colocar em prática essa
indissociabilidade. Este é o grande desafio: aprofundar o conceito de unidade entre teoria e
prática e oferecer ao futuro professor uma sólida formação teórica para que ele se transforme,
de fato, em agente de uma práxis pedagógica transformadora.
3.1 É POSSÍVEL O ESTÁGIO SUPERVISIONADO SUPERAR A DICOTOMIA ENTRE
TEORIA E PRÁTICA?
Pimenta (2006) afirma que o estágio supervisionado é na verdade uma atividade teórica
que prepara o futuro professor para uma práxis transformadora. Leva-o a tomar a realidade
como objeto de conhecimento, como uma referência para chegar à realidade que se quer
alcançar.
De acordo com Mizukami e Reali (2002), durante o curso de formação, os futuros
professores recebem informações sobre as diversas teorias educacionais, nas diversas áreas do
conhecimento, ao mesmo tempo em que vivenciam experiências práticas. No entanto,
consideram também que, por um lado, as situações de ensino e aprendizagem podem ocorrer de
maneira descontextualizada em relação ao campo de estudo prático e, por outro lado, que
As experiências caracterizadas pelos estágios ou práticas de ensino têm como marca, em geral artificialismo do ensino ministrado e da realidade do exercício profissional, na medida em que após um período longo de planejamento e preparação o aluno⁄futuro professor executa a sua ‘regência’ numa circunstancia tal em que muitas vezes os alunos da classe em que realiza o estágio são ‘orientados’ a como se comportar. (MIZUKAMI E REALI, 2002, p.125).
Nesta lógica, segundo Pimenta e Lima (2008), os estágios, quando reduzidos apenas à
prática instrumental, também provocam uma dissociação entre teoria e prática, o que leva à
necessidade de aproximá-los de uma dimensão teórica. Segundo elas:
De acordo com o conceito de ação docente, a profissão de educador é uma prática social. Como tantas outras, é uma forma de se intervir na realidade social, no caso por meio da educação que ocorre não só, mas essencialmente, nas instituições de ensino. Isso porque a atividade docente é ao mesmo tempo prática e ação. (PIMENTA E LIMA, 2008, p.41).
Em sentido amplo, o entendimento que se tem de ação, segundo as autoras, é o de
atividade humana, de fazer efetivo. De acordo com uma compreensão filosófica e sociológica,
ação está vinculada a objetivos, finalidades e meios, supondo, portanto, conhecimento. Assim,
ação pedagógica pode ser identificada como “as atividades que os professores realizam no
coletivo escolar supondo o desenvolvimento de certas atividades materiais orientadas e
estruturadas” (PIMENTA E LIMA, 2008, p.42). São atividades com mediações pedagógicas
específicas que têm por finalidade a concretização da aprendizagem por parte de alunos e
professores.
As teorias têm como objetivo oferecer condições para a análise das práticas e ações dos
sujeitos, ao mesmo tempo em que permitem ser questionadas, já que teorias nunca são
consideradas explicações definitivas da realidade. Para superar a dicotomia entre teoria e
prática, além da compreensão teórica dessa relação, é necessário que o estágio supervisionado
proporcione a compreensão da complexidade das práticas institucionais e das ações
profissionais. Com este objetivo, que se relaciona ao intuito de torná-lo significativo, Pimenta e
Lima (2008) e Mizukami e Reali (2002) propõem encaminhamentos para o estágio.
Pimenta e Lima (2008), analisando a discussão teórica acerca do estágio supervisionado,
situam duas perspectivas que favorecem a superação do confronto entre atividades práticas e
teóricas. Com as recentes contribuições da epistemologia da prática e dos conceitos de ação e
prática, a pesquisa começa a aparecer como uma nova possibilidade para o estágio
supervisionado. As autoras defendem a idéia de que a realidade vivenciada pelas futuras
professoras no estágio deve incentivar a reflexão, mas isso só acontece quando a vivência do
real
[...] tem conotação de envolvimento, de intencionalidade, pois a maioria dos estágios burocratizados, carregados de fichas de observação, é míope, o que aponta para a necessidade de um aprofundamento conceitual do estágio e das atividades que nele se realizam. (PIMENTA E LIMA, 2008, p.45).
Segundo Schaffrath (2006), os trabalhos de pesquisa, quando ligados às práticas
pedagógicas, servem como mecanismos de construção e reconstrução de conhecimentos na
escola e sobre a escola. Segundo ela:
Nossos argumentos são de que é preciso mais que pequenas amostras de lecionação para que os alunos do curso de formação docente possam conhecer o cotidiano da docência e da escola e treinar algumas aulas; como tem sido executada boa parte dos estágios-docencia” (SCHAFFRATH, 2006, p.2).
Neste sentido, o estágio deve ofertar subsídios teóricos para que o futuro professor
conheça o universo escolar como instituição que produz conhecimento científico.
Cabe aos professores orientadores, juntamente com os alunos, se aproximarem da
realidade, dispondo-se a estudá-la criticamente, com embasamento teórico. Pimenta e Lima
(2008, p.45) concluem ainda, que “o estágio, ao contrário do que se propugnava, não é atividade
prática, mas teórica, instrumentalizadora da práxis docente, entendida esta como atividade de
transformação da realidade”. Assim, o estágio é uma prática que envolve estudo,
fundamentação, conversa e envolvimento com a realidade, ou seja, a práxis pedagógica.
A organização do estagio, fundamentada nestes princípios, torna possível a superação da
relação dicotômica, mas este trabalho é desafio para muitas mãos.
4. ESTÁGIO COM PESQUISA: UM ESPAÇO PARA O DIÁLOGO TEÓRICO-
PRÁTICO.
Pensar o estágio aliado à pesquisa é buscar um princípio articulador para o
imprescindível diálogo teórico-prático nas atividades de formação de docentes. De acordo com
Pimenta e Lima (2008), o estágio supervisionado pode se realizar por meio da pesquisa,
entendida como uma forma de preparação do futuro professor. Realizar pesquisas significa, por
um lado, a possibilidade de uma análise da realidade em que os estágios acontecem; por outro, a
possibilidade de motivar os alunos a se tornar pesquisadores das situações vivenciadas, a
organizar projetos que permitam analisar, compreender e estudar estas situações. Esta proposta
pressupõe que os futuros educadores se dediquem a encontrar novos conhecimentos
relacionados às explicações existentes e à realidade percebida nos estágios.
Schaffrath (2006, p.2) considera que:
[...] é preciso que a pesquisa seja um processo incorporado pelo Estágio que compreende a prática articulada com a teoria, e mais, que os processos teórico-práticos vivenciados pela escola se transformem em produtos ⁄processos das pesquisas científicas sobre o cotidiano escolar. Isto significa compreender a pesquisa como produtora de conhecimento – objetivo da escola. Mais do que isso, que a prática da pesquisa possibilita a articulação de saberes, condição essencial para que o educador (re) signifique sua experiência e a dos seus alunos de forma criativa.
A função da teoria, explicam Pimenta e Lima (2008), é a de proporcionar aos
professores condições para a compreensão do contexto histórico, social, cultural, organizacional
e de si mesmos como profissionais, de forma a poderem interferir na realidade em que atuam.
Justifica-se, portanto, a necessidade constante da análise crítica das condições na qual o ensino
acontece. Para as autoras:
O desenvolvimento desse processo é possibilitado pela atividade de pesquisa, que se inicia com a análise e a problematização das ações e das práticas, confrontadas com as explicações teóricas sobre estas, com experiências de outros atores e olhares de outros campos de conhecimentos com os objetivos pretendidos e com as finalidades da educação na formação da sociedade humana. (PIMENTA E LIMA, 2008, p.50).
Com a problematização e a análise das ações à luz do referencial teórico, é possível
entender o estágio como um eixo articulador entre a teoria e a prática, já que os componentes da
prática trazidos das escolas de estágio são reconstruídos durante as aulas do curso de formação
de docentes (SCHAFFRATH, 2006).
As experiências de estágio com pesquisa resultam em uma vigorosa formação para os
professores, pois, tornando possível uma prática reflexiva com base nas teorias pedagógicas,
estabelecem a articulação teórico-prática.
A utilização da pesquisa como metodologia do estágio supervisionado, segundo Pimenta
e Lima (2008), implica que alguns questionamentos devem ler levados em consideração. Quais
as condições reais de o professor concretizar a pesquisa e a prática? Quais os suportes teóricos e
metodológicos para o desenvolvimento das pesquisas? Como as teorias são vistas nesta
perspectiva? A análise da prática vivenciada é concretizada para além de si e criticamente?
As autoras discutem também a possibilidade de algumas distorções na adoção do
trabalho de pesquisa no estágio supervisionado:
Diversos autores têm apontado os riscos de um possível ‘praticismo’ daí decorrente, para o qual bastaria à prática para a construção do saber docente; de um possível ‘individualismo’, fruto de uma reflexão em torno de si própria; de uma possível hegemonia autoritária, se se considerar que a perspectiva da reflexão é suficiente para a resolução dos problemas da prática; além de um possível modismo, com uma apropriação indiscriminada e sem críticas, sem compreensão das origens e dos contextos que a geraram, o que pode levar à banalização da perspectiva da reflexão e da pesquisa. (PIMENTA E LIMA, 2008, p.52).
Apontar e classificar estes problemas são o primeiro passo para saná-los. Os professores
orientadores dos estágios têm, assim, de um lado, possibilidades de promover pesquisas que
ampliem a compreensão da vivência adquirida nas escolas e em todas as situações de
aprendizagem e, de outro, de orientar a organização de projetos com base nas necessidades
apontadas na prática vivenciada.
Mizukami e Reali (2002) sugerem que, após a observação e a participação em classes
das séries iniciais do ensino fundamental, depois do diálogo com os professores destas turmas e
contato com alunos, é possível desenvolver um projeto de ensino e aprendizagem baseando-se
no que foi constatado. Sugerem que, ao retornar das escolas de estágio, os futuros professores,
por meio de um relatório, descrevam de modo detalhado as informações obtidas. Após isso, as
situações são analisadas, os problemas são detectados e, buscando-se amparo na literatura
correspondente, procura-se compreender a situação e encontrar alternativas para a superação do
problema.
Schaffrath (2006) salienta que o contato dos estagiários com as escolas é uma
oportunidade para se coletar elementos da realidade para estudo, análise e reflexão. As situações
detectadas são sempre atuais e reais e repetem-se no cotidiano da escola até que o olhar do
estagiário se transforme em um olhar científico. Esta movimentação que permite que o estágio
se caracterize ao mesmo tempo como teórico e prático é a construção do conhecimento
científico. Assim, o futuro educador transforma-se em autor de propostas teóricas.
As autoras afirmam ainda que, após o estudo dos casos detectados e do aprofundamento
de conhecimentos teóricos, por meio da reconsideração de alguns conceitos já estabelecidos e
da vivência nas instituições, é possível que os alunos ampliem suas concepções sobre o
processo de ensino aprendizagem. Ao colocar em prática o que se aprendeu ao longo do curso
de formação, as futuras professoras aprendem a lançar um olhar para os fatores que impedem ou
facilitam a aprendizagem dos alunos e a acreditar no poder que os professores têm de solucioná-
los.
Seguindo esse raciocínio, as autoras afirmam ainda que os professores da escola
formadora devem romper com antigos paradigmas e adotar novas estratégias de trabalho para
compreender o conteúdo especifico, o conteúdo pedagógico, o pensamento do aluno, tendo em
vista a formação dos futuros educadores. “Parece ser também necessário que os formadores
assumam de modo mais intenso as suas novas responsabilidades - o que exige aprender novos
repertórios, além de simplesmente ministrar aulas, seminários e cursos”. (MIZUKAMI E
REALI, 2002, p.135)
Segundo Kenski (2004), o estágio supervisionado é uma oportunidade para que o
professor orientador se aproxime mais dos futuros educadores, mas também exige que ele tenha
claro que tipo de professor quer formar. Ainda segundo ela, o estágio voltado para a elaboração
de projetos - estudo de casos- envolve uma atitude de observação, análise crítica e uma
reorganização de atitudes por parte das estagiárias. Para a autora:
Essas características colocam-no próximo à postura de um pesquisador não numa postura acadêmica, mas como investigador preocupado em aproveitar as atividades comuns de sala de aula e delas extraírem respostas que reorientam sua prática pedagógica com os alunos. (KENSKI, 2004, p.41).
O estudo de caso é um encaminhamento metodológico que pode ser utilizado no estágio
com pesquisa e, segundo Mizukami e Reali (2002), oferece oportunidades para análises e
reflexões sobre o cotidiano de sala de aula. As situações do cotidiano descritas detalhadamente
oportunizam aos futuros educadores estudar eventos em determinado contexto. E ainda:
A análise e a elaboração de casos de ensino podem permitir aos futuros professores desenvolver e explicitar seu conhecimento profissional, já que possibilitam o estudo de várias temáticas relacionadas a diversas áreas de conhecimento e a revisão de concepções sobre ensino, aprendizagem, aluno, disciplina, avaliação, dificuldades de aprendizagem etc. constituem-se, portanto, em importantes instrumentos de ensino. (MIZUKAMI E REALI, 2002, p.146, 147).
As diversas temáticas apresentadas pelas alunas do curso de formação colocam-nas
diante das complexas situações vividas em sala de aula, permitindo-lhes, assim, tomar
conhecimento de aspectos ainda não conhecidos e aprimorar a capacidade de observação nos
estágios. Os conhecimentos sobre como ensinar e como a criança aprende, construídos pelas
alunas durante o curso de formação, não abrangem completamente o processo de ensino
aprendizagem. Reconhecer este fator é importantíssimo para que as futuras professoras
assumam seu processo de aprendizado para a atuação na profissão.
Enfim, trabalhar o estágio como pesquisa da realidade vivenciada implica que o
planejamento, o desenvolvimento e a avaliação podem ser pensados de forma coletiva,
envolvendo professores orientadores, estagiários e escolas. “Dessa forma, o projeto de estágio
pode se constituir em projeto de pesquisa colaborativa da prática dos envolvidos” (PIMENTA E
LIMA, 2008, p.215).
Entendendo que, na articulação entre ensino e pesquisa, é possível se encontrar o
caminho para uma formação profissional de qualidade, a tomamos como embasamento de nossa
proposta de intervenção.
4.1 ALGUMAS ANOTAÇÕES PARA O ENCAMINHAMENTO DO TRABALHO
Para encaminhar esta proposta, a primeira condição é o entendimento de que a pesquisa
é uma possibilidade metodológica para a realização do estágio supervisionado no curso de
formação de docentes. Com base nessa metodologia, pode-se gerar no estágio a produção de um
conhecimento sobre o real que responda às expectativas da escola. Ou seja, pode-se realizar
uma possível intervenção por parte dos futuros professores. Considerando as discussões
apresentadas anteriormente destacamos que:
• o estágio supervisionado é um componente curricular a ser realizado pelos futuros
professores nos campos de atuação profissional; é constituído por análise da realidade, o
que exige habilidades como saber observar, relatar, registrar, interpretar, problematizar e
principalmente propor alternativas de intervenção;
• o estágio deve ser compreendido como um tempo direcionado ao processo de ensino e
aprendizagem, já que somente a preparação oferecida em sala de aula não é suficiente
para uma formação plena para o exercício do magistério;
• o estágio deve focar a necessidade de uma posição reflexiva e investigativa;
• a sala de aula na escola de formação pode se tornar um rico espaço para troca de
experiências, de práticas inovadoras e principalmente para momentos de estudo e
análise da relação entre teoria e prática.
Propõe-se, portanto, um caminho teórico metodológico que atue, concomitantemente,
em dois pontos básicos e essenciais: a formação dos futuros professores e a possibilidade de
melhoria das escolas de educação infantil e ensino fundamental.
Para tanto, faz-se necessário pensar instrumentos para a organização desse trabalho.
Propõe-se que as observações e participações discentes sejam organizadas de tal forma que as
estagiárias permaneçam no mínimo três dias em uma única turma na escola de estágio, tendo
assim condições mínimas de levantamento de “casos” a serem investigados. Após estas
observações iniciais, as aulas de estágio na escola formadora devem ser direcionadas para o
levantamento dos casos junto a cada equipe de trabalho. Escolhidos os temas de investigação,
os professores orientadores direcionam a busca de referencial teórico para o estudo de hipóteses
explicativas para as questões percebidas durante as observações e participações. Finalizando o
trabalho, os professores em formação retornam à escola com o resultado dos estudos realizados.
Nesse percurso, percebe-se a importância do registro das observações para a seleção do
material a ser estudado. Considerando que um relatório é fundamental para o encaminhamento
do trabalho, sugere-se a organização de um roteiro para balizar as observações e facilitar sua
elaboração. A elaboração do roteiro é parte importante para os estagiários entenderem a
proposta. Destacam-se alguns aspectos que podem compor o roteiro:
• processo de ensino: forma de transmissão dos conteúdos, recursos utilizados e
atividades propostas;
• organização do espaço e do tempo;
• postura dos alunos: aquisição de conhecimentos, habilidades e atitudes relacionados ao
processo de leitura e escrita;
• Conteúdo trabalhado: domínio, recorte, fonte;
• Atitude dos alunos quanto aos acontecimentos da sala de aula, quanto à professora e aos
colegas de classe;
• aspectos relacionados à cultura da escola e às condições de trabalho dos professores;
• situações desafiadoras encontradas durante o estágio, comportamento apresentado pelos
alunos durante aula e intervalos, relacionamento aluno/aluno e aluno/professor;
• formas de avaliação.
Os relatórios descritivos, com as observações realizadas nas instituições de educação
infantil e ensino fundamental, tornar-se-ão instrumento ímpar na organização do trabalho. É este
material que sinalizará possíveis questões a serem investigadas sob a orientação do professor de
estágio.
Enfim, ao elaborar este texto, fomos levados a pensar o planejamento, o
desenvolvimento das atividades do estágio supervisionado e a avaliação do mesmo como um
conjunto de fatores essenciais ao processo pedagógico nos cursos de formação de professores.
Planejar o estágio nessa dimensão leva-nos a acreditar em algumas possibilidades:
• os alunos detectam quando a proposta de estágio é planejada e organizada com base em
questões teórico-práticas e assim valorizam mais o exercício da docência;
• os professores, quando preparados adequadamente, percebem a importância do trabalho
coletivo e direcionado tendo como base os casos detectados nas escolas de estágio;
• a avaliação contínua de todo o processo permite uma postura teórico-metodológica que
articula ensino e pesquisa.
Em síntese, a possibilidade de estágio supervisionado, cujo direcionamento seja a
pesquisa da realidade encontrada nas instituições de educação infantil e ensino fundamental,
implica a necessidade de que seu planejamento, desenvolvimento e avaliação tenham como
finalidade superar a dicotomia entre teoria e prática e sejam resultantes de um processo coletivo
entre escola formadora e escola de estágio.
CONCLUSÃO
Com base nos autores referenciados neste trabalho, pudemos mostrar que, no decorrer da
história da formação docente no Brasil, foram dados diferentes sentidos ao estágio. Essa
variação ocorreu conforme o entendimento histórico e social da profissão de professor, bem
como conforme as finalidades que se atribuíam à educação básica de cada período.
O estágio supervisionado no Curso de Formação de Docentes é sempre uma atividade
baseada na indissociabilidade entre teoria e prática. A pesquisa, como uma metodologia de
estágio, traduz-se na possibilidade de que os futuros educadores desenvolvam uma atitude
reflexiva e investigativa a respeito das situações do cotidiano. Esta é uma condição essencial
para que o futuro educador faça da sua atividade profissional uma práxis transformadora.
Espera-se que estas reflexões subsidiem os professores de estágio para organizar as
aulas teóricas com base nas observações realizadas pelos discentes no cotidiano escolar.
Acredita-se que este seria um primeiro passo para se evitar que os registros dos alunos se
configurassem apenas como um ritual burocrático a ser rigorosamente cumprido. Utilizar estes
escritos apenas como objeto de avaliação é desconsiderar um material fundamental para
discussões, análise e pesquisa. Na metodologia de trabalho com pesquisa, a reflexão é elemento
primordial e contribui para o aprofundamento da relação prática-teoria-prática, pois a vivência
adquirida no estágio supervisionado fornece elementos para discussões entre alunos e
professores que podem contribuir para transformar a realidade.
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