daniela vagos marcelino relatório de estágio e monografia … · 2020. 5. 29. · daniela vagos...
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Daniela Vagos Marcelino
Relatório de Estágio e Monografia intitulada “CRISPR até agora...” referentes à Unidade Curricular “Estágio”, sob a orientação, respetivamente, da Dra. Ana Rico e do Professor Doutor João Nuno Moreira
e apresentados à Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra, para apreciação na prestação de provas públicas de Mestrado Integrado em Ciências Farmacêuticas
Julho 2017
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Daniela Vagos Marcelino
Relatório de Estágio e Monografia intitulada “CRISPR até agora...” referentes à Unidade Curricular “Estágio”,
sob a orientação, respetivamente, da Dra. Ana Rico e do Professor Doutor João Nuno Moreira e apresentados
à Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra, para apreciação na prestação de provas
públicas de Mestrado Integrado em Ciências Farmacêuticas
Julho 2017
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“We are the facilitators of our own creative
evolution.”
(Bill Hicks)
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Um agradecimento especial …
A toda a equipa da farmácia sem a qual esta minha experiência com certeza não teria
sido tão positiva. Todos são insubstituíveis e acredito que a equipa não teria o mesmo
espírito se estivesse a faltar qualquer elemento, e, por isso, não sou capaz de fazer distinções
na importância de cada um individualmente.
Aos meus parceiros de estágio por sempre contribuírem para a boa disposição geral
seja com música ambiente ou por deixarem as tarefas a meio.
À minha família por serem quem são.
Aos meus amigos por todos os momentos ao longo destes muitos anos, em particular
à Luana, ao Rúben e ao Vítor por aturarem o meu nervosismo.
Ao Professor Doutor João Nuno Moreira pela cooperação e por me ter apresentado a
este tema.
À Faculdade de Farmácia que me vai ficar sempre na memória.
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Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra
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Índice
Parte I - Relatório de Estágio em Farmácia Comunitária
Enquadramento do Estágio em Farmácia Comunitária .................................. 7
Forças (Strenghts) ................................................................................................ 9
S.1 - Organização dos medicamentos ..................................................................................................... 9
S.2 - Divisão de tarefas ............................................................................................................................... 9
S.3 - Clientes Habituais .............................................................................................................................. 9
S.4 - Ligação com outras farmácias ......................................................................................................... 9
S.5 - O pessoal .......................................................................................................................................... 10
Fraquezas (Weaknesses) ................................................................................... 11
W.1 - Proximidade de outras farmácias .............................................................................................. 11
W.2 - Número elevado de estagiários ................................................................................................ 11
W.3 - Espaço de armazenamento ......................................................................................................... 11
W.4 - Não realização de manipulados ................................................................................................. 11
W.5 – Espaço Animal ............................................................................................................................... 12
Oportunidades (Opportunities) ........................................................................ 13
O.I - Obras internas ................................................................................................................................. 13
O.2 - Dinamização dos espaços ............................................................................................................ 13
O.3 - Participação em várias tarefas ..................................................................................................... 13
O.4 - Formações ....................................................................................................................................... 14
O.5 - Cartão Saúda .................................................................................................................................. 14
Ameaças (Threats) ............................................................................................. 15
T.1 - Obras externas ............................................................................................................................... 15
T.2 - Situação Económica Actual .......................................................................................................... 15
T.3 - Falta de confiança nos estagiários ............................................................................................... 15
T.4 - Serviço de assistência ao Sifarma 2000® ................................................................................... 16
Casos Práticos ..................................................................................................... 17
Caso 1 - Hemorroidas ............................................................................................................................. 17
Caso 2 - Pensos com Ácido Salicílico em diabéticos ....................................................................... 17
Referências Bibliográficas .................................................................................. 18
Parte II - Monografia - CRISPR até agora…
Resumo ................................................................................................................ 20
Abstract ............................................................................................................... 20
Abreviatura e Acrónimos .................................................................................. 21
1. Nota Introdutória ........................................................................................... 23
2. Tipos de CRISPR ............................................................................................. 25
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3. Como actua o CRISPR ................................................................................... 26
3.1 Na Natureza ........................................................................................................................................ 26
3.2 No Laboratório .................................................................................................................................. 29
4. Comparação com outras técnicas ................................................................ 30
4.1 TALEN .................................................................................................................................................. 30
4.2 ZNF ...................................................................................................................................................... 31
5. Limitações do CRISPR ................................................................................... 32
5.1 PAM ....................................................................................................................................................... 32
5.2 Design de sgRNA ............................................................................................................................... 32
5.3 Transferência do sistema ................................................................................................................. 33
5.4 Proporção NHEJ:HDR ...................................................................................................................... 33
6. Deteção e prevenção de mutações off-target ............................................. 35
7. Aplicações/Potenciais ..................................................................................... 37
7.1 Terapêuticas ........................................................................................................................................ 37
7.2 Noutras Áreas .................................................................................................................................... 40
8. Preocupações Éticas e Legais ........................................................................ 42
9. Propriedade Intelectual ................................................................................. 44
10. Considerações Finais .................................................................................... 45
Referências Bibliográficas .................................................................................. 46
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PARTE 1
RELATÓRIO EM FARMÁCIA COMUNITÁRIA
FARMÁCIA CENTRAL DE COIMBRA
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Enquadramento do Estágio em Farmácia Comunitária
Chegada a etapa final deste meu percurso académico é com uma certa ansiedade e um
certo alívio que me foi dada a oportunidade imprescindível de colocar em prática todo o
conhecimento que adquiri durante estes longos anos de estudo. O estágio em Farmácia
Comunitária é, para mim, precisamente o culminar da minha vida académica.
A importância do papel da Farmácia Comunitária nos cuidados de saúde da
comunidade é superlativa e nunca deverá ser subestimada, sendo, portanto, o meu objetivo
com este estágio testemunhar a maior variedade de situações e a maior heterogeneidade de
população possível. Por todas estas razões escolhi ficar numa farmácia em Coimbra,
nomeadamente, a Farmácia Central, localizada na Rua da Sofia, na Baixa de Coimbra, sob a
orientação da Dr.ª Ana Rico, enquanto diretora técnica. A equipa da farmácia é ainda
constituída pela Dr.ª Alda Lindo, com a função de Farmacêutica Adjunta, pelo Dr. Guillaume
Tróia, e pelo Sr. Vítor Santos.
O meu estágio teve, assim, início no dia 9 de janeiro tendo durado até meados de
Junho, período este em que pude, efetivamente, não só pôr em prática mas também adquirir
muitos novos conhecimentos que com certeza me serão importantes para o futuro. De toda
esta experiência surge este meu relatório, sob a forma de uma análise SWOT, onde espero
conseguir fazer transparecer todos os aspetos importantes do meu estágio.
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Forças (Strenghts)
S.1 - Organização dos medicamentos
Aquela que eu considero ser a grande vantagem da Farmácia Central em relação a
outras farmácias é, sem dúvida, o facto de os medicamentos estarem organizados não por
ordem alfabética, mas sim por grupo terapêutico.
Devo admitir que ao início este facto me gerou uma certa dificuldade, principalmente
enquanto estava a fazer atendimentos, casos esses em que não dispunha de tanto tempo
para encontrar o medicamento em questão, mas após alguma habituação considero que este
tipo de organização é uma grande mais valia, na medida em que me permitiu fazer
associações entre princípios ativos e as suas respetivas atividades.
S.2 - Divisão de tarefas
Como se trata de uma farmácia com um espaço reduzido e um ambiente bastante
familiar entre todo o pessoal, a maior parte das tarefas podem ser realizadas por qualquer
um, tirando algumas exceções, como, por exemplo, a realização e verificação da encomenda
diária, que fica a cargo da Dr.ª Ana, da Dr.ª Alda ou do Dr. Guillaume, pois, apesar de o
sistema Sifarma 2000® apresentar uma lista com base nos stocks mínimos e máximos, é
sempre necessário haver uma verificação cuidada da necessidade de determinados
medicamentos e da escolha do fornecedor mais adequado ao momento.
S.3 - Clientes Habituais
Esta é uma componente muito importante de salientar nesta farmácia, dado que se
trata de uma das primeiras farmácias a surgir em Coimbra e que se tem mantido no mesmo
espaço físico desde a sua abertura em 1830. Uma grande parte dos utentes que frequentam
a farmácia, sejam idosos ou jovens, já o fazem desde há muito tempo e depositam uma
grande confiança no trabalho de toda a equipa, preferindo que, tendencialmente, sejam
atendidas pela mesma pessoa.
S.4 - Ligação com outras farmácias
A Farmácia Central desde há muito tempo que tem uma boa relação com algumas
farmácias à sua volta, o que nos permitiu muitas vezes obter medicamentos que não
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tínhamos de momento em stock, medicamentos esses que eram posteriormente devolvidos
às outras farmácias assim que obtivéssemos o produto.
Para além disso, a pessoa responsável pela farmácia também o é por mais duas outras
duas farmácias fora de Coimbra, sendo por isso possível recorrer a transferências inter-
farmácias de medicamentos que pudessem fazer falta, quando as outras farmácias tivessem
disponibilidade de stocks.
S.5 - O pessoal
Por fim, e sem dúvida um dos pontos mais fortes desta farmácia é toda a equipa que a
constitui. Desde o início que sempre foram acolhedores e me deixaram sempre à vontade
para colocar qualquer tipo de questão e esclarecer dúvida. Foi este ambiente relaxado que
me permitiu ter à vontade suficiente para começar a fazer atendimentos na minha segunda
semana de estágio apesar de ainda não manipular bem o sistema Sifarma 2000®. Todos eles
tiveram a paciência e a calma para me responder.
É graças a tudo isto que os utentes têm o nível de confiança que têm nesta farmácia,
pois claramente muitas das relações já não são meramente comerciais, mas sim quase de
companheirismo.
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Fraquezas (Weaknesses)
W.1 - Proximidade de outras farmácias
Um dos mais flagrantes problemas neste estágio foi a quantidade e a proximidade de
farmácias na mesma rua da Farmácia Central, chegando a ser mais de quatro. Isto faz com
que haja uma distribuição muito grande da população pelas farmácias, ou seja, a razão per
capita para cada farmácia acaba por estar com níveis muito baixos nesta zona de Coimbra, o
que por sua vez limitou a variedade de situações e utentes com que eu poderia ter sido
confrontada o que, com certeza, teria sido uma grande contribuição para a minha formação.
W.2 - Número elevado de estagiários
Apesar de eu ter apreciado a companhia de todos os indivíduos nesta farmácia, é da
minha opinião que, tendo em conta o espaço e a localização, entre outros fatores, o número
de estagiários presentes é demasiado elevado, tendo chegado a 4 estagiários durante um
longo período de tempo. Isto levou a que se desse uma grande distribuição das tarefas
existentes, e apesar de não achar que me tenha terminantemente limitado a nível de
experiências, acredito que tenha desacelerado o meu ritmo de aprendizagem.
W.3 - Espaço de armazenamento
A farmácia em si já possui uma área reduzida, mas este facto fica obviado
principalmente quando chegam encomendas que exigem um maior espaço de arrumação e
armazenamento, e é o principal motivo pelo qual o nível de stock da maior parte dos
medicamentos nunca pode ser muito elevado, o que por sua vez, poderá eventualmente
trazer problemas a nível de falhas de vendas por nível de stock insuficiente.
W.4 - Não realização de manipulados
Uma fraqueza que vem diretamente relacionada com a evidenciada no ponto anterior
diz respeito à não realização de manipulados, justamente devido à falta de uma área que
estivesse de acordo com as exigências legais.
Pessoalmente, lamento imenso não ter tido a possibilidade de participar na elaboração
de manipulados, pois esta era uma área da farmácia comunitária que representava um grande
atrativo para mim, na medida em que seria uma oportunidade para colocar as minhas
capacidades a nível laboratorial à prova.
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W.5 - Espaço Animal
De um modo geral, apesar de não achar que esta seja uma farmácia muito pobre em
termos de produtos neste campo, creio que esta é uma área da farmácia que ainda poderia
ser bastante melhorada. Aliado a este facto vem uma realidade com a qual fui confrontada ao
longo do estágio, a minha falta de conhecimentos de base nesta área de um modo geral.
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Oportunidades (Opportunities)
O.I - Obras internas
Ao longo de toda a duração do meu estágio pude presenciar várias alterações feitas à
estrutura interna da farmácia. Apesar de isto também se poder julgar um ponto negativo, eu
conto como sendo positivo na medida em que não devem ser muitas as oportunidades de
apanhar um período de mudança tão acentuada numa farmácia. Logo, apesar de por vezes
não facilitar a execução das tarefas, eu considero esta como tendo sido uma experiência
interessante.
O.2 - Dinamização dos espaços
Dado que estive na Farmácia Central desde janeiro até junho tive a oportunidade de
observar várias alterações aos expositores, quer fosse devido a alterações sazonais, como o
início da primavera, ou a aproximação da onda de calor, quer fosse devido à necessidade de
promoção de uma marca em particular. E pude, consequentemente, observar o efeito
positivo que estas alterações induzem nas vendas. Isto prova que se trata de uma farmácia
que, apesar de não haver uma grande variedade de produtos nas áreas da dermocosmética e
puericultura, sabe aplicar de forma correta as regras de marketing.
O.3 - Participação em várias tarefas
Como mencionei anteriormente, a divisão de tarefas nesta farmácia não se trata de
algo rígido e, portanto, acho que posso dizer com certo nível de confiança que fiz todas as
tarefas que me foi dada a oportunidade.
Fiz receções de encomendas, arrumei medicamentos e todos os outros produtos
disponíveis na farmácia, fiz atendimentos livres e também com todos os tipos de diferentes
de receitas que se encontram em circulação, desde as manuais às eletrónicas sem papel,
organizei o receituário, fiz reservas de produtos e vendas de psicotrópicos, e cheguei a
encomendar produtos, tendo por vezes de confirmar com os todos os fornecedores se
tinham stock disponível ou não.
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O.4 - Formações
Ao longo do estágio também se deu a oportunidade de ir assistir a várias formações,
tanto de medicamentos sujeitos, como não sujeitos, a receita médica, que me ajudaram
bastante a ter uma melhor compreensão das particularidades de cada produto.
Para além destas formações que exigem presença física, também tive conhecimentos
de várias plataformas online onde era possível fazer formações, creditadas e não creditadas,
pela Ordem dos Farmacêuticos, que também me forneceram informação bastante
interessante.
O.5 - Cartão Saúda
Como já deve ser praticamente de conhecimento comum, o Cartão Saúda é um cartão
do qual qualquer utente pode usufruir, sem quaisquer custos associados, e apresenta uma
vantagem muito pertinente pois permite acumular pontos com todas as idas à farmácia, seja
para realizar uma compra com receita ou uma venda livre, pontos esses que podem ser
posteriormente utilizados para trocar por produtos, serviços, ou até mesmo vales de
desconto.
Neste estágio tive a oportunidade de aprender vários aspetos relacionados com este
cartão, desde a sua execução, ou seja, a criação de uma nova ficha, ao rebate de pontos na
forma de vales de desconto e mesmo de produtos.
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Ameaças (Threats)
T.1 - Obras externas
Já referi anteriormente que a farmácia esteve sujeita a obras internas, tendo até
considerado isso como um ponto positivo. No entanto também esteve sujeita a obras
externas, chegando mesmo a estar, na fase inicial do estágio, a fachada do edifício em que se
compreende a farmácia completamente tapada, sendo a única exceção a esta situação a
entrada da farmácia. Como será de imaginar isto teve um efeito bastante pejorativo no meu
início de estágio, na medida em que tinha menos oportunidades para testar as minhas
capacidades práticas.
Felizmente esta situação acabou por ficar resolvida, se bem que num prazo bem mais
tardio do que o inicialmente esperado, após o que se verificou um aumento do afluxo de
utentes à farmácia, muitos dos quais chegaram a pensar que esta se encontrava encerrada,
ou que tinham mudado as instalações.
T.2 - Situação Económica Atual
Não posso deixar de referir os danos a nível de receitas que a situação económica de
uma boa parte dos utentes representa para a farmácia, sendo que muitos destes acabam por
ter de ficar a dever à farmácia, durante períodos de tempo ainda longos, até terem a
disponibilidade financeira para acertar as contas.
Tudo isto limita, obviamente, a liberdade e o poder de compra de quem se apresenta a
farmácia, efeito este que eu acredito que não se verifica apenas nesta farmácia em particular,
mas nas farmácias em geral a um nível nacional.
T.3 - Falta de confiança nos estagiários
Este ponto, creio também se tratar de uma realidade em qualquer farmácia, mas posso
aventurar que será, porventura, ligeiramente mais acentuado nas farmácias em que, como é
o caso da Farmácia Central, todo o pessoal já criou um nível de confiança tal com os utentes
que leva a que estes fiquem mais reticentes quando chegada a hora de lidarem com uma
pessoa que ainda desconhecem.
Tendo dito isto, a verdade é que após algum tempo os utentes começaram a habituar-
se à minha presença, por isso, apesar de ter desacelerado o arranque inicial do meu estágio,
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esta trata-se de uma circunstância que claramente se tenderia a desvanecer dado o tempo
necessário.
T.4 - Serviço de assistência ao Sifarma 2000®
Algo que também se acabou por verificar inúmeras vezes ao longo do estágio foi a
falha do programa Sifarma 2000®, por razões que a mim me são desconhecidas.
Durante essas ocasiões houve uma em particular que me ficou na memória pois,
apesar de terem sido imediatamente contactados, aquando da abertura da farmácia, que o
programa não se encontrava operacional e que, mesmo após seguir determinadas instruções,
o problema não se resolvia, a assistência só chegou durante a tarde, ou seja, a farmácia ficou
sem programa durante uma manhã inteira. Quero acreditar que foi feito tudo o possível no
menor espaço de tempo, mas, mesmo assim, tendo em conta o prejuízo que tal situação
representa para uma farmácia considero que seja uma falha muito grande da parte da
assistência.
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Casos Práticos
Caso 1- Hemorroidas
Um utente dirige-se à farmácia e pede algo para hemorroidas não complicadas e afirma
que não está a sangrar, mas sente uma “bola” e ardor durante a evacuação, pelo que queria
algo que impedisse a evolução do processo inflamatório.
Tratando-se de uma situação muito inicial optei por aconselhar o NeoFitoroid®, um
dispositivo médico propositadamente indicado para distúrbios hemorroidais pois atua,
principalmente, através da proteção da mucosa [1], e medidas não farmacológicas como, não
comer comidas muitas condimentadas, principalmente que não sejam picantes, e lavar a zona
com banhos de água morna para diminuir o ardor/inflamação através da vasoconstrição.
Caso 2 - Pensos com Ácido Salicílico em diabéticos
Um utente idoso dirige-se à farmácia a queixar-se de calos dolorosos nos pés,
procurando, portanto, algo que lhe fosse diminuir os calos.
Posto isto, estava prestes a indicar uns pensos com ácido salicílico que iriam,
gradualmente, remover os calos quando me lembrei de perguntar ao utente se ele, por
acaso, não seria diabético. Tendo recebido uma resposta afirmativa decidi recuar na minha
sugestão anterior [2] pois, devido ao desgaste da pele provocado pelo ácido salicílico, o
risco de vir a provocar uma ferida no pé seria mais elevado. Caso tal situação viesse a
suceder poderia trazer complicações para o utente tendo em conta a menor capacidade de
cicatrização, principalmente nos pés, no caso dos diabéticos.
Assim sendo aconselhei antes uns pensos hidrocolóides que iriam desgastar o calo,
através da ação da humidade, de uma maneira mais suave e menos arriscada. Aconselhei
ainda mergulhar os pés em água de forma a melhor amolecer o calo, facilitando o seu
desgaste.
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Referências Bibliográficas
[1] FARMÁCIAS PORTUGUESAS – Neo Fitoroid®. [Acedido a 7 de junho de 2017].
Disponível na Internet: https://www.farmaciasportuguesas.pt/catalogo/index.php/catalog
/product/view/id/643847/s/neo-fitoroid/category/1134/
[2] COMPEED® – Textos Legais. [Acedido a 7 de junho de 2017]. Disponível na
Internet: http://www.compeed.com.pt/textos-legais
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PARTE 11
MONOGRAFIA
CRISPR ATÉ AGORA…
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Resumo
O mundo das tecnologias de modificação genética sofreu uma grande evolução nos
últimos anos com a descoberta dos Clustered Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats
(CRISPR) e das suas possibilidades nas áreas da investigação e terapêutica. Originário do
sistema imunitário de procariotas esta técnica tem atraído muita atenção ao ser aplicada,
com sucesso, na modificação do genoma de eucariotas sob o nome de CRISPR-Cas9. As
discussões envolvendo esta técnica têm também sido muitas, pois a sua simplicidade e
facilidade de emprego abrem caminhos acompanhados de várias questões que não podem
deixar de ser colocadas.
Pretendo, com esta monografia, fazer um levantamento geral da evolução do CRISPR,
do seu passado, do seu presente e da sua previsão para o futuro.
Palavras-chave: CRISPR; cas9; sgRNA; genoma; ética; patente; off-target; transfeção;
terapêutica; modificação genética.
Abstract
The world of genetic editing technologies as suffered a great evolution in the past few
years with the discovery of Clustered Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats
(CRISPR) and its possibilities in the fields of investigation and therapeutics. Originating from
the immune system of prokaryotes this technique has been attracting a lot of attention with
its successful application in modifying the genome of eukaryotes under the name of CRISPR-
Cas9. Discussions involving this technique have also been many, for its simplicity and ease of
use open paths which bring along several questions that can´t be left unspoken.
I intend, with this monography, to summarise in a general fashion the evolution of
CRISPR, its past, its present and its vision for the future.
Keywords: CRISPR; cas9; sgRNA; genome, ethics; patent; off-target; transfection;
therapeutics; genetic editing.
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Abreviatura e Acrónimos
A – Adenina
A1ATD – Alpha-1-antitrypsin Deficiency
AdVs – Adenoviral Vectors
C – Citosina
CAR – Chimeric Antigen Receptors
Cas9n – Cas9 nicase
CccDNA – Covalently Closed Circular DNA
CCR5 – Chemokine receptor 5
CFTR – Cystic Fibrosis Transmembrane Conductance Regulator
CGD – Chronic Granulomatous Disease
CRISPR – Clustered Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats
CRISPRi – CRISPR interference
CrygC – Gene Crystallin Gama C
dCas9 – “dead” Cas9
DMD – Distrofia Muscular de Duchenne
DNA – Ácido Desoxirribonucleico
DSB – Double Strand Break
ECJ – European Court of Justice
EGFP – Enhanced Green Fluorescent Protein
G – Guanina
GMO – Organismos Geneticamente Modificados
gRNA – guide RNA
HDR – Homology Directed Repair
HIV – Human Immunodeficiency Virus
IDLVs – Integrase-defective Lentiviral Vectors
iPSCs – Células Estaminais Pluripotentes Induzidas
KRAB – Repressor Kruppel-associated box
LDL – Low Density Lipoprotein
LTRs – Long Terminal Repeats
NHEJ – Non-homologous End-joining
PAM – Protospacer Adjacent Motif
PCSK9 – Proprotein convertase subtilisin/ kexin type 9
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Pre-crRNA – CRISPR RNA precursor
RNA – Ácido ribonucleico
RNase – Ribonuclease
SCD – Sickle Cell Disease
sgRNA – Single guide RNA
SpCas9 – Streptococcus pyogenes Cas9
SSB – Single Strand Break
T – Timina
T7E1 – T7 Endonuclease 1
TALENs – Transcription activator-like effectors
TRAC – T-cell Receptor Alpha Chain
tracrRNA – Trans-activating CRISPR RNA
U – Uracilo
ZFNs – Zinc Finger Nucleases
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1. Nota Introdutória
A ciência é uma área em constante evolução e atualização. No que diz respeito à
saúde, desde há muito que existe o sonho longínquo de se encontrar “uma cura para cada
pessoa” e a manipulação genética é um dos caminhos com maior possibilidade de atingir esse
sonho. Mas, a medicina é apenas uma das muitas áreas que podem vir a retirar vantagens
desta abordagem, áreas essas que têm todas uma forte ligação com a biotecnologia, pois, é a
partir dos conhecimentos e das novas descobertas nesta área da investigação que surgem as
bases para uma aplicação multifacetada da técnica que aqui vai ser abordada.
A modificação genética assenta num passo inicial fundamental, a ocorrência de uma
quebra na dupla cadeia de DNA, ou DSB, num local previamente determinado (Sander &
Joung, 2014). A partir desta quebra os mecanismos naturais de reparação das células vão
entrar em ação e tentar corrigir esta falha utilizando um de dois mecanismos diferentes, a
NHEJ (non-homologous end-joining), ou a HDR (homology-directed repair). A NHEJ dá-se com
uma maior frequência e associada à inexistência de um template de correção, mas é uma via
com uma maior tendência para a ocorrência de erros, sob a forma de mutações de
inserção/deleção, que conforme as situações podem acabar por ser benéficos, ou até mesmo
o objetivo final. A HDR tem uma taxa de ocorrência mais baixa e variável, mas devido ao
facto de permitir executar modificações específicas e precisas, através da utilização de um
template de reparação que pode ser adicionado exogenamente, é a via preferida (Figura 1).
Esta via, no entanto, encontra-se ativa maioritariamente em células com capacidade de
divisão, mais especificamente, no fim da fase S e na fase G2 (Pellagatti, Dolatshad, Yip,
Valletta, & Boultwood, 2016; Peng, Lin, & Li, 2016), e a sua eficácia pode ter níveis variados
conforme o tipo de célula, o local alvo e até mesmo o template (Brookhouser, Raman, Potts,
& Brafman, 2017; LaFountaine, Fathe, & Smyth, 2015; Pellagatti et al., 2016; Ran et al., 2013).
Figura 1 – As DSB
podem ser reparadas através
de dois mecanismos, a NHEJ,
que pode resultar em
inserções ou deleções, ou a
HDR a partir de um template
de reparação. (Adaptado de
Brookhouser et al., 2017).
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Ao longo de um passado relativamente recente, têm-se vindo a descobrir e a melhorar
várias tecnologias de manipulação genética que tiram partido destes mecanismos de
reparação celular, entre as quais se podem salientar os Zinc-finger nucleases (ZFNs), os
Transcription activator-like effector nucleases (TALENs),que utilizam ligações proteína-
DNA para atingir o local alvo, e, mais recentemente, o foco principal desta monografia, as
Clustered regularly interspaced short palindromic repeats (CRISPR) que, por sua vez,
se baseia nas regras das ligações entre pares de bases Watson-Crick, nomeadamente, RNA-
DNA.
A primeira descoberta diretamente relacionada com o CRISPR surgiu no ano de 1987,
num trabalho de Y. Ishino et al em que se fala do que mais tarde se veio a chamar os
protospacers (Pellagatti et al., 2016; Quétier, 2016; Singh, Braddick, & Dhar, 2017).
O CRISPR encontra-se num loco do DNA de procariotas com a função de sistema
imunitário adaptativo, tendo sido inicialmente detetado na Escherichia coli (E. Coli) (Doudna &
Charpentier, 2014; Rath, Amlinger, Rath, & Lundgren, 2015). Mais especificamente, este
sistema trata-se de um conjunto de repetições de sequências curtas separadas por spacers,
estes com sequências únicas, que são elementos de reconhecimento do local de ação (Rath
et al., 2015), ou seja, um novo ataque à célula levará à aquisição de um spacer em específico
capaz de reconhecer o novo inimigo.
Um facto interessante é que, devido ao facto de o DNA ser modificado aquando da
aquisição de novos spacers, esta informação vai ser transmitida às gerações seguintes, e visto
que os spacers são adicionados sempre no mesmo lado do CRISPR, este torna-se, na
verdade, num registo cronológico dos ataques sofridos pela célula presente e suas
ancestrais (LaFountaine et al., 2015; Rath et al., 2015).
Para atuar, o CRISPR necessita, para além dos spacers, de genes associados a este, os
chamados CRISPR-associated (cas) genes, adjacentes ao próprio CRISPR e que codificam
proteínas (nucleases, helicases, etc.) essenciais à resposta imune (Rath et al., 2015; Singh et
al., 2017), daí ter surgido a nomenclatura CRISPR-Cas.
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2. Tipos de CRISPR
O sistema CRISPR não se trata de uma estrutura rígida, sendo que, dentro do mesmo
genoma, podem existir vários sistemas CRISPR com variações entre si, nomeadamente, no
número e comprimento dos spacers e das sequências de repeats, e também nas proteínas cas
(Rath et al., 2015).
Apesar de todas estas variações, foi atingido um consenso geral de classificação dos
sistemas CRISPR-Cas em três tipos, cada um com diversos subgrupos (Doudna &
Charpentier, 2014; Pellagatti et al., 2016; Rath et al., 2015; Singh et al., 2017).
O Tipo I apresenta subgrupos que vão desde o I-A ao I-F, em que todos estes
apresentam cas1, cas2, cas3 e um complexo cascata-like com função de localizar e ligar o
CRISPR RNA (crRNA) ao alvo. O cas3 é a proteína representativa deste tipo,
apresentando atividades de helicase e nuclease (Rath et al., 2015; Singh et al., 2017).
O Tipo II é o melhor caracterizado dos três e também o mais utilizado pelos
laboratórios, devido ao facto de apenas necessitar de uma única proteína cas para exercer a
sua ação. Este subdividide-se em II-A, II-B e II-C onde se encontram as proteínas cas1, cas2,
cas9 e, por vezes, uma outra proteína, a csn2 ou a cas4 que se encontram, respetivamente,
nos subtipos II-A e II-B, mas não no II-C. De todas estas, a proteína representativa deste tipo
é a cas9, cuja estrutura vai ser analisada mais à frente, envolvida na capacidade adaptativa do
sistema, no processamento do crRNA e na rutura do DNA alvo (Biolabs, 2007; Peng et al.,
2016; Rath et al., 2015; Singh et al., 2017).
Por fim, o Tipo III apresenta como proteína representativa o cas10, cuja função em
concreto ainda não é conhecida, e está subdividido em III-A e III-B. Este último tem uma
diferença que vale a pena salientar em relação aos dois anteriores, pois, enquanto esses
apenas atuam em DNA, o Tipo III atinge tanto DNA como RNA (Rath et al., 2015; Singh et
al., 2017).
No que diz respeito à sua localização no mundo biológico, o único que se encontra
exclusivamente em bactérias é o Tipo II, dado que os tipos I e III podem ser encontrados
tanto em bactérias como nas archaea (Rath et al., 2015).
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3. Como atua o CRISPR
3.1 Na Natureza
O processo de ação do CRISPR, enquanto parte do sistema imunitário, pode ser
dividido em três fases: adaptação, expressão e interferência (Rath et al., 2015; Singh et al.,
2017).
A adaptação é a fase em que se dá a incorporação de novos spacers, seguida da
expressão dos genes cas e da transcrição do CRISPR num CRISPR RNA precursor, o pre-
crRNA, que por sua vez vai passar, através de um processo de maturação, a crRNA devido à
ação das proteínas codificadas pelos cas, sendo cada um destes crRNA composto por um
repeat e um spacer. Por fim, dá-se o reconhecimento do ácido nucleico alvo por
emparelhamento de bases, e sua consequente destruição através da ação conjunta do
CRISPR e das endonucleases cas, que vão provocar uma DSB no DNA do patógeno em
causa, impedindo desta forma que este se possa integrar e replicar no genoma da célula, o
que constitui a interferência (Doudna & Charpentier, 2014; Rath et al., 2015).
Entrando agora em maior pormenor, a fase de Adaptação, por ser a fase de aquisição
de spacers, é a responsável pela memória genética do sistema. Já no que toca ao processo de
aquisição desses mesmos spacers, é importante explicitar que existem, na verdade, dois
tipos: a aquisição naive, quando se trata do primeiro contacto com o organismo patogénico,
e a primed, quando já houve uma tentativa prévia de invasão por parte desse organismo e
subsequente contato com o CRISPR. De uma maneira sucinta, o mecanismo para a
incorporação dos spacers passa pela seleção dos protospacers, produção do material para os
spacers, integração destes no CRISPR e síntese de uma nova repeat. Da mesma maneira,
também pode ocorrer a eliminação de spacers com o objetivo de controlar o tamanho do
CRISPR, apesar de este se tratar de um evento meramente ocasional sobre o qual ainda não
há muita informação (Rath et al., 2015).
Os fatores mais importantes em todo o processo de incorporação são as proteínas
cas1 e cas2, cujo papel já foi confirmado tanto por experiências de sobre-expressão, em
ausência de todas as outras, em que se verificou a persistência da incorporação dos spacers,
como por experiências de modificação do local ativo, nomeadamente da cas1, em que se
deixou de verificar essa mesma incorporação. Este último caso deve-se ao facto de ser
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necessária a formação de um complexo entre um dímero da cas2 e dois da cas1 para que a
aquisição de spacers se dê com sucesso (Rath et al., 2015).
Ora, logo para começar, surge a questão “Como é feita a seleção do material que
constitui os spacers Será escolhido ao acaso, ou será que existem regras?”, cuja resposta é, na
verdade, simples. Existem de facto “guias” a indicar a localização do material apropriado a
que se deu o nome de Protospacer Adjacente Motif (PAM), que, como a própria
denominação indica, não são mais que sequências curtas, regra geral de 3 nucleótidos, que se
encontram ao lado do local a atingir e que, inicialmente, se julgavam ter um papel a
desempenhar apenas na fase da Interferência, mas que, na realidade, possuem também
uma função fundamental na distinção do self e do non-self. Este reconhecimento das PAM
pode ser efetuado por componentes diferentes, conforme o tipo de CRISPR em causa,
como por exemplo o cas9 no tipo II-A e o complexo cas1-cas2 no I-E. No entanto, após a
sua localização, ainda não se sabe se o protospacer surge a partir de uma cópia do material
patogénico ou se é retirado deste através de corte (Rath et al., 2015; Singh et al., 2017).
O passo seguinte é então a integração do spacer no CRISPR, sendo que também esta
está sujeita a regras, pois, como já foi referido anteriormente, em geral os spacers são
adicionados no mesmo lado e no mesmo sentido. Esta organização deve-se sobretudo à
natureza palindrómica de muitos dos repeats no CRISPR, que vai levar à formação de
estruturas cruciformes que, por sua vez, vão ser o alvo da atividade nuclease da cas1.
Curiosamente, verificou-se que esta integração dos spacers também pode ocorrer noutras
sequências que formem estruturas cruciformes, mesmo que não sejam repeats, o que nos
leva a concluir que a integração depende não apenas de uma sequência em concreto, mas
também da sua estrutura (Rath et al., 2015).
Vale a pena salientar que, no caso de haver uma aquisição primed de spacers, até
agora apenas detetada em CRISPRs do Tipo I, foi provada a existência de uma ligação entre
o processo de integração e os mecanismos da fase de interferência, que apresenta duas
importantes vantagens em relação aos restantes casos, pois leva a uma aquisição mais
acelerada de spacers, o que, consequentemente, proporciona um aumento da
resistência contra os patógenos em questão e dificulta a evolução de mutantes do
patógeno, visto que seria necessário alterar vários locais de uma vez (Rath et al., 2015).
Passando à fase da Expressão, esta começa com a formação da longa transcrição
primária que é o pre-crRNA, que pode conter várias estruturas hairpin caso o CRISPR
apresente repeats palindrómicos e que vai ser processado em várias subunidades de crRNA,
cada uma correspondendo a um spacer rodeado por partes de repeats.
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A grande diferença entre os três tipos de CRISPR, nesta fase, reside na proteína cas
responsável pelo processo de maturação, pois, mesmo que co-existam vários tipos no
mesmo organismo, estes não são capazes de processar o pre-crRNA uns dos outros. No
entanto, posto isto, não quer dizer que não existam semelhanças. De facto, todos os Tipos I
e III, com exceção do I-C, utilizam a proteína cas6 no processamento (Rath et al., 2015). Já
nos Tipos II encontra-se algo bastante diferente, verificando-se uma dependência da
presença da, ribonuclease III, ou RNase III, do hospedeiro, do RNA trans-ativador, ou
tracrRNA, que se liga ao crRNA por emparelhamento de bases, e também da proteína
cas9, cujo papel ainda não se sabe ao certo (Doudna & Charpentier, 2014; Rath et al., 2015).
Finalmente, na fase de Interferência, esta tem como base a localização, por parte
do crRNA ligado a proteínas cas, do local correspondente ao spacer, ligação ao mesmo e
sua subsequente destruição, destruição essa levada a cabo por algumas cas em específico.
No Tipo I a degradação da dupla cadeia alvo dá-se pela ação conjunta das funções
nuclease e helicase da cas3, enquanto que o Tipo II recorre apenas à proteína cas9, não só
para a degradação, mas para todo o mecanismo de interferência, com a ainda maior
diferença que, para além do crRNA, este tipo requere também o tracrRNA, ligado à cas9.
Isto é possível devido à identificação de dois lobos separados na estrutura da cas9, um para
o reconhecimento, ou seja, responsável pela ligação do crRNA ao DNA do patógeno, e
outro com atividade nuclease, concedida pelos domínios HNH e RuvC que clivam as
cadeias complementares e não-complementares do alvo, respetivamente (Doudna &
Charpentier, 2014; Pellagatti et al., 2016; Rath et al., 2015; Singh et al., 2017).
Tanto no Tipo I como no Tipo II é essencial a presença de uma sequência PAM, sendo
que esta ativa a deteção non-self de modo a evitar que o sistema alveje o próprio CRISPR, e
também a existência de uma complementaridade crRNA-spacer perfeita na região seed,
adjacente à PAM, apesar de ser passível de ocorrerem algumas falhas na complementaridade
fora da região seed sem que haja modificação da Interferência. Já nos CRISPR do Tipo III não
foram detetadas quaisquer PAM, sendo a descriminação conseguida através da extensão da
ligação do crRNA para uma região de repeat do hospedeiro, o que resulta numa self-
inactivation (Rath et al., 2015; Singh et al., 2017).
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3.2 No Laboratório
Tendo observado tudo isto os cientistas aperceberam-se do potencial biotecnológico
deste sistema. Aliás, o nível de interesse que levou a um aumento exponencial de
conhecimento relativo a este tema pode ser facilmente traduzido através do número de
artigos científicos publicados entre 2013 e agosto de 2015, que, segundo a base de dados
Web of Science, atingiram os 1415 com o termo CRSPR-Cas9 no título ou no abstract
(Quétier 2016).
De todos os tipos de CRISPR já referidos, como foi dito anteriormente, o mais
utilizado em laboratório é o Tipo II, aliado à cas9. Para que possa ser utilizado em células
eucariotas, para além da cas9, é ainda necessário fornecer o crRNA e o tracrRNa, que,
convenientemente, podem ser fundidos num guia-único de RNA, o sgRNA.
Tendo todos os elementos é possível redirecionar a ação nuclease da cas9 para
qualquer local, sendo para tal apenas necessário alterar a sequência guia de
aproximadamente 20-pb, dentro do sgRNA, ou seja, deverá ser originada uma DSB no local
de ligação entre o correspondente à sequência-guia e uma determinada PAM (Doudna &
Charpentier, 2014; LaFountaine et al., 2015; Pellagatti et al., 2016; Plaza Reyes & Lanner,
2017; Rath et al., 2015; Rots, 2016; Singh et al., 2017).
É importante realçar que a cada ortólogo do CRSIPR corresponde uma PAM diferente,
no caso da cas9 da Streptococcus pyogenes, ou SpCas9, 5’-NGG-3’ ou 5’-NAG-3’, sendo um
fator a ter conta de acordo com o local que se pretende atingir (Guha, Wai, & Hausner,
2017; Pellagatti et al., 2016; Peng et al., 2016; Ran et al., 2013; Sander & Joung, 2014; Singh et
al., 2017). Para além da localização, as PAM também estão envolvidas na indução da alteração
conformacional que permite à cas9 passar da ligação à clivagem (Pellagatti et al., 2016).
Figura 2 – Fusão do
tracrRNA com o
crRNA, dando origem
ao sgRNA. (Adaptado
de Doudna &
Charpentier, 2014).
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4. Comparação com outras técnicas
Como foi referido anteriormente, e ainda sem entrar nas diferenças específicas entre
algumas técnicas, o CRISPR destaca-se das demais pela base do seu funcionamento.
Enquanto que métodos anteriores utilizavam a ligação de proteínas a locais indutores de
DSBs, as ligações no CRISPR utilizam RNA que emparelha com o DNA de acordo com as
regras Watson-Crick. Por si só, esta diferença já é o suficiente para fazer com que, logo à
partida, o CRISPR seja uma técnica mais fácil de desenhar, mais específica e mais
eficiente (Ran et al., 2013).
4.1 TALEN
Os TALEN são constituídos por quatro proteínas efetoras TAL que, devido a domínios
específicos nas suas cadeias de aminoácidos, têm a capacidade de se ligar a cada um dos
aminoácidos essenciais (guanina, adenina, citosina e timina). Esta capacidade de se ligar
individualmente faz com que seja possível construir um TALE capaz de reconhecer qualquer
sequência de DNA desejada. Apenas depois desta descoberta é que os TALE foram
associados a uma nuclease, a Fok1, de forma a conjugar a capacidade de reconhecimento
com a indução de DSBs (LaFountaine et al., 2015).
É precisamente devido à Fok1 que surge a primeira desvantagem do TALEN em
comparação com o CRISPR, pois, esta trata-se de uma enzima que, para provocar uma DSB,
precisa de atuar como um dímero, em que cada uma das partes vai cortar uma das cadeias
do DNA. Isto, por si só, não coloca problema, mas torna o processo de desenhar um novo
TALEN mais complicado e moroso (LaFountaine et al., 2015; Ran et al., 2013).
O próprio local onde se dá a DSB não está completamente definido no caso dos
TALEN, podendo ocorrer a clivagem não-específica no espaço, entre os pares de bases 12-
24, que liga os dois monómeros. Já o mesmo não se verifica no caso do CRISPR, e a título de
exemplo, na cas9 do Wild-Type da SpCas9, sabe-se que o corte se dá entre as bases 17-18
(Ran et al., 2013).
Por fim, e não querendo desvalorizar a eficácia dos TALEN, não posso deixar de
referir a grande vantagem que o CRISPR apresenta, comparativamente. Devido à
simplicidade do processo de desenho de novas sequências de reconhecimento e de toda a
técnica do CRISPR, é possível proceder à clivagem de vários locais diferentes ao mesmo
tempo, sendo para tal apenas necessário fornecer as sequências guia.
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4.2 ZNF
Os ZNF são obtidos através da fusão de dois componentes, uma sequência com 3 a 6
proteínas zinc finger, bastante comuns em células eucariotas, e a nuclease Fok1. A
característica que levou a que estas proteínas fossem associadas à modificação genética foi a
sua elevada especificidade, pois um zinc finger é capaz de reconhecer uma sequência
específica de 3 pares de bases. Assim sendo, criaram-se zinc fingers para reconhecer as
sequências mais comuns e, a partir daí, contruíram-se sequências mais longas para serem
reconhecidas. De maneira semelhante aos TALEN, com a adição da Fok1, torna-se então
possível originar DSB nos locais reconhecidos pelos zinc finger (LaFountaine et al., 2015).
As desvantagens desta técnica em relação ao CRISPR são, na verdade, bastante
semelhantes às dos TALEN, mas, devido a esta ter sido uma das primeiras e mais conhecidas
técnicas na área da manipulação genética, optei por dar-lhe um certo destaque. A sua grande
desvantagem prende-se sobretudo com a dificuldade e tempo que demora a criar um novo
zinc finger, podendo esse tempo chegar, por vezes, a meses de preparação (Merkert &
Martin, 2016). Provavelmente esta grande diferença terá ajudado ainda mais a realçar o quão
simples é o CRISPR, por comparação.
Para além disso, como cada zinc finger reconhece sequências de três pares de bases e
apresenta uma maior afinidade para locais ricos em guanina, existem sequências no
organismo que não são reconhecíveis por nenhum zinc finger (Brookhouser et al., 2017).
Como seria de esperar, estes factos tornam a técnica desencorajadora, tendo levado
vários laboratórios a optarem por outros caminhos.
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5. Limitações do CRISPR
Apesar de todas as suas vantagens em relação a técnicas anteriores, também o CRISPR
apresenta limitações e aspetos passíveis de melhoramento.
5.1 PAM
A mais relevante dessas limitações, se bem que não se trata da mais restritiva, (Guha et
al., 2017) é, sem dúvida, a necessidade de uma PAM (Biolabs, 2007; Brookhouser et al.,
2017; Ran et al., 2013; Rath et al., 2015; Sander & Joung, 2014). Como foi exposto
anteriormente, a PAM é uma sequência que se encontra adjacente ao local alvo e sem a qual,
mesmo que se verifique uma correspondência total entre a sgRNA e uma sequência no
DNA da célula alvo, não se verifica a DSB (Biolabs, 2007; Doudna & Charpentier, 2014).
Existe, obviamente, uma certa margem para erro dado que a cas9 continua a clivar mesmo
perante cinco bases mal emparelhadas na sequência alvo, e uma base na PAM, no máximo
(Biolabs, 2007; Peng et al., 2016).
Não posso deixar de relembrar que, no diz respeito à PAM, esta não é sempre a
mesma, variando conforme a escolha do ortólogo da cas9. Para além da diferença na PAM, a
atividade do próprio sistema CRISPR também vai variar conforme a espécie (Guha et al.,
2017; Peng et al., 2016; Ran et al., 2013; Sander & Joung, 2014).
5.2 Design de sgRNA
O design dos sgRNA também é um dos maiores focos de preocupação, pois, foi
provado que, mesmo na presença de uma PAM, determinados sgRNA apresentavam níveis
de atividade diferentes. Após várias experiências e ensaios de screening, identificaram-se
várias características, nomeadamente, relativas ao conteúdo em determinados nucleótidos
que podem fazer a diferença. Posto isto, descobriu-se que, idealmente, a guanina (G) deve
encontrar-se nos pares de bases mais próximos da PAM, enquanto que, no caso da citosina
(C), se verifica o oposto. O uracilo (U) provoca um baixo nível de expressão dos sgRNA,
portanto, é preferível que não se tenha timina (T), pelo menos, nos quatro pares de bases
diretamente adjacentes à PAM. A adenina (A), por sua vez, é preferível encontrar-se na
zona mais central do sgRNA, mas, de uma maneira geral, verificou-se que os sgRNAs mais
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estáveis e eficientes são aqueles que apresentam níveis elevados de G e reduzidos de A
(Peng et al., 2016).
5.3 Transferência do sistema
Depois de criar o sgRNA ideal, o passo importante seguinte é levá-lo ao local
pretendido da melhor maneira possível, por isso desde cedo que se começou a analisar
vários métodos de transfeção diferentes. Disto são exemplos a eletroporação, a
nucleofeção e a transfeção mediada pela Lipofetamina de plasmídeos (Peng et al., 2016;
Sander & Joung, 2014). No entanto, esta metodologia apresentava a desvantagem de permitir
a ocorrência da inserção, ao acaso, de todo, ou parte, do plasmídeo no genoma da célula
alvo (Peng et al., 2016), para além de também poder haver uma persistência do DNA do
plasmídeo, e dos componentes nele inseridos, na célula, dando origem a um aumento das
mutações off-target (Peng et al., 2016; Sander & Joung, 2014).
Para além destas medidas existe também a hipótese de se realizar a transferência
genética através de vetores virais, que apresentam a grande vantagem de permitir
controlar a quantidade de DNA transferido, o que levará a uma maior eficácia e também a
uma diminuição da eventual citotoxicidade (Peng et al., 2016). São exemplos disso a
utilização de IDLVs (integrase-defective lentiviral vectors), que possuem uma grande
capacidade de empacotamento, permitindo a transferência de sgRNAs de maiores
dimensões, ou em maior quantidade (Peng et al., 2016; Wang et al., 2015) e de AdVs
(adenoviral vectors), cuja estrutura do DNA tem a vantagem de diminuir possíveis
interações com locais off-target, o que faz com haja uma inserção mais precisa do material
exógeno (Holkers et al., 2014; Peng et al., 2016).
5.4 Proporção NHEJ:HDR
Dentro da própria biologia da célula existe um fator que limita, não a ocorrência de
mutações per se, mas o processo pelo qual elas se dão. Como foi dito anteriormente, os
mecanismos de reparação da célula podem envolver o NHEJ ou a HDR, e apesar de o
NHEJ também ser bastante útil quando apenas se pretende provocar uma alteração ao acaso
numa sequência alvo, quando se pretende que se essa alteração provoque uma modificação
específica, o NHEJ deixa de ser uma via viável. O que acontece muitas vezes na manipulação
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genética é que o objetivo é, justamente, o de provocar alterações específicas e, por isso,
nessa ótica, a via de reparação pretendida é a HDR. No entanto, esta trata-se da via que
ocorre com menor frequência a nível celular portanto, surgiu a necessidade de desenvolver
medidas que aumentassem essa mesma frequência (Peng et al., 2016).
Existem factos que sugerem que estas duas vias são, na verdade, competitivas, na
medida em que a diminuição da ocorrência da NHEJ levou, em várias situações, ao aumento
da HDR. Nomeadamente, o uso do inibidor Scr7, cujo alvo é a DNA ligase IV, um
componente essencial para o funcionamento da NHEJ, levou a um aumento de 19 vezes mais
da frequência da HDR (Chu et al., 2015; Maruyama et al., 2016; Peng et al., 2016; Vartak &
Raghavan, 2015).
Apesar de esta técnica ter sucesso, dado que consegue aumentar os níveis de HDR, a
interferência com componentes para a NHEJ pode ter efeitos nefastos para a célula (Peng et
al., 2016). Uma alternativa a estes métodos prende-se com o conhecimento e sincronização
da transfeção do sistema, dos períodos celulares, referidos anteriormente, em que a
frequência de HDR se encontra mais elevada (Lin, Staahl, Alla, & Doudna, 2014; Peng et al.,
2016).
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6. Deteção e prevenção de mutações off-target
Uma preocupação comum a todas as técnicas de modificação genética é a
especificidade, aspeto esse que está diretamente relacionado com um outro: a possibilidade
de mutações off-target e os respetivos efeitos secundários. No que diz respeito ao CRISPR,
em específico, um dos métodos mais utilizados para detetar a ocorrência de mutações, tanto
on como off-target, é o ensaio T7 Endonuclease1 (T7E1), em que se dá a digestão dos locais
com modificações, por parte dessa mesma nuclease, sendo os fragmentos, posteriormente,
detetados por eletroforese (Biolabs, 2007). Este método apresenta, no entanto, a
desvantagem de apenas detetar mutações que ocorram com frequências superiores a 2-5%
(Sander & Joung, 2014) e, por isso, começaram a procurar-se novas alternativas.
É possível encontrar um leque de opiniões muito variadas, e até contraditórias,
relativamente à percentagem de mutações off-target que se podem esperar. Isto deve-se ao
facto de diferentes sgRNAs terem propensões variadas para originarem mutações off-target,
indo desde o zero a percentagens muito elevadas. Muitos estudos tiraram proveito
justamente do tipo de sgRNA que tinha a maior percentagem de off-target para analisar quais
as melhores metodologias para detetar essas mutações (O’Geen, Yu, & Segal, 2015).
Em vez de se limitarem a detetar falhas que já tenham acontecido criaram-se
bibliotecas e várias ferramentas computacionais, como é o caso da CRISPR Design (Ran et
al., 2013), E-CRISPR, ZiFiT (Peng et al., 2016; Singh et al., 2017), entre outras, as quais
permitem conhecer previamente vários parâmetros, como, por exemplo, o local alvo mais
indicado dada uma determinada sequência guia, e, dentro desses parâmetros, encontra-se,
também, a probabilidade de mutações off-target, seja para um tipo de tecido, uma linha
celular ou uma sequência de bases em concreto, podendo até fazer uma distinção entre a
adequação de CRISPRs de espécies diferentes (Quétier, 2016; Sander & Joung, 2014).
Para além destas ferramentas, foram feitas alterações diretamente nos sgRNA numa
tentativa de diminuir os off-target sem por em causa a percentagem de mutações on-target.,
Uma das primeiras alterações que se realizaram foi a adição de GG no terminal 5’, o que
efetivamente originou uma diminuição de off-target em proporção com o on, mas que, em
termos de valores absolutos, também diminuiu os valores de on-target (Sander & Joung,
2014).
Outra alteração, e uma das mais conhecidas, foi a conversão da ação nuclease, da
SpCas9, em nicase através da indução de uma mutação, D10A no domínio RuvC, ou H840A
no domínio HNH. Com a ação conjunta desta cas9 nicase (cas9n) e um par de sgRNAs é
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possível provocar, simultaneamente, SSB (single-strand break) em locais adjacentes de cada
cadeia do DNA alvo, e que apenas levaram a uma DSB quando essas se encontrem dentro
de uma determinada distância uma da outra. Com isto, dobram-se o número de bases a ser
reconhecidas no alvo, o que faz com que haja um aumento significativo da especificidade da
técnica e, por sua vez, uma grande redução (50-1000x) de off-targets (Jo, Suresh, Kim, &
Ramakrishna, 2015; Peng et al., 2016; Ran et al., 2013, 2014; Sander & Joung, 2014).
Uma outra alteração importante é o uso de sgRNAs truncados, isto é, sgRNAs com
um comprimento entre 17-18 pares de bases devido a uma redução no terminal 5’. Estes
sgRNAs acabaram por demonstrar também uma redução de cerca de 5000x na frequência
de off-targets, sem afetar os níveis de on-target (Fu et al., 2014; Guha et al., 2017; Jo et al.,
2015; Peng et al., 2016; Sander & Joung, 2014).
Com o objetivo de diminuir ainda mais as mutações off-target surgiu a ideia de,
havendo já duas técnicas com resultados tão positivos, fazer-se uma conjugação destas, ou
seja, utilizar dois sgRNAs truncados e a cas9n. Os resultados desta combinação foram,
também eles, positivos, tendo-se verificado o aumento pretendido na diminuição de off-
targets (Jo et al., 2015; Peng et al., 2016).
Recentemente, atingiu-se uma nova inovação com o isolamento da proteína Cpf1 do
CRISPR, que se trata de uma nuclease não-cas9. A Cpf1, ao contrário das proteínas da cas9,
provoca staggered DSB e requer sequências PAM ricas em T, o que faz com que seja uma
boa técnica para atingir partes do genoma que sejam também ricas em T (Guha et al., 2017).
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7. Aplicações/Potenciais
O CRISPR, sendo a técnica versátil que é, já demonstrou a sua utilidade num leque
muito variado de aplicações, indo desde a saúde até à agricultura. Neste tópico tenciono
salientar apenas algumas das aplicações que são alvo de maior atenção.
7.1 Terapêuticas
Existem vários casos de situações clínicas para as quais o CRISPR já foi avaliado, sendo
que se pode dizer que existe uma tendência clara no diz respeito ao tratamento de doenças
monogénicas hereditárias e terapias antivirais (LaFountaine et al., 2015).
Começando pelas doenças monogénicas, no caso da A1ATD (Alpha-1-antitrypsin
deficiency), uma doença em que se há uma deficiência da enzima AAT, responsável por
prevenir danos no tecido respiratório dos pulmões (Alagille, 1984), e que vai ser portanto o
alvo do CRISPR, os resultados deste estudo mostraram ser tão bons, ou melhores quando
comparados com os resultados obtidos com TALEN (LaFountaine et al., 2015).
Na cistite fibrosa ocorre uma mutação no CFTR (cystic fibrosis transmembrane
conductance receptor), um canal iónico que regula o transporte epitelial de fluídos, no qual
ocorre uma deleção de três pares de bases que leva à sua perda de função. A perda desta
função, por sua vez, vai levar a uma acumulação de muco nos tratos pulmonar e
gastrointestinal que podem originar sintomas como dificuldade respiratória e várias infeções
(Savic & Schwank, 2016). Para este estudo isolaram-se células estaminais intestinais e
expandiram-se para culturas organoides, às quais foi depois adicionado o sgRNA juntamente
com uma com um template, cujos alvos seriam, então, o exão e o intrão 11 do gene do
CFTR, para se dar a reparação por HDR. Os resultados do estudo foram positivos, tendo-se
verificado poucos efeitos off-target (Go & Stottmann, 2016; LaFountaine et al., 2015; Savic &
Schwank, 2016).
Ainda dentro das doenças monogénicas temos o caso da DMD (Duchenne’s Muscular
Dystrophy), uma doença fatal em que mutações no gene da distrofina, que codifica uma
proteína responsável pela manutenção da integridade das fibras musculares, levam ao
enfraquecimento dos músculos cardíaco, respiratório e esquelético. Esta doença foi alvo de
vários estudos com aproximações diferentes. Num desses estudos, pretendeu-se corrigir os
genes com falta do exão 44 através de exon knockin, tirando partido, mais uma vez, da
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HDR com a adição de um template de correção (Go & Stottmann, 2016; Savic & Schwank,
2016).
Num outro estudo optou-se por gerar, tanto deleções únicas como múltiplas de
exões, numa tentativa de recuperar o quadro de leitura do gene da distrofina. Estas deleções
múltiplas possibilitaram a excisão de “hot spot” mutacional, entre os exões 45 e 55, onde se
verificavam mais de 60% das mutações responsáveis pela doença, e os resultados foram
positivos, na medida em que se recuperou a expressão e a função do gene (Savic & Schwank,
2016).
Outros grupos de investigação tiraram partido do facto de a deleção do exão 23
mutante originar exon-skipping e restauração do quadro de leitura, sendo observada uma
maior eficácia de targeting devido ao facto de não se recorrer à HDR. Com isto, verificou-se
um melhoramento significativo da força muscular, apesar de ainda serem necessários mais
estudos antes que se possa passar à aplicação terapêutica (Munshi, 2016).
As Cataratas, uma doença ótica em que há perda gradual da visão devido à
opacificação da lente (The National Eye Institute (NEI), 2009), também foram alvo de
estudos, mais concretamente, a mutação que leva à perda de função do gene Crygc,
responsável pela doença. Para este estudo, de maneira semelhante aos exemplos anteriores,
co-injetaram a cas9 com um sgRNA, e, numa segunda experiência, adicionaram ainda um
oligonucleótido do wild-type para servir como template. Os resultados também foram
positivos, e nos casos em que se obteve a cura, também se verificou que o gene corrigido
era passado às gerações seguintes (Go & Stottmann, 2016; LaFountaine et al., 2015; Savic &
Schwank, 2016).
As mais conhecidas técnicas de manipulação genética foram avaliadas a nível de várias
condições hematológicas, como é o caso da anemia falciforme ou SCD (sickle cell
disease), da anemia de Fanconi, Hemofilias A e B, a CGD (chronic granulomatous disease),
entre outras (Pellagatti et al., 2016), mas no que ao CRISPR diz respeito quero apenas referir
a β-talassemia.
A β-talassemia é uma doença hematológica que se deve a mutações no gene
responsável pela β-globina, o HBB (Conditions, 2017). Para esta condição foram realizados
vários estudos (Go & Stottmann, 2016; Savic & Schwank, 2016; Song et al., 2015; Xie et al.,
2014) em que se procurou reparar o gene através do CRISPR, sendo que, num desses
estudos, se tirou partido das propriedades das iPSCs (induced pluripotent stem cells) para, em
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conjunto com a HDR, corrigir a mutação do gene HBB. Os resultados foram bastante
positivos, tendo em conta que, para além de as células reparadas apresentarem um cariótipo
normal e pluripotência, também demonstraram um aumento na capacidade de diferenciação
hematopoiética (Go & Stottmann, 2016; Song et al., 2015).
Uma outra área terapêutica onde o CRISPR já deu provas do seu valor potencial, é o
tratamento de infeções virais, nomeadamente, de entre os estudos existentes, pretendo
referir os casos do HIV e da Hepatite B.
O HIV (human immunodeficiency virus), mais especificamente o HIV-1, é um vírus que
infecta células imunitárias, integrando-se no seu genoma para mais tarde este ser transcrito,
levando à expressão viral e propagação do vírus no organismo, mas que nem sempre
provoca infeção ativa imediatamente, podendo ficar num estado de latência caso as células
em que se encontrar não forem recrutadas para exercer ação. A existência deste estado de
latência é uma das principais razões para a ineficácia dos antivirais atuais na eliminação total
do vírus, pois permite ao vírus subsistir sem ser detetado (Adoga & Pennap, 2011;
Thompson & Shalit, 2015). Tendo em conta isto, foram feitas duas aproximações para
aplicação do CRISPR.
Numa aproximação procurou-se atingir as LTRs (long terminal repeats), que são
sequências muito conservadas no HIV-1, nas células T CD4+ tendo-se verificado que houve
uma redução na produção do vírus e a eliminação daqueles que se encontravam em estado
de latência. Nestas células com possibilidade de se tornarem reservatórios, quando se
introduziu previamente um CRISPR para alvejar as LTRs, estas demonstraram ser resistentes
a novas infeções pelo HIV.
A segunda aproximação consiste em modificar o CCR5, um coreceptor necessário ao
HIV-1 para conseguir infetar as células, ou a expressão deste, de modo a conferir resistência
celular ao vírus. O resultado esperado foi obtido nas células em que o CRISPR atingiu o gene
que codifica o CCR5, e a resistência celular foi mantida até mesmo 84 dias após a transfeção
do CRISPR (Go & Stottmann, 2016; LaFountaine et al., 2015; Savic & Schwank, 2016).
Um outro vírus no qual se estudou a ação do CRISPR foi a Hepatite B com o
objetivo de ajudar principalmente os casos de indivíduos com infeção crónica. Este vírus
possui um cccDNA (covalently closed circular DNA) com elevada estabilidade, que serve de
template para a replicação viral, e que é o alvo principal das terapias atuais (Pujol, Jaspe, &
Rangel, 2011). Com o CRISPR, também numa tentativa de atingir o cccDNA, alvejaram-se
diferentes componentes como os antigénios de superfície e do core, e os genes da
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transcriptase reversa, tendo as várias experiências se revelado um sucesso (Go & Stottmann,
2016; Savic & Schwank, 2016).
Por último, queria também referir os estudos que surgiram em volta da PCSK9
(proprotein convertase subtilisin/kexin type 9), uma proteína, envolvida na homeostase do
colesterol, secretada no plasma dos hepatócitos que atua como um antagonista para os
recetores de LDL (low-density lipoprotein) limitando o uptake deste. Posto isto, alguns grupos
de investigação, procederam à aplicação do CRISPR para originar mutações através de NHEJ,
no gene que codifica esta proteína que levassem à sua não produção ou perda de função. O
que se verificou foi, justamente, uma diminuição dos níveis da proteína, uma diminuição da
função das proteínas que, efetivamente, são produzidas, um aumento dos recetores de LDL
e, como consequência de todos estes fatores, uma diminuição de aproximadamente 40% dos
níveis séricos de colesterol, sem que se tenham detetado efeitos adversos. Os resultados
destes estudos são muito significativos e devem ser tidos em conta como um meio de ajudar
a diminuir os riscos de doenças cardiovasculares (Go & Stottmann, 2016; LaFountaine et al.,
2015; Savic & Schwank, 2016).
7.2 Noutras Áreas
Fora da terapêutica o CRISPR também está a ser bastante utilizado e o seu sucesso
tem sido tal que chegou mesmo a originar uma expressão “CRISPR it!” (Dow, 2015). O
CRISPR tem estado a ser muito posto em prática principalmente no que toca à investigação
biomédica e está-se a revelar muito útil na elucidação das funções de muitos genes devido ao
facto de o CRISPR, não apresentando as limitações de técnicas anteriores, conseguir atingir
e manipular qualquer gene que seja de interesse, tendo já sido realizadas várias experiências
(Go & Stottmann, 2016).
Um exemplo das muitas experiências realizadas é o caso que diz respeito aos
recetores CAR (chimeric antigen receptors), que se encontram na superfície das células T e
permitem que se reconheçam e ataquem células cancerosas. Estes recetores eram,
inicialmente, introduzidos no genoma através de retrovírus, mas esta técnica não era muito
precisa e o gene era introduzido de maneira aleatória no genoma, o que poderia provocar
efeitos indesejados. Através da implementação do CRISPR foi possível direcionar a
introdução do CAR no gene TRAC (T-cell receptor alpha chain) e, após comparação das duas
técnicas, verificou-se que as células em que se introduziu o CAR com o CRISPR eram mais
eficazes na destruição de células tumorais. Para além disso, estas células também apresentam
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uma grande diminuição da exaustão, o fenómeno que leva as células a deixarem de
reconhecer e atacar o tumor, tornando esta técnica duplamente vantajosa (Eyquem et al.,
2017).
Relativamente a esta capacidade de manipular genes, não posso deixar de referir a
existência de um tipo modificado de CRISPR com um papel importante na regulação da
expressão genética, o CRISPRi (CRISPR interference). Este CRISPR contém uma variação da
cas9 catalicamente inativa, devido ao facto de possuir, tanto a mutação D10A no domínio
RuvC, como a H840A no domínio HNH, a chamada “dead” ou dCas9, ou seja, apesar de
continuar a atingir os alvos corretos, perdeu a capacidade de provocar a clivagem desse
DNA.
A dCas9 pode-se fundir com vários domínios efetores que lhe podem conferir
diferentes tipos de atividade, como por exemplo, a repressão da expressão de genes, através
de domínios de repressão transcricional, como o KRAB (Kruppel-associated box) da Kox1,
ou, inversamente, a sua ativação, utilizando domínios de ativação transcricional, como o
VP64 do vírus Herpes simplex VP16. Alternativamente, a dCas9 também pode ser usada
como um método de visualização de genes, ao ser fundida com o EGFP (Enhanced Green
Fluorescent Protein), sendo uma ferramenta importante que permite estudar a dinâmica e
estrutura dos cromossomas (Biolabs, 2007; Jo et al., 2015; Rath et al., 2015; Rots, 2016;
Sander & Joung, 2014).
Dadas todas as possibilidades postas em aberto pelo CRISPR e os vários métodos de
transfeção do material, os grupos de investigação aperceberam-se que, para além de estudar
as funções dos genes, era possível utilizar este sistema para produzir melhores modelos
animais de doenças e a partir daí surgiram imensos estudos. Apesar de se verificar um
melhoramento e uma evolução muito rápida dos resultados obtidos, ainda é necessário que
se continue a investigar, sempre na procura do modelo ideal (Dow, 2015; Go & Stottmann,
2016).
As propriedades da manipulação genética foram aplicadas não só em animais, mas
também em plantas, havendo quem diga que está aberto o caminho para a biologia sintética.
Pesquisou-se a manipulação do genoma de organelos, de cloroplastos, e até mesmo da
mitocôndria, apesar de esta última não ter sido bem-sucedida (Quétier, 2016).
Como referi antes, o CRISPR atingiu áreas para além da saúde pois algumas das plantas
estudadas são, na verdade, alimentícias como o tomate, a alface, a batata, entre outras
(Quétier, 2016). A tendência é que a gama de áreas em que o CRISPR demonstra a sua
utilidade esteja sempre a aumentar.
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8. Preocupações Éticas e Legais
Um tópico que eu creio ser comum a todas as inovações tecnológicas que envolvam
diretamente a biologia e, principalmente, a genética, é a controvérsia gerada por todas as
preocupações éticas e morais que revolvem à sua volta. Ora, o CRISPR sendo a técnica
revolucionária que é, e com o seu ritmo acelerado de evolução, não poderia deixar de criar
as suas próprias controvérsias, pois, possibilidades, que antes não eram opção, passaram
agora a ver-se de “portas abertas” (Singh et al., 2017).
É evidente que, apesar da sua grande evolução, em muitos aspetos, ainda se pode
considerar que o CRISPR se encontra num estado de imaturidade e que, portanto, ainda
deve ser alvo de estudos mais aprofundados, particularmente no que concerne à segurança
e à eficácia (Heidari, Shaw, & Elger, 2017; Plaza Reyes & Lanner, 2017; Singh et al., 2017).
Logo à partida, podemo-nos referir ao artigo primeiro da Declaração Universal do
Genoma Humano e dos Direitos Humanos (UNESCO, 1997), onde o genoma humano
é considerado como world heritage, ou herança mundial, e como tal deve ser protegido e
conservado. No entanto, esta definição pode ser interpretada de diferentes maneiras, e aí, a
questão que surge é se todos os “defeitos” e falhas genéticas que têm sido detetadas ao
longo do tempo, e são causadoras de doenças, se devem considerar como sendo uma parte
essencial das variações que, eventualmente, levam à evolução e que, portanto, também
devem ser protegidas, ou se se devem considerar apenas como erros suscetíveis de serem
corrigidos. Pessoalmente, a minha opinião sobre esta questão específica resume-se
facilmente numa frase que passo a citar: “se temos a capacidade de corrigir erros biológicos, não
será nossa responsabilidade moral, para com as gerações futuras, que o façamos?” (Heidari et al.,
2017).
Para analisar mais profundamente esta questão organizou-se, em 2015, a International
Summit on Human Gene Editing, da qual foi possível retirar decisões que criam uma base
ética para a aplicação do CRISPR. Estas conclusões sobre a responsabilidade ética podem ser
dividas em três níveis.
Começando pelos estudos com o CRISPR que utilizem células somáticas, ou seja,
aquelas em que não há transmissão hereditária da informação, foi permitida a sua
modificação tendo em vista o benefício que representam e o facto de, por apenas afetarem o
indivíduo em questão, as preocupações éticas serem mínimas, limitadas à segurança deste.
Passando para a utilização básica e pré-clínica, também lhes foi reconhecido o
devido valor e, portanto, concedida a autorização, desde que os estudos se desenrolem
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sempre de acordo com as leis e guidelines éticas, e que as células modificadas não possuam a
capacidade de vir a dar origem a um embrião.
Por fim, o terceiro nível sujeito a análise foi a modificação direta da linha
germinativa ou germline, humana. Este caso em particular foi considerado cientificamente
inaceitável e irresponsável, e que ia contra todas as regras legais e éticas existentes. Abriu-
se, no entanto, uma exceção para casos em que haja comprovação de eficácia e segurança
aceitáveis, não haja outra alternativa melhor, e se mantenha o modo de ação mais
apropriado para a situação (Reardon, 2015a, 2015b; Singh et al., 2017).
Este último tópico em particular foi alvo de muita controvérsia e preocupação, pois,
existe o medo que, caso se continue a estudar a germline, mesmo só para a investigação
básica, o aumento de conhecimento vá, inevitavelmente, levar a uma aproximação dos
estudos clínicos. Também se acredita que esta permissão possa, facilmente, “escorregar” e
que comecem a surgir casos de utilizações incorretas da técnica. Acima de tudo, e mais
importante que qualquer receio ético, existe o status moral dos embriões, uma barreira que
não deve ser ultrapassada e, possivelmente, o argumento mais forte contra os estudos com a
germline (Plaza Reyes & Lanner, 2017).
A manipulação genética de plantas também está a dar que falar, portanto que existe
discussão sobre o tipo de regulamentação a aplicar nestes, havendo quem seja da opinião
que devem ser consideradas como organismos geneticamente modificados (GMO) e
sujeitas às leis subjacentes, como o Ministério do Ambiente da Alemanha, devido ao
desconhecimento dos eventuais impactos ambientais que estas plantas podem ter.
Contrariamente, também há quem alegue que as alterações são apenas para estudar a
biologia básica das plantas, ou para produzir melhores plantações agrícolas, como é o caso
do Ministério da Agricultura da Alemanha. Esta diferença de opiniões que está a deixar
vários países num estado de indecisão, no entanto o ECJ (European Court of Justice) já
veio dizer que só é expectável que se chegue a uma decisão em 2018, devido à sensibilidade
política e financeira do tema (Editorial, 2017).
Mas no fim de contas, não nos podemos esquecer que também a ética é uma parte da
ciência que está em constante e rápida evolução. Por isso a única certeza que podemos ter é
que vai ser necessário voltar a falar deste tema e, possivelmente, as leis e as guidelines vão
ter de, também elas, ser atualizadas e adaptadas às realidades que estão para vir. Afinal, o
impossível de hoje pode ser o fácil de amanhã.
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9. Propriedade Intelectual
Seria de esperar que a atribuição da propriedade intelectual desta técnica não tivesse
muito que se lhe dissesse, mas a verdade não é assim tão simples. A verdade é que no ano
de 2012 foram entregues dois pedidos de patente acerca da tecnologia CRISPR, uma da
parte de Jennifer Doudna da Universidade da Califórnia, Berkeley (EUA), no mês de maio, e
outra da parte de Feng Zhang do Broad Institute de Cambridge, MA, EUA, no mês de
dezembro (Cohen, 2017). Sabendo dos factos até este ponto continua a parecer óbvio a
quem deve ser concedida a patente. No entanto a situação complica-se devido ao facto de
os dois pedidos não serem completamente iguais. Enquanto que o pedido de Doudna se
referia à utilização do CRISPR enquanto tecnologia capaz de modificar regiões específicas do
DNA bacteriano, o pedido de Zhang referia-se à utilização do CRISPR para editar o genoma
de células eucariotas (Starling, 2017). A patente acabou por ser concedida a Zhang com base
na non-obviousness, como se diz nos EUA, ou inventive step, na Europa, ou seja, se seria
expectável, e até óbvio, que um indivíduo com conhecimento e experiência na área fosse
capaz de, facilmente, fazer a transição da técnica de células bacterianas para eucariotas
(Cohen, 2017; Sherkow, 2017).
A decisão final foi que, tendo em conta a informação que consta do pedido de
Doudna, a passagem para a utilização em células eucariotas não é um passo óbvio até
porque, como a equipa do lado do Broad Institute esclareceu, há vários mecanismos em
procariotas que falharam ao tentar ser feita a transição para eucariotas, tendo a própria
Doudna admitido em situações anteriores, o desafio que representava a passagem da técnica
para células humanas (Biotechnology, 2017; Cohen, 2017; Sherkow, 2017; Starling, 2017).
No entanto, não é que não tenha sido concedida nenhuma patente a Doudna, pois,
afinal de contas, a base para se conceder a patente a Zhang é que os pedidos são
considerados como assuntos distintos. Com isto quero dizer que foi concedida uma patente