das coisas, outras
DESCRIPTION
livro de poesias Das coisas, outras, de André Arruda.TRANSCRIPT
da
s c
ois
as
, o
utr
as
André arruda
das coisas, outrasé a reunião de textos que venho escrevendo desde
o lançamento de Estranheza. Outros que deveriam também estar por aqui,
infelizmente, se perderam num dos desarranjos do meu computador.
A idéia é, em breve, publicá-los juntamente de outros que vem sendo
ou serão, oxalá, produzidos.
Como não poderia deixar de ser, refletem,
de forma crítica, às vezes bem humorada, outras até um tanto mal educadas,
meu jeito de ver, entender e tentar
explicar o mundo, neste
tempo em que vivemos.
do alto
o que vem é chuva
do baixo
a inundação
o vinho
é o que vem da uva
da musa
a inspiração
do novo
vem o cagaço
do traço
a impressão
do bem
é que vem o abraço
de trem
o cansaço e o pão
da noite
vem a aurora
de Cora
minha emoção
os loucos
vinham de fora
agora
a condenação
muamba
vem da fronteira
dos “Obamas”
castração
biscoito
vem de Marília
de Brasília
danação
vem do anseio
a esperança
do seio
a satisfação
da dança
vem o desejo
do beijo
a desilusão
da razão
vem a descrença
do pecado
a religião
a arte
vem da coragem
a revolta
do coração
do cano
vem a fumaça
da regra
a exceção
da política
vem a trapaça
da praça
a revolução
do fuçar
vem o encontro
vem do encanto
o grilhão
do espanto
a porfia
e por fim
a conclusão
do nada
nada provém
de cada coisa
outras coisas vêm
advento (das coisas, outras)
“No princípio a Terra estava informe e vazia.
As trevas cobriam o abismo
e o Espírito de Deus´pairava sobre as águas...”
Biblia Sagrada
I
e disse Deus:
“- faça-se a luz!”
e a luz se fez
então, Deus criou
primeiro o Homem
“à Sua imagem e semelhança”
só depois, a Mulher
logo: errar é Divino!?
afinal
o que é
e o que não é divino no mundo?
II
desde pequeno
me ensinaram que amar é divino
“-Deus é amor!”, Eles me diziam
mas não amavam
eles não me amavam
e também não se amavam
mas eu, corajosamente
decididamente
implacavelmente, amei-os todos
eu já era um deus e eles não sabiam
sobre a Criação
e
quem sabe se
para ter com quem correr
pular
compartilhar as brincadeiras
no princípio
e com um pouquinho só de argila
o Criador tenha feito
um menino
e
a partir de uma costelinha deste
uma menina
e deixá-los crescer
não fizesse parte dos planos divinos
então
o pecado original
pode vir do fato de
ao “adultar-se”
a criatura
além do brilho do olhar
e da indulgente alegria
perder a espontaneidade
e sua natural
inocente (e terrível) poesia
ainda sobre a Criação
se Deus fosse bom
amar não doía tanto
morrer não causava espanto
solidão não angustiava
Carlos Drumond era santo
cada qual tinha seu canto
o sonho não acabava
se Deus fosse mesmo bom
banqueiro era socialista
a Igreja, comunista
governador governava
o PT inda era petista
a Xuxa não era artista
Gisele Bünchen me amava
se Deus fosse mesmo bom
dinheiro não me faltava
Corinthians nunca ganhava
Charlis Chaplin não morria
mulher feia não existia
Pelé não envelhecia
e o Galvão aposentava
“Existem mentiras que tornam-se verdades;
existem verdades que tornam-se mentiras.
É tudo uma questão de ponto de vista.”
José Saramago
e se Deus fosse bom?
se Deus fosse mesmo bom
político era sincero
cidadão um ser sagrado
e falar de “fome zero”
era chover no molhado
contrabando era exceção
honestidade era praxe
e nos quartéis, diversão
invés de “ordinário, marche!”
aposentado, aposentava
criança se divertia
funcionário, funcionava
e patrão pagava em dia
hospital era asseado
gasolina era de graça
e livros, por todo lado
espalhados pela praça
se deus fosse mesmo bom
surtar era uma saída
loucura, lição de vida
e o Juqueri, faculdade
burrice não era moda
nem viver era tão foda
mera “pragmaticidade”
a Arte, enfim, era tudo
Ser Humano não era ego
Beethoven não morria surdo
nem Stevie Wonder, cego
rodeio não existia
o axé desaparecia
Roberto não era o rei
Educação, uma verdade
Cultura, prioridade
e a Poesia era lei
por Mandamento Divino, hoje sou gente
negligente, por desgraça
por princípios, sou descrente
palmeirense, por pirraça
por vontade própria, louco
estudante, por atraso
amante não fui por pouco
e suicida, por descaso
burro sou, por hipocrisia
inocente, por malícia
sonhador, por teimosia
cabeludo, por preguiça
por instinto, sou artista
piadista, por arraso
em meus sonhos, anarquista
poeta, por mero acaso
meio cego, por relaxo
tímido por covardia
ralaxado por capricho
covarde, por ironia
por encargo, eleitor
por concurso, funcionário
por prazer, sou todo amor
por Decreto Federal, otário
perfil
Poesia
é pra ler uma por dia
mais que isso é perigoso
(e também não vale à pena)
suja o mote
perde o gozo
dá um bode horroroso
poesia envenena
é pequena arma branca
que alarma
que alavanca
que ironiza e alerta
que a libido liberta
um brinquedo ardiloso
engrenagem de idéias
que orienta e mapeia
alimenta e estonteia
poesia é panacéia
manual de incertezas
é pra ser lida com classe
como quando numa missa
como quem medita ou reza
acha no feio a beleza
traz do lodo a pureza
aflora o instinto animal
poesia é ritual
senão
não causa estranheza
bula (manual de instruções)
um povo que vive em Dó
um lugar que avança em Ré
um poeta que desatina
um padre que reza em Mi
um pastor que ora em Fá
um coro que desafina
um esgoto aberto em Sol
um saneamento que não tem Lá
uma ameaça em cada esquina
um político que pensa em Si
um narciso em Tom Maior
um vício que contamina
um estado de saúde em Dó
um transporte público em Ré
um descaso que alucina
uma loja que grita em Mi
um camelô que berra em Fá
uma balbúrdia que fascina
uma sobrevida ao Sol
um sonho da casa em Lá
uma angústia em surdina
uma inconsciência em Si
uma revolta Ma Nom Tropo
um conformar-se com a sina
rogo, que algo, enfim, aconteça
para que os que por ali convivem
nessa cidade dormitório
possam
ao menos
potencializar seus bons sonhos
ode a um certo povoado tido como
cidade dormitório
e
se eu
um certo dia
num rompante
numa rua da Bahia
em determinado instante, enfim
de você me aproximasse
e olhasse assim
assim
meio de lado
e ousasse lhe dizer que
parece
estou apaixonado
você
então
diante de tal feito
quase surpresa
e também meio sem jeito
em um tom intempestivo
nada falasse
apenas
se virasse
e qual modelo
o cabelo balançasse
e bem no fundo dos meus olhos
simplesmente
me olhasse
e me sorrisse
e eu
por fim
provavelmente
arrepiado
e um tanto indefeso
atrapalhado
até quase
com o sol incomodado
sem saber o que falar
apenas enrubescesse
um sorriso amarelado devolvesse
e
talvez
no limiar
até torcesse
que tal átimo ali permanecesse
e até mesmo de acordar
me esquecesse
encontro(sonho em Amaralina)
Para o meu amor
eu tenho planos
sonhos e sussurros
levianos
tenho liberdades vigiadas
torreões
e celas mal travadas
(até mesmo escadas, quando em vez)
dissabores tive três
tenho três momentos cruciais
movimentos sensuais
rituais
e um tormento nas idéias
tenho idéias de corar a face
muitas fantasias
e um disfarce:
o de sorrir
quando chorar não sei
eu vou à luta, se isso me condiz
eu fico puta, se isso me compraz
e só não mato para ser feliz
porque não sou capaz
disfarce
como Perus
está para Paris
ou como está
Aquiles para Páris
como as antenas
para os pulsares
como estas ruas
para aqueles mares
outros lugares
para o meu quintal
como a prosódia
pra prosopopéia
ou como Jonas
para a tal baleia
como a Judéia
para a Palestina
como a geléia
está pra gelatina
ou cocaína
para um bom cacau
assim está
meu coração
anos luz
como o anzol
está para a enxada
como um espeto
está para uma espada
uma viela está
para uma estrada
como Calípso
pra Luiz Gonzaga
ou uma escada
para um vôo ao léu
como um tropel
está para um remanso
como a labuta
para um bom descanso
“filho da puta”
está para o “pai nosso”
como a vingança
está para o remorso
ou terremoto
para um bom cinzel
anos luz
# a
pa
rtir
de
me
lod
ia d
e C
ha
rlis
Ab
raã
o
assim está
meu coração
anos luz
como está
Pirapora para Roma
ou como a divisão
está pra soma
como Arruda
está para Matoso
ou Abraão
está para Veloso
determinismo
para o mero acaso
como está
George Busch para Gandhi
como um medíocre
para um visionário
como um otário
para um cidadão
como o papel de pão
está prum dicionário
ou Ilha das Flores
para Abrolhos
assim está
meus coração
anos luz
dos seus olhos
quando pequeno
eu achava
que meu quintal era o mundo
cresci
só então percebi
o quanto pode ser grande meu quintal
a ponto de não caber em meus olhos
nem no coração dos homens
reminiscência
o que desgraça o mundo?
o que mais desgraça o mundo
não é a Política
o que mais desgraça o mundo
são os políticos
o que mais desgraça o mundo
não é a Ciência
o que mais desgraça o mundo
são os cientistas
o que mais desgraça o mundo
não é a Economia
o que mais desgraça o mundo
são os economistas
o que mais desgraça o mundo
não são as Finanças
o que mais desgraça o mundo
são os financistas
o que mais desgraça o mundo
não é a Religião
o que mais desgraça o mundo
são os religiosos
o que mais desgraça o mundo
não é a Filosofia
o que mais desgraça o mundo
são os filósofos
o que mais desgraça o mundo
não é a Sociologia
o que mais desgraça o mundo
são os sociólogos
o que mais desgraça o mundo
não são as Ideologias
o que mais desgraça o mundo
são os ideólogos
o que mais desgraça o mundo
não são os seres humanos
o que mais desgraça o mundo
é a falta de humanidade
o que mais desgraça o mundo
não é a falta de poesia entre os poderosos
o que mais desgraça o mundo
é a falta de coragem dos poetas em tomar o poder
chamamento à Revolução
com que planos
me veio falar de amor?
que sabor
minha boca
deixou-se esquecer?
com cores ciganas
me levas talvez
com flores tiranas
tiradas do chão
de que sonhos?
que caminhos
atado
me fez percorrer?
perceber os atalhos
do meu coração
com planos e sonhos
roubados de vez
humores serenos
venenos iguais
que amores?
o amor
tem a cor que seu sonho quiser
bem me quer
e não quer
espalhados no chão
com cores tiranas
tiradas do chão
mais amores virão
com planos e sonhos
roubados de vez
de que flores?
trança
# a
pa
rtir
de
me
lod
ia d
e C
ha
rlis
Ab
raã
o
arrebentação
vento e coração à beira mar
sons de multidão
poeira das ruas, pensamentos
frio, escuridão
eu saí pra ver estrelas
do que fui, então
se perdeu no tempo o que escrevi
sonhos
senhas
sanhas
sensações
salvas
saltos
santos
salvações
salas
celas
ciladas
selvas
solidões
mil constelações
vêm pra me estancar o medo
do que hoje sou
valho meu destino, meu enredo
cheiro matinal
flor de laranjeira no capim
ouço um murmurar
colho da janela o amanhã
marcas
manhas
mamas
matinais
mares
matas
metas
madrigais
montes
mitos
mortes
mundos
muito mais
tempo
# a
pa
rtir
de
me
lod
ia d
e C
ha
rlis
Ab
raã
o
todo
meu sofrimento
eu disfarço em alegria
as dores
que doem em mim
entalho em filosofia
desgostos
que me cortejam
eu traduzo em rebeldia
minhas paixões
chegam a ti
destiladas em poesia
transmutação
eu desfilo meu arsenal de verdades
distribuo poesias e outras vaidades
no gueto
num pobre soneto
num velho coreto
no espaço marcado, exato e final
ao normal não me submeto
eu prometo, um dia, ser quase uma santa
(sem tanta exploração da fé alheia)
minha teia alimenta a quem quero
eu espero
eu esmero
esmerilho
eu sorrio e choro
o meu texto eu decoro
eu valoro
eu decifro e devoro
eu deploro discursos promessas
eu sou cheia de pressa, mas demoro no banho
eu me acho estranha
meio fora de centro
meio louca por dentro
mas, por fora
além da beleza
e de uma delicadeza sem par
tenho muitos afagos
tenho muitos recados
tenho muitos estragos
tenho mais de mil brados sinceros a dar
louca por dentro#
a p
art
ir d
e u
ma
co
nv
ers
a c
om
a a
triz
Le
tíc
ia L
eo
na
rdi, a
nte
s d
e u
m e
ns
aio
da
Cia
Te
atr
o d
e S
eg
un
da
-fe
ira
boca foi feita pra beijar
bunda foi feita pra bater
orelha foi feita pra puxar
nariz, pra escorrer
mão foi feita pra apertar
língua foi feita pra arder
cabelo pra se embaraçar
verruga, pra crecer
peito foi feito pra apalpar
joelho foi feito pra torcer
braço foi feito pra quebrar
e dente, pra doer
perna foi feita pra cansar
olho, pro cisco se esconder
pé foi feito pra pregar
e dedo, pra prender
unha foi feita pra encravar
ferida foi feita pra bulir
coração, pra se angustiar
e choro, pra engolir
castigo foi feito pra educar
criança fo feita pra sofrer
você nasceu pra me amar
e eu, pra lhe esquecer
antipoema materno paterno
Porque algumas pessoas, simplesmente, não nasceram para ser pais
o professor está enfermoeu o vejoe a moléstia que nele reparo(e que talvez nem o próprio o saiba)não é aquela tosse da madrugada fria ou da condução lotadanem o termômetro caseiroguardado na maleta de primeiros socorros, no fundo do guarda roupasque lhes vão denunciar
não é o voltaremdo médico, às pressas, da ubsnem o analgésico da bolsa da amigaa quimioterapiaou o coquetel de aztque irão aliviar suas dores
não é o raio x o exame de urina ou fezesnão é o hemogramaou a ultrassonografia o papa nicolau a mamografianem o teste do bafômetroou o dedo indicador, do temido urologistaque irão apontá-la
porque a doença que esses buscam mostrartalvez nem existae quando, e se, existenão passa de uma somatização daquela doença principalque outra coisa não ésenãoa vergonhaque vem do medo de- ao procurar cumprir seu dever com maestria -eleo professorser humilhado retaliado fulminadopor um ultrapassado falidoe hoje, desumano sistemadenominado Educação
diagnóstico
dentro de mim
passa um rio
despejador de emoções
dentro de mim
corre um rio
querendo desvencilhar-se
o que ele tem de mim
é a sua inconstância
o que ele leva de mim
é esse desassossego
o que ele deixa em mim
meio mágoa - meio medo
o que guardo dele em mim
...
segredo
são águas passadas
águas silentes
água com sabão
pra tirar sujeira
bate no bumbum
pra tirar a valentia
dandá
pra ganhar tentém
cantá
pra nanar neném
bota patuá
pra tirar feitiço
muita oração
pra tirar a ziquizira
ebó
para o badauê
axé
para o fuzuê
tira a sorte no peão
na sinuca e na roleta
loteria na eleição
joga a sorte na sarjeta
então...
bate espanador
pra tirar poeira
apruma o visual
pra tirar a esquisitice
zanzar
pra meninas ver
sonhar
pra nun enlouquecer
bate o pé no chão
pra tirar canseira
tit’o de eleitor
pra tirar autonomia
lutar
pra poder comer
matar
pra sobreviver
tira a sorte no peão
na sinuca e na roleta
loteria na eleição
joga a sorte na sarjeta
então...
abdominal
pra tirar barriga
cald’e mocotó
pra tirar a clamaria
tratar
de envelhecer
cuidar
pra depois morrer
tirada
# a
pa
rtir
de
me
lod
ia d
e C
ha
rlis
Ab
raã
o
por aqui
rio já virou calçada
calçada, avenida
avenida, às vezes, rio
minha cidade
é a cara do Brasil
por aqui
movimentos instintivos
pensados
despensados
descompensados
brincar de sonhos
dançar com os sonhos
com as vontades
os medos
buscar no nada significados e desprezá-los
ouvir a música
fugir da música
a capacidade que temos de expressarmo-nos
com nossos corpos e não nos damos conta
os ruídos
os silêncios
a luz
os sonhos
os objetos
os outros
as inúmeras possibilidades de inventar
de criar
de...
e lá fora
e aqui
continuamos escravizados pela mesmice
sem nos darmos conta (muitas vezes)
do quanto nos faz falta aquilo que nos é inédito
e de como é difícil não ser o mesmo de sempre
ensaio 28/07
tex
to p
rod
uzi
do
ap
ós
um
en
sa
io d
o T
ea
tro
Gir
an
do
lá