dentro- fora tencionando o espaço de arte

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO CENTRO DE ARTES LICENCIATURA EM ARTES VISUAIS Dentro | Fora Tencionando o espaço na arte contemporânea VITÓRIA, ES 2010

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Monografia de conclusão de curso.

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Page 1: dentro- fora tencionando o espaço de arte

UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTOCENTRO DE ARTES

LICENCIATURA EM ARTES VISUAIS

Dentro | ForaTencionando o espaço na arte contemporânea

VITÓRIA, ES2010

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RENATA RIBEIRO DOS SANTOS

Dentro | ForaTencionando o espaço na arte contemporânea

VITÓRIA, ES.2009

Projeto de Graduação apresentado ao Departamento de Artes Visuais do Centro de Artes da Universida-de Federal do Espírito Santo, como requisito para obtenção do título de Licenciada em Artes Visuais. Orientação: Prof. Dr. Lincoln G. Dias.

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FOLHA DE APROVAÇÃO

RENATA RIEIRO DOS SANTOS

TRABALHO DE GRADUAÇÃO APROVADO EM ____/____/______

ATA DE AVALIAÇÃO DA BANCA

________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________

AVALIAÇÃO DA BANCA EXAMINADORA

______ ____/____/______ ___________________________Nota Data Prof. Dr. Lincoln G. Dias

Tutor______ ____/____/______ ___________________________

Nota Data Profa. Dr. Rita Bredarioli______ ____/____/______ ___________________________

Nota Data Prof. Dr. Júlio Tigre

APROVADO COM NOTA FINAL ________

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“Visitar um museu é questão de ir de vazio a vazio.”

Robert Smithson

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SUMÁRIO

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Introdução 11

Sobre as instituições 19

Sobre o objeto artístico e espaço: as relações 22

Espaço + arte contemporânea: tentativas de adequação 31

Espaço versus arte contemporânea: tensão dentro|fora 35

Espaço & arte contemporânea:Considerações finais 62

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 64

REFERÊNCIAS ICONOGRÁFICAS 68

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INTRODUÇÃO

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Pai e filho visitam a Documenta de Kassel de 1982. O filho,

ao ver algumas das obras expostas, indaga sobre seu sentido

e o porquê destas fazerem parte do conjunto Arte. O pai tenta

explicar que a configuração da produção feita em nossa época

pressupõe alguns conceitos que não eram aplicados às obras

no passado e, que agora, elas só podem ser compreendidas em

sua totalidade quando estes são de conhecimento do espectador.

Idéias como “interatividade com o público”, “construção de

sentidos na troca autor-espectador” e “comprometimento do

outro”, são fundamentais no entendimento de trabalhos como

o de Joseph Beuys, um dos que o filho coloca em questão.

Os acontecimentos posteriores confundem ainda mais o seu

entendimento: ao se aproximar de uma mesa de vidro, obra de

Mario Merz, um segurança solta a fatídica frase “Não toque! Isso

é Arte!”. Pouco depois, cansado de tanta arte, tenta sentar-se

sobre os sólidos cubos de madeira de Carl Andre e descobre

que Arte não está aí para ser sentada.

A partir deste relato de Andreas Huyssen, presente em o “Guía

del postmodernismo”1, este texto começou a se configurar há

alguns anos. Assim como contradição entre as explicações

e a postura do segurança causam perturbação no menino,

as relações destoantes mantidas entre a produção de arte

contemporânea e as instituições, começaram a me intrigar.

1. HUYSSEN, Andreas. Guía del postmodernismo. In: Opción, núm. 8 (1993), p. 208-248

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12

Tinha principal interesse na relação conflituosa entre a produção

de arte contemporânea e a forma da inserção e apresentação

da Arte em espaços institucionais de galerias, museus, centros

culturais e meio urbano.

Importante determinar os sentidos dos termos Arte e arte, que

já foram usados e continuarão presentes, desta forma, em

todo o texto. O termo Arte, se refere a um conceito instituído,

normatizado, onde as relações não se discutem. É a arte que já

foi estabelecida como Arte pelas instituições. Já o uso do termo

arte, trata um conceito crítico, inacabado, ainda não definido

e que é problematizado sempre, “que escapa às instâncias

imutáveis que referem-se ao termo Arte. arte, em minúsculo,

revela a potência criadora e mutável do conceito, capaz de

moldar-se para receber as mais diferentes definições através

das mais esparsas manifestações do homem”2.

Continuando o texto, Huyssen coloca que: “O Museu era [voltou a

ser] um templo, o artista seu profeta, a obra uma relíquia, objeto

de culto: a aura havia sido restaurada”.3 Desta afirmação sobre

o retorno da “aura” em uma mostra de Arte produzida em nosso

tempo, nascem alguns questionamentos: será que as exposições

de Arte contemporânea, assim como os eventos, sustentam

as proposições trazidas pelas obras, tais como interatividade,

comprometimento com o outro (espectador), diminuição da

barreira entre objetos cotidianos e arte e o desmantelamento

das fronteiras entre artes e outras linguagens? Ou continuamos

a encontrar seguranças, como o citado por Huyssen, além de

2. SARNAGLIA, Melina A. Frase em e-mai l trocado no dia 26 de janeiro de 2010.

3. IBID, p. 209. Tradução da autora. Texto original: “El museo era un templo, el artista su profeta, la obra una reliquia objeto de culto: el aura había sido restaura-da.”

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13

outros dispositivos institucionais, que nos lembram que Arte não

pode ser tocada? Os espaços expositivos a par com a produção

de arte hoje ou seu funcionamento e conformação segue preso

a uma herança anterior àquelas propostas pelo Modernismo?

Dura ainda a manutenção da idéia da obra de arte como objeto

precioso, que deve ser preservado?

Desta questão geral, envolvendo uma relação problematizadora

entre a atual produção artística e os espaços que a abrigam,

uma série de questões mais específicas se desdobram.

Começa-se pensado no estudo do perfil físico destes espaços

em contraponto com as exposições ali mostradas. O que ainda

gera uma grande quantidade de questionamentos neste amplo

“cenário da arquitetura na arte”4

No intuito de centrar o foco da pesquisa, o estudo tratará das

questões referentes às relações conformadas entre as obras

contemporâneas e suas condições concretas de manifestação.

O objetivo principal do trabalho será de discutir esta relação

entre o conceito de arte, tal como é problematizado na obra

dos artistas contemporâneos e o modo como este conceito e o

próprio sentido das obras se reconfigura quando estas estão são

expostas nos espaços expositivos.

Para melhor compreender as modificações sofridas pelos espaços

de Arte em paralelo com as mudanças de paradigma da arte,

se fará um suscinto recorrido pelos mais significativos modelos

de espaço, mostrando como estes foram e são modificados

pela arte (e vice-versa). Trantando destes espaços, ainda se

buscará uma conceituação dos espaços instituicionais e uma

4. Termo emprestado de DEL CASTILLO, Sonia S. Cenário da Arquitetura da Arte. Editora Martins Fontes. São Paulo, 2008, passim.

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exemplificação da tentativa de criação de modelos de museus

para abrigar arte contemporânea.

Sendo ainda, as questões abertas nesta relação entre arte

contemporânea e condições de manifestação das obras muito

amplas, será feito neste estudo um recorte apontando a real

existência desta relação no trabalho do artista plástico Rubens

Mano. Paralelo aos exemplos de Mano, se trará outros exemplos

de artistas e obras para um traçar-se um melhor e mais completo

panorama da questão tratada.

A escolha do artista se dá primeiramente pela qualidade de

sua obra. Nas obras de Mano o espaço nunca é neutro, um

receptáculo. As obras problematizam o espaço onde estão

inseridas. Proporciona também, ao tema de estudo, um grande

leque de exemplos, posto que, recorrentemente em suas obras

aparece esta relação problematizadora entre a obra e o espaço.

Aliás, sua intenção poética aponta para uma operacionalização

do espaço, de modo a fazer dele parte constitutiva da obra.

Como o artista trabalha em suportes e escalas variados, cada um

deles apresentando diferentes tipos e níveis desta problemática

entre o espaço e a manifestação da obra, a escolha do artista

abre ainda várias possibilidades de discussão do tema em

diversas expressões da arte contemporânea.

Por último, é possível justificar que a escolha de um único artista,

tem como objetivo focalizar o tema em função deste recorte.

Não se trata de reduzir a problemática proposta pelo trabalho a

um único artista, mas sim, de começar uma abordagem a partir

deste.

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15

O artista Rubens Mano (1960, São Paulo) tem formação em

Arquitetura e inicia sua produção nas artes utilizando a fotografia.

Participa de algumas exposições significativas nos anos 90,

usando este suporte para uma discussão conceitual do “fato

fotográfico, expandido-o quase sempre para além do resultado

previsível dessa modalidade”. 5

A partir de projetos posteriores sua prática começa a buscar

outros espaços para a produção artística e não somente aqueles

dentro do chamado “circuito da Arte”, indo de encontro com

“proposições que estabelecessem um diálogo mais amplo

e anônimo com o espaço urbano e seu habitante também

anônimo.” 6

Não será feito neste texto um estudo sobre o conjunto da

produção do artista, como explicado anteriormente. Não se trata

de um estudo especifico sobre ele. O estudo se utilizará de

obras de Mano, um recorte em sua produção, para exemplificar a

questão levantada no texto. A escolha das obras foi realizada de

modo a salientar as que possuíam um maior grau de discussão

para o tema proposto. Foram eleitas as que apresentavam

uma relacão singular entre obra e espaço, em uma relação

de interdependéncia. As seguintes obras serão utilizadas como

exemplário:

1. Sem titulo. Fotografia, datada de 1987. Uma luz dentro

da imagem é direcionada de forma a iluminar o retratado

5. CHIARELLI, Tadeu. A cidade não mais como obstáculo: a produção de Rubens Mano. Disponível em: http://www.casatriangulo.com/scripts/txt2.php?id:22. Em: 21 de abril de 2005. p.1

6. IBID, p. 2

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que se encontra fora do enquadramento, dentro do

espaço do mundo real.

2. Detector de Ausência. Intervenção urbana realizada em

1994 no Viaduto do Chá em São Paulo. Dois refletores

de luz foram instalados a cada lado do Viaduto e

interpolavam os passantes. Como grandes canhões

de luz de busca militar, apontavam para lugares não

definidos, como se as pessoas que eram iluminadas,

não fossem seu real objetivo.

3. Bueiro, da Série Huecos. Intervenção urbana no Bairro

do Bom Retiro, SP, realizado em 1999. Luzes eram

projetadas das saídas de “bocas de lobo” no bairro.

Lugares que até então eram pertencentes ao cotidiano

corrente das pessoas que por ali transitavam, eram

modificados por estes feiches que as atingiam a altura

de seus pés.

4. Pavement, 1999. Mano leva a energia elétrica de um

Centro Cultural, situado no centro da cidade de São

Paulo para a rua. A instalação de tomadas, semelhantes

a “gatos”, ligações clandestinas, possibilitava a qualquer

transeunte fazer uso da energia.

5. Proposta de intervenção para Bienal Internacional de

São Paulo de 2002, não realizada. Um corte seria

feito no segundo piso do prédio da bienal, onde seria

instalanda uma grade como as de respiradouro de

metrô. A comunicação entre os espaços e sujeitos seria

possível entre os dois pisos, mas sempre velada pela

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grade.

6. Vazadores, 2002. Intervenção / instalação feita na

Bienal Internacional de São Paulo. Uma saída foi

construída no prédio da bienal, utilizando materiais

semelhantes aos do prédio original. A obra causou

muita discussão com a direção da Fundação Bienal,

já que produzia evasão de renda e problemas com a

segurança. Após muita discussão se determinou que a

entrada não poderia ser mais usada para passagem e

um segurança foi enviado para o local.

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Fig. 01 Rubens Mano.Detector de Ausências, 1994. Intervenção realizada no Viaduto do Chá, SP para o projeto Arte / Cidade.

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SOBRE AS INSTITUIÇÕES

Ao pensarmos em espaços expositivos, há o risco de associá-lo

somente com a arquitetura, com os aspectos físicos de espaço.

É confundido com a arquitetura da sede ou da galeria do museu,

com as galerias ou os centros culturais.

Ao observarmos mais de perto a trama que envolve estes

espaços, perceberemos que eles apresentam duas dimensões,

fortemente imbricadas, apesar de parecerem autônomas: a

física e a institucional. Ao aprofundarnos no estudo de cada

um, vemos que se contaminam e se interconectam em vários

pontos, funcionando como uma grande rede ou engrenagem. A

dimensão física funciona para que objetos sejam colocados no

espaço para o hipotético espectador. A dimensão institucional

regra e formula os modos desta exibição.

A dimensão física compreende o conjunto dos elementos

arquitetônicos e paisagísticos, suas áreas internas e externas,

incluindo equipagem, adereços e componentes acidentais. Isto

inclui toda a parte arquitetônica dos espaços que sediam as

exposições, sejam eles galerias, corredores ou galpões, bem

como seus dispositivos de funcionamento como paredes,

divisórias, vitrines, pedestais, iluminação etc. Trata-se do

conceito mais usual de espaço físico, “uma extensão entre dois

pontos ou a área ou o volume entre limites determinados”7.

7. ESPAÇO. In: FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Miniaurélio Século XXI . 4. ed. rev. ampliada. Editora Nova Fronteira. Rio de Janeiro, 2001. p.286

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Para caracterizar o elemento externo, utilizaremos um conceito

da física, que traz a idéia da interação dos objetos externos

a este espaço como pertencentes a ele: “Extensão contínua

e ilimitada em que se contém todos os objetos externos que

coexistem”.8 Neste elemento externo podemos inserir os jardins,

praças e parques, o meio urbano em geral ou os elementos de

locais não urbanizados como regiões rurais, florestas, vastos

campos ou desertos. É importante frizar que mesmo áreas

ermas, intocadas pelo urbanismo, quando recebem uma obra

de arte contemporânea passaram anteriormente pelas etapas de

reconhecimento da dimensão institucional.

Esta é constituída por basicamente três elementos. Pelos

agentes, que são diretamente ligados ao trabalho cognitivo de

construção das condições de manifestação das obras: críticos,

curadores, arte-educadores, artistas e demais trabalhadores

envolvidos. Estes são os atores desta dimensão, mas para que

a realização da sua cena se complete, também contam com

um elemento ideológico, sustentado pelas idéias centrais da

instituição mantenedora do espaço expositivo e, “supostamente

afinado com seu perfil midiático”9. Estas instituições também

ditam um regime regulamentar, que aliado à sua ideologia traça

o modo de funcionamento dos espaços expositivos. A presença

de acervos, a existência de projetos de arte-educação e a

forma como são aplicados, como se dá a relação público e

obra, o relacionamento instituição e artistas, o teor das mostras

apresentadas; dentre vários outros fatores, são guiados pelos

três elementos formadores desta dimensão institucional.

8. ESPACIO. In: Nuevo Espasa ilustrado. Editora Espasa Calpe, S.A. Lima, 2005. p.514. Tradução livre da autora.

9. FARIAS, Agnaldo e DOS ANJOS, Moacir. Geração da Virada. In: Geração da Virada: 10 + 1 os anos recentes da arte brasileira. Instituto Tomie Othake. São Paulo, 2007. p. 37.

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21

Sendo assim, o processo de reconhecimento institucional, passa

por duas etapas, que valem ser descritas: uma cognitiva e outra

pragmática. A cognitiva está na presença da instituição que

valida o trabalho de arte, já seja pela reputação e / ou pelo

trabalho de seus agentes, que confirmavam sua condição de

Arte. O reconhecimento pragmático consiste no financiamento

da obra, do apoio monetário para realização desta.

Podemos citar como exemplo a intervenção urbana Detector

de Ausências (fig. 01), de 1994. Apesar de ser construída no

Viaduto do Chá em São Paulo, em via urbana, também passou

pelo processo de institucionalização, tendo o consentimento de

instituições publicas, ao ser partícipe do Projeto Arte / Cidade,

neste ano sob a égide da Secretaria de Estado da Cultura de

São Paulo, com coordenação e curadoria de Brissac Peixoto. Se

dá aqui o reconhecimento institucional cognitivo, ao ser validado

pelo projeto Arte / Cidade e pela Secretaria de Cultura. Esta

também proporciona o reconhecimento pragmático ao financiar

a obra exposta. Então, mesmo não estando em um espaço

reconhecidamente de Arte, aparece como institucionalizada por

estes fatores.

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SOBRE O OBJETO ARTÍSTICO E O

ESPAÇO: AS RELAÇÕES

A transformação do paradigma da obra de arte também modifica

o perfil dos espaços que pretendem abrigá-la. Se observamos

as modificações sofridas pelas obras de arte a partir do século

XVIII, durante a consquista de sua condição moderna até seu

deslocamento à condição contemporânea, podemos traçar um

paralelo com aquelas sofridas pelos espaços de Arte. Faremos

aqui, de forma suscinta, uma explanação destas modificações,

relacionando os espaços de Arte com as propostas artísticas de

cada período.

A primeira germinação dos espaços expositivos datam do século

XV e XVI, com a criação dos Gabinetes de Curiosidades ou

Quartos das Maravilhas. Na epóca, de grandes explorações e

dos descobrimentos, estes espaços eram usados para colecionar

objetos raros ou estranhos. Alguns colecionadores além de

espécies da fauna, flora e objetos tecnicamente avançados,

começaram a reunir amostras de quadros e pinturas. Estes

espaços não eram abertos ao público em geral, sua posse

estava restrita a alguns grupos sociais, os quais detinham com

eles o monopólio das representações culturais ou da natureza.

Somente duzentos anos, depois estes espaços foram

transformando-se em instituições que começam a vincular

os novos ideais propostos pelo Iluminismo. Ultrapassando

sua condição de Gabinetes de Curiosidade, encontramos

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uma condição inicial dos espaços expositivos como edifícios

arquitetônicos, com supostas verdades estáticas e últimas. Estes

espaços possuem a ambição de serem universais e atemporais

e “a defesa que agora se desenvolve de que a cultura deve ser

acessível a toda a gente”.10

A arte produzida na época e a estética dominante, moldava estes

espaços como galerias com paredes cobertas por quadros, onde

ainda precebe-se vestígios das coleções de insetos e mineralogia

dos Gabinetes. Estes espaços pregavam sua condição de

exterioridade. As obras ali expostas não possuiam relação direta

nem com ele, nem com as obras que a cercavam. Uma obra

que tornou recorrente na exemplificação destes espaços é a

“Galeria de Exposição no Louvre” de 1832-34 (fig. 02). Nela

podemos observar como os quadros são dispostos por toda a

parede, sem espaço de respiração ou com uma sequência lógica

para um observador contemporâneo. A sequência era dada, no

entanto, pela “qualidade” das obras (as melhores ficavam no

centro) e pelas dimensões (maiores no topo, menores embaixo).

10. MAGALHÃES, Fernando P. O. Museologia, Ecomuseus e o Turismo, uma relação profícua? Disponível em: http://ceaa_novo.ufp.pt/files/artigos/ANTROPO-logicas07/ANTROPO07-09.pdf. Acesso em: 26 de janeiro de 2010.

Fig. 02Samuel F. B. Morse.

Galeria de Exposição no Louvre, 1832-33.

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24

A apreciação deste mosaico, difícil de ser entendida na

contemporaneidade, se justifica por uma única norma: os

quadros eram encarados como independentes. Sua composição

era totalmente voltada para seu interior e as grandes molduras o

independizavam de seu vizinho. Não existe nenhuma indicação

de que exista continuidade do espaço interno do quadro para

nenhum lado. Pode-se fazer uma analogia a uma “janela portátil,

que colocada na parece, cria nela a profundidade do espaço.”11

Sendo assim, o espaço e as paredes onde eram pendurados

não eram pensados como partícipes na produção de sentido das

obras.

Quando as bordas começam a tornar-se imprecisas, fazendo

as áreas delimitadas pelas molduras menos absolutas; e

com a invenção da fotografia, que usa o tema como parte da

composição e não este alinhado a borda; percebe-se uma ilusão

que aumenta a área das imagens lateralmente e não penetrando

nela, internamente, como nas pinturas anteriores. As obras

então, tem que ser inevitavelmente separadas na parede, pois

necessitam deste espaço de respiro para sua continuidade.

As paredes e a relação entre as obras ali expostas começaram

a ser observadas. As obras vão tomando noção de autônomas,

não mais como independentes. As paredes onde estariam

expostas e os espaços aos quais estas paredes pertenciam

deveriam adquirir um caráter “neutro” para a correta apreciação

das obras. Segundo Basbaum, este conformação se dá de

maneira acelerada “em direção a uma concepção arquitetônica

moderna, que visa a acolher sem impedimentos a potência

11. O’DOHERTY, Brian. No interior do Cubo Branco: A ideologia do espaço de arte. Editora Martins Fontes. São Paulo, 2002. pp. 08.

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desse novo objeto sensível do século XX”.12 A referência deste

modelo é a inaguração do MoMa (Museum of Modern Art) em

1937, em Nova York (fig. 03).

A concepção arquitetônica moderna a qual se refere o autor é o

“Cubo branco”. Este modelo é a forma de espaço expositivo que

teve sua eficácia aprovada pelo uso durante o Modernismo e foi

consagrado por este movimento ao proporcionar ao objeto uma

visibilidade privilegiada. O espaço se neutraliza para ressaltar a

obra. Sua funcionalidade se dá, neste momento, porque a obra

de arte é objeto.

Neste modelo a forma quadrada e as paredes brancas foram

re-significadas no intuito de transmitir uma impressão de

neutralidade. Proporcionava às obras modernas o local ideal

(moderno) para sua fruição e “boa parte da produção de arte

do século passado foi idealizada de antemão para ser exposta

12 BAUSBAUM, Ricardo. Perspectivas para o museu do século XXI. Dis-ponível em: http://forumpermanente.incubadora.fapesp.br/portal/.painel/artigos/rb_museus/. Acesso em: 10 de dezembro de 2009.

Fig. 03. Atrio do MoMa. Ao fundo podemos observar “Nin-feias” de Claude Monet,

1920.O quadro é um bom exem-plo de desvaneciamento das bordas e atenuação da função estrutural da borda.

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26

neste ambiente”13. Podemos perceber aqui, uma inversão da

relação entre obra de arte e espaço: a obra que outrora era

modificadora do espaço, agora é modificada por este.

O espaço da galeria modernista tinha extrema força na orientação

do visitante e do objeto, chegando, em dado momento, a

orientar a própria arte moderna. A construção do espaço seguia

criteriosas regras para potencializar sua função na “apresentação”

das obras de arte: A galeria é construída de acordo com preceitos tão rigorosos

quanto de os da construção de uma igreja medieval. O

mundo exterior não deve entrar, de modo que as janelas são

geralmente lacradas. As paredes são pintadas de branco.

O teto torna-se fonte de luz. O chão de madeira é polido,

para que você provoque estalidos austeros ao andar, ou

acarpetado, para que você ande sem ruído. A arte é livre,

como se dizia, ‘para assumir vida própria.14

Não se realizou aqui, como cita O’Doherty, uma degeneração

do espaço, mas conformados pela cultura dominante na época,

eles foram anulados de seus valores, dessemantizados, em

nome de uma suposta “liberdade” que proporcionariam as obras.

Percebe-se nos objetos ali expostos uma preocupação em

relação a estes espaços, mas como estes são “neutros”, não se

trava um real diálogo com eles.

Este diálogo aparece na arte contemporânea, onde busca-

se trabalhar com os sentidos que o espaço traz. Assumindo

estes sentidos, a arte então, passa a buscar e utilizar-se de

espaços que não foram concebidos para esta função. A obra

13. GROSSMAN, Martin. Isso não é uma galeria de arte. In No interior do Cubo Branco: A ideologia do espaço de arte. Editora Martins Fontes. São Paulo, 2002. p.XVI.

14. O’DOHERTY, Brian, 2002. Op. Cit., p. 04. O’DOHERTY, Brian, 2002. Op. Cit., p. 04

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27

já não requerer a neutralidade e a idealização do Cubo Branco

modernista, ela busca relações e inter-conexões neste espaço

para totalizar seu sentido. Segundo Miwow Kwon:O espaço da arte não era mais percebido como tábula rasa,

mas como um espaço real. O objeto da arte ou evento neste

contexto era para ser experienciado de forma singular no

aqui-agora a partir da presença de cada participante, em

uma imediatez sensorial da extensão espacial e da duração

temporal, mais do que instantaneamente “percebido” em uma

epifania visual por um olho sem corpo.15

Importante destacar no texto da autora a mudança de postura

pela qual passará o sujeito frente à arte contemporânea.

Quando esta convoca para si o espaço onde está inserida e as

relações estabelecidas nele, também traz como partícipes das

proposições o sujeito. Deste, em que até então, lhe era cobrado

apenas o olho, agora é convocado a participar de corpo inteiro

na obra ou, como pauta Melina Almada em sua dissertação de

mestrado: “o corpo do espectador é proposto também como

espaço de obra, na possibilidade de uma performação deste

corpo pelo espaço.”16

Diferente também da condição de objeto proposto pela arte

moderna, a arte contemporânea trabalha com proposições, onde

o aspecto formal não é mais prioritário. Objetos são abrigados

nos espaços expositivos. Proposições não são abrigáveis.

Pode-se analisar esta necessidade de abrigo dos objetos

modernistas através de uma fala de Crimp: “O idealismo da

15. K�ON, Miwon. One Place after another: notes on site-specific. In: Revista . K�ON, Miwon. One Place after another: notes on site-specific. In: Revista In: Revista October 80, 1997. pp.86.

16. ALMADA, Melina S. De possibilidades e afirmações introdutórias. Capítulo de dissertação de mestrado ainda não publicada, cedida pela autora. pp. 01.

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arte modernista, no qual o objeto era visto como possuidor de

um significado fixo e trans-histórico, determinava a autonomia

do objeto em relação ao seu contexto, o seu não –pertencer à

lugar algum...”17 A busca por esta idealização da obra moderna,

buscando a universalidade e neutralidade de tempo e espaço,

encontra no espaço das galerias modernistas seu abrigo: um

refúgio contra as intempéries, seu lugar de proteção e defesa.

Os arte contemporânea, principalmente os site-specifics, surgidos

com a onda do arte minimal, no final dos anos 60 e ínicio da

década de 70, começam a questionar a separação existente

entre o espaço “previsto” para a Arte e o mundo comum, real.

Imprimem então em seus trabalhos uma tentativa de retirada

deste véu institucional que recobria as obras. Segundo Miwon

Kwon:Ser ‘específico’ em relação a esse lugar (site), portanto é

decodificar e/ou recodificar as convenções institucionais de

forma a expor suas operações ocultas mesmo que apoiadas

– é revelar as maneiras pelas quais as instituições moldam

o significado da arte para moldular o seu valor econômico

e cultural, e boicotar a falácia da arte e da autonomia das

instituições ao tornar aparente sua imbridada relação com

processos socioeconômicos e políticos (...).18

Percebe-se aqui a preocupação com este espaço expositivo

em suas dimensões completas, como citadas anteriormente, em

suas dimensões física e institucional. As proposições realizadas

pelos artistas da década de 70, tinham como questão básica

as condições físicas do espaço da galeria e como estes,

relacionados a sua dimensão institucional podavam e limitavam

17. CRIMP, Douglas. Sobre as ruínas do museu. Editora Martins Fontes. São Paulo, 2006. pp.17.

18. K�ON, Miwon., 1997. Op. Cit. pp.03.

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29

seus trabalhos. A partir da década de 80, as investigações

começam a apontar para outros caminhos. A questão física

(mesclada com sua interrelação institucional) não é mais o centro

das proposições. A preocupação começa a mirar “as técnicas e

os efeitos da instituição da arte na medida em que circunscreve

a definição, produção, apresentação e disseminação da arte

(...)”.19 Indo em contra também, dos processos de mercantilização

sofrido pela arte, as preposições buscam cada vez mais a

desmaterialização do trabalho de arte. As obras já não precisam

ter permanência física, serem construídas para determinado

espaço e deste não poderem ser retiradas. São pautadas agora

em sua “impermanência móvel”, devem ser experimentadas e

percebidas como atos, ações irreptíveis e que se dissipam.

A partir deste ponto a arte contemporânea começa a despreender-

se desta crítica, de alguma forma, ainda fechada ao “universo

da Arte” e busca um caminho de contato maior com o mundo

e as vivências cotidianas. Se reforça ainda mais a utilização de

espaços não-especializados e a discussão de temáticas não-

especializadas em arte. Qualquer é o espaço ideal para a arte

contemporânea. O “espaço” agora não é somente circunscrito ao

local onde este é realizado ou, as condições culturais e sociais

da moldura institucional; ele acontece no processo discursivo da

proposição, que é delineado como um campo de conhecimento, troca

intelectual ou debate cultural (...) este site não é definido

como pré-condição, ou seja ele é gerado pelo trabalho

(frequentemente como ‘conteúdo’), e então comprovado

através de sua convergência com uma formação discursiva

existente.20

19. K�ON, Miwon., 1997. Op. Cit. pp.04.. K�ON, Miwon., 1997. Op. Cit. pp.04.Op. Cit. pp.04.

20. K�ON, Miwon., 1997. Op. Cit. pp.05. K�ON, Miwon., 1997. Op. Cit. pp.05Op. Cit. pp.05.

Page 30: dentro- fora tencionando o espaço de arte

30

As lâmpadas instaladas dentro de bocas de lobo em São

Paulo, que evidenciavam o caminhar dos transeuntes de um

bairro. Seus pés, construindo novos sentidos neste deambular

cotidiano, buscando uma integração diferente do sujeito com

este espaço no trabalho “Bueiros” de Rubens Mano (fig. 04),

exemplifica esta nova construção e significação do espaço na

arte contemporânea. Ele se edifica no processo de duração e

interação da obra com o espaço e os sujeitos, nas relações

estabelecidas e (talvez silenciosamente) sentidas e discutidas.

Fig.04 Rubens Mano. Bueiro, da Série Huecos, 1999.Intervenção/fotografia, 131 x 131 cm,

Page 31: dentro- fora tencionando o espaço de arte

31

ESPAÇO + ARTE CONTEMPORÂNEA:

TENTATIVAS DE ADEQUAÇÃO

Continuando a discussão, proposta anteriormente, percebe-

se que pela nova relação proposta pela arte contemporânea

com este espaço, a tensão causada entre obra e espaço,

levou a que projetos arquitetônicos e institucionais, tenham sido

pensados com o intuito de abrigar estas obras. Busca-se um

tipo de construção, que seja propícia a abrigar a diversidade

contemporânea da arte, ainda tendo em mente preceitos da

origem do espaço museológico: “a noção de se construir alguma

forma de proteção para as coisas da cultura, salvando-as de sua

destruição e ao mesmo tempo integrando-as em um conjunto de

objetos representativos .”21

Apesar de já termos analisado que a condição da arte

contemporânea, que não possui espaço ideal, pois todos espaços

passam a ser adequados, são uma “potencial moldura”22, torna-

se interessante analisar com que ótica se pensavam e projetam

estes “museus contemporâneos”. Podendo assim perceber

reducionismo ou preconceitos que foram atribuídos ao plural

conjunto da arte contemporânea. A busca por uma regra, por

este espaço modelar, idealizado, uma delimitação formal que

adeque-se à totalidade da obras de Arte produzidas, é um

rasgo do Moderno. A arte contemporânea, ainda que também

21. BAUSBAUM, Ricardo. Op. Cit., 2002.

22. Termo emprestado de Rita Bredarioli.

Page 32: dentro- fora tencionando o espaço de arte

32

responda a determinadas regras e convenções, relativiza e

pluraliza mais essas noções. Porque não faz parte da natureza

da arte contemporânea a busca por uma relação pacificada.

Porque um dos fatores que a diferenciam da Arte moderna é

exatamente uma nova forma de compreender e re-significar o

espaço.

Tomando-se como partida, um questionamento de Sonia S. del

Castillo: “diante das freqüentes transformações espaciais que o

contexto artístico atual vem exigindo, seria possível pensar em

um espaço expositivo ideal?”23

Confundem-se por vezes museus de arquitetura contemporânea

com os feitos para “abrigar” Arte contemporânea. Em uma clara

tentativa de encontro deste “espaço expositivo ideal”24. Exemplo

desta tentativa é o Museu do Século XXI, de Kanazawa no

Japão (fig. 5 e 6), inaugurado em 2007. Uma das diferenças no

projeto é o trabalho conjunto de arquitetos e curador, que busca

“o respeito entre as obras de arte, que não são eclipsadas, e

a arquitetura, que não se deixa eclipsar”25. Ao entender que a

peculiaridade da arte contemporânea é “a diversidade formal e

de atitudes das obras dos artistas, sobretudo diante do desafio

de ocupar um espaço dado, isto é, diante da solicitação de um

trabalho feito a propósito de uma arquitetura pré-existente.”26,

entende-se que deve ser planejado um museu com salas de

tamanhos e materiais diferentes, inclusive com diferença de pé

23. DEL CASTILLO, Sonia S. Cenário da Arquitetura da Arte. Editora Martins Fontes. São Paulo, 2008.

24. DEL CASTILLO, Sonia S, 2008. Op. Cit., p.21.

25. FARIAS, Agnaldo. O que o Museu do Século XXI, no Japão, tem a ensinar ao mundo. Revista BRAVO, São Paulo, 2005.

26. IBID.

Page 33: dentro- fora tencionando o espaço de arte

33

direito. Parece ingênua a crença de que assim o embate entre

arte contemporânea e espaço estaria resolvido: construímos

salas de formatos tão variados que qualquer obra pode “adaptar-

se” a elas.

Não há como pensar em espaços ideais, nem em abrigo para arte

contemporânea. Ela continuará propondo uma problematização

com o espaço, esta é sua relação primeira com o espaço dado.

Acredito que isso deverá acontecer, inclusive, nas 14 salas do

Museu do Século XXI no Japão.

Fig.06 Edifício do

Museu Kanazawa.

Fig. 05 Maquete do

Museu Kanazawa.

Page 34: dentro- fora tencionando o espaço de arte

34

Fig. 07 “Avenida-jardim” do CACI (Centro de Arte Contempo-rânea Inhotim).

Page 35: dentro- fora tencionando o espaço de arte

35

ARTE CONTEMPORÂNEA VERSUS

ESPAÇO: TENSÃO DENTRO | FORA

“Este é o lugar que a gente vai quando morre!”. O comentário

demonstra o assombro de um visitante hipotético, ao entrar

na primeira grande “avenida jardim” (fig. 07) no CACI (Centro

de Arte Contemporânea de Inhotim). Depois de passar pela

longa rodovia que liga Belo Horizonte a Brumadinho, segue

pela estrada de terra batida, com aspecto de não terminada, e

depara-se com a magnitude do Centro de Arte. A surpresa é

tamanha que se tecem vários comentários deste caráter.

Fundado em 2005 o CACI é um complexo museológico, formado

por vários pavilhões de exibição localizados em seqüência não

linear, em meio a um parque ambiental. Possui um importante

acervo de arte contemporânea, incluindo nomes como Cildo

Meirelles, Tunga, Adriana Varejão, Dan Grahan, Hélio Oiticica,

Olafur Eliasson, Doris Salcedo, dentre muitos outros. Possui

também uma extensa coleção botânica dentro do Parque

Tropical, que foi construído a partir de conceitos sugeridos pelo

paisagista Roberto Burle Marx. Suas ações incluem, além da

arte contemporânea e do meio ambiente, iniciativas nas áreas

de pesquisa e de educação.27

27 Fonte disponível em: http://www.inhotim.org.br/p/v/199. Em 29 de setembro de 2009.

Page 36: dentro- fora tencionando o espaço de arte

36

O visitante, ainda impressionado com o parque, continua

caminhando e entra em uma das salas expositivas. Depara-

se com uma catraca conectada a um sistema de transmissão.

Percebe que o sistema conecta-se a um macaco mecânico que

pressiona duas vigas apoiadas nas paredes laterais da galeria

(fig. 08 e 09). Ao passar pela catraca acionará o dispositivo

que tensionando as vigas, poderá contribuir, teoricamente, para

a destruição do edifício. Gira a catraca e entra.

A obra em questão, Samson (1985) de Cris Burden é um exemplo,

quase literal, desta relação de embate, de tensão entre a arte

contemporânea e suas condições concretas de manifestação.

Além de representar este sentimento de crise entre o espaço

expositivo e a produção, cria uma relação diferenciada com o

sujeito: delega responsabilidade a ele.

A crítica institucional contida em Samson é a um só tempo

brutal e sutil: ao obrigar o espectador a passar pela catraca

para satisfazer sua curiosidade, Burden divide com eles a

culpa pela eventual destruição do espaço da galeria.28

A obra só acontece na interação com o sujeito. Mais do

que uma proposta de interatividade com o outro, busca certo

comprometimento dele, não necessariamente político, mas

causal, sua atitude gerará uma ação, que acarretará a possível

destruição do espaço de arte em que o trabalho está inserido.

O sujeito, ciente ou não da reação de sua ação, é convidado a

participar da proposta do artista.

O titulo da obra Samson remete ao mito bíblico de Sansão. Este

após ter o cabelo cortado e perder suas forças é capturado.

28. ____________. Samson. Disponível em: http://www.inhotim.org.br/arte/obra/view/160 Acesso: 20-05-09

Fig 09 Chris Burden - Samson,

detalhe.

Fig. 08 Chris Burden. Samson,

1985. Catraca, engrenagem de

rodas dentadas, tira de couro, macaco mecânico,

toras de madeira e placas de aço,

dimensões variáveis,

Page 37: dentro- fora tencionando o espaço de arte

37

Page 38: dentro- fora tencionando o espaço de arte

38

Pede a Deus que restitua seu poder e empurra então as colunas

do local onde estava aprisionado e derruba com elas o teto.

Morrem todas as pessoas que estavam lá, incluindo ele. A

relação entre mito e obra a torna ainda mais intrigante. Trata-

se de um jogo. De alguma forma traz uma diagnose que com

a destruição planejada do espaço expositivo, ela também seria

destruída.

Este espaço não é de forma alguma negado por obras

contemporâneas. Entende-se sua necessidade e que as obras

precisam dele para serem vistas. O que torna interessante é a

maneira como problematizam a essa institucionalização em sua

manifestação. Como conseguem manter uma sutil e, ao mesmo

tempo, forte relação de crítica com ele.

Ao continuar seu “passeio” pelo centro o sujeito se depara com

uma fotografia (fig. 10) onde de dois vãos (que posteriormente

ao ler o título entende como sendo um bueiro) sai uma estranha

luz. São como olhos que observam o sujeito posicionado fora

da obra. Ele é incorporado por ela, passa a ser elemento

constitutivo da produção de sentido. O poder de contemplação

não é mais privilegio do sujeito. A obra também ganha este

poder.

A fotografia exposta no CACI é um registro da intervenção

urbana “Bueiro”, da série Huecos, realizada pelo artista Rubens

Mano no bairro do Bom Retiro, São Paulo em 1999. Luzes foram

instaladas dentro de bueiros do bairro, de onde faixas luminosas

eram projetadas por suas saídas. A luminosidade era revelada à

altura dos pés dos sujeitos, transeuntes que por ali caminhavam.

Page 39: dentro- fora tencionando o espaço de arte

39

Fig. 10 Rubens Mano. Bueiro, da

Série Huecos, 1999.Intervenção/fotografia,

131 x 131 cm.

Fig. 11 Rubens Mano – Sem título,

1987. Fotografia.

Page 40: dentro- fora tencionando o espaço de arte

40

O uso de pequenos recortes do cotidiano, como neste trabalho,

nos mostra esta apropriação da realidade proposta pela arte

contemporânea. O uso deste novo espaço, antes não selecionado

para a “exposição” de obras de arte, faz com que esta apareça

agora, inadvertidamente, incorporada ao meio urbano e a

cidade, propondo uma nova possibilidade de convivência e

interação entre a obra e o espaço. Ela não se reduz a um objeto

autônomo, que independe do espaço onde se insere. Modifica o

modo de percebê-lo e significá-lo, ressemantizando-o, criando

um novo espaço neste diálogo do dentro e do fora da arte, do

espaço e dos sujeitos.

O trabalho surge subitamente, modificando a forma em que o

sujeito vê este espaço cotidiano. Diferente das obras expostas

em exposições de arte, trabalhos como este, aparecem como

um elemento novo dentro da cotidianidade. São espécies de

fraturas, introduzem um elemento que rompe a percepção

normatizada do cotidiano.

Em um trabalho sobre fotografia contemporânea e apropriação,

Gauna e Costa, utilizam o exemplo do registro fotográfico desta

intervenção, para exemplificar como estes trabalhos buscam

registrar situações cotidianas, que muitas vezes fogem a nossa

percepção, “detalhes que passam despercebidos pelo olhar

comum”. 29

Rubens Mano registra nas simples imagens do cotidiano,

aparentemente ingênuas, aparentemente naturais, mas que

na verdade são imagens construídas, fabricadas ou alteradas,

29. GAUNA, Evandro de F.; COSTA, André F. A apropriação e a resignificação na fotografiacontemporânea. Eletras, vol. 18, n.18, jul.2009. p.147. Disponível em: http://www.utp.br/eletras/texto/AV_artigo_18.5_Evandro_Freitas_Gauna_Andre_Figueiredo_A_apropriacao_e_resignificacao_na_fotografia.pdf . Acesso em 15 de novembro de 2009.

Page 41: dentro- fora tencionando o espaço de arte

41

uma outra realidade à espera de ser registrada.30

Ao observar uma fotografia de 1987 (fig. 11), percebe-se que

um “perturbador buraco luminoso se impõe numa paisagem

desfocada” 31. Parando-se frente à imagem e observando com

mais atenção, compreende-se que o buraco é um holofote,

ligado e voltado a quem permanece fora do espaço da fotografia.

Laymert Garcia dos Santos, pesquisador do trabalho de Mano,

considera este trabalho como um retrato ou auto-retrato. Regra

geral dos retratos clássicos, o sujeito retratado é iluminado por

uma luz que aparece fora do enquadramento. Neste caso, ao

contrario, o que aparece no espaço da foto é a fonte de luz (o

holofote), iluminando o retratado que estaria a frente a imagem,

fora dela. Segundo Laymert, sobre o sujeito: “Presente, embora

ausente, esse corpo real-virtual se faz imagem fora da imagem,

fora do campo, no contra-campo”.32

Nesta fotografia (Sem título, 1987) de Rubens Mano encontramos

uma nova noção de espaço presente na produção de arte

contemporânea. Apesar de utilizar um formato de obra moderna,

a fotografia, ela discute uma condição contemporânea: a

interação do sujeito com a obra, com a incorporação de outro

espaço, o real. Ao incluir este espaço fora (o real), busca

incorporar também o sujeito que nele se encontra. O diálogo

entre o sujeito, a obra e o espaço se amplia, um se percebe no

outro e necessita do outro.

30. IBID, p.147.

31. SANTOS, Laymert Garcia dos. A tecno-estética de Rubens Mano. Em: Item-3. Rio de Janeiro, 1996. p.71.

32. IBID, p. 73.

Page 42: dentro- fora tencionando o espaço de arte

42

A interioridade que caracterizava as obras modernas, sua

resolução através do acomodamento de elementos internos

aparece aqui quebrantada. O protagonista da obra, o retratado,

revela-se exterior a própria obra. O espaço necessário para a

convivência com o trabalho é aumentado, com a inserção do

espaço real. É o que Alberto Tassinari chama de espaço em

obra. Não se trata do “próprio espaço do mundo em comum,

mas mesmo assim o requisita para participar da obra.”33 Ainda

segundo Tassinari, a requisição da espacialidade do mundo em

comum (o espaço real), para individualizar a obra contemporânea,

como obra de arte, diferente de um objeto qualquer, faz com

que ela não possua autonomia suficiente para desembaraçar-se

totalmente dele. Sua produção de sentido depende do espaço.

O termo espaço em obra proposto por Alberto Tassinari é uma

busca de conceituar o espaço das obras de Arte contemporâneas,

diferenciando-as das obras produzidas durante o período

naturalista e mesmo na fase de formação da arte moderna34. O espaço moderno35, (...) é um espaço em obra, assim como

é dito de uma casa em construção que ela está em obras.

Por meio da locução “em obras”, um espaço em obra possui

um significado assemelhado, com a diferença de que uma

obra de arte moderna, na grande maioria dos casos, não é

algo incompleto, inacabado, mas algo pronto que pode ser

visto como ainda se fazendo.36

33. TASSINARI, Alberto. O espaço moderno. São Paulo, Cosacnaify, 2001. P.56

34. Tassinari chama de arte naturalista a produzida a partir da matriz renascentista até por volta de 1870. Já a arte moderna, a divide em duas fases: a de formação, indo desta data, 1870, do Impressionismo, até a décadas de 1950, 1960 do século XX.; e a fase de desdobramento, chegando até nossos dias, a que chamamos neste texto de arte contemporânea.

35. Entenda-se que neste ponto Tassinari fala sobre o espaço moderno da fase de desdobramento, portanto da fase da arte contemporânea.

36. TASSINARI, Alberto, 2001. Op. Cit., p.50.

Page 43: dentro- fora tencionando o espaço de arte

43

Fig. 12 Rubens Mano - Detector

de Ausências, 1994. Instalação no Viaduto do

Chá, São Paulo. Foto: Renato Cury.

Page 44: dentro- fora tencionando o espaço de arte

44

Pensando desta maneira, podemos utilizar como exemplo a

foto Sem título de Mano para entender este espaço em obra.

Ainda que o espaço da obra na fotografia já esteja “terminado”,

construído, para se totalizar as potencialidades da imagem é

requerido um elemento forâneo, que como um corpo do mundo

em comum é requisitado para ser partícipe da obra. Para

corroborar esta análise, Tassinari coloca também que na arte

contemporânea o espaço do mundo assume funções que antes

– na fase naturalista e na de formação da arte moderna – eram

cumpridas no próprio espaço da obra, em seu interior.

O Detector de ausências (fig. 12), concebido por Mano para

o projeto Arte/Cidade II em 1994, é um dos trabalhos onde

podemos perceber esta proposição do diálogo entre o habitante

e o espaço urbano. Dois holofotes militares, cada um com 12

mil watts de potência, instalados sobre duas torres de 13 metros,

foram instalados nos dois lados do Viaduto do Chá em São

Paulo. Fachos de luz de 1,5 m de diâmetro são lançados, sem

coincidir-se, e atingem o fluxo dos pedestres. Durante as noites

as poderosas luzes cruzam perpendicularmente o viaduto à

altura dos transeuntes, projetando suas sombras e aumentando

a questão do anonimato. Apesar de por um instante serem

iluminados, protagonizados por esta luz, ela os devolve a sua

condição de anônimos ao projetar sombras iguais e sem limites

definidos no espaço.

Segundo Laymert Garcia37, o desenraizamento que este trabalho

provoca é a experiência básica do homem contemporâneo. Mas

visto em seu sentido positivo, libertando o pedestre do “sentido

37 SANTOS, Laymert Garcia dos. Detector de ausências: o desenraiza-mento como iluminação profana. Disponível em: http://www.casatriangulo.com/scripts/txt2.php?id:22. Em: 21 de abril de 2005.

Page 45: dentro- fora tencionando o espaço de arte

45

da realidade”, imposto pela racionalidade dominante. O golpe ou

choque sofrido por este passante da megalópole de São Paulo

pode deslocá-lo de sua “normalidade” e exigir sua atenção. O

uso dos refletores faz com que se fatie o espaço que a obra

atinge. Sem focar diretamente a pessoas, o espaço do trabalho

dialoga com todos os aparecimentos e desaparecimentos, com

tudo o que se movimenta na cidade. As luzes de grande alcance

apontam para o nada e são propagadas pela geografia do Vale

do Anhangabaú, como se não tivessem objeto especifico para

iluminarem. Apesar de iluminar passantes por alguns instantes,

parece que iluminam algo que não existe, que está fora do

nosso campo de visão.

Ao ser instalado no espaço urbano, no espaço comum de

uma grande cidade como São Paulo, o trabalho de Mano,

integra-se a ele e também, necessita dele para que aconteça

completamente. Necessita do espaço como um todo, do espaço

físico, da rua, e das pessoas, dos transeuntes que comumente

por ali caminham. A obra, ao mesmo tempo em que necessita

deste espaço, que trava um diálogo com ele, não o altera como

um todo. O espaço comum segue igual. O espaço em obra

continua operando na proposição de Mano enquanto as pessoas

caminham e fazem com que ela aconteça. Tassinari assim fala

das operações da arte contemporânea no espaço:Uma obra contemporânea não transforma o mundo em arte,

mas ao contrário, solicita o espaço do mundo em comum

para nele se instaurar como arte.

Assim há uma duplicidade na arte contemporânea quanto ao

papel do espaço do mundo em comum. De um lado ele é

requerido para individualização da obra, de outro, ele deve

permanecer inalterado e não ser articulado pela obra. (...)

Distante das vizinhanças da obra, ele é o espaço habitual;

Page 46: dentro- fora tencionando o espaço de arte

46

próximo da obra, porém ele é, tanto parte dela quanto o

espaço do mundo comum habitual, cotidiano (...).38

Encontrar este diálogo com o espaço urbano e com aqueles que

o habitam aparece decisivo na escolha de Mano pela arte. Ao

unir as práticas artísticas com a experiência acumulada com a

arquitetura, o artista promove este diálogo com um hibridismo

característico da arte contemporânea. Os limites entre as áreas

perdem seus contornos. O espaço da arte se mistura e dança

com os outros espaços e áreas do conhecimento. Traços estes,

característicos da arte hoje como aponta Sonia S. Del Castillo:(...) multiplicidade, entrelaçamento, fusão e

insterdisciplinaridade são as características da arte nos dias

atuais.39

Também nesta busca pelo diálogo e interação entre arte e

espaço, pode-se fazer uma análise observar uma continuação

deste processo nos três trabalhos de Mano aqui mostrados. Na

fotografia (1984) começa a incorporar o espaço real, mas ainda

utilizando-se de uma moldura moderna de apresentação. Em

Bueiros, parte para uma construção maior do espaço ao colocar

o trabalho na rua, com recortes do cotidiano, assim como fará

de maneira ainda mais elaborada em Detector de ausências.

Percebe-se nesta tragetória como a construção do espaço

acontece nas sequências de eventos e ações do artista. Miown

Kown aponta que estes sites (espaços) “são estruturados (inter)

textualmente mais do que espacialmente, e seu modelo não é

mais um mapa mas um itinerário (...) uma narrativa nômade cujo

percurso é articulado pela passagem do artista.”40

38. TASSINARI, Alberto, 2001. Op. Cit., p.76.

39. CASTILLO, Sonia S. del, 2008. Op. Cit., p.215.

40. KO�M, Miwon, 1997. Op. Cit. p.07.

Page 47: dentro- fora tencionando o espaço de arte

47

Bueiros e Detector de Ausências, apresentam outra importante

semelhança: a concepção das obra, discorre sobre o tema que

aborda o trabalho de arte dentro da compreensão chamada

de site - specificity 41, ou seja, a inserção da arte no espaço

das cidades, que desponta após a discussão do site-specific

e o rompimento da relação formal estabelecida entre a noção

artística e local para onde estava projetada, possibilitando o

redescobrimento do tecido urbano e o surgimento de uma prática

cultural mista. Esta noção também é tratada pelo artista em sua

tese de mestrado, onde é observada através de imagens de

determinadas intervenções que ele realiza ou capta no ambiente

urbano.

Para a XXV Bienal de São Paulo (2002) faz uma proposição

que parte do próprio programa da mostra. Com o tema “A

metrópole”, Mano acreditava que, apesar de pretender abordar

as tensões e relações construídas no espaço das metrópoles,

a mostra não previa ações que se projetassem para além do

âmbito controlado do edifício da Bienal, projetado por Oscar

Niemeyer. Espaço cheio de restrições e impedimentos para a

realização de algumas proposições contemporâneas. Mesmo com

as discussões da arte instalando-se na trama social da cidade,

nas implicações sociais e na necessidade de re-significação

de outros espaços urbanos, a bienal continua circunscrita ao

prédio, um dos marcos da arquitetura moderna de São Paulo.

Mano relaciona o tema da mostra e sua condição de realização

limitada ao edifício e diz: “Isto me fez pensar nas inserções que realizo nas cidades, e

como um trabalho poderia comentar as implicações contidas nesta

41. Este assunto é tratado no seguinte texto: KRAUSS, Rosalind. Richard Serra – Richard Serra – sculpture. New York: Museum of Modern Art. 1986.

Page 48: dentro- fora tencionando o espaço de arte

48

posição da instituição.” 42

O artista propõe duas intervenções no prédio da Bienal. A

primeira seria um corte de 2 x 5 metros no 2º andar do edifício,

vazando a laje e coberto por uma grade, como as que são

comumente usadas em respiradouros de metrô. Este corte faria

uma comunicação entre os dois andares ou, como observa o

curador da bienal, Agnaldo Farias: “o incauto espectador seria repentinamente assaltado pela

evidência de uma fresta no espaço, uma fratura vertical que o

convidaria a espreitar o andar de baixo, uma câmera através

da qual ele observasse o fluxo descontinuo dos outros

visitantes, até mesmo capturasse seu ruído.” 43

Ao analisar o espaço em obra e como este se comunica com

o mundo comum, Alberto Tassinari, faz uma análise da obra

Conceito Espacial: espera (fig. 13), de Lucio Fontana, que

podemos usar como análoga a esta proposição de Mano. A

ligação da tela com seu exterior revela-se inicialmente por sua

ausência de profundidade. O campo de cor amarelo, opaco,

tingido de forma homogênea, traz uma exterioridade onde o

olhar não penetra. Ele a transpõe, exatamente onde ela não

é tela, nos talhos, onde o escurecimento arrosta contra a

homogeneidade da superfície. Tassinari, fala sobre a relação

entre obra e o mundo em comum:A comunicação entre os dois espaços, o da obra e do mundo

em comum, é, então muito tênue. Ela se dá, além da própria

opacidade da tela, pelas fendas. E dado que são fendas,

também respiram, embora sendo partes da obra, o mesmo

42. MANO, Rubens. Entrevista dada a Helmut Batista, realizada em junho de 2002. Disponível em http://www.casatriangulo.com/scripts/txt2.php?id:120. Em: 21 de abril de 2005.

43 FARIAS, Agnaldo. Rubens Mano. Disponível em: http://www.casatrian-gulo.com/scripts/txt2.php?id:120. Em: 21 de abril de 2005. Originalmente publicado em 2002, no catálogo Cidades da 25ª Bienal de São Paulo.

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49

ar do espaço fora.44

Podemos pensar na fenda proposta por Mano, como os talhos

na pintura de Fontana. Como estes, aparece como um espaço

em obra em estado nascente. A abertura no piso ainda não cria

toda uma expansão do espaço. Fazendo uma paráfrase ao texto

de Tassinari: Os limites exteriores da abertura pertencem ao

piso. Seu interior, coberto pela grade, é o lugar por onde a obra

se liga com o espaço comum. O piso guarda a abertura, porém,

em regiões que ainda não vieram à luz. A abertura é definitiva.

O piso, entretanto, apenas começa por fecundar um espaço.

Pouco se abre para o exterior.45

44. TASSINARI, Alberto, 2001. Op. Cit., p. 78.

45. Texto original: Os limites exteriores das fendas pertencem à tela. Seus interio-res, delgadas frestas, são lugares por onde a obra se liga com o espaço em co-mum. A tela guarda as fendas, porém, em regiões que ainda não vieram à luz. Os rasgos são firmes, definitivos. A tela, entretanto, apenas começa por fecundar um espaço. Pouco se abre para seu exterior. TASSINARI, Alberto, 2001. IBID, p.80.

Fig. 13 Lucio Fontana,

Conceito Espacial: espera, 1965.

Óleo sobre tela, 92,4 x 73,2cm.

Acervo Museu de Arte Contemporânea da Cidade

de São Paulo.

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50

Esta proposição não chega a ser executada. Esbarra em uma

amálgama de entraves financeiros, institucionais e no órgão de

Patrimônio do Estado, o Conselho de Defesa do Patrimônio

Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat) por se

tratar de um edifício tombado por este órgão. Segundo Mano,

este fator não era exatamente um empecilho, já que a intervenção

era reversível. Utiliza outro argumento em favor da obra, este

de maior interesse neste estudo. No domínio curatorial, o uso

de um edifício tombado (onde não é possível realizar nenhuma

intervenção física) não condiz com a realização de uma mostra

de Arte contemporânea.

Fig. 14

Rubens Mano.

Vazadores,2002.

Vista interna

Fig. 15

Rubens Mano.

Vazadores,2002.

Vista externa

Page 51: dentro- fora tencionando o espaço de arte

51

Vazadores foi a proposta executada pelo artista na Bienal. Uma

passagem vazando a fachada oposta à entrada oficial do Edifício

da Bienal foi construída em vidro e ferro, assemelhando-se a

construção original do prédio (fig. 14 e 15). A construção é uma

espécie de anexo e, ao mesmo tempo independente da estrutura

original. A obra estabelecia, simultaneamente, uma aproximação

e uma crítica à Bienal. A criação da passagem não-oficial punha

à prova o próprio título tema da mostra: Iconografias Urbanas.

A problematização entre o espaço e a obra que vê-se germinando

na primeira proposição de Mano para a Bienal, em Vazadores

percebemos de forma cabal. Mais uma vez utilizamos o conceito

de espaço em obra, necessitando deste espaço externo, do

mundo comum. Aqui, ainda que não modificando este mundo,

altera formas no trânsito e na percepções, tanto do mundo em

comum quanto do espaço expositivo. Ao deparar-se com ela,

aos sujeitos se abre um leque de possibilidades de percepção

e vivência com a obra. Já que esta instala-se em uma fresta

do espaço real, podendo modificá-lo e reorganizá-lo em

dependência da experiência, seja ela qual for, do sujeito.

Em Vazadores nota-se ainda, uma proposição que aproxima-

se mais ao site-specific. Existe uma maior preocupação com o

local onde a obra é inserida, já que sua criação de conceitos

estava vinculada fortemente ao prédio da bienal e da instituição

organizadora do evento. Trata-se aqui da primeira noção de

site articulado por M. Kwon46, transformada em localiade física

– enraizada, fixa e real.

46. KO�N, Miwon, 1997. Op. Cit. p07.. KO�N, Miwon, 1997. Op. Cit. p07.

Page 52: dentro- fora tencionando o espaço de arte

52

Page 53: dentro- fora tencionando o espaço de arte

53

O Arco Inclinado de Richard Serra possui similaridades com a

proposição de Mano, ao analisarmos a relação entre o espaço

e a obra. Realizada a princípios da década de 1980, uma chapa

de aço curva de 3,6m de altura abraça o espaço da Federal

Plaza em Nova York (fig. 16 e 17).

Assim como em Vazadores, a escultura de Serra necessita do

espaço do mundo em comum para se fazer obra. “Seu espaço é

quase inteiramente sua exterioridade – a curvatura que conforma

e requisita o espaço fora dela.”47 Nas duas propostas não existe

uma interioridade na obra, elas praticamente não possuem um

interior. Tassinari, assim fala sobre a exterioridade e a relação

obra – espaço de Arco Inclinado: Não há uma interioridade na obra onde o espectador possa

duplicar ou refletir a sua própria. Há, antes, uma segunda

exterioridade que sobreveio ao espaço do mundo em comum.

Exterior num exterior, o obra não pode modificar o mundo do

espaço em comum em sua estrutura básica. Ela também está

no espaço do mundo em comum como qualquer outra coisa.

A obra não é o mundo nem possui um mundo inteiramente

autônomo, mas emerge do espaço em comum emprestado

dele – através dos sinais do fazer, do corte e a implantação

– o que ela falta para individualizar-se, pois, sem um interior,

precisa fincar no espaço fora para completar seu espaço em

obra.48

Esta segunda exterioridade também esta presente na obra de

Mano, que parte de uma estrutura arquitetônica pré-existente

e a duplica em uma parte autônoma, mas similar. Ela toma

emprestado, este mundo comum do prédio institucionalizado da

Bienal, ao mostrar sinais de seu fazer que em pouco diferem da

47. TASSINARI, Alberto, 2001.Op. Cit., p. 77.. TASSINARI, Alberto, 2001.Op. Cit., p. 77.

48. TASSINARI, Alberto, 2001.Op. Cit., p. 77.. TASSINARI, Alberto, 2001.Op. Cit., p. 77.

Fig. 16 - Richard Serra –

Arco Inclinado, 1981.

Aço cor-tem,

366 x 3.751 x 6 cm.

Federal Plaza, Nova York.

Obra destruída.

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54

disposição original. A complementação de seu espaço fora, se

dá pela totalidade do local onde está instalada e pela realocação

e alteração de sentido do trânsito. Assim também aconteceu com

o Arco Inclinado. Pela escala da chapa, que ocupava quase a

totalidade da praça, as pessoas tiveram que mudar o percurso e

seu trajeto, encontrando sempre a obra em seu curso.

No caso da proposta de Mano a mudança de circulação proposta

por esta nova entrada / saída pode dar novo sentido a todo

projeto de curadoria da mostra. Se pensarmos nas concepções

curatoriais modernas, onde se analisa o sentido do fluxo dos

visitantes para a disposição das obras, este “Vazador” seria um

entrave na “completa fruição das obras”.

O cubo branco modernista, apesar de sua negação da existência

do tempo e do mundo exterior, marca o momento onde a obra

deixa de ser um parêntese, uma janela, um universo a parte

para o começo do nascimento de algum diálogo com o espaço

expositivo. Com a exclusão da idéia de janela, os quadros

começam a expandir-se lateralmente tornando a parede um

elemento componente da obra. A maneira de organizar os

quadros passa a requerer outros profissionais, os curadores e

designers de exposição. Agora, muitas vezes sem moldura, os quadros se comunicavam

entre si, exigindo assim, os cuidados de serem setorizados

e por estilos que dialogavam bem e serem privados de um

contato demasiadamente próximo com a obra vizinha para

que tivessem o espaço necessário para respirar.49

A proposição de Mano desconstrói essa lógica expográfica

modernista, muito utilizada até os dias de hoje. Os sujeitos não

49. ALVES, Giovana Cruz. [Espaço entre] arquitetura e arte. Monografia de conclu-. ALVES, Giovana Cruz. [Espaço entre] arquitetura e arte. Monografia de conclu-Giovana Cruz. [Espaço entre] arquitetura e arte. Monografia de conclu-são de curso. Vitória: UFES, 2009. Orientador: Martha Machado Campos.

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55

possuem mais um sentido pré-determinado para o recorrido da

mostra, terão outras orientações de sentido ao entrarem pela

nova entrada proposta.

Este corte no edifício traz ainda muitas questões à tona. Ao

situar-se na borda do prédio, perpassa os limites da própria

instituição. O público poderia entrar sem pagar, provocando

evasão de renda. Poderia sair levando alguma peça roubada

ao não haver total segurança na saída. Estes entraves levaram

a instituição a impor limites ao trabalho. Um segurança deveria

ficar próximo ao “Vazador” durante todo o tempo. Já não seria

permitida entrada ou saída pela nova fresta do edifício. O

espectador poderia se aproximar, perceber seu funcionamento

e seria, cordialmente, convidado a entrar ou sair pelos locais

antes estabelecidos.

Encontramos aqui outra vez o segurança da Documenta de

Kassel, referido por Huyssen50. Arte não esta feita para entrar,

sair, sentar. Mesmo que estas funções estejam aparentes

em sua condição concreta de manifestação. Agnaldo Farias,

referindo-se a colocação do segurança, assim escreve no

catálogo da Bienal: “Curioso este tempo em que até mesmo

um trabalho de Arte demanda de uma exposição como a da

Bienal, tradicionalmente devotada às expressões mais radicais,

uma atitude de vigília.”51 Acredito que esta fala poderia ser dita:

“Curioso uma exposição como a da Bienal, tradicionalmente

devotada às expressões mais radicais, precisar demandar de

uma atitude de vigília, neste tempo.

50. HUYSSEN, Andreas, 1993. Op. Cit., p. 208-248. HUYSSEN, Andreas, 1993. Op. Cit., p. 208-248208-248.

51. FARIAS, Agnaldo, 2005. Op. Cit.

Page 56: dentro- fora tencionando o espaço de arte

56

Mano então retrucou ao controle da exposição, com outro

controle. Os quatro representantes de São Paulo na Bienal,

um deles Rubens Mano, colocaram uma mesa e duas cadeiras

dentro do prédio. Em uma delas um segurança, contratadopor

eles, tinha um monitor que transmitia uma vista do trabalho e

que na existência de qualquer ocorrência comunicaria ao artista.

Acontece outra vez uma segunda exterioridade na obra. O vigia

vigila o vigia.

Assim como trabalho de Mano, o Arco Inclinado também

sofreu imposições, neste caso públicas, devido igualmente a

alteração da dinâmica espacial que provocava. Em 1989, após

discussões em tribunais que se arrastaram por oito anos, a

obra foi removida. Serra afirmou que a escultura havia sido

concebida especificamente para aquele espaço e sua remoção

seria equivalente a destruí-la. Depois de sua retirada foi então

desmantelada e depositada, fragmentada em um ferro-velho.

O episódio causou uma viva polêmica nos Estados Unidos, a

discussão sobre a arte nas ruas assumiu grandes proporções.

Segundo Breson, um dos grandes equívocos do caso foi que

funcionários de prédios públicos que circundavam a praça, que

conviveriam diariamente com a obra não foram consultados no

caso. Todavia a obra de Serra chamou a atenção da sociedade

para problemas básicos, segundo Fernando Oliva:Como se abrira essa ferida entre o mundo da arte e o povo e

como se podia curá-la? Quem era a platéia da arte pública?

Quem era o público? Quem constituía o povo? Quem e o

que, em última instância, decidia o que fazia a arte num

cenário público ser bem ou mal-sucedida? Como seria a arte

pública se tivesse de ser imediatamente aceita, quando não

moldada, pelas pessoas que vão conviver com ela?52

52. OLIVA, Fernando. Escultura de Elisa Bracher é retirado do Largo do Arouche. Disponível em: http://www.cosacnaify.com.br/noticias/elisabracher.asp . Acesso em: 22 de novembro de 2009.

Fig. 17 - Richard Serra –

Arco Inclinado 1981.

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57

Em sua dissertação de mestrado, Mano destaca que as novas

propostas trazidas pela arte contemporânea não pretendia

transformar a vida em happenings ou performances, mas

superar a oposição entre a ação artística e as situações banais

do dia-a-dia. Assim como podemos observar em Vazadores

e em Pavement, que será analisada a seguir, estas propostas

informam “a necessidade de uma resistência às articulações

do poder real, desempenhado por normas e instituições, e a

importância de colocá-las em evidência, trazendo à luz suas

operações de monitoração e controle.”53

53. MANO, Rubens. A condição do lugar no site. In: Intervalo Transitivo. Dissertação de mestrado. São Paulo: ECA/USP, 2003. p.9. Disponível em: http://www.cap.eca.usp.br/ars7/mano.pdf. Acesso em: 21 de dezembro de 2009.

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58

Tomadas aparecem nas escadas e calçadas próximas ao Centro

Cultural Oswald de Andrade no bairro do Bom Retiro em São

Paulo. Os sujeitos que por ali caminhavam acham suspeito aquela

possível disponibilidade de energia elétrica gratuita. Seria “gato”?

Estariam as autoridades cientes do que estava acontecendo? A

maioria das pessoas continua passando e indagando-se sobre

a veracidade dos dutos espalhados. Mas alguns vendedores

ambulantes da área percebem que a oferta não é somente

potencial e passam a utilizar a eletricidade para incrementar

seus negócios (fig 18). Um vendedor de pipoca aproveita, liga

uma luz durante a noite, alargando seu horário de trabalho.

Moradores de rua utilizam as tomadas para a preparação de

seus alimentos em fogões elétricos adaptados.

Fig. 18 – Rubens Mano.

Pavement, 1999.

Em uso por vendedor de

discos ambulante.

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59

As tomadas faziam parte da proposta Pavement (fig. 19 e 20),

que Rubens Mano executou em 1999, durante seis semanas,

entre julho e agosto, a convite da Oficina Cultural Oswald de

Andrade no bairro do Bom Retiro em São Paulo. A energia

elétrica do Centro foi “levada” para o exterior e disponibilizada

a qualquer pessoa durante vinte e quatro horas. Os dutos

industriais, colocados de forma desorganizada pelo edifício

adjacente se assemelhavam aos “gatos”, ligações de água e

elétricas furtivas. Lilian Tone, em ensaio sobre a obra comenta:Invertendo as noções usuais de pertencimento, dentro e fora, esta

simples operação mudou radicalmente a dinâmica da vida na rua. 54

54. TONE, Lilian. Rubens Mano on light and power. Disponível em: http://home.att.

net/~artarchives/mano.html. Acesso: 12 de setembro de 2009. Texto original: “In-

verting the usual notions of what belongs inside and what belongs outside, this simple

operation radically changed the dynamics of life in the street.”Fig. 19 – Rubens Mano.

Pavement, 1999.

Page 60: dentro- fora tencionando o espaço de arte

60

Rubens Mano explicou a autora55 que o local onde a oficina

está localizada é um dos bairros mais antigos de São Paulo e

vem sendo negligenciado nas últimas décadas, apesar de uma

intensa história de atividade comercial. A intenção da criação

da oficina foi revitalizar a área e proporcionar uma série de

atividades a seus moradores. Mano sentiu uma lacuna entre a

proposta e o efetivo alcance da instituição e propõe um trabalho

que estende seus efeitos para além do limite do prédio, tentando

reduzir as distâncias entre a instituição e o público que objetiva.

Segundo Mano: O artista não é um ‘criador de sociedades’ e tampouco deve

se tornar um espelho passivo dessa realidade. Ele é um

membro da comunidade que não deveria se afastar das

implicações relativas ao ambiente em que vive e, tampouco,

evitar as ‘responsabilidades éticas e políticas’ de sua inserção

no espaço.56

Seguindo a análise de Tone, Pavement fala sobre a mudança

de papel do sujeito frente a obra de arte. Para a autora vários

artistas contemporâneos tem demonstrado o interesse de

renegociar seu relacionamento com o público, utilizando-se de

muitas estratégias para que realizem uma convidativa, ainda que

muitas vezes, desconcertante, experiência. Buscam envolver

sujeito através de suas propostas. Félix González Torres com

suas pilhas de chocolate, os jantares de Rirkrit Tiravanija e

os produtos livres e serviços de Minerva Cuevas, são alguns

exemplos neste sentido.

Estas ações, assim como Pavement, apresentam-se como

espaço em obra, acontecendo em espaços expositivos não

55. TONE, Lilian. Op. Cit.. TONE, Lilian. Op. Cit.

56. MANO, Rubens, 2006. Op. Cit. p.07.. MANO, Rubens, 2006. Op. Cit. p.07.

Page 61: dentro- fora tencionando o espaço de arte

61

habituais, jogando com os limites do pertencimento e do dentro-

fora. Suas práticas envolvem ações que promovem relações

interpessoais e as levam para a esfera social. Utilizando as

palavras de Tone: Em outras palavras, estes novos trabalhos tem tempo e

espaço real, envolvem as especificidades do público e

enfatizam a sua articulação dentro do próprio contexto em

que são apresentados.57

O trabalho de Mano promove uma sensibilização para a

mudança da definição do quadro atual dos espaços onde a

arte é apresentada. Uma mudança situacional, como se em

seus trabalhos a moldura fosse sutilmente deslocada. Em suas

proposições o espaço em obra cria novos lugares, que podem

gerar conforto e desconforto, liberdade e auto-consciência e

gera, nas instituições e nos sujeitos um desafio ao seu poder

de adaptação.

57. TONE, Lilian.Op. Cit.. Texto original: In other words, these works foreground . TONE, Lilian.Op. Cit.. Texto original: In other words, these works foreground real time and space, engage the specificities of the audience, and emphasize their own articulation within the context in which they are presented.

Fig. 20 – Rubens Mano.

Pavement, 1999.

Page 62: dentro- fora tencionando o espaço de arte

62

ARTE CONTEMPORÂNEA & ESPAÇO:CONSIDERAÇÕES FINAIS

Caracterizando o espaço e a paisagem Milton Santos escreve:

O espaço é a sociedade, e a paisagem também o é.(...)

A paisagem existe através de suas formas, criadas

em momentos históricos diferentes, porém coexistindo

no momento atual. No espaço, as formas de que se

compõe a paisagem preenchem, no momento atual,

uma função atual, como resposta às necessidades atuais

da sociedade. Tais formas nasceram sob diferentes

necessidades, emanaram de sociedades sucessivas,

mas só as formas mais recentes correspondem a

determinações da sociedade atual.158

Arte e espaço, em sua relação na contemporaneidade, se

encontram assumindo estas funções do espaço que destaca o

autor. No decorrer do texto pode-se perceber que os sucessivos

diálogos (ou a falta deles) que foram estabelecidos entre arte e

espaço através da história, desembocaram na situação atual. A

arte já não possui mais espaços ideais para sua apresentação.

Todos o são em realidade. Entretanto se relaciona com estes

buscando um embate, propondo conflitos e se imbrica nele e em

seus sentidos para sua produção de sentido.

As determinações da sociedade contemporânea formadoras

dessa relação, promovem esse caráter do diálogo. A noção de

58. SANTOS, Milton. A natureza do espaço: Técnica e tempo, razãoe emoção. 4 ed. 2 reimpr. São Paulo, Editora da Universidade de São Paulo, 2006. p. 67.

Page 63: dentro- fora tencionando o espaço de arte

63

espaço visto unicamente em sua dimensão física se desdobra

a noções que perpassam este campo e se instalam também

no descobrimento do tecido urbano e em produções artísticas

contaminadas por outros campos do conhecimento.

O exemplário de obras do artista Rubens Mano utilizado para

ilustrar a questão, mostra como se busca sempre o caráter

relacional entre arte e espaço. Existe uma procura constante de,

através e com a arte, confrontar-se com este espaço, cotidiano

ou imperceptível, buscando novas percepções ou, apenas, e

não menos considerável, torná-lo visível. Da mesma forma

busca tornar visível a imbricada rede dos aparatos institucionais,

propondo um confontro também com estes espaços, os espaços

da Arte.

Afinal, será ali onde, invariavelmente, estas proposições /

ações serão expostas. Talvez reconstruídas ou representadas

em um espaço de museu. Talvez em um museu do século XXI.

A experiência única poderá se converter em simulacro, a tensão

em apaziguamento, a participaçao em passividade, o conflito

em algo “interessante”. Ao tentar tocar a obra de Arte, não se

surpreendam se forem repreendidos por um segurança.

Page 64: dentro- fora tencionando o espaço de arte

64

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upload/2008/06/129_2849-Arco.jpg

Fig. 17. Richard Serra – Arco Inclinado 1981. Obra destruída. Federal

Plaza, Nova York. Fonte: http://www.tc.pbs.org/wgbh/cultureshock/

flashpoints /visualarts/images/tiltedarc_big2.jpg

Fig. 18. Rubens Mano. Pavement, 1999. Dutos industriais e tomadas

elétricas. Em uso por vendedor de discos ambulante. Fonte: http://home.

att. net/~artarchives/mano2.72.jpeg

Fig. 19. Rubens Mano. Pavement, 1999. Dutos industriais e tomadas

elétricas. Fonte: http://home.att.net/~artarchives/mano1.72.jpeg

Fig. 20. Rubens Mano. Pavement, 1999. Fonte: http://home.att.

net/~artarchives/ mano3.72.jpeg