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Parasitologia prática Malária 1 DIAGNÓSTICO LABORATORIAL DA MALÁRIA 1. Diagnóstico clínico inespecífico Após inoculação do parasita Plasmodium no Homem, o período médio de incubação da infecção é no mínimo de uma semana e varia de acordo com a espécie: Plasmodium falciparum - 8 dias P. vivax – 10 dias P. ovale – 11 dias P. malariae – 17 dias. No caso de P. ovale e P. vivax a primeira manifestação clínica pode demorar alguns meses a surgir. Assim, devem ser tomadas medidas de vigilância em indivíduos que tenham estado em zona endémica de malária de forma que um diagnóstico positivo não seja demasiado tardio. As manisfestações clínicas da malária são inespecíficas incluindo febre, anemia, icterícia e esplenomegalia, entre outras, para todas as espécies de Plasmodium. No caso de P. falciparum pode surgir sintomatologia mais severa como malária cerebral, convulsões, falha renal e edema pulmonar. Assim é evidente que não há um padrão clínico típico e específico da malária que possa ser utilizado para o seu diagnóstico pelo que muitas vezes a infecção é confundida com gripes, hepatites, gastro-enterites, encefalites virais e psicoses. 2. Diagnóstico laboratorial 2.1. Exame parasitológico por Microscopia Óptica Este é o método clássico e mais específico de diagnóstico da malária, por observação dos parasitas no sangue periférico. 2.1.1. Amostras -sangue periférico -grávidas e recém nascidos: sangue do cordão umbilical e de amostras de placenta 2.1.2. Esfregaços 2.1.2.1. Esfregaço clássico ou “gota fina” Objectivo: examinar os parasitas no interior dos eritrócitos e determinar a espécie de Plasmodium de acordo com as características morfológicas Preparação: Colocar 1 gota de sangue de forma a ocupar aproximadamente 3 mm de diâmetro no 1º terço duma lâmina de vidro. Usar uma outra lâmina inclinada a 45º para espalhar o sangue suave e rapidamente. Deixar secar ao ar.

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Parasitologia prática Malária

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DIAGNÓSTICO LABORATORIAL DA MALÁRIA 1. Diagnóstico clínico inespecífico Após inoculação do parasita Plasmodium no Homem, o período médio de incubação da infecção é no mínimo de uma semana e varia de acordo com a espécie: Plasmodium falciparum - 8 dias P. vivax – 10 dias P. ovale – 11 dias P. malariae – 17 dias. No caso de P. ovale e P. vivax a primeira manifestação clínica pode demorar alguns meses a surgir. Assim, devem ser tomadas medidas de vigilância em indivíduos que tenham estado em zona endémica de malária de forma que um diagnóstico positivo não seja demasiado tardio. As manisfestações clínicas da malária são inespecíficas incluindo febre, anemia, icterícia e esplenomegalia, entre outras, para todas as espécies de Plasmodium. No caso de P. falciparum pode surgir sintomatologia mais severa como malária cerebral, convulsões, falha renal e edema pulmonar. Assim é evidente que não há um padrão clínico típico e específico da malária que possa ser utilizado para o seu diagnóstico pelo que muitas vezes a infecção é confundida com gripes, hepatites, gastro-enterites, encefalites virais e psicoses. 2. Diagnóstico laboratorial 2.1. Exame parasitológico por Microscopia Óptica Este é o método clássico e mais específico de diagnóstico da malária, por observação dos parasitas no sangue periférico.

2.1.1. Amostras -sangue periférico -grávidas e recém nascidos: sangue do cordão umbilical e de amostras de placenta

2.1.2. Esfregaços 2.1.2.1. Esfregaço clássico ou “gota fina” Objectivo: examinar os parasitas no interior dos eritrócitos e determinar a espécie de Plasmodium de acordo com as características morfológicas Preparação: Colocar 1 gota de sangue de forma a ocupar aproximadamente 3 mm de diâmetro no 1º terço duma lâmina de vidro. Usar uma outra lâmina inclinada a 45º para espalhar o sangue suave e rapidamente. Deixar secar ao ar.

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Coloração: Várias colorações podem ser utilizadas no diagnóstico da malária incluindo Field, Leishman e Giemsa. As duas primeiras não permitem contudo um diagnóstico exacto ao nível da espécie, pelo que a mais comum e que permite evidenciar todas as estruturas importantes na detecção e identificação do parasita é a: Coloração Giemsa 1. Fixar o esfregaço com metanol, 1 a 2 minutos. 2. Preparar uma solução de Giemsa a 10% em PBS. (usar no máximo até 8

horas depois) 3. Corar o esfregaço durante 20 minutos. 4. Lavar a lâmina em água corrente. 5. Secar ao ar na posição vertical. Observação do esfregaço corado:

A melhor zona para observação da morfologia dos parasitas é a região do esfregaço onde os eritrócitos estão em contacto, mas não sobrepostos.

Observar com a objectiva de 100x em óleo de imersão: - eritrócitos: tom cinzento a vermelho-tinto - leucócitos: núcleo azul escuro ou violeta, com citoplasma azul claro Características a registar: - tamanho e forma dos eritrócitos - presença de pontuações: . Schuffner´s dots . Jame´s dots . Maurer´s clefts -aspecto dos parasitas: . citoplasma azulado . cromatina vermelha ou púrpura . fase de desenvolvimento- forma

Ponto de aplicação

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. nº de parasitas/eritrócito

. Estimativa da parasitémia nos esfregaços “finos” - essencial na infecção por P. falciparum Contagem de 1000 eritrócitos e determinar a percentagem de células infectadas

Possíveis artefactos: pó, grânulos de corante, agregados e plaquetas 2.1.2.2. Esfregaço de gota espessa Objectivo: examinar uma maior quantidade de sangue (maior probabilidade de encontrar parasitas) e concentrar os parasitas numa área menor; as hemácias perdem a estrutura celular e os parasitas são libertados Preparação: Adicionar cerca de 5 µl de sangue a uma lâmina e espalhar com um palito em movimentos circulares, numa área de 1 cm2. Deixar secar a preparação. Coloração: Giemsa

1. Preparar uma solução de Giemsa a 3% em água tamponada a 7,2

2. Corar o esfregaço não fixado, durante 30 minutos 3. Lavar a lâmina com água tamponada a 7,2 4. Secar a preparação ao ar

Observação . Macroscopicamente o esfregaço deve ser azul claro e semi-transparente. É examinado com a objectiva de 100x, em óleo de imersão. Devem ser observados 100 campos, no mínimo, mas idealmente deve ser todo o esfregaço . Observam-se leucócitos e plaquetas mas não eritrócitos, já que foram lisados durante o processo de coloração (água)

Informação decisiva para identificação da espécie de Plasmodium

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. Os parasitas, quando presentes, estão bem definidos, mas tendem a estar mais densos e compactos o que dificulta ou impossibilita, em conjunto com a ausência da informação da estrutura do eritrócito, a identificação da espécie. Limite de sensibilidade da técnica: 20 parasitas/µl sangue (0,0004% parasitémia)

Esfregaços “negativos” . Por vezes a suspeita clínica de malária é forte, mas os esfregaços dão resultados negativos Possíveis explicações:

- em áreas geográficas onde a malária é pouco frequente pode ocorrer um diagnóstico errado - quando não é este o caso, os esfregaços devem ser revistos e novas amostras de sangue devem ser colhidas - o tratamento com anti-maláricos pode levar à ausência temporária de parasitas do sangue ----recolha de amostras sequenciais - no caso da infecção por P. falciparum, os parasitas podem ficar temporariamente sequestrados nos capilares dos tecidos profundos o que pode conduzir a um resultado negativo---- repetir a recolha de sangue duas vezes ao dia

2.2. Sistema QBC –Microscopia de Fluorescência Os métodos clássicos de diagnóstico parasitológico são os mais práticos e específicos, mas quando a parasitémia é reduzida (< 0,001%), a técnica é morosa e requer um microscopista experiente De forma a ultrapassar estas limitações, foi desenvolvida uma técnica rápida designada “Quantitative Buffy-Coat”-QBC, da marca BectonDickinson. Desvantagem: é necessário um microscópio de fluorescência ou

uma luz ultravioleta acoplada ao microscópio óptico Preparação: O sangue é centrifugado num tubo capilar revestido com “acridin

orange” (substância com afinidade para os ácidos nucleicos) e que contem um flutuador interno

Os parasitas quando presentes no sangue adquirem o “acridin orange” e como os eritrócitos infectados são menos densos que os não infectados, vão aparecer na interface eritrócitos/granulócitos. Sob iluminação Ultravioleta o DNA dos parasitas emite flurescência com a acridin orange.

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2.3. Detecção de anticorpos anti-malária

A resposta humoral com produção de anticorpos desenvolve-se poucos dias depois de os parasitas invadirem os eritrócitos, aumentando o título nas semanas seguintes. Estes anticorpos podem persistir durante meses e mesmo anos, em indivíduos semi-imunes em áreas endémicas onde a re-infecção é frequente. Contudo, num indivíduo não-imune e após infecção, os níveis de anticorpos decaem rapidamente e podem ficar indetectáveis em 3 a 6 meses.

Assim, este método não pode substituir o exame do esfregaço na fase aguda da infecção, mas pode auxiliar no “screening” de dadores de sangue e na confirmação de malária em estudos retrospectivos em residentes de zonas não-endémicas. Técnicas mais utilizadas: Imunofluorescência indirecta /ELISA/Imunocromatografia

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2.4. Detecção de material genético dos parasitas Importante quando existe um grande número de amostras/dia ou em estudos “de campo” (epidemiológicos). É ainda importante na identificação de estirpes de Plasmodium resistentes a fármacos (multiresistentes). Técnicas mais utilizadas: -Sondas de DNA: Barker desenvolveu uma sonda específica para P. falciparum, capaz de detectar 20-25 parasitas/ µl sangue -PCR: esta técnica apresenta como limite de sensibilidade de 10 parasitas/ 20 µl sangue

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Formas parasitárias no eritrócito

Trofozoito imaturo

Trofozoito maduro

Esquizonte

Gametócitos

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Tabela 1. Aspecto morfológico dos eritrócitos infectados e dos parasitas das diferentes espécies de Plasmodium (esfregaço clássico ou gota fina) P. vivax P. falciparum P. ovale P. malariae

Eritrócito infectado

Aumentado; Schuffner’s dots

Tamanho normal; Maurer’s clefts

Aumentado; James’s dots

Tamanho normal ou diminuído

Trofozoito imaturo (anel)

Grande; 1 ou 2 pontos de cromatina; por vezes 2 parasitas/cél

Pequeno; delicado; frequente com 2 pontos de cromatina e 2 ou mais parasitas/cél.

Compacto; Raro 2 parasitas/cél

Compacto; Raro 2 parasitas/cél

Trofozoito maduro

Grande; amebóide

Tamanho moderado; compacto

Pequeno; não amebóide

Pequeno e compacto

Esquizonte Grande, com grandes merozoitos (12-24); pigmentos coalescentes

Raro no sangue periférico; 8-26 merozoitos; Pigmentos agrupados em massa

Menor que P. vivax; 6-12 merozoitos; pigmentos mais escuros que P. vivax

Pequeno; 6-12 merozoitos

Gametócitos Esférico e compacto com um único núcleo; pigmentos difusos

Forma de lua crescente ou banana, com um único núcleo

Semelhante a P. vivax, mas menor

Semelhante a P. vivax, mas menor e menos numerosos

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Folha de observação e registo

Espécie ou taxon

Características microscópicas

Características macroscópicas

Outras observações